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SESSÃO DE 6 DE AGOSTO DE 1869
Presidência do ex.mo Antonio Alves Carneiro, vice-presidente supplementar
Secretários (José Gabriel Holbeche.
Henrique de Barros Gomes)
Chamada- 59 Srs. deputados.
Presentes á abertura da sessão - os Srs. Agostinho de Ornellas, Braamcamp, A. A. Carneiro, Ferreira de Mello, Pereira de Miranda, Villaça, Sá Nogueira, Silva e Cunha, A. J. Pinto de Magalhães, Sousa de Menezes, Falcão da Fonseca, Montenegro, Abranches, C. de Seixas, Carlos Bento, Ribeiro da Silva, Conde de Thomar (Antonio), Fernando de Mello, F. J. Vieira, Francisco Beirão, Diogo de Sá, Francisco Costa, Pinto Bessa, Quintino de Macedo, H. Barros Gomes, Noronha e Menezes, H. de Macedo, Gil, Vidigal, Baima de Bastos, Corvo, Santos e Silva, Assis Pereira de Mello, Aragão Mascarenhas, Alves Matheus, Matos Correia, Gusmão, Ferreira Galvão, Correia de Barros, Bandeira Coelho, Infante Passanha, Mello e Faro, Firmo Monteiro, Holbeche, Vieira de Sá Júnior, Queiroz, J. M. Lobo d'Avila, José de Moraes, Oliveira Baptista, Silveira e Sousa, Luiz de Campos, Daun e Lorena, Affonseca, M. F. Coelho, Penha Fortuna, M. 11. Valladas, Mathias de Carvalho, Thomás Lobo, Visconde de Bruges, Visconde do Carregoso, Visconde de Guedes.
Entraram durante a sessão os Srs. Adriano Pequito, Falcão de Mendonça, Fonseca, Sá Brandão, Veiga Barreira, Guerreiro Júnior, A. J. de Seixas, Fontes, Magalhães Aguiar, Eça e Costa, Barão da Ribeira de Pena, Barão da Trovisqueira, Belchior Garcez, B. F. da Costa, F. F. de Mello, J. Pinto de Magalhães, J. Thomás Lobo d'Avila, Teixeira Cardoso, Sette, José Luciano, Rodrigues de Carvalho, Nogueira, Levy, L. A. Pimentel, Camará Leme, Espergueira, M. A. de Seixas, Paes Villas Boas, R. V. Rodrigues, Calheiros, Visconde dos Olivaes.
Não compareceram-os Srs. Costa Simões, Antonio Poemeto, Costa e Almeida, C. J. Freire, Palmeiro Pinto, Diogo de Macedo, Coelho do Amaral, F. L. Gomes, Martins Ferrão, Nogueira Soares, J. A. Maia, Dias Ferreira, Lemos e Nápoles, Latino Coelho, J. H. dos Santos, Mello Gouveia, Mendes Leal.
Abertura - Aos ires quartos depois do meio dia.
Acta - Approvada.
EXPEDIENTE
A que se meu destino pela mesa
Officio
Do Sr. deputado Costa e Almeida, participando ter de faltar a algumas sessões por incommodo de saude.
Requerimentos
1.º Requeiro, pelo ministerio das obras publicas, informação sobre o numero de kilometros de estradas a macadam, e caminhos de ferro, construídos em cada um dos districtos do continente do reino, e dos que estão em construcção, estudadas ou em estudo, e bem assim sobre as sommas gastas em obras publicas em cada um dos mesmos districtos desde a creação do referido ministério.
Sala das sessões, 6 de agosto de 1869.= O deputado pelo circulo de Bragança, Veiga Barreira.
2.º Requeiro que, pelo ministerio dos negócios da marinha e ultramar, sejam mandadas com urgencia a esta camará copias da portaria, que ordenou um inquérito á agencia do banco nacional ultramarino em S. Thiago de Cabo Verde, e da portaria que mandou fazer idêntica investigação na succursal d'aquelle banco em Londres. Outras copias dos termos dos inquéritos realisados, e informação ou pareceres das commissões nomeadas para aquelle fim.
Sala das sessões, 6 de agosto de 1869.= Mathias de Carvalho.
3.º Requeiro que, pelo ministério da fazenda, se dê conhecimento com urgência a esta camara, não havendo inconveniente, das condições do emprestimo que foi contratado com a casa Stern.
Sala das sessões, 6 de agosto de 1869.= 0 deputado, Carlos Bento da Silva.
Nota de interpellação
Desejo interpellar o Sr. ministro das obras publicas, sobre a publicação do regulamento especial que ha de determinar o processo de habilitação com títulos legaes para o exercício da profissão de ferrador e castrador, prescripto no decreto de 29 de dezembro de 1864.
Sala das sessões, 6 de agosto de 1869.= O deputado pelo circulo de Bragança, Veiga Barreira.
O Sr. Presidente: - Tendo o Sr. presidente, Palmeiro Pinto, participado á mesa que não podia comparecer á sessão de hoje por incommodo do saúde, e não se achando presente o Sr. vice-presidente, o Sr. Costa Simões, é por este motivo que vim occupar o logar da presidencia.
O Sr. Secretario (Holbeche): - A commissão de redacção não fez alteração alguma no projecto n.º 41; portanto vae ser remettido para a camará dos dignos pares.
O Sr. Baima de Bastos: - Mando para a mesa uma representação, assignada por vinte e tres parochos do grão priorado do Crato, pedindo providencias tendentes a melhorar o desgraçado estado em que esta classe se acha pelo que respeita a meios de subsistencia.
Já antes da promulgação do codigo civil era minha opinião que as congruas, que os parochos recebiam no nosso paiz, eram insuficientes para a sua decente sustentação, e por isso era já então também opinião minha, e que n'esta casa emitti, que uma das necessidades da administração publica d'este paiz era a dotação do clero.
Esta necessidade porém tornou-se mais urgente depois da publicação do codigo civil, porque pelo artigo 2:116.º perderam os parochos uma parte importante dos rendimentos e proventos que recebiam, mal que a portaria de 27 de abril do anno passado não remediou, nem podia remediar, porque uma portaria não póde destruir uma lei.
Quando em 1837 se estabeleceram as congruas, os rendimentos do pé de altar foram considerados no computo d'ellas, e como fazendo d'ellas parte; e assim é certo que a disposição do artigo 2:116.º do código veiu diminui-las, quando deviam antes ser augmentadas, e collocar os parochos em peiores circumstancias do que estavam, tirando-lhes parte do pouco que recebiam; e portanto é também certo que ainda quando a dotação do clero não podesse, nem devesse ter logar, em todo o caso era de justiça que elles fossem indemnisados da perda de uma parte das suas congrua, que soffreram em virtude do citado artigo do código civil.
Já tive occasião de dizer n'esta casa que me parecia que a dotação do clero se podia verificar no nosso paiz sem onus para o thesouro, e sem que tivessemos de pedir ao contribuinte mais do que actualmente paga para os parochos.
Parece-me que a somma das congruas que actualmente se paga, a somma dos rendimentos dos bens dos passaes que devem ser desamortisados e applicados para aquelle fim, e a somma dos rendimentos dos bens dos conventos das freiras, que dentro em pouco tempo devem estar acabados, e que não podem ter mais condigna applicação, produzirão um total sufficiente para a dotação do clero, em termos que correspondam á nobreza do seu sacerdocio e á altura da sua missão (apoiados).
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Já em outra occasião mais opportuna desenvolvi mais idéas n'esta casa; e por isso limito me agora a deixar consignado o meu pedido ao Sr. ministro da justiça, para que preste a este respeito toda a sua attenção, é a pedir a v. ex.ª, que dê a esta representação o mesmo destino que tem dado a outras de identica natureza e que já foram apresentadas n'esta casa do parlamento.
O Sr. Carlos Bento: - Mando para a mesa uma representação dos foreiros da casa de Bragança, na comarca de Arouca, queixando se dos vexames que se lhes fazem para a cobrança dos fóros que devem.
O Sr. Assis Pereira de Mello: - Sr. presidente, ainda mais uma vez vou chamar a attenção do governo, sobre um objecto que julgo de summa importancia, multo embora não veja presente nenhum Sr. ministro.
Logo que dei entrada n'esta casa, pela primeira vez, um dos objectos sobre que chamei a attenção do mesmo governo foi sobre a demarcação dos concelhos de Estarreja, Aveiro e Ovaz. Depois de ter fallado mais de uma vez sobre aquelle assumpto, e vendo que o governo não dava as providencias que eu pedia, resolvi elaborar um projecto de lei, que tive a honra de mandar para a mesa, no qual pedia as providencias que julgava necessárias para se proceder á diminuição d'aquelles concelhos.
Um dos principaes fins que tinha em visto era regular, ou antes melhorar, as matrizes que não só n'aquelles concelhos, mas em todo o pais, estão em um estado deplorável. Nada consegui; nem o governo remediou o que pedia, nem a respectiva commissão deu o seu parecer sobre o projecto que tive a honra de mandar para a mesa.
Agora vejo que aquelle projecto era muito importante, porque a proposta de lei, que está em discussão n'esta casa, no artigo 5.º diz = que os proprietarios e administradores dos predios que não estão nas matrizes os descrevam dentro de trinta dias desde a publicação do regulamento, de que se faz menção na mesma proposta, nos concelhos a que pertencem =.
Ora pergunto eu a qual dos concelhos pertencem os predios colocados nos limites d'aquelles em que não ha uma demarcação regular?
Não sei em que concelho se não de inscrever. Alem d'isto se ignorar, ainda acresce a circumstancia de se inscreverem n'um concelho, onde o proprietario julgar mais conveniente, e de se dar o caso, como já se tem dado, de aparecerem os prédios em dífferentes matrizes e em differentes concelhos, o que traz inconvenientes gravíssimos, porque os proprietarios têem de recorrer quando forem avisados para pagar novamente as contribuições já satisfeitas, o que sé tarde conseguem.
O meu fim, como disse, era melhorar as matrizes, não só mencionando os predios que estão fóra da inscripção, como também porque todos os predios dos diferentes concelhos fazem uma diferença consideravel nas avaliações; e tanto assim que o concelho de Estarreja, que tenho a honra de representar n'esta casa, até ao anno de 1865, em que as matrizes se não tomavam por base da distribuição do contingente da contribuição predial, pagava este 7:000$000 a 8:000$000 réis, e o concelho da Feira 10:000$000 a 11:000$000 réis. Hoje, pelo contrario, o concelho de Esterreja paga 12:000$0000 réis, e o da Feira 8:000$000 réis, cifra redonda. E note v. ex.ª que o concelho de Estarreja tem uma superfície muito inferior ao da Feira. O concelho de Estarreja tem 18:600 hectares e o da Feira 24:911, como se vê do Diario de Lisboa, de 23 de setembro de 1868, n.º 216.
Já v. ex.ª vê que ha uma grande desproporção entre estes dois concelhos, e esta desproporção tem sido notada, não só pelo chefe do districto, mas tambem pela junta geral, que, apesar d'isso, não tem remediado este mal; porque, depois de se terem tomado para base as matrizes em 1865, houve recurso da camara de Agueda para o conselho d´estado, que foi attendido, mas desprezado pela mesma junta na distribuição do novo contingente em 1866 e por diante.
A junta geral adoptou as matrizes como base por serem mais convenientes para os seus concelhos do que as que tinham servido na distribuição do contingente anteriormente. O chefe do districto, quando se reuniu a junta geral no anno seguinte, apresentou varias considerações e inconvenientes, pelos quaes devia a mesma junta conhecer que não podia adoptar as matrizes como base da distribuição do contingente; mas, não obstante as instrucções que lhe foram prestadas por aquelle magistrado, e outras bases que lhe deu, nada menos que dezasseis, para sobre ellas se fazer com mais igualdade a divisão do contingente, tudo foi desattendido; mas ajunta geral do districto não consentiu n'isto, e continuou a adoptar o mesmo systema, o das matrizes, porque assim é mais conveniente á maior parte dos procuradores, ficando alliviados os seus concelhos e sobrecarregados os outros, que tinham menor numero de procuradores. Isto é um mal que não póde continuar.
Acontece que o concelho de Estarreja interpoz o recurso em 1865, e só em dezembro de 1868 é que foi resolvido favoravelmente, e os povos continuaram a pagar o que lhes tinha sido distribuído pela junta geral do districto. Interpoz novamente o recurso no anno seguinte, que ainda está pendente no conselho d'estado.
Mas, Sr. presidente, não é só relativamente aos concelhos do districto de Aveiro que as matrizes estão imperfeitas, é tambem com relação aos differentes districtos do continente, porque o concelho de Villa Nova de Gaia, por exemplo, paga 10:000$000 réis, segundo me consta, e só os armazéns devem pagar tres ou quatro vezes mais que esta quantia, o que renderia para os cofres do estado uma somma importante de contos de réis.
Isto não é desconhecido pelo governo actual, nem pelos que o têem precedido, desde que se começou a adoptar por base as matrizes; e tanto assim que o governador civil de Aveiro, no relatório que ultimamente foi premente a esta camará, diz, por occasião em que se fez a distribuição do contingente em 1866, que indicára á junta geral do districto as bases que julgava mais convenientes para a distribuição da contribuição, o declara que por fórma nenhuma póde adoptar como base as matrizes, porque conhece a sua imperfeição.
Portanto ha uma desigualdade importante, que não póde continuar por fórma alguma, e o governo, no projecto que está em discussão, augmentando a contribuição no districto de Aveiro em 32:310$500 réis, já se vê que é um mal grave, e que ha de ir aggravar cada vez mais a situação dos povos.
É necessario que elles paguem em proporção, mas attendido á imperfeição com que está feita a base não é possível, sem uma grande injustiça, usar-se de semelhante systema.
Portanto peço desde já ao governo que tome providencias sobre este assumpto, assim como á commissão respectiva que dê o seu parecer sobre o projecto que tive a honra de apresentar.
Sr. presidente, ainda sobre outro assumpto desejo chamar a attenção do Sr. ministro da marinha. Ainda que s. ex.ª não está presente, comtudo terá conhecimento das poucas palavras que vou dizer.
Desejo chamar a attenção de s.ex.ª, para o regulamento ou compromisso que mandei para o ministerio das obras publicas em janeiro do corrente anno, que dizia respeito aos pescadores da costa da Torreira, no districto de Aveiro.
Em 1865 foi apresentada no ministerio das obras publicas, commercio e industria uma representação dos chefes das companhas da costa, a que me referi, pedindo a approvação de um compromisso ou estatutos, pelos quaes se governassem as companhas da pesca. Esteve ali aquelle compromisso alguns annos, mas o anno passado disseram me alguns cavalheiros, empregados d'aquella repartição, que
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elles não estavam nos termos de irem á approvação, dando as instrucções que julgaram convenientes para se reformarem ; e eu tive a honra de apresentar no mesmo ministerio um novo regulamento ou compromisso, assignado por aquellas sociedades, pedindo a sua approvação, sem a qual ellas não podem continuar.
O Sr. ministro da marinha, entendendo que aquelle objecto era da sua repartição, mandou-o trazer para o seu gabinete, e até hoje ainda não deu conta d'elle. Não sei com que bullas s. ex.ª fosse tirar um negocio, que pertencia á repartição do commercio e industria, do seu competente logar; mas s. ex.ª, se me não engano, quer sujeitar as companhas ás leis de navegação para o ultramar, quando ellas devem ser unicamente reguladas por leis especiaes proprias da localidade.
Não sei quaes as rasões em que o Sr. ministro se fundou para chamar a si este negocio; mas, admittindo mesmo que elle pertença á sua repartição, não posso por fórma alguma concordar em que o tenha demorado, sendo de tanta urgencia. Por consequencia é necessario que os negocios publicos se tratem por outra fórma, e que as primeiras auctoridades dêem o exemplo na solução dos negocios a seu cargo. Este negocio é urgentíssimo, porque na occasião da pesca, não estando approvados os regulamentos a que me referi, os socios despedem-se, e nem é preciso despedirem-se, abandonam o seu posto, e por fim aquelles que ficam não podem continuar no exercício da sua industria.
Peço pois ao Sr. ministro da marinha que dê quanto antes andamento a este negocio, e tenho concluído por agora as minhas reflexões; mas protesto desde já continuar com ellas, e serei mais alguma cousa severo se S. ex.ª, não der as providencias necessarias a este respeito.
O Sr. Ministro das obras Publicas (Cacheiros e Menezes): - Mando para a mesa a seguinte proposta de lei (leu).
O Sr. Levy: - Por parte da commissão de marinha, nando para a mesa o parecer sobre a pretensão do Sr. Arrabas.
O Sr. Adriano Pequito: - Mando para a mesa uma representação da camara municipal de Fronteira, na qual pode á camara dos senhores deputados que seja alterada a diposição da lei de 6 de junho de 1864.
As rasões em que funda o seu pedido são assás claras e incontestaveis, e não farei por agora reflexões algumas, porque, como disse ha dias n'esta casa, hei de apresentar sole esto assumpto um projecto de lei.
Fui também encarregado pelo Sr. Antonio Pequito, que, com v. ex.ª sabe, está ausente por doença, de mandar para mesa outra representação, sobre igual assumpto, da camara municipal do concelho de Marvão.
O Sr. Montenegro: - Pedi a palavra para participar que o Sr. Costa e Almeida não tem comparecido ás ultimas sessões e talvez não possa comparecer ás seguintes, por incomodo de saúde sua própria e de sua família.
O Sr. Fernando de Mello: - Desejava perguntar á illustre comissão de infracções por um requerimento, que tive a hora de mandar para a mesa no principio da sessão, do cirurgião ministrante, José Maria Pinto, que se queixava de uma portaria do ministerio do reino, publicada em 10 de maio, supponho eu, porque lhe usurpava algumas das attribuições que lhe dava a sua carta.
Suponho que este requerimento foi á commissão de infracções ou então á commissã o de petições. Pedia a qualquer destas commissões onde pára este requerimento, que é bastante extenso, e ao qual estão juntos documentos comprovativo do pedido do requerente, que desse sobre elle a sua opinião.
O secretario (Holbeche): - Devo informar o Sr. deputado da commissão de infracções ainda não está constituída, por consequencia a essa commissão não foi distribuído Requerimento.
O Sr. Fernando de Mello: - Então pedia a v. ex.º que convidasse commissão a constituir-se, ou então que mandasse o requerimento á commissão de petições, se porventura ella substitue a commissão de infracções, visto que essa commissão não tem querido, ou não tem podido, constituir-se.
O Sr. Presidente: - Convido a commissão de infracções a constituir-se e a dar o seu parecer sobre o requerimento a que allude o Sr. Fernando de Mello.
O Sr. Fernandes Gil:- Recebi ha dias uma representação da camara municipal da villa da Povoação, da ilha de S. Miguel, contra o augmento extraordinario do imposto predial.
Não remetti para a mesa esta representação, porque quando a recebi já a commissão da fazenda tinha apresentado o seu parecer sobre a proposta de lei apresentada pelo governo, mas entendo que devo dar conhecimento d'ella á camara, e por isso peço licença para a ler (leu).
Quando esta representação foi feita não se sabia ainda em S. Miguel que a proposta do Sr. ministro da fazenda, conde de Samodães, tinha sido alterada pela illustre commissão de fazenda, reduzindo se a cifra de 50 a 20 por cento; mas como a cifra não é verdadeiramente o ponto principal das nossas reclamações e das nossas queixas, porque o que especialmente contribue para lamentarmos o augmento do imposto é a desigualdade da base que se nota entre o que pagam os districtos; insulares, com o que paga o continente, não duvidei fazer a leitura da representação; e como pedi a palavra sobre a ordem ácerca do assumpto que se discute na ordem do dia, exporei então aquillo que entender opportuno e conveniente.
O Sr. Henrique Cabral: - Pedi a palavra para participar que o Sr. Nogueira Soares não póde comparecer á sessão por incommodo de saude.
O Sr. J. M. Lobo d'Ávila: - Pedi a palavra para mandar para a mesa um requerimento de um official que, estando em Lisboa como incapaz de serviço, foi sujeito a uma inspecção e depois mandado transferir para a província de Cabo Verde, sondo obrigado a servir no ultramar para esperar A sua reforma na posição em que se achava, devendo pelo menos ser addido a veteranos de marinha; pede que lhe sejam applicadas as vantagens que são concedidas pelo decreto de 10 de setembro de 1846 e portaria circular de 22 de maio de 1863.
Parece-me justa a pretensão d'este oficial, porque elle era oficial inferior do exercito, estava na escala aos sargentos, aos quaes pertence passar a alferes quando tenham a antiguidade conveniente.
Ora, se a portaria circular de 22 de maio de 1863 garante certas vantagens aos seus camaradas, elle, que tinha sido despachado antes de estar em vigor A circular, não tem menos direito a essas vantagens.
Não tomo mais tempo á camara com este assumpto.
Espero que a mesa dê o conveniente andamento a este requerimento, mandando-o á commissão respectiva.
O Sr. Montenegro: - Pedi a palavra com o intuito de dirigir um pedido aos meus collegas da commissão de administração publica.
Em 23 do mez passado foi apresentada pelo governo uma proposta de lei para que a camara municipal de Houças fosse auctorisada a levantar um emprestimo com destino exclusivo para a construcção de estradas municipaes.
Ninguem ignora a grandíssima utilidade que deve resultar para o nosso paiz de se completar a rede de estradas municipaes; e portanto escuso de encarecer agora, nem é occasião para isso, a conveniencia de se conceder aquella auctorisação, que ha de habilitar a camará de Bouças a concorrer em parte para isso.
Estou convencido de que os membros da commissão de administração publica não têem dado até agora o seu parecer sobre a proposta a que me referi por terem tido muitos outros trabalhos a considerar e resolver; sou o primeiro a reconhecer a sua muita solicitude e o seu muito zelo, mas o facto é que não apresentaram ainda o seu parecer.
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Peço lhes que tenham a bondade de o apresentar quanto antes, a ver se poderá ser approvado ainda na actual sessão legislativa, porque é negocio proveitosíssimo para todo o paiz.
O Sr. B. F. de Abranches: Desejava fallar na presença do Sr. ministro da marinha e do Sr. ministro da justiça.
Com relação ás observações que desejava fazer perante o Sr. ministro da justiça, por deferencia para com s. ex.ª reservo-me apresenta-las quando s. ex.ª estiver n'esta casa.
Entretanto peço licença á camara para declarar que, devendo a minha estada n'esta casa ser por pouco tempo, não posso deixar de chamar desde já a attenção do Sr. ministro da justiça para que haja de tomar conhecimento de todas as interpellações que tenho annunciado n'esta casa ao seu antecessor, e se dê por habilitado para responder a essas interpellações, que se acham publicadas nas sessões de 25 de junho, e de 2 e 22 de julho d'este anno.
E espero também que s. ex.ª dê quanto antes as ordens necessárias para que sejam remettidos a esta camara os differentes mappas estatísticos que tenho pedido, e constam dos requerimentos que se acham publicados na sessão de 10 de maio proximo passado.
Por esta occasião peço aos illustres membros das commissões de legislação e do ultramar, que se dignem dar os seus pareceres sobre alguns projectos de lei que eu apresentei n'esta casa.
Sinto que a iniciativa dos deputados seja sempre modificada pelos nossos collegas, porque os differentes membros das commissões, dos quaes aliás eu respeito muito, ou por terem de se occupar com outros projectos do governo, que por emquanto são poucos, ou por outros motivos, deixam de dar os seus pareceres
com relação aos projectos de iniciativa se dignem, ao menos por contemplação para com um antigo collega seu, darem os seus pareceres, muito embora se não conforme com os projectos que tenho apresentado.
Em relação ao Sr. ministro da marinha, apesar de não estar presente s. ex.ª, permitta-me v. ex.ª, que diga duas palavras sobre um objecto que reputo da maior importância.
O artigo 31.º da lei de 21 de julho de 1863 diz muito positivamente o seguinte:
«O orçamento e as contas da gerencia e de exercício das províncias ultramarinas serão apresentadas ás côrtes nas mesmas epochas marcadas para a apresentação dos orçamentos e contas geraes do estado, servindo para a sua confecção os esclarecimentos que houver no ministerio da marinha e ultramar na epocha da sua organisação.»
O artigo 13.º do acto addicional á carta constitucional, reformando os artigos 136.º, 137.º e 138,º da carta, impõe ao governo a obrigação de apresentar o orçamento da receita e despeza quinze dias depois da constituída a camara dos deputados; e no primeiro mez, contado da mesma data, a conta da gerencia do anno findo, e a conta do exercício annual ultimamente encerrado na fórma da lei.
Ora, os quinze dias já lá vão; a epocha da sessão ordinária já lá vae, estamos agora n'esta casa em virtude do decreto que prorogou as sessões até ao dia 15.
Por consequência o ministerio tem apenas nove dias para apresentar o orçamento do ultramar, mas já muito fóra do tempo competente em que o devia apresentar.
Ha muito tempo que mandei para a mesa uma nota de interpellação a este respeito; v. ex.ª declarou n'esta casa, que estava prompto para responder a todas as interpellações, menos á que dizia respeito ao ex-governador de S. Thomé. Eu apenas tive occasião de verificar aquellas que s. ex.ª dizia que não tinha obrigação de responder, e outra relativa a um official do ultramar; porém outras, que diziam respeito a assumptos de administração e de interesse publico, ainda não tive a occasião de as verificar, porque nem a presidência deu dia para se verificarem aquellas interpellações, nem S. ex.ª, aqui se tem apresentado antes da ordem do dia para nós, em conversa parlamentar, podermos dizer alguma cousa a respeito das differentes interpellações que temos annunciado e mandado para a mesa.
Eu declaro a v. ex.ª e á camara que insisto na apresentação do orçamento, porque o governo tem obrigação rigorosa do cumprir a lei. (O Sr. J. M. Lobo d' Ávila: - Apoiado.)
A apresentação do orçamento não póde nem deve ser preterida por mais tempo, e o governo encorou n'uma grave responsabilidade pela falta que já notei.
Por emquanto não digo mais nada a este respeito.
Tenho concluído.
O Sr. Caetano de Seixas: - O meu illustre collega e amigo, o Sr. Montenegro, usou de palavras tão benevolas para com a commissão de administração publica, que merece se lhe dê resposta satisfactoria. S. ex.ª, diz que = na commissão de administração publica existe um projecto de lei para uma certa camará municipal, a que designadamente se referiu, poder contrahir emprestimos para estradas municipaes .
Não é por menos respeito para com s. ex.ª, que este projecto pende na commissão sem ter andamento; eu declaro ao nobre deputado, que a commissão tem-se encarregado de trabalhos importantes, e que por isso não se tem occupado, por não poder, do seu projecto, a respeito do qual não ha duvida nenhuma, pois que é identico a muitos outros que têem passado n´esta camara nem discussão.
Por conseguinte fique o illustre deputado descansado que a commissão dará a maior attenção a este negocio, e que a demora que tem havido é devida aos motivos que acabo de expor.
Se V. Ex.ª me dá licença tambem direi duas palavras ao meu illustre amigo e condiscípulo o Sr. Abranches. Esse foi um pouco mais violento na phrase; queixou se amargamente da commissão de legislação, porque ainda não tenho dado expediente aos projectos da iniciativa de s. ex.ª, remettidos para a commissão de legislação.
O réu sou eu; aqui está o réu, e s. ex.ª, deve estar mulo satisfeito, porque tem um réu competente. Esses projectos foram me distribuídos; tenho os estudado e são para mim, nacional todos aquelles crimes a que pela legislação em vigor correspondem dois annos de prisão. São pois projectos importantes.
A primeira cousa que eu tinha a fazer era examinar quaes e quanto são os crimes a que, pelo codigo penal, em vigor, corresponde a pena de dois annos de prisão, e esse será conveniente tirar ao réu a garantia do processo odinario, e submette-lo a um processo correcional e summarissimo.
Eu perguntarei ao illustre deputado: sendo converdo em lei o seu projecto, emquanto não for melhorada, como eu entendo, a instituição dos juizes ordinarios, ou extinta, segundo o parecer de outros, quem há de conhecer espellação das sentenças que elles proferirem, impondo a pena de dois annos de prisão? Há de ser o juiz de no tribunal de policia correccional da cabeça da comarca, como dispõe o artigo 1:255.º da novissima reforma? Eu declaro que temo de alargar lhe tanto a alçada, não havendo d´ee tribunal senão um recurso possivel, mas distante, o de vista nos casos unicos de incompetencia ou excesso de jurisdicção, citada reforma, artigo 1.262.º o nosso fôro adpte Segunda appellação.
Parece-me, pois, que os projectos do illustre datado, simples na redacção, são difficeis na exposição dossotivos que os justifiquem e na sustentação.
Aqui está a rasão por que eu, réu convicto, me resento n'esta camará a confessar o meu crime, mas is porque entendo que o projecto se deve estudar maduramte, para ver se temos de submetter a um juizo summariorocessos
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crimes a que corresponde uma pena de dois annos de prisão.
Peço portanto ao meu illustre amigo, que muito respeito, que aguarde com paciência o estudo consciencioso que estou fazendo, e que não se persuada que desejo afastar os seus projectos de uma deliberação da camará, mas sim que não me atrevo a apresentar-lhe um parecer sem o ter estudado maduramente, e sem dizer á camará quaes são e quantos os inconvenientes que resultam de se adoptar um systema diverso d'aquelle que está em vigor. A cousa é grave, e o meu illustre amigo, que é um profundo jurisconsulto, que tem uma grande pratica judiciaria e que tem ido acompanhando na pratica as disposições das leis, ha de permittir que eu considere projectos de summa gravidade todos aquelles que têem por fim reduzir as garantias dos cidadãos.
Reduzir a policia correccional crimes a que se applicam dois annos de prisão é um negocio de muita gravidade.
Fallo n'isto com um certo calor, porque estas questões para mim são sempre muito importantes, mas sem animo algum de offender o meu illustre collega, de quem sou amigo. Espero portanto que o nobre deputado aguarde que eu faça o estudo que preciso fazer sobre os seus projectos.
O sr. Paes Villas Boas: - Entrei na sala quando o illustre membro da commissão de legislação, o sr. Caetano de Seixas, dava explicações ao sr. deputado Montenegro ácerca de umas perguntas que s. ex.ª dirigiu á commissão sobre a demora na apresentação de parecer a um projecto por s. ex.ª, apresentado. Tudo quanto eu, na qualidade de secretario da commissão, podia dizer ao illustre deputado foi dito pelo meu illustre collega, o sr. Caetano de Seixas, e por isso me limito a offerecer ao sr. Montenegro as explicações dadas pelo sr. Caetano de Seixas, com as quaes me parece que o illustre deputado se dará por satisfeito.
O sr. Montenegro: - Eu só tenho a agradecer aos meus illustres collegas a promptidão com que se dignaram responder, vindo confirmar de novo a opinião e convicção que eu tinha da sua solicitude nos trabalhos que lhes estão incumbidos. Espero que elles empenhem todos os seus esforços para se aproveitarem os bons desejos de que os povos se acham possuídos em se tributarem a si próprios para estes melhoramentos públicos.
O sr. B. F. dê Abranches: - Nas poucas palavras que disse não tive a menor intenção de offender nenhum aos membros das illustres commissões de legislação e ultramar, e muito menos podia eu irrogar censura ao meu particular amigo e antigo condiscípulo, o sr. Caetano de Seixas e Vasconcellos. Mas permitia-se-me que, sem entrar agora, porque não devo, na apreciação de todas as razões que tive para apresentar dois projectos de lei para regular o julgamento dos processos correccionaes, eu diga a v. ex.ª que, convencido como estou pela pratica que tenho de alguns annos como juiz no continente, que o jury é geralmente muito indulgente em absolver os réus convictos de crimes de pequena importância, nos quaes cabem penas também menores, e vendo sobretudo pela nova lei de organisação do jury de l de julho de 1867, que os jurados precisam hoje ter um grande incommodo, mais do que tinham até então, alem de despezas que têem de fazer na opocha das audiências geraes, não pude deixar de por alguma maneira procurar remediar os inconvenientes que se davam, por causa dos motivos já ditos.
V. ex.ª, e a camara sabem perfeitamente que a lei de l de julho de 1867 foi promulgada quando se fez a divisão administrativa das diferentes províncias do continente; e então havia tambem a idéa de serem extinctos os juizes ordinarios, e de se crear por consequencia um jury para cada comarca.
Já se vê que então predominava a idéa de que as comarcas tivessem uma certa área mais pequena do que têem actualmente. Antes da lei de l de julho de 1867 havia comarcas que tinham mais de um circulo de jurados; actualmente cada comarca tem o seu circulo de jurados; ora, como ha comarcas que comprehendem mais de um julgado, e uma grande area, segue-se que, se por algum modo não diminuirmos o numero dos processos ordinários ou de querela, os jurados soffrerão um grande vexame, e a sociedade se resentirá pela impunidade dos crimes leves, e que podiam ser julgados correccionalmente.
Actualmente sou juiz na comarca de Almada, que tem três julgados, o de Almada, Cezimbra e Seixal; a área Testa comarca é grande, e por isso os jurados soffrem grandes incommodos na epocha das audiencias geraes.
O que acontece n'esta comarca póde acontecer n'outras. Se não se procurar diminuir o numero de processos ordinarios, o resultado é que o numero de querelas ha de ser grande, e as audiencias geraes podem durar por muitos mezes.
S. ex.ª sabe perfeitamente que da impunidade dos crimes nasce e ha de sempre resultar a tendência para os crimes de maior importância; se acaso a pena não for applicada immediatamente ao delicto, e se o delinquente contar com a absolvição do jury, teremos necessariamente o augmento dos processos de querela e dos crimes.
Não vejo portanto inconveniente algum em que os crimes a que pelo codigo pertencem penas correccionaes sejam julgados correccionalmente, como eu propuz, ou então se s. exª, quer dar mais garantias aos réus do que á sociedade, lá tem outro meio, que é fazer reviver o processo chamado mixto, e que era estabelecido no decreto de 10 de dezembro de 1852, que foi revogado pela lei de 18 de agosto de 1853.
Entendo portanto que, emquanto não forem extinctos os juizes ordinários, emquanto as comarcas não tiverem uma área mais pequena do que têem, emquanto forem chamados jurados de logares distantes da cabeça da comarca para julgar os réus, e emquanto não forem julgados correccionalmente muitos crimes que actualmente são julgados por meio da querela, será certa a impunidade d'esses crimes,
É preciso que se procure por todos os meios a diminuição aos processos ordinarios, e isto póde-se conseguir fazendo-se reviver o decreto de 10 da dezembro de 1862, ou então adoptando-se o principio de serem julgados em policia correccional todos os crimes a que correspondam penas correccionaes.
Não se diga que ficam os réus sem garantias e que os juizes podem abusar; não quero suppor nem levemente que os indivíduos, a quem se acha confiada a magistratura portugueza, sejam capazes de abusar; mas quando assim fosse, os réus não ficavam privados do recurso, porque continuavam a tê-lo com tantas ou maiores garantias que nos processos ordinários, porque os recursos dos processos correccionaes saem muito mais baratos do que os dos processos ordinários, e são decididos com maior brevidade.
O meu fim era dar aos réus a garantia dos recursos, porque assim tinha a certeza de que havia de haver um tribunal que emendasse os erros que houvesse na instancia ou mesmo por parte dos juizes ordinarios.
Com relação a este objecto não posso dizer mais nada, porque não está em discussão o meu projecto. S. ex.ª tem lá dois projectos para se conseguir a diminuição do numero das querelas.
Na sessão de 10 de maio d'este anno renovei a iniciativa do projecto de lei que tinha apresentado na sessão de 1868, pedindo a revogação da lei de 18 de agosto de 1853, pondo-se novamente em vigor o decreto de 10 de dezembro de 1852, e na sessão de 6 de julho apresentei outro projecto para serem julgados correccionalmente todos os crimes a que correspondem penas correccionaes. E note-se que para o primeiro projecto eu não quero ter as honras de invenção, porque não fiz mais do que pedir que fosse posto em pratica o decreto de 10 de dezembro de 1852, que foi promulgado depois de vários trabalhos meditados por uma commissão, e que seria ainda hoje a lei do esta-
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do se não tivesse sido revogado pela lei de 18 de agosto de 1853.
Por consequência, já se vê que tendo eu renovado em 10 de maio d'este anno a iniciativa do primeiro projecto com relação ao julgamento dos processos correccionaes, e tendo apresentado outro projecto em 6 de julho, não sou muito exigente pedindo um parecer sobre qualquer d'estes dois projectos.
Também não sou, creio eu, muito exigente pedindo um parecer sobre um outro projecto já muito antigo, cuja iniciativa renovei na sessão de 10 de maio d'este anno, e é relativo ás contas das arcas dos orphãos. Os resultados praticos da maneira por que eu quero que se tomem as contas das arcas doe orphãos, foram já publicados nos Diarios de Lisboa n.ºs, 120 e 158, de 1868, no tempo em que era ministro da justiça o sr. visconde de Seabra. Constam dos relatorios que eu enviei como juiz de direito da comarca de Almada. Eu já fui juiz de direito em quatro comarcas, em Armamar, Alemquer, Chamusca e Almada, e posso assegurar a v. ex.ª, que em todas ellas achei muito descurado o serviço das contas das arcas dos orphãos.
N'umas comarcas encontrava o dinheiro embrulhado n'um papel, com um letreiro dizendo a quem pertencia. N'outras, como na Chamusca, havia casaes que já tinham tirado maiores valores do que lhes pertencia, a escripturação dos livros era pessimamente feita; em Armamar encontrei as cousas em peor estado, porque ali nem havia a arca dos orphãos.
Ora, se houvesse os dois livros de entrada e saída, como manda a ordenação, e alem d'isso um livro caixa e outro de contas correntes, de prompto e com facilidade se podiam tomar as contas, e saber-se a quem pertenciam os valores depositados no cofre dos orphãos, como hoje se sabe na comarca de Almada, aonde creei esses livro.
Apresentei tambem um outro projecto na sessão de 8 de julho, com o fim de acabar com a distincção entre a magistratura do reino e a do ultramar. Este projecto foi manado á commissão do ultramar, e não sei se o sr. ministro da marinha já deu sobre elle a sua opinião. A seu tempo fallarei da conveniência d'este projecto, por agora peço apenas um parecer sobre elle.
Ha ainda um outro projecto meu, publicado na sessão de 6 de julho ultimo, sobre a applicação das multas correccionaes para as despezas do juízo. O sr. ministro do reino, quando esteve encarregado da pasta da justiça, ordenou, por portaria de 16 de julho, que tudo quanto fosse publicado no Diario do governo fosse immediatamente cumprido. Pelo decreto de 11 de dezembro de 1868, que reformou o Diario de Lisboa, todas as repartições publicas são obrigadas a tomarem uma assignatura do Diario do governo; mas se nos cofres das muitos menores não ha dinheiro para outras despezas, como é que os juízas hão de mandar tomar essa assignatura?
Não digo mais nada. Peço aos illustres relatores dos projectos citados que dêem quanto antes os seus pareceres, e concluo como principiei.
Peço ao sr. ministro da justiça que leia as differentes interpellações que tenho annunciado, porque muitas d'ellas podem ser resolvidas por s. ex.ª, com portarias, e outras com decretos regulamentares ou com propostas de lei, que partam ou da iniciativa do sr. ministro, ou da iniciativa dos deputados. Da minha iniciativa já tenho feito uso, e declaro a v. ex.ª, que, ainda que estivesse muitos annos n'esta casa, não estava resolvido a estudar cousa alguma para apresentar projectos de lei, porque não queria vê los morrer nas commissões.
O sr. Caetano de Seixos: - O illustre deputado mesmo acaba de reconhecer que o projecto de lei que mandou para a mesa tem certos inconvenientes de execução. O meu illustre collega é o proprio que vê que o projecto é inexequível emquanto os juizes ordinarios não forem extinctos.
Por consequência peço ao illustre deputado que reserve
o seu projecto para quando os juizes ordinarios estiverem extinctos.
Diz s. ex.ª, que - a demazia da benevolencia do jury nos processos submettidos ao seu julgamento torna necessario subtrahir a esse julgamento uma certa ordem de crimes, para que a impunidade não seja um facto.
Seja s. ex.ª logico; se o argumento colhe subtráhia-os todos, mas não conte com o meu voto. Eu não quero supprimir a iniciativa dos deputados, mas não quero também supprimir a intervenção do jury no julgamento das causas crimes.
Referiu-se o illustre deputado ao decreto de 10 de dezembro de 1852, que alargou a area do processo correccional, mas esse decreto caiu logo em descredito, e foi revogado, muito pouco tempo depois de publicado, como contrario ás instituições de um povo livre, pela carta de lei de 18 de agosto de 1853.
Por consequencia não conte s. ex.ª, commigo para supprimir a iniciativa dos deputados, mas não conte tambem commigo para supprimir a intervenção do jury no julgamento das cansas crimes, excepto n'aquellas a que corresponder uma pena muito leve.
O sr. Sá Nogueira: - Parece me que o illustre deputado por S. Thomé se dirigiu, se me não engano, á commissão do ultramar, arguindo a de não ter dado parecer sobre os projectos de lei que s. ex.ª, aqui tem apresentado.
Devo dizer a s. ex.ª, que tenho a honra de ser presidente da commissão do ultramar, que a tenho convocado algumas vezes, e que lá se tem discutido alguns negocios importantes, embora se não tenham discutido todos.
Entendo que a camara não deve ser illudida, e por isso sigo o systema de, a não ser em alguma cousa muito insignificante, não assignar parecer algum sem o objecto ter sido discutido na commissão, para que não haja projectos, ás vezes importantes, que andem aqui a assignar- se nos bancos sem terem sido discutidos. Isso seria uma illusão á camara, que suppunha que os assumptos tinham sido discutidos, quando tal discussão não tinha existido.
Tenho convocado a commissão algumas vezes, e só muito poucas é que ella se tem reunido. Naturalmente os membros d'ella têem tido motivos fortes para não comparecerem. Se a commissão se não tem reunido mais vezes não é por culpa do presidente nem do sr. secretario, que tambem tem apparecido sempre, e os outros Srs. deputados que a com puem naturalmente é por força maior que não têem podido comparecer.
São estas as rasões por que se não tem dado o andamento devido a todos os trabalhos que têem sido commettidos á commissão do ultramar.
O sr. Presidente: - Não ha mais ninguem inscripto antes da ordem do dia.
A ordem do dia de hoje é a continuação da do projecto de lei n.º 45; mas, como não está presente o governo, que tem de comparecer na outra casa do parlamento, fica adiada esta discussão para ámanhã.
Está levantada a sessão.
Eram duas horas da tarde.
Parecer
Senhores. - Á vossa commissão de instrucção publica foi presente um requerimento de varios estudantes de preparatorios, pedindo que se auctorísem no mez de outubro, d'este anno, os exames nos lyceus.
Comquanto a commissão entenda que possa haver rasões que justifiquem o pedido dos requerentes, é comtudo de parecer que é ao governo a quem mais propriamente compete tomar conhecimento d'este negocio, e que por isso lhe seja remettido o requerimento para o tomar na consideração que merecer.
Sala da commissão de instrução publica, 6 de agosto de 1869.= João de Andrade Corvo = Fernando Augusto de Andrade Pimentel A Mello = Antonio Pinto de Maga-
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lhães Aguiar = Antonio Gonçalves da Silva e Cunha = Antonio Augusto da Costa Simões = Raymundo Venancio Rodrigues - Antonio Cabral de Sá Nogueira, com declaração = Manuel Joaquim Penha Fortuna.
Discurso do sr. deputado Joaquim Thomás Lobo d'Avila, pronunciado na sessão de 3 de agosto, e que deixou de ser publicado no logar competente.
O sr. J. T. Lobo d'Avila: - Tendo pedido a palavra para um requerimento, não quero abusar d'ella; e tambem não desejo tratar n'este momento a questão política, por isso que, tendo a palavra pendente sobre o assumpto que devia occupar a primeira parte da ordem do dia, que foi interrompida por motivos conhecidos de toda a camara, me reservo para tratar d'essa questão n'outra occasião, quando continuar o meu discurso; agora limito me a tratar do meu requerimento, que se refere a uma solução do incidente que se debate.
Diz-se que = não devemos perder o tempo, e devemos deixar o governo apresentar projectos = Eu entendo que a primeira necessidade que tem o paiz é ter governo (apoiados); e o systema parlamentar serve para se apurar se temos ou não governo, e se elle satisfaz ás indicações publicas, ás aspirações do paiz, e ás necessidades da situação (apoiados). Portanto entendo que a questão política é da mais alta importância, a fim de se conhecer se temos um governo que corresponda ás necessidades do paiz (apoiados).
Para que nos havemos de embalar com as esperanças nos projectos que nos hão de apresentar os Srs. ministros? Se nós soubermos de antemão, pelas suas declarações, que elles nunca hão de apresentar esses projectos, e que se ha de preterir de novo a solução do problema que nos afflige, para que havemos de estar com esta nova espera a aggravar cada vez mais as circunstancias do paiz, principalmente quando se diz que não ha dinheiro, que ha um perigo publico, e que ha até a ameaça de uma bancarrota!!
Emquanto para os seus fins políticos, para a sua conservação no poder, lhe pareceu que convinha conservar no ministério o sr. conde de Samodães, allegava se que a sua saida podia acarretar serias dificuldades, podia difficultar a realisação do emprestimo por elle contratado, podia deixar o thesouro sem meios de pagar as letras que representam a divida fluctuante externa, e que se vencem em prasos proximos e fataes; depois que por um calculo egoísta e contrario aos princípios da responsabilidade ministerial, que é solidaria, entenderam que deviam fazer demittir o sr. conde de Samodães, desappareceram immediatamente todos aquelles receios e escrupulos, e alijaram ardilosamente o seu collega, sem lhe importar mais com aquallas considerações! Logo este procedimento do governo não foi filho de rasões de conveniencia publica, mas de calculos políticos.
As nossas circumstancias aggravaram-se com a permanencia do sr. conde de Samodães no governo; e se não fosse esta especulação política teríamos evitado ao paiz os encargos enormes que resultaram de uma gerencia financeira inhabil e infeliz.
Agora repetem se as scenas. Sobem ao poder dois ministros que nasceram d'estas intrigas políticas, moços inexperientes, e que não inspiram confiança, e diz-se que é necessario esperar pelos seus actos, esquecendo que a questão financeira exige uma resolução immediata, e que estão imminentes os mesmos perigos com que nos ameaçam ainda aggravado pelo tempo decorrida!
Sacrificam as conveniencias publicas ao calculo mesquinho de se conservarem mais alguns dias no poder, capitulando com as ambições de alguns membros da commissão de fazenda, a quem pelas suas vociferações tinham desauctorisado! (Apoiados.)
O que devemos examinar e se temos rasão para esperar esses actos de que nos fallam, porque se tal rasão não existe, a primeira necessidade é deitar abaixo este governo, e organisar um que dê fundadas esperanças de que ha de tomar as providencias que as circumstancias requerem e o paiz reclama (apoiados). Esta é a primeira necessidade.
Portanto não se diga que se está perdendo o tempo com esta discussão, e que se devem esperar os actos dos novos ministros (apoiados).
Os actos dos membros do governo que ficaram, porque este governo, segundo a phrase do nobre ministro das obras publicas, não foi demittido completamente (riso), já nós os sabemos, já o paiz os sabe: nada ha a esperar d'elles para a salvação publica (apoiados).
Trouxeram-nos á critica posição em que nos achâmos. Depois de vexarem os funccionarios publicos e os contribuintes, vemos o deficit no mesmo estado, o nosso credito abatido, e os fundos descendo sempre!
Dos novos só sabemos os tristes precedentes da sua entrada no governo, e que pelas suas declarações nada nos promettem de positivo e definido, pois não apresentam plano algum, apesar do sr. presidente do conselho os apresentar como os mais competentes para resolver immediatamente a nossa questão de fazenda (apoiados).
O primeiro facto que se nos apresenta é uma irregularidade da parte do sr. ministro da fazenda, e que não nos deixa esperar factos mais auspiciosos para o paiz (apoiados).
E este incidente e esta perda de tempo é originada pela irregularidade com que o governo procedeu na apresentação de uma proposta de lei.
Se o sr. ministro tivesse feito como fazem todos os ministros, d'estes que não são predestinados para a salvação publica, que não trazem o elixir na algibeira, d´estes ministros communs, da classe dos mortaes, que costumam apresentar as suas propostas depois de as lerem e de as meditarem, sem se forrarem ao trabalho de as datarem e assignarem, como e do seu dever; se s. ex.ª, tivesse procedido assim, ter-se ia evitado esta discussão (apoiados)
Estes ministros predestinados esquecem-se porém de todas estas circunstancias (riso), e por causa d´este esquecimento, que denota uma certa leviandade, é que nós temos este incidente, que tem occupado a attenção da camara, porque ella não podia, sem faltar ao seu dever, deixar passar sem correctivo esta irregularidade.
Pois a camara podia aceitar o facto de um ministro apresentar uma proposta sem ser firmada com a sua assignatura? A camara podia deixar passar sem correctivo uma transgressão d'esta ordem? Uma proposta assignada por um cavalheiro que já não era ministro, e não assignada por aquelle que devia ter a responsabilidade d'ella, e com uma data anterior á sua entrada no governo? Não era possível.
S. ex.ª, disse que tomava a responsabilidade da proposta que apresentava, mas disse isto depois de se ter requerido que fosse lida na mesa, e de apparecer ali assignada pelo sr. conde do Samodães...
O sr. Luiz de Campos: - E o requerimento?
O Orador: - Ora, o illustre deputado que ainda ha pouco elevou á altura de questão vital para o paiz uma questão de transferencia de um empregado subalterno de obras publicas, e até invocou a auctoridade do seu bispo diocesano, devia ser menos exigente e menos rigoroso (apoiados).
O sr. Luiz de Campos: - Não infringi o regulamento.
O Orador: - Infringiu, trazendo o sagrado para o profano (riso).
O nobre deputado devia ser menos rigoroso e deixar isso ao sr. presidente, que já o não é pouco (riso). Temos conhecimento d´este seu rigor, temperado por um certo pensamento político, que elle sabe habilmente combinar com a imparcialidade que o caracterisa (riso). Não queira o sr. deputado ser mais rigoroso do que o sr. presidente, que o sabe ser.
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Voltando ao que estava a dizer, repito: este incidente não se teria levantado, nem a camara teria perdido este tempo, se o sr. ministro tivesse procedido regularmente (apoiados).
A camara não podia deixar passar sem correctivo, sem reflexão, um acto irregular (apoiados).
Não têem validade para a camara os documentos que não são assignados pelos ministros (apoiados).
Logo, se existe a responsabilidade de se perder o tempo, cabe ella ao sr. ministro, que apresentou irregularmente um documento; não cabe á camara, porque tinha obrigação de zelar o cumprimento das fórmas, sem as quaes não póde existir o systema representativo (muitos apoiados). Não se compõe elle só de certa ordem de princípios e doutrinas, mas de fórmas e praxes.
Não quero levantar a questão política a respeito d'esta preterição de formalidades, mas entendo que não podem corrigir se estas irregularidades senão por uma fórma. Os documentos, depois de entregues á camara, pertencem a ella, e sem deliberação da camará não podem ser alterados (apoiados).
Isto é serio, pelas consequencias que póde trazer, e agora mesmo póde ter grave importancia. Um documento mandado para a mesa por um sr. ministro não póde ser alterado por ninguem; só tornando-se uma resolução publica a este respeito (apoiados).
Portanto, da primeira irregularidade nasceram muitas, seguiram-se umas após outras.
Quando se quiz supprimir o nome do sr. conde de Samodães praticou-se uma irregularidade, uma vez que não havia auctorisação para o fazer; quando o sr. ministro da fazenda assignou o documento, estando elle já assignado pelo sr. conde de Samodães, praticou-se outra irregularidade; quando o sr. ministro assignou a proposto, estando ella datada do dia 29, praticou-se outra irregularidade, porque n'esse dia ainda o Sr. Saraiva de Carvalho não era ministro, e, assignando-a, devia mudar a data. Portanto, todas estas irregularidades derivaram da primeira irregularidade do (apoiados).
S. ex.ª, o sr. ministro da fazenda, com a velocidade que levava o trem, não póde notar esto circumstancia (riso), e se não póde apreciar esta circumstancia, como podia avaliar o objecto e importancia da proposta? (Apoiados.) Não o podia fazer, ainda que tivesse a sagacidade que lhe attribuiu o sr. Ferreira de Mello (riso).
Portanto, s. ex.ª, não podia emendar o documento depois de o ter apresentado á camara. A mesa tambem o não podia alterar (apoiados).
Dito isto, sou de opinião que se não deve fazer questão política d'estas irregularidades, mas entendo que a camara deve deliberar, e proponho que assim o delibere, que se convide o sr. ministro da fazenda a retirar a proposto, para depois a trazer emendada. O sr. ministro pede para retirar a proposto para a substituir por outra, e a questão acaba (apoiados).
Portanto, proponho que se auctorise a mesa a entregar ao sr. ministro a sua proposto. Este é o meu requerimento. O meu fim é que o sr. ministro formule a sua proposta segundo as regras e praxes estabelecidas (apoiados).
O sr. Presidente: - Queira mandar para a mesa a sua proposto.
O Orador: - Sim, senhor, eu mando já.
Discurso pronunciado na sessão de 4 de agosto corrente pelo sr. deputado Joaquim Thomás Lobo d'Avila
O sr. J. T. Lobo d'Avila: - Em primeiro logar devo dizer que eu, e estou persuadido de que todos aquelles que não têem confiança na marcha do governo nem esperam que as suas medidas resolvam a crise financeira que atravessâmos, e mesmo outras difficuldades com que o paiz luta, não queremos empregar por fórma alguma meios que não sejam regulares, constitucionaes e legítimos (apoiados),
guardado o devido respeito e decoro, não só ao parlamento, mas ao ,systema constitucional; mas tambem não podemos ser responsaveis de certos movimentos que nascem espontaneos, que ninguem prevê nem póde calcular (apoiados). Portanto não se façam imputações a ninguem a este respeito e tenha cada um cautela no modo por que falla (apoiados), a fim de não provocar esses movimentos, cuja responsabilidade não toca senão a quem os provoca (apoiados).
Mantenhamos o decoro do systema parlamentar, mantenhamos a liberdade da nossa discussão, respeitemo nos reciprocamente, mas não queiramos tambem tornar saturnas, tristes e melancolicas as nossas discussões, porque em todos os parlamentos foi sempre permittida a ironia quando não ultrapassa as raias da decencia e do decoro (apoiados), em todos os parlamentos foi sempre permittido o sorriso, nem se póde tolher esse movimento espontaneo; e tanto assim é que o proprio sr. ministro do reino é um dos primeiros que, não podendo ser senhor dos seus nervos, quasi sempre começa os seus discursos desabrochando um sorriso (risadas).
A situação do paiz é grave e muito grave (apoiados), requer providencias immediatos e importantes, a em de serem resolvidas as questões que estão pendente? É por esse motivo que eu trato ainda d´este político. Se não tivesse em vista senão o pensamento mesquinho de desacreditar os homens que estão no governo, de lhes fazer perder qualquer resto do opinião que ainda tivessem; se não tivesse em visto senão aggredi-los, eu de certo não tomaria a palavra, porque a recomposição, pelo modo por que foi [... PARTE DO TEXTO ILEGÍVEL]/no, para o fazer cair em pouco tempo apoiados se ....tivesse em visto senão deixa-los gastar e designar a opinião publica a respeito d'elles, regosijava-me com tanta recomposição, porque ella leva a fazer desapparecer o governo (apoiados).
Mas, sr. presidente, acima d'estas considerações, que são pequenas, existe uma consideração maior para mim; é a do interesse publico (apoiados), é a da causa do paiz (apoiados), é a da nossa sorte futura (apoiados), é a do progresso d'esta sociedade (apoiados), é a aos deveres que nos impõe a civilisação (apoiados), é a da questão mesmo da nossa existencia, da nossa autonomia, da nossa independencia (apoiados), que nunca póde ser baseada senão em um governo sensato e justo, o qual nos torne respeitaveis e respeitados, e que faça acreditar aos outros povos que nós não somos menos dignos da missão de nos governarmos como um membro independente da grande família humana (apoiados).
É encarando, como encaro, a questão debaixo d´este ponto de vista, que eu occuparei ainda por alguns momentos a attenção da camara, porque eu entendo que esta recomposição ministerial continua este estado de cousas indefinido, anomalo, que não resolve nada, que nos leva a complicações maiores, e que me faz receiar seriamente d'essa tremenda bancarota com que em occasiões de crises políticas nos têem ameaçado (apoiados).
Quiz-se lançar á opposição a responsabilidade de n'este ultimo período parlamentar se não terem apresentado trabalhos, de não ter havido a assiduidade que as circumstancias reclamavam, de se não ter tratado da gravíssima questão de fazenda, de se não ter discutido o orçamento, e de se não ter apresentado o parecer sobre elle.
Pois a opposição é que é responsavel pela marcha do governo?! (Apoiados.) Quem é responsavel pela direcção das cousas publicas é o governo (apoiados), são os membros do gabinete que se acham á testa dos negocios, não é a opposição (apoiados).
Os responsaveis são os amigos políticos do governo, são aquelles que o apoiam; e a grande responsabilidade existe principalmente no governo, porque elle é o chefe nato da
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maioria parlamentar, porque elle é o director d'essa maioria (apoiados).
Portanto, se tem havido morosidade nos trabalhos do parlamento, se se tem desperdiçado o tempo, se se não tem discutido as questões mais importantes, a culpa é do governo (apoiados), e esse é mais um motivo para que nem eu nem ninguem que seja amante do seu paiz possa desejar que um governo, que tem dirigido as cousas por este modo, continue ali (apoiados).
E o que ouvi eu hontem!... Que revelações se apresentaram n'esta casa!... Por ellas vi, que aquelles que mais tinham cooperado para crear esses embaraços ao governo, para difficultar a apresentação d'esses pareceres, e para demorar a resolução d'essas propostas; que aquelles, a respeito dos quaes se diziam, por parte de alguns membros do gabinete, cousas que todo o publico conhece, e que não eram muito agradaveis, pelas resistencias e dificuldades que elles creavam, silo, segundo as revelações que hontem ouvi, os que foram chamados a formar parte do gabinete! (O sr. Ministro da Justiça: - Peço a palavra.)
Para que se quer pois lançar esta accusação á opposição, se os primeiros responsaveis, se aquelles que mais embaraços crearam são os que foram chamados a formar parte do gabinete?!?. Se mesmo por terem feito este desserviço ao paiz e que foram escolhidos?!... (Apoiados.)
Diz o sr. ministro do reino: Toda a nossa questão está em reduzir a despeza e augmentar a receita. Ora isto diz qualquer que seja o menos illustrado possível nas cousas publicas (apoiados).
Isto é a indicação mais simples e rudimental que póde haver (apoiados).
Mas em que consiste a sciencia do governo ? Digamos com franqueza, será n'esta banalidade?
A sciencia do governo consiste em saber o modo por que se devem fazer as reducções, quaes ellas são, sem desorganisar os serviços que são essenciaes para a marcha das cousas publicas; em saber qual é o modo de crear essa receita, por fórma que os impostos sejam o menos vexatorios possível, que sejam distribuídos com maxima igualdade, que vão incidir do modo mais conveniente nas fontes de riqueza que os devem satisfazer, e que estejam dentro das faculdades do paiz (apoiados).
N'isto é que consiste a sciencia do governo, n'este complexo de medidas que devem formar um systema.
Dizer o sr. ministro do reino que o problema é reduzir a despeza e augmentar a receita, é uma cousa que nada significa; a questão está no modo de realisar este pensamento (apoiados).
Ora, sobre o modo de se realisar este pensamento é que os ministros que ficaram, solidários com os outros que saíram, não apresentaram medida para a resolução da questão ; pelo contrario, vieram aggravar as nossas circumstancias, e, pelas operações financeiras que fizeram, crearam encargos muito superiores a algumas economias que realisaram (apoiados), economias que se realisaram de um modo menos conveniente, porque ellas podiam ter-se realisado muito maiores sem desorganisar serviço nenhum útil (apoiados).
Mas, diz-se, perde-se muito tempo n´estas questões políticas. Por que se perde tempo? Quaes são as propostas que ha para discutir? Quaes são os pareceres que ha na mesa sobre propostas importantes? Aonde está o parecer sobre o orçamento?
Portanto não ha propostas importantes pendentes e de urgencia para se discutir. E depois qual é a cousa mais urgente para nós todos, para o paiz inteiro, não é ter governo? Não é esta a questão mais urgente para o paiz? (Apoiados)
Pois perde-se tempo quando se trata de apurar se o governo póde satisfazer ou não ás exigencias publicas?
Este governo póde satisfazer ás exigencias publicas? Cuido que não. A primeira, cousa que ao paiz interessa saber é se deve esperar que este governo resolverá as questões importantes que o estado do paiz demanda que se resolvam, é saber se tem rasão de tal esperar de um modo conveniente ao mesmo paiz (apoiados}.
Mas fez-se esta recomposição ministerial em condições normaes? Fez-se dentro dos princípios, regras e indicações do systema constitucional ? Parece-me que não (apoiados). E isto é uma questão de princípios, que tambem convem tratar (apoiados).
Disse-se que já durante o nosso regimen parlamentar houve diversas recomposições ministeriaes, nas quaes uns ministros saíram e outros ficaram (riso). É exacto. Mas é preciso examinar se as circumstancias foram as mesmas (apoiados), para ver se se póde admittir igualmente o mesmo que se fez agora. Na verdade as circumstancias não foram as mesmas (apoiados). E demais, já nos dizia um grande publicista nosso, o sr. Silvestre Pinheiro, que as nações governam-se pelos princípios e não pelos precedentes (apoiados).
Mas porque se recompoz este ministerio? Porque é que saíram os dois ministros? Foi por motivos politicos? Já aqui se disse, e toda a gente sabe, que foi porque se lhes fez sentir que a maioria da camaráanão confiava n'elles, e foi porque as suas medidas não agradaram nem ao publico nem á camara; foi porque a sua gerencia se tornou incompatível com a força que era necessario que o governo tivesse. Foi por isso que saíram os dois ministros, e não foi pelos motivos apparentes que se quizeram procurar (apoiados).
Agora pergunto ao sr. ministro do reino se os ministros que permaneceram no ministerio não são solidariamente responsaveis pelos actos dos ministros demittidos?(Apoiados.) Pois nas operações de 78 por cento, que não podiam ser bem recebidas no publico, pois no modo por que foi conduzido o negocio do emprestimo dos 18.000:000$000 réis, que não mereceu as sympathias da camara, que ainda não está concluído, e a respeito do qual o primeiro acto do sr. ministro da fazenda actual foi vir trazer á camara uma nova proposto de lei que augmenta em mais de 400:000$000 réis a somma que vae dar-se aos emprezarios do caminho de ferro de sueste, alem dos dois mil e tresentos e setenta e seis contos e tantos mil réis, que estavam mencionados no artigo 4.º do projecto respectivo, interpretando os sentimentos generosos da nação (apoiados); pois em acto nenhum d'estes os ministros que ficaram são responsaveis? Não póde ser (apoiados). Todos têem igual responsabilidade (apoiados).
Pois não foram estes erros de gerencia; não foram todos estes actos absolutamente contrarios ao programma com que este governo entrou na gerencia dos negocios publicos, actos contrarios ao que se pedia nas representações que lhe foram dirigidas e publicadas no Diario do governo com todas as assignaturas, não importando então ao sr. ministro do reino as economias, quando elle por economia tinha limitado as publicações que se faziam no mesmo Diario, que estão hoje muito limitadas, mas que para a publicação de todas as assignaturas houve sempre espaço, não se contentando com o mandar pôr a declaração seguem se as assignaturas; digo pois não teriam sido todos esses actos pratica, dos pelo governo ao contrario d'aquillo que o paiz pedia, que teria concorrido para as manifestações que appareceram? O governo tem feito tudo ao contrario de que o paiz lhe pediu; ao contrario d'aquillo que serviu para entrar na gerencia dos negocios publicos e do que serviu de fundamento para o ressuscitar (apoiados). Fez tudo ao contrario. O que o governo fez foi comprometter horrorosamente as finanças publicas (apoiados), de fórma que ainda não foi possível realisar o emprestimo (apoiados); as letras estão a bater as portas do thesouro sem se saber como se hão de pagar (apoiados).
Pergunto eu - em todos estes actos não eram tambem responsaveis o sr. ministro do reino e os seus collegas?
Não eram porventura igualmente responsaveis em todas as
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propostas apresentadas á camara sobre a questão de fazenda e a respeito das quaes ha um parecer, que desauctorisa completamente o governo, porque declara que uma das principaes medidas do governo é inopportuna e inefficaz? (Apoiados.) Não têem s. ex.ª, igual responsabilidade á dos ministros que saíram? Têem; e o sr. ministro do reino declarou hontem que não declinava a responsabilidade de
todos os actos do sr. conde de Samodães. Ora, o sr. conde de Samodães foi demittido pelos seus actos, e portanto o Sr. ministro do reino e os seus collegas, que são igualmente responsaveis por esses actos, não podiam conservar-se no poder (apoiados). Tanto o sr. ministro do reino, como o sr. ministro das obras publicas, o sr. ministro da marinha e o sr. presidente do conselho, são igualmente responsaveis, são solidariamente responsaveis em todos esses actos; o
sr. ministro do reino ainda hontem assim o declarou, e ainda
que não o declarasse era a mesma cousa, porque de contrario a solidariedade ministerial era uma illusão (apoiados). E se a voz publica, se o conhecimento que nós temos das cousas, se a consciencia de cada um dos membros d'esta
casa está dizendo que os verdadeiros motivos por que saiu
o sr. conde de Samodães foram aquelles, qual é a rasão por que os outros ministros não saíram? (Muitos apoiados.)
Portanto é claro que nem os princípios da solidariedade ministerial nem os princípios constitucionaes admittiam esta recomposição (apoiados).
Ou s. Ex.ªs, tinham maioria para governar com a camara ou não tinham. Se não tinham, deviam retirar-se todos; e se tinham, deviam permanecer todos os ministros no poder, visto que eram todos igualmente responsaveis. Se isto se não fez, é claro que se faltou ao que dispõem as praxes constitucionaes e os princípios da solidariedade ministerial, e que se sophismou o systema representativo (apoiados.)
Mas se aquelles ministros sairam por effeito das suas medidas e dos actos da sua gerencia; se os ministros que ficaram não apresentaram até hoje outras medidas, qual é a rasão por que nós havemos de ter confiança em que de futuro elles hão de gerir melhor? Não vejo motivo nenhum para que a camara tenha essa confiança (apoiados)
Eu tenho pensado e reflectido sobre as causas da sympathia profunda que se diz haver pela capacidade estadística do nobre presidente de facto do conselho de ministros, do sr. bispo dê Viseu, e realmente eu não as tenho podido descobrir (riso).
Pretende-se politicamente sustentar o governo dizendo §e que se elle cair, cáe a situação. Este é o grande argumento; mas o que acontecia se caísse a situação e o governo?
Fez-se acreditar que se caísse o governo vinha outro que immediatamente dissolveria esta camara e que representaria uma política inteiramente diversa. São estes os terrores que se espalham (apoiados). Nós devemos dizer toda a verdade, segundo o systema do sr. ministro do reino (apoiados).
Ora eu digo sincera e francamente que estas eleições de camara não se devem repetir continuadamente, porque isso desacredita o systema parlamentar e fatiga o paiz (apoiados).
Faço justiça aos membros d'esta casa que apoiam o ministerio, suppondo que elle satisfaz ás necessidades publicas, de acreditar que se este governo caísse e viesse um outro, que melhor satisfizesse as suas aspirações, elles não lhe fariam opposição systematica e haviam de o apoiar (repetidos apoiados).
Pois se isto é assim, se eu por este modo faço justiça ás intenções da maioria e não offendo por modo nenhum a sua dignidade, porque a dignidade da camara não está na teimozia e no apego a certos homens, mas está no apêgo a certas doutrinas e princípios (apoiados); digo que se os Srs. ministros saíssem, não caía a situação, se se entende por situação o pensamento de fazer todas as economias compatíveis com o serviço (apoiados), e procurar os meios que são necessários para resolver a nossa questão financeira (apoiados).
E n'este ponto acredito que todos os homens publicos, acima de qualquer paixão, collocamm o amor pelo paiz (apoiados)
Portanto para que é este receio pela situação, que ninguem ameaça?
Ordinariamente faz-se uma situação e identificam-se com ella certos homens, mas os princípios e as doutrinas é que devem ser a causa principal e não uma causa individual. É necessario separar estas duas entidades. Os homens desapparecem e ficam as doutrinas e os princípios (apoiados).
A camara não deve dirigir-se por estas considerações pessoaes, dirija se por considerações de princípios e de interesse publico (muitos apoiados). Esta é que é a norma, e estou persuadido que a camara assim e sente, porque faço justiça á sua dignidade (apoiados).
Em presença d'estas considerações, que mal viria ao paiz se caísse este ministerio, e se o sr. bispo de Vizeu fosse para a sua diocese? Creio que as suas ovelhas ganhariam muito e o paiz não perderia nada (riso - Apoiados.)
Por consequencia vá s. ex.ª pastorear as suas ovelhas, que é uma missão muito mais evangelica e propria do seu estado, e deixe homens do estado civil o tratarem as cousas profanas. (Apoiados - Riso).
Qual é o systema que s. ex.ª, tem? Se o sr. ministro do reino, que é o sustentaculo d'esta situação política, tivesse um systema para salvar o paiz, em era o primeiro que curvava a cabeça, se elle realisasse o seu pensamento, porque quizera ver o meu paiz feliz. Mas qual o pensamento que s. ex.ª, tem manifestado? Quaes as providencias que tem apresentado durante um no? Não vi ainda apresentar pensamento algum (apoiados). Diz s. ex.ª, que o seu systema é cortar a despeza e augmentar a receita. É uma cousa que diz toda a gente. Mas como o realisou? No ministerio a seu cargo que economias fez? {Apoiados ) O chefe d'esta phalange, que tanto tem sabido tirar partido d´esta palavra economias para a sua política, no seu ministerio não realisou economia alguma. Quaes são as reformas que apresentou? Houve alguns actos de dictadura que cortaram aqui e ali algumas despezas; mas a par d'isso tambem crearam outras, e desorganisaram os serviços (muitos apoiados). Houve no ministerio do reino a tal reforma de instrucção publica (apoiados), que S. ex.ª, mesmo aqui confessou que tinha muitos defeitos (apoiados), que era preciso emendar. Fazendo uma reforma mais bem pensada podia ter obtido verdadeiras e mais avultadas economias com melhoramento d'aquelle ramo de serviço (apoiados),
JÁ nos indicou porventura aqui s. ex.ª, os seus planos da economias? Já s. ex.ª, nos disse quaes são as grandes idéas que tem para reformar o paíz, para o tirar d´este estado de abatimento em que se acha? Quaes são os recursos d'este Pombal? (Hilaridade.) Aonde está a fertilidade financeira d´este Colbert? Aonde está o espirito economico d´este Turgot? (Riso.) Não o vi ainda revelado em acto algum (apoiados). E como elle é a alma do governo deve ter um pensamento, e indica lo; e nos discursos que dirige á camara devia dizer qual era o seu pensamento elevado. Deveria levar na mão o facho que illuminasse o governo na sua marcha. Mas eu ainda não vi nenhuma luz na sua mão (hilaridade). S. ex.ª, caminha sempre ás escuras (riso). Não sei se elle lançou mão da lanterna de Diogenes para achar os dois ministros (hilaridade); e se n'essa parte foi mais feliz do que o philosopho, achando dois homens, quando elle não póde achar um (riso).
Portanto eu realmente não sei explicar por que ha de haver esta apprehensão de que a salvação publica está em perigo, a que desaba uma situação que representa um todo pensamento do paiz, se cair o sr. bispo de Vizeu. (Voz - Muito bem.)
O sr. ministro do reino não symbolisa esse pensamento,
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porque não apresenta idéa alguma para o realisar. O pensamento hoje todos o abraçam, todos desejam satisfazer a opinião e a espectativa publica (apoiados). A respeito de desejos, ninguem fará a injustiça de negar os desejos que cada um de nós tem (apoiados).
Se o sr. ministro do reino diz que tem bons desejos, tambem deve admittir que os outros tenham igualmente bons desejos; pelo lado de bons desejos não ficâmos atrás uns dos outros. Mas não é só com bons desejos que se salva a causa publica (apoiados).
Não vejo pois rasão alguma política nem desconveniencia publica que leve esta camara a querer por força sustentar o sr. ministro do reino n'aquelle logar, quando todas as praxes seguidas nos paizes constitucionaes e todas as indicações de conveniencias publicas, pelo contrario, aconselham que se retire, porque é responsavel por uma serie de actos que têem aggravado as nossas circumstancias, e não ha nenhuma consideração política que o possa salvar (Apoiados.)
Emquanto ao sr. Calheiros, não sei se se julga tambem sustentaculo d'esta situação, e não sei mesmo o que é que o sustenta n'aquelle logar (riso); pelo laconismo da sua palavra e correcção admiravel da sua phrase, parece me que s. ex.ª não dá uma grande força ao governo, e que qualquer gabinete poderia viver perfeitamente sem o illustre ministro!
(Apoiados.)
Não quero agora entrar na analyse da reforma da sua repartição, porque hei de fazer esta analyse se tivermos a fortuna de se discutir o orçamento (apoiados).
Mas, sr. presidente, apresentou-se uma nova proposta para se darem á companhia de sueste mais quatrocentos e tantos contos de réis, alem de 2.376:000$000 réis que se lhe deram; essa proposta vae entrar brevemente em discussão para equilibrarmos assim o nosso orçamento (riso), que provavelmente ha de ficar em esquecimento e adiado!
A sessão está muito adiantada, e portanto não esperemos este anno resolução nenhuma relativamente á questão de fazenda, salvo se o sr. ministro da fazenda apresentar aquelle incognito plano que tinha já feito, e que é o resultado de dez annos de meditação sobre esta questão! (Riso.) Porque s. exª. seisma n'isto desde cresnça (riso).
Tendo s. ex.ª dito, quando follou, que já na sua mente havia planeado o modo de sair d'estas difficuldades, tinha obrigação de nos apresentar sem demora a resolução do problema.
Falta -se em que ha idéa de estabelecer um imposto sobre os tumulos e sobre os cães (riso). Não sei se isto é exacto. Mas também se diz, o que igualmente vi referido n'um jornal que tem apoiado conscienciosamente esta situação, porque assim o entende, que s. ex.ª na ultima reunião dos amigos politicos do governo fôra mais expansivo e franco do que tinha sido n 'esta camara, porque fallou de outras reformas que pretendia fazer!
S. ex.ª disse aqui que havia de empenhar os seus esforços, phrases que não tem significação; fez algumas reflexões a respeito da liberdade do commercio e a respeito da reforma de pautas em Hespanha, mas não nos disse nada a respeito de seus planos financeiros!
S. ex.ª, disse tambem que havia de continuar com o mesmo pensamento da situação. Todos dizem que continuam com o mesmo pensamento; mas como o querem realisar? Esta é que é a questão. O paiz já está farto d'esta espectativa e já vae estando desenganado (apoiados). É necessario que se diga o modo por que se quer realisar este pensamento (apoiados).
S. ex.ª não nos disse nada a este respeito, mas na reunião da maioria foi um pouco mais expansivo e franco, e creio que disse alguma cousa com que não concorda muito aquelle jornal, porque elle diz que s. ex.ª apresentou idéas que podiam comprometter a nossa situação financeira.
(Vozes: - É verdade.) Desejava que s. ex.ª tivesse a bondade de ser explicito perante a camara, e de dizer quaes são as suas idéas a respeito da resolução da questão financeira visto que s. ex.ª, foi apresentado pelo Sr. presidente do conselho como o mais competente; isto é, no primeiro dia o sr. presidente do conselho apresentou os srs. ministros da fazenda e da justiça como os mais competentes das duas camaras e de todos os outros círculos; no segundo dia corregiu a phrase, e disse que os apresentava como dos mais competentes e habilitados (riso}.
Portanto o sr. ministro da fazenda deve indicar á camara, como indicou na reunião da maioria, quaes são as suas idéas e as medidas que intenta apresentar ao parlamento, que nos livrem dos embaraços financeiros com que lactamos. Por ora vejo que s. ex.ª não faz senão tomar a responsabilidade de nos apresentar mais uma nova indemnisação ao caminho de ferro de sueste; por ora não vejo mais nada (apoiados).
Realmente a situação é angustiosa, e custa-me protrahir este debate. Se eu tivesse fé, ou tivesse motivo para a ter, que os Srs. ministros resolveriam a questão de fazenda, e as difficuldades com que lutâmos, seria o primeiro a dar lhes o meu apoio e a não lhes causar o menor embaraço. Mas era necessario que s. ex.ª, dissessem o modo por que queriam resolver a questão, e que em vez d'isso não apresentassem medidas que tendem a aggrava-la (apoiados).
E o sr. ministro da justiça? Pois o sr. ministro da justiça é que ha de resolver as difficuldades da situação? S. ex.ª, não nos disse bem quaes eram as reformas que intentava fazer no ministerio da justiça. Apresentou-se de um modo um pouco medonho, que não está completamente de accordo com a placidez do seu caracter e apparencia cortez (riso); mas desejava saber quaes eram as reformas que s. ex.ª, intentava fazer no ministerio da justiça, que produzissem alguma economia e sobretudo melhor administração de justiça, com mais imparcialidade nos julgamentos. Por exemplo: se s. ex.ª, tinha tenção de applicar aquella sua idéa que apresentou na dissertação inaugural de 1861 na universidade de Coimbra, que era isolar os membros do jury por meio de tubos (riso), sendo esses tubos de caoutchouo para se não ouvir a repercussão do som produzido pelas bolas quando partissem até chegarem aonde iam ter! (Riso). Isto está escrípto, eu não o invento, e digo o com toda a seriedade, (riso) porque estou persuadido de que o pensamento de s. ex.ª, foi fazer com que os membros do jury estivessem completamente incommunicaveis e tomassem uma decisão a mais imparcial possível (riso). Não sei se s. ex.ª, adopta essa idéa, mas é certo que a idéa de isolar os membros do jury, a fim d'elles darem um voto imparcial sem se communicarem entre si, é digna de consideração, e tende a estabelecer a imparcialidade n'aquella corporação, para proferir um julgamento digno d'ella (riso).
Desejava, pois, saber se s. ex.ª, tinha o pensamento de levar á pratica esta idéa por alguma fórma. Tambem desejava saber se s. ex.ª, tem tenção de tomar alguma medida relativamente ao regimen das nossas prisões e ao systema penitenciario; assim como se tem tenção de realisar alguma reforma no ministerio publico e algumas reducções em diferentes tríbunaes; em, fim quaes são os seus planos em referencia á collação de alguns parochos apresentados, que me parece que está adiada.
Desejava, portanto, saber a resolução em que s. ex.ª, está relativamente a todos os pontos da administração a seu cargo, porque s. ex.ª, não nos disse cousa alguma a esse respeito, e só annunciou que desejava que todos nós fossemos inexoraveis para com elle, e que o atacassemos quando o entendessemos sem dó nem contemplação alguma (riso). Tal é a confiança que s. ex.ª, tem de que os seus actos hão de estar ao brigo de toda a censura, que não necessita a menor complacencia nem benevolencia da parte de ninguem! (Riso). Esta confiança de s. ex.ª em si proprio augura um bom ministerio da sua parte e eu, para desde já antegostar o resultado das suas medidas, desejava que s. ex.ª nos
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desse mais alguns pormenores a respeito dos seus planos (riso).
Não quero prolongar mais as reflexões que tive a honra de apresentar á camara. Repito o que disse no começo d´este discurso: o assumpto é grave, as circunstancias solemnes. Se eu visse que este ministerio, que este governo tinha satisfeito ás regras e prescripções constitucionaes na sua reconstrucção; se visse que a constituição do governo estava dentro dos verdadeiros princípios constitucionaes e que os não havia offendido, não só na essencia, mas sua parte moral, eu esperava pelos actos dos novos ministros, se não soubesse tambem já quaes são os actos e precedentes dos outros ministros, que são solidariamente responsaveis pelos actos dos que saíram (apoiados). Esperava ainda pelos actos dos ,Srs. ministros se entendesse que os Srs. ministros, pelo modo por que annunciaram os seus planos financeiros e as suas reformas, promettiam uma resolução da crise financeira com que lutâmos. Em tal caso eu seria o primeiro a aguardar os actos de s. ex.ª; mas das palavras pronunciadas, pelo illustres ministros não vejo nada d'isto, e só vejo que se diz que se ha de conservar o mesmo systema, systema que, como o paiz sabe, foi o contrario de tudo o que se tinha promettido (apoiados), e que consiste principalmente nos supprimentos por preço exorbitante, e nas dadivas generosas ás emprezas estrangeiras (apoiados).
Portanto, concluo fazendo votos para que os Srs. ministros se compenetrem da necessidade publica e vantagem que ha para o paiz em se retirarem d'aquellas cadeiras, deixando assim que se organise um governo, que trate de resolver de um modo conveniente as questões que pesam sobre a arena publica, e cuja delonga o paiz não póde de maneira alguma aceitar, sem comprometter o seu futuro.
Vozes: - Muito bem, muito bem.
(O orador foi comprimentado por muitos Srs. deputados.)
1:206 - IMPRENSA NACIONAL -