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conhece os principios da justiça e da liberdade a ponto que ordinariamente se confunde o indigitado ou suspeito com o criminoso, fazendo as massas justiça ou antes vinganças por suas mãos, com horror e offensa da sociedade. Dizia um dos espiritos fortes da França, e que hoje terá voga n'esta terra, que se o accusassem de ter furtado o sino grande da cathedral de París, e de o metter na algibeira, que elle começaria por fugir e depois provar de longe que o tal sino lhe não cabia na algibeira. É o que pede a prudencia para se não ser victima em taes crises. Vindo apresentar-me á justiça do meu paiz, pedindo-lhe o meu julgamento, provei o quanto confiava nas instituições liberaes, e fazia assim uma profissão de fé politica bem valiosa para quem apreciasse as minhas circumstancias e caracter. E de facto isso me deu a confiança d'aquelles mesmos que então me arguiam de revolucionario, quando o meu crime foi ter dado fuga a um desgraçado preso, crime que eu agora repetiria em iguaes circumstancias. Mais de vinte testemunhas provaram isto, ou nada disseram contra este grande revolucionario. Se as minhas contas com Deus estivessem tão justas como estão com os homens ia eu bem para o outro mundo.

Por esta occasião pedirei aos meus amigos, que de certo entre os principaes conto o nobre deputado o sr. João de Mello que muito prezo, e que sempre se tem prestado a ouvir-me e a aconselhar-me em muitas questões, para que se não opponham a esse requerimento em que solicito esses documentos, que é uma certidão de folha corrida da minha vida publica; não peço da minha vida particular, porque tendo muitas manchas enojaria os meus collegas, vendo o grande numero das minhas faltas e defeitos.

Mando tambem para a mesa um requerimento da camara municipal de Villa Nova de Famalicão, em que pede a reforma da lei do recrutamento. Eu não preciso dizer nada porque as minhas opiniões são conhecidas n'esta questão. A camara municipal de Villa Nova de Famalicão pede que se approva um projecto de lei, que foi apresentado a esta camara na sessão passada, para a reforma da lei de recrutamento. Expõe as rasões em que se funda, e se forem justas, espero que sejam tomadas em consideração pela camara dos senhores deputados.

Mando mais outro requerimento para a mesa, pedindo varios esclarecimentos com que eu possa provar a vantagem e economia da publicidade das nossas sessões serem inseridas no corpo do Diario de Lisboa, como tão convenientemente se tem feito durante o mez de fevereiro que acaba de findar.

Tambem pedirei a V. ex.ª o favor de fazer discutir os pareceres não numerados que estavam impressos no antigo Diario da Camara, e que hoje estão impressos no Diario de Lisboa, sobre alguns requerimentos de particulares que têem documentos captivos n'esta casa e de que querem fazer uso logo que sejam discutidos os seus pareceres. Peço a V. ex.ª que sejam dados para a discussão na primeira parte da ordem do dia logo que seja possivel.

Pediria tambem ao meu nobre amigo, o sr. ministro da justiça, mas de certo não é pela repartição a seu cargo que corre este negocio, mas pelo ministerio do reino, que se ordene aos governadores civis façam publicar por editaes quando estiverem promptos os livros o todas as mais disposições precisas para o registo vincular, porque ha muitas pessoas que não estão ao facto da lei, que estão longe e que podem soffrer nos seus interesses. Já lá vão dois mezes, e ainda os governadores civis não estão habilitados com os livros de registo que são indispensaveis. Pediria portanto de novo, aos srs. ministros queiram promptificar-se a que de prompto se destine um dia para a discussão da portaria de 5 do corrente que trata das irmãs da caridade, e que eu V entendo em minha consciencia ter sido um acto arbitrario e illegal pelos seus fundamentos.

O sr. Mello Soares: — Eu sinto que o meu illustre amigo, o sr. D. Rodrigo, que acabou de fallar, se impressionasse, quando pedi a palavra para um requerimento, suppondo que com elle queria contrariar as intenções de s. ex.ª Longe e muito longe estou d'isso. Quando mesmo não reconhecesse, como sempre reconheço, que as intenções de s. ex.ª são nobres e justas, então remetter-me-ía ao silencio, para não contrariar a vontade do meu illustre amigo, salvo se as suas indicações podessem envolver algum desaire para a camara.

Tendo dado esta explicação, cumpre-me agradecer as expressões de benevolencia que s. ex.ª me dirigiu, que eu não mereço e que são filhas do seu caracter.

O meu requerimento dirige-se a um fim que, longe de contrariar um dos pedidos que s. ex.ª fez, ha de facilitar o seu andamento. Refiro-me ao assumpto da portaria que ha tres dias foi publicada no Diario de Lisboa, em relação ás irmãs da caridade.

A camara sabe, o paiz e todos — que o objecto é importantissimo, e sobre o qual não deve haver uma resolução precipitada (apoiados) para não prejudicar alguem. Por isso é preciso que tratemos de examinar todos os documentos: é preciso proceder com regularidade e prudencia; e parece-me que chegaremos melhor ao nosso fim nomeando-se uma commissão especial que trate de examinar todos os documentos que foram enviados para a mesa; e que se esta commissão entender, como o nobre deputado entende, que falta algum documento importante, que o reclame, e que esse negocio se trate; isto é, que dê o seu parecer sobre os documentos. Parece-me que d'este modo trataremos do negocio com a circumspecção que elle pede, e que se fará justiça mais completa depois da commissão dar o seu parecer, que servirá de base á discussão.

Proponho pois que se nomeie uma commissão especial, pela camara ou pela mesa, se a camara assim o entender, para tratar d'este assumpto, e dar sobre elle o seu parecer, a fim de servir de base á discussão, para se tomar uma resolução justa e conveniente em objecto de tanta monta.

O sr. Presidente: — Queira mandar a sua proposta para a mesa.

O sr. Ministro da Justiça (Moraes Carvalho): — Sr. presidente, a primeira ponderação que fez o meu nobre amigo, o sr. D. Rodrigo, diz respeito a uma escola para educação de creanças desvalidas, que occupa uma parte do convento de Santa Martha, e queria s. ex.ª saber se a portaria quando manda encorporar os bens das irmãs da caridade, como congregação, nos bens nacionaes podia comprehender os bens daquelle estabelecimento.

A portaria é explicita, restringindo-se unicamente aos bens da congregação, como congregação, e não póde comprehender os bens dos individuos que não pertencem á congregação, nem mesmo os bens particulares dos membros d'esta. A segunda ponderação de s. ex.ª foi para que o sr. ministro do reino desse pressa a decidir um negocio da camara de Villa Nova de Famalicão para uma expropriação; nada sei a este respeito; não é negocio da minha repartição; mas tomei nota para dar parte ao meu collega.

Notou s. ex.ª tambem, que nos documentos apresentados não se encontrasse o officio que eu tinha dirigido ao em.mo patriarcha.

Julgo que s. ex.ª se quiz referir ao aviso de 3 de outubro do anno passado. É muito natural que na remessa dos documentos que o meu collega do reino enviou para a mesa possa faltar algum, porque tratando-se do satisfazer aos desejos d'esta camara com brevidade, e que foram tambem os desejos da outra camara, foi preciso que n'aquelle dia houvesse um trabalho immenso com a copia dos documentos, e isso deu causa a que hontem se notasse que os documentos não estivessem ainda na mesa quando se abriu a sessão; mas persuado-me que o illustre deputado fará justiça ás intenções do governo, pois ainda que não viesse esse documento, comtudo elle foi publicado no Diario do Governo, e por toda a imprensa; e por esta occasião direi a s. ex.ª, sobre uma reflexão que apresentou, de que effectivamente não vinha eu assignado na' portaria de 5 de março, entretanto que o aviso do anno passado tinha sido expedido e por mim assignado — que a rasão é porque as portarias são assignadas pelo ministro da repartição competente, os decretos é que ás vezes são assignados por varios ministros; o aviso pois foi expedido por mim, sem a assignatura do sr. marquez de Loulé, assim como esta portaria foi assignada pelo sr. marquez de Loulé, e sem a minha assignatura, porque era um objecto que não dizia respeito á minha repartição. Mostrou s. ex.ª desejos de se designar um dia para esta discussão: o governo está prompto, logo que a mesa o designe, ou os srs. deputados o decidam, mas parece me que este desejo do illustre deputado fica um pouco prejudicado pela proposta do sr. Mello Soares, no caso de ser approvada (apoiados).

Fallou s. ex.ª n'um processo das Marnotas; n'esta epocha penso que não estava eu no reino. (O sr. D. Rodrigo de Menezes: — Foi em 1836.) Exactamente, estava eu ausente da patria, onde me tinha levado a emigração; eu, respeitando o sentimento de delicadeza e de pundonor do illustre deputado, parece-me que pratica um acto desnecessario, porque todos reconhecem o caracter de s. ex.ª; repito, é um acto de nimia delicadeza, de nimia susceptibilidade da parte de s. ex.ª, mas acto que eu julgo superfluo (apoiados).

Fallou s. ex.ª a respeito dos livros dos governos civis para o registo de todas as instituições vinculares.

O projecto inicial da nova lei de vinculos dizia = que os dois annos deviam correr desde a data d'aquella lei =, e eu me applaudo por ter feito introduzir a disposição de que os dois annos só correriam da publicação do decreto regulamentar.

Depois das ponderações do sr. D. Rodrigo veiu o requerimento do sr. Mello Soares, para se nomear uma commissão, mas a esse respeito não tenho nada a dizer; o governo não considera haver censura na nomeação da commissão, delibere a camara como julgar conveniente. Não sei se satisfiz aos desejos do illustre deputado, mas se for preciso darei mais explicações.

Leu-se na mesa a seguinte

PROPOSTA

Proponho que se eleja uma commissão especial para com urgencia dar o seu parecer sobre os documentos já publicados no Diario de Lisboa, com relação á portaria de 5 do corrente, relativa ao assumpto das irmãs da caridade; podendo a mesma commissão exigir do governo qualquer outro documento, que porventura não fosse enviado á camara, ou não fosse publicado no referido Diario. = Mello Soares.

Foi admittida á discussão.

O sr. D. Rodrigo de Menezes: — Sr. presidente, eu sei que não devia impugnar a proposta do meu illustre amigo, e só explicarei a resistencia que lhe faço pela posição singular e especial em que me acho, e aliás bem conhecida de alguns dos meus collegas.

Se considerássemos a proposta do illustre deputado pelo lado politico, ella tinha de certo a significação que me não parece que fosse a mais lisonjeira para o governo; pois a camara nomeando a commissão avoca a si este negocio.

Um negocio d'esta ordem, que está aliás bem claro, e que todos os documentos precisos para uma discussão estão impressos com muita lealdade da parte do governo, nada mais resta senão discuti-lo.

Parece-me, digo, que elegendo a camara uma commissão, de alguma sorte colloca o governo n'uma posição menos favoravel do que aquella que eu proponho, sem comtudo ter intenção com isto de alliviar a ss. ex.as Entendo que esta portaria não póde existir n'um paiz constitucional por muito tempo sem haver uma resolução da camara que approve a theoria n'ella apresentada pelo governo, ou que declare a este que se excedeu, e que a portaria caía em todas as suas consequencias. Isto é de absoluta necessidade, mas absoluta necessidade de prompto, sem demora.

Eu concebo a nomeação de uma commissão como um acto de adiamento, que não condiz nem com esta camara nem com os ministros. Ou é um adiamento, e parece que é querer-se acudir ao governo; ou não é um adiamento, e é querer-se buscar um maior argumento para atacar este acto que o governo praticou, e de que a camara quer tomar conhecimento immediato pela sua commissão.

Eu poderia apresentar mais argumentos, mas apresento os que tenho; e cada um que dá o que tem, não é obrigado a mais.

Só n'um caso approvaria a nomeação de uma commissão para apreciar este negocio, isto é, ficando suspensa a execução da portaria até que esta camara resolvesse sobre a sua legalidade. Se convêm n'isto, voto pela nomeação da commissão, mas de outro modo não posso votar pela proposta do illustre deputado, porque ella traz o adiamento inconveniente para esta questão.

Todos os documentos precisos estão impressos, o governo não tem outros. A portaria mesmo em que eu fallei é uma portaria muito simples, segundo creio, dirigida ao sr. patriarcha, que manda retirar uma licença que estava concedida. O sr. patriarcha remetteu a copia d'essa portaria a uma superiora das irmãs da caridade que existiu em 1837, e que já deixou de existir por uma licença que deram aquella corporação para estabelecer uma nova fórma de governo interno da instituição. Eu precisava d'essa portaria para a apresentar como argumento na discussão, mas prescindo d'ella, porque o argumento está sempre em pé. Tenho o officio do sr. patriarcha que diz que existe a portaria, e não preciso de mais para a discussão. Poderia pedir muitas outras portarias e ficar tres dias a pedir portarias. Podia pedir uma, ou um decreto de 1845 que auctorisa no Porto a creação de irmãs da caridade indeterminadamente, ouvindo o procurador geral da corôa e o bispo diocesano. Podia pedir muitas mais cousas, mas assento que com isso não faria se não embaraçar e demorar o negocio, que é necessario que se decida para socego e governo de todos. Voto contra a nomeação da commissão. Peço a V. ex.ª que designe dia para a discussão d'este negocio, e no caso de se votar, a nomeação da commissão, hei de propôr que a portaria fique suspensa nos seus effeitos até que esta camara dê o seu voto a respeito d'esta questão.

O sr. Mello Soares: — Se a camara está instruida plenamente do negocio que tem a examinar; se pelos documentos póde formar um juizo seguro, a commissão é desnecessaria; mas eu entendo que não. A legislação sabe toda a camara qual é; mas a applicação da legislação ao facto, ao proceder do governo e em relação ao assumpto, é um negocio complicado que demanda um estudo serio o que não deve ser resolvido de salto (apoiados). Repito: se a camara entende que está plenamente instruida, que póde resolver o negocio com conhecimento do causa, eu retirarei o meu requerimento; mas eu entendo que a camara nomeando uma commissão não faz mais do que dar um passo de prudencia — direi mais, de necessidade e de conveniencia para o assumpto.

O illustre deputado, que combateu o requerimento, parece que o combateu de modo que affirmou e negou; peço perdão para lh'o dizer.

A primeira idéa que suscitou a s. ex.ª o meu requerimento foi = que eu olhando o requerimento pela parte politica, devia considerar que ia atacar o governo =. Ora é necessario que eu diga com franqueza, que o governo para mim é uma entidade indifferente em relação ao assumpto; elle é de tal maneira importante, que considero o governo como agente n'um negocio que eu hei de examinar sem relação a pessoas e só com relação á legalidade o á importancia do objecto. Mas a minha intenção já se vê que não é, nem tambem é a da camara, incriminar o governo sem rasão. Se a camara achar que o governo andou bem, ella ha de ser unanime em approvar o seu proceder; se achar que obrou mal, creio que tambem será unanime em o condemnar; pelo menos é o que é justo. O que não posso combinar é como o illustre deputado entende que o meu requerimento faz mais desfavor ao governo do que a proposta de s. ex.ª; não sei por que.

S. ex.ª tendo tomado parte n'este debate, sendo, para assim dizer, um dos encetadores d'elle, parece que está insoffrido, e quer que o negocio progrida. Diz s. ex.ª = que a portaria é de tal natureza que não póde existir por muito tempo num paiz civilisado =. Se ella for d'essa natureza não receie o illustre deputado que a commissão vote por ella, e menos receio deve ter de que a camara approve um parecer d'essa commissão sustentando essa portaria.

Agora emquanto a s. ex.ª considerar que o adiamento não póde ter fim, peço a s. ex.ª que leia a expressão ou o epitheto com que eu alcunhei, pode-se dizer, ou com que adjectivei o pedido, para que com urgencia a commissão dê o seu parecer. Ora, já se vê que quem pede que uma commissão, que ha de ser eleita pela camara, dê o seu parecer com urgencia, não póde ter em vista que ella o demore.

Ha de mais a mais outra rasão de utilidade. A proposta do illustre deputado para que se convide o governo, para se declarar por prompto a responder á interpellação, não preenche o fim que eu desejo, porque n'esta interpellação, se se seguirem as regras regimentaes, o que acontece é — que o sr. Mousinho, que é o interpellante, faz a sua interpellação, e o governo responde; mas n'este assumpto não podemos deixar de generalisar a discussão a toda a camara. Portanto não se prejudica em nada o assumpto, e por isso insto pela nomeação da commissão.

Eu não devo por emquanto aventar idéa nenhuma, nem