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CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

SESSÃO DE 10 DE MARÇO DE 1865

PRESIDENCIA DO SR. CESARIO AUGUSTO DE AZEVEDO PEREIRA

Secretarios os srs.

Joaquim Xavier Pinto da Silva

José de Menezes Toste

Chamada: — Presentes 78 srs. deputados.

Presentes á abertura da sessão — os srs. Adriano Pequito, Garcia de Lima, Annibal, Abilio, Soares de Moraes, Quaresma, Gomes Brandão, Barros e Sá, Pinto Ferreira, Lemos e Napoles, Magalhães Aguiar, Faria Barbosa, Barjona, Barão do Rio Zezere, Albuquerque e, Amaral, B. F. Abranches, Poppe, Carolino, Cesario, Claudio, Custodio Freire, D. de Barros, Eduardo Cabral, Quental, Diogo de Sá, F. I. Lopes, Soares do Freitas, Cadabal, Valladares, Medeiros, Sant'Anna, Abreu e Lima, Alves dos Reis, J. A. de Carvalho, J. A. de Sousa, Ferrão, Pereira de Mello, Mendonça Castello Branco, Silva Loureiro, Sepulveda Teixeira, Soares de Sousa, Calça e Pina, Rodrigues Camara, Noutel, J. Pinto de Magalhães, Pinto da Silva, J. A. Maia, Vieira de Castro, Infante Passanha, Ferraz, Carvalho Falcão, Homem de Gouveia, Alves Chaves, Fernandes Vaz, Costa e Silva, José Maria Frazão, Alvares da Guerra, Menezes Toste, José de Moraes, Gonçalves Correia, Oliveira Baptista, Tiberio, Julião Mascarenhas, J. do Carvalhal, Levy, Sá Coutinho, Alves do Rio, Souto Maior, Sousa Junior, Leite Ribeiro, Lavado de Brito, Tenreiro, Miguel Osorio, Pedro Castello Branco, Placido, R. Gama, Ricardo Guimarães, Carvalho e Lima, Pizarro, Visconde de Lagoaça e Visconde dos Olivaes.

Entraram durante a sessão — os srs. Braamcamp, Antonio Augusto, Almeida Carvalho, Gonçalves de Freitas, Seixas, A. J. Pinto de Magalhães, Fontes, Antonio Pequito, Antonio de Serpa, Belchior Garcez, Caetano Garcez, Carlos Bento, Delphim, Silva e Cunha, F. J. Vieira, Bivar, Coelho do Amaral, Costa e Silva, Lampreia, Bicudo Correia, F. M. da Cunha, Gaspar Pereira, Carvalho e Abreu, G. de Barros, Blanc, Gomes de Castro, Santos e Silva, J. A. Sepulveda, João Chrysostomo, Costa Xavier, Fonseca Coutinho, Barros e Cunha, Alcantara, Aragão Mascarenhas, Tavares de Almeida, Albuquerque Caldeira, Coelho de Carvalho, Matos Correia, Proença Vieira, Thomás Lobo d'Avila, J. A. Gama, Barbosa e Silva, Sette, Luciano de Castro, Casal Ribeiro, J. M. Lobo d'Avila, Sieuve, Barros e Lima, Magalhães Mexia, Mendes Leal, Amaral Carvalho, Mendes Leite, Marquez de Monfalim, Severo, R. Lobo d'Avila e Visconde de Pindella.

Não compareceram — os srs. Affonso Botelho, Vidal, A. C. da Maia, Pinto de Albuquerque, Freitas Soares, Pinto Coelho, Fortunato de Mello, Gavicho, Silveira da Mota, Ayres de Campos, Vieira Lisboa, Torres e Almeida, Correia de Oliveira, Garrido, D. José de Alarcão, Rojão, Freitas Branco, Rocha Peixoto, Sousa Feio, Thomás Ribeiro e Teixeira Pinto.

Abertura: — Áo meio dia e tres quartos.

Acta: — Approvada.

EXPEDIENTE

1.° Um officio do ministerio da guerra, dando os esclarecimentos pedidos pela commissão de guerra ácerca dos abonos que tem o segundo sargento do 1.° batalhão de veteranos, Francisco José Pires. — A commissão de guerra.

2.° Do ministerio da marinha, acompanhando cento e cincoenta exemplares das contas da gerencia d'este ministerio relativas ao anno de 1863-1864, e as do exercicio de 1862-1863. — Mandaram-se distribuir.

3.° Da junta do credito publico, acompanhando cento e cincoenta exemplares da conta da sua gerencia no anno de 1863-1864. — Idem.

4.° Da associação commercial do Porto, acompanhando cento e cincoenta exemplares do relatorio dos seus trabalhos no anno findo. — Idem.

5.° Uma representação dos empregados do governo civil do districto de Bragança, pedindo augmento de vencimento e o beneficio da reforma. — A commissão de administração publica, ouvida a de fazenda.

6.° Dos empregados das repartições civis do arsenal do exercito, pedindo que lhes sejam applicaveis, as disposições do projecto de lei do sr. Alcantara. — A commissão de guerra.

7.° Da irmandade de Nossa Senhora Dourada, da freguezia do Pinheiro, no concelho da Vieira, contra o projecto da desamortisação. — A commissão de fazenda.

8.° Trinta e sete requerimentos de officiaes do exercito, pedindo a approvação do projecto de lei apresentado pelo sr. Alcantara. — A commissão de guerra.

9.° Da direcção da companhia união mercantil, pedindo ser indemnisada dos prejuizos que soffreu com o decreto da sua dissolução. — A commissão de fazenda, ouvida a de obras publicas.

EXPEDIENTE A QUE SE DEU DESTINO PELA MESA NOTAS DE INTERPELLAÇÃO

1.ª Pretendo interpellar a s. ex.ª, o sr. ministro do reino, sobre a portaria de 20 de fevereiro ultimo, pela qual se ordenou á camara municipal de Setubal substituisse o antigo imposto indirecto sobre cereaes pelo directo sobre a propriedade, reservando-se o governo o direito de decretar este

Imposto, quando aquella camara o não votasse. = O deputado, Annibal Alvares da Silva.

2.ª Desejo interpellar a s. ex.ª, o sr. ministro dos negocios da marinha e ultramar, ácerca das providencias que pelo respectivo governador e pelo governo foram adoptadas por occasião do flagello das bexigas que ultimamente houve na provincia de S. Thomé e Principe. = Bernardo Francisco de Abranches.

3.ª Desejo igualmente interpellar a s. ex.ª, o sr. ministro dos negocios da marinha e ultramar, sobre se é ou não verdade ter o governador de S. Thomé prohibido que da botica do estado se vendessem os medicamentos, sem embargo de serem requisitados por meio de receitas. = Bernardo Francisco de Abranches.

4.ª Desejo interpellar o sr. ministro dos negocios da marinha e ultramar:

I Sobre se é, ou não, exacto ter o actual governador de S. Thomé maltratado com bengaladas os guardas de policia d'aquella ilha, a ponto da bengala quebrar;

II Sobre se é, ou não, exacto ter o mesmo governador, arbitrariamente, mandado prender alguns carpinteiros indigenas, e assentar-lhes praça com o fim de obter d'esta maneira alguma economia nas obras de um barracão, por elle mandado construir. — Bernardo Francisco de Abranches.

Mandaram-se fazer as communicações respectivas.

REQUERIMENTOS

1.° Requeiro que, pelo ministerio do reino, seja remettida a esta camara uma relação nominal de todos os devedores que se têem negado a pagar á misericordia de Torres Vedras os capitães que tomaram a juro; as circumstancias em que tomaram esses capitães; desde quando deixaram de pagar os juros, e todos os documentos que provem as diligencias que as administrações da misericordia têem feito para as cobrar; bom assim os motivos porque esses devedores se têem recusado a paga-los. =Barros e Cunha.

2.° Requeiro que, pelo ministerio da justiça, sejam enviadas, com a maior brevidade, a esta camara todas as informações, officios e relatorios que tenham sido dirigidos á presidencia da relação de Lisboa, pelos magistrados judiciaes de Torres Vedras, sobre a sedição que ali teve logar na noite de 26 de fevereiro. — Barros e Cunha.

3.° Requeiro que, pelo ministerio da justiça, sejam requisitados a s. em.ª, o sr. cardeal patriarcha, os officios o relatorios que lhe tenham sido dirigidos pelo reverendo vigario da vara, e parochos de Torres Vedras, ácerca dos acontecimentos que ali tiveram logar na noite de 26 de fevereiro, a fim de serem enviados a esta camara com a maior brevidade. =Barros e Cunha.

4.° Requeiro que, pelo ministerio da justiça, seja requisitada a s. em.ª, o sr. cardeal patriarcha, a denuncia que lhe foi feita contra o reverendo padre José do Rosario Nunes da Paz, da freguezia de S. Pedro de Dois Portos, de Torres Vedras, o inquerito a que s. em.ª mandou proceder, e que todos estes documentos sejam remettidos a esta camara com a maior brevidade. = Barros e Cunha.

5.° Requeiro que, pelo ministerio da justiça, sejam enviados a esta camara todos os officios, relatorios e informações que o procurador regio tenha recebido do delegado da comarca de Torres Vedras, sobre a revolta e sedição que ali teve logar na noite do dia 26 de fevereiro. = Barros e Cunha.

6.° Requeiro que, pelo ministerio do reino, sejam mandados a esta camara todos os officios e relatorios que o governo tenha recebido das auctoridades administrativas de Torres Vedras, bem como os inqueritos officiaes a que se proceder ácerca da sedição que ali teve logar na noite de 26 de fevereiro. = Barros e Cunha.

7.° Requeiro que, pelo ministerio do reino, se peça ao governo queira remetter a esta camara, com a maior urgencia, o seguinte:

I Copia da acta da sessão da camara e conselho municipal de Setubal, em que se dão as rasões pelas quaes não podiam aquellas corporações municipaes fazer a substituição do tributo indirecto sobre o consumo de cereaes, pelo directo sobre a propriedade;

II Copia da consulta do conselho d'estado sobre este mesmo assumpto;

III Copia do parecer do ajudante do procurador geral da corôa, relativo a este mesmo objecto;

IV Copia de quaesquer representações, que tenham subido ao governo, dos povos do concelho de Setubal, ou da respectiva camara municipal, a favor ou contra a substituição do imposto indirecto pelo directo.

Sala das sessões, em 10 de fevereiro de 1865. = Annibal Alvares da Silva.

8.° Requeiro, pela secretaria d'estado dos negocios da guerra, seja remettida com t urgencia a esta camara uma nota:

I De quanto augmentaria a verba de despeza d'aquelle ministerio com os novos soldos que propõe no seu projecto de lei o illustre deputado o sr. Alcantara;

II Qual o numero de officiaes que se acham em activo serviço, com designação dos seus postos, e quanto importa a totalidade dos seus soldos e mais gratificações;

III Qual o numero de officiaes em disponibilidade, com a designação das patentes, e importancia total dos soldos;

IV Qual o numero de officiaes aposentados, com a designação das patentes e importancia total dos soldos;

V Finalmente qual a proporção que ao presente se dá entre o numero total dos officiaes de todo o exercito portuguez comparado com as praças de pret em serviço.

Sala das sessões, 7 de março de 1865. = Henrique Ferreira de Paula Medeiros.

9.° Requeiro que o governo, pelo ministerio dos negocios da marinha e ultramar, haja de enviar a esta camara a relação do numero dos individuos fallecidos em cada uma das

Ilhas de S. Thomé e Principe, em consequencia das bexigas que ultimamente houve n'aquellas ilhas. = Bernardo Francisco de Abranches.

Foram remettidos ao governo.

SEGUNDAS LEITURAS PROJECTO DE LEI

Senhores. — Estão felizmente terminadas ha muito as nossas dissensões politicas, graças á tolerancia dos governos que têem gerido os negocios do estado desde 1851. Tem-se attendido a quasi todos aquelles que foram prejudicados pelos acontecimentos politicos de 1846 a 1850, já reintegrando os empregados nos logares de que haviam sido demittidos, já considerando os militares que tinham sido excluidos das fileiras do exercito por haverem seguido o governo da junta do Porto, e finalmente attendendo ás justas reclamações que a esses governos se fizeram.

Uma revolução tão espontanea como foi a que representou a junta do Porto, a cujo chamamento respondeu quasi todo o paiz, obrigou o governo da mesma junta a despezas muito extraordinarias e avultadas, como foram aquellas que tiveram por fim equipar e sustentar o numeroso exercito, que a junta do reino occupou em defeza das liberdades do paiz.

Não foram porém sufficientes os recursos que a nação forneceu á junta, para esta occorrer a encargos de tamanha consideração, não obstante a estricta economia que se observava, como é notorio, em todas as repartições a cargo dos cavalheiros que compunham a mesma junta; e por isso o seu governo teve de recorrer a meios extraordinarios, servindo-se não só dos fundos que encontrou nos cofres do estado, n'aquellas terras occupadas pelas suas forças, mas ainda recorrendo a emprestimos forçados, para haver sommas que á habilitassem a satisfazer as necessidades do serviço.

Terminada a luta pela convenção de Gramido, foram obrigados os contadores de fazenda e outros empregados responsaveis a prestar contas da sua responsabilidade.

Sei porém que o tribunal de contas se negou a abonar as quantias que esses funccionarios tinham sido compellidos a entregar ás forças da junta, porque não tem lei que auctorise o abono; e que sendo taes quantias relaxadas ao contencioso, estão aquelles funccionarios, ou seus herdeiros, sendo obrigados pelos respectivos bens ao pagamento de importancias que não gastaram.

Tão grande vexame é preciso que a vossa illustração e recta justiça faça terminar.

Não sou da opinião d'aquelles que dizem que = quem emprestou á junta emprestou a um governo illegitimo, e que por essa rasão taes sommas não devem ser pagas pelo thesouro =; e não sou d'essa opinião, porque considero que o governo legitimo é aquelle onde reside a maioria da nação, e ninguem ousaria contestar que ao serviço da nobre causa da junta do. Porto estiveram tres quartas partes da população dó paiz; quanto mais que algumas quantias foram tiradas por emprestimo forçado, como aconteceu a respeito das do banco commercial do Porto, e das da contadoria de fazenda no districto de Faro, e de outras. Cumpre pois, e é de justiça, que presteis a devida attenção para as sommas que entregou por emprestimo forçado feito á junta o dito banco commercial do Porto. Este estabelecimento não deu voluntariamente as sommas que lhe pediram; foi como fica exposto, forçado a faze-lo, e similhantes fundos empregaram-se na sustentação de portuguezes, que tinham direito a este nome, pois que pugnavam pela liberdade do seu paiz.

E preciso que a lei seja igual para todos, e se aos funccionarios publicos se attendeu, e tambem aos militares, não é menos justo que se attenda aquelles que, tendo seguido a vida do commercio, na qual poderam adquirir pelo seu trabalho, fadigas e muitas angustias alguns centos de mil réis com que no ultimo quartel da vida estivessem a coberto da miseria, os tinham ido entregar á sombra da lei do reino, que garante a propriedade a um estabelecimento que, gerindo em commum essas economias, lhes assegurasse assim os meios de subsistencia, no que tambem prestaram ao seu paiz o serviço que de similhantes instituições tira o mesmo commercio, a industria e a agricultura; de que todos nós, senhores, podemos dar testemunho.

Tirar pois por emprestimo forçado, ainda que para um fim tão justo como foi aquelle de que se trata, sustentação das liberdades publicas, é o mesmo que quebrar a ferramenta do operario, que com ella ganha os meios da sua sustentação; tal é privar o homem, que negoceia, dos fundos do seu commercio, porque o inhabilita de continuar as suas operações commerciaes, que equivale a reduzi-lo á miseria. E não se diga que ao banco não fazem falta os réis 67:855000 que elle entregou á junta, é um erro; facilmente se comprehende que aquella importancia estaria hoje duplicada, que as circumstancias d'aquelle estabelecimento seriam hoje mais favoraveis, e que seus accionistas teriam mais bem garantida a sua propriedade, a qual é tambem de portuguezes, que têem direito á consideração dos poderes do estado.

E pois conveniente, senhores, que acabem por uma vez todos os vestigios das nossas discordias civis, e que, applicando-se justiça com a igualdade a que todos têem direito, se faça desapparecer do activo do banco commercial a verba que figura no seu balanço, e que tem este rotulo de tanto descredito e vergonha para o nosso paiz = emprestimo forçado a junta do Porto em 1847 =; rotulo que é officialmente repetido todos os mezes por ordem do ministerio das obras publicas, sendo para notar que se dá como existente aquillo que não existe, e que o governo tolera, porque sabe que o paiz deve esta somma, que o banco considera existente nas suas caixas.

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Á vossa illustração pois cumpre fazer justiça aos que têem inquestionavel direito a ella.

São estas as rasões que me levaram a propor á vossa consideração o seguinte projecto:

Artigo 1.° É o governo auctorisado a abonar aos contadores de fazenda dos districtos do reino, ou a seus herdeiros, bem como a outros quaesquer empregados responsaveis, as quantias que provarem, por documentos authenticos, haver entregado á junta do Porto ou a seus delegados, durante os acontecimentos politicos de 1846 a 1849.

Ar. 2.° Pela mesma fórma é o governo auctorisado a pagar ao banco commercial do Porto a quantia de 67:855$000 réis do emprestimo forçado que este estabelecimento fez á junta do Porto; fazendo inserir no orçamento do estado, em todos os annos economicos futuros, uma verba de 10:000$000 réis até ao integral pagamento da mencionada quantia.

Art. 3.° É igualmente auctorisado o governo a pagar a qualquer outro estabelecimento a quantia que provar ter entregado por emprestimo forçado á junta do Porto; devendo inserir no orçamento do estado, em todos os annos, uma somma não inferior a 15 por cento da quantia ou quantias assim emprestadas, até que fiquem completamente solvidos.

Art. 4.° Fica revogada toda a legislação em contrario. Camara dos senhores deputados, em 9 de março de 1865. = O deputado por Loulé, João Antonio de Sousa. Foi admittido e enviado á commissão de fazenda.

PROJECTO DE LEI

Senhores. — A camara municipal da villa da Lagoa, da ilha de S. Miguel, dirigiu ao parlamento uma representação, que foi apresentada n'esta casa, na sessão de 26 de março de 1860, pedindo a concessão do convento e cerca annexa dos extinctos frades de S. Francisco d'aquella villa, a fim de construir ali uma sala propria para as suas sessões, e os quartos indispensaveis para o archivo e mais objectos a cargo da mesma camara.

Este pedido foi feito por fórma que a parte restante d'aquelle convento possa continuar a servir, como desde alguns annos tem servido, para as repartições judiciarias, administrativas e de fazenda, mas por um modo mais conveniente e regular, no interesse publico do municipio, do concelho e do julgado, que têem a sua sede n'aquella villa.

As ponderosas rasões em que se funda este pedido acham-se expendidas n'aquella representação; e, sendo manifesta a sua utilidade e justiça, por isso proponho o seguinte projecto de lei: I

Artigo 1.° É concedido á camara municipal da villa da Lagoa o convento e a cerca annexa dos extinctos franciscanos da mesma villa, a fim de construir a sala para as suas sessões, e os quartos necessarios para o archivo e mais repartições a seu cargo.

Art. 2.° As repartições judiciarias, administrativas e de fazenda continuarão a ser conservadas no referido convento pela fórma que for mais regular e conveniente, sem prejuizo da concessão feita por esta lei.

Art. 3.° N'esta concessão não se comprehende a igreja do dito convento, nem a sacristia e mais pertenças da mesma igreja.

Art. 4.° A concessão feita por esta lei ficará de nenhum effeito logo que o referido convento e suas pertenças deixem de ter a applicação para que são concedidos.

Sala da camara dos deputados, 8 de março de 1865. = O deputado, João José Silva Loureiro.

Foi admittido e enviado á commissão de fazenda.

PROJECTO DE LEI

Senhores. — A carta de lei de 30 de julho de 1860, determinando no artigo 2.°, n.° 2.°, quanto á contribuição pessoal, que a percentagem complementar, sobre o valor locativo das casas de habitação, sómente comprehende as que excederem a 20$000 réis de renda nas terras de primeira ordem, 15$000 réis nas de segunda, e descendo até á ultima ordem, estabeleceu uma medida de grande justiça; e a experiencia tem já demonstrado que este principio se deve applicar pelo modo possivel á contribuição predial, pelas rasões que passo a expor.

Tomando por base os dados estatisticos colhidos na repartição de fazenda de um districto que contém perto de 25:000 fogos, como contém o da cidade de Ponta Delgada, vê-se que a contribuição predial inferior a 200 réis apenas ali produz 495$525 réis, sendo lançada a 4:569 contribuintes, cujo rendimento não excede a 2$000 réis em predios inscriptos nas respectivas matrizes; e esta consideração bastaria para justificar a medida que proponho.

Acresce que, para se effectuar a cobrança d'esta pequena verba, não se pôde calcular em menos de 100$000 réis a importancia das despezas que se fazem em salarios dos informadores e louvados para avaliarem aquelles predios, bem como em gratificações e quotas aos empregados fiscaes, pelo serviço de lançamento e de arrecadação.

D'este modo vem o thesouro a receber sómente 395$525 réis pela contribuição predial inferior a 200 réis em um districto, que, como aquelle a que alludo, contém 7 concelhos, 41 freguezias, 24:508 fogos e 106:544 habitantes, vexando 4:569 contribuintes, os mais pobres; e pôde dizer-se que este minimo da contribuição predial não dá melhor resultado em algum dos outros districtos do reino e ilhas adjacentes, guardadas as devidas proporções.

Tomo como base para este minimo, cuja eliminação proponho, o valor do termo medio de um dia de trabalho; porque muitos dos contribuintes, que devem pagar quantias insignificantes até 200 réis, e que são os mais desgraçados, não podendo desviar-se das suas occupações para irem satisfazer; soffrem os vexames das execuções fiscaes, que algumas vezes se têem instaurado por 20 réis, com perda de tempo, e de despezas que duplicam os mesmos vexames.

Para evitar um trabalho inutil e estes vexames, sem alterar o actual systema de repartição, proponho que sejam excluidos das matrizes os predios cuja renda annual, na sua totalidade, com relação a cada contribuinte, for inferior a 2$000 réis.

Por este meio o thesouro não soffre desfalque algum; porque os contingentes de cada districto ficam sendo pagos pelos outros contribuintes que têem maior renda do que aquella, vindo os mesmos contingentes a recaír sobre o rendimento collectavel das matrizes em que já se deve achar excluido o que for de menos de 2$000 réis, e alem d'isto allivia-se a classe mais infeliz da sociedade, e economisa-se a despeza dos differentes processos da arrecadação; porque os referidos predios sómente deverão entrar nos respectivos arrolamentos, a fim de ser verificada aquella renda, pelos escrivães de fazenda, pelos meios competentes.

Por estes motivos proponho o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° Fica extincta a contribuição predial, inferior a 200 réis, no continente do reino e ilhas adjacentes.

§ unico. Para este effeito serão excluidos das respectivas matrizes os predios cuja renda annual, na sua totalidade, com relação a cada individuo, for inferior a 2$000 réis, sendo esta renda Verificada nos competentes arrolamentos pelos escrivães de fazenda.

Art. 2.° A isenção concedida por esta lei não altera o systema de repartição em vigor, e os contingentes de cada districto recairão sobre o rendimento collectavel das matrizes em que se achar excluido o que for de menos de réis 2#000.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario. Sala da camara dos deputados, 8 de março de 1865. = João José Silva Loureiro.

Foi admittido e enviado á commissão de fazenda.

PROPOSTA

Renovo a iniciativa do projecto de lei por mim apresentado, relativo á escripturação dos livros das arcas dos orphãos, e que se acha publicado no Diario de Lisboa n.° 76 de 8 de abril de 1863. = Bernardo Francisco de Abranches.

Foi admittida e enviada á commissão do ultramar. O sr. Presidente: — Vae dar-se conta de um officio do sr. presidente da camara dos dignos pares. Leu-se o seguinte

OFFICIO

Da camara dos dignos pares dirigido ao sr. presidente, em que, expondo a necessidade d'aquella camara celebrar as suas sessões em local mais vasto, para que o publico possa concorrer a ellas, pede que se lhe permitta celebrar as suas sessões na sala d'esta camara, depois das quatro horas da tarde, começando no proximo sabbado.

O sr. Presidente: — Antes de dar a palavra aos srs. deputados que a pediram sobre este officio, devo informar a camara de que recebi na quarta feira á noite um officio do sr. presidente da camara dos dignos pares, no qual dizia que = a mesma camara tinha deliberado ter sessão no dia seguinte, que foi hontem, e que a sessão tivesse logar n'esta casa =.

Não julgando dever dispor d'esta casa sem consultar a mesa, assim o participei logo ao sr. presidente da outra camara. Convoquei hontem pela manhã a mesa, e esta julgou não poder dispor-se da sala das sessões da camara dos senhores deputados, sem previo conhecimento da camara (apoiados), e n'este sentido fiz segundo officio ao sr. presidente da camara dos dignos pares.

O sr. Barros e Cunha: — Pedi a palavra para dizer a v. ex.ª que, pela minha parte, se v. ex.ª tivesse accedido á proposta e pedido que lhe foi feito pelo sr. presidente da camara dos dignos pares do reino, não tinha objecção alguma a fazer, porque entendo que devemos, tanto quanto nos for possivel, manter as melhores relações de camaradagem com o outro corpo legislativo; e entendo que v. ex.ª deve pedir á camara a auctorisação necessaria para que todas as vezes que v. ex.ª julgar que não ha incompatibilidade em prestar a sala para as sessões da camara dos dignos pares, V. ex.ª o possa fazer (apoiados). Era para isto que eu tinha pedido a palavra.

O sr. José de Moraes: — Pedi a palavra para dizer a v. ex.ª que estou completamente de accordo em que a sala das nossas sessões seja cedida á camara dos dignos pares do reino para celebrar as suas sessões. Não podemos deliberar outra cousa quando queremos, e o systema constitucional o exige, que haja a maior publicidade em todos os actos parlamentares. Por consequencia não posso deixar de dar o meu voto n'este sentido; mas como o illustre deputado diz que pôde haver alguma incompatibilidade n'esta cedencia, parece-me que não a pôde haver se os srs. deputados quizerem vir ao accordo de as nossas sessões começarem mais cedo. Pelo regimento deve abrir-se a sessão ás onze horas da manhã, e sem querer culpar ninguem...

O sr. Barros e Cunha: — Aceito a censura, se é dirigida a mim.

O Orador: — Não censuro ninguem; mas se v. ex.ª entende que lhe é applicavel, não tenho nada com isso. O que entendo é que era conveniente que as nossas sessões principiassem mais cedo; podia abrir-se a sessão ás onze horas e fechar-se ás tres; mas quando mesmo não se queira isso, não ha incompatibilidade alguma, porque ás quatro horas da tarde acaba a Sessão dos srs. deputados, e a outra camara tem esta sala livre. O meu voto é que se consulte a camara, para que as sessões da outra casa do parlamento possam já ámanhã ter aqui logar.

O sr. Presidente: — O officio, que acaba de ser lido, diz que = a primeira sessão d'aquella camara deve ter logar n'esta casa no dia de sabbado depois das quatro horas da tarde =.

Creio que n'isto não ha incompatibilidade alguma (apoiados), e por isso eu vou já fazer esta communicação, não só

com relação ao dia de sabbado, mas a todos os dias que a outra camara queira celebrar aqui as suas sessões depois das quatro horas da tarde (apoiados).

O sr. José de Moraes: — Mas não será necessario a votação da camara?

O sr. Presidente: — Não é necessario, porque a camara toda, mostra estar de accordo na cedencia da sala (apoiados).

O sr. Mártens Ferrão: — Abundo nas opiniões apresentadas pelo sr. José de Moraes, e pela minha parte julgava a v. ex.ª na ampla competencia de satisfazer ao pedido da outra camara. Foi um excesso de delicadeza de v. ex.ª para com esta camara o não querer tomar sobre si a responsabilidade de uma cousa que, na minha opinião, pertence a v. ex.ª como aquelle a quem incumbe tudo que tem relação com a gerencia d'esta casa. É claro que eu, entendendo que isto é um objecto de mera competencia de v. ex.ª, uno a minha opinião aquella que tem sido manifestada.

Entendo que n'esta casa do parlamento deve haver a maior confraternidade, urbanidade e cortezia com a outra casa do parlamento, porque os dois corpos colegislativos não se hostilisam, pelo contrario devem coadjuvar-se mutuamente, e formarem um só e um unico corpo, a que estão commettidas as altas funcções do estado. Concordo na concessão do pedido da camara dos dignos pares, porque effectivamente o local aonde estão fazendo as suas reuniões não se presta aos principios da publicidade, que é a alma do systema representativo.

Nada mais tenho a dizer; quiz só registar a minha opinião sobre este assumpto.

O sr. Presidente: — Vae ler-se um parecer da commissão de verificação de poderes, que na ultima sessão foi mandado para a mesa.

É o seguinte:

PARECER

A commissão de verificação de poderes foi remettido o diploma do sr. deputado eleito pelo circulo n.° 77, Rezende, e encontrou-o regular e de accordo com os documentos sobre que assentou a approvação da eleição respectiva pela junta preparatoria. É portanto de parecer a commissão, que seja proclamado deputado da nação, pelo referido circulo de Rezende, o sr. Manuel Pereira Dias, eleito pelo dito circulo.

Sala da commissão, 7 de março de 1865. = Antonio Egypcio Quaresma Lopes de Vasconcellos — Joaquim José de Sousa Torres e Almeida = Manuel Alves do Pio.

Foi logo approvado, e proclamado deputado o sr. Manuel Pereira Dias.

O sr. M. S. de Freitas: — Pedi a palavra para mandar para a mesa uma representação dos povos das freguezias que constituiam o antigo concelho do Vimieiro, que pela ultima divisão territorial ficou annexo ao concelho de Arraiollos,;do districto administrativo de Evora.

É uma representação assignada por 132 cidadãos dos mais importantes da localidade, pedindo o restabelecimento do referido concelho do Vimieiro. São justificadissimas as rasões do seu pedido; e eu rogo a v. ex.ª que tenha a bondade de lhe dar o devido seguimento, a fim de que a commissão ou commissões, que tiverem de ser ouvidas, dêem com a possivel urgencia o seu parecer a este respeito.

O sr. Presidente: — Vae passar-se á segunda parte da ordem do dia; mas os srs. deputados que tiverem representações ou requerimentos a mandar para a mesa, podem faze-lo.

O sr. Sant'Anna e Vasconcellos: — Mando para a mesa um requerimento do major reformado Joaquim Gonçalves de Sousa, hoje servindo em veteranos, pedindo que lhe seja extensivo, e a outros seus camaradas, o projecto de lei apresentado pelo sr. Alcantara.

Mando mais cinco requerimentos de outros officiaes de veteranos, fazendo o mesmo pedido.

O sr. Mártens Ferrão: — Mando para a mesa um requerimento.

O sr. Ministro da Justiça (Ayres de Gouveia): — Mando para a mesa a seguinte proposta (leu). Ficou para segunda leitura.

O sr. Faria Barbosa: — Mando para a mesa uma representação da camara municipal de Barcellos. Não sei se as commissões, a quem foi remettida a proposta de lei sobre a desamortisação, estão presentes. Comtudo direi que a representação dirige-se a pedir a liberdade da venda de fóros municipaes; isto, é, que não obriguem as camaras a vender os fóros por menos do que se poderá obter postos em praça.

Esta representação é digna de toda a consideração e de ser attendida, porqUe os melhoramentos que se apresentam no concelho de Barcellos são de grande vulto. É talvez a unica camara que tem feito uma estrada de dez a onze kilometros; um mercado que, no meu entender, é um dos melhores do reino; tem a casa da camara e o tribunal judiciario; alem de outros melhoramentos, como pontes, calçadas e fontes; pelo que não merece que lhe cortem os meios.

Mando tambem para a mesa uma representação da irmandade do Santissimo Sacramento da freguezia de Gondifellos, do mesmo concelho; outra do Santissimo Sacramento da freguezia de Fornellos, do mesmo concelho; outra da confraria do Santissimo Sacramento da freguezia de Pilhai, do mesmo concelho; outra da confraria do Santissimo Sacramento da freguezia de Alvellos, do mesmo concelho; e outra da confraria do Santissimo Sacramento da freguezia de Barcellinhos, sendo todas tendentes a pedir a mesma liberdade da venda e da applicação dos seus fundos.

SEGUNDA PARTE DA ORDEM DO DIA

CONTINUAÇÃO DO DEBATE SOBRE A ORGANISAÇÃO MINISTERIAL

O sr. Presidente: — Tem a palavra o sr. João Antonio de Sousa para um requerimento.

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O sr. J. A. de Sousa: — Peço a v. ex.ª que consulte a camara se & materia, que faz parte da segunda parte da ordem do dia, está suficientemente discutida.

O sr. Presidente: — Queira o sr. deputado mandar para a mesa a sua proposta.

O sr. Vieira de Castro: — Eu já tinha antehontem pedido a palavra para um requerimento.

(Diversos srs. deputados pedem a palavra.)

O sr. Presidente: — Peço aos srs. deputados que me deixem tomar sentido na ordem dos que pedem a palavra (apoiados).

O sr. Vieira de Castro, na sessão de antehontem, pediu a palavra para um requerimento, e eu não sabia se pertencia á primeira ou segunda parte da ordem do dia. Eu vou dar a palavra ao sr. Vieira de Castro para mandar o seu requerimento para a mesa; recommendando aos srs. Deputados que, quando tenham a fazer requerimentos, na conformidade do regimento, os leiam antes de usar da palavra (apoiados).

Tem a palavra o sr. Vieira de Castro.

O sr. Vieira de Castro: — O meu requerimento era para que v. ex.ª consultasse a camara, fiado na benevolencia com que me attendeu, se me permittia que eu desse uma explicação.

Vozes: — Isso é no fim.

O sr. Presidente: — Peço aos srs. deputados que não entrem nas attribuições da mesa, respondendo ao sr. Vieira de Castro.

O sr. Vieira de Castro: — O meu fim era unicamente tirar dos discursos anteriores o azedume que n'elles se podesse ver, e se a camara entender que me deve dar a palavra, tomar-lhe-hei muito pouco tempo.

O sr. Presidente: — Permitta-me a camara que lhe diga que, no fim de qualquer discussão, pedem a palavra para explicações os srs. deputados que assim o entendem, e que tenham usado d'ella durante a discussão; e para haver explicações é necessario que a camara o permitta, e para esse fim já estão inscriptos alguns srs. deputados.

O sr. J. A. de Sousa: — Mando para a mesa o seguinte

REQUERIMENTO

Requeiro que v. ex.ª consulte a camara se a materia, que faz objecto da segunda parte da ordem do dia, está sufficientemente discutida. = João Antonio de Sousa.

O sr. Fontes Pereira de Mello: — V. ex.ª dá-me licença que eu lhe dirija uma simples pergunta para minha instrucção?

O sr. Presidente: — Sim, senhor.

O sr. Fontes Pereira de Mello: — Pergunto a v. ex.ª se já se passou á segunda parte da ordem do dia. O sr. Presidente: — Sim, senhor.

O sr. Sant'Anna e Vasconcellos: — Peço a palavra para um requerimento.

O sr. Presidente: — Vae votar-se...

O sr. Sant'Anna e Vasconcellos: — V. ex.ª acaba de conceder a palavra ao sr. Fontes para uma simples pergunta, e eu espero de v. ex.ª igual procedimento para commigo.

O sr. Presidente: — O sr. deputado pediu a palavra para um requerimento, mas como transformou o seu requerimento em simples pergunta, tem a palavra.

O sr. Sant'Anna e Vasconcellos: — Peço a v. ex.ª que tenha a bondade de me dizer se algum sr. deputado já fallou sobre a materia.

Como é que se requer a materia discutida, quando nem só uma voz se levantou sobre a materia!

O sr. Presidente: — E necessário que eu falle claro aos srs. deputados.

Muitos srs. deputados têem pedido a palavra sobre a materia, transformando depois o sou pedido para sobre a ordem, e n'este caso está o sr. Antonio de Serpa; e depois de fallarem sobre a ordem, em logar de apresentarem moções, apresentam requerimentos. Esta é a verdade, é isto que se tem passado na discussão (apoiados).

Portanto vou pôr á votação o requerimento do sr. João Antonio de Sousa, o depois darei a palavra ao sr. Sant'Anna e Vasconcellos sobre o modo de propor.

O sr. Sant'Anna e Vasconcellos: — Sobre o modo de propor, depois da votação, não póde ser (apoiados).

O sr. Presidente: — Custa-me sempre conservar discussão entre a mesa e os srs. deputados, e por isso vou consultar a camara sobre se quer que dê a palavra ao sr. Sant'Anna e Vasconcellos.

O sr. Sant'Anna e Vasconcellos: — Isso nunca se fez n'esta casa, V. ex.ª não pôde deixar de me dar a palavra sobre o modo de propor.

O sr. Presidente: — Queira o sr. deputado dar-me attenção. Todos os meus esforços têem por fim conservar a ordem n'esta casa (apoiados). Não tenho outro intuito, e penso pois que não mereço censura de nenhum lado da camara (muitos apoiados).

Tem a palavra o sr: Coelho de Carvalho.

O sr. Coelho de Carvalho: — Antes de apresentar o meu requerimento sobre o modo de votar, precisava de que v. ex.ª mandasse ler na mesa a Inscripção sobre a materia que o illustre deputado por Loulé acaba de pedir que se julgue discutida.

O sr. Presidente: — Satisfazendo os desejos do sr. deputado, vou ler a inscripção sobre a materia e sobre a ordem (leu).

O sr. Coelho de Carvalho: — A vista de uma tão grande inscripção não posso votar que se julgue a materia discutida, e portanto peço a v. ex.ª que consulte a camara sobre se quer que haja votação nominal sobre o requerimento do sr. João Antonio de Sousa (apoiados):

O sr. Sant'Anna e Vasconcellos: — Não posso votar que se julgue a materia discutida, quando nem uma palavra se disse ainda sobre a materia.

O sr. Presidente: — O sr. deputado não se quer conformar com as observações da mesa...

O Orador: — Eu tenho a maior consideração pela pessoa de v. ex.ª, mas peço-lhe que me conceda uma pouca de indulgencia...

O sr. Presidente: — Eu não faço distincção entre nenhum sr. deputado.

O Orador: — Eu peço ao menos a liberdade da palavra; peço que se attenda ás circumstancias em que nos achámos; a crise continua, e continua temerosa (apoiados). Eu já disse n'este debate que não é só aqui dentro que se faz a opinião publica; já disse n'esta casa que a onda da opinião publica ameaça submergir todo este feixe de sophismas. E digo a verdade. Se me não querem acreditar leiam a imprensa inteira da capital e das provincias; percorram as ruas e as praças; vão escutar as queixas e os clamores populares a todos os pontos de reunião.

Dizia eu, sr. presidente, que não se tendo ainda ouvido uma só voz sobre a materia, ter a soffreguidão que tem o illustre deputado de pedir que se julgue a materia discutida, é o maior escarneo de todos os principios constitucionaes.

O sr. Presidente: — Eu lembro ao sr. deputado que está fallando sobre o modo de propor e não sobre a materia.

O Orador: — Deixem-nos ao menos fallar; concedam-nos esta valvula, se não querem que nos asphyxie a indignação contra os actos que vemos praticar.

O sr. Presidente: — É a primeira vez que chamo um sr. deputado á ordem; porém agora não posso deixar de o fazer. O sr. deputado tom a palavra sobre o modo de propor, e eu não o posso deixar fallar sobre a materia (apoiados).

O Orador: — Que impaciencias são estas? De que modo pretendem tolher-nos a palavra e os movimentos?

Querem pôr-nos a camisa de força? Pois eu declaro-lhes que a hei de despedaçar pelas Costuras, porque a não reputo inconsutil como a tunica de Christo. São algemas que nos querem lançar aos pulsos? Pois affirmo-lhes que as hei de arrebentar como se fossem fios de estopa.

O sr. Presidente — A camara e o paiz avaliam muito bem a justiça com que eu digo que o sr. deputado não está na ordem (apoiados).

O Orador: — Eu oiço os apoiados, mas appello para a liberdade (apoiados).

Liberdade, senhores, no delirio do seu apoio deixem tambem logar para a liberdade. A liberdade, esperança e vida dos povos; liberdade, nobre incentivo e motor sublime de todos os actos generosos. A liberdade é Caio Graccho defendendo as franquias do povo romano contra as extorsões e demasias dos patricios.

O sr. Presidente: — Permitta-me que lhe diga que o sr. deputado é que está offendendo a liberdade (apoiados).

O Orador: — Sr. presidente, eu não offendo a liberdade, o culto que tenho por ella é demasiado santo para a poder offender. A liberdade é Catão na impassibilidade estóica do suicidio preferindo a morte ás algemas de Cesar.

A liberdade são os gerondinos entoando a Marseillaise no festim mortuário á luz vacillante dos candelabros, que allumiavam as faces lívidas de Valazé. A liberdade é Washington proclamando a independencia dos Estados Unidos da America.

O que nós estamos vendo é que não é liberdade. Respeitem ao menos a liberdade!

Eu estou tremulo e convulso, mas este tremor não é o tremor do receio, é o tremor do meu respeito e da minha dedicação pela liberdade. (Vozes: — Muito bem.)

E o tremor pelos principios constitucionaes que vejo offendidos por esta inexplicavel vertigem politica. Pois que!? Querem tambem sacrificar a liberdade ao sr. presidente do conselho?

O sr. Presidente: — O sr. deputado está offendendo a liberdade e á carta constitucional, e eu não consinto que continue a fallar da maneira por que está fallando.

O Orador: — Eu sempre respeitei a liberdade, mas acredite V. ex.ª que as vozerias descompostas dos pretorianos não são capazes de me abafar a palavra.

Vozes: — Ordem, ordem.

O Orador: — Eu não insulto, mas respondo por todas as minhas palavras.

O sr. Presidente: — O sr. deputado está fallando no seio da representação nacional, e não está fallando nas praças (apoiados).

O Orador: — Eu fallo no seio da representação nacional, e não disse palavra alguma que possa ser qualificada de offensiva para ninguem.

O sr. Presidente: — O sr. deputado está offendendo a liberdade.

O Orador: — Protesto contra a asserção de v. ex.ª, porque não offendi a liberdade, nem a podia offender quem a ama tanto como eu.

Vozes: — Votos, votos.

O sr. Presidente: — Vou pôr á votação o requerimento do sr. João Antonio de Sousa.

O sr. Coelho de Carvalho: — Perdôe V. ex.ª, mas tem de pôr á votação primeiro o meu requerimento pedindo votação nominal.

O sr. Presidente: — O sr. deputado vae ser attendido. O sr. Coelho de Carvalho requereu a votação nominal sobre o requerimento do sr. J. A. de Sousa;'os senhores que approvam que a votação seja nominal, tenham a bondade de se levantar.

Foi approvado unanimemente.

O sr. Presidente: — Vae votar-se. Os senhores que julgam a materia discutida dizem approvo, e os outros senhores dizem rejeito.

Feita a chamada

Disseram approvo os srs.: Adriano Pequito, Garcia de Lima, Annibal, Braamcamp, Abilio Costa, Soares de Moraes, Teixeira de Vasconcellos, Quaresma, Brandão, Pinto Ferreira, Lemos e Napoles, Antonio Pequito, Magalhães Aguiar, Barjona de Freitas, Barão do Rio Zezere, Belchior Garcez, Albuquerque e Amaral, B. F. de Abranches, Poppe, C. de Almeida Pessanha, Claudio Nunes, Custodio Freire, Delphim, Eduardo Cabral, Eduardo Cunha, F. J. Vieira, Quental, Diogo de Sá, Lampreia, Bicudo Correia, F. M. da Cunha, Mello Soares de Freitas, Cadabal, Valladares, Guilhermino de Barros, Medeiros, Abreu e Lima, Reis Moraes, J. A. de Carvalho, Gomes de Castro, J. A. de Sepulveda, J. A. de Sousa, Costa Xavier, Fonseca Coutinho, Mendonça Castello Branco, Alcantara, Loureiro, Sepulveda Teixeira, Tavares de Almeida, Teixeira Soares, Albuquerque Caldeira, Calça e Pina, Rodrigues da Camara, J. A. Maia, Barbosa e Silva, Infante Passanha, Sette, Carvalho Falcão, Homem de Gouveia, Alves Chaves, Fernandes Vaz, Costa e Silva, Frazão, Gonçalves Correia, Oliveira Baptista, Mexia Salema, Mendes Leal, José Tiberio, Julião Mascarenhas, Julio do Carvalhal, Levy, D. Luiz do Azevedo, Amaral Carvalho, Alves do Rio, Macedo Souto Maior, Sousa Junior, Leite -Ribeiro, Lavado de Brito, Tenreiro, Miguel Osorio, Severo de Carvalho, Monteiro Castello Branco, Placido de Abreu, R. F. da Gama, Carvalho e Lima, Pinto Bizarro, Visconde dos Olivaes, Menezes Toste, Xavier Pinto e Cesario.

Disseram rejeito os srs.: Barros e Sá, Seixas, A. Pinto de Magalhães, Fontes Pereira de Mello, Faria Barbosa, Pereira Garcez, Teixeira da Mota, Bivar, Ignacio Lopes, Pereira de Carvalho e Abreu, Blanc, Sant'Anna e Vasconcellos, Santos e Silva, Mártens Ferrão, Barros e Cunha, Coelho de Carvalho, Matos Correia, Noutel, J. Pinto de Magalhães, J. A. da Gama, Vieira de Castro, Ferraz, Casal Ribeiro, J. M. Lobo d'Avila, Alvares da Guerra, Sieuve de Menezes, José de Moraes, Barros e Lima, Marquez de Monfalim, Ricardo Guimarães, R. Lobo d'Avila, Visconde de Lagoaça e Visconde de Pindella.

Julgou se portanto a materia discutida por 90 votos contra 33.

O sr. Presidente: —Vão votar-se as propostas pela ordem da sua precedencia.

O sr. Barros e Cunha: — Peço licença para retirar a minha moção.

Foi retirada.

O sr. Presidente: — A primeira proposta sobre que se vae votar é a do sr. Vieira de Castro.

O sr. Bivar: — Requeiro que a votação seja nominal. Assim se resolveu. Feita a chamada

Disseram approvo os srs.: Barros e Sá, A. J. de Seixas,

A. J. Pinto de Magalhães, Fontes, Faria Barbosa, Antonio de Serpa, Pereira Garcez, Teixeira da Mota, Bivar, F. I. Lopes, Pereira de Carvalho e Abreu, Mártens Ferrão, Costa Xavier, Aragão, Coelho de Carvalho, Matos Correia, Noutel, J. P. de Magalhães, J. A. da Gama, Vieira de Castro, Ferraz, Casal Ribeiro, Alvares da Guerra, Sieuve de Menezes, J. de Moraes, Barros e Lima, Marquez do Monfalim, Visconde de Lagoaça e Visconde de Pindella.

E disseram rejeito os srs.: Adriano Pequito, Garcia de Lima, Annibal, Braamcamp, Abilio Costa, Soares de Moraes, Teixeira de Vasconcellos, Quaresma, Gomes Brandão, Pinto Ferreira, Pacheco Metello, Antonio Pequito, Magalhães Aguiar, Barjona de Freitas, Barão do Rio Zezere, Belchior Garcez, Albuquerque o Amaral, B. F. de Abranches, Poppe, Carolino Pessanha, Claudio Nunes, Custodio Freire, Delphim, Eduardo Cabral, Eduardo Cunha, Quental, Coelho do Amaral, Diogo de Sá Lampreia, Bicudo Correia, F. M. da Cunha, Mello Soares de Freitas, Cadabal, Valladares Aguiar, Guilhermino de Barros, Paula Medeiros, Barbosa e Lima, Reis Moraes, J. A. de Carvalho, Gomes de Castro, J. A. de Sousa, Fonseca Coutinho, Mendonça Castello Branco, Barros e Cunha, Alcantara, S. Loureiro, Sepulveda Teixeira, Tavares de Almeida, Soares de Sousa, Albuquerque Caldeira, Calça e Pina, Rodrigues Camara, J. A. Maia, Barbosa e Silva, Infante Passanha, Sette, Carvalho Falcão, Homem de Gouveia, Alves Chaves, Fernandes Vaz, Costa e Silva, Frazão, Gonçalves Correia, Oliveira Baptista, Mexia Salema, Mendes Leal, José Tiberio, Julião Mascarenhas, Julio do Carvalhal, Levy, D. Luiz de Azevedo, Xavier de Carvalho, Alves do Rio, Macedo Souto Maior, Sousa (Junior), Ribeiro e Silva, Lavado de Brito, Tenreiro, Miguel Osorio, Severo de Carvalho, Placido de Abreu, Raymundo da Gama, Carvalho e Lima, Pinto Pizarro, Visconde dos Olivaes, Menezes Toste, Xavier Pinto e Osorio.

Ficou portanto rejeitada por 89 votos contra 29.

O sr. Presidente: — Agora vae votar-se a proposta do sr. Placido de Abreu.

O sr. Pereira de Carvalho e Abreu: — Requeiro que esta votação seja tambem nominal.

Assim se resolveu.

Feita a chamada

Disseram approvo os srs.: Adriano Pequito; Garcia de Lima, Annibal, Braamcamp, Abilio Costa, Soares de Moraes, Teixeira de Vasconcellos, Quaresma, Gomes Brandão'; Pinto Ferreira, Pacheco Metello, Antonio Pequito; Magalhães Aguiar, Barjona de Freitas, Barão do Rio Zezere; B. Garcez Albuquerque e Amaral, B. F. de Abranches, Poppe, Carolino Pessanha, C. J. Nunes, Custodio Freire', Delphim, Eduardo Cabral; Eduardo Canha, Quental, Diogo de Sá, Lampreia, Bicudo Correia; F. M. da Cunha, Mello Soares; Cadabal, Valladares Aguiar, Guilhermino de Barros, Paula Medeiros, Barbosa e Lima; Reis Moraes, J. A. de Carvalho, Gomes de Castro', J. A. de Sousa, Fonseca; Coutinho, Mendonça Castello Branco,Barros e Cunha, Alcantara, S. Loureiro, Sepulveda Teixeira, Tavares de Al-

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meida, Soares de Sousa, Albuquerque Caldeira, Calça e Pina, Rodrigues Camara, J. A. Maia, Barbosa e Silva, Infante Passanha, Sette, Carvalho Falcão, Homem de Gouveia, Alves Chaves, Fernandes Vaz, Costa e Silva, Frazão, Gonçalves Correia, Oliveira Baptista, Mexia, Mendes Leal, Tiberio, Julião Mascarenhas, Julio do Carvalhal, Levy, D. Luiz de Azevedo, Amaral Carvalho, Souto Maior, Sousa Junior, Ribeiro e Sousa, Lavado de Brito, Tenreiro, Miguel Osorio, Severo de Carvalho, Monteiro Castello Branco, Placido de Abreu, R. Gama, Carvalho e Lima, Pinto Pizarro, Visconde dos Olivaes, Pontes, Xavier Pinto e Cesario.

Disseram rejeito os srs.: Barros e Sá, Seixas, A. P. de Magalhães, Fontes, A. de Serpa, Teixeira da Mota, Bivar, F. I. Lopes, Pereira de Carvalho e Abreu, Sant'Anna, Santos e Silva, Mártens Ferrão, Costa Xavier, Aragão, Coelho de Carvalho, Matos Correia, Noutel, J. P. de Magalhães, J. A. da Gama, Vieira de Castro, Casal Ribeiro, Alvares da Guerra, Sieuve, José de Moraes, Marquez de Monfalim, Ricardo Guimarães, Visconde de Lagoaça e Visconde de Pindella.

Ficou portanto approvada por 87 votos contra 28.

O sr. José de Moraes: — Pedi a palavra para uma explicação, por me não ter chegado a palavra que havia pedido. Não posso explicar o meu voto, porque sou conhecedor do regimento, e sei que o não, posso fazer, e nem mesmo o meu voto tem explicação alguma senão para a minha consciencia. Tenho a felicidade de ter muitos amigos em todos os partidos, e respeito-os a todos, mas não estou ligado em politica a nenhum d'esses_ amigos.

Estou só, só tenho marchado desde que entrei n'esta camara em 1853, e só continuarei a estar, votando com a minha consciencia e nunca ligado a facção ou partido algum, emquanto a procuração me não for retirada e permanecer n'esta cadeira.

Tambem nunca me despeitei por qualquer offensa dos srs. ministros, e quando os censuro ou apoio, faço-o segundo o que a minha consciencia me pede.

Não estou despeitado, como se diz, por eu ter desejo de me sentar n'aquellas cadeiras (apontando para as dos srs. ministros), porque julgo que não tenho capacidade para isso (riso).

Agradeço aos illustres deputados essas risadas que dão. Não sei se são de censura, se de elogio; se são de censura, desprezo-as; se são de elogio, agradeço-as (apoiados).

Disse eu que não estava despeitado, nem pertenço ao numero, e grande é elle, dos que pretendem sentar-se n'aquellas cadeiras. É verdade.

Tambem devo fazer ainda uma declaração, porque votando eu a proposta de um joven deputado, não quero que nem aqui, nem lá fóra se entenda, que eu votei os insultos e as injurias dirigidas aos srs. ministros. Respeito-os, como respeitei sempre, e hei de respeitar os que ali se sentam. Sempre que via insultar um caracter tão respeitavel e tão digno, e de quem sou tão dedicado amigo, como o do sr. Casal Ribeiro, sentia-o, e o mesmo digo a respeito do sr. Fontes Pereira de Mello.

Ss. ex.ªs sabem que eu, desde que tive a honra de entrar no parlamento até hoje, nunca insultei os illustres deputados (apoiados), nem nunca lhes dirigi uma insinuação. Discrepava muitas vezes da sua opinião, é facto, fazia-lhes opposição, mas nunca faltei ao que devia a elles e a mim (apoiados).

Os nobres deputados sabem que o que eu digo é a pura verdade. Isto é uma declaração para o futuro, e quero por ella ser julgado se algum dia a contradisser. Tenho dito.

O sr. Ministro da Fazenda (Mathias de Carvalho): — Interrompeu-se a sessão da camara no dia de quarta feira por motivos que não quero recordar.

É um facto, e d'elle resultou que me não foi possivel tomar a palavra, como desejava, como pedia a satisfação de um dever sagrado, ajusta defeza da minha dignidade offendida..

Creio que nas duas vezes que tive a honra de fallar no seio do parlamento, depois que occupo este logar, não dirigi a nenhum dos lados da camara expressões que podessem ferir a sua susceptibilidade.

Se o fiz, porém, se nas breves considerações que tive a honra de vos apresentar, alguma palavra me escapou que podesse offender alguem, peço-lhe que acredite que foi acto involuntario.

Não venho de modo nenhum responder ao discurso que se fez na sessão passada; cumpre-me porém protestar energicamente contra uma insinuação grave, gravissima, que me abstenho de qualificar n'este logar, pelo respeito que devo ao parlamento e a mim proprio (apoiados); contra essa insinuação venho protestar com aquella energia de homem de bem, que me prezo de ser. O deputado que a proferiu acrescentou que =não tomava a responsabilidade do que dizia =. Pois então como é que s. ex.ª vem ao seio da representação nacional fazer-se echo de uma injuria, da qual não toma a responsabilidade?

O sr. Sant'Anna e Vasconcellos: — Peço a palavra, e igualmente peço a v. ex.ª que não tolere que o sr. ministro da fazenda me declare echo da calumnia.

O sr. Presidente: — Peço ao sr. deputado que não interrompa.

O sr. Sant'Anna e Vasconcellos: — Eu não admitto injuria de ninguem.

O Orador: — Não pertendo injuriar ninguem, seria improprio do logar que occupo, e se a camara julga que a expressão é injuriosa não duvido retira-la. Os que me conhecem sabem de certo que se quizesse dirigir palavras offensivas a alguem, não me punha a cuberto com a posição em que me acho.

O meu intento é repellir energicamente toda a insinuação deshonrosa com que me agredirem; protesto contra toda a injuria que se quizer levantar contra o meu caracter honesto, porque posso dizer bem alto, no meio dos representantes do meu paiz, que todo o meu passado é honrado (apoiados), e posso tambem affirmar que os meus actos nunca o hão de desmentir (apoiados).

Não tenho mais nada a dizer.

Vozes: — Muito bem.

O sr. Presidente: — Tem a palavra o sr. ministro das obras publicas.

O sr. Sant'Anna e Vasconcellos: — V. ex.ª teve a bondade de me inscrever?

O sr. Presidente: — Sobre isto não ha discussão; agora são explicações.

O sr. Sant'Anna e Vasconcellos': — Peço a v. ex'.a me inscreva para uma explicação.

O sr. Ministro das Obras Publicas (João Chrysostomo): — A provocação que me foi dirigida dentro d'este recinto, foi de tal ordem, que a camara poderá receiar que, nas explicações que vou dar, eu me deixe dominar pela paixão. Esteja porém v. ex.ª descansado e a camara, que não me esquecerei do respeito que devo a mim proprio, á dignidade da camara, e á dignidade do logar que occupo (apoiados).

Sei perdoar ás vezes as injurias; mas não sei insultar ninguem. Serei severo, mas não serei injusto, por que procuro sempre fazer justiça a todos, sejam amigos, sejam adversarios.

A victima aqui está erguida de cabeça bem levantada! (Apoiados.)

As setas que lhe dirigiram vieram de tão baixo que a não poderam alcançar (apoiados), e foram caír, e embeber-se no rosto do meu agressor. N'essas faces ainda vejo o sangue... mas será o sangue do pudor e do remorço.

Passo ás explicações.

Perguntou o sr. deputado por Fafe, d'onde tinha eu vindo, para onde ía, e por que estava aqui?

Vim de muito longe; vim de 1833 e 1834 (apoiados); pertenci ao exercito libertador; fui soldado do immortal Duque de Bragança, de gloriosa memoria; ajudei a plantar a liberdade no meu paiz.

Vozes: — Muito bem.

Seguiram-se as nossas desgraças das lutas da familia liberal.

Não tomei parte n'ellas até 1847; com franqueza o digo, reprovei tanto a revolução de setembro, como a de 1842.

Os sentimentos que sempre professei de amor e lealdade á dynastia e ás instituições, fizeram-me sentir dolorosamente o golpe de estado de 6 de outubro, por que vi que elle vinha acarretar ao paiz uma nova e temerosa luta. Não me enganei. N'essa luta tomei parte, como tomou toda a nação; mas tomei parte sem atraiçoar ninguem.

Pedi a minha demissão e renunciando á patente que tinha no exercito, que era o meu unico patrimonio, fui ser soldado da junta do Porto.

Vozes: — Muito bem.

Aqui está o nobre marquez de Sá, a quem me apresentei, que me deu a maior prova de confiança, de amisade e de affeição, o que me concedeu a maior honra nomeando-me seu secretario particular.

Acompanhei o sr. marquez de Sá n'essa epocha, e tenho-o acompanhado desde então até hoje. Quem tem cursado uma tal escola não tem medo de que o accusem de deslealdades (apoiados).

Vozes: — Muito bem.

Quando dei este passo, era ministro da corôa um parente meu. Quando combati o partido, á testa do qual estava o sr. conde Thomar, não tinha deixado de receber d'este cavalheiro, e d'este homem d'estado, a quem aliás muito respeito, provas de muita consideração; mas as minhas idéas politicas eram outras, e chamavam-me para outro campo, porque eu nunca approvei governos pessoaes, parecia-me que aquelle tinha essas tendencias.

Desde 1847 tenho vivido mais ou menos na vida publica.

O illustre deputado fingiu porém ignorar d'onde eu vinha e onde eu estava; pareceu ignorar quaes eram os meus titulos, quaes as minhas habilitações antecedentes que me conduziram a este logar.

Tenho exercido varios cargos publicos, alguns difficeis e de bastante importancia, e sempre honrosamente, sempre com louvor e com elogio das pessoas com quem tenho servido.

Honrei-me e honro-me com a amisade de muitos homens distinctos do meu paiz, uns que estão sentados n'esta camara, e outros que estão fóra d'ella ou já falleceram.

Fui amigo do sr. Mousinho de Albuquerque, e fui amigo do sr. Thiago Horta, dois nomes que deixaram de si um honroso e glorioso vestigio (muitos apoiados). Honrei-me muito com a amisade d'estes cavalheiros, e ainda conservo saudosa lembrança de quanto lhes devi.

Estão sentadas n'esta camara pessoas igualmente respeitaveis, com cuja amisade me honro. Ali está o sr. Fontes Pereira de Mello; parece-me que lhe posso dar o nome de amigo, porque, não obstante os dissentimentos -políticos, sempre respeitei, sempre confessei os seus dotes eminentes.

S. ex.ª, com quem tive a honra de servir, tambem pôde dizer se eu servi com lealdade ou não (O sr. Fontes—apoiado); se eu não fiz sempre todos os esforços para bem cumprir os meus deveres.

Ali está o sr. Carlos Bento tambem e outros cavalheiros distinctos com quem tenho servido, e todos conhecem a norma do meu proceder.

Tenho exercido no meu paiz uma profissão honrosa, uma profissão que creio se não exerce sem alguns diplomas (apoiados). Creio que ninguem ignora que o diploma de engenheiro não se obtém sem habilitações difficeis e distincções scientificas. Nas academias obtive essas distincções; assim como tambem no exercicio d'essa profissão tenho sido considerado no meu paiz e fóra d'elle (apoiados).

Eis-aqui a minha vida antes de ministro; depois de ministro os meus actos ahi estão patentes e são completamente do dominio do publico.

Ha apenas um anno que sou ministro da corôa, e parece-me que, se me tivesse retirado da administração publica, alguns vestigios deixava ahi da minha passagem (apoiados).

Negocios importantes n'este curto espaço têem sido por mim estudados ou resolvidos. A camara sabe muito bem que a viação publica não tem tido menos desenvolvimento que teve em epochas anteriores.

No ultimo anno construiram-se mais de 240 kilometros de estradas, que é a maior extensão que se tem construido n'este espaço no nosso paiz; e no mesmo anno tive a felicidade de effectuar a venda do caminho de ferro do sul em condições muito vantajosas, e de contratar mais 200 kilometros de caminhos de ferro, entre os quaes hontem se inaugurou uma secção de trabalhos em direcção ao Algarve, assim como está inaugurada a secção de Beja ao Guadiana, e em breve espero que se inaugure a secção de Evora ao Crato. Mais de 500 kilometros de estradas estão em construcção ao mesmo tempo.

A rede telegraphica tem tido notavel augmento. Muitos outros trabalhos e estudos têem sido executados. Foram fundados alguns estabelecimentos de credito, certamente pela iniciativa particular, mas auxiliada com toda a efficacia pelo governo.

Fundou-se o credito hypothecario, e lisongeio-me de ter procurado combater e ter conseguido destruir todas as difficuldades que se oppunham á sua fundação. Em tempo competente darei conta á camara de tudo quanto se passou a este respeito, e a camara verá que não eram pequenas as difficuldades que havia a vencer para que se chegasse a constituir aquella sociedade, de que muita utilidade publica deve resultar.

Resolvi a questão das aguas e a questão da companhia das carreiras de navegação a vapor para a Africa, Açores e Algarve.

Ahi está sobre a mesa um contrato, que já foi approvado pela commissão respectiva; contrato em que toda a imprensa não encontrou nada que dizer, que tem as sufficientes garantias para ser executado devidamente, e que me dá a fundada esperança de se estabelecer definitivamente, com as condições devidas, e como a camara e o publico reclamavam este serviço tão importante para o paiz de um modo inteiramente satisfactorio.

A questão das aguas foi resolvida, e tambem darei conta ás côrtes não só do que se praticou, mas ainda do que pretendo fazer a este respeito.

Mandei tambem para a mesa dois projectos importantissimos, como são o da liberdade do commercio dos cereaes e o de vinhos...

Uma voz: — São projectos.

O Orador: — São ainda projectos, é verdade, mas por projectos se havia de começar. A censura não é a mim, é á camara que se dirige.

Se a camara não os approvar, de certo ficarão só em projectos, mas eu hei de empregar os esforços que me cumpre empregar para que elles não sejam só projectos e se convertam em leis do paiz (apoiados).

Fez-se a reforma das repartições dependentes do ministerio a meu cargo; a da engenheria, da telegraphia, dos correios, e a dos trabalhos geographicos e estatisticos. Publicaram-se decretos importantes sobre a policia dos telegraphos, caminhos de ferro e mais vias de communicação, assim como sobre a policia das edificações.

Reformou-se e ampliou-se o ensino agricola e industrial j e posso dizer com alguma ufania que ainda nenhum d'estes trabalhos, que não quero ter o desvanecimento de que não tenham defeitos, foi censurado de modo que me podesse convencer de que elles não são muito proficuos para o paiz (apoiados). >

A organisação da engenheria civil foi apreciada fóra do paiz, em alguns jornaes que não têem caracter politico, nem se deixam dominar pelas paixões politicas, como vantajosa para o paiz e honrosa para o ministro que referendou aquelle decreto.

A este ministro, que em tão pouco tempo effectuou estes trabalhos, que durante um anno tem dado provas de iniciativa, de amor ao trabalho, dedicação, espirito de rectidão e justiça para resolver os negocios, parecia-me que não se lhe podiam fazer as imputações e dirigir os insultos que se ouviram n'esta casa (apoiados).

Disse-se que esse ministro tinha sido recebido á gargalhada. Esse ministro quando entrou para o ministerio em janeiro do anno passado, teve a honra, teve o desvanecimento de que toda a imprensa, mesmo a da opposição, lhe fez alguns elogios, e nem lhe negou a sua competencia para os negocios que lhe iam ser encarregados, nem tratou de lhe deprimir o seu caracter. Em quasi todos os jornaes recebi provas de benevolencia, e em nenhum d'elles encontrei as expressões que vim ouvir agora n'esta casa só proferidas pelo sr. deputado por Fafe.

Não foi portanto á gargalhada que fui recebido quando entrei para o ministerio. A gargalhada é mais recente; a gargalhada data desde que o illustre deputado por Fafe entrou no parlamento.

Desgraçadamente eu peço no Diario de Lisboa, e vejo n'elle, por quarenta vezes, na sessão da camara, em que fallou o sr. deputado, tratando-se dos assumptos os mais serios e graves — a gargalhada e a risada.

Sinto que similhante documento corra a Europa, porque não sei se a Europa se rirá tambem de nós (muitos apoiados).

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Mas porque entrei eu no ministerio, tendo reprovado alguns actos anteriores de alguns dos ministros? Porque entrei eu no ministerio tendo votado contra a aposentação do thesoureiro pagador de Faro?

Antes de entrar no ministerio já tinha sido convidado n'outras occasiões a sentar-me n'estas cadeiras, e recusei-me a aceitar essa honra. Não era a ambição pois que me impellia ou fascinava a minha rasão, quando em janeiro do anno passado, instado de novo, vim occupar este logar. Mas, sentando-me aqui, não retratei, nem retrato as minhas opiniões. Se tivesse de votar novamente sobre a aposentação do thesoureiro pagador de Faro, votava ainda da mesma fórma.

Eu acompanhei sempre a maioria d'esta casa em todas as questões politicas, ou não politicas; e só d'ella me desviei em tres pontos importantes, e esses ainda os Votava da mesma fórma. Foi na questão da aposentação, de que tenho failado, na questão dos legados pios, e na questão da restituição in integrum. E n'esta ultima abstive-me de Vo tarv

A excepção d'estas tres questões, acompanhei em tudo o mais a maioria d'esta casa. E faço justiça a todos, honro a opinião de todos. Não reputo que ninguem tenha enfeudado a ministerio nenhum as suas opiniões, e o que creio é que acompanham uma situação emquanto a podem acompanhar, emquanto a consciencia lh'o permitte (apoiados).

Mas eu não retirei as minhas opiniões. Quando fui convidado para o ministerio declarei aos cavalheiros que para isso me convidavam que tinha votado d'esta fórma, e que isso poderia ser um impedimento para a minha entrada. Julgou-se porém que o não era.

Depois acompanhei todos os meus collegas, o elles ahi estão. Sinto não ver presentes alguns, porque poderiam dizer se não os acompanhei com toda a lealdade o com toda a dedicação; a todos indistinctamente...

O sr. Mendes Leal: — Apoiado.

O Orador: — Estimo ver presente o meu antigo collega, antigo camarada e amigo, o sr. Lobo d'Avila. S. ex.ª pôde dizer se eu, nos conselhos da corôa, não o acompanhei sempre com toda a lealdade, e se houve algum dissentimento notavel nas questões que tivemos de discutir e resolver.

Sou collega do sr. Lobo d'Avila desde 1848 ou 1849. A primeira vez que tive a honra de concorrer com s. ex.ª foi na collaboração de um jornal que era redigido por s. ex.ª, assim como por outras pessoas que estão na camara, taes como os srs. Antonio de Serpa e Casal Ribeiro. Depois tive a honra de acompanhar a s. ex.ª como membro do conselho de obras publicas.

Sempre fiz justiça á sua alta intelligencia, sempre disse, apesar de haver muitas pessoas que lhe faziam injustiça, que era uma pessoa cuja intelligencia para os negocios, eu reputava muito segura e muito solida. Nunca tive estreitas relações, nem grande intimidade com s. ex.ª, mas o que é certo é que nunca houve uma só questão desagradavel entre, nós, nem mesmo aquellas que acontecem ás vezes entre os amigos os mais Íntimos, e isto no longo trato de mais de dezasseis annos.

Com o sr. Lobo d'Avila tive muitas occasiões de discutir como membro do conselho, ou em outras commissões, nunca nos encontrámos muito distantes em opinião ou em luta..

Aqui está presente outro membro do conselho de obras publicas, o sr. Belchior José Garcez, meu amigo desde os bancos das escolas, o que eu muito respeito, e cuja intelligencia muito considero, o que não impede que com a franqueza de amigos discutamos de modo que muitas mais vezes me tem acontecido achar me em divergencia de opiniões com este meu prezado amigo, do que com o sr. Lobo d'Avila. Nunca houve pois entre mim e s. ex.ª divergencias algumas, nem antes de ministros, nem depois.

Votei de coração muitas das medidas que s. ex.ª aqui sustentou, taes como a lei dos morgados e a questão do tabaco. Acompanhei o sr. ministro em muitas o graves questões do seu ministerio, e dei-lhe o meu voto leal e sincero.

Sei avaliar o seu merecimento, sei para quanto vale, mas isto não é motivo para que eu acompanhe ou deixe do acompanhar a s. ex.ª em todas as posições Ou evoluções politicas. Não tenho compromissos pessoaes nem com o sr. Lobo d'Avila, nem com algum dos srs. ministros. Tenho compromissos, sim, com o meu paiz, com o chefe do estado, de quem sou ministro, com o partido progressista a quem anho a honra do pertencer, e emfim com a maioria d'esta casa que represento como ministro d'esta situação (apoiados). Estes é que são os meus compromissos.

Não foi por culpa minha que o ministerio a que pertenci começou a desmoronar-se. Houve alguns ministros que entenderam dever saír do gabinete; não sei se havia alguem que entendesse dever ficar, o que sei é que fui de opinião que deviamos todos saír; e se alguma pena tenho a este respeito, foi de não acompanhar na saída o meu collega e amigo, o sr. Mendes Leal, porque, alem de reconhecer e venerar as suas eminentes qualidades, ao mesmo tempo podia de alguma fórma aceitar as rasões que o sr. Mendes Leal deu para a sua saída em uma carta que é do dominio publico.

Fui pois de opinião que o ministerio devia todo pedir a sua demissão. Foi depois encarregado o sr. marquez de Sá da organisação do novo ministerio, e tive a honra de ser convidado para fazer parte d'este ministerio. Eu declarei a s. ex.ª que reputava conveniente não entrar para o ministerio n'aquella occasião, porque me parecia util que entrassem homens que não pertencessem ao antigo ministerio. Se as cousas depois, pela successão das circumstancias, tomaram outro rumo, eu não sou responsavel por isso.

Devo dizer ainda n'esta casa que foi minha opinião não haver reunião alguma de deputados durante a crise ministerial, porque entendia que, quando se tratava da reconstrucção do ministerio, era de toda a conveniencia, e conforme com a indole das nossas instituições, que não houvesse similhantes reuniões, a fim de deixar livre e completamente desembaraçada a prerogativa da corôa. Foi esta a minha opinião, e se reuniões houve não foi por meu conselho...

~ O sr. Mendes Leal: — Peço a palavra para explicar o meu voto.

O Orador: — O que é certo é que o sr. duque de Loulé, que é considerado por todos como chefe do partido progressista, teve um voto de confiança para empregar todos os esforços no sentido de se sustentar a situação, e de organisar o ministerio. Foi o sr. duque do Loulé que recebeu duplicadamente este voto de confiança do seu partido e da corôa.

Porque se queixam pois de eu me achar n'este logar com o sr. presidente do conselho? Acho-me, porque entendi não dever abandonar a situação nem os meus amigos politicos (apoiados), e que devo prestar ao meu paiz os serviços que de mim se exigem. Não tentei vir a este logar, antes procurei eximir-me. Não desejo estar aqui, mas nunca me nego a qualquer serviço que de mim seja exigido, a qualquer sacrificio que seja necessario fazer (apoiados). Tenho a coragem necessaria para não recuar o não abandonar estas cadeiras, apesar dos insultos e recriminações, apesar de ver mal interpretadas as minhas intenções. Não obstante esses insultos e injurias hei de cumprir com toda a tenacidade os meus deveres (apoiados).

É isto que me cumpria dizer. É penoso ter de fallar de sr. Se foi immodestia a assembléa m'o relevará de ter occupado a sua attenção por tanto tempo, tendo que repellir tão atrozes injurias. A benevolencia com que sempre me tem tratado o a necessidade em que estava de dar estas explicações é que fizeram com que me demorasse tanto. Tenho dito.

Vozes: — Muito bem, muito bem.

O sr. Vieira de Castro: — Entrei n'esta camara com a vontade firme, com a resolução inabalavel de ser sempre na tribuna um orador delicado. A primeira e segunda provas que dei de mim, tiveram o apoio d'esta assembléa e do paiz. Na terceira seria severo de mais. Não foi por vontade; a causa que me inspirava ora severa tambem (apoiados).

Vou dar uma prova de ser delicado, quero dizer, de quanto eu mesmo prezo a minha reputação o prezo as muitas attenções que devo a vós todos, explicando-me debaixo da impressão que me causou a sirvente que todos ouviram, com que me fulminou o sr. ministro das obras publicas. Mas deixo a s. ex.ª para o fim, porque eu já estava inscripto antes de s. ex.ª fallar, o tenho que dar as explicações para que primeiro pedi a palavra.

Fui accusado de atacar a prerogativa da corôa pelo sr. ministro da fazenda, o sr. Mathias do Carvalho, e de atacar a honestidade dos ministros.

Eu acato e venero a constituição politica do meu paiz. Eu acato e venero, na divisão dos poderes e na sua independencia, a melhor e a mais bella garantia das liberdades publicas. Eu acato o venero no Rei constitucional da minha patria o supremo vértice da pyramide social, que essas liberdades amparam e sustentam.

Vozes: — Muito bem.

Sr. presidente, um dia amanheceu triste o céu de Portugal. O sol rompeu nos horisontes para allumiar na terra uma scena triste. Estava cercado pelas bayonetas de uma soldadesca desenfreada o palacio do uma Rainha, e dentro d'elle essa Rainha chorava, e as lagrimas pendentes de suas pálpebras mais pareciam. diamantes descidos da sua corôa. N'essa occasião atravessava pelas hostes da força amotinada um sacerdote, que interpondo a sua cabeça descoberta ás fúrias militares o ás lagrimas d'aquella senhora, logrou desarmar as primeiras, e enxugar as segundas. A corôa do padre salvou a corôa da Rainha, o ninguem profanou, nem as vestes sagradas d'aquelle, nem o corpo gentil da soberana. Esse sacerdote era meu tio! (applausos prolongados).

Já se vê pois que, em nome das minhas tradições, eu não podia atacar a corôa no parlamento do meu paiz. Mas n'este logar olho tambem para o povo d'onde venho, defendo as prerogativas d'elle, e nunca me esquece que estou aqui com a hera dos homens da revolução de setembro. Provei que vinha d'elles fallando da maneira por que o fiz na primeira vez que tomei a palavra; provo que venho d'ella, fallando a linguagem energica com que Passos Manuel fallava ao ministro inglez diante da Rainha a Senhora D. Maria II, no paço de Belem, quando vejo em perigo a minha patria (apoiados).

Nos parlamentos de hontem levantavam-se sempre todas as vozes a favor do povo; nos parlamentos de hoje, estranho contraste, estimulam-se todos os escrupulos a favor da corôa, e sou eu, sósinho, pelo povo; pelo povo d'onde todos procedemos, e em nome do qual estamos todos aqui! (Muitos apoiados.)

Em que ataquei eu a honestidade do sr. duque de Loulé, em que ataquei a honestidade e a honra de algum dos srs. ministros? O que eu disse foi que — a organisação ministerial tinha sido feita por um homem que tinha as costas voltadas para o povo, para a agitação do parlamento, para a agitação da imprensa, para a agitação da opinião publica. Que esse homem, como as syrtes no meio do oceano, tentava desfazer nas suas gargantas a onda sempre encapellada da opinião, affrontando-a ainda com apresentar-lhe sempre no cimo das cristas, o quê? O que os rochedos no meio do mar mostram ao desfazer das vagas — a espuma!

Vozes: — Muito bem.

Disse que esse homem não podia ter o pé nas recamaras populares, mas sim nas antecamaras da realeza.

Mas quando eu disse que — o ministerio tinha sido feito por um valido do paço...

O sr. Presidente: — Como o sr. deputado é novo no parlamento, permitta-me que lhe observe que ha uma disposição no regimento que prohibe nas discussões todo o insulto e toda a personalidade (apoiados).

O Orador: — Eu não estou insultando, peço perdão; e _appéllo para o sr. duque de Loulé, faço toda a justiça á sua alma de fidalgo, para que diga se effectivamente o estou insultando (apoiados).

Quando eu proferi essa palavra, que parece que tantos sustos faz, parava no homem; não olhava para cima; e parava n'elle em nome do povo de quem venho, em nome do povo, cujos interesses eu advogava; sentenciava o homem politico que julgava, e ainda julgo, o mais perigoso para o meu paiz; mas não offendia o cavalheiro com quem eu nada tinha (apoiados).

Conjuro a qualquer voz que se levante n'esta camara, e que declare em que offendi eu a honra de algum dos srs. ministros (muitos apoiados). Pois ao sr. ministro do reino não disse eu phrases as mais agradaveis, e não disse que estimaria muito que o sr. Ayres de Gouveia continuasse nas cadeiras do magisterio d'onde esperava muito de s. ex.ª? Não disse que conhecia muito particularmente o sr. ministro da fazenda; que respeitava os seus talentos? Ao sr. marquez de Sá não tratei de igual modo com o mais profundo acatamento pela alta respeitabilidade do seu caracter e pelos seus muitos e relevantissimos serviços? O sr. ministro das obras publicas é que foi por mim tratado mais severamente; e se mesmo no calor da discussão; se a electricidade d'ella me inspirou alguma palavra (note-se bem o que vou dizer); se a electricidade da discussão me arrastou alguma palavra menos conveniente, que duvida teria eu era a retirar quando soubesse que ella maguava a s. ex.ª, som todavia diminuir n'um apice a força da idéa, do pensamento que ella representava? (Muitos apoiados.)

E por esta occasião devo dizer ao nobre ministro da fazenda que eu lamentei muito o modo por que s. ex.ª se dirigiu a mim no seu primeiro discurso. Soffri por uns poucos do motivos uma decepção atroz. S. ex.ª levantava-se depois de dois dias da debate agitadíssimo; tinham posto em duvida os seus talentos; s. ex.ª tinha as galerias pejadas de povo espectante, como agora; moço, audaz, que mais bellos estimulos para que um sincero talento voasse n'uma replica brilhante, ostentando nos esplendores de um programma de sua futura iniciativa as virilidades todas do seu genio e da sua força? E que fez o nobre ministro? Agachou-se debaixo do manto da realeza para conquistar os apoiados sempre faceis aos logares communs de toda a oratoria banal (muitos apoiados).

Vozes: — Muito bem.

Amarga e triste decepção!

Estão dadas às minhas explicações.

Agora devo dizer ao sr. ministro das obras publicas que s. ex.'1 foi muito severo para commigo. Eu não sei o que serei com s. ex.ª A inspiração me ensinará o meu caminho.

Disse s. ex.ª que = nas minhas faces estava o sangue do pudor e dos remorsos, porque as settas que eu tinha expedido contra si tinham ido cravar-se nas faces do seu aggressor =. Sangue? (Pausa.)

Ha sangue nas minhas faces? Ainda bem que o ha! Ha sangue no meu rosto? Mas o sangue é sempre a manifestação de um pudor, ou o titulo posthumo de um heroismo que morreu (apoiados).

Vozes: — Muito bem.

O sangue é sempre nobre; ou nas faces de Carlota Corday, redivivas para a vergonha á bofetada insultuosa do carrasco; ou no solo aonde elle caiu para regar as sementes d'onde deve nascer a liberdade; ou na tunica de Jesus Christo, aonde elle ensina, em tinta inapagavel, a base eterna e sacrosanta do amor universal (applausos prolongados).

Sabe v. ex.ª aonde não ha sangue? É no campo dos transfugas, porque os transfugas desapparecem, e as armas dos seus adversarios não lhes podem sequer gravar nas costas o ferrete indelevel da sua ignominia (longos e repetidos apoiados).

Aonde não ha sangue, é nas physionomias refractárias ao pudor, dos que recalcam e esmagam dentro de si o estimulo do brio e o conselho da honra (applausos prolongados).

Aonde não havia sangue era na physionomia da victima que Cicero esmagava diante do senado de Roma, porque lá dentro minava o pensamento infernal de atraiçoar a sua patria (applausos).

Aonde não havia sangue era nas faces de Filippe de Macedonia, subjugado pelas objurgatorias de Demosthenes.

Aonde não ha sangue é nas physionomias dos cadaveres; aonde não ha sangue é nas faces do ministro das obras publicas, que é o cadaver do, ministerio passado (longos e repetidos apoiados).

O sr. Ministro das Obras Publicas (João Chrysostomo): — Peço a palavra.

(Susurro.)

O sr. Presidente: — Peço ao sr. deputado que não use de palavras insultuosas.

O Orador: — Então tambem eu fui insultado. Vozes: — Tambem foi insultado. Outras vozes: — Ordem, ordem.

O Orador: — Estou na ordem; não venho insultar ninguem.

O sr. Presidente: — O illustre deputado é obrigado a retirar todas as palavras insultuosas que dirigiu ao sr. ministro das obras publicas (Muitos apoiados).

O Orador: — Perdão...

O sr. Presidente: — Convido o sr. deputado a retirar essas expressões (Muitos apoiados).

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(Susurro.)

O sr. Presidente: — Peço ordem aos srs. deputados.

O sr. Coelho do Amaral: — Mantenha-a a v. ex.ª como poder. Isto não póde ser.

O Orador: — Sou docil aos conselhos de v. ex.ª; mas permitta-me que diga tambem que estou sereno, e que me não bate o coração diante de tempestade alguma (apoiados repetidos).

Se pedem ordem contra mim, em nome das minhas palavras; se alguma proferi, que se possa julgar offensiva, não terei duvida de a retirar, mas entenda-se bem...

(Susurro.).

O sr. Presidente: — Peço a attenção da camara.

Convido o sr. deputado a retirar as expressões que podem de qualquer modo offender o sr. ministro das obras publicas (apoiados).

O Orador: — Por consideração com v. ex.ª, retiro tudo que v. ex.ª quizer.

O sr. Presidente: — Por consideração com a camara (apoiados prolongados).

O Orador: — Não tenho duvida alguma, quando v. ex.ª entenda que sim. Mas não sei que estas phrases possam ser offensivas ao sr. ministro, quando declaro que tinham referencia ao ministerio passado (repetidos apoiados).

Pois eu levantei-me com a deliberação firme de ser delicado, e podia ter na minha mente o querer amargurar, azedar a minha explicação?

(Agitação na assembléa.)

Lembro a v. ex.ª uma cousa. O sr. ministro das obras publicas disse que = a gargalhada existia desde que eu tinha entrado',por aquella porta dentro = (apoiados).

Vozes—E verdade.

Ouvi placida e serenamente, e desejava a mesma generosidade para commigo (muitos apoiados).

Mas bem; eu quero confundir o meu adversario. Sr. ministro das obras publicas, eu sou homem novo; V. ex.ª está coberto de cãs, curvo-me diante dellas como os espartanos faziam; relevo as injurias que v. ex.ª me dirigiu, e se alguma Ih'as fiz, retiro-as; é a melhor prova que posso dar de mim.

Vozes: — Muito bem.

O Orador: — O sr. ministro das obras publicas defendeu-se apresentando o seu passado, dizendo o que tinha feito e d'onde vinha; disse que vinha de remota era, e não era d'essa que se tratava. S. ex.ª andou completamente em campo differente d'aquelle em que devia estar; porque eu questionei a procedencia de s. ex.ª, referindo-me unica e exclusivamente ao ministerio de hontem, d'onde s. ex.ª tinha vindo para o ministerio de hoje (muitos apoiados).

Não contesto que s. ex.ª tenha feito relevantes serviços, não os ataquei; s. ex.ª defendeu-se contra uma sombra, e eu a isso nada tenho que dizer (apoiados).

Mas disse s. ex.ª que = quando entrou para este ministerio tinha perguntado aos seus collegas = se poderia ser-lhe desairosa essa entrada, porque votara n'uma moção, contra o sr. Lobo d'Avila =. Estou debaixo de uma pressão tal, parece-me que ha um espirito n'esta casa de tal modo decidido contra todas as minhas palavras, que tenho medo de definir o que isto é, o que se me afigura!

O sr. ministro das obras publicas votou aqui contra o sr. Lobo d'Avila n'uma moção, depois convidaram-n'o para entrar no ministerio. Quem é que s. ex.ª consulta sobre se ha incompatibilidade na sua entrada para o ministerio, por ter votado contra o sr. Lobo. d'Avila n'aquella moção? É aos mesmos que o convidam! (Riso.) Isto não póde ser serio nem grave (apoiados). A quem s. ex.ª devia consultar era a sua consciencia e a sua dignidade; porque, quando eu,tenho de dar um passo na minha vida publica, ou particular, em questões de honra e de dignidade, não conheço ninguem acima, nem abaixo de mim; é a minha consciencia que consulto, e inspiro-me d'ella (apoiados).

S. ex.ª fez tambem uma resenha de todas as suas amisades, e entre ellas citou o sr. Thiago Horta, e disse que = todos os passos do sr. Thiago Horta tinham sido, e eram ainda hoje, vestigio honroso da sua vida =. Então aceite s. ex.ª a condemnação que lavrou a si proprio, porque um d'estes vestigios honrosos é o que o sr. Thiago Horta fez n'um dos parlamentos passados. Tinha-se reconstruído o ministerio, houve uma pequena apprehensão no publico de que elle tinha sido desleal aos seus collegas demissionários, e demittiu-se (apoiados). Eu aceito a apotheose d'este passo do sr. Thiago Horta, porque é referida por s. ex.ª, porque é insuspeita.

Vozes: — Muito bem.

Mas trouxe ainda uma outra condemnação do seu facto, dizendo: «Eu fui de opinião que todos saíssem do ministério». Pois é exactamente esta tambem a minha opinião (riso); é que s. ex.ª devia igualmente ter saído e todos os mais; é por isto que tenho combatido, e que volto de novo a sustenta-lo (riso). Mas se eu era d'esta opinião, e s. ex.ª diz que tambem era, para que estamos a discutir? E porque é que s. ex.ª ahi está n'essa cadeira? Isto é que custa a acreditar (riso — apoiados).

A honra dos ministros não era cousa que eu viesse atacar. Não offendi, não podia offender, porque não está na minha indole, nem nos meus intuitos, a honra de nenhum dos srs. ministros. Não offendi, nem podia offender, porque os conheço a todos. O sr. Ayres de Gouveia, que aqui está mais perto de mim, tenho-o eu por modelo de honestidade, e como elle a todos os nobres ministros; e se a honestidade fosse o unico titulo para se conquistar aqui as cadeiras do ministerio, eu adormeceria serenamente no meu leito, seguro de que a minha patria não perigava nas futuras delapidações dos Verres!

Vozes: — Muito bem.

Mas eu estabeleci proposições, sustentei-as, e a tribuna do parlamento que se fez dos estilhaços partidos das hastes de bandeiras rasgadas nas revoluções, não está ali para favorecer defezas ineptas de oradores que não sabem responder a argumento com argumento, soccorrendo-se ás banalidades de uma eloquencia gasta (muitos apoiados).

Quando de um lado do parlamento se apresenta uma proposição e se prova, não se levanta a gente para dizer = está atacada a minha honestidade, atacou-se a minha honra =; combate-se essa proposição, examina-se, estabelecem-se novas proposições, e tira-se a verdade d'esta luta de principios (apoiados). Isto é o que eu queria, isto foi o que não se fez. Não ataquei a honra dos srs. ministros, torno a repetir.

As minhas reflexões acabam desde o momento em que o sr. ministro das obras publicas se levantou para se defender tão tristemente; porque effectivamente s. ex.ª concluiu por dizer que = era da minha opinião e da opinião de nós todos, que não devia estar nas cadeiras do ministerio =.

Vozes: — Muito bem.

Agora, em conclusão e resumindo, tenho a dizer á camara uma cousa, e é, que no mesmo logar do meu coração eu aceito sempre e guardarei eternamente os seus applausos e os seus conselhos: os primeiros servem-me sempre e hão de eternamente servir-me de incitamento; os segundos de preparação da minha vontade para reprimir em mim os erros que são muitos— muitos!

Tenho dito.

Vozes: — Muito bem, muito bem.

(O orador foi comprimentado por muitos srs. deputados, e alguns pares que estavam na sala.)

O sr. Sant'Anna e Vasconcellos: — Acho-me demasiadamente agitado, pelos abalos que ha alguns dias soffro, para poder tomar a palavra; comtudo começarei o pouco que vou dizer por onde acabou o sr. ministro das obras publicas.

S. ex.ª, depois da apotheose de si proprio, feita em tom soturno e com ar desconfiado de si mesmo, disse que = tinha coragem para soffrer insultos =. Eu admiro a abnegação; é philosophica, é evangelica, mas devo confessar que a não tenho: eu não tenho coragem para soffrer insultos de ninguem, e por isso tomei a palavra quando o sr. Mathias de Carvalho disse que = eu tinha sido aqui o echo da calumnia =; felizmente s. ex.ª retirou immediatamente essa phrase, dispensando-me assim de tomar em tempo opportuno uma resolução condigna.

A opinião publica, repito, não se fórma só dentro d'esta casa. Leia V. ex.ª, leiam os srs. ministros, leiam todos os meus illustres collegas a imprensa da capital e a das provincias; percorram ss. ex.ªs as ruas da capital, as praças publicas, oiçam a opinião de todos, vejam se effectivamente, alem do que eu declarei que ella dizia, não ouve proclamar que =-as inspirações do sr. ministro da fazenda partem de algum foragido da policia estrangeira =. Tenho dito. (Susurro e agitação na assembléa.)

O sr. Ministro da Fazenda (com vehemencia): — Peço novamente a palavra:

O sr. Presidente: — Já lhe concedo a palavra, mas antes d'isso devo dirigir-me ao sr. deputado Sant'Anna e Vasconcellos, e dizer-lhe que eu ha pouco acabei de ler o regimento d'esta casa, que prohibe se use de palavras offensivas, assim como prohibe toda e qualquer personalidade (apoiados). O sr. Sant'Anna e Vasconcellos é convidado por mim a retirar as expressões offensivas que usou agora ao terminar o seu discurso (apoiados repetidos).

O sr. Sant'Anna e Vasconcellos: — Peço perdão e licença para declarar a v. ex.ª e á camara, que não tenho nada que retirar. Pois que...

O sr. Presidente: — Eu não discuto d'aqui com o illustre deputado, nem o illustre deputado commigo (apoiados), só lhe pedi e peço que retire as palavras com que acabou o seu discurso (apoiados).

O Orador: — Peço perdão para dizer que não tenho nada que retirar. As expressões que proferi não podem referir-se a nenhum homem de bem. Repito o que a opinião publica proclama.

(Susurro.)

Desde quando esta cadeira deixou de ser a voz da verdade? Pois então como deputado da nação eu não posso ser aqui echo da opinião publica? Vá V. ex.ª lá fóra, vá ver, vá ouvir, e reconhecerá a verdade do que referi...

O sr. Presidente: — Não são essas as expressões que são notaveis, são as personalidades que o regimento prohibe que se dirijam a quem quer que for (muitos apoiados).

O sr. Ministro da Fazenda: — É triste para o systema representativo, e doloroso para todo o homem liberal, assistir ás scenas que se têem passado n'estes ultimos dias dentro d'esta casa! (Apoiados repetidos.) Não comento esses acontecimentos; deixo ao juizo imparcial do publico o avalia-los como elles merecem.

Registo porém como consolação para o meu profundo desgosto, o silencio completo com que a camara ouviu as ultimas palavras do sr. Sant'Anna (apoiados). Nem um só membro d'esta camara se levantou para apoiar o sr. deputado, nem uma só voz se ergueu para applaudir s. ex.ª! É de certo esta a mais concludente prova de que a camara não pôde approvar o que acaba de dizer o sr. deputado (muitos apoiados), quando asseverou que nas ruas e praças publicas da capital se diz = que eu estou aqui debaixo das inspirações de pessoas que me podem deshonram e infamar =. Protesto contra esta falsidade monstruosa (apoiados).

Sabe s. ex.ª, como muita gente, que tenho sido sempre um homem de bem (muitos apoiados); que sou pobre, mas honrado (prolongados apoiados), e que não ha considerações nem influencias que me possam arredar do caminho que deve seguir todo o homem de brio, de pundonor e de bons sentimentos (muitos apoiados).

Nunca dirigi insultos a s. ex.ª, nem lhe fiz a mais leve offensa (apoiados). D'onde vem pois esta pertinacia em me aggredir tão violenta quão injustamente? Porque não me combate s. ex.ª em outro campo e de outra fórma se tem recursos para isso? (Apoiados.) O sr. deputado não voltará de certo a este logar a atacar-me, sem provas, com insinuações injuriosas ao meu caracter honrado, e que por isso constituem tambem uma offensa á representação nacional e aos principios liberaes (apoiados geraes).

Prende-me a este logar a expressiva manifestação com que ainda ha pouco a maioria da camara fortaleceu o governo de que tenho a honra de fazer parte (apoiados).

Vozes: — Muito bem.

Mas a circumstancia de me achar n'estas cadeiras, será uma rasão para eu ser tratado de uma maneira inqualificavel? (Apoiados.) E por esta circumstancia, hei de ficar collocado na degradante posição de ouvir tudo quanto se queira dizer de mim, sem protestar energicamente contra os ataques, dos quaes ninguem toma a responsabilidade, feitos á minha honra e á seriedade do meu caracter? Não, sr. presidente, não consentirei em tal (muitos apoiados), porque se o consentisse auctorisava esses excessos e auctorisava essas atrozes e immerecidas censuras que me têem sido dirigidas.

Vozes: — Muito bem).

Espere o sr. deputado pelos meus actos. Se elles lhe não agradarem, combata-me então, combata-me e guerreie-me sem me dar quartel, porque usa então de um direito que ninguem lhe poderá contestar (apoiados). De outro modo tal procedimento é inadmissivel (apoiados).

Os homens que vem sentar-se n'estas cadeiras não podem ser recebidos como eu o tenho sido pelo sr. deputado a que respondo (apoiados). A dignidade do logar que represento pede todo o respeito e consideração da parte de qualquer membro d'esta casa (repetidos apoiados), nem nenhum homem politico pôde applaudir esses desvairamentos da paixão partidaria (apoiados). Se não ficasse lavrado um protesto energico contra o procedimento havido ultimamente n'esta camara, nenhum homem honrado quereria ámanhã vir sentasse n'estas cadeiras (apoiados).

È me extremamente doloroso fallar assim, sr. presidente, mas como conter-me? (Apoiados.)

Vozes: — Tem rasão, tem rasão.

Concluo repetindo o que já disse: sou pobre, mas honrado; nunca hei de deixar de o ser (apoiados), e nada ha n'este mundo que me desvie da senda para onde a minha educação, os meus sentimentos e a minha consciencia, tranquilla e satisfeita, me tem guiado até hoje e não me ha de deixar afastar nunca (muitos apoiados).

Vozes: — Muito bem.

Peço perdão á camara de lhe roubar o tempo, mas ella reconhece certamente que eu não podia ouvir em silencio taes offensas sem me desaggravar, como o exigia a minha propria dignidade e a do logar que occupo (apoiados).

Vozes: — Muito bem, muito bem.

(Agitação na assembléa.)

O sr. Presidente: — A hora está adiantada e por isso vou levantar a sessão. A ordem do dia para ámanhã é a mesma que vinha para hoje.

Está levantada a sessão.

Eram quasi quatro horas da tarde.

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