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N.° 5

SESSÃO DE 4 DE MAIO DE 1859

PRESIDENCIA DO SR. M. A. VELLEZ CALDEIRA

SECRETARIOS OS SRS.

Miguel Osorio Cabral

Bernardino Joaquim da Silva Carneiro

Chamada—presentes 55 srs. deputados.

Entraram antes do meio dia — os srs. Balduino, Azevedo e Cunha, Faria Maia, Barão das Lages, Abranches, Mousinho de Albuquerque, Costa Lobo, Polido, Soares Franco, Pessoa de Amorim, Santos Silva, Vaz Preto, Sousa Machado, Ferreira de Mello, Maia, Frazão, Vaz Monteiro, Paes de Figueiredo, e Canã.

Entraram depois do meio dia — os srs. Alves Martins, Sá Nogueira, Dias de Azevedo, Lousada, Arrobas, Rodrigues Sampaio, Telles de Vasconcellos, Dias e Sousa, Carlos Bento, Pinto Coelho, Silva e Cunha, Faustino da Gama, Frederico de Mello, Bivar, Gavicho, Faria Junior, Pereira e Carvalho, Sant’Anna e Vasconcellos, Gomes de Castro, Costa Xavier, Sequeira Pinto, Almeida Pessanha, Rebello Cabral, Simas, Lobo d'Avila, Barbosa e Silva, Infante Pessanha, Sousa Pinto Basto, José Estevão, Luz, Mendes Leal Junior, Rebello da Silva, Camara Leme, Luiz de Castro, Freitas Branco, Browne, Paulo Romeiro, Charters, S. J. de Carvalho.

Não compareceram—os srs. Alexandre de S. Thomás, Ferreira Lima, Heredia, Antonio Emilio, Avila, Seabra, Pinto de Albuquerque, Couceiro, Barão de Almeirim, Garcez, B. C. do Amaral, Seixas e Vasconcellos, Conde de Valle de Reis, Custodio de Faria, Garcia Peres, Palha, Barrozo, Alves Vicente, Chamiço, Senna Fernandes, Palma, Cabral de Barros, Fonseca Coutinho, Judice, Reis e Vasconcellos, Oliveira Baptista, Julio Ferreira, Justino Pinto Basto, Menezes e Vasconcellos, Julio Guerra, Balthazar de Campos, D. Rodrigo de Menezes, Nogueira Soares, Fernandes Thomás, Ferrer, e Visconde da Carreira (Luiz).

Abertura — ás onze horas e tres quartos. Acta—approvada.

DECLARAÇÕES

1. º—Do sr. Sampaio e Mello, de que por incommodo de saude não póde assistir á sessão de hontem.

A camara ficou inteirada.

2. º—Do sr. Pinto de Almeida, de que o sr. Reis e Vasconcellos não póde assistir á sessão de hoje e a mais algumas por justo motivo.

A camara ficou inteirada.

3. º—Do sr. Sousa Sampaio, de que não póde comparecer na sessão de hontem.

A camara ficou inteirada.

4. º—Do sr. Senna Fernandes, de que por incommodo de saude não póde comparecer á sessão de hoje e a mais algumas. A camara ficou inteirada.

5. º—Do sr. Balduino, de que. o sr. Rebello Cabral não póde comparecer á abertura da sessão de hoje por motivo justificado.

A camara ficou inteirada.

CORRESPONDENCIA

OFFICIO

Do ministerio do reino, acompanhando dois exemplares impressos do decreto de 18 de abril ultimo, e programma approvado por decreto de 23 do mesmo mez, relativos ao proximo consorcio entre Sua Alteza a Serenissima Senhora Infanta D. Maria Anna, e Sua Alteza Real o Serenissimo Principe Jorge de Saxonia.

A camara ficou inteirada.

REPRESENTAÇÃO

Da camara municipal de Lamego, pedindo que evolam os fundos necessarios para a continuação da estrada de Lamego a Vizeu.

Foi a commissão de obras publicas.

O sr. Presidente: — Vae ler-se uma proposta do sr. Xavier da Silva, que não teve hontem vencimento sobre ser admittida á discussão, para se consultar agora a camara se a admitte.

É a seguinte

PROPOSTA

Proponho que em quanto se não concluir a discussão do projecto n.° 112 da lei eleitoral, se designe uma ou duas sessões nocturnas em cada semana. — Xavier da Silva.

Não houve vencimento.

O sr. Henriques Secco: — (Leu.)

Vozes: — Ordem! Ordem! Não se podem ler discursos, o regimento proíbe-o.

O sr. Presidente: — O sr. deputado é cavalheiro, e ha de reconhecer que esta completamente fóra da ordem.

O Orador: — As expressões que soltei em referencia á commissão, se as soltei sem as dever soltar, e admitto que sim, retiro-as; mas desejava que nem v. ex.ª, nem o sr. deputado secretario, nem o sr. deputado por Castello Branco me não tivessem feito injuria dizendo que eu era menos bem educado, porque me preso de cumprir sempre os meus deveres para com as outras pessoas.

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O sr. Presidente: — O sr. deputado a meu respeito esta enganado; eu pela minha parte nao proferi nenhuma das palavras que o sr. deputado acaba de referir, nem era possivel que eu dissesse isso, e appello para a camara.

O sr. Cesario: — Tenho a honra de remetter para a mesa uma representação que acabo de receber n'este momento dos habitantes da cidade de Coimbra, conteudo oitocentos quarenta e cinco assignaturas, adherindo á da camara municipal de Coimbra. Não podia demorar por mais tempo a remessa d'este documento que e importante não só pelo numero de assignaturas que encerra, sua categoria, e grandes interesses que defende, mas que ainda se torna mais importante pela gravidade das circumstancias em que nos achámos.

Lisongeio-me de cumprir este dever, na certeza de que os meus constituintes não representam contra os interesses geraes do paiz, nus sim contra uma proposta de lei que affecta evidentemente os interesses de uma localidade, sem que d'este sacrificio resulte de modo algum beneficio para o paiz em geral.

Os habitantes de Coimbra teem abnegação bastante para não contrariarem as reformas de interesse geral, ainda com prejuizo proprio; e a sua illustração tem-os levado em todos os tempos e nas mais criticas circumstancias a darem ao paiz nobres exemplos de acrisolado patriotismo.

O sr. Gaspar Pereira: — Pedi a palavra para declarar a v. ex.ª e a camara que fallei a sessão de hontem por motivos justificados.

O sr. Costa e Silva: — Vejo com sentimento que não se acha presente o sr. ministro das obras publicas; como porem não tenho em vista provocar explicações da parte de s. ex.ª, mas tão sómente fazer uma recommendação, usarei da palavra na esperança de que essa recommendação chegue ao conhecimento de s. ex.ª pelo extracto da sessão no Diario do Governo.

Sr. presidente, por mais de uma vez tive occasião de chamar a attenção do governo sobre a falta de execução que se tem dado a resolução tomada na camara dos srs. deputados em sessão do 13 de abril de 1857, resolução em virtude da qual se mandou proceder á reparação da igreja parochial de S. Pedro da cidade de Evora; este objecto mereceu tanto interesse e consideração a camara, que lido só se ordenou que se procedesse á obra com urgencia, mas de mais á mais se auctorisou o governo a vir pedir a camara os meios necessarios, se assim o julgasse indispensavel, pois é sahido que a verba designada no orçamento do ministerio das obras publicas para obras e reparos de edificios publicos e monumentos nacionaes e insignificante. O sr. ministro das obras publicas da administração transacta deu-me as mais lisonjeiras esperanças de que se havia de fazer, chegando até uma vez a dizer-me que já tinha mandado expedir as ordens para se levantarem os andaimes.

São decorridos mais de dois annos depois que a obra foi auctorisada, e esta ainda se não fez, nem sequer teve principio de execução; entretanto o tempo tem produzido os seus naturaes effeitos, sendo hoje as ruinas taes e tantas, que a não se prover de prompto remedio, a perda do edificio e inevitavel.

Em vista d'estas considerações peço ao sr. ministro das obras publicas que haja de dar á este negocio toda a attenção que o caso merece; não peço favor, peço justiça, peço o cumprimento da lei.

Tambem pedi a palavra para dizer a v. ex.ª, sr. presidente, que n'uma das ultima» sessões lei lido na mesa o parecer sobre as alterações feitas na camara dos dignos pares ao projecto de lei sobre á continuação do caminho de ferro das Vendas Novas a Evora e Beja; que, entrando-se na discussão, um illustre deputado ponderou á conveniencia do adiamento ale se achar presente o sr. ministro das obras publicas, expediente que foi approvado pela camara; e nao lendo v. ex.ª dirigido os trabalhos da camara n'aquella sessão, eu julguei do meu dever levai ao conhecimento de v. ex.ª similhante resolução, para que v. ex.ª se digne dar-lhe cumprimento logo que seja possivel.

O sr. Presidente: — O parecer sobre as alterações feitas na camara dos dignos pares ao projecto para a continuação do caminho de ferro das Vendas Novas para Evora e Beja, foi adiado por uma resolução da camara ate estar presente o sr. ministro das obras publicas; e não podendo interrompera ordem do dia, quando n'essa occasião estiver presente o sr. ministro, posso comtudo assegurar que aproveitarei o primeiro ensejo para se discutir este projecto.

O sr. Vaz da Fonseca: — Mando para a mesa uma representação dos administradores e empregados nas administrações de alguns concelhos do districto de Lisboa, expondo o modo como pagam os impostos dos seus vencimento», que lhes são collectados como industria, obrigando-os assim á pagar para as estradas e para á amortisação de notas, e podem providencias para que sejam isentos d'estes pagamentos.

O sr. Pinto de Almeida: — Pedi a palavra para chamar a attenção do sr. ministro das obras publicas, mas infelizmente vejo que s. ex.ª não está presente, nem nenhum dos seus collegas; comtudo farei sempre uso da palavra, porque do menos constará a s. ex.ª, pelo Diario do Governo, o assumpto de que queria occupar-me.

Soube hontem por um cavalheiro respeitavel para mim, e para todos que têem a honra de o conhecer, e hoje por uma caria que tive de outro cavalheiro não menos respeitavel, o mau estado em que está a administração da pittoresca matta do Bussaco, aonde a titulo de limpeza se teem cortado arvores que têem mais de trezentos annos, para depois n'esse terreno se semearem couves, ervilhas e cebolas!

Este escandalo e inaudito, e e necessario tomarem-se providencias; o governo não deve abandonar este assumpto, e pela minha parte não o abandonarei, porque venho aqui para levantar a minha voz contra os escandalos, e por isso repelirei a minha exigencia ao sr. ministro ate que seja attendida.

O sr. Barão das Lages: — Espero ha muito tempo o sr. ministro das obras publicas, para dirigir a s. ex.ª algumas considerações em relação a crise commercial do Porto, e ao estado em que se acha este negocio por occasião dos ultimos acontecimentos politicos.

Sr. presidente, este negocio e muito grave para ficar sem uma solução propria e conveniente. Sei que s. ex.ª o sr. ministro das obras publicas tenciona fazer uma viagem as provincias do norte, e poço a s. ex.ª que estude esta grave questão, para que ella seja resolvida na proxima sessão legislativa.

Por este motivo vejo-me na necessidade de mandar para a mesa uma nota de interpellação, para saber o que s. ex.ª tenciona fazer sobre este assumpto.

Sr. presidente, esta questão não e só questão commercial, e tambem a questão da agricultura do Douro que se acha muito prejudicada com o estado em que esta o commercio do Porto.

Os proprietarios do Douro têem sido sacrificados a especulações ruinosas.

O commercio do Porto é, na sua generalidade, um commercio regular, mas n'aquella respeitavel corporação ha especuladores que compromettem tudo.

Só por um acto dos poderes publicos e que se remediará este mal, como mostrarei em tempo competente.

Eu, sr. presidente, tenho pezar de que o sr. ministro das obras publicas não esteja presente, porque evitava mandar para a mesa esta nota de interpellação, que nem mesmo se podera verificar seguindo-se as regras que costumam seguir as interpellações para se verificarem, mas eu tenho vindo aqui muitas vezes resolvido a fallar n'este assumpto, umas vezes esta o illustre ministro e não estou eu, outras vezes estou eu e não está o illustre ministro, o tempo e limitadissimo entre o espaço que ha para os deputados pedirem á palavra sobre negocios d'esta ordem e á ordem do dia, e eu pela minha parte não quero carregar com a responsabilidade de um negocio tão grave vir á camara e ficar no estado em que se acha; parece que da parte da camara não mereceu a consideração que entendo que deve merecer, e da parte das pessoas mais particularmente interessadas no mesmo negocio.

O sr. Castro e Lemos; — Sr. presidente, em uma das sessões

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da semana que proximamente findou, estando v. ex.ª ausente, o sr. vice-presidente, que occupava então essa cadeira, mandou logo depois do expediente fazer a leitura do parecer sobre as emendas que vieram da camara dos dignos pares a respeito do projecto de lei para a continuação do caminho de ferro das Vendas Novas a Evora e Béja. N'essa occasião estava unicamente presente o sr. ministro do reino, que não se julgou habilitado para poder entrar na discussão do assumpto e dar as explicações convenientes, por isso ficou o parecer reservado para quando estivesse presente o sr. ministro das obras publicas. Eu rogava portanto a v. ex.ª que aproveitasse a primeira occasião de estar presente o dito sr. ministro, a fim de que, seguindo o mesmo exemplo, logo depois da leitura do expediente se discutissem estas emendas, porque estão já ha muito tempo demoradas sobre a mesa, e versam sobre objecto transcendente que seria necessario resolver antes que a camara se fechasse. Eu bem sei que actualmente as circumstancias financeiras elo paiz, e quaesquer acontecimentos hostis que se possam dar na Europa, poder a tornar mais difficil arranjar fundos para essa obra, e o que desejo é que só não possa dizer que por omissão ou falla de diligencia da parte dos deputados do Alemtejo se deixa de discutir um objecto Ião transcendente. Peço pois a v. ex.ª que aproveite a primeira occasião de estar presente o sr. minislro das obras publicas, para pôr este objecto em discussão, e ao mesmo tempo que sirva isto de aviso áquelles srs. deputados, que n'essa occasião possam ler duvidas por não lerem sido impressas as emendas, a fim de que as evaminem, porque ha muitos dias que estão na mesa, e os srs. deputados que quizerem estudar a materia têem lido e continuam a ler tempo sufficientissimo para isso.

O sr. Presidente: — O sr. deputado não ouviu o que ha pouco acabei de responder a uma pergunta sobre o mesmo assumpto. Eu disse que esse parecer estava dependente da presença do sr. ministro das obras publicas para se discutir, mas que no meio da discussão de outro objecto, eu não a podia interromper para se tratar d'este.

O sr. Castro e Lemos: —Eu não sabia que algum outro sr. deputado linha feito o mesmo pedido, mas é mais uma instancia para que v. ex.ª tenha em consideraçao o negocio.

O sr. Gavicho: —...............................

O sr. Presidente: — O sr. deputado pedirá a palavra quando estiver presente o sr. ministro das obras publicas. Em quanto ás propostas, estão pendentes de uma interpellação. A mesa tem querido dar umas poucas ele vezes interpellações para os dias em que a camara determinou que ellas tivessem logar, mas a camara tem decidido que não.

O sr. Gavicho: — Requeiro a v. ex.ª que consulte a camara sobre se hão ser dadas para ordem do dia de uma das sessões proximas as propostas que estão na mesa sobre a crise commercial do Porto.

O sr. Barão das Lages: — Parece-me que tudo fica combinado da seguinte maneira.

Eu na minha interpellação chamo a attenção do governo sobre o assumpto, que é grave. As propostas que foram mandadas para a mesa talvez a camara não as possa votar sem ouvir o governo sobre o assumpto; por consequencia parecia-me que, pedindo o illustre deputado que sejam dadas para ordem do dia essas propostas, devia pedir igualmente a assistencia do governo para saber qual é a sua opinião sobre o assumpto. Se o governo nos declarar que tem uma opinião formada, isto é, que póde estudar a questão de per si, que não precisa de commissão nenhuma para a estudar, e que ha de apresentar na sessão que vem um projecto de lei sobre este importante objecto, nós de certo não podemos exigir mais cousa alguma. Se o governo, pelo contrario, julgar indispensavel uma commissão de inquerito para estudar o negocio, e sobre o resultado dos trabalhos d'essa commissão apresentar um projecto de lei, então parece-me que a camara deve votar essas propostas que estão na mesa. Portanto parecia-me que o que era mais rasoavel era que nós ouvíssemos o governo, que chamássemos a sua attenção sobre o assumpto, e depois de ouvir a sua opinião nós então resolvêssemos. O que pedia ao illustre deputado era que para melhor andamento d’este negocio em que s. ex.ª se mostra e se tem mostrado tão empenhado, annuisse a este meu desejo, porque me parece que assim satisfaz tambem melhor o seu intuito.

O sr. Gavicho: —................................

O sr. Ta: Monteiro: — Pedi a palavra para participar ao illustre deputado que o parecer da commissão de commercio e artes, sobre o seu projecto, foi-me hontem entregue juntamente com elle, que ámanhã é o dia da reunião da commissão, e n'essa reunião trataremos d'esse assumpto.

(Foi introduzido na sala com as formalidades do estylo, prestou o juramento e tomou assento o sr. deputado João Maria de Sequeira Pinto.)

O sr. Presidente: — Já deu a hora de se entrar na ordem do dia; mas antes d'isso, como não esta presente o governo, e a camara esta agora mais numerosa do que estava no principio da sessão, vae ler-se uma proposta do sr. Xavier da Silva para se propor se ha de ser admittida á discussão. Foi admittida.

O sr. Mello Soares: — Pedi a palavra, não para combater a proposta, porque vejo que é necessario discutir a lei eleitoral, e que a camara tem empenho e o paiz interesse em que ella se discuta, mas para secundar a mesma proposta com uma outra que me parece que ha de dar melhor resultado, e vem a ser, para que, no tempo que decorrer desde a abertura da sessão até á hora de se entrar na ordem do dia, se discuta a lei eleitoral. E n'este sentido apoio a proposta do sr. Augusto Xavier, com quanto, pelo meu estado de saude, possa deixar de vir ás sessões nocturnas, porque desejo que a lei eleitoral se discuta.

Se é preciso vou mandar para a mesa uma proposta para que o intervallo desde a abertura da sessão até á ordem do dia se dedique á discussão da lei eleitoral.

O sr. Presidente: — Como acaba de entrar o sr. ministro das obras publicas, desejava que s. ex.ª me dissesse se estava habilitado para a discussão do projecto n.° 111?

O sr. Ministro das Obras Publicas (Antonio de Serpa): — Sim, senhor.

O sr. Presidente: — Então vae passar-se á ordem do dia, o fica para ámanhã a discussão da proposta do sr. Xavier da Silva.

O sr. Cesario: — Requeiro que a representação, que ha pouco apresentei, seja, como todas as outras lêem sido, impressas no Diario do Governo.

O sr. Pinto de Almeida: — Como está presente o sr. ministro das obras publicas, peço a v. ex.ª me conceda a palavra para chamar a attenção do sr. ministro sobre um abuso que me foi participado: refiro-me ao córte de madeiras que se está fazendo na matta do Bussaco. Ha pouco acabei de alludir a esse abuso que se está praticando, e como não costumo nunca dizer na ausencia dos srs. ministros o que não sou capaz de dizer na sua presença, repetirei o mesmo que disse na ausencia do sr. ministro das obras publicas...

O sr. Presidente: — Não posso dar a palavra ao sr. deputado.

O Orador: — Pois então peço a v. ex.ª que consulte a camara sobre se me concede a palavra. Não houve vencimento.

O sr. Pinto de Almeida: — Pedi-la-hei ámanhã antes da ordem dia, se v. ex.ª estiver presente.

ORDEM DO DIA

O sr. Ministro das Obras Publicas (Antonio de Serpa): — Eu posso declarar-me habilitado para entrar na discussão de que se tem tratado; mas ponderarei a v. ex.ª que ha uma medida muito grave, um projecto que talvez passe sem discussão n'esta camara, que é a auctorisação sobre os cereaes. Ha um ramo de commercio que esta paralysado, que é o arroz. Como no projecto se propõem direitos differentes dos que actualmente o arroz paga, esta claro que não se fazem despachos d'esse genero. Por outro lado, apesar da baixa que tiveram

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os cereaes, algumas localidades estão ainda reclamando o centeio, unico cereal que não esta admittido pelos portos do sul, e na proposta que apresentei á camara, e a commissão approvou, vem um artigo perceptivo para a entrada já do centeio. Portanto parecia-me conveniente, se v. ex.ª tivesse a bondade de assim o propor á camara, que se entrasse desde já na discussão do projecto sobre os cereaes, que talvez passe com pequena alteração ou sem ella.

E propondo-se logo se havia de entrar em discussão o projecto n.° 118 — decidiu-se que sim. É o seguinte

PROJECTO DE LEI N.° 118

Senhores: — A commissão de agricultura examinou a proposta de lei de 18 de abril do corrente, apresentada á camara pelo ministro e secretario d'estado das obras publicas, e depois de ler ouvido o governo e avaliado as rasões que motivaram aquella proposta;

Considerando que, não obstante terem em parte sido desvanecidos os receios de uma má colheita, todavia convindo que o governo se ache armado de uma medida preventiva com que remedeie qualquer eventualidade que se possa dar em objectos alimenticios, durante a ausencia das côrtes, que tanto mais é para receiar attendendo ao estado actual da Europa;

Considerando que esta auctorisação não é tanto um voto de confiança como uma necessidade que convem de prompto remediar:

Considerando que nunca ha a receiar taes auctorisações, quando a camara faça effectiva a responsabilidade;

Considerando a conveniencia que ha de acudir desde já ás peremptorias necessidades de alguns districtos do interior do reino, em que os cereaes têem tomado um alto preço;

Considerando, alem d'isso, que o arroz é um objecto de grande consummo e póde em grande parte substituir como alimento os cereaes; e lendo em vista igualmente as queixas que alguns districtos do reino têem dirigido a esta camara contra o cultivo daquella gramine, que julgam altamente insalubre;

A commissão de agricultura, de accordo com o governo, julga dever submetter á consideração da camara o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º Fica o governo auctorisado, na ausencia das côrtes, a tomar as providencias necessarias para occorrer a qualquer crise alimenticia que possa sobrevir durante este tempo, dando livre entrada aos cereaes e legumes, debaixo de qualquer fórma, pelos portos seccos e molhados do reino, ouvindo previamente o conselho geral de commercio, agricultura e manufacturas, e as auctoridades superiores administrativas dos districtos.

Art. 2.° As medidas que o governo julgar conveniente tomar em virtude do artigo antecedente vigorarão até ao dia lo de novembro do presente anno.

Art. 3.° Para os fins d'esta auctorisação ficam reduzidos, até o mesmo dia 15 de novembro do presente anno, a 400 réis por cem arrateis os direitos de importação sobre o arroz descascado estrangeiro, e a 200 réis por cem arrateis os direitos sobre o mesmo arroz com casca.

Art. 4.° Fica permittida desde o data da presente lei a livre admissão do centeio pelos portos seccos e molhados do reino, para os quaes ainda não foi decretada, em virtude da auctorisação concedida pela carta de lei de 14 de agosto de 1858. durante o praso estabelecido na mesma lei.

Art. 5.° Todos os generos estrangeiros comprehendidos nas disposições d'esta lei ficam sujeitos aos mesmos direitos de consummo que pagam os generos similares nacionaes.

Art. 6.° Aos generos estrangeiros de que trata o precedente artigo, e que entrarem nos portos molhados do reino, depois de terminados os prasos para a sua admissão, na fórma da presente lei, serão applicaveis as disposições n'ella contidas, com tanto que se prove que saíram directamente dos portos da sua procedencia para os do reino com a anticipação necessaria para chegarem antes de terminados os mesmos prasos, no caso de uma viagem regular.

§ unico. O governo decidirá sobre a applicação d'este artigo, ouvindo o conselho geral do commercio, agricultura e manufacturas, e á vista dos manifestos certificados pelos respectivos consules.

Art. 7.° O governo dará conta ás córtes do uso que tiver feito das auctorisações contidas na presente lei.

Art. 8.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Sala da commissão, 28 de abril de 1859. = João José Vaz Preto Geraldes— José Alvares de Oliveira = Estevão José Pereira Palha—Antonino José Rodrigues Vidal = Francisco Martins Polido = José Maria da Silveira e Menezes —José Vaz Monteiro.

PROPOSTA DE LEI N.° 109-A

EM que recaiu o projecto antecedente

Senhores: — A irregularidade com que vae correndo a estação faz receiar uma colheita pouco abundante era alguns dos districtos do continente do reino. A carestia de alguns generos de primeira necessidade para as classes laboriosas começa a fazer-se sentir em diversos pontos do paiz. A eventualidade de acontecimentos exteriores vem augmentar ainda os receios de uma alta no preço dos generos alimentares. Em taes circumstancias o governo fallaria aos seus mais imperiosos deveres se não procurasse munir-se com a auctorisação necessaria para ter abertos os portos do reino, no caso de o exigirem as circumstancias, á importação livre dos cereaes, unica medida efficaz para minorar os males do preço excessivo a que podér receiar-se que cheguem alguns generos de consummo geral e necessario. O governo procurará usar d'esta faculdade com a discrição que reclamam os interesses de todas as classes.

Circumstancias analogas aconselharam o poder executivo a munir-se da auctorisação que lhe foi concedida pela carta de lei de 14 de agosto do anno preterito, e em virtude d'ella foram abertos os portos seccos e molhados do reino á introducção livre dos cereaes até á epocha proxima de 31 de maio, excepto á do centeio pelos portos do sul. O governo podia fazer desapparecer esta excepção, que esta hoje sendo excessivamente gravosa já uma parte do paiz, dentro das attribuições da mesma lei, e depois de preenchidas as formalidades que ella exige. No momento porém de vos pedir uma auctorisação mais ampla sobre tal assumpto, entendi que era não menos expedito e mais curial solicitar esta medida da vossa deliberação.

O arroz, posto que menos indispensavel e nutriente do que os outros cereaes, póde pelo seu baixo preço, se approvardes a diminuição dos direitos que vos proponho, supprir em grande parte as necessidades da alimentação, e melhorar a sorte das classes numerosas e desvalidas, no caso determos de sentir os effeitos de uma alta prolongada no preço das outras substancias. A receita publica não será desvantajosamente affectada por uma tal medida. Se isto não fosse uma verdade, que a sciencia e a pratica de outros paizes tornam incontestavel, quando se trata de generos de consummo tão universal, o exemplo pouco remoto do nosso paiz no-lo provaria. Em quanto uma medida definitiva sobre pautas não é submettida pelo governo á vossa consideração, esta medida parcial e temporaria, de accordo com os principios economicos que devem dirigir um trabalho de tal natureza, vem occorrer á urgencia das actuaes circumstancias, e servo ao mesmo tempo de meio indirecto para obviar aos inconvenientes da extensão de uma cultura, que em terrenos pouco proprios e sem as necessarias cautelas póde affectar a salubridade das populações.

Em virtude d'estas ponderações tenho a honra de submetter ao vosso exame a seguinte proposta de lei.

Artigo 1.° Fica o governo auctorisado a prorogar até uma epocha, que não exceda o dia 31 de dezembro do corrente anno, o praso determinado no artigo 1.° da carta de lei de 14 de agosto de 1858, para a livre admissão de cereaes e legumes debaixo de qualquer fórma, pelos portos seccos e molhados

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do reino que forem designados, se as circumstancias assim o exigirem, e ouvidos previamente o conselho geral do commercio, agricultura e manufacturas, e as auctoridades superiores administrativas dos districtos.

Art. 2.° Para os fins d'esta auctorisação ficam reduzidos, ale ao dia 30 de junho do anno proximo futuro, a 400 réis por cem arrateis os direitos de importarão sobre o arroz descascado estrangeiro, o a 200 réis por cem arrateis os direitos sobre o mesmo arroz com casca.

Art. 3.° Fica permittida, desde a data da presente lei, a livre admissão do centeio pelos portos seccos e molhados do reino, para os quaes ainda não foi decretada, em virtude da auctorisação concedida pela carta de lei de 14 de agosto de 1838, e durante o praso estabelecido na mesma lei.

Art. 4.° Todos os generos estrangeiros, comprehendidos nas disposiçoes d’esta lei, ficam sujeitos aos mesmos direitos de consummo que pagam os generos similares nacionaes.

Art. 5.° Aos generos estrangeiros de que tratam os precedentes artigos, e que entrarem nos portos molhados do reino depois de terminados os prasos para a sua admissão, na fórma da presente lei, serão applicaveis as disposições n'ella contidas, com tanto que se prove que saíram directamente dos portos da sua procedencia para os do reino com a antecipação necessaria, para chegarem antes de terminados os mesmos prasos, no caso de uma viagem regular.

§ unico. O governo decidirá sobre a applicação d'este artigo, ouvido o conselho geral do commercio, agricultura e manufacturas, e avista dos manifestos certificados pelos respectivos consules.

Art. 6.° O governo dará conta ás córtes do uso que tiver feito das auctorisações contidas na presente lei.

Art. 7.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Ministerio das obras publicas, commercio e industria, 18 de abril de 1859. = Antonio de Serpa Pimentel.

O sr. Barão das Lages: — Eu tinha tenção de nunca dar o meu voto a similhantes auctorisações, porque tenho conhecido pela experiencia que muitas vezes este paiz tem sido victima de precipitações dos ministros, pela facilidade com que usam d'estas auctorisações que as camaras lhes dão; e se eu não tivesse plena confiança no sr. ministro das obras publicas e no actual ministerio, certamente lhe negaria este voto de confiança. Mas não posso n'esta occasião deixar de chamar a attenção do sr. ministro das obras publicas, para lhe pedir que no uso que tiver de fazer d'esta auctorisação seja o mais cauteloso e prudente possivel, e que haja de consultar todas as classes interessadas e as auctoridades respectivas, quando houver de tomar uma resolução sobre este importante assumpto; porque eu tenho visto por varias occasiões que muitos srs. ministros têem consultado unicamente classes e auctoridades interessadas na introducção dos cereaes, em quanto que têem despresado o consultarem as classes que têem interesses inteiramente diversos.

Portanto eu, pela confiança que tenho no sr. ministro das obras publicas, e porque espero que s. ex.ª com a prudencia com que costuma proceder em todos os seus actos, fará d'esta auctorisação o uso mais conveniente, não tenho duvida nenhuma em lh'a votar, pedindo ao nobre ministro, como acabei de dizer, que, quando tiver de usar d'esta auctorisação, consulte todas as associações diversamente interessadas n'esta medida.

Nada mais tenho a dizer sobre este objecto.

O sr. Ministro das Obras Publicas (Antonio de Serpa): — Sr. presidente, eu creio que os lavradores, que as classes especialmente interessadas na producção dos cereaes, ler-se-hão convencido de que o peior estado para ellas é o por que têem passado nos ultimos annos, é este estado de duvida e incerteza; por um lado tendo a protecção quando não carecem d'ella, quando ha grande abundancia no paiz; e por outro lado cessando essa protecção no momento em que podiam tirar algumas vantagens, porque o interesse maior de todas as classes, a necessidade de occorrer ás exigencias do consummo, faz com que se abram continuadamente os portos aos cereaes estrangeiros, sem se sujeitarem a nenhum direito.

Estas fluctuações trazem gravissimos inconvenientes para o commercio, e trazendo-os para o commercio, tambem os trazem para o consumidor e para o lavrador. (Apoiados.)

Eu entendo portanto que uma lei permanente de cereaes é de uma grande necessidade. Não é facil estabelecer estalei sobre dados exactos na falla dos estatisticos que se dá no paiz; não é facil, digo, chegar a uma lei perfeita, no entretanto o governo está na intenção de na proxima legislatura apresentar uma lei permanente de cereaes, e de agora até essa epocha procurará munir-se de todos os esclarecimentos e fundamentos que possam servir para bem estabeleceras disposições d'esta lei.

Em quanto ás reflexões que acabou de fazer o nobre deputado, posso assegurar a s. ex.ª que hei de procurar, nas informações que se ouvirem, proceder com toda a circumspecção e prudencia necessaria, para garantir os interesses de umas e outras classes; e para prova d'estas disposições em que o governo está, é que se inseriu na lei a disposição de que o governo não decretasse esta introducção de cereaes senão depois de ouvidas todas as auctoridades superiores dos districtos. Parece-me que d'esta maneira estão afastadas as apprehensões do nobre deputado, e que a camara não póde deixar de dar o seu assentimento a esta auctorisação, mesmo porque as circumstancias hoje da Europa são de uma ordem tal, que não se tem a receiar que o preço dos cereaes possa ser favoravel á introducção, porque uma vez abertos os portos, o preço dos cereaes ha de regular-se pelo que tiverem nos paizes estrangeiros, e esse não póde descer a uma baixa tal, que venha fazer mal aos lavradores; ao contrario, hade subir, (Apoiados.) de maneira que os nossos preços em relação ao nosso mercado conservem o equilibrio, e que mesmo o commercio possa abastecer o mercado sem perda do lavrador, que de certo encontrará sempre um preço animador para os seus generos. E a prova estamos vendo-a no preço a que têem subido nos ultimos dias os cereaes, especialmente no mercado de Londres, (Apoiados.) que é o regulador da Europa. Por consequencia, parece-me que não póde haver escrupulo por parte do nobre deputado em conferir esta auctorisação ao governo.

O sr. Dias de Azevedo: — Sr. presidente, tambem eu tenho confiança no actual sr. ministro das obras publicas. Entretanto eu desejo fazer algumas observações sobre este projecto que se entende que é de grande momento.

Começarei por lamentar, como já lamentei de outra vez o ler-se apresentado este projecto sem a competente estatistica, sem saber o que lemos nem o que necessitamos, e quando nós não sabemos o que temos nem o que necessitamos a nossa auctorisação é vaga e póde ser inutil, e na actualidade entendo que o projecto é inutil por duas rasões, é inutil pelas circumstancias do paiz e inutil pelas circumstancias da Europa. Pelas circumstancias do paiz, porque felizmente realisaram-se as nossas esperanças, as nossas cearas renasceram com grande abundancia de cereaes, a ponto de que agora não ha nenhuma falla d'elles, por isso que em Lisboa onde o consummo é maior e onde ha mais necessidade d'este genero, existem hoje depositos taes que das provincias vem buscar a Lisboa os generos para ali consumirem.

O nobre deputado sabe muito bem que a causa da decadencia na nossa agricultura foi a barateza dos preços da nossa producção agricola, de maneira que quando chegou a nova colheita o genero não teve preço nenhum, e o resultado foi uma grande perda que teve o lavrador. É uma inutilidade porque as circumstancias do paiz variaram completamente, e é ainda uma inutilidade, porque as circumstancias da Europa fizeram que nós não possamos temer a introducção, pelo genero ser mais barato. Mas ainda que estou persuadido que este projecto seria uma inutilidade, eu não tenho duvida em auctorisar a introducção de lodo o genero, quando as circumstancias o permittirem. Mas o que não posso votar é que com a lei dos cereaes se apresente uma idéa realmente economica e que o nobre ministro das obras publicas o outro dia disse que desejava fazer passar n'esta camara a da diminuição dos direitos do arroz, e que eu entendo que não vem

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a proposito na lei de auctorisação para a introducção de cereaes. E por isso eu, sem julgar necessaria e indispensavel a auctorisação pedida, não tenho duvida em a conceder n'um artigo só que é que fique o governo auctorisado até ao dia 15 de Dezembro a admittir todos os generos alimenticios, se circumstancias o exigirem, ouvindo alem dos corpos collectivos mencionados no artigo 1.°, as associações agricolas e districtaes aonde as houver; e entendo que está deslocada aqui a questão do arroz, e quando entrarmos n'esta discussão eu mostrarei que a diminuição dos direitos do arroz, em logar de ser um beneficio é um desperdicio, se não a ruina da industria agricola mais proveitosa que existe no paiz. Por isso eu n'esta parte separo-me das idéas do projecto, approvando as suas disposições para a introducção, como disse de cereaes, mas nenhuma outra disposição por a julgar deslocada e desnecessaria; tanto mais quanto eu espero e confio que d'esta mesma auctorisação se servirá o governo com aquella precaução e tacto indispensavel, e nunca em prejuizo da nossa agricultura.

O sr. Ministro das Obras Publicas (Antonio de Serpa): — Sr. presidente, eu deploro tambem como o nobre deputado que acabou de fallar, que este projecto fosse apresentado á camara sem ser acompanhado da competente estatistica; mas o nobre deputado sahe muito bem que essa estatistica infelizmente não existe, e por consequencia não esta na mão do governo o apresenta-la. O governo poderia trazer uma estatistica inexacta, mas preferiu não apresentar nenhuma a apresenta-la inexacta, e a camara sabe que o governo não tem os meios necessarios para poder apresentar uma estatistica mais completa a respeito de todos os objectos, e sobretudo commerciaes, agricolas e industriaes do paiz; e eu pedi já uma auctorisação para organisar uma repartição de estatistica.

Diz o illustre deputado, que a medida se toma inutil, porque as circumstancias mudaram com a ultima variação atmosphericas é verdade, mas na falta dos dados estatisticos, o que nos regula um pouco são os preços, e mesmo nos paizes em que a estatistica está muito exacta, os preços são como um thermometro, mais exacto ainda que as estatisticas, (Apoiados.) e o illustre deputado sabe muito bem, que apesar das chuvas, se alguns generos desceram de preço, outros subiram. (Apoiados.) O illustre deputado entende que é inutil até certo ponto esta auctorisação, porque do estrangeiro não nos podem vir hoje cereaes mais baratos; mas sendo assim, não póde haver o menor fundamento de que d'ella provenha prejuizo algum aos lavradores.

O illustre deputado entende que não convinha apresentar n'esta auctorisação disposição ácerca da diminuição dos direitos do arroz; parece-lhe menos proprio que se trate d'este assumpto n'uma questão de cereaes. Ora eu digo ao illustre deputado, que segundo alguns homens technicos, o arroz é um cereal; (Apoiados.) mas deixemos agora essa questão, o que eu entendo é que o arroz é um alimento importante, e em 1856 este genero foi de grande auxilio para as classes pobres; n'essa epocha houve uma grande escassez, e a medida que Se tomou ácerca do arroz foi de tanta conveniencia, que os direitos do arroz que na alfandega do Porto costumavam montar a 30:000$000, n'esse anno o rendimento da alfandega proveniente dos direitos de entrada por esse genero subiu a 80:000$000. (Apoiados.) Faça-se idéa por aqui, de qual foi o extenso consummo do arroz naquelle anno. E o que prova isto? Prova que o arroz suppriu em grande parte a falla de cereaes pelo preço excessivo a que elles chegaram. Por consequencia, não me parece que não seja proprio introduzir esta disposição n'esta lei. (Apoiados.)

Torno a dizer: nas circumstancias actuaes, o governo entende que deve ficar armado com esta auctorisação, assim como que se deve conservar na lei esta disposição, para a diminuição dos direitos do arroz, e que a camara votando d'esta maneira previne eventualidades que podem ser funestas até certo ponto ás classes pobres da sociedade, e ao mesmo tempo não prejudica de nenhuma maneira os interesses dos productores.

O sr. Barão das Lages: — Esta auctorisação, como disse o nobre ministro, póde ser vantajosa e util, e não póde nunca ler resultados inconvenientes, uma vez que o sr. ministro use d'ella com a devida prudencia. Póde ser util o vantajosa, porque, nas. circumstancias em que se acha a Europa, apesar das considerações apresentadas pelo illustre deputado, e da probabilidade das colheitas serem boas, póde haver uma necessidade urgente, e é bom que o governo esteja habilitado para providenciar como convier. Eu concordo com o sr. ministro nas considerações que acabou de fazer, ácerca da necessidade de uma lei permanente sobre cereaes; não combali esta idéa, o que disse, o que desejei mostrar foi a necessidade que s. ex.ª tinha de ser muito prudente no uso d'esta auctorisação, ena necessidade de consultar todas as associações e auctoridades que representam interesses diversos n’esta importante questão; porque é necessario que se diga que o governo n’este assumpto tem ido consultar sempre as associações interessadas na introducção dos cereaes, e não as associações agricolas que têem interesses diversos. Foi para isto que eu chamei a attenção do nobre ministro, para que não seguisse a marcha dos seus antecessores.

S. ex.ª disse = que consultava os governadores» civis =; ora, s. ex.ª deve saber que os governadores civis são auctoridades que governam e residem no centro das grandes cidades, sempre interessadas na introducção dos cereaes, porque são consumidoras, e então é necessario não se limitar a consultar só essas auctoridades, mas sim tambem as sociedades agricolas.

Eu se não tivesse tanta confiança no nobre ministro não votava por esta auctorisação: estava muito desgostoso por ver o modo por que os governos têem procedido n'este ponto, havendo-se por mais de uma vez introduzido cereaes n'este paiz com grave prejuizo da agricultura; confiando porém no governo voto a auctorisação, com a condirão de que o nobre ministro nunca fará uso d'ella sem consultar as auctoridades e associações que representam interesses diversos.

O sr. Polido: — Sr. presidente, quando no mez de agosto do anno passado o governo se apresentou n'esta camara pedindo uma auctorisação para a admissão dos cereaes, a camara toda concedeu essa auctorisação em rasão da necessidade. Quando posteriormente, no mez de janeiro, o sr. ministro da fazenda, usando dessa auctorisação, decretou a admissão dos cereaes até 31 de maio, v. ex.ª e a camara ha de lembrar-se que eu pedi a palavra e dirigi uma interpellação ao sr. ministro do reino, allegando a inopportunidade de decretar a admissão dos cereaes, advoguei então os interesses da agricultura, que eu julgava ficar prejudicada coma admissão dos cereaes. Hoje, sr. presidente, vindo, por parte da commissão de agricultura, defender a auctorisação que o governo pede, não estou em contradicção com aquillo que defendi em janeiro relativamente á inopportunidade da admissão dos cereaes.

Com effeito as auctorisações todas são um objecto de opportunidade e de urgencia, e se são inuteis essas auctorisações, quando a necessidade publica não reclama essa admissão, ellas são uma medida preventiva, quando essa medida é reclamada pelos interesses publicos e da mesma agricultura. Quando o governo pediu aqui a auctorisação, a qual lhe foi concedida, o paiz estava ameaçado de um grande infortunio, porque se via que a estação promettia uma fraca colheita de cereaes, e annunciava uma grande carestia de alimentação.

Posteriormente as circumstancias mudaram, e a colheita que se annunciava pouco favoravel, apresenta um aspecto mais propicio; (Apoiados.) mas sobretudo a necessidade da admissão dos cereaes reclamada é tão sómente pelo estado da colheita, e ainda que o illustre deputado o sr. Dias de Azevedo linha dito que a colheita é abundantissima, todavia ella, pelas noticias que individualmente podemos ler a esse respeito, não passa de ser mediocre; por conseguinte ainda por esta parte não vem a tornar-se consideravel pelo estado em que se acham os assumptos na Europa, e pela necessidade que tem Portugal de se abastecer já nos portos do Mar Negro, da Africa e nos de Londres; se as circumstancias assás desgraçadas que se dão hoje na Europa continuarem, é pro

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vavel que não tenhamos meios de communicação para obter importação. (Apoiados.)

Sr. presidente, esta questão da admissão dos cereaes nem sempre e funesta á agricultura, é pelo contrario um meio para a sua prosperidade. Eu ouvi com estranheza da parte do illustre deputado, o sr. Dias de Azevedo, dizer que a agricultura em 1857 tinha soffrido um grande abalo pela admissão dos cereaes estrangeiros, e pelo baixo preço que tinham obtido os cereaes em Lisboa, obrigando as provincias a vir abastecer-se no mercado d’esta capital; a epocha, sr. presidente, não esta muito longe, as impressões ainda estão fortes d'esse anno de carestia, para que nós lenhamos esquecido tão facilmente os factos desgraçados que se deram: a agricultura não recolheu esse anno um grao de trigo, e tanto para a alimentação do povo, como para a semente teve que se fornecer do estrangeiro. (O sr. Dias de Azevedo: — Não é exacto.) É perfeitamente exacto; veja-se a importação que houve de trigo estrangeiro, compare-se a introducção nos depositos mensaes em Lisboa, e ver-se-ha que a maior parte do trigo estrangeiro foi consumido nas provincias, e foi uma grande fortuna para este paiz ter os portos abertos. (O sr. Dias de Azevedo: — Foi para a Hespanha.) Sr. presidente, eu sou de uma provincia essencialmente agricola, o trigo estava ao preço de 900 e 1$000 em Lisboa, e o preço na provincia era de 1$200 e 1$600; ora póde coadunar-se o dito do illustre deputado com esta barateza do preço da provincia? Nós sabemos que o preço medio dos cereaes no nosso paiz não vae alem de 400 e 500 réis, como póde combinar o illustre deputado, que a provincia tendo trigo ao preço ordinario de 400, 500 e 600 réis, só por 1$600 réis? Sr. presidente, longe de ser um argumento contra a admissão dos cereaes, eu vejo pelo contrario uma advertencia util. (Apoiados.)

Sr. presidente, logo que se sentiu e se annunciou este anno a colheita com um caracter menos bom, as reclamações chegaram das provincias, e foram as primeiras que reclamaram ao governo a necessidade da admissão dos cereaes, e principalmente o centeio, que apesar das melhoras que tem havido no tempo, é das colheitas mais pequenas; os centeios nas provincias do sul estão perdidos. (Apoiados.)

Sr. presidente, com respeito a que os depositos de trigo vão augmentando em Lisboa com esta introducção, felicito-me d’isso, porque isso tem sido um meio de que o genero não tivesse subido de preço: a crise alimenticia quando subsiste é motivo para fortes receios e desgraças no paiz, e a maior parte dos paizes estrangeiros trataram de se munir contra essa eventualidade; a França prohibiu a protecção aos cereaes; a Hespanha fez o mesmo, isto indica que a auctorisação que o governo pediu é util; e eu entendo que, mesmo sem auctorisação, quando a crise existe, o governo devia saltar por cima da lei e attender á salvação publica? (Apoiados.) logo é uma medida prudente e não inutil, póde ser preventiva, não é inutil.

Sr. presidente, eu tenho advogado aqui os interesses da agricultura, pertenço a essa commissão; para lá foi remettido um projecto de lei, que trata de fixar a admissão permanente dos cereaes estrangeiros; direi a v. ex.ª que uma das maiores fortunas que póde ler a agricultura, é que esta lei venha á camara, e seja discutida convenientemente, porque um dos maiores males que pésa pobre a agricultura é a incerteza. (Apoiados.) A agricultura não carece nos annos de abundancia de protecção alguma: póde affrontar com a producção estrangeira, e quando chega a carestia não ha nenhum systema protector que a ponha ao abrigo contra o arbitrio. Por isso eu entendo que isto que se chama systema protector de agricultura entre nós é uma illusão completa. (Apoiados.) Por isso a commissão de agricultura tomando este negocio a peito, tem na devida consideração a proposta que lhe foi apresentada pelo governo anterior e traia dar a esta proposta uma resolução de maneira que se respeitem os interesses da agricultura e os interesses dos povos, ou classes populares. Mas como ha um preconceito que é necessario destruir n’esta questão; como não basta que a lei sáia d'esta casa e tenha a sancção real, mas e necessario que seja bem aceita, entendeu por isso a commissão de agricultura, que devia procurar obter todos os esclarecimentos necessarios sobre qual o preço medio do preço do genero nos annos de maior carestia, e o preço medio quando ha abundancia, para ver se se póde combinar isso e propor-se uma lei que, sem que possa fazer mal á agricultura a concorrencia estrangeira, se abram os portos aos cereaes. A camara sabe que a commissão se constituiu em commissão de inquerito, e para este fim tem nomeado os seus delegados em cada provincia que estão trabalhando n’este negocio e espera essa commissão, se as circumstancias não mudarem, no principio da sessão proxima apresentar um parecer fundamentado, de modo que seja util e satisfaça a todos os interesses.

Sr. presidente, a commissão, sem deixar de reconhecer que as circumstancias tinham mudado desde a apresentação d’esta lei até ao momento em que este projecto se discute, em relação á nossa producção, não desconhece que inconvenientes podem vir e que no estado da Europa possa haver falta de cereaes, e então dadas estas circumstancias se não possa fornecer do estrangeiro; mas em quanto se póde aproveitar esta circumstancia bom é que se adopte esta medida, e que com alguns cereaes que venham do estrangeiro se possam fazer alguns depositos com que se possa affrontar qualquer carestia.

Sr. presidente, a questão do arroz foi considerada pelo governo, como objecto alimenticio que póde substituir em caso de necessidade os cereaes; e é um farto que o consummo do arroz augmenta quando ha carestia de cereaes: nós sabemos que a classe proletária substitue muito facilmente a sua alimentação com o arroz em logar de cereaes; mas a commissão leve em vista outro objecto, e foi por isso que incluiu com muito gosto o arroz no projecto da admissão dos cereaes. Esta camara tem por diversas vezes representado contra o cultivo de arroz, que é julgado, com bons ou maus fundamentos como altamente insalubre. (Uma voz: — Deixe isso.)

Sr. presidente, uma industria que é protegida com 400 réis em cem arrateis, o que vem a ser 15 por cento, parece-me que é bastante para o seu desenvolvimento e progresso, e isto dá-se, repito, em uma industria que é altamente insalubre, e eu entendo que as industrias que são insalubres e nocivas ao paiz, longe de se lhe dar uma protecção d’estas não devem existir.

Digo estas palavras unicamente, e concluo declarando que a commissão de agricultura com boas rasões entendeu que devia incluir o arroz no projecto da admissão dos cereaes, reservando-me apresentar uma emenda ao segundo artigo do projecto quando for occasião.

O sr. Ferreira de Mello: — Peço que a materia se julgue discutida.

Decidiu-se affirmativamente.

E pondo-se logo á votação o

Projecto na generalidade—foi approvado.

O sr. Barão das Lages: — Peço que se dispense o regimento para se passar á especialidade.

Resolveu-se que sim, e poz-se em discussão o

Artigo 1.°

O sr. J. F. Coelho do Amaral (sobre a ordem):: — Mando para a mesa um additamento ao artigo 1.°, para que sejam tambem ouvidas as commissões agricolas districtaes, porque são as mais competentes para conhecerem da necessidade relativa da introducção, e apreciar a influencia e alcance que a medida reflecte sobre as localidades. Os governadores civis não ouvem os administradores dos concelhos, ou se os ouvem, nem todos respondem, de modo que os governadores civis fiquem conhecedores da existencia dos depositos, e por isso é necessario que as commissões agricolas sejam ouvidas em rasão da sua competencia, visto que os seus membros são dos primeiros lavradores do districto. Tem-se visto aqui em alguma occasião clamar muito pela necessidade da introducção, quando os depositos de cereaes existentes nas provincias eram grandes, mas dos quaes não havia exacto conhecimento por parte do governo, porque os chefes dos districtos pela maior parte não tinham podido colher informações exactas, devido

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isso infelizmente no modo porque de ordinario as auctoridades subalternas fornecem os esclarecimentos que lhe são pedidos superiormente.

Portanto, eu entendo que as sociedades agricolas devem ser ouvidas, porque são as mais competentes para fornecerem esclarecimentos sobre as existencias; assim como para avaliarem a influencia que póde exercer em certas circumstancias sobre a agricultura a livre introducção dos cereaes estrangeiros.

ADDITAMENTO

E as commissões agricolas districtaes. = F. C. do Amaral. Foi admittido.

O sr. Ministro das Obras Publicas (Antonio de Serpa): Sr. presidente, eu posso asseverar ao illustre deputado, que acabou de fallar e que mandou para a mesa uma emenda, que já estava resolvida uma circular aos governadores civis para estes mandarem todos os esclarecimentos, consultando as associações agricolas onde ellas existem. Entretanto a camara votará como entender.

O sr. Thiago Horta (sobre a ordem): — Sr. presidente, parece-me que ha uma pequena contradicção entre o artigo 1.° e o 3.° O artigo 1.° diz assim. (Leu.)

Ora o arroz é um cereal. Se não ha alguma disposição no artigo para o arroz, convirá que se acrescentem as palavras = não comprehendendo o arroz. = Se a commissão não tiver duvida, então mando uma emenda de redacção.

É a seguinte

EMENDA

Depois da palavra cereaes se acrescente o seguinte = não comprehendendo o arroz. = Thiago Horta. Foi admittida.

O sr. Paulo Romeiro: — Sr. presidente, eu tinha pedido a palavra sobre a generalidade do projecto, mas infelizmente vim a ser uma das victimas do zêlo da cohorte dos illustres deputados que tomou á sua conta abafar as discussões, mesmo antes de ouvidas as opiniões dos primeiros oradores inscriptos. Bem andou o meu amigo o sr. ministro das obras publicas, antecipando-se a fazer uso da palavra. Se s. ex.ª se demora alguns minutos, o debate ter-se-ía encerrado sem que fosse ouvido o governo, que tem a iniciativa na proposta que se discute. (Apoiados.)

Sr. presidente, eu não recuso o meu voto á auctorisação que o governo pede. Parece-me um pouco largo o praso que se indica para a admissão. Em 13 de novembro esta concluida a colheita de»lodos os cereaes, e em toda a parte. O aspecto da proxima colheita não se póde dizer que seja mau. Pelo contrario, as ultimas chuvas reanimaram as esperanças de uma boa colheita, e se ella se realisar, é possivel que a competencia dos cereaes estrangeiros da nova colheita venham prejudicar consideravelmente os nossos productores. Entretanto eu receio pouco essa competencia na presença das circumstancias extraordinarias em que se acha a Europa. (Apoiados.) Por isso voto desassombradamente a auctorisação pedida, e não proponho restricção alguma para o uso d'ella. O governo, cuja responsabilidade se augmenta, com a investidura d'esta auctorisação, que ande com prudencia e acerto n'este negocio. É preciso attender convenientemente todos os interesses. (Apoiados.)

Mas o que eu não posso comprehender é a rasão por que se estabelece uma distincção entre o arroz e os outros cereaes. Tanto a commissão como o sr. ministro consideram o arroz como um cereal. Se o é, para que estabelecem em favor d'elle uma protecção que não concedem aos outros cereaes? Será porque a cultura do arroz é infecta e prejudicial ao paiz, considerada debaixo do ponto de vista economico, agricola e de salubridade? Pois deve proteger-se uma industria nociva á saude publica e acabar com toda a protecção á industria innocente de todos os outros cereaes? Como explicam o governo e a commissão esta contradicção?

Sr. presidente, o arroz é uma potencia que supplanta tudo n'este paiz. É um estado no estado. Zomba de todos os principios economicos, de todos os clamores dos povos, de todos os instinctos da humanidade, de todas as aspirações de progresso, zomba de tudo. (Apoiados.) Já aqui se disse que a cultura do arroz era trezentas mil vezes mais innocente do que todas as outras. Não carece de protecção para viver, por, que deixa lucros fabulosos, embora á custa de muitas vidas e de muita saude, mas por isso mesmo que não carece da protecção é que se protege escandalosamente. Isto é que é coherencia. Se carecesse de protecção, não se lhe dava. Estamos todos enfeudados ao arroz. Enfeudámos-lhe a nossa vida, a nossa saude e até a nossa bôca, porque quando se trata de conjurar uma crise alimenticia, admittimos livremente todos os cereaes, menos o arroz! Pois viva o arroz, em quanto elle não der cabo de todos nós; depois de nos malar a todos tambem elle ha de morrer. (Riso.)

O sr. Pinto Coelho (para um requerimento): Requeiro a v. ex.ª que consulte a camara sobre se quer discutir conjunctamente o artigo 1.° com o 3.°

Resolveu-se affirmativamente.

O sr. Meneses Pitta (sobre a ordem): Sr. presidente, pedi a palavra sobre a ordem para mandar para a mesa uma emenda ao final do artigo 1.°, aonde se diz. (Leu.) se diga. (Leu.)

Eu voto contra o artigo, mas não sei se será esta a occasião de pedir explicações ao sr. ministro das obras publicas; porque no caso contrario peço a palavra sobre a materia.

O sr. Presidente: — É melhor tomar a palavra sobre a materia para pedir essas explicações ao sr. ministro das obras publicas.

Leu-se logo na mesa a seguinte

PROPOSTA

Os governadores civis em conselho de districto. = Meneses Pitta.

Foi admittida.

O sr. Pinto Coelho: —...........................

Leu-se na mesa a seguinte

PROPOSTA

Fica o governo igualmente auctorisado para no caso do artigo 1.°, e precedendo audiencia das auctoridades e corporações n'esse artigo mencionadas, reduzir os direitos de importação no arroz, até 600 réis sobre o arroz descascado, e 400 réis sobre o arroz com casca. — Pinto Coelho — Telles de Vasconcellos.

Foi admittida.

O sr. Polido (sobre a ordem): — Como a camara resolveu que se discutissem conjunctamente os artigos 1.' e 3.° tenho a honra de mandar para a mesa por parte da commissão as seguintes

PROPOSTAS

Artigo 1.°

Depois da palavra cereaes se acrescente o seguinte = não comprehendendo o arroz. = Emenda ao artigo 3.°:

Desde a data da publicação d’esta lei até 30 de junho de 1860 ficam reduzidos a 400 réis por cem arrateis os direitos da importação sobre o arroz descascado estrangeiro, e 200 réis por cem arrateis os direitos sobre o mesmo arroz com casca. = Francisco Martins Polido. Foram admittidas.

O sr. Bartholomeu dos Martyres (sobre a ordem): — Sr. presidente, eu pedi a palavra para mandar uma proposta para a mesa que contém simplesmente a eliminação do artigo 3.° (Leu.)

Sr. presidente, quando li este projecto pareceu-me desde logo que todo o fim que se linha em vista estava preenchido pelos dois artigos 1.° e 2.° e que n’estes dois artigos estava toda a lei, porque encerravam, para assim dizer, todos os mandamentos do projecto; e por consequencia formei logo tenção, se acaso a discussão me não fizesse mudar de opinião, de propor a eliminação de todos os artigos desde o 3.º até ao fim.

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ficando só aquelles dois, 1.º e 2.° Quanto á materia do artigo

3. ° não tenho duvida, chegada a circumstancia de que o governo tenha necessidade de usar d'esta auctorisação, em a conceder; mas sempre que se dê essa necessidade e muito facil acudir a ella; porque o que e que se pretende pelo artigo 1.º e 2.° do projecto. É dar ao governo uma auctorisação para na ausencia do parlamento prover ás occorrencias que se apresentarem, segundo as quaes for necessario, decretar a admissão dos cereaes estrangeiros. Ora no artigo 1.º esta comprehendido o arroz, ou então seria preciso estabelecer no mesmo artigo uma disposição expressa de que o arroz se comprehendia debaixo da palavra cereaes, mas eu entendo que mesmo sem essa disposição, póde votar-se o artigo 1.° e approvar-se, porque approvando-se approva-se a introducção do arroz, todas as vezes que se der o caso das necessidades publicas reclamarem que seja admittido. E do mesmo modo que n'este artigo 1.º se comprehende o arroz tambem esta comprehendido o centeio, a respeito do qual não vejo rasão nenhuma para uma excepção, ou para que se formule um novo artigo.

Portanto, estando coherente com a minha proposta tudo o que se tem aqui dito a respeito da cultura do arroz, pois eu desejo que a cultura do arroz não continue do modo como esta actualmente tão prejudicial á salubridade publica, se o governo entender que é necessario usar da auctorisação para a introducção do centeio, se entender que ha conveniencia publica na introducção do arroz, quero que seja admittido com o mesmo favor de todos os outros cereaes, e que venha disputar o mesmo terreno que occupa qualquer outro genero que por esta auctorisação seja importado.

Ora ler o governo proposto esta medida, manifestando a sua opinião na proposta que fez, e ler a commissão de agricultura manifestado tambem a sua, favoravelmente á mesma proposta e por consequencia ligada desde já á idéa da introducção do arroz, é mais uma rasão por que eu não vejo necessidade de que se faça um artigo separado a respeito do arroz, devendo considerar-se comprehendido no artigo 1.°, porque é um dos generos que mais concorre para a alimentação das classes menos abastadas, e depois de dar-se o caso de os homens da sciencia e competentes das localidades lerem manifestado que a sua cultura é altamente prejudicial á saude publica.

Não digo mais nada por ora: quando se tratar do artigo

4. ° direi tambem alguma cousa. A minha opinião é facilitar-se a entrada do arroz com todos os cereaes; diminuindo, quanto possivel, por esta fórma o incitamento para a cultura do arroz, que tão damnosa se mostra á saude publica.

Mando para a mesa a seguinte

PROPOSTA

Proponho a eliminação do artigo 3.°== Bartholomeu dos Martyres.

Foi admittida.

O sr. Ministro das Obras Publicas (Antonio de Serpa): — Sr. presidente, a camara me permittirá de não entrar agora na questão de saber se o arroz e ou não cereal; nem me parece conveniente embaraçar-nos agora com a questão de redacção. Todos estâmos de accordo, e foi a idéa do governo e da commissão de que o primeiro artigo, dizendo respeito a cereaes, comprehendia o arroz; por consequencia, quanto á maneira de redigir, qual é a maneira de pôr o artigo mais claro, eu pediria ao meu nobre amigo o sr. deputado Thiago Horta, que fizesse favor de retirar a sua emenda para a apresentar á commissão de redacção, e tomar-se em consideraçao este assumpto na ultima redacção.

Eu pedi a palavra para responder ao nobre deputado o sr. Pinto Coelho, quando pareceu suppor que na apresentarão da medida para a livre introducção dos cereaes houve a idéa de resolver J outra questão differente, que era a questão do arroz, e que achava n'isto um meio indirecto menos franco e leal. Não houve tal idéa. A questão do arroz não se resolve com esta medida, assim como não se resolveu em 1856; resolve-se uma questão muito importante, que é a das subsistencias, no caso provavel de as necessidades publicas, falhas das circumstancias, o exigirem.

O nobre deputado diz que se a medida não é provisoria, porque se vem propor facultativa para o arroz, em quanto que se apresenta perceptiva a respeito de todos os cereaes? E disse mais que não ha crise agora, e que a questão é só para a crise. Mas o que é indubitavel, o de que ha todas as probabilidades, é de que este preço se conserve subido por algum tempo, se as circumstancias da Europa continuarem, embora os acontecimentos se passem a distancia um pouco grande. Pois se essas probabilidades de o preço das subsistencias se elevar existem, ha de o governo, que tem presente estas circumstancias, cruzar os braços? Não ha de propor uma medida sobre este objecto tão importante? (Apoiados.) Esta medida que produziu tão bons effeitos em 1856, que não prejudicou os lavradores, não podia o governo deixar hoje de a pedir.

Outro sr. deputado entende que o artigo 3.° devo ser eliminado ficando reduzida a auctorisação, quanto ao arroz, ao mesmo caso que a respectiva aos outros cereaes, admittindo-se o arroz tambem quando se julgar conveniente sem pagamento de direitos. Quer que o arroz como cereal fique collocado nas mesmas circumstancias dos outros cereaes. Mas o caso é differente. O arroz esteve sempre collocado em circumstancias muito diversas pela legislação que ha a tal respeito; e não me parece que por causa de uma melhor symetria se altere o que esta estabelecido a este respeito. É necessario attender a todos os interesses. Os proprietarios da cultura de arroz têem um grande direito protector a seu favor; ha um • meio termo a seguir n'este caso, e esse meio termo é a proposta do governo. Nós agora não tratâmos de discutir e resolver a questão do arroz; nem é occasião propria para isso, nem devemos tomar uma medida que possa ir aniquilar completamente direitos que são dignos de serem respeitados. Parece-me que o arbitrio proposto pelo governo satisfaz á necessidade imperiosa, e que ao mesmo tempo não vamos ferir nenhuma especie de interesse. Alem d'isso é preciso não adoptar uma medida que vá comprometter as receitas do estado é preciso prestar toda a attenção aos interesses da fazenda, e esses interesses serão prejudicados se acaso houver dispensa completa do pagamento de direitos do arroz; e não me parece que o thesouro publico esteja em estado de despresar os interesses que podem provir de um ramo de receita tão importante como a introducção d'este genero, introducção que ha muitos annos tem produzido uma receita consideravel, que ficará completamente aniquilada se o arroz estrangeiro entrar sem pagamento de direito, e que prejudica tambem os proprietarios da cultura do arroz. Mas não acontecerá nada d'isto se se proceder a este respeito como em 1856, que produziu receita para o thesouro sem prejuizo dos lavradores. Portanto não vejo motivo algum para equiparar o arroz aos outros cereaes. (Apoiados.)

Quanto ás reflexões apresentados pelo illustre deputado o sr. Bartholomeu dos Martyres relativamente ao centeio, devo dizer que o centeio é o unico cereal que não está admittido nos portos do sul do reino. O governo tem recebido das provincias participações da escassez e do alto preço d'este genero: estava auctorisado para permittir a sua entrada livre até ao fim do corrente mez; entretanto o governo por um lado entendeu que, na occasião que tinha de trazer ao parlamento a resolução da questão ácerca da crise alimenticia, não devia tomar uma medida por arbitrio seu, apesar de estar auctorisado para isso, e sim deixar ao corpo legislativo resolver um assumpto d'esta natureza.

Por outro lado lendo o governo, para decretar a admissão d'este genero, de consultar as auctoridades administrativas e apresentar essas consultas ao conselho geral de agricultura e commercio, isso levava talvez o mesmo tempo que levaria a discussão d'este assumpto nas duas casas do parlamento.

Foi esta a rasão por que o governo entendeu que devia inserir este genero no artigo; não prejudicando nada, antes pelo contrario sendo vantajoso que se declare desde já a livre entrada d'elle.

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Em vista das rasões que tenho exposto, estou convencido de que a camara bem fará em approvar o projecto proposto pelo governo com a emenda apresentada de accordo com o governo, pelo illustre relator da commissão o sr. Polido, emenda insignificante, emenda que por um lado torna mais claro o artigo, e por outro lado proroga um pouco mais o praso para a admissão do arroz.

E eu vou dizer á camara que contando o governo com apresentar na proxima sessão legislativa uma reforma das pautas, provavelmente n'essa epocha, que estava marcada no artigo do projecto da commissão, não estaria decidida a questão da reforma, e aconteceria pois que o arroz teria um direito pequeno até essa epocha, outro maior desde essa epocha até que estivesse decidida a questão da reforma das pautas, e outro depois d'essa reforma, na qual o direito de importação d'este genero lerá de ser diminuido; e não ha nada mais prejudicial, tanto ao commercio como aos consumidores, do que esta mudança ou alternativa constante nos direitos de qualquer genero. (Apoiados.)

Portanto o governo conforma-se plenamente com a emenda apresentada pelo illustre relator da commissão, porque provavelmente até á epocha marcada n'essa emenda, a reforma das pautas está decretada por lei.

O sr. Dias de Azevedo: — Sr. presidente, eu declarei, quando ha pouco fallei, que tinha confiança no actual sr. ministro das obras publicas, e declarei igualmente por essa occasião que votava a idéa do projecto; mas que não votava os artigos do projecto; e se eu fallasse segunda vez sobre a generalidade d'este projecto, ainda seria mais explicito e mostraria quaes as minhas idéas; mas agora resta-me simplesmente tratar da materia do 1.° e 3.º artigos que estão em discussão.

Sr. presidente, o sr. ministro das obras publicas disse, e acredito-o, que o meio da reducção proposta do imposto do arroz não é a restricção para a cultura do mesmo arroz; mas eu, sem ir mais longe, lerei parte do relatorio do sr. ministro das obras publicas, e por elle se verá que effectivamente o fim que s. ex.ª teve em vista na proposta que apresentou era para restringir a cultura do arroz. (Apoiados.) Diz s. ex.ª no fim do seu relatorio o seguinte: «Em quanto uma medida definitiva sobre pautas não é submettida pelo governo á vossa consideração, esta medida parcial e temporaria, de accordo com os principios economicos que devem dirigir um trabalho de lai natureza, vem occorrer á urgencia das actuaes circumstancias, e serve ao mesmo tempo de meio indirecto para obviar aos inconvenientes da extensão de uma cultura, que em terrenos pouco proprios e sem as necessarias cautelas póde affectar a salubridade das populações.

Por consequencia s. ex.ª declarou ha pouco que a sua proposta não é para restringir a cultura do arroz, mas effectivamente as palavras do seu relatorio indicam que a proposta é uma restricção á cultura do arroz. (Apoiados.) Sr. presidente uma de duas, ou o governo com a prevenção que é mister, entende que é conveniente achar-se munido d'esta auctorisação para em dadas circumstancias decretar a livre entrada dos cereaes ou não? Se entende, como s. ex.ª ha pouco declarou, que o arroz se comprehende na palavra cereal, entendo então que a medida deve ser ampla e deve ser franca. Se as circumstancias forem taes que para a introducção dos generos alimenticios seja necessario o governo providenciar na conformidade d'esta auctorisação, eu desejo então que o arroz seja comprehendido com os outros cereaes, e que não seja só o arroz, que seja tambem o centeio, o milho, o trigo e cevada, emfim lodosos legumes e farinhas, ele. Por consequencia eu entendo a necessidade que ha de que o governo fique auctorisado para a admissão dos cereaes, mas entendo ao mesmo tempo que a medida encoberta que se vota aqui n'este projecto não convem de maneira alguma, e muito embora s. ex.ª nos diga que não se traia d'isso, pois que as suas palavras de agora estão em contradicção com as expressões do seu relatorio.

Eu entendo que não podemos por este meio restringir a cultura do arroz. Não entro agora na conveniencia ou inconveniencia da cultura do arroz, é objecto que não se trata agora, quando se tratar, eu apresentarei as minhas idéas e mostrarei aos illustres deputados por Leiria e Béja, que não sou protector da cultura do arroz. Mas entendo, e é minha convicção, que devemos proteger todas as culturas que forem uteis ao paiz: esta póde ser util, a questão é de localidade e modo de fazer essa cultura, quando pois se tratar d’essa questão em presença dos esclarecimentos que o governo nos apresentar então desenvolverei as minhas idéas ácerca d'esta importante e grave questão.

Eu entendo, pois, que esta lei deve reduzir-se ao artigo 1.°, pois que este artigo como esta redigido, acrescentando-lhe a indicação do praso até 13 de novembro, comprehendendo todos Os cereaes e acrescentando-se que sejam ouvidas as associações agricolas districtaes, esta preenchido o fim da lei, e o governo fica perfeitamente auctorisado para poder, se as circumstancias assim o exigirem, decretar a admissão dos cereaes e prover á crise alimenticia que porventura se possa apresentar. Eu confio tanto na probidade, dignidade e sensatez do actual sr. ministro das obras publicas, que estou certissimo que não ha de abusar de maneira alguma d'esta auctorisação, e por isso não estabeleço condição nenhuma para o desempenho d'esta auctorisação, e estou certo de que não ha de abusar de maneira nenhuma, por isso escuso de lhe fazer recommendação alguma; isto é, o governo fica auctorisado até ao dia 15 de novembro para poder dar entrada livre a todos os cereaes que julgar necessarios, ouvidas as auctoridades competentes, centre estas, as associações agricolas. Eis-aqui o que eu tenho a dizer sobre este objecto.

O sr. Pinto Martins: — Peço a v. ex.ª que consulte a camara sobre se a materia está discutida.

Julgou-se discutida.

O sr. Horta: — Como a minha proposta é uma emenda de redacção unicamente, se se entende que se approva o artigo salva a redacção, peço licença para retirar a proposta.

Foi-lhe permittido retira-la.

E pondo-se logo á votação o Artigo 1.°— foi approvado.

Additamento do sr. Menezes Pitta—approvado.

Additamento do sr. Coelho do Amaral — não houve vencimento.

Eliminação do artigo 3.º—rejeitada. Substituição a esse artigo proposta pela commissão — approvada.

O sr. Presidente: — Eu devo uma justificação ao illustre deputado por Vizeu, que estranhou que eu lhe não désse a palavra para explicação. Não lh'a dei, nem lh'a podia dar senão no fim. Eu tenho lido este artigo do regimento muitas vezes. (Leu.)

É o que eu tenho feito sempre, concedo-a no fim aos srs. deputados que têem fallado sobre a materia, e quando não lèem fallado na discussão, consulto a camara.

O sr. Dias de Azevedo: — Tomo nota do que v. ex.ª me diz.

O sr. Ministro do Reino (Fontes Pereira de Mello): — Mando para a mesa uma proposta de lei, estabelecendo algumas modificações na lei de 23 de junho de 1855 sobre o recrutamento para o exercito, e peço licença para a não ler, por não tomar tempo á camara, visto que ha de ser impressa no Diario do Governo.

O sr. Presidente: — A resolução da camara é para que as propostas de lei apresentadas pelos srs. ministros, possam ou não ser lidas por elles, mas devem ser lidas sempre na mesa; entretanto eu consulto a camara se quer dispensar esta leitura. (Apoiados.)

A camara dispensou a leitura na mesa, e foi remettida ás commissões reunidas de administração publica e de guerra.

Passou-se ao

Artigo 2.º

O sr. Dias de Azevedo: — Sr. presidente, eu lamento a precipitação com que se quer fazer tudo, declaro ingenuamente que não é d'esta maneira que se fazem leis, e que el-

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las podem ter o criterio que devem ter, nunca foi assim nem ha de ser; é uma cousa nova. (Apoiados.) Apresenta-se uma proposta da commissão que altera o pensamento do projecto que essa mesma commissão elabora, e apenas é lido e admittido á discussão, julga-se discutido, sem sobre essa proposta se dizer uma palavra! Altera-se o praso de 15 de novembro de 1859 para 30 de junho de 1860 e não se discute uma tal alteração!

É uma maneira notavel o modo por que esta discussão correu, e eu não posso deixar de declarar que votei que a materia não estava discutida, e desejo que este meu voto fique registado.

Entrando na discussão do artigo 2.° eu considero este artigo desnecessario desde que se declarou que era livre a entrada do arroz até 1860, é escusado ir aqui esta disposição, e deixemo-nos de estar a enganar o pobre lavrador, é melhor dizer por uma vez, fica livre ao governo permittir a introducção de cereaes quando e como quizer! Voto contra o artigo stygmatisando o systema adoptado de se fecharem as discussões antes de começadas; não é para isto por certo que nós recebemos um diploma, e que somos considerados representantes do paiz, porque os povos dirão que nós vimos aqui unicamente para salvar a responsabilidade ministerial, e votar ao governo quanto elle entende que lhe é necessario, sem nos importarmos senão com a vontade dos srs. ministros.

Temos deveres mais elevados, e não devemos assim descer da nossa posição. Nenhum dos meus collegas respeita mais os srs. ministros, tanto os actuaes, entre os quaes conto amigos particulares e de muitos annos, como os anteriores e todos que com esse caracter se sentarem naquellas cadeiras; mas por isso mesmo que os respeito e desejo que façam a fortuna do paiz, devo dizer-lhes sempre e com franqueza o que a minha experiencia e a minha consciencia me dictar: voto como já disse contra o artigo 2.º por desnecessario.

O sr. José Estevão: — Sr. presidente, eu não sei se a camara está confusa e baralhada, eu estou-o, e preciso portanto que me ajudem a ordenar o meu espirito para poder votar.

Parece-me que discutimos e votámos o artigo 3.º antes do 2.º (Apoiados.) Isto é um peccado mortal.

O sr. Presidente: — Foi por decisão da camara.

O Orador: — Bem sei, mas isso não quer dizer que a camara não possa tambem peccar mortalmente. (Apoiados.) Mas parece-me que é uma venialidade pelo menos contra a ordem regular. Emfim, está feito.

Talvez o artigo 2.° que vem aqui não se referisse senão ao artigo 1.°, mas como votámos o 1.° e 3.°, as disposições do 2.° dizem já respeito á materia do 1.° e 3.°

Vozes: — Nada, nada.

O Orador: — Não, porque os desorganisadores têem a faculdade de explicarem até que ponto desorganisaram, mas o que eu vejo é, que se diz respeito ao artigo 3.°, está claro que estamos em uma posição, não digo arriscada, mas um pouco difficil, porque já votámos um praso diverso do de 15 de novembro, e não podemos ir invalidar esta disposição com o artigo 2.°', porque nós que tinhamos dito até 15 de novembro, agora alargámos esta medida até 30 de junho, por consequencia já não podemos dizer no artigo 2.° «As medidas que o governo julgar conveniente tomar em virtude do artigo antecedente, vigorarão até ao dia 15 de novembro do corrente anno.» porque já se votou que vigorassem até 30 de junho do anno seguinte, quer dizer mais sete mezes e meio.

Portanto o que eu quero é ordenar d'aqui por diante o caracter da lei, a historia da lei, o motivo por que se deu esta disposição permanente mettida n'uma lei de simples auctorisação. Isto significa que se quiz aproveitar a occasião para fazer o que se não podia fazer assim, salva a opinião de um estadista, que já aqui foi apresentada, que era usar de uma armadilha legislativa para suffocar estes interesses.

Eu refiro-me a factos e não a pessoas. Esta idéa foi aqui emittida no tempo do ministerio passado por um dos mais distinctos membros d'elle, que não sei se esteve para soffrer um desastre desagradavel que nós todos lamentaríamos, e que é a sorte de quem se colloca em situações arriscadas, (Risadas.) e como premio de ler sustentado esta doutrina deshumana contra os pobres cultores que em boa fé julgaram que faziam um acto de utilidade para si e para o publico agricultando umas terras que antes do seu trabalho eram muito mais infestas a saude publica sem dar utilidade alguma e nenhum contingente para a nutrição.

O facto da camara resolver incidentemente uma questão grave e séria e historicamente grave e serio porque resume, compendeia o governo do estado entre nós. Não fallo de nenhum ministro, nem de nenhum governo; fallo de todos nós que não podemos conseguir resolver negocio algum serio sem ser por este modo, sem ser sempre debaixo de impressões temerosas. Que estatistica temos nós do rendimento d'esta producção que tem rendido tudo para os particulares e nada para o estado? Havia terras que não rendiam cousa alguma, mas que centuplicaram de rendimento, que tornaram os seus possuidores homens ricos e abastados; foram porventura os impostos elevados á proporção d'essa renda? Não, senhor; o proprietario que tinha uma terra que não rendia cousa alguma, mas que depois de cultivada rende 200$000, ficou pagando a mesma quota de contribuição. Acontece isto, porque a decima é fatal, é infallivelmente posta a mesma somma todos os annos, quer o homem seja rico, quer seja pobre. O que faria todo o governo vendo levantar-se uma industria nova, pouco dispendiosa e que devia augmentar a renda publica, era examinar quanto ao estado pertencia receber; mas d'isto não se cogita, grita-se que a salubridade publica soffre com esta industria, e acaba-se com esta fonte de receita. E como isto tem uma certa resistencia, tratado como se devem tratar os negocios publicos, aproveita-se a primeira occasião, e por um modo indirecto e incidentemente dá-se de garrote n'essa industria. Ora isto é contra os meus principios, é contra o caracter d’este systema, não me agrada, nunca o fiz, nem creio que farei, nem creio que isto é ser estadista, é mesmo o contrario de estadista, é uma giria, e uma giria creio que é uma cousa opposta á seriedade e á gravidade.

Eu fallo em geral, sem me referira cousa nenhuma, e abstrahindo completamente de pessoas. A questão esta resolvida, mas o que é preciso é que depois de termos feito uma lei pouco leal, parece-me, não façamos uma lei obscura, não deixemos passar por a letra da lei a pouca lealdade do nosso espirito; já que a intenção não foi pura, ao menos a redacção não seja obscura. Portanto o que me parece é que o artigo 2.° devia ser supprimido; não sei, os desordenadores que expliquem a sua desordem.

O sr. Ministro das Obras Publicas (Antonio de Serpa): — Sr. presidente, eu já expliquei a rasão por que o governo tinha convindo na prorogação do praso para a entrada do arroz com o direito reduzido, e se o sr. José Estevão tivesse n'essa occasião ouvido as minhas palavras, provavelmente não acharia lauta estranheza n'esta differença de prasos...

O sr. José Estevão: — De quem me queixo é do sr. Polido, que é padre mestre n’estas cousas.

O Orador: — Eu disse que se ficasse unicamente até 15 de novembro o direito reduzido do arroz, não sendo natural que n’essa epocha tivesse já sido approvada a reforma da pauta que o governo tenciona propor, aconteceria que até 15 de novembro haveria um direito bastante reduzido, depois de 15 de novembro tornava-se outra vez ao direito da pauta, e depois ao direito estabelecido na nova reforma. Ora a dizer a verdade não ha nada mais prejudicial para o commercio, nem mais prejudicial em geral para a sociedade, que esta alternativa continuada de direitos; (Apoiados.) foi por isso que entendi que um periodo maior em relação ao arroz era conveniente, o que mio acontece com os cereaes, porque não se davam as mesmas circumstancias; a respeito d’elles a legislação é completamente differente.

Sr. presidente, eu torno a insistir em que n’esta occasião não se trata, nem se póde resolver definitivamente a questão do arroz. Torno a lembrar que em 1856 se adoptou esta mesma medida. Eu respeito muito os interesses de todos os proprietarios, mas respeito mais as necessidades publicas, as ne-

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cessidades de todas as classes, mas principalmente das classes mais numerosas e menos abastadas. (Apoiados.) Em 1856 houve esta mesma reducção de direitos, os lavradores não foram prejudicados, e as classes numerosas entendo eu que foram muito favorecidas. Portanto, entendo que a medida que acaba de votar a camara não prejudica os interesses que parece apprehender-se que serão prejudicados, e ao mesmo tempo e uma medida conveniente e favoravel ás circumstancias em que nos achâmos, e em que nos acharemos ainda por mais tempo, se acaso a Europa continuar nas complicações que hoje se antevêem em regiões afastadas de nós, mas cujas consequencias economicas reflectem seguramente entre nós, como e natural em occasiões de conflictos d'esta ordem.

Em relação ao artigo em discussão, creio que não foi ainda atacado, por consequencia a respeito d'elle não direi nada.

O sr. Lobo d'Avila: —............................

O sr. Presidente: — Eu já disse que os artigos 1.° e 3.º se discutiam conjunctamente, segundo uma resolução da camara: a mesa não tem nada com isso.

Leu-se logo na mesa a seguinte

PROPOSTA

Proponho que no artigo 2.° se diga = até 30 de junho de 1860 = em vez de se dizer = até 15 de novembro do presente anno. — Lobo d'Avila.

Foi admittida.

O sr. Xavier da Silva: — Mando para a mesa alguns pareceres da commissão de fazenda, entre elles vae o das pensões.

O sr. Carlos Bento: — Sr. presidente, eu devo declarar que realmente estou n'uma posição difficil, porque divirjo da opinião de alguns srs. deputados, e entendo que elles teem rasão: eu me explico. Eu entendo que se o debate podesse offerecer campo á manifestação das opiniões, seria facil combater as rasões dos illustres deputados; agora acho-me n'uma posição difficil. Eu votei por que não estava sufficientemente discutido o artigo 1.° e 3.°, que estavam em discussão, e confesso a deficiencia da minha intelligencia, porque não via motivo para serem discutidos conjunctamente, quando a respeito d'elles ha disposições inteiramente diversas. (Apoiados./ É preciso respeitar as decisões da camara, e ninguem as respeita mais do que eu. Comprehendo bem que depois de uma tão longa duração da sessão, e na presença de lhe pôr termo, a camara julgue necessario poupar tempo; mas o que eu não admitto, e que nenhuma camara possa fazer, é que por falla de tempo se discutam de repente questões importantes, e que se mostre o elemento da brevidade, como o mais efficaz para se decidirem assumptos da maior gravidade. O que eu disse nas cadeiras do ministerio, digo-o n'estes bancos: eu votarei ao meu amigo o sr. Antonio de Serpa todas as auctorisações que pedir, porque entendo que é ser governamental votar auctorisações d'esta natureza; (Apoiados.) e eu seria completamente homem systematico nas minhas idéas de opposição ao governo, se por acaso na presença de uma escassez de fome, negasse ao governo os meios necessarios para a introducção dos cereaes; (Apoiados.) eu entristeceria, se por acaso, na presença de uma penuria, de escassez de cereaes, não votasse ao governo a admissão dos cereaes, quando essa penuria e essa escassez a tornassem indispensavel, e declaro por esta occasião, que não ha de ser nunca da minha parte que ha de vir a menor desconfiança, quanto á introducção dos cereaes, a respeito do caracter do nobre ministro. (Apoiados.)

Sr. presidente, eu votei por este projecto porque o governo o apresentou, nem entendo que faço injuria aos illustres deputados que pensam em sentido contrario; quando votei que não é preciso ouvir as auctoridades em conselho de districto; nem votei que fossem ouvidas as sociedades agricolas porque entendo que em occasião de salvação publica o governo é o unico responsavel; não se lhe deve tolher a marcha; a responsabilidade do governo é tanto maior, quanto mais amplo for o voto de confiança. Mas n'este ponto todos têem confiança no ministerio. A salvação publica, repito, sobretudo, e se não fosse assim podiam, sem inconveniente, estar vagas as cadeiras do governo. Eu bem sei, sr. presidente, que o artigo 3.º não está em discussão, mas tem-se alludido a elle, e os fados lêem sido mais fortes do que o direito; tem-se discutido este artigo depois de se dizer que o voto linha concluido esta discussão.

Eu não sou suspeito n'esta questão; eu reajo contra ler-se fechado o debate, e fallei no sentido da maioria d'esta camara.

Sr. presidente, eu tanto julguei que o assumpto não estava discutido, e tanto n'isto ia de accordo com a opinião da camara, que um illustre deputado da maioria disse que a materia linha sido julgada discutida por giria e por armadilha. Note-se bem, a camara entendeu que estava habilitada para não ouvir mais ninguem, e depois de assim o ler declarado, disse-se que era uma giria e uma armadilha.

Mas permitta-me o meu nobre amigo o sr. ministro das obras publicas que eu tome n'este ponto a sua posição. Pois a linguagem do governo no relatorio que precedeu esta proposta, não se defende? Pois que diz o governo? Diz o seguinte. (Leu.)

Isto envergonha o governo? O governo póde envergonhar-se de apresentar esta linguagem? Entendo que não, e sustento que a occasião de votar este projecto não é a occasião de proteger ou combater industrias que senão reputam vantajosas para o paiz. Mas não confundamos. A quem disse que se não respeitam os direitos da propriedade e que se vae atacar uma industria legalmente estabelecida, peço perdão para observar que não apreciou verdadeiramente a medida como ella é. Não é d'isso que se trata, não se trata de atacar uma industria, trata-se de saber se se ha de dar protecção, se se hão de dar 300 e 400 por cento de protecção a uma industria que um illustre deputado, que acabou de fallar, disse que tem feito centuplicar a fortuna dos proprietarios. Isto disse-o o illustre deputado, e eu acho que não se podia apresentar argumento mais forte para votar a proposta. (Apoiados.)

Sr. presidente, estes dois artigos são differentes e não e por minha culpa que foram discutidos juntamente; não é por minha culpa que os illustres deputados mandam propostas para a mesa, quando confundem dois artigos totalmente differentes.

Sr. presidente; um illustre deputado mandou uma proposta para a mesa para que a livre admissão de cereaes tivesse logar até 1860, conforme se havia estabelecido para o arroz. Mas como póde haver analogia entre disposições tão diversas? Em primeiro logar determina-se a entrada para o arroz desde já, e para os cereaes determina-se que entrem só quando se der escassez; portanto, a analogia pecca pela base e não póde estabelecer-se, porque ha uma differença absoluta entre estes dois artigos.

Eu peço ao illustre ministro das obras publicas que me permitta dizer em defeza da sua proposta que a questão, come se apresenta, não é uma e a mesma cousa, em relação aos cereaes e ao arroz, porque n'um raso tratou-se de permittir a entrada dos cereaes, tirando-lhe a protecção que elles tinham, e no outro tratou-se do estabelecimento de um meio fiscal. O sr. ministro já o declarou, e isto é uma differença muito grande.

Eu li ha pouco tempo um economista muito distincto, e diz elle que em cereaes não se podem comprehender direitos protectores senão quando a escassez do genero determina que esses direitos tenham logar.

Mas será o genero de que se trata absolutamente necessario para a subsistencia publica? Entendo que não. Não haverá no paiz, note-se bem, uma industria que possa fazer face a esta? Entendo que sim, e os illustres deputados que querem que o arroz fique no mesmo caso de todos os outros cereaes, e que acham contradicção nos seus adversarios, tambem incorrem n'ella. Em primeiro logar faz-se uma lei permanente dê cereaes, propriamente dita? Não. (E eu entendo que é necessario votar uma lei permanente de cereaes; n'este ponto creio que o illustre ministro das obras publicas está de accordo.) Mas então que ha de inconveniente n'isto?

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Mas diz-se = que se acaso a cultura do arroz é productiva, está claro que a protecção a essa industria é necessaria =; e eu digo mais, que a cultura e tanto mais proveitosa quanto melhores são as condições em que é feita: quanto menos insalubre ella é, tanto mais proveitosa para o proprietario, porque ha mais facilidade de obter operarios que n'ellas trabalhem. O sr. dr. Beirão, na sua memoria ácerca dos arrozaes, declarou que esta cultura, apesar do insalubre d'ella, faz conta aos operarios, porque os proprietarios augmentam os salarios na proporção da insalubridade. Portanto, quanto menos protecção houver tanto melhor: é necessario que a cultura fique nas circumstancias que deve ficar.

Sr. presidente, eu concluo dizendo que voto contra as propostas apresentadas, voto pelo artigo 2.°, votei os artigos 1.º e 3.º e votei tambem que a materia não estava sufficientemente discutida.

(O sr. deputado não reviu este discurso.)

O sr. Ministro das Obras Publicas (Antonio de Serpa): — Sr. presidente, eu não discutirei o que já está discutido, e acho mesmo que isso é inconveniente: no entretanto, ouvi dizer: «Discute-se a materia discutida, porque ella não estava na realidade discutida e sufficientemente. »

Ha duas questões: a questão que tem sido discutida ultimamente, que foi a materia que se votou, a questão de expediente, e a que tem sido discutida depois, a questão permanente, a questão de salubridade, e essa não se discute de uma maneira definitiva: embora esta medida de expediente minore um pouco os inconvenientes da cultura do arroz nos terrenos em que não é feita com as precauções convenientes, esta questão não esta completamente resolvida.

Portanto, esta questão, que tem aqui apparecido de novo, não foi a que se votou, e por conseguinte não se diga que renasce, porque não estava discutida. Eu entendo que a questão de expediente estava discutida, porque a camara está de accordo a respeito das medidas que faziam objecto d'estes artigos, assim como esta de accordo na generalidade do projecto. Mas eu não posso deixar de dizer duas palavras em defeza da commissão, porque me parece que foi muito aggredida pelo illustre deputado o sr. Lobo d'Avila, e que não andou tão precipitadamente como ao illustre deputado se lhe afigurou.

O praso proposto pela commissão na sua substituição era o praso que o governo linha marcado: o governo explicou á commissão os motivos que leve para propor esse praso. Mas como me parece que não fui ouvido por alguns illustres deputados, devido á confusão que havia quando fallei, tratarei ainda de dizer alguma cousa a esse respeito.

Eu tratei de apresentar os inconvenientes que ha em marcar um direito até 5 de novembro antes de se discutir aqui uma reforma das pautas, para n'essa epocha se voltar ao direito da pauta actual que é um direito elevado, e depois haver de ser reduzido ao que se marcar na nova pauta; e é claro que d'aqui haviam de resultar inconvenientes para o commercio e em geral para o consumidor; sendo por isso que concordei em que se inserisse no projecto esta disposição depois de ler combinado com a commissão. E torno a repetir para aqui o que disse ha pouco: que não se dá rasão de symetria; que não ha inconveniencia ou inconsequência em se marcar para a admissão do arroz um praso, e para a admissão dos cereaes outro praso; porque são cousas muito differentes. ]Não ha incoherencia, por isso mesmo que as medidas são de diversa natureza: para um caso é uma medida perceptiva, e para o outro é uma medida facultativa. Acho muito mau e é um pouco contra os principios constitucionaes que se esteja a investir o governo de auctorisações durante o tempo em que esta aberto o parlamento; ora o parlamento abre-se a 4 de novembro, e se houver uma grande infelicidade, o tempo que vae de 4 a 15 é muito sufficiente para o governo apresentar uma nova proposta de auctorisação e a camara resolve-la. Parece-me que esta sufficientemente explicada a rasão dos dois periodos; um para a medida que é perceptiva e o outro para a medida que é facultativa, que é apenas uma auctorisação. Em quanto á maneira de encarar a questão do arroz, attendendo aos inconvenientes da sua cultura, e á desvantagem de n'uma auctorisação apresentar esta medida, eu na verdade fui prevenido pelo illustre deputado e meu amigo o sr. Carlos Bento, a quem agradeço, não só a benevolencia, mas o calor que tomou n'esta discussão. Acho-me completamente de accordo com s. ex.ª; e tanto me tenho sempre achado que no anno passado, apresentando o governo uma auctorisação analogo a esta, fiz todos os esforços por trazer á camara esta medida, e a faze-la passar. O que é certo é que não o consegui, tive de ceder (e cedo quando julgo que isso é util), até vir a medida que foi adoptada e que infelizmente não foi posta em execução. Mas a proposta que então fazia como deputado era a mesma que faro agora como governo.

O sr. Rebello da Silva (para um requerimento): —Requeiro a v. ex.ª que consulte a camara se dispensa ámanhã que haja commissões para se continuar na discussão do projecto n.° 111 sobre instrucção publica.

O sr. Pinto Coelho: —.........................

Leu-se na mesa a seguinte

PROPOSTA

Fica o governo auctorisado a encurtar os prasos designados nos artigos 1.° e 3.° se a crise alimenticia cessar antes de findos esses prasos. = Pinto Coelho.

Foi admittida.

O sr. Presidente: — Vae votar-se um requerimento do sr. Rebello da Silva para que ámanhã não haja commissões, e se continue na discussão do projecto n.° 111 para a organisação da secretaria do ministerio do reino.

Pião houve vencimento.

O sr. José Estevão: — Precisamos de uma declaração da parte do sr. ministro. Ámanhã é dia de despacho, e não sabemos se s. ex.ª poderá vir assistir a sessão.

O sr. Ministro do Reino: — Posso estar presente.

O sr. Presidente: — Agora vou propor á camara o requerimento do sr. Rebello da Silva, com prejuizo d'esta discussão.

Vozes: — Com prejuizo d'esta discussão!

O sr. Ministro das Obras Publicas (Antonio de Serpa): — Talvez uma explicação da minha parte conduza a uma votação rasoavel. Amanhã não posso estar presente, e pode-o estar o sr. ministro do reino. É esta uma das rasões por que o governo deseja que se discuta antes o objecto que se póde discutir.

O sr. José Estevão: — Peço que se rectifique a votação.! Foi approvado o requerimento do sr. Rebello da Silva. O sr. Sant’Anna e Vasconcellos (para um requerimento): —

Requeiro que depois de ámanhã se entre na discussão da lei eleitoral.

O sr. José Estevão: — Proponho que haja sessões nocturnas para se discutir a lei eleitoral.

O sr. Presidente: — Eu vou propor á votação o requerimento do sr. Sant’Anna e depois o do sr. José Estevão.

O sr. José Estevão: — Eu proponho que v. ex.ª ponha á votação a proposta do sr. Xavier da Silva.

O sr. Presidente: — A proposta do sr. Xavier da Silva ficou para se decidir ámanhã.

O sr. José Estevão: — Eu faço minha esta proposta, portanto requeiro a sua votação.

O sr. Telles de Vasconcellos: — Requeiro que v. ex.ª consulte a camara se quer votar sobre a moção do sr. Xavier da Silva.

O sr. secretario Miguel Osorio: — Essa proposta foi admittida á discussão, esteve em discussão e não houve vencimento.

O sr. Presidente: — E verdade que não obteve vencimento, e quando a quiz sujeitar a nova votação, já tinha dado a hora para se passar á ordem do dia.

O sr. José Estevão: — Mas eu proponho que se ponha á votação esta proposta e faço-a minha.

O sr. Telles de Vasconcellos: — Pedi a palavra, e não estou disposto a ceder d'ella, ficando-se na certeza, que em

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quanto eu estiver n'esta casa hei de pugnar pelos meus direitos, para os fazer valer sempre, não respeitando senão as decisões da camara e as leis e o regimento, para me insurgir contra toda e qualquer deliberação da mesa quando arbitraria e contraria ao mesmo regimento.

Eu, sr. presidente, não voto a proposta porque seja assignada pelo sr. José Estevão ou pelo sr. Xavier da Silva, porque o ser assignada por um ou por outro tem para mim o mesmo valor, voto-a porque quero como todos querem a discussão da lei eleitoral; (Apoiados.) mas é necessario rectificarem-se os factos e dizer-se sempre e francamente a verdade, a proposta do sr. Xavier da Silva foi admittida á discussão antes da ordem do dia, (Apoiados.) e tanto isto foi verdade, que o sr. João de Mello pediu a palavra e apresentou uma outra proposta differente, julgando-se com esta prejudicada aquella sem votação da camara. Eu não sei nem mesmo pretendo saber o motivo por que assim se procedeu, bem ao contrario hei de subtrahir-me ao conhecimento das rasões que conduziram a taes resoluções da parte da mesa, porque o conhecimento d'ellas me havia por certo de incommodar immenso.

Ouvi dizer a um meu illustre collega que se senta no lado esquerdo d'esta casa: «Já não quereis lei eleitoral.» Mas peço licença para observar ao nobre deputado, que todos querem a lei eleitoral; (Apoiados.) quando eu era opposição pedi, instei juntamente com os meus collegas pela discussão da lei eleitoral, e tanto hoje nos anima o mesmo sentimento, que temos vindo constantemente pedir sessões nocturnas para a discussão da lei eleitoral. (Vozes: — É verdade.) O governo quer lei eleitoral, (Apoiados do ministerio.) os seus amigos querem lei eleitoral; (Apoiados.) e se a discussão da lei eleitoral foi protrahida por assumptos não menos momentosos na occasião, isso não quer significar que o governo ou a maioria se eximam da discussão da lei eleitoral.

Eu não só estou prompto a votar por uma sessão nocturna, mas por todas as precisas, ainda para discutirmos outros projectos que não sejam lei eleitoral, mas é necessario sobretudo que se não alterem os factos, porque eu desejo que fóra d'esta casa se tenha conhecimento dos factos como elles se passaram; o paiz tem direito a aprecia-los, e cumpre-nos ser exactos, para poder ser verdadeiro o juizo na apreciação que o publico fizer do que tem logar n’este recinto. (Apoiados.)

O sr. F. Coelho do Amaral: — Requeiro a v. ex.ª que consulte a camara se a materia da proposta está discutida, visto que todos estâmos de accordo.

Julgou-se discutida.

E pondo-se á votação a

Proposta dos srs. Xavier da Silva e José Estevão—foi approvada.

O sr. Presidente: — Em virtude da resolução da camara, ámanhã deve haver sessão nocturna. Continua a discussão.

O sr. Ministro das Obras Publicas (Antonio de Serpa): — Sinlo, sr. presidente, ver sempre apparecer esta idéa, de que o governo ou alguem quer n'esta occasião, e a proposito de cereaes, tomar uma medida definitiva sobre os arrozaes. Não repetirei mais o que tenho dito, porque isso seria cansar a camara, e unicamente affirmo que não é nem foi essa a idéa do governo.

Tambem me parece que foi menos exacto o sr. Pinto Coelho quando attribuiu ao governo uma certa mobilidade de idéas sobre esta materia, quando o governo não mudou de idéas, e tem estado constantemente com a mesma idéa. Ora o governo propoz o praso de 30 de junho, e sendo convidado pela illustre commissão para uma pequena mudança de redacção em quanto ao artigo 1.° accedeu; porém a respeito d'este não foi consultado, nem as commissões tem obrigação de consultar sempre o governo, porque certos objectos ha em que se não da essa necessidade, e esta alteração é tão pequena que me parece não vale a pena da discussão que tem havido. Mas o facto é este: chegando á camara vi a alteração que se linha proposto, e ouvindo os membros da commissão, expliquei á camara os motivos porque o governo linha aceitado aquella idéa; portanto da parte do ministerio não ha mudança de idéa, e da parte da commissão ha apenas uma pequena mudança de redacção.

O illustre deputado o sr. Pinto Coelho quer que o governo fique auctorisado a encurtar os prasos marcados para a introducção de todos os cereaes, se a crise alimenticia cessar antes de findos esses prasos. Se a camara quizer votar essa auctorisação ao governo, o governo aceita-a, e usará d'ella se se der esse caso; mas o governo não carece agora d'essa auctorisação: se a crise cessar antes dos prasos, vem pedi-la ás côrtes, e não é preciso dar-se-lhe agora este arbitrio. Não ha nada mais inconveniente para o commercio do que estas fluctuações. Tenha o governo o arbitrio que não póde deixar de ler em virtude das circumstancias, e de não podermos fazer agora uma lei permanente de introducção de cereaes, mas aquelle arbitrio que não é indispensavel sobre essa materia não se dê ao governo, porque prejudica o commercio, e prejudicando o commercio prejudica naturalmente todos os interesses da sociedade.

(O sr. ministro não reviu discurso algum dos que proferiu n'esta sessão.)

O sr. Ministro da Justiça (Mártens Ferrão): — Pedi a palavra para mandar para a mesa a seguinte proposta de lei. Leu e tem por fim ser confirmada a aposentação concedida a José Maria da Silveira Estrella, secretario do supremo tribunal de justiça.)

Isto não é mais do que confirmar por meio de uma lei o que já esta feito por um decreto do governo de ha dois dias.

O sr. Sant'Anna e Vasconcellos: — Ha dias requeri eu que fosse remettido a esta camara pelo ministerio competente um inquerito a que se procedeu na alfandega das sete casas, do qual resultou a transferencia de um empregado para a alfandega grande. Creio que não é tão volumoso esse trabalho que não tenha podido estar já copiado. Eu renovo o meu requerimento. Nós temos o direito de fazer d'estes requerimentos, e o governo a obrigação rigorosa de os satisfazer.

O sr. Ministro da Fazenda (Casal Ribeiro): — O pedido de esclarecimentos a que se refere o sr. deputado chegou á secretaria não ha de certo uma semana, e s. ex.ª esta perfeitamente enganado quanto ao volume dos documentos que pediu; o inquerito é volumosíssimo, não tem havido tempo para o copiar todo, nem póde copiar-se todo em tão pequeno espaço como s. ex.ª suppõe: quando estiver copiado ha de vir á camara, porque o governo sabe qual é o seu dever.

O sr. Sant’Anna e Vasconcellos: — Com tanto que venha, estou satisfeito.

O sr. Presidente: — A ordem do dia para ámanhã e a continuação da que vinha para hoje, e ha de haver sessão nocturna para se tratar do projecto da lei eleitoral. Está levantada a sessão.

Eram quatro horas da tarde.

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