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Diario da camara dos senhores deputados

Discurso do sr. Pinheiro Borges, proferido na sessão de 19 do corrente, e que deveria ler-se a pag. 410, col. 1.ª

O sr. Pinheiro Borges: — Julgo do meu dever explicar desde já o meu voto, não só porque assignei com declarações o parecer das commissões de fazenda e guerra reunidas, mas porque me afasto n'este assumpto um pouco dos meus amigos politicos.

Não é esta a primeira vez que isto me acontece, e sempre o tenho feito desassombradamente, certo de que estas divergencias de opinião não põem em duvida a minha lealdade, e que pelo contrario demonstram que nos arraiaes reformistas se preferem os escrupulos de consciencia a quaesquer outras considerações (apoiados).

Eu aceito o projecto do governo, mas não as rasões com que o governo o apoia; influem no meu animo outras considerações, que passo a expor.

Eu aceito o projecto, porque elle dá maior valor a um dos tres elementos precisos para a defeza do paiz, a qual no meu entender se póde considerar como um problema de mechanica, representando uma resistencia, producto d'esses elementos. E tendo idéas fixas, ácerca do limite minimo d'essa resistencia; isto é, tendo de antemão determinado o producto que os tres factores, pessoal, material e fortificações, devem formar para que contenham alguma efficacia, aceito toda a solução que augmenta o valor d'este producto que existe muito distante do que deve ser (apoiados).

Sr. presidente, eu só posso aceitar as rasões do governo com o fim especulativo de lhe demonstrar praticamente na primeira sessão legislativa, se a camara for a mesma, e eu aqui estiver, que este elemento de força publica, a que elle chama reserva, não é a reserva a que os escriptores militares destinam um papel principal na defeza das nações ameaçadas de invasão; para lhe demonstrar que essa reserva não é mais do que um contingente, inferior á decima parte d'aquelle que o paiz póde fornecer, tornando o serviço obrigatorio; para lhe demonstrar que a actual organisação do exercito sem a reserva convenientemente organisada não produz d'esses soldados velhos promptos a ser mobilisados de um para outro momento.

A não ser nas guardas municipaes, nem no exercito nem na chamada reserva existem soldados velhos; a experiencia de 1866 bem o demonstrou. N'esse anno tambem se chamou a reserva, alem de faltarem muitas praças, a maior parte dos que se apresentaram tinham esquecido a instrucção, tinham perdido os habitos da vida militar, e tanto a estranharam que o maior numero deu baixa aos hospitaes (apoiados). Foi alem d'isso necessario dar-lhes uniformes, que não tiveram tempo de pagar, e debaixo d'este ponto de vista mais valia completar o pé de paz do exercito com recrutas, obrigando os districtos a pagar as dividas dos contingentes que lhes tem sido distribuidos, e não têem sido satisfeitos.

Aceito ainda o projecto, porque estou convencido que é o maior esforço que do governo ha a esperar em favor do desenvolvimento da força publica, no meu entender necessario para assegurar a segurança interna e a defeza do paiz.

Eu não posso deixar de dar rasão aos cavalheiros que têem fallado por parte da opposição, quando elles affirmam que ha gravo injustiça em chamar ao serviço aquelles que já serviram, emquanto que os que não cumpriram a lei ficam muito socegados nas suas casas. Isto é verdade, e o argumento pesa bastante sobre o meu animo; mas ainda me pesam mais as preoccupações a que obedeço, e que me levam a aceitar o projecto para que me não assalte qualquer remorso futuro. Deixo, porém, ao governo que pede os recursos a responsabilidade das rasões que o conduzem a chamar a reserva n'este momento; e por isso mesmo que lhe faço a concessão, não deixarei de lhe tomar severas contas quando a experiencia me mostre que o governo teve em vista satisfazer fins differentes dos da defeza e segurança publica (apoiados).

Para as necessidades da defeza do paiz este chamamento da reserva é insufficiente, mas emfim vae reunir isso que chamam reserva, e que se não sabe aonde está; as necessidades da nossa organisação militar são outras, mas vou aceitando esta medida como transição; porque o governo nem quer alterar a lei do recrutamento, nem quer organisar convenientemente a reserva, nem quer estabelecer o serviço obrigatorio, que no meu entender são providencias necessarias para a organisação militar mais conveniente ao paiz (apoiados).

Que o governo não quer alterar a lei do recrutamento, deduz-se das observações feitas por s. ex.ª o sr. ministro da guerra, quando hontem declarou que achava boa a que actualmente vigora, fundando o seu argumento na circumstancia de ter sido feito pelos seus adversarios politicos (apoiados. — Vozes: — É verdade). Isto não é argumento. Basta olhar para a data da lei, basta considerar que a lei foi feita em 1855, e que estamos em 1873, para reconhecer que se tornou anachronica. Entre 1855 e 1873 operaram-se taes melhoramentos no material de guerra, que, determinando uma alteração completa na organisação dos principaes exercitos da Europa, pedem que a nossa organisação militar passe tambem por uma transformação radical (apoiados).

Disse mais s. ex.ª a respeito da lei do recrutamento, que se a actual não se cumpre, muito mais resistencias havia de encontrar outra que exigisse maiores sacrificios! Mas porque se não cumpre? Por causa dos governos que, não tendo opinião publica se servem ou antes abusam d'ella, empregando-a como arma eleitoral. Eu já aqui affirmei uma vez que ha no reino districtos aonde só a opposição fornece recrutas para o exercito (apoiados).

A parcialidade dos delegados do governo não póde servir de argumento, ella só indica intolerancia, levada muitas vezes ao maior excesso; e a proposito d'isto, e como exemplo, me lembra um caso recente.

Quando o sr. marquez d'Avila e de Bolama era ministro do reino veiu a Lisboa um cavalheiro da provincia, muito respeitavel, amigo de s. ex.ª, e antigo liberal, certificar ao sr. ministro que as cousas tinham chegado a ponto, que a auctoridade augmentava o numero dos seus eleitores, protegendo os ratoneiros, comtanto que assaltassem tão sómente os quintaes dos que faziam opposição (riso).

A unica alteração que podemos esperar na lei do recrutamento, segundo as declarações de s. ex.ª o ministro da guerra, é estabelecer n'ella a substituição, em vez da remissão.

Fica, pois, subsistindo do mesmo modo o principio da isenção do imposto de sangue para os favorecidos da fortuna, e creio que o exercito nada ganha com a modificação.

Todos os que têem servido nos corpos de primeira linha são concordes em affirmar, que os substitutos não são os melhores soldados; e quando eu servi em infanteria tive