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diario da camara dos senhores deputados

Discurso do sr. deputado Mariano de Carvalho, proferido na sessão de 22 de fevereiro, e que deveria ler-se a pag. 448, col. 2.ª

O sr. Mariano de Carvalho: — Preciso em brevissimas palavras recapitular os argumentos que apresentei hontem á camara.

Lembrar-se-hão, v. ex.ª e ella, de que apreciando os diversos documentos apresentados pelo nobre ministro da fazenda, documentos aliás deficientissimos e que não têem sido completados pelos esclarecimentos que se têem aqui pedido, mostrei que estavam crivados de erros e de inexactidões que lhes tiram toda a auctoridade. Estão ali errados os numeros e são viciosos os argumentos e raciocinios que sobre elles se fundam.

Mal preciso lembrar á camara que um d'esses erros era, por exemplo, que em dois mappas que conduziam ao mesmo deficit de 400:000$000 réis, em um d'elles o rendimento do real d'agua era avaliado em 660:000$000 réis e no outro em 1.292:000$000 réis. A discrepancia é de 632:000$000 réis.

É realmente extraordinario, quando o rendimento de um imposto é calculado em dois documentos comtemporaneos, por um modo tão diverso, que se chegue exactamente ao mesmo resultado quanto ao calculo do deficit. Depois de ter assim demonstrado que os documentos apresentados pelo sr. ministro da fazenda não dão uma idéa exacta do verdadeiro deficit do nosso thesouro, procurei, partindo das contas do thesouro de 1871-1872, calculando pelo orçamento de 1873—1874 e pelos mappas que acompanham o relatorio do sr. ministro da fazenda, deduzir qual seria o verdadeiro deficit no anno corrente e por consequencia no anno futuro, que d'este pouco póde differir. A camara está lembrada de que, por todos estes modos diversos de calcular a receita e a despeza, eu achei um deficit de 2.000:000$000 réis approximadamente. Como as novas receitas propostas pelo sr. ministro da fazenda são apenas por emquanto o augmento de sêllo e o augmento do imposto de importação e exportação, e como estas duas propostas não podem dar uma receita superior a um quarto do deficit existente, é claro que ficam a descoberto não só 1.500:000$000 réis do deficit ordinario, mas ainda toda a despeza que ha a fazer com o chamamento da reserva e com Angola.

N'estas circumstancias era naturalissimo perguntar com que meios conta o governo para occorrer á despeza extraordinaria que se propõe e cujo minimo é de 660:000$000 réis, segundo a declaração feita pelo sr. presidente do conselho.

Por isso pedi á camara que pensasse bem na responsabilidade que sobre ella podia recaír se porventura, por um acto inconsiderado, fosse preparar de novo os elementos da ruina financeira, quando já estão muito cerceados os meios de que lançámos mão em 1868 e annos seguintes, para evitar os grandes males que os erros da gerencia financeira tinham creado.

Disse eu tambem: Quer o governo crear novos impostos? Essa hypothese é pouco provavel, attento o estado de adiantamento da sessão.

Considerando que a maior parte das propostas de fazenda apresentadas pelo sr. ministro, a quem está entregue a gerencia da pasta da fazenda, parece destinada a morrer nas commissões; no caso do governo querer crear novos impostos, é conveniente apressar-se a trazer á camara as propostas necessarias para se realisar esse augmento de receita.

Qual é o procedimento que o governo intenta seguir para acudir a uma crise financeira que me parece imminente? Desejava que o governo dissesse se conta para occorrer tanto ao deficit ordinario como ao extraordinario, creado pelo chamamento da reserva, lançar mão da divida fluctuante ou da consolidada. Lançar mão da divida fluctuante parece-me muito difficil, porquanto sendo ella de 13.000:000$000 a 15.000:000$000 réis, não ha grande latitude para augmenta-la sem grandes perigos e pesados encargos.

É preciso que as lições do passado nos dêem regras para no futuro procedermos por um modo mais consentaneo com o interesse publico.

O governo não póde lançar mão da divida consolidada, porque os fundos vão descendo de tal modo, que difficilmente será possivel uma operação de divida consolidada em circumstancias rasoaveis.

Tambem lembrei á camara que a historia do presente é a história do passado. As causas que nos levaram á crise financeira dos annos de 1867 e posteriores foram a accumulação successiva de deficits, não só perniciosos em si, mas perniciosos porque os seus juros accumulando-se successivamente trouxeram o desiquilibrio financeiro a réis 7.000:000$000. Houve ainda outras causas que mais rapidamente aggravaram o mal; taes foram o chamamento da reserva ás armas em 1866 e o acampamento de Tancos, e todas as despezas accessorias.

Hoje pede-se o chamamento da reserva, e já sabemos, porque no-lo disse o sr. presidente de conselho, que a despeza a fazer é avultada, embora ainda tenhamos um desiquilibrio de mais de 2.000:000$000 réis entre a receita e a despeza ordinarias.

Parece-me imprudentissimo crear novas despezas, sem se pensar em estabelecer a receita correspondente. Conheço a fraqueza dos meus recursos, e por consequencia acho natural que os factos e os argumentos que apresento á camara não possam convencer á sua maioria; mas ha um facto actual já consummado, que deve inspirar á ca-

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mara e ao governo serios cuidados. Refiro-me ao movimento dos nossos fundos publicos.

Na segunda feira da semana anterior, quando se soube em Lisboa a noticia de que o principe Amadeu abdicára a corôa de Hespanha, e que se proclamára a republica n'aquelle paiz, os nossos fundos que estavam a pouco mais de 44, desceram a menos de 42. Depois a praça de Lisboa recobrou-se do primeiro sobresalto, e os fundos continuaram a subir até que na sexta feira passada, dia em que o sr. presidente do conselho apresentou n'esta casa a proposta, chamando ás armas as reservas, os fundos elevavam-se a 43; em seguida á apresentação da proposta, a baixa dos fundos tem sido constante, a ponto que hontem o preço ultimo da praça foi de 40,08.

Se é licito comparar as cousas pequenas ás grandes, lembrarei á camara que, quando os exercitos de Napoleão dominavam a Europa inteira, quando o grande imperador comprimia nos braços potentes todas as nações, desde o Tejo até o Vistula, antes das desgraças de Moscow e das traições de Leipzick, já a bolsa de París tinha, no movimento de fundos, dado á França e ao mundo os primeiros rebates dos desastres que se approximavam.

Pôde Napoleão vencer a Europa inteira, mas não pôde evitar que a cada nova victoria os fundos francezes tivessem uma baixa constante na praça de París. O credito annunciava de longe a capitulação de París e a derrota de Waterloo.

Faço votos, sr. presidente, para que o movimento de fundos que se realisa hoje na nossa praça não seja tambem um prenuncio do Waterloo do nobre presidente do conselho. Sinceramente, não lh'o desejo, e tambem não desejo que o Waterloo de s. ex.ª seja igualmente o Waterloo do reino. Os homens e os ministerios vão-se, mas ficam as nações para soffrerem e chorarem os males que a imprevidencia dos seus governantes lhes causa.

Prevejo facilmente, pelas palavras anteriores do nobre presidente do conselho, qual ha de ser a resposta que s. ex.ª me ha de dar. Já ouvi dizer n'esta casa a s. ex.ª que n'estas crises supremas em que a honra e a independencia de uma nação se jogam não é patriotico, não é prudente attender a mesquinhas questões de dinheiro. Foram estas, pouco mais ou menos, se não as palavras, pelo menos as idéas do nobre presidente do conselho.

Declaro francamente a V. ex.ª e á camara que este argumento não me commove.

Eu concedo facilmente ao governo e á maioria o monopolio da intelligencia, o monopolio da illustração, o monopolio do saber, e muitos outros monopolios; mas o que, em meu nome, em nome da opposição e em nome do paiz que lá fóra nos escuta a todos, lhe não concedo de fórma alguma é o monopolio do patriotismo (apoiados).

Se um perigo serio e imminente ameaçasse esta terra, estou convencido, e a historia do passado confirma a minha opinião, de que nenhum portuguez recusaria o ultimo ceitil da sua bolsa ou a ultima gota do seu sangue para defender a integridade e a honra do seu paiz (apoiados).

As circumstancias porém não são essas. Não ha perigo serio que nos ameace, di-lo o sr. presidente do conselho, e se o não dissesse, era o mesmo; bastava que olhassemos para a situação da Hespanha, bastava que considerasse-mos aquella generosa nação com o seio retalhado palas garras impias da guerra civil, bastava que attendessemos a que, se ella pretendesse attentar contra Portugal, haveria aqui uma nova Vendée, mas uma Vendée mais forte e sobretudo mais patriotica do que a Vendée franceza, para afastarmos do nosso espirito e da nossa consciencia quaesquer receios de um attentado contra a nossa independencia. Não póde pensar em conquistas, quem não póde exterminar os carlistas.

E, se um perigo existisse, então os meios propostos pelo nobre presidente do conselho seriam inefficazes, porque não se conjurava com mais 5:000, 6:000 ou 7:000 homens, que são os que podem vir da reserva, e digo 5:000, 6:000 ou 7:000 homens porque ninguem sabe qual é a força da reserva nem quantos soldados hão de vir para a fileira.

O sr. presidente do conselho diz que a lei do recrutamento não tem os defeitos que muita gente lhe vê, o sr. presidente do conselho não acha excessivamente defeituosa a organisação militar; mas basta um traço para definir a lei do recrutamento e a organisação militar. É que o proprio ministro da guerra não póde dizer ao parlamento nem qual é a força da reserva, nem qual é o numero de soldados que ha de vir para a fileira.

Mas, dizia eu, se realmente corressemos um perigo imminente e grave, os meios propostos pelo sr. presidente do conselho eram completamente inefficazes. Já o demonstrou muito competentemente pelo lado militar o illustre deputado o sr. Candido de Moraes, e demonstram-no os factos, porque eu não quero avançar cousa alguma que não seja fundada em factos.

Se ámanhã uma fragata couraçada se quizesse apoderar do porto de Lisboa e da cidade, nós, ainda que tivessemos 100:000 homens completamente armados na fronteira, ou haviamos de sepultar-nos debaixo das ruinas das nossas casas ou haviamos de nos render á discrição. Este é que é o facto.

Mas, suppondo mesmo que as providencias militares propostas pelo sr. presidente do conselho podessem ser efficazes, era preciso que fossem acompanhadas de certas providencias financeiras, porque nas guerras, e sobretudo nas guerras modernas, se as armas são um elemento essencial de triumpho, não o são menos as finanças (apoiados).

Entende o sr. presidente do conselho que devemos crear meios de resistencia, entende s. ex.ª que devemos preparar o paiz para qualquer eventualidade pelos meios mais convenientes, que são crear-lhe recursos, proporcionar-lhe armamentos e organisar militarmente a nação? Venha á camara, faça as propostas convenientes, que eu estou convencido de que ha de encontrar aqui applausos unanimes. Mas não é nada d'isto o que se está fazendo.

O sr. presidente do conselho quer apenas ter uma maior força no exercito para impedir que alguma guerrilha carlista, d'aquellas que campeiam alem do Ebro, viole o nosso territorio.

Ora, contra este receio do sr. presidente do conselho protestou eloquentemente o sr. Saraiva de Carvalho, comparando 1868 e annos posteriores com 1872 e 1873. Em 1868, disse o sr. Saraiva de Carvalho, e eu não posso referi-lo com a mesma eloquencia e a mesma energia com que s. ex.ª exprimiu o seu pensamento, caía um throno radicado pelas tradições, baqueava contra o estrondo das armas, no meio de uma luta civil e militar, cujo exito se não podia prever. Em 1873 cáe um throno pela abdicação voluntaria de um principe, que ha pouco tempo fôra elevado a elle; é substituido pacificamente por uma situação creada pelos poderes legaes. Ou este acontecimento ou o de 1868! Não se chamou então a reserva ás armas e chama-se hoje, quando, se algum bando carlista vier a Portugal, nós temos força sufficiente para o desarmar! Em 1868 e 1869 andavam as guerrilhas muito mais proximas da nossa fronteira; não se chamou a reserva e o territorio não foi violado.

Por consequencia, em face de um perigo enorme, como é o da ruina financeira do paiz, temos apenas uma vantagem minima: a de ter em armas um numero de homens um pouco mais consideravel do que o que existe actualmente.

Não são porém só os inconvenientes de ordem financeira aquelles que podem apreciar-se na proposta do sr. presidente do conselho; ha inconvenientes gravissimos de ordem economica, que não só tendem a diminuir a riqueza publica, mas hão de influir de um modo desfavoravel nos rendimentos publicos.

Nós sabemos que a emigração, que nos rouba annualmente 10:000 ou 12:000 pessoas, tem produzido uma alta

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nos salarios, e que essa alta, embora seja até certo ponto favoravel para as classes operarias, prejudica sensivelmente a producção. Se aos males provenientes de uma emigração, que não diminue, antes augmenta, juntarmos o de arrancar ás lides do trabalho 7:000 a 8:000 homens, que estão empregados no serviço da agricultura, alem dos 10:000 homens do contingente ordinario, eu não sei o que será do paiz, porque a alta do salario influe de um modo sensivel no desenvolvimento da producção, e por consequencia nos recursos do thesouro.

O chamamento da reserva, disse o sr. presidente do conselho, tem unicamente por fim occorrer á possibilidade da violação do territorio portuguez pelas guerrilhas carlistas. S. ex.ª não apresentou outro motivo, não só n'esta casa mas tambem n'uma reunião muito particular, em que poderia mais facilmente expor o seu pensamento. Não póde haver outro motivo senão este, porque para obstar a uma invasão estrangeira os recursos propostos são insufficientes; e para comprimir a propaganda republicana, socialista, ou outra qualquer, é evidentissimo que os meios propostos são inefficazes, e podem ser contraproducentes.

A propaganda das idéas combate-se de outro modo que não com as armas. E quanto mais se querem comprimir as idéas com maior energia ellas vingam. Acontece com ellas o que acontece com as forças naturaes: quando não são bem aproveitadas, esmagam e destroem quem ousa affronta-las. A propaganda das idéas combate-se com a palavra, com a escripta, com a doutrina, e principalmente com os progressos liberaes, com a economia e a moralidade dos governos. O chamamento da reserva não comprime a evolução de nenhuma idéa e cria grandes e fundados descontentamentos. De modo que se pesarmos n'uma balança imparcial as vantagens e os inconvenientes do chamamento da reserva, vemos que não tirâmos nenhuma vantagem valiosa, mas que por todos os lados surgem inconvenientes gravissimos e dos mais perigosos.

Querendo tomar pouco tempo á camara, cuja benevolencia, n'esta occasião mais uma vez agradeço, termino as considerações de ordem financeira e economica que tinha de fazer sobre este projecto, e vou em breves palavras expor qual o meu pensamento a respeito da questão de confiança.

O artigo 3.° do projecto em discussão é uma auctorisação amplissima, das mais amplas que tenho visto.

Quando este ministerio subiu ao poder, d'aquelle logar (apontando para a esquerda), lhe disse eu, que julgando do futuro pelo passado, prevendo quanto me era possivel os actos do porvir do governo pelos seus actos preteritos, eu não tinha n'elle confiança, nem na ordem politica, nem na administrativa, nem na financeira. Os factos succedidos desde que na camara proferi estas palavras, robusteceram no meu animo o convencimento de que não podia dar de modo algum a minha confiança a este governo.

Effectivamente vimos no intervallo parlamentar, nomeações que a moralidade publica justamente condemna (apoiados), vimos favores onerosos, concedidos sem rasão, á custa do thesouro; e alem d'isso vimos a infracção constante e presistente de todas as leis.

Do real d'agua já hontem fallei. Havia um artigo preceptivo, que mandava que s. ex.ª, o sr. presidente do conselho, fizesse um regulamento; s. ex.ª não o fez, allegando-nos que aquella disposição não era senão um pleonasmo legislativo.

Supponho que, se porventura a lei em vez de mandar fazer um regulamento, mandasse que ficassem em vigor os regulamentos anteriores á lei, se dissesse: «o governo manterá os regulamentos passados», o nobre presidente do conselho faria um regulamento novo; e quando nós o accusassemos n'esta camara, nos viria dizer que aquelle artigo não era senão uma ellypse legislativa.

De maneira que a execução das leis, na opinião do sr. presidente do conselho, é apenas uma questão de figuras de rhetorica.

É pleonasmo o artigo de uma lei quando não convem cumpri-lo, com seria ellypse no caso contrario que figurei.

Comprehendo que o governo, compellido por circumstancias politicas momentosas, que muitas vezes se levantam na governação publica, não fizesse o que a lei marcava, mas n'esse caso entendo que o governo devia no primeiro dia de sessão apresentar um bill (apoiados) para justificar quaes tinham sido as rasões que o tinham levado a não fazer o regulamento como a lei lhe mandava.

Escuso de mostrar, porque já outros illustres deputados provaram com rasões irrespondiveis, que a legislação a respeito da contribuição industrial, sumptuaria e de renda de casas, comparada com a legislação financeira, tambem não foi cumprida.

Já lembrei á camara que o governo, apesar dos argumentos em contrario dos srs. ministros da guerra e da fazenda, tinha contrahido um emprestimo sem auctorisação legal; mas se eu quizesse fundamentar mais as minhas opiniões na questão de confiança devia lembrar á camara que a lei de 1867, que permittiu a construcção do caminho de ferro do Minho, dava uma auctorisação restrictissima, e impunha nem menos de tres condições. Primeira, que os fundos para a construcção seriam levantados por meio de obrigações; segunda, que os juros d'essas obrigações deveriam pagar-se adiantadamente; terceira, que o governo antes de emittir as obrigações haveria de propor á camara os meios de receita necessarios para pagar o juro e amortisação das obrigações.

Nenhuma d'estas condições foi cumprida. O governo violou abertamente a lei movido por mesquinhos interesses politicos.

Se um governo, quando uma auctorisação estava cercada de tantas restricções, passou por cima d'ellas e começou a construir o caminho de ferro do Minho, o que fará elle de uma auctorisação illimitada e a que nenhuma restricção cérca! (Apoiados).

Vou concluir. Expuz singela e despretenciosamente os factos, que são por todos conhecidos, como se apresentaram á minha intelligencia, e taes quaes me pareceu resultarem do exame dos documentos officiaes. Sinto não ter os dotes oratorios necessarios para convencer a camara; porém entendo que cumpri o meu dever, dizendo a verdade, e que posso sentar-me com a consciencia tranquilla e isento de toda a responsabilidade d'esta lei, que julgo ruinosa para o paiz (muitos apoiados).

Creio que em toda a minha oração não proferi uma palavra que podesse offender algum dos illustres cavalheiros a que me referi. Todos sabem que eu, sem estar a protestar a minha consideração pelo governo e pela camara, procuro sempre affirma-la e mante-la com relação a todos os membros d'esta casa (apoiados); porém, se contra a minha vontade, me escapasse alguma phrase com que s. ex.ªs se possam julgar offendidos, eu voluntariamente a retiro.

Discurso do sr. deputado Mariano de Carvalho, proferido na sessão de 22 de fevereiro, que deveria ler-se a pag. 459, col. 2.ª

O sr. Mariano de Carvalho: — Começo por ler a minha moção (leu).

A moção que anteriormente apresentei, pedia que o governo fixasse o maximo da despeza, e declarasse quaes os meios de receita para occorrer a esta despeza; da parte do governo não houve resposta, e apenas o sr. ministro da fazenda disse ha pouco que no mez de novembro ficou um saldo nos cofres publicos, e que esse saldo podia ser applicado para a despeza a fazer com o chamamento da reserva ás armas.

O sr. Ministro da Fazenda: — Eu não disse isso.

O Orador: — Se não disse isto, disse pelo menos uma cousa analoga. Allegou que com o saldo se podia gastar sem augmentar a divida fluctuante.

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E, disse tambem s. ex.ª, que, se acaso se despendessem 1.200:000$000 réis com a reserva que se vae chamar, não se seguia que o deficit augmentasse essa quantia, porque só haveria que fazer face aos juros do dinheiro que se levantasse.

Como levanta o ministerio o dinheiro para a despeza da reserva e outras accessorias? Levanta-o por meio de um emprestimo consolidado, ou por meio de um emprestimo de divida fluctuante?

Se é por meio de um emprestimo consolidado, pergunto qual é a auctorisação e os meios para occorrer aos encargos permanentes d'esse emprestimo? Onde está a auctorisação? Quaes são os meios de receita creados para occorrer aos encargos do emprestimo?

O sr. presidente do conselho fez passar no parlamento uma lei consignando o principio de que nenhum emprestimo se contrahisse sem crear ao mesmo tempo a receita que houvesse de fazer face aos respectivos encargos; a camara votando ha pouco uma moção do sr. Barros e Cunha, affirmou este mesmo principio.

Se o governo quer que se lhe vote um emprestimo, peça auctorisação para elle, e crie os meios com que ha de fazer-lhe face. Esta é a sua obrigação solemnemente contrahida; é tambem a da camara.

Se o governo recorre á divida fluctuante, será prudente com uma divida d'esta especie, que não é inferior a réis 15.000:000$000, porque eu não acredito que os réis 2.000:000$000 de saldo em 31 de dezembro na agencia de Londres fosse para amortisar a divida fluctuante, será prudente, digo, augmentar esta divida com os réis 1.000:000$000 para o pagamento da reserva, e com os 100:000$000 réis para a expedição de Angola? Querem de novo sujeitar este paiz aos prejuizos, aos vexames, aos opprobrios, aos vilipendios com que se viu afflicto em 1868 por causa de outra divida fluctuante não superior? O sr. ministro da fazenda quiz retaliar contra outros governos e outros partidos, recordando os supprimentos a 14, 17, 18 e 22 por cento. Mas lembro á camara que os emprestimos a 14, a 17, a 18, a 22 por cento não datam de 1868 e 1869, mas de 1867, quando era ministro da fazenda o sr. presidente do conselho (apoiados).

É preciso que os srs. ministros, quando fallam contra os partidos que lhes são adversos, se lembrem de que as circumstancias extraordinarias, que collocaram os governos d'esses partidos na dura necessidade de se sujeitarem a encargos elevadissimos para poderem occorrer ás despezas publicas, não foram creadas por elles, mas pelo partido regenerador e pelo sr. Fontes Pereira de Mello (apoiados da esquerda).

O deficit de 7.000:000$000 réis não fomos nós que o creámos; foi o sr. presidente do conselho, que foi ministro da fazenda desde 1865 até 1868.

Em 1865 estava o deficit, em 4.000:000$000 a réis 5.000:000$000; entrou então o sr. presidente do conselho para o governo, e o primeiro acto de s. ex.ª, que tinha sido repetidas vezes ministro da corôa e muitas capitaneára a opposição n'esta casa, foi pedir á camara que lhe concedesse tempo para estudo! Todo o tempo que s. ex.ª e os seus collegas estiveram na opposição, doze annos, ou mais, e todo o tempo que estiveram no governo não lhes serviu para estudarem os meios de n'aquella occasião occorrer ao desequilibrio das receitas e despezas. O deficit era, pois, de 4.000:000$000 a 5.000:000$000 réis. Estudou o governo, e creio até que estudou de mais. Em 1866 começámos a ver o resultado dos seus estudos; foi crescer o deficit a 6.000:000$000 réis, graças a uma administração detestavel, ás extravagancias de Tancos e outras muitas. Em 1867 apresentou-nos o governo as suas propostas de lei, cuja parte principal o paiz rejeitou; o facto foi que o deficit estava em 7.000:000$000 réis no fim de 1867. A divida fluctuante era de 16.000:000$000 réis, parte do emprestimo contrahido para amortisa-la foi gasto nas despezas correntes pelo ministerio da fusão e pelo que se lhe seguiu.

Depois, quando entrou para os conselhos da corôa o partido reformista, a divida fluctuante era de 12.000:000$000 réis; estava consumido o emprestimo que se havia levantado, os rendimentos das alfandegas estavam antecipados e despendidos, os encargos da fazenda eram enormes, nas arcas do thesouro, como muitas vezes o disse um cavalheiro que faz parte da maioria parlamentar e que não é suspeito á situação actual, o sr. Carlos Bento, não havia um real. Grande divida fluctuante, rendimentos publicos antecipados, supprimentos a 17 e 18 por cento, deficit de 7.000:000$000 réis, as receitas publicas diminuindo, uma crise economica e financeira, tal foi a situação que nos legaram! E estranham que lutassemos com enormes difficuldades, que fizessemos emprestimos caros, os ministros e os parlamentares que nos deixaram o thesouro arruinado e sem credito!

Agora preciso responder a algumas observações do sr. ministro da fazenda a respeito das minhas apreciações sobre os erros, tristes erros, dos mappas e mais documentos que s. ex.ª apresentou á camara.

Estranhei eu, por exemplo, que no dia 4 de janeiro para s. ex.ª o consumo do vinho fosse um e no dia 7 de janeiro fosse outro, e que se desse o mesmo caso em relação ás bebidas alcoolicas e fermentadas e em relação ás carnes. A resposta de s. ex.ª compõe-se de duas partes: a primeira é que no orçamento foram adoptados todos os calculos feitos no relatorio do sr. presidente do conselho em 1867, e que nos mappas do relatorio do sr. Serpa foram em relação á carne aceitos os dados estatisticos obtidos na repartição de agricultura. A segunda parte é que os orçamentos levam tempo a imprimir e que, embora tenham a data de 4 de janeiro, entraram muito antes na imprensa nacional.

Esta segunda parte é facilima de responder. O argumento do nobre ministro é pueril, mas, como s. ex.ª se defende com a imprensa nacional, não ha remedio senão ataca-lo com a mesma imprensa nacional.

Sabe-se perfeitamente que os orçamentos da despeza dos ministerios são escriptos com muita antecipação, em setembro ou outubro, e vão-se imprimindo na imprensa nacional até janeiro. Mas os orçamentos de receita, mas o relatorio que precede o orçamento são mandados á imprensa nacional nos ultimos dias de dezembro ou primeiros dias de janeiro.

Assim o argumento tirado da demora na imprensa nacional é futil; alem d'isso se o pequeno relatorio do orçamento leva mezes a imprimir na imprensa nacional, como é que o extenso relatorio de s. ex.ª se imprimiu de um momento para o outro? Assim os dois documentos, relatorio de fazenda e orçamento de despeza, são com pequena differença contemporaneos, e por isso as suas discrepancias não têem desculpa.

Passo á primeira parte do argumento do sr. ministro e desde já noto que póde apenas desculpar as discrepancias relativas ao consumo da carne. As outras ficaram sem explicação.

Emquanto á carne direi que n'um documento financeiro não se póde tratar de modo nenhum de saber qual é a totalidade do consumo da carne em todo o paiz.

Toda a gente sabe que a carne que se consome no paiz é o dobro, o triplo, se não é mais, d'aquella que se manifesta para o pagamento do imposto do real d'agua. E só a que se manifesta interesse para o calculo d'este imposto.

Nunca o consumo da carne manifestada para o pagamento do imposto do real d'agua excedeu a 13.000:000 ou 14.000:000 kilogrammas; é facto incontestavel que se vê em todos os documentos officiaes.

Os redactores dos orçamentos, com o intuito muito virtuoso e respeitavel de diminuir o deficit, desde que encontraram os calculos do sr. presidente do conselho em 1867, que elevavam o consumo da carne a 16.500:000 kilogram-

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mas, aproveitaram esse numero para crearem mais receita ficticia, embora os factos todos os annos mostrem que não é exacto aquelle consumo.

O nobre ministro da fazenda quando viu que os numeros do seu relatorio relativos ao rendimento do real d'agua não podiam concordar com os do orçamento, achou uma cousa que não era nova, achou na repartição de agricultura os mappas que existem ha uns poucos de annos ácerca do consumo da carne, e lançou mão de um esclarecimento que alem de não merecer confiança nenhuma estatistica, não merece confiança nenhuma como elemento fiscal, porque, como disse, é facto que ainda em anno nenhum o consumo da carne manifestada excedeu 14.000:000 kilogrammas. Tendo conhecimento perfeito d'este facto o sr. ministro da fazenda diz no orçamento que o consumo tributavel é de 16.500:000 kilogrammas, e no relatorio que sobe a 18.800:000 kilogrammas!

Quem procede assim tem a intenção, que muito respeito, de convencer o paiz de que o desequilibrio financeiro é muito menor do que realmente é, mas não tem intenção de dizer a verdade! Ora a falta de verdade não extingue nem attenua o deficit, antes póde levar a augmenta-lo com imprudencias.

Passo a outro ponto.

Para qualificar o methodo extraordinario descoberto pelo sr. ministro da fazenda para calcular o deficit, fiz a seguinte consideração. No relatorio de fazenda, a pagina 2, diz o sr. Serpa que os documentos n.ºs 9 e 10 se contraprovam, embora calculados por methodos diversos, em apresentarem um deficit de pouco mais de 400:000$000 réis. Ora d'estes documentos, um calcula o rendimento do real d'agua em 660:000$000 réis, outro em 1.292:000$000 réis suppondo aliás que são identicas as outras receitas e identicas tambem as despezas. Se os taes mal chamados documentos dão o mesmo deficit, embora um admitia o real d'agua rendendo 660:000$000 réis, outro rendendo réis 3.292:000$000, esses documentos não se contraprovam, destroem-se. Um pelo menos é falso, ou antes com maior exactidão ambos são falsissimos. Eis o que eu disse, lamentando que os documentos officiaes não mereçam nenhuma confiança.

O que me respondeu o sr. ministro da fazenda? Que tratou de ver qual era o deficit do anno actual, que não tratou do deficit do anno futuro, que nos seus calculos do anno actual entra o real d'agua pelo que se cobrou. Mas esta resposta não satisfaz, porque não chega a ser cousa nenhuma. O meu argumento foi que nos referidos documentos n.ºs 9 e 10 s. ex.ª achou para o anno actual o deficit de 400:000$000 réis, embora no primeiro entrasse o real d'agua como rendendo 660:000$000 réis, e no segundo réis 1.292:000$000. Desde que nos dois documentos ha para este imposto uma discrepancia de 632:000$000 réis, o facto de chegarem ambos ao mesmo deficit prova que esses documentos são absurdos e falsos. Assim o meu argumento subsiste de pé e as considerações do sr. ministro da fazenda provam apenas a impossibilidade de destrui-lo. Na verdade é triste chegarmos a uma epocha, em que o ministro para definir a situação da fazenda só possa usar dados e argumentos absurdos e erroneos!

S. ex.ª tambem quiz defender aquella espantosa concordancia de rendimento entre os dois impostos, para os quaes a materia collectavel é diversa, em que as bases são diversas, e em que o methodo da cobrança é tambem diverso.

S. ex.ª tinha posto como dado fundamental do problema o rendimento do imposto em 1.292:000$000 réis; procurou pelo modo que julgou mais provavel o consumo dos diversos generos sujeitos ao novo imposto, procurou depois a incognita do problema, as taxas. Na verdade o problema está bem posto, mas os raciocinios, mas os calculos para resolve-lo vem todos errados. Assim o nobre ministro para estabelecer entre o seu relatorio e o orçamento uma concordancia que não existia, deu-se ao incommodo de errar todos os calculos e todos os raciocinios. Singular modo de estabelecer concordancias, as quaes só podem resultar da accumulação de erros incriveis.

S. ex.ª quiz mostrar que não errou, eu pretendo mostrar-lhe que errou, e tanto, que a sua concordancia se traduz n'uma discrepancia de 211:200$000 réis, entre o real d'agua que s. ex.ª propõe no orçamento, e o que nos apresenta no seu relatorio. Com effeito s. ex.ª diz no relatorio que o consumo total de vinho sujeito ao imposto é de réis 221.150:000 litros, dos quaes 150.750:000 litros ficam sujeitos só ao imposto por grosso, e 70.400:000 litros aos dois impostos por grosso e por miudo.

Admira que o sr. ministro da fazenda, que foi distincto professor de mathematica, soubesse formular o seu problema, e não empregasse os meios da sciencia que estudou para achar o resultado exacto. O illustre ministro tinha obrigação de saber que 150.750:000 litros vendidos por grosso, tendo de ficar sujeitos ao imposto de 3 réis, produzem 452:250$000 réis, como está no seu relatorio, e que os 70.400:000 litros vendidos por miudo não só pagam o imposto da venda por miudo na importancia de 325:200$000 réis, como tambem está no relatorio, mas tambem se accumula sobre elles o imposto da venda por grosso, que produz 211:200$000 réis. Estão certos no relatorio os primeiros dois numeros, estão certas as multiplicações e as sommas, mas está omittida a ultima verba. Ahi tem o seu erro, ahi tem a famosa concordancia reduzida á discrepancia de 211:000$000 réis. O nobre ministro apresentou bem o seu problema, mas teve a infelicidade de o resolver mal, não foi porque não soubesse, mas por querer á viva força achar um accordo impossivel e contradictorio com os dados da questão.

Passo adiante.

Nos mappas do relatorio de s. ex.ª, não apontei senão os mais notaveis erros, porque reservo a analyse de muitos outros para quando se discutir a questão de fazenda. Agora aproveitei só o preciso para esclarecer a camara a respeito do estado da fazenda, visto que se lhe exige auctorisação para despezas avultadas.

Disse eu que no relatorio, mappa nº. 9 a paginas 59, affirma o sr. Serpa que em 1871-1872 foi de 700:000$000 réis a despeza na agencia de Londres. Ora isto não é verdade, e parece-me singular que seja falso um documento official. Vê-se com effeito pelos mappas officiaes da despeza do thesouro em 1871-1872, a pag. 35 e 48 dos documentos enviados á camara, que n'esse anno a despeza n'aquella agencia não foi de 700:000$000 réis, mas de 908:021$129 réis. Accusei este erro, e a resposta de s. ex.ª foi: «é porque em 1871-1872 havia mais divida fluctuante do que actualmente, ou porque os seus encargos eram maiores».

Poderia ser assim, mas n'esse caso quem auctorisou s. ex.ª a pôr aqui n'este mappa, que a despeza em 1871-1872 foi de 700:000$000 réis, quando na realidade foi de réis 908:000$000? Quem auctorisou s. ex.ª a alterar a verdade?

Mas alem d'isso, nego a s. ex.ª que a divida fluctuante de 1871-1872 fosse maior que a actual, que sobe a réis 15.000:000$000, alem dos 100:000$000 réis para as despezas de Angola, alem do necessario para acudir ao deficit ordinario d'este anno, alem das centenas de contos precisas para a despeza com a reserva. A divida fluctuante actual é a maior que tem havido desde 1867 (apoiados).

O outro erro de que fallei e o sr. ministro procurou desculpar, é relativo aos juros dos titulos na posse da fazenda. Não posso de fórma alguma concordar com a resposta que s. ex.ª me deu, porque provo de uma maneira muito simples que é exacta a minha asserção e que o sr. ministro tentou desculpar um erro com outro ainda maior.

A demonstração é muito facil.

S. ex.ª disse que em geral os juros dos titulos na posse da fazenda figuram apenas na contabilidade publica por encontro ou jogo de contas, e que portanto, se estão na

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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

receita dos mappas n.ºs 8 e 9 do seu relatorio, ou dos elementos com que foram construidos, tambem estão na despeza. Esta asserção não é verdadeira, é erronea. Eu lh'o provo em duas palavras. Nos referidos mappas e nas notas que os acompanham declara s. ex.ª que os encargos da junta do credito no anno de 1872-1873, nos termos da lei de 14 de maio de 1872, importam em 8.678:000$000 réis. É com estes 8.678:000$000 réis que são feitos todos os calculos. Ora, os encargos da junta, incluindo os juros dos titulos na posse da fazenda, eram pela citada lei de 10.573:000$000 réis. Logo se os mappas e notas do relatorio fallam só de 8.678:000$000 réis, é porque não incluem os juros dos titulos na posse da fazenda.

Logo o sr. ministro, dizendo que os juros d'estes titulos tambem figuravam na despeza mencionada no seu relatorio, enganou-se, não disse a verdade.

E, como se um erro só não lhe bastasse, ainda commetteu outro. Por quanto, depois de declarar que os juros dos titulos na posse da fazenda, se figuram na receita dos seus mappas, tambem estão na despeza, o que já provei não ser exacto; acrescentou que na receita só poderia estar alguma pequena parte d'esses juros cobrada a dinheiro. Vou-lhe provar que tambem se enganou; que na receita não vem só alguma pequena parte d'esses juros, mas que vem todos na importancia de mais de 1.500:000$000 réis, que é a total.

Com effeito no mappa de pag. 56, temos:

«Bens proprios nacionaes e rendimentos diversos (em tres mezes), incluindo juros dos titulos na posse da fazenda:

Correio geral.......................... 123:771$660

Caminho de ferro do sul................. 95:309$180

Outros rendimentos..................... 700:293$129

919:373$969

Tal é a receita toda d'essa especie n'um trimestre. Para achar a receita annual havemos de quadruplicar aquella verba, e assim faz o sr. ministro da fazenda.

Temos, pois, n'um anno 3.677:495$876 réis como receita total dos proprios nacionaes e rendimentos diversos. Agora vamos a ver do orçamento qual é o rendimento annual dos bens proprios nacionaes e rendimentos diversos, excluindo o juro de titulos de posse da fazenda; é apenas de 1.484:000$000 réis. Por conseguinte, n'este ponto ha uma notavel discordancia (apoiados) entre o rendimento mencionado no orçamento e o calculado como effectivo pelo sr. Serpa. Ora, a discordancia desapparece de um modo muito simples e que revela o segundo erro do nobre ministro. Se aos 1.484:000$000 réis do orçamento juntarmos a contribuição dos bancos para as classes inactivas na importancia de 666:000$000 réis, se juntarmos 1.580:000$000 de juros de titulos na posse da fazenda, a somma dá réis 3.730:000$000, numero que pouco differe dos 3.677:000$000 réis calculados pelo sr. ministro. Assim não póde s. ex.ª negar que pertendeu desculpar um erro com dois erros, e que não merecem confiança os seus calculos ácerca do deficit.

Depois d'estas rectificações, seria demorar muito o debate se tratasse da questão do emprestimo e de outras muitas que incidentemente se levantaram. Nós havemos de tratar brevemente da questão de fazenda, e então será occasião de desenvolver com mais largueza este assumpto. Agora apenas direi que o sr. ministro pretendeu justificar a illegalidade do emprestimo apontando illegalidades iguaes de outros ministros, o que na verdade é um singular modo de argumentar. E acrescentarei que s. ex.ª não combateu muitos outros argumentos que apresentei, nem contestou que o deficit ordinario seja superior a 2.000:000$000 réis, embora no seu relatorio o queira erradamente figurar muito menor. Apenas fallou da melhoria do nosso estado financeiro, que ninguem contesta; mas não cuidou em que esta proposta da reserva e outras muitas tendem a peiorar a situação. Em presença de tão consideraveis augmentos de despeza, era mister demonstrar que a situação está longe de ser agradavel, e que qualquer imprudencia a póde tornar pessima.

A camara, que está impaciente por terminar este debate, me perdoará o tempo que lhe tomei; mas deve comprehender que, depois do discurso do sr. ministro da fazenda, era obrigação minha provar, por bem do meu credito, que disse a verdade, e que é o sr. ministro da fazenda quem erra (apoiados).

Vozes: — Muito bem.

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