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sessão de 7 de maio de 1879

Presidencia do ex.mo sr. Francisco Joaquim da Costa e Silva

Secretarios - os srs.

Antonio Maria Pereira Carrilho Augusto Cesar Ferreira de Mesquita

SUMMARIO

Continua a discussão do capitulo 8.º do orçamento do ministerio do reino. — É apresentada pelo sr. ministro da marinha uma proposta de lei organisando o serviço postal das provincias ultramarinas.

Abertura — Ás duas horas da tarde.

Presentes á abertura da sessão 54 deputados — Os srs.: Adolpho Pimentel, Adriano Machado, Fonseca Pinto, Alfredo Peixoto, Torres Carneiro, Avila, Lopes Mendes, Arrobas, Carrilho, Mendes Duarte, Ferreira de Mesquita, Pereira Leite, Barão de Ferreira dos Santos, Caetano de Carvalho, Sanches de Castro, Cazimiro Ribeiro, Diogo de Macedo, Costa Moraes, Goes Pinto, Fortunato das Neves, Mesquita Castro, Pinheiro Osorio, Gomes Teixeira, Francisco Costa, Sousa Pavão, Guilherme de Abreu, Paula Medeiros, Palma, Brandão e Albuquerque, Scarnichia, Barros e Cunha, Sousa Machado, J. J. Alves, Frederico Costa, José Guilherme, Figueiredo de Faria, Namorado, Rodrigues de Freitas, Borges, Pereira Rodrigues, Sousa Monteiro, Sá Carneiro, Taveira de Carvalho, Julio de Vilhena, Almeida Macedo, Luiz de Bivar, Luiz Garrido, Faria e Mello, Aralla e Costa, Miguel Dantas, Miguel Tudella, Pedro Jacome, Visconde de Balsemão, Visconde de Sieuve do Menezes.

Entraram durante a sessão — Os srs.: Carvalho e Mello, Agostinho Fevereiro, Osorio de Vasconcellos, Alfredo de Oliveira, Alipio Leitão, Pereira de Miranda, Gonçalves Crespo, A. J. Teixeira, Pinto de Magalhães, Telles de Vasconcellos, Fuschini, Neves Carneiro, Victor dos Santos, Zeferino Rodrigues, Avelino de Sousa, Carlos do Mendonça, Emygdio Navarro, Hintze Ribeiro, Firmino Lopes, Francisco de Albuquerque, Van-Zeller, Silveira da Mota, Jeronymo Pimentel, Jeronymo Osorio, J. A. Neves, Almeida e Costa, Pires de Sousa Gomes, Dias Ferreira, Tavares de Pontes, Frederico Laranjo, José Luciano, Ferreira Freire, Teixeira de Queiroz, Barbosa du Bocage, Luiz de Lencastre, Freitas Branco, Manuel d'Assumpção, Pire3 de Lima, Correia de Oliveira, Alves Passos, M. J. Gomes, M. J. Vieira, Macedo Souto Maior, Pinheiro Chagas, Nobre de Carvalho, Miranda Montenegro, Pedro Correia, Pedro Barroso, Rodrigo de Menezes, Thomás Ribeiro, Visconde da Aguieira, Visconde de Andaluz, Visconde da Azarujinha, Visconde de Moreira da Rey.

Não compareceram á sessão — Os srs.: Tavares Lobo, Braamcamp, Emilio Brandão, Pedroso dos Santos, Barros e Sá, Saraiva de Carvalho, Bernardo de Serpa, Conde da Foz, Moreira Freire, Filippe do Carvalho, Mouta e Vasconcellos, Pereira Caldas, Frederico Arouca, Freitas Oliveira, Costa Pinto, Anastacio de Carvalho, Melicio, João Ferrão, Ornellas de Matos, J. M. dos Santos, Mello Gouveia, Lopo Vaz, Lourenço de Carvalho, Rocha Peixoto, M. J. de Almeida, Marçal Pacheco, Mariano do Carvalho, Pedro Carvalho, Pedro Roberto, Ricardo Ferraz, Visconde de Alemquer, Visconde da Arriaga, Visconde do Rio Sado, Visconde de Villa Nova da Rainha.

Acta — Approvada,

EXPEDIENTE

Representações

1.ª Do presidente e vereador da camara municipal de Villa Pouca de Aguiar, pedindo que seja approvado o projecto do lei com relação ao caminho de ferro do Porto a Povoa e Famalicão.

Apresentada pelo sr. deputado Avila e enviada á commissão de fazenda e obras publicas.

2.11 Dos empregados da repartição de fazenda do districto de Vizeu, pedindo augmento de vencimentos. ¦ Apresentada pelo sr. deputado Manuel (d’Assumpção e enviada á commissão de fazenda.

Declaração

Declaro que, por motivo justificado, faltei a algumas das passadas sessões. = Augusto Fuschini. Inteirada.

O sr. Guilherme Pacheco: — Na sessão de 26 de março ultimo, tive a honra de mandar para a mesa duas representações, uma assignada por 417 cidadãos eleitores da freguezia do Aguas Santas, concelho da Maia, e outra assignada pelos membros da junta de parochia da mesma freguezia, pedindo a esta camara que desannexasse do concelho da Maia e transferisse para o concelho de Vallongo a mesma freguezia de Aguas Santas.

N'essa occasião tive a honra de mandar para a mesa um projecto de lei tendente a verificar os votos e a aspiração dos povos d'aquella freguezia. Esse projecto foi por v. ex.ª remettido á commissão de administração publica, onde existe.

Dias depois foi apresentado n'esta casa, pelo illustre deputado, representante d'aquelle circulo, o sr. barão de Ferreira dos Santos, uma representação na qual se contraprotestavam os fundamentos, factos o deducções que apresentavam áquelles cidadãos, pedindo a esta assembléa que. não tomasse em consideração a representação d'aquelles povos.

Gomo esta representação foi publicada no Diario do governo, por deliberação d'esta camara, eu pude obter uma copia d'ella, que remetti á junta de parochia d'áquella freguezia, a qual ire envia hoje, a fim de eu apresentar n'esta casa, uma outra representação, declarando n'ella que os factos em que se fundam os que protestaram contra o pedido do3 signatarios da representação que eu tive a honra de mandar para a mesa, não podem julgar-se producentes, por isso mesmo que uma grande maioria, mais do 121 d'aquelles signatarios, não são cidadãos d'aquella freguezia nem ali moram.

E sabido que muitos dos individuos que figuram como signatarios d'aquelle contra-protesto, não residem ali e estão ausentes d'aquella freguezia ha muitos annos, e outros que figuram como assignados, a rogo, por individuos que tambem não são conhecidos n'aquella freguezia, não auctorisaram nem consentiram que os seus nomes fossem firmados pelos rogantes.

A junta de parochia, para prova das allegações, e para mostrar a verdade dos factos que allega na representação que tenho a honra de mandar para a mesa, apresenta um requerimento' feito em nome de varios d'estes signatarios, referindo os nomes de 127 d'esses cidadãos, e no fim d'este requerimento está escripto e firmado um attestado jurado pelo reverendo parocho do Aguas" Santas, em que declara terminantemente que todos estes individuos não são conhecidos n'esta freguezia, nem são ali parochianos.

Apresenta-se tambem uni documento firmado por varios cidadãos, no qual se declara que, apparecendo os seu3 nomes assignados, a rogo, na representação apresentada pelo sr. barão do Ferreira dos Santos, não tinham dado auctorisaçâo a ninguem para os assignar, por isso mesmo que alguns dos signatarios sabem escrever, e outros tinham as-

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signado a primeira representação, assignaturas que ratificam n'este documento.

Mandando para a mesa a representação e os documentos que n'ella vem referidos, peço a v. ex.ª que se digne envial-a á commissão de administração publica, á qual peço que não adie por mais tempo o parecer que deve dar sobre esta representação, a fim de tranquillisar os povos d'aquella freguezia, que desejam mais que tudo passar com a maior brevidade do concelho da Maia para o de Vallongo.

Já que estou com a palavra mando tambem para a mesa uma outra representação, que pessoalmente me entregou o conselheiro Anthero Albano da Silveira Pinto, primeiro bibliothecario da bibliotheca municipal da cidade do Porto.

Este zeloso o infatigavel empregado, que tem trinta e oito annos de effectivo serviço, e mais de sessenta e tres annos de idade, requereu á camara municipal do Porto, com fundamento no artigo 353.° do codigo administrativo, a sua aposentação.

O illustre senado do Porto, persuadido, ou antes entendendo, que effectivamente os empregados da bibliotheca não podiam considerar-se como empregados sujeitos á aposentação, não deu seguimento aquelle requerimento, e, portanto, denegou-lhe o deferimento.

O sr. Adriano Machado: — Peco a palavra. O Orador: — Este funccionario, que é bem conhecido, e creio que particular amigo do illustre deputado e meu amigo que n'este momento acaba de pedir a palavra, appella para a camara dos senhores deputados.

Eu, para tornar effectiva a sua pretensão, apresento igualmente um projecto de lei, em que, fuudando-me nas rasões que elle apresenta, e outras deducções, concluo por pedir que os empregados das bibliothecas municipaes sejam considerados empregados do quadro das respectivas secretarias, com direito á aposentação.

Peço a v. ex.ª que consulte a camara sobre se me dispensa a leitura do relatorio, e mesmo da representação.

Peço tambem a v. ex.ª que consulte a camara sobre se, considerando este projecto urgente, dispensa a segunda leitura, a fim de desde já ser remettido á commissão a 'que pertence, e seguir os devidos tramites.

Mando, portanto, para a mesa o projecto de lei, assim como a representação a que me referi.

Remetto igualmente para a mesa duas representações, urna assignada pelo porteiro, continuos e official de diligencias do governo civil do Porto, e outra assignada pelo actual thesoureiro pagador d'aquelle districto, pedindo augmento de vencimento.

Convencido da justiça que assiste aos peticionarios, comquanto me pareça que as cireumstancias do thesouro não estão em termos do se poder attender a todos estes pedidos, todavia, verificada a necessidade que elles têem do um ordenado" um pouco mais largo, a fim de poderem satisfazer ás necessidades da vida, solicitava da camara dos senhores deputados que se condoesse da sorte d’aquelles infelizes, e que não regateasse um pequeno obolo do caridade para augmentar os vencimentos d’aquelles empregados.

No fim do mez de março, ou principio do abril, renovei a iniciativa de varios projectos de lei que tinha apresentado em outras sessões da legislatura passada. _

Não me consta por emquanto que nenhuma das commissões a quem estes projectos deviam ser remettidos para da rena parecer, tenham até agora apresentado o, resultado dos! seus trabalhos.

Eu creio que as diversas commissões d'esta casa, como delegados do parlamento, devem compenetrar-se dos deveres que lhes assiste do serem um pouco mais assíduas e cuidadosas no desempenho dos seus deveres o obrigações, e não devem querer que, por uma vez, se inutilise completamente a iniciativa parlamentar de cada um dos deputados.

Peço a v. ex.ª que ponha á votação o requerimento que fiz em relação á dispensa da segunda leitura do projecto que apresentei para ser considerado urgente.

Consultada a camara resolveu afirmativamente.

E o seguinte:

Projecto de lei

Senhores. — O conselheiro Anthero Albano da Silveira Pinto, bacharel formado, e primeiro bibliothecario da bibliotheca municipal do Porto, com trinta e oito annos de effectivo serviço publico, e sessenta e tres de idade, doente, e já sem forças, presuppondo-se com direito á sua aposentação, attenta a disposição do artigo 353.° do codigo administrativo, em dezembro ultimo solicitou-a da respectiva camara municipal, pelo requerimento que acompanha a adjunta representação.

Não suspeitava aquelle zeloso, e já cansado, empregado que a corporação municipal do Porto deixasse do attender á sua justificada pretensão, com o pretexto do que «o direito da aposentação sendo restricto aos empregados da secretaria da camara não comprehende os da bibliotheca, que não fazem parto d’aquelle quadro!...

E nem mesmo o podia suspeitar, porque os empregados da bibliotheca, pelas habilitações litterarias, que se lhos exigem, pela natureza e qualidade dos serviços que são obrigados a desempenhar, e pela graduação e posição que occupam, apesar do menos retribui dos que outros de inferior graduação e habilitações, foram sempre classificados como empregados da secretaria o como taes descriptos no respectivo capitulo orçamental, e se, para não gosarem do beneficio da aposentação, se lhes pretendo negar esta qualidade, de rasão e justiça era que se denegasse tambem a outros, a quem, esse beneficio se tem já concedido, e exercem igualmente funcções fóra da Secretaria municipal.

Os empregados da bibliotheca municipal do Porto, sendo dos mais graduados e considerados, ainda que menos bem remunerados, não podem ser excluidos do beneficio da aposentação concedida pelo artigo 353.º do codigo administrativo, nem devem ficar sujeitos ao arbitrio, o para que se defina e fixe a sua posição e cireumstancias, sem necessidade de arbitraria classificação e de encontradas interpretações, tenho a honra de sujeitar ao vosso juizo e approvação o seguinte

projecto de lei

Artigo 1.° Os empregados das bibliothecas municipaes são considerados empregados do quadro das respectivas secretarias, com direito á aposentação.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala da camara, 7 de maio de 1879. = José Guilherme, deputado por Paredes. ' •

Enviada á commissão de administração publica,.ouvida depois a de fazenda.

O sr. J. J. Alves: — Não desejando concorrer para protelar a discussão do orçamento, pedi, agora a palavra porque queria chamar a attenção do sr. ministro do reino para a necessidade que ha de se construir um edificio onde se estabeleça o lyceu nacional - de Lisboa, porque aquelle que o governo traz de renda não tem as condições precisas para similhante fim: como, porem, s. ex.ª não está presente, reservo-me para o fazer no capitulo que continua a discutir-se sobre instrucção publica.

Agora, sr. presidente, visto que estou com a palavra permitta-me v. ex.ª e a camara que eu me refira a um incidente originado pela discussão que hontem teve logar n'esta casa, quando pretendia chamar para o municipio de Lisboa os rendimentos cobrados pela alfandega municipal, e que em grande parte lhe pertencem.

Quando eu podia isto, quando dizia que a camara tinha direito a receber o que era seu, disse tambem, referindo-mo á entidade camara municipal, lhe cabia o dever de proceder por fórma que em todos os serviços se mantivesse a maior economia, o que se poderia conseguir por uma severa administração; e o que disse aqui tenho-o dito na cadeira

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do vereador, e na imprensa, quando a ella tenho sido chamado.

Sem ter vontade de trazer para este logar as apreciações que um jornal tenha feito sobre o que eu disse, lastimo profundamente que um collega, que é ao mesmo tempo auctor dos boletins parlamentares, podendo combater aqui as minhas palavras, preferisse outra tribuna, onde nem sempre é permittido o desforço, e apresentasse os factos pelo modo que lhe conveiu.

Sr. presidente, sou deputado livre, o como tal tenho o direito de expender as minhas idéa3 conforme posso e sei; (Apoiados.) este direito é dado a todos, porque todos aqui representam a nação: fallo segundo as minhas convicções, e quando tratar de defender ou de accusar alguem, creia v. ex.ª que não acceitarei procuração, nem exigirei recompensa alguma por tal serviço.

Não fiz, como alguem disso, accusações apaixonadas, nem tão pouco fui contraditório; o que exigi foi que variasse o systema de administração ha muito em uso na camara municipal de Lisboa.

E se não diga-mo v. ex.ª, póde considerar-se principio de boa administração, vendo nós que os 200:000$000 réis, producto da venda de umas propriedades, que davam um certo rendimento á camara, são applicados para despezas ordinarias, ficando ella privada do capital e do rendimento? Como se póde considerar boa administração, creando-se logares que bem podem dispensar-se, isto na occasião em que a camara lucta com gravissimas difficuldades, não chegando os seus fracos recursos para acudirás obras de primeira necessidade, e quando a sua divida não é pequena? So é defeito apontar estas verdades, então commettem os srs. deputados defeitos d'esta ordem todos os dias. Mas ou não chamo a isto defeito, pelo contrario é uma franqueza que eu louvo a todos, porque todos devem pugnar pelo interesse publico.

Sou deputado e vereador; tanto aqui como lá respondo pelas minhas acções; e creia a camara que um, dos actos do sr. duque d'Avila e do Bolama que mais senti, foi que s. ex.ª dissolvesse a camara municipal por motivos quasi sem rasão de ser, e não mandasse syndicar sobre o que publicamente se dizia, que na camara municipal existia a origem da malfadada questão Gotto.

Quer o cavalheiro, que é deputado e jornalista, contestar que o municipio tenha direito a exigir os rendimentos que lho são arrecadados pelo thesouro, está no seu direito; mas esta opinião não é só minha, é de muita gente, e até do membros do gabinete, que não duvidarão, em occasião opportuna, e organisada a questão de fazenda, dar á municipalidade de Lisboa mais 300:000$000 réis, alem dos 215:000$000 réis que actualmente recebe.

Estas opiniões póde não as ter o cavalheiro a que me refiro, mas acho mais proprio que as combata aqui, sobretudo quando não lhe falta o merecimento para o fazer, e. não mudar do tribuna, para deturpar os factos e offender quem se, preza de não lhe havei dirigido uma palavra desfavoravel. Era mais proprio, mais franco que se discutisse aqui o assumpto, porque o cavalheiro a quem me estou dirigindo diria o que quizesse, e ouviria tambem o que tem direito a ouvir.

Se aqui se dissesse tambem, como se avançou fóra d'este logar, que a administração financeira da camara municipal não póde ter Jogar emquanto os vereadores não se indispozerem com os magnates eleitoraes, e cumprirem o seu dever, eu responderia que não acceito o. conselho, porque não me accusa a consciencia do ter faltado aos meus deveres como vereador mas que se este dever se refere a carregar mais o povo da capital com impostos, ou jamais os votarei, e commigo muitos collegas do municipio, porque entendemos que o povo já paga q não pouco.

Pretendeu-se tambem affirmar fóra d'esta casa, que o sr. visconde do Moreira do Rey discordava das minhas opiniões: s. ex.ª apenas apresentou uma idéa de que eu dirijo, qual é a, do passarem para o governo todas as obras municipaes: nenhuma rasão me póde convencer, sobretudo quando vejo que as obras da camara, apesar dos seus fracos recursos, têem uma conclusão mais prompta, ao passo que as que são feitas por conta do estado, quaesquer que sejam os motivos, tornam-se muita mais morosas; e darei como exemplo tuna parte do aterro da Boa Vista, concluido em alguns mezes, emquanto que o aterro oriental dura ha annos, sem esperanças do tão cedo se concluir. (Apoiados.)

Eis o que tenho a dizer, e peço desculpa á camara de cansar a sua attenção com um assumpto que fui obrigado a tratar aqui, para mostrar que sinto que o cavalheiro a quem me refiro não procurasse antes, n'este logar, esclarecer o assumpto, e preferisse ir provocar quem não o offendeu.

O sr. Goes Pinto: — A illustre commissão do guerra deve ter sido apresentado o projecto de lei formulado pelo meu amigo o collega o sr. Namorado, com respeito ao melhoramento do nosso serviço medico militar. Não havendo na sala nenhum dos membros da commissão de guerra, peço a alguns dos membros da commissão de fazenda tenha a bondade de informar-me se tal projecto já passou d'aquella para esta commissão.

A camara sabe bem que é do grande conveniencia occupar-se do projecto a que me refiro. Carece o nosso serviço do saude no exercito de grandes melhoramentos, e devemos olhar com muita atenção, especialmente para o que diz respeito ao pessoal technico. Em todos os paizes, e recentemente em França, tom este serviço merecido especial attenção e detido estudo.

E urgente attentar na situação pouco lisonjeira em que se encontra o pessoal technico, principalmente os cirurgiões mores e cirurgiões ajudantes. Oh! sr. presidente, ha cirurgiões mores com mais de trinta annos de serviço, que estão a ver reformados em officiaes superiores áquelles que elles conheceram recrutas! Isto não póde ser. Os cirurgiões ajudantes têem uma promoção tal, que alguns conheço n'aquella, situação ha cerca de quatorze ou quinze annos!

O sr. Carrilho: — O projecto ainda não foi enviado á commissão de fazenda.

O Orador: — Visto que o projecto não foi enviado á commissão de fazenda, faço votos para que não tenha grande demora na commissão de guerra, e possamos ainda discutil-o na presente sessão.

Declaro desde já, que salvo algumas pequenas divergencia em pontos secundarios, eu voto o pensamento gorai do projecto, o não quero ser taxado de contradictorio, votando um augmento de despeza, porque o meu empenho é que nos differentes ramos de administração se despenda. e remunere bem o serviço bem feito.

Como está presente o meu nobre amigo o sr. ministro do reino, eu peço a s. ex.ª que dê ordem ao governador civil do Vianna do Castello para que remetta com brevidade os esclarecimentos que pedi com relação a materia do recrutamento. Eu comprehendo bom que aquella auctoridade não tenha grande empenho em satisfazer o meu pedido, mas isso não obsta a que o sr. ministro do reino me faça o favor do ordenar aquelle funccionario que cumpra com o seu dever.

Por ultimo mando para a mesa um requerimento pedindo alguns esclarecimentos pelo ministerio da marinha, rogando a v. ex.ª, sr. presidente, queira dar a este requerimento o destino conveniente.

É o seguinte;

Requerimento

Requeiro que, pelo ministerio da marinha e ultramar, seja enviada á camara copia de toda a correspondencia que diga respeito á exoneração do tenente coronel Francisco Augusto Ferreira da Silva, do commando do corpo de policia do Macau, por portaria de 15 de março d'este anno. = O deputado, Goes Pinto.

Enviado á secretaria para expedir com urgencia,

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O sr. Adriano Machado Pedi a palavra, na occasião era que me pareceu que o sr. José Guilherme Pacheco se propunha a censurar a camara municipal do Porto por ter negado a aposentação ao bibliothecario d'aquella cidade; mas depois pelo projecto que s. ex.ª apresentou vi que o seu fim não era fazer uma censura á camara, e sim mostrar que ora de equidade conceder-se aquelle funccionario a sua aposentação, reconhecendo ao mesmo tempo que elle não é empregado de secretaria, e que não estava comprehendido nas disposições do novo codigo administrativo. '

Portanto, nada tenho que dizer a este respeito, o quando o projecto vier á discussão examinal-o-hei. Devo, porém, desde já declarar que me parece que o funccionario do quem se trata é realmente muito digno o que merece a contemplação da camara. Mas tratando de jure constituto, não se póde considerar o bibliothecario da camara municipal do Porto como empregado da secretaria municipal.

Repito, examinarei o projecto, e a camara avaliará a justiça que assiste aquelle empregado, para ser approvada ou não a proposição apresentada pelo sr. Guilherme Pacheco......'

O sr. Pinto de Magalhães: — Mando para a mesa um projecto de lei assignado por mim e pelo3 srs. Pereira de Miranda o Arrobas, alterando os direitos estabelecidos pela lei do 27 de dezembro do 1870 para o cordame, e os consignados no artigo 172.° da pauta geral das alfandegas para os chapéus de chuva ou sol, a fim de se prover de remedio á situação em que se acham estas industrias.

?Sendo simples o assumpto de que trata o projecto, eu pedia a v. ex.ª a urgencia, a fim do ser com brevidade remettido á commissão respectiva.

(Consultada a camara, foi julgado urgente.

E o seguinte:

Projecto de lei Artigo 1.° Os direitos estabelecidos pela lei do 27 de dezembro do 1870 para o cordame, e os consignados no artigo 172.° da pauta geral das, alfandegas para os chapéus de chuva ou sol, são substituidos pelos seguintes:

Cabos, amarras, cordas e enxárcias de qualquer especie, fio de carreta e de vela, merlim, linha,

sondarezas e cordel—1 kilogramma....... $065 réis

Umbellas o chapéus de chuva ou sol:

De seda — cada um...................... $800 réis

De outros estofos — cada um............... $400 réis

Em peças separadas — 1 kilogramma........ 1$500 réis

Art. 2.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Antonio Augusto Pereira de Miranda = Antonio de Sousa Pinto de Magalhães — Antonio Maria Barreiros Arrolas.

Enviado á commissão de fazenda,

O sr. Guilherme Pacheco: — Pedi a palavra para declarar ao meu amigo o sr. Adriano Machado, que não faço censuras a ninguem, nem me levantei para censurar corporação alguma, e apenas apresentei um projecto de lei, pela qual se deduz que o bibliothecario da bibliotheca do Porto está comprehendido no artigo 353.° do codigo administrativo, dissentindo n'esta parte da interpretação que a camara municipal do Porto dá aquelle artigo, e dissinto fundado em rasões que adduzírei quando este projecto vier á discussão, e pelo ¦ que se deduz de um documento que vem junto á representação que apresentei.

Nos orçamentos annuaes da camara municipal do Porto vem classificados e incluidos no capitulo « empregados de secretaria» os que fazem parte da. bibliotheca publica.

O illustre senado do Porto, quando aquelle, empregado pediu a aposentação, entendeu que elle não era empregado de secretaria, talvez pela circumstancia d'elle não exercer as suas funcções dentro da propria secretaria;, porque de outra fórma não ora possivel deixar de o considerar empregado de secretaria.

Não é agora occasião de discutir este assumpto. Quando

eito se discutir, parece-me que hei de demonstrar com rasões obvias e procedentes, que effectivamente os empregados d'aquella graduação estão considerados e devem ser considerados como empregados de secretaria.

Mas para evitar qualquer duvida que possa apparecer nos espiritos um pouco mais atilados que o meu, é que apresentei o projecto de lei, para que os mesmos empregados sejam considerados legalmente, e sem duvida nenhuma, como fazendo parte do quadro da secretaria para o effeito da aposentação.

O sr. Mesquita e Castro: — Mando para a mesa um parecer da commissão de administração publica, para ser remettido á commissão de obras publicas.

O sr. Presidente: — Passa-se á

ORDEM DO DIA

Continuação da discussão do capitulo 8.° do orçamento do ministerio do reino

O sr. Presidente: — Continua com a palavra o sr. Alfredo da Rocha Peixoto.

O sr. Alfredo Peixoto: — Permittam-me v. ex.ª e a camara que faça mais algumas considerações ácerca dos pontos que hontem tratei especialmente, pouco antes de ser fechada a sessão.

V. ex.ª sabe que, quando teve a bondade de conceder-me a palavra sobre a materia em discussão, ía a hora bastante adiantada; e, portanto, não podia eu occupar-me, com a devida extensão, das questões principaes a que se tinha referido o illustre deputado, a quem devia responder pela ordem da inscripção.

Ainda assim, sr. presidente, entendi que, na impossibilidade em que estava de tratai-as todas com o desenvolvimento e a circumspecção indispensaveis, devia escolher as que mais ou menos claramente envolviam, com responsabilidades serias, pessoas que não tinham voz n'esta casa; cavalheiros que, por muito alto que estejam collocados, não podem ser trazidos assim para um debate menos conveniente, nem occupar a nossa attenção, sem necessidade seria, por muito tempo, especialmente quando ella está sendo reclamada para os negocios mais importantes da administração publica.

Tratando primeiramente da instrucção superior, lembrarei a v. ex.ª e á camara, que é illustre deputado o sr. dr. Laranjo impugnou o censurou a accumulação do ordenados, sem poder provar sequer um caso unico, ou antes a justissima vantagem concedida aos professores jubilados do exercer commissões retribuidas o compativeis com o seu estado.

Alludiu então s. ex.ª a um caso particular e accusou n'elle uma illegalidade; vou primeiramente provar que tal irregularidade não existe; tratarei de demonstrar que s. ex.ª está em erro; desempenhar-me-hei d'este encargo sem grande difficuldade, porque a questão é simples; mas, pelo respeito que devo a v. ex.ª, á camara e a mim proprio, n'uma questão pessoal, que não levantei, mas que devo acceitar, citarei o nome venerando da pessoa a quem foi attribuido interesse na illegalidade presumida e accusada sem rasão.

Disse o illustre deputado que um professor tinha sido jubilado e depois collocado em uma commissão remunerada; e então fallou na junta de credito publico.

N'isto quiz s; ex.ª descobrir a illegalidade que accusou. Sr. presidente, não comprehendo por que motivo não foi pronunciado o nome d'esse: antigo professor1, o, todavia, a allusão é sufficiente indicação para descobril-a. É facil ir ver o quadro do pessoal da junta do credito publico, para se conhecer qual é o membro d'essa junta que é professor jubilado. Não hesito em fazel-o.

Encontra-se logo no primeiro logar, que é o de presidente, um nome que todos nós os professores, que todos os que te-

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moa logar n'esta assembléa, mas especialmente os professores, podemos e devemos pronunciar com honra, reconhecimento e justo louvor; é o do sr. conselheiro dr. Joaquim Gonçalves Mamede, a quem o paiz deve cerca de quarenta annos de serviços relevantissimos, (Apoiados.) prestados sempre com austera honradez, com dedicação constante, com distincta seriedade e com bem reconhecido proveito para o paiz, que de certo nunca ha de esquecel-os.

O professor que, depois de ser jubilado, foi collocado na junta do credito publico, sr. presidente, bem sabem v. ex.ª o a camara, que foi o sr. conselheiro dr. Joaquim Gonçalves Mamede.

O illustre deputado, que sinto não ver presente n'este momento, teve duvida em proferir este nome; não sei porquê.

Comprehendo que haja duvidas em fazer apreciações mais ou menos explicitas, mais ou menos justas, ácerca de quaesquer pessoas sem citar seus nomes; mas não comprehendo que as haja, quando se fazem essas apreciações para logo declarar os nomes de taes pessoas, principalmente quando essas apreciações se referem a actos publicos de funccionarios do estado.

Expliquei hontem á camara quaes eram as disposições de, lei que regulam este assumpto; mas permitta-me v. ex.ª que de novo as refira; e aos srs. lachygrapho3, a quem desde já declaro que muito desejo não ter o trabalho de rever as suas notas, peço que tenham a bondade de mencional-as palavra por palavra.

A lei de 12 de abril de 1875 diz o seguinte, no artigo 2.°:

(Leu.)

Esta lei é posterior á que citou o illustre deputado, que é a lei de 8 de junho de 184.3, a qual no § unico do artigo 2.° diz assim:

(Leu.)

Entendo que nem esta mesma lei de 1843 é applicavel aos professores jubilados, pois que estes não podem deixar vagos logares em qualquer repartição, porque não estão em serviço activo. Parece-me claro que tal disposição não podia ser applicada ás classes inactivas, embora não houvesse mais lei alguma, pois que se refere só a empregados publicos em. actividade de serviço e a vencimento, que é a remuneração de serviço que se presta e não do que já foi prestado, como é o ordenado de um empregado jubilado, aposentado ou reformado. É preciso attender bem a esta distincção de vencimento, ordenado e gratificação, pois não são termos synonimos. O vencimento comprehende o ordenado e a gratificação por trabalho feito em serviço activo; para que se vença, é necessario que se trabalhe, e tanto que pêra o pagamento d'esta remuneração é necessario verificar se foi feito o trabalho. Não é assim o ordenado de um antigo empregado da nação que esteja jubilado, aposentado ou reformado; este não vence; recebe á remuneração que já tinha ganho pelo que trabalhou; e para o pagamento do seu ordenado ha só a verificar se é vivo.

Mas deixem-me v. ex.ª, sr. presidente, e a camara, interpretar similhante lei como quer o sr. Laranjo; não me levem isto a mal.

Se o artigo 2.° da lei de 8 de junho de 1843 comprehende tambem os professores jubilados, está revogada já n'esta parte pela lei de 12 de abril de Í875, cujo artigo 3.° revoga a legislação contraria. D'esta lei lembro-mo perfeitamente, porque tambem concorri com o meu voto n'esta casa para ella ser feita.

Mas, antes d'esta lei, havia outras que permittiam aos professores jubilados ou aposentados o exercicio de commissões activas, logo que elles podessem desempenhal-as com reconhecido proveito publico.

Disse o illustre deputado que assumia a responsabilidade da lei de 2 de setembro de 1869 (note v. ex.ª que este documento é uma carta de lei e não decreto, como naturalmente por equivoco disse o illustre deputado), por ser o governo d'essa epocha constituido pelo antigo partido historico, o qual, confundido com o antigo reformista, fórma hoje o progressista.

Creio que o illustre deputado não póde dizer o mesmo ácerca de outras leis de instrucção publica, que são da responsabilidade do mesmo partido; pelo menos hontem impugnou algumas. Pois, apesar de ser adversario do antigo e fina do partido historico, julgo boas e justas algumas das suas leis, e entre essas as que s. ex.ª tão severa e injustamente condemnou aqui.

A carta de lei de 11 de agosto de 1853 estabelece o seguinte no artigo 1.°:

«Os lentes e professores de instrucção superior que completarem vinte annos de bom e effectivo serviço, a contar do primeiro despacho para o magisterio, lêem direito a ser jubilados cora o ordenado das cadeiras em que se acharem providos; querendo, porém, continuar o magisterio, e verificando-se que estão em cireumstancias de o exercer com proveito publico, vencerão mais um terço do ordenado; mas só depois de trinta annos de serviço poderão ser jubilados com mais este acrescimo do ordenado.».

No § 3.° do mesmo artigo lê-se o seguinte:

«Os lentes e professores jubilados serão pagos com os effectivos, e serão considerados adjuntos aos estabelecimentos a que pertencerem, para poderem ser empregados em serviços extraordinarios, compativeis com as suas cireumstancias, não sendo n'estes comprehendida a regencia das cadeiras.»

Vejam v. ex.ª; sr. presidente, e a camara, como n’esta lei é reconhecido o respeitado o principio que invoco para esta nossa questão, sob o aspecto do que deve ser legislado ácerca d'ella, de jure constituendo, como se dizia quando se ensinava o direito em latim.

Mas esta lei é da responsabilidade do muito illustre estadista Rodrigo da Fonseca Magalhães, e tal responsabilidade, sem duvida, não quer assumir o sr. dr. Laranjo; nem é preciso.

Pois aqui tem v. ex.ª o decreto regulamentar de 4 de setembro de 1860, para as jubilações e aposentações dos professores de instrucção publica. Este é do sr. marquez do Loulé, estadista a cuja veneranda memoria presto o mais respeitoso reconhecimento.

Dispõe o seguinte no artigo 6.°:

« Os lentes e professores, que completarem cincoenta annos deidade e trinta de bom o effectivo serviço na instrucção superior, e trinta e cinco na secundaria, poderão jubilar-se com, o acrescimo da terça parte do seu ordenado.»

No artigo 7.° diz o mesmo decreto:

«Os lentes o professores que, depois de completarem o tempo de bom e effectivo serviço para obter a jubilação ordinaria, na conformidade do n.º 2.° do artigo 1.° d'este regulamento, quizerem continuar no exercicio do magisterio, verificando-se que estão em cireumstancias de o desempenhar com reconhecido proveito publico, vencerão mais um terço do ordenado, sujeito a todas as deducções e impostos que lhes forem applicaveis.»

Está aqui o nome do nobre marquez de Loulé, a cuja saudosa memoria todos nós, sem distracção de partidos, prestámos a mais profunda veneração; está o nome do sr. marquez de Loulé a referendar este decreto, que o illustre deputado com tanta crueldade impugnou ou intentou impugnar; e diz o illustre deputado, que assume a responsabilidade das leis propostas e referendadas pelos ministros do antigo partido historico!

Posteriormente a este decreto, vieram outra3 disposições legislativas, que alteraram o que havia ácerca de jubilações o aposentações.

Veiu uma que exigia para a jubilação dos professores a incapacidade absoluta. Reconheceu-se — e não era preciso meditar muito que era absurda e iniqua esta exigencia, porque podia um professor não estar habilitado para o bom o effectivo serviço do magisterio, que exige estudo aturado

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todos os dias para acompanhar a sciencia no seu immenso curso o em seus rapidos progressos; mas podia estar muitissimo habilitado para diversas e importantes commissões, e para algumas até mais do que professores validos e no vigor da mocidade.

Ha commissões, não é necessario citar algumas d'ellas que bem conhecidas de todos são muitas; ha commissões para as quaes é necessaria, ou convem muito, uma certa experiencia de negocios que os professores novos não têem, porque só se póde adquirir com o tempo; e, com franqueza, é mais de presumir que se encontre experiencia sensata nos professores antigos do que no3 modernos.

Esta lei, porém, foi revogada; e hoje está em vigor a que tenho citado mais de uma vez, de 12 de abril do 1875, a qual exige apenas a incapacidade para o exercicio do magisterio.

.lá não é, portanto, exigida para a jubilação ou aposentação e incapacidade absoluta para o serviço publico; mas sómente a relativa para o magisterio.

Permitta-me v. ex.ª que apresente uma consideração, a qual vem muito a proposito.

Esta lei de 12 do abril do 1875, como a que exigia a incapacidade absoluta, tem sido mal interpretada em meu parecer, pois que, alem da incapacidade relativa, provada directamente em inspecção official de facultativos, tem-se continuado a exigir a condição dos cincoenta annos de idade, condição estabelecida na lei de 17 de agosto de 1853 e no decreto regulamentar de 4 de setembro do 1860.

Não posso approvar similhante exigencia.

A lei de 12 de abril de 1875 dispõe, no ultimo artigo, que fica revogada a legislação em contrario.

Por conseguinte n'esta parte estão revogadas todas as outras leis sobre jubilações o aposentações; e portanto não ha actualmente em vigor disposição legislativa que exija a idade de cincoenta annos completos para a jubilação.

Exige-se ainda todavia esta condição para que o professor seja jubilado, e ao mesmo tempo exige-se a inspecção directa da incapacidade physica.

A rasão porque a lei de 17 de agosto' de 1853 e o decreto de 4 de setembro de 1860 exigiam para a jubilação a idade de cincoenta annos, era evidentemente por ser esta idade um symptoma provavel de incapacidade para a continuação do magisterio.

Entendia-se que um professor com vinte annos de serviço e cincoenta annos do idade, na grande maioria dos casos não estava em condições de continuar a exercer o magisterio; e assim entendia-se mal, em muitos casos.

Mas a verdade era que estas condições estavam em leis, que não temos necessidade de discutir, porque entendo que já estão revogadas n'esta parte.

Não obstante o que tenho ponderado, a lei de 12 de abril de 1875 não tem sido interpretada como a entendo, e ainda é exigida a idade de cincoenta annos e ao mesmo tempo a prova directa da incapacidade physica; quer isto dizer que alem do exame de peritos que julguem e attestem definitivamente a incapacidade para o exercicio do magisterio, é necessario um symptoma, um indicio da incapacidade já provada. Tambem é verdade que este facto não produz grande mal. As jubilações aos vinte annos de serviço são pouco frequentes, pois, como já tenho dito, depois d'este tempo de serviço, quasi todos os professores estão nas condições de prestal-o bom e effectivo.

As jubilações com o terço antes dos cincoenta annos de idade só em mui poucos casos podem succeder; pelo menos, não conheço caso algum em que um professor chegue a cincoenta annos de idade com trinta de serviço.

Ainda assim bom seria que esta lei fosse interpretada conformo a entendo.

A illustre commissão de instrucção publica está confiado o exame de um projecto de lei apresentado pelo meu antigo mestre e nosso muito distincto collega, o sr. dr. Antonio José Teixeira, projecto que no artigo 1.º dispõe a dispensa da condição da idade para as jubilações.

Declarando eu que esta lei tem sido mal interpretada, não tenho a idéa do censurar o sr. ministro do reino; estas divergencias de opiniões são compativeis com a confiança politica, o até muito frequentes entre os homens de direito na applicação das leis.

Nenhum professor póde ser jubilado sem que uma junta de medicos independentes e conscienciosos o declaro incapaz para a continuação do magisterio; ninguem póde apontar um unico facto, que auctoriso uma suspeita contra qualquer dos cavalheiros que têem exercido tão importantes funcções.

Conheço alguns, o sei que n'este serviço têem entrado homens de todos os partidos, progressistas tão dedicados, tão liberaes e tão valentes como o sr. dr. Laranjo; e regeneradores tão firmes, tão justos o tão devotados á causa publica como qualquer dos cavalheiros que formam a maioria d'esta assembléa e como eu.

Declaro francamente que foi com intimo pezar, que vi um distincto professor da faculdade do direito, em cujos cursos se preparam os cidadãos para a magistratura judicial, julgar com tão grave injustiça homens que, tanto como a honra e a familia, muito mais que a propria vida, prezam a sua dignidade pessoal e a da sua profissão. (Apoiados.)

Tanto isto assim é, que raras têem sido as jubilações concedidas exactamente no fim de vinte ou trinta annos do serviço.

O illustre professor, o sr. conselheiro dr. Mamede, a quem ha pouco me referi, foi jubilado com trinta e dois a trinta o tres annos de serviço, e depois de ter luctado por muito tempo com uma pertinaz doença, que todos nós cabemos que o accommetteu nos ultimos annos do seu serviço na universidade. (Apoiados.)

Foi jubilado o sr. conselheiro dr. Mamede, permittam-me que o diga n'esta occasião, levando a saudade e o respeito de nós todos, que eramos seus collegas na faculdade, tendo uns sido discipulos de s. ex.ª, e outros, como eu, discipulos d’esses seus discipulos.

Tenho a satisfação de declarar que nas actas das congregações do conselho da faculdade de mathematica se lançou um voto de reconhecimento pelos grandissimos serviços prestados á universidade e á sciencia por s. ex.ª durante trinta e tres annos, voto que foi approvado por unanimidade e sem discussão; o considero um dos factos mais honrosos da minha vida a iniciativa de propol-o.

E na verdade, sr'. presidente, a faculdade do mathematica não podia esquecer os serviços de tão distincto professor, que á dirigiu, como decano e lente de prima, com inexcedíveis dedicação e estima.

Mas porque s. ex.ª não podia continuar no aturado serviço de ensinar mathematica, não estaria s. ex.ª nas circumstancias de presidir ajunta do credito publico?

Quero invocar o testemunho, não dos srs. deputados que apoiam o gabinete, mas dos srs. deputados do partido do sr. Laranjo.

Pois, quando se tratou da dotação da junta do credito publico, onde foi votada a gratificação do presidente da mesma junta, quem se levantou e impugnou tal gratificarão? Quem?

Ninguem teve que contestar; e se houvesse a illegalidade accusada pelo sr. deputado Laranjo, seria na gratificação do presidente da junta do credito publico, e nunca n'um 'ordenado ganho com trinta o tres annos do serviço bom o effectivo, distincto e summamente proveitoso. ' Só agora, no orçamento da instrucção publica, é que o sr. Laranjo vem com censuras o vem isolado felizmente!

Repito, que muitos professores têem accomulado com incontestavel direito gratificações com os seus ordenados.

Tambem as tenho recebido, ainda em julho e outubro as recebi pelo serviço extraordinario que fiz na qualidade

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do presidente de uma das mesas dos exames de mathematica elementar na circumscripção de Lisboa; e tenho-as recebido com a convicção de que tinha direito a tal vencimento, tanto como um filho ao que herda de sou pae, tanto como um operario ao seu salario de cada dia de trabalho.

Pois, o mesmo é o direito que o sr. conselheiro Mamede tem aos vencimentos que recebe.

Não quer o illustre deputado que os professores tenham esta vantagem. S. ex.ª sabe o que é um professor? É um homem que passou os melhores dias da sua mocidade a estudar com assidua dedicação, dispendendo o que é seu e o que é do sua familia, e Deus sabe com que sacrificios!

Depois tom de esperar logar para ser admittido a concurso, onde vae dar rigorosas provas, o se lhe é favoravel a decisão do jury, vae vencer 500$000 réis de ordenado, quando muito, como substituto.

Só depois do primeiro despacho é que se lhe conta o tempo de serviço; para nada e contado o tempo necessario para obter os diplomas que lhe são exigidos; emquanto que a outros funccionarios do estado, como os officiaes do exercito e da armada real, é contado para todos os effeitos, como de serviço activo, o tempo dos seus cursos.

Pois, sr. presidente, é tão sincera e digna a abnegação da nobre e honrada classe dos professores, que dos do instrucção superior ainda não veiu um pedir augmento de ordenado; nem um só virá. E, todavia, esta classe, e a dos magistrados judiciao3 e do ministerio publico, são as que mais se têem distinguido no funccionalismo portuguez, pela consciencia e honradez com que prestam os seus serviços; e, coincidencia notavel, são tambem as de menos remuneração.

Acercado augmento de ordenado por diuturnidade do serviço, da jubilação e da aposentação, ha uma idéa falsa, que é necessario desvanecer.

Este augmento de ordenado, a jubilação e a aposentação correspondem á capitalisação, para assim dizer, de uma quantia que o estado deixa de dar aos professores, para lh'a restituirem depois por tal fórma. Em vez de se lhes dar o devido ordenado, dá-se-lhes menos no fim de vinte annos de bom e effectivo serviço; augmenta-se-lhes o terço do ordenado, se podem continuar no serviço com reconhecido proveito publico; ou concede-se-lhes a jubilação com todo o ordenado, no caso de incapacidade para o magisterio; o, finalmente, com mais dez annos de serviço igualmente bom e effectivo, havendo a incapacidade para a continuação do officio de ensinar, é-lhes concedida a jubilação com todo o ordenado, com o terço do mesmo, e com a vantagem do poderem exercer commissões gratificadas, compativeis com as suas forças..

Já se vê, pois, que é falsa a idéa de que pagar a jubilados é pagar a quem não trabalha; o mesmo é applicavel aos aposentados e reformados.

Os vencimentos das classes inactivas, sr. presidente, são a paga devida por bons serviços já feitos.

Não quer o illustre deputado que um professor jubilado ou aposentado seja empregado em commissões remuneradas? Por consequencia o illustre deputado não quer que um professor jubilado ou aposentado preste serviços ao paiz, ou quer que os presto de graça! Seria, portanto, esta a unica classe de funccionarios, a quem tal succedesse, se tal incompatibilidade fosse decretada.

Tambem s. ex.ª não quer o augmento de ordenado por diuturnidade de serviço; mas sim que os professores sejam jubilados logo que cheguem ao tempo de serviço necessario para este augmento. Pois haviam de saír agora da faculdade de direito homens tão distinctos como o sr. conselheiro dr. Henriques Secco? Pois a nossa universidade havia de perder o eminente jurisconsulto, o summamente distincto professor da faculdade de direito, o sr. dr. Joaquim José Paes da Silva?

Pois aquella honrada faculdade havia do ficar sem este

homem de sciencia, como ha pouquíssimos, e que vale muito mais do que muitos jurisconsultos que estão no vigor da vida?

E, sr. presidente, um collega nosso tão profunda e sinceramente estimado por ledos nós, o sr. conselheiro dr. José Dias Ferreira, havia de preparar-se já para saír da mesma faculdade por estar perto de vinte annos de serviço?

Sabe v. ex.ª de que tenho immensa pena?

É de que alguns professores jubilados com mais de trinta annos de serviço, não tenham o vigor physico indispensavel para a regencia assidua das suas cadeiras.

Como professor de mathematica sinto com intimo pezar que os srs. conselheiros srs. Sousa Pinto e Castro Freire não possam estar em serviço activo.

Eu preferia ser substituto mais vinte annos; preferia ver mais demorada a minha promoção a cathedratico, tendo por collegas na faculdade do que sou lente, tendo n'ella por meus mestres tão illustres sabios que por mais de trinta annos prestaram como professores os mais importantes serviços.

Francamente digo, sr. presidente, que poucos poderão prestar ao paiz os mesmos serviços, que s. ex.ªs prestaram, e ainda hoje prestariam se conservassem o vigor physico indispensavel, como felizmente ainda conservam o das suas altas faculdades e honradíssimas consciencias.

E ambos prestam ainda serviços de incontestavel valia.

O sr. conselheiro dr. Sousa Pinto está actualmente regendo ainda, com grande incommodo da sua saude, uma das cadeiras mais importantes da faculdade de mathematica, que não póde ser regida por pessoas estranhas á faculdade, a cadeira de astronomia pratica..

Creia, sr. presidente, que bem contente seria eu substituto por muito tempo, tendo por cathedratico este professor.

Pela falta de vigor physico n'este respeitabilissimo professor não queria eu passar de substituto a cathedratico.

Sr. presidente, se um professor é mau, tanto o póde ser no principio da sua vida como aos vinte annos de serviço; se foi bom até aos vinte anno3 de serviço, como felizmente são todos os que tenho a honra de conhecer, em regra, continua a ser bom.

Está por conseguinte demonstrada, tanto pela significação do augmento do ordenado por diuturnidade de serviço, da jubilação o aposentação, como pelos factos, a justiça d'estas vantagens que a nação deve dar aos professores.

Mas, não pense v. ex.ª o não pense a camara, que entendo que acerca de instrucção superior nada temos a fazer. Temos muito; o porque temos muito é que eu faço fervorosos votos para que continue na pasta do reino o sr. Rodrigues Sampaio.

Pôde s. ex.ª ser substituido por outro membro distincto do partido regenerador; mas desde já e com franqueza declaro que confio mais em s. ex.ª do que em muitos outros.

Se s. ex.ª não conseguir a reforma indispensavel da instrucção superior, como já conseguiu a da primaria, o era breve ha de conseguir a da secundaria, tarde a teremos, se a tivermos.

Sr. presidente, quem foi que n'este paiz e nos ultimos tempos mais se tem empenhado na reforma da instrucção superior?

Não se lembram todos do que fez em 1867 o sr. conselheiro dr. Mártens Ferrão? Esses serviços de s. ex.ª não ficaram perdidos, porque estão impressos muitos trabalhos de professores muito distinctos de todas as escolas do paiz, que foram ouvidos por s. ex.ª

E o sr. Conselheiro Rodrigues Sampaio não tem prestado serviços á instrucção superior?

Não é preciso ser doutor em direito, nem compulsar muitos livros, para se reconhecer que alguns, e valiosos, s. ex.ª tem prestado.

Tenho aqui um livro muito conhecido, um livro que anda nas mãos de todos os alumnos da universidade: é o annua,

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Rio da mesma universidade para o corrente anno lectivo, publicação ultimamente desenvolvida e enriquecida com excellentes esclarecimentos pelo meu bom e querido amigo o sr. commendador Manuel Joaquim Fernandes Thomás, dignissimo e honradissimo secretario da universidade.

_ Abro este livro, e aqui encontro, na faculdade de medicina a 7.ª cadeira, que é a de pathologia geral e historia geral da medicina, cadeira que está confiada ao meu excellente amigo dr. João Jacinto da Silva Correia, uma das mais robustas intelligencias que conheço, professor por todos respeitado e estimado como muito distincto.

Quem foi que creou esta cadeira na universidade do Coimbra? Quem creou tambem a mesma cadeira nas escolas médico-cirúrgicas de Lisboa e Porto? Foi, do certo, o poder legislativo; mas a iniciativa foi uma proposta do sr. ministro do reino.

_E, para honra de todos, devo dizer que esta proposta de lei foi votada sem discussão por todos os membros d'esta e da outra casa do parlamento na ultima legislatura.

Tambem não devemos A illustrada iniciativa do sr. conselheiro Rodrigues Sampaio a confirmação da creação da ladeira de lingua litteratura sãoskrita, vedica e classica, e a creação da do philologia comparada, ou sciencia de linguagem, no curso superior de letras? Todos sabem que ao sr. ministro do reino deve estes excellentes serviços a sciencia portugueza.

Mais ainda, sr. presidente. Pois não nos lembramos nós das grandes e aturadas difficuldades que tivemos para conseguir que fosse votada a proposta de lei, apresentada pelo sr. ministro do reino, para a organisaçao definitiva do real observatorio astronomico de Lisboa, que estava sendo reclamada pelas necessidades impreteriveis da sciencia, ha muitos annos?

Pois, sr. presidente, se não fosse convertida em lei esta proposta, os sabios estrangeiros teriam necessidade de vir aqui construir um observatorio para a astronomia estrellar.

Pois, sr. presidente, tal proposta era uma homenagem devida á memoria santa do Senhor D. Pedro V. Quem ignora que a veneração devida á memoria d'aquelle virtuoso monarcha reclamava a definitiva organisaçao d'este observatorio?

E cerca de quatro annos esteve aquella proposta de lei embaraçada e demorada; taes eram as difficuldades que n'esta questão, que não era nem podia ser de politica, encontrou o sr. Rodrigues Sampaio!

Mas a organisaçao proposta pôr s. ex.ª é lei do paiz, e está em vigor com grande proveito para a sciencia. E assim foi satisfeito o compromisso do paiz com a sciencia, compromisso em que estavam empenhados os brios nacionaes.

Quo faz o sr. ministro do reino quando tem de prover um logar de instrucção publica? Nomeia immediatamente o que mais convem para o bem do ensino; e na nomeação dos professores acceita sempre a proposta dos conselhos das faculdades e das escolas.

Que fez s. ex.ª quando teve de nomear o vice reitor da universidade de Coimbra, pelo fallecimento do virtuoso prelado, de saudosa memoria, o conselheiro sr. José Ernesto do Carvalho o Rego? Nomeou o sr. conselheiro dr. Castro Freire e a escolha d'este venerando professor estava tanto no coração dos professores, que, se o logar de vice-reitor da universidade fosse de eleição, creio firmemente que s. ex.ª havia de ser eleito por unanimidade de votos.

Ha dias, um illustre deputado, que não vejo presente, disse que o sr. ministro do reino, por economia, tinha obstado a que se realisasse a expedição scientifica a Macau, para a observação astronómica da passagem de venus sobre o disco do sol.

Posso assegurar á camara que o sr. ministro do reino empregou todos os esforços para que se realisasse esta expedição; occorreram difficuldades que a. ex.ª não podia evitar, nem remediar.

Sabem isto todos os que acompanharam esses acontecimentos com o interesse da sciencia.

Não pensem v. ex.ªs que para estas observações astronomicas serve qualquer homem de sciencia: no paiz ha muito poucas pessoas aptas para tão arduo serviço o d'essas nenhuma podia ser obrigada, em virtude das suas funcções, a ir na expedição scientifica que foi projectada.

Aproveitei esta occasião para explicar, tanto quanto pude, sem ser inconveniente, o facto de se ter mallogrado a expedição scientifica a Macau. V. ex.ª e a camara sabem que eu estava compromettido a dar estas explicações.

Estou bem certo, sr. presidente, dos vehementes o sinceros desejos do sr. ministro do reino para uma reforma efficaz da instrucção superior.

Ha dias disse eu n'esta casa, e repito hoje, que assim como s. ex.ª se empenhou em reformar a instrucção primaria, e actualmente se empenha em reformar a secundaria, tambem ha de empenhar-se da mesma maneira em reformar a superior.

A projectada reforma da instrucção secundaria todos nós sabemos que está adiantada.

Tenho boas rasões para acreditar que s. ex.ª ha de trazer brevemente a proposta de lei para tal reforma, que ha de ser convertida em lei na proxima sessão legislativa com as modificações que a discussão ha de lembrar e' mostrar que possam ser necessarias ou convenientes.

Não occulto que ha muito que fazer na instrucção superior; é o que entendo e já o tenho provado.

Na sessão legislativa de 1876 propuz que fosse eleita uma commissão parlamentar para estudar a reforma da instrucçâo superior.

Entendia eu que essa commissão devia ser composta de membros d'esta camara, onde havia, como tambem hoje ha, professores muito distinctos, para que o projecto da reforma da instrucçâo superior fosse já apresentado com auctoridade parlamentar. (Apoiados.)

Tambem por minha proposta foi escolhida para tão importante trabalho a commissâo de instrucçâo publica' d'esse tempo; e posso affirmar á camara que esta começou os seus trabalhos, irias não os concluiu; nem mesmo os adiantou, por motivos realmente attendiveis, e principalmente por entender que a reforma da instrucçâo superior dependia da reforma da instrucção secundaria.

Na mesma occasião pedi tambem a attenção do parlamento e do governo para a reforma que reputava, e ainda reputo, urgente, da organisaçao de tribunaes academicos na universidade; e nem do lado da maioria, nem do lado da opposição, prestaram attenção ás minhas considerações; digo isto sem animo' de queixar-me.

Dois annos depois é que alguns srs. deputados se queixaram de um certo accordão do conselho dos decanos da universidade; isto é, queixaram-se de uma lei; para a qual ou já tinha pedido remedio n'esta casa.

Ainda n'essa mesma occasião apresentei um projecto do lei para a abolição do escrutinio secreto em todas as votações de exames, actos e concursos, desde o exame de instrucçâo primaria até á admissão ao magisterio de instrucçâo superior.

Devo dizer á camara que considero absolutamente indispensavel a conversão d'este projecto em lei, não"tanto para que seja feita justiça em tão importantes actos, porque estou convencido do que hoje é feita com inteira rectidão, nem os examinadores carecem de similhante estimulo para julgarem com acerto, o conforme as suas esclarecidas e rectas consciencias; mas para que os professores possam ir para os actos e exames bem socegados e tranquillos, sem serem incommodados por grande numero de pedidos de protecção para os alumnos que hão do ser julgados.

Sendo abolido o escrutinio secreto nos exames e actos, isto é, com a votação nominal e publica, mais seguras ga-

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rantias têem os alumnos para os direitos de seus talentos e saber; mais digno e efficaz e o prestigio dos professores; mais respeitavel, emfim, é a responsabilidade de cada examinador.

Quero ainda mais alguma cousa do que a abolição do escrutinio secreto; quero tambem que sejam publicadas por notas de valores officiaes, como se pratica actualmente com as informações finaes de bacharel formado, licenciado e doutor na nossa universidade, as classificações que cada professor der ás lições do cada alumno.

Muito facil e simples e a execução d'esta idéa; basta no fim de cada mez mandar affixar nos logares proprios para os editaes uma lista com 03 nomes dos estudantes dos differentes cursos com as notas das respectivas classificações de suas lições.

Isto é de manifesta vantagem; tanto para o estudante, porque sabe com o que póde contar; é prevenido de que precisa preparar-se melhor quando as notas lhe sejam desfavoraveis, o póde, emfim, animar-se quando sejam boas; como tambem para o professor, que assim terá uma resposta seria e digna, a responsabilidade das suas informações e notas officiaes, para apresentar aos que forem importunal-o com pedidos. (Apoiados.)

Lembrarei ainda um projecto de lei que já n'esta sessão legislativa foi apresentado n'esta casa, e considero muito importante.

É seu auctor o meu excellente amigo, mais que muito distincto e illustre collega, o sr. dr. Gomes Teixeira.

Folgo por não ver presente s. ex.ª n'esta occasião; é tambem a primeira vez que estimo a sua ausencia.

Bom é que este nosso collega não esteja a ouvir-me, porque assim posso, sem molestar a elevada e natural modestia de s. ex.ª, declarar que tão eminente professor de mathematica é um verdadeiro genio, que honra e engrandece o seu paiz e a sciencia, muito justamente estimado pelos sabios do todos os paizes, e, tanto mais, quanto mais altamente collocados na sciencia estão. (Apoiados.)

É com intima satisfação que, entre os applausos da camara, que assim muito se honra, como já em outra occasião se honrou, presto esta homenagem aos extraordinarios dotes e merecimentos do sr. dr. Gomes Teixeira. (Apoiados.)

Esse projecto, que tambem tive a honra de assignar, propõe que na faculdade do mathematica seja ensinada a geometria superior; e muito é para lamentar que não se tenha já realisado este urgentissimo melhoramento.

Notem v. ex.ª e a camara que tal projecto não augmenta a despeza, nem significa vantagem pessoal para alguem; é simplesmente uma alteração no programma da 4.ª cadeira da faculdade de mathematica.

A illustre commissão de instrucçâo publica deu sobre este projecto um parecer, que não discuto agora, declarando apenas que me parece conveniente, pelo menos, se bem que é susceptivel do alguns reparos; e aproveito esta occasião para pedir a v. ex.ª que o dê opportunamente para ordem do dia, pois é de vantagem que a camara se pronuncie sobre assumpto tão importante o urgente.

Já vêem, portanto, v. ex.ª e a camara, que temos muito que fazer nos negocios de instrucçâo superior; e n'este ponto estou plenamente de accordo com o illustre deputado a cujas considerações me tenho referido. Devem tambem j reconhecer que n'estes negocios me tenho empenhado com dedicação.

Mas não se podia nunca exigir uma reforma completa na instrucçâo publica, abrangendo a primaria, a secundaria e a superior, n'um praso curto. (Apoiados.)

O nobre ministro do reino empenhou-se na reforma da instrucçâo primaria, e conseguiu-a. Se a nova lei não está ainda em execução, é sómente pela falta dos regulamentos; o todos sabem, sr. presidente, que regulamentos de tamanha importancia não podem ser feitos em pouco tempo. (Apoiados.) Venham embora tarde, mas venham completos, sensatos e excellentes.

Emquanto á reforma da instrucçâo secundaria, ha de conseguir realisal-a com o mesmo proveito para a nação; o depois, estou certo de que ha do occupar se séria e efficazmente da instrucçâo superior.

Dêem-mo v. ex.ª, sr. presidente, e a camara, licença para ainda voltar á questão, que já tratei, do augmento de ordenado por diuturnidade de serviço.

Este augmento, mais conhecido pelo nome de terço, tinha sido supprimido por uma lei da responsabilidade do sr. bispo de Vizeu, e foi restabelecido por uma carta do lei, que o tornou extensivo aos magistrados judiciaes, e do ministerio publico, que antes d'esta lei não tinham similhante vantagem.

Estamos aqui muitos deputados que a votámos. Votou-a v. ex.ª, sr. presidente, e votai-a tambem.

Estou convencido de que prestámos assim um bom serviço ao paiz, fazendo um lei justa, cuja iniciativa me parece, não me atrevo a affirmal-o, nem valo a pena ir verificar nos registos parlamentares, ter sido do nosso distincto collega, o sr. Mariano de Carvalho: pelo menos s. ex.ª concorreu poderosamente para ella.

Em honra d'este illustrado deputado e distincto professor, devo declarar que s. ex.ª era prejudicado pessoalmente por similhante lei; porque, restabelecidos os terços, os professores, com vinte annos de serviço, continuariam a reger as suas cadeiras, mesmo com sacrificio de saude, e só mais tarde, quando estivessem inteiramente impossibilitados e com mais dez annos de serviço, se jubilariam, sendo assim demorada a promoção do s. ex.ª a cathegoria do cathedratico.

E, já que alguns srs. deputados tanto fallam de si mesmos, com satisfação o até com louvor, o que applaudo por s. ex.ªs, hão de permittir-me que eu diga que tambem fui prejudicado com similhante disposição, porque, sendo um um dos professores mais modernos da minha faculdade, pela mesma rasão que já apontei a respeito do sr. Mariano do Carvalho, mais tarde serei assim promovido a lente cathedratico.

Mas a lei era justa, e votei a.

Foi por economia que o sr. bispo de Vizeu supprimiu os terços. Vejam v. ex.ªs que economia!

Lembro-mo de outra tambem importante, que o mesmo illustre estadista realisou na instrucçâo superior; foi a suppressão dos premios pecuniarios.

Querem saber a importancia de tal economia?

Leiam a ultima verba da secção 1.ª do artigo 22.°, d'este capitulo. É de 6:100$000 réis para a continuação das obras nos estabelecimentos da universidade — partidos e premios aos estudantes das faculdades e aos de pharmacia o todas as mais despezas.

Na escola polytechnica de Lisboa é de 1:170$000 réis a quantia destinada para premios a alumnos; na academia polytechnica do Porto é de 1:7300$00 réis, quantia que tambem é para despezas do expediente, compra de livros para a bibliotheca, conservação e aperfeiçoamento do jardim botanico, dos gabinetes de physica e de historia natural e do laboratório chimico; na escola medico-cirurgica da Lisboa é de 3:000$000 réis, que tambem é para compra de instrumentos, drogas, vidros e mais utensilios; e isto basta, sr. presidente.

Veja v. ex.ª que grande economia não produziu a suppressão dos premios!

E v. ex.ª sabe que taes premios são de valor insignificante, e que, embora para muitos sejam indifferentes, para uma grande parto são de alta conveniencia e de proveitoso e honrado estimulo.

Disso tambem o illustre deputado que era necessario que das escolas superiores saíssem com diplomas só os talentos privilegiados, só homens capazes de grandes serviços, emfim de extraordinarios merecimentos.

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S. ex.ª, como professor, ha rio contentar-se com bons estudantes e ha de approval-os; d'isto estou bera certo; aos muito distinctos ha de conferir as elevadas honras academicas.

Mas o que tem o governo com isto? Pois o governo póde ter inspecção sobre os professores no modo por que julgam os alumnos que se apresentam a exame ou acto? Isto deponde unicamente dos professores; e tenho a satisfação de declarar que, salvos casos excepcionaes, que são fataes e independentes da vontade do cada qual, que se hão do dar sempre por ser da condição humana o erro, o nosso professorado é justo. (Apoiados.)

Sabe v. ex.ª quem não é justo e quer protecção menos conveniente e menos licita para os alumnos? São os paes e protectores dos mesmos alumnos; são os homens influentes dos partidos; são muitos, emfim, que não deixam socegar o professor que tem de assistir a um exame.

E muitas vezes áquelles que solicitam e mendigam esses favores dos professores, são áquelles que os accusam pelos mesmos, favores, não porque lhes tenham sido feitos, mas por lhes parecer que a elles foram devidos os bons resultados dos exames e actos.

Eu queria que o illustre deputado me dissesse que grande influencia politica tinha, ou quem o protegia, para s. ex.', com applauso do todos os seus condiscípulos e com a plena approvação das consciencias de todos os que tinham a fortuna de conhecel-o e apreciar-lhe os talentos e conhecimentos, ser classificado como o mais distincto do seu curso? Estava só com o seu talento e com o seu estudo aturadissimo; e s. ex.ª encontrou sempre da parte de seus mestres, não protecção, que não carecia d'ella, mas justiça. (Apoiados.)

Quem protegeu o sr. conselheiro1 dr. José Dias Ferreira para ser collocado sempre, em cada anno do seu curso, entre os distinctos como o mais distincto? Ninguem; só o protegiam o seu profundo e brilhante talento, o seu merecimento superior, o seu caracter honestíssimo, o seu trabalho honrado e o estudo levantado de um sabio na mocidade.

Diz o sr. dr. Laranjo, e diz muito bem, que quando está na sua cadeira, sente a satisfação de poder dizer que a ninguem deve a sua posição. N'isso é s. ex.ª justo para seus mestres.

Nenhum dos seus collegas da universidade é capaz de dar distincções elevadas, como as que s. ex.ª teve, sem que sejam bem merecidas.

Ha quem erre; todos temos errado. Se o sr. dr. Laranjo não errou ainda, é porque está ainda novo, e é professor ha poucos mezes; mas tenha paciencia, que tambem ha de errar; bem novo sou no magisterio e já errei. Já tive o desgosto profundo de votar um r a um discipulo, cujas lições não eram garantia segura para a approvação, e cujo acto foi infeliz; votei assim convencido de que praticava um acto de justiça, e depois reconheci que me tinha enganado, e duas vezes tive a satisfação de votar lhe honras de accessit sem importar-me nada, absolutamente nada, com o meu, voto anterior.

(Aparte.)

Sim; talvez tivesse acertado em todas estas votações; e creio que foi o que se deu effectivamente O r foi estimulo.

A verdade é que isto succede com as mais justas intenções. Succede a todos; o esteja certo o illustre deputado1 de que ha de succeder a elle mesmo com a melhor vontade do acertar.

Por isso, sr. presidente, foi profunda a magna que senti quando vi um dos meus mais illustres collegas no professorado dirigir accusações, ou pelo menos fazer considerações que pareciam accusações, contra os professores, suppondo-os menos solicitos ou menos escrupulosos na escolha d'aquelles a quem dão diplomas.

O sr. Laranjo: — Eu não fiz taes accusações; não era minha intenção fazel-as, nem das minhas palavras se podia deprehender tal,

O Orador: — Peço perdão ao illustre deputado, mas é isto que se. deprehende exactamente das suas palavras.

O que é indispensavel, e com esta observação termino as minhas considerações n'este ponto, é que nós os professores nos convençamos de que, para o bom serviço do ensino, o sobretudo para o exemplo que devemos dar sempre aos nossos discipulos, é muito conveniente, se não até necessaria, harmonia de familia, até mais de fraternal entro todos os professores, especialmente entre os lentes da mes ma faculdade ou escola.

Por isso tambem me custou que s. cx.1 fallasse aqui em rivalidades de escolas ou de professores.

Francamente, eu não conheço taes rivalidades; declaro que nem as tenho, nem sei quem as tenha.

Já tive occasião do prestar serviço em exames de instrucção secundaria com professores que não eram da universidade, o declaro a v. ex.ª que n'elles encontrei professores muito distinctos e excellentes collegas.

No pouco tempo que com elles servi, e logo voltarei a este ponto, consegui a amisade de s. ex.ª, amizade á qual tenho a satisfação de corresponder com profundo reconhecimento.

O sr. dr. Laranjo fallou ainda n'uma viagem, por s. ex.ª imaginada, de um decano d'aqui para Coimbra.

Porque não disse s. ex.ª o nome d'esse decano?

Era esta uma d'aquellas allusões pessoaes a que hontem me referi, tendo o desgosto do provocar as iras de alguns deputados, dos quaes effectivamente sou amigo, e a um dos quaes devo finezas que nunca poderei esquecer.

Não tenho mesmo duvida em declarar o nome d'este ultimo, a quem encontrei como amigo ao meu lado quando a morte me arrebatou dos braços um irmão estremecido; é o illustre deputado o sr. Emygdio Navarro.

Quer o illustre deputado apreciar as commissões desempenhadas pelo sr. conselheiro dr. Diogo Pereira Forjaz de Sampaio Pimentel?...

Creio que era a este cavalheiro que s. ex.ª se referia.

Tambem o sr. dr. Laranjo censurou a reintegração d'este professor no quadro effectivo da faculdade do direito na universidade.

V. ex.ª, e os illustres deputados que estiveram aqui nas duas ultimas legislaturas, sr. presidente, sabem que me empenhei tanto quanto cabia nas minhas forças contra o projecto que auctorisava o governo a fazer este despacho.

Declarei então a muitos collegas que, se aquelle, projecto viesse fundado sómente nos serviços que este illustrado professor tinha prestado e podia ainda prestar ao paiz, eu não teria duvida em approval-o.

Não duvidaria eu, nem duvido ainda, votar auctorisação ao governo para nomear professor para a universidade ou para qualquer outra escola um homem que, sem estar habilitado com os diplomas scientificos exigidos pela lei, tenha dado provas publicas de saber profundo em qual quer ramo dos conhecimentos humanos; pela mesma rasão votar a, portanto, o projecto a que me refiro, mas só cem esta significação.

Não votei n reintegração do sr. conselheiro dr. Diogo Pereira Forjaz do Sampaio Pimentel, na faculdade de direito, porque eu não pedia acceitar a rasão, que era allegada, de economia, que era felizmente provavel não haver; nem a pretendida analogia entre o caso de que. se tratava e. o que havia succedido com o finado, de saudosa memoria, professor o parlamentar de merecimentos distinctos, Fradesso da Silveira..

O projecto só foi approvado em 1876; mas, desde que o projecto foi convertido em lei, o que havia de fazer o governo?

Pois não é muito mais conforme com o espirito constitucional acceitar o governo os decretos das côrtes geraes da nação, sobretudo os que tiverem sido approvados sem discussão, como foi este, do que negar-lhes ou influir para que lhes seja negada a sancção regia?

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E o governo podia usar ou não d'essa auctorisação? Pois não é perceptiva tuna auctorisação d'esta natureza? Pois não são elementares estes principios?

Houve, porém, uma coincidencia notavel, por ter sido o de lente de prima, decano e director de faculdade o primeiro logar que vagou, pela jubilação do nosso venerando collega, o sr. conselheiro dr. Bernardo de Serpa, que infelizmente por motivo de doença está ausente; e, referindo se a esta coincidencia, alludiu o sr. dr. Laranjo ás relações de parentesco entro este sabio professor e o sr. conselheiro dr. Diogo Pereira Forjaz de Sampaio Pimentel.

Demos graças a Deus, porque foi de jubilação e não de morte o motivo da vacatura, que deu ao governo a occasião de usar da auctorisação a que me tenho referido; foi a jubilação do sr. conselheiro dr. Bernardo de Serpa; e notem v. ex.ª, sr. presidente, e a camara, que s. ex.ª, quando se jubilou, tinha mais de trinta annos de serviço.

«Aqui está uma letra de nova especie, indossada por um parente a outro», dizia hontem o sr. Laranjo!

O sr. Bernardo de Serpa foi jubilado com mais de trinta annos de serviço, não porque lhe faltasse o vigor intellectual, porque ainda hoje o tem, mas porque estava impossibilitado de continuar a reger a sua cadeira por motivo de doença.

N'esla3 cireumstancias o que havia de fazer o governo?

Usou da auctorisação que o parlamento lho tinha concedido, e nomeou o sr. Diogo Forjaz.

Era o que devia fazer, embora assim fossem prejudicados os meus excellentes amigos e distincto collegas, o sr. conselheiro dr. Henriques Secco, na sua promoção a lente de prima, decano e director de faculdade, e o sr. dr. Chaves e Castro, na sua promoção a cathedratico; embora assim fosse prejudicado tambem qualquer candidato no seu ingresso para a faculdade.

«Mas o decano reintegrado não tem apparecido na universidade», diz o illustre deputado.

Naturalmente não tem ido Já, porque tem sido encarregado de diversas commissões de grande importancia, para as quaes s. ex.ª tem reconhecida competencia. O illustre deputado sabe perfeitamente que um dos professores que tem prestado mais importantes serviços ao seu paiz é o sr. Dias Ferreira, a quem ninguem póde negar o reconhecimento que o" paiz deve a s. ex.ª pelo muito com que o tem servido e honrado.

O sr. Dias Ferreira apresentou-se ha annos a reger na faculdade de direito a cadeira, creio que de organisação judicial, theoria das acções, e processo civil ordinario, emfim uma cadeira de processo.

Começaram as prelecções de s. ex.ª; foram logo publicadas; e todos sabem que essas prelecções não eram procura das e lidas unicamente pelos discipulos de s. ex.ª e por todos os alumnos da faculdade de direito; eram tambem procuradas com grandissimo interesse por muitos professores da mesma faculdade, por magistrados judiciaes e do ministerio publico, por advogados distinctos, emfim pelos homens mais competentes em direito, que a tão sabias prelecções reconheciam merecimento extraordinario.

Pois este serviço não vale os que outros prestam em muitos mezes, embora tambem com distincção?

E o serviço que s. ex.ª prestou por devoção e não por obrigação com o Commentario do codigo civil, quanto vale? E poderia s. ex.ª, mesmo com os seus extraordinarios dotes e merecimentos, com a sua tenaz e dedicada vontade, prestal-o, se tivesse regendo cadeira assiduamente?

E o sr. conselheiro Mendonça Cortez? Não conhecemos os excellentes serviços que com Improbo trabalho está prestando na capital?

Podia citar muitos mais outros.

"Já vê v. ex.ª que não ha motivo para censurar os professores que têem estado ausentes da universidade em serviço de commissões importantes.

Uns têem prestado grandes serviços -há universidade, e

quasi sempre se têem conservado ali; outros, se menos tempo têem estado ao serviço da universidade, têem trabalhado com reconhecido proveito publico em commissões, na3 quaes não poderiam ser facil e convenientemente substituidos.

Sr. presidente, de mim só direi que tenho servido na universidade, sempre que me tem sido possivel, apesar de ter sido membro de uma commissão parlamentar.

Emquanto ao illustre deputado, só lamentarei que s. ex.ª recuso a coadjuvação das suas poderosas faculdades para qualquer commissão de serviço que seja da especial competencia do s. ex.ª; é com franqueza que o declaro.

Passo agora á instrucção secundaria. Principiarei pelo caso extraordinario, a que o illustre deputado se referiu e que hontem rapidamente expliquei; é a dispensa do exame de desenho para a primeira matricula nas faculdades de theologia e direito.

Quantos theologos consummados, quantos illustres jurisconsultos vemos nós que não possuem a bella prenda do desenho! Creio que bem poucos theologos e jurisconsultos estarão mais adiantados do que ou, a quem a natureza negou plenamente aptidão para esta arte, o que tive serias difficuldades para obter approvação nos exames de desenho exigidos por lei para a formatura na faculdade de philosophia.

Entendo que o ensino de desenho devo fazer parte da educação liberal; comprehendo que seja exigida a habilitação n'esta disciplina para certos empregos publicos; mas realmente não é indispensavel para o estudo do dogma, da moral ou da liturgia; nem para o de direito natural, publico, civil ou commercial; nem para o de astronomia o mechanica; nem para o de chimica e physica; nem para o de pathologia e clinica; nem, finalmente, para muitas sciencias que são professadas nos estabelecimentos de instrucção superior.

Uma VOZ: — Para os padres?

O Orador: — Para os padres póde ser inconveniente. Ha conhecimentos de que elles carecem muito mais. (Interrupção.)

Este decreto, porém, está perfeitamente conforme com a lei; já hontem o demonstrei, e repito hoje. (Leu.)

Quer s. ex.ª censurar o governo por não ter feito isto ha mais tempo? Se o não fez, foi som duvida por causa dos muitos e importantes negocios que o occupam. A attenção do governo não póde abranger immediatamente todas as necessidades especiaes, e provavelmente esta justissima providencia só tarde lhe foi lembrada pelas pessoas competentes. Mas o que fez o governo? Não satisfeito com as rasões que vem expostas n'este decreto, e são boas, indiscutíveis; nem com as representações, de certo bom desenvolvidas, que lhe foram dirigidas, ouviu ajunta consultiva de instrucção publica, e seguiu o parecer d'ella.

E o illustre deputado, que, se bem me lembro, n'outra questão accusou o governo do não ter seguido em todas a? suas indicações o parecer de uma junta consultiva, agora nem quer saber se foi ouvida ajunta consultiva da instrucção publica!

A responsabilidade scientifica d'este decreto, accusado de favor, é da junta consultiva de instrucção publica, corporação muito respeitavel, que certamente a acceita inteira.

Disse porém s. ex.ª, que este decreto não fóra determinado por conveniencia publica; mas simplesmente porque a um filho de um influente em politica, cujo nome s. ex.1 houve por bem calar, faltava o exame de desenho para a primeira matricula nas faculdades de theologia e direito.

Referiu-se na mesma occasião áo decreto, de prorogação do praso para esta matricula.

Claro é, sr. presidente, que para o decreto de 22 da outubro de 1878 poder aproveitar a alguem no corrente anno

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lectivo era indispensavel a prorogação do praso para a matricula, praso que acabava no dia 15 de outubro.

O decreto permittindo a matricula depois de ter findado a geral e ordinaria, era consequencia logica o necessaria do decreto que havia dispensado o exame de desenho.

Mas, pelas informações de s. ex.ª, esta prorogação do praso foi tambem mercê especial de favoritismo para um filho de um homem importante em politica.

Francamente, não sei a quem s. ex.ª se refere; vejamos se é possivel averigual-o.

Tenho aqui as relações nominaes dos estudantes nos primeiros annos de theologia e direito; ora é certo que o tal protegido do governo, por decreto de favoritismo, ha do ser um dos ultimos na matricula; não póde deixar de ser.

O ultimo estudante matriculado no primeiro anno de direito, chama-se Antonio José Pires Dias de Freitas; é filho do sr. José Joaquim Pires de Freitas, e natural de Santa Marinha de Covide, do districto de Braga.

E possivel, e quero acreditar, que o pae d'este alumno," a quem não tenho a honra de conhecer, seja de grande influencia no seu concelho e mesmo no seu districto; mas em todo o caso creio que nenhum dos illustres deputados conhece a influencia politica d'este cavalheiro em todo o paiz.

Será então o pae do penúltimo? Será o sr. Francisco Eusebio da Costa Santos?

Tenha o illustre deputado a bondade do ler a relação dos alumnos do primeiro anno de direito, e ahi verá que o penúltimo, n.º 109 de matricula, é o sr. Antonio da Costa Santos, filho do sr. Francisco Eusebio da Costa Santos, natural de Leiria.

Penso que este cavalheiro não é conhecido por grande influencia na politica do paiz.

Observa-se isto mesmo na relação dos estudantes do primeiro anno de theologia.

O ultimo d'estes é o sr. Victor Machado de Serpa, filho do sr. José Antonio de Serpa, do districto da Horta; e o penúltimo é o sr. Antonio Cesar de Azevedo Araujo Cardoso, filho do sr. Thomás de Azevedo Araujo Cardoso, natural de Arcos de Val de Vez, do districto a que tenho a honra de pertencer.

Aqui tem v. ex.ª as relações nominaes, pela ordem da matricula, dos alumnos dos primeiros annos de theologia e de direito.

Não é possivel com os elementos que aqui temos, conhecer quaes foram os que aproveitavam com os decretos que s. ex.ª condemnou; mas a verdade é que os estudantes anteriores a estes não podiam aproveitar-se d'elles, sem estes tambem se aproveitarem.

Se fóra d'esta casa ha quem saiba, diga e repita o nome do protegido por especial favoritismo do governo, aqui ninguem póde alludir a esse nome. O que havia de responder o illustre deputado a quem lh'o perguntasse? Como havia de s. ex.ª apresentar provas do que asseverou, se lhe fossem pedidas?

Havia s. ex.ª de responder com um «diz se»? Com um «todos o sabem?»

O que seria de nós, o que seria do parlamento, se viessemos repetir o que lá fóra se diz?

Já ouvi, e quero crer que com flagrante injustiça, accusar uma faculdade inteira de fazer politica n'um concurso. Recordo-me de que em muitas partes se dizia até que a votação d'esse concurso tinha sido determinada em uma reunião de um partido da opposição. Dizia-se isto lá fóra, o: nunca ninguem aqui repetiu similhante accusação; nem é intento meu, repetil-a n'esta occasião, nem quero acreditar os boatos que correram então.

Referiu-se o illustre deputado aos professores provisorios; dos lyceus nacionaes, com desfavor; não posso dispensar-me de defendel-os.

Dos 1 7J professores dos lyceus nacionaes só G9 são provisorios, o estes têem sido escolhidos com escrupulosos cuidados entre pessoas aptas e em habilitações scientificas.

Aqui no lyceu do Lisboa temos professores provisorios de merito distincto; n'esta occasião lembro-me dos meus sympathicos o respeitaveis amig03 os srs. licenciado Manuel de Arriaga e Pedro Eusebio Leite.

No lyceu do Coimbra actualmente esta regendo a cadeira do philosophia o meu antigo e excellente amigo, dr. José Braz de Mendonça Furtado, que é um verdadeiro homem do sciencia e dos mais distinctos collegas do sr. dr. Laranjo na faculdade de direito; está regendo a do hebraico o sr. dr. Manuel do Jesus Lino, que é um ornamento da faculdade de theologia; o tem regido a de allemão, em impedimentos e ausencias do respectivo professor, o meu honradissimo collega o sr. dr. José Joaquim Pereira Falcão, sempre meu mestre e uma das mais queridas glorias da minha faculdade.

Muitos outros poderia eu citar como distinctos; medíocres ou maus, com franqueza, não conheço.

Acrescentou o sr. dr. Laranjo que «a instrucçâo secundaria em Portugal está perdida, porque, embora seja convenientemente reformada, hão de ficar nos lyceus nacionaes os actuaes professores provisórios».

Tambem penso e espero que elles hâo de ficar quasi todos, senão todos, porque hão de satisfazer com distineçâo ás provas dos concursos que têem de fazer.

Por decreto de 31 de dezembro de 1868, da especial responsabilidade do sr. bispo de Vizeu, então ministro do reino, e no uso da auctorisaçâo concedida ao governo pela carta de lei de 9 de setembro do mesmo anno, auctorisaçâo que era para reformar todos os serviços publicos, foi reformada a instrucçâo publica, nas suas tres provincias; mas este decreto foi suspenso pela carta de lei de 2 de setembro de 1869.

Esta carta de lei, no § 2.° do artigo 1.°, dispunha que, emquanto não se levasse a effeito a reforma geral de instrucçâo publica, não se faria nomeação alguma de substitutos extraordinarios para a universidade, de professores para a escola medico-cirurgica do Funchal e de professores de instrucçâo secundaria, tanto nos lyceus como fóra d'elles.

Enorme foi este erro, que, hontem o sr. dr. Laranjo pretendeu justificar de modo bem singular. Lembram-se v. ex.ªs do que s. ex.ª disse?

«Como a reforma do sr. bispo de Vizeu supprimia logares, disse s. ex.ª, havia manifesta vantagem em para elles não nomear professores, para se ver se da falta dos mesmos logares provinha ou não mal para o serviço, e depois se apreciar devidamente a reforma que se devia fazer».

Ai, sr. presidente, o que seria de um pobre doente, se o sr. Laranjo fosse medico, e alguem se lembrasse de dizer que a doença era incurável?

Ficaria abandonado, entregue só á natureza, esperando-se que morresse para se verificar que a doença era effectivamente incurável.

Pois o que é evidente, sr. presidente, é que não havia necessidade de ter os logares vagos para se apreciar o mal que d'ahi provinha; havia o serviço já feito o de muitos annos a mostrar a necessidade do provimento d'estes logares.

Eram de grandissima vantagem os substitutos extraordinarios da universidade.

Quantas vezes é necessario que os professores cathedraticos ou substitutos, com pesado trabalho e insignificante retribuição, accumulem cadeiras!

Tem sido tambem necessario que professores jubilados se prestem a reger cadeiras, no impedimento ou na ausencia dos respectivos cathedraticos e substitutos, como actualmente succede com a aula de astronomia pratica na universidade.

Sr. presidente, o professorado precisa de aprendizagem,

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porque é um officio, uma profissão; como professor honro-me de considerai o assim; e esta era outra vantagem da conservação dos substitutos extraordinarios.

Entre a investidura no grau de doutor e o concurso para a admissão ao professorado havia um intervallo menor que hoje; e esta era uma excellente vantagem para os candidatos ao magisterio, sem grande sacrificio do thesouro publico, porque é preciso que a assembléa saiba que o ordenado annual de um substituto extraordinario era de réis 300,5000.

Emfim, sr. presidente, sendo necessario, como era, votação favoravel do conselho da faculdade para a promoção do substituto extraordinario a ordinario, o serviço de substituto extraordinario era um demorado, rigoroso e seguro concurso com muitas e variadas provas do capacidade de cada um para o ensino, para os argumentos, e emfim para julgar

Para a instrucçâo secundaria o inconveniente foi muito maior, porque v. ex.ª sabe que para o provimento das cadeiras dos lyceus nacionaes havia concurso especial para cada uma, e, portanto, não é facil a um professor accumular outra cadeira com a sua. O inconveniente foi tão gravo que ainda não houve um ministro do reino que deixasse de nomear sem demora professores provisorios para as cadeiras que têem vagado.

Acerca da escola medico-cirurgica do Funchal, devo dizer á camara que não a conheço bem; mas entendo que convem uma escola onde se possa habilitar convenientemente quem queira exercer a clinica, sem que lhe seja necessario um curso longo, como é o de medicina.

Quando n'esta camara se discute um projecto de lei que abrange a creação de qualquer logar, dizem logo todos, que o fim principal da lei proposta é servir algum afilhado; quando se falla na nomeação de qualquer commissão, repete-se logo a mesma accusação; mas ácerca das commissões dos exames finaes de instrucçâo secundaria, ainda ninguem se lembrou de similhante accusação.

O sr. Laranjo: — Mas digo eu.

O Orador: — Lamento que o diga; é s. ex.ª o primeiro a formular essa accusação.

Para estas commissões o sr. ministro do reino tem escolhido sempre os professores mais distinctos e mais serios que a tão pesado trabalho se prestam. Basta examinar as relações dos que têem sido nomeados, para se reconhecer que assim é.

Não estranhe v. ex.ª, nem estranhe a, camara que eu principie por áquelles com quem servi.

Tive por collegas no serviço dos exames finaes de mathematica elementar na primeira circumscripção, os srs. Adriano Augusto de Pina Vidal e Carlos Moraes de Almeida, distinctissimos lentes da escola polytechnica de Lisboa; o sr. Pedro Eusebio Leite, professor muito distincto do lyceu d'esta cidade; e o sr. Joaquim Duarte Moreira e Sousa, professor igualmente distincto do lyceu do Porto.

Encontrei em todos elles o mais dedicado e escrupuloso empenho em acertar, inexcedivel zêlo no serviço e constante rectidão no julgamento.

Dias houve em que nos demorámos sete horas para examinarmos seis alumnos; e mais de uma vez chegámos ao fim de uma hora de argumento sem podermos formar juizo seguro, sem estarmos habilitados a julgar; continuava-mos com paciencia e cuidado, com attenção e clareza na exploração.

Nenhum se queixava; só eu, commigo mesmo protestava nunca mais fazer serviço similhante, a que aliás não sou obrigado como lente da universidade.

Procederam todos dando provas de que, alem de professores distinctos, eram juizes de summa probidade, examinadores zelosos, e finalmente inexcediveis no desempenho do serviço.

Posso dizer isto, porque antes de o dizer aqui, affirmei-o categoricamente, como era de justiça, no relatorio que tive

a honra do apresentar ao muito honrado e conspicuo presidente geral da commissão, o sr. conselheiro Silvestre Ribeiro, a (piem o paiz deve a mais profunda veneração e o mais dedicado reconhecimento.

Pelo conhecimento proprio que tenho da maior parte dos outros examinadores, entendo que todos elles se recommendavam por muitos e muitos titulos para tão importante commissão.

. Posso felizmente affirmar, que não se tem attendido ás condições politicas dos professores escolhidos para estas commissões.

Quando ultimamente, em 1877, foi presidente do conselho de ministros, e ministro do reino, o sr. marquez, hoje duque, de Avila, houve uma excepção a esta pratica, excepção que francamente deplorei, e muito.

Um professor que desde o primeiro anno d'estas commissões foi nomeado sempre presidente de uma das mesas dos exames finaes, só não foi nomeado no tempo do sr. duque d'Avila.

Direi o nome d'este professor; já me referi a elle com a mais grata veneração, a que elle tem direito incontestavel e por todos reconhecido. É o meu respeitavel mestre, dr. Pereira Falcão.

O sr. duque d'Avila, ou se esqueceu, ou teve duvidas de nomeal-o em julho de 1877; mas logo depois, em outubro, reparou o esquecimento e emendou a falta.

Se houve, pois, esta excepção, o sr. duque d'Avila reparou-a espontaneamente e com nobre dedicação pelo bem do serviço.

Têem sido sempre nomeados professores de todos os partidos politicos, sem que a influencia d'estes tenha prejudicado o serviço.

Não vimos nós no Porto fazer serviço nos exames um professor, do qual não tenho conhecimento pessoal/ mas que me dizem ser um excellente e honrado mestre, e que era, nas eleições que estavam proximas, o candidato que em Bragança se oppunha ao sr. ministro das obras publicas? (Apoiados.)

Foi um facto que me causou estranheza, tanto nomeai e o sr. ministro do reino, como elle acceitar.

Declaro a v. ex.ª que por caso algum me prestava ao serviço dos exames na circumscripção, á qual pertencessem terras onde eu quizesse ou podesse influir nas luctas politicas.

Por mim mesmo quiz averiguar o que era o serviço á exames de instrucçâo secundaria no systema das commissões; quiz assim habilitar-me a concorrer efficazmente, n'esta parte, para a reforma da instrucçâo secundaria.

Por isso, sr. presidente, acceitei, e até solicitei a commissão com que fui honrado no ultimo anno lectivo; mas logo declarei que para o Porto não iria, e, por tal motivo, vim para Lisboa.

Estas observações não significam animo de suspeita contra o professor a quem me refiro; pelo contrario, estou convencido, porque todos m'o dizem, de que é um professor distincto e honrado.

E na verdade, mesmo na occasião em que, por causa da eleição de Bragança, eram publicadas nos jornaes, contra s. ex.ª, accusações de que tive conhecimento, umas, porque as li nos mesmos jornaes, e outras, porque me foram referidas, accusações que, evidentemente, eram apaixonadas e injustas, não houve uma só accusação feita ao serviço de examinador.

Está perto de mim, obsequiando-me com a sua attenção, o nosso illustre collega, e meu amigo, Carvalho e Mello, que foi governador civil do districto de Bragança, e s. ex.ª, que conhece aquelle cavalheiro, acaba de dar-me testemunho de que este professor é dignissimo; com satisfação sincera o declaro á camara.

Nem eu podia commetter a leviandade de ferir com uma suspeita a honradez de um professor a quem não conheço, porque declaro a. v. ex.ª que, depois das leis da honra, e

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dos sentimentos do familia, nada estremeço mais do que a dignidade da profissão de cada qual.

Repito, pois, sr. presidente, que os factos comprovam que o sr. ministro tem acertado sempre nas nomeações para estas commissões. (Apoiados.)

É o que muito bem póde confirmar o sr. conselheiro dr. Adriano Machado, a quem agradeço profundamente reconhecido a bondosa attenção com que me tem ouvido.

S. ex.ª, como director da academia polytechnica do Porto, tem proposto para estas commissões sempre os professores mais distinctos; mas tambem é verdade que as propostas de s. ex.ª têem sido sempre attendidas.

A grande vantagem d'estas commissões é um exame mais consciencioso e de mais attento rigor, e ao mesmo tempo um augmento de vencimento para os professores mais dignos.

Estes exames têem sido presididos por professores do instrucçâo superior, salvas poucas excepções; o a escolha d'estes presidentes o dos vogaes das mesas dá uma garantia que reputo segura para 0 bom serviço e recto julgamento dos exames; sem duvida tem havido o rigor indispensavel nas decisões finaes, e benevolencia na exploração, que é tambem um dever impreterivel.

Assim, sr. presidente; até certo ponto, podemos prescindir dos antigos exames de madureza sem grave inconveniente.

Desde que os exames actuaes de instrucção secundaria são feitos com rigor o garantias do exploração profunda e julgamento serio, nada mais natural, portanto, do que a dispensa dos antigos exames de madureza. (Apoiados.)

Em todo o caso, é certo que ha sobre este assumpto opiniões contrarias entre auctoridades de competencia especial para elle.

N'esta parte não estou com o sr. conselheiro Rodrigues Sampaio, que foi effectivamente quem, por decreto de 4 do setembro de 1873, aboliu os exames de madureza. (Apoiados.)

Mas este facto não é motivo para censurar o nobre ministro; não é.

Entre os professores> ha uns muito distinctos que são contrarios aos exames de madureza; e outros que estão convencidos da conveniencia e até da necessidade d'elles, como é o sr. dr. Laranjo; como é tambem o sr. dr. Bocage, por um apoiado que lhe ouvi quando o sr. dr. Laranjo mostrava a conveniencia d'estes exames.

A minha opinião é a de s. ex.ª

E preciso que nos lembremos bem de que todos os annos se podia aqui a abolição dos exames do madureza. Não se podia admittir que os alumnos fossem compellidos a dar segunda prova, tendo obtido já approvação n'uma; era o que muitas vezes aqui ouvia.

Sendo um alumno reprovado no segundo exame, em que situação ficará o professor que o tinha approvado no primeiro?

Quantas vezes ouvimos isto aqui!

É certo que n’essa occasião devia eu levantar esta questão na camara; mas não me atrevi a apresentar as minhas idéas, porque sabia que perderia o tempo; debalde luctaria

eu contra a corrente da maioria d'esta casa; não conseguiria esclarecel-a.

Tambem não era preciso que se ficasse sabendo a minha opinião som que ella servisse para alguma cousa.

Repito que, em meu parecer ha uma grande vantagem nos exames de madureza; (Apoiados.) n'isto sou insuspeito, porque o serviço de taes exames é um pesadíssimo encargo para os professores.

Acerca da instrucçâo secundaria desejo, autos do passar á primaria, lembrar ao sr. ministro do reino umas considerações que já tive a honra de apresentar no relatorio a que ha pouco me referi.

Ha difficuldades em se fazer o serviço dos exames, como é preciso que seja feito, com o actual numero de examinandos por dia.

É impossivel examinar conscienciosamente em mathematica elementar seis alumnos por dia. É este um exame muito mais serio que o de philosophia racional; e, todavia, aos exames d'esta disciplina são admittidos cinco alumnos por dia, emquanto que são seis aos de mathematica elo meu lar.

Os exames de mathematica elementar não podem deixar de exigir muito mais tempo que os de qualquer outra disciplina, porque as provas são dadas por escripto, num quadro, o todos sabem que é necessario muito mais tempo para escrever, do que para fallar. (Apoiados.)

Alem d'isto, é um exame vastissimo. Muitas vezes, examinando o sexto alumno, sentia me fatigado de corpo e espirito; estava prostrado; o tinha de fazer violentos esforços para poupar-nos a dores de consciencia, que sem duvida ha de deixar um exame menos cuidadoso.

Note v. ex.ª que não é insignificante esta questão. Todos sabem que o futuro de um mancebo, a creação de um bom funccionario e a sorte de uma familia muitas vezes dependem de um d'estes exames.

A responsabilidade de um examinador é ainda maior do que a de um juiz de direito; porque dos despachos e das sentenças da primeira instancia do poder judicial ha ainda o recurso de aggravo e a appellação para a segunda; e depois ainda ha o recurso do revista para o supremo tribunal; mas os desgraçados, que são reprovados n'um exame do instrucçâo publica; só têem o triste recurso de novo exame, o que muitas vezes é um anno perdido e representa um capital importante para o estudante e sua familia.

Se, portanto, o nobre ministro do reino reduzir o numero de examinandos em mathematica elementar, por cada dia, fará um bom serviço; pois, francamente declaro que não se podem examinar convenientemente n'esta disciplina mais de quatro alumnos.

Finalmente, ácerca da instrucçâo secundaria, lembro e recommendo novamente ao sr. ministro do reino a necessidade de serem feitos os exames finaes em todos os lyceus nacionaes do reino. É pequeno o augmento de despeza; é simplesmente a importancia das ajudas de custo para as jornadas.

Tenho presente a nota das importancias despendidas com o serviço de taes exames, nota que a esta camara foi remettida pelo ministerio do reino a meu requerimento.

É a seguinte:

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DJARJO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Gratificações Ajudas de custo Despeza de expediente Importância total

3:300$200 9755$000 131$750 4:505$950

4:801$500 1:288$500 129$580 6:300$580

3:889$500 1:327$500 1$000 5:218$000

4:018$500 1:135$500 88$310 5:272$310

G:127$500 1:200$000 206$965 7:633$465

5:006$500 1:770$500 138$500 6:921$500

4:032$000 1:488$000 161$110 6:581$110

5:988$000 1:303$500 251$900 7:633$400

5:202$000 2:010$000 152$030 7:364$030

5:006$500 1:683$000 313$250 7:052$755

5:733$000 2:170$000 282$165 8:185$665

5:020$500 2:254$550 256$010 8:131$110

3:078$000 1:552$500 310$860 5:811$360

2:775$000 6075$00 280$850 3:663$350

3:183$000 4:1525000 1:666$500 579$115 5:428$615

1:581$000 310$100 276$770 6:0855100

3:250$500 810$000 4:355$270

3:033$000 1:737$000 622$760 6:202$760

81:17$5200 26:771$000 4:532$025 112:479$125

Exercício

1873-1871. 1874-1875. 1875-1876. 1876-1877. 1877-1878. 1873 1879.

Circumsprições

. Primeira..

• Segunda.. (Terceira.

i Primeira..

• Segunda. ¦ (Terceira.. Primeira.. Segunda.. (Terceira.. j Primeira..

• Segunda.. (Terceira..

!Primeira.. Segunda,.. Terceira..

!Primeira.. Segunda.. Terceira..

Vê se por esta nota que é muito insignificante o augmento de despeza necessario para a satisfação de tão manifesta e justa necessidade.

Tambem no serviço da instrucção primaria se revela o mesmo empenho do nobre ministro do reino, se não mais dedicado ainda.

A escolha dos professores é feita escrupulosamente, attendendo se unicamente ao bem do serviço publico; e para isto é o sr. ministro do reino poderosa o efficazmente coa djuvado peio muito illustrado o muito diligente director geral da instrucção publica.

Quando alguem pede a s. ex.ª, que para uma determinada escola seja nomeado um professor especialmente recommendado, s. ex.ª responde, se não com o nom possumus, que o sr. dr. Laranjo imaginou, com a phrase decisiva de quem é justo: «Será nomeado aquelle de quem eu tiver melhores informações»; e diz isto por fórma que ninguem se atreve a insistir no pedido de recommendação.

Ainda não ha muitos dias succedeu isto commigo. Um professor de instrucção primaria tinha requerido a transferencia da sua cadeira para outra. Era um professor que tinha o defeito de aggredir na imprensa collegas o outras pessoas; mas era um dos mais distinctos professores do instrucção primaria. Pretendia elle uma cadeira que era pretendida por outro professor tambem distincto, cuja nomeação eu estimava e me parecia boa; mas não occultei ao sr. ministro do reino que mais distincto era o outro a quem me tenho referido. Foi transferido o mais distincto; e o nobre ministro, com as maneiras afiáveis que tão nobremente o distinguem, teve a bondade de communicar-me este despacho, dizendo-me que estava satisfeita a vontade que eu devia ter, e sem duvida, tinha, como amigo de s. ex.ª, de que cite fosse justo sempre, especialmente em questões de administração publica.

E assim, sr. presidente, devo hoje ao nobre ministro do reino a satisfação de não ter contribuido para um despacho que havia de. preterir um professor distincto por outro que não o era tanto.

Factos d'estes dão-se com frequencia.

Perde o seu tempo quem pedir ao sr. ministro do reino um despacho menos justo. (Apoiados.)

Se o illustre deputado, o sr. Laranjo, tivesse vindo mais cedo para, aqui, havia de sabei' que nem sempre foi assim, estando (Vira dos conselhos da corôa o sr. conselheiro Rodrigues Sampaio. (Apoiados.)

Já tem sido dito n'esta camara que o sr. ministro do reino tem creado um grande numero de escolas de instrucção primaria; não sei agora exactamente quantas, mas a

assembléa teve a satisfação de ouvir o numero d'ellas, ha dias, n'um discurso do sr. Hintze Ribeiro; è' facil é sabel-o.

Ordenou tambem s. ex.ª Uma inspecção ás mesmas escolas, inspecção que foi realisada com proveito publico, que ninguem póde contestar.

«Mas não está ainda em execução a reforma dá instrucção primaria; é uma dás reducções dá opposição a s. ex.ª; é a primeira.

Porque não está em execução? Todos o sabem. Porque são necessarios muitos e importantes regulamentos. Quem é que ahi se julga habilitado a fazer taes regulamentos, completos, efficazes e excellentes, como é preciso que sejam, no tempo decorrido desde a promulgação dá lei até hoje?

Sr. presidente, o sr. ministro do reino quer um decreto regulamentar, que previna o maior numero de hypotheses, pelo menos as mais provaveis, emfim uma obra que eleve a instrucção primaria á altura a que é necessario em que ella esteja.

Acerca d'este assumpto, que sem duvida é fundamental para unia nação culta, vou apresentar uma proposta, que é assignada tambem por seis dos meus mais distinctos collegas; e, se não a assignam mais, é porque o regimento desta casa não admitte que um projecto tenha mais de sete, assignaturas.

E assignado pelo nosso muito illustrado e querido collega. o sr. Osorio de Vasconcellos, que 11'csta casa foi o primeiro apostolo de tão fecundo methodo, era cuja propagação tem empenhado com efficaz influencia a sua eloquente voz na nossa tribuna, e a sua brilhante e sabia penna na imprensa periodica. É assignado por quatro professores de instrucção superior, que mais altamente honram a sua classe, o paiz e a sciencia; e são estes os srs. drs. Adriano Machado, Gomes Teixeira, Rodrigues do Freitas e Pires de Lima; é assignado pelo nosso respeitabilissimo collega, o sr. Paula Madeiros, que só dá o seu voto a propostas de reconhecida justiça o manifesta vantagem.

Emfim, considero elevada honra ter o meu nome em seguida a nomes de tão conspícua auctoridade.

Attendendo á importancia do beneficio que assim pedimos para a instrucção primaria, não me parece exagerada a quantia que propomos.

Não é a primeira vez que peço um subsidio para a propagação d'este methodo, sobre o qual tive a fortuna e a honra de ouvir lições do seu auctor, tão sympathico como util ao paiz; e espero que não seja agora a primeira vez que elle me seja negado.

Ha um anno, quando foi encerrado o parlamento, apresentei-me na junta geral do districto de Vianna, corpora-

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çâo á qual tinha a honra de pertencer; e logo na primeira sessão propuz um subsidio de 135$000 réis para um professor de instrucçâo primaria do sexo masculino, e outro da mesma importancia para uma professora do sexo feminino, a fim de virem a Lisboa aprender com o sr. dr. João do Deus o seu methodo; ajunta, na qual havia dois procuradores da opposição progressista, approvou unanime a minha proposta; nomeou o professor e a professora, que no districto mais se recommendavam por seus bons serviços; e, emfim, só teve motivos para applaudir-se pela sua resolução.

Não ha perigo, pelo contrario ha necessidade publica em se habilitar o governo com esta auctorisação.

Para a prova da excellencia d'este methodo, tenho aqui uma nota das localidades em que d'elle têem sido dadas, com excellente resultado, provas publicas. Taes localidades são o Porto, Coimbra, Braga, Faro, Santarem, Figueira da Foz, Penafiel, Gouveia, Alemquer, Aviz, Niza, Thomar e muitas outras terras.

Houve prelecções para a propagação d'este methodo em quasi todos os concelhos do meu districto; e digo quasi, porque não tenho a certeza de que hajam sido feitas em todos.

Ha um argumento que desvanece todas as duvidas que possam occorrer a espiritos menos crentes, ou menos esclarecidos, ou menos rectos, ácerca da excellencia do methodo; é a rapidez, verdadeiramente assombrosa, com que têem sido esgotadas as edições da Cartilha Maternal e dos quadros parietaes.

Tenho presentes estes esclarecimentos em uma nota, que vou ler.

A primeira edição da Cartilha Maternal foi de 8:000 exemplares, e durou dezesete mezes; a segunda foi de 7:000, e durou tres mezes e meio; note a camara este notavel progresso; e a terceira, emfim, de 24:000, publicada em fevereiro ultimo; e, embora não possa fazer agora um calculo exacto ácerca do tempo que durará, creio que não chegará para este anno.

Dos quadros parietaes, que são indispensaveis para o ensino simultaneo, já houve tres edições; estão vendidos 400, e quasi todos desde outubro ultimo; notem v. ex.ª, sr. presidente, e a camara que cada collecção representa uma escola.

É um verdadeiro milagre a dedicação com que tantos homens de sciencia e boa vontade se empenham na propagação d'este Methodo.

Citarei como principaes os srs. Annes Baganha no Algarve; abbade de Arcozello no Porto; Graça Affreixo em Serpa; em Vizeu o commissario dos estudos do districto; em Lisboa, alem do auctor, o sr. Costa Terenas; e, finalmente, no Brazil o meu amigo e collega o sr. dr. Antonio Zeferino Candido da Piedade, que foi aquelle imperio expressamente para propagar este methodo, e ali encontrou a protecção de todos, desde Sua Magestade Imperial.

Tenho informações de que este methodo já foi ensaiado em larga escala n'um corpo militar da capital por ordem do sr. ministro da guerra; e folgo de referir este caso, para que a camara tenha mais uma occasião de reconhecer que o sr. ministro da guerra não se esquece da instrucçâo primaria dos soldados. Nem s. ex.ª podia esquecer-se de tão imperiosa necessidade; s. ex.ª a quem devemos o ensino agricola e o industrial, estabelecidos em dezembro de 1852, o primeiro por decreto de 16 e o segundo por decreto de 30.

Sou agora informado, por collegas que estão a penhorar-me muitissimo com a sua attenção, de que os mesmos ensaios têem sido feitos nas cadeias por ordem do sr. ministro da marinha, no exercicio das suas funcções de director geral dos negocios da justiça.

Não sei se tenho respondido a todas as considerações do sr. dr. Laranjo; creio, porém, que, se algumas esqueci, não foram das principaes.

Eu ha dias, disse que, quando chegassemos ao capitulo da instrucçâo publica, na discussão do orçamento, havia de aproveitar a occasião para mostrar os serviços que o sr. conselheiro Rodrigues Sampaio tem prestado á instrucçâo publica, e com elles mesmos responder a umas palavras menos justas de um deputado da opposiçâo.

Não tinha idéas de discutir estas questões do instrucçâo publica tão largamente; mas o discurso do illustre deputado que me precedeu, como v. ex.ª, sr. presidente, e a camara, hão de ter reconhecido, impoz-me este dever impreterivel, sendo eu o primeiro inscripto depois de s. ex.ª para fallar.

Foi por isso que me demorei muito mais do que tencionava.

Antes de sentar-me, permitta-me v. ex.ª que eu declare que, embora ande afastado da maioria d’esta assembléa, por motivos que não são de principios politicos, nem significam incompatibilidades pessoaes, conservo-me ainda no mesmo logar, apoiando este gabinete, no mesmo logar que humilde mas lealmente tenho occupado desde 1871, desde que principiou a minha carreira politica.

E para isso bastava que no gabinete estivesse o sr. conselheiro Sampaio, pois tenho legitimo e nobre orgulho em poder dizer que, tendo tomado parte como deputado em nove sessões legislativas, nem ainda uma só vez em assumptos de administração votei contra o honradissimo ministro do reino.

É tão dedicada a confiança que eu tenho em s. ex.ª, é tão profunda a veneração que lhe tributo, sr. presidente, que reputo honra distincta o apoio com que o tenho acompanhado.

Disse o illustre deputado que este governo é uma mancenilheira! Será; mas a sua sombra dá vida e forças. Aqui estamos unidos pela dedicação; nenhum de nós succumbe. Bem vê o illustre deputado como resistimos e triumphâmos sempre. Mas, se o gabinete é a mancenilheira para nós que o apoiamos, que lho partilhamos as responsabilidades, para que pretendem derrubal-o os senhores da opposição? Esperem que á sombra d'elle morramos todos.

Embora haja dissidências pessoaes entre os que apoiam o governo, como ha em todos os partidos, unem se todos quando se trata de qualquer manifestação do confiança politica ao governo. (Apoiados.)

Repetem-se as votações, suecedem-se as luctas da palavra, o todos nós, os que apoiámos o governo, continuámos unidos e fortes ao seu lado. (Apoiados.)

Pela minha parto, declaro a v. ex.ª que tenho a profunda convicção de que presto um importantissimo serviço ao meu paiz, estando sempre ao lado do nobre ministro do reino o sr. Antonio Rodrigues Sampaio (Apoiados.); e a minha consciencia applaude-se do cumprir assim um dever.

Faço votos para que assim seja sempre, e em tudo; é este o meu principal empenho na vida publica. Tenho dito.

(O orador foi comprimentado por varios srs. deputados.)

Leu-se na mesa a seguinte

Proposta

Propomos que o governo seja auctorisado a gastar até á quantia de 6:000$000 réis:

1.° Para que o methodo João de Deus seja authentica e officialmente ensinado na escola normal.

2.° Para facilitar aos professores primarios a aprendizagem do methodo com o auctor ou com os seus interpretes auctorisados.

3.° Para prover as escolas publicas com livros e objectos necessarios ao ensino por este methodo. = Pires de Lima = José Joaquim Rodrigues de Freitas = Henrique de Paula Medeiros — Francisco Comes Teixeira = A. Osorio

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de Vasconcellos = A. da Rocha Peixoto — Adriano Abreu Cardoso Machado. ¦.<¦

Foi admittida..

O sr. Ministro da Marinha (Thomas Ribeiro): — Mando para a mesa uma proposta do lei organisando o serviço postal nas provincias ultramarinas.

Gomo esta proposta tem do ser lida na mesa, peço a v. ex.ª que me dispense de a ler, para não tomar tempo á camara.

V. ex.ª dar-lhe-ha o destino conveniente. E a seguinte:

Proposta de lei n.º 110-A

Senhores — A organisaçao do serviço do correio póde considerar-se quasi sempre como indicador verdadeiro da civilisação do cada povo.

Raro será encontrar paiz, que caminhe muito adiante na estrada do progresso, sem que a transmissão das correspondencias se faça n'elle com grande rapidez e regularidade.

As possessões portuguezas do ultramar, apesar das contrariedades com que luctam e dos poucos recursos que lhes podemos fornecer, vão sem duvida crescendo em civilisação e em riqueza.

Abrem-se estradas; projectam-se caminhos de ferro; fundam-se escolas; regula-se a administração; vão-se, embora lentamente, explorando os feracissimos terrenos de alguns dos nossos dominios de além mar; lançam-se, n'uma palavra, as bases de uma verdadeira reorganisação colonial.

Para acompanhar todos estes melhoramentos, para ligar todos estes elementos de actividade, para aproveitar o tempo, que nas actuaes circumstancias é mais do que nunca precioso, é mister que o pensamento que dirige, não encontro delongas nem embaraços em chegar a todos os pontos onde se trabalhe; é indispensavel como que approximar do seu paiz natal todos esses operarios benemeritos, que, longo da terra da patria, estão abrindo caminho largo ao desenvolvimento da agricultura, da industria e do commercio n'essas vastíssimas regiões.

A estas justificadas aspirações, que surgem naturalmente ao attentar na transformação por que ora passam algumas das nossas possessões, não corresponde actualmente o serviço postal do ultramar. E quando para o reformar não tivéramos este incentivo, um dever imperioso nos obrigaria a dar aquelle serviço organisaçao regular.

Foram admittidas na união postal as provincias ultramarinas portuguezas. Entrando n'esta vasta associação, que representa um dos grandes progressos do seculo, participaram de todas as vantagens que ella offerece á transmissão das correspondencias. Impõem, porém, taes vantagens obrigações indeclinaveis.

Muitos dos correios do ultramar têem de se corresponder directamente com os correios estrangeiros e regular contas com elles; precisam de conhecer e executar as convenções postaes, e em muitos casos é indispensavel que saibam occorrer á solução de quaesquer difficuldades do serviço postal com os outros paizes, não havendo tempo para solicitarem conselho ou informação do governo da metropole.

Em uma ou outra provincia a organisaçao do correio está regularmente estabelecida; mas em geral, por se haver subordinado tudo ao pensamento de aggregar este serviço a outros com o fim de o tornar menos oneroso, póde dizer-se com verdade que é muito irregularmente desempenhado. As funcções postaes estão, com raras excepções, confiadas nas provincias ultramarinas ao cuidado de funccionarios, aos quaes especialmente se incumbem serviços muito diversos, e que, não recebendo pelo desempenho d'aquellas funcções nenhuma gratificação, ou recebendo-a assas limitada, lhes não prestam a attenção necessaria.

Podem muitos logares do correio, é certo, ser exercidos por individuos que tenham a desempenhar outras funcções publicas, especialmente quando o movimento postal

nas respectivas localidades é pequeno, mas não póde comprehender-se que tal accumulação se dê sem graves transtornos nas capitães das provincias e nas dos districtos mais importantes.

Não é igualmente admissivel que o serviço do correio seja em algumas localidades desempenhado por individuos que não estão subordinados a nenhuma auctoridade portugueza, como succede em Macau e em Damão.

O pensamento capital que presidiu á proposta da nova organisaçao foi, pois, dar unidade ao serviço postal das provincias ultramarinas, creando em cada uma d'ellas um funccionario a quem incumba a direcção, administração o fiscalisação de tudo quanto importe aquelle serviço, acabando com a accumulação dos logares do directores de correios com outros, salvos casos mui excepcionaes, e dando aos funccionarios do correio a independencia sufficiente para que se não encontre a sua acção tolhida a cada momento com embaraços e attrictos difficeis de superar sem as disposições da reforma que proponho.

Na nomeação dos empregados postaes superiores attende-se á necessidade de ter funccionarios habilitados, porque d'estes dependerá principalmente o melhoramento do serviço. Para os demais logares, verdadeiramente secundarios, adopta-se, como regra a aproveitar, havendo compatibilidade, outros funccionarios, quer em activo serviço, quer reformados; arbitrando-lhes, porém, uma remuneração, embora medica, pelo seu trabalho, mas que lhes seja incentivo para não descurarem as funcções que lhes incumbam, e compensação ás responsabilidades que assumem.

Procura se manter a unidade de todos os serviços postaes por meio tambem do visitas periodicas. Essas visitas constituirão um dos mais importantes deveres dos funccionarios superiores de cada provincia. Em pontos muito afastados entre si, onde as instrucções dadas nem sempre serão comprehendidas e regularmente executadas, é necessario que haja um laço, que estreite e harmonise o serviço das differentes estações poslae3 assegurando o bom desempenho dos deveres dos differentes funccionarios. E as visitas que os empregados superiores não deixarão de realisar, porque d'ellas depende uma parte da remuneração que lhes é fixada, contribuirão do certo efficazmente para se conseguir tão util resultado.

Estabelece-se a distribuição domiciliaria das correspondencias e criam-se estações postaes em todas as localidades onde, pela importancia da população, pelas relações commerciaes e pelas que resultam da organisaçao de outros serviços, administrativos e judiciaes, ellas se tornavam indispensaveis, e deixa-se aos governos locaes, sem dependencia de demoradas auctorisações, estender taes melhoramentos a outras localidades, que venham a (encontrar-se em identicas circumstancias.

Finalmente regulam-se os portes internos das provincias ultramarinas, estabelecendo-se como regra que elles sejam a metade dos menores portes fixados pelas convenções da união postal. D'este modo acaba-se com distincções o diversidades de taxas o de escalas de peso, que só redundavam em confusão de serviço e em prejuizo do publico.

O pensamento d'esta proposta de lei terá de se completar com os regulamentos especiaes, em que será indispensavel attender ás condições de cada provincia, mas em que se deverá tomar como base, no que for com ellas compativel, o regulamento da convenção postal do París.

Assim conseguiremos a desejável unidade em grande parte das disposições regulamentares do serviço do correio nas provincias ultramarinas; mas teremo3 em attenção, como convem aos interesses d'ellas e aos seus habitos, as respectivas condições especiaes, que nos obriguem a modifical-as segundo as conveniencias de cada uma d'essas provincias.

Do que fica exposto vê-se claramente que não se modelou uma reforma postal como se se tratasse de qualquer paiz dos mais adiantados no caminho da civilisação, antes

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se procedeu cautelosamente para não prejudicar os melhoramentos projectados com as exigencias de uma organisação, que mal podesse ser applicada ás provincias a que se destina.

Seria facil vasar esta reforma no3 moldes á as organisações postaes mais perfeitas, mas d'este modo só conseguiríamos decretar uma organisação inexequivel, que deixaria o serviço talvez em peiores condições que as actuaes.

Foi por isso que julguei dever contar com o estado crescente, mas não perfeito, da civilisação das nossas provincias ultramarinas, com os seus meios de communicação, por emquanto limitados, com os seus escassos recursos; n'uma palavra, com as condições muito especiaes dos paizes onde tem do realisar-se o serviço que se pretende reformar; não esquecendo, porém, que era conveniente introduzir na nova organisação 03 elementos necessarios para que ella podesse ir acompanhando os progressos que se forem realisando e a que as vastas possessões ultramarinas portuguezas não podem ficar estranhas.

Convencido da urgente necessidade da adopção das medidas a que me refiro, tenho a honra de submetter á vossa esclarecida apreciação a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.° A superior administração e fiscalisação do serviço postal das provincias ultramarinas compete á secretaria d'estado dos negocios da marinha e ultramar, pela direcção geral do ultramar.

Art. 2.° Cada provincia ultramarina constituirá um districto postal, dirigido por uma administração geral do correio, com a sede na capital da respectiva provincia.

Art. 3.° Cada districto postal é dividido em direcções de primeira e segunda ordem.

Art. 4.° As direcções do primeira ordem são estabelecidas em todas as sedes do governos subalternos, e bem assim nas demais terras que, pela sua população, relações commerciaes e industriaes, ou por outras cireumstancias, mereçam este melhoramento.

§ unico. A creação das direcções do correio de 1.ª ordem será feita pelo governo da metropole, precedendo proposta do respectivo administrador do correio, e informação do governador da provincia.

Art. 5.° As direcções do 2.ª ordem são estabelecidas nas sedes dos concelhos e presidios, e bem assim em todas as povoações cujo numero de habitantes e movimento commercial sejam iguaes ou superiores aos d'aquellas sedes.

Art. 6.° Haverá distribuição domiciliaria por carteiros nas sedes das administrações geraes dos correios e nas direcções de correio, cujo movimento postal seja igual ou superior aos da sede da respectiva administração.

§ unico. É permittido aos destinatários das correspondencias chegadas pelos paquetes receberem estas na respectiva estação postal, pagando previamente a quantia de 4500 réis annuaes.

Art. 7.° O serviço de transporte de malas entre as possessões portuguezas e as possessões estrangeiras limitrophes é objecto de ajustes especiaes entre os governos das respectivas possessões; não podendo, porém, tornar-se effectivo taes ajustes sem approvação do governo da metropole.

Art. 8.° Pertence aos governadores das provincias ultramarinas, ouvido o respectivo administrador geral do correio:

1.° A nomeação, suspensão e exoneração dos empregadas das administrações geraes e directores do correio, cujo vencimento não seja superior a 300£000 réis;

2.° A suspensão ou substituição temporaria de qualquer outro empregado, quando assim for urgentemente reclamado pelas conveniencias do serviço;

3.° A celebração de todos os contratos de conducção do malas, quando a despeza d'elles resultante for superior a 50'000 réis, com excepção d'aquelles que devam celebrar se em conformidade com o disposto no artigo 7.° d'e3ta lei.

4.° A creação de direcções de correio do 2.ª ordem fóra das terras, que lhes vão classificadas na presente lei;

5.° A adopção de providencias que sejam urgentemente reclamadas, das quaes deverão dar immediatamente conta ao governo da metropole.

Art. 9.° As juntas de fazenda pertence:, '

1.° O exame e ajuste do contas dos funccionarios postaes, que forem responsaveis para com a fazenda publica;

2.º A fixação das fianças que deverão prestar estes responsaveis;

3.6 A requisição de sellos postaes necessarios para o expediente da provincia.

Art. 10.° As juntas do fazenda são obrigadas: 1.° A dar annualmente conhecimento ao governo da metropole do resultado do exame das contas dos differentes responsaveis;

2.° A enviar ao mesmo governo, no fim de cada trimestre, um balancete do movimento de fundos representados por sellos postaes.

Art. 11.° Pertence aos administradores geraes do correio:

1.° Publicar as instrucções que entenderem convenientes para o regular desempenho do serviço postal a seu cargo, em execução dos regulamentos e convenções postaes em vigor;

2.° Nomear, suspender o exonerar os carteiros ou distribuidores do correspondencia;

3.° Ajustar a conducção de malas quando a despeza não exceder a 50000 réis annuaes;.

4.° Conceder licença para a collocação de caixas do correio e para a venda de sellos postaes, havida a correspondente garantia;

5.° Propor, por intermedio do governador da provincia, tudo quanto entenderem conveniente para o melhoramento do serviço postal.

Art. 12.° Os administradores geraes do correio são obrigados a dar conhecimento ao governador da provincia de todos os actos que praticarem dentro das attribuições especiaes, que lhes são conferidas pelo artigo antecedente.

Art. 13.° Os administradores geraes deverão annualmente fazer uma visita a todas as direcções de 1.ª ordem do respectivo districto postal, e bem assim ás direcções de 2.ª ordem mais importantes.

§ unico. O relatorio d'esta visita, que se completará com o de todos os factos occorridos no serviço postal durante o anno civil anterior, será remettido até ao fim de março de cada anno ao governador da provincia, e por este, com o seu parecer, enviado á secretaria da marinha, e ultramar até 30 do abril.

Art. 1-1.° Quando por impossibilidade, devidamente comprovada perante o governador da provincia, o administrador geral não poder verificar a visita será, precedendo proposta d'este, encarregado pelo governador de desempenhar este serviço o empregado da administração ou o director do correio, que houver dado maiores provas de zêlo e intelligencia.

§ unico. 0 relatorio especial de visita, que ficará a cargo do empregado que a realisar, não dispensa o administrador geral do relatorio geral do. serviço, nos termos do artigo antecedente.

Art. 15.° A visita a que se referem os artigos antecedentes não deverá prolongar-se alem de dois mezes, e ao empregado que a realisar será abonada, alem de despezas de viagem, uma gratificação equivalente á quarta parte do vencimento fixado por esta lei para o logar de administrador geral da respectiva provincia.

Art. 16.° Era vista do relatorio da visita e das informações que se entenderem necessarias para bem apreciar o modo por que ella foi desempenhada, poderá o governo elevar a gratificação até metade do vencimento a que se refere o artigo 15.°

Art. 17.° Durante a ausencia ou impedimento do admi-

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nistrador geral, faz as suas vezes o empregado mais graduado da respectiva administração.

Art. 18.° Os logares de administradores geraes do correio serão providos por concurso documental, ao qual serão admittidos t

1.° Os administradores geraes do correio das outras provincias;

2.° Os empregados das respectivas administrações e os directores de correios d'ellas dependentes, que tenham prestado bom e effectivo serviço, e estejam habilitados com o conhecimento das linguas ingleza o franceza;

3.° Os empregados da direcção geral dos correios ou das administrações centraes dos correios do reino, que estejam nas mesmas condições;

4.° Quaesquer individuos que tenham servido bem effectivamente cargos publicos na respectiva provincia, e possuam as habilitações indicadas;

5.° Os individuos habilitados com algum curso superior.

§ 1.° São motivos de preferencia:

1.° O serviço prestado em repartições postaes;

2.° O conhecimento de quaesquer linguas, alem das indicadas, especialmente das que fallam os indigenas ou das que se fallarem nos territorios vizinhos do respectivo districto postal.

§ 2.° Se o governo assim o julgar conveniente, ou o concurso aberto não der resultado favoravel, poderá ser nomeado para exercer em commissão, durante tres annos, o logar de administrador qualquer individuo que esteja nas condições acima designadas, sendo preferidos, porem, os empregados do correio do reino.

Art. 19.° Os logares do directores de correio de primeira ordem serão providos em individuos habilitados pelo menos com os conhecimentos de instrucçâo primaria.

§ 1.° São preferidos para estes logares os professores de instrucçâo primaria sempre que, por informações das auctoridades competentes, se conhecer que a accumulação se póde verificar som prejuizo do serviço.

§ 2.° Nas direcções do correio, em que houver relações postaes directas com paizes estrangeiros, será motivo de preferencia o conhecimento da lingua franceza.

Art. 20.° Para os logares de directores de correio de segunda ordem só poderão ser nomeados individuos que desempenharem outras funcções publicas ou receberem, como aposentados, reformados ou veteranos, vencimento do estado e souberem ler e escrever.

Art. 21.° O serviço dos carteiros, distribuidores e caminheiros ou conductores de malas, será ajustado pelo modo que se julgar mais conveniente; devendo, porém, ser preferidas as praças de pret com baixa de serviço, e os soldados reformados ou 03 que estiverem em serviço quando possam ser dispensados.

Art. 22.° O ordenado dos administradores geraes do correio é fixado do modo seguinte:

Era Cabo Verde 500$000 réis;

Na Guiné 500$000 réis;

Em Angola 1:000$000 réis;

Em S. Thomé e Principe 500$5000 réis;

Em Moçambique 1:000$000 réis;

No Estado da índia 1:000$000 réis;

Em Macau 300$000 réis.

Art. 23.° O ordenado dos directores do correio de primeira ordem é fixado em 300$000 réis.

§ 1.° Nas direcções do correio, que tiverem relações postaes directas com paizes estrangeiros, poderá o governo abonar aos respectivos directores a gratificação annual de 100$000 réis.

§ 2.° Quando o logar de director for exercido por um professor de instrucçâo primaria abonar-se-ha por este serviço a gratificação do 150)5000 réis.

Art. 24.° Os directores do correio de segunda ordem receberão uma gratificação, que variará desde 20/5000 até Sessão de 7 de maio de 1879

50/5000 réis, conforme o maior ou menor movimento postal das respectivas direcções.

§ unico. No mez de janeiro de cada anno será submettida á approvação do governo a tabella dos vencimentos d'estes directores, organisada segundo o movimento postal do anno anterior.

Art. 25.° As despezas de expediente tanto das direcções de 1.ª ordem como das de 2.ª ordem serão feitas á custa dos directores.

§ unico. Não se comprehendem n'esta disposição os objectos necessarios para pesar, marcar e facturar as correspondencias e inutilisar-lhes os sellos, bem como os livros de escripturação, que são fornecidos pelas respectivas administrações.

Art. 26.° É o governo auctorisado a fixar o quadro das administrações geraes e o pessoal das direcções do correio, pelo modo que se julgar mais conveniente, comtanto que a despeza, excluidos os vencimentos dos respectivos administradores e directores, não exceda um terço mais do que se despende actualmente com taes serviços.

Art. 27.° Os empregados das administrações geraes dos correios e os directores de correios de 1.ª ordem têem direito á aposentação, nos termos do decreto de 28 do junho do 1864.

Art. 28.° Aos empregados da metropole, que servirem em commissão logares do correio no ultramar, será contado pelo dobro, para a reforma no reino, o tempo da referida commissão.

Art. 29.° O governo mandará inspeccionar extraordinariamente, quando o julgar necessario, qualquer das administrações do correio do ultramar, escolhendo de preferencia para esta commissão um empregado da direcção geral dos correios ou da administração central do correio de. Lisboa.

§ unico. Para occorrer ás despezas d'estas visitas será inscripta no orçamento de cada procedencia a verba annual de 500$000 réis.

Art. 30.° Todas as auctoridades civis ou militares do ultramar são obrigadas a prestar aos funccionarios postaes ou aos empregados encarregados da inspecção, a que se refere o artigo antecedente, o auxilio que por elles lhes for reclamado para a maior regularidade e segurança do serviço ou commissão que lhes incumba desempenhar.

Art. 31.° Os portes das correspondencias no interior de cada provincia ultramarina e os das correspondencias trocadas entre uma e outra provincia, sendo o transporte d'estas feito em navios portuguezes, são fixados em metade dos menores portes que vigorarem para as correspondencias trocadas entro paizes pertencentes á união geral dos correios, adoptando-se as mesmas escalas de peso e a mesma classificação de correspondencias que estiverem estabelecidas para estas ultimas.

Art. 32.° Os portes das correspondencias trocadas entre qualquer provincia ultramarina e o reino e ilhas adjacentes, quando o transporto se fizer em navios portuguezes, serão equiparados aos menores portes que vigorarem para as correspondencias trocadas entre os paizes da união geral dos correios, mantendo-se igualmente a mesma escala de peso e a mesma classificação de correspondencia.

Art. 33.° As cartas que não forem devidamente franqueadas serão transmittidas ao seu destino e taxadas no valor dos sellos que lhes faltarem. As demais correspondencias não serão expedidas quando não forem devidamente franqueadas.

Art. 34.° A correspondencia official trocada entre as respectivas auctoridades da mesma provincia, entre as repartições e auctoridades de duas provincias ou entre as referidas auctoridades o o governo da metropole, quando o transporte se fizer em navios portuguezes, não está sujeita ao pagamento de porte.

Art. 35.° Para que uma carta seja considerada official é necessario:

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1.° Que seja trocada entre auctoridades ou repartições officiaes;

2.° Que tenha no sobrescripto a designação de serviço nacional;

3.° Que seja apresentada no correio acompanhada de guias assignadas pela auctoridade respectiva ou por quem o representar.

Art. 36.º É prohibida a inclusão, nas correspondencias que não forem registadas, de dinheiro, pedras preciosas ou quaesquer objectos de oiro ou prata.

§ 1.º As correspondencias que derem entrada em qualquer estação, dando indicios claros de conterem algum dos objectos acima indicados, serão registadas em um livro especial, e depois de se fazer n'ellas a devida declaração, seguirão ao sou destino.

§ 2.° O chefe da estação postal de destino, logo que receba qualquer correspondencia n'estas condições, avisará o destinatário para comparecer "no correio, onde em presença de duas testemunhas e lavrando-se o necessario termo será aberta a correspondencia e verificado o seu conteudo.

§ 3.º Se a correspondencia contiver objectos, cuja transmissão pelo correio seja prohibida, o destinatário só poderá recebel-a pagando o décuplo do porte.

§ 4.º'As estações postaes enviarão no fim de cada trimestre ás respectivas administrações uma relação das correspondencias que houverem sido expedidas ou entregues n'estas condições.

Art. 37.° O pagamento dos portes será sempre feito em relação á moeda forte.

Art. 38.°' O governo fará os regulamentos necessarios para a administração do serviço postal das provincias ultramarinas, adoptando em tudo quanto não for contrariado, pelas condições especiaes das mesmas provincias, as disposições consignadas nas convenções e regulamentos em vigor para as relações postaes entre os paizes que pertencerem á união geral dos correios.

Art. 39.° Emquanto não forem decretados os novos regulamentos, a que se refere o artigo antecedente, considerar-se-hão em vigor, em tudo o que não for alterado por esta lei, os actuaes regulamentos, quer tenham sido postos em execução por ordem do governo da metropole, quer por ordem dos governos das provincias.

Art. 40.° Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria d'estado dos negocios da marinha e ultramar, em 30 de abril de 1879. == Thomás Antonio Ribeiro Ferreira.

O sr. Presidente: — Esta proposta será mandada publicar no Diario do governo, e enviada ás commissões respectivas.

O sr. Julio de Vilhena: -— Mando para a mesa a seguinte.

Proposta

Proponho que se consigne a verba de 6:000$000 réis como subsidio ao theatro de D. Maria II.

Sala das sessões, em 7 de maio do 1870. = Julio de Vilhena.

Foi admittida.

O sr. Caetano de Carvalho: — Mando tambem para a mesa a seguinte

¦ Proposta

Capitulo 8.°, artigo 22.°, secção 2.ª

Proponho que se crie um posto meteorologico na ilha do Faial, como ha em S. Miguel, Angra do Heroismo o Funchal. — Filippe de Carvalhos = Caetano de Carvalho.

Foi admittida.

O sr. Rodrigues de Freitas: — Apesar de ser a instrucção publica um dos mais importantes e mais vastos assumptos que o parlamento possa discutir, farei por ser breve; mas de certo não me será facil concluir hoje as considerações que julgo dever meu apresentar.

Em todas as cireumstancias é importantissimo tudo que

respeita á instrucção publica; mas no estado actual da. nossa patria, a importancia de tal assumpto se me figura inexcedivel.;

A questão financeira e as questões politicas estão em grande parte dependentes da instrucção nacional o principalmente da primaria. Como se ha de augmentar bem a materia collectavel, se não crescer a capacidade industrial de cada individuo? (Apoiados.) Como havemos de concorrer com os outros povos, como havemos de realisar progressos rapidos nos diversos ramos do trabalhos, sem que esteja mais desenvolvido o entendimento de cada um dos membros d'esta associação politica, chamada Portugal? (Apoiados.) Torne-se maior a instrucção util de cada um d'elles, o tanto bastará para que o producto do trabalho nacional represente cada anno mais alguns milhares do contos de réis. (Apoiados.)

E que direi do alcance politico da maior instrucção nacional? N'um paiz como o nosso é indispensavel que os cidadãos comprehendam bem os seus direitos e os seus deveres; é necessario que uma opinião publica verdadeiramente esclarecida auxilie efficazmente os governos o os parlamentos no desempenho de tão difficil missão d'elles; sem este auxilio mal podem as leis corresponder aos grandes interesses publicos.

Durante seculos temos supportado as consequencias de um grande abatimento intellectual; sem este abatimento não poderiamos ter sido tão longamente dominados, e opprimidos, como o fomos, pela theocracia o pelo absolutismo. Antes de perdida, na Africa por D. Sebastião, a corôa de Portugal, já o povo portuguez tinha perdido outra corôa mais preciosa, a da sua independencia intellectual. (Apoiados)

Quando se estuda a nossa historia da instrucção publica, fica-se convencido de que o reino estava em. tal grau de decadencia, que em poucas nações era mais facil aos theocratas e aos absolutistas apoderarem-se do espirito da povo, e, obrigal-o a permanecer em densas trevas. Leia-se a historia da universidade de Coimbra, examine-se o que se fez do ensino primario e secundario durante seculos, o comprehender-se-ha desde logo a causa da differença entro a nossa marcha politica e a de outras nações n'esse longo periodo. A seu turno, grande parte d'essa historia não se comprehenderia sem o exame das causas da nossa decadencia, cujo começo é muito anterior á morte de D. Sebastião.

Gastámo-nos abusando enormemente das navegações e da conquista; de sorte que não podemos acompanhar outros impérios, nas conquistas scientificas e industriaes; leiam-se os nomes dos sabios que dotaram a humanidade com grandes descobertas no mundo intellectual; percorre se a lista do3 que applicaram as sciencias a tantos ramos de trabalho; nenhum, ou quasi nenhum acharemos que seja de portuguez.

Ainda agora, decorrido tanto tempo, sentimos os effeitos de taes acontecimentos; corrijamol-os propagando a instrucção, sobretudo a que interessa aos que trabalham, aos que são mais uteis.

Não exponho agora á camara as minhas idéas ácerca das relações entre o estado e o individuo; não as exporei, sequer no que respeita ao serviço da instrucção publica; sómente direi que a solicitude do estado deve dedicar-se principalmente á primaria; necessita menos cuidado a secundaria, como eu a entendo; e meno3 ainda a superior; este meu modo de ver me parece harmonisar-se tambem com as actuaes necessidades d'esta provincia da administração.

Em 1878 foi promulgada uma lei ácerca do ensino primario; mas até agora as reformas que ella ordenava ficaram só no papel. Ainda não se publicaram os regulamentos, os quaes é verdade que estão quasi promptos.

Proferindo estas palavras, não ponho em duvida o sincero desejo que o sr. ministro do reino tem de melhorar a instrucção publica; peço até a s. es a que não julgue que

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pretendo aggredil-o e censural-o. Digo o que entendo, não mudando de pensar por ser ministro do reino o sr. Rodrigues Sampaio, ou qualquer outro estadista.

Nem podia proceder de outro modo, eu, que julgo dever de todos os partidos auxiliarem-se mutuamente em tudo que é commum aos seus programmas; auxiliarem-se mutuamente não só no parlamento, mas tambem fóra d'elle, em todas as localidades; lembremo-nos que á instrucção primaria se prende intimamente a propria independencia patria. (Apoiados.)

Não creio que um só dos nossos partidos, servido só pelos seus naturaes elementos, possa realisar a reforma que traz o nome do sr. Rodrigues Sampaio, ou outra qualquer; a experiencia nol-o affirma; assim aconteceu, desde os decretos de um dos mais illustres estadistas que ainda houve, o sr. Passos Manuel, até aos mais recentes. Fallando assim, não comprometto nenhum dos partidos que me escutam; apresento-lhes a minha opinião singelamente.

E, a proposito d'isto, direi como me parece que ainda o anno passado podia ter procedido o governo por occasião das eleições, para proveito seu e alheio.

O ministerio desejava obter maioria; todos os ministerios o desejam; são numerosos os processos de a alcançar; mas ha um que o governo não empregou. Os srs. ministros podiam dizer ás auctoridades: «Não façam eleições; não violem o direito eleitoral, que violal-o seria um crime. Deixem o recrutamento ao cuidado da lei, que abusar d'elle para alcançar votos, é um crime. Não perturbem a distribuição dos impostos, que perturbal-a para captar a influencia dos eleitores, é um crime».

E em vez de usarem d'esses velhos processos, os representantes do poder central dirigir-se-íam aos seus administrados, attrahiriam os mais influentes, empenhar-se-iam em que fundassem escolas do ensino primario, ou caixas economicas, ou bancos agricolas, ou sociedades cooperativas, ou associações de seguros, ou casas de beneficencia; procura riam assim exercer aquella acção paternal de que fallava Mousinho da Silveira n'um do3 seus famosos decretos; e não teriam d'esta sorte contribuido mais para estabelecer verdadeira popularidade do que empregando o systema eleitoral, de que mais ou menos se têem servido todos ou quasi todos os gabinetes?

Emquanto os trabalhos eleitoraes fatalmente perverterem a acção administrativa e tambem a das localidades; emquanto andarem a combater se os que deviam trabalhar harmonicamente, mal se poderá esperar que sejam bem succedidos os esforços do3 parlamentos e dos governos a favor da instrucção publica.

Vejamos o que diz o artigo 28.° da nova lei de instrucção primaria:

«As camaras municipaes, com o auxilio da auctoridade administrativa, dos parochos e dos membros da junta de parochia, organisam commissões promotoras de beneficencia o ensino nas localidades onde houver escola primaria, para promoverem a frequencia das creanças e adultos; a acquisição e distribuição de vestuario, livros e outros objectos de ensino ás creanças mais necessitadas; a creação do • premios para os alumnos distinctos; a prestação de soccorros o subsidios para auxiliar as familias desvalidas no cumprimento da obrigação do ensino; e tudo o mais que for conducente á difusão e ao progresso da instrucção popular. Estas commissões serão compostas pelo menos de quatro cidadãos o de tres senhoras residentes na freguezia. Quando não for possivel organisar as commissões promotoras pelo modo determinado no paragrapho antecedente, as camaras municipaes, com o auxilio da junta de parochia, designam tres chefes de familia em cada parochia para auxiliar a escola até que se organisem definitivamente as commissões.»

Mas o governo sabe que têem sido quasi vãos os esforços feito3 para organisar commissões de escola; que resultou dos circulares de 26 de julho del863, 12 de outubro

de 1866, 28 de janeiro de 1871 o 22 de fevereiro do 1875? Se as commissões foram instituidas, bem depressa deixaram de funccionar proficuamente. Dir-mo ha o sr. ministro do reino que estou provando não haver no paiz boa vontade do contribuir para o desenvolvimento da instrucção, e que não é dos governos culpa alguma do atrazo d'olla? Enganar-se-fa quem tal dissesse; aproveite-se a acção administrativa; dirija-se intelligente e proficuamente a grande massa de esforços que se estraga e desperdiça por causa das eleições; e o paiz se transformará dentro do poucos annos. Permaneçam os habitos politicos o será impossivel a este ou a outro governo executar a lei de 1878, o organisar as commissões escolares de modo que dêem grandes resultados.

Ora, sem essas commissões, o sem que se estimulo ou aproveite o encaminhe a iniciativa particular não se conseguirão os recursos indispensaveis ao progresso do ensino primario, os orçamentos do estado e dos municipios, não poderão ainda por muito tempo destinar para esse ramo de instrucção as sommas de que elle carece. Provoquemos pois, a fundação de muitas sociedades que subsidiem escolas, ou distribuam livros, ou dêem vestidos a creanças, ou lhes ministrem varios utensilios escolares, eu façam propaganda civilisadora nas familias, ou animem os professores.

E não é preciso que sejam grandes associações; no estrangeiro ha-as que não juntam durante o anno mais do que algumas dezenas de libras, mas assim se formam centenas; e cem libras, distribuidas em objectos do valor relativamente pequeno, podem determinar a frequencia escolar de centenas e creanças, que sem esses modestos auxilios ficariam privadas de instrucção. N'este campo se obtêem ás vezes grandes resultados com pequenos esforços.

Passo a occupar-me das disciplinas que compõem o quadro de instrucção primaria.

Segundo a lei de 2 do maio do 1878 o ensino primario elementar para o sexo masculino comprehende: leitura, escripta, quatro operações sobre os numeros inteiros o fraccionarios, elementos de grammatica portugueza, principios de systema metrico, principios de desenho, moral, e doutrina christã.

O ensino primario elementar para o sexo feminino comprehende estas mesmas materias e os trabalhos de agulha destinados ás classes menos abastadas.

Só no ensino primario complementar foram comprehendidas as noções elementares de hygiene, a gymnastica, e os direitos e deveres dos cidadãos. «Só passados tres annos depois do estabelecimento das escolas normaes, diz a lei, e conforme as condições especiaes das localidades, poderá ser ampliado»: o primeiro grau do ensino para o sexo masculino com gymnastica, canto chorai e noções elementares de agricultura; e o segundo com escripturação, principios de economia rural, commercial ou industrial; o primeiro grau do ensino para o sexo feminino com gymnastica e canto chorai, e o segundo com economia domestica, desenho de ornato applicado ás obras proprias do sexo, escripturação e rudimentos de sciencias physicas e naturaes.

Quizera eu que as sciencias physico-naturaes fossem aprendidas desde a escola do primeiro grau, não nego a difficuldade de realisar desde já este desideratum; porque nos falta pessoal habilitado; mas sinto que a lei deixasse para tão tarde o ensino dos rudimentos d'essas sciencias, preferindo-lhes materias que com ellas mal se estudaram, ou que são menos necessarias do que ellas.

Nem se supponha que sejam precisos profundos conhecimentos nos mestres de instrucção primaria para ensinarem ás creanças alguma cousa de sciencias naturaes. O que a este respeito se faz lá fóra é o seguinte:

Nos livros de leitura incluem-se trechos sobre materias de physica, ou chimica, ou zoologia, etc.; não são paginas de grande força scientifica; pelo contrario, são tão singelas quanto possivel as verdades ali escriptas; o professor ex-

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plica-as, commenta-as, desenvolve-as, segundo convem, ou segundo sabe. D'esta sorte a creança, ao saír da escola, tem adquirido noções positivas, necessarias á vida da familia o da sociedade; sáe, pois, com um valor muito maior que o d'aquella que frequenta as nossas escolas.

Hoje é extremamente preciso o ensino das sciencias physico-naturaes. Hoje são muito outras do que foram as condições da existencia. Novos principios, novas leis escriptas, regem o mundo social. Houve tempo em que rasoavelmente se chamavam humanidades os estudos classicos, das linguas mortas, da grammatica e da litteratura. Hoje as humanidades não podem ser senão os conhecimentos indispensaveis á vida na familia, na fabrica ou no campo, e na sociedade politica, e a acquisição d'estes conhecimentos é preciso que principio na escola primaria do primeiro grau; é preciso que ahi se organise o ensino de modo que nenhum tempo se desperdice, o que esteja de harmonia com o quadro das materias da instrucção secundaria o superior; seja a instrucção secundaria tão ligada;l primaria, e a superior á secundaria, que o espírito dos alumnos passe facilmente de um a outro grau, sem lacunas, nem superfluidades.

Considerando como sciencias fundamentaes a mathematica, a astronomia, a physica, a chimica, a biologia o a sociologia, todas ellas têem de ser estudadas desde a escola primaria até á superior, gradualmente, em harmonia com o desenvolvimento das faculdades dos alumnos, o segundo a dependencia que existo entro áquelles ramos do saber humana.

Talvez pareça impossivel iniciar em tão vastos conhecimentos o alumno da escola de ensino primario; mas não o é; levar-me-ía longe discutir esta materia em toda a sua amplitude; mas permitta-me a camara que em breve3 palavras explique o meu pensamento.

Entre as quatro operações e o calculo integral vao uma distancia enorme; e comtudo aquellas e este pertencem á mathematica; as mais simples propriedades dos corpos e a thermodynamica aprendem-se na physica; o nascimento e o pôr do sol, bem como os eclipses, são phenomenos ácerca dos quaes se podem dar explicações faceis, embora incompletas; e comtudo pertencem á mesma sciencia que estuda a mechanica celeste; a divisão do trabalho o a troca, na sua simplicidade, ficam a grande distancia das mais complicadas questões da propriedade; os rudimentos da linguagem são indispensaveis ao philologo, o comtudo são incomparavelmente mais faceis do que os pontos mais intrincados de linguistica. A esta gradação de difficuldades correspondem os graus do ensino. A creança, ainda na primeira infancia, aprende a conhecer varias propriedades dos corpos; a mãe ensina-lhe um pouco de physica sem livro algum, sem mesmo pensar que lhe ministra noções de tal sciencia; e comtudo a physica é tambem ensinada nos estabelecimentos dê instrucção superior.

Como exemplo de experiencias com que se podem apresentar de um modo comprehensivel á infancia grandes verdades scientificas, recordarei aquella com que se da idéa da theoria de Laplace ácerca da formação do nosso systema planetário: n'um copo com agua deita-se álcool até que o todo tenha densidade igual á do azeite"; lança-se-lhe uma porçãosinha de azeite, o qual, sujeito á mesma pressão por todos os lados, ficará com fórma de esphera; atravessando-a com um arame, e fazendo girar este, a esphera move-se tambem, achata-se, e porções d’ella se destacam, indo formar outras espheras. Está n'isto a imagem do que se passou com a massa de que saíram o sol e os planetas; a experiencia é tão simples que pede ser até aproveitada na escola de instrucção primaria, quando o mestre saiba dirigir bem o ensino.

Parece-me ter indicado quanto basta para se comprehender como entendo o ensino das sciencias na escola primaria.

A geographia e a historia entram no quadro legal da instrucção complementar; mas os methodos de ensino geralmente seguidos são pessimos; trata-se mais de decorar, que de engrandecer o entendimento. Dizem-se os nomes dos mares, dos rios, dos continentes, das, montanhas, dos cabos, das nações, das capitães, etc, e quasi nunca se ministra uma noção agradavel; fica-se com vontade de esquecer quanto se aprendeu. Estragam-se assim os cerebros que se cuidava aperfeiçoar. (Apoiados.)

Quanto á historia, o ensino primario e o secundario estão, em geral, atrazadissimos; estudamos mal a historia sagrada, a historia da Grecia, a historia de Roma, recebemos idéas falsíssimas ácerca das antigas civilisações. E como se aprende a historia de Portugal? Ficámos sabendo que houve tantos réis, os quaes edificaram taes cidades ou villas, e igrejas, deram taes batalhas, tiveram taes filhos, praticaram certos actos, morreram em tal anno, etc.

Pois não seria melhor que este ensino principiasse por biographias de grandes homens, como se faz em varias nações estrangeiras? Escolher-se-íam áquelles que mais notaveis se tivessem tornado pelos seus serviços á. patria ou á humanidade. As creanças gostam de ouvir historias; a este gosto corresponderiam as vidas de varões illustres, que representassem a sua epocha sob qualquer aspecto; as explicações do professor completariam o quadro esboçado no livro; mais tardo juntar-se-iam a essas, outras biographias, combinar-se-ia com ellas a narração de factos capitães, a descripção de monumentos e do costumes; emfim, n'um terceiro grau de estudo elementar da historia, poder-se-iam apresentar os factos syntheticamente. (Vozes: — Muito bem.)

O ensino da geographia conviria principial-o pelo da topographia; o exame dos logares proximos da escola, isto é, de sítios que os alumnos percorrem muitas vezes, daria ensejo a expor intelligivelmente alguns principios do geographia, a explicar varios termos da sua nomenclatura; seria até facil dar algumas noções de geologia.

E se os methodos usados entro nós são geralmente maus, salvas pois honrosas excepções, como podem as creanças amar a escola? Demais, o modo por que muitas pessoas educam as creanças, contribuo para a falta de vivacidade, para a tristeza d'ellas; quer-se que sejam como senhoras ou homens feitos; pretende se que pautem os seus movimentos pelo manual de civilidade, ao qual creio que ainda se attribue grande importancia.

Um dos nossos mais distinctos escriptores, o que em qualquer das mais cultas nações seria considerado como um dos primeiros, pelo seu estylo e pelo modo como corajosamente tem discutido importantes questões sociaes, o sr. Ramalho Ortigão, tem escripto nas Farpas mais do uma pagina brilhante ácerca da tristeza das creanças portuguezas. E cito as Farpas como publicação digna de ser bem recebida nas melhores bibliothecas, e de ser citada no parlamento.

Em terras estrangeiras os passeios publicos são frequentados por creanças que se divertem umas cora as outras, que se movem, que saltam, que brincam. Acompanham-as ás vezes senhoras que para ali vão com o seu trabalho. Entro nós, quantas senhoras não teriam pejo de trabalhar nos passeios?! Quantas até se não envergonhariam de se apresentar com as mãos ainda mal saídas do algum trabalho culinário; o julgarão indispensavel o traje luxuoso e o pó de arroz para receberem visitas! Quantas vezes em logar de se permittir ás creanças que sigam os impulsos da natureza, isto é, que se movam o fallem, se lhes impõe o, silencio o a quietação! Mal sabem algumas mães o mal que assim praticam! Inspirem-se antes no que lhes dicta o coração; escutem os filhos; sigam com cuidado a curiosidade d’elles; a natureza tornou-os curiosos para que se instruíssem.

Deixem-os mover se o saltar; a natureza tornou-os amigos do movimento para que desenvolvessem o corpo. E contrariando-se nas creanças a curiosidade, ella se perverterá; contrariando-se o movimento, arriscar se-ha o, saude.

A instrucção publica para as creanças não deve princi-

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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

piar na escola do ensino primario; cumpro que comece no que os allemães chamam Kindergarten, ou jardim da infancia.

Tenho pena de que a lei de 1878 não determinasse claramente que, pelo menos, junto das escolas normaes houvesse um jardim infantil para os exercicios pedagógicos. O Kindergarten foi inventado por Froebel, um dos mais distinctos pedagogistas; 'comprehendendo que na primeira idade é o brincar, é a recreação o que mais agrada ás creanças, procurou systematisar jogos e recreações de modo que a puericia, ao mesmo tempo que brincava, se desinvolvesse physica, intellectual e moralmente; pequenas espheras, barrinhas o cubos, servem para construir diversos objectos usuaes; habituam-se as creancinhas a conhecer formas, a pensar no modo de as produzir, e a contar as differentes;partes de que são feitas.

As vezes tecem com tiras de papel de coros, e nas combinações d'ellas exercem o sentido do bello; picam o papel segundo linhas traçadas n'elle, o depois passam pelos buracos fios variegados; fazem determinados movimentos a compasso, e ás vezes cantam tambem; estes movimentos são ordenados de sorte que harmonicamente se fortifiquem todos os orgãos; conversam com as jardineiras, que lhes contam historias instructivas, ou encaminham a curiosidade da puericia, e a habituam a reflectir sobre objectos que precisam conhecer.

Não custaria muito mandar uma senhora portugueza estudar os jardins da infancia na Allemanha ou na Suissa; ella viria ensinar professoras em Portugal.

Tenho me referido ao ensino primario na sua generalidade; mas não posso omittir algumas considerações ácerca da instrucçâo do sexo feminino.

Houve um periodo em que alguns paes julgavam perigoso que as filhas até soubessem escrever; seguiu-se outro periodo em que se entendeu indispensavel o conhecimento de varias linguas, o tocar piano o o canto; mas para que servirá tudo isto se não for acompanhado pelo conhecimento dos grandes deveres a cumprir na familia? Convirá ensinar tudo aquillo, e esquecer a economia domestica?

A mulher que possue áquelles conhecimentos pede ser bem menos util, bem inferior aquella que sabe ser esposa o mãe. 1

As senhoras verdadeiramente laboriosas valem muito mais do que aquellas que só lêem educação luxuosa; (Apoiados.) educação esta, que nem faz bem ao cerebro, e nem sempre está do accordo com os recursos de quem a paga o de quem a recebe. (Apoiados.)

Cuidemos, pois, de reformar quanto antes a educação feminina; tornemol-a qual é precisa á grande missão que a mulher tom do desempenhar; tornemol-a racional, methodica, e em harmonia com as necessidades da familia. Entro nós são ainda muito falsas as idéas ácerca da instrucçâo da mulher; convem que a occupe menos o figurino, e que tenha os conhecimentos que se requerem n'uma boa dona de casa.

Eu tinha do apresentar á camara numerosos trechos de varios livros por que entro nós se aprende a ler, mas não lhe darei noticia senão de dois, são os seguintes.

(Leu.)

Que idéa ficarão formando as creanças ácerca do que é metaphysica o algebra? Para que dar-lhes estas pessimas o desnecessarias definições? Para que sobrecarregar-lhes a memoria com estas palavras n'uma idade em que é preciso aproveitar o tempo solicitamente, caridosamente? Não se perverterá assim o entendimento das creancinhas que precisam affecto e amor? (Apoiados.)

Como livro para aprender a ler é opinião de pessoas auctorisadas que merece a geral acceitação, que vae tendo, o de João de Deus. (Apoiados.)

Assignei ha pouco a proposta, que foi apresentada pelo meu illustre amigo o sr. Rocha Peixoto; exige o augmento

do despeza de 6:000$000 réis; entendo, porém, que esta verba póde ser tirada de outra, como proporei, mas declaro desde já que os votaria ainda que não saísse de outra parte do orçamento, tal é a importancia que dou a introduzir-se nas escolas publicas um melhor systema de leitura. (Apoiados.)

Quão grande economia não representa esse systema devido a um homem de superior merecimento, (Apoiados) que se elevou á custa das suas grandes faculdades, (Apoiados) que não vive da intriga, (Apoiados) e que póde ser já considerado como um dos mais distinctos pedagogistas do seu tempo? (Apoiados.)

Se attendermos a que as escolas publicas e particulares são frequentadas por cerca de 200:000 alumnos basta que o methodo de João de Deus permitta aprender a ler em menos dois mezes do que os outros methodos, para que a economia annual que aqui resulta represento 400:000$000 réis por anno; com effeito, se calcularmos em 200 réis por dia o preço medio da alimentação do cada creança, leremos nos dois mezes 12$000 réis, multiplicados pelos réis 200$000, dão 24:000$000 réis; e, admittido que permanece seis annos na escola primaria cada alumno, chega-se aos 400:000$000 réis annuaes; será menor o preço da alimentação do que 200 réis; mas o numero dos alumnos vao crescendo, o tempo economisado excedo muito dois mezes, o methodo applica-se a creanças e a adultos, o a permanencia media na3 escolas é inferior a seis annos.

Tal é o valor do serviço prestado por João de Deus á sua patria. (Apoiados.)

Ainda ha pouco um dos nossos mais illustrados collegas, o sr. dr. Pires de Lima, chamava a minha attenção para outra vantagem do systema; como se a menos tempo cada dia ensinando por elle, póde um só professor instruir em mais de uma escola. Demais, por quasi todos os velhos systemas, a creança era martyrisada; pelo moderno desenvolve-se naturalmente, sente amor pela escola e poios livros. (Apoiados.) E facilitado o ensino da infancia, teremos largamente beneficiado as industrias, que luctam tantas vezes com a dificuldade de obter pessoal habilitado. Leiam se os relatorios de companhias incipientes e comprehender-se-ha melhor o alcance do que acabo do dizer.

E comtudo os nossos operarios são intelligentes e corajosos; a camara conhece o grande elogio que um official da marinha dos Estados Unidos recentemente fez aos operarios do nosso arsenal; comparando-os aos americanos, que os proprios inglezes receiam, não podia dizer dos nossos trabalhadores nada maia agradavel. Quando se inaugurou a ponte Maria Pia, que uno as duas margens do Douro, o distincto engenheiro Eiffel, chefe da notavel casa constructora d'este nome, deu um jantar á imprensa portuense; brindando aos operarios portuguezes, deu testemunho das grandes qualidades d'elles, da sua disciplina, da sua coragem, da sua laboriosidade; considerou 03 tão bons como os francezes; desejei ou saber se n'estas phrases ía mais um. comprimento lisonjeiro do que a severa expressão da verdade; fazendo perguntas particularmente ao sr. Eiffel o a outros engenheiros francezes, soube que aquellas palavras correspondiam aos factos.

Demos, pois, instrucçâo ás classes laboriosas, que ellas progredirão rapidamente. Cuidemos todos da difusão do ensino. Empenham-se n'isto os homens publicos; façam como na Inglaterra; as instituições uteis ao povo são ali fundadas ou auxiliadas tambem por homens que. desempenham papel importante na vida politica. Imite-se entre nós este exemplo; não percamos a actividade nas eleições; saiba cada qual trabalhar fóra do par]amónio a favor do progresso nacional, e deixe que os seus concidadãos o julguem como entenderem no campo da urna. Sem offensa a ninguem, permittam-me dizer que assim os nossos politicos em geral teriam maior auctoridade, a nação comprehenderia melhor os pensamentos d'elles, e os negocios do estado correriam muito melhor,

Sessão de 7 de maio de 1879

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Não termino hoje som fallar das caixas economicas escolares»

Seriam completa novidade em Portugal, apesar do já serem tão numerosas n'outras nações.

Não faço a historia d'esta salutar instituição; alludirei ró aos esforços efficazes empregados em Gand por um dos mais notaveis escriptores d'este seculo, o sabio professor Laurent, tão conhecido pelo3 seus livros de historia o de direito.

O sr. Laurent fez conferencias ácerca das vantagens da economia; percorreu as escolas, dirigiu-se ás classes d'elles. dirigiu-se até a cada alumno; por toda a parte evangelisou as vantagens economicas e morae3 da economia; se bem recordo, cedeu a favor da propagação das caixas economicas escolares um premiado 10:000 francos, conferido a uma excellente lição feita por elle ácerca da economia. Os seus grandiosos esforços foram coroados dos melhores resultados.

Estas caixas recebem dos alumnos quantias pequenissimas, 5 réis até; o professor colhe estas parcellas, e quando chega ao minimo que se pede depositar na caixa economica da localidade, vae entregal-o ahi em nome do respectivo discipulo.

A influencia economica d'esta instituição é enorme; contam-se por milhões as sommas já reunidas por ella. O seu influxo salutar ha familia é ainda maior. As creanças vão para casa educar os velhos ácerca das vantagens de poupar; os paes talvez até então não tinham reflectido n'isto, ou não attentaram no livro que leram na conversação que ouviram a tal respeito; mas quando é a creança quem falla, o ensino vao direito ao coração; é attendido porque prececede de quem o dá conforme o verdadeiro amor.

Ainda o anno passado uma professora húngara contava o seguinte n'um congresso celebrado em París: ella não

acreditava nas caixas economicas escolares; mas rendeu-se á evidencia dos factos; estabeleceu uma para as suas creancinhas; entre varios acontecimentos que provaram a vantagem da instituição, deu-se um que merece ser narrado: o avô de uma das alumnas embriagava-se desde muitos annos; debalde se tentara libertal-o do vicio; um dia a neta fallou-lhe, como ás vezes sabem fallar creanças, ácerca da caixa economica de que ella era depositaria; o antigo ébrio converteu-se em homem economico e bem procedido; aquella creancinha tornara-se apostolo do bem no seio da familia.

.Costumamos dizer que são os paes os que educam os filhos'; mas não só a educação dura toda a vida, mas tambem a melhor parte d'esta é ás vezes a que, se. recebe dos filhos.

Mas eu tenho ainda tanto que dizer á camara sobre instrucção primaria, bem como um pouco sobre bellas artes, e a hora está tão adiantada, que eu peço a v ex.ª que me reserve a palavra para ámanhã.

Vozes: — Muito bem.

(O orador foi comprimentado, por srs. deputados de todos os lados da camara.)

O sr. Presidente: — A ordem do dia para ámanhã é trabalhos em commissões, e para sesta feira é a continuação da que estava dada, e mais o projecto n.º 113.

Está levantada a sessão.

Eram cinco horas a tres quartos da tarde.

Rectificações

Na sessão de 6 de maio de 1879, pag. 1:557, col. 1.ª, lin. 36 e 37, onde se lê =- contestada =' deve ler-se •— contestável —; na lin. 37, onde se lê = o procedimento dos dois chefes de secção da direcção = deve ler-se — a situação de dois chefes de secção na direcção =; nas lin. 46 e 47, onde se lê = por elle ter ido = deve ler-se = de ter elle ido -.

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