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SESSÃO DE 8 DE AGOSTO DE 1890

Presidencia do exmo. sr. Antonio de Azevedo Castello Branco (vice-presidente)

Secretarios - os exmos. srs.

José Joaquim de Sousa Cavalheiro
Antonio Teixeira de Sousa

SUMMARIO

O sr. Francisco Machado, sobre a acta, protesta contra a maneira por que se abriam as sessões, contrariando a resolução da camara do que, não havendo numero às duas horas e meia, não podia haver sessão, e insiste que não ha numero na sala. - Depois de algumas observações do sr. presidente, e de usar da palavra sobre O mesmo assumpto o sr. Jacinto Candido, e a acta approvada. - Dá se conhecimento de um officio do ministerio da guerra, devolvendo um requerimento do alteres reformado Antonio Rodrigues Pinto; outro da camara dos dignos pares, participando que o sr. marquez de Fontes Pereira de Mello tomou assento n'aqnella camara; o outro do ministerio do reino, acompanhando o decreto de prorogação das côrtes até 15 de agosto exclusive. - Lê o sr. presidente o decreto de prorogação. - Representações apresentadas pelos srs. Pestana de Vasconcellos, José de Alpoim e Adriano Monteiro. - Requerimentos de interesse particular apresentados pelos srs. José de Alpoim e José de Castro. - Declarações de voto dos srs. Alfredo Brandão, Ruivo Godinho e Casal Ribeiro. - Justificação de faltas.

Na ordem do dia, continuação da intcrpellação do sr. Emygdio Navarro ao sr. ministro dos negocios estrangeiros sobre a entrega de 28:000 libras ao governo inglez, prosegue no uso da palavra o sr. Veiga Beirão.- Responde lhe o sr. Pinheiro Chagas. - A requerimento do sr. Teixeira.de Vasconcellos e prorogada a sessão ate terminar a intcrpellação. - O sr. Manuel de Arriaga faz largas considerações sobro o assumpto. - A requerimento do sr. Pereira Leite julga-se discutida a materia da interpellação. - O sr. Francisco Machado, tendo a palavra para um negocio urgente, deseja saber se o governo tem conhecimento do factos graves que se estão dando em Macau ácerca da construcção das fortalezas pelos chinas. - Responde lhe o sr. ministro dos negocios estrangeiros, assegurando as melhores relações entre os dois paizes.

Abertura da sessão - Ás duas horas e meia da tarde.

Presentes á chamada 44 srs. deputados. São os seguintes: - Abilio Eduardo da Costa Lobo, Adriano Augusto da Silva Monteiro, Adriano Emilio de Sousa Cavalheiro, Albino de Abranches Freire de Figueiredo, Alexandre Maria Ortigão de Carvalho, Alfredo Cesar Brandão, Alvaro Augusto Froes Possollo de Sousa, Amandio Eduardo da Mota Veiga, Antonio Augusto Correia da Silva Cardoso, Antonio de Azevedo Castello Branco, Antonio Jardim de Oliveira, Antonio Manuel da Costa Lereno, Antonio Ribeiro dos Santos Viegas, Antonio Teixeira de Sousa, Arthur Urbano Monteiro de Castro, Augusto José Pereira Leite, Barão de Paço Vieira (Alfredo), Eduardo Abreu, Eduardo Augusto da Costa Moraes, Fernando Pereira Palha Osorio Cabral, Fortunato Vieira das Neves, Francisco Antonio da Veiga Beirão, Francisco de Castro Mattozo da Silva Corte Real, Francisco José Machado, Francisco Xavier de Castro Figueiredo de Faria, Jacinto Cândido da Silva, João de Barros Mimoso, João Marcellino Arroyo, João de Paiva, João Pereira Teixeira de Vasconcellos, João Pinto Moreira, João Pinto Rodrigues dos Santos, João Simões Pedroso de Lima, Joaquim Ignacio Cardoso Pimentel, Joaquim Simões Ferreira, José Augusto Soares Ribeiro de Castro, José Bento Ferreira de Almeida, José Christovão Patrocinio de S Francisco Xavier Pinto, José Elias Garcia, José Frederico Laranjo, José Joaquim de Sousa Cavalheiro, José Julio Rodrigues, José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral, José Maria Charters Henriques de Azevedo José Maria de Oliveira Peixoto, José Maria Pestana de Vasconcellos, José Maria de Sousa Horta e Costa, José Paulo Monteiro Cancella, José Victorino de Sousa e Albuquerque, Julio Antonio Luna de Moura, Luiz de Mello Bandeira Coelho, Manuel Francisco Vargas, Manuel de Oliveira Aralla e Costa, Marcellino Antonio da Silva Mesquita, Matheus Teixeira de Azevedo, Pedro Ignacio de Gouveia, Roberto Alves de Sousa Ferreira e Thomás Victor da Costa Sequeira.

Entraram durante a sessão os srs.: - Agostinho Lucio Silva, Alfredo Mendes da Silva, Antonio Baptista de Sousa, Antonio Eduardo Villaça, Antonio Fialho Machado, Antonio José Arroyo, Antonio José Lopes Navarro, Antonio Maria Jalles, Antonio Maria Pereira Carrilho, Antonio Costa, Antonio Mendes Pedroso, Antonio Sergio da Silva e Castro, Augusto Cesar Elinano da Cunha e Costa, Christovão Ayrcs de Magalhães Sepulveda, Eduardo de Jesus Teixeira, Eduardo José Coelho, Emygdio Julio Navarro, Fernando Mattozo Santos, Fidelio de Freitas Branco, Francisco Joaquim Ferreira do Amaral, Francisco Severino de Avellar, Frederico Ressano Garcia, Guilherme Augusto Pereira de Carvalho de Abreu, Ignacio Emauz do Casal Ribeiro, Jayme Arthur da Costa Pinto, João Ferreira Franco Pinto Castello Branco, Joaquim Germano de Sequeira, José Dias Ferreira, José Domingos Ruivo Godinho, José Estevão de Moraes Sarmento, José Freire Lobo do Amaral, José Gonçalves Pereira dos Santos, José Monteiro Soares de Albergaria, Luiz Augusto Pimentel Pinto, Manuel Affonso Espregueira, Manuel de Arriaga, Manuel d'Assumpção, Manuel Constantino Theophilo Augusto Ferreira, Manuel Pinheiro Chagas e Miguel Dantas Gonçalves Pereira.

Não compareceram á sessão os srs.: - Abilio Guerra Junqueiro, Adolpho da Cunha Pimentel, Albano de Mello Ribeiro Pinto, Alberto Augusto de Almeida Pimentel, Alexandre Alberto da Rocha Serpa Pinto, Antonio José Ennes, Antonio Maria Cardoso, Antonio Pessoa de Barros e Sá, Aristides Moreira da Motta, Árthur Alberto de Campos Henriques, Arthur Hintze Ribeiro, Augusto Carlos de Sousa Lobo Poppe, Augusto da Cunha Pimentel, Augusto Maria Fuscbini, Augusto Vidal de Castilho Barreto e Noronha, Bernardino Pacheco Alves Passos, Bernardino Pereira Pinheiro, Caetano Pereira Sanches de Castro, Carlos Lobo d'Avila, Carlos Roma du Bocage, Columbano Pinto Ribeiro de Castro, Conde do Côvo, Conde de Villa Real, Custodio Joaquim da Cunha e Almeida, Eduardo Augusto Xavier da Cunha, Elvino José de Sousa e Brito, Estevão Antonio de Oliveira Junior, Eugênio Augusto Ribeiro de Castro, Feliciano Gabriel de Freitas, Francisco de Almeida e Brito, Francisco de Barros Coelho e Campos, Francisco Felisberto Dias Costa, Francisco José de Medeiros, Frederico de Gusmão Corrêa Arouca, Henrique da Cunha Matos de Mendia, Ignacio José Franco, João Alves Bebiano, João José d'Antas Souto Rodrigues, João Lobo de Santiago Gouveia, João Maria Gonçalves da Silveira Figueiredo, João de Sousa Machado, Joaquim Alves Matheus, Joaquim Pedro de Oliveira Martins, Joaquim Teixeira Sampaio, José de Abreu do Couto Amorim Novaes, José de Alpoim de Sousa Menezes, José Alves Pimenta de Avellar Machado, José Antonio de Almeida, José de Azevedo Castello Branco, José Gregorio 3e Figueiredo Mascarenhas, José Luiz Ferreira Freire, José Maria Greenfield de Mello, José Maria Latino Coelho, José Maria dos Santos, José de Vasconcellos Mascarenhas Pedroso, Julio Cesar Cau da Costa, Lourenço Augusto Pereira Malheiro, Luciano Affonso da Silva Monteiro, Luciano Cordeiro, Luiz Gonzaga, dos Reis Torgal, Luiz Virgilio Teixeira, Manuel

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Thomás Pereira Pimenta de Castro, Manuel Vieira de Andrade, Marianno Cyrillo de Carvalho, Marquez de Fontes Pereira de Mello, Pedro Augusto de Carvalho Pedro de Lencastre (D.), Pedro Victor da Costa Sequeira, Sebastião de Sousa Dantas Baracho, Visconde de Tondella e Wenceslau de Sousa Pereira Lima.

Leu-se a acta.

O sr. Francisco Machado (sobre a acta): - Mais uma vez venho protestar contra a maneira como se abrem as sessões e como se regulam os trabalhos.

Repito que ha uma deliberação da camara, para que as sessões abram ás duas horas, e quando às duas horas e meia em ponto não houver numero não se abra a sessão.

Ora ás duas horas e meia não havia numero.

O sr. Presidente: - Eu peço licença ao sr. deputado para o interromper. Eu mandei proceder á chamada quando eram duas horas e meia no relogio da sala, que é por onde se regulam os trabalhos da sessão.

O Orador: - O relogio da sala está adiantado dez minutos pelo relogio da torre. Nos vemos que são duas horas o tres quartos, e que a chamada leva um quarto de hora a fazer-se.

A maioria póde fazer contra a opposição o que os inglezes fazem contra nós, que é uso do direito da força; mas ou protesto mais uma vez contra este facto.

Eu roqueiro a v. exa. que mande verificar se ha numero na sala para approvar a acta.

O sr. Presidente: - Antes da ordem do dia não ha requerimentos.

O Orador: - Insisto pelo meu requerimento, porque desde que não ha numero, v. exa. não pode abrir discussão.

O sr. Jacinto Candido: - Desejava responder às considerações feitas pelo sr. Machado, que representavam uma censura, pois outra cousa não era accusar a presidencia do abrir as sessões depois da hora e sem numero.

A mesa representava a maioria e esta tinha n'ella plena confiança, e não podia crer que não houvesse numero quando o sr. presidente declarava que o havia.

Se a opposição tinha empenho em que os trabalhos da camara corressem com regularidade, a maioria não tinha menos.

Não se dera ao trabalho de verificar se havia numero na sala, porque confiava na palavra do sr. presidente, que era o mais fiel cumpridor das prescripções regimentaes, mas estava certo de que se o sr. Machado se desse ao incommodo de contar os srs. deputados presentes, verificacaria que havia na sala numero mais que sufficiente.

(O discurso será publicado na integra, e em appendice a esta sessão, quando s. exa. o restituir.)

O sr. Presidente: - Como não está mais ninguem inscripto vae votar-se.

O sr. Francisco Machado: - Não ha numero para se votar.

O sr. Presidente: - Ha 48 srs. deputados presentes.

O sr. Alfredo Brandão: - Declaro que, se estivesse presente á sessão nocturna de hontem, teria votado contra a auctorisação concedida ao governo nas emendas ao projecto n.º 165, para dispensar o concurso da navegação entre Lisboa e as nossas colonias da Africa oriental.

O sr. Presidente: - Vae votar-se a acta.

O sr. Francisco José Machado: - Não se pode votar porque estão presentes só 48 srs. deputados e para se approvar a acta são precisos 54.

O sr. Presidente: - Peço a attenção do illustre deputado para o artigo 9.° do regimento e para a annotação que se encontra na pagina 53, que diz que a acta se pode approvar com a quarta parte dos srs. deputados, e portanto bastava que estivessem presentes 46 srs. deputados.

O sr. Francisco José Machado: - O outro dia havia 46 e não se abriu a sessão.

Approvou-se a acta.

EXPEDIENTE

Officios

Do ministerio da guerra, devolvendo o requerimento em que o alferes reformado Antonio Rodrigues pede que seja extensivo a todos os alferes reformados o beneficio concedido pela carta de lei de 20 de junho de 1889.

Para a commissão de guerra.

Da camara dos dignos pares do reino, participando que o sr. marquez de Fontes Pereira de Mello tomou assento n'aquella camara.

Para a commissão de verificação de poderes.

Do ministerio do reino, acompanhando o seguinte:

Decreto

Usando da faculdade que me confere a carta constitucional da monarchia, no artigo 74.° § 4.° e a carta do lei de 24 de julho de 1885, no artigo 7.° § 2.°, depois de ter ouvido o conselho de estado, nos termos do artigo 110.° da mesma carta, hei por bem prorogar as côrtes geraes ordinarias da nação portugueza ate ao dia 15 do corrente mez de agosto exclusivamente.

O presidente da camara dos senhores deputados da nação portugueza assim o tenha entendido para os effeitos convenientes.

Paço, em 7 de agosto de 1890. = REI. = Antonio de Serpa Pimentel.

Para a secretaria.

REPRESENTAÇÕES

Dos escrivães e tabelliães da comarca de Valença, pedindo que lhes seja votado um ordenado.

Apresentada pelo sr. deputado Pestana da Vasconcellos, enviada á commissão de legislação civil e mandada publicar no Diario do governo.

Da classe dos caixeiros de Lamego, adherindo ás representações dos seus collegas, pedindo que seja decretada uma lei isentando-os do trabalho ao domingo o dias santificados.

Apresentada pelo sr. deputado José Maria de Alpoim, enviada á commissão de petições e mandada publicar no Diario do governo.

Da camara municipal do concelho de Arraiollos, pedindo auctorisação para levantar do cofre de viação a quantia de 1:000$000 réis, para occorrer a despezas sanitarias contra a cholera morbus.

Apresentada pelo sr. deputado Adriano Monteiro, enviada á commissão de administração publica, ouvida a de obras publicas.

REQUERIMENTOS DE INTERESSE PARTICULAR

De José Fernandes, contramestre da banda de musica do regimento de infanteria n.° 3, pedindo que a lei de reforma dos musicos militares seja substituida por outra mais vantajosa, ou que, pelo menos, ao supplicante seja garantida por lei uma melhor reforma.

Apresentado pelo sr. deputado José Maria de Alpoim, enviado á commissão de guerra e mandado publicar no Diario da camara.

De José Maria de Lima, pae do guarda marinha Al-

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berto Maria Lisboa de Lima, fallecido no Chire, pedindo tuna pensão para sua familia.

Apresentado pelo sr. deputado José Maria de Alpoim, enviado á commissão de petições, ouvida a de fazenda e mandado publicar no Diario da camara.

De D. Maria Engracia Barroso e Tello, viuva de Gonçalo Tello de Magalhães Collaço, pedindo que lhe seja votada uma pensão.

Apresentado pelo sr. deputado José de Castro, enviado á commissão de petições, ouvida a de fazenda.

DECLARAÇÕES DE VOTO

Declaro que, se tivesse assistido á sessão nocturna de hontem, votaria contra a auctorisação concedida ao governo, nas emendas ao projecto n.° 165, para dispensar o concurso no serviço da navegação entre Lisboa e as nossas colonias da Africa oriental. = Alfredo Cesar Brandão.

Declaro que, se estivesse presente quando se votou o projecto sobre a mala real portugueza, tel-o-ía rejeitado. = Ruivo Godinho.

Declaro a v. exa. que, se estivesse presente ás sessões em que foram votados os projectos de lei respeitantes ao caminho de ferro de Mossamedes e á navegação para a Africa, n.° 16õ, os teria rejeitado. = Ignacio do Casal Ribeiro.

Para a secretaria.

JUSTIFICAÇÕES DE FALTAS

Declaro que por motivo justificado tenho faltado às ultimas sessões. = Manuel Aralla.

Declaro a v. exa. que tenho faltado às ultimas sessões por motivo justificado. = Ignacio do Casal Ribeiro.

Para a secretaria.

O sr. Pestana de Vasconcellos: - Mando para a mesa uma representação dos escrivães de juizo de direito e tabelliães da comarca de Valença, na qual estes funccionarios, referindo em phrases muito sentidas, mas verdadeiras e rasoaveis, a situação em que ficaram com a creação do julgado municipal de Villa Nova da Cerveira, pediam á camara que se dignasse attender ás circumstancias precarias em que se acham collocados.

Já o sr. ministro da justiça, que creou estes julgados, considerou justas as reclamações, não só d'estes empregados, mas as de todos os empregados dos julgados ordinarios, pelo que fez expedir uma portaria no sentido de providenciar convenientemente, para que lhes fosse concedida indemnisação pelos prejuizos recebidos.

Tambem no orçamento rectificado d'este anno, o nobre ministro da justiça fez incluir uma verba destinada a esse fim. Recommendando ao nobre ministro da justiça e á camara a pretensão dos peticionarios, parece-me que n'este caso sou echo da justiça d'elles, e confiando na benevolencia da camara estou certo que serão attendidos em tudo que elles pedem.

Peço a v. exa. que consulte a camara sobre se consente que ella seja publicada no Diario do governo.

A camara assim o resolveu.

(S. exa. não reviu.)

O sr. José Maria de Alpoim: - Mando para a mesa um requerimento de José Maria de Lima, pae do guarda-marinha Alberto Maria Lisboa e Lima, fallecido no Chire, ferido por uma bala que partiu do mato que orla o Zambeze.

Parecem-me muito justas as considerações que o pae do fallecido faz n'este requerimento, e o parlamento procederá com justiça, se deferir a sua pretensão.

Mando tambem para a mesa uma representação da classe dos caixeiros de Lamego, pedindo á camara que envide todos os seus esforços para que seja votada uma
lei qualquer que os dispense do trabalho ao domingo e dias santificados.

Tambem se adduzem rasões n'esta representação para serem attendidas as reclamações que fazem.

Fui representante do circulo de Lamego, e apesar de não ter já a honra de o ser, nutro sempre os mesmos sentimentos de sympathia pessoal e affecto por aquelle circulo, e desejo que quando aquelles povos tiverem reclamações a fazer perante os poderes publicos m'as enviem para as patrocinar com o meu fraco auxilio.

Mando igualmente um requerimento de José Fernandes, contramestre de musica do regimento de infanteria 3.

Não me alongo em considerações sobre as rasões que undamcntam este pedido.

Peço a v. exa. que consulte a camara sobre se consente que a representação e os requerimentos sejam publicados no Diario do governo, o eu tenho a consciência de que na sua alta sabedoria a camara procederá de fórma a serem attendidos.

Foi auctoriaada a publicação.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Eduardo Abreu: - (O discurso de s. exa. será publicado na integra, e em appendice a esta sessão, logo que s. exa. devolva as respectivas notas.)

O sr. Ministro da Instrucção Publica (Arroyo): - Como o illustre deputado disse, o governo já tem conhecimento do estado em que se encontram os povos dos Açores por causa da crise alimenticia que ali existe, e posso assegurar ao illustre deputado que transmittirei ao meu collega do reino as observações de s. exa., assim como lhe posso assegurar que o governo tem na maxima consideração, como é seu dever, a resolução dos problemas que se referem ás condições economicas do paiz, e ás condições em que se encontram as classes a que o illustre deputado se referiu.

As crises, e sobretudo as alimenticias, impõem-se a todos os governos, e não póde o governo de que faço parte deixar de as attender, como foi intenção do governo progressista attender ás condições da crise angustiosa que se deu n'uma das nossas provincias ultramarinas. O governo ha de pôr o maior empenho em debellar a crise que afflige os Açores, e posso asseverar que os membros do governo hão de empregar n'este sentido toda a sua attenção e solicitude.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Jacinto Candido: - (O discurso de s. exa. será publicado na integra, e em appendice a esta sessão, quando s. exa. haja revisto as notas tachygraphicas.)

O sr. José Julio Rodrigues: - Pedi a palavra para declarar que, se estivesse na camara na occasião em que se votou o projecto da navegação, teria votado contra elle.

O sr. Pinto Moreira: - Pedi a palavra para juntar a minha debil voz á dos srs. deputados João de Paiva e Pestana de Vasconcellos, que se referiram ás circumstancias em que se encontram os officiaes de diligencias, cuja situação é realmente precaria.

Eu chamo para este assumpto a attenção do sr. ministro da justiça.

O governo tem mostrado desejo de attender a esta deploravel situação.

É certo que se nomeou uma commissão de empregados de justiça que hão de redigir as bases da reorganisação judiciaria; e por isso peço a s. exa. que faça apresentar a essa commissão a exposição que fazem estes empregados e todas as reclamações que têem feito os empregados das

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outras comarcas, a fim de que elles sejam attendidos tanto quanto possivel nos seus legitimos interesses.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Pestana de Vasconcellos: - Requeiro a v. exa. que consulte a camara sobre se dispensa o regimento para entrar desde já em discussão o projecto de lei n.° 179.

Foi dispensado o regimento e entrou em discussão.

É o seguinte:

PROJECTO DE LEI N.º 179

Senhores. - Á vossa commissão de legislação civil foi apresentado o projecto de lei n.° 171-B, de iniciativa do illustre deputado João Pinto Moreira, o qual tem por fim a creação de um officio de tabellião de notas no districto do juizo de paz de Santa Marinha do Zezere, com séde na freguezia d'este nome.

A necessidade da providencia, a que se refere o projecto, é incontestavel, porque as freguezias que compõem o mencionado districto do juizo de paz, alem de serem das mais importantes da comarca pela sua riqueza, população e valor das suas transacções, ficam tambem a grande distancia da sede da comarca, e d'esta separada por terrenos muito montanhosos e servidos por caminhos de difficilimo accesso, o que causa grande incommodo, e frequentes vezes embaraços invenciveis, ás pessoas que precisam de recorrer aos tabelliães de comarca para a celebração de contratos, factura de testamentos, protesto de letras e para a pratica de outros actos, que muitas vezes têem de ser feitos com rapidez que as referidas circumstancias não permittem.

Por estes motivos, pois, a vossa commissão é de parecer que deve ser approvado e convertido em lei o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º É creado no districto do juizo de paz de Santa Marinha do Zezere, com sede na freguezia d'este nome, comarca de Baião, um officio de tabellião de notas, que poderá ser cumulativamente exercido pelo respectivo escrivão do juizo de paz tendo as habilitações legaes.

Art. 2.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Sala das sessões da commissão de legislação civil, 29 de julho de 1890. = Pereira Leite = Joaquim Germano de Sequeira = Amandio Eduardo da Moita Veiga = Manuel Thomás Pereira Pimenta de Castro = Eugenio de Castro = José Maria Pestana de Vasconcelos, relator.

N.º 171-B

Senhores. - A comarca de Baião comprehende uma area larguissima com uma população bastante densa, espalhada em um território extremamente accidentado, que na sua maior extensão é quasi montanhoso e do difficilimo accesao, sobretudo na parte em que confina com o rio Douro; todavia, é tambem na zona parallela á margem direita de um rio que a população é mais importante, e que se accentuam as tendencias para a augmentar cada vez mais, para o que concorre
consideravelmente a circumstancia de ser servida pelas duas vias, fluvial e de caminho de ferro. No emtanto, a sede do concelho da comarca está localisada em Campello, que demarca a mais de 15 kilometros de algumas das freguezias limitrophes do rio Douro, e para mais os habitantes dessas freguezias encontram-se em gravíssimas difficuldades para concorrer á cabeça da comarca por falta de estrada ou mesmo de caminhos concelhios. N'estas condições, é de alta justiça procurar para estes povos todos os meios de lhes facilitar o recurso á satisfação das suas necessidades sociaes e aos empregados públicos a quem a lei reveste de auctoridade e fé publica para a validade dos contratos. Por isso, julgâmos plenamente justificada a creação de um officio de tabellionato na séde do districto de paz em Santa Marinha do Zezere, como se indica no seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É creado na sede da freguezia de Santa Marinha do Zezere, comarca do Balcão, um officio de tabellionato que poderá cumulativamente ser exercido pelo respectivo escrivão do juiz de paz, tendo as habilitações legaes.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões, em 25 de julho de 1890. = João Pinto Moreira.

O sr. Paulo Cancella: - Sr. presidente, um projecto desta natureza não póde ser approvado sem uma prolongada discussão; antes, porém, de fazer algumas considerações pedirei ao sr. ministro da justiça me diga qual a sua opinião ácerca d'elle.

Sendo este projecto para se crear no districto do juizo de paz de Santa Marinha do Zezere, com sede na freguezia d'este nome, um officio de tabellião de notas, o que é dependente do ministerio da justiça, desejo saber se o sr. ministro da justiça concorda ou não com elle. A opinião de s. exa. tem muita importancia, porque estando o governo auctorisado pelo artigo 22.° do decreto n.° 3 de 29 de março, publicado em dictadura, a reorganisar o serviço do tabellionato, é conveniente saber-se se s. exa. consente ou não na nova creação de logares de tabelliães, o que certamente irá difficultar a nova reorganisação por causa dos direitos adquiridos.

Todos nós sabemos que em muitas comarcas do reino os escrivães, os quaes accumulam as funcções de tabelliães, estão quasi morrendo de fome, devido isso ao pouco movimento judicial.

Alem de outros motivos, por todos conhecidos, a elevação das custas, a morosidade nos processos, as delongas da rabulice e sobretudo a maneira como os solicitadores, em vez de attenderem aos interesses dos seus constituintes, attendem aos seus interesses pessoaes, tudo isto, tem feito diminuir por tal forma o movimento judicial e por isso os emolumentos e salários dos escrivães e mais empregados judiciaes, que todos se acham nas mais criticas circumstancias.

Já a esta camara, sr. presidente, têem sido apresentadas pelos deputados da maioria, deputados que votaram o projecto de lei dos 6 por centos de addicionaes, que veiu aggravar a fome que já opprime o paiz, varias representações dos escrivães de direito, expondo as precárias circumstancias em que se encontram e pedindo ás côrtes que lhes acendam para não morrerem de fome.

Sr. presidente, é preciso attender á classe dos escrivães e tabelliães de notas; é preciso que o serviço destes seja reorganisado o mais brevemente possivel, porque a responsabilidade e despezas que fazem são grandes e elles não podem viver com o que actualmente ganham.

Não é, porém, com um projecto d'esta natureza que se attende á situação difficil d'estes empregados, porque ainda mais difficil a torna.

Um projecto d'esta natureza vem aggravar extraordinariamente estas condições, porque faz com que se desvie para o tabellionato creado no juizo de paz, serviço que devia ser feito pelos escrivães de direito, que, como todos sabem, são tambem tabelliães, resultando d'ahi prejuizo para o thesouro, porque quanto mais serviço desviarem d'estes, mais representações mandarão ás côrtes e mais instarão com o governo para os compensar da falta de serviço dando-lhes ordenado, e o governo terá de ceder para os não deixar morrer do fome e para evitar que a necessidade os leve a prevaricar.

A questão é grave, sr. presidente, e merece toda a attenção do sr. ministro da justiça. E a questão é grave não só por causa do aggravamento das difficuldades em que se encontram os tabelliães de notas, mas tambem pelas consequencias de se confiar um tabellionato a um escrivão de juizo de paz.

Sabe v. exa. e sabem os meus collegas que frequentam fôro que grande numero das questões apresentadas em juizo provém de defeitos de escripturas e testamentos, e

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esse defeito resulta da falta de competencia dos tabelliães. Ora se os escrivães e tabelliães das differentes comarcas, que conhecem mais de direito que os escrivães de juizes de paz, estão sempre a commetter erros e faltas em escripturas e testamentos, o que occasiona questões, o que fará um escrivão de juiz de paz que nada sabe de direito?

Os concursos que agora se fazem são uma phantasmagoria, porque só mostram que os concorrentes sabem as formulas tabellioas, mas não se chega a averiguar se elles sabem ou não alguma cousa de direito para comprehenderem se o contrato que se pretende fazer ou a disposição a inserir n'um testamento e ou não legal, e se por isso devem ou não fazer a escriptura ou inserir a disposição no testamento.

Este assumpto deve merecer toda a attenção do sr. ministro da justiça, e não devem ser approvados de leve quaesquer projectos que como este vão crear um tabellionato que talvez seja provido por individuo ignorante e incompetentissimo.

Eu, sr. presidente, irei fazer um resumo da historia do tabellionato desde a mais remota antiguidade, descreverei as phases por que elle tem passado, e direi tambem alguma cousa do que elle e actualmente entre nos e sobre o nada que temos feito para o melhorar, para convencer a v. exa., ao sr. ministro da justiça e á camara de que este projecto não deve ser approvado e tambem para d'ahi concluir qual a reforma a fazer no tabellionato, porque v. exa. bem sabe que a historia e um dos elementos a attender para o estudo e confecção de qualquer lei, porque nella ha muito a aprender.

Sr. presidente, eu disse que faria um resumo da historia do tabellionato desde a mais remota antiguidade, e não se admire v. exa. nem a camara d'isso, porque, segundo diz Van Huffel no seu livro Guerre aux frais de justice a origem do tabellionato perde-se na noite dos tempos, e o distincto tabellião d'esta cidade, o sr. Jorge Camelier, que se tem dedicado de todo o coração á reforma e elevação da sua classe, em uma dissertação que leu na associação dos tabelliães de Lisboa em 1 de outubro de 1869, ahi disse, com a competencia que lhe não pode ser contestada, que o notariado remonta na essencia ao mais longinquo passado e se perde na mais escura noite dos tempos.

Segundo diz o sr. Jorge Camelier na dita dissertação, com a formação da primeira sociedade nasceram as convenções, as quaes só principiaram a ter fórmas e solemnidades externas e a ser permanentes e seguras desde que se inventou a escripta.

Começa, pois, aqui a historia do tabellionato. Antes da invenção da escripta a base das convenções era simplesmente a boa fé dos contrantes; mas depois d'ella sujeitaram-se a formulas escriptas, e por isso permanentes, não ficando portanto sujeitas ás vicissitudes da boa ou má fé.

Remontando, sr. presidente, ao tempo dos judeus e dos egypcios, quando estas duas nações foram florescentes, quando, pode se dizer assim, ellas dictavam as leis ao mundo, no tempo de Jeremias, nós lá vamos encontrar os tabelliães com o nome de scribas e divididos em tres classes: scribas da lei, scribas do povo e scribas communs.

Na Grecia tambem havia scribas, empregando-se principalmente nas transacções financeiras em Athenas e na Macedonia, e dizia Aristoteles que a existencia dos scribas era uma das condições da boa administração da cidade.

Na historia do povo romano encontramos nos tambem o tabellionato desde os tempos mais antigos e é sobre o tabellionato romano que mais me demorarei, porque e talvez ahi que se vae descobrir a origem do tabellião como funccionario publico e alem d'isso pela grande influencia que a legislação romana teve na nossa.

Sabe v. exa. e sabe a camara que o povo romano foi o primeiro na historia do mundo.

Desde o oceano Atlântico ate aos confias da Asia, o povo romano estendeu a sua influencia e levou a civilisação, e onde levou as suas armas levou tambem a sua sciencia. Respeitando sempre os costumes indigenas dos paizes conquistados, o que consolidava a sua soberania, ia applicando sua legislação, a qual dentro em pouco estava regendo em quasi todo o mundo então conhecido.

Como todos sabem, a Lusitania foi por muitos annos uma das provincias do imperio romano, e por isso não podia deixar de ser influenciada pelo direito romano, e tanto o foi que ainda os nossos praxistas, um pouco antiquarios, se esquecem muitas vezes dos preceitos das nossas leis para citarem textos latinos, que, por serem latinos e nem todos os entenderem, produzem bom effeito.

Podemos, pois, considerar o tabellionato romano como progenitor do nosso.

Nos primeiros tempos de Roma, os scribas eram escravos e só mais tarde este cargo foi exercido por homens livres, que tiveram o nome de tabularii, porque tomavam nota dos contratos sobre tábuas; mas esses contratos nada tinham de authenticos e não mereciam fé publica sem o completio contratus, que lhe era dado pelo pretor em presença de duas testemunhas.

Houve tambem em Roma tabelliães com o nome de argentarii, notarii, cancellarii, exceptores, actuarii, commendatorienses, scriniarii, conicularii, amanuenses, tabullarii e tabeliones, isto é, uma verdadeira chusma de empregados d'esta natureza, cujos nomes variavam como diversas eram as funcções de cada um.

No fim, porem, do seculo IV e principio do seculo V só tinham os tabullarii, que tambem se denominavam cursores e notari.

Arcadio e Honorio e depois d'isso o codigo de Theodosio e principalmente o imperador Justiniano, e que tentaram elevar o tabellionato ao logar importante que carecia ter, porque ate então não se lhe havia dado a importancia que elle merecia.

Leão, o Grande, publicou tambem um decreto ácerca do tabellionato, e no seculo VI, no reinado de Justiniano, o Velho, formavam os tabelliães um collegio, no que nos posteriormente, no reinado de D. Affonso III os imitámos, organisando-se o paço dos tabelliães.

Os povos germanicos não conheciam o notariado e por isso, depois da invasão que fizeram ao imperio romano, a legislação deste povo caiu em desuso e so entre o povo gallo romano parece haver indicios de se observarem a este respeito as regras do codigo de Theodosio, e nos outros paizes que haviam estado sujeitos ao imperio romano havia notarios, mas sem caracter official.

Em França o primeiro imperante que attendeu ao tabellionato foi Carlos Magno, e cada alto titular ou dignatario quer civil quer religioso devia ter o seu tabellião.

Devo notar a v. exa. e á camara que eu emprego a palavra tabellião, que e portugueza, para definir o individuo que nos tempos antigos exercia funcções analogas ás dos nossos tabelliães, para não estar a massar a v. exa. e á camara com o palavão em latim por que então eram conhecidos esses individuos.

Depois da morte de Carlos Magno o tabellionato perdeu a importância que elle pretendêra dar-lhe, e caiu na mão dos padres, que arrogaram a si o direito de fazer testamentos, direito de que usaram e abusaram em seu proveito, do que nada nos devemos admirar.

Voltando, porém, aos tempos mais antigos e que mais relação têem comnosco, vamos encontrar o tabellionato no tempo dos visigothicos, como diz o sr. Jorge Camelier, na dissertação a que já me referi.

No livro 2.°, titulo 5.°, lei 1.ª do codigo visigothico exige-se para a validade dos contratos o signal ou assignatura das partes contratantes e de duas testemunhas.

Nos tempos feudaes, cada senhor feudal tinha o seu tabellião ou notario, guarda notas, e guarda sellos, porque

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1782 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

estas tres entidades eram meio para elle arranjar mais dinheiro.

Como v. exa. ve, o tabellionato passou por vicissitudes extraordinarias, tendo os tabelliães ora fé publica ora não, sendo o cargo exercido umas vezes por escravos, outras por cento livre, tendo umas vezes grande importância, outras nenhuma, sendo exercido o cargo pelos padres e pelos dependentes dos senhores feudaes; mas o que se vê de tudo isto e que o tabellionato foi sempre julgado uma instituição necessária na sociedade, fosse qual fosse as bases em que assentasse.

Os contratos não podiam estar sómente á mercê da boa fé dos contratantes e era por isso indispensavel o ordenar formulas e decretar preceitos a que se devesse obedecer nas convenções.

O movimento religioso, que deu logar a movimentos politicos e militares, causara grande desordem nas sociedades e sobretudo as cruzadas produziram deslocações enormes nos individuos que, para arranjarem dinheiro, tiveram de fazer grandes transacções de propriedades.

S. Luiz quiz obviar a desordem que certamente devia advir em não serem legalisadas as transacções, e por isso organisou o tabellionato, creando sessenta tabelliães no chatelet de Paris.

Vemos n'esta organisação a influencia da epocha d'esta creação. Accentuava-se por toda a pai te e principalmente então em França, no reinado de S. Luiz, a influencia religiosa e o elemento clerical dominavam em tudo e por isso os tabelliães do chatelet eram padres.

O sr. Presidente: - Eu tenho a observar a v. exa. que faltam cinco minutos para dar a hora para se passar á ordem do dia.

O Orador: - Muito bem, eu continuo, e quando der a hora, v. exa. tem a bondade de me avisar, para, se eu não tiver ainda terminado as considerações que desejo fazer, pedir a v. exa. que me reserve a palavra para a sessão seguinte. O que tenho a dizer leva ainda muito tempo, e com certeza não posso terminar hoje; deve mesmo levar ainda muitas sessões, porque desde o tempo de S. Luiz e desde o principio da monarchia, ha muito que dizer sobre o tabellionato.

Vozes: - Ordem do dia.

O Orador: - Sr. presidente, eu pergunto a v. exa. se já, e a hora de se entrar na ordem do dia.

O sr. Presidente: - Sim, senhor.

O Orador: - N'esse caso peço a v. exa. que me reserve a palavra para ámanhã.

O sr. Casal Ribeiro: - Mando para a mesa uma justificação de falta e uma declaração de voto.

O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros (Hintze Ribeiro): - Por parte do meu collega da fazenda, mando para a mesa uma proposta de lei, auctorisando o governo a conceder á sociedade de geographia de Lisboa a garantia de juro para um emprestimo ate á quantia de 200 contos de réis, para construcção de um edificio para séde d'aquella sociedade.

Proposta de lei n.º 189-A

Senhores. - Tendo a sociedade de geographia de Lisboa representado ao governo sobro a conveniencia de tão util instituição ter edificio proprio onde funccionasse, e sendo conhecidos os serviços distinctos que ao paiz tem prestado essa sociedade e as suas ligações intimas com a administração geral do estado, nos termos do preceituado no decreto de 12 de agosto de 1880, e justo attender á solicitação, tanto mais que o edificio a construir e seus pertences ficarão na posse da fazenda, caso a sociedade se dissolva; portanto tenho a honra do submetter á vossa approvação a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.° É auctorisado o governo a conceder á sociedade de geographia do Lisboa a garantia de juro para um emprestimo até á quantia de 200:000$000 réis, nos termos seguintes:

1.° A sociedade de geographia de Lisboa edificará ou transformará convenientemente um edificio para installação da sua séde, o qual, com todos os pertences da sociedade, ficará pertencendo ao estado se ella se dissolver; os planos da reconstiucção ou edificação do edificio serão approvados pelo governo;

2.º Esse edificio será consagrado como homenagem nacional á memoria dos descobridores portuguezes, e n'elle organisará e conservará a sociedade, alem das suas repartições de serviço, um museu colonial e commercial, que será franqueado ao publico nas condições dos respectivos regulamentos;

3.° A sociedade poderá levantar um emprestimo até á quantia de 200:000$000 réis em obrigações amortisaveis em sessenta annos, ao juro de 5 por cento, e emittido por series para a construcção ou transformação do edificio e respectivas installações;

4.º O estado prestará a garantia de juro de 5 por cento ao anno ás obrigações desse emprestimo ate sua extincçãão, das nenhuma serie póde ser emittida ou negociada sem preliminar auctorisação do governo;

5.° O juro e amortisação do emprestimo serão satisfeitos pelas receitas ordinarias da sociedade, deduzidas as despezas do expediente e serviços ordinarios, computando-se em 2:500$000 réis a quantia minima annnal destinada a este juro e amortisaçào, desde que a sociedade se ache reinstallada no novo edificio;

6.° Subsistirão os auxilios e obrigações reciprocas entre o estado e a sociedade, que se derivaram do accordo homologado pelo decreto de 12 de agosto de 1880.

Art. 2.° Fica revogada a legislação contraria a esta.
Ministerio dos negocios da fazenda, aos 8 de agosto de 1890. = João ferreira Franco Pinto Castello Branco.

Enviada á commissão de fazenda e a publicar no Diario do governo.

ORDEM no DIA

Continuação da interpellação do sr. Emygdio Navarro ao sr. ministro dos negocios estrangeiros

O sr. Francisco Beirão: - (O discurso de s. exa. será publicado na integra, e em appendice a esta sessão, quando haja revisto as notas tachygraphicas.)

O sr. Pinheiro Chagas: - (O decurso do orador será publicado na integra, e em appendice a esta sessão, quando s. exa. restituir as notas tachygraphicas )

O sr. Teixeira de VasconcellOS (para um requerimento): - Requeiro a v. exa. que consulte a camara sobre se quer que se prorogue a sessão ate se liquidar este incidente.

A camara resolveu afirmativamente.

O sr. Manuel de Arriaga: - (O discurso de s. exa. será publicado na integra, e em appendice a esta sessão, quando haja revisto as notas tachygraphicas.)

O sr. Pereira Leite: - Requeiro a v. exa. consulte a camara, se julga a materia sufficientemente discutida.

Foi approvado.

O sr. Francisco José Machado: - Eu pedi a palavra por que desejava fazer umas perguntas ao governo, para que elle nos informe de factos graves que se estão passando em Macau.

Sr. presidente, recebi uma carta d'aquella localidade que diz o seguinte:

«Os chinas estão construindo fortalezas em volta de Macau, e artilhando-as com artilheria moderna.

«Nós nada temos aqui. Nem sequer uma unica peça Krupp.»

A carta não diz onde são essas fortificações, mas e de suppor que sejam na ilha da Lapa, que fica a distancia de 2 kilometros do nosso territorio.

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SESSÃO DE 8 DE AGOSTO DE 1890 1783

Consta-me tambem que os chinas estão reconstruindo e artilhando o forte de Passaleão, que fica a distancia de 1 kilometro do nosso territorio.

V. exa., sr. presidente, deve concordar que isto e grave e que nós não podemos assistir de braços cruzados a que se construam fortificações a distancias tão proximas do nosso territorio sem nos precavermos. É possivel que a China obedeça a manejos de outra potencia, que procura todas as occasiões de nos ser hostil; mas e por isso mesmo que o nosso governo não póde ficar indifferente perante este facto.

Pergunto, pois, ao sr. ministro dos negocios estrangeiros se tem conhecimento do que acabo de expor á camara, e quaes as providencias que o governo tenciona adoptitr para nos precavermos contra qualquer insidia.

Os animos dos nossos irmãos d'aquella colonia estão altamente surprehendidos e alarmados com este facto, e o governo não póde cruzar os braços, deixando ao abandono portuguezes que querem ser fieis á sua patria.

Este assumpto e grave, e não vejamos surgir outras complicações bastante serias, como aquellas que temos entre mãos.

Outra pergunta desejo ainda fazer ao governo.

Sei tambem que veiu hoje a Lisboa uma commissão de individuos das provincias do norte, a fim de pedir providencias ao governo para o estado angustioso em que se encontra aquella parte do paiz.

Essa commissão pediu a diminuição de direitos sobre a importação do milho, para acudir á situação das provincias do norte.

Pergunto, tem o governo tenção de attender a este pedido, que lhe foi feito por aquella commissão em nome da fome que reina nas provincias do norte do paiz?

É natural que o governo não se importe com a fome que reina em muitos districtos do paiz.

No emtanto, o meu dever como deputado da nação e pedir providencias ao governo para remediar os males que affligem o nosso povo.

Espero a resposta do sr. ministro dos negocios estrangeiros.

O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros (Hintze Ribeiro): - Relativamente á primeira pergunta do illustre deputado, devo dizer que as relações entre a China e Portugal são perfeitamente de boa paz.

Não chegou ao meu conhecimento facto algum que possa perturbar essas relações.

Quanto á segunda pergunta, o illustre deputado comprehende que o assumpto não corre pela minha pasta; mas eu não posso senão formular o desejo de que as petições dirigidas ao governo possam encontrar da parte d'elle o acolhimento necessario a fim de se debellar a crise a que s. exa. allude.

Pelo que toca á natureza d'essas providencias, não posso entrar na sua especificação, porque, repito, não correm pela minha pasta.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Presidente: - A ordem do dia para amanhã e a continuação da que estava dada.

Está levantada a sessão.

Eram seis horas e meia da tarde.

Representações mandadas publicar n'este diario

Senhores deputados da nação portugueza. - José Fernandes, contramestre da banda de musica do regimento de infanteria n.° 3, desde o dia 2 de julho de 1864, contando sessenta e oito annos de idade e cincoenta e um de serviço effectivo sem a mais leve nota, o que tudo prova pelo attestado junto, vem perante vós fazer uma succinta exposição do misero estado em que terá de encontrar-se no fim de tão longos annos de serviço, quando num dia, coagido pela decrepitude e pela doença, que e o seu apanagio, seja forçado a reformar-se.

A vigente lei de reformas dos musicos militares dá a estes direito ás pensões que competem aos officiaes inferiores e nas mesmas condições de idade e de serviço, sendo, porem, condição indispensavel para a obterem o serem julgados incapazes de todo o serviço por uma junta militar de saude. Para os effeitos da pensão de reforma os musicos são ainda equiparados aos officiaes inferiores pelo modo seguinte: mestre de musica a sargento ajudante e primeiro sargento, contramestre e musicos de 1.º e 2.ª classe a segundo sargento, ditos de 3.ª classe a furriel ou antes tambem a segundo sargento, visto haver sido extincta
a classe dos furrieis.

D'aqui provém que os contramestres de musica, que por via de regra contam muitos mais annos de serviço do que os musicos de 1.ª, 2.ª e 3.ª classe, que deram de si muito maiores provas de conhecimentos profissionaes, e que por isso mesmo na effectividade percebem um vencimento médico (520 réis diarios), mas ainda assim superior ao dos musicos das denominações hierarchicas inferiores, depois de reformados passam a fruir uma pensão igual á de um simples musico de 3.ª classe reformado, isto é, o vencimento diário e unico de 350 réis!

Revela-se, pois, logo á primeira vista a grande injustiça que tão de rijo fere a classe dos contramestres de musica, os quaes, havendo-se reconhecido a necessidade de na effectividade lhes dar maior vencimento, como remuneração de maiores responsabilidades e mais vastos conhecimentos profissionaes do que os dos musicos que lhes são inferiores, depois do reformados são equiparados na pensão ate a quem jamais passou de um simples musico de 3.ª classe!

Senhores. O supplicante ousando apontar aqui unicamente de um modo succinto as rasões para o vosso espirito recto e esclarecido poder formar um juizo seguro da imperiosa necessidade que ha de obviar a tão grave injustiça, vem mui respeitosamente pedir-vos, que a lei de reforma dos musicos militares seja sem detença substituida por uma outra mais equitativa, que não esteja como a actual em antagonismo com os mais rudimentares principios da justiça, e que, quando não possa providenciar-se já n'este sentido, pelo menos havendo em consideração a já avançada idade do supplicante, o numero de longos annos de bom e effectivo serviço, durante os quaes passou todas as privações e incommodos da campanha de 184& a 1847 (o que tudo consta do attestado annexo), se lhe garanta por lei uma melhor reforma, que, quando alquebrado pelos annos e pela doença, o livre da miseria.

Para o conseguir, animado da melhor esperança, appella para os vossos sentimentos justiceiros e para o vosso espirito esclarecidissimo. - E. R. Mce.

Vianna do Castello, 2 de agosto de 1890. = José Fernandes, contramestre da banda de musica do regimento de infanteria n.° 3.

Illmo. e exmo. sr. - José Fernandes, contramestre de musica n.° 2 de matricula do 1.° batalhão 20 da 1.º companhia do regimento do commando de v. exa., desejando, a fim de documentar uma pretensão, de um attestado do que a seu respeito constar nos livros de matricula e registo disciplinar, respeitosamente - P. a v. exa., illmo. e exmo. sr. coronel commandante do regimento de infanteria n.° 3 se digne mandar passar-lhe o referido attestado. - E. R. Mce.

Quartel em Vianna do Castello, 2 de agosto do 1890. = José Fernandes, contramestre da banda de musica do regimento de infanteria n.° 3.

Auctoriso a que seja passado o attestado pedido. = O commandante, Mesquita.

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1784 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Em virtude do despacho supra attesto que do primeiro livro de matricula do 1.° batalhão das praças de pret d'este regimento, consta o seguinte:

Designações do estado civil:

Numero de matricula - 2.

Nome - José Fernandes.

Occupação - musico.

Nasceu em 1822 em Vianna do Castello, concelho e districto de Vianna, filho de José Fernandes.

Estado - solteiro.

Designações do estado militar:

Assentamento de praça em 1 de agosto de 1839, como voluntário; presente no regimento de infanteria n.° 3, em 1 de agosto de 1839.

Graduações e posição n'este batalhão - grau contramestre de musica.

Desde quando - 16 de novembro de 1884, 1.ª, 20.

Notas biographicas durante o serviço militar - Classificado contramestre em 10 de julho de 1864, para tocar requinta.

Liquidação annual do tempo do serviço até 2 de agosto de 1890 - cincoenta e um annos e um dia.

Campanhas - a de 1846 a 1847, no regimento de infanteria n.° 3.

Condecorações e louvores - Medalha de oiro de comportamento exemplar; ordem do exercito n.° 14 de 1889.

Applicação litteraria - Ler, escrever e contar.

Do registo disciplinar nada consta.

Quartel em Vianna do Castello, 2 de agosto de 1890. = Carlos Augusto Correia, major de infanteria 3.

Senhores deputados da nação portugueza. - José Maria de Lima, casado, natural de Lamego, pae do desventurado guarda-marinha da armada real portugueza, Alberto Maria Lisboa de Lima, fallecido no Chire, era junho passado, de um ferimento com arma de fogo, vem impetrar da camara dos senhores deputados da nação portugueza que seja votada a sua família uma pensão, que lhe substitua aquella que o seu desventurado filho estabelecera desde outubro de 1889 como soccorros de familia.

Á data do fallecimento commandava o desventurado guarda-marinha o vapor de guerra Quaqua, pertencente á esquadrilha do Zambeze, commissão para que fôra nomeado em 19 do março ultimo, saindo então da canhoneira Tamega, onde se achava, para se encorporar em Quelimane na expedição ao Chire, commandada pelo tenente João de Azevedo Coutinho, expedição que saiu de Quelimane nos primeiros dias de abril para fazer a guerra do Massingire onde foi morto o filho do supplicante, o qual assim se tornou victima do seu amor pela patria e da sua disciplina militar; pois que, embora podendo reclamar contra a ordem que o fez passar da canhoneira Tamega para o vapor Quaqua, sem lhe pertencer tal serviço, preferiu comprometter a sua vida em serviço da patria.

Com a morte do chorado guarda-marinha, alem da falta que a pensão faz a toda a familia do supplicante, fica cortada a educação do seu outro filho mais novo, Henrique Gualberto Lisboa de Lima, que cursava o lyceu, pois que o supplicante esgotou todos os recursos de que podia dispor para elevar, com immensos sacrifícios, o seu fallecido filho á posição que occupava, e para a qual uma vocação decidida o impellia desde creança.

Julgando da maxima justiça a sua pretensão pelas rasões expostas o supplicante - P. a v. exas., senhores deputados da nação portugueza, a graça de deferir-lhe, como requer. - E. R. Mcê.

Lisboa, 6 de agosto de 1890. = José Maria de Lima.

O redactor = Lopes Vieira.

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