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Sessão de 20 de agosto de 1868

PRESIDENCIA DO SR. JOSÉ MARIA DA COSTA E SILVA

Secretarios — os srs.

José Tiberio de Roboredo Sampaio.

José Faria de Pinho Vasconcellos Soares de (Albergaria.

Chamada— 69 srs. deputados.

Presentes á abertura da sessão — os srs.: A. E. de Seabra, Braamcamp, Villaça, Sá Nogueira, Falcão de Mendonça, Ferreira Pontes, Barros e Sá, A. L. de Seabra Junior, Arrobas, Magalhães Aguiar, Faria Barbosa, Lopes Branco, Montenegro, Cunha Vianna, B. F. Abranches, Vellosa do Carvalhal, C. J. Freire, Pereira Brandão, Eduardo Tavares, Fernando de Mello, F. F. de Mello, Albuquerque Couto, Silva Mendes, Gavicho, Bicudo Correia, F. M. da Rocha Peixoto, G. A. Rolla, Guilhermino de Barros, Almeida Araujo, Judice, Santos e Silva, Matos e Camara, Assis Pereira de Mello, João de Deus, Cortez, J. M. da Cunha, João M. de Magalhães, Fradesso da Silveira, Gusmão, Xavier Pinto, J. A. Maia, J. A. Ferreira Galvão, Bandeira de Mello, J. Klerk, Dias Ferreira, Faria Pinho, Carvalho Falcão, Pereira de Carvalho, Vieira de Sá Junior, Costa e Silva, Achioli de Barros, Frazão, Rodrigues de Carvalho, Menezes Toste, Mesquita da Rosa, José de Moraes, José Paulino, Batalhoz, José Tibério, Lourenço de Carvalho, Camara Leme, M. B. da Rocha Peixoto, Motta Veiga, Aralla e Costa, Pereira Dias, Mathias de Carvalho, Paulino e Sousa, R. V. Rodrigues, Ricardo de Mello, Sabino Galrão.

Entraram durante a sessão — os srs.: Annibal, Alves Carneiro, Azevedo Lima, A. J. de Seixas, A. J. Pinto de Magalhães, A. de Faria, Barão da Trovisqueira, Garcez, B. F. da Costa, E. Cabral, Faustino da Gama, Silveira Vianna, Van-Zeller, Noronha Menezes, Faria Blanc, Silveira da Motta, I. J. de Sousa, Freitas e Oliveira, Homem e Vasconcellos, J. A. Vianna, Gaivão, Calça e Pina, J. Pinto de Magalhães, J. T. Lobo d'Avila, Costa Lemos, Mardel Sette, Correia de Oliveira, Teixeira Marques, J. Rodrigues Coelho do Amaral, Alves Ferreira Junior, Penha Fortuna, Limpo de Lacerda, P. A. Franco, P. M. Gonçalves de Freitas, Sebastião do Canto, V. A. Deslandes, Visconde dos, Olivaes.

Não compareceram — os srs.: A. R. de Azevedo, Fevereiro, A. Ornellas, Rocha París, Costa Simões, Ferreira de Mello, A. de Azevedo, A. B. de Menezes, Correia Caldeira, Gomes Brandão, Silva e Cunha, Antas Guerreiro, A. J. da Rocha, A. J. Teixeira, Falcão Povoas, Costa e Almeida, Araujo Queiroz, Torres e Silva, Falcão da Fonseca, Saraiva de Carvalho,. Carlos Testa, C. Vieira da Motta, Conde de Thomar (Antonio) Coelho do Amaral, Dias Lima, F. L. Gomes, Pinto Bessa, Xavier de Moraes, Gaspar Pereira; Meirelles Guerra, Baima de Bastos, Ayres de Campos, Aragão Mascarenhas, Pinto de Vasconcellos, Albuquerque Caldeira, Ribeiro da Silva, Faria Guimarães, Firmo Monteiro Lemos Napoles, Ferraz de Albergaria. Maria Lobo d'Avila, José Maria de Magalhães, Silveira e Sousa, Mendes Leal, Pinto Basto, Levy, Balthasar de Vasconcellos, J. Guerra, Lavado de Brito, Theotonio de Ornellas, Thomás Lobo, Vicente Carlos.

Abertura -A uma hora da tarde.

Leu-se e entrou em discussão a acta da sessão antecedente.

O sr. Gavicho (sobre a acta): — Acabo de ouvir ler a acta, e vejo que d'ella consta que eu rejeitei o parecer da maioria, o approvei o da minoria; por isso preciso explicar este voto, para que se não julgue que estou em discrepancia...

O sr. Presidente: — Isso não é sobre a acta

O Orador: — E exactamente sobre a acta que estou a fallar, e vou dizer porque.

O sr. Presidente: — V. ex.ª sabe melhor do que eu que

não lhe posso dar a palavra agora; se quizer usar d'ella use, mas eu não lh'a posso conceder.

O Orador: — V. ex.ª não m'a póde negar; o que póde é chamar-me á ordem, se vir que eu me desvio d'ella.

O sr. Presidente: — Mas V. ex.ª acaba de dizer que a acta esta exacta.

O Orador: — V. ex.ª continua a interromper-me, e eu não posso fallar. Em V. ex.ª acabando, eu então continuarei. 1 O sr. Presidente: — Póde continuar; mas o que não quero, é que se supponha que não comprehendo as questões.

O Orador: — Comprehende perfeitamente. Posso continuar?

O sr. Presidente: — Póde continuar, e a camara avaliará o que v. ex.ª disser.

O Orador: — A camara e v. ex.ª avaliarão o que vou dizer.

Da acta, como eu disse, consta que rejeitei o parecer da maioria, e approvei o da minoria.

O sr. Presidente: — Mas o que o sr. deputado esta a dizer, nada tem com a approvação ou rejeição da acta.

O Orador: — Se v. ex.ª continua a interromper-me, nem V. ex.ª nem eu nos entendemos. V. ex.ª julga que inter-rompendo-me póde tapar-me a bôca, e por fim ha de convencer-se que assim se consumirá mais tempo.

Dizia eu que da acta consta que rejeitei o parecer da maioria, e approvei o da minoria; e como as minhas idéas a este respeito são sabidas, porque por mais de uma vez as tenho expendido no parlamento, sobre o direito e dever que tem o estado de desamortisar os passaes, e apparecendo o meu nome como tendo rejeitado o parecer da maioria, que respeitava a desamortisação dos passaes, desde já preciso expor o sentido do meu voto.

(Muitos srs. deputados pediram a palavra sobre a acta.)

Vozes: — Não póde ser.

O Orador: — Preciso dizer a rasão por que rejeitei o projecto da maioria, e approvei o da minoria.

O sr. Secretario (José Tiberio): — Se isto esta em discussão, tambem peço a palavra sobre a acta; e todos os srs. deputados que a pedirem, têem igual direito de fallar.

O sr. Presidente: — Mas como é que o illustre deputado se julga superior ao regimento e a tudo?

O sr. Gavicho: — Eu não quero ser superior ao regimento, quero explicar o meu voto.

O sr. Presidente: — Não o póde fazer n'esta occasião; póde reclamar contra a exactidão da acta, e mais nada.

Peço aos srs. deputados que tomem os seus logares.

Ha muitos srs. que pediram a palavra...

O Orador: — V. ex.ª não me póde tirar a palavra.

O sr. Faria Rego: — Então é preciso que todos se expliquem.

O Orador: — Expliquem-se depois; façam o que quizerem, mas não queiram privar-me de fallar agora.

O sr. Presidente: — Mas ha materias importantes a discutir.

O Orador: — Ha materias importantes a discutir, mas ha tambem votos de deputados a explicar.

O sr. Presidente: — Vou consultar a camara.

Os senhores que são de opinião que o sr. Gavicho deve continuar as suas explicações sobre a acta, tenham a bondade de se levantar.

Foi rejeitado.

O sr. Gavicho: — Peço a v. ex.ª que me conceda a palavra para um requerimento antes da ordem do dia.

O sr. Presidente: — Não póde fundamentado.

O Orador: — Bem sei. Escusa V. ex.ª de me ensinar o que devo fazer.

O sr. Presidente: — O regimento manda entrar na ordem do dia á uma hora, depois de approvada a acta; entretanto os senhores que são de opinião que se não execute o regimento n'esta parte, a fim de usar da palavra o sr. Gavicho, tenham a bondade de se levantar.

Não houve vencimento.

Terminado o incidente suscitado pelo sr. Gavicho, foi a acta da sessão antecedente approvada.

EXPEDIENTE

A QUE SE DEU DESTINO PELA MESA

Representação

Da camara municipal do concelho de Sattam, pedindo que, a cabeça do concelho seja transferida da Villa de Igreja para a povoação do Tojal.

A commissão de administração.

Participações

1.ª Participo á camara que o sr. Caetano Vellosa do Carvalhal, deputado pelo Funchal, não compareceu á sessão de hontem, nem á de hoje, e talvez, não comparecerá a mais algumas, por incommodo de saude. = Annibal Alvares da Silva.

2.ª [Participo a v. ex.ª cá camara que, por motivo justificado, deixei de comparecer, ás ultimas sessões. = Camara Leme.

3.ª O sr. Antonio Gonçalves da Silva e Cunha encarregou-me de participar á mesa que esta deixando de comparecer ás sessões por, motivo justificado. =, Costa Simões.

Inteirada

ORDEM DO DIA

Leu-se na mesa e entrou em discussão o seguinte

Projecto de lei n.º 29

Senhoras. — A vossa commissão de legislação examinou a proposta n.° 4-AB, do sr. deputado por Guimarães, Antonio Alves Carneiro, que tem por fim prorogar por cinco annos o praso do registo dos onus reaes, e isentar do pagamento, do pêllo os titulos admissiveis a registo, definitivo ou provisorio, quando fossem celebrados em, papel sem sêllo ou com sêllo inferior anteriormente á lei de 1 de julho de 1867 e respectivo regulamento.

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Quanto ao primeiro ponto a vossa commissão, tendo ouvido o respectivo ministro, é de parecer que o praso concedido pelo § unico do artigo 1:023.° do codigo civil seja elevado a tres annos, não só porque o praso d'aquelle paragrapho é insufficiente, mas, e muito principalmente, porque o registo predial, a mais util e benefica instituição para a propriedade, deve ser executado por fórma que não seja uma lei vexatoria ou que não possa corresponder aos fins a que foi destinada.

O segundo ponto da proposta não parece admissivel. Além de ir alterar leis fiscaes por natureza genericas, em que as excepções seriam revoltantes, privaria o estado de um recurso já votado, e alem d'isso oppor-se-ia a disposições importantes da lei do registo predial que por fórma alguma devem ser alteradas. O registo predial é destinado a ser o tombo da propriedade e a prova unica dos direitos sobre ella. Os titulos admissiveis a registo devem e não podem deixar de ser revestidos de todas as formalidades legaes, e se por um lado parece onerosa a disposição de as obrigar ao sêllo, esse onus desapparece por outro lado, quando se considera que elles não eram admissiveis em juizo sem sêllo e que a disposição apenas antecipa uma formalidade, sem a qual elles seriam reputados sempre illegaes. A estas considerações acresce que a prorogação do praso attenua muito os inconvenientes a que a proposta pretende prover.

Por taes considerações é a vossa commissão de parecer que a proposta seja convertida no seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° No § unico do artigo 1:023.° do codigo civil as palavras «um anno» serão substituidas pelas palavras «tres annos».

Art. 3.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Sala da commissão da legislação, 10 de julho de 1868. = Antonio José da Rocha = José Maria Rodrigues de Carvalho == Carlos Vieira da Motta = Antonio Pequito Seixas de Andrade = Joaquim Antonio de Calça e Pina = Bernardo Francisco de Abranches = José Ildefonso Pereira de Carvalho = Annibal Alvares da Silva = Antonio Roberto de' Oliveira Lopes Branco = Antonio Augusto Ferreira de Mello, relator.

N.º 4-AB

Senhores. — A instituição do registo de hypothecas, direitos e encargos prediaes, estabelecida em todo o reino pela lei de 1 de julho de 1863 e regulada pelo decreto de 4 de agosto de 1864, foi sempre considerada inexequivel em muitas das suas disposições, principalmente na parte relativa ao artigo 197.° da citada lei, em que se estabeleceu o preceito de que os onus reaes não registados ao tempo da sua publicação só poderiam ser oppostos a terceiros durante o praso de um anno, a contar desde a publicação do regulamento geral que se fizesse para a sua execução.

A experiencia mostrou logo que a citada lei e regulamento tiveram principio de execução, que era materialmente impossivel registar dentro do praso de um anno milhares de onus reaes, que pesavam sobre a propriedade de todo o paiz, e n'este sentido muitas reclamações particulares e de diversas corporações o estabelecimentos de beneficencia foram dirigidas aos poderes publicos, pedindo a prorogação d'aquelle praso de tempo. Essas reclamações porém nunca tiveram logar para ser attendidas.

Veiu depois o codigo civil, que principiando a ter força de execução em 22 de março do corrente anno, acabou com o praso d'aquella lei, mas não removeu ainda a difficuldade ou antes a impossibilidade de effectuar o mesmo registo dentro do novo praso marcado pelo mesmo codigo no artigo 1:023.° § unico, onde se determina que os onus com registo posterior ao da hypotheca ou transmissão não acompanham o predio, excepto os constituidos antes da promulgação do codigo que forem registados dentro do praso de um anno, contado desde a mesma promulgação.

Esta disposição não fez mais do que prorogar o praso por outro anno, tempo este ainda insufficientissimo para poder levar-se a effeito o registo do milhares e milhares de onuos reaes, principalmente em emphyteuse e servidão, que affectam a propriedade, e com mais força na bella provincia do Minho, onde será difficil encontrar um predio que não esteja sujeito a um onus d'aquella natureza.

Elevar-se pois aquelle praso ao de cinco annos, pelo me nos, é uma necessidade palpitante e reconhecida por todos, a fim de que se torne exequivel o preceito da lei salutares 03 seus effeitos, e é essa providencia q"ue tenho a honra de propor-vos, convencido de que será ella de uma manifesta utilidade publica.

Mas alem d'isto a lei de 1 de julho de 1863 e seu regulamento de 4 de agosto de 1864 tornou o registo excessivamente vexatorio, porque estabeleceu um pesado tributo lançado sobre todo o paiz. Este grande mal, que tem impossibilitado o registo e concorrido poderosamente para um geral desgosto, foi em parte attenuado pelo regulamento de 14 do corrente mez e anno, mas não alliviou o registante do pesadissimo tributo do sêllo, a que esta obrigado pelos titulos admittidos a registo provisorio e definitivo, e nem podia fazer, porque um regulamento não póde alterar uma disposição legislativa qual é na questão sujeita, a lei do sêllo de 1 de julho de 1867.

No regulamento de 4 de setembro do mesmo anno tabella n.° 1, classe 9.ª e n.° 8; auctorisado por aquella lei determina-se que todos os documentos que não tenham sido sellados, ou que não foram escriptos, impressos lithographados ou estampados em papel sellado que tenham de se juntar n requerimentos' que' se dirijam a tribunaes ou repartições publicas de qualquer ordem que sejam, pagarão de sêllo em cada meia folha 60 réis, é quando tenham sêllo inferior pagarão a differença.

Esta disposição obriga portanto a sellar todos os titulos que podem ser admittidos ao registo provisorio ou definitivo, e que tenham sido celebrados em papel sem sêllo ou sêllo inferior anteriormente áquella lei. Estes titulos designados pelos artigos 967.° e 978.° do codigo civil, taes como cartas de sentença, autos de conciliação, certidões de deliberações do conselho de familia, escripturas, testamentos, titulos de estabelecimentos descredito predial, etc.. são por sua natureza volumosos, e alguns d'elles, como escripturas de emprazamentos, volumosissimos. Obrigar pois a sellar cada meia folha de papel d'estes documentos com o sêllo de 60 réis, é lançar em todo o paiz um pesado tributo, o difficultar senão impossibilitar para muitos a execução da lei do registo.

Para obviar pois a estes inconvenientes tenho a honra de submetter á vossa illustrada apreciação o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° Fica elevado a cinco annos o praso marcado no § unico do artigo 1:023.° do codigo civil, para os effeitos consignados no mesmo paragrapho.

Art. 2.° Ficam isentos do pagamento do sêllo estabelecido na tabella n.° 1, classe 9.*, n.° 8 do regulamento da lei de 1 de julho de 1867 todos os titulos que podem ser admittidos ao registo provisorio e definitivo, na fórma dos artigos 967.° e 978.° do mesmo codigo, e que tenham sido escriptos ou celebrados em papel sem sêllo ou sêllo inferior anteriormente áquella lei.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario. Sala das sessões da camara, 22 de maio de 1868. = O deputado pelo 1.° circulo de Guimarães, Antonio Alves Carneiro.

O sr. Barros e Sá: — Não tenho reflexões a fazer contra o artigo 1.°, antes pela contrario approvo-o e adopto-o; mas peço licença para em brevissimas palavras dizer o que penso a respeito do artigo 2.° do projecto primitivo do illustre deputado, o sr. Alves Carneiro, que a commissão entendeu não dever approvar.

O artigo 2.° do projecto do sr. Alves Carneiro, que sinto não ver presente, tinha por fim poderem ser admittidos a registo os documentos que foram inscriptos em papel sem sêllo na epocha em que o sêllo não era lei obrigatoria, em que não havia este imposto, ou que foram escriptos no tempo em que o sêllo era inferior em custo ao actual.

A commissão rejeitou o artigo 2.°, e eu não posso conformar-me com a rejeição d'esse artigo do projecto primitivo. Vou dar as rasões.

Em primeiro logar ha um principio de eterna justiça e equidade consignado em todas as legislações, de que as leis não têem effeito retroactivo. Querer, por exemplo, que eu, que tenho um documento escripto em papel com o sêllo de 40 réis, ou uma carta de sentença, que o vá sellar com um sêllo de 60 réis, é dar effeito retroactivo a lei até ao dia em que esse papel foi escripto.

Em segundo logar ha outro principio que determina que em todas as solemnidades extremas em documentos publicos devem ser feitos, segundo a legislação do paiz em que foram feitas. N'estas solemnidades ha de cumprir-se a lei que vigorava n'essa epocha, e bem assim no logar em que foram feitos os documentos. Por exemplo, um documento escripto ou lavrado em Portugal ha de ser feito com as solemnidades da legislação portugueza, e não com as da franceza.

Um documento escripto deve-o ser e authenticado tambem com as solemnidades que vigoraram n'essa epocha, e não com as de hoje. As solemnidades do dia de hontem va tem por esse dia e por todos os que se seguirem até á eternidade dos seculos. Querer o contrario é querer contrariar não só o principio da não retroactividade das leis, mas inaugurar um outro tão injusto como este de que os documentos devam ser feitos com as solemnidades de uma lei que não existia. Isto importa tambem uma lei tributaria.

Portanto cuido que annunciei claramente as minhas idéas, e não posso dar a ellas uma grande amplitude, porque estorvava o fim a que nos propomos; mas tomo a iniciativa do artigo 2.º do projecto primitivo, e proponho que, do pois de approvado o artigo 1.°, com o qual concordo, seja substituido ao artigo 2.° do projecto pelo artigo 2.° do sr. Alves Carneiro.

O sr. B. F. de Abranches: — As reflexões que acabou de fazer o sr. Barros e Sá são justas, e até certo ponto legaes.

A commissão não deixou de reconhecer o principio de que as leis não devem ter o effeito retroactivo, e por consequencia não deixou de reconhecer as rasões ponderadas por s. ex.ª; porém, considerando que o regulamento da lei de 1 de julho de 1867 teve por fim augmentar o imposto do sêllo, decretando a retroactividade, tanto assim que ordenou que nos documentos de sêllo inferior, quando fôssem apresentados, se pagasse o sêllo addicional, não podia, sem alterar aquelle regulamento, aceitar a disposição do artigo 2.° do projecto de lei apresentado pelo sr. deputado Alves Carneiro, renovada agora pelo sr. Barros e Sá, sem primeiro ouvir a illustre commissão de fazenda.

Sem esse parecer não podia, a commissão de legislação adoptar um. principio contrario ao que já se achava estabelecido, e que o estava não só com relação aos documentos que não tinham sêllo na epocha em que foram feitos, como tambem com relação aos documentos de sêllo inferior.

Por consequencia a camara póde votar como quizer, mas se o illustre deputado insistir em que subsista o artigo 2.° do projecto de lei apresentado pelo sr. Alves Carneiro, declaro que, por parte da commissão, requeiro que essa proposta seja remettida á commissão de fazenda, de modo que a camara não haja de emittir o seu voto sem que ai commissão de fazenda seja primeiro ouvida.

O sr. Barros e Sá: — Eu não vejo destruidos os principios em que firmei a minha opinião, porque são indestructiveis.

Não ha nada mais santo e mais justo do que o principio da não retroactividade das leis.

A rasão que apresentou o sr. Abranches é para mim incomprehensivel. Admittir o principio e ficar parado diante d'elle, porque ha um regulamento que o contraria, não é logico.

O sr. Abranches: — Não ha um regulamento, ha uma lei.

O Orador: — Não ha lei, ha um regulamento, e este póde ter a força de lei, mas foi feito em virtude de um voto. de auctorisação, o que nos deve levar a ser mais parcos em dar votos de confiança.

Em todo o caso o principio da não retroactividade é santo, justo e incontestavel, bem como o outro principio de que os documentos devem ser feitos com as solemnidades legaes que vigoram nos dias em que são feitos. O contra* rio d'isto não só é injusto, mas inconstitucional.

Admittir um principio que se reconhece santo e justo, e dizer que é necessario ouvir a commissão de fazenda é o mesmo que dizer que para dar cumprimento á constituição é preciso o voto da commissão de fazenda.

Requeiro a v. ex.ª que proponha á votação o artigo 2.°' do projecto do sr. Alves Carneiro, e a camara resolverá como entender.

O sr. Faria Barbosa: — Estou de accordo com as rasões apresentadas pelo sr. Barros e Sá, e admira-me os escrupulos do sr. relator da commissão. O sr. Abranches: — Não sou relator. O Orador: — Ou do membro da commissão, por isso. mesmo que tem um exemplo.

No judiciario ha processos ainda do primeiro sêllo, e apesar de haver uma lei que augmenta o preço do sêllo, o processo esta valido.

Já por duas ou mais vezes tem augmentado o preço do sêllo, e o processo sellado com o sêllo mais barato não deixou de continuar a valer, por consequencia apresenta-se agora uma injustiça.

Eu reconheço que é da maior justiça que a lei do sêllo novo não tenha effeito retroactivo e que se não obrigue a sellar novamente os documentos que uma lei julga legaes, e que como taes passaram em juizo.

Portanto n'esta conformidade não tenho duvida alguma em approvar o artigo 2.° do projecto do sr. Alves Carneiro.

O sr. Presidente: — Devo lembrar á camara que ha uma resolução antiga para que se não vote projecto de lei algum que possa influir na receita publica, sem que seja sobre elle ouvida a commissão de fazenda.

Portanto, se o sr. Barros e Sá insiste no seu requerimento, eu ponho á votação o requerimento do sr. Abranches para que o projecto vá á commissão de fazenda.

O sr. José de Moraes: — Eu entendo que v. ex.ª deve propor á votação o requerimento do sr. Abranches, para que o artigo 2.° do projecto do sr. Alves Carneiro vá á commissão de fazenda. Se a camara decidir affirmativamente, entendo comtudo que devemos votar este projecto tal qual esta, porque é de alta conveniencia publica, embora fique dependente, como deve ficar, da resolução da camara, o artigo 2.° do projecto do sr. Alves Carneiro;

O sr. Barros e Sá: — Eu desisto do meu requerimento, para não complicar a questão mais (apoiados).

Posto a votos o projecto, foi approvado em todos os seus artigos.

O sr. Santos e Silva (por parte da commissão de redacção): — Foi-me agora entregue uma proposta do sr. Rodrigues de Azevedo a respeito do projecto n.° 1, cujas emendas nós já discutimos, tendo sido rejeitados hontem os pareceres da maioria e da minoria.

Vejo-me embaraçado sobre se devo ou não dar collocação no projecto de lei a este additamento, porque effectivamente não sei se á vista das votações, que hontem tiveram logar, caducou ou não similhante proposta.

O paragrapho do sr. Rodrigues de Azevedo diz o seguinte (leu).

V. ex.ª e a camara reconhecem, que a commissão de redacção não tem outra cousa a fazer senão inserir convenientemente nos projectos de lei todas as propostas, que forem approvadas, áparte algum lapso grammatical, que possa haver n'ellas.

A commissão não cumpre acrescentar idéas, nem tirar idéas ás emendas, votadas pela camara. Eu desejo, como decerto todos desejam, que as leis sáiam das nossas mãos o mais perfeitas que for possivel; e que n'ellas não haja redundancias nem contradicções. Portanto entro em duvida, se, depois das votações que hontem tiveram logar, devo ou não incorporar na lei a proposta do sr. Rodrigues de Azevedo, proposta que ha dias foi approvada;

Pedia pois a v. ex.ª tivesse a bondade de provocar da camara um voto qualquer, ou uma resolução sobre isto. A commissão de redacção ha de immediatamente cumprir com o seu dever, em harmonia com as resoluções da camara.

Nada mais tenho a dizer.

O sr. Presidente: — Eu não posso dizer qual é a minha opinião; mas o que é verdade é que a commissão; sob responsabilidade sua, tem obrigação de dar um parecer para ser submettido discussão, podendo n'essa occasião apresentasse qualquer duvida que a camara tenha Mas esta discussão só póde ter por base o parecer da commissão de redacção.

O sr. Santos e Silva: — A commissão de redacção, sem ouvir o voto ou a opinião da camara sobre esta moção, - não esta habilitada para podér redigir um parecer a este respeito. Se v. ex.ª não quer consultar a camara n'este sentido, ou não quer provocar uma resolução; eu desde já declaro que não posso tomar conta da emenda, e v. ex.ª tem de nomear outra commissão de redacção para dar um pa-

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recer qualquer. No momento actual considero-me na impossibilidade de proceder por outra fórma.

O sr. Presidente: — Eu disse qual era a minha opinião individual.

O Orador: — Eu desejava que n'estes ultimos dias de sessão V. ex.ª não saísse da placidez com que costuma dirigir os trabalhos, porque hoje esta com muita disposição para o dialogo. Permitta-me v. ex.ª esta pequena observação, que é benevola.

(Varios srs. deputados pedem a palavra.)

O sr. Presidente: — Eu não dou a palavra a nenhum sr. deputado, porque não esta nada em discussão, nem esta presente o governo.

O Orador: — Eu o que desejo é que haja discussão; d'ella é que ha de saír a opinião actual da camara. Só assim poderemos saber os termos em que a lei é concebida, e deverá ser redigida. Esta questão não é do governo, é da camara (apoiados). Em summa a commissão de redacção precisa, por qualquer fórma, ser esclarecida. Insisto n'este ponto. A camara conhece o seu alcance.

O sr. Sá Nogueira: — Segundo o que ouvia ao illustre deputado, s. ex.ª o que apresentou aqui foi a sua opinião individual, e não a da commissão, por consequencia não a devia trazer aqui sem se ter discutido esta materia na commissão de redacção. Vou dizer como entendi sempre a questão.

A proposta do sr. Rodrigues d’Azevedo ficou considerada tal qual o sr. deputado a fez; depois vieram additamentos, que se podiam fazer, ou ampliativos ou restrictivos, e a camara podia votar o que quizesse, sem reconsideração alguma. Não me refiro a mim, porque votei sempre do mesmo modo. Mas o que aconteceu foi, que a camara não quiz additamento algum, nem restrictivo nem ampliativo; o que quer pois a camara? É que fique de pé o que votou, isto é, a proposta do sr. Rodrigues de Azevedo, tal qual a apresentou e a camara a votou.

Não póde portanto haver duvida alguma a este respeito. Se s. ex.ª tem duvidas, deve apresenta-las á commissão de redacção, e ella que dê o seu parecer para a camara resolver ou acabando com ellas, ou encarregando outras pessoas de fazerem a redacção da lei.

Creio que é o que ha a fazer, porque não podemos estar a perder tempo, quando ha projectos importantes de que a camara deve tomar conhecimento. Não""podemos estar a perder tempo com objectos que as commissões se devem encarregar, e trazer para aqui preparados, e não vir pedir explicações á camara.

O sr. Santos e Silva: — A commissão de redacção é composta de tres membros, e um d'elles tem exactamente as mesmas duvidas que eu tenho. O meu collega não quiz dar parecer sobre a emenda, e devolveu-m'a.

Por consequencia estamos ambos no mesmo estado de duvida, e o terceiro membro não esta presente. Mas como os dois constituímos maioria, desde que declarâmos não estarmos habilitados para dar um parecer antes de ouvirmos a opinião da camara, caducam as censuras ou advertencias mais ou menos ponderosas que foram feitas por um membro d'esta camara, a quem muito respeito.

Não pretendo protrahir o debate nem roubar tempo á camara, que util e necessario é para outros projectos; mas effectivamente tenho duvidas, e duvidas serias sobre o modo de considerar este additamento.

Se a camara é de opinião que elle não caducou, immediatamente vae ser inserido no projecto. Desejaria pois que v. ex.ª provocasse uma votação da camara a este respeito.

Era isto o que tinha a responder.

O sr. Mendonça Cortez: — A camara, nas duas decisões que tomou, nada tem que ver com a sua anterior votação sobre o additamento do sr. Rodrigues de Azevedo. Nem isso podia ser, porquanto nem as votações de hontem foram sobre o additamento do sr. Azevedo, mas sobre pareceres muitos outros, nem se podiam referir á redacção do artigo 1.° e do seu § unico, porque o sr. relator da commissão acaba de nos dizer que só agora é que o additamento lhe foi remettido, e não podia ser ter havido votação sobre um objecto ainda não considerado pela commissão.

Se s. ex.ª e a commissão de redacção não estão habilitados para darem o seu parecer, n'esse caso tem logar a proposta de s. ex.ª, e a camara tem de nomear uma nova commissão.

Em todo o caso isto deve ser attendido, mas só e unicamente debaixo do ponto de vista de haver uma commissão de redacção que accome o additamento ao artigo.

O que não se póde admittir é qualquer das duas asserções.

A primeira, que a camara reconsiderou ou reconsidera. A camara não reconsiderou cousa alguma, porque nada o prova; não reconsidera, porque não sente necessidade d'isso.

A segunda, que a camara, votando o que votou, prejudicou o additamento do sr. Rodrigues de Azevedo. Não prejudicou, porque a sua interpretação esta nas votações da camara, no espirito do artigo 1.°, e nas declarações do governo aceitas pela camara.

O sr. Barros e Sá: — Mando para a mesa o seguinte requerimento (leu).

O sr. Secretario (José Tiberio): — Por parte da mesa tenho a declarar á camara que a mesa entendeu que devia ir á commissão o additamento, por isso que foi votado pela camara em seguida ao artigo 1.°

Não houve votação alguma da camara que annullasse essa primeira votação, por consequencia a rejeição dos pareceres não invalidou a votação sobre o assumpto, e tanto mais que nenhum d'esses pareceres se referia ao additamento do sr. Rodrigues de Azevedo.

O sr. Presidente: — Vae entrar em discussão o projecto de lei n.° 13.

Leu-se na mesa e entrou em discussão o seguinte

Projecto de lei n.º 13

Senhores. — Á commissão de administração publica foi presente a proposta de lei do ministerio do reino n.° 7-A, que tem por fim auctorisar a camara municipal do concelho do Seixal a levantar um emprestimo de 10:000$000 réis para obras de reconhecida utilidade municipal. A commissão, considerando que o relatorio e a proposta do governo foram precedidos pelo respectivo processo preparatorio que, nos termos dos artigos 122.° n.° 1.° e 126.° § unico do codigo administrativo, são formalidades essenciaes para que o poder legislativo possa auctorisar a deliberação camararia;

Considerando que para a amortisação do capital e pagamento do juro não são os encargos do emprestimo superiores ás forças do concelho, e não alteram a sua situação financeira;

Considerando que para extincção do emprestimo fica subsistindo a consignação especial das quantias votadas pelos artigos 5.° e 6.° da lei de 23 de abril de 1859, que auctorisou a mesma camara municipal a contrahir um emprestimo até á quantia de 8:000*000 réis;

Considerando que o novo emprestimo não será realisado, sem que o anterior esteja inteiramente satisfeito;

Considerando que os melhoramentos publicos reclamados pela camara peticionaria, com assistencia do conselho municipal, são de reconhecida e urgente vantagem;

Considerando porém que os principios economicos indicam a conveniencia de additar ao artigo 8.° da proposta de lei em termos amplos e resolutivos o preceito do artigo final da lei de 23 de abril de 1859, cessando o imposto de barreiras logo que se ultime a solução do emprestimo;

Considerando que a proposta de lei não só especifica a applicação exclusiva do emprestimo, cuja opportunidade e conveniencia são justificadas pelo destino que lhe é dado, mas desenvolve tambem as condições economicas e administrativas que devem garantir a fiel operação de credito, sujeitando a camara á fiscalisação tutelar do governo e do conselho do districto:

Por estes motivos e pelas rasões que a sabedoria da camara ha de supprir, é de parecer a commissão, de accordo com o governo, que a proposta seja convertida no seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É auctorisada a camara municipal do Seixal a levantar por emprestimo a quantia de 10:000*000 réis, a juro que não exceda a 7 por cento ao anno.

Art. 2.° O emprestimo será exclusivamente applicado:

1.° Ao acabamento da casa da escola de instrucção primaria; f

2.° A construcção do uma muralha na freguezia da Amora, desde a fonte da Prata até á travessa da Amoreira;

3.° A abertura de quatro poços de agua potavel, sendo um na Torre da Marinha, freguezia da Arrentella, outro nos fóros da freguezia da Amora, outro na freguezia de Paio Pires, outro no largo da Estalagem, freguezia do Seixal;

4.° A construcção e reconstrucção das calçadas nas quatro freguezias do concelho;

5.° A construcção de pequenos bocados de muralha na estrada que liga o Seixal á Arrentella.

Art. 3.° O emprestimo será levantado por series, precedendo licença do governo, a qual sómente será dada á medida que as sommas a levantar forem necessarias para o pagamento da despeza com as obras em andamento, e provada a existencia dos meios precisos para o juro e amortisação do emprestimo.

Art. 4.° O emprestimo poderá ser contratado com quaesquer bancos ou sociedades de credito, por concurso publico, ou por meio de acções, como melhor parecer ao governo, ouvido o conselho de districto.

Art. 5.° Se o emprestimo for levantado por meio de acções, a amortisação far-se-ha por sorteio publico no dia 31 de dezembro de cada anno. Se for contratado por modo diverso, far-se-ha a amortisação pelo modo que for accordado entre a camara e os mutuantes, e se for contratado por annuidades, as prestações semestraes serão pagas nos prasos convencionados.

Art. 6.° As obras a que e destinado o emprestimo poderão ser feitas por administração ou por arrematação em hasta publica, no todo ou em parte, segundo parecer conveniente ao conselho de districto.

Art. 7.° Ao pagamento do juro e amortisação d'este emprestimo são applicados os mesmos rendimentos que constituiam a dotação do outro emprestimo de 8:000*000 réis, que a camara foi auctorisada a contrahir pela lei de 23 de abril de 1859, logo que este se mostre inteiramente pago.

Art. 8.° Os direitos de barreira a receber na ponte e caes do Seixal serão regulados pelas disposições da lei citada e ficarão extinctos logo que se ultime a solução do emprestimo auctorisado pela presente lei.

Art. 9.° A dotação do novo emprestimo será inscripta no orçamento do concelho em capitulo especial, sem o que não poderá ser approvado o mesmo orçamento*

Art. 10.° Os vereadores e quaesquer outros funccionarios que effectuarem, auxiliarem ou approvarem o desvio das quantias mutuadas ou dos rendimentos e impostos que lhes servem de garantia para qualquer applicação diversa da que lhes é prescripta por esta lei, incorrerão nas penas do artigo 54.° da de 26 de agosto de 1848.

Art. 11.0 Fica revogada a legislação em contrario.

Sala da commissão, 14 de agosto de 1868. — --Anselmo José Braamcamp = Francisco Antonio da Silva Mendes = Antonio Xavier Torres e Silva = João José Antunes Mascarenhas Gaivão = Manuel Bento da Rocha Peixoto = João Antonio dos Santos e Silva = Francisco Van-Zeller.

N.º 7-A.

Senhores. — A camara municipal do Seixal pretende levantar um emprestimo de 10:000$00 réis, para applicar o producto d'elle ás obras municipaes que são mencionadas na proposta de lei que tenho a honra de apresentar-vos.

Não póde contestar-se a utilidade das obras que a camara projecta, porque ellas têem por fim o melhoramento da viação, o abastecimento de agua potavel, de que ha grande escassez nas povoações do concelho, e o acabamento da escola começada a construir com o legado deixado pelo conde de Ferreira.

Os encargos do emprestimo não alteram a situação financeira do concelho, porque os rendimentos destinados para pagamento do juro e da amortisação são os mesmos que até agora se applicavam ao custeio de um outro emprestimo de 8:000*000 réis auctorisado pela lei de 23 de abril de 1859, emprestimo que estará amortisado dentro de poucos mezes.

Estes rendimentos são sufficientes para o pagamento do juro e para uma amortisação tal, que não demande um longo numero de annos o pagamento integral do emprestimo.

N'estas circumstancias, e concordando o conselho de districto e o governador civil de Lisboa, na utilidade da operação de credito de que se trata, e achando-se tambem instruido o processo com os meios de informação precisos para que o poder legislativo possa apreciar devidamente a opportunidade e conveniencia do projectado emprestimo, submetto por isso á vossa consideração a seguinte proposta de lei,

Artigo 1.° É auctorisada a camara municipal do Seixal a levantar por emprestimo a quantia de 10:000$000 réis, a juro que não exceda a 7 por cento ao anno.

Art. 2.° O emprestimo será exclusivamente applicado:

1.° Ao acabamento da casa da escola de instrucção primaria;

2.° Á construcção de uma muralha na freguezia da Amora, desde a fonte da Prata até á travessa da Amoreira;

3.° Á abertura de quatro poços de agua potavel, sendo um na Torre da Marinha, freguezia de Arrentella, outro nos fóros da freguezia da Amora, outro na freguezia de Paio Pires, e outro no largo da Estalagem, freguezia do Seixal;

4.° A construcção e reconstrucção das calçadas nas quatro freguezias do concelho;

5.° Á construcção de pequenos bocados de muralha na estrada que liga o Seixal á Arrentella.

Art. 3.° O emprestimo será levantado por series, precedendo licença do governo, a qual sómente será dada á medida que as sommas a levantar forem necessarias para o pagamento da despeza com as obras em andamento, e provada a existencia dos meios precisos para o juro e amortisação do emprestimo.

Art. 4.° O emprestimo poderá ser contratado com quaesquer bancos ou sociedades de credito, por concurso publico, ou por meio de acções, como melhor parecer ao governo, ouvido o conselho de districto.

Art. 5.° Se o emprestimo for levantado por meio de acções a amortisação far-se-ha por sorteio publico no dia 31 de dezembro de cada anno; se for contratado por modo diverso far-se-ha a amortisação pelo modo que for accordado entre a camara e os mutuantes; e so for contratado por annuidades as prestações semestraes serão pagas nos prasos convencionados.

Art. 6.° As obras a que é destinado o emprestimo poderão ser feitas por administração ou por arrematação em hasta publica, no todo ou em parte, segundo parecer conveniente ao conselho de districto.

Art. 7.° Ao pagamento do juro e amortisação d'este emprestimo são applicados os mesmos rendimentos que constituiam a dotação do outro emprestimo de 8:000$000 réis, que a camara foi auctorisada a contrahir pela lei de 23 de abril de 1859, logo que este se mostre inteiramente pago.

Art. 8.° Os direitos de barreira a receber ria ponte e caes do Seixal serão regulados pelas disposições da lei citada.

Art. 9.° A dotação do novo emprestimo será inscripta no orçamento do concelho em capitulo especial, sem o que não poderá ser approvado o mesmo orçamento.

Art. 10.° Os vereadores e quaesquer outros funccionarios que effectuarem, auxiliarem ou approvarem o desvio das quantias mutuadas, ou dos rendimentos e impostos que lhes servem de garantia, para qualquer applicação diversa da que lhes é prescripta por esta lei, incorrerão nas penas do artigo 54.° da de 26 de agosto de 1848.

Art. 11.º Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria d'estado dos negocios do reino, em 6 de agosto de 1868. =. Antonio, Bispo de Vizeu.

Foi approvado sem discussão.

Entrou em discussão e foi logo approvado o seguinte Projecto de lei n.° 4

Senhores. — A vossa commissão de legislação examinou com a devida attenção o projecto de lei n.° 1-FQ do sr. deputado Antonio do Rego de Faria Barbosa, e que tem por fim tornar extensivas aos depositarios geraes das comarcas judiciaes das provincias do continente e ilhas adjacentes as vantagens que os alvarás de 21 de maio de 1751 e 25 de agosto de 1774 concederam ás juntas dos depositos publicos de Lisboa e Porto, em remuneração do seu trabalho e responsabilidade; e

Considerando que o premio estabelecido nos citado» alvarás de 1 por cento do valor das peças de oiro, prata, pedras preciosas e dinheiro liquido, e 2 por cento do preço da arrematação dos bens moveis corruptíveis, levados ao deposito por ordem judicial, não póde ser percebido pelos depositarios geraes das outras terras do reino, sem lei que o auctorise, porque tendo a natureza de tributo, não se legitima pela simples analogia dos depositos publicos de Lisboa e Porto;

Considerando que a favor daquelles depositarios militam as mesmas rasões que determinaram a concessão do premio

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ás juntas dos depositos de Lisboa e Porto, pois que do mesmo modo estão sujeitos ao incommodo e responsabilidade inherentes á guarda e conservação dos objectos depositados;

Por estas rasões tem a honra de submetter á vossa illustrada apreciação o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° São applicaveis aos depositarios geraes das comarcas judiciaes das provincias do continente e ilhas adjacentes as disposições do capitulo 5.° do alvará de 21 de maio de 1751, e § 16.° do alvará de 25 de agosto de 1774, quanto ao premio ou percentagem pela guarda e conservação dos objectos levados aos depositos publicos de Lisboa e Porto por ordem judicial.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala da commissão, 3 de agosto de 1868. = Antonio José da Rocha = Antonio Roberto de Oliveira Lopes Branco = Manuel Joaquim Penha Fortuna = Annibal Alvares da Silva = José Ildefonso Pereira de Carvalho = Antonio Augusto Ferreira de Mello = Bernardo Francisco de Abranches = Joaquim Antonio de Calça e Pina = José Maria Rodrigues de Carvalho, relator.

N.º 1-FQ

Renovo a iniciativa da proposta n.° 125, apresentada em 1864, sobre os thesoureiros dos cofres do geral, e já renovada por mim em 1867, a fim de seguir os tramites legaes.

Sala das sessões, 5 de maio de 1868. = O deputado, Antonio do Rego de Faria Barbosa.

N.º 125 _

Senhores. — A commissão de legislação, tendo examinado a representação que alguns depositarios judiciaes da provincia do Minho dirigiram a esta camara, pedindo que lhes seja applicada a disposição do capitulo 5.° do alvará de 21 de maio de 1751, que conferiu ás juntas do deposito publico de Lisboa e Porto uma percentagem dos dinheiros e mais objectos depositados, como premio pela guarda e conservação dos mesmos; é de parecer que, militando a favor dos depositarios judiciaes das provincias as mesmas rasões que motivaram o dito premio ás juntas de Lisboa e Porto, pois que, não menos que a estas cabe áquelles grave incommodo e responsabilidade.com a guarda e conservação dos objectos depositados, pelos quaes respondem com fiança e hypotheca geral de seus bens, se deve attender ao seu pedido, conferindo-se-lhes a mesma percentagem que a lei já concede ás juntas das duas cidades; e por isso tem a honra de submetter á vossa approvação o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º E applicavel aos depositarios geraes das comarcas judiciaes das provincias do continente e ilhas adjacentes a disposição do capitulo 5.° do alvará de 21 de maio de 1751, quanto á percentagem pela guarda e conservação dos objectos depositados.

§ unico. A disposição d'este artigo não se entende com os depositos orphanologicos, que continuarão a ser gratuitos.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala da commissão, 25 de maio de 1864. = José de Oliveira Baptista = Bernardo de Albuquerque Amaral = Annibal Alvares da Silva = José Maria da Costa e Silva = Antonio Ayres de Gouveia = Albino Augusto Garcia de Lima = João Rodrigues da Cunha Aragão Mascarenhas = Antonio Carlos da Maia, relator.

O sr. Presidente: — Vae entrar em discussão o projecto de lei n.° 15.

E o seguinte:

Projecto de lei n.º 15

Senhores. — A vossa commissão de fazenda foi presente a proposta de lei n.° 14-A, em que o governo pede auctorisação para despender, no actual anno economico, até á quantia de 100:000$000 réis, destinados á construcção de uma ponte na alfandega de Lisboa, com as condições necessarias para n'ella se effectuarem as descargas e carregamentos de embarcações, que transportarem generos e mercadorias para a mesma alfandega, ou d'esta para exportação e reexportação. O juro e amortisação da somma indicada serão satisfeitos pelo producto da tarifa que o governo deverá estabelecer para as cargas e descargas, devendo este imposto ser inferior áquelle que o commercio actualmente faz com este serviço.

A vossa commissão de fazenda, reconhecendo as innegaveis vantagens que resultam para o commercio da capital de similhante melhoramento, vantagens que são tão evidentes, que dispensam qualquer demonstração; considerando por outro lado que a construcção da ponte não aggrava as difficuldades do orçamento, porque o juro e a amortisação do capital hão de ser cobertos pelo producto de uma tarifa rasoavel, que será calculada de fórma que não deixe a descoberto differenças que tenham de ser suppridas pelo thesouro:

É de parecer que a proposta do governo seja convertida no seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É o governo auctorisado a despender, no actual anno economico, até á somma de 100:000$000 réis, na construcção de uma ponte com as condições necessarias para n'ella se effectuarem as descargas e cargas das embarcações que trouxerem generos e mercadorias para a alfandega de Lisboa, ou da mesma alfandega as receberem para exportação e reexportação.

' Art. 2.° O juro e amortisação da somma que o governo for obrigado a levantar para este fim serão pagos pelo producto da tarifa, que o governo fica auctorisado a estabelecer para as descargas e cargas pela ponte, devendo a despeza ser inferior á que o commercio faz actualmente com aquelle serviço.

Art. 3.° O governo dará conta ás côrtes do uso que fizer das auctorisações que lhe são concedidas por esta lei.

Art. 4.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala da commissão, em 18 de agosto de 1868. = Antonio Maria Barreiros Arrobas = Hermenegildo Augusto de Faria Blanc = Francisco Van-Zeller = José Dias Ferreira

= José Maria Rodrigues de Carvalho = Antonio Joaquim Ferreira Pontes = João Antonio dos Santos e Silva, relator.

N.º l4-A

Senhores. — O embarque e desembarque dos generos que alimentam o commercio de Lisboa effectuam-se em condições tão desvantajosas, que tornam este ramo de serviço alem de incommodo excessivamente caro.

Por muitas vezes tem o commercio representado sobre a necessidade de occorrer a tão grave inconveniente, que esta privando o porto de Lisboa de muitas das vantagens que lhe confere a superioridade da sua situação geographica. Diversos governos têem consagrado a sua attenção a tão importante assumpto, e não faltam relatorios, consultas e orçamentos, á vista dos quaes se póde formar exacta idéa, não só da utilidade das obras a emprehender, como dos meios que para as realisar ha facilidade de conseguir.

A benemerita classe commercial de Lisboa tem-se mostrado sempre disposta a auxiliar o governo para se chegar a um prompto resultado. Insta pois que se possa desde já aproveitar do que até agora se ha feito, preparando os trabalhos preliminares, e é por isso que o governo vem submetter á vossa consideração a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.° E o governo auctorisado a despender, no actual anno economico, até á somma de 100:000$000 réis na construcção de uma ponte com as condições necessarias para n'ella se effectuarem as descargas, e cargas das embarcações que trouxerem generos e mercadorias para a alfandega de Lisboa, ou da mesma alfandega as receberem para exportação e reexportação.

Art. 2.° O juro e amortisação da somma que o governo for obrigado a levantar para este fim serão pagos pelo producto da tarifa que o governo fica auctorisado a estabelecer para as descargas e cargas pela ponte, devendo a despeza ser inferior á que o commercio faz actualmente com aquelle serviço.

Art. 3.° O governo dará conta ás côrtes do uso que fizer das auctorisações que lhe são concedidas por esta lei.

Art. 4.° Fica revogada a legislação em contrario.

Ministerio da fazenda, em 18 de agosto de 1868. = Carlos Bento da Silva.

Foi approvado o projecto n.° 15 na generalidade e na especialidade sem discussão.

O sr. Mardel: — Mando para a mesa o parecer sobre o projecto de lei n.° 12.

Peço a v. ex.ª que consulte a camara se dispensa o regimento para que este projecto entre em discussão logo que haja occasião opportuna.

Entrou em discussão o projecto de lei n.° 8.

E o seguinte:

N.º 8

Senhores. — A vossa commissão de fazenda foi presente a proposta n.° 8-A, em que o governo pede auctorisação para applicar no anno economico de 1867—1868, ao pagamento das despezas legaes do ministerio das obras publicas, commercio e industria, para as quaes não tenham sido sufficientes as verbas especialmente votadas, quaesquer quantias que sobrarem nos diversos artigos da tabella da despeza extraordinaria para o exercicio de 1867-1868, com tanto que não seja excedida na despeza total de 1.742:800$000 réis, marcada na mencionada tabella.

A commissão de fazenda, considerando que a lei de 19 de junho de 1866 é omissa a respeito da transferencia de sobras de uns para outros artigos da despeza extraordinaria, e julgando necessario satisfazer ao pagamento das despezas do estado, relativas á exposição universal de París, ao abastecimento de agua em Lisboa, á viação e outras obras publicas, para as quaes não chegaram os creditos especificadamente votados; considerando finalmente que as verbas despendidas a mais com o abastecimento das aguas da capital e com a repartição de pesos e medidas são meros adiantamentos feitos pelo estado, que vão sendo cobertos com a receita satisfeita pelos consumidores, e com o producto das aferições, o qual é superior á importancia da despeza, é de parecer que a proposta do governo seja convertida no seguinte projecto de lei.

Artigo 1.° E o governo auctorisado a applicar no actual anno economico ao pagamento das despezas legaes do ministerio das obras publicas, commercio e industria, para que não tenham sido sufficientes as verbas especialmente votadas, quaesquer quantias que sobrarem nos diversos artigos da tabella da despeza extraordinaria para o exercicio de 1867-1868, a que se refere o decreto de 11 de julho de 1867, com tanto que não seja excedida a despeza total de 1.742:800$000 réis, marcada na mencionada tabella.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala da commissão de fazenda, 10 de agosto de 1868. = Joaquim Ribeiro de Faria Guimarães = Francisco Van-Zeller = Antonio Joaquim Ferreira Pontes = Antonio José Teixeira = José Dias Ferreira = José Maria Rodrigues de Carvalho = José Gregorio Teixeira Marques = João Antonio dos Santos e Silva, relator.

N.º 8-A.

Senhores. — A lei de 19 de junho de 1866 não estabelece preceito algum para transferir de uns para outros artigos da despeza extraordinaria as sommas que porventura houver em alguns d'elles, para serem convenientemente applicadas a despezas legaes, e sendo necessario occorrer ao pagamento daquellas que se fizeram com a exposição universal de París, abastecimento de aguas em Lisboa, viação e outras obras publicas, para as quaes não chegaram os creditos especificadamente votados, carece o governo de auctorisação para applicar as sobras da tabella da despeza extraordinaria relativa ao exercicio de 1867-1868, ás mencionadas despezas, sem exceder a importancia total marcada na mesma tabella.

Pelo que respeita ás importancias despendidas a mais com o abastecimento de aguas na capital e com a repartição dos pesos e medidas, apenas podem ser consideradas como adiantamentos, por isso que relativamente á despeza feita com a primeira será satisfeita pelo producto das sommas dos consumidores em divida, e quanto á segunda, deverá igualmente entrar nos cofres do thesouro o preço de aferições superior á importancia da despeza, e por conta do qual se acha já realisada até hoje a receita de 8:000$000 réis. Em taes circumstancias tenho a honra de submetter á vossa approvação a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.° É o governo auctorisado a applicar no actual anno economico ao pagamento das despezas legaes do ministerio das obras publicas, commercio e industria, para que não tenham sido sufficientes as verbas especialmente votadas, quaesquer quantias que sobrarem nos diversos artigos da tabella da despeza extraordinaria para o exercicio de 1867-1868, a que se refere o decreto de 11 de julho de 1867, com tanto que não seja excedida a despeza total de 1.742:800$000 réis marcada na mencionada tabella.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Ministerio das obras publicas, commercio e industria, em 31 de maio de 1868. = Sebastião do Canto e Castro Mascarenhas.

O sr. Presidente: — Este projecto tem só uma discussão na generalidade e na especialidade.

O sr. José de Moraes: — Eu não quero discutir o projecto; pedi a palavra só para declarar a v. ex.ª e á camara que não o posso votar assim em globo sem que esteja presente o sr. ministro das obras publicas para responder a algumas perguntas que se lhe façam. Votar assim em globo 1.700:000$000 réis sem saber quaes são as despezas que se fizeram, e porque se fizeram, e se foram legalmente feitas? Não o posso eu fazer (apoiados). A camara approve se quizer, eu declaro que rejeito, se isto se não esclarecer.

O sr. Sá Nogueira: — Sinto ter de fallar n'esta occasião porque não desejava tomar tempo á camara; mas o projecto de que se trata é importantissimo (apoiados), não é um projecto que possa passar sem discussão (apoiados).

E notavel a concisão da proposta do governo, e mais notavel ainda a concisão do parecer da commissão.

Pede-se-nos nada menos do que a approvação de despezas que se fizeram e que se dizem legaes, sem nos mostrarem quaes ellas são, sem se nos dizer qual é a importancia d'ella em cada um dos seus generos, sem se nos apresentar a importancia total das verbas que a camara vae votar, e ao mesmo tempo sem se saber se foram ou não applicadas legalmente.

Eu estou certo de que uma parte d'essas verbas não foram applicadas legalmente (apoiados). Pois como é que nos pedem que approvemos despezas feitas com a exposição universal quando todos sabem que....tenho até difficuldade em empregar o termo proprio, mas não ha remedio senão em portuguez... quando todos sabem que escandalosamente se gastaram sommas sem utilidade alguma, mandando-se á exposição individuos só por favor! (Apoiaãos.) Querem então que a camara sanccione estas despezas sem exame algum? Eu protesto contra isso, e como antigo deputado da opposição e sempre zelador dos direitos da camara, não posso approvar similhante proposta (apoiados).

E necessario que se nos diga quaes foram as despezas que se fizeram e a rasão por que se fizeram; é necessario mostrar a legalidade ou a absoluta necessidade dellas, e não se nos pedir aqui uma auctorisação em globo, sem se nos dar a rasão, sem a commissão ter requisitado do governo esclarecimentos, e sem o governo ter apresentado todos os documentos que justificassem este seu pedido (apoiados).

Eu não quero offender a commissão; mas é preciso advertir, sem querer escandalisar ninguem, que nós andámos aqui um pouco ligeiramente muitas vezes nas nossas discussões, e no modo por que tratámos os negocios. Vae um projecto a uma commissão, a commissão deve estuda-lo, deve exigir esclarecimentos, e deve apresenta-los á camara para ella saber como vota; mas ir um projecto a uma commissão, e sem se fazer cousa nenhuma d'estas trazer-se ao debate a auctorisação para se approvarem muitas verbas que foram gastas inutilmente, isto quando o paiz esta nas circumstancias que todos sabemos, não póde ser! (Apoiaãos.)

Eu pediria á commissão, visto não estar presente o sr. ministro das obras publicas, que nos informasse que despezas são estas.

Diz aqui: «despezas relativas á exposição universal de París.» Aqui esta uma verba que se não sabe emquanto importa. Não foi bastante a despeza votada? Em quanto foi excedida? Vamos a saber o que isto é. t

Diz mais: «abastecimento de agua em Lisboa.» E natural que esta despeza se possa justificar muito bem, mas é necessario mostrar qual foi a necessidade e urgencia de a fazer e a importancia d'ella; e entretanto nada d'isto se nos diz. «A viação e outras obras». Isto é muito vago. Tem-se levantado clamores por parte de alguem contra a despeza que se faz com o exercito, quando é preciso advertir que uma parte d'essa despeza não é feita com o exercito e sim com as classes inactivas; e é uma verba que se não póde extinguir; mas ninguem levanta a sua voz contra as despezas que se fazem no ministerio das obras publicas (apoiados).

Pelo orçamento d'este anno no ministerio das obras publicas devem gastar-se tres mil e tantos contos de réis. Ora, como é que um paiz nas circumstancias financeiras em que o nosso se acha, póde gastar tres mil e tantos contos de réis n'um anno em obras publicas?!

Tem-se censurado o sr. ministro das obras publicas por mandar publicar uma portaria, suspendendo alguns traba-

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lhos; eu em vez de clamar contra o sr. ministro, dou-lhe louvores;. fez muito bem; é necessario entrar no caminho racional, para nos não arruinarmos completamente (apoiados).

Não quero dizer que alguns dos trabalhos que o sr: ministro mandou suspender, não possam continuar, mas isso é uma questão que s. ex.ª ha de certo estudar.

Podia apresentar muitas outras considerações, mas não quero alongar o debate, e por isso concluo declarando que não posso approvar este parecer sem que esteja presente o sr» ministro para nos dar explicações. Proponho portanto o adiamento d'este projecto.

Direi só que, embora a camara julgue dever auctorisar esta despeza que devida ou indevidamente se fez, o que não deve é absolver quem a fez da responsabilidade em que incorreu. Nós estamos aqui a dar por bem feito o que foi, mal feito, e a absolver os ministros da responsabilidade que tomaram sobre si; não póde ser, não a tomassem, tenham paciencia. Portanto se se entende que o credito do paiz exige que se paguem essas despezas, paguem-se muito embora, mas acate-se o direito do paiz, e não se absolvam aquelles que fizeram essas despezas sem ter auctorisação para as fazer.

Esta é a minha opinião.

O sr. Santos e Silva: — Acho perfeitamente bem fundadas algumas das observações apresentadas pelo illustre deputado que me precedeu. Effectivamente toda a camara tem direito de exigir do governo que se lhe dêem as explicações necessarias, para se poder votar com conhecimento de causa qualquer projecto. Entretanto as duvidas, que s. ex.ª tem na materia sujeita, póde não as ter a commissão, porque póde ter sido esclarecida na occasião em que este negocio lhe foi presente, achando-se habilitada para redigir o seu relatorio, apesar de ser conciso, como o redigiu. Não cabe pois á commissão nenhuma das censuras que s. ex.ª lhe quiz fazer, porque ella tem consciencia do que fez, e ficou satisfeita com as explicações que se lhe deram.

O illustre deputado póde ter alguma rasão para não estar satisfeito; mas exigir que os outros o não estejam, mas querer marcar á commissão as dimensões do seu relatorio, é ser exagerado. A commissão não fez um extenso relatorio; entendeu que o podia dispensar, e que as lacunas, que aqui ha, podiam ser suppridas pelas explicações do governo. A commissão não podia estar a prever todas as duvidas de S. ex.ª, nem todas as explicações que o illustre deputado porventura exigisse, nos seus accessos de zêlo, que tão habituaes lhe são.

Talvez s. ex.ª imagine que esta proposta de lei é só da responsabilidade dos ministerios passados, que já não podem officialmente responder por ella. Pois engana-se. O actual sr. ministro das obras publicas herdou e assumiu a sua responsabilidade, e empregou incessantes esforços para que a commissão désse parecer sobre elle, e viesse á discussão. O projecto é da responsabilidade do actual governo. Mas nem este nem o seu antecessor tiveram nada com certas despezas, que motivaram os reparos principaes de s. ex.ª A exposição de París teve logar no tempo do ministerio que desabou em janeiro do corrente anno.

O sr. ministro das obras publicas não esta presente, nem o seu antecessor, o sr. Canto. Eu não tenho de memoria todas as explicações que ss. ex.ªs me deram, mas o que posso affiançar aos illustres deputados é que ellas me satisfizeram.

Demais n'este relatorio mencionam-se duas verbas, que não póde haver escrupulo algum em approvar. Uma dellas diz respeito ao abastecimento das aguas da capital, despeza adiantada pelo governo, mas que vae sendo coberta, se o não esta já, pela receita havida dos consumidores. Por consequencia esta despeza é verdadeiramente um adiantamento que o governo fez. Outra verba, a despendida com a attenção dos pesos e medidas, é tambem coberta pelo producto muito superior das ditas afferições. Portanto duas verbas importantes, já o illustre deputado vê como foram despendidas, e como são restituidas ao thesouro.

Sr. presidente, sejamos francos. Se foi excedida pelo governo a verba gasta com a exposição de París, se outras despezas são tambem superiores ás que legalmente foram votadas, este projecto de lei é um verdadeiro bill de indemnidade (apoiados). Bill de indemnidade, que talvez abranja tres ministerios, incluindo o actual. Mas as despezas foram feitas, as despezas foram pagas, e é necessario legalisadas (apoiados do sr. ministro da fazenda).

Todavia eu não nego á camara o direito de indagar, se as despezas são ou não justificadas, se foram legal ou illegalmente feitas. Á camara pertence dar ou negar o bill de indemnidade, se ha logar para elle.

A questão é pois a seguinte:

Estava ou não o governo auctorisado afazer despezas com a exposição de París? Estava. Foram estas despezas excedidas, ou não? Se foram, a camara vota ou nega um bill de indemnidade. Se não foram, não ha reparos alguns a fazer. O mesmo digo a respeito das outras verbas consignadas n'este projecto de lei..

A minha opinião é que, havendo bill de indemnidade, é necessario approvado, porque despezas feitas não podem estar por legalisar. É isto o que sempre se tem feito, é isto o que cumprirá agora fazer. Faço votos tambem por que se não repitam os abusos, se abusos houve aqui. Estabeleçam-se regras, exerça-se uma activa fiscalisação, e tomem-se para o futuro todas as convenientes providencias. A camara votará como entender. Como esta presente o sr. ministro da fazenda, s. ex.ª dará as explicações que quizer.

O sr. Ministro da Fazenda (Carlos Bento): — Eu não sabia mesmo que este projecto estava dado para ordem do dia.

O que posso assegurar á camara é que se o ministro da repartição competente não esta presente é por motivo justificado, e devo tambem dizer que o cavalheiro que assignou este projecto como ministro esta ausente igualmente por motivo de serviço. São estas as explicações que posso dar.

A despeza esta feita; esta é a verdade, mas mais explicações não posso dar, porque nem mesmo sabia que este projecto entrava hoje em discussão.

O sr. Arrobas (sobre a ordem): — Ainda bem que veiu um projecto a respeito do qual se não póde dizer que fallo por politica, porque,»apesar de ter sido apresentado pelo governo transacto, nao estava muito disposto a approva-lo, e as minhas difficuldades em o approvar augmentaram desde que fallou o sr: relator da commissão, e depois da declaração que fez o sr. ministro da fazenda.

S. ex.ª não estava preparado, apesar de ser ministro da fazenda; e, comquanto fosse membro da commissão, tambem não vem assignado no parecer. Naturalmente não lhe foram presentes todos os documentos, e depois que o sr. relator da commissão reconhece que ha aqui um bill de indemnidade sobre certas despezas, é preciso que a camara saiba em que consiste esse bill de indemnidade.

(Interrupção que não se ouviu.)

Se não excedesse não vinha aqui este negocio; mas isto não é uma cousa que se apresente assim em globo, e que a camara vá cobrir, sem mais exame; com o manto legislativo. E preciso que cada um, quando vote, saiba o que vota.

Eu não quero dizer que não voto; quero saber o que voto.

(Interrupção que se não ouviu.)

A despeza esta feita, e a questão é de legalisar, é de bill de indemnidade. Pois bem, se é assim não ha grande urgencia de votarmos já, e por consequencia adiemos até que se saiba em que se despenderam estes 1.742:000$000 réis.

O que eu entendo é que é preciso sabermos em que esta verba se despendeu, e por consequencia parece-me conveniente, visto que não ha grande urgencia em votarmos já, que o projecto fique adiado até virem á camara os esclarecimentos precisos.

Quando vejo que se supprimem as obras publicas, quando vejo que se suspende a construcção das estradas e dos telegraphos para se pagarem as despezas da exposição e outras, parece-me que tenho rasão em pedir estes esclarecimentos.

Não faço isto, repito, porque este projecto foi apresentado pelo governo passado; faço-o porque, vendo parar os trabalhos das estradas, tenho difficuldade de votar projectos d'esta ordem, sem os devidos esclarecimentos.

Portanto a minha moção e o adiamento d'este negocio até que venham á camara os esclarecimentos necessarios.

Leu-se na mesa a seguinte

Proposta

Proponho o adiamento da discussão do parecer n.° 8 até serem remettidos á camara os documentos justificativos da despeza que tem de ser paga pelas sobras do orçamento das obras publicas. = Arrobas.

Admittida.

O sr. José de Moraes (sobre a ordem): — Pedi a palavra sobre a ordem, e vou mandar para a mesa a seguinte proposta (leu).

Desejo que o sr. ministro das obras publicas esteja presente para que s. ex.ª responda, não só a mim, mas a todos os srs. deputados que perguntem quaes são estas verbas da despeza que se fez a maior. j

O sr. Santos e Silva disse que estas verbas foram consumidas com as aguas o com os pesos e medidas. Se ellas foram applicadas a este fim, não tenho duvida em approvar esta despeza, mas tenho duvida em approvar uma verba que diz respeito á despeza feita com a exposição de París, e digo a v. ex.ª a rasão por que: porque sou coherente. Quando n'esta» camara se votou a verba de 50:000$000 réis para a exposição de París, tomei a palavra n'essa occasião e disse, que votava aquella verba, mas que ficasse o nobre ministro das obras publicas certo, ou outro sr. ministro que o substituisse, que não votava mais quantia alguma para esse fim.

(Interrupção de sr. Gavicho.)

Digo ao illustre deputado que hei de rejeitar; que tenho coragem para isso, seja qual for o ministro que a venha, pedir. Tenho obrigação de ser coherente.

Querem V. ex.ª e a camara saber quanto se gastou, só com o ministerio das obras publicas, com' os individuos que foram a París e quem elles são? (Apoiaãos.) Eu hei de' ler um papel que tirei de um jornal, o qual ha de ser transcripto no Diario de Lisboa. Mas primeiro que tudo é preciso que se saiba que não se gastaram só os 50:000$000 réis, mas 75:355$817 réis! Estas são as informações que o jornal póde alcançar; mas sabe Deus qual seria a quantia que se gastou!

Foram, peço á camara que me desculpe a phrase, certos patuscos a París divertir-se, gastando ao thesouro uma somma importante, e hoje suspende-se a obra de uma ponte e de uma estrada! Eu voto a'.favor das obras e contra este projecto.

Eu vou ler o papel.

Despendeu o thesouro portuguez com a ultima exposição, universal 75:355*817 réis, que foram assim applicados:..

Ao commissario regio................... 1:695$000

Ao vice-commissario...................... 2.250$000

Ao fiel e delegado junto ao jury............ 2:719$000

A um dito, dito......................... 2:274$000

Ao encarregado das colonias............ 1:876$500

Ao encarregado da secção retrospectiva...... 930$000

A um dito.............................. 2:093$250

Ora, note v. ex.ª estes" quatro contos e tantos mil réis para colonias, era melhor manda-los para as mesmas, para matar a fome a alguem que a tivesse.

A um jurado............................ 1:220$000

A um dito.............................. 730$000

A um dito.............................. 930$000

A um addido á commissão................ 1:413$000

A um encarregado de estudar materias primas 600$000 A um encarregado de estudar a hygiene dos estabelecimentos publicos................ 600$000

Parecia-me que era escusado ir este cavalheiro a París estudar hygiene publica, tendo o sr. Macedo Pinto escripto uma obra sobre este assumpto que foi elogiada em París (apoiados). Ainda ha mais alguma cousa; este cavalheiro tem estragado a sua saude em consequencia do seu trabalho. Não se deu esta quantia a este cavalheiro, e foi-se dar a outro.

A um encarregado de estudar a construcção

de casas para operarios............... 600$000

A um lente do instituto industrial.......... 600$000

A 17 artífices.......................... 3:060$000

Aos artistas de bellas artes............... 1:327$200

Despeza de installação e outras........... 50:437$867

A auctorisação concedida era só de 50:000$000 réis.

Note v. ex.ª que isto é o que o jornal publicou; e eu, logo que vi isto, guardei-o para o ler á camara na primeira occasião opportuna que tivesse. Parece-me que esta é a mais propria.

Mas segundo as informações que tenho, devo dizer a v. ex.ª que ainda foi mais gente a París, mandada pelos outros ministerios. Ha até um individuo que foi ali estudar rhetorica! Mas não ha só este facto, ha outros muitos.

Ha um anno ou anno e meio que chamei a attenção da camara para um favor que se fez então, que foi, querendo despachar-se um individuo e não havendo em que, mandou-se escrever uma certa historia. Nós estamos fartos de historia de Portugal, de historia antiga. Esta ahi a torre do tombo cheia de documentos importantissimos para se escrever toda a historia, e temos a historia de Portugal escripta por um homem que talvez ninguem seja capaz de a escrever melhor, que é o sr. Alexandre Herculano (apoiados). Houve empenho em servir o individuo que se queria despachar, e não se sabendo em que havia de ser empregado, mandou-se que escrevesse a historia da introducção dos celtas em Portugal!

E contra estes desperdicios que eu voto, e continuo no mesmo caminho, por isso declaro desde já que voto contra-o projecto na parte respectiva á despeza feita com a exposição de París, porque se gastou mais do que foi votado, e o ministro não devia pagar, porque o governo não estava auctorisado a faze-lo; e se pagou mais de 50:000$000 réis, pagou indevidamente. Mas para poder discutir este projecto, preciso da presença do sr. ministro das obras publicas, e por isso insisto no seu adiamento até s. ex.ª estar presente.

Leu-se na mesa a seguinte

Proposta

Proponho que seja adiado o projecto n.° 8 até que seja presente o sr. ministro das obras publicas. = José de Moraes Pinto de Almeida.

Foi admittida.

O sr. Santos e Silva: — A commissão de fazenda não póde ter duvida alguma em aceitar, pela sua parte, o adiamento da discussão d'este projecto. Desde o momento em que alguns membros da camara apresentam exigencias rasoaveis e sensatas, no intuito de serem esclarecidos para a votação, o governo tem obrigação de lhes prestar todos os esclarecimentos. O adiamento é tanto mais justificado, quanto não esta presente nem o actual sr. ministro das obras publicas, nem o seu antecessor, que são os mais habilitados para dar explicações, visto que o sr. ministro da fazenda as não póde agora dar.

O sr. Presidente: — Se por parte da commissão não ha duvida alguma em aceitar o adiamento, esta acabada a questão (apoiados). Portanto vae votar-se sobre os adiamentos. O primeiro a votar-se é o do sr. Arrobas.

Posta a votos a proposta de adiamento do sr. Arrobas foi approvada.

O sr. Presidente: — -Pela approvação do adiamento proposto pelo sr. Arrobas, esta prejudicado o do sr. José de Moraes.

O sr. Secretario (José Tiberio): — A commissão de redacção não fez alteração alguma no projecto n.° 1, sobre' a desamortisação; e no additamento' ao artigo 1.° do mesmo projecto.

O sr. Arrobas: — Vae passar para a camara dos dignos pares o projecto de lei cuja ultima redacção acaba de se ler; e como sei que se pretende usar de uma esperteza, para fazer com que a emenda ou additamento do sr. Azevedo diga

O contrario do que ella significa, pareceu-me conveniente tomar n'esta occasião a palavra para deixar bem claro e patente que a camara não retractou o voto que deu em 6 do corrente, para que ficasse obrigatoria a desamortisação dos passaes, que é isso, e não póde ser outra cousa; o que significa essa emenda que vae no projecto.

Julguei isto de primeira necessidade para o bem publico, visto que muito grandes seriam os perigos, se fosse na lei um artigo de redacção ambigua, que poderia dar pretexto a resistências fundadas em uma falsa interpretação, a que a letra do additamento do sr. Azevedo se presta.

Que a camara votando o referido additamento do sr. Azevedo, votou que ficasse obrigatoria a desamortisação dos passaes, é tão claro e evidente, que não póde haver ninguem de boa fé que o negue (apoiados).

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Demonstra-se isto pelas palavras do auctor do additamento, quando o sustentou, por occasião de o mandar para a mesa.

S. ex.ª mui clara e positivamente disse que=tendo sido contra a desamortisação obrigada das misericordias e hospitaes, comtudo depois de tal se achar legislado, não via agora motivo para que tambem não ficassem os passaes obrigados á desamortisação forçada =.

Tanto os oradores que defenderam, como os que combateram aquelle adiamento, como tal o consideraram; leiam-se os Diarios, e lá se verá que ninguem aqui tomou a proposta do sr. Azevedo se não no sentido da desamortisação forçada (apoiados).

No acto de se ir votar propoz-se a votação nominal, e houve-a, votando pela proposta os partidarios da desamortisação forçada, e contra os que não querem tal desamortisação (apoiados).

Seria acaso para introduzir na lei uma redundancia, que houve tão grande questão e a votação nominal?

Seria por isso, que o governo tem perdido treze dias a manobrar para evitar, que aquella votação ficasse como estava, o que deu em resultado as votações de hontem, que nada mais foram do que a confirmação da votação do dia 6 do corrente, isto é, de ficarem sujeitos á desamortisação obrigatoria os passaes desde já, e sem exceptuar as proprias casas de residencia dos parochos (apoiados).

' A camara não reconsiderou hontem, quando rejeitou, tanto o parecer da maioria, como o da minoria da commissão (muitos e repetidos apoiados).

A camara votou contra o parecer da maioria apresentado em globo á votação, porque exceptuava da desamortisação obrigatoria as residencias dos parochos, e a camara tendo já votado a desamortisação forçada das proprias residencias, não quiz reconsiderar o que tinha votado (%poia, dos).

Rejeitou tambem o parecer da minoria, porque apresen-1 tado á votação em globo, como foi, representava o adiamento da execução da desamortisação obrigada (apoiados).

Já tinha votado no dia 6 a desamortisação forçada, e j agora tratava-se de modificar essa votação, e a camara re- j jeitando essas modificações deixou em pé e em toda a sua força a votação que se queria modificar; esta pois em todo I o seu vigor o additamento do sr. Azevedo tal qual foi votado sem restricções nem adiamentos (muitos apoiados).

Agora prepara-se o governo para um curioso esforço, que por força lhe ha de custar caro, e que lhe não ha de produzir o desejado effeito (apoiados).

Quer o governo depois de publicada esta lei fazer acreditar, que o additamento relativo aos passaes é uma redundancia, por significar desamortisação facultativa dos mesmos passaes. Mas, sr. presidente, eu venho agora para lhe tirar esse trabalho, deixar bem gravado e patente na folha official, /que a camara não se presta a uma tal interpretação (apoiados).

Sr. presidente, quando se quer interpretar uma lei, manda a boa hermeneutica recorrer á discussão para se conhecer a intenção do legislador; ora, no caso presente, alem das palavras de todos os oradores que fallaram sobre a proposta do sr. Azevedo, das quaes se vê qual o sentido da votação; ha mais a declaração de voto feita no dia seguinte

•por muitos deputados que.não tinham estado presentes á votação, de que se o estivessem teriam votado a proposta do sr. Azevedo, que torna obrigatoria a desamortisação dos passaes (apoiados).

Ha ainda, sr. presidente, o proprio governo que assim tambem o entendeu; para bem o fazer notar vou ler.á camara um paragrapho em que o sr. ministro do reino bispo de Vizeu, fallando em nome do governo expressa e terminantemente declara, que a votação.de O do corrente fôra

•pela desamortisação obrigatoria dos passaes.

«O que se notou em 6 de agosto foi que, em logar de

'ser facultativa, fosse obrigatoria a desamortisação dos passaes, e de todos os bens e direitos prediaes, que fazem.parte

.da dotação do clero. E tanto'assim foi, que o illustre deputado o.sr. Motta Veiga, apresentou agora uma emenda

•para-se exceptuar a residencia dos parochos e prelados, e

¦ um espaço de terreno junto a essa residencia. E porque fez isto? Porque na proposta, votada-em 6 de agosto, se votou mais do que o illustre deputado queria (apoiados). A proposta de 6 de agosto vae mais adiante do,quo o illustre deputado iquer: logo o illustre deputado quer que a camara reconsidere,-votando)a sua emenda (muitos apoiados).»

'Depois d'isto,sr. presidente, ha de ser curioso ver o governo a.dizer que tal tvotaçâo não quiz dizer desamortisação obrigatoria, mas sim facultativa como já era!

Os jornaes,-no dia.7, annunciarem todos que a camara dos deputados tinha,votado, a.desamortisaçâo obrigada dos passaes. Para todaja-parte, no mesmo dia,.communicou o telegrapho, I que ía votação tinha,sido,tal, e no fim de tudo, sr. presidente, vou apresentar.a ultima prova (elevando a voz), Be>ba-.ahiicalguinsde,putado-que votasse, o.additamento

¦ do. sr.'Azevedo, no. íentido.de.ser, facultativa.a desamortisação dos passaes, lcvanto-se>e diga-o; havel-a algum dos que approvaram aquella proposta,quetdiga,que anâoivotouno

¦ sentido da desamortisação obrigatoria,.lavante-se!

¦Se houver doze que ise levantem, eu,declaro,que serei o primeiro.a -proclamar -desde já,quea votação.nâo foi pela •desamortisaçâo.obrigatoria.

Ninguem se Jevanta, ha o in&is completo silencio; pois bem, ahi ficai essa prova irrecusavel.para a boa interpretação do sentido do additamento do.givAzevedo, que é,para de futuro não haver.duvidas-sobre tal objecto (apoiados).

'Nem era de esperar outra cousa de,uma assembléa tão illustrada e respeitavel. Seria uma indignidade e baixeza, de que nenhum deputado é capaz,.qual a de faltar á ver, dade, e negar a sua consciencia e palavra (apoiados).A

camara não reconsiderou a sua votação de 6 do corrente, feita no sentido da desamortisação obrigatoria dos passaes (muitos apoiados). O que rejeitou foi as restricções e os adiamentos, a que o sr. bispo de Vizeu chamou reconsiderações, e que felizmente não se deram, porque a camara as rejeitou (muitos apoiados).

A vista d'isto, sr. presidente, não mando proposta alguma para a mesa; a camara sustenta a sua primitiva votação, que significa desamortisação obrigatoria dos passaes. Se assim não fosse, ter-se-ía levantado algum dos srs. deputados que votaram a favor do additamento do sr. Azevedo, a reclamar contra esta asserção (apoiados).

Ahi tem o governo o resultado das suas hesitações! Ha treze dias que este principio foi aqui votado, e depois de tanto tempo e trabalho, ahi esta outra vez de pé a mesma votação; e mais levantada ha de ella ficar ainda na camara dos dignos pares (apoiados).

Ahi estão as pressas do governo.

Se elle tivesse deixado logo seguir a vontade nacional, já seria este projecto lei do estado, e agora quem sabe quantos dias ainda estará sem o ser.

E a unica cousa que leva de bom é a desamortisação dos passaes (apoiados). Nem o governo se póde já livrar delles, nem ha de levantar fundos, se os não incluir na massa dos bens que offerecer em garantia do emprestimo a que o projecto se refere, e se não der outra garantia ao pagamento pontual dos juros.

Vozes: — Muito bem, muito bem.

O sr. Mardel (para um requerimento): — Peço a v. ex.ª queira consultar a camara se ella se julga bastantemente esclarecida sobre este assumpto para passar a votar a ultima redacção do projecto n.° 1 (apoiados).

Posto a votos este requerimento, foi approvado.

O sr. Pereira Dias (sobre a ordem): — Não pedi.a palavra para votar contra o requerimento do sr. Mardel...

Vozes: — Já esta approvado.

O Orador: — Pedi a palavra só e unicamente para declarar que, vindo este requerimento depois de fallar o sr. Arrobas, não entenda a camara que votando-o eu me julgo sufficientemente esclarecido pelo que s. ox.a disse, porque eu sou exactamente contra o que s. ex.ª disse (apoiados).

O sr. Secretario (José Tiberio): — A commissão não fez alteração alguma á redacção do projecto n.° 1 e additamento ao artigo 1.°

Posta a votos a ultima redacção do projecto n.° 1, foi approvada.

O sr. Secretario (José Tiberio): — A commissão de redacção não fez alteração alguma á redacção dos projectos n.ºs 29 e 4.

Posta a votos a ultima redacção dos projectos n.m 29 e 4, foi approvada.

O sr. Presidente: — Peço a attenção da camara. O sr. Mardel fez um requerimento para que o parecer das commissões reunidas, de guerra e recrutamento, que tem por fim approvar a proposta do governo que reduz de cinco a tres annos o tempo de serviço effectivo no exercito ás praças de pret entrasse desde já em discussão, dispensando-se

O regimento.

Consultada a camara a este respeito, deciãiu affirmativamente.

Entrou em discussão o referião parecer. É o seguinte:

Projecto de lei

Senhores. — O desenvolvimento da arte da guerra, tendo destruido successivamente os antigos systemas militares da Europa, trouxe como base essencial da mais perfeita organisação da força publica a existencia dos exercitos permanentes em todos os estados, já para comprimir as rebelliões e as desordens intestinas, já para sua defeza contra os ataques e invasões do estrangeiro; esta instituição, subordinada sempre ás condições economicas ou politicas de cada paiz, divide-se naturalmente em duas partes distinctas: a força em activo serviço,-e a força em reserva. Da mais acertada combinação d'estes dois elementos, ajustada ás circumstancias peculiares e especiaes da nação depende a inteira satisfação das exigencias sociaes, sem que seja inutilmente aggravado o peso dos sacrificios que este serviço impõe aos povos.

E o tributo de sangue, votado a esta grande necessidade publica, torna-se cada dia mais pesado para nós, em face das exigencias com que a rehabilitação das industrias reclama o.auxilio de braços uteis ao trabalho, para que lhes não seja estorvado o progresso, e para que se não obste ao desenvolvimento das riquezas productivas de um paiz tão agricola como Portugal.

Mas,senhores, os meios de guerra caminham tambem tão ivelozmente nas suas transformações mechanicas e disciplinares, e a historia politica dos ultimos tempos tem paginas porventura tão eloquentes, que a rasão não póde ilíu-dir-se e esquecer a conveniencia de empregarmos quanto,antes os meios mais.efficazes para conseguir o preenchimento facil e certo dos recrutamentos, e para levar o maior numero de cidadãos.áquella grande educação militar e espirito.de.disciplina que constituem o soldado util e aguerrido.

Na proposta'de lei que o governo apresenta, parece ás

1 vossas commissões rreunidas de administração publica e de irecrutamento, que vem cautelosamente attendidas todas as exigencias darpaz, e,aquellas exigencias da guerra que podem prever-se e devem prevenir-se.

Em nada affecta ella o estado difficil das finanças do es-,tado.

.Estão ali attendidos os interesses das industrias, não lhes roubando o:habito>e o amor do trabalho pela prolongada.duração do serviço militar, que fica reduzido ao curto espaço de.tres annos.

Ficam satisfeitos os interesses legitimos da familia, não sacrificando a longas ausencias auxilios naturaes e esteios valiosos.

Respeitados ficam tambem os direitos da liberdade individual e as indicações da equidade e da justiça na mais larga e mais perfeita distribuição do pesado tributo que assim toca a um maior numero.

Ainda a reducção do serviço de cinco a tres annos destroe em grande parte a reluctancia á satisfação d'este imposto; e torna por isso mais facil a execução dos recrutamentos; d'aqui e do que dispõe o artigo 2.° nasce a diffusão de conhecimentos, e propaga-se a educação militar na massa da sociedade.

A organisação da reserva, complemento indispensavel da boa organisação do serviço militar, logra com a proposta do governo uma'vantagem dupla no augmento consideravel do numero e no crescimento do tempo em que a ella ficam pertencendo os que n'ella têem cabimento.

Por todas estas considerações, e não permittindo o adiantamento que levam já os trabalhos d'esta sessão extraordinaria, que se tentem agora mais profundas reformas nàléi de recrutamento, e sendo estas abonadas pelas instantes reclamações de cada dia, são as vossas commissões "de parecer que a proposta do governo seja convertida no seguinte projecto de leir:

Artigo 1.° E reduzido de cinco a tres annos o tempo de serviço a que pelo artigo 4.°, capitulo 1.° da carta de lei de 27 de julho de 1855, são obrigados os mancebos que constituem os contingentes annuaes de recrutamento, e é elevada de tres a cinco annos a duração do seu serviço na reserva.

Art. 2.° Todos os mancebos que em virtude das disposições da citada carta de lei forem sorteados para o exercito de terra e não recrutados, serão inscriptos nos quadros da reserva, I

Art. 3.º As disposições contidas na presente lei não serão applicaveis ás praças de pret que estão actualmente alistadas nos differentes corpos do exercito e na reserva.

§ unico. O governo apresentará ás côrtes, na proxima sessão legislativa, uma proposta de lei determinando a especie de serviço a que a reserva fica sujeita, e a fórma porque ha de ficar organisada.

Art. 4.° Não é igualmente applicavel o disposto n'esta lei aos mancebos que tendo sido sorteados para o preenchimento dos contingentes anteriores ao do corrente anno, deixaram de se apresentar nos prasos legaes para fazerem o seu alistamento, nem tão pouco aos futuros refractarios a quem será regulado o tempo de serviço pela legislação anterior. *

Art. 5.° A presente lei começará a ter vigor de 1 de janeiro do anno de 1869 em diante.

Art. 6.° O governo adoptará as disposições necessarias para a execução d'esta lei.

Art. 7.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Sala da commissão, em 20 de agosto de 1868. =. ánseZ-mo José Braamcamp = Francisco Antonio da Silva Mendes = Custodio Joaquim Freire = Francisco Van-Zeller=A. B. de Oliveira Lopes Branco=João Antonio dos Santos e Silva = Antonio Augusto da Silva Azevedo Villaça = Fortunato Frederico de Mello = Manuel Bento da Rocha Peixoto (com declaração) = Antonio José Lopes de Azeveão-e Lima = José Carlos Mardel Ferreira.

O sr. Freitas e Oliveira: — Eu requeiro que seja adiada a discussão d'este projecto até que esteja presente o sr. ministro da guerra.

O sr. Ministro da Fazenda: — Eu por ora declaro-me habilitado para poder responder ás objecções que se apresentarem a este projecto (apoiados).

O sr. Presidente: — Pergunto ao sr. Freitas e Oliveira se ainda insiste no seu requerimento?

O sr. Freitas e Oliveira: — Desisto do adiamento que tinha proposto.

O sr. Presidente: — Então continua em discussão o projecto, e tem a palavra o sr. Camara Leme.

O sr. Camara Leme: — Não me opponho á idéa fundamental do projecto sobre a reducção do tempo de serviço no exercito de cinco a tres annos. Este pensamento tenho-o ha muito'tempo. Entretanto tenho duvidas sobre a maneira de executar esta lei. A vantagem d'este projecto é clara. Elle torna muito mais equitativo o serviço e habilita muito maior numero de soldados a pegar em armas. Mas é preciso que eu diga á camara que o contingente tem de ser muito maior. Depois de votada esta lei, não póde ser menor de 9:000 a 10:000 homens. Por consequencia se hoje ha difficuldade em preencher o contingente, que é muito menor, muito mais haverá depois.

O que desejo sobretudo é que o nobre ministro da fazenda, que declarou achar-sc habilitado para responder ás objecções que se fizessem ao projecto, me diga se o governo esta disposto a empregar todos os meios para que o contingente annual em relação a este projecto ha de ser religiosamente executado; porque todas as vezes que o contingente não for fixado em 10:000 homens annualmente, então tudo isto é uma pura ficção, e teremos depois um inconveniente muito maior, que é ficarmos sem exercito. Desejo portanto que s. ex.ª me esclareça sobre este ponto e sobre outro que eu não reputo menos -importante. Jlefiro-me á maneira por que se deve attender á instrucção do soldado de artilheria e cavallaria. É impossivel com o serviço de policia a que é obrigado o soldado d'esta arma instrui-lo convenientemente em tres annos, principalmente não havendo um deposito geral ou uma escola normal.

Eis-aqui as difficuldades de se apresentar um projecto isolado que não esta em harmonia com um pensamento geral.

E de certo conveniente adoptar o que ha de bom nos ou

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tros paizes, mas é indispensavel pensar no modo de o realisar.

Ha outro assumpto ainda em que eu desejo ser elucidado.

Pela leitura rapida que ouvi fazer do projecto, parece-me que o governo se compromette a apresentar na proxima sessão a constituição da reserva, que é um objecto importantissimo.

Chamo para este assumpto a attenção do governo e da camara, porque não é possivel aspirar á defeza do paiz, não podendo o exercito passar rapidamente do pé de paz a pé de guerra. E um problema que se esta hoje discutindo em todos os paizes militares da Europa, e que merece toda a attenção. Desejaria pois que o governo desse algumas explicações a tal respeito.

Tenho ainda outra duvida, porque não pude, como v. ex.ª comprehenderá perfeitamente e a camara, meditar sobre o projecto que acaba de se ler; mas parece-me que ha uma transição do estado actual para a applicação da nova lei; é preciso saber se a lei estabelece uma perfeita igualdade com relação aos soldados que estiverem em serviço effectivo no exercito na occasião da transição.

(Áparte.)

Ouço dizer que o projecto tem providenciado a esse respeito. Senão fosse assim, tomaria a liberdade de mandar para a mesa uma emenda.

Chamo tambem a attenção do governo para uma necessidade imperiosa.

Nós não temos uma arma do systema moderno. Isto é um objecto de summa gravidade.

Ainda que estivessemos nas circumstancias de comprar o armamento necessario para o exercito em pé de guerra, teriamos de esperar pelo menos um anno para podermos obter 50:000 ou 60:000 armas.

As armas de carregar pela bôca, que são as que usa a infanteria de linha do nosso exercito, pertencem hoje aos museus; e quando vejo que se discute na imprensa estrangeira a maneira de invadir o nosso paiz, não me parecia inopportuno que o governo providenciasse a este respeito, e que o paiz fizesse um sacrificio para assegurar a independencia da patria.

Eu preferiria que os 100:000$000 réis que a camara votou ha pouco para fortificações, fossem antes applicados para compra de armamento para o exercito.

Eu podia n'esta occasião entrar em mais largas considerações, porém não o faço para poupar tempo, visto que a camara esta impaciente de votar, dispensando até a impressão de um projecto que pela sua importancia merecia toda a attenção. Apesar de eu não ser alheio ao assumpto, confesso a v. ex.ª que não me julgo habilitado a entrar na discussão como desejava. Respeito as resoluções da camara, mas acho muito irregular o systema.

Parece-me que uma reforma bem pensada nos daria os meios precisos para a compra do material de guerra de que tanto precisâmos, e sem o qual não podémos aspirar á defeza do paiz.

O sr. Ministro da Fazenda: — Pedi a palavra sobre este assumpto para responder ao illustre deputado.

Realmente esta [idéa não é nova. É talvez Portugal o unico paiz em que se não applica o principio reconhecido por toda a Europa. A nação vizinha foi a ultima a reduzir o tempo de serviço aos seus soldados, e esta regra esta hoje sendo applicada em todos os estados da Europa.

A Prussia reduziu o tempo de serviço a tres annos; a França a cinco, mas com as licenças que dá, esse tempo de serviço fica reduzido a tres annos. Na Dinamarca o tempo de serviço não passa de tres annos; na Russia reduziu-se o tempo de serviço, e na Inglaterra tambem.

Nas nações onde se entendeu que o tempo de serviço devia ser mais longo, tambem se reduziu, e o illustre deputado tambem não desconheceu e antes approva a reducção do tempo de serviço.

O ponto porém que fez duvida as illustre deputado foi o não se augmentarem os contingentes. Reduzido o tempo de serviço, para haver a força necessaria é preciso augmentar os contingentes annuaes; mas nós não tratámos de fixar agora os contingentes; esses contingentes hão de ser votados para o anno, e é essa então a occasião propria de saber se os contingentes hão de ser maiores, ou se havemos de reduzir a força effectiva do exercito.

Para não ter de licencear 12:000 praças basta ser o exercito de 18:000. Ha portanto dois meios a considerar. Ou licenciar menos praças, ou ter maiores contingentes, para estar em harmonia com a reducção do tempo de serviço.

Quanto á questão dos armamentos do exercito, parece-me que não descura este negocio quem, como o sr. ministro da guerra, se occupa tão zelosa e inteligentemente d'este assumpto. S. ex.ª já nomeou uma commissão para estudar o meio de inverter o armamento do nosso exercito em armamento aperfeiçoado. Este é o meio mais rapido e mais barato do exercito poder ter armamento aperfeiçoado, mas isto não quer dizer que o sr. ministro da guerra se não occupe d'este assumpto.

A questão das fortificações não demonstra senão que s. ex.ª tem em vista attender ao melhoramento do armamento das nossas praças.

E o illustre deputado sabe que nas ultimas guerras que tiveram logar na Allemanha, em todos os pontos onde havia fortificações e os armamentos eram iguaes, as perdas eram tambem iguaes. Nos paizes que usam de armas aperfeiçoadas, não havia grandes differenças senão aonde não havia fortalezas.

Já disse que o sr. ministro da guerra nomeou uma commissão para tratar da compra de armamentos, ou do meio de aperfeiçoar o que existe; e, dada esta explicação, creio que o illustre deputado não quererá que eu entre em mais pormenores.

Mas sempre direi que, a respeito de um artigo que appareceu em um jornal do reino vizinho, quanto aos meios por que se podia operar uma invasão, causou profunda surpreza á redacção d'aquelle jornal a interpretação que a esse artigo se deu aqui. Era como um assumpto litterariamente militar; e posso assegurar, repito, que* a redacção daquelle jornal ficou surprehendida da interpretação que se lhe deu, e deu as mais amplas explicações a respeito d'aquelle negocio.

Por agora não digo mais nada.

O sr. Pereira Dias: — Declaro desde já que voto o projecto em discussão, entretanto desejava que n'elle fosse incluida uma disposição que julgo muito conveniente.

A camara sabe que entre nós esta desde ha muito legislado o principio da instrucção primaria obrigatoria. Entretanto esta disposição é letra morta. Sabem todos quanto é difficil obrigar os paes de familia á cumprirem esta disposição, e essas difficuldades praticas têem feito com que até hoje esse principio não tenha sido cumprido.

É conveniente pois buscar por todos os meios indirectos a realisação d'este principio; e por consequencia, incluindo-se n'este projecto de lei a disposição que eu vou lembrar, talvez obtivessemos indirectamente aquillo que desejâmos desde ha muito realisar em virtude do que esta estabelecido pela lei.

Reduz-se por este projecto o tempo de serviço de cinco a tres annos; muito bem, pois eu lembro o seguinte.

Os recrutas, que não souberem ler nem escrever, servirão cinco annos em logar de tres, e aquelles que se habilitarem durante o tempo de serviço, e que aprenderem a ler e escrever, o que se póde conseguir por meio de escolas regimentaes, esses terão tambem só tres annos de serviço.

De mais a mais, sendo esta disposição incluida desde já na lei, não podia ter effeito immediato, porque eu creio que, approvado este projecto, deve vigorar para o contingente do anno que vem; não ha por consequencia tempo para que esta disposição vigore como é conveniente que vigore; mas, incluindo-se ella no projecto, declarando-se que só póde ter execução depois de decorridos cinco annos após a publicação da lei, todos os paes de familia ficariam prevenidos a este respeito.

(Apartes de alguns srs. deputados que não se ouviram.)

Emfim, eu não declaro o praso. Exponho á camara o meu pensamento; não vejo n'elle senão vantagens; e de mais a mais, como esta disposição, que eu lembro, de servirem os recrutas mais um ou dois annos do que os fixados n'este projecto, póde deixar de ter effeito desde o momento em que o recruta aprender a ler e escrever nas escolas regimentaes durante os tres annos, creio que ainda por este lado a minha proposta não tem inconveniente algum.

Adoptado o meu alvitre, conseguimos indirectamente dois resultados. O primeiro é obrigar os paes de familia a mandarem seus filhos ás escolas de instrucção primaria, porque é sabido o grande horror que ha pelo serviço militar, horror que eu entendo que este projecto de lei ha de attenuar muito; ao mesmo tempo conseguimos que o soldado aprenda a ler, e que as escolas regimentaes sejam mais concorridas.

Lembro isto como um meio que se póde aproveitar, e porque é necessario que procuremos diffundir por todos os meios os principios de instrucção primaria. Não cito aqui factos que se dão em muitos paizes da Europa, especialmente na Allemanha, em que, quando apparecem nos recrutados tres ou quatro individuos que não sabem ler, tem muitas vezes acontecido mandar-se proceder a uma syndicancia para saber a causa d'aquella monstruosidade. Faz-se isto porque em cem recrutados cinco não sabem ler nem escrever!

Não digo mais nada, nem redijo a proposta, apenas exponho a idéa, e se porventura ella for adoptada pelo governo e pela commissão, então tratarei de a formular por escripto.

O sr. Mardel: — O sr. ministro da fazenda deu as necessarias explicações ás observações feitas pelo illustre deputado, o sr. Camara Leme; agora pelo que diz respeito ás observações feitas pelo sr. Pereira Dias, tenho a dizer a s. ex.ª e á camara, que a commissão, nas suas discussões a este respeito, ventilou largamente este assumpto, e aceitou as idéas apresentadas agora por s. ex.ª, na sua maxima escala.

Parece-me que ninguem póde negar que o meio apontado é um dos mais convenientes para o derramamento da instrucção primaria por todas as classes da sociedade; mas a par d'estas vantagens ha outras não menos importantes a attender na lei do recrutamento, como são a questão das isenções, questão importantissima, que precisa de um estudo aturado, e alem d'essa a das substituições a dinheiro. São reformas importantes que a commissão entendeu dever guardar para occasião opportuna, em que se trate de fazer uma reforma radical na lei do recrutamento; mas agora procura-se unicamente estabelecer principios, para depois serem desenvolvidos, e tanto que no § 1.° s. ex.ª aceitou como additamento o artigo 2.°, pelo qual o governo se compromette a apresentar em janeiro ao parlamento uma proposta de lei para regular o serviço a que deve ficar sujeita a reserva.

Por consequencia a camara, votando este projecto, vota apenas os principios, e parece-me que nos principios tanto pelo que diz respeito á reducção do tempo de serviço, como ás vantagens de augmentar a reserva, todos estão completamente de accordo.

O sr. Sá Carneiro: — Creio que a camara me fará a justiça de acreditar que não tenho menos empenho em que se derrame a instrucção primaria era' todo o paiz do que o sr. Pereira Dias. Adoptava completamente a idéa do illustre deputado, mas vejo que havia grandes inconvenientes em adopta-la, e muito mais n'uma lei que já esta a discutir-se, e que em poucos momentos será votada, sem se pensar maduramente n'esta nova condição. Em primeiro logar pergunta-se—haverá em todo o paiz o necessario numero de escolas em que todos os mancebos possam aprender a ler? Não ha. E o que vamos nós fazer com isto? E com que muitas familias, não obstante o desejo que tenham de mandar aprender a ler os seus filhos, o não podem fazer, e assim seriam os filhos castigados por culpas que nem elles, n'este caso, nem os proprios paes, commetteram por indolencia e desleixo.

Emquanto á lembrança do sr. Pereira Dias, seria muito para desejar que se podesse executar, mas sem fazer injustiça a ninguem. Digo a v. ex.ª, em honra de todos os meus collegas, que todos os commandantes dos corpos, sem excepção, olham para a instrucção primaria dos seus soldados com o maior esmero. Infelizmente não podem conseguir o resultado que podia alcançar-se se o serviço se fizesse de outra maneira. Posso apresentar a estatistica do meu regimento, que ha quatro annos commando, aonde ha soldados que não podem ir á escóla regimental mais do que trinta ou quarenta vezes no anno intercaladamente. Poderia só conseguir-se resultado se o serviço fosse feito de outro modo, isto é, se fosse possivel estar metade do regimento seis mezes no quartel.

Emquanto o sr. ministro da guerra não combinar as necessidades do serviço, de modo que se possa conseguir que pelo menos o soldado esteja o tempo que eu disse no quartel, é impossivel tirar-se a vantagem que se deveria tirar das escolas regimentaes. Portanto entendo que seria andar com certa leviandade, perdoe-me o sr. Pereira Dias a expressão, introduzir n'esta lei uma condição qualquer, e esta principalmente, sem que fosse muito meditada.

Emquanto á diminuição do tempo de serviço, os srs. ministro da fazenda e Camara Leme tambem aqui apresentaram diversas rasões para dever ser adoptada.

A diminuição do serviço é uma cousa reclamada hoje no nosso paiz, e que tem sido admittida em todos os exercitos da Europa. Não ha um só que não tenha adoptado este systema.

Eu porém, se considerasse a questão militarmente, declaro a v. ex.ª e á camara, que não era da opinião da diminuição do tempo de serviço. Pelo contrario entendo, que o soldado quanto mais tempo estiver nas fileiras, tanto mais habilitado esta para a guerra, pela melhor disciplina e melhor instrucção; ainda que n'esta parte ha militares que preferem os soldados novos, por exemplo no campo de batalha. N'este ponto sigo o meio termo. Recrutas até certo ponto é bom, porque combatem ás cegas sem saber o que fazem, e levam-se muitas vezes até ao ponto a que os soldados velhos chegam de má vontade por conhecerem melhor os perigos, e têem mais velhacaria do que os soldados novos.

Apesar d'isso Changarnier e o velho Jomini escreveram ainda ha pouco manifestando-se contra essa opinião da diminuição no tempo de serviço; elles olham para qualidade e não para quantidade das tropas; é certo que na Europa geralmente se esta admittindo a diminuição de serviço, porque não póde haver grandes exercitos permanentes, para o que seria preciso fazer despezas com que as nações não podem, e então soccorrem-se a este meio. Têem assim um pequeno exercito em tempo de paz, e um grande exercito em tempo de guerra.

Nós, que não temos milicias nem ordenanças, como em outro tempo, devemos estabelecer outro systema para conseguirmos uma melhor organisação, pois que o paiz esta ha muitos annos completamente desarmado.

E melhor adoptar este systema do projecto, com o qual o nosso povo não antipathisará tanto, como com as antigas denominações de milicias e ordenanças. Se lhe falhássemos em segunda linha seria dar o alarma, e pelo projecto que esta em discussão conseguimos o mesmo fim, uma vez que a reserva seja devidamente organisada, e evitámos um grande mal, que é o seguinte: O soldado portuguez, em servindo cinco annos, quando leva baixa difficilmente vae sujeitar-se ao trabalho a que estava habituado antes de servir na fileira. E raro aquelle que vae pegar na rabiça do arado ou no cabo da enxada. De ordinario trata logo de obter um emprego, ou no caminho de ferro, ou ser guarda-barreira, zelador, tudo, menos curvar as costas ao trabalho. Ora, eu tenho esperança de que o soldado em servindo só tres annos ha de conservar o amor á familia, ha de conservar mais apego aos seus primeiros habitos, e haverá assim a vantagem de não vermos homens perdidos para a agricultura e para as outras industrias a todos aquelles que entram no serviço do exercito.

Creia V. ex.ª que hoje o contingente annual que fornece o paiz é em pura perda para o estado civil, o soldado de hoje não volta mais aos seus primitivos habitos; mas d'aqui em diante tenho esperança, repito, de que ha de voltar, porque o tempo do serviço é pouco (apoiado do sr. ministro do reino), e de ordinario vem a reduzir-se a dois annos e meio, obtendo seis mezes de licença, e o soldado n'este tempo não perde as affeições de familia, como disse, e o amor do trabalho (apoiados).

Agora, eu como militar não posso deixar de considerar, que lá fóra os meus collegas militares hão de notar a facilidade com que eu admitto esta reducção do tempo de serviço, sobretudo para a arma de cavallaria e de artilheria.

Effectivamente o soldado de cavallaria e de artilheria não se fórma facilmente; quer dizer, dão-lhe baixa quando elle principia a ser soldado. Mas nós não devemos abandonar um grande principio por causa d'este inconveniente, nem uma excepção que não é admissivel; ainda assim este inconveniente póde ser minorado, facilitando as readmissões n'estas armas, offerecendo vantagens pecuniarias, que podem saír do producto das remissões.

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A proposito de remissões, em França tirou-se um grande partido dellas; entre nós nenhum; e o que tem acontecido é que o dinheiro das remissões tem sido gasto não sei como. Não tem. sido roubado, mas tem tido uma applicação que não devia ter. Pouco ou nada existe em cofre, porque se applicou a outras necessidades do paiz; mas effectivamente não devia ter sido desviado do fim para que a lei o destinou, que foi para contratar soldados (apoiados).

Ora eu entendia que, emquanto houvesse em cofre dinheiro de um homem que se remiu, não se podia dizer ao paiz: Dê-nos cá um homem para o serviço militar. Gaste o ministerio da guerra primeiro o dinheiro que tem em cofre antes de pedir mancebos.

Mas o que acontece é que se quer um homem, e o homem não apparece. E tambem não se faz grande esforço para que appareça, porque ha conveniencia em que o dinheiro fique em deposito; o ministerio da guerra não se afflige por não apparecer ninguem. Os homens que apparecem contratam-se, mas se não apparecem, paciencia, pois o dinheiro em cofre não faz despeza, e ha sempre outras cousas para que o applicar.

Mas o que resulta d'isto é uma grande injustiça para o povo. Talvez nenhum dos representantes do paiz ainda tenha dado por ella; entretanto nem por isso o paiz têm soffrido menos uma injustiça que não devia soffrer se houvesse mais escrupulo em applicar o dinheiro das remissões (apoiados).

Voltando outra vez á questão primitiva da reducção do tempo de serviço, eu entendo que é de grande vantagem; e sobretudo para a artilheria e cavallaria, porque tres annos são insufficientes; havendo certo premio e offerecendo-se certas vantagens dadas aos homens que quizerem continuar a servir, ha de apparecer sempre quem queira, e muito mais com o tempo de se.viço reduzido como fica; esta é a minha opinião.

Dou portanto todo o meu apoio a este projecto, e desejava que passasse n'esta sessão, e faço votos para que os illustres deputados o approvem, porque entendo que traz muito vantagem para o paiz, e será um meio de augmentar a força publica, obtendo um grande numero de homens habilitados a pegar em armas no momento de perigo.

Aproveito tambem a occasião para dizer a v. ex.ª o seguinte:

Li hoje, n'um d'esses jornaes de 10 réis, um artigo sobre escola de tiro nacional. Aqui esta o sr. Gavicho, meu vizinho de cadeira, que póde ser testemunha de que por quatro ou cinco vezes eu tenho lembrado, ha quatro annos a esta parte, ao governo a grande vantagem que. ha de resultar do estabelecimento d'estas escolas (apoiados). O governo e as camaras municipaes têem sempre meios para poderem estimular os mancebos a irem áquelle exercicio, e eu declaro francamente que desde o momento em que me dissessem que n'este paiz ha 5:000 mancebos bons atiradores, fazendo uso das armas de carregar pela culatra, attendendo á posição topographia do nosso paiz, desde esse momento declaro que não terei receio nenhum de qualquer força que nos quizesse aggredir ou atacar a nossa independencia (apoiados).

Portanto faço votos, não só por que este projecto seja approvado, mas lembro a conveniencia e necessidade mesmo, é este o meu mais vehemente desejo, de que se estabeleçam entre nós escolas de tiro nacional.

Póde haver alguns militares que não vejam com bons olhos o estabelecimento d'estas escolas, porque em occasião de desinteligencia entre o povo e a tropa podia isso ser inconveniente... mas primeiro que soldado, sou portuguez. Tambem o nosso exercito é essencialmente liberal, tem dado d'isso exuberantes provas. Ora, os meus immensos desejos pelo estabelecimento d'estas escolas são filhos do interesse que tenho pela independencia da patria (apoiados). Venha pois a escola de tiro nacional, e faço votos pelo seu desenvolvimento. (Vozes: — Muito bem.)

O sr. Cunha Vianna: — Não me opponho ao projecto em discussão desde que se diz, que só tem por fim estabelecer principios, mas parece-me ainda assim, que a occasião não era a mais opportuna para se approvar a reducção do tempo de serviço sem se tratar da lei de recrutamento.

Não tomei apontamentos do que disseram alguns illustres deputados que têem fallado sobre o assumpto, e nem mesmo tenho o projecto para ver e ler; ouvi-o ler uma vez apenas, e não estou muito seguro nas suas disposições, entretanto direi algumas palavras para expressar a minha opinião.

Diz-se que o serviço militar seja reduzido de cinco a tres annos. Isto é muito facil, mas como os mancebos que vem para o exercito têem de ser repartidos por todas as armas, e em todas ellas o tempo de serviço é o mesmo, differindo comtudo a instrucção, ha portanto n'isto algum inconveniente. Em tres annos podem-se ter suffriveis soldados de infanteria, mas de* artilheria e cavallaria não é possivel.

Com tres annos de serviço consegue-se que haja nos corpos do exercito, na infanteria, gente habilitada para servir de nucleo á formação de outros corpos compostos de 'gente pouco habilitada, mas para isto mesmo é necessario, estabelecer alguma cousa mais na lei do recrutamento. E isso o que se chama formar os bons quadros dos corpos, que não são compostos só de officiaes, mas de officiaes, sargentos e alguns soldados.

Qual é o modo de conseguir pelas nossas leis esses bons quadros? Não temos nenhum, porque temos na actual lei "do recrutamento uma disposição que destroe esses quadros; é a disposição relativa aos soldados contratados, aos substitutos, aos readmittidos, etc... Nada d'isto póde ser um bom quadro.

N'esta reducção do tempo de serviço de cinco a tres annos não fazemos mais do que imitar o que se faz lá fóra; é este o nosso antigo e constante costume.

O sr. Sá Carneiro: — Elles têem mais juizo do que nós.

O Orador: — Mas elles estão sempre a alterar o que fazem. E pergunto eu — seguimos nós á risca o que lá fóra se faz? Não seguimos. Nós vamos com dois artigos reduzir o tempo de serviço de cinco a tres annos, mas não dizemos como se ha de organisar a reserva. Lá fóra organisaram a guarda nacional movel, mas cá em Portugal logo que se falla em segunda linha ha um rumor que diz =não. E porque é que não se organisa entre nós a segunda linha? E porque estamos em tempo de paz. Esteja a camara certa de que não se organisa a segunda linha senão quando chegar o momento do perigo.

Portanto é uma completa ficção estarmos a imaginar que havemos de organisar a reserva para o anno que vem. Se a organisarmos ha de ser muito cára.

Eu não me opponho ao estabelecimento do tiro nacional. Já ha tiro allemão, haja tambem tiro portuguez. Mas o que eu digo é que nós já temos tiro portuguez. Na Beira, em Traz os Montes, e no Alemtejo, ha magnifico tiro. Vem de lá bellos caçadores. Eu já tenho visto alguns recrutas daquellas provincias atirarem ao alvo e acertarem cinco e seis vezes seguidas. Se organisarem porém o tiro nacional, ha de custar muito caro e não ha de servir para instrucção do exercito.

Quanto á idéa apresentada pelo illustre deputado, o sr. Pereira Dias, direi que ella é muito boa em theoria; seria excellente que todos os soldados soubessem ler e escrever, mas primeiro que isso succeda ha de passar uma geração inteira. Entretanto, diga-se a verdade, nós já temos mais soldados habilitados do que em outras epochas. Mas esperar que em tres annos de serviço no exercito possam os soldados fazer o serviço e juntamente aprender a ler e escrever, é desconhecer completamente a organisação e serviço do nosso exercito.

Por isso digo — voto os tres annos, e voto-os por uma rasão: é por sermos uma nação pequena. Não os voto por imitação, voto-os por sermos uma nação pequena e por desejar que o contingente annual seja maior, ao mesmo tempo que em dadas circumstancias póde ser chamada ás fileiras uma massa maior de combatentes do que actualmente, ainda que se não póde contar com essa massa senão para a infanteria. Para a cavallaria e artilheria não se deve esperar contingente algum.

O que é preciso é que nós na lei do recrutamento consideremos com muita attenção o modo de constituir os bons quadros. Depois convenho que licenceiem tudo quanto poderem.

Os bons quadros são os officiaes, os sargentos e um certo numero de soldados, mas soldados habilitados não só por estarem instruidos, mas por terem bom comportamento. Não basta sómente que elles saibam ensinar os deveres da disciplina e do serviço interno do quartel, é preciso que com o seu exemplo sirvam de alguma cousa para a moralidade dos que vem, porque nem todos vem com muita moralidade.

Não pretendo com isto fazer opposição ao projecto, nem me parece que elle a tenha, porque isto é uma cousa que esta na mente de todos; de uns, os militares, porque é um meio de haver maior numero de gente apta em dada occasião; e de outros, por que quem não é militar deseja tambem satisfazer com pouco tempo de serviço a esta obrigação.

E aproveito a occasião para declarar a v. ex.ª e á camara, que não aceito o dizer-se, como se tem repetidos muitas vezes, e como se lê em alguns livros, que o recrutamento seja um tributo. Não aceito esta qualificação.

O serviço militar não é um tributo, é um dever. Todo o cidadão tem obrigação de servir a sua patria, e aonde ha a lei da conscripção, presta-se um dever e não um tributo.

(Interrupção que não se ouviu.)

Isto são opiniões.

(Interrupção que não se ouviu.)

Então tambem é tributo de sangue o ser jurado, tambem são tributo de sangue outros serviços que se prestam ao paiz. Logo todos nós pagâmos tributo de sangue em todas as attribuições que exercemos, se tributo de sangue é o trabalho do homem.

Votou-se ha poucos dias um maximo de 30:000 homens, e outro maximo de 18:000. São dois maximos, para o minimo ser zero: é preciso que se saiba que quando se diz — haja 18:000 praças de pret, não são 18:000 soldados mettidos na fileira e promptos para todo o serviço. Promptos para todo o serviço não se apuram 13:000, e estes são para o serviço de todo o paiz e para o serviço de policia.

Não ha auctoridade que não requisite uma força para qualquer cousa, de maneira que o soldado anda sempre destacado em diligencias ou esta de guarda. E que tempo lhe resta para aprender a ler e a escrever?

Nós temos as escolas regimentaes montadas, mas o aproveitamento é muito pouco. Se estivesse preparado para esta discussão, podia apresentar esses resultados, porque ainda ha pouco na commissão de guerra, quando fazia parte d'ella, relatei um projecto apresentado pelo sr. D. Luiz da Camara Leme sobre escólas regimentaes, e tive occasião de colligir alguns dados estatisticos a esse respeito.

As escolas regimentaes não produzem nada. Ha mil e tantos matriculados, mas pouco podem aproveitar, porque não têem uma frequencia pela qual possam tirar um resultado satisfactorio.

Sinto não ver presente o sr. ministro da fazenda, o qual se tinha encarregado de dar explicações á camara por parte do sr. ministro da guerra. Por conseguinte eu não combatendo o projecto, entendia comtudo que não perdiamos nada se adiassemos este assumpto para janeiro. A camara não deseja isso, eu, não me opponho, mas peço ao governo que tome bem nota d'estas considerações.

O sr. Villaça: — Requeiro a v. ex.ª que consulte a camara sobre se quer que se prorogue a sessão até se votar este projecto, attendendo á sua urgencia.

Foi approvado este requerimento.

O sr. Sá Carneiro: — Requeiro a v. ex.ª que consulte a. camara sobre se quer prorogar a sessão até se votar tambem o projecto n.° 14, que diz respeito ao generalato por armas. E um projecto em que o sr. marquez de Sá tem todo o empenho.

Foi rejeitado este requerimento.

O sr. Presidente: — Sobre a generalidade do projecto em discussão esta inscripto só o sr. Sá Carneiro, que tem a palavra.

O sr. Sá Carneiro: — Cedo da palavra.

Posto á votação o projecto, foi approvado na generalidade.

Entrou em discussão o

Artigo 1.°

O sr. Sá Carneiro: — Pedi a palavra para declarar que, se a reducção do tempo de serviço se apresentasse n'esta casa isoladamente, votaria contra; mas como eu tenho a certeza de que, votada a reducção do tempo de serviço, se ha de depois tratar da reorganisação da reserva, votei conscienciosamente este projecto.

Foi approvado o artigo 1.°, e seguidamente o artigo 2.º

O sr. Barão da Trovisqueira: — Requeiro a v. ex.ª para que se verifique a votação do artigo 2.°, que acaba de ter logar.

O sr. Secretario (José Tiberio): — O artigo 2.° foi approvado por 69 votos.

Foram approvados, sem discussão, os mais artigos do projecto.

O sr. Braamcamp: — Mando para a mesa um parecer da commissão de administração publica.

O sr. Montenegro: — Vou mandar para a mesa uma representação para a qual reclamo a solicitude do nobre ministro do reino.

Eu confesso que quando a li tive duvida em a acreditar, mas não pude deixar de me convencer de que o que ella diz é verdade, não só pela asseveração de pessoas que para mim merecem toda a confiança, mas pela assignatura de 325 pessoas do concelho de Vinhaes, e pessoas que não assignára de cruz, mas que assignam o seu nome por extenso, o que é digno de toda a consideração por ser n'um concelho da provincia de Traz os Montes onde a instrucção não esta muito derramada.

São conhecidos já d'esta assembléa os nefastos acontecimentos que deram logar á annullação da eleição de Vinhaes. O nobre ministro da justiça, que esta presente, foi relator do parecer da commissão, e sabe perfeitamente o que houve. Instaurou-se um processo, mas a amnistia depois lançou um véu sobre esses crimes; comtudo as auctoridades foram conservadas nos seus logares. Dizem que pouco depois começaram as represalias, foram continuadas as oppressões, e a proximidade das eleições a que se vae proceder deu logar a que no concelho de Vinhaes recrudecessem as perseguições, as ameaças e as violencias.

Vou ler apenas uma parte da representação.

Diz-se aqui (leu).

Vozes: — Ouçam, ouçam.

Não canço mais a attenção da camara com a leitura do resto d'esta representação.

Vozes: — A quem é dirigida a representação?

O Orador: — Aos srs. deputados da nação portugueza.

Effectivamente parece impossivel a existencia d'estes factos. Mas, repito, esta representação é dirigida aos srs. deputados da nação portugueza, é assignada por 325 pessoas do concelho de Vinhaes, competentemente reconhecidas as suas assignaturas pelo tabellião Antonio Joaquim Garcia. Chamo a attenção do governo para este objecto.

As auctoridades superiores do districto, e por consequencia o governo, creio que têem sido illudidos nas informações que têem vindo d'aquella localidade.

É facto que, quando ha um espancamento, diz-se logo = é da opposição =; mas examinado o caso, o espancado é em geral da opposição, e o espancador partidario da auctoridade.

E necessario pôr cobro a estes despotismos e a estas violencias. O emprego do despotismo e da violencia póde impor aos povos o silencio do terror, mas é um gravissimo attentado contra as instituições liberaes (apoiados).

Peço portanto toda a attenção do governo, e espero que o nobre ministro do reino tomará as providencias necessarias para que sejam respeitadas as liberdades dos povos do concelho de Vinhaes, e para que se ponha cobro ao despotismo que os opprime.

Vozes: — Muito bem.

O sr. Ministro do Reino (Bispo de Vizeu): — A camara acaba de ouvir ler parte de uma representação, que não póde deixar de fazer impressão na camara e no publico.

Quando de um ponto do paiz vem uma representação assignada por 325 cidadãos, que se dirigem á representação nacional, queixando-se de oppressão e despotismo local, ainda que haja exageração, deve haver um fundo de verdade (apoiados).

Estou ha pouco tempo no ministerio do reino. Estes acontecimentos já vão longe, datam da eleição, mas uma queixa igual a esta tive-a eu particularmente. Dirigiu-ma o bacharel Barreira, que se apresenta victima da prepotencia de outros seus vizinhos.

Pouco mais ou menos o que esta n'esta representação, que acaba de ser lida, acha-se na queixa que o que se diz offendido me fez. Eu fiz o que me cumpria. Mandei-a logo ao governador civil de Bragança, pedindo-lhe contas do que soubesse e do que havia de verdade n'este negocio.

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Não fui procurar na secretaria se havia já alguma cousa passada a este respeito, porque isso não me habilitava bastante para saber o que havia agora.

Dirigi-me pois ás auctoridades, e estou á espera de ver o que ellas me dizem.

Torno a repetir; não póde suppor-se que 325 cidadãos de Vinhaes venham mentir á representação nacional. Poderá haver exageração, mas mentira não.

Hei de informar-me dos acontecimentos e chegar á verdade. E creio que a camara fará justiça tambem ao actual ministro do reino, que elle ha de applicar as leis a todos aquelles que faltarem a ellas (apoiados).

A lei ha de ser cumprida... (Os srs. Mathias de Carvalho e Montenegro pedem a palavra.)

Se lá houver prepotencias hão de acabar, e hei de fazer todos os esforços, todos os que estiverem ao -meu alcance, para que se restitua a tranquillidade ao concelho de Vinhaes, se porventura lá esta alterada.

A camara saberá se o governo dorme a este respeito ou não. Não posso dizer mais nada.

Vozes: — -Muito bem, muito bem.

O sr. Mathias de Carvalho: — Foi lida pelo nobre deputado, o sr. Montenegro, uma representação de varios habitantes de Vinhaes, queixando se de oppressão da parte da auctoridade administrativa d'aquelle concelho. A camara já sabe pelos acontecimentos que tiveram logar na ultima eleição de Vinhaes, que os espiritos ali estão longe de poderem apreciar devidamente os actos d'aquella auctoridade. O concelho esta dividido em dois partidos; por consequencia não devemos suppor que exista na apreciação dos actos da auctoridade administrativa aquella imparcialidade, que em occasiões normaes se devia encontrar.

Lembro esta circumstancia ao sr. ministro do reino, não para pedir a s. ex.ª, longe de mim tal idéa, que deixe de averiguar qual é a verdade, que deixe de tomar conhecimento dos factos que ali se tenham passado; mas peço a s. ex.ª que não esqueça tambem as circumstancias em que se acha aquelle concelho, e espero que s. ex.ª, procurando apreciar os factos livre de todas as apprehensões, como é proprio do seu caracter, faça justiça a quem se dever (apoiados).

Impressionou-me a leitura. d'esta representação, porque conheço pessoalmente o administrador do concelho de Vinhaes. Não posso deixar de declarar á camara que as idéas que tenho a respeito de s. ex.ª são as mais favoraveis. Considero-o um cavalheiro e estimo poder dar á camara este testemunho.

O sr. Montenegro: — Pedi a palavra unicamente para agradecer ao sr. ministro do reino a promptidão da sua resposta e a garantia que me dá de que ha de cumprir a lei depois de tomar todas as informações.

Não posso assegurar que o que se diz na representação seja inteiramente verdade, mas em summa o facto parece confirmar-se, porque assignaram a representação 325 pessoas que sabem ler, e por consequencia não devem ser das ultimas classes do concelho.

O meu nobre amigo o sr. Mathias de Carvalho diz, que é muito natural que os povos avaliassem mal os actos da auctoridade; mas tambem é muito natural que a auctoridade, tendo sido vencida na occasião das eleições, hoje não olhe com muita estima e com muito amor para os seus adversarios politicos (apoiados). Entretanto não quero que esta circumstancia sirva de cousa alguma, mas que se mandem tirar informações. E isso que já nos assegurou o sr. ministro do reino, pelo que eu lhe dou os meus agradecimentos.

O sr. Presidente: — A ordem do dia para ámanhã é a mesma que já está dada. Está levantada a sessão. Eram quatro horas da tarde.

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