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SESSÃO DE 5 DE JULHO DE 1890
Presidencia do exmo. sr. Pedro Augusto de Carvalho
Secretarios - os exmos srs.
José Joaquim de Sousa Cavalheiro
Antonio Teixeira de Sousa
SUMMARIO
Dá-se conhecimento dos seguintes officios: dois do ministerio do reino, sobre a ceremonia da imposição do barrete cardinalício ao cardeal Vannutelli, nuncio apostolico n'esta côrte; um do ministerio da marinha, remettendo exemplares da carta de Moçambique; do centro commercial do Porto, acompanhando uma representação contra o imposto addicional de 6 por cento, e pedindo modificações em varios ramos do serviço publico; da liga dos lavradores do Baixo Alemtejo, acompanhando uma representação contra o mesmo imposto; do sr. deputado Ignacio José Franco, sobre justificação de faltas; do digno par visconde de Soares Franco, acompanhando um requerimento; e do cardeal Vannutelli, convidando os srs. deputados para a sua soirée de 6 do corrente, desculpando-se de o não fazer individualmente. - Segunda leitura e admissão do projecto de lei n.° 67, de 1889, em renovação de iniciativa do sr. Ferreira de Almeida, sobre a antiguidade, para os effeitos da promoção e reforma, do segundo official do corpo de officiaes de fazenda da armada, Antonio Allemão de Mendonça. - Diversas representações apresentadas pelo sr. presidente e pelos srs. Adriano Monteiro, Eduardo Coelho, Ressano Garcia, Teixeira de Vasconcellos, Soares de Albergaria e Santos Viegas; e duas, remettidas em officios, da liga regional e do centro commercial do Porto. - Requerimento de interesse publico mandado para a mesa pelo sr. Roberto Alves. - Requerimento de interesse particular apresentado pelo sr. Ressano Garcia; e outro, enviado em officio pelo digno par visconde de Soares Franco. - Justificação de faltas do sr. Mascarenhas Pedroso. - O sr. Almeida e Brito renova o pedido de explicações que fizera ao sr. ministro do reino, ácerca do administrador do concelho de Penafiel. - O sr. ministro da fazenda promette transmittir ao seu collega do reino o pedido do sr. Almeida e Brito. - O sr. Germano de Sequeira chama a attenção do governo para os prejuizos que está soffrendo a classe dos pescadores com a pesca feita pelos barcos a vapor. - Responde-lhe o sr. ministro da fazenda, e promette transmittir ao seu collega da marinha as considerações do illustre deputado. - Chama o sr. Elmano da Cunha a attenção do governo para as condições hygienicas de Lisboa e do hospital de S. José, e faz largas considerações sobre o assumpto, a que responde o sr. ministro da fazenda. - O sr. Alpoim de Menezes faz diversas ponderações sobre os prejuizos provenientes do emprego dos barcos a vapor na industria da pesca. - Insiste o ar. Adriano Monteiro na necessidade dos documentos que pedira Acerca da direcção geral de agricultura, e apresenta um projecto de lei anctorisando a camara de Vianna do Alemtejo a desviar certa quantia do fundo de viação. - O sr. Alves Bebiano apresenta dois projectos de lei, um creando mais uma assembléa eleitoral no concelho de Pedrogão Grande, e outro creando mais uma assembléa eleitoral no concelho de Figueiró dos Vinhos.
Na ordem do dia continua a discussão do projecto de lei n.º 120, addicional de 6 por cento, defendendo-o largamente o sr. Teixeira de Vasconcellos. - Usa da palavra, combatendo o projecto, o sr. Paulo Cancella. - Responde-lhe o sr. Sergio de Castro. - Nomeia o sr. presidente a deputação que deve assistir á ceremonia da imposição do barrete cardinalicio no cardeal Vannutelli.
Abertura da sessão - Ás duas horas e meia da tarde.
Presentes á chamada 52 srs. deputados. São os seguintes: - Adriano Augusto da Silva Monteiro, Albino de Abranches Freire de Figueiredo, Alexandre Maria Ortigão de Carvalho, Amandio Eduardo da Motta Veiga, Antonio Augusto Correia da Silva Cardoso, Antonio de Azevedo Castello Branco, Antonio Fialho Machado, Antonio Maria Cardoso, Antonio Maria Pereira Carrilho, Antonio Ribeiro dos Santos Viegas, Antonio Sergio da Silva e Castro, Antonio Teixeira de Sousa, Arthur Alberto de Campos Henriques, Arthur Hintze Ribeiro, Augusto Cesar Elmano da Cunha e Costa, Bernardino Pacheco Alves Passos, Carlos Lobo d'Avila, Custodio Joaquim da Cunha e Almeida, Eduardo Augusto da Costa Moraes, Eduardo José Coelho, Eugenio Augusto Ribeiro de Castro, Feliciano Gabriel de Freitas, Fortunato Vieira das Neves, Francisco de Almeida e Brito, Francisco Antonio da Veiga Beirão, Francisco José Machado, João Ferreira Franco Pinto Castello Branco, João de Paiva, João Pereira Teixeira de Vasconcellos, João Pinto Moreira, João de Sousa Machado, Joaquim Germano de Sequeira, José de Alpoim de Sousa Menezes, José Antonio de Almeida, José Bento Ferreira de Almeida, José Christovão Patrocinio de S. Francisco Xavier Pinto, José Estevão de Moraes Sarmento, José Gregorio de Figueiredo Mascarenhas, José Joaquim de Sousa Cavalheiro, José Júlio Rodrigues, José Maria Charters Henriques de Azevedo, José Maria de Oliveira Peixoto, José Maria Pestana de Vasconcellos, José Maria de Sousa Horta e Costa, José Monteiro Soares de Albergaria, José Victorino de Sousa e Albuquerque, Julio Antonio Luna de Moura, Luciano Cordeiro, Luiz de Mello Bandeira Coelho, Luiz Virgilio Teixeira, Manuel Constantino Theophilo Augusto Ferreira, Marcellino Antonio da Silva Mesquita, Matheus Teixeira de Azevedo, Pedro Augusto de Carvalho, Pedro Ignacio de Gouveia, Roberto Alves de Sousa Ferreira, Thomás Victor da Costa Sequeira e Visconde de Tondella.
Entraram durante a sessão os srs.: - Abilio Eduardo da Costa Lobo, Abilio Guerra Junqueiro, Agostinho Lucio e Silva, Alberto Augusto de Almeida Pimentel, Alexandre Alberto da Rocha Serpa Pinto, Alfredo Mendes da Silva, Alvaro Augusto Froes Possollo de Sousa, Antonio Baptista de Sousa, Antonio Eduardo Villaça, Antonio Jardim de Oliveira, Antonio José Arroyo, Antonio José Lopes Navarro, Antonio Manuel da Costa Lereno, Antonio Maria Jalles, Augusto José Pereira Leite, Augusto Maria Fuschini, Barão de Paçô Vieira (Alfredo), Bernardino Pereira Pinheiro, Caetano Pereira Sanches de Castro, Carlos Roma du Bocage, Christovão Ayres de Magalhães Sepulveda, Eduardo Augusto Xavier da Cunha, Fernando Mattozo Santos, Fernando Pereira Palha Osorio Cabral, Fidelio de Freitas Branco, Francisco de Castro Mattozo da Silva Corte Real, Francisco Felisberto Dias Costa, Francisco Joaquim Ferreira do Amaral, Francisco Severino de Avellar, Francisco Xavier de Castro Figueiredo de Faria, Frederico Ressano Garcia, Guilherme Augusto Pereira de Carvalho de Abreu, Ignacio Emauz do Casal Ribeiro, Jacinto Cândido da Silva, João Alves Bebiano, João Marcellino Arroyo, João Maria Gonçalves da Silveira Figueiredo, Joaquim Alves Matheus, Joaquim Ignacio Cardoso Pimentel, Joaquim Pedro de Oliveira Martins, José Augusto Soares Ribeiro de Castro, José Dias Ferreira, José Elias Garcia, José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral, José Maria Greenfield de Mello, José Maria Latino Coelho, José Paulo Monteiro Cancella, Julio César Cau da Costa, Manuel Affonso Espregueira, Manuel de Arriaga, Manuel d'Assumpção, Manuel Francisco Vargas, Manuel Pinheiro Chagas e Miguel Dantas Gonçalves Pereira.
Não compareceram á sessão os srs.: - Adolpho da Cunha Pimentel, Adriano Emilio de Sousa Cavalheiro, Albano de Mello Ribeiro Pinto, Alfredo Cesar Brandão, Antonio José Ennes, Antonio Costa, Antonio Mendes Pedroso, Antonio Pessoa de Barros e Sá, Aristides Moreira da Motta, Arthur Urbano Monteiro de Castro, Augusto Carlos de Sousa Lobo Poppe, Augusto da Cunha Pimentel, Columbano Pinto Ribeiro de Castro, Conde do Covo, Conde de Villa Real, Eduardo Abreu, Eduardo de Jesus Teixeira, Elvino José de Sousa e Brito, Emygdio Julio
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Navarro, Estevão Antonio de Oliveira Junior, Francisco de Barros Coelho e Campos, Francisco José de Medeiros, Frederico de Gusmão Corrêa Arouca, Henrique da Cunha Matos de Mendia, Ignacio José Franco, Jayme Arthur da Costa Pinto, João de Barros Mimoso, João José d'Antas Souto Rodrigues, João Pinto Rodrigues dos Santos, João Simões Pedroso de Lima, Joaquim Simões Ferreira, Joaquim Teixeira Sampaio, José de Abreu do Couto Amorim Novaes, José Alvos Pimenta de Avellar Machado, José de Azevedo Castello Branco, José Domingos Ruivo Godinho, José Frederico Laranjo, José Freire Lobo do Amaral, José Gonçalves Pereira dos Santos, José Luiz Ferreira Freire, José Maria dos Santos, José do Vasconcellos Mascarenhas Pedroso, Lourenço Augusto Pereira Malheiro, Luciano Affonso da Silva Monteiro, Luiz Augusto Pimentel Pinto, Luiz Gonzaga dos Reis Torgal, Manuel de Oliveira Aralla e Costa, Manuel Thomás Pereira Pimenta de Castro, Manuel Vieira de Andrade, Marianno Cyrillo de Carvalho, Marquez de Fontes Pereira de Mello, Pedro de Lencastre (D.), Pedro Victor da Costa Sequeira, Sebastião de Sousa Dantas Baracho e Wenceslau de Sousa Pereira Lima.
Acta - Approvada.
EXPEDIENTE
Officios
Do ministerio do reino, participando que no dia 6 do corrente mez, pelas onze horas da manhã, deve ter logar na real capella do paço da Ajuda a ceremonia da imposição do barrete cardinalicio ao cardeal Vanutelli, nuncio apostolico nesta corte, dando Sua Magestade ElRei, em seguida a este acto, audiência publica no paço da Ajuda ao novo cardeal, e que na referida capella haverá logares reservados para os membros d'esta camara.
Para a secretaria.
Do mesmo ministerio, participando que a ceremonia da imposição do barrete cardinalicio ao cardeal Vanutelli deve ter logar na real capella do paço da Ajuda, no dia 6 do corrente, pela hora do meio dia, e não ás onze horas, como fez constar no seu officio datado de hontem.
Para a secretaria.
Do ministerio da marinha, remettendo 100 exemplares da carta da provincia de Moçambique.
Para a secretaria.
Do centro commercial do Porto, acompanhando uma representação contra o imposto addicional de 6 por cento e pedindo modificações em varios ramos de serviço publico.
Para a secretaria.
Da liga regional dos lavradores do baixo Alemtejo, acompanhando uma representação contra a proposta da lei n.° 113-H, addicional de 6 por cento.
Para a secretaria.
Do sr. deputado Ignacio José Franco, participando que por motivo de doença não tem podido comparecer nas ultimas sessões da camara, e que pelo mesmo motivo faltará a mais algumas.
Para a secretaria.
Do digno par do reino visconde de Soares Franco, remettendo um requerimento em que pede ao parlamento, a quem compete a interpretação das leis, haja de tomar uma resolução da defeza da sua prerogativa politica como par do reino e dos direitos individuaes dos membros da marinha militar portugueza.
Para a commissão de petições.
O seguinto do sr. cardeal Vannutelli:
Excellence. - J'ai l'homeur de prier votre excellence de vouloir bien passer chez moi la soirée de dimanche, 6 courant, jour où aura bien la remise de ma barrette cardinalice par Sa Magesté le Roi, au palais d'Ajuda.
Le temps étant trop restreint pour adresser une invitation speciale à chacun des deputés de la nation portugaise, je prie votre excellence do vouloir bien profiter de la réuniou de la chambre qu'elle préside si dignement, pour les inviter tous, eu mon nom, et leur dire que je se-rais enchanté de lês reunir dans la même soirée, à 8 1/2 heures.
En vous remerciant davance, je vous prie, mr. le president, d'agreer l'expression de ma haute considération.
Lisbonne, le 4 juillet 1890. - De votre excellence, le tres dévoué serviteur, Vincenzo Card. Vannutelli, prononce apostolique. - Son excellence mr. le président de la chambre de deputés à Lisbonne.
Para a secretaria.
Segundas leituras
Proposta para renovação de iniciativa
Renovo a iniciativa do projecto de lei n.° 67 de 1889, da commissão de marinha.
Sala das sessões, em 4 de julho de 1890. = J. B. Ferreira de Almeida.
Lida na mesa foi atdmittida e enviada á commissão de marinha.
Esta renovação refere-se ao seguinte:
Senhores. - A vossa commissão de marinha foram presentes os requerimentos dos segundos officiaes de fazenda Antonio Allemão de Mendonça e Joaquim Antonio Correia, em que o primeiro pede seja reparado o prejuizo que tem soffrido na sua collocação na escala, que o segundo contradicta, allegando apenas a prescripção.
Entende a vossa commissão, que em boa regra é preciso estabelecer e manter a disposição do direito de reclamação em tempo opportuno, mas não é menos certo, que no caso sujeito o primeiro supplicante teve que occupar-se, nas suas reclamações, de obter do poder executivo a sua conservação na classe que occupava, e equivalente na do novo corpo em que fôra encorporado o pessoal do quadro anterior, de que o supplicante fazia parte.
O segundo supplicante reconhece, que ao primeiro não faltam as qualidades, que eram requisito essencial para a sua admissão no quadro, e admitte a possibilidade da omissão, casual, ou da injustiça; fundando apenas o seu protesto no longo lapso de tempo decorrido desde a preterição.
O primeiro supplicante allega, o prova por documento authentico, e bem assim pela informação do governo em officio n.º 281 de 24 de fevereiro de 1888, que á data de ser promulgada a nova organisação, que o desattendeu, decreto de 20 de junho de 1867 e decreto de 3 de outubro de 1867 que nomeou o pessoal, se achava fóra de Lisboa, por ter embarcado, saindo a barra a 19 de janeiro de 1865, e apresentando-se em Lisboa a 12 de agosto de 1869.
O artigo 32.º da organisação de 1867 concedia a admissão, sem concurso, no quadro dos aspirantes de 2.ª classe do corpo de officiaes de fazenda da armada, aos aspirantes supranumerarios que existiam á data da publicação da nova lei, desde que tivessem mostrado que possuiam a aptidão necessária para bem desempenharem o serviço que lhes compete. Mal se comprehende, portanto, que outros supranumerarios como o primeiro supplicante, o com data de admissão ao serviço naval mais moderna do que a d'elle, o preterissem, e são estes os seguintes:
Francisco Antonio Gonçalves Cardoso, 3 de outubro de 1865;
Joaquim Antonio Correia, 2 de junho de 1866;
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Joaquim Antonio de Sequeira Brito, 28 de janeiro de 1868;
Antonio Allemão de Mendonça, 29 de novembro de 1864.
Se se notar que, marcando a disposição da nova lei que regulava a inscripção, artigo 32.°, apenas a prova de aptidão, mal se comprehende igualmente que, reconhecida ella, como foi, para admittirem o primeiro supplicante como addido, pela disposição do artigo 36.°, e necessariamente demonstrada no serviço do embarque e da Cotação naval de Angola, que desempenhou desde 19 de janeiro de 1865 até 24 de julho de 1869, isto é, durante quatro annos e meio consecutivos, só se póde e deve attribuir a omissão casual, a sua não inscripção em tempo competente, e na devida altura, quando se organisou o novo quadro, epocha em que o supplicante se achava ausente de Lisboa, vindo confirmar esta hypothese a declaração do officio n.° 281 de 24 de fevereiro de 1888 quando diz:
«Das rasões de preferencia que houve então para a admissão dos quatro aspirantes supranumerarios no quadro não é possivel julgar hoje, passados vinte annos.»
Como as rasões de preferencia deviam constar de um processo ou proposta devidamente informada, o que se conclue d'esta allegação do officio, é que, o não houve, e a promoção e admissão se fez por uma simples indicação ou proposta de nomes, não he incluindo o do primeiro reclamante por omissão casual, vindo confirmar ainda este modo de apreciar a questão, a referencia que no officio já citado se faz, do que, tendo o primeiro reclamante requerido a sua admissão no quadro quando chegou a Lisboa em 1869, por lhe terem dado a collocação de simples escrevente, o seu requerimento foi indeferido, com o fundamento de que a lei prohibia a admissão de empregados supranumerarios, mas que deveria ser admittido na primeira vacatura que occorresse.
É de notar que se tenha encontrado o despacho da primeira petição do primeiro reclamante, e sendo de um periodo proximo a proposta de admissão no novo quadro, em que o primeiro reclamante ficou preterido, essa proposta ou processo não appareça.
Por todas estas rasões deve concluir-se que o primeiro reclamante foi preterido e prejudicado na sua devida collocação na escala, por omissão que deve suppor-se casual; e mal parecendo que outros logrem, como beneficio, do prejuizo illegitimo e injusto de terceiro, deve ser attendida a petição do primeiro reclamante, e desattendida a do segundo.
A adopção d'este principio importa para tres segundos officiaes o retardamento de um numero para a promoção ao posto immediato; se se considerar, porém, que até agora têem gosado antecipadamente a promoção para um numero mais cedo em tres postos, o primeiro reclamante obtém mais a reparação de uma injustiça, do que a indemnisação de um prejuizo.
N'estes termos a vossa commissão, ouvido o governo, entende que deve merecer a approvação da camara o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.º A ordem de antiguidade e inscripçâo na lista da armada, para todos os effeitos de promoção e reforma, do segundo official do corpo de officiaes de fazenda da armada Antonio Allemão de Mendonça é immediatamente a esquerda do official da mesma categoria Antonio Augusto Barradas Guerreiro, com respeito á sua actual collocação na escala.
Art. 2.º Fica revogada a legislação em contrario.
Sala das sessões, em 12 de junho de 1889. = J. Simões Dias, presidente = Antonio Maria Dias Pereira Chaves Mazziotti = A. Victor dos Santos = Antonio Maria Jalles = Luiz da Cunha Mancellos = João Cardoso Valente = A. Baptista de Suusa = F. J. Machado = Augusto Ribeiro = Joaquim H. Veiga = J. B. Ferreira de Almeida.
REPRESENTAÇÕES
Da camara municipal de Vianna do Alemtejo, pedindo auctorisação para desviar do fundo de viação a quantia de 886$905 réis, em deposito na caixa geral, quantia que será applicada em melhoramentos publicos.
Apresentada pelo sr. deputado Adriano Monteiro, enviada á commissão de administração publica, ouvida a de obras publicas, e mandada publicar no Diario do governo.
Da camara municipal de Bragança, contra o imposto addiccional de 6 por cento.
Apresentada pelo sr. deputado Eduardo José Coelho, enviada á commissão de fazenda e mandada publicar no Diario do governo.
Da camara municipal do Redondo e da junta de parochia de Terena, concelho de Alandroal, no sentido da antecedente.
Apresentadas pelo sr. deputado Ressono Garcia, enviadas á commissão de fazenda e mandadas publicar no Diario do governo.
Do centro commercial do Porto, no sentido das antecedentes, e pedindo modificações em varios ramos do serviço publico.
Remettida em officio do mesmo centro commercial. Foi enviada á commissão de fazenda e mandada publicar no Diario do governo.
Da liga de lavradores do baixo Alemtejo, contra o imposto addicional de 6 por cento.
Remettida em officio da mesma liga regional. Foi enviada á commissão de fazenda.
Da camara municipal de Bragança, pedindo a construcção dos caminhos de ferro que fazem parte da rede ao norte do Mondego e que interessam aquella região.
Apresentada pelo sr. deputado Eduardo José Coelho, enviada á commissão de obras publicas, ouvida a de fazenda, e mandada publicar no Diario do governo.
Da camara municipal do concelho de Azambuja, protestando contra as palavras proferidas em sessão de 1 do corrente pelo sr. deputado Francisco José Machado, relativamente a umas obras mandadas fazer pelo governo n'aquelle concelho.
Apresentada pelo sr. deputado Soares de Albergaria, enviada á secretaria e mandada publicar no Diario do governo.
Da camara municipal do concelho de Azambuja, protestando contra as palavras proferidas em sessão de 1 do corrente pelo sr. deputado Francisco José Machado, relativamente a umas obras mandadas fazer pelo governo n'aquelle concelho.
Apresentada pelo sr. deputado Soares de Albergaria, enviada á secretaria e mandada publicar no Diario do governo.
Da camara municipal de Tarouca contra o imposto addicional de 6 por cento.
Apresentada pelo sr. deputado Santos Viegas, enviada á commissão de fazenda e mandada publicar no Diario do governo.
De officiaes de diligencias do juizo de direito da comarca de Vouzella, pedindo melhoramento de situação.
Apresentada pelo sr. deputado Teixeira de Vasconcellos e enviada á commissão de petições.
REQUERIMENTO DE INTERESSE PUBLICO
Requeiro que, pelo ministerio da fazenda, sejam enviados com urgencia a esta camara os documentos seguintes com relação á administração geral dos tabacos e ao período decorrido desde o 1.º de julho de 1889 até 30 de junho de 1890:
1.° Nota das quantias despendidas com os addidos conservados por virtude da base 9.º da lei de 22 de maio de 1888 que excedem os quadros fixados pela administração em 20 de julho de 1890;
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2.° Quantidades de tabacos manipulados discriminados por grupos de producção com os respectivos valores;
3.° Quantidades recambiadas á administração e seus valores;
4.° Quebra do tabaco em bruto na manipulação dos diversos grupos de producção;
5.º Quantidades de tabaco em rama consumido na producção e seu custo, discriminando as quantidades e custo do do Douro adquirido pela régie;
6.º Custo da producção fabril por grupos de productos;
7.° Vendas triinestraes de productos - quantidades e valores:
a) Na zona fiscal;
b) Na venda ordinaria;
c) Nas ilhas adjacentes;
d) No ultramar;
e) Quaesquer outras;
8.º Lucros liquidos escripturados pelo fabrico e venda de tabacos;
9.° Importancia dos direitos aduaneiros cobrados no continente e nas ilhas com designação das quantidades, e provenientes do despacho de tabacos.
Requeiro tambem que sejam enviados para a mesa todos os esclarecimentos que no parecer n.° 141 se declara terem sido presentes á commissão de fazenda, sobre o projecto de lei referente ao monopólio dos tabacos. = O deputado, Roberto Alves.
Mandou-se expedir.
REQUERIMENTOS DE INTERESSE PARTICULAR
De José Silverio de Sousa, tenente do estado maior de infanteria, pedindo que se lhe torne extensiva, para os effeitos da reforma, a disposição do § 3.° do artigo 85.º do regulamento disciplinar do exercito, approvado por decreto de 15 de dezembro de 1875.
Apresentado pelo sr. deputado Ressano Garcia e enviado á commissão de guerra, ouvida a de fazenda.
Do digno par do reino visconde de Soares Franco, primeiro tenente da armada, pedindo que o parlamento, a quem compete a interpretação das leis, haja de tomar uma resolução da defeza da sua prerogativa politica como par do reino e dos direitos individuaes dos membros da marinha portugueza.
Remettido em officio. Foi enviado á commissão de petições.
JUSTIFICAÇÃO DE FALTAS
Participo a v. exa. e á camara que o sr. deputado José de Vasconcellos Mascarenhas Pedroso tem faltado ás sessões e continuará a faltar por motivo de doença. = O deputado, Santos Viegas.
Para a secretaria.
O sr. Presidente: - Foi-me dirigido um officio com uma representação do sr. visconde de Soares Franco, para ter o devido destino.
Os srs. deputados que approvam que ella seja publicada no Diario do governo, tenham a bondade, de se levantar.
Está approvada. Vae ser remettida á commissão de petições.
Peço a attenção da camara.
Na mesa receberam-se dois officios do ministerio do reino, participando que amanhã, pelas doze horas da manhã, ha de ter logar, no palacio da Ajuda, a ceremonia da imposição do barrete cardinalicio ao sr. cardeal Vannutelli, nuncio de Sua Santidade n'esta côrte.
Creio que a camara estará de accordo em que se nomeie uma grande deputação para assistir a este acto. (Apoiados.)
Por esta occasião participo tambem á camara, que s. ema., por intermedio do ministerio dos negocios estrangeiros, pediu para fazer constar aos srs. deputados que ámanhã á noite haveria recepção no palacio da nunciatura.
S. ema. pede-me para era seu nome convidar os srs. deputados a comparecerem nessa recepção, visto não poder, em consequência da estreiteza do tempo dirigir convite especial a cada um.
A commissào de redacção não fez alteração ao projecto n.° 134.
Vae ler-se a proposta do sr. Manuel de Arriaga.
É a seguinte:
Proposta
Para regularisarem-se melhor as discussões parlamentares e dar-se as minorias garantia efficaz ao direito indiscutivel que lhes assiste de intervindo nos debates e emittindo n'elles as suas opiniões, definirem perante o paiz as suas responsabilidades: proponho que, sempre que haja atropellamento no pedir da palavra, e se torne por isso difficil a sua inscripção pela verdadeira ordem por que fôra pedida, seja a presidencia auctorisada a inscrever os oradores pelos grupos politicos representados nesta casa, intercallando successivamente grupo a grupo, seguindo se os mais oradores no uso da palavra pela ordem por que a forem pedindo. = O deputado por Lisboa, Manuel de Arriaga.
O sr. Presidente: - Como esta proposta altera as disposições do regimento, se for admittida, tem de ser enviada á commissão do regimento. Eu vou consultar a camara.
Consultada a camara sobre a proposta, esta foi admittida.
O sr. Almeida e Brito: - Pedi a palavra para renovar um pedido que tenho dirigido já por duas vezes ao sr. ministro do reino.
Não vejo s. exa. presente, e ha muito tempo que não vem a esta casa. Todavia não posso deixar de chamar a attenção de s. exa. para os factos graves que se estão dando no concelho de Penafiel, originados por uma auctoridade que está pronunciada por abusos das suas funcções.
Já por duas vezes pedi a attenção do sr. ministro do reino para este assumpto, mas até hoje não me consta que s. exa. se tenha apresentado n'esta camara para me responder.
Tenho encarregado o sr. Arroyo de transmittir as minhas considerações ao sr. presidente do conselho, mas tenho sido completamente infeliz. Agora peço ao sr. ministro da fazenda que transmitia ao sou collega do reino as minhas considerações, a fim de s. exa. tomar providencias para que aquelle concelho entre na ordem.
Não me parece rasoavel que esteja exercendo as suas funcções uma auctoridade pronunciada por abusos que commetteu no exercicio do seu cargo.
Comprehendo que s. exa. o não demitta, porque é possivel que o processo esteja pendente, por se ter interposto recurso da pronuncia para os tribunaes de segunda instancia; mas o que devia estar ha muito tempo era suspenso.
Peço ao sr. ministro da fazenda o favor de transmittir ao sr. ministro do reino as minhas considerações, a fim de ver se s. exa. adopta algumas providencias, que se me afiguram de toda a urgencia.
O sr. Ministro da Fazenda (Franco Castello Branco): - Em primeiro logar direi ao illustre deputado que communicarei ao sr. ministro do reino as considerações de s. exa. Em segundo, como s. exa. sabe, e tem ao seu lado um magistrado competentissimo que o póde affirmar, o despacho de pronuncia, emquanto não transita em julgado, não produz effeitos juridicos, nem póde produzir.
Certamente por este ou por igual motivo o sr. ministro do reino não tomou já qualquer providencia a esse respeito.
(S. exa. não reviu esta declaração.)
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O sr. Eduardo José Coelho: - Mando para a mesa duas representações da camara municipal de Bragança, uma contra a proposta ministerial em discussão, o addicional de 6 por cento, e outra relativamente a caminhos de ferro, que directamente interessam ao districto de Bragança, ao paiz, e especialmente á capital do districto. Estão redigidas em termos dignos, e por isso peço a v. exa. se digne consultar a camara para serem publicadas no Diario do governo.
Pelo que respeita á representação contra o addicional, não preciso agora justifical-a: a camara conhece a minha altitude, e na sessão nocturna de 4 do corrente largamente combati similhante augmento de imposto, que reputo desigual e iniquo. (Apoiados.) Dos caminhos de ferro, a que allude a representação da camara municipal, occupar-me-hei em breve, e com particular attenção.
Para tratar d'estes e de outros assumptos, preciso da presença do sr. ministro das obras publicas. Pedia ao sr. ministro da fazenda a fineza de prevenir o seu collega, de que espero que elle compareça sem demora n'esta camara antes da ordem do dia.
Tenho dito.
O sr. Ministro da Fazenda (Franco Castello Branco): - Tenho unicamente a declarar no sr. Eduardo Coelho que transmittirei ao meu collega o pedido de s. exa.
O sr. Germano de Sequeira: - Não vejo presente o sr. ministro da marinha, a quem desejava fazer algumas observações ácerca de um assumpto importante; todavia, como está presente o sr. ministro da fazenda, peço a s. exa. que communique ao seu collega aquillo que vou dizer.
Ha uma classe de cidadãos d'este paiz que está soffrendo as angustias e os horrores da miséria e da fome.
Esta classe é a dos trabalhadores do mar; é a dos pescadores.
Estes homens, que arriscam muitas vezes a vida na furia das vagas, vêem-se altamente prejudicados nos seus interesses, porque os barcos a vapor empregados ultimamente rui pesca os impossibilitam quasi completamente de angariarem os meios de subsistencia para si e para as suas familias.
O sr. Francisco Machado: - Apoiado.
O Orador: - O codigo civil diz no seu artigo 395.º que a todos os cidadãos é licito pescarem nas aguas publicas, salvas as restricções dos regulamentos administrativos.
Ora, já se vê que, sendo licito a todos pescarem nas aguas publicas, a ninguem é licito prejudicar os direitos dos outros.
Se porventura a empreza dos barcos a vapor póde pescar livremente dentro da área costeira, e a área costeira é aquella que se comprehende dentro do espaço que se pude percorrer ao alcance do canhão, tambem aos pescadores é licito pescarem n'essa área.
A todos é licito pescarem, mas o que de modo algum deve ser permittido é que a empreza dos barcos a vapor arranje para si uma espécie de privilegio da pesca usando de meios e de redes taes que os pescadores fiquem em condições de não poderem adquirir os meios de subsistência para si e para os seus.
Eu sei que já se têem dado indemnisações a alguns pescadores, mas essas indemnisações não satisfazem, porque são de momento e não permanentes, quando o mal é permanente.
Desejava portanto chamar a attenção do sr. ministro da marinha para que olhasse com olhos de protecção e mesmo com olhos de commiseração para esta classe, que é eminentemente desgraçada, sendo ao mesmo tempo valente e afrontando todos os perigos para ganhar os meios de vida.
É vulgar, não se dando mesmo estas circumstancias, verem-se os pescadores, n'uma certa epocha do anno em que escasseia o peixe, privados dos meios de vida ; mas agora, desde que a pesca é feita pelos vapores, acham-se completamente prejudicados e torna-se necessario de prompto occorrer a este grande mal por uma fórma qualquer.
Para este fim e que desejava chamar a attenção do sr. ministro da marinha, porque estou certo que s. exa. ha de tomar em consideração estas observações, que são de todo o ponto importantes; como porem s. exa. não está presente, peço ao sr. ministro da fazenda para ter a bondade de as communicar ao seu collega, no sentido de obviar quanto possivel a esse grande mal, dando toda a protecção a esta classe tão desgraçada. (Apoiados.)
(S. exa. não reviu.)
O sr. Ministro da Fazenda (Franco Castello Branco): - Pedi a palavra para declarar ao illustre deputado que communicarei ao meu collega as observações de s. exa. A questão é grave e importante, não só porque são numerosos os individuos a quem ella diz respeito, mas especialmente pelas condições em que esses individuos empregam a sua actividade e o seu trabalho. (Apoiados.)
Estou intimamente convencido de que o sr. ministro da marinha ha de ouvir com interesse as considerações do illustre deputado, e, se não tratou já d'esse assumpto, ha de por certo estudal-o cuidadosamente, em harmonia com o bem estar dos interessados.
(S. exa. não reviu.)
O sr. Presidente: - Acha-se nos corredores da camara o sr. deputado já proclamado, Joaquim Alves Matheus; convido os srs. Julio de Moura e Silva Cardoso a introduzirem-no na sala.
Em seguida foi introduzido na sala, prestou juramento e tomou assento o sr. Joaquim Alves Matheus.
O sr. Ressano Garcia: - (O discurso será publicado na integra e em appendice a esta sessão, quando s. exa. tenha revisto as respectivas notas tachyyraphicas.)
O sr. Elmano da Cunha: - Sr. presidente, uso da palavra para fazer ao governo uma simples indicação, que acompanharei de breves reflexões.
Esta indicação é da minha parte um acto de coherencia. Quando em 1879 se inaugurava a epocha dos grandes melhoramentos da capital, dizia ca em junta geral do districto, de que então fazia parte, que esses melhoramentos deviam iniciar-se por um começo de canalisação modelo e pela creação de um estabelecimento sanitario que pela escolha do local, pela vastidão e desenho do edificio e suas dependencias, e pela organisação technica de todos os serviços, respondesse larga, ampla e condignamente ás necessidades da população e a todas as exigencias da sciencia e hygiene modernas.
É n'isto que venho hoje insistir perante a camara e perante o governo, de quem exclusivamente depende a satisfação de tão grande necessidade.
Eu tenho, por certo, sr. presidente, que desde ha muitos annos Lisboa mantém a sua população unicamente á custa do seu poder absorvente.
E faço um voto; que alguma grande calamidade sem precedente não venha demonstrar pela eloquencia de algarismos assombrosos nos registos do obituario, que somos um paiz de prevenções singulares: as que visam aos grandes emprehendimentos repentinos, mais ou menos irreflectidos esquecem de que não ha nação, de que a não póde haver, população.
Melhor farei sentir a minha apprehensão, se é que é só apprehensão, dizendo que a falta de braços no paiz se explica mais e melhor pelo poder absorvente da capital do que pela torrente da emigração.
Limito-me a proposições, porque não quero tomar tempo á camara, e peço só aos que cogitam, que as meditem.
O governo sabe que o hospital de S. José é um estabelecimento condemnado em mais de uma condição por successivas direcções, por commissões e pela classe medica de Lisboa em geral. (Apoiados.)
Tenho noticia de que n'este sentido existe no ministerio
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do reino a mais larga informação por dezenas de diplomas.
Portanto, sr. presidente, parece-me que e chegado o tempo do dotar-se a capital com o único estabelecimento de que ella não póde prescindir. (Apoiados.)
Não se trata de uma obra de luxo, de mais um progresso, de um melhoramento superficial, no sentido vago destes termos: trata-se de uma ingente necessidade clamorosa que se contorce e debate em agonias: de um dever imperioso, que se impõe como o mais sagrado e absoluto dos preceitos por todos os titulos e por todos os respeitos humanos, a (malquer governo honesto, como é o actual, de uma sociedade culta, como vae sendo a nossa. (Apoiados.)
Os desgraçados que perderam ou arruinaram a saúde nas engrenagens e affrontamento do trabalho incessante, e que a doença surprehende quasi sempre na miseria, não podem ter menores direitos, e penso que os tem melhores, do que os reprobos acolhidos aos cuidados e á hygiene de um estabelecimento penitenciario de primeira grandeza, ainda dirigido pelo mais zeloso dos homens. (Apoiados.)
Depois, sr. presidente, o estabelecimento a que me refiro significa o unico correctivo, a unica compensação ainda por largo tempo possivel e admissivel ás actuaes condições hygienicas, e ás futuras e cada vez mais graves condições hygienicas de Lisboa.
O saneamento da capital só por meio de uma canalisação modelo conseguirá obter-se; e, ninguem se illuda, essa obra custará milhares de contos, porque importa revolver Lisboa nos seus fundamentos, nos seus ultimos recessos.
Note bem o governo e note a camara que eu não fallo do cholera, eu não temo o cholera, temo-o pelos altos favores hospitaleiros que elle encontraria em Lisboa na sua pouco amável visita, que Deus afaste. (Apoiados.)
No estado presente de cousas, eu considero o cholera como as campanhas do seculo; que devoram milhares de vidas em três ou quatro jornadas, e passaram.
O verdadeiro cholera é aquelle que se esconde furtivamente no ventre de Lisboa, e cujo bacillo em permanente fermentação se aspira a cada momento, e ceifa intempestivamente em dez ou quinze annos um exercito inteiro de operarios, definhando ainda as novas gerações. (Vozes: - Muito bem.)
Abstrahindo, pois, do cholera, um hospital magnifico é uma necessidade que a todas as actuaes de Lisboa de avantaja.
E direi mais: será a maior das necessidades e a mais acertada das prevenções precisamente no momento em que se tratar seriamente da canalisação de Lisboa. As rasões são obvias.
Ora, sr. presidente, o fallecido estadista o sr. Antonio Rodrigues de Sampaio, que sob aquelle aspecto severo, que todos lhe conhecemos, abrigava uma grande alma verdadeiramente humana, tomara a peito o assumpto de que trato, e consta me que se acha feito todo o necessario para metter hombros á empreza.
Porque não ha de pois, começar-se? É uma herança de partido, e o governo que a acceitar corajosamente vinculará o seu nome ao mais util e humanitario dos emprehendimentos. (Apoiados.)
Eu, sr. presidente, comprehendo todas as economias, e muito melhor depois dos brilhantissimos discursos que ouvi, principalmente os do meu illustre amigo o sr. ministro da fazenda (Apoiados.), cujo elogio não faço porque receio não ter intelligencia ou não ter palavras que possam pintar ao justo os quilates de um talento que se accentua de hora a hora de um modo excepcional. (Apoiados.) O sou ultimo discurso ha de ficar nos annaes parlamentares como ficam as collinas isoladas no meio de rara campina, embora bella e fertil. Mas, sr. presidente, a primeira economia que comprehendo, é a economia de vidas e saude de uma população por varios motivos depauperada, das ultimas camadas sociaes, primeiras pelo trabalho, a preço de todos os sacrificios.
E eu creio que penso tão acertadamente n'este assumpto, que a todos farei justiça affirmando que nem um só membro do parlamento regateará ao governo as auctorisações e meios para essa obra tão necessaria que chega a ser uma vergonha, quando não uma impiedade a falta d'ella. (Apoiados.)
E espero, portanto, que o governo trará ao parlamento uma proposta de lei que satisfaça á inadiavel necessidade que apenas esbocei, porque não precisa mais.
Vozes: - Muito bem.
O sr. Ministro da Fazenda (Franco Castello Branco): - Agradeço as phrases amaveis que o illustre deputado me dirigiu e que só posso attribuir á sua delicadeza e á amisade que me dispensa.
Emquanto ao assumpto a que s. exa. se referiu, devo dizer que o sr. ministro do reino tem muito a peito a necessidade da creação de um estabelecimento nas condições a que alludiu o illustre deputado, e em occasião opportuna s. exa. virá a esta camara para expor largamente o seu pensamento a este respeito.
O sr. Mattozo Santos: - (O discurso será publicado em appendice a esta sessão, quando s. exa. devolver as notas tachygraphicas.)
O sr. Alpoim. de Menezes: - Pedi a palavra para me referir a um assumpto importante, e que póde occasionar os mais serios e graves conflictos.
É relativamente ao mesmo assumpto a que já hoje aqui se referiu, e muito bem, o meu illustre collega o sr. Germano de Sequeira.
Em um telegramma dirigido do Porto a um jornal d'esta cidade, lê-se uma noticia relativa a Vianna do Castello, cujo circulo tenho a honra de representar nesta casa.
Peço licença, sr. presidente, a v. exa. e á camara, para ler esse telegramma.
Diz assim:
«A classe piscatoria de Vianna foz hoje grande motim, em consequencia de se effectuar a primeira experiencia do vapor destinado á pesca, comprado por uma empreza ultimamente organisada n'aquella cidade. Os pescadores quiseram assaltar o vapor. Compareceram no cães forças de policia e infanteria n.° 3, que dispersaram os amotinados.»
Como v. exa. e a camara comprehendem, isto é serio e grave. Sei bem que este novo systema de pesca tem sido mal recebido por todo o paiz, especialmente pelas povoações da beira-mar, que são as mais interessadas n'este assumpto.
É certo que a pesca a vapor vem prejudicar consideravelmente uma classe pobre, como é a dos pescadores, que é digna e merecedora, por todos os titulos, da attenção dos poderes publicos. (Apoiados.)
Por esta rasao eu venho pedir ao governo toda a sua attenção para este assumpto tão importante.
Como o sr. ministro da marinha não está presente, dirijo-me ao illustre ministro da fazenda, pedindo-lhe a elevada fineza de tvansmittir estas minhas considerações aquelle seu collega, a fim de que s. exa., com ordens terminantes, energicas e immediatas, trate de pôr cobro a este estado de cousas, para que taes conflictos se não repitam, e a classe dos pescadores não seja mais prejudicada. (Apoiados.)
O illustre parlamentar o sr. Pinheiro Chagas já hontem pediu a palavra sobre este menino assumpto; mas não lhe tendo chegado a occasião de fallar, e como s. exa. reclamou a presença do sr. ministro da marinha, de certo tratará d'esta questão com toda a proficiencia, como costuma, e por isso limito por aqui estas minhas ligeiras considerações.
Vozes: - Muito bem, muito bem.
O sr. Ministro da Fazenda (Franco Castello Bran-
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co): - Não quero deixar do cumprir um dever que me impõe, não só a minha qualidade de ministro, mas a sympathia o consideração pessoal que tenho pelo illustre deputado; quero dizer a s. exa. que transmittirei as suas considerações ao sr. ministro da marinha, como ha pouco disse tambem em resposta ao sr. deputado Germano de Sequeira.
O assumpto merece por todos os motivos a attenção do governo. Effectivamente essa classe é uma d'aquellas que pelo emprego da sua actividade mais se impõe, não só aos cuidados do parlamento, mas até, se é permittida a phrase, á caridade de todos os homens de coração. (Apoiados.)
Quando as circumstancias de fazenda publica melhorarem, como de certo hão de melhorar, se continuarem a augmentar as receitas e houver todo o cuidado em não aggravar as despezas, penso que um dos primeiros impostos que deve ser remodelado ou abolido completamente é o que está onerando a classe dos pecadores, o imposto do pescado, essa classe tão desgraçada que por todos os motivos não merece que o estado lhe faça imposições tão duras como aquella. (Apoiados.)
Isto desculpa-se, justifica-se apenas pelas circumstancias um pouco precarias do thesouro, mas logo que a situação mude, dever-se-ha remodelar no sentido mais favoravel e de maior protecção para aquella classe.
(S. exa. não reviu as notas tachyqraphicas.)
O sr. Adriano Monteiro: - Mando para a mesa uma representação da camara municipal de Vianna do Alemtejo, pedindo para desviar do fundo especial destinado á viação publica uma quantia realmente pequena, 886$000 réis, para emprehender melhoramentos de obras publicas propriamente ditas, assim classificadas.
Apresento por isso um projecto de lei, de que não fiz relatorio, porque supponho que a vereação diz o bastante para esclarecer o assumpto. Apenas direi mais algumas palavras n'este sentido, com o fim de proteger o pedido d'aquella camara.
Como v. exa. sabe o pedido é justo, porque a verba destinada para a viação é muito considerável, emquanto que a verba destinada para obras publicas é muito pequena, em todos os municípios pequenos, e o estado por uma simples portaria, de execução permanente sorve-se do dinheiro das camaras que são obrigadas a depositar na caixa geral de depositos, o que é sabido por quem conheço estes assumptos.
Peço a v. exa. tambem que consulte a camara sobre se consente que esta representação seja publicada no Diario do governo.
É como estou com a palavra direi ainda mais alguma cousa.
Na sessão de 21 de maio pedi, pela direcção geral de agricultura, informações a respeito da despeza feita com a extincta repartição de agricultura, durante os ultimos quatro annos da sua existencia e das despezas feitas com a actual direcção geral de agricultura, durante toda a sua existencia, que e tambem de quatro annos proximamente. Em 4 de junho fiz novo requerimento delineando os meus pedidos. E, quando fiz este requerimento, acompanhei os pedidos com varias considerações, que tiveram a honra de ser attendidas pelo sr. ministro das obras publicas.
Eu tenho empenho em tratar d'esta questão; mas não quero tratar d'ella sem ter todos os elementos para fazer inteira justiça. Esperava que os documentos viessem n'um praso curto, relativamente, e dei um mez de intervallo entre o ultimo pedido e agora, que torno a renoval-o.
Creio que na mesa não estão ainda esses documentos.
O sr. Presidente: - Manda-se averiguar.
O Orador: - Eu disse que queria entrar n'esta questão, não para atacar o actual ministro, que sei não tem a minima responsabilidade do facto; mas para apreciar os beneficios que a agricultura tem a agradecer á nova estação official, chamada direcção geral de agricultura, e, como não desejo, repito, entrar n'este assumpto sem ter um juizo completo, aguardo os documentos para então annunciar uma interpellação ao sr. ministro das obras publicas.
Na certeza de que, se por qualquer circumstancia a repartição entender que não me deve informar do estado geral da questão, julgo-me no direito de dizer á camara e ao paiz qual é a questão concreta na localidade que eu represento.
D'isto é que eu me não dispenso, e espero que, antes de se encerrar a actual sessão parlamentar, v. exa., sr. presidente, me fará a fineza de me conceder, mais uma vez, a palavra para eu poder tão largamente, quanto caiba nas minhas forcas, tratar desta questão em toda a sua plenitude.
O sr. Presidente: - Os documentos foram requisitados em 23 de maio, mas ainda não veiu resposta.
Se v. exa. quer, a mesa torna a instar pelos documentos.
O Orador: - Então peço á mesa a fineza de renovar o pedido
Não creio que a direcção geral de agricultura tenha empenho em esconder os documentos.
Faço justiça ao pessoal superior da direcção, e á vontade que o sr. ministro tenha de que se esclareça a questão, em que não tem responsabilidade alguma.
Eu, desde já, digo que não acredito na proficuidade do que se tem feito até agora, como hei de provar com factos.
Devo dizer que, embora respeite muito a doutrina abstracta que se usa nos gabinetes dos estudiosos, não posso deixar de reconhecer que, quando applicada, dá, muitas vezes, resultados oppostos ás melhores previsões.
Uma instituição que póde ser benefica, deixa de o ser, quando se desacredita na sua installação.
É o que está succedendo com a direcção geral de agricultura. E estou certo que ninguem julga que eu lhe tenho odio, porque, em circumstancias especiaes e bem definidas e com a experiencia dos factos, eu não votava só pela direcção geral, votava por um ministerio especial, porque o fomento agrícola é talvez a salvação do nosso paiz. (Apoiados.)
A producção fabril é quasi nulla, e, se o solo da pátria não nos der alguma cousa, nada temos a esperar de outra parte; queira Deus que me engane.
Por isso, digo, espero que venham os documentos, porque não desejo incriminar ninguem.
Desejo apenas fazer justiça inteira, e saber mesmo se estou em erro para me corrigir.
Ainda uma outra ordem de considerações. Se realmente os princípios theoricos que presidiram á installação da direcção geral de agricultura são aquelles que se tornam necessarios porá o nosso paiz e se têem completa adaptação, admira que, pertencendo eu a uma região onde existem os grandes lactifundios e em que seriam precisos exemplos sensatos de cultura esmerada para regenerar um paiz inculto, não appareça lá nenhum d'esses exemplos, e todos os serviços da direcção geral fossem para a região onde ha a cultura intensiva, onde não é preciso dar exemplo. É extraordinario! Todos sabem que o nosso Alemtejo é uma região essencial humida, secca, fria e quente, toca todos os extremos, porque a plantação de arvoredo que, em grande parte, como é sabido, regula o regimen das aguas 3 as temperaturas, não existe lá senão limitadamente. Estamos sujeitos a excessos oppostos e temperatura, alta e baixa; e os terrenos, em grande parte primitivos, formados de desaggregação de rochas graniticas, algumas muito friaveis, são por isso tão faceis de humedecer no inverno, como faceis de seccar no verão. Alem d'isso, o regimen das aguas, determinado pelas condições da orographia do terreno, é muito differente do do norte, não ha tão profundos valles, sendo por consequencia as bacias hydrographicas mal definidas. Logo, o systema de irrigação
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não se póde applicar ali como no norte, e a cultura intensiva não está economicamente indicada.
Por isso eu desejava que a nova repartição de agricultura fosse dar exemplos de cultura intensiva no meio de uma charneca sem agua nem arvoredo. Eu queria ver isso, e como se resolvia o problema sem ir acompanhado da questão do credito agricola.
Desejava ver isso, digo, dentro das forças dos próprios agricultores, que não produzem, porque não têem dinheiro, e não recebem dinheiro porque não produzem. Sem entrar um elemento novo, o dinheiro barato, na questão, seria extraordinario que tal se realisasse.
Já ouvi fallar no principio de associação applicado ás povoações ruraes, para resolver o grande problema da crise economica agricola, a comicios agricolas, a que em França se chama comités, a syndicatos agricolas, e sociedades de credito cooperativo, ou simplesmente platonicas.
Toda a gente sabe que em o nosso paiz o principio associativo está muito longe do que devia ser.
De mais a mais dá-se uma circumstancia que todos conhecem, é a existencia do scepticismo politico em todas as aggremiações, em que, julgando-se que se vae tratar de politica, começam logo as desconfianças reciprocas.
Não venho dizer isto para armar ao effeito; sinto o que digo. Tenho a honra de pertencer a uma cooperativa agricola, de cuja creação tenho grande responsabilidade. Posso affirmar que essa cooperativa devia ter um grande numero de socios, dentro em pouco tempo; mas o espirito de antagonismo politico pessoal destruiu, quasi por completo, toda a acção benefica que podia resultar d'ella, e o impulso generoso morreu quasi á nascença, ou pelo menos, está reduzido a circumstancias mesquinhas, que não lhe permittem vida longa, ou, quando muito, desafogada, e tudo por causa da tal politica!
Sem a questão de credito agricola, parece-me que a cultura intensiva do Alemtejo não passa de uma utopia.
O unico capital barato que ha no Alemtejo e a terra - qual será a consequencia logica d'esta verdade?
É a cultura extensiva, com os alqueives, pousios, roças (queimadas), alimentação dos gados em prados naturaes, e emprego apenas de estrumes de curral, etc., etc., emfim com todo o cortejo, chamado de rotina.
(Interrupção do sr. Teixeira de Vasconcellos, que não se ouviu.)
A cultura hortense custa muito dinheiro, e, desde que não ha capitães baratos, não póde entrar como elemento da questão.
A solução pratica de alta economica seria a da cultura intensiva; mas eu desejava ver a questão resolvida, sem n'ella entrar um elemento, o dinheiro barato. Ficaria encantado e viria ao parlamento dizer o contrario do que affirmo, se, com estes elementos que ha, se chegasse a conseguir alguma cousa.
Eu peço desculpa de ter tirado mais tempo á camara para dar estas explicações. Não tenho animosidade contra pessoa alguma, nem contra qualquer estação official; acceito-as a todas, quando boas, porque tambem sou filho das escolas, embora modesto e humilde.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem.
O projecto ficou para segunda leitura e foi approvada a publicação da representarão no Diario do governo.
O sr. Santos Viegas: - Por parte do sr. deputado José de Vasconcellos Mascarenhas Pedroso, mando para a mesa uma justificação de factos.
Por parte do mesmo sr. deputado mando tambem para a mesa uma representação da camara municipal de Tarouca.
Peço a v. exa. consulte a camara sobre se permitte que este documento seja publicado no Diario do governo.
Foi approvada a publicação.
O sr. Teixeira de Vasconcellos: - Mando para a mesa um requerimento dos officiaes de diligencias do juizo de direito da comarca de Vouzella, pedindo augmento de vencimento.
Peço a v. exa. consulte a camara sobre se permitte que este requerimento seja publicado no Diario do governo.
Foi approvada a publicação.
O sr. Soares de Albergaria: - Mando para a mesa uma representação da camara municipal de Azambuja, protestando contra as palavras aqui proferidas pelo sr. Francisco José Machado na sessão de 1 do corrente, a respeito das obras de interesso publico que o governo mandou fazer n'aquelle concelho.
Peço a v. exa. consulte a camara sobre se permitte que esta representação seja publicada no Diario do governo.
Foi permittida a publicação.
ORDEM DO DIA
Continuação da discussão do projecto n.° 120, que lança um addicional de 6 por cento sobre as contribuições do estado
O sr. Presidente: - Como a hora está muito adiantada, vão passar-se á hora do dia. Os srs. deputados que quizerem mandar alguns documentos para a mesa, podem fazel-o.
Continua em discussão o projecto n.° 120.
O sr. Teixeira de Vasconcellos: - (O discurso será publicado na integra, e em appendice a esta sessão, quando s. exa. haja revisto as notas tackygraphicas.)
O sr. Paulo Cancella (sobre a ordem): - Não tencionava referir-me a um facto que se deu nesta casa; mas, tendo-se referido a elle o meu collega que acaba de fallar, não deixarei de dizer tambem alguma cousa a tal respeito.
Tenho ouvido muita gente lamentar profundamente a indifferença politica que reina no nosso paiz; tenho ouvido muita gente dizer que lá fóra, na provincia, o povo despreza completamente as questões politicas e que apenas na occasião das eleições, levado mais pelas dissenções locaes, e pelas inimisades pessoaes do que pelas paixões partidarias é que se levanta e faz politica.
Mas isso, sr. presidente, não é politica. A indifferença existe e, infelizmente para o paiz, ella vem do alto, pois que nós, os membros desta camara, temos dado e estamos dando o exemplo d'isso. Nas sessões nocturnas decretadas pela maioria é que se vê como esta casa está completamente deserta. (Apoiados.) E o que significa isto, sr. presidente? Significa a indifferença completa do parlamento por tudo aquillo que interessa ao paiz. Para que decretou a maioria as sessões nocturnas?
Para estarmos apenas 24 deputados ao terminar a sessão, em que fallou o sr. Mattozo Santos?! E a proposito, folgo de ter ouvido o sr. Teixeira de Vasconcellos fallar do discurso proferido por aquelle illustre deputado, porque isso faz-me crer que foi um dos 24 que estavam aqui nessa noite, 13 da opposição e 11 da maioria, incluindo os tres cavalheiros que compunham a mesa.
Creio que os assumptos se apuram e esclarecem por meio da discussão. (Apoiados.)
É para isso que servem as minorias.
Cada um dos partidos apresenta as suas idéas, as suas opiniões, e é por meio do debate, que é o grande criterio por onde se deve aferir a verdade das doutrinas apresentadas por cada um, que se póde chegar a uma conclusão justa e rasoavel. (Apoiados.) Mas quando as bancadas estão desertas, quando a discussão se limita ao orador e a meia duzia de deputados, occorre perguntar: O parlamento fez já o seu juizo mesmo sem discutir? Então vote; é escusado cansarmo-nos, estar a pensar, a discutir, a soffrer o calor. (Apoiados.) Se a maioria está completamente elucidada, é melhor irmo-nos embora e deixemo-nos de dis-
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cussões. O governo ahi está, manda a sua maioria, ella vota. Que fazemos nós aqui?
O governo para que nos quer cá? (Apoiados.) Para que serve n'este caso o systema parlamentar. (Apoiados.) É uma burla.
Ainda ha pouco num paiz amigo, quasi irmão nosso, na Italia, houve uma manifestação ruidosa numa das casas do parlamento, e em que as galerias tambem tomaram parte, occasionada pela accusação feita ao governo de exercer demasiada pressão sobre a sua maioria. E tambem o que aqui se está fazendo. O governo manda, a maioria obedece e tudo passa adiante; nas questões nada se apura; as idéas expostas pela opposição não podem ser aproveitadas, porque as bancadas, tanto de um como de outro lado da camara, estão completamente desertas. (Apoiados.)
(Ápartes.)
Cada um tome a responsabilidade que lhe cabe. Nós (O lado esquerdo da camara.) tambem temos faltas e peccados. (Apoiados.)
Vozes da direita: - Isso sim. (Riso.)
O Orador: - Mas nós somos poucos e os senhores são muitos. Não mostre pois a maioria tanta satisfação por eu me referir á falta de alguns membros da opposição ás sessões. As condições não são as mesmas, porque foi a maioria que approvou a proposta para haver sessões nocturnas.
Alem disso, sr. presidente, ao encerrar-se a sessão de hontem á noite estavam apenas 22 deputados, estando a opposição em maioria, e a responsabilidade é tanto maior quanto maioré o numero de deputados que falta de qualquer dos lados da camara, e como d'esse lado da camara faltaram muitos mais do que d'este, por conseguinte a responsabilidade da maioria é muito maior do que a nossa. Eu não a quero para mim; como tenho aqui estado sempre, fallo desafogadamente.
Não digo isto para obrigar a maioria a ouvir-me. O que vou dizer nada vale, pois sou incompetentissimo para fallar sobre este assumpto, e por isso estimarei até estar apenas em amavel conversa com o nosso digno presidente e srs. secretarios, que em cumprimento do dever do seu cargo têem obrigação de ali estar, e ser ouvido pelos srs. tachygraphos que têem de stenographar o meu discurso, e pelos continuos para me darem algum copo de agua; mas talvez quando eu lhes disser que vão pagar mais 6 por cento sobre os 3 por cento do imposto de rendimento que já pagam dos seus ordenados, elles me attendam um pouco, porque lhes chega á bolsa.
Eu não quero que a maioria esteja aqui a fazer o sacrificio de me ouvir e a sua attenção só poderei agradecer-lh'a como um acto de deferencia pessoal, pois certamente as minhas palavras não a demoverão de approvar o projecto que se discute.
Com estas palavras não quero melindrar ninguem; tenho relações particulares com quasi todos os srs. deputados e a muitos liga-me uma intima amisade; n'estas condições, nem o meu caracter o permittiria, quaesquer palavras que eu aqui pronuncie não podem ter a menor intenção de melindrar ou maguar pessoa alguma.
Feita esta declaração, direi que não pretendo fazer um discurso politico; não sou politico nem mesmo tenho a menor inclinação para isso; o que sou é lavrador e como lavrador venho levantar a minha voz contra o addicional de 6 por cento; como lavrador venho gritar «aqui d'El-Rei!» contra o sr. ministro da fazenda, que quer tirar-me os magros vintens que a phylloxera me deixa, e contra toda a camara que quer expoliar-me dos magros lucros da viticultura, porque eu sou viticultor, especialmente.
Eu, sr. presidente, se ainda hoje sou juiz de direito é por causa da phylloxera, porque em 1885 quando ella começou a devastar a região vinicola da Bairrada, tencionava eu abandonar a magistratura, mas desisti do meu intento porque entendi que emquanto me não d'esse a phylloxera nos braços, a minha familia teria pão. Ora, sr. presidente, é n'estas circumstancias que o governo vae aggravar os impostos!
Eu, sr. presidente, já disse que não fallava na questão politica; tambem não fallarei na questão financeira, porque tive sempre horror ás cifras, e muito mais desde que o sr. ministro da fazenda nos disse hontem aqui que com ellas se chega a conclusões diametralmente oppostas.
Nada sei de finanças, mas vejo que, em vista desta declaração do sr. ministro da fazenda, ainda é mais difficil de que eu imaginava o saber-se d'isto alguma cousa.
Eu julgava, sr. presidente, que pelas cifras se chegava a conclusões exactas e incontestaveis, mas agora fico sabendo que, no que diz respeito a orçamentalogia do estado, essas cifras sei levam às conclusões que mais convenientes são ao sr. ministro da fazenda. Porei pois de parte as cifras e limitar-me-hei a fazer algumas considerações ao projecto que cria o addicional de 6 por cento, quando o paiz esta em lucta com a miseria e com a fome. Eu quero apenas protestar contra a expoliação que nos querem fazer num momento em que a nossa agricultura está atravessando uma angustiosa e grandissima crise, e em que as vinhas estão sendo destruidas por differentes doenças. (Apoiados.)
E agora permitta-me v. exa. que eu me refira a uma phrase do illustre deputado o sr. Teixeira de Vasconcellos, que tão proficientemente acaba de entreter a camara com um esplendido discurso. (Apoiado).
Eu ouvi uma phrase a este cavalheiro que achei profundamente justa. Disse s. exa. que a sua posição era ingrata. Não sei a que se referia.
Disseram-me que s. exa. tem sido aqui um dos mais extrennos defensores da nossa agricultura, mas tendo eu procurado os discursos de s. exa. não os pude encontrar.
Julgo que s. exa. se referiu pois á posição especial em que se achava de defender e de ir votar o addicional de 6 por cento, que vae sobrecarregar a nossa agricultura, que até agora defendêra.
A sua posição era effectivamente muito ingrata por ter de defender esse addicional; mas s. exa., com a sua elevada intelligencia e com o seu fino criterio, evitou a difficuldade em que se achava, porque só no fim do seu discurso se referiu aos 6 por cento, que disse que votava, apesar de ser lavrador, e de representar aqui uma região agricola, sem dar explicação do seu procedimento.
S. exa. viu a difficuldade com que luctava, sendo lavrador e agricultor, em vir defender o addicional de 6 por cento, porque effectivamente não comprehendo como, sendo as circumstancias da agricultura as mais precárias e terriveis, s. exa. entenda que sobre ella só póde lançar este addicional. (Apoiados.)
Eu não posso deixar de lamentar o paiz e o governo; o paiz, porque é administrado por um governo que só sabe viver de expedientes; o governo, por ver que estão á frente dos negocios publicos homens que não têem orientação politica nem financeira. (Apoiados.)
Eu fazia parte da camara dissolvida, e vi chegar aqui o sr. presidente do conselho com a sua bella cohorte de jovens.
A maior parte dos actuaes deputados não assistiu á apresentação que o sr. presidente do conselho então fez do ministerio, mas eu recordo-me do que s. exa. então disse, e vou repetir as palavras de s. exa.
Disse s. exa. que tinha chamado aos conselhos da corôa homens novos, rapazes, para injectar sangue novo no governo.
Foi um engano, sr. presidente.
O chamamento aos conselhos da corôa de homens novos, de rapazes, não foi mais que um expediente de que o sr. Serpa Pimentel usou para que esses rapazes o não incommodassem ficando fóra do ministerio, porque as aspirações d'elles eram serem ministros e se o sr. Serpa os tivesse posto de parte, elles, amuados, despeitados, furiosos por terem
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sido desprezados, mais incommodariam o governo do que o auxiliariam.
O sr. Serpa fez das fraquezas forças e chamou para junto de si aquelles que mais o incommodariam se não fossem ministros e que ha tanto tempo trabalhavam para isso, sendo essa a sua mais ardente aspiração.
E eu não me admirei de ver chamados aos conselhos da corôa os srs. Arroyo e Franco Castello Branco, porque s. exas., querendo ser ministros, trabalharam muito e não era por isso para admirar que, organisando-se uma situação regeneradora, s. exa. 8 fossem chamados a fazer parte do governo. Mas foi um expediente do sr. Serpa o chamal-os.
Ainda outro expediente nesta occasião foi o chamamento do sr. Vasco Guedes aos conselhos da corôa. Lembro-me que se disse então que se tinha ido buscar o sr. Vasco Guedes por não haver outro militar mais competente para ministro da guerra; mas lembro-mo tambem que n'essa occasião o sr. presidente do conselho disse aqui que o chamamento do sr. Vasco Guedes para a pasta da guerra fôra motivada por haver pendentes duas questões importantes, a pendencia ingleza e a administração colonial, e ser preciso que no governo houvesse quem estivesse perfeitamente ao facto das questões coloniaes, circumstancia que se dava no sr. Vasco Guedes, que já havia sido governador no ultramar e estava ao facto de taes questões. O governo, dizia o sr. presidente do conselho, precisa de ter, em primeiro logar, voltada a sua attenção para a questão ingleza e em segundo logar precisa resolver algumas questões coloniaes que devem merecer toda a attenção.
O sr. Vasco Guedes era, pois, o Eneas que havia de conduzir ás costas, atravez dos sertões da Africa, mas sobre o mappa, o pater Anchises, sr. Antonio de Serpa e pela mão o puer Ascanius, joven sr. Arroyo.
Mas, sr. presidente, tendo o sr. Vasco Guedes sido chamado ao governo por ser necessario que houvesse n'elle um homem que tivesse perfeito conhecimento dos negocios do ultramar, o mesmo sr. Vasco Guedes foi, com pasmo do toda a gente, demittido tres, dias depois da sua nomeação!!! Desagradava, e por isso demittiram-o.
Outro expediente, cuja causa escuso de expor, foi o tomar conta da pasta da guerra o sr. presidente do conselho, que nunca foi nomeado effectivo, e que, como já disse foi interinamente ministro da guerra durante tres dias, que foi o espaço que mediou entre a nomeação do sr. Vasco Guedes e u sua exoneração.
O sr. presidente do conselho tinha sido nomeado ministro da guerra durante a ausencia do sr. Vasco Guedes, mas desde que elle recusou o logar, a interinidade acabou, e por um expediente novo o sr. presidente do conselho continuou a ser ministro da guerra.
Mas não acabam aqui os expedientes.
O sr. Arroyo fôra nomeado ministro da marinha, os seus collegas entenderam que elle não fazia lá nada e então rua com o sr. Arroyo; mas então tratou-se de crear o ministerio da instrucção publica em dictadura.
Foi um expediente tirar o sr. Arroyo da pasta da marinha para ir para a pasta da instrucção publica, mandando-se para a pasta da marinha o meu amigo o sr. Julio de Vilhena, cuja competencia era de todos conhecida, e em quem já se fallára na primitiva organisação do ministerio.
Vendo-se porém o sr. Serpa em difficuldades por não saber o que havia de fazer do sr. Arroyo, lembrou-se de crear o ministerio da instrucção publica para, como expediente, se mandar para lá o sr. Arroyo, e para a pasta da marinha foi então, como expediente tambem, o meu sympathico amigo, o sr. Julio de Vilhena, para salvar as nossas colonias, que felizmente sei que pretende salvar em dois annos, e declaro que não posso deixar de admirar um talento como aquelle, que em dois annos vae resolver as tão difficeis questões coloniaes! Aguardarei o resultado dos seus trabalhos e então fallaremos.
Ainda ha um outro expediente que o governo tem usado, é o silencio do sr. Hintze Ribeiro de não dizer o que se passa com respeito á questão ingleza.
O sr. Hintze Ribeiro metteu-se ao silencio, e não ha o demovel-o da resolução tomada, para podermos apreciar os seus actos e para nos livrarmos da anciedade em que estamos.
Outro expediente foi o da dictadura. O patriotismo tinha-se levantado um pouco por causa da Inglaterra. A indifferença tinha desapparecido com a bofetada com que a Inglaterra aqueceu a face do povo portuguez. Então o que fez o governo? Fez a dictadura para suffocar o patriotismo e não para o levantar.
Nos decretos dictatoriaes falla-se muito em organisações do exercito e da marinha de guerra, e até o sr. ministro da fazenda diz no seu relatorio:
«O movimento espantoso, sincero e apaixonado da opinião publica, funda e dolorosamente agitada pelos recentes acontecimentos da nossa politica externa e colonial, veiu pôr em relevo a insufficiencia dos elementos da defeza nacional, com que podiamos contar, tanto no que respeita a material de guerra, como pelo que toca á organisação das indispensaveis forças militares de terra e mar.»
Ora, sr. presidente, com este pretexto o governo, a par de um exercito e marinha que só existe no papel, porque não tem dinheiro para o realisar, foi fazendo tambem a lei das rolhas.
O expediente da dictadura teve pois dois fins, fingir patriotismo e soffocar o ardor dos que o tinham.
Finalmente, o governo vem agora apresentar á camara outro expediente, o do addicional de 6 por cento, mas fal-o dando-lhe com franqueza o seu verdadeiro nome. É o seu unico merecimento.
Este expediente, porém, chega-nos á bolsa e infelizmente som esperança de apesar de irmos pagar mais, as nossas finanças entrarem em bom caminho.
O que eu queria é que o governo tivesse adoptado outro expediente e isso era o fazer economias e não augmentar as despezaa, e então s. exa. não teria só o apoio da maioria., roas talvez o da opposição e com certeza o meu, e digo talvez da opposição, porque eu não sou leader, sou simplesmente um guerrilheiro, e só por mim posso responder.
Se s. exa. se servisse de um expediente que não fosse recorrer ao credito o ao imposto, então é que era um bom ministro, então eu dava-lhe um abraço como amigo e como portuguez.
Deixando-me, porém, de divagações, eu direi que não pretendo fazer a historia dos addicionaes que têem sido creados; não analysarei as circumstancias em que estava o paiz quando se lançou o addicional de 5 por cento pela lei de 12 de dezembro de 1844, que foi elevado a 15 por cento pela lei de 22 do julho de 1850, augmentando em seguida em mais 5 por cento pela lei de 20 de julho de 1860, dobrado para 40 por cento em 1867 e finalmente augmentado ainda com 6 por cento pela lei de 22 de abril de 1882, depois de fundida a percentagem com o addicional em 1880.
Não me refiro ao addicional lançado pela lei de 13 de julho de 1889, porque este não foi aggravar o contribuinte, pois foi apenas uma deslocação do districto para o estado e com vantagem e allivio para os povos e não com gravame.
Devo, porém, dizer a v. exa., que não entro na analyse das circumstancias do paiz quando se lançaram aquelles addicionaes, porque tenho medo do sr. ministro da fazenda, a quem eu, aqui ha dias, quando respondeu ao sr. Ressano Garcia, vi de cara carregada, gesto vehemente e irado, e, qual professor de instrucção primaria, de ferula em punho a querer ensinar o sr. Ressano Garcia e a querel-o castigar dos seus erros, quando é certo que o sr. ministro da fazenda devia ser mais prudente, porque se devia lembrar que todos nós viamos atraz d'elle o sr. Carrilho a ensinar-lhe muitas vezes o que s. exa. havia de dizer.
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S. exa. deve moderar um pouco o seu genio para nos não metter medo, e permitta-me o sr. ministro da fazenda uma cousa; é que eu, paraphraseando a s. exa., do que lhe peço desculpa, lhe diga como s. exa. disse a um ministro progressista: deve ser mais ministro e menos Franco Castello Branco.
S. exa. esqueceu-se de que passou d'aqui para ahi, das bancadas da opposição para a cadeira de ministro, levado pelo seu incontestavel talento, mas que devia deixar aqui os seus nervos e impaciencia. S. exa. deve saber que um ministro precisa ter muita paciência para aturar os ataques da opposição, que precisa revestir-se de uma couraça de paciência, que s. exa. nunca devo deixar.
Creia s. exa. que lhe digo isto como seu sincero amigo, porque não gosto de o ver ahi sempre irado e nervoso.
Sr. presidente, eu conheço a minha incompetencia para tratar deste assumpto dos 6 por cento; e por isso vou apenas fazer umas considerações que são conhecidas de toda a gente.
Sr. presidente, eu não quero que o sr. ministro da fazenda nos tire o dinheiro sem o sentirmos; este facto de tirar dinheiro sem se sentir tem no codigo penal um outro nome e constitue um crime.
Não é pois das cousas mais correctas e não passa de um expediente, como o proprio sr. ministro confessano seu relatório a paginas 22 e a commissão declara no seu parecer.
Ora eu, sr. presidente, que, ha muito conheço o sr. ministro da fazenda, a quem me liga uma amisade pessoal muito sincera e cordial, eu que ha muito admiro o seu talento e que por isso senti grande satisfação quando o vi subir aos conselhos da corôa, declaro que soffri uma grande decepção ao ver s. exa. apresentar-se ás camaras sem plano financeiro e só com expedientes.
Esperava, sr. presidente, que o sr. ministro da fazenda se apresentasse aqui com rasgados planos financeiros e que não viesse dizer-nos, como disse no seu discurso, que apresentava o projecto do addicional porque era o meio de tirar ao contribuinte dinheiro sem elle sentir!!
Se o thesouro estava exhausto, se era preciso pedir mais sacrificios ao contribuinte, porque o não disse o sr. ministro da fazenda com toda a franqueza? Porque não appellou para o patriotismo do povo portuguez e para a sua bolsa, mas por fórma que todos o soubessem? Se era preciso dinheiro e mesmo muito dinheiro, ao menos s. exa. pedisse-o por fórma que todos sentissem, para poder ser apreciado o sacrificio. Se as necessidades são grandes, grandes deveriam ser os remédios, e ninguem se negaria a dal-os.
Eu tenho ouvido dizer que estamos á beira do abysmo, e s. exa., que agora está a frente d'isso a que chamam chaveco do estado, deve tentar desvial-o d'esse abysmo, das clara e energicamente, de maneira que nós saibamos todos o serviço que nos presta e nSo subrepticiamente.
O addicional de 6 por cento, como já aqui disse o meu illustre amigo e distincto financeiro o sr. Fernando Mattozo, que ouvi com todo o acatamento que me merece a sua palavra, é um imposto desnecessario e inopportuno, resultando essa inopportunidade de estarem más todas as contribuições sobre que vae recaír.
Eu sou simplesmente lavrador, e como lavrador é que eu vou encarar a questão.
Eu direi que o imposto é injusto; mas, sob o ponto de vista agricola, que é inconveniente e porque é a agricultura que tem de pagar mais e não póde e ha de reagir, e que o governo não tem direito nem auctoridade para pedir mais dinheiro do que aquelle que já se lhe dá.
Na sessão de 21 do mez passado disse o sr. ministro da fazenda, cuja auctoridade em questões financeiras eu reconheço, que em finanças só se podia ser opportunista.
O opportunismo em finanças é unico processo e unica lei, e lamento que o sr. ministro da fazenda depois de fixar as bases de verdadeiro financeiro, viesse cair em um erro de palmatoria, creando o addicional de 6 por cento, que é perfeitamente inopportuno, e tanto que confio que s. exa. retirará este proposto da discussão e não quererá pedir ao lavrador mais 6 por cento sobre aquillo que já paga. Se s. exa. não o retirar, não é financeiro nem coherente com os principios que aqui estabeleceu.
Creio que por todos é reconhecido que nós somos um paiz eminentemente agricola, e que por isso toda a sua riqueza provém da agricultura, devendo por isso perscrutar-se o opportunismo no seu estado de prosperidade.
Que phenomenos económicos revelaram a s. exa. o seu opportunismo? Está o paiz a nadar em dinheiro? São prosperas as condições da nossa agricultura?
Eu, sr. presidente, que sou lavrador, é que sei bem as difficuldades com que lucta o agricultor para pagar todas as despezas do amanho das suas terras e replantação das suas vinhas, que cada vez estuo mais phylloxeradas.
Mas deixemo-nos de lamentações e continuemos.
Só a agricultura é a nossa principal fonte de riqueza, e se por conseguinte é nas suas circumstancias que nós devemos procurar o opportunismo, tão proclamado pelo sr. ministro da fazenda, eu quero apenas mostrar que, segundo as condições actuaes da nossa agricultura, esse opportunismo não existe, e que o sr. ministro da fazenda não podia escolher peior occasião.
Onde ha de ir s. exa. buscar esses 6 por cento sem grande sacrificio do lavrador?
Note s. exa. que não é sobre a base de 2.040:000$000 réis, que se paga de contribuição predial, que se póde argumentar com os a por cento, dizendo que o sacrificio que se lhe exige é pequeno.
Sei tambem que s. exa. póde argumentar, dizendo que não é só sobre a agricultara que pesam os encargos extraordinarios, porque a maior parte das receitas do estado provém de outras fontes.
Este argumento, porém, não colhe.
Sendo Portugal um paiz essencialmente agricola, não póde deixar de cair sobre a agricultura a maior parte dos encargos que provém de todas as contribuições.
Nós já pagâmos para o estado 2.040:000$000 réis; pagâmos para a parochia, para o municipio e para o districto; e é hoje que se vae aggravar esta situação com mais 6 por cento!
Se já hoje nos custa a pagar, não sei como se poderá pagar o mais que agora só pede.
Direi mais a s. exa.; d'onde vem o dinheiro para se pagar tudo isto? Nós somos um paiz agricola, e, portanto, está claro que é da agricultura. Alem d'isso quem paga ao pedreiro e ao carpinteiro, porque toda a gente sabe que no serviço agricola não se trata só de sulcar terra, trata-se de mil construções, muros de anteparo nas propriedades, muros de vedação, trinta mil cousas? É a agricultura, porque elles artistas vivem da agricultura.
Dizia hontem o sr. ministro da fazenda: «qual é o trabalhador que consome assucar?»
Eu direi a s. exa. que não é como luxo que o agricultor, o jornaleiro, hoje consome assucar e café; é por uma questão de economia. Ainda me lembro do tempo, porque já não sou novo, em que o jornaleiro não gastava assucar nem café; mas hoje gasta-os, porque esses generos são mais baratos do que as antigas sopas de carne. Hoje com 10 réis de café, 10 réis de assucar e com 10 réis de pão ficam promptos para o trabalho.
Por conseguinte, hoje o trabalhador, o jornaleiro, que tambem bebe vinho, que come arroz, fica sobrecarregado com este augmento de imposto que vae recair sobre todos estes generos.
Eu, sr. presidente, estou á espera de ver os agricultores, os deputados que aqui foram mandados pela liga agraria se têem coragem para votar este imposto.
O sr. Adriano Monteiro: - Sim, senhor; hão de ter.
O Orador: - Será isso admiravel.
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O sr. Adriano Monteiro: - Ha de ver isso. Estimarei muito que me chegue a palavra para me explicar.
O Orador: - Estimarei que lhe chegue a palavra para o ouvir e admirar as suas explicações, que hão de ser curiosas.
S. exa. o sr. ministro da fazenda deve ir passear pelo Alemtejo, onde eu ainda não ha muitos mezes estive.
S. exa. deve ir a região do Douro e á região da Bairrada, essencialmente viticolas; deve ir á região da Beira Alta. Se s. exa. percorrer essas regiões viticolas, verá a miseria dos lavradores e as difficuldades com que luctam para sustentarem as suas famílias e para occorrerem aos serviços agricolas.
E eu não quero que s. exa. me diga, como costuma, «prove aquillo que allega». Vou provar-lh'o já com um documento official, que s. exa. de certo não leu, porque, se o tivesse lido, não vinha propor o addicional de 6 por cento.
Quer s. exa. saber o que diz o boletim da direcção geral de agricultura de dezembro de 1889, onde todos os agronomos que ha espalhados por esse paiz expõem qual é o estado da agricultura? Eu vou ler.
N'este relatorio, a paginas 1014 e 1019, diz se o seguinte:
«Os gados têem soffrido muito com a falta de forragens verdes, havendo já morrido á míngua bastantes animaes na provincia de Traz os Montes, etc.
«Ás informações que sobre o assumpto dei nos boletins precedentes ha a acrescentar a do apparecimento da phylloxera em 2:500 metros quadrados de vinhas pertencentes a duas freguezias do concelho de Goes, e na enorme superficie de 55 hectares no concelho de Peniche.»
Isto agora que vou ler diz respeito ao sr. Adriano Monteiro, que é do Alemtejo, o conhece as condições em que está a agricultura n'aquella provincia. A paginas 1005, 1006, 1007, 1010, 1012 e 1013 do mesmo relatorio lê-se o seguinte:
«Assim os arroteamentos, lavouras de sementeira, cavas de vinhas, não se têem feito; e as culturas cerealiíicas ou não têem nascido ou se acham enterradas, bem como as pastagens.
«O aspecto geral das culturas cerealificas não é bom.
«A azeitona, n'esta região como por toda a parte, não é boa este anno.
«Já no concelho do Crato não succedeu assim; encontram-se phylloxeradas tres vinhas de Gatete e de Flor da Rosa, tendo-se inspeccionado 63 vinhas em seis freguezias.
«Nos poucos boletins recebidos, em todos ha concordancia de que é muito mau o estado geral da agricultura, pela falta de agua, muitas geadas e baixa de temperatura. Os campos apresentam quasi o aspecto que mostram no fim do verão. Tudo secco. As culturas temporãs de trigo, cevada, centeio, aveia e fava estavam muito atrazadas ou prejudicadas por modo, que muitas têem de ser inutilisadas, para se proceder a novas sementeiras. O gado manadio está passando por um periodo excepcionalissimo de fome, por isso que as terras destinadas á sua apascentação não lhe proporcionam alimento algum.
«Ha cearas temporãs que estão ainda por nascer, e de entre as que lograram germinar, quasi todas se conservam num estado de vegetação estacionaria. Em algumas localidades os trabalhadores dizem não poderem pagar as respectivas contribuições. Continua a apanha da azeitona que, em virtude do seu mau estado, está produzindo nos lagares a escassa funda de 8 a 10 por cento. O tempo não tem corrido favorável á engorda do gado suíno nos montados, já pela falta de bolota e do seu mau estado, como tambem pela má forra que proporciona a estes animaes, que sem estas duas condições bem preenchidas não podem medrar. Começaram os mercados de gado suíno, os quaes têem eido bem concorridos d'estes animaes que em virtude da escassez do alimento, não podem chegar á sua completa engorda.
«Não tardarão muitos annos que todo o Alemtejo esteja phylloxerado; o inimigo ataca-o já pelo norte e peio centro...»
Isto é official. Isto não são declarações officiosas; é o que consta do boletim official que me foi em tempo distribuido.
Como sou lavrador e curioso, fui ver o que dizia este boletim, e deparei com este quadro de miserias.
Ainda no mez de março estive n'uma região do baixo Alemtejo, em Cuba, e sabe v. exa. o que eu lá vi? Vi que se tinham feito umas sementeiras que não nasceram e que sobre ellas se estavam a fazer novas sementeiras.
Vi que era tal o receio da fome, que os maiores lavradores já não queriam vender a cevada para a guardarem para o anno que vem.
Vi que todas as cearas temporãs que tinham nascido, como as de fava, de grão de bico, etc., estavam em flor, é verdade, mas de tal modo enfezadas, que não podiam dar grande producto.
E vi mais ainda; vi de noite andarem grupos de homens que não tinham trabalho, e portanto que não tinham que comer, a pedir esmola. Eram grupos de cem e duzentos homens, que não tinham quem lhes desse trabalho com que ganhassem o salário para se sustentarem a si e ás suas familias.
E depois de vermos que o Alemtejo não tem nem cereaes, nem gados, nem lãs, que não tem emfim nenhuma das fontes do seu rendimento, se foi-mos para as regiões viticolas, veremos tudo devastado pela phylloxera.
Na minha região, que ainda ha poucos annos não tinha a phylloxera, lá vão ella caminhando a passos agigantados, e muitos lavradores não se defendem, porque não têem meios para isso.
Emquanto á viticultura disse o sr. Campos Henriques que o governo tinha isentado de impostos por seis annos os terrenos phylloxorados que entrem novamente em cultura e de que falla o artigo 2.° da lei do 13 de julho de 1889.
Eu já previa que o governo havia de appellar para o n.° 8.º do § 1.° do artigo 1.° do projecto para socegar os viticultores, para lhes dourar a pillula dos 6 por cento com que os quer mimosear.
Creia s. exa. que o remedio não é efficaz e não produz effeito algum.
O mal é tão profundo que não é um simples paliativo que o póde curar, porque nem ao menos o allivia.
O viticultor não tem meios para pagar as contribuições actuaes e muito menos as futuras.
Dizia então o meu illustre amigo o collega o sr. Campos Henriques que o governo isentara o viticultor durante seis annos, e por isso não se esquecera das circumstancias precárias da agricultura!
É um engano, o creio que o meu caro collega não é de paiz viticola, porque se o fosse não diria tal cousa. Não é com a isenção dos seis annos que se ha de salvar a viticultura, porque s. exa. o que deve saber é que são tão magros os rendimentos da viticultura, são tantas as despezas que se fazem para nos defendermos da phylloxera, tão elevados os salarios que temos de pagar aos nossos jornaleiros, que o que nos resta sabe v. exa. para que é applicado? E para tornar a recompor as vinhas phylloxeradas, a ver se de futuro temos mais algum rendimento, é para applicar a plantações novas a ver se nos salvâmos da crise de que estamos ameaçados.
E é quando estamos n'estas condições, quando não temos 5 réis de economias, porque a phylloxera não nos deixa economisar, que o sr. ministro da fazenda nos vem pedir mais 6 por cento sobre todas as contribuições! O que s. exa. quer é que os lavradores morram de fome.
Não está presente n'este momento o nosso digno presi-
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dente o sr. Pedro de Carvalho, porque, se estivesse, per guntaria a s. exa. de aqui a quantos annos é que seu irmão, o sr. visconde de Chancelleiros, um dos primeiros viticultores do paiz, poderá obter 30:000$000 róis que está gastando na replantaçâo das suas vinhas, plantando milha rés e milhares de cepas americanas. E v. exa. sr. ministro da fazenda, que quer ser a misericordia dos povos, é v. exa. que quer metter-nos as mãos nos bolsos sem sentirmos S. exa., porém, e infeliz porque só encontrará cotão.
Não podemos dar-lhe o que não temos.
E é quando o paiz está a braços com uma crise agricola que s. exa. vem exigir mais 6 por cento. Deve s. exa. ter notado que o povo portuguez está atacado de uma grande doença - a emprego-mania.
Pois, sr. presidente, o mau estado da nossa agricultura explica este phenomeno.
A agricultura não dá nada ao agricultor para poder viver, por consequência elle o que faz? O que procura? Um emprego que lhe dê alguma cousa, visto que pela agricultura nada obtém para se sustentar e às sua familia.
Quanto mais a agricultura for sobrecaregada com impostos, mais augmentará a emprego-mania.
Se a agricultura até agora dava tão pouco que não chegava o seu rendimento para os lavradores viverem, d'aqui em diante essas circumstancias serão ainda peiores, por causa do aggravamento dos impostos, resultante do addicional creado pelo projecto em discussão, e, creia s. exa. que o resultado d'isso será tambem o aggravamento da emprego-mania.
O sr. ministro da fazenda deve saber as difficuldades com que tem lutado, para satisfazer os pedidos de empregos para os seus correligionarios.
Não digo que s. exa. os desse, mas elles tiveram o hão de ter essas pretensões.
Creio que s. exa. deve apreciar bem quaes são as difficuldades de um ministro relativamente á emprego-mania, que é o resultado da agricultura não dar rendimento sufficiente para se poder viver.
S. exas. fundamentaram todos os seus decretos de dictadura no patriotismo; mas, se não me engano, entre elles ha um alargando mais as guardas municipaes para se poderem livrar das dificuldades que lhes trariam os seus amigos e correligionarios, que procuram empregos. E esta prova ve-se no parecer da commissão do bill, que relativamente ao decreto n.º 3, que reorganisa as guardas municipaes de Lisboa e Porto, diz o seguinte:
«O decreto n.° 3 reorganisava as guardas municipaes de Lisboa e Porto, não só para occorrer ás necessidades quotidianas do serviço, reclamado pelo augmento extraordinario da população d'estas duas cidades, etc.»
É realmente notavel este motivo sem fundamento para, com tanta urgencia, se reorganisar em dictadura a guarda municipal, cuja reorganisação não fora julgada necessária até 11 de janeiro!
Todos sabem que a população da capital tem augmentado muito, mas não tão repentinamente como o parecer faz suppor e nem isso é crivel.
Ora de 11 de janeiro, dia em que caiu o governo progressista, até 10 de fevereiro, em que foi publicado este decreto, não se deu grande augmento de população; por isso não posso deixar do attribuir esse augmento repentino de população ao grande numero de amigos do governo, que depois da subida do partido regenerador aqui têem sido trazidos pela monomania de empregos e que passeiam na Arcada! (Riso)
Digo a s. exa., que o seu opportunismo é a fome, e que se s. exa. attender um pouco á agricultura ha de ver que tal opportunismo não existe.
Agora, sr. presidente, direi que o projecto é injusto, e é isso que vou demonstrar a v. exa. e á camara, não para a convencer, porque já sei que se ha de pagar este addicional, que remedio ha! mas ao menos para varrer a minha testada, para reclamar contra estes 6 por cento, que me querem tirar. Eu hei de pagar, mas hei de buffar.
Diz s. exa. no seu relatorio: «O encargo não deve ser pesado a ninguem para ser passivel. A sua incidencia deve ter o maximo caracter de generalidade, para ser productivo. A distribuição approximar-se da mais rigorosa igualdade, para ser justo.»
Isto diz v. exa., sr. ministro da fazenda, com grande espanto meu, no seu relatorio a paginas 21.
Ora, como s. exa. se quer approximar da mais possivel igualdade para ser justo, eu vou mostrar a s. exa. aonde está essa igualdade, vou mostrar a s. exa. que, se ha igualdade, é em aggravar a desigualdade já existente.
S exa. mesmo no seu relatorio reconhece a desigualdade do imposto predial o implicitamente o aggravamento dessa desigualdade com os 6 por cento, porque a paginas 22 diz o seguinte «não corrige em verdade as desigualdades existentes, mas tambem as não torna mais numerosas.»
Que novidade!!
Não corrige as desigualdades, não as torna mais numerosas, mas aggrava-as, e esse é que é o grande mal do projecto.
Um financeiro, como devia ser o sr. ministro da fazenda, devia procurar corrigir as desigualdades do imposto, e não trazer aqui um projecto em diametral opposição com os verdadeiros principios da sciencia financeira.
Disse que o addicional de 6 por cento aggrava a desigualdade existente no imposto predial e vou mostrar onde está essa desigualdade, porque d'ahi se conclue a injustiça do mesmo addicional.
As nossas matrizes prediaes são muito antigas e estão de tal modo organisadas que é extraordinaria a desigualdade na distribuição do imposto.
O meu illustre amigo o sr. Campos Henriques, relator do projecto, disse que ha desigualdades em todos os impostos, dil-o mesmo o relatorio, como acabei de ler.
Mas por isso mesmo que ha desigualdades é que o governo, em logar de tratar de corrigil-as, as augmenta lançando mais 6 por cento de addicionaes. (Apoiados.) A rasão por que existem estas desigualdades sabe v. exa. tão bem como eu. Eu sei que ha muitos proprietarios que, devendo pagar 20, pagam 10, e outros que, devendo pagar 10, pagara 20. (Apoiados.) Como corrigir essas desigualdades? Está claro que a maneira de corrigir era proceder á organisacão de novas matrizes. Este trabalho ia começou a fazer se, e se a politica não se tivesse mettido n'elle, como se mette em tudo, talvez já estivesse concluido.
Infelizmente no nosso paiz tudo que é feito por um governo, embora isso seja bom, é contrariado pelo partido que está na opposição. Temos d'isso um exemplo no imposto de rendimento, nas novas matrizes e na lei das licenças. Eu não desejo accusar ninguem, mas a verdade é que todos temos culpas no cartorio. (Riso. - Apoiados.)
Se a politica se não tivesse mettido de permeio na execução de differentes leis, talvez não tivessemos de fallar em tantas desigualdades, e o governo não viesse pedir-nos tantos impostos e entre elles mais 6 por cento de addicionaes. (Apoiados.)
As novas matrizes, embora já feitas em algumas partes do paiz, não podem, todavia, pôr-se em execução, porque têem de executar-sc ao mesmo tempo em todo o paiz, para não succeder que uns estejam pagando mais e outro menos. (Apoiados.)
Nas antigas matrizes as desigualdades são enormes, e quanto mais se lhes addicionar mais se aggravam essas desigualdades. (Apoiados.)
Sr. presidente, vejo que o projecto não isenta do addicional a contribuição de registo, que é um imposto que tambem onera a propriedade. (Apoiados.)
Tenho exercido algumas vezes a profissão de advogado, conheço por isso as difficuldades que se encontram lá fóra, sei as questões que se levantam pela falta de pagamento
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da contribuição de registo. A contribuição de registo, que é um imposto pesadíssimo, vae recair sobre a propriedade, chegando a pagar-se 14 por cento. E sabem qual é o resultado d'isto? E a fraude, é não se pagar.
Agora vae lançar-se mais 6 por cento. Com isto remedeia-se o mal? Pois eu creio que em vez de se remedeiar se vae aggravar, porque quanto maior for o imposto, maior é a repugnancia em o pagar. (Apoiados.}
Alem d'isso direi a s. exa. que se os antigos addicionaes eram maus porque aggravavam as desigualdades existentes, s. exa. o sr. ministro da fazenda vem agora com o § 2.° do projecto dar-nos mais a consolação de que o addicional não recáe só sobre a verba principal, mas sobre todas as verbas que foram encorporadas com a principal em 1889, creio eu.
Se pois, os antigos addicionaes, recaindo só sobre a verba principal eram maus, porque aggravavam a injustiça resultante da desigualdade do imposto, este addicional, agora que vae recair não só sobre a verba principal, mas tambem sobre a que provém dos addioionaes antigos é ainda muito peior do que elles.
Declaro a v. exa. que parece incrivel que o sr. ministro da fazenda, que é um moço de talento, não visse que este addicional era impossivel, e que tivesse a coragem de apresentar á camara este projecto. (Apoiados.)
Nas circumstancias actuaes da agricultura que tem de pagar quasi todo o imposto resultante deste addicional, e com as desigualdades aggravadas pelo addicional, este projecto é impossivel.
Por consequencia, como demonstrei, este addicional alem de ser inopportuno, é não só injusto mas injustissimo.
Provarei agora que elle é inconveniente.
Disse s. exa. que o paiz não acceita impostos novos, mas acceita o addicional sem resistencia; que o paiz não reagiu ainda contra o addicional, e concluo d'aqui s. exa. que não ha nada melhor do que o addicional de 6 por cento.
Emquanto isto vae em palavriado, o paiz pouco se importa, e ainda assim já tem reagido pacificamente, porque todos os dias se têem apresentado n'esta camara representações contra o addicional, e portanto o paiz levanta-se. Isto, porém, é por emquanto com relação ás classes mais illustradas; mas quando o povo tiver de pagar o addicional então ha de reagir mais seriamente.
Antes do antigo addicional ser conglobado na verba principal, vi muitas vezes a difficuldade que havia em o contribuinte pagar quando o recebedor juntava o addicional á verba principal.
O sr. ministro da fazenda sabe muito bem que em tempo os avisos que eram entregues ao contribuinte mencionavam apenas a verba principal da contribuição e que o recebedor, no acto do pagamento, é que lhe juntava a importancia do addicional. Isto tinha um grande inconveniente. O contribuinte, que vinha com a sua quantia, conforme o aviso, para pagar a sua decima, quando o recebedor lhe exigia mais dinheiro, reagia e não pagava, porque muitas vezes não tinha mais dinheiro e o que trazia era muitas vezes emprestado.
Ora, o sr. ministro da fazenda, que sabe d'estas difficuldades, tratou de dizer no § 4.º que o governo fica auctorisado a incluir nas taxas principaes dos tributos existentes, tanto o addicional estabelecido pela lei de 29 de abril do 1882, como o imposto de que trata esta lei.
Mas o que s. exa. não sabe é que o contribuinte pagou no anno passado uma taxa de contribuição, e suppondo que este anno pagará o mesmo, quando for a pagar os G por cento ha de reagir, e isso é um grande inconveniente para a boa administração, e Deus sabe os resultados que d'aqui podem porvir.
S. exa. não removeu com o § 4.° as difficuldades que pretendia evitar.
Se dissessem ao povo que tem a pagar um imposto completamente novo, elle paga sem reagir, se a politica se não metter n'isso; mas se lhe no mesmo imposto lhe pedirem mais n'um anno do que elle pagára no antecedente, já não paga sem reacção.
O addicional actualmente já não é pago sem se sentir, como diz o sr. ministro da fazenda, o esse é que é o seu inconveniente, podendo resultar d'isso perturbação na ordem publier.
(Interrupção que não se percebeu.)
Esqueci-me, sr. presidente, de mencionar mais uma injustiça d'este addicional.
Os empregados publicos vão tambem pagar 6 por cento sobre o imposto de rendimento que já pagam, porque o projecto diz no n.° 11.º do § 1.º que d'elles só fica exceptuado o imposto de rendimento que competir aos juros dos títulos de divida publica, consolidada e amortisavel.
Ora, como toda a camara sabe, o imposto de rendimento só incide sobre duas fontes, que são os juristas e os empregados publicos, e portanto soo projecto só exclue os juristas, é claro que o addicional vae recair sobre os 3 por cento que pagam os empregados publicos.
Toda a camara comprehende que devendo sor genérica a incidencia do imposto de rendimento, é injusto que ella comprehenda apenas os juristas e os empregados publicos.
Ou este imposto deve ser pago por todos, ou por ninguem. Em questão de impostos não deve haver favoritismo. (Apoiados.)
Pois, sr. presidente, este projecto, isentando os juristas e portanto os capitalistas do pagamento d'este addicional de 6 por cento, augmenta mais a injustiça existente, indo aggravar o imposto de rendimento que os empregados publicos pagam dos seus ordenados.
A excepção devia comprehender uns e outros e a sua falta para os ordenados é tanto mais odiosa quanto todos sabem que, em geral, os ordenados são pequenos e que por isso se vae exigir um sacrifício com que nem todos podem. (Apoiados.)
Agora sou chegado a uma questão, um pouco mais politica; e vou encurtar quanto possivel as minhas considerações para dar ao illustre deputado, que se me segue no uso da palavra, ensejo de poder fallar ainda hoje.
Eu entendo, sr. presidente, que o governo não tem auctoridade nem direito para pedir mais dinheiro ao contribuinte.
O sr. ministro da fazenda disse que os progressistas gastaram muito, que é preciso não despender como nos quatro annos de gerencia progressista, e acrescentou:
«Precisâmos de marinha para nos desaffrontarmos do qualquer nação como nós; devemos ter exercito para nos defendermos; deve qualquer nação organisar-se para se fazer respeitar.»
Aqui tem v. exa. a que se reduzem as economias que o governo pretende fazer! O governo, que nos argue de termos gasto muito, vae gastar muito mais do que nós; o governo, que nos argue de termos gasto alguns milhões de contos em obras publicas, vae gastar 50.000:000$000 réis em despezas militares, que só têem por fim illudir o povo. Tudo isso que por ahi se diz sobre defeza nacional, organisação do exercito e de marinha, etc., para mira não passa de palavras inuteis e vãs. Como é que nós poderemos organisar-nos de modo a que possamos bater-nos com qualquer nação? Pois um paiz que tem uma tão extensa costa, por onde qualquer nação nos póde atacar; um paiz que tem uma enorme raia secca, por onde qualquer exercito nos póde invadir, poderá nunca defender-se? Isto tudo não foi mais do que poeira lançada aos olhos do contribuinte. E sabe v. exa. por que é que eu digo isto? É porque o disseram já os srs. Campos Henriques o Carrilho.
O sr. Campos Henriques disse que a dictadura tinha dado força e auctoridade ao governo, e que o facto do o governo se dar a si mesmo aquellas auctorisações não queria dizer que se fizessem já essas despezas. E o sr.
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Carrilho acrescentou que as despezas com os navios não se faziam, porque ainda na o havia os planos.
Então, pergunto eu, para que era essa urgência em decretar em dictadura aquillo que ha de levar quatro annos a fazer, como disse o sr. Teixeira de Vasconcellos? Para que vem o governo com estas auctorisações decretadas apenas para enganar os verdadeiros patriotas, aquelles que tinham sentido bem viva na face a bofetada de Inglaterra? Um governo, que pretende assim enganar o verdadeiro patriotismo; um governo que vem assim decretar, apenas no papel, esses navios do guerra, esses exercitos numerosos com que quer cobrir Portugal, essas torres blindadas para defender o Tejo, mas quando na realidade tudo isto não passa do papel, porque nos falta o principal elemento com que se faz a guerra, dinheiro, dinheiro e dinheiro; um governo d'estes não tem auctoridade para vir pedir sacrificios ao paiz, porque só o quiz illudir. Forque não veiu o governo pedir ao parlamento auctorisação para fazer essas despezas, á medida que as circumstancias o exigessem? Então ainda teria alguma auctoridade, porque ao menos não teria enganado o paiz.
Quer s. exa. que Portugal seja respeitado? Dê-lhe s. exa. uma boa administração politica e economica. Não suffoque o governo a liberdade. (Apoiados.)
Para sermos respeitados não precisâmos do grandes exercitos e de grande marinha. A Suissa é um paiz mais pequeno que o nosso e tem apenas um exercito activo de 3.000 homens, e nem por isso deixa de ser respeitada. Organise o governo as forças militares como na Suissa que, apesar de ter apenas um exercito activo de 3:000 homens em caso de guerra, em vinte quatro ou quarenta e oito horas põe nas suas fronteiras 200:000 homens. Era muito mais economico e muito mais conveniente para a agricultura.
É preciso que nos não illudamos, mas muito mais preciso é ainda que o governo não perca auctoridade pretendendo illudir-nos, porque só se illudo a si e perde força para governar, e fica sem direito a pedir-nos dinheiro porque todos sabemos que elle não faz, porque não póde fazer, as despezas para que está auctorisado, mesmo por que essas despezas são desnecessarias.
Nós, um paiz pequeno como somos, se nos abandonarmos aos nossos proprios recursos de defeza nada valemos; o que nos póde salvar é a diplomacia.
O sr. Ferreira de Almeida: - Não apoiado.
O Orador: - V. exa. tem ahi o Pimpão no Tejo, para que nos serve? O que nós precisâmos é de pequenos barcos para o serviço de navegação na Africa.
Uma voz: - É triste.
O Orador: - O que é triste é o governo pedir mais impostos, querer gastar contos e contos de réis para ficarmos na mesma.
Querem ter uma grande esquadra. E o dinheiro! Querem occorrer a essa despeza com os 6 por cento dos addicionaes? (Apoiados.) Diz-se que são necessarios réis 50.000:000$000.
Uma voz: - Não é preciso tanto.
O Orador: - Eu já vi, creio que n'um relatorio ou projecto, calculada essa despeza em 50.000:000$000 réis. Pois bem, gastem-se esses 50.000:000$000 réis. Mas onde se hão de ir buscar? Se não for ao credito, do certo que não teremos essa quantia.
O que eu digo é que apesar de todas essas torres blindadas, de todo esse exercito, de toda essa marinha, havemos de estar sempre á disposição das outras nações.
Se precisâmos de marinha não é para nos desaffrontar-mos de qualquer nação pequena como a nossa, essa não vem affrontarmos porque, provavelmente, tem tanto medo como nós.
O sr. Manuel de Arriaga: - Não apoiado.
O Orador: - Não vem, porque tem medo de se comprometter com as nações grandes.
Nem mesmo com 50.000:000$000 réis nós poderiamos adquirir uma esquadra que podesse combater com vantagem as esquadras inglezas.
Sr. presidente, o movimento patriotico que se fez em Portugal por occasião de se saber do conflicto com a Inglaterra, e que levou aos conselhos da corôa o actual governo, só serviu para elle abusar do patriotismo, coarctando as liberdades publicas e enganando o povo. (Apoiados )
O governo, sr. presidente, quando calcou aos pés com a dictadura, as garantias parlamentares, já sabia que não podia fazer uso das auctorisações que a si proprio dava.
O governo pois só lançava mão do patriotismo em seu proveito proprio e não no da nação. (Apoiados.)
O governo quando fez a dictadura já sabia que com o dinheiro de que poderia dispor, só poderia arranjar navios de papel, soldados do chumbs e torres blindadas de papelão.
O seu fim, pois, foi enganar-nos e suffocar o patriotismo que o incommodava. (Apoiados).
Se não, diga-me v. exa., sr. ministro da fazenda, que corrente de opinião publica levou a crear em dictadura o ministerio da instrucção publica e a organizar as guardas municipaes?
Foi o patriotismo como diz no seu relatorio a pagina 21?
Era melhor fallar com franqueza e dizer-nos que o ministerio da instrucção publica fora creado para contentar o sr. Arroyo e que as guardas foram organisadas para suffocar o patriotismo que serviu de pretexto á sua organisação.
E a respeito de economias nem um projecto. Tudo despezas (Apoiados.)
O governo nem mesmo podo soccorrer-se ao § 10.° da lei de meios, porque todos sabem que ella só tem vigor durante este anno economico e que depois lá fica a porta aberta para desperdicios (Apoiados.)
Ora, sr. presidente, o governo que enganou o paiz, publicando em dictadura decretos contendo auctorisações que só podem ser executadas d'aqui a muitos annos, não havendo por isso necessidade de calcar as garantias parlamentares, não tem auctoridade para vir pedir ao parlamento que lhe vote mais 6 por cento de addicionaes (Apoiados.)
O governo, que em vez de fazer economias, só apresenta projectos para se gastarem muitos mil contos de réis, tendo accusado o seu antecessor, que não lançou impostos, de ter feito grandes despredicios, e quer agora fazer mais ainda do que esse seu antecesor, não tem direito a vir pedir mais dinheiro (Apoiados.)
Um governo economico é que teria esse direito.
Terminarei, sr. presidente, dizendo que o governo é como Luiz XV, rei de França.
Este monarcha dizia: «Depois de mira o diluvio». Creio que os srs. ministros dizem o mesmo.
Se a onda, porém, se levantar, oxalá que não nos esmague a todos, porque essa onda será a bancarota.
O paiz está exhausto e não póde pagar mais.
Tenho concluido.
Vozes: - Muito bem.
(O orador foi comprimentado.)
O sr. Sergio de Castro (sobre a ordem): - Sr. presidente, mando para a mesa a minha moção de ordem, que é concebida nos seguintes termos:
«A camara, comprehendendo que os sacrificios pedidos ao paiz são uma consequencia da situação financeira que o partido regenerador herdou com o poder, continúa na ordem do dia.
«Sala das sessões, em 5 de julho de 1890.= Sergio de Castro.»
Sr. presidente, sei, por ter visto da galeria, que frequentei por largo tempo, que é da praxe, sempre que alguem ergue pela primeira vez a sua voz n'este recinto, pedir a
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benevolencia dos ouvintes, amigos e adversarios; e ainda que essa não fosso a pratica, eu seguil-a-ía, porque muito especialmente necessito d'ella; já porque não é sem uma grande commoção que me levanto para fallar, já porque, costumado a uma outra tribuna, a da imprensa, sei que a profissão de jornalista intransigente e lutador não é das mais apropriadas a captar benevolencias espontaneas.
Sr. presidente, cumpro muito gostosamente o dever de comprimentar o orador que me antecedeu, o meu prezado amigo o sr. Monteiro Cancella, pelo excellente discurso que acaba de pronunciar, assegurando-lhe que, no correr da minha exposição, responderei a alguns dos seus reparos ao projecto em discussão; e feito este cumprimento, começo por affirmar a v. exa. e á camara que farei brevissimas considerações, occupando por poucos momentos a sua attenção benevola, affirmação esta que eu não farei em vão, como tantas outras que se fazem, e que não se cumprem. (Apoiados.) Não quero, sr. presidente, ser solidario, ou antes connivente com os propositos manifestos da opposição em protelar os debates, tendo os srs. progressistas dedicado a sua ultima sorte de obstruccionismo ao illustre ministro da instrucção publica, não se lembrando s. exas. de que os seus largos e notabilissimos discursos se harmonisavam com os verdadeiros attentados, que em tempo passaram por esta casa, como hoje as energias e indignações de sobreposse não se coadunam com o projecto de reformar e unificar o ensino, juntando-se ao fomento material de 1851 o fomento educativo de 1890, e continuando assim o partido regenerador na carreira das suas gloriosissimas tradições. (Vozes: - Muito bem, muito bem.)
Nas condições em que eu fallo, sr. presidente, um pouco excepcionaes, necessito de fazer algumas considerações geraes. Felizmente, não tenho a fazer profissão de fé partidaria, (Apoiados.), e, se alguma força possuo, é essa.
Jornalista do partido regenerador ha quinze annos, lutando noite e dia (Apoiados.), e sem hesitações nem jogos de porta, eu entro n'esta casa quando já conto no jornalismo partidario os annos que na vida civil são necessarios para a primeira aposentação legal; e com este passado é claro que estou ao lado do governo, isto é, do partido regenerador, e incondicionalmente, como é proprio do meu feitio, dado a extremos. Hoje mais do que nunca, hoje mais do que nunca, accentuo bem estas palavras, em que este partido retoma o fio das suas tradições, que um prurido doutrinario lhe havia quebrado por instantes. (Apoiados.)
Sr. presidente, n'este tempo em que quasi todos os que têem fallado, ainda os mais conhecidos pelas suas idéas e auctorisados pela sua posição, entendem dever fazer affirmações de politica geral, eu quero tambem expor a minha e é que - n'esta direita, eu estou na extrema direita. Curado, felizmente muito a tempo, d'aquelle sarampo politico de que se falla em uma comedia de Pailleron, eu sou conservador, tanto quanto é possivel sel-o dentro do systema monarchico constitucional representativo. E não cuide alguem que eu assim me orientei com De Maistre, ou outro qualquer praxista de theorias de absolutismo; não, sou conservador pela convicção em que estou de que são os conservadores que realisam todos os progressos compativeis com o tempo - these de historia universal, liquidada pela observação de um milhão de factos e apresentada por um eminente publicista e orador, insuspeito para os mais liberaes, o sr. D. Emilio Castellar.
Sr. presidente, é meu firme propósito não offender nem melindrar sequer partidos ou pessoas; mas como o vicio jornalistico póde atraiçoar-me o pensamento, se eu soltar alguma referencia destoante, desde já a declaro não escripta. (Vozes: - Muito bem.
Mas a minha organisação, os meus processos, a minha orientação, como quizerem, é essencialmente politica, e por isso eu não posso, como já disse, deixar de formular algumas considerações essencialmente politicas.
A duas cousas me quero referir principalmente: uma que ouvi ao illustre publicista, o sr. Oliveira Martins, que disse que todos os partidos são iguaes, e outra que é o estribilho de todas as tiradas oratorias de quantos faliam d'aquelle lado da camara (do esquerdo), que todos terminam por dizer que nunca hão de quebrar carteiras.
Sr. presidente, a phrase de que todos os partidos são iguaes, é uma d'aquellas phrases que se fazem, vasias de sentido, e que passam em julgado, sem lhes corresponder uma idéa. (Apoiados.)
É certo que, quando um paiz completa a sua emancipação nacional, se assim me posso expressar, se fórma um typo commum de raça, que se individualisa na figura, na linguagem, nas tendencias, nas idéas, nos processos, etc., sem que por isso deixe de haver diversidades manifestas.
Nas idéas e nos processos, essas diversidades manifestam-se, por exemplo, na politica que orienta os regeneradores em contraste com a acção dos progressistas, embora concordem em principios fundamentaes, desde que ambos desenvolvem a sua actividade dentro do mesmo regimen politico.
Vejamos emquanto a dictaduras e a questões de fazenda.
Nós tivemos a dictadura da ordem, tivemos a dictadura que habilita o paiz a defender-se, porque o paiz não foi atacado, o tivemos a dictadura da instrucção; mas todas estas dictaduras contrastam com a da vaidade e dos empregados publicos, que se estendeu desde 17 de julho de 1886 a 17 de março de 1887, periodo este que, por não completar os nove mezes das gestações regulares e normaes, abortou, (Riso. - Apoiados.) abortou aquella dictadura a mais monstruosa de todas, a dictadura do pagamento dos 449:000$000 réis, que de tal ordem foi, que ainda não está completamente absolvida pela camara dos dignos pares. (Apoiados.)
E d'este acontecimento me lembrei eu, sr. presidente, quando ouvi ao sr. Monteiro Cancella dizer que o sr. ministro da fazenda queria tirar o dinheiro da algibeira dos contribuintes, sem elles o sentirem, para lhe lembrar agora que não é bom desafiar represalias, porque se algum dinheiro foi tirado da algibeira do contribuinte, sem elle sentir, foi aquelle, porquanto o relator do respectivo projecto se apressou a declarar em cartas memoraveis, que tal pagamento não ficára auctorisado na lei. (Apoiados.)
Este projecto é que não póde ser mais franco, nem mais nitidamente posto em frente do contribuinte: pedem-se-lhe 1.400:000$000 réis, e elle sabe que ha de pagal-os por mais 6 por cento sobre as contribuições a que actualmente é obrigado. Onde ha, pois, aqui escamoteações insensiveis?! (Apoiados.)
E no que respeita ao modo por que progressistas e regeneradores encaram as questões financeiras? É ver e comparar os ultimos relatorios e as respectivas propostas; as de hoje são francas, claras, e as de hontem tinham alçapões, meandros, labyrinthos - eram operações bem combinadas!
Mas vamos agora á grande, á incommensuravel, á grandiloqua questão das carteiras partidas. (Riso.)
Ora, sr. presidente, seja-me permittido ser immodesto uma vez, dizendo que, ácerca d'este extraordinario e assombroso assumpto eu tenho idéas assentes e definidas: a minha opinião, sr. presidente, é que não quebra carteiras quem quer. Quebra-as quem tem no fundo da sua consciencia fundamento de justiça bastante para se desvairar, sendo esse desvairamento um testemunho da grandeza dos seus sentimentos. (Muitos apoiados.) Exemplificando, seria comico, seria rediculo, que alguem se pezesse a quebrar carteiras porque um governo tratára de restabelecer a ordem, que está restabelecida, porque tratára de fazer respeitar o principio da auctoridade, que estava achincalhado nas ruas, nas praças e nos pasquins; mas essas energias
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comprehendiam-se diante de certas monstruosidades, que eu nem sequer desejo recordar...
E assim fica discutido, de uma vez para sempre, o estribilho de todos os discursos do sr. capitão Machado, e o ritornello de todas es expansões fortes do sr. Eduardo Abreu; porque, sr. presidente, é de notar que n'esta questão gigantesca encontram-se de accordo o Marte, que mata, e o Hyppocrates, que cura. (Riso.)
Est modus in rebus; e posto isto, o sr. capitão Machado póde continuar á vontade com o seu estribilho e o sr. Eduardo Abreu com o seu ritornello. (Apoiados.)
Mas vamos particularisar as criticas do projecto que se discute; e eu, sr. presidente, estou de olho no relogio porque quero metter na hora da sessão as minhas considerações.
Sr. presidente, eu confesso que a marcha do discurso do sr. conselheiro Eduardo José Coelho, pronunciado hontem á noite, me causou certa estranheza... E vejo que s. exa. se está enfrenesiando, e fal-o antes de tempo, póde estar tranquillo, porque logo lhe mostrarei que a minha estranheza redunda em seu louvor e honra.
Já se vê que não vou dar resposta ás suas observações financeiras, porque a essas já respondeu com grande elevação de espirito e proficientemente o meu prezado amigo, o sr. Teixeira de Vasconcellos. (Apoiados); quero apenas levantar a phrase de que a questão dos julgados municipaes já deu tudo quanto tinha a dar, que está esgotada, que está liquidada. Ora, eu estranhei esta affirmativa, e já vou dar a rasão; tenha s. exa. paciencia em esperar um poucochinho. (Riso.)
Sr. presidente, em fins de janeiro do anno passado, o sr. conselheiro Eduardo Coelho pediu aqui documentos pelo ministerio da justiça, e eu tenho em frente a copia dos documentos que s. exa. pediu, e o que posso affirmar é que desde que ha systema representativo ainda ninguem fez, em nenhum parlamento do mundo, da Europa ou da America, um tão vasto pedido de documentos. São columnas do Diario das sessões; não parece um requerimento, mas um discurso! (Apoiados.) Um immenso discurso...
Façam favor de ouvir:
«Nota dos juizes do ultramar que foram collocados na magistratura do reino, bem como a do numero dos juizes das relações ultramarinas, com a data das suas posses na primeira e segunda instancias. Mappa dos julgados municipaes creados, e datas das suas creações; lotação dos empregados de justiça em cada uma das comarcas onde se crearam julgados municipaes, com respeito a escrivães, contadores e officiaes de diligencias; lotação, nas referidas comarcas, de juizes de direito e delegados do procurador regio; mappa demonstrativo das indemnisações pedidas pelos juizes e delegados e quaesquer empregados de justiça, conforme o § 1.° do artigo 18.° do decreto de 23 de julho de 1886, data d'esses pedidos e data das concessões feitas e quantitativo d'ellas.»
Sr. presidente, eu paro aqui a leitura, no centesimo miliario d'esta jornada. Isto é a legua da Povoa dos requerimentos! (Riso.)
Ora, sr. presidente, o sr. conselheiro Eduardo José Coelho não pôde fazer uso d'estes documentos, se acaso lhe foram enviados, porque, pedindo-os, como já d'isso, em fins de janeiro, logo no mez seguinte foi chamado aos conselhos da corôa, para ministro e secretario d'estado dos negocios das obras publicas, commercio e industria, para collega do sr. conselheiro Francisco Beirão, o Pombal dos julgados municipaes, a quem por isso não pôde, pela critica aos factos a que taes documentos se referiam, mostrar o muitissimo que o considerava e estremecia no tribunal do commercio da sua amisade, situado no mais intimo e graduado dos reconditos da sua alma, que é como quem diz: no tribunal do commercio da sua amisade, situado no Terreiro do Paço do seu coração. (Riso.-Vozes: Muito bem, muito bem.)
Por isso eu entendo, sr. presidente, que, não podendo s. exa. ter feito uso o anno passado de taes documentos estando na maioria, o podia fazer este anno estando na opposição, onde se permittem maiores liberdades, tanto mais que s. exa. e o seu ex-collega da justiça estão aqui muito unidos pelo menos em fauteuils. (Riso.)
Portanto, emquanto s. exa. não tiver feito uso d'aquelles documentos, eu, que tenho em muito o seu espirito pesquizador, não posso considerar liquidada a questão dos famosissimos julgados municipaes. (Apoiados.)
Sr. presidente, tenho ouvido todos os discursos que se têem pronunciado contra o projecto, e com a maxima attenção, devida ao talento dos oradores, desde o sr. Fernando Mattozo Santos ao sr. Paulo Cancella, e tenho visto que todas as allegações se cifram em duas censuras. A primeira consiste em se condemnar o pedido de novos sacrificios ao contribuinte, que não póde, não deve, nem quer pagar mais - antiga phrase, ou antiga bandeirola do partido progressista, que aliás, posteriormente a ella, tem pedido, e por diversas vezes, importantes sacrificios ao contribuinte; a segunda consiste em dizer que o projecto não passa de um expediente financeiro, de um meio empirico de crear receita, que não está em harmonia com os elevadissimos talentos, incontestados e incontestaveis, do meu querido amigo o sr. ministro da fazenda.
Vamos por partes; mas antes eu quero dizer que este ultimo argumento chega a ser contraproducente, pois se s. exa., com esse merecimento superior, não póde encontrar na actualidade melhor meio para elevar as receitas publicas, devemos concluir que a medida é insubstituivel! (Apoiados.)
Mas, sr. presidente, eu confesso que esta censura, de se pedirem novos sacrificios ao paiz, nos seria cabida se o pedido fosse feito após dois, tres ou quatro annos de gerencia regeneradora; mas o pedido é feito após quatro annos de administração progressista. (Apoiados.) Repito: é necessario ver que o pedido é feito após quatro annos de administração progressista, porque fundamentalmente esta é que é a questão das responsabilidades. E isto o que significa? Significa que nós vamos equilibrar o que elles desequilibraram; e são os srs. propressistas que nos censuram por nós acudirmos com o remedio ao mal que elles produziram! (Muitos apoiados.)
Sr. presidente, pedem-se por este projecto 1.400:000$000 réis ao contribuinte; mas este sacrificio seria desnecessario, se porventura o partido progressista não tivesse gasto mais do que gastou o partido regenerador, conforme confessou o sr. Mattozo Santos, no seu discurso; seria desnecessario, se a administração progressista tivesse agradado, que não agradou, ao sr. dr. Frederico Laranjo, que teve a hombridade de o declarar, e que é membro muito distincto e dedicado d'esse partido; o sacrificio seria desnecessario, se o partido progressista não tivesse gasto mais do que permittem as forças do thesouro, como disse o sr. Oliveira Martins. (Apoiados.)
Bem vêem que me auctoriso em uns testemunhos insuspeitissimos. (Apoiados.)
Mas continuemos.
Sr. presidente, este sacrificio seria desnecessario pedil-o ao contribuinte se porventura o augmento das despezas ordinarias, que anteriormente a 1886 era de 1.000:000$000 réis, quando muito, não se tivesse elevado posteriormente a muito mais de 2.000:000$000 réis. (Apoiados.)
Sr. presidente, este sacrificio era desnecessario pedil-o ao povo, se por acaso não se tivesse pago os celebrados 449:000$000 réis aos herdeiros dos antigos contratadores do tabaco.
Sr. presidente, não haveria necessidade de sobrecarregar o contribuinte com mais impostos se se não tivessem feito conversões, que segundo os calculos do sr. Moraes Carvalho, uma verdadeira auctoridade em assumptos financeiros e económicos, (Apoiados.) e que eu tenho o prazer dever
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presente, calculos que eu nunca vi contestados, duram para o thesouro um prejuizo annual de 50:000$000 réis, emquanto que deixaram aos seus negociadores o lucro fabuloso de 5.000:000$000 réis! (Apoiados.)
Este sacrificio era desnecessario pedir-se ao paiz, sr. presidente, se as despezas proprias da ministerios se não tivessem elevado, ao orçamento de 1889-1890, em réis 7.000:000$000, numeros redondos, sobre o orçamento de 1885-1886, apresentando-se-nos o sudario nos seguintes termos de augmento:
[Ver tabela na imagem]
Fazenda ....
Reino ....
Justiça ....
Guerra ....
Marinha ....
Estrangeiros ....
Obras publicas ....
Sr. presidente, este sacrificio não teria rasão de ser se não se tivessem feito reformas, tumultuariamente, em que os addidos formam um exercito, que se não póde contar, porque ninguem conta as areias do mar e as estrellas do ceu!
Este pedido de sacrificios ao paiz, sr. presidente, seria desnecessario, se não se tivesse feito a reforma dos alcools, em que os empregados da fiscalisação dos ditos, fartamente remunerados, têem unicamente por trabalho... consumir os seus ordenados, constituindo o estado de S. Jorge da burocracia portugueza. (Riso.)
Se todos estes factos não se tivessem dado, o projecto era um crime; assim é uma necessidade evidente. (Muitos apoiados.)
Sr. presidente, ouvi no outro dia aqui, á voz dulcissima do meu antigo amigo, e sempre amigo o sr. Eduardo Villaça, dizer que a creação do ministerio da instrucção publica era conveniente, mas que era financeiramente inopportuna. E ao ouvir isto, eu lembrei-me que o illustre partido progressista aventára com um ministerio da instrucção publica pela janella fóra, porquanto o juro dos 449:000$000 réis, a que me tenho referido mais de uma vez, dava farta e de sobra para a organisação dos seus serviços.
Ao ouvir, sr. presidente, faltar das conveniencias a par das inopportunidades financeiras, eu lembrei me d'aquelle outro ministerio, o da agricultura, que foi aqui annunciado em 1886. Esse podia ser montado fartamente com o dinheiro que o thesouro perdeu nas conversões.
Mas ficou na casca; ficou in mente, como a lei da successão do tempo de El-Rei D. Duarte; nem sequer teve dobradiça n'esta casa, nem sequer teve aposentadoria em segundo andar, porque se algumas edificações teve, foi de castellos no ar, nos intermundios do Alto de Santa Catharina, que, segundo a phrase popular, é de onde se avistam os navios... (Riso. - Vozes: - Muito bem, muito bem.)
Sr. presidente, ha economias de economias, e a proposito, eu lembro-me agora de um facto historico da nossa politica contemporanea. O partido progressista, desde que nasceu na praia da Granja, e de coito damnado, constituiu dois ministerios: o que foi presidido pelo fallecido conselheiro d'estado, o sr. Anselmo Braamcamp, ministerio que foi perseguista, sendo o sr. Oliveira Martins o Fernão Lopes d'esse perseguismo, como tinha sido o fr. Bernardo de Brito ou o Fernão Mendes Pinto do fontismo; (Apoiados.) e o ministerio que findou com o ultimatum inglez, presidido pelo sr. conselheiro José Luciano de Castro, e que foi mais alguma cousa do que perseguista. (Apoiados.)
Sr. presidente, uma das consequencias d'essa mais alguma cousa é o projecto que se discute. (Muitos apoiados.)
Mas vamos ao empirismo do projecto.
Eu devo declarar á camara que, em certo modo, sympathiso com as cousas empiricas: são as simples, são as que todos comprehendem, e em finanças contrastam com os financeirismos metaphysicos, que apenas eram comprehendidos pelos privilegiados, pelos que viviam em graça. (Apoiados.)
Mas, sr. presidente, este empirismo foi não só confessado, mas justificado circunstancialmente nos seguintes luminosos periodos do seu relatorio.
(Leu.)
Mas, sr. presidente, ha muitas mais rasões justificativas, mesmo sem fazer erudição com Leroy Beaulieu á frente, mesmo sem cobrir esta carteira com muitos livros em oitavo, ou então expol-os sem os apresentar, no que ha certo perigo, porque eu sei que ha quem tenha, n'esta casa, modestamente, muita leitura, sem que faça alarde d'ella, podendo comprimentar os seus conhecimentos, pela fórma porque o fazia Piron, que assistindo á leitura de uma tragedia do Voltaire, abaixava ceremoniosamente a cabeça, quando pelo ouvido lhe passava algum verso de Racine. (Riso.)
Vamos, pois, singelamente a essas rasões. Synthetiso-as, sr. presidente, porque a hora fatal está a approximar-se, o eu quero fatalmente terminar as minhas considerações.
O addicional é um imposto provisorio, circumstancial; corresponde a uma certa situação precaria da fazenda publica, e melhorando esta, como ha esperança que melhore a nossa, principalmente com as restricções que vem na lei de meios, não se unifica com o imposto principal, e desapparece, o que nunca se dá com um imposto novo... desde que se lhe montassem os serviços.
Sendo um pequeno augmento sobre os impostos existentes, tem de bom o já estar sanccionado, em certo modo, pelo paiz, que acceitou esses impostos: e com as excepções, que eram da proposta, e que foram augmentadas no projecto, ficou um verdadeiro imposto proporcional - que é o ideal dos impostos. (Apoiados.)
Tem uma escripturação rapida, e tem uma rapida execução, o que não é indifferente antes é importantissimo nas circumstancias criticas que obrigam o governo a pedil-o ao parlamento e o parlamento a lançal-o ao paiz.
Não é um imposto novo de classes, (Apoiados.) que as faça protestar, e que as levante em conflictos - elementos de perturbação, que obrigam a sair da vida normal, e que quasi sempre custam mais á economia d'essas classes de que o quantum que lhes é pedido pelo estado. (Muitos apoiados.)
Sr. presidente, eu não sei se estes argumentos têem valor; o orador que se me seguir, que é o sr. capitão Machado, que a estas horas vae em caminho de Peniche, a coroar-se com a aureola dos immortaes, em que os de Peniche são prodigos, (Riso.) o dirá; e como eu tenho voz em outra tribuna, d'ali lhe responderei, se o julgar conveniente.
Sr. presidente, agora uma vista de olhos, rapidissima, sobre o que disse o meu prezado collega o sr. Monteiro Cancella.
Começou s. exa. por censurar a falta de numero na sessão da hontem á noite, quando fallava o sr. conselheiro Eduardo Coelho, sem que tivesse ao lado o sr. conselheiro Francisco Beirão. Quero crer que s. exa. se enganou na conta, o que é peccado leve, porque em maiores contas têem errado os seus correligionarios: havia numero sufficiente, aliás o sr. Eduardo Coelho, muito amigo da legalidade, seria o primeiro a protestar, o que não fez, antes pelo contrario puxou pela sobrecasaca ao sr. capitão Machado, quando este cavalheiro ía a protestar no sentido do protesto do sr. Cancella. E porque o sr. Eduardo Coelho via que estava na camara numero sufficiente para s. exa. continuar a fallar.
O sr. Cancella disse - a questão está esgotada -, e eu esperava que s. exa. não continuasse a fallar, terminando repentinamente, e dizendo: sr. presidente, enganei-me, eu não pedi a palavra sobre a ordem, mas para um requeri-
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SESSÃO DE 5 DE JULHO DE 1890 1065
mento. Requeiro a v. exa. que consulte a camara sobre se julga a materia sufficientemente discutida. (Riso.)
O sr. Cancella: - Eu não disse isso...
O Orador: - Foi o que ouvi, mas se s. exa. faz questão, olhe que não merece a pena, e fica dado o dito por não dito. (Riso.)
Emfim; s. exa. fallou como lavrador, protestando; mas como interpellou o meu amigo o sr. Adriano Monteiro, que é uma auctoridade, que é agricultor, que é deputado agricola, e como eu sei que s. exa. tenciona expor as rasões por que approva o addicional, entrego-o ao braço secular de s. exa. E póde crer que fica muito bem entregue. (Apoiados.)
Deu a hora, sr. presidente, e eu, fiel á minha palavra, encerro por aqui as minhas considerações, sentindo não dispor de mais tempo para responder por completo ao discurso do meu illustre antagonista.
Vou terminar, sr. presidente, e dizendo: este governo já restabeleceu a ordem, já habilitou o paia a defender-se, já fez com que tenhamos uma imprensa seria, respeitavel e respeitada, de que andavamos desacostumados desde 1876; já deu o primeiro passo para o renascimento da instrucção publica em Portugal: se o sr. ministro da fazenda conseguir o seu desideratum, o de firmar em bases solidas as finanças portuguezas, como eu espero do seu superior talento e grandes predicados de trabalho, terá feito um enorme serviço a este paiz, e o actual ministro será benemerito da patria, como foram os ministerios regeneradores de 1851 e 1872.
Vozes: - Muito bem, muito bem.
(O orador foi muito comprimentado por todos os lados da camara e pelos srs. ministros presentes.)
O sr. Presidente: - A grande deputação que deve assistir ámanhã, ás doze horas do dia, no palacio da Ajuda, á ceremonia da imposição do barrete cardinalicio ao sr. cardeal Vannutelli será composta, alem da mesa, dos srs. deputados:
Agostinho Lucio e Silva.
Amandio Eduardo da Motta Veiga.
Antonio Sergio da Silva e Castro.
Antonio Maria Cardoso.
Antonio Ribeiro dos Santos Viegas.
José Bento Ferreira de Almeida.
Carlos Roma du Bocage.
Eduardo José Coelho.
Fernando Mattozo Santos.
Joaquim Germano de Sequeira.
Roberto Alves de Sousa Ferreira.
José Monteiro Soares de Albergaria.
A ordem do dia para segunda feira é a continuação da que estava dada e mais o projecto n.° 147.
Está levantada a sessão.
Eram seis horas e meia da tarde.
O redactor = Lopes Vieira.