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SESSÃO N.º 36 BE 27 DE JULHO DE 1909 15

quero de maneira nenhuma irritar esta questão, vou terminar.

Mas não o faço, sem lembrar a V. Exa. e á Camara que as associações religiosas, como associações legaes que são, não podem ser privadas dos beneficios concedidos a todas as associações. (Muitos apoiados).

(O orador foi cumprimentado pela maioria da Camara).

O Sr. Estevam de Vasconcellos: - Sr. Presidente: Tambem eu não venho irritar este debate; sempre tenho procurado moderar o meu temperamento e disciplinar o meu cerebro por forma a ser o mais correcto possivel nas discussões parlamentares.

Ainda menos tenho o menor intuito de vir aqui levantar a questão religiosa, á qual, diga se de passagem, tenho sido sempre o mais indifferente possivel, preferindo ao estudo, das questões metaphicas o estudo das questões concretas que se resolvem pela investigação dos factos sociaes.

O que irrita o debate, o que levanta a questão religiosa é o projecto de lei em discussão!

É isto que eu vou demonstrar, e a melhor forma de o fazer é provando que elle não é trabalho serio, que a sua execução não melhoraria as condições de vida das classes proletarias, que não passa emfim de uma burla e de uma mystificação. (Apoiados).

Sr. Presidente: o projecto de lei em discussão é alem disto um estratagema indecoroso de que os oradores pseudo-socialistas se hão de servir nas reuniões operarias paraludibriareru o publico, com a esperança de que ainda seja possivel, nesta crise agudissima a que nos arrastou o regime monarchico, a solução immediata de qualquer problema social.

E é ainda lima arma que a monarchia procura dar ao clericalismo para desenvolvimento e propaganda das congregações religiosas.

Decerto nos republicanos, que pelo facto de sermos republicanos ligamos importancia primacial á questão do regime politico, não deixariamos de dar o nosso applauso a quaesquer medidas que- de momento, pudessem attenuar a situação desgraçadissima do proletariado português.

Mas veja V. Exa. o seguinte confronto que dá bem a medida da lealdade, da sinceridade e da correcção com que os dirigentes da politica monarchica estão procedendo para com as classes trabalhadoras.

Da ultima sessão legislativa ficaram pendentes dois projectos de lei de caracter social, admittida a designação restricta que entre nos se costuma dar ás questões sociaes, as quaes de resto envolvem tudo, absolutamente tudo o que incide sobre a vida de um povo, desde a acção dos poderes constituidos até a organização intima das familias.

Um d'esses projectos foi o meu sobre acidentes dê trabalho; o outro é o que neste momento se discute.

O primeiro continua dormindo o somno das cousas inopportunas, no seio da respectiva commissão. E, no entanto, o unico defeito, que lhe assacaram, foi o de não ser completo nos seus objectivos, o de não prever todas as hypotheses, o de não garantir em todos os casos as indemnizações devidas ás victimas dos desastres do trabalho. Pois eu vou demonstrar que o projecto sobre as casas baratas nem por sombras resolve o problema.

Sr. Presidente: vamos a factos, vamos a argumentos, e vamos a factos tão positivos a argumentos tão concretos, que eu hoje vou falar, não com as opiniões mais ou. menos autorizadas de medicos ou sabios que haja lá fora, mas com a opinião de um homem que esta Camara muito bem conhece.

Ha nesta casa um medico que foi operador distinctissimo e que depois se consagrou ao estudo de questões de hygiene social. Refiro-me ao Sr. Dr. Sabino Coelho.

Pois S. Exa., tendo que apresentar um estiado no congresso sobre a tuberculose realizado em Vianna do Castello em 1902 sobre a construcção de casas baratas e hygienicas para os operarios, chegou ás seguintes conclusões, que são a condemnação formal, categorica, esmagadora deste projecto que nós estamos a discutir.

Peço a attenção da Camara.

As conclusões que o Sr. Sabino Coelho, apresentou no congresso de Vianna do Castello foram as seguintes:

"Que o problema não podé ser resolvido apenas pela acção da iniciativa individual, que é indispensavel á acção do Estado exercida pelos seguintes processos: concessão de terrenos gratuitos ou em condições muito favoraveis; contribuição das caixas economicas; emprestimos com pequeno juro; isenção de impostos; canalizações gratuitas".

Quer dizer: S. Exa. entendia que eram condições fun-damentaes para a resolução do problema, cinco alvitres que apresentou nas conclusões sujeitas ao congresso de Vianna do Castello.

A solução do problema, tal como vem apresentado neste projecto de lei, é tão completa, tão real, tão decisiva que apenas a um dos alvitres se attendeu - á diminuição de alguns impostos.

E digo apenas a diminuição de alguns impostos, porque a unica cousa com que este projecto de lei procura garantir no futuro a edificação de casas baratas e hygienicas, alem da diminuição e reducção de alguns impostos, diminuição e reducção que, diga-se a verdade, já os actuaes proprietarios podem conseguir, se forem caciques ou influentes eleitoraes, dada a situação deprimente em que se encontram os empregados de fazenda; a unica vantagem que o projecto de lei estabelece para as futuras casas baratas é uma reducção no preço da agua nas condições seguintes:

"Artigo 28.° Não serão approvados contratos para o abastecimento de aguas nas povoações, nem se permittirá modificações de qualquer natureza nos contratos já existentes, sem que nelles fique estabelecido que o preço da agua não seja superior a 100 réis por metro cubico, comprehendendo o aluguel dos hydrometros, para as habitações de renda annual até 100$000 reis, em povoações de mais de 4:000 habitantes e de 36$000 réis em povoações de menos de 4:000 habitantes".

Ora V. Exa., Sr. Presidente, quer ver como esta vantagem é effectiva e immediata e tem importancia decisiva? V. Exa. bem vê que esta vantagem apenas se pode tornar effectiva quando se revogar o contrato da Camara Municipal de Lisboa com a Companhia das Aguas. E quer V. Exa. saber até quando vigora o contrato? Até 1973.

Ora veja V. Exa. que mystificação tão manifesta.

Então o Governo da monarchia portuguesa procura resolver o problema das casas baratas dando como estimulo para a sua construcção uma vantagem que apenas se pode tornar effectiva daqui a 64 annos?

V. Exa. comprehenae que este facto é de uma eloquencia esmagadora, e que d'esta forma não se pode de maneira nenhuma admittir que haja sinceridade e seriedade no projecto de lei que se discute.

Este problema das casas baratas é um problema de necessidade instante, inadiavel e palpitante; é um problema que sobreleva a todos os outros problemas.

Nós, medicos, sabemos que acima da propria assistencia, publica, acima da alimentação e acima de todos os cuidados, prophylaticos, acima de tudo isto, estão as condições da habitação.

Não ha duvidas a este respeito. Mas este problema é de uma complexidade enorme, é de uma gravidade immensa; é um problema que não se resolve senão com muito