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minha opinião. Não sei que haja necessidade de estreitar estes laços que unem já os. dois povos, estas relações de amisade que ha entre os dois paizes e leva»los até á exageração, porque isto póde levar-nos a seguir uma politica que póde ser prejudicial á nossa independencia; porque um paiz cuja politica tem sido a das annexações e das aggressões até praticadas sem declaração de guerra, dá-nos exemplos de certas praticas contrarias ao direito, e esta politica, repito, póde ser prejudicial á nossa independencia, a qual esta garantida pelo direito e não pela força.

Por consequencia ir estreitar cada vez mais a intimidade politica com um paiz que se tem engrandecido mais pela força do que pelo direito, parece-me que é sanccionar precedentes que não podem ser senão prejudiciaes á nossa independencia.

Diz-se mais no discurso da corôa que as nossas relações de amisade continuam inalteraveis com todas as potencias estrangeiras.

Isto mesmo tem certa ligação com o que acabo de dizer. Pois se estamos em relações amigaveis com as potencias estrangeiras, como podemos ir estreitar relações e allianças politicas com um paiz que mantem ainda um voto do parlamento, de março de 1861, em que declara que uma cidade que esta n'um estado que não lhe pertence, é a sua capital, e que o proprio parlamento de Turim é o que declara que Roma é a capital de Italia?

Não podemos ir ao mesmo tempo acariciar o tigre e a sua preza. Não é 'fundado em principio algum de direito que um paiz póde manter um voto do parlamento que significa um acto de politica ambiciosa. Desde que nós formos a estreitar relações politicas tendentes a aceitar esta doutrina, poderemos sanccionar factos consummados contrarios ao direito internacional e prejudiciaes á independencia das nações.

A hora esta adiantada; a camara esta cansada de me ouvir, e por consequencia vou concluir, fazendo votos para que todas essas medidas que o governo houver de propor nos possam trazer remedio aos nossos males, que são grandes, e realmente sejamos francos; segreda-se de ouvido em ouvido uma especie de desconfiança geral que parece que já não temos para que appellar, pelo menos nos homens já se não confia, todos dizem que estamos á borda de um abysmo, parece-me que nós, homens, perdemos a confiança, por consequencia só temos a appellar para Deus.

Mas que disse eu? Fallei em Dous, cousa que não esta aqui? N'este documento não se encontra Deus, nem na pergunta, nem na resposta, nem no norte, nem no sul; navega-se por todos os rumos da agulha, e aqui não se encontra Deus! Notavel lacuna n'um documento d'esta ordem!

Lembra-me de uma anedocta, que não me recordo onde a li, mas que é a seguinte:

O papa Adriano VI, que fôra preceptor de Carlos V. e professor da universidade de Lovaina, mandou n'esta cidade edificar um collegio, onde poz a seguinte inscripção:

«Utrecht me deu o ser; Lovaina me deu agua; Cesar me deu esplendor.»

Um curioso acrescentou-lhe:

«Só Deus aqui não fez nada.»

O mesmo se póde dizer d'este documento.

Lacuna bem notavel! Estará Deus mal com os homens, ou os homens mal com Deus?

Qualquer das versões é pessima! Se me fosse dado poder supprir a uma tal lacuna, manifestando os sentimentos que a tal respeito nutro, eu o faria, additando a seguinte expressão: «Deus salve o paiz».

Tenho concluido.

Leu-se na mesa a seguinte

Substituição ao § 2.º do projecto de resposta

A viagem de Sua Magestade a Rainha á Italia para assistir a um acto de familia, permitte á camara a feliz supposição do que não fôra emprehendida em rasão do estado precario de saude da mesma Augusta Senhora, como se chegou a suppor mais uma vez. A camara folga com tal supposição, e aprecia esta circumstancia mais do que outra qualquer, que podesse ser causa da ausencia de Sua Magestade do seu paiz adoptivo, cujos habitantes sempre fizeram timbre da habitual dedicação o affecto a seus réis. = C. Testa.

Foi admittida.

O sr. Santos e Silva: — Sr. presidente, a camara não estava de certo preparada, para assistir a um sermão, ou a uma homilia. Não era costume até hoje trazer para esta casa questões religiosas a proposito da resposta ao discurso da corôa, e assentar sobre ellas a parte principal da discussão. Além d'esta novidade, é para surprehender tambem, como o illustre deputado, que acaba de fallar, houve por bem passar á commissão, e passar-nos a nós todos, um diploma de atheos!

Sr. presidente, Deus esta em toda a parte; revela-se a sua existencia em todas as suas obras; e são mais sinceras as nossas crenças, quando se affirmam por actos, do que quando se inculcam por discursos impertinentes e deslocados (apoiados). Desengane-se o illustre deputado, que a camara não aceita a questão no terreno, em que s. ex.ª a quer collocar.

A camara faz votos pela prosperidade da Italia, faz votos por todas as grandes idéas de liberdade, por todos os grandes principios; e não tem desejos de transportar para aqui a questão de Roma, nem a de Victor Manuel, nem a das temporalidades do papa, nem a da unidade de uma grande nação, porque a outros parlamentos, a outros oradores, a outros poderes, e a outros estados, cumpre dirimir similhantes assumptos. Tendo-se de referir á Italia, a proposito da viagem de uma alta personagem, a camara, que é respeitosa e cortez, não podia deixar de fazer os seus cumprimentos a um notavel paiz, que tem á sua frente Um rei, cuja augusta filha é nossa Rainha (apoiados).

A Italia, gloriosa no seu passado, grande no seu presente, e que tem diante de si um brilhante futuro, que não ha de ser indifferente aos destinos da civilisação dos povos continentaes da Europa, e ás grandes conquistas da liberdade democratica, que é o alvo a que miram as modernas sociedades, a Italia, sr. «presidente, merece e ha de sempre merecer as sympathias de todos os homens verdadeiramente liberaes (apoiados).

A camara, prestando as suas homenagens á Rainha de Portugal, fazendo votos por que a sua viagem seja mais um feliz ensejo para se estreitarem os laços de amisade que unem dois povos e duas dynastias, e mostrando desejos por que o regresso de Sua Magestade e o do Principe Real se não façam por muito tempo esperar; cumpriu o seu dever (apoiados).

Forte monomania! Deploravel aberração! A que proposito, sr. presidente, na discussão da resposta ao discurso da corôa, se arrasta para esta casa a questão do poder temporal do papa, de Roma, capital da Italia, da unidade e das annexações??? A que proposito vem os romances e a educação materialista da actual sociedade? A que proposito 'vem a pretensão do illustre deputado, que se indignou todo contra nós, contra a commissão, e creio, que tambem contra o governo, porque o documento, que estamos discutindo, não falla de Deus, e não sei se da vida eterna e da religião?? É notavel! É surprehendente similhante exibição.

Se o illustre deputado, o sr. Carlos Testa, a cuja intelligencia faço justiça, e cujas crenças, que se me afiguram sinceras, eu respeito, tem algumas esperanças de nos fazer envergar a roupeta, póde perde-las. Esta camara já não muda de habitos, e não aceita a roupeta com que o illustre deputado parece querer atavia-la (apoiados).

(Interrupção, que se não percebeu.)

Perdôe-me o illustre -deputado, eu aprecio muito o seu talento; digo mais alguma cousa, não só estimo muito o seu caracter, mas faço justiça á seriedade das suas convicções; todavia permitta-me dizer-lhe que não devemos confundir questões completamente distinctas, e não queira o illustre deputado collocar a camara, a commissão, ou o seu relator, na dura necessidade de ser um pouco severo, repellindo certas asserções ou insinuações, que nós não merecemos (apoiados).

Não fomos nós que trouxemos para aqui questões de atheismo, nem fizemos invocações religiosas, nem forçamos o debate a ponto de enxertar n'elle impertinencias, que ninguem póde aceitar (apoiados).

O acto de homenagem era um dever da nossa parte. Cumprimo-lo (apoiados). Insinuar n'elle a politica, transforma-lo, desfigura-lo por meio de uma censura, ou de uma phrase menos delicada e cortez, seria uma inconveniencia, que ninguem n'esta casa esta disposto a praticar (apoiados).

Pergunta o illustre deputado quaes são as relações que nós desejâmos estreitar com a Italia. Pela minha parte, respondo-lhe que desejo com aquelle paiz todas as relações, quer politicas, quer commerciaes, porque é do maior interesse para nós estar em paz e amisade com a Italia, bom como com todas as demais nações. Se fizemos menção especial da Italia, é porque a isso nos levou um acto de boa cortezia.

A commissão, em presença, da falla do throno, não podia deixar de consignar na sua resposta o grande desejo de que Portugal estreite cada vez mais as suas relações com um paiz, que esta tão ligado a nós pelos vinculos que toda a camara sabe (apoiados).

O sr. Carlos Testa: — Não soltei expressão alguma contra esse paiz; apenas contra o sou systema politico, em relação ao principio de annexação, que podia ser serio.

O Orador: — Desenganemo-nos e desengane-se o illustre deputado, que, apesar da sua má vontade, a Italia ha de ser poderosa, ha de ser livre, ha de ser uma das grandes potencias da Europa, porque esses são os 'seus destinos (apoiados).

O illustre deputado, alludindo ao paragrapho que se refere ao acto eleitoral, parece que o achou deficiente, por não se mencionarem lá todas as occorrencias eleitoraes, e por se não fallar talvez da sua eleição. Mas eu direi a s. ex.ª, que a commissão, quando redigiu o seu projecto do resposta, não se lembrou da eleição do illustre deputado, por lhe não constar que se praticassem n'ella actos taes que fosse preciso relatar.

A eleição do illustre deputado foi aqui approvada sem reparo algum. Apenas s. ex.ª disse alguma cousa. Não sei mesmo se houve algum protesto ou reclamação. Se o houve, foi de tal ordem que não levantou questão n'esta casa.

Fallou a commissão, em rarissimas excepções, quando aludiu á tranquillidade e liberdade, que reinaram no acto eleitoral. E verdade. Nem podia fallar de outro modo. Desde que á commissão constou, por um documento impresso e distribuido n'esta casa— o parecer sobre a eleição de Vinhaes — que n'um circulo eleitoral, ou pelo menos n'uma assembléa, a de Santalha, se praticaram actos perturbadores da liberdade eleitoral, julgou do seu dever fallar a verdade, e não omittir um facto, que ora conhecido de todos nós. Mas a tranquillidade e a liberdade, se não foram completissimas, foram completas, o mais completas que é costume acontecer em actos de tal natureza. Nem á commissão consta, nem esta camara, nem o illustre deputado, nem ninguem, póde affirmar, que por parte do governo fossem ordenados ou insinuados quaesquer actos attentatorios da consciencia do voto e da liberdade eleitoral (apoiados). Os proprios disturbios de Santalha não foram começados ou provocados pelo candidato e eleitores governamentaes. A provocação em Santalha partia da opposição.

Seja como for, sr. presidente, é facto que nenhum de nós esta aqui por alcavalas, subornos ou actos de compressão por parte do governo. Estamos aqui pelo suffragio livro e espontaneo dos povos (apoiados). Estamos aqui pelo nosso direito, desassombrado de toda a violencia governamental. Estas eleições foram libérrimas, são a expressão genuina da vontade nacional, têem uma alta significação politica, e o nosso diploma não esta menos limpo, não é menos puro, do que o de todos os nossos antecessores, que têem tomado assento n'esta casa, desde que ha systema representativo entre nós (apoiados).

É muito simples a rasão por que a commissão fez rarissimas excepções Á tranquillidade e liberdade eleitoraes. Dos incidentes eleitoraes se podemos ter conhecimento official, quando são aqui discutidos os pareceres das commissões; antes d'isso é facil ter informações particulares, mais ou menos exactas, mas conhecimento official e exacto só se póde adquirir á vista dos documentos legaes. Ora, quando a commissão da resposta ao discurso do throno lavrou este documento, que estamos discutindo, eram já do dominio da camara os documentos relativos á eleição de Santalha. Parece-me que não ha motivo nenhum para a commissão ser censurada, e antes se lhe deve fazer justiça pela sinceridade e franqueza com que procedeu (apoiados).

Eu não posso acompanhar em todas as suas fases a prelecção moral e religiosa do illustre deputado, e por consequencia não tratarei agora de discutir se os romances que a esmo se espalham na sociedade, se as doutrinas materialistas, ou pouco religiosas, são ou não o principal motivo do nosso mau estado financeiro, e até que ponto têem contribuido para o desprestigio ou fraqueza da auctoridade. Concordo que ha um mau estar na sociedade; concordo que são precisas reformas, mas entendo tambem que ellas não se decretam pela fórma e sob o ponto de vista que o illustre deputado quer. Eu não dispenso por ora, no meu paiz, a acção do governo em tudo que poder concorrer beneficamente para a educação moral e politica dos cidadãos, mas quero alem d'isto e sobretudo a influencia salutar da iniciativa particular, porque todos nós temos obrigação de concorrer para a nossa grande regeneração politica e moral (apoiados).

Eduquemos nossos filhos na religião de seus paes; e se é necessario formar almas para Deus, é tambem indispensavel crear bons cidadãos para a sociedade (apoiados).

(Interrupção que não se ouviu.)

Estabeleçam-se os principios; muito bem. E sabe o illustre deputado, quaes são os principios que eu hei de estabelecer quando se discutir essa materia? São os principios da ampla liberdade, emquanto se não attentar contra as nossas instituições, e se não pretender com as liberdades de uns suffocar e agrilhoar as liberdades dos outros (apoiados).

(Interrupção do sr. Testa que não se ouviu.)

Quero todas as associações, que não sejam perturbadoras da ordem publica, porque, desde que ellas se tornarem instrumentos politicos para perturbarem a liberdade dos outros, então voto para que sejam contidas dentro dos seus limites racionaes.

Quando as associações não tendam a desvirtuar as instituições que nos regem, as instituições que assentam sobre a liberdade e os principios constitucionaes, não hei do votar contra ellas; serei sempre por ellas; mas hei de empregar todos os meus esforços para que se não deixem acclimar no nosso paiz plantas que possam produzir fructos venenosos.

Voto contra as associações, que tenham por fim minar as instituições constitucionaes, quer vivam nas trevas, quer appareçam á luz do sol; mas quando ellas não tiverem estes intuitos, hei de respeita-las e acata-las, porque respeito e acato o principio da associação em todas as suas manifestações, e em todas as espheras da actividade humana.

Peço desculpa aos meus collegas, que tomaram parte n'esta discussão, de não lhes responder pela sua ordem, porquanto as observações apresentadas pelo sr. Carlos Testa, que foi o ultimo a fallar, involuntariamente me levaram a faltar á consideração que devia aos srs. deputados que fallaram antes d'elle.

"O que é facto e que o discurso do illustre deputado resume-se em dois pontos.

Em primeiro logar quiz mostrar s. ex.ª a sua má vontade á Italia; são opiniões, segundo me consta, que o illustre deputado não occulta a ninguem, nem em parte alguma. Pelo menos honra-o esta franqueza, e não serei eu que lh'a censurarei. S. ex.ª aproveitou a primeira questão politica n'esta casa para nos dizer que é inimigo da unidade da Italia.

Estamos n'um completo desaccordo, porque sou exactamente de opinião contraria. Mas, a proposito da Italia, s. ex.ª podia dispensar a camara de lhe ouvir uma profissão de fé religiosa. Nós não lhe merecíamos umas certas insinuações de atheismo, pelo facto de não falharmos em Deus no documento que estamos discutindo.

O segundo ponto do discurso do illustre deputado foi mostrar que a educação religiosa da sociedade esta acima de todos os outros deveres por parte do governo; e eu declaro que, desejando que se mantenham vivos e sinceros os principios religiosos e os principios moraes, ha outros misteres importantissimos a desempenhar na sociedade, não só por parte do governo, mas tambem por parte dos cidadãos (apoiados). '

Creio que deu a hora e por isso peço a v. ex.ª que me reserve a palavra para ámanhã.

O sr. Presidente: — A ordem do dia para ámanhã é a continuação d'esta discussão, e se houver tempo entrará tambem em discussão o projecto de lei n.° 2 — bill de indemnidade. Está levantada a sessão.

Eram quatro horas da tarde.