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finissem de fórma que se não sophismassem como se sophismam constantemente, e com a lei á vista!

É preciso acabar com esta superabundancia de officiaes superiores no exercito, que é uma cousa impossivel de sustentar-se. Quer a camara saber quantos officiaes superiores existem? 242 officiaes superiores, estado maior 17, engenheria 28, artilheria 43, cavallaria 35, infanteria 119, a parte que cabe ás armas especiaes é de 88!

Não admira pois que haja 35 generaes, havendo 242 officiaes superiores.

E quando fallo no exercito, não fallo na instrucção do exercito; eu sei que devia indicar a conveniencia dos campos de manobra, mas sou tão acanhado em pedir para o exercito, que nem me atrevo a pedir os meios, que eram os mais apropriados para a sua instrucção, nada me atrevo a pedir, porque a resposta é = não ha meios =; portanto vejo que nada se póde fazer, por falta de dinheiro. Quando se trata do exercito, peço sempre com certo temor; mas senhores, o exercito não tem instrucção. Eu podia pedir á camara que facilitasse os meios para elle se poder instruir em campo de manobras, mas eu já não ambiciono o optimo, nem mesmo o bom, contento-me com o soffrivel, com o indispensavel; já não peço instrucção em campo de manobras, porque exige muita despeza com barracas e outros utensilios que não temos; barracas apparecem algumas em Cascaes, e em Pedrouços para banhos, que me dizem, que a entidade do arsenal empresta ás pessoas de amisade; e bota é, que sirvam para banhos, já que para outra cousa não servem; os soldados levam baixa sem saber o que é uma tenda de campanha: felizes tempos! Eu já me contentava que nos limitassemos á instrucção de escola de batalhão, de esquadrão, de bateria, á ordem extensa, e em fazer exercicios ao alvo; a camara não deve lamentar a des peza de polvora e de chumbo. Quanto aos campos de manobras seria de muita conveniencia tê-los, mas n'esses campos faz-se bastante despeza, e alem d'isso tambem, não nos illudamos, a instrucção dos campos de manobras é mais para os srs. generaes e para os coroneis, do que para as outras classes, e o nosso paiz é muito montanhoso, muito accidentado e cortado; entre nós ha poucos terrenos aonde possam desenvolver-se grandes massas de tropas, se exceptuarmos um ou outro ponto do Alemtejo, do Ribatejo, ou as planicies de Bragança; a guerra mais apropriada ao nosso terreno é a guerra de atiradores, é a guerra de mais a mais para que o nosso povo tem mais tendencia.

Lembro ao sr. ministro da guerra e á camara a necessidade de se estabelecerem escolas nacionaes de tiro, aonde possa ir exercitar-se toda a mocidade.

Uma voz: — Mas para isso temos a reserva.

O Orador: — É verdade que temos a reserva; e já que se fallou em reserva direi o que penso. Entendo que não deve haver um exercito effectivo sem reserva (apoiados) Aonde existe a reserva entre nós? Não sei; é uma reserva sophismada (apoiados). Hoje sáe um soldado para a reserva, e ámanhã vae este soldado contratar-se. Contrata-se e fica no exercito. Mas o exercito não é a reserva; a reserva, n'uma palavra, não existe. Em que divisões existem livros para servir de registo á reserva? A reserva não se reune pelo menos uma vez em cada seis mezes? Que reserva é esta? Que desprezo é este que os poderes publicos têem por esta lei? Que incuria é esta sobre a força publica? O que significa? Eu não percebo. Já se vê que em Portugal o exercito não tem reserva; porque não é d'esta fórma que as reservas existem nos outros paizes. Eu o que vejo é que nós, depois de chegar a paz, desprezâmos completamente a força publica. Não me queixo d'isso; os tempos que correm hoje, as circumstancias da epocha são outras; os interesses são outros. Hoje entende-se mais de melhoramentos materiaes e moraes, que todos nós desejâmos; trata-se mais de obras publicas do que das cousas da guerra; das cousas militares ninguem quer ouvir fallar. Mas é verdade que quando ha alguma desordem n'um concelho, logo se pede o auxilio da força em officio urgentissimo. É lá fóra aonde se conhece mais a necessidade da força armada; são os administradores e os juizes para as audiencias geraes a pedir bayonetas; que é raro o mez em que o administrador, o governador civil, não requisitam forças. E ralham do exercito. Aqui, em Lisboa, reputa-se uma cousa desnecessaria. Tenho sempre receio, e causa-me profundo sentimento quando vejo esquecida a historia. Eu receio pela sorte de um povo que despreza a sua força publica.

Já que fallei n'este ponto, permitta-se-me que faça uma pequena digressão. Os chins, que foram muito dados ao exercicio das armas, logo que desprezaram a sua força publica, foram conquistados pelos tartaros. Os egypcios, os seus grandiosos monumentos e a sua civilisação desappareceram aos golpes do ferro arabe. Vejo mais, Pericles desprezou a força publica, e substituiu-a pelo luxo e pelo theatro, e assim aplanou o caminho á conquista de Filippe, que alcançou em Cheroné o que Dario e Xerxes tinham tentado em vão; e os gregos que, estimulados por Demosthenes, o gigante da palavra, tinham jurado morrer pela liberdade e independencia da patria, ficaram reduzidos á mesquinha sorte de escravos, porque na Grecia havia muitos philosophos e oradores, mas não havia soldados; e o mais vergonhoso foi que Demosthenes foi um dos primeiros que fugiu do campo da batalha; encarregou-se de fazer o elogio a Filippe, de quem recebeu uma corôa de oiro.

Vejamos a Inglaterra, que descurou o seu exercito de terra desde 1815; e na Criméa arrependeu-se; e arrependeu-se pouco depois na India de similhante erro. Veja-se o estado em que hoje se acha o exercito inglez (apoiados). Veja-se o que fez aquelle paiz tão previdente e tão trabalhador. Corrida de vergonha a Inglaterra, comparando a sua administração militar com a do exercito francez! Por esta falta teve o exercito inglez maiores perdas do que o exercito francez; passou até pelas forcas caudinas aceitando da administração militar franceza beneficios no anno seguinte já a administração militar ingleza fazia inveja á franceza; assim aconteceu que as perdas dos inglezes no segundo anno, na Criméa, foram muito inferiores ás dos francezes; quando no primeiro as d'estes tinham sido muito inferiores ás d'aquelles.

Na sessão passada indiquei eu algumas economias que podiam fazer-se no orçamento da guerra; mas note-se que não mando proposta alguma para a mesa, porque ouvi dizer que o orçamento devia passar como estava, que o governo se preparava a fazer grandes reformas, que havia de apresentar na sessão seguinte,: e que essas reformas deviam ter certo nexo entre si, deviam ser feitas debaixo de um plano geral. Entendi pois ocioso mandar propostas para a mesa; mas como tenho occasião de fallar sobre o orçamento da guerra, faço apenas ligeiras indicações que o sr. ministro da guerra, que está presente, póde aproveitar, se porventura lhe agradarem; é provavel que lhe não agradem, mas eu desencarrego-me para com o paiz e fico bem com a minha consciencia.

Eu quero que se façam economias no exercito, mas quero que simultaneamente se façam nos outros ramos do serviço publico (apoiados), porque não quero que seja só a força publica a victima; isso não entendo eu que succeda, porque seria isso uma flagrante injustiça.

Se os outros ramos do serviço são necessarios, tambem o é o exercito, e, direi mais, o exercito é um elemento indispensavel para o goso dos melhoramentos materiaes que por ahi se veem. Quando chega a occasião do perigo, é então que se reconhece a necessidade do exercito. Não ha uma desordem n'uma aldeia, para que não se reclame logo uma força militar! Tenho observado isto mil vezes; passa o perigo e logo desejam anciosos ver essa força pelas costas. O soldado é um infeliz que tem poucos amigos. Temos dez divisões militares que eu entendo que se podem muito bem reduzir a quatro. Entendo que esta reducção está mesmo de accordo com a defeza do paiz, considerada debaixo do ponto de vista estrategico.

Não quero que se privem os generaes que commandam as divisões das vantagens que hoje têem; continuem nas suas divisões; mas quando por fallecimento ou por outro qualquer motivo vagar o commando de alguma divisão, não deve preencher-se, e assim se conseguirá a reducção. É assim que eu quero que se façam as reformas. Eu estou certo que dentro em pouco tempo por este processo as divisões militares ficariam reduzidas a quatro.

Emquanto á divisão militar dos Açores, entendo que ella tem suas inconveniencias, porque é preciso notar-se que o general que commandar a divisão não póde mandar ordens ás suas dependencias, senão por via do vapor que d'aqui vae principalmente na estação do inverno.

Entendo tambem que com as inspecções militares se podem fazer economias, porque sendo effectivamente pequeno o nosso exercito, o inspector que nada deve ter com a contabilidade dos corpos, pouco tem a fazer, porque a contabilidade deve pertencer exclusivamente á administração militar.

As inspecções n'outros paises são principalmente para o trabalho preparatorio das promoções, porque lá ha promoções de merito, de antiguidade, ella escolha do rei; é preciso ter grande escrupulo na maneira de formar essa escala para o accesso. Os inspectores com os commandantes dos corpos e o ministro da guerra é que formam a lista do accesso. O inspector tem por fim verificar annualmente o adiantamento dos inscriptos na lista respectiva das promoções.

Emquanto aos inspectores do material de artilheria, creio que tambem se póde fazer economia. Quer v. ex.ª saber as bellezas que resultam do estado em que está este ramo de serviço? O major que está em Lisboa commandando o material de artilheria recebe 90$000 réis mensaes, fazendo por mez algumas assignaturas em mappas d'esses que ha no exercito aos milhares, que para nada servem, e por este pesadissimo serviço recebe um major 90$000 réis mensaes, isto é, recebe mais do que um coronel de cavallaria ou de infanteria que tem 94$800 réis, mas que despende no expediente 7$000 ou 8$000 réis! Compare-se o posto, o vencimento e a responsabilidade! Entendo que é preciso que se acabem estes nichos do material, onde são desnecessarios.

Emquanto a presidios temos oito, este numero póde ser reduzido a dois ou tres, porque o numero de presidiados, termo medio, é de oitenta. E é preciso notar que quanto maior for o numero dos presidios, maior será a despeza que se fará com este ramo do serviço. É necessario fazer acabar os nichos que são o valhacouto de ociosos.

Emquanto ás commissões districtaes para o apuramento de recrutas, entendo que tambem se póde fazer uma economia com as gratificações que se dão aos officiaes reformados, que montam a dois contos e tantos mil réis.

Sr. presidente, não ha capital nenhuma de districto, que é justamente onde se apura o recrutamento, onde não haja um destacamento de linha; a palavra linha de que usei era desnecessaria, como designação, porque primeira, ou segunda ou terceira linha, não temos outra qualidade de tropa, senão a que todos veem, uma só, mas divisivel.

Em todas as capitaes dos districtos ha destacamentos. Pois bem, os officiaes d'esses destacamentos que façam parte das commissões de apuramento, e com isso poupar-se-ha a despeza de dois contos e tanto de réis. De mais a mais os officiaes que estão em actividade, tratavam com mais escrupulo d'este apuramento, do que os officiaes que já não pertencem ao exercito. Portanto do modo que eu lembro teremos um apuramento mais bem feito e mais economico.

Ha outra economia que me parece se poderá realisar, senão no todo, ao menos em parte.

Vou fallar de ministros de Christo, isto é, dos capellães do exercito. Bem sei que fallando n'esta classe terei tantos inimigos mais quantos foram os capellães; sei que elles sobem á cadeira da verdade e que de lá me podem fulminar, classificando-me de impio; mas primeiro que tudo e acima de tudo, está a minha consciencia e o meu dever (apoiados).

Os capellães do exercito tinham d'antes no tempo propriamente do throno e do altar, o que hoje ainda temos, felizmente, a graduação de alferes e o soldo respectivo, e nem elles, creio eu, se lembraram de pedir mais. Mas agora chegou o tempo do progresso, e conseguintemente entenderam os auctores da organisação de 1864, e entenderam na opinião dos capellães muito bem, que não deviam ficar estacionarios; estabeleceu-se pois que o capellão no fim de cinco annos de serviço fosse tenente, e no fim de dez annos capitão, e major quando se reformasse, com o soldo d'esta patente.

O capellão entra para qualquer corpo do exercito coma graduação de alferes e seu respectivo soldo que é de réis 25$000, d'ahi a cinco annos está tenente, e d'ahi a outros cinco annos está capitão, quer dizer com dez annos de serviço é capitão, o que não acontece aos officiaes do exercito, e se pede a sua reforma, é reformado no posto de major. Dito isto admira que haja padres que requeiram ser conegos; eu, se fosse padre, havia de perseguir o sr. ministro da guerra para me fazer capellão, que é melhor que ser conego (apoiados), porque o capellão vence mais que o conego da maior parte, das cathedraes do reino.

Vejamos agora qual é o serviço do capellão do exercito. O serviço de capellão é dizer cincoenta e tantas missas no anno, se as diz; é obrigado a desobrigar os soldados. Mas como desobriga elle os soldados? Desobriga-os até com certa irreverencia; desobriga-os em grandes turmas; e o que eu tenho observado é que uma força de quinhentas praças apparece desobrigada em poucos dias; eu entendo que a confissão dos soldados se assimilha áquella que fazem os pequenos nas freguezias ruraes (riso).

Eu não quero que do exercito se eliminem os capellães, Deus me livre disso; é preciso padres; mas senão houvesse capellães privativos dos corpos, não se perdia nada, porque por 500 réis haveria muitos padres que dissessem uma missa nos dias santificados aos soldados, e, digo mais, haveria padres em abundancia, e ouvir-se-ía até o a mim, a mim (riso).

Mas não param ainda aqui as vantagens concedidas aos capellães. A lei diz que os capellães são obrigados a dirigir as escolas regimentaes, e que por este facto terão mais 6$000 réis mensaes. De maneira que, alem de terem obtido vantagens novas em relação á graduação, tiveram mais esta de 6$000 réis mensaes, que em todo o exercito prefaz a quantia annual de 3:024$000 réis.

Agora querem v. ex.ª e a camara saber as vantagens (e reporto-me ao meu corpo) que têem resultado das escolas regimentaes? No meu corpo em cinco annos na escola regimental habilitaram-se quatorze homens em ler e escrever; ora, d'estes só foi um a sargento, porque os treze restantes não aprenderam a ler e escrever senão para cabo! Portanto descreio da escola regimental, tenho desanimado muito d'este ensino e não sou dos que olho para isto com indifferença. Tenho conseguido algum resultado, dispensando do toque de recolher alguns soldados que vão aprender a ler e escrever a uma escola estabelecida no sitio da Pampulha, creio que se denomina civilisação popular.

D'ahi é que tenho tirado resultados. A culpa não é toda dos capellães, nem dos soldados, é preciso ser justo; porque o serviço da guarnição, diligencias e destacamentos, e alem disso o serviço do quartel, um serviço esmagador, que se não percebe cá fóra, obsta a que as praças frequentem com certa regularidade, sem a qual pouco se póde aproveitar.

Não sei se os commandos das armas especiaes devem extinguir-se e se devem existir as commissões de melhoramento na arma de artilheria sómente; eu creio que em todos devia haver commissões de melhoramentos. Parece-me que seria conveniente haver uma commissão consultiva, composta das sumidades de cada uma das armas, de que o presidente seria o sr. ministro da guerra. Comtudo disso não faço questão, aponto só esta idéa que até já foi lei n'esta terra.

O que acho inconveniente, desigual e até certo ponto muito injusto, é que se faça uma concessão ao commandante geral da artilheria que não se faz aos commandantes das divisões militares.

O general de artilheria póde conceder as passagens para os corpos de artilheria. Pois o general de artilheria póde fazer passar de um para outro corpo a seu arbitrio, os officiaes por proposta, e as outras praças sem ella, ao passo que aos seus collegas generaes commandantes de divisões, e alguns mais graduados, não lhes é concedida a mesma faculdade! Parece-me que este favor é uma excepção odiosa.

Emquanto ao corpo dos artilheiros auxiliares na Madeira é uma cousa desnecessaria. Tenho fallado com alguns dos mais estimaveis collegas, representantes d'aquellas ilhas, que são da minha opinião, de que o corpo dos artilheiros auxiliares é desnecessario, deve portanto extinguir-se, do que resultará uma economia proximamente de 2:000$000 réis.

Nos corpos de veteranos desejava que houvesse mais escrupulo, porque se faz com elles a despeza de 130:000$000 réis; ora, estando nós ha tanto tempo gosando de uma paz octaviana, não comprehendo como ha tantas praças de pret em veteranos. Para veteranos creio que têem sido mandados homens que nunca foram soldados, ao passo que andam esmolando por ahi infelizes que fizeram a guerra peninsular; chama-se a isto a injustiça dos homens.