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CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

32.ª SESSÃO

EM 20 DE JUNHO DE 1908

SUMMARIO. - Approvada a acta e lido o expediente, tem segunda leitura um projecto de lei. - O Sr. Reymão insta por documentos que pediu e refere-se ao provimento do logar de piloto-mor da barra de Aveiro e á nomeação dos professores primarios. Responde-lhe, o Sr. Ministro da Marinha. - O Sr. Pinto da Motta occupa-se do contrato de adjudicação do Theatro de D. Maria II, respondendo-lhe o Sr. Ministro da Justiça. - O Sr. Valerio Villaça pede providencias contra a concorrencia feita pelo commercio ambulante ao commercio estabelecido. Responde-lhe o Sr. Ministro da Fazenda.- O Sr. Costa Lobo justifica um projecto de lei sobre a questão vinicola.- O Sr. Oliveira Mattos apresenta um parecer da commiasão de administração publica, e requer documentos relativos a dividas de contribuições e adeantamentos feitos a funccionarios. Responde-lhe o Sr. Ministro da Fazenda. - O Sr. Brito Camacho deseja tratar como questão urgente a forma como se está procedendo ao cadastro da população, o que a Camara não reputa de urgencia. - Os Srs. Affonso Costa, Almeida Garrett e Nunes da Silva requerem varios documentos. - O Sr. Mário Monteiro apresenta um projecto de lei relativo ao agronomo Antonio Filipe da Silva. - O Sr. Nunes da Silva annuncia um aviso previo sobre a situação da magistratura judicial. - O Sr. Brito Camacho apresenta um aviso prévio sobre o cadastro da população de Lisboa. - O Sr. Canto e Castro apresenta uma representação dos pilotos da barra de Lisboa e o Sr. Estevam de Vasconcellos uma representação da Associação dos Operários Corticeiros de Almada.

Na ordem do dia continua a discussão do projecto de lei n.º 14. fixação da lista civil, usando da palavra os Srs. João de Menezes, Soares Branco e Joaquim Pedro Martins.

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2 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Presidencia do Exmo. Sr. Libanio Antonio Fialho Gomes

Secretarios - os Exmos. Srs.:

Amandio Eduardo da Motta Veiga
Antonio Augusto Pereira Cardoso

Primeira chamada - Ás 2 horas da tarde.

Presentes - 8 Srs. Deputados.

Segunda chamada - Ás 2 e 45 da tarde.

Presentes - 64 Srs. Deputados.

São os seguintes: - Abel de Mattos Abreu, Abilio Augusto de Madureira Beça, Affonso Augusto da Costa, Alberto Pinheiro Torres, Alfredo Candido Garcia de Moraes, Alfredo Mendes de Magalhães Ramalho, Amadeu de Magalhães Infante de La Cerda, Amandio Eduardo da Motta Veiga, Antonio Alberto Charulla Pessanha, Antonio Alves Oliveira Guimarães, Antonio Augusto de Mendonça David, Antonio Augusto Pereira Cardoso, Antonio Ferreira Cabral Paes do Amaral, Antonio José Garcia Guerreiro, Antonio Maria Dias Pereira Chaves Mazziotti, Antonio Rodrigues Ribeiro, Antonio Sergio da Silva e Castro, Antonio Zeferino Candido da Piedade, Augusto de Castro Sampaio Côrte Real, Augusto Cesar Claro da Ricca, Augusto Pereira do Valle, Augusto Vidal de Castilho Barreto e Noronha, Aurélio Pinto Tavares Osorio Castello Branco, Carlos Augusta Ferreira, Diogo Domingues Peres, Eduardo Valerio Augusto Villaça, Francisco Limpo de Lacerda Ravasco, Francisco Mirandada Costa Lobo, Gaspar de Queiroz Ribeiro de Almeida e Vasconcellos, Henrique de Mello Archer da Silva, João do Canto e Castro Silva Antunes, João Henrique Ulrich, João de Sousa Tavares, Joaquim Anselmo da Matta Oliveira, Joaquim Heliodoro da Veiga, Joaquim José Pimenta Tello, Joaquim Mattoso da Camara, Joaquim Pedro Martins, José Antonio da Rocha Lousa, José de Ascensão Guimarães, José Bento da Rocha e Mello, José Caeiro da Matta, José Caetano Rebello, José Gonçalves Pereira dos Santos, José Malheiro Reymão, José Maria de Moura Barata Feio Terenas, José Maria de Oliveira Mattos, José Ribeiro da Cunha, José dos Santos Pereira Jardim, Libanio Antonio Fialho Gomes, Lourenço Caldeira da Gama Lobo Cayolla, Manuel Affonso da Silva Espregueira, Manuel de Brito Camacho, Manuel Joaquim Fratel, Mario Augusto de Miranda Monteiro, Miguel Augusto Bombarda, Paulo de Barros Pinto Osorio, Rodrigo Affonso Pequito, Sabino Maria Teixeira Coelho, Thomaz de Aquino de Almeida Garrett, Vicente de Moura Ccutinho de Almeida de Eça, Visconde de Coruche, Visconde de Oliva, Visconde de Villa Moura.

Entraram durante a sessão os Srs.: - Abel Pereira de Andrade, Alberto de Castro Pereira de Almeida Navarro, Alexandre Braga, Alexandre Correia Telles de Araujo e Albuquerque, Alfredo Carlos Le Cocq, Alvaro Rodrigues Valdez Penalva, Anselmo Augusto Vieira, Antonio de Almeida Pinto da Motta, Antonio Caetano de Abreu Freire Egas Moniz, Antonio Centeno, Antonio José de Almeida, Antonio Macedo Ramalho Ortigão, Antonio Osorio Sarmento de Figueiredo, Antonio Rodrigues Nogueira, Antonio Tavares Festas, Arthur Pinto de Miranda Montenegro, Conde da Arrochella, Conde de Castro e Solla, Conde de Mangualde, Conde de Penha Garcia, Eduardo Frederico Schwalbach Lucci, Emygdio Lino da Silva Junior, Ernesto Julio de Carvalho e Vasconcellos, Fernando Augusto Miranda Martins de Carvalho, Fernando de Sousa Botelho e Mello (D.), Francisco Cabral Metello, Francisco Joaquim Fernandes, Francisco Xavier Correia Mendes, João Carlos de Mello Barreto, João Correia Botelho Castello Branco, João Duarte de Menezes, João Ignacio de Araujo Lima, João José Sinel de Cordes, João Pinto Rodrigues dos Santos, João Soares Branco, João de Sousa Calvet de Magalhães, José Augusto Moreira de Almeida, José Cabral Correia do Amaral, José Coelho da Motta Prego, José Estevam de Vasconcellos, José Francisco Teixeira de Azevedo, José Jeronymo Rodrigues Monteiro, José Joaquim Mendes Leal, José Joaquim da Silva Amado, José Maria Joaquim Talares, José Maria Pereira de Lima, José Maria de Queiroz Velloso, José Mathias Nunes, Luis Vaz de Carvalho Crespo, Manuel Antonio Moreira Junior, Manuel Nunes da Silva, Manuel Telles de Vasconcellos, Matheus Augusto Ribeiro de Sampaio, Roberto da Cunha Baptista, Thomaz de Almeida Manuel de Viihena (D.).

Não compareceram a sessão os Srs.: - Adriano Anthero de Sousa Pinto, Alfredo Pereira, Alvaro Augusto Froes Possollo de Sousa, Antonio Bellard da Fonseca, Antonio Hintze Ribeiro, Antonio Rodrigues Costa da Silveira, Arthur da Costa Sousa Pinto Basto, Conde de Azevedo, Conde de Paçô-Vieira, Duarte Gustavo de Roboredo Sampaio e Mello, Eduardo Burnay, Ernesto Jardim de Vilhena, Fernando de Almeida, Loureiro e Vasconcellos, Frederico Alexandrino Garcia Ramirez, Henrique de Carvalho Nunes da Silva Anachoreta, João Joaquim Isidro dos Reis, João José da Silva Ferreira Netto, João Pereira de Magalhães, Jorge Vieira, José Antonio Alves Ferreira de Lemos Junior, José Joaquim de Sousa Cavalheiro, José Julio Vieira Ramos, José Maria de Oliveira Simões, José Osorio da Gama e Castro, José Paulo Monteiro Cancella, José Victorino de Sousa e Albuquerque, Luis Filippe de Castro (D.), Luis da Gama, Manuel Francisco de Vargas, Manuel de Sousa Avides, Mariano José da Silva Prezado, Visconde de Reguengo (Jorge), Visconde da Torre.

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SESSÃO N.° 32 DE 20 DE JUNHO DE 1908 3

ABERTURA DA SESSÃO - Ás 3 horas da tarde

Acta - Approvada.

Officios

Do Ministerio dos Negocios Estrangeiros, remettendo nota das despesas liquidadas e não pagas até 31 de janeiro de 1908, satisfazendo assim ao requerimento do Sr. Deputado João Carlos de Mello Barreto.

Para a secretaria.

Do Ministerio do Reino, remettendo copias dos officios dirigidos pelo director da Escola Polytechnica de Lisboa ao director geral da instrucçao secundaria, superior e especial em dezembro de 1906 e maio de 1908, sobre o concurso para a cadeira de mineralogia, satisfazendo assim ao requerimento do Sr. Deputado Alfredo Mendes de Magalhães Ramalho.

Para a secretaria.

Do Ministerio das Obras Publicas, remettendo nota das quantias fornecidas por este Ministerio para obras no Paço Episcopal da Guarda, durante os ultimos oito annos economicos, satisfazendo assim ao requerimento do Sr. Deputado Duarte Gustavo de Reboredo Sampaio e Mello.

Para a secretaria.

Do Ministerio das Obras Publicas, remettendo nota das dividas deste Ministerio, liquidadas e não pagas até 31 de dezembro de 1907, conforme fora solicitado pela commissão do orçamento desta Camara.

Para a secretaria.

Do Ministerio das Obras Publicas, remettendo nota da despesa com os serviços de propaganda commercial nos annos economicos de 1901-1902 a 1906-1907, e nota da exportação de vinhos por intermedio do Mercado Central, satisfazendo assim ao requerimento do Sr. Deputado José Maria Pereira de Lima.

Para a secretaria.

Segunda leitura

Projecto de lei

Senhores. - Attendendo á terrivel crise vinicola, que tantos e tão grandes prejuizos tem trazido ás freguesias de Collares, S. Martinho e S. João das Lampas, do concelho de Cintra, não só em consequencia da falta quasi absoluta de compradores, mas principalmente pela extraordinaria reducção que tem soffrido o preço dos seus magnificos vinhos de pasto.

Attendendo a que o verdadeiro vinho conhecido pelo nome de Collares só pode ser produzido nos terrenos de areia, por ser unicamente nesta qualidade de terreno que a casta chamada ramisco se desenvolvo e produz;

Considerando que estes terrenos não podem ser utilizados para nenhuma outra cultura;

Considerando que não só a plantação de vinhas na areia, mas tambem o seu fabrico, é muito dispendioso, tenho a honra de levar á vossa consideração o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° Ficam isentos do pagamento da contribuição predial, emquanto existir a actual crise vinicola, as vinhas já plantadas nos terrenos de areia da freguesia de Collares, S. Martinho e S. João das Lampas, do concelho de Cintra.

Art. 2.° Pica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da Camara dos Senhores Deputados, 19 de junho de 1908. = Chaves Mazziotti.

Foi admittido á discussão e enviado á commissão de fazenda.

O Sr. Malheiro Reymão: - Sr. Presidente: antes de me referir ao principal assunto para que pedi a palavra, rogava a V. Exa. se dignasse instar com o Ministerio da Fazenda para que me fossem remettidos alguns documentos que desde muito reclamei e ainda até hoje me não foram enviados.

Solicitei do Ministerio da Fazenda documentos indispensaveis para apreciação de uma resolução tomada pelo actual Governo, a proposito do regime do açucar na ilha da Madeira.

Essa questão é uma das mais graves e importantes, quer sob o ponto de vista da economia da ilha, quer sob o ponto de vista da moralidade, e preciso tratar d'ella no Parlamento.

Na occasião em que deixei o Ministerio estava quasi a ser resolvido este assunto em condições, a meu juizo, convenientes; mas o Governo actual seguiu a esse respeito orientação absolutamente diversa d'aquella que tinha ficado traçada e julgo que assim serviu apenas os interesses dos industriaes.

Eu desejo tratar desta questão sobre documentos que revistam um caracter de autenticidade e que sejam absolutamente indiscutiveis. Rogo porem a V. Exa. que inste com o Ministerio da Fazenda para que me sejam enviados, com a possivel urgencia, os documentos que pedi.

E, como está presente o Sr. Ministro da Marinha, vou tratar do assunto para que mais especialmente pedi a palavra. Não peço resposta a S. Exa., que porventura pode não ter conhecimento deste assunto.

Desejo referir-me ao concurso para o provimento da vaga de piloto-mor de Aveiro.

Esta questão pode parecer insignificante, mas não é.

Desde que as leis foram feitas para se cumprir e desde que o Governo inscreve, como principal tenção do seu programma, o cumprimento exacto é rigoroso da lei, não se deveria, no interesse da politica, preterir as disposições claras e terminantes da mesma lei.,

Foi aberto concurso para a vaga de piloto-mor de Aveiro, e tinha este concluido, quando, em virtude de ordens superiores, foi prorogado o prazo do concurso por mais dez ou doze dias para se alterarem disposições da lei e, ao que se diz, para ser provido nesse logar o afilhado de um dos maiores influentes d'aquella região, que aliás é largamente fertil em influencias.

Sr. Presidente: a lei de 1878 diz que para ser provido no logar de piloto é preciso ter não menos de 21 annos nem mais de 35 de idade; pois não obstante isto, no concurso ultimamente aberta declara se que poderão ser admittidos a concorrer individuos que tiverem mais que 21 annos e menos de 54 annos de idade!

Onde é que o Sr. Ministro da Marinha foi encontrar uma disposição, um preceito que autorize este extraordinario escandalo? Está manifesta derogaçoso dos preceitos legaes, este acto de favoritismo com que se pretende beneficiar um individuo, preterindo outros que tinham ido ao primeiro concurso, o que é senão simplesmente fazer politica a menos defensavel e a mais criminosa, pois será proteger um individuo em manifesto desproveito de outros! (Apoiados).

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4 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Como disse, o Sr. Ministro da Marinha pode não ter conhecimento dcsse assunto e não peço portanto resposta de S. Exa.; opportunamente a dará, explicando, não a mira, mas á Camara e ao país, os motivos por que assim procedeu num caso desta ordem.

Tambem desejava dirigir-me ao Sr. Presidente do Conselho para pedir a attenção de S. Exa. a proposito da lastimosa situação em que se encontram numerosos candidatos aos logares de professores de instrucção primaria que, pelas disposições legaes vigentes, não poderão ser despachados e podem, por completo, perder a esperança do alcançar alguma collocação.

As disposições legaes que regulam o assunto - e que creio estão sendo executadas ainda rigorosamente por este Governo - determinam que nos logares de professores de instrucção primaria serão de preferencia providos aquelles que tiverem melhor classificação, ou nota nos respectivos cursos de habilitação.

Este criterio não é justo, nem averigua do merecimento relativo dos professores entre si. Assim, só teem a esperança de ser collocados os alumnos que frequentaram essas escolas onde havia mais escandalosas e generosas classificações, ao passo que os que cursavam escolas que eram mais parcimoniosas, mais rigorosas, nos valores que davam aos seus alumnos, veem a sua carreira perdida e não podem ter esperança de algum dia ser collocados como professores de instrucção primaria.

Desde que ha abundancia de individuos habilitados, o criterio justo seria sujeitar estes individuos a concurso para demonstrarem por provas praticas os seus merecimentos. Estabelecia-se um criterio pelo qual poderia fazer-se um recrutamento perfeito de professores de instrucção primaria; premiavam-se aquelles que, tendo completado os seus cursos, effectivamente se teem continuado a habilitar, podia dar-se até preferencia aquelles que tivessem praticado o ensino ou mesma obrigá-los a um determinado estagiato.

O que reputo essencial é que, por qualquer forma, o Governo attenda ao assunto, porque uma das condições mais indispensaveis para ter uma boa instrucção é ter bons professores, e para os ter é necessario fazer uma boa selecção, a qual só poderá conseguir-se por esta forma ou por qualquer outra, porque eu não me permitto lembrar ou indicar como unico alvitre razoavel aquelle que acabo de referir. O que desejo é chamar a attenção do Governo para este assunto e pedir ao Sr. Ministro do Reino que apresente á Camara uma providencia a este respeito, que julgo terá uma benéfica acção no desenvolvimento da nossa instrucção.

Tambem tenho recebido reclamações de differentes associações commerciaes em que me pedem para chamar a attenção do Governo para a concorrencia absolutamente invencivel que fazem os vendedores ambulantes aos commerciantes que teem as suas lojas estabelecidas em differentes localidades. Já o assunto tem sido versado por differentes Deputados que teem recebido reclamações da mesma natureza, e, por isso, limito me a pedir para este assunto a attenção do Governo, esperando que elle adoptará as providencias que julgue mais conformes com a justiça destas reclamações porque me parece que a ellas não deixa de assistir razoavel fundamento.

Acabo por aqui as minhas considerações e peço a V. Exa. que insto com o Ministerio da Fazenda para que me sejam enviados os documentos que pedi a proposito do regime do açucar na ilha da Madeira.

O Sr. Ministro da Marinha (Augusto de Castilho): - Pedi a palavra para responder immediatamente ao Sr. Deputado que me fez algumas perguntas sobre o provimento da vaga de piloto-mor da barra de Aveiro.

Eu teria preferido que S. Exa. me tivesse dado uma prevenção, não muito grande, mas a necessaria para eu trazer á Camara todos os documentos relativos a este assunto, que me parece muito fácil de comprehender em todas as suas minuciosidades.

A lei manda que o piloto-mor da barra de Aveiro seja nomeado de entre os pilotos da corporação, mas succede que os. pilotos que a constituiam não tinham as habilitações necessarias para a poder dirigir, e, por consequencia era indispensavel, por proposta da autoridade superior d'aquelle departamento, procurar-se outra maneira de prover esse logar, ou, no caso contrario, ficar por prover. E V. Exa. comprehende que, se a lei estabelece que haja um chefe da corporação, era necessario providenciar-se nesse sentido, e não deixar a corporação acephala.

A lei marca effectivamente, que para se entrar no quadro dos pilotos se não exceda a idade de 35 annos, mas comprehende-se que, para se ser piloto-mor, se demanda uma certa pratica e condições que não se attingem senão em idade mais avançada. Foi por isso que se julgou preferivel a deixar se a corporação sem chefe, o adoptar-se uma providencia provisoria que permittisse a nomeação do concorrente melhor classificado, e que tinha 50 annos de idade ou pouco mais.
Prometto trazer á Camara na proxima sessão os documentos comprovativos do que disse.

Aproveito a occasião de estar com a palavra para declarar a V. Exa. que estou perfeitamente habilitado para responder ás perguntas que o Sr. Deputado Antonio José de Almeida tenciona dirigir-me, e de que V. Exa. me mandou dar conhecimento.

Direi ainda, com respeito a umas perguntas que me dirigiu, por intermédio de V. Exa., o Sr. Deputado Affonso Costa, relativamente á prorogação do prazo das armações ao norte de Leixões, até 30 de setembro, que o regulamento geral da pesca da sardinha, de 14 de maio de 1903, estabelece no artigo 98.° que as armações que se lançam na costa do departamento maritimo do norte estarão em exploração de 15 de março a 30 de setembro.

Ha um pedido dos armadores daquelle departamento para que seja alterado o prazo, mas esse pedido está affecto á commissão de pescarias, que ainda não deu o seu parecer. Logo que o de, estou pronto a communicar a substancia d'elle ao illustre Deputado.

Ha ainda uma outra pergunta, que me foi dirigida pelo Sr. Deputado Moreira de Almeida, por intermedio de V. Exa., e que diz respeito á differença estabelecida no, novo orçamento da provincia de Moçambique, entre os filhos das colonias e os individuos europeus, na questão dos seus vencimentos.

Julgo que será desnecessario dizer á Camara que sou muito liberal, e por isso que, no meu espirito, não existe differença entre qualquer cidadão português, quer tenha nascido na zona torrida ou na temperada, quer seja branco ou preto, mestiço ou mulato; para mim todos são iguaes perante a lei; a todos é permittido occupar qualquer cargo na administração publica, comtanto que satisfaçam os preceitos que as leis exigem.

Esta doutrina, que tem sido de ha muitos annos seguida em Portugal, tem sido uma das nossas glorias, como país colonial. (Apoiados). E assim que nos vemos nos mais altos cargos, nas posições mais nobres, tanto da vida civil, como da militar, individuos filhos das nossas colonias.

Estou perfeitamente de acordo com as nossas leis que não distinguem entre cidadãos europeus e os naturaes do ultramar, e por conseguinte escusado será dizer a V. Exa. que a disposição estabelecida recentemente no orçamento da provincia de Moçambique e approvada pelo Conselho do Governo não pode merecer a minha approvação e que vou providenciar no sentido de não consentir essas differenças, que são odiosas e antipathicas.

V. Exa. comprehende que o nosso país, que tem avançado sempre no caminho da civilização, á frente de qual-

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quer outro, na sua tolerância e maneira de tratar as raças, não pode, no seculo XX, voltar atrás. (Apoiados).

(S. Exa. não reviu).

O Sr. Malheiro Reymão: - É simplesmente para declarar a V. Exa., Sr. Presidente, que acabo de receber os documentos a que ha pouco me referi.

O Sr. Pinto da Motta: - Sr. Presidente: na ausência do Sr. Ministro do Reino, por cuja pasta correm os negocios referentes ao assunto que vou tratar, peço ao illustre Ministro da Justiça a fineza de attender ás minhas considerações e solicitações e dignar-se transmitti-las ao Sr. Presidente do Conselho.

Vou referir-me á situação criada aos antigos societários do Theatro de D. Maria, pelos decretos do Sr. João Franco, de 14 de dezembro de 1906 e 23 de abril de 1907, tão parecidos um com o outro, como se parecem duas gotas de agua, e que teem todos os caracteres da legislação do Sr. João Franco: inepcia, violencia e malevolencia.

O decreto de 14 de dezembro de 1906 diz no seu artigo 1.°:

(Leu).

O artigo 3.° diz:

(Leu).

Aqui tem V. Exa. que por este artigo ficam os antigos societários privados individualmente do seu direito de trabalho direito natural, sob pena de perderem os direitos adquiridos á sua aposentação. Quer dizer: o Sr. João Franco, pelo artigo 3.° do seu decreto de 14 de dezembro de 1906, collocou os antigos secretarios numa situação que hoje se não admittiria mesmo a pretos, e como se elles constituissem uma sub-raça.

Transformou-os em servos d'aquella gleba.

O artigo 1.° é attentatorio dos direitos civis da sociedade artistica, organizada pelo Governo pelo decreto de 4 de agosto de 1898, devido ao Sr. José Luciano de Castro. Com efteito, pelo artigo 2.° do decreto de 4 de agosto, é concedido á sociedade o usufruto gratuito do Theatro de D. Maria.

Ora é sabido que no tocante a usufruto, quando se não marca prazo, se entende que este é perpetuo; mas como para sociedades não haja usufruto perpetuo, deverá entender-se que o prazo é o máximo, isto é, trinta annos.

É assim que diz a lei geral; assim como se comprehende que uma exploração d'aquella ordem, a exploração do theatro, que exige largas despesas, não se pode acceitar sem a certeza do dia de amanhã.

Mas ha mais. Pelo decreto de 4 de agosto é tambem criado um cofre de subsidios e soccorros, preceituando se nos artigos 55.° e 56.° quaes os fundos de receita que o hão de alimentar.

Como, porem, fosse necessario desviar receitas do Estado, e isso excedesse as faculdades do executivo, no artigo 60.° "disposições transitorias", dispõe-se que os artigos 55.° e 56.° ficam dependentes da sancção parlamentar.

E de facto foram sanccionados pelo decreto das Cortes Geraes de 21 de julho de 1899 e por El-Rei na carta de lei de 29 de julho de 1899.

Por essa carta de lei se fixa a criação do cofre, em termos de não poder ser revogada senão por uma lei regular, e tambem se fixam os direitos da sociedade nas condições a que alludi, pois que nas alineas a) e b) do artigo 1.° se diz que a contribuição industrial da sociedade, como exploradora, em usufruto, gratuito, do theatro, constituirá receita do cofre, assim como a contribuição industrial dos artistas.

Ora estas fontes de receitas deixam de existir integralmente desde que a sociedade não exista, o que equivale a dizer que os decretos do Sr. João Franco legislaram sobre o que não podiam legislar.

Mas ainda ha mais: a sociedade foi atacada nos seus haveres.

O § 2.° do artigo 03.° do decreto de 14 de dezembro diz:

(Leu).

O § 3.° do artigo 4.° do decreto de 4 do Agosto de 1898 diz:

(Leu).

A sociedade artistica do Theatro de D. Maria, por portaria de 2 de dezembro de 1902, recebeu do Estado um empréstimo de 5:000$000 réis, ao qual caucionou o scenario, mobilia, adereços, até ali adquiridos.

Quando o theatro foi entregue ao actual arrendatário, procedeu-se a inventario do svenario, mobiliário, adereços, e tudo foi avaliado era mais de 10:000$000 réis.

Pois nem se entregou aos antigos societários o remanescente do dinheiro, nem o remanescente do scenario, mobilia e adereços.

Quer dizer: fez-se uma verdadeira apropriação do alheio.

É para estes pontos que eu chamo a attenção de V. Exa. e da Camara.

A antiga sociedade artistica de D. Maria não reclama, e eu disso me faço interprete, a rescisão do contrato, visto isso implicar com interesses; reclama, porem, o seu direito de trabalho sem prejuizo dos direitos adquiridos.

O que peço, em nome da lei, cujo imperio está proclamado, é que se quebre a grilheta; que se acabe com isto. Mesmo para os pretos ha Carta Constitucional.

Era necessario que se fizesse alguma cousa pela arte. A exemplo do que se faz nos povos latinos, nos povos germanicos e scandinavos, principalmente nestes, faça-se alguma cousa pela arte dramatica, cuja funcção educativa é bem manifesta.

É preciso mesmo acudir a esta cidado, que, se nutre de politica facciosa e revistas pornographicas. É preciso na verdade que a indole da população seja optima para resistir a esta constante intoxicação.

Tenho dito.

O Sr. Ministro da Justiça (Campos Henriques): - Sr. Presidente: o illustre Deputado, o Sr. Pinto da Mota, referiu-se, mostrando ter perfeito conhecimento de causa, aos direitos dos antigos societários do Theatro de D. Maria II.

Pela exposição que S. Exa. fez, parece que esses direitos não foram perfeitamente garantidos. E natural que os interessados tenham representado, ou representem ainda perante o Governo, e eu o que posso fazer, é prometter a S. Exa. chamar a attenção do Sr. Presidente do Conselho para o assunto, e estou certo de que, se com effeito direitos foram postergados, S. Exa. fará com que esses direitos sejam restituidos áquelles que delles foram privados.

(S. Exa. não reviu.).

O Sr. Valerio Villaça: - Sr. Presidente: pedi a palavra para chamar a attenção do Governo, e em especial do Sr. Ministro da Fazenda, para duas representações e que me foram remettidas, uma da Associação Commercial de Guimarães e outra da Associação Commercial de Braga, com referencia á concorrencia que ao commercio destas duas cidades faz o commercio ambulante.

Peço ao Sr. Ministro da Fazenda a sua attenção para este assunto, a fim de que S. Exa. traga a esta Camara uma medida que estabeleça a devida equidade entre estes dois commercios, o local e o ambulante.

Tenho dito.

(S. Exa. não reviu).

O Sr. Ministro da Fazenda (Manuel Affonso de Espregueira): - Sr. Presidente: devo dizer a V. Exa. e á Camara que tenho recebido numerosas representações de associações commerciaes e até de camaras municipaes, recla-

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mando a apresentação de uma proposta para que sejam tributados, pela forma que se julgue mais conveniente, os vendedores ambulantes, por isso que estão causando grande prejuizo ao commercio local.

Já mandei estudar o assunto para trazer uma proposta á Camara, porque a tributação que antigamente existia foi abolida pela lei da contribuição industrial.

O que se reclama parece-me que não se poderá conseguir senão por meio de licenças, que esses vendedores deverão tirar, em certas condições, devendo todavia ser modicas, para não prejudicar esse pequeno commercio, mas collocando-o em todo o caso em igualdade de condições ao commercio local.

Parece-me tambem conveniente aproveitar a opportunidade para estabelecer o mesmo systema das licenças para outras industrias para que é difficil formar gremios, que ha grande difficuldade em tributar e sobretudo em executar, que escapam á acção do fisco e causam grande prejuizo ao commercio local, por andarem sempre de terra em terra.

N'este sentido já mandei estudar uma proposta que terei a honra de apresentar á Camara, logo que esteja completa.

(S. Exa. não reviu).

O Sr. Costa Lobo: - No intuito de por sua parte contribuir para o estudo da questão vinicola formulou um projecto, que manda para a mesa, autorizando o Governo a regular a plantação das vinhas e o commercio e fiscalização dos vinhos segundo as bases que no mesmo projecto estabelece.

Ficou para segunda leitura.

(O discurso será publicado na integra quando o orador restituir as notas tachygraphicas).

O Sr. Oliveira Mattos: - Sr. Presidente: pedi a palavra para mandar para a mesa um projecto de lei, que autoriza a Camara Municipal de Coimbra a contratar um empréstimo de 150:000$000 réis para a municipalização dos serviços da viação publica por meio da tracção electrica, n'aquella cidade e seus suburbios.

Este projecto de lei já tem parecer das commissões de administração publica e de fazenda, e por isso peço a V. Exa. que elle seja dado o mais depressa possivel para ordem do dia, para assim se satisfazerem as justas reclamações d'aquella respeitavel corporação, que vela de maneira elogiavel os interesses que lhe estão confiados.

Não me alargo em mais considerações a justificar as vantagens do projecto, porque já aqui o fiz quando se apresentou a representação da Camara Municipal e a do grande comicio que se fez em Coimbra, pedindo a realização deste importante melhoramento.

Apenas acrescentarei que, estando de acordo no pedido feito e na approvação do projecto, todos os partidos representados nesta Camara, e o Governo que lhe concede o seu apoio, como já prometteu, nenhuma impugnação ha a recear, devendo elle ser rapidamente approvado logo que seja dado para ordem do dia. Novamente peço ao meu digno Presidente, a quem desde já muito agradeço, o attender o meu empenho, como espero.

Continuando no uso da palavra, permitta-me V. Exa., Sr. Presidente, que eu declare mais uma vez, que o meu modesto apoio, sincera e lealmente dado ao Governo, não é incondicional, como já aqui tenho dito, embora tenha a maior consideração pelos illustres homens publicos que o compõem.

Mas a unica condição que exijo é a delle continuar a bem cumprir os seus deveres, como prometteu, no interesse publico, mantendo fielmente o prograrnma com que se apresentou ao Parlamento.

E é assim que eu o tenho apoiado e me julgo no dever de o continuar a apoiar, emquanto elle, como até hoje tem feito, cumprir a lei e fizer respeitar todos os direitos; emquanto elle se mantiver dignamente dentro do seu honesto e respeitavel programma de liberal e de tolerante; emquanto provar que, zelando o bem publico, os sagrados interesses da nossa querida patria, administra honradamente com moralidade e economia; emquanto manifestar, mais por obras do que por palavras, que tem boa vontade e emprega todos os meios de, com energia e justiça, corrigir os abusos, os erros, as illegalidades revoltantes e criminosas do Governo transacto, que tanto escandalizou e offendeu a opinião publica! (Apoiados).

E permitta-me V. Exa. e a Camara que eu estranhe, com toda a indignação que me anima, que um dos sete ex-Ministros d'esse odiado Governo que tantos males causou ao país, que foi causa das maiores desgraças, descreditos e deshonras, que tanto nos prejudicaram e envergonharam perante a Europa, e que caiu afogado em sangue para não mais se poder levantar (Apoiados), tenha o atrevimento, a insensata ousadia de vir aqui dizer, como ha pouco ouvimos, arrogante e provocadoramente, que se praticara actos illegaes e escandalosos, que se illudem e sofismas as leis para se favorecerem afilhados, e que as leis se fizeram para se cumprir. (Apoiados).

Com que autoridade ousa faar em leis, em falta de cumprimento de leis, um dos membros do ominoso Governo da ditadura, que as não cumpriu, que as desrespeitou, que impunemente calcou aos pés, como o fez a todos os direitos e liberdades publicas, que praticou as maiores violencias, as mais condemnaveis arbitrariedades, rasgando, esfrangalhando vergonhosamente a lei fundamental do Estado? (Muitos apoiados).

O Sr. Malheiro Reymão: - V. Exa. tem liberdade para dizer o que quiser sobre esse motivo.

O Orador: - Não pode interromper-me sem minha permissão ! Eu não peço nem preciso da licença de V. Exa., da sua liberdade para dizer o que quiser e como quiser! Guarde-a, porque eu tomarei a que me for precisa!

Eu neste logar, como representante da nação, no pleno uso do meu direito, não preciso de licença de ninguém para dizer o que sinto e penso, para apreciar, para criticar, para censurar e até accusar os actos dos homens publicos com responsabilidades e grandes, como são as de um dos criminosos signatarios do decreto assassino de 31 de janeiro!...

Hei de faze-lo como eu quiser, sem medo de arremetidas furiosas, que me não intimidam! (Apoiados).

Nada tenho com a vida particular dos politicos em evidencia, que a opinião publica accusa e condemna, como aos do odiado franquismo; mas como homens publicos, tenho o direito e o dever, de que não quero prescindir, de apreciar os seus actos, a sua politica, a sua administração, de mostrar as suas responsabilidades!

Eu fui illudido uma vez na minha boa fé, como tanta gente, que acreditou nos falazes protestos do franquismo, nas suas hypocritas affirmações e juramentos, não o quero tornar a ser, não me deixarei enganar mais pelas perfidias dos que, com mais ou menos audácia, aqui tentarem renovar os seus processos de vida, esquecendo se de que estão mortos, de que só devem inspirar piedade e compaixão!

Alem disso, no dia em que eu me convencesse de que este Governo merecia com verdade as palavras de violenta censura e accusação que o ex-Ministro franquista acaba de pronunciar, eu não lhe daria mais o meu apoio, modesto e desvalioso como o, mas leal, sincero e desinteressado!

Declaro o bem desassombradamente!

O Sr. Ministro da Marinha justificou, e muito bem, os seus actos, dentro da lei, demonstrando claramente que não "e praticaram escandalos nem abusos para se servi-

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rem afilhados, desmentindo e combatendo dignamente as affirmações menos verdadeiras e audaciosas, feitas com arrogancia e provocação por quem para isso não tem autoridade! (Apoiados).

Quando for preciso, eu provarei nesta Camara, que quem praticou abusos, escandalos e immoralidades, esbanjando os dinheiros do Thesouro para servir afilhados, para angviriar partidarios, para corromper com veniaga os adversarios, para ver se engrossava o seu minguado partido, violando leis e offendendo direitos, foi o accusador de agora, como Ministro das Obras Publicas, foi o Governo da infamante ditadura de que fez parte, e que tantas culpas teve! (Apoiados).

E o ultimo desplante, revolta até á indignação mais justificada, irrita os animos mais serenos, o atrever-se a vir aqui fazer accusações destas, esquecendo tudo o que se passou ha tilo pouco tempo e está na memoria de todos, um ex-Ministro dos mais odiados e accusados, que sendo réu, se quer arvorar em autor, que de criminoso quer passar a juiz, pensando que esta Camara, como o país que com justiça o condemnou, lhe deixará inverter os papeis, pôr maior que seja o seu ousio e atrevimento, apresentando-se da maneira impertinente e provocadora como acaba do fazer! (Muitos apoiados).

Por mim, não lh'o consentirei! E emquanto á opinião publica, que o castigou e aos seus cumplices, lhes não tiver perdoado, não serei mais generoso deante das suas provocantes arremettidas!

O Sr. Malheiro Reymão: - V. Exa. dá licença?

O Orador: - Eu não dou licença! Já me interrompeu inconvenientemente uma vez, sem ella, para que me mereça essa concessão que a todos farei, e faço, menos a S. Exa.! (Voltando-se para o Sr. Reymão). Velho parlamentar e com a lingua desimpedida pronta para a resposta, não tenho medo nenhum de interrupções ou apartes, mas, desde que elles representam um favor do orador, eu não quero conceder-lho! Não pode merecer-mo quem como S. Exa. se apresentou e procedeu, sem minha licença, no começo desta discussão!

Recuso-lhe o que me pede agora! É o meu direito!

O Sr. Malheiro Reymão: - Quando quiser discutir os meus actos, é preciso que me caiba a palavra para me defender.

S. Exa. accusa-me de ter praticado actos de violação da lei.

(Sussurro e grandes risadas em toda a Camara).

O Sr. Presidente: - Peço ao orador que dirija o seu discurso para a Presidencia. Se S. Exas. estabelecem outra vez dialogo, eu vejo-me obrigado a interromper a sessão.

O Orador: - Eu não dei licença para ser interrompido! Fizeram-me um aparte com pretensão a explicações, não o quis permittir! E repito, não os receio, não tenho medo nenhum d'elles! Com mais de vinte e um annos de Parlamento, não receio apartes nem interrupções, e tenho-os permittido sempre e em discussões bem acaloradas e importantes, mas agora não quis, por virem de onde vieram e pela maneira como vieram. E nada mais, pedindo desculpa a V. Exa. que muito respeito, se a discussão não corre com a serenidade e calma que V. Exa. deseja, mas que é impossivel manter, deante de provocações mal cabidas, inadmissiveis e inopportunas, que nem eu nem a Camara tolera sem um protesto. (Muitos apoiados).

O Sr. Reymão fez um discurso tão altivo, tão ousado, provocador e irritante, querendo accusar tão violenta como injustamente o Governo, de faltar ao cumprimento das leis, atrevendo-se a perguntar se as leis se não fizeram neste país para ser cumpridas! Ora, este ousio e atrevimento, inqualificavel por parte de um ex-Ministro da ditadura, que tanto oiFendeu as leis, os direitos, e todas as liberdades publicas, merecia correctivo pronto e energico, para que se não dissesse que se estava censurando, impunemente, com consentimento da Camara, dos representantes da nação, que revoltados, amaldiçoaram e condemnaram para sempre a ditadura e os ditadores! (Apoiados).

E extraordinario que aqui faça uma pergunta desta ordem um ex-Ministro tão culpado como os outros, pretendendo falar ainda em nome do franquismo, desse aventureiro franquismo que era um homem e não um partido, e que depois de tão graves erros, faltas e crimes, de toda a ordem, tantos males causados ao país, escorraçado do poder pela indignação publica, pelo maior desastre que a nossa historia aponta, ainda pense em resuscitar, e sobretudo ainda se atreva a ameaçar, a accusar, como a camara presenceou! Não pode ser! (Apoiados).

E diz o Sr. Reymão que ha de vir aqui dar conta dos seus actos; pois venha que a Camara os apreciará e julga como elles merecem! só o que digo é que me admira, e muito, que S. Exa. ouse ainda levantar aqui a- sua voz, da maneira por que hoje o fez, parecendo esquecer-se, ou julgando que os outros esquecem os seus actos e pesadas responsabilidades de homem publico! (Apoiados).

Sr. Presidente: fechado este inesperado parenthesis, e pedindo desculpa á Camara da maneira um pouco mais energica e apaixonada como falei, instado e impressionado desagradavelmente pela maneira como correu a discussão, e agradecendo os constantes e calorosos apoiados com que a Camara acompanhou as minhas modestas palavras, que mereceram o seu applauso, não por mim, mas pelas ideias que manifestei, volto serenamente ao assunto para que tinha pedido a palavra. Ha dias tive a honra de mandar para a mesa um requerimento pedindo alguns, documentos pelo Ministerio da Fazenda, mas ainda não me foram enviados. Esses documentos referem-se á grande questão dos adeantamentos, e necessito d'elles para melhor poder formar o meu juizo ácerca dessa grave questão, que a todos interessa e que todos desejam ver resolvida a toda a luz da verdade, nada se occultando no que ella possa ter de importante. (Apoiados).

Chamo a attenção do Sr. Ministro da Fazenda para esse meu requerimento, pedindo a S. Exa. a fineza de me mandar os documentos o mais depressa possivel.

Sr. Presidente: é necessario que se acabe com a lenda de que todos os homens politicos teem mettido as mãos nos cofres do Estado, como, para fazer estilo, ainda ha pouco aqui ouvi dizer ao Sr. Brito Camacho. Ha nos partidos monarchicos muito homem honrado e de bem, a quem as suspeitas nunca podem ferir. Os homens dos dois grandes partidos, que teem dirigido os negocios publicos, podem ter commettido erros de administração, mas nunca se serviram dos dinheiros do Thesouro para seu beneficio ou de suas familias! (Apoiados}. Esta é a verdade que é preciso dizer e affirmar bem alto, (Apoiados) e que ninguem pode contestar! O Sr. Brito Camacho, que é um dos vultos mais valiosos do seu partido, deve saber muito bem que se não metem garras aduncas, nem curtas nem compridas, nos cofres do Estado, e que tudo quanto ali entra ou sae é escriturado, podendo-se apurar, como agora se está fazendo, quem entrou, com quanto, o que sae, para quem e á ordem de quem! Não ha portanto desvios mysteriosos, nem contas escuras que se não possam aclarar, como se ha de fazer para honra de todos e para a todos se fazer justiça!

Ninguem receia luz, muita luz, como se ha de fazer, esperem os Srs. republicanos. (Apoiados). Eu por mim nunca exerci funcções do Estado ou de responsabilidades com que não possa, de nada me receando, como todos os mais Deputados, honestos e honrados; e tambem nunca exerci emprego algum publico, ou commissão de serviço

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remunerada, tendo numa em que fui ao estrangeiro pago do meu bolso, não só todas as despesas, mas até as dos caminhos de ferro em que viajei, nada pedindo nem acceitando do Estado.

Creio piamente na honestidade de todos os meus collegas, como dos homens publicos tantas vezes injustamente accusados, mas é necessario que acabe a lenda de descredito, de suspeição, tão falsa como perniciosa, que a todos pretende envolver, lançando na opinião publica a errada persuasão de todos receberem importantes favores dos Ministros, á custa dos cofres publicos, e de que todos teem supprimentos, adeantamentos, abonos, dividas ao Thesouro, o que é uma falsidade e uma arma de má fé (Apoiados) de que se servem os inimigos das instituições contra os que, no cumprimento do seu dever, as sustentam lealmente, convencidos de que assim defendem os sagrados interesses da nação a ellas ligados. (Apoiados).

O Sr. Presidente: - Previno o illustre Deputado de que faltam cinco minutos para se passar á ordem do dia e que ainda estão inscritos alguns oradores.

O Orador: - Agradeço muito a V. Exa.; tenho, muita consideração por todos os oradores inscritos, mas não posso deixar de a ter igualmente pelo que ainda tenho de dizer e que tambem é importante.

Ainda quero chamar a attenção do Governo e igualmente do illustre Ministro das Obras Publicas, tão modesto como cheio de boa vontade de acertar, para outro assunto: qual é o que diz respeito á questão vinicola, a mais importante para o país, de quantas aqui se debatem e na imprensa, e bem mais grave que a dos adeantamentos com que se pretende tomar todas as attenções! (Apoiados).

Tenho recebido innumeras representações sobre o assunto de varias corporações e de differentes pontos de que desejo dar conhecimento á Camara e ás illustres commissões a que está affecta a difficil resolução do problema.

Uma é da Camara Municipal da Figueira da Foz e suas importantes freguesias de Paião e Lavos, como outras de outros concelhos e da região central da Beira; são umas a favor do plantio e outras contra, e justificam todas as pretensões dos seus respeitaveis signatarios.

É do meu dever não defender uns contra os outros, para não complicar ,mais a emmaranhada questão, e para isso limito-me apenas a fazer-me eco dessas reclamações, apresentando-as a quem de direito, e fazendo-as ouvir nesta assembleia, no cumprimento do meu dever. Oxalá ellas possam ser attendidas.

Sr. Presidente: não quero de forma nenhuma occupar todo o tempo que resta para a hora antes da ordem do dia, porque tenho empenho em que o Sr. Ministro da Fazenda me responda alguma cousa ao menos, e por isso termino aqui as minhas considerações, deixando para outra vez o muito que ainda tinha a dizer em assuntos de interesse publico, os unicos que aqui venho tratar e defender.

(O orador não reviu).

O Sr. Ministro da Fazenda (Manuel Affonso de Espregueira): - Se pedi a palavra foi somente para satisfazer o desejo do illustre Deputado Sr. Oliveira Mattos, que disse me deixava dois minutos para que eu lhe respondesse, e cumpro essa minha obrigação com a melhor vontade.

No meu Ministerio existe, effectivamente, uma nota de todos os débitos das differentes contribuições do Estado desde uma época bastante afastada, mas já dei ordem para que, por todas as repartições do Estado, fosse completada essa nota, e logo que esteja concluida mandá-la-hei para a Camara.

Essa verba, que figura como muito avultada, no fundo é pequena, porque é, em grande parte, representada pelas falhas.

Não se pode, portanto, concluir dahi que a cobrança dos impostos seja mal feita...

O Sr. Oliveira Mattos: - Eu não disse que era mal feita.

O Orador: - Perfeitamente. Essa cobrança não é tão perfeita como devia ser, mas a maior parte do que figura na nota a que me refiro são dividas incobraveis.

Relativamente a adeantamentos, supprimentos ou abonos, que se tenham feito aos differentes funccionarios do Estado, vou dar ordem para que essa nota se formule o mais rapidamente possivel.

(S. Exa. não reviu).

O Sr. Presidente: - Deu a hora de se passar á ordem do dia.

Os Srs. Deputados que tiverem papeis a mandar para a mesa podem faze-lo.

O Sr. Brito Camacho: - Peço a palavra para um negocio urgente.

O Sr. Presidente: - Queira V. Exa. vir á mesa declarar qual é o negocio de que deseja occupar-se.

(Pausa).

O Sr. Presidente: - Chamo a attenção da Camara.

O Sr. Brito Camacho pediu a palavra para um negocio urgente, e, convidado a vir á mesa declarar do que constava, disse ser o seguinte:

O juiz de instrucção intimou-me, sob a forma de convite, a fornecer-lhe o nome, idade e morada de todos os individuos que trabalham na administração, typographia e casa de machinas do jornal a Lucia, de que sou director.

Reputo arbitraria esta intimação disfarçada, sem fundamento legal em nenhum diploma publicado, e porque ella viola os meus direitos e a minha liberdade, e porque a intimação que me fez o Sr. juiz de instrucção criminal tem a nota de urgente, desejo interrogar a este respeito o Governo. = Brito Camacho.

A Camara não a considerou urgente.

O Sr. Affonso Costa: - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro que, pelo Ministerio da Fazenda, me seja enviada a copia da portaria inédita do Sr. Mattoso Santos, de data incerta, mas do periodo em que elle foi Ministro da Fazenda (30 de novembro de 1900 a 28 de fevereiro de 1903), ácerca das joias da Coroa, ou das chamadas de D. Miguel, que estavam depositadas noBanco de Portugal. = Affonso Costa.

Mandou se expedir.

O Sr. Mario Monteiro: - Mando para a mesa um projecto de lei, que tem por fim contar, para os effeitos da aposentação, ao agronomo de 1.ª classe do quadro dos serviços agronomicos da Direcção Geral da Agricultura, actualmente em exercicio no districto de Portalegre, Antonio Filipe da Silva, o tempo em que desempenhou o logar de director da estação chimico agricola da Quinta da Bemposta.

Ficou para segunda leitura.

O Sr. Almeida Garrett: - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro que, pelo Ministerio da Marinha e Ultramar, me seja enviada, com urgencia, nota de:

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1.° Quanto custou o transporte Pero de Alemquer;

2.° Quanto se tem gasto em fabrico com este transporte desde a sua acquisição;

3.° Quaes as commissões que tem desempenhado este navio desde a sua acquisição. = Thomás de Almeida Garrett.

Mandou-se expedir.

O Sr. Nunes da Silva: - Mando para a mesa o seguinte

Aviso previo

Declaro, que desejo interrogar o Sr. Ministro da Justiça sobre a situação da magistratura judicial e designadamente sobre a necessidade de se rever urgentemente a nossa organização judicial e ainda de se adoptarem providencias tendentes a regular a collocação na magistratura do continente dos magistrados judiciaes vindos do ultramar. = Nunes da Silva.

Mando tambem para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro que, pelo Ministerio da Justiça, seja solicitada e me seja enviada uma nota indicativa do numero de causas que, durante os ultimos 3 annos judiciaes, foram distribuidas nos tribunaes das Relações de Lisboa e Porto e no Supremo Tribunal, declarando-se a natureza das causas, data das distribuições e do julgamento. = Nunes da Silva.

Mandou-se expedir.

O Sr. Brito Camacho: - Mando para a mesa o seguinte

Aviso previo

Desejo interrogar o Sr. Ministro do Reino sobre o modo como o juiz de instrucção criminal entende e executa o decreto de 25 de abril de 1908, que mandou cadastrar a população de Lisboa, sem fundamento legal em qualquer diploma tornado publico, e com manifesta violação dos decretos de 28 de agosto de 1893, que reformou os serviços policiaes em Lisboa, e o de 24 de dezembro de 1901, que criou a Inspecção Geral dos Impostos. = Brito Camacho.

Mandou-se expedir.

ORDEM DO DIA

Continuação da discussão do projecto de lei n.° 14 fixando a dotação de Sua Majestade El-Rei e de Sua Alteza o Senhor Infante D. Affonso

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para continuar o seu discurso, o Sr. Deputado João de Menezes.

O Sr. João de Menezes: - Depois do que hontem se passou na Camara, a logica mandava approvar a proposta do illustre Deputado Sr. Brito Camacho, eliminando do projecto tudo quanto se refere aos adeantamentos e deixando em discussão apenas a lista civil.

Não tenha illusões a Camara; confundir a lista civil e os adeantamentos constitue erro muito grave.

Se pudesse admittir o absurdo de se suppor monarchico por alguns momentos, elle, orador, insistiria pela separação dos dois assuntos, porque, depois do que hontem se passou, é um erro pretender cobrir a avariada mercadoria dos adeantamentos com a discussão da lista civil do Rei.

Assim pensaria se fosse monarchico, para evitar commentarios que envolvam o novo Rei, de cuja mocidade radiosa se abstém de falar, e de quem não dirá nem bem nem mal, pois nem para uma ou outra cousa encontra motivo.

Mas a maioria da Camara quer insistir no erro, por teimosia, por capricho, por descabido amor proprio. Insista, já que assim o quer, confunda as duas questões e espere as naturaes consequencias.

Dizendo o Governo que mandaria todos os documentos que existem sobre adeantamentos á Casa Real, e á casa da Senhora D. Maria Pia, á commissão, e ha demandá-los porque o país quer que tudo seja conhecido, pergunta para que serve a famosa commissão de juizes.

Serve apenas para que na opinião publica se radique a ideia de que essa commissão será uma commissão de juizes arranjadores de contas, visando a tudo confundir para que não se saiba a verdade. Este é o criterio do publico e não ha maneira de o modificar.

Mas se o Governo envia todos os documentos ao exame da commissão parlamentar, para que servem os juizes? Para fazerem contas?

Contas de sommar sabe faze-las a commissão, onde ha um lente de mathematica e homens competentes para fazer operações arithmeticas.

Ou pensa o Governo em encarregar alguém de tazer contas de subtrahir, por se tratar de adeantamentos?

O Sr. Brito Camacho: - Essas já estão feitas.

O Orador: - Se querem que as contas apuradas pela commissão parlamentar sejam verificadas até o ultimo real, então sujeitem-nas ao exame de uma commissão de actuarios. Mas os juizes do Supremo Tribunal elevados á categoria de especialistas em contas!...

Está em discussão a lista civil. Se não estivesse confundida com os adeantamentos discuti-la-hia.

Um Parlamento monarchico, evidentemente, ha de approvar a lista civil, que elle aliás rejeita, porque rejeitaria tambem num Parlamento republicano a lista civil do presidente da republica, entidade que julga desnecessaria.

Como porem não pode realizar as suas aspirações, trataria de propor a reducção da lista civil da Familia Real, como o fizeram por varias vezes Rodrigues de Freitas e outros Deputados republicanos. É claro que a Camara rejeitaria a sua proposta. Mas, em todo o caso, como se trata da applicação do dinheiro dos contribuintes, não quer deixar de protestar contra o exagero da lista civil proposta, que é sempre, e em todas as circunstancias, uma despesa improductiva e inutil.

Por mais firme que seja o seu proposito de não falar ainda no monstruoso caso dos adeantamentos, nelle falará por incidente, ao menos, visto como os adeantamentos cresceram e floresceram no anterior remado e nesse reinado se avolumou a crise financeira, que hoje de novo se apresenta ameaçadora.

Todos se lembram da situação de 1890. Falhava em Paris um triste empréstimo de 9.000:000$000 réis. O Governo lançava um imposto addicional de 6 por cento e fazia a primeira ditadura de engrandecimento do poder real. Veio em 1891 o emprestimo dos tabacos, mas esse expediente, votado pelas Camaras, cuja convocação os financeiros insolentemente impuseram, já não evitou a catastrophe.

Em 1892 estalou a bancarrota.

Era então de 23.000:000$000 réis a divida fluctuante e o déficit, calculado por palpite em 10.000:000$000 réis, veio a verificar-se que excedia a 16.000:000$000 réis!

Gloriosa monarchia constitucional!

Custou annos e annos de guerras civis, de violencias e depredações de toda a ordem. Mas, a partir de 1852, o país entrou em calmaria.

De 1852 a 1892 decorreram quarenta annos de tranquillidade. Nesse periodo não soffremos nenhuma das grandes commoções, não experimentámos nenhuma das catastrophes que agitaram e commoveram a França, a Italia e a Espanha. E vivendo, a bem dizer, em paz podre, caimos na mais vergonhosa bancarrota.

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Emprestimos sobre emprestimos, desperdicios sobre desperdicios, esbanjamentos sobre esbanjamentos, arrastaram o país á ruina. Foram elles taes e tantos que dos empréstimos contrahidos, dos milhares e milhares de contos pedidos ao credito, calcula-se que 140:000:000$000 réis se perderam. Apenas 45 por cento do dinheiro pedido emprestado teve applicação util e reproduciiva.

O resultado foi a bancarrota. Veja-se, porem, o que foram os ultimos dezasete annos, o que foi o ultimo reinado.

Antes do fazer o seu balanço, deve-se ter na lembrança que começou por uma ditadura, a primeira do engrandecimento do poder real, e com ella coincidiram as primeiras despesas illegaes com a Casa Real depois da subida de D. Carlos ao throno.

Lá disse o Sr. Dias Ferreira:

"Quando em 1890 se tratou de fortalecer o poder real, gastaram-se centenas e centenas de contos de réis sem planos nem estudos para abrir a estrada de Setubal ao Outão, unicamente por servilismo e mais baixezas para com o Chefe do Estado".

Radioso inicio de um reinado!

De janeiro de 1890 a setembro de 1907 venderam-se 90:000 contos de réis norninaes de titulos da divida interna, que produziram 31:500 contos de réis em dinheiro.

Ao Banco de Portugal pediram-se emprestados 14:180 contos de réis; os dois emprestimos dos tabacos em 1891 e 1896 deram, realizados, 25:315 contos de réis.

A divida fluctuante, que em 31 de dezembro de 1890 era de 33:728,contos de réis, era em 30 de setembro de 1907°de 76:368 contos de réis.

A divida fluctuante rendeu, portanto, nesses 17 annos, 42:640 contos de réis.

Bens nacionaes venderam-se, ou queimaram-se, 485 contos de réis.

Resumindo: pediram-se ao credito, de 1890 a 1907, nada menos de 114:120 contos de réis.

Qual foi a applicacão deste dinheiro?

Estradas, telegraphos, caminhos de ferro, 12:790 contos de réis; navios de guerra, 3:000 contos de réis; indemnização do caminho de ferro de Lourenço Marques, 5:900 contos de réis.

E o resto? Para onde foram os 93:000 contos de réis cuja applicacão falta indicar?

Foram para cobrir o deficit. O que se esbanjou! O que se perdeu criminosamente!

Bem dizia Dias Ferreira em 1903:

"Não ha ninguem, por mais leigo que seja em negocios piiblicos, que não saiba ou não presinta que nada menos de 1/4 da receita do Thesouro, nos ultimos dez annos, tem tido applicacão que não pode vir a lume".

Agora é que comprehende todo o valor desta affirmação de um homem que conhecia todos os segredos do Estado!

Gloriosa monarchia constitucional! Glorioso reinado das ditaduras do engrandecimento do poder real e dos adeantamentos!

Em 1892, bancarrota. Os juros da divida publica reduzidos, os ordenados diminuidos, os impostos aggravados. Estes sacrificios tremendos, que custavam milhares e milhares de contos de réis á nação, foram sacrificios perdidos. Veja-se: em 1892, a divida fluctuante era de réis 23.000:000$000; hoje está em perto de 78.000:000$000 réis.

E tanto devemos que o Sr. Ministro da Fazenda vem agora dizer que a situação financeira é melindrosissima, que só consignando um rendimento do Estado pode obter dinheiro a 7 por cento, juro monstruoso, juro imposto a quem se encontra em condições desesperadas.

Gloriosa monarchia dos adeantamentos!

Quando em 1891 votavam o emprestimo dos tabacos, os politicos reconheciam os seus crimes, pediam perdão e promettiam emendar-se.

Em 1892, sob a trovoada da bancarrota, batiam nos peitos, confessavam-se criminosos e juravam não reincidir. Quando nos foi imposto o convénio tornaram a fazer confissão geral.

Foi sempre assim. Os autores da nossa desgraça rezam o acto de contriccão, mas quem cumpre a penitencia é sempre o desgraçado país, sempre disposto ao sacrificio, sempre inclinado ao perdão, sempre illudido, sempre explorado, massacrado e ludibriado!

Que monstruosidades politicas, financeiras e moraes se commetteram desde esse anno tragico da bancarrota!

Veja-se o resultado da obra da Monarchia, depois de tantos annos de promessas de arrependimento e vida-nova!

E agora dizem que é pouco, muito pouco, o que vae dar-se á Familia Real: 365:000$000 réis ao Rei, 60:000$000 réis a uma Rainha, 60:000$000 réis a outra, 16:000$000 réis ao infante D. Affonso.

São 505:000$000 réis desperdiçados para engrandecer as mentiras do prestigio da realeza. E o que será depois, quando à Familia Real aumentar?

Bem sabe que lhe vão argumentar com a lista civil de outros países. Mas que tem a Camara com os milhões de libras, de marcos, de francos ou de duros que outros países desperdiçam em listas civis? Que tem Portugal, povo arruinado, sem instrucção, sem defesa, soffrendo uma crise economica tremenda, com o que despendem os outros povos?

Respondam-lhe se é admissivel este escandalo:

Lista civil 505:000$000 réis, hygiene publica réis 188:000$000!

Lista civil 505:000$000 réis; instrucção superior réis 432:000$000!

Lista civil 505:000$000 réis; instrucção secundaria 407:000$000 réis!

Pode haver confronto mais eloquente e que melhor sirva a condemnar o desperdicio que vae votar-se?

Para a lista civil não votará um real; tudo votará para a instrucção, para a assistencia social, para emprehendimentos que determinem o progresso da industria, da agricultura, do commercio. Para a lista civil nem um real votará, seja na monarchia, seja na republica.

Por mais que deseje não falar agora nos adeantamentos, a verdade é que o projecto o leva a referir-se a esse tremendo e irremediavel escandalo dos adeantamentos. Jamais esquecerá o que hontem se passou e que se dispensa de commentar, porque todo o país, a estas horas, já formou o seu juizo.

Mande o Sr. Ministro da Fazenda o mais depressa possivel, á commissão parlamentar, todos os documentos sobre adeantamentos á Casa Real e á Casa da Rainha D. Maria Pia.

Mande tudo! O país exige que se apresentem todas as provas, quer que se apure toda a verdade! Toda!

Quer conhecer a somma dos adeantamentos, quer saber quem foram os adeantadores!

Porque, deve dize-lo com a maior sinceridade, o Sr. Ministro da Fazenda não é o unico culpado; seria uma injustiça affirmá-lo.

Ha mais culpados, ha mais responsaveis.

Todos os Governos progressistas e regeneradores fizeram adeantamentos. E sobretudo os regeneradores.

Estes começaram, deram o exemplo, forjaram cavilosas leis, como a de 13 de maio de 1896 (artigo 30.°) e a de 12 de junho de 1901 (artigo 19.°), que inventaram dividas de centos decontos de réis do Thesouro á Casa Real. Leis traiçoeiras que sugaram o dinheiro dos contribuintes, fazendo d'elles devedores á Coroa, quando a Coroa tudo deve ao país.

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Vejam se as tres ditaduras regeneradoras de engrandecimento do poder real.

A de 1890 faz ás obras escandalosas da Torre de Outão. A de 1895-1896 forja o artigo 30.° da lei de 13 de maio de 1896 e faz adeantamentos.

A de 1901 engendra a ignobil porcaria, inventa as rendas dos palacios e faz adeantamentos.

Engrandecimento do poder real, ditadura, escandalos, perseguições, leis de excepção e adeantamentos, sempre adeantamentos.

Agora comprehende a significação das tremendas accusações feitas pelos progressistas, ainda não convertidos ao palacianismo, quando atacavam os Governos regeneradores no reinado de D. Luis, por darem dinheiro á Casa Real.

Vem de longe o escandalo dos adeantamentos.

Teem custado centos e centos de contos de réis; tanto que nem se calcula, nem se poderá saber nunca.

Ditaduras, adeantamentos, favores da Coroa aos ditadores, saques sobre o Thesouro Publico.

Eis o regime. E os Ministerios regeneradores do ultimo reinado encontraram a formula de governar, estabelecendo o principio de que a Coroa podia negociar ditaduras como a igreja de Roma pode vender indulgencias.

Para engrandecerem o poder real, para governarem sem o Parlamento, para se imporem, perseguindo, vexando e opprimindo, os ditadores sabiam a que recorrer: havendo dinheiro para adeantamentos, havia tudo.

Agora sim, agora comprehende-se bem o significado politico, moral e financeiro dessas ditaduras de engrandecimento do poder real; agora sim, agora comprehende-se e legitima-se o odio, o espirito de revolta, contra esses politicos desalmados que perseguiram, que roubaram eleições, que mandaram prender, acutilar, espingardear o povo!

A sua politica está definida pelo crime dos adeantamentos; por esse crime está definido o regime.

(O discurso será publicado na integra. quando o orador restituir as notas tachygraphicas).

O Sr. Soares Branco: - Não responderá a todas as referencias feitas pelo illustre Deputado Sr. João de Menezes, unicamente, porque é provinciano, e quando se fazem referencias a alguém que tenha morrido, ouviu sempre dizer lá na sua provincia: - Paz á sua alma; já lá está na terra da verdade! As cidades são de outra maneira, chamam-se intellectuaes, e fazem cousas absolutamente contrarias.

Tem, portanto, repugnancia de entrar em questões quando se trata de mortos.

Analysa em seguida o projecto, referindo-se largamente ao artigo 5.° que nomeia a commissão extra-parlamentar para a liquidação dos adeantamentos.

Antes de terminar, refere que no ultimo domingo, estando com alguns dos seus collegas em casa do Sr. Ministro da Fazenda, ouviu dizer a S. Exa. que existia effectivamente no Ministerio da Fazenda, num processo de abonos á Casa Real, uma carta de um determinado Presidente do Conselho a um Ministro da Fazenda, e que, provavelmente por informação errada dos seus adversarios, julgaram ter sido dirigida a elle, actual Ministro; portanto, S. Exa. não se recordava ainda nesse domingo da carta a que se referiu o Sr. Queiroz Ribeiro e que, de facto, existia, como o Sr. Ministro da Fazenda já confessou á Camara.

Por ultimo, pede a todos os Srs. Deputados que se congreguem, para diminuir a agitação publica, e para que o país não seja levado para uma convulsão perigosa.

(O discurso será publicado na integra quando o orador restituir as notas tachygraphicas).

O Sr. Pedro Martins: - Nesta altura do debate, depois do que na Camara se tem passado nas duas ultimas sessões, apos a completa e tremenda execução moral que, na sessão de hontem, a si mesmo e ao Presidente do Conselho de 1898, Sr. José Luciano de Castro, foi forçado a infligir o Sr. Ministro da Fazenda, réu confesso de adeantamentos illegaes á Casa Real, e a quem, em respeito da lei e da dignidade e moralidade do poder, já a esta hora devera ter sido arrancada a farda de Ministro, para ser enviado para o banco dos réus, espera o orador que no espirito da Camara não subsista a minima duvida sobre a necessidade imperiosa de não se converter em lei do Estado o presente projecto de lei.

Se em Portugal houve desgraçadamente um Ministro que, sem respeito pela dignidade e pelo prestigio da funcção governativa, ousou formular uma proposta de lei, com o proposito consciente e doloso de subtrahir o seu procedimento illegal e o dos seus cumplices á reprovação do Parlamento, condemnação do país e á acção punidora da justiça criminal; e se, illudida na sua boa fé. a commissão de fazenda deu o seu voto a essa proposta, que certamente não sabia que fosse bandeira protectora, á sombra da qual o Ministro esperava fazer passar o contrabando e os contrabandistas dos adeantamentos; hoje, que todos estão esclarecidos, que ouviram dos lábios do delinquente a confissão do seu crime, a revelação da cumplicidade do chefe do partido progressista e de que mais delinquentes havia, réus do mesmo crime de peculato, crime tão grave, tão odioso á consciencia publica e tão repugnante aos principies de moral e de direito, que o Codigo Penal, lei do Estado, o pune com pena penitenciaria, não se pode acreditar que o Parlamento Portugues ouse cobrir com o seu voto a torpeza dos adeantamentos e os que os fizeram, ordenaram ou instigaram.

Que ninguem commetta o erro, como hontem advertia generosamente o talentosissimo e eloquentissimo Deputado Sr. Affonso Costa, de tomar, com intuitos talvez caridosos, as responsabilidades dos outros.

Que ninguem queira a minima solidariedade com o Panamá dos adeantamentos. só conseguiria aumentar o numero dos que hão de ser amarrados ao pelourinho justiceiro da execração publica, só conseguiria aumentar a leva tristissima dos que hão de morrer moral e politicamente; só conseguiria tornar maior o cancro purulento que a nação tem de extirpar.

Se o Parlamento cobrir com o seu voto a torpeza dos adeantamentos illegaes e aquelles que os fizeram, ordenaram ou instigaram, ter-se-ha exautorado moralmente, e a nação tem o direito de responder a esse desafio á honestidade da consciencia publica, vindo ao Parlamento justamente offendida na sua soberania e na sua dignidade moral, arrancar os diplomas dos seus representantes com que os honrou para assegurarem e defenderem o imperio da lei e da moral não para encobrirem crimes ou sanccionarem pefeulatos.

Por isso, tem o orador a convicção de que em breve, muito breve, será retirado da discussão o presente e repugnante projecto de lei, que, depois do espectaculo miserando desenrolado pelo Sr. Espregueira, é o projecto mais suspeito, mais offensivo dos principios da moral e da dignidade do poder, e mais ultrajante para a nação e para o Rei, que, do seu conhecimento, se tem tido a ousadia de apresentar ao Parlamento.

Demais, o projecto está morto na sua contextura e economia geral.

Desde que o Sr. Espregueira teve de assistir ao desabar da sua obra habilidosa e foi forçado, pela imposição moral da opposição parlamentar e da opinião publica, a remetter á commissão parlamentar de inquerito os documentos relativos aos adeantamentos illegaes, a fim de que, com brevidade, esta os examinasse, para que serve essa estravagante e famosa commissão de juizes, que o

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12 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Sr. Espregueira inventou para liquidar clandestinamente os adeantamentos illegaes, de que é o réu?

Que significado moral teria, na consciencia publica, a manutenção do artigo 5.° do projecto, cujo fim manifesto era liquidar na treva os adeantamentos illegaes e proteger, os seus autores á sombra da bandeira da lista civil, subtrahindo-se á reprovação publica, escondidos nas dobras do manto real?

E, se depois: de tudo quanto se passou, depois de o lar. Espregueira, haver confessado que elle e o chefe do seu partido eram réus de adeantamentos illegaes, pois tão delinquente é o que directamente commette o crime como aquelle que o aconselha ou instiga, se apos tudo isto se mantivesse a famosa commissão liquidataria dos juizes e na pasta da Fazenda se mantivesse o Sr. Espregueira influindo dia a dia, quasi dirigindo os trabalhos e inqueritos da commissão, nessa hora trágica, na consciencia publica, já sobresaltada de pasmo por tanta miseria, a dignidade do poder cairia para sempre.

Por isso o orador se dirige ao Governo para lhe dizer que se apresse a intervir com toda a sua autoridade para que seja para sempre arredado da discussão este projecto infamado, e lembra ao Sr. Ministro da Fazenda que a sua posição é absolutamente incompativel com o brio e insuspeição do poder.

Faça isto pela nação e pelo Rei.

Pela nação, porque esta tem o direito de exigir que não mais seja escarnecida a sua dignidade e ante o estrangeiro seja apresentada como terra dilecta do impudor administrativo e da dissipação financeira. Pelo Rei, porque este, absolutamente innocente dos erros e crimes do passado, tem tambem o direito de não ser envolvido em suspeições infamantes e de exigir que o projecto da lista civil, que é constitucional, não tenha a companhia suspeita de adeantamentos illegaes e criminosos.

Faça isto o Sr. Presidente do Conselho.

Interponha o Governo a sua autoridade politica e moral para que seja sepultado o presente projecto de lei e traga á camara dois projectos distinctos, precisos, claros acompanhados de todos os documentos comprovativos e precedidos dos respectivos e indispensaveis inqueritos.

Analysa depois a situação moral da Casa Real, sustentando a necessidade de um inquerito á fazenda da mesma e á sua administração, e descreve as bases em que deve assentar a organização da lista civil, que devem ser similares ás da lista civil inglesa, e advoga a necessidade de reorganizar a administração da fazenda da Casa Real, subordinando-a directamente ao Governo, combatendo igualmente o projecto pela forma por que é feito o aumento indirecto da lista civil, sem garantias de protecção para o Thesouro.

A questão dos adeantamentos illegaes ao ReiD. Carlos e a outros membros da Familia Real é uma questão da mais alta importancia e gravidade moral.

Que elle, orador, saiba, ainda nenhuma questão appareceu na politica portuguesa com um tão estranho e suspeito aspecto moral. Nem a celebre questão dos tabacos, em que tambem, como agora, o Sr. Ministro da Fazenda se tornou celebre, desde a engenhosa manobra dos sobrescritos até as lastimosas contradições em que caia de dia para dia, nem essa teve aspecto tão grave.

Nos modernos tempos só a questão escandalosa do Panamá na França lhe é similar. Mas na França fez-se completa luz sobre essa questão, a Franca foi esclarecida, e os culpados, não obstante se encontrarem entre elles algumas glorias do espirito francês, como o genial Lesseps, foram arrastados ao tribunal, onde se apuraram as suas responsabilidades criminaes.

E a França, que a corrupção procurara ennodoar, saiu dessa prova mais levantada e mais aureolada na sua honra e probidade collectiva. E, depois de justiça feita, a França, confiante na dignidade do poder, pode retomar a sua tranquilidade e proseguir na sua vida progressiva.

Em Portugal é absolutamente preciso que a luz se faça tambem. Luz, muita luz, luz a jorros sobre o caso escurissimo dos adeantamentos illegaes, que foram verdadeiros crimes contra a Fazenda Nacional.

E esta a reclamação geral, feita com indomavel energia pela opinião publica desde que a questão dos adeantamentos illegaes veio á luz da publicidade.

Mas se é esta a reclamação da consciencia publica, tambem por parte do poder e dos partidos rotativos tem havido o proposito de a esconder no silencio e na treva. Desde que a revelação dos adeantamentos illegaes veio á Camara, o poder prestou-se logo para sobre ella assentar a lapide tumular do silencio.

Na Camara dos Pares os Presidentes do Conselho, reptados a fazerem declarações, não hesitaram em affirmar que não haviam feito adeantamentos illegaes.

A 30 de agosto de 1907, o mesmo Presidente do Conselho, que fizera a revelação e solemnemente promettera trazer ao Parlamento toda a luz, logo assegurava a retirada, declarando-se impertinentemente juiz da opportunidade; e mentia á sua promessa, liquidando na noite torva da ditadura os adeantamentos.

Sobe ao Throno o Rei actual, que declara honesta e nobremente querer pagar. E, logo que os partidos teem de apresentar o projecto da lista civil, qual é a sua lealdade para com a Nação e para com o Rei, que dizem defender?

Escondendo os adeantamentos e dando ao Rei a companhia injuriosa de criminosos, de adeantadores, que se procuram encobrir nas dobras do manto real.

Analysa depois o que se tem passado na Camara a proposito de adeantamentos; frisa a situação em que se encontram o Ministro da Fazenda e o chefe do partido progressista perante a moral e o direito constitucional e penal; declara que em face da Carta e do Codigo Penal um e outro são criminosos de peculato, tão grave, tão repugnante á moral e ao direito, que a lei applica-lhes pena penitenciaria.

Mas o Ministro da Fazenda e o chefe progressista, pela sua idade, estão ao abrigo da pena penitenciaria. A lei concede-lhes este favor. Mas já que estão ao abrigo da pena penitenciaria uma cousa lhes resta: é morrerem para a vida publica e pedirem a Deus que a nação os esqueça e lhes perdoe o crime.

(O discurso será publicado na integra quando o orador restituir as notas tachygraphicas).

O Sr. Presidente: - Na ordem da inscrição segue-se o Sr. Claro da Ricca. Como a hora está adeantada, não sei se S. Exa. quer usar da palavra ainda hoje, ou se quer ficar com a palavra reservada.

O Sr. Claro da Ricca: - Peço a V. Exa. que me reserve a palavra para a sessão seguinte.

O Sr. Presidente: - A seguinte sessão é na segunda feira, sendo a ordem do dia a continuação da discussão do projecto de lei n.° 14.

Está levantada a sessão.

Eram 6 horas e 45 minutos da tarde.

Documentos mandados para a mesa nesta sessão

Representações

Da corporação dos pilotos do rio e barra de Lisboa, pedindo que na revisão dos decretos ditatoriaes seja consi-

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SESSÃO N.° 32 DE 20 DE JUNHO DE 1908 13

derada a transferencia da estação de saude de Lisboa pelos grandes inconvenientes que tem para a navegação.

Apresentada pelo Sr. Deputado Canto e Castro e enviada á commissão do "bill".

Da Associação dos Operários Corticeiros de Almada, pedindo que seja approvado o projecto do Sr. Deputado Estevam de Vasconcellos sobre as condições das classes operarias.

Apresentada pelo Sr. Deputado Estevam de Vasconcellos e mandada enviar ás commissões de administração publica e de artes e industrias.

O REDACTOR = Affonso Lopes Vieira.

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