Página 155
N.° 13.
SESSÃO DE 16 DE JULHO DE 1858.
PRESIDENCIA DO Sr. M. A. VELLEZ CALDEIRA.
Secretarios os srs.
Miguel Osorio Cabral.
João Antonio Gomes de Castro.
Chamada—presentes 54 srs. deputados.
Entraram durante a sessão — os srs. Affonso de Castro, Braamcamp, Vidal, Gouveia Osorio, Avila, Lousada, Seabra, Pinto d'Albuquerque, Gromicho Couceiro, Antonio de Serpa, Pinto Carneiro, David, Castro Guedes; Xavier da Silva, B. C. do Amaral, B. F. da Costa, Bernardo de Serpa, Pinto Coelho, Conde de Valle de Reis, Garcia Peres, Palha, Faustino da Gama, Bivar, F. C. do Amaral, Polido, Ribeiro de Faria Junior, Sena Fernandes, Gaspar Pereira, Guilhermino Augusto, Pegado, Palma, Mártens Ferrão, Cabral de Barros, Rebello Cabral, Roboredo, Sepulveda Teixeira, Simas, Pinto de Magalhães, Lobo d'Avila, Sousa Pinto Basto, José Estevão, Lourenço da Luz, Frazão, Estrella, Oliveira Baptista, Mendes Leal, Vaz Monteiro, Justino Pinto Basto, Correia Caldeira (Luiz), Castro Guimarães, Browne, Pinto Marlins, Nogueira Soares, Ferrer e Visconde da Carreira (Luiz).
Não compareceram—os srs. Ferreira Lima, Thedim, Sousa Sampaio, Dias e Sousa, Barão d'Almeirim, Possolo, Barroso, Francisco Carvalho, J J. de Mello, Sousa Machado, Barbosa da Silva, Silveira e Menezes, Fernandes Thomás, Visconde de Portocarrero e Visconde de Porto Covo da Bandeira.
Abertura—ao meio dia.
Acta-approvada. Declaração
Do sr. Barão das Lages, de que o sr. visconde de Porto Covo não póde comparecer á sessão de hoje, e a mais algumas, por ler de ausentar-se para as Caldas da Rainha.
A camara ficou inteirada.
CORRESPONDENCIA.
Officio.
Do ministerio do reino, participando, em resposta a um requerimento do sr. Ferreira Lima, que os documentos officiaes relativos á epidemia da febre amarella, que affligiu a capital no anno passado, se acham em poder de uma commissão encarregada de preparar o respectivo relatorio, que ha de ser opportunamente publicado, e por este motivo não podem ser enviados á camara.
Para a secretaria.
EXPEDIENTE
a que se deu destino pela mesa. Requerimentos.
1.º—Renovo os requerimentos que fiz nas sessões de 13
e 21 de fevereiro, 9 e 26 de março do anno passado, e que foram adoptados na sessão de 27 de maio pelos illustres deputados os srs. Miguel do Canto, Rodrigues Leal, Sardinha, Girão, Gouveia Osorio, Nogueira, F. Coelho do Amaral, Teixeira, Barão d'Almeirim, B. Coelho do Amaral, Oliveira Baptista, Sena Bello, Pedro Jacome, Seixas e Vasconcellos, Pinto Soares, Balthasar de Campos, Cordeiro, A. de S. Thomás, Alves Vicente, Rebello da Silva, Geão, J. J. da Cunha, Menezes Pita, Costa Veiga, Bettencourt, e repetidos na sessão de 11 de janeiro do corrente anno pelos srs. Miguel do Canto, Cordeiro, D. Rodrigo, Bettencourt, Rodrigues Leal, e José Guedes, a respeito: '
1. Dos devedores á fazenda nacional, a quem se têem concedido moratorias;
II. Dos arrematantes de bens nacionaes que ainda não satisfizeram o preço das suas arrematações;
III. Dos rendeiros de bens nacionaes que devem o preço dos seus arrendamentos;
IV. Dos agraciados com merces honorificas que ainda não pagaram os respectivos direitos;
V. Dos funccionarios publicos, que accumulam soldos, ordenados, gratificações, ajudas de custo, etc.
VI. Dos thesoureiros pagadores, recebedores, e mais exactores fiscaes que estão alcançados com a fazenda publica;
VII. Dos diplomaticos que devem ajudas de custo ou adiantamentos, que ainda não encontraram nos seus vencimentos.
Requeiro mais, que quaesquer esclarecimentos, que*o governo lenha fornecido em satisfação d'estes requerimentos, sejam publicados, na sua integra, no Diario do Governo; e bem assim que o sejam todos aquelles que successivamente se forem recebendo, com relação a este negocio. Paulo Romeiro—D. Rodrigo de Menezes..
2. ° — Renovo o requerimento que fiz na sessão do 1.° de maio de 1857, pedindo que, pelo ministerio competente, fosse remettido a esta camara um mappa estilístico dos seguintes artigos despachados por importação nas alfandegas grande e municipal de Lisboa, e na alfandega do Porto nos annos de 1853, 1854, 1855 e 1856:
Melaço estrangeiro.
Dito nacional.
Figo.
Alfarroba.
Medronho.
Vinho.
Aguardente estrangeira.
Requeiro mais que n'esle mappa seja comprehendida a estatistica de importação d'estes mesmos artigos a respeito
Vol. II—Julho— 1858.
13
Página 156
— 156—
do anno de 1857, e do 1.° semestre de 1858. = Patrio Romeiro.
3. º—Renovo o requerimento feito na sessão de 16 de janeiro d'este anno pelo sr. Rodrigues Cordeiro, e assignado pelos srs. D. Rodrigo, M. do Canto, Pinto d'Almeida, Pedro Jacome, Rodrigues Leal, e por mim; pedindo que, pelo ministerio da fazenda, fossem enviados a esta camara os differentes relatorios annuaes, que, em conformidade do artigo 23.° do decreto de 10 de novembro de 1850, tenham sido dirigidos ao mesmo ministerio pelo tribunal de contas = Paulo Romeiro.
4. °—Renovo os requerimentos que fiz nas sessões de 20 de fevereiro e 2 de Julho d'este anno, para que, pelo ministerio da fazenda, sejam remettidas a esta camara, com urgencia:
I. Copias de todas as consultas dirigidas ao governo pela commissão nomeada por decreto de 3 de novembro, para propor a reforma das alfandegas.
II. Copias dos pareceres das commissões especiaes nomeadas pela associação commercial de Lisboa, para auxiliar esta commissão no trabalho que lhe foi commettido. = Paulo Romeiro = Barros e Sá.,
5. º—Não tendo o governo até ao presente cumprido o que se ordena no artigo 14.º da carta de lei de 15 de julho de 1857, requeiro que, pelo ministerio competente, sejam remettidos a esta camara todos os documentos especificados no citado artigo,= Bivar — Barros e Sá.
6. º—Para poder habilitar-me convenientemente a sustentar as interpellações mandadas para a mesa, e a formular, se tanto for preciso, uma proposta de censura contra o ministerio, peço que, pelo ministerio do reino, seja remettida a esta camara a copia de todos os papeis relativos á pretenção da camara municipal de Braga, para ser auctorisada a contrahir a primeira serie do emprestimo para a construe cão da estrada da mesma cidade para o Bom Jesus do Monte, e igualmente todos os papeis relativos aos orçamentos dos annos economicos de 1857 a 1858, e d'esle a 1859, que a mesma camara pretende sejam approvados, remettendo-se copia de todas as portarias pelo ministerio expedidas a lai respeito, das respostas dadas pela camara, officios do governador civil, e auctorisações do conselho de districto. == Alves Vicente.
Foram remettidos no governo.
Notas de Interpellação.
1.ª— Desejo interpellar o sr. ministra do reino sobre os seguintes objectos, que requeiro com urgencia lhe sejam communicados:
I. Qual a rasão por que não tem approvado os orçamentos da camara municipal de Braga para os annos economicos de 1857-1858 e d'este a 1859.
II. No caso de que tal facto tenha acontecido, porque os ditos orçamentos porventura não tenham as solemnidades legaes, qual a rasão por que não attendeu ao requerimento da mesma camara, em que pedia a sua dissolução, maiormente quando a referida camara declarára que não podia continuar na gerencia do municipio na falla daquellas approvações, a qual considerava como uma manifestação clara da nenhuma confiança que mereci» ao governo.
3. ª—Que medidas se tomaram ultimamente quando a camara de Braga se declarou camara de mero expediente, o que assim communicou ao governador civil e mais auctoridades, pedindo se pozesse cobro a uma Ião extraordinaria situação. = Alves Vicente.
4. ª—Desejo interpellar o sr. ministro do reino para que declare a rasão por que não tem. em cumprimento da lei, auctorisado a camara municipal de Braga a contrahir a primeira serie do emprestimo para a construcção da estrada para o Bom Jesus do Monte, contrariando assim os desejos de uma cidade inteira, que lamenta não poder obter, ainda á sua custa, os melhoramentos de que carece, e que já leria conseguido, a não serem os obstaculos postos pelo governo. =Alves Vicente.
Mandaram-se fazer as communicações.
SEGUNDAS LEITURAS.
Proposta.
Renovo a iniciativa do projecto n.° 64, de 1857. = Sepulveda Teixeira.
Foi admittida, e enviada á commissão de instrucção publica.
Foram remettidas á commissão administrativa da camara as contas da junta administrativa, desde 8 de março até 30 de junho d'este anno.
O sr. Presidente: — A grande deputação encarregada de apresentar a Sua Magestade a resposta ao discurso da corôa, cumpriu hontem a sua missão, sendo recebida com a affabilidade costumada; e a mesma grande deputação lendo concorrido ao cortejo real, eu, na qualidade de presidente dirigi a Sua Magestade o discurso que vou ler, assim como a resposta de Sua Magestade.
Discurso.
Senhor! — A camara dos deputados vem respeitosamente felicitar a Vossa Magestade pelo anniversario do nascimento da augusta Rainha dos portuguezes.
Começando a celebrar se entre nós este injustissimo dia, -a nação espera festeja-lo por longos annos, e a camara dos deputados renovar muitas vezes a Vossa Magestade este tributo dos seus sentimentos.
A Providencia prospere e dilate os preciosos dias de Vossas Magestades.
Resposta de Sua Magestade.
A camara dos deputados congratulasse comigo pelo motivo do anniversario natalicio da Rainha, minha amada esposa.
Ninguem póde interessar se mais do que eu pela realisação dos votos que a camara dos deputados fórma pela felicidade da Rainha, e pela conservação de seus dias. Ninguem pois poderia agradece-los mais sinceramente do que aqui o faço.
Na vida do soberano entrelaçam se satisfações e dissabores. Padece por si, e padece por tantos que d'elle podem depender. Na vida domestica encontra elle, como todos com quem tem necessidade de parecer-se, ou sempre ou nunca, a felicidade que, na vida publica, Ião intermittente se mostra.
O sr. Presidente: — A camara quer que, lançando se tudo na acta, a resposta de Sua Magestade o seja como recebida com especial agradecimento?
Resolveu se que fossem lançados na acta, tanto o discurso como a resposta de Sua Magestade, sendo esta recebida com especial agrado.
O sr. Guedes de Carvalho: —.Tenho a mandar para a mesa uma representação da camara municipal do Alandroal, no mesmo sentido de outra que apresentei da camara municipal de Villa Nova de Reguengo, sobre a distribuição do contingente para o recrutamento; como porém já esta distribuido o parecer dá commissão de guerra, relativo á distribuição dos contingentes de recrutas pelos differentes districtos, não mando a representação para a mesa.
O sr. Barão das Lages: — Antes de tudo mando para a mesa uma representação da camara municipal de Penafiel, na qual se expõe, com as mais vivas côres, os males que estão resultando á agricultura e commercio da desastrosa emigração para o imperio do Brazil. -
Chamo novamente a attenção do governo sobre este grave, mal que affecta profundamente o paiz.
Sr. presidente, já dirigi uma nota de interpellação sobre este assumpto, e espero provocar da parte dos srs. ministros explicações que satisfaçam as reclamações publicas, sobre um assumpto de tanto momento.
Sr. presidente, vou tambem apresentar dois projectos de lei, e peço licença para fazer algumas considerações, que julgo indispensaveis.
Página 157
—157—
Tendo sido ha dez annos honrado com os suffragios dos meus patricios, seria um homem muito ingrato se não procurasse todas as occasiões para defender os seus interesses.
Ha cinco annos, pouco mais ou menos, levantou-se uma luta de morte entre um alto dignatario da corôa, o sr. conde de Penafiel, e os habitantes daquellas terras, e ou elles hão de encontrar protecção e auxilio no parlamento, ou então aquelle dignatario da corôa levará a desgraça, a miseria e a perturbação a muitos centos de familias naquellas povoações; porque todos sabem que as terras reguengueiras, depois do decreto de 13 de agosto, foram consideradas como partiveis, e que se ellas vem agora a considerar-se como emphyteuticas, n'esse caso os filhos mais velhos irão rehaver de seus irmãos aquellas partes, que ha mais de vinte annos lhes foram consignadas em inventario; causando isto uma desordem completa na fortuna daquelle povo.
Se o sr. conde de Penafiel realisar o seu direito, como pretende, n'esse caso tem de levantar uma somma de mais de cem mil cruzados, que aquelles desgraçados povos têem de lhe pagar.
Ah! que se o sr. Mousinho da Silveira resuscitasse, elle morreria de pena ao ver tão tristemente sophismado o seu pensamento liberal.
Sr. presidente, se o decreto de 13 de agosto, feito debaixo do estrondo das armas, foi unicamente um fim politico e com elle se alacam direitos adquiridos, n'esse caso fossem indemnisados pelo thesouro publico; mas nunca se deviam deixar subsistir estes impostos territoriaes, que são uma vergonha no governo representativo.
O concelho de Penafiel paga as contribuições para o estado, e mais 30 por cento para a casa do sr. conde, a fim de o indemnisar de setenta mil cruzados que seu avô havia dado por um officio publico que tinha comprado a Filippe II.! Mas se este cavalheiro ainda não está indemnisado, em logar de dezesete mil cruzados que se lhe paga pelo thesouro publico, dêem-se-lhe trinta, quarenta, ou os que quizerem; mas de fórma alguma se deve consentir um tal absurdo, de ser uma só terra que esteja a concorrer para esta indemnisação.
Sr. presidente, hei de tratar sèriamente esta questão, ainda que ella me dê desgostos, como já me succedeu com o sr. João de Mello, ao qual desejo dar explicações, e á camara, para me justificar da posição pouco agradavel em que me tem collocado em' relação a um cavalheiro que respeito..
O sr. Presidente: — O sr. deputado não esta na ordem; agora não é logar opportuno para dar essas explicações.
O Orador: — Entendo que v. ex.ª tem rasão; mas estando ha um mez á espera de me explicar, requeiro á camara permissão para dar esta explicação.
Consultada a camara resolveu negativamente.
O Orador (continuando): — A camara ha sido pouco generosa em não consentir na minha explicação; mas eu appello da pouca liberdade da tribuna para a imprensa livre, e ahi poderei satisfazer o meu desejo.
Eu entendo em minha consciencia que o sr. conde de Penafiel, a quem muito respeito, não tem justiça nenhuma.
Sr. presidente, quem equipara o direito sagrado da propriedade particular ao direito que se possa ler. aos officios publicos, ainda mesmo aos comprados, commette um erro muito grande, porque pelas leis d'este paiz nunca elles constituiram uma propriedade perfeita, pois todos sabem que são bens inalienáveis da corôa; quem comprava sabia que o rei, querendo, podia tirar-lh'os no dia seguinte á compra, e era esta a rasão por que os officios publicos se vendiam sempre por baixo preço. Mas entendo eu que a lei de 22 de junho não póde ser revogada, porque já tem creado muitos direitos que não podem destruir-se; n'este caso limito-me a propor a remissão daquellas pensões.
Isto é um bem incontestavel para este donatario da corôa, e para todos aquelles que se acharem em iguaes circumstancias, e tambem para aquelles povos, porque não ficam a pesar eternamente sobre aquella terra estes tão graves encargos.
Tambem mando um outro projecto para que os pensionistas não possam ser obrigados a pagar por uma só vez as pensões vencidas, quando os senhorios não abriram os seus celleiros, nem estabeleceram procuradores.
O sr. Mousinho de Albuquerque: — Peço a v. ex.ª que me inscreva para apresentar um projecto de lei.
O sr. Balthasar de Campos: — Mando para a mesa o diploma do sr. Francisco de Paula Pinto Tavares, deputado eleito por Castello Branco; e por esta occasião participo que este meu amigo me encarregou de communicar á camara que motivos inopinados e invenciveis o tem privado de vir tomar parte nos trabalhos da camara, e que espera vir logo que elles cessem.
O sr. Pequito: — Pedi a palavra para mandar para a mesa uma representação da commissão administrativa da santa casa da misericordia de Estremoz, que pede que a camara auctorise o governo a fazer-lhe a concessão do edificio do convento de Santo Agostinho, a fim de para ali passar o hospital, visto que o edificio onde actualmente se acha collocado não tem condições algumas proprias para um estabelecimento daquella classe. A commissão diz=que já em 1846 fez este pedido ao governo, em 1857 repetiu á camara = r e por isso remetto a representação para a mesa, para que v. ex.ª lhe dê o destino conveniente.
O sr. Azevedo e Cunha: — Quando o anno passado se votou a distribuição dos 600:000$000 réis para estradas, recommendou a commissão de obras publicas ao governo que mandasse estudar a estrada que devia communicar as duas Beiras; este estudo parece-me que não se fez; e eu repito este anno o mesmo requerimento, para que se faça o estudo d'essa estrada, bem como o da estrada de Vizeu a Lamego. Este requerimento vae assignado por mais sete srs. deputados.
Igualmente tenho que renovar a iniciativa de um projecto que o anno passado apresentei, assignado tambem pelo sr. Colaço, para que os vencimentos das praças de pret do exercito fossem augmentados com uma pequena quantia. Este projecto não leve solução, e reconhecendo eu que necessariamente precisa ser melhorado o desgraçado estado dos nossos soldados, por isso renovo a iniciativa d'esse projecto, pedindo á respectiva commissão que quanto antes dê o seu parecer sobre elle.
O sr. Menezes Pitta:—Pretendia que v. ex.ª me informasse se o sr. ministro da justiça já se tinha declarado habilitado para responder a uma interpellação que na sessão de 5 mandei para a mesa, assignada por mim e pelo sr. deputado Placido de Abreu, ácerca da creação de alguns circulos de jurados em alguns logares onde houver o numero necessario de jurados para comporem a pauta.
O sr. Barros e Sá: —Sr. presidente, vou mandar para a mesa duas propostas, e ainda que eu desejava dizer duas palavras sobre cada uma d'ellas, reconhecendo quaes são os desejos de v. ex.ª nada direi. A primeira é. (Leu)
Peço a urgencia d'esta proposta, a fim de ser discutida e votada hoje sendo possivel. A segunda é. (Leu.)
A este respeito direi sómente, que a provincia de Traz-os-Montes é a unica que não conhece beneficio algum da civilisação moderna.
O sr. Presidente: — Vou propor á camara a urgencia da primeira proposta.
O sr. Mello Soares: — Não me opponho ao pedido do illustre deputado, mas parece-me que é inutil, porque ha já uma resolução tomada pela camara, para que todas as propostas do governo sejam publicadas no Diario do Governo; a mesa póde informar sobre isto.
O sr. Presidente: — Manda-se informar á secretaria e depois se dará seguimento á proposta.
O sr. Barros e Sá: — Se houve já resolução da camara não é necessaria a minha proposta, e então espero que v, ex.ª faça com que na secretaria cumpram esta disposição, porque já duas vezes pedi que se publicasse uma certa proposta, e não foi publicada; quero que a publicidade seja tão completa quanto póde ser.
Página 158
-158-
O sr. Bernardo de Serpa: — Pedi a palavra para mandar para a mesa duas representações das camaras municipaes de Moimenta da Beira e Sernancelhe; têem a data de 27 e 28 de março, eram dirigidas á camara da legislatura passada, e como não chegaram a tempo déas apresentar, pareceu-me que agora era occasião propria. É uma estrada muito importante aquella de que tratam as representações; é a estrada de Lamego a Almeida, e parecem-me muitissimo ponderosas as rasões que apresentam as camaras. Eu sinto que na distribuição dos fundos para estradas não venha mencionada esta, mas isso não impede de remetter as representações para a mesa e recommendar muito o objecto d'ellas á consideração da commissão, que se ha de convencer das rasões, que me parecem muito procedentes, das camaras municipaes; e sem duvida destinará para ellas alguma quantia importante. Espero que a illustre commissão fará ver ao sr. ministro das obras publicas a necessidade de attender a este pedido.
O sr. Luiz Caldeira: — Pedi a palavra para mandar para a mesa uma representação da camara municipal de Torres Vedras, ácerca do justissimo pedido relativo á construcção da estrada daquella villa á capital pela Cabeça de Montachique.
Sr. presidente, o concelho de Torres Vedras é infeliz em negocios de estradas; ha alguns annos fez muitos e valiosos esforços para se concluir a estrada de Alhandra, da qual havia já duas leguas feitas, e apesar d'esses trabalhos lerem começado ha oito, ha dez ou não sei mesmo se ha vinte annos, a estrada está ainda por acabar, com grande incommodo dos povos, e sobretudo com grave prejuizo da fazenda publica.
Nada mais direi ácerca d'este negocio, sobre o qual ha na mesa uma nota de interpellação ao sr. ministro das obras publicas, assignada por mim e pelos srs. Sebastião de Carvalho e Paulo Romeiro.
Pelo que respeita porém á estrada da Cabeça de Montachique, sempre direi que por vezes tem sido já votadas diversas quantias para ella; mas até agora ainda nem uma só teve a applicação que lhe fóra destinada.
Por consequencia chamo a attenção da illustre commissão de fazenda sobre este objecto. A estrada de Torres Vedras a Lisboa pela Cabeça de Montachique é a mais recta, é portanto a mais curia e é indubitavelmente a mais commercial, se não a unica commercial daquelle concelho.
E agora que foi já apresentada pelo sr. ministro das obras publicas uma proposta para a distribuição dos 1.000:000$ réis, destinados a este importante objecto, peço que a illustre commissão se lembre que o concelho de Torres Vedras é um dos mais visinhos de Lisboa, ao mesmo tempo que é um dos mais ferteis e mais agricultores; não deve ficar por falta de communicações mais longe da capital do que os mais remotos do reino, que vejo contemplados com avultadas quantias.
O sr. Antonio de Serpa: — Para que sejam pedidas com urgencia ao governo as representações das camaras municipaes de Oliveira de Azemeis e Maceira de Cambra sobre a necessidade de uma estrada, e que vão á commissão das obras publicas antes d'ella dar o seu parecer sobre a proposta do governo dos 1.000:000$000 réis para a distribuição das estradas, mando o seguinte
Requerimento.
Requeiro que sejam pedidas ao governo, com urgencia, para serem presentes á commissão de obras publicas, em quanto essa discute a proposta do governo para a distribuição dos 1.000:000$000 réis pelas estradas do reino, as representações das camaras municipaes de Oliveira de Azemeis e de Macieira de Cambra, sobre a necessidade de um ramal de estrada entre aquelles dois concelhos. = Antonio de Serpa = Sousa Pinto Basto = Conde de Valle de Reis.
Foi remettido ao governo.
Foi introduzido na sala com as formalidades do estylo, prestou juramento e tomou assento o sr. Francisco Ribeiro de Faria Junior, deputado eleito por Lamego.
O sr. Ferrer: — Sr. presidente, pergunto a v. ex.ª se ha sessão secreta.
O sr. Presidente: — Ha de haver.
O sr. Ferrer: — Hoje?
O sr. Presidente: — Hoje não póde ser.
O sr. Ferrer: — Queixo-me de não ser hoje, como se prometteu.
O sr. Presidente: — Em um requerimento do sr. Paulo Romeiro, pedindo esclarecimentos ao governo, que vae ser expedido, propõe que, á proporção que vierem os esclarecimentos, sejam impressos no Diario do Governo; e por isso consulto a camara a este respeito.
A camara resolveu affirmativamente.
PRIMEIRA PARTE DA ORDEM DO DIA.
Continuação da discussão do projecto n.º 5
O sr. Polido: —.................................
O sr. Cesario: — Sr. presidente, eu pouco tenho que dizer sobre este ponto. Na sessão passada quando foi apresentado para a discussão este projecto, pensei eu que elle passaria sem que deputado algum tomasse a palavra, porque já não é o primeiro objecto d'esta natureza que vem a esta camara, e passa sem discussão. Mas como o nobre deputado que me precedeu pediu a palavra contra, pedi eu immediatamente a palavra a favor para o sustentar, porém agora folguei de ver que o illustre deputado longe de o combater, fallou a favor do projecto. Apesar d'isso não posso deixar de dar alguns esclarecimentos ácerca d'esle objecto.
Sr. presidente, parece-me a mim que este projecto é uma censura ao governo, e não só a este governo mas a todas as administrações passadas, porque diz o projecto, que é para applicar ao pagamento das dividas passivas do hospital de Coimbra a quantia de 3:300000 réis.
Mas nem a commissão nem a representação deu a rasão ou o motivo por que o hospital tem esta divida. A rasão por que aquelle estabelecimento tem esta divida, claro esta que é porque gasta mais do que as prestações que se lhe dão; e por que gasta mais? Porque o numero de doentes tem acrescido.
Esle hospital foi creado pelo marquez de Pombal para a admissão de um numero limitado de doentes, o de cento e vinte, mas como este numero tem augmentado e alem d'isso têem augmentado os encargos do estabelecimento em consequencia dos seus melhoramentos, as prestações que se lhe dão não são sufficientes para occorrer ás suas necessidades, que têem ido em escala ascendente.
Fallou se nas misericordias; as misericordias devem concorrer ou concorrem para a sustentação dos doentes nos hospicios ou hospitaes que são encarregados de sustentar; mas em Coimbra a misericordia já deu para este hospital bastante, porque deu aquillo que lhe era necessario. (Interrupção.)
A camara não quer saber estas cousas, pois então eu limito-me a dizer que a misericordia de Coimbra dá 500$000 réis por anno para a sustentação d'esle hospital. No tempo da administração passada offerecia-se a dar 1:200$000 réis annuaes, e uma portaria do ministro do reino mandou que a misericordia désse só 500$000 réis annualmente.
O que acontece agora, ha de acontecer todos os annos. Hão de vir todos os annos pedir que se attenda ás dividas passivas do hospital, o que ha de dar logar a um dia fechar-se a porta, porque não só o governo mas a representação nacional, têem adormecido e não têem querido saber do que se passa nos hospitaes do reino. Em algumas partes ha uma difficuldade muito grande em admittir os doentes por falla de meios sufficientes. Em Coimbra já aconteceu haver doentes deitados no chão sem lençoes.
Eu não só voto pelo projecto, mas peço que o governo dê attenção ás representações que lhe têem sido dirigidas pela
Página 159
—159—
faculdade de medicina, que quer tirar de si a administração d'esse estabelecimento (Interrupção.)
Muito bem; voto a favor do pro]ceio, como uma medida paliativa, porque n'esle paiz tudo são medidas paliativas. Para o anno apresentar-se-ha outro projecto no mesmo sentido.
O sr. Pinto d’Almeida: — Peço a v. ex.ª consulte a camara, sobre se o projecto está sufficientemente discutido. Julgou-se discutido; e pondo-se logo á votação o Artigo 1.°—foi approvado. Artigo 2.º— foi approvado.
O sr. José Estevão: — Eu pergunto a v. ex.ª se já foi approvado o projecto que auctorisa o governo para applicar ao pagamento das dividas passivas do hospital de Coimbra a quantia de 3:300$000 réis?
O sr. Presidente: — Já, sim senhor, agora é o n.° 6.
O sr. José Estevão: — Reservarei para outra occasião o que linha a dizer, porque eu hei de negar sempre o meu voto a projectos d'esta ordem: entendo que a maneira de resolver este negocio era por meio de uma medida geral, em relação a todas as misericordias. Este é o caracter das medidas governamentaes, o mais e a negação de lodo o governo; mas cada um aproveita-se da occasião que póde para fazer beneficio á sua terra.
Passou-se á discussão na generalidade do seguinte
Projecto de Lei. (N.° 6.)
Senhores: — A camara municipal do concelho de Portalegre dirigiu uma representação á camara transacta para que lhe fossem concedidas as duas igrejas das freguezias supprimidas de S. Martinho e de Santa Maria Magdalena, para no terreno d'ellas poder estabelecer um mercado, e edificar um chafariz, para commodidade e proveito dos povos daquelle concelho. A commissão de fazenda daquella camara, conformando-se com o parecer da commissão de administração publica, linha dado o seu, no sentido de acceder á representação da camara municipal do concelho de Portalegre, formulando para isso o competente projecto de lei. Não póde seguir esse projecto, dados os tramites legaes, antes da dissolução daquella camara. Agora, o sr. deputado por Portalegre, João da Fonseca Coutinho, renovou a iniciativa d'elle. Em vista das rasões com que o precede, dos pareceres das antigas commissões de fazenda e de administração publica, e da representação primitiva da camara municipal do concelho de Portalegre, a vossa commissão tem a honra de vos apresentar o seguinte projecto de lei;
Art. 1.° É auctorisado o governo a conceder á camara municipal do concelho de Portalegre as igrejas secularisadas e em ruinas das duas freguezias supprimidas de S Martinho e Santa Maria Magdalena, a fim de poder estabelecer no local da primeira um mercado, e no da segunda um chafariz.
Art. 2.º Fica auctorisada a camara municipal do concelho de Portalegre a fazer os contratos necessarios para levar a effeito os melhoramentos de que trata o artigo antecedente.
Art. 3.° Fica revogada toda a legislação em contrario.
Sala da commissão, em 26 de junho de 1858. = Antonio de Serpa Pimentel= Augusto Xavier da Silva—José Lourenço da Luz=José da Silva Passos=Anselmo José Braamcamp— Joaquim José da Costa e Simas.
N.° 3-RR. — N.° 191 do anno de 1857,
Sr presidente. — Renovo a iniciativa do projecto de lei n.° 191 da illustre commissão de fazenda d'esta camara em a ultima legislatura, apresentado em sessão de 23 de fevereiro ultimo, em que a camara,-conformando-se com o parecer da commissão, auctorisou o governo a concederá camara municipal da cidade de Portalegre as duas igrejas em ruinas das freguezias extinctas de S. Martinho e Santa Maria magdalena; o projecto de lei é do teor seguinte:
Art. 1.° É auctorisado o governo a conceder á camara municipal da cidade de Portalegre as igrejas das duas freguezias supprimidas de S Martinho e de Santa Maria Magdalena, a fim de poder estabelecer no local da primeira um mercado, e no da segunda um chafariz.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.
Sala da commissão, 9 de julho de 1857 == José da Silva Passos = Faustino da Gama =Antonio Cabral d» Sá Nogueira (com declaração)=José Silvestre Ribeiro (com declaração)=Luiz Augusto Rebello da Silva=Augusto Xavier da Silva=Barão de Almeirim.
Esle projecto, sr. presidente, foi remettido á camara dos dignos pares, mas não chegou a ser discutido, caducou, e por isso é que renovo a sua iniciativa.
Aquella localidade tem a maior precisão que esta concessão lhe seja feita quanto antes; tem projectado melhoramentos muito importantes á salubridade publica, que não póde levar a effeito sem que ella tenha logar.
Peço portanto a v. ex.ª seja remettido á commissão de fazenda este projecto, para que, ouvida a commissão de administração publica, dê o seu parecer coma brevidade possivel.
Sala da'[commissão, em 23 de junho, de 1858. = José da Fonseca Coutinho, deputado pelo circulo de Portalegre.
N.° 191.
Senhores: — A commissão de fazenda examinou a representação da camara municipal do concelho de Portalegre, em que pede se lhe concedam as duas igrejas das freguezias supprimidas de S. Martinho e Santa Maria Magdalena, para no terreno d'ellas poder estabelecer um mercado, e edificar um chafariz, de que tanto proveito póde resultar aos povos daquelle concelho.
A commissão, attendendo ás rasões expostas pela municipalidade e ao pequeno valor dos referidos edificios, e conformando-se com o parecer da illustre commissão de administração publica, tem a honra de offerecer á sabedoria da camara o seguinte projecto de lei.
Artigo 1.º É auctorisado o governo a conceder á camara municipal do concelho de Portalegre as igrejas das duas freguezias supprimidas de S. Martinho e Santa Maria Magdalena, a fim de poder estabelecer no local da primeira um mercado, e no da segunda um chafariz.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.
Sala da commissão, 9 de junho de 1857. = José da Silva Passos — Faustino da Gama —Antonio Cabral de Sá Nogueira (com declaração) = José Silvestre Ribeiro (com declaração) = Luiz Augusto Rebello da Silva = Augusto Xavier da Silva = Barão d'Almeirim.
E pondo-se logo á votação o
Projecto na generalidade—foi approvado.
O sr. Pequito: — Peço a v. ex.ª consulte a camara sobre se quer passar já á especialidade d'este projecto.
Decidiu-se affirmativamente. — E pondo se á discussão s logo á votação o
Artigo 1.º—foi approvado.
Artigo 2.º—approvado.
Artigo 3.°—approvado.
O sr. Secretario (Miguel Osorio): — A commissão de redacção não fez alteração ao projecto n.° 5, e vae remetter-se para a outra camara.
SEGUNDA PARTE DA ORDEM DO DIA.
Continuação da discussão do projecto de lei n.º 13
O sr. D. Rodrigo de Menezes: — Eu pedia a v. ex.* que tivesse a bondade de me dizer a classificação dos oradores a favor e contra, e se não abuso da bondade de v. ex.ª, me fizesse o obsequio de dizer os que estão inscriptos?
O sr. Presidente: — Quando o sr. deputado acabar de fallar, eu perguntarei aos srs. deputados que estão inscriptos, os que são a favor, e contra.
O Orador: — Bem, v. ex.ª fará o que entender.
Eu tinha dito na sessão passada e sustentado com as rasões que me era possivel, que para se votarem ao governo os-sacrificios que elle pede ao paiz, era preciso que elle mos
Página 160
— 160—
trasse se a arrecadação da fazenda era feita o melhor possivel, se elle tinha empregado os meios para melhorar os differentes ramos da administração publica n'este sentido; (Apoiados.) e em segundo logar, que era de absoluta necessidade mostrar o governo em que linha procurado equiparar a despeza com a receita, porque no estado em quo nos achâmos, com um deficit permanente, que não desce de SOO a 600:000$000 de réis; um deficit que está hoje representado n'uma divida fluctuante de 4 000:000$000 réis; um deficit para o qual é preciso applicar talvez 300:000$000 réis annuaes para os seus juros; um deficit que não póde deixar de assustar todos os homens que se interessam pelo bem geral do seu paiz; um deficit, sr. presidente, que desgraçadamente é augmentado muitas vezes á custa dos sacrificios que nós pedimos ao paiz para a sua prosperidade, como é o augmento e desenvolvimento das obras publicas; e ss. ex.ª sabem que ainda o anno passado foi necessario pedir a esta casa um bill de indemnidade pela distracção dos fundos destinados a obras publicas, e se eu não tivesse outra rasão para fundar a minha falla de confiança no governo, este seria um argumento assás forte, que levaria a eu não poder de maneira alguma prestar a ss. ex.ªs um serio apoio, como exigem n'este projecto. (Apoiados.)
Sr. presidente, a terceira cousa que eu julguei precisa, foi que o governo mostrasse a conveniencia, a necessidade e o interesse publico que ha em fazer certas e determinadas obras, e sobretudo aquellas que estão destinadas a melhorar o estado de salubridade publica de Lisboa; é preciso acompanhar, sr. presidente, a relação d'essas obras com o necessario desenvolvimento para se mostrar a sua conveniencia, para que o governo tem tido tempo, porque ha perto de nove mezes que houve o flagello da febre amarella em Lisboa, e não se tem feito cousa alguma, podendo o governo n'esse longo espaço ler feito esse exame e mostrar a conveniencia d'essas mesmas obras. Fundado n'esta terceira necessidade, eu hei de terminar por uma proposta que me passou da cabeça na discussão passada, pelo estado de doença com que estou. Fallo agora do aterro que ss. ex.ª estão fazendo na margem do Tejo, por me ler esquecido hontem o que queria dizer a esse respeito. Eu linha dito então, não obstante a desconfiança permanente que tenho tido contra todas as emprezas e companhias de estrangeiros, que aqui tem vindo a Portugal negociar comnosco, eu não podia deixar de defender uma companhia, que aliás não tem cumprido o que prometteu, é a companhia do caminho de ferro de Cintra; esta ou não está em pé o contrato com esta companhia? Se está, porque é que ss. ex.ª vão invadir já um direito que foi conferido áquella companhia, fazendo um aterro despendioso, com o qual não tiveram nenhum accordo com a companhia!
Quando o governo passado se ingeria nos trabalhos do caminho de ferro de leste, nós com toda a rasão nos zangámos e lamentámos uma tal intervenção do governo, e porque é que ss. ex.ªs intervém agora n'um objecto d'estes? §e a companhia não cumpre o seu dever, só se prorogou o praso, qual é a portaria que o prorogou, ou então porque não esta rescindido o contrato? Isto mesmo preciso eu dizer a respeito do caminho de ferro do Porto; o caminho está promettido por um contrato, o praso expirou, logo deve haver uma portaria ou um acto official, que nos diga se foi prorogado aquelle praso, ou está rolo aquelle contrato, e isto n'uma occasião em que aquelle cavalheiro, com Ioda a sua respeitabilidade, abandona á sua terra e se apresenta com os engenheiros; mas a opinião publica diz que elle quer ser empreiteiro; e quando uma portaria manda dar dois terços das empreitadas aos empreiteiros pequenos, eu temo que isso se applique aos grandes.
Tambem desejava que ss. ex.ª me dissessem, se este dinheiro produzido pelas acções vendidas no Brazil, que deve ter voltado ao thesouro, e voltado em alguns centos de contos de réis, qual é a applicação d'esle dinheiro? qual é o seu destino? eu não posso dizer com certeza, mas talvez mais de 1.200:000$000 réis era o total; não sei hoje o que falta a entrar, ou se já entrou todo, mas desejava saber qual é o seu destino?
Ss. ex.ª permittir-me-hão que eu lhes traga á memoria, que por uma lei do estado até 30 de junho do anno proximo passado, devia-se ter gasto 100:000$000 réis na estrada marginal do Douro; ora n'uma conta apresentada no Diario do Governo falta ainda 39:000$000 réis, creio eu, n'esta parte é preciso um novo bill d'indemnidade; não é quantia grande, mas é uma falha dos preceitos estabelecidos, e falha que, quando se pedem novos sacrificios, deve actuar no animo dos deputados da opposição, que não tem tanta certeza e confiança no governo, como podem ler aquelles que privam com elle.
Sr. presidente, torno a trazer á memoria do sr. ministro das obras publicasse meu amigo, a portaria que s. ex.ª publicou em 13 de agosto do anno passado. Quer ou não s. ex.ª aceitar as offertas dos povos de Guimarães, de Fafe e das duas Bastos? É ou não conveniente a estrada para Traz-os-Montes, atravessando aquelles concelhos? Se é, s. ex.ª linha um anno para fazer esses estudos e até hoje ainda não se fizeram. Na epocha das eleições appareceram ali officiaes engenheiros, assim como as respeitaveis bandeirolas, mas recolheram se aos bastidores apenas acabou o acto eleitoral. Sr, presidente, as obras de Lisboa são um pesadelo para mim, porque receio o quanto ss. ex.ªs têem de soffrer e as exigencias extraordinarias que se hão de fazer por causa d'essas obras. A camara municipal de Lisboa fez uma representação a esta casa, na qual pede que o emprestimo lhe seja inteiramente entregue; como as obras são municipaes e a camara se ache com força de fazer o emprestimo para ellas, e que este negocio seja separado da acção do governo e seja entregue a auctorisação para lazer o emprestimo e para o applicar segundo as conveniencias e necessidades do municipio. Existe ou não esta representação? Eu não a vi, mas se existe, admiro-me que a illustre commissão não se referisse a ella.
Oh sr. presidente! Pois a camara municipal de Lisboa não é um corpo assás respeitavel para que d'elle se deva fazer menção, quando representa no interesse do municipio e quando trata de obras extraordinarias como estas? Entendo que sim, e surprehendeu-me, quando tive conheci mento d'esta representação, dever que nós n'esta casa, caso algum d'ella tinhamos feito. Ora, sr. presidente, veja v.ex.ª o perigo de se fazer as reformas municipaes que na sessão passada se exigiram e pediram a esta casa, quando hoje, não existindo essa reforma, nós deixâmos uma representação d'esta magnitude sem tomarmos d'ella conhecimento tão amplo e tão minucioso como deviamos fazer. Não sei, sr. presidente, até onde chegará a conveniencia de entregar á camara municipal de Lisboa o direito de fazer esse emprestimo e de o applicar ás obras; não sei, muito mais quando eu ouço dizer que é necessario revestir as montanhas do outro lado do Tejo, porque a força da corrente leva as suas terras até á barra, e para isso seria necessario milhares de contos, quando é muito mais facil mudar o lazareto da posição em que está, e colloca-lo n'outro ponto aonde se fizesse menos despeza. Quer a commissão que o excedente do tributo seja applicado ao caminho de ferro do sui? Quem' é que auctorisou já os trabalhos d'esse caminho? Já estão elles votados pela camara? Pois haverá algum sr. deputado que vote um tributo para uma cousa que as camaras não resolveram que se ha de fazer? Isso é impossivel. Sr. presidente, em tributos só se pede o preciso. Eu preciso de 200:000$000 réis, lanço ao paiz 400:000$000 réis, e os 200:000,000 réis são para o caminho de ferro do sui, quando não esta votado por lei alguma. (Apoiados.) O facto é este. Desejava que os meus amigos, membros da commissão de fazenda, dessem as explicações porque assignaram o parecer com declarações. (Apoiados.) Desejo isso, sr. presidente, porque elles com mais proficiencia, com muita illustração e com perfeito conhecimento de causa, trarão ao meu coração talvez o convencimento de cousas que eu não posso ler hoje; trarão um desengano que é preciso para que de algum modo vote, não
Página 161
-161-
o lodo, porque é impossivel, mas parte do que os srs. ministros pedem. Sr. presidente, avancei aqui uma inexactidão na sessão passada, e\ou rectifica la; mas que triste rectificação. Disse que linha havido um alcance no hospital de S. José de 18:000$000 íeis, mas depois soube que são 14...
O sr José Lourenço da Luz:: — São 18...
O Orador: — Bem; tinham me dito 14:000$000 réis: e já antes d'este houve dois alcances, um de 20:00011,000 réis e outro de 4:000$000 réis; e agora 18:000$000 réis, della a 42:000$000 réis Ora n'um estabelecimento que vive de esmolas, de prestações do estado, da caridade publica, que é o patrimonio do pobre, é preciso que se evitem alcances d’esta ordem, e quem quer que for que administre esse estabelecimento lenha fiscalisação bastante para conhecer os ladrões, aquelles que roubam os dinheiros publicos. Em honra da memoria d'esse homem que já não existe, tenho ouvido dizer a muita gente que não foi elle quem distrahiu esses fundos, que era homem honrado e pessoa inoffensiva, mas que a generosidade do seu coração, porque emprestava o alheio, e outras muitas cousas, fazia com que o pobre homem, não tirando lucro algum, deixasse á sua familia este triste legado.!
Peço ao sr. ministro das obras publicas o que já lhe pedi n'outra occasião. O telegrapho electrico é um dos maiores 1 elementos de civilisação publica; os ordenados são insignificantissimos: um chefe de estação tem 400 réis, e consta-me que ha estações aonde estão atrazados mezes. Não sei se é verdade. Peço a s. ex.ª duas cousas, a paga em dia e a melhoria dos ordenados; porque é uma despeza productiva com que se não perde cousa alguma. Os reformados que existem 1 no concelho de Guimarães, alguem que me escreveu de cá, J diz que ha um grande atrazo nos pagamentos; e é uma advertencia que faço ao sr. ministro da guerra. Sr. presidente, o que levo dito justificava assás a minha falla de confiança politica ao governo; mas eu tenho e devo adduzir outros motivos e outras causas pelos quaes assim penso. Eu citei, sr. presidente, n'esta casa, no mez de janeiro, quando aqui entrei, um facto que ss. ex.ªs ainda julgam resentimento da minha parte, e de o fazer reviver unicamente na discussão e nas palavras que vou dirigir. Mas accusei, sr presidente, o governo pelo grande desleixo na maior parte dos ramos de administração publica; accusei, argui, que é uma expressão menos dura e offensiva, de que deixasse correr livremente a falta de processos crimes que ha para com a maior parte dos culpados; a ponto, sr. presidente, de estarem homens presos dez annos, como eu aqui referi, e de serem julgados quatro vezes com annullação do processo. Mal sabia eu, sr. presidente, que um anno depois de ter feito prender os moedeiros falsos de Braga, estivessem como ainda estão hoje por julgar com escandalo publico. Aponto este facto, a desconsideração em que esta um dos tribunaes de primeira ordem; aponto o descredito em que. alguns homens daquelle tribunal lêem caído, compromettendo a reputação e credito dos seus collegas, apesar de saber que a honra e a honestidade não se confunda com a maldade e crime; e ninguem ainda accusou um juiz honesto, pondo sobre elle as faltas dos culpados. Se argui o governo, é pelo desleixo com que deixa que alguns homens da classe ecclesiastica estejam manchando a sua missão, a sua missão santa! (Apoiados.) Eu já disse aqui por tres vezes, que a religião catholica, se não fosse divina e santa, aquelles que estão encarregados de a defender e sustentar, linham dado cabo d'ella. (Apoiados.) Não ha papel, não ha jornal, não ha dia em que não appareçam factos escandalosos! O que é que se tem feito para moralisar esta terra? Prendeu se ha poucos dias no Porto um conego implicado em moeda falsa, tres ecclesiasticos achei eu implicados em Braga em crime de moeda falsa: isto póde soffrer-se? Pois os homens que estão evangelizando esta terra hão de dar êstes exemplos? Não se podem nem se devem tolerar. (Apoiados.) O mais culpado de todos os criminosos é o que pactua com o crime.
Sr. presidente, chegou a desgraça a ponto de soffrer Portugal os maiores insultos e as maiores humilhações possiveis, e sobre o que vou dizer, chamo muito especialmente a attenção dos srs. ministros.
Sr presidente, veiu á frente de um parlamento um ministro dos negocios estrangeiros considerar Portugal lodo como moedeiro falso; assim se acha escripto no relatorio do ministro dos negocios estrangeiros do imperio do Brazil, de que ss. ex.ªs devem ler conhecimento. (O sr. Ministro da Fazenda: — Apoiado.) Se alguem nos póde arguir, não é o Brazil. (Apoiados.) Se ha homens de Portugal tão indignos que manchem a sua patria, que manchem o nome de portuguez, levando ao Brazil moeda falsa, ha brazileiros que vem buscar a flor da nossa mocidade para os fazer escravos no centro do Brazil. (Apoiados.) Que providencias tem tomado o governo do Brazil para evitar que seja ali feito escravo o homem livre, o branco, o christão? E será cidadão brazileiro quem tal faz? Pois não se deve respeitar o homem seja de que côr for, e a lei do Brazil presta Ioda a protecção ao desgraçado que, seduzido, vae para ali arrancado do lar de sua familia e a amigos, que deixa sua mulher e filhos, porque muitos homens casam, principalmente na provincia do Minho, e deixam sua mulher e seus tenros filhos I para irem para o Brazil ser escravos? Vão ser escravos de j homens que os traiam com desprezo, de uma maneira barbara. que os têem em roças sem dignidade, sem consolação, sem caridade, e até sem soccorro da religião, unico que nos resta, quando estamos para abandonar este mundo! Pois será 1 o Brazil que nos póde lançar pedradas, chamando-nos moedeiros falsos? Poderá o Brazil dizer com rasão que se rompam as suas relações comnosco, porque somos um paiz de piratas? Aonde esta a dignidade do governo portuguez, que 1 soffre isto? (Apoiados.) Eu, sr. presidente, ou o relatorio do j ministro dos negocios estrangeiros do imperio do Brazil havia de ser reformado, ou havia largar aquellas cadeiras. (Apoiados.)
Sr. presidente, quaes são as providencias que o governo tem tomado para moralisar o paiz? Qual é a lei que aqui nos apresentou para evitar essa emigração terrivel, immoral e indigna, que está lendo logar no nosso paiz? Chama-se escravidão á situação em que se acham os pretos; perante Deus são iguaes tanto o prelo como o branco; mas pergunto, que se faz ao branco quando chega ao Brazil? Faz-se peior que aos pretos que vão da Africa. Ali é humilhada a dignidade do homem livre; assim que chegam, tratam-nos em tudo e por tudo como escravos; e fazem mais, separam os maridos das mulheres, as mulheres dos maridos, arrancam as filhas aos paes e levam-n'as para os lupanares!! (Sensação.) E os portuguezes soffrem isto! Oh! sr. presidente, sinto, e sinto muito do coração não ver presente o sr. ministro dos negocios estrangeiros; eu me esqueceria agora da amizade e delicadeza com que s. ex.ª me trata para usar de phrases mais duras do que estas que estou usando.
Sr. presidente, sahe v. ex.ª o que acontece aos moedeiros falsos, que vão ao Brazil espalhar notas falsas? Vão para lá, passam-n'as Iodas sem incommodo nem prejuizo algum; pouco tempo depois apparecem em Portugal livres! Lá não poderam prender esses homens que fizeram a moeda falsa, e que a foram lá espalhar, e que a passaram; nós é que havemos descobrir, havemos sonhar quem a fez ás escondidas, e a espalhou lá!
Houve insultos á nação portugueza; a nossa imprensa ' soffre isto, e o nosso governo admitte lai!.. Sr. presidente, se somos nação é preciso repellir energicamente estas affrontas. (Apoiados.) Quando se insulta qualquer homem, esse insulto repelle-se immediatamente; é este o dever de lodo o homem de brio e dignidade. (Apoiados) Uma nação tem a dignidade de homem, e deve proceder n'essa conformidade; se se lhe dirige um insulto, se se lhe faz uma injustiça, deve repellir o insulto e fazer reparar a injustiça. (Apoiados.) O relatorio a que alludi não deve ficar sem resposta. (Apoiados.) Sr. presidente, bem disse eu que o peior do meu discurso tinha ficado para hoje, bem dizia eu que elle era pungente ao meu coração.
Sr presidente, eu respeito os srs. ministros, faz-lhes hon-
Página 162
—162—
ra o seu caracter; digo mais, custa a encontrar homens tão limpos de mãos, tão honestos, mesmo com tanta intelligencia, e com tantos desejos de acertar; mas ss. ex.ªs são infelizes. A culpa não é minha.
Sr. presidente, um deputado seguro na sua consciencia, conscio do seu dever, forte na rasão que vem a esta camara accusar as faltas que ha, que pede providencias, que argue o governo, este deputado está desempenhando uma missão, que não troco por cousa alguma d'este mundo. Veja a maioria a grande responsabilidade que deve recair sobre ella, se por indulgente e não severa com o governo, lhe prestar o seu apoio em tudo que elle quizer, e deixar depois de lh'o prestar em medidas de pouco alcance, fará com que elle cáia sem saudades do paiz. E que desgosto não lerá o homem publico quando saír das cadeiras dos ministros, sem que o paiz tenha por isso saudade alguma?/E estas saudades do povo ganham-se, quando se tem feito a bem d'elle tudo quanto era possivel fazer-se, quando se tem apresentado ou feito passar medidas que o paiz reclamou, quando se tem attendido ás suas necessidades e aos seus clamores, mas não quando se tem por desgraça e infelicidade ido de erro em erro, até se caír n'um precipicio.
Sr. presidente, é me impossivel n'esta occasião deixar de chamar a attenção de ss. ex.ªs para uma cousa a respeito da qual tenho annunciada uma interpellação; mas no estado em que eu estou, nem a camara, nem os meus amigos podem exigir mais de mim; eu lerei d» os largar n'estes trabalhos, é isso o que se me aconselha e a minha saude o pede, não poderei pois verificar essa interpellação, e então seja-me permittido que eu, com sentimento de todo o meu coração, diga duas palavras sobre o objecto d'essa minha interpellação.
Sr. presidente, se os homens na Europa, se as primeiras intelligencias, se as pessoas mais notaveis precisam de um padre esclarecido e exemplar que os ajude, aconselhe e anime, que seja o vinculo de sua familia, que os una sempre, que faça com que a paz reine entre a familia, para o que é preciso um padre esclarecido e moral; se d'isto se carece na Europa, o que não será nas colonias?
Pois os nossos irmãos das colonias não precisam ler junto a si os seus padres, os seus bispos? Elles nunca podem abandonar o seu ministerio, e eu não posso deixar de refutar o que o sr. ministro da fazenda então aqui disse, porque v. ex.ª não me permittiu que eu fallasse. Eu disse: «Diga s. ex.ª o que quizer, que eu estou calado á ordem do nosso presidente»; tal é o respeito que eu tenho por v. ex.ª, mas agora chegou a occasião de fallar.
Os bispos não pódem passar de bispado para bispado, como passa um governador de um districto para outro (Apoiados.) O bispo casa com a sua igreja, lá vive e lá morre, e deve dar exemplos de moralidade e saber. A religião não se casa com o interesse, se é preciso interesse então abandonemos a religião, eu sou religioso pela minha cabeça e pelo meu coração. O bispo deve entregar-se na sua diocese ao serviço do seu sagrado ministerio e não ír para outra que lhe convem mais. Diz-se: «O bispo não tem saude». Se não tem saude em um bispado pobre, tambem não tem saude em um bispado rico. Eu se fosse rico linha a mesma saude que tenho hoje; mas isto não é nada, sr. presidente. O que é mais, é que se vae ao ultramar buscar um bispo onde elle é mais preciso, para o ir collocar na ilha da Madeira, onde o protestantismo lavra com tanta força, na ilha da Madeira onde se precisa de um homem cheio de força, de illustração, de edificarão e de dedicação. Eu não digo que tudo isto não lenha o illustre prelado que para lá mandaram, nem estou tratando de o arguir, quem eu arguo é o governo pelo mandar para lá, porque em manda-lo para lá, ataca-.se de face o que a igreja prescreve. Só de Angola ha dois resignatarios em Lisboa e ha de haver mais para o futuro. Ah! igreja, que fostes tão pura nos primeiros seculos, que púnheis por cima da porta dos templos os nomes daquelles que se linham esquecido dos seus deveres, tanto é a prova de que a religião não manda encobrir faltas, que pódem offender o interesse da moral e da decencia publica.
Dizendo isto, devo uma satisfação ao caracter do prelado de quem fallei. Não o conheço, e estou persuadido de que será muito intelligente, muito erudito e muito digno, mas pelo menos é doente, e quem abandona a sua igreja por doente não póde ir trabalhar em outra. Quem sabe se isto tambem me fará perder alguns amigos, se esta linguagem desgostará alguem!
Eu a respeito de popularidade vou cada vez a menos. Já disse que fui repellido de Leiria, depois do Porto, agora vou avançando para o norte e já me acho em Guimarães. Tambem se me sumirão os amigos, por dizer a verdade? Espero que não, mas quando isso aconteça, fico com um amigo que me não ha de abandonar, que é a minha consciencia e o Juizo de Deus, que eu aprecio sobre tudo.
Mas tenho eu confiança no governo?... No ministerio que teve aqui em janeiro passado a maioria de seis votos n'uma questão de moralidade! Maioria que lhe deu a morte apparente! O que quer isto dizer? Que só houve um voto de censura mais directo? Tres propostas foram para a mesa, que eram tres censuras, e contentaram-se com a menor. Pergunto: o que se fez depois á syndicancia? Lá morreu; não se sabe d’ella, assim como se não sabe do inquerito ou syndicancia sobre a alfandega da Horta: morrem tambem... (O sr. ministro da Fazenda: — Está publicada nos jornaes.) Se v. ex.ª já a mandou publicar, retiro a arguição.
Sr. presidente, apresentou-se aqui n'esta casa uma proposta de lei com o fim de obstar á emigração, e a primeira cousa que se fazia era estabelecer o cargo de alliciador para o Brazil; a unica providencia que tenho visto propor para obstar á emigração portugueza, que era nada menos do que dar patente para engajar portuguezes, pagando por isto réis 3$000, e deixa-se de pé a lei do recrutamento sem reforma, que é a maior excitação para a emigração. A lei do recrutamento é necessario reforma-la, porque em muitos pontos errámos. Pois não dissemos que podiam emigrar os mancebos até á idade de dezoito annos, mas que desde os dezoito até aos vinte, não, porque estavam sujeitos ao recrutamento? O que acontece é que se vão embora até aos dezesete annos, e não apparece um moço de vinte annos em algumas terras da provincia do Minho! A Vieira parece me que é um concelho bem administrado: pois não apparece lá um mancebo de vinte annos: vão para o Brazil antes dos dezesete, e vem de lá velhos e ricos, se é que vem. É necessario, portanto, reformar a lei do recrutamento e quanto antes, apresentando para isso o governo a proposta respectiva. É necessario tratar do registo civil, e para isto não é precisa lei alguma. Santo Deus, fazem a carta defeituosa, da mesma maneira que alguns padres fazem a porta do céu apertada. O registo civil é uma cousa que se póde entregar á auctoridade civil; encarregar aos administradores dos concelhos que o tenham em dia. Pois alguem póde duvidar que em os governadores civis mandando aos administradores dos concelhos que procedam á feitura do registo, e estes mandando a todos os chefes de familia que lhes dêem uma relação por ordem, e que lhes participem os casos de obito e de nascimento, se não póde ter um registo civil muito bom? (Uma voz: — Entreguem-o, aos parochos.) Aos padres não peço nada senão que me absolvam quando lá for Ha Anlonios que se tem mudado para Antonias. Lastimo que o sr. ministro do reino não goste d'estas discussões, não goste d'isto. S. ex.ª tem collegas muito dignos e muito respeitaveis; mas ha cousas que só com o proprio ministro se podem tratar, e infelizmente não ha meios de nos encontrarmos; s. ex.ª sabe que eu sou seu amigo, e que não accuso a pachorricce do seu genio. Se eu tivesse aquelle genio, estava mettido na cama com os padres á cabeceira, ou talvez já tivesse morrido; mas cá vou andando e combatendo na tribuna.
Sr. presidente, levanta se ao paiz um rasgo de generosidade puramente portugueza: não houve terra, não houve freguezia, não houve aldeia, não houve pobre que não mandasse o resultado das suas economias, o fructo dos seus trabalhos para acudir aos orphãos e viuvas da febre amarella:
Página 163
-165-
todas estas esmolas foram depositadas na mão do governo: o governo tem tido a maior confiança, que tem havido: é o pobresinho, apesar das suas necessidades, que corre em auxilio do seu irmão afflicto. Esses, é que dão verdadeiramente esmolas. Para o pobre que nada tem, é tanto dar cinco íeis como para quem tem cem contos dar tres, ou quatro. (Vozes: — É verdade, apoiado.)
Esse pobre confiou no governo, e disse: «Ahi vae a minha esmola para a viuva, para o orphão, para o desgraçado, que escapando á febre amarella, ficou reduzido á mendicidade.» Porque a morte é o menor dos males que acontece n'esta vida; ainda não ouvi ninguem queixar-se de ter morrido (Riso), ninguem, olhem que mal tão grande que ninguem se queixa! Este é que é o grande remedio' que eu hei de ler aos meus males e soffrimentos.
Sr. presidente, como correspondeu o governo á esta confiança publica, manifesta e inteira n'elle? como? Não dando contas e não applicando o dinheiro. Quer v. ex.ª saber quanto se diz que existe d'este dinheiro? Eu bem dizia que não podia ser hoje tão amavel com ss. ex.ªs como me pareceu que tinha sido outro dia; mas creiam que tudo isto não altera em nada a consideração, respeito e estima que tenho por ss. ex.ªs Diz o publico, que é quem sabe de todos os acontecimentos, de todas as cousas, e de todos os negocios por mais intrincados e reconditos que sejam, que não ha em caixa mais do que 40:000$000 réis! Pois seja 10:000$000 réis, em que se gastou o mais? Não foi n'esse asylo da Ajuda, que é regido por umas senhoras que são as verdadeiras irmãs da caridade, porque não ha desgraçado em Lisboa que não conheça a senhora condessa de Rio Maior, (Apoiados) e mais ainda, que não conheça sua filha, (Apoiados) uma menina instruida, de muito espirito, de muita delicadeza com belleza mesmo, e que se entrega constante é permanentemente ao serviço arduo e duro de andar subindo escadas com sua mãe para levar a esmola ao desgraçado, o pão ao infeliz, a roupa ao nu, e para cumprir todas as obras de misericordia. E é isso cá para mim quem salva o asylo; essas senhoras vêem-se com todas as difficuldades, vêem-se reduzidas a todas as angustias do coração para acudirem áquellas creanças infelizes, e não é só ás que lá estão no asylo, é tambem ás que estão cá fóra, porque as creanças são oitocentas e tantas e só tresentas estão recolhidas. Quinhentas não estão bem tratadas; comem pouco, não aprendem nada, e preparam-se para a perdição, porque é o que acontece em Portugal. Não só em Lisboa, mas na maior parte das terras das nossas provincias vêem-se creanças abandonadas; aqui está um illustre deputado de Braga que não me deixará ficar mal; vêem-se nas ruas daquella cidade vinte ou trinta creanças, dormindo como caes á roda uns dos outros, para com o calor animal poderem supportar o frio da estação; vêem-se deitadas ás portas das casas transidas de frio e fome, e a auctoridade administrativa julgo que vê isto, e não lhe dá remedio porque não póde... porque não póde, sr. presidente. E ha estabelecimentos de piedade com um capital de perto de réis 2.000:000$000, em que se alguem for tocar para acudir a estas desgraças, gritam logo que é um attentado e empregam o dinheiro em festas, como se Deus aceitasse os foguetes e os fogos de artifício, como se Deus se não affligisse de ver deitar ao chão, á poria daquelle mesmo que o esta desbaratando, o patrimonio do pobre, porque a esmola do rico é o patrimonio do pobre, gasto em festejos, em enfeitar cargos e em mil outras cousas que eu não quero mencionar. E agora direi eu de passagem que uma parte d'esses capitaes são emprestados, e estão hoje pelas mãos de particulares que não pagam, e que se tornam caloteiros, porque isto aprende-se, e um officio que se aprende, e que vão pedir ás misericordias um emprestimo a S por cento pára negociarem com outros a 12 e a 20! (Apoiados.)
Sr. presidente, Portugal faltam-lhe recursos? O que lhe falta é juizo. Eu tenho-me visto em muitas afflicções na minha vida; quando me vi sem dinheiro é que achei recursos, porque até ahi não os procurava; gastava, faltou me, procurei os recursos.
Sr. presidente, a falla de contas das esmolas applicadas para os infelizes da febre amarella, é um escandalo; peço perdão da aspereza d'esta expressão, ainda não diz bem tudo o que sinto no fundo do meu coração. É offensivo e escandaloso, em presença dos deveres sociaes, guardar a esmola do pobre, e não lhe dar o destino que lhe manda dar quem a fez. (Apoiados.) Se vier uma outra calamidade, os srs. ministros não podem tirar da esmola dada para as victimas da calamidade que passou, nem uma moeda de um real, para a dar ás victimas da nova calamidade; e necessario respeitar a propriedade e a intenção: essa esmola é d'aquelles, não é d'estes.
Morreram da febre amarella dezeseis medicos, dezeseis facultativos, não sei se seria mais, deixaram as familias todas ricas? Morreram cincoenta e dois padres, é esses padres, esses martyres, não leriam mãe, irmãs, familia infeliz e desgraçada a quem se deva supprir e soccorrer? Oh, sr. presidente TE mesmo os ricos, mesmo os que tinham fortuna, precisam de alguma cousa que anime, que conforte e, de estimulo. Pois dão-se commendas e habitos, faz-se todo o mundo titular, faz se todo o mundo grande (quanto mais liberal é o homem, por vergonha da humanidade, mais apreço dá a estas frioleiras), e não se dá um habito, não se dá uma distincção ao medico e ao padre que velou á cabeceira de milhares de doentes, e que ali sacrificou, futuro da sua familia! (Apoiados.) que ali sacrificou pela humanidade o amor a seus filhos e a sua mulher, a quem sahia que, morrendo, deixava ás porias de Lisboa a pedir esmola!...
E os ricos, sr. presidente? Os, ricos tratam de servir a Deus, mas sem desagradar ao diabo! (Riso.) Dão quanto querem, ninguem os obriga a dar.. Sr. presidente, só dá quem tem precisão, que esse é que sabe a desgraça e a necessidade do pobre: quem lhe sobeja não danada! Ha sujeitinho que se tivesse sabido quando havia de morrer na vespera fazia cousas grandes! (Risadas.) Melhoremos a instrucção publica, melhoremos este grande elemento, de civilisação que está abandonado; não é formando cadeiras e entregando-as a mestres que nada sabem, com uma mesa de pinho que dá a camara municipal e dois bancos, que isso se, conseguirá.
Ora de que serve á instrucção assim? Não serve de nada. Eu quando peço isto, não quero dizer que os ministros centralisem tudo, porque um dos nossos grandes males tem sido a centralisação levada ao ponto em que a lemos. Diz o sr. Alexandre Herculano que a centralisação que hoje existe é o absolutismo liberal, porque esta centralisado nos ministros o que d'antes estava na mão do rei, mas então o rei tinha certa responsabilidade; ouvia certos tribunaes, e quando se excedia, vinha uma revolta que o punha a caminho; não tenha duvida nenhuma,(essa é a, belleza, do systema constitucional, e peço perdão aos meus nobres amigos para entrar n'esta questão. Os srs. ministros querem que eu lenha confiança no governo? Eu sou homem de principios, sou liberal, não pelo que vejo; sou liberal porque fui beber ao Evangelho os principios liberaes que tenho; foi ali que Deos igualou perante si todos os homens, a lei deve do mesmo modo igualar-nos a todos.
E foi por isso que me horrorisei quando o sr. ministro da fazenda' no discurso que n'outro dia aqui fez, sustentou a theoria apresentada do alio daquella tribuna, de que a dissolução da camara era um acto do poder moderador, de sorte que nós não podemos tocar naquella area santa sem offender o espirito da carta. (O sr. Ministro da Fazenda: — Não disse tal.) Ora, eu peço perdão; s. ex.ª tomou a responsabilidade, mas tomou-a como um acto de puro cavalheirismo.,,
Sr. presidente, quando alguem aconselha ao chefe do estado que dissolva uma camara, não se embrulha, no manto real; o homem de estado que não é capaz de ouvir contrariar as suas opiniões, não é liberal, é necessario que com sangue frio me ouçam, e que assim como do, alto daquella tribuna disseram tudo quanto quizeram, me deixem tambem agora fallar. (O sr. Presidente: — Ninguem o interrom-
Vol. II —Julho—1858.
13.
Página 164
-164-
pe: o illustre deputado póde fallar.) Eu sei, tenho a esperiencia da amabilidade com que a camara me honra, e é uma das cousas que me faz uma admiração extraordinaria, porque eu não mereço de todos os lados da camara o favor com que me tratam, e digo em consciencia, como homem que fallo diante de Deus, que não esperava o favor com que a camara me tem tratado; e não é só agora, isto dá-se ha tres legislaturas; e creio que é por uma rasão, e v. ex.ª já a conhece, porque se disse aqui um dia que eu não era infallivel; de certo não sou infallivel, mas sou verdadeiro; a camara Sabe que sinto o que digo, e que sigo os dictames da minha consciencia, e eu creio que por isso mesmo que sou verdadeiro, é que a amizade, com que me honro, do sr. ministro das obras publicas, ha de augmentar ainda mais... (O sr. Ministro dai Obrai Publicas:—....)
O Orador: — Muito obrigado! Mas se houvesse um governo mau que substituisse o actual, o que Se seguia d'ahi! Repetir-se-iam estes acontecimentos! Escolher até acertar, guerrear até acertar; "era o que eu faria em quanto podesse. (O sr. Paulo Romeiro: — Apoiado.) O nobre ministro esta com tanta amabilidade comigo, que eu não quero repelir o que se disse já: alguem ha que diz que se esta administração saisse do poder, não podia acontecer peior do que succedeu quando caiu a regeneração, que foi vir outro governo peior; eu não quero dizer isto, mas ha quem o diga; fui eu mesmo na sessão passada: póde vir peior, e póde vir melhor.
Sr. presidente, que diz o artigo 139.º da carta constitucional? Diz o seguinte:
«As córtes geraes no principio das suas sessões examinarão, se a constituição politica do reino tem sido exactamente observada, para prover como for justo.»
Para que é isto? Isto não serve de nada na carta?
Diz o artigo 102.°: «Os ministros de estado referendarão ou assignarão todos os actos do poder executivo, sem o que não poderão ter execução.»
Pergunto ao sr. ministro, se o poder moderador determinar, por qualquer caso, dissolver a Camara, não estando o decreto da dissolução referendado por s. ex.ª, se algum de nós saímos d'aqui? Feliz paiz é Portugal. Republica! Nós não trocámos a nossa republica pela republica americana ingleza; nós, homens livres, que queremos que não haja acto nenhum que parta do poder moderador, que não cumpra ao ministerio referenda-lo, não trocámos a nossa republica por nenhuma republica; o chefe da nossa republica é Orei. monarca illustrado, moralisado, e que nos dá em tudo os melhores exemplos. (Apoiados.) A face do artigo 105.º póde alguem dizer que não cabe a responsabilidade aos ministros, quando esse artigo diz expressamente: «Não salva aos ministros da responsabilidade a ordem do rei vocal, ou por escripto»? Se ha alguem que não queira isto, eu fujo d'está terra, onde talvez esteja mais em perigo, muito mais dó que muitos dos illustres deputados que me escutam, e eu sei porque o digo. Este mesmo discurso de hoje não era uma boa cama para me deitar, e por isso digo que a carta ha de ter sempre em mim um grande defensor, um grande defensor, sim, senhores. É a salvaguarda da minha pessoa, que eu respeito muito; (Riso.) é a salvaguarda da minha propriedade que me é necessaria para viver, e mais que tudo a salvaguarda do bem estar do paiz, que é mais do que eu, e mais do que todos nós. Sr. presidente, eu não preciso corroborar a minha opinião, citando alguns nomes de publicistas estrangeiros, mesmo eu Sempre tive repugnancia aos sabios estrangeiros, tomára eu haver-me com os portuguezes que me dão bastante que fazer; não preciso citar mais auctoridades, porque tenho a opinião dos srs. ministros, tambem porque ss. ex.ªs hão de confirmar e ratificar esta doutrina, porque ss. ex.ª são homens de lei; não sabem quando sairem daquellas cadeiras, se virá um governo que applique para com elles o mesmo principio É uma questão de interesse proprio. E eu peço perdão para dizer em honra do nobre ministro das obras publicas, o sr. Carlos Bento, a quem já tive uma vez occasião de fallar sobre este negocio, s. ex.ª apresentou-me as idéas liberaes, identicas áquellas que estou sustentando. Creio que n'isso não faço injuria. Peço perdão, mas não ha remedio senão dize-lo.
Eu não quero entrar agora em grandes considerações a respeito da ingerencia das auctoridades, das eleições. Ss. ex.ªs estão muito contentes porque obtiveram uma grande maioria no paiz inteiro Pois alegrem-se os srs. ministros; mas eu vou fazer uma prophecia que não ha de agradar. Ss. ex.ªs com a maioria da camara actual não estão melhor. Faço esta justiça á maioria da camara, aonde vejo homens tão leaes, de tão boa fé, e tão desejosos de ver triumphar os principios de justiça, que nem são, nem hão de ser jámais uma maioria cega. Estou intimamente convencido de que se uma medida for boa, qualquer d'esses cavalheiros a approva como antes, e se é má, ha de combate la ou rejeita-la. (Apoiados.)
Então qual será a rasão por que o governo esta tão vaidoso, porque o paiz escolheu ou deixou de eleger aquelles cavalheiros que se julgavam com direito a ler um logar n'esta casa. Isso não quer dizer nada, porque ha trinta annos que se trabalha em eleições n'esta terra, e ainda não houve governo algum que perdesse as eleições senão um, e foi porque se deitou a dormir, e a dormir perde-se muita cousa boa. Esle mal é velho. Consulte-se o paiz, deixe-se o paiz escolher livremente, e auctorisem-se os empregados a usar da sua influencia, do seu nome e da sua posição para influir a favor d'esle ou daquelle. Ha dois modos de empregar essa influencia, ou a influencia para vencer uns ou para afastar outros. Antigamente empregava-se a força, agora não se emprega esse meio, é o geito. Faz-se mais. Diz-se: «Eu não quero intervir, mas apresentámos, uma lista dos nomes d'onde deixâmos escolher, só entre os nossos amigos, individuos que se quer que sejam atentos » e não ha remedio, bella escolha.,,
Ora os srs. ministros intervieram nas eleições, o sr. ministro negou. Foi quando eu contei a historia do regedor de S. Mamede que foi fallar ao governo, e a quem se prometteram grandes cousas, e que por fim recebeu 80000 réis para as obras da igreja, e a eleição venceu-se. Foi a demissão ao regedor de Santa Catharina. Foi a eleição de Aldeia Gallega. Foram outros muitos factos que não repelirei agora. Mas ss, ex.ªs hão de permittir que eu diga que se a promessa do caminho de ferro de Aldeia Gallega era uma cousa justa e de lei, vendia-se a justiça, se se promettia uma cousa que não era justa e de lei, comprometteu-se a justiça, e comprou-se os votos. D'aqui ninguem me lira. E as bandeirolas de Aldeia Gallega? Quer v. ex.ª saber qual o resultado de empregar as auctoridades sómente para seus galopins eleitoraes? Eu o vou contar. Ha dois ou tres dias foi o regedor de S. José, acompanhado de quatro cahos de policia, esperar um litterato baixo, com bigode, e com dimensões acanhadas, e chegando-se a elle com uma bengala na mão, em ar de ameaça disse-lhe: «Leia este papel»; o litterato não viu mais nada, porque logo se seguiu uma grande bofetada; era um homem prudente, tomou posições á retaguarda, começou a gritar pela guarda, tirou testemunhas, e dizem que vae fazer não sei o que, que talvez fosse melhor que não fizesse nada. Será isto administração publica E se o litterato tivesse tanta força nas mãos como tem na -penna, tinha morto o regedor, e fazia bem. Se a auctoridade administrativa tem o atrevimento de vir embaraçar quem passa, é porque nós não nos fazemos respeitar. Se o cidadão fizesse recuar a auctoridade administrativa até ao seu logar, não tinha esse desaforo a auctoridade de ameaçar os cidadãos. Auctoridade e governo paternal de florete na mão! Mas la) é o estado da administração publica.
Ha tres ou quatro semanas, passei pela rua Nova dos Martyres, e junto á igreja de S. Francisco vi um tapume que tinha um grande buraco, que deixava ver umas ossados humanas n'uma altura horrivel, que me fez recuar de horror. Isto na rua e n'um sitio aonde entram caes e gatos, e tudo quanto ha. E é isto uma cidade policiada! A segurança pu-
Página 165
—165—
blica está reduzida a deixar andar os louros estramalhados por essas ruas, e os regedores a espancar os cidadãos! Eternos uma guarda municipal armada dos pés até á cabeça, e sem ao menos ter dois capotes para se cobrir cada soldado, não estão confortareis, e gastando-se com ella 200 e tantos contos.
Sr. presidente, vou tratar de outro objecto sobre que não posso deixar de locar, e sobre o qual quero que a camara decida, se commetti algum crime.
Sr. presidente, eu não sou regenerador, declaro-o á face de Deus e todo o mundo. Eu não sou de partido nenhum, porque não ha partido nenhum em que não ache muita cousa má. Sou do partido da carta, sou homem livre e mais nada; mas agora a dissolução atirada á cara! E o sr. ministro já disse que dissolveu a camara, não por uma maioria contra o governo, mas por haver uma minoria facciosa; eu não fui minoria facciosa, declaro-o á face de Deus e dos homens. Pois o governo expressa-se assim a meu respeito e eu hei de ter confiança n'elle? Que systema constitucional é este, onde o governo dissolve uma camara e quer declinar a responsabilidade d'esse acto?.. Dizia Chateaubriand, que quem tivesse muito amor ao governo absolutista fosse estar seis mezes na Turquia; ora venha aqui ouvir esta doutrina, e diga-me se não emalota o fato e se põe a uma distancia respeitavel. Pois Levanta-se um ministro da corôa e diz:« A opposição era facciosa...»
O sr. Ministro da Fazenda: — Não disse, ninguem ouviu tal.
O Orador: — Eu não digo isto por offender a v. ex.ª
O sr. Ministro da Fazenda: — Leia as palavras que eu proferi.
O Orador: — Pois se me permitte, vou ler.
O sr. Ministro da Fazenda: — Apoiado; gosto que o faça.
O Orador: — V. ex.ª disse que para dissolver uma camara não bastava uma maioria contra o governo, bastava que a minoria fosse facciosa.
O sr. Ministro da Fazenda: — Não disse tal.
Uma voz: — Bastava que a minoria não deixasse governar.
O Orador: — Ainda assim, aceito. Mas em que é que a opposição não deixou governar os srs. ministros? Empraso a ss. ex.ªs para que o digam.
(Examinando o Diario do Governo.) Aqui diz-se que o não. deixava marchar; e eu tinha tomado nota de que era facciosa.
O sr. Ministro da Fazenda: — É como se tomam as notas. O Orador: — Mas eu ouvi esta expressão a alguem n'esta essa...
O sr. Ministro da Fazenda: — A mim, não, O Orador: — Pois aceito. Eu que é que não deixámos marchar o governo? Seria em não discutir os sete peccados mortaes, que elle mandou para a mesa? Queixe-se da maioria, queixe-se da commissão que leve lá os projectos e nunca os estudou; ou os estudou e os achou tão maus que os não quiz trazer á discussão; ou os não estudou e faltou assim á attenção devida aos srs. ministros. Vem o projecto para a salubridade de Lisboa, deixamos as pessoas competentes tratar d'elle, estavamos tão aterrados que não dissemos nada: coma embaraçámos o governo? Só se commetteu esse crime um deputado, da opposição, que fallou a favor do projecto, o sr. José Maria d'Abreu, que lastimo que não esteja aqui, porque era um ornamento da tribuna, (Apoiados.) porque as opposições esclarecidas servem bem o governo e o paiz. (Apoiados.)
Sr. presidente, chocou-me ver a dissolução lançada á cara sem haver motivo para isso. Ora eu não queria nada com o governo e o governo nada queria comigo; então uni me á parte que me pareceu mais liberal e disse: «Vamos a trabalhar contra o governo»; formámos uma commissão, que resolveu a colligação. Preciso dar estas explicações, porque pertenci a um corpo collectiva que esta vergando debaixo de uma pressão, que esta de alguma maneira maltratado na opinião publica, e que o tem sido depois pelos srs. ministros, que, tendo um reforço tão grande na opinião publica, não deviam mostrar força contra nós n'esta parte.
Resolvemos a colligação. Não estaria ella nos principios liberaes? Está. Pois não nos colligámos em 1846? Em 1846 pertenci á junta do Porto, e se o governo d'esse tempo me apanhasse em Lisboa, ou a outro qualquer de nós, como tinha feito uma lei que auctorisava um cabo de esquadra e quatro soldados a fazer um conselho de guerra sobre um tambor e a fuzilar quem pertencesse á junta, vimos que é negocio era serio, e mettemos as armas na mão ao partido miguelista, Pois, sr. presidente, ha homens que em boa fé possam dizer que era menos perigoso um bacamarte («inda mesmo carregado com as listas que sobejassem ás eleições, como agora nos asseveram os jornaes do governo). Eu sou obrigado a toda a gente, já o tenho confessado (respondendo a um áparte). Mas era menos perigoso para a dynastia é para as instituições dizer a um homem atira a este soldado, mata-o, e toma o logar d'elle, era menos perigoso do que dizer a um realista, a um cartista, a um republicano, toma esta lista e mette-a na urna?!... Assim que o homem mette a lista na urna, treme a dynastia e as instituições! As instituições estão mais seguras do que isso, estão no coração do povo, na educação publica, na consciencia propria, no nosso interesse, no intimo da nossa alma; ninguem é capaz de as tirar; ao antigo sentimento portuguez rei e patria acrescentou-se e liberdade, porque sem liberdade não ha patria, nem póde haver rei.
Sr. presidente, a colligação era um acto de moral (Apoiados da esquerda.) era um acto de principios liberaes, era trazer a esta casa todas as côres politicas, livre e espontâneamente, com honra e brio; aqui está o que era; assim é que a vi eu, e na minha opinião pessoal era mais ainda um desforço com o governo.
De duas uma, ou nós viamos obrigados a appellar para as armas, o que era improprio de homens livres, ou haviamos de appellar para a urna e vir a esta casa representar as nossas idéas, sustentar os nossos principios. Levantou-se um ministro da corôa e disse: (O sr. José Estevão: — Peço a palavra para uma explicação.) que se tinha colligado com muitos partidos, mas com nenhum que não tivesse as suas idéas...
O sr. Presidente: — Mas o sr. José Estevão não fallou já sobre a materia?
O sr. José Estevão: — Fallei, e como desconfio de que v. ex.ª me não dava a palavra sobre a materia, se a pedisse outra vez, e com justa rasão, peço agora para uma explicação pessoal.
O Orador: — Eu, penso de outra sorte. Quando eu me colligar com alguem não ha de ser para o humilhar, nem desautorar, ha de ser com a dignidade propria de homem livre. S. ex.ª nunca se colligou senão com quem veiu ás suas idéas. S. ex.ª esta colligado com o velho partido progressista, e faz-lhe a injuria de dizer, que elle abandonou as suas idéas para vir ás de s. ex.ª, ou então abandonou s. ex.ª as suas para vir ás d'elle? S. ex.ª combateu o ministerio do sr. conde de Thomar, e foi ministro com elle. Quem abandonou as suas idéas, foi o sr. conde de Thomar, ou foi s. ex.ª ? Se foi o sr. conde de Thomar, s. ex.ª é responsavel por tudo quanto elle fez; se foi s. ex.ª, não tem rasão para condemnar a colligação de agora. (O sr. Alves Martins: — Então não vae á questão dos 1 800:000$000 réis?) Vou lá, e talvez votarei só 1.000:000$000 réis. O illustre deputado vota 1.800:000$000 réis, vae mais longe do que eu, mas tambem voto alguma cousa, tudo é que não é possivel; porém, o illustre deputado ha de ouvir me.
Pois o illustre ministro, vendo vasias as cadeiras dos dois deputados realistas que linham entrado n'esta casa. vem dizer: « Eu não me colliguei com partido algum que não quizesse o senhor D. Pedro V e as instituições?» Oh sr. presidente! e vem um ministro da corôa fallar em injurias? (O sr. Ministro da Fazenda: —Injurias!) Foi a expressão que se disse fallando-se da colligação: «E não se lembram das injurias!» Pois não ouviram dizer n'esta casa isto? E que queria isto dizer? Queria dizer que nos tinhamos colligado com o partido do sr. conde de Thomar, quando tinhamos
Página 166
—166—
feito injurias a elle e d’elle as tinhamos recebido. Parece 1 me que era isto. (Apoiados.) E é do banco dos ministros que parte a vida dos antigos epithetos com que nos injuriávamos, os epithetos de miguelistas, pé fresco e outros, pois tudo isso recorda essa expressão de injuria.
Pelo amor de Deus, o paiz já repelliu tudo isso. (Apoiados) Estamos hoje divididos em dois chulos; um dos homens que querem a liberdade, outro o dos absolutistas Quem quer a liberdade ha de vir o nosso caminho; quem quizer outra cousa, appella para os armas e nós os combateremos. E falla-se em quem jura com restricções, em quem jura com declarações, estando aquellas cadeiras desertas Oh, sr. presidente eu não esperava isto de uma intelligencia ião elevada como a do sr Avila; digo mais a s ex.ª, isto foi filho do estado de irritação em que s. ex.ª estava, porque s. ex.ª a sangue frio não era rapaz de offender dois homens que aqui não estavam. Mas note v ex.ª que se trouxe isto para mostrar a criminalidade da colligação, para mostrar que nos tinhamos colligado com os fins sinistros de alacar a dynastia e as instituições; e a pi ova de que isto era inexacto é que os dois cavalheiros Mi estão sentados; ali está Rei e caria; que mais querem? A mais não são elles obrigados. Pois não póde haver republicanos na extrema esquerda? Não haverá algum homem n'esse lado que no fundo do coração bem tapado diga: «Eu sou republicano?» (O sr. José Estevão: — Destapado mesmo.) E porventura queremos nós atacar as crenças do parti lo republicano? Uma vez que quem entra aqui jura ser fiel e não sophismar, como disse o sr. Pinto Coelho, meu amigo não quero mais nada de homem nenhum, (Apoiados.) nem ninguem póde querer mais; o mais é de Deus. e elle tem mais com que se entreter de que com estas bagatellas.
Sr. presidente, concluo agradecendo á camara o favor, a dedicação e bondade com que ouviu este desconchavado arrasoado, filho só das crenças e das persuações do meu coração, talvez filhas de grande illusão que de certo se ha de dissipar com as explicações dos srs. ministros; comtudo não posso deixar de as justificar com esta proposta. (Leu)
Proposta.
Proponho o adiamento do projecto em discussão até que o governo:
1. ° Dê conta ás côrtes do estado em que se acham as obras publicas votadas por lei, e das sommas n’ellas despendidas até ao fim do anno economico de 1857 a 1858.
2. ° Apresente á camara a designação e os orçamentos das obras indicadas como indispensaveis para o melhoramento das condições de salubridade da capital, a que se refere o artigo 1 0 do projecto, declarando igualmente o governo quaes são as que é mister sejam emprehendidas antes de novembro do corrente anno.
3. º Assente de uma maneira igual e equitativa a base do imposto, que serve de dotação ao emprestimo, sendo tributados com igualdade os capitaes moveis e immoveis.
Foi apoiada.
Foi introduzido na sala, com as formalidades do estylo, prestou o juramento e tomou assento, o sr. Francisco de Oliveira Chamiço.
O sr. Affonso de Castro: — A commissão do ultramar acha-se constituida, lendo nomeado para presidente o sr. Moraes Carneiro, a mim para secretario, e não nomeou relator porque tem relatores especiaes para os differentes negocios.
O sr. Bivar: — A commissão de pescarias está installada; nomeou para presidente o sr. Judice Samora, para relator o sr José Estevão e a num para secretario.
O sr. Seixa e Vasconcellos: — Esta installada a commissão de foraes; nomeou para presidente o sr Seabra para secretario o sr. visconde de Porto Covo e para relator a mim.
O sr. Ministro da Fazenda (Antonio José d'Avila). — Sr presidente, eu acredito que o illustre deputado o sr. D. Rodrigo, quando mandou para a mesa a sua questão de adiamento, não tinha por fim protrahir o debate, e n'esle caso eu pediria á camara, na minha qualidade de membro d'ella, que tomasse uma resolução que póde concorrer para que esta discussão se simplifique, e vem a ser, que o adiamento fique em discussão juntamente com a generalidade do projecto, que é o que se discute. A camara viu que o illustre deputado, para fundamentar o seu adiamento, não só fallou da questão de fazenda, mas fallou de Iodas as questões que se podiam apresentar na camara; fallou da dissolução, da colligação, da moralidade publica, n'uma palavra, trouxe aqui completamente a questão governamental, que poderia trazer na discussão da resposta ao discurso da corôa; (Apoiados.) e se o illustre deputado, para fundamentar o adiamento, trouxe a questão a este terreno, afigura-se-me que os illustres deputados que tomarem parte no debate, seguirão a s. ex.ª no mesmo campo, e eu pela minha parte declaro que não posso deixar de o seguir, (Apoiados.) porque s. ex.ª -fez arguições ao governo Ião severas, citou factos de uma tal importancia a respeito dos quaes é impossivel que o governo fique silencioso, que me parece que o meio unico que nós temos para tirar algum proveito d'este debate é convir a camara em que se discuta tudo junto, isto é, o adiamento e. o projecto na generalidade. (O sr. D. Rodrigo de Menezes: — Apoiado) Si na camara não ha objecção alguma a esta idéa, como me parece pela acquiescencia que me dá o illustre deputado o sr, D. Rodrigo, eu podia que em boa paz ficassemos n'esta intelligencia, isto é, que o adiamento proposto pelo illustre deputado entre em discussão juntamente com a questão principal e por consequencia que a unica vantagem que lerá é a prioridade em votação, isto é votado o adiamento, se elle for rejeitado, v ex.ª põe immediatamente á votação a generalidade do projecto (Apoiado)
Estimarei que seja esta a opinião da camara, (Apoiados.) porque n'esle caso deixarei de provocar uma votação. Este requerimento foi feito por mim como deputado.
Consultada a camara, decidiu affirmativamente.
O sr. Presidente: — Tem a palavra sobre a ordem o sr. Dia? de Azevedo.
O sr. Ministro da Fazenda (Antonio José d'Avila): — Mas v. ex.ª tinha-me dado a palavra; eu apresentei um requerimento, v. ex.ª consultou a camara, e fiquei com a palavra.
O sr. Presidente: — Mas antes de v. ex.ª pedir a palavra, tinham n'a pedido sobre a ordem dois illustres deputados. Tem a palavra sobre a ordem o sr Dias de Azevedo.
O sr. Dias de Azevedo: — Eu cedo da palavra para fallar o sr. ministro da fazenda; não tenho n'isso duvída alguma; a minha proposta fala hei posteriormente.
O sr. Simas: — Eu tambem cedo por agora da palavra, mas peço a v. ex.ª que m'a mantenha, porque quero dar explicações sobre um facto da discussão, e como relator d» commissão tenho direito a da-las (Apoiados.)
O sr. Ministro da Fazenda (Antonio José d'Avila): — Sr. presidente, eu começo por declarai que a camara esta avaliando esta situação com muita inexactidão: (Apoiados.) os srs. deputados que pretendem combater a administração e tornar impossiveis todos os meios de governo, obram bem, fazendo o que estão fazendo; mas os illustres deputados que querem sustentar esta situação, enganam se fazendo demorar a conclusão d'este projecto, (Apoiados.) porque rós não podemos continuar as obras publicas, porque não temos meios para isso. O sr. ministro das obras publicas está me pedindo todos os dias dinheiro para as obras de estradas, e eu, em quanto estiver no ministerio, hei de dar lh'o, mas de s claro que o não tenho, porque o corpo legislativo ainda o não deu. Segundo a leitura que agora ouvi fazer dos senhores que estão inscriptos para fallar, vejo que temos discussão para dois mezes; ora, n'estes dois mezes têem necessariamente de parar as obras das estradas, porque não ha meios, e saibam os illustres deputados que o thesouro bem longe de ser devedor ao ministerio das obras publicas, é já credor a este ministerio por uma forte somma, e não póde continuar a fornecer meios a esse ministerio sem que as côrtes lh'os votem, e não me pari iv por este caminho que as t orles os votem: (Apoiados) desenganem se bem os illustres deputados, que querem tornar impossivel esta situação, fa-
Página 167
—167 –
zem muito bem em protelar o debate, e os illustres deputados que querem que esta situação continue, que a sustentam, devem votar o mais breve possivel os meios indispensaveis para que o governo possa continuar. (Muitos apoiados.) Mas eu, na qualidade de membro do governo, não posso deixar de dizer duas palavras sobre os pontos principaes que tocou o sr. D. Rodrigo de Menezes; e peço á camara que, não consinta que a discussão se concentre n'esta parte, qual a da «dissolução da camara, de que se occupou o illustre deputado, e da responsabilidade ou não responsabilidade do poder executivo no acto da dissolução da camara: essa questão é uma questão acabada; (Apoiados.) pois quando se tratar aqui de qualquer projecto, póde um membro d'esta camara combater certas proposições, só porque ellas foram apresentadas em outra occasião? N'esse caso, onde vae ter o debate! Eu peço á camara que me ouça com alguma paciencia, porque havendo algum susurro, obriga-me a falar mais alio, e parecerá que eu fallo irritado, (o que não estou) e isso causa-me tambem algum incommodo.
Mas o illustre deputado, o sr. D. Rodrigo, que tratou esta administração, em relação aos homens que a compõem, com estremada benevolencia, o illustre deputado demonstrou que realmente a respeito de alguns factos, que esteve combatendo, esteve-os combatendo sobre falsos presuppostos. O illustre deputado disse que eu linha dito, que a camara tinha sido dissolvida, porque havia uma minoria facciosa, quando eu não disse lai. Isto é o que muitas vezes acontece, referirem-me expressões que não pronunciei; eu não podia dizer que a camara linha sido dissolvida, porque havia no seu seio uma minoria facciosa, e se o dissesse nem a camara nem v. ex.ª deixariam de me chamar á ordem; eu fallei em these geral, disse que as camaras não só pódem Ser dissolvidas, quando os governos não têem maioria, porém ainda quando ha nas mesmas camaras minorias que o não deixam funccionar.
Ora em relação á dissolução não posso deixar de repetir o que disse, eu disse: «Os ministros aceitam a responsabilidade da dissolução, mas o que eu não posso aceitar como doutrina corrente é que seja o poder executivo quem dissolva as camaras; quem dissolve as camaras é o poder moderador, segundo a carta constitucional »; foi isto o que eu disse (Apoiados.) (O sr. Mártens Ferrão: — V. ex.ª refere-se a mim?) Eu não me refiro ao sr. Mártens Ferrão, refiro-me ao sr. D. Rodrigo, que disse que se tinha espantado de me ouvir as doutrinas que eu apresentei, e as doutrinas que eu apresentei foram estas: os ministros aceitam a responsabilidade da dissolução; mas o que eu nunca hei de consentir sem protestar contra essa doutrina, é que se diga, que é o poder executivo que dissolve as camaras e não o poder moderador. (Apoiados.)
Eu pedirei aos nobres deputados que quando me combaterem, combatam as minhas expressões, e pedir-lhes-hei ainda, mas isso será talvez muito, uma outra cousa, e é que combatam unicamente o meu pensamento; os illustres deputados dirão que não podem saber qual é o meu pensamento senão pelas expressões que emprego: mas ao menos não alterem essas expressões, fazendo me dizer o que não disse. O illustre deputado, o sr. D. Rodrigo, dividiu a questão em duas partes: a parte de confiança e a parte da fazenda; o ministerio não merece confiança por uma serie de factos, que o illustre deputado produziu, e pela maneira por que gere a fazenda publica. É tambem a este campo que hei de trazer a questão.
Disse o illustre deputado que a immoralidade campeava por lodo esse reino, e que o governo não empregava meios nenhuns para a atalhar; eu já declarei aqui que o meio mais efficaz para pôr termo a essa immoralidade esta nas boas escolhas que o governo fizer dos empregados, (Apoiados.) e estendendo esse principio aos parochos, a que se referiu especialmente o nobre deputado, direi que não tenho feito uma só nomeação que não seja de homens dignos, ou pelo menos de homens a respeito dos quaes eu não tenha as melhores informações. E todas as vezes que me tem constado que se accusa de immoralidade algum parocho, immediatamente tenho mandado proceder ás informações as mais rigorosas a esse respeito, a fim de proceder, como devo* contra elle, se forem verdadeiras essas accusações.
Acredite o illustre deputado que esta é a maneira de proceder que eu tenho seguido, e não teria duvida de lhe franquear os archivos da secretaria, para se certificar de que aquillo que eu estou dizendo é a pura verdade.
Fallou o illustre deputado de uma alta dignidade ecclesiastica, e eu deflorei que o illustre deputado viesse a este campo em sessão publica. Quando s. ex.* annunciou aqui uma interpellação a este respeito, pedi lhe que fizesse esta interpellação em sessão secreta e que eu estava prompto a dar todas as explicações sobre este assumpto: mas o illustre deputado não fez isto, e veiu fazer referencias em sessão publica, pouco honrosas para um alto funccionario, e então em sessão publica devo desaggravar a reputação d'esse alio funccionario Eu não sustentei que se transfere um bispo como se transfere um governador de uma provincia para outra: ainda que não tenho a fortuna de ser formado em direito canonico, tenho as noções geraes que me fazem comprehender que a doutrina do sr. D. Rodrigo é exacta; mas ha excepções, e podem-se fizer lais transferencias, quando o bem da religião ou o do estado o exige, t quando a situação especial do dignatario faz com que a sua vida perigue, se continuar em uma certa localidade Foi exactamente porque se verificou uma (festas hypotheses, que a transferencia teve logar.
O illustre deputado referiu-se a informações que tem ouvido a este respeito, mas o illustre deputado tomou a precaução de dizer que não conhece o cavalheiro a que allude; mas se o illustre deputado o não conhece, não devia fallar a respeito á 'elle da maneira por que o fez. O illustre deputado fallou na diocese do Funchal, e lembrou-se das tentativas do protestantismo, quando sabia que fallava diante de um homem que já foi á ilha da Madeira em commissão, por causa d'essas tentativas, e o illustre deputado disse que o bispo para ali transferido não estava na altura da sua missão.
Sr. presidente, eu não apresentarei á camara todos os documentos que poderia produzir em abono d'este alto funccionario, reservo-me para a sessão secreta, mas lerei sempre dois documentos assignados pelo fallecido patriarcha de Lisboa o sr. D. Guilherme, nos quaes se exprime a respeito* d'esse cavalheiro nos lermos que a camara vae ouvir. O primeiro d'esses documentos diz o seguinte:
«Tendo fallecido o conselheiro João Baptista de Castro, «prior encommendado da igreja de Villa Franca de Xira, « e tendo nós hoje mandado passar titulo de encommendação na mesma igreja ao reverendo padre Patricio Xavier «de Moura: attendendo a suas qualidades e bom conceito de «suas virtudes religiosas, moraes e politicas, o nomeámos «para servir de vigario da vara do Ribatejo, durante a ausencia ou impedimento do actual vigario o reverendo Manuel Pires. E por este nosso despacho lhe conferimos a jurisdicção necessaria para o desempenho do officio, que assim interina e provisoriamente lhe commettemos. S. Vicente, 3 de setembro de 1845. = ír. bispo de Leiria e patriarcha eleito.»
Este cavalheiro foi pois considerado digno, como a camara vê, pelo cardeal patriarcha de Lisboa, de ser nomeado vigario d’aquelle arciprestado; este diploma é de 3 de setembro de 1845. Foi depois elevado á dignidade de bispo de Cabo Verde, e quer v. ex.ª saber qual foi o documento que lhe deu o mesmo illustre prelado?
« Ex.mo e rev.mo sr. = Com muita satisfação dou os para bens a v. ex.ª, ou antes á igreja de Cabo Verde, que ha de colher abundantes fructos das virtudes e zêlo pastoral de v. ex.ª Já ha muito que eu sahia o despacho, ajudando-o com meu honroso e verdadeiro testemunho; mas era para mim objecto de segredo, e-não devia por isso communica-lo. Deus guarde a v. ex.ª e lhe dilate e felicite os annos de vida, como desejo e lhe peço. S. Vicente, 2 de junho
Página 168
—168—
«de 1848. = = G. cardeal patriarcha. = Ex.mo e rev.mo sr. «bispo eleito de Cabo Verde, vigario da vara do Ribatejo. « = Villa Franca de Xira.»
Aqui tem o illustre deputado, que o governo não recorreu a motivos menos honestos, e a que aqui se fez allusão para esta nomeação; mas o governo procurou obter informações a respeito d'este ecclesiastico, para saber se elle era digno do episcopado, e informações do cardeal patriarcha de Lisboa seu prelado. Ha outro documento do mesmo prelado:
«Tendo nós participado ao ex.mo e rev.mo bispo eleito de «Cabo Verde, em seu officio de 29 de maio proximo, que «deveria ler logar a sua sagração no domingo 10 do corrente; e sendo necessario antes d'isso prover á cura paro« chiai da igreja de S Vicente Martyr, de Villa Franca de «Xira, e ao serviço da vigariaria da vara do arcebispado do «Ribatejo, de que tinhamos encarregado o mesmo ex.mo e «e rev.mo bispo eleito, e cujas funcções até agora tem desempenhado com tanto zêlo, prudencia e proveito espiritual, que deixa muito penhorada a nossa gratidão e saudade; conformando-nos com a regia insinuarão que nos foi « dirigida em aviso de 24 de janeiro ultimo, e com a informação do mesmo rev.mo bispo eleito, nomeámos parocho «encommendado da dita igreja de S. Vicente Martyr, ao «padre Antonio d'Almeida, que tem servido de coadjutor « d'ella; e bem assim o encarregámos da vigariaria do arciprestado do Ribatejo, conferindo-lhe toda a jurisdicção « necessaria para o exercicio de umas e outras funcções. E « rogamos ao ex.mo e rev.mo bispo eleito de Cabo Verde, que « aceitando este solemne testemunho da nossa estima, saudade e gratidão, pela illustrada, zelosa e fiel corporação « que nos tem prestado no serviço de Deus e no proveito espiritual de nossos amados subditos, ele.»
- Peço ao illustre deputado, que me diga se estas informações não valerão mais alguma cousa na mente de s. ex.ª do que aquillo que se lhe tinha dito de um homem que s. ex.º não conhece. (O sr. D. Rodrigo de Menezes: — Eu não disse nada d'elle) V. ex.ª disse em sessão publica, que era um alaque á igreja e á moralidade publica a transferencia daquelle bispo (O sr. D. Rodrigo de Menezes: — E se me derem a palavra justifico isso.) Oh! sr. presidente, pois hade se discutir esta questão em cessão publica? E consente v. ex.ª isso?... (O sr. D. Rodrigo de Menezes: — Mas não é nada contra as virtudes do prelado.) Tanto melhor; mas peço aos illustres deputados por quem são, que me não obriguem a demorar-me sobre este assumpto. Querem promover a moralidade por estes meios? É mau caminho: estamos muito distantes sobre a maneira, de ver esta questão. Ora, na questão de moralidade de que fallou o sr. D. Rodrigo, a respeito da alfandega da Huila, eu sinto que o illustre deputado, que póde ter de mim as informações mais cabaes sobre os objectos da administração que estão a meu cargo, faça politica pelo que lê em jornaes que fazem opposição ao governo.
- Foi mandado áquella alfandega um visitador: elle deu conta ao governo do estado em que se achava aquella alfandega, e das suas informações resultou a convicção da conveniencia da nomeação do director daquella casa, cavalheiro muito digno, que se julgou conveniente ali: resultou tambem, que havia dois empregados suspeitos de ler prevaricado n'uma certa occasião. O director foi exonerado, e foi nomeado outro, e os dois empregados estão suspensos e em processo. Pergunto que mais quer o illustre deputado que eu faça? Aquella alfandega funcciona, e funcciona bem, e o novo director tem correspondido completamente á confiança que n'elle depositei Os dois empregados suspeitos estão em processo e suspensos, quer que os demitta? Mas que certeza tenho eu de que aquelles dois funccionarios se não poderão justificar? É necessario dar-lhe occasião para se justificarem, mas a suspensão ainda existe.
Vamos á alfandega do Porto. Fui censurado porque mandei tapar a pedra e cal uma porta pela qual se verificou que se*fazia contrabando: entendo que devia ser censurado se a não mandasse tapar. Pois acha-se um armazem, no qual existe uma poria de communicação, por essa porta faz-se contrabando, e eu não hei de mandar tapa-la a pedra e cal? Não só uma porta, mas todas as portas que estivessem no mesmo caso. Mas diz se: Não basta isto»: de accordo; «o verdadeiro correctivo para estes abusos é a moralidade dos empregados», convenho, e por isso lá estão suspensos onze e mettidos em processo. Ora affigura-se-me que só em uma repartição estarem suspensos onze empregados, já não é pouco;' querer que eu suspendesse todos, não os podia suspender sem ler provas.
O illustre deputado fallou tambem em o director da alfandega e disse que nada tinha ouvido dizer contra a moralidade daquelle funccionario, mas que se suspeitava que elle era um pouco docil. Não me lembro da expressão de que o illustre deputado usou, mas parece-me que disse que aquelle empregado pela sua brandura, ou bondade de seu caracter não era tão severo como devia ser para com os meus empregados.
Sr. presidente, eu devo n'esle logar dar um testemunho a favor d'este empregado. O director da alfandega do Porto tem servido debaixo das minhas ordens em todos os ministerios de que tenho feito parte, e tenho notado que é um empregado intelligentissimo, assim como o tenho na conta de um empregado muito probo; e não tenho motivo algum para acreditar que lhe póde ser applicada essa censura, porque eu sei de factos que provam precisamente o contrario.
O director da alfandega do Porto, em uma occasião solemne, deu provas de muita firmeza de caracter, e de ler precisamente a qualidade que lhe nega o illustre deputado. Os illustres deputados sabem que d'antes os vinhos do Porto de primeira qualidade pagavam um direito muito elevado: o vinho de primeira qualidade pagava 12$000 réis por pipa, em quanto que o de segunda pagava 100 réis; houve quem entendeu que mandando vinho de segunda qualidade para a America, podia mais tarde faze-lo transportar para a Europa, onde seria vendido por de primeira qualidade, e d'esta maneira se subtrahia ao pagamento dos direitos O director da alfandega do Porto foi severo com os negociantes que faziam essa especulação, obrigando-os a depositar o direito elevado, e não lh'o mandando restituir senão depois de lerem provado que esse vinho linha sido consumido na America.
Eu podia citar muitos outros factos d'esta natureza, mas não quero demorar-me mais a este respeito: entendi que devia dar este testemunho publico a um empregado em quem se reunem as qualidades que acabei de designar á camara, e que por consequencia não merece a menor allusão contra a sua probidade nem contra a sua intelligencia.
Mas quando se descobriu este contrabando, sabem os nobres deputados que eu nomeei immediatamente uma commissão de inquerito; essa commissão está funccionando, e eu ordenei que se empregassem as medidas as mais efficazes para perseguir os fautores d'esse contrabando, os cumplices, n'esse crime, por virtude do que, como disse ha pouco, estão suspensos onze empregados e mettidos em processo, e um já está na cadeia da relação. Mas fiz mais alguma cousa do que isso: nomeei alguns empregados da alfandega grande de Lisboa, que me merecem inteira confiança, para irem ' em commissão áquella casa fiscal, e habilitarem por consequencia o governo a conhecer mais particularmente de todas as medidas que é necessario que elle adopte para pôr termo aos escandalos a que se referiu o illustre deputado.
Quanto á syndicancia da relação do Porto, pareceu me que depois da explicação que eu tinha dado na camara, não podia esse objecto ser apresentado como prova da immoralidade d’esta administração. O corpo legislativo fez uma lei por virtude da qual é o governo auctorisado para aposentar juizes, mas precedendo consulta affirmativa do supremo tribunal de justiça; manda o governo essa syndicancia ao supremo tribunal de justiça: que mais póde fazer o governo agora do que esperar a consulta d'esse tribunal? Eu desejaria que o nobre deputado o sr. D. Rodrigo de Menezes me indicasse um meio de saír d'esta questão, a não ser este. O
Página 169
—169—
illustre deputado póde propor outro meio, lembro-lh'o, e a revogação daquella lei: se os nobres deputados têem a consciencia da necessidade da revogação daquella lei, porque não tomam a iniciativa d'essa revogação? (O sr. Borão das Lages: — Nós!) Pois o nobre deputado não tem o direito de iniciativa? Abdicaria já esse direito? O governo tem o direito de iniciativa, mas têem-n'o igualmente os illustres deputados. E porque não usam d'elle? É, sr. presidente, porque é mais facil censurar do que emendar: (Apoiados.) se os illustres deputados tomassem essa iniciativa, haviam de apresentar uma medida, que me parece que seria peior do que a lei que esta em vigor; e então faz muita conta aos illustres deputados vir aqui todos os dias incommodar o governo porque está cumprindo uma lei, quando o governo entende que não ha substituição mais vantajosa para o serviço do que essa lei. Sejamos francos! Isso são armas de guerra; mas é bom que a camara saiba qual é o valor que teem estes meios a que recorrem os illustres deputados. O supremo tribunal de justiça mandou correr esse processo pelos seus membros, e a lei a esse respeito é Ião severa, a lei a esse respeito quer pôr por tal fórma termo ao arbitrio, que ordena que todos os conselheiros do supremo tribunal de justiça, que estejam na capital, hão de assistir ás conferencias em que essa questão ha de ser resolvida; todos, não valem as licenças, não vale commissão alguma, todos os conselheiros do supremo tribunal de justiça, que residirem na capital, hão de assistir ás conferencias em que esse negocio for resolvido.
Portanto, sr. presidente, essa questão está entregue a quem pertence, e o governo nada mais póde fazer a esse respeito, excepto reprehender o supremo tribunal de justiça, porque este negocio não tem andado depressa. Póde o governo faze-lo? Tem o governo direito para isso? Merece o supremo tribunal de justiça essa censura? Pois é o que os illustres deputados têem estado a fazer, é censurar o supremo tribunal de justiça; não censuram o governo, censuram o supremo tribunal de justiça.
O illustre deputado locou n'outro ponto, e foi n'essa occasião que eu pedi a palavra. Eu associo-me a todos os sentimentos de indignação que o illustre deputado manifestou n'essa occasião; mas s. ex.ª viu no documento official do imperio do Brazil expressões que lá se não acham. O ministro do Brazil não accusou o governo de proteger os moedeiros falsos, o ministro do Brazil não declarou que a nação portugueza era toda cumplice n'este crime; não havia ministerio nenhum que, sem uma manifestação a mais solemne de protesto contra uma linguagem tão inconveniente, podesse consentir que á face do mundo illustrado fosse tratada a nação portugueza d'esta fórma; mas não são tambem lisonjeiras, nem sobretudo justas, as expressões empregadas naquelle relatorio, sem serem comtudo tão severas quanto indicou o nobre deputado; e eu, sr. presidente, posso declarar ao illustre deputado, e estou certo que é esta uma declaração que lhe dará prazer, e posso declarar á camara que Iodas as arguições feitas ao governo portuguez, não direi de cumplicidade, mas de frouxidão, em perseguir os moedeiros falsos, e sobretudo aquelles que se julgava que falsificavam as notas do thesouro brazileiro e do banco do Brazil, todas as accusações n'esle sentido são injustíssimas; e se dós tivermos a honra de continuarmos n'estas cadeiras, eu espero que o meu collega o sr. ministro dos negocios estrangeiros ha de responder a um relatorio com outro relatorio, e eu, pela minha parte, como ministro da justiça, hei de fornecera s. ex.ª, posso fornecer lhe desde já, documentos importantissimos, por onde os illustres deputados verão o zêlo e a actividade com que esta administração (não direi o actual ministro da justiça, porque os documentos fallarão por si), tem andado a esse respeito; e parece-me que, se os illustres deputados viram o que se diz na imprensa periodica da segunda cidade do reino, os illustres deputados hão de ter encontrado documentos por onde se demonstra que as auctoridades a quem pertence perseguir estes crimes têem cumprido o seu dever. Peço á camara que não exija
de mim mais explicações a este respeito, e que espere os documentos que lhe hão de ser apresentados.
Parece-me, sr. presidente, que tenho respondido aos argumentos principaes que o illustre deputado apresentou em relação a não ler confiança n'esta administração por actos de immoralidade, pelo não cumprimento do seu dever. Farei agora algumas ponderações em relação á questão financeira, e começarei por dizer que o illustre deputado, e alguns outros cavalheiros que já têem feito estas accusações ao governo, têem sido sobremaneira injustos, quando dizem que um ministerio que veiu pedir um bill de indemnidade por ter desviado das suas applicações legaes fundos destinados para obras publicas, não merecia a confiança do parlamento: eu peço só aos nobres deputados que se lembrem que quando o governo veiu declarar á camara que tinha desviado, temporariamente, das suas applicações legaes fundos destinados para obras publicas, foi na occasião em que a febre amarella flagellava esta capital, em que não havia receita, em que uma crise medonha lá fóra inhibia o governo de levantar alguns meios com que podesse acudir ás despezas da capital, e n'este caso eu seria merecedor do mais severo castigo se, tendo meios á minha disposição para fazer pagar com pontualidade todas as despezas do serviço publico, comprehendendo os trabalhos das estradas, dissesse ao meu collega o sr. ministro das obras publicas que lhe não fornecia dinheiro para isso, porque o não queria tirar de uma certa somma; se eu dissesse ao sr. ministro da guerra que não lhe dava dinheiro para pagar as quinzenas na capital e nas provincias, por esse mesmo motivo; se eu dissesse a todos os meus collegas que as despezas do serviço se não pagavam para não desviar sommas, de que o governo podia dispor, da sua applicação legal.
O ministro da fazenda que se conduzisse d'esta maneira devia ser accusado, e devia infringir-se-lhe o mais severo castigo. Eu não peço louvores pelo que fiz, mas estar-se todos os dias a accusar o ministro da fazenda por um dos actos que eu reputo o mais meritorio da minha vida publica, por um dos actos pelo qual eu teria expiado todos os delictos que porventura tivesse commettido, enche-me de dôr e de magoa, porque vejo que a opposição não quer nunca entrar no caminho em que deve entrar. Eu quero uma opposição, mas uma opposição justa. Ataquem, combatam os defeitos do governo, demonstrem que as suas medidas não são sufficientes; mas quando o governo obra bem, censura-lo por-isso é cruel. (Apoiados.) Que queria o sr. D. Rodrigo que eu fizesse, quando pelos documentos que eu apresentei na camara se vê que a alfandega nada produziu, quando os capitalistas abandonavam a capital, e nem cobravam as suas letras, quando o devedor lh’as queria ir pagar no dia do vencimento, quando todas as operações commerciaes estavam suspensas? Que queria o sr. D. Rodrigo que fizesse o governo, o governo que tinha a fortuna de, por meio de medidas bem combinadas, poder levantar meios naquella occasião para fazer frente a todas as necessidades do serviço?
E disse-se aqui: «O governo nada fez durante a febre amarella». Oh, sr. presidente! Arrede Deus de nós esse flagello para todo o sempre! Mas eu queria ver sentados n'estas cadeiras, n'uma crise igual a essa, os cavalheiros que nos tratam com esta severidade, eu queria ver o que elles, haviam de fazeis Bastava que nós tivessemos estado firmes no nosso posto, bastava que a machina governativa funccionasse como n'uma situação normal, bastava que nenhum serviço tivesse sido suspenso, para os srs. deputados dizerem: «O governo bem mereceu do paiz n'esta crise.» (Apoiados.)
Voltem os illustres deputados a folha, vejam a questão por outro lado, vejam o governo a não pagar as despezas do serviço, vejam a anarchia introduzida immediatamente na capital, vejam os prejuizos enormes que d'ahi haviam resultar; n'este caso haviam dizer que o governo esteve cem braças abaixo da sua missão.
E dizem os srs. deputados: «Veiu pedir um bill e nós
Página 170
-170-
démos esse bill.» eu aceitei-o por deferencia para com a camara, não porque entendesse que elle era necessario, em minha consciencia entendia não ser preciso; assim como entendo que as arguições feitas pelo sr. O. Rodrigo a respeito da estrada marginal do Douro, estão no mesmo caso. Pois porque ha nos cofres do thesouro 40:000$000 réis á disposição do ministerio das obras publicas, e que se darão quando s. ex.ª os quizer para essa estrada, segue-se que o governo desviou essa somma da sua legal applicação? Não disse eu já aqui, que o governo entregou até ao ultimo real ao sr. ministro das obras publicas, para as obras designadas na lei do emprestimo dos 1.500:000$000 réis. todo o producto d'esse emprestimo, que é a base de toda esta accusação? Hoje o sr. ministro das obras publicas é devedor ao thesouro de uma somma não pequena para obras publicas que o thesouro lhe tem adiantado, e este debito ha de augmentar todos os dias, em quanto não forem votados pela camara os meios que o ministerio de obras publicas precisa para a continuação d'essas obras.
Os illustres deputados dizem que já nos deram 30:000$ réis para a limpeza dos canos Aonde e quando é que deram esses 30:000$000 réis? Disseram ao governo: «Gaste 30:000$000 réis n'essa obra,» fizeram lhe um grande favor. Mas os meios para fazer frente a essa despeza, aonde lh'os designaram? A despeza fez-se, mas os meios ou a receita para compensar essa despeza, isso é que se não designou. Não basta só votar, despenda, é preciso votar tambem d'onde ha de viro dinheiro que se manda despender. (Apoiados.) Estes negocios são muito serios, não podem ser tratados como os illustres deputados os pretendem tratar.
Sr. presidente é preciso fallar claro. Esta questão do emprestimo dos 1 800:000$000 réis é uma questão politica, (Apoiados.) nada mais. e nada menos; os illustres deputados da opposição se estivessem collocados na maioria e lhe pedissem 1.800:000$000 réis e mais. votavam essa quantia pedida ao ministerio a quem apoiassem, (Apoiados.) esta é que é a verdade; e por isso eu digo, que a questão é toda politica, das proprias declarações do sr. D. Rodrigo se infere isto claramente.
Sr. presidente, ouvi uma aspera censura dirigida ao sr. ministro das obras publicas, por ler vindo aqui pedir réis 1:800:000$000, sem dizer para que eram. O meu collega respondeu logo pela sua parte. Mas falta a designação das obras pelo ministerio do reino, apesar de que as principaes estão designadas no projecto, obras que não podem custar menos de 600:000$000 réis. Disse-se: «Ha de votar-se dinheiro sem se saber primeiramente quaes hão de ser essas obras?»
Sr. presidente, eu ouvi aqui em 1856 sustentar um projecto que pedia uma somma muito maior, e não se sabia para que obras, (Apoiados.) e quando eu perguntava, que obras são estas? Respondiam-me =ha de ser uma alfandega no Porto, uma doca em Ponta Delgada, e hão de ser outras cousas =. E porventura havia promptos os planos e orçamentos d'essas obras, que se declaravam, e das que havia em mente fazer? Não, senhor. O governo então não tinha designado na sua proposta as obras a que tencionava applicar as sommas pedidas, então não houve escrupulo nenhum em sustentar o emprestimo proposto, e approva-lo para obras que se não sabia quaes eram; e vem agora escrupulos quando se pedem 800:000$000 réis para obras na capital! (Apoiados.) Só as obras designadas no projecto para a capital não gastarão menos de 600:000$000 léis. Hoje designam se as obras, então não se designava nada; hoje apparecem escrupulos, então não não appareceu nenhum, e note-se a differença que ha entre a importancia de um e de outro pedido. (Apoiados.)
Sr. presidente, disse o sr. D. Rodrigo, que a arrecadação da fazenda esta pessima. Ora eu espero mostrar a s. ex.ª pelos documentos que tenho na mão, de que vou dar conhecimento á camara, e mandarei entregar aos srs. tachygraphos para os publicarem no extracto da sessão, digo, espero mostrar que durante a actual administração a arrecadação
dos rendimentos publicos tem melhorado consideravelmente.
Disse o sr. D. Rodrigo, ha 4.000:000$000 réis de atrazos por cobrar. É verdade, mas o illustre deputado se percorresse os documentos que estão distribuidos n'esta camara, e que eu tenho aqui reunidos em resumo desde 30 de junho de 1849 a 30 de junho de 1857, e é impossivel fazer o mesmo até 30 de junho de 1858, porque ainda não tenho os precisos esclarecimentos, tenho já as tabellas até ao mez de maio, não tenho as tabellas do mez de junho, as tabellas começam a entrar no thesouro do dia 20 do mez seguinte por diante, é necessario dar tempo aos delegados do thesouro para poderem organisar as respectivas tabellas; digo. que d'esses documentos verá o sr. D. Rodrigo qual o estado dos atrazos da cobrança dos differentes impostos desde 1849, proximo á minha entrada no ministerio n'esse anno, até á epocha presente, documentos que peço licença para ler:
A importancia dos documentos de cobrança não realisada a 30 de junho dos annos abaixo designados é a seguinte:
1849...................... 4.529:838$976
1850...................... 3.800:062$264
1851...................... 3.679:790$753
1852...................... 3.735:462$329
1853...................... 3.846:970$972
1854...................... 3.885:535$980
1855...................... 3.960:011$254
1856...................... 4.022:233$393
1857...................... 3.969:515$147
Por aqui vê pois o sr. D. Rodrigo, que logo nos primeiros dois annos da minha gerencia de 1849 a 1851, eu promovi como devia a cobrança dos rendimentos publicos, que ella melhorou em relação aos annos anteriores, que nos cinco annos que se seguiram depois o atrazo na recepção dos impostos appareceu logo no primeira anno e foi indo progressivamente, e que finalmente, desde que começou na gerencia dos negocios publicos a actual administração até agora esse atrazo tem diminuido 52:000$000 réis. Eis-aqui tem pois n'estes documentos que acabo de ler a resposta ao sr. D. Rodrigo, quanto aos atrazos.
Agora vamos á cobrança nos cofres dos districtos nos mesmos annos:
1849 a 1850................ 2.818:171$740
1850 a 1851................ 2.799:442$069
3851 a 1852................ 2.640:191$113
1852 a 1853................ 2.856.150$618
1853 a 1854................ 2.922:016$616
1854 a 1855................ 2.739:425$413
1855 a 1856................ 2.882:387$349
1856 a 1857................ 3.006:966$462
1857 a 1858 (1)............ 3.087:236$430
Já vê portanto o illustre deputado que nos primeiros onze mezes do anno economico findo, o governo leve já uma receita superior ao ultimo anno da administração preterita em 200:000$000 léis.
Vamos a ver outros impostos, onde se manifesta a acção do governo ainda a favor do thesouro.
Quanto ao imposto da siza foi o rendimento d'esle imposto
em 1849 a 1850................. 369:621$345
1850 a 1851.................. 397:140$663
1851 a 1852(2)............... 237:781$129
1852 a 1853.................. 229.096&045
1853 a 1854.................. 245:227$207
1854 a 1855.................. 272:789$786
1855 a 1856.................. 298:303$852
1856 a 1857.................. 330:573$775
(1) É o rendimento dos onze mezes de julho de 1857 a maio de 1858. Do mez de junho ainda não ha tabellas.
(2) Por decreto de, 23 de junho de 1851 foi reduzido este imposto de 10 a 5 por cento, e extincta a siza das cavalgagaduras.
Página 171
— 171—
Este resultado tambem é favoravel ao governo actual. (O sr. Barros e Sá: — Isso não prova nada para o caso.) Isto não prova nada? Pois a cobrança dos impostos esta muito melhorada como acabo de mostrar, e diz o illustre deputado que isto não prova nada? Se o resultado fosse desfavoravel ao governo, então para o illustre deputado e para a opposição provava muito; (Apoiados.) mas como é a favor, não prova nada! Triste modo é este de argumentar. (Apoiados.)
Vamos ao imposto do pape] sellado, a respeito do qual tenho ouvido fazer sempre interpellações contra o governo, dizendo-se que ha um grande contrabando, etc. Vamos a esse imposto. Rendeu em
1849 a 1850.................. 186:076$496
1850 a 1851.................. 172:726$478
1851 a 1852.................. 197:533$943
1852 a 1853.................. 191:567$931
1853 a 1854.................. 180:150$985
1854 a 1855.................. 197:980$738
1855 a 1856.................. 202:213$642
1856 a 1857.................. 232:680$490
Tambem n'esle houve augmento de receita. Agora vamos ao imposto de sello de verba. A respeito d'esta devo dizer, que estou preparando um trabalho, do qual espero resulte um grande melhoramento na cobrança d'este imposto Mas aqui não houve um augmento tão consideravel, como nos outros impostos. Vejamos o que elle produziu: em
1849 a 1850.................. 113:647$317
1850 a 1851.................. 75:578$353
1851 a 1852.................. 68:489$378
1852 a 1853.................. 89:959$890
1853 a 1854.................. 90:018$238
1854 a 1855.................. 95:590$405
1855 a 1856.................. 103:871$718
1856 a 1857.................. 109:882$263
Agora vamos ao imposto de transmissão: este imposto igualmente tem augmento Em
1849 a 1850................... 21:471$099
1850 a 1851................... 26:351$791
1851 a 1852................... 23:455$132
1852 a 1853................... 37:046$874
1853 a 1854................... 30:754$726
1854 a 1855................... 34:201$238
1855 a 1856................... 54:650$493
1856 a 1857................... 57:803$911
Por consequencia, em todas estas receitas, sobre as quaes se póde exercer a acção do governo, em todas ellas tem havido melhoramento sensivel. Só n'estas contribuições, siza, papel sellado e sêllo de verba, houve um augmento de receita para mais de 60:000$000 réis no anno de 1856-1857, isto é, durante a administração actual. Parece-me, por consequencia, que o sr. D. Rodrigo devia ler ou deve ler alguma confiança n'esta administração.
Sr. presidente, fallou tambem o nobre deputado nas matrizes, e disse que ellas estavam muito mal feitos. Eu a este respeito hei de fazer uma revelação á camara, hei de dizer-lhe o meu pensamento lodo inteiro, isto liga com o projecto que se discute. As matrizes estão mal feitas, convenho; mas de quem é a culpa? É do governo? Não. A culpa vem de se ler entregue ao paiz a feitura das matrizes. Disse se então: « Entregue-se ao paiz a feitura das matrizes, para que a acção do fisco o não vá opprimir»; foi o principio que a administração que restabeleceu o imposto de repartição quiz respeitar; porque os illustres deputados sabem que as matrizes são feitas por uma junta, que é composta do administrador do concelho, do escrivão de fazenda e de tres proprietarios; um nomeado pelo governador civil, e dois pelas camaras municipaes, mas o nomeado pelo governador civil não deixa de ser proprietario; por consequencia se ha defeito, não o impute o illustre deputado senão á idéa que o governo leve de entregar a organisação da base da contribuição de repartição predial ao paiz.
Se eu ámanhã vier declarar á camara que este meio não é efficaz, e que é preciso reforçar a acção do governo na feitura das matrizes, espero que os illustres depurados, pela doutrina que agora sustentam, me hão de apoiar.
Diz o illustre deputado: «Quando a contribuição predial esta tão desigualmente repartida, quer-se ainda augmentar esta desigualdade»! E que remedio me dá o illustre deputado para evitar isto? A feitura de novas matrizes? Eu mostro ao illustre deputado o tempo que têem levado a fazer as matrizes.
Por virtude do artigo 53.º do decreto de 9 de novembro de 1853 deviam as matrizes estar concluidas a 30 de junho de 1854: pois a 31 de dezembro de 1855 só estavam concluidas 1:599, fallando portanto 2:169. No anno de 1856, e nos primeiros dois mezes de (857, concluiram-se mais' 66 matrizes. D'essa data até agora fizeram-se mais 752 matrizes, faltando por consequencia ainda 1:351.
Já vê pois a camara a demora que tem havido para a organisação das matrizes, e igualmente que nos dezeseis mezes da minha gerencia, já fiz organisar mais 752, no que dou uma prova do empenho que tenho de acabar com a irregularidade que ha na distribuição da contribuição predial. (Apoiados.) Mas se ha uns poucos de annos que se tem estado a fazer matrizes, e ainda não estão acabadas, como querem os illustres deputados que nós vamos fazer de novo todas as matrizes para depois distribuir este pequeno imposto? Ora, eu pergunto aos illustres deputados que votaram, aquelles que votaram, o projecto da repartição da contribuição predial, se o fizeram na idéa de que nunca esse contribuição havia de ser augmentada? Se linham esse pensamento? Não o tinha ninguem.
Essa alteração na maneira de ser de contribuição predial tinha dois fins; o primeiro, acabar com a desigualdade, o segundo habilitar o governo nas occasiões de crise a ir buscar á propriedade os meios indispensaveis para occorrer a essa crise. E que aconteceu? É que se pôz um prego na cifra da contribuição predial em 31 de dezembro de 1852 até hoje, e vindo agora o governo pedir 2 por cento mais, que augmenta só a contribuição em 30:000$000 réis, levanta-se esta celeuma! Pois saiba a camara que sem essa reforma a decima predial tinha augmentado muito mais, e eu lh'o vou provar. (Uma voz: — Isso não é argumento.) Ouço dizer que não é argumento o que eu estou dizendo; tem rasão o illustre deputado, argumentos são só proposições vagas sem demonstração alguma, que vem todos os dias dos bancos da opposição; mas documentos officiaes, esses não provam nada Quer v. ex.ª e a camara saber o estado d'esta contribuição em 1849? Eu lh'o mostro. A decima predial e de foros era em
1849...................... 1.030:769$990
1850...................... 1.045:350$156
1851...................... 1.044:542$350
1852...................... 1.054:235$606
1853...................... 1.060:351$614
Tinha subido pois 30:000$000 réis de 1849 a 1853, e ía subindo, e pergunto, quanto pagam hoje de renda de casas os illustres deputados em Lisboa, em comparação do tempo que precedeu a este systema de contribuição? (Apoiados.) Pois como se ha de queixar um senhorio por se lhe exigir mais 2 por cento de contribuição, quando elle exige mais de 30 por cento do que recebia d'antes? (Apoiados.) Então porque choram os illustres deputados 30:000$000 réis, que o governo pede á propriedade para fizer estradas?
O sr. Paulo Romeiro: — E a producção tambem tem augmentado?
O Orador: — Eu lhe Irarei os documentos sobre a exportação dos nossos productos agricolas...
O sr. Presidente: — Peço que não interrompam.
O Orador: — Quando é que os lavradores exportaram productos agricolas, como estão exportando?
Página 172
—172—
O sr. Paulo Romeiro: — Vinho?
O Orador: — Pois é esse o unico producto que o paiz exporta? Repito, se naquelle tempo senão tivesse substituido a decima de quota pela contribuição de repartição, hoje o paiz havia pagar muito mais do que paga. (Apoiados)
Sr. presidente, a verdade é que os illustres deputados consultando os documentos officiaes, hão de encontrar que a contribuição predial que hoje paga o paiz, é exactamente igual á que se pagava em 1850, e querem saber o que aconteceu de 1850 até hoje? Aconteceu que se fizeram cento e sessenta leguas de estrada, aconteceu que temos dois caminhos de ferro em exploração na extensão de cento e vinte kilometros, aconteceu que o paiz tem recebido grandes e consideraveis melhoramentos; (Apoiados.) mas tenham a certeza de que continuando n'esle systema mesquinho, e não se offendam com a phrase, que não é dita no sentido de offender ninguem, vindo regatear ao governo os meios para continuar esses melhoramentos materiaes, fazem o peior de todos os serviços ao paiz. (Apoiados.) Os illustres deputados não linham duvida nenhuma em votar agora os 1.800:000$000 réis, o que não querem é votar o imposto, o que quer dizer, que em presença de um orçamento em que ha um deficit, se augmente ainda mais esse deficit, e se obrigue o thesouro a operações ruinosas, mas que se não augmente a receita; os illustres deputados não querem que se augmente a receita nem para estradas, que os illustres deputados reputam as unicas despezas productivas: a despeza que se faz com a instrucção publica, com a administração publica, com a administração da justiça, com o exercito, com a marinha, essa para nada presta! Pois esta administração quer fazer frente aos encargos dos melhoramentos do paiz, mas tambem quer fazer frente aos encargos da governação publica, e para isso ainda que hoje não houvesse deficit, havia-o ámanhã, porque o governo não póde consentir que a remuneração do serviço publico continue como está, porque não ha nada mais absurdo do que querer exigir que os funccionarios publicos prestem bom serviço, quando se lhes não retribue como deve ser. (Apoiados.)
Tinha muito mais que dizer, mas para não cansar a camara, e como provavelmente terei ainda de pedir a palavra n'esta questão, reservo-me para então dizer alguma cousa mais em resposta a algum argumento que se apresentasse, e que agora me escapou de responder. (Vozes: — Muito bem.)
O sr. Presidente: — A ordem do dia para ámanhã é a continuação da de hoje, e mais os projectos n.º 16, 17, 15, 18, 19, 14 e 23. Está levantada a sessão.
Eram quatro horas e meia da tarde.