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N.° 102

SESSÃO DE 4 DE JULHO DE 1899

Presidencia do exmo. sr. Luiz Fisher Berquó Poças Falcão

Secretarios - os exmos srs.

Joaquim Paes do Abranches
Frederico Alexandrino Garcia Ramirez

SUMMARIO

Approvada a acta, tiveram segunda leitura dois projectos de lei. - O sr. Ferreira da Fonseca manda para a mesa uma representação da camara municipal de Almeida - O sr. Franco Frazão apresenta um projecto de lei sobre caça, que é considerado urgente O sr. Tavares Festas faz algumas considerações a respeito d'esse projecto. - O sr. Guilherme de Abreu apresenta duas representações das camaras municipaes de Cabeceiras de Basto e Vieira - O sr. visconde da Ribeira Brava manda para a mesa um projecto de lei; o sr. Avellar Machado justifica as suas faltas e o sr. Dias Costa apresenta um parecer da commissão de fazenda

Na ordem do dia entra em discussão o projecto de lei n.° 74, reforma eleitoral, que é approvado, depois de terem usado da palavra sobre elle os srs. Arroyo, presidente do conselho, Alexandre Cabral, Adriano Anthero, Arthur Montenegro, conde de Burnay, Fialho Gomes, Tavares Festas, Abreu Castello Branco e visconde da Ribeira Brava. - Pelos srs. Tavares Festas, Alexandre Cabral, Adriano Anthero, Arthur Montenegro, Queiroz Ribeiro, visconde da Ribeira Brava, Carlos Ferreira, Fialho Gomes, Simões dos Reis, Alvaro Castellões, Ferreira da Fonseca, Mazziotti, Christovão Pinto, Abreu Castello Branco, Abel da Silva e Tellee de Vasconcellos são mandadas para a mesa propostas, que se remettem á commissão -Approvam-se depois sem discussão as emendas feitas pela camara dos dignos pares ao projecto n.° 69, reforma administrativa, e entra em discussão o projecto n.º 83, bens nacionaes, usando da palavra os srs. Cabral Moncada e Luiz José Dias

Primeira chamada - Ás dez horas e meia da manhã.

Presentes - 10 srs. deputados.

Segunda chamada - Ás onze horas.

Abertura da sessão - Ás onze horas e um quarto.

Presentes - 47 srs. deputados.

São os seguintes: - Abel da Silva, Adriano Anthero de Sousa Pinto, Alberto Affonso da Silva Monteiro, Alexandre Ferreira Cabral Paes do Amaral, Alfredo Carlos Le-Cocq, Alfredo Cazimiro de Almeida Ferreira, Alvaro de Castellões, Antonio Eduardo Villaça, Antonio Maria Dias Pereira Chaves Mazziotti, Antonio Tavares Festas, Arnaldo Novaes Guedes Rebello, Arthur Pinto de Miranda Montenegro, Augusto José da Cunha, Bernardo Homem Machado, Carlos Augusto Ferreira, Carlos José de Oliveira, Conde de Burnay, Conde de Silves, Francisco Barbosa do Couto Cunha Sotto Maior, Francisco Felisberto Dias Costa, Francisco Futrado de Mello, Francisco José Machado, Francisco José de Medeiros, Francisco Limpo de Lacerda Ravasco, Frederico Alexandrino Garcia Ramirez, João Antonio de Sepulveda, João Baptista Ribeiro Coelho, João Joaquim Izidro dos Reis, João Lobo de Santiago Gouveia, João Marcellino Arroyo, Joaquim Augusto Ferreira da Fonseca, Joaquim Heliodoro Veiga, Joaquim Paes de Abranches, Joaquim Simões Ferreira, José Alberto da Costa Fortuna Rosado, José Benedicto de Almeida Pessanha, José Capello Franco Frazão, José Christovão Patrocinio de S. Francisco Xavier Pinto, José da Cruz Caldeira, José da Fonseca Abreu Castello Branco, José Maria de Alpoim do Cerqueira Borges Cabral, José Mathias Nunes, Libanio Antonio Fialho Gomes, Lourenço Caldeira da Gama Lobo Cayolla, Luiz Fisher Berquó Poças Falcão, Manuel Telles de Vasconcellos e Visconde da Ribeira Brava.

Entraram durante a sessão os srs.: - Antonio Ferreira Cabral Paes do Amaral, Antonio de Menezes e Vasconcellos, Antonio Simões dos Reis, Eusebio David Nunes da Silva, Francisco Silveira Vianna, Francisco Xavier Cabral de Oliveira Moncada, Frederico Ressano Garcia, Gaspar de Queiroz Ribeiro de Almeida e Vasconcellos, Guilherme Augusto Pereira de Carvalho de Abreu, Henrique Carlos de Carvalho Kendall, Jacinto Simões Ferreira da Cunha, Jeronymo Barbosa de Abreu Lima Vieira, João Catanho de Menezes, João Ferreira Franco Pinto Castello Branco, Joaquim José Pimenta Tello, Joaquim Ornellas de Matos, José Eduardo Simões Baião, José Gonçalves Pereira dos Santos, José Gregorio de Figueiredo Mascarenhas, José Joaquim da Silva Amado, José Maria Barbosa de Magalhães, Luciano Affonso da Silva Monteiro, Luiz José Dias, Manuel Affonso de Espregueira, Manuel Antonio Moreira Junior e Sebastião de Sousa Dantas Baracho.

Não compareceram á sessão os srs.: - Adolpho Alves do Oliveira Guimarães, Alfredo Cesar de Oliveira, Anselmo de Andrade, Antonio Augusto Gonçalves Braga, Antonio Carneiro de Oliveira Pacheco, Antonio Maximo Lopes de Carvalho, Antonio Teixeira de Sousa, Arthur Alberto de Campos Henriques, Augusto Cesar Claro da Ricca, Conde de Idanha a Nova, Conde de Paço Vieira, Conde da Serra de Tourega, Francisco de Almeida e Brito, Francisco Antonio da Veiga Beirão, Francisco Manuel de Almeida, Francisco Pessanha Vilhegas do Casal, Henrique da Cunha Matos de Mendia, Jacinto Candido da Silva, Jeronymo Barbosa Pereira Cabral Abreu o Lima, João Abel da Silva Fonseca, João de Mello Pereira Sampaio, João Monteiro Vieira de Castro, João Pereira Teixeira de Vasconcellos, João Pinto Rodrigues dos Santos, Joaquim Saraiva de Oliveira Baptista, José de Abreu do Couto Amorim Novaes, José Adolpho de Mello e Sousa, José Alves Pimenta de Avellar Machado, José Bento Ferreira de Almeida, José Dias Ferreira, José Estevão de Moraes Sarmento, José Gil de Borja Macedo e Menezes (D.), José Luiz Ferreira Freire, José Malheiro Reymão, José Maria de Oliveira Matos, José Maria Pereira de Lima, Julio Ernesto de Lima Duque, Leopoldo José de Oliveira Mourão, Luiz Cypriano Coelho de Magalhães, Luiz Osorio da Cunha Pereira de Castro, Manuel Pinto de Almeida, Marianno Cyrillo de Carvalho, Martinho Augusto da Cruz Tenreiro, Sertorio do Monte Pereira e Visconde de Melicio.

Acta - Approvada.

O sr. Presidente: - Ha do entrar-se na ordem do dia ás onze horas e tres quartos, e a sessão ha de encerrar-se ás duas horas e um quarto.

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2 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Vae ler-se o

EXPEDIENTE

Segundas leituras

Projecto de lei

Senhores. - A camara municipal de Redondo, do districto de Evora, tendo em vista a principal e mais instante necessidade dos seus municipaes, continúa tratando de abastecer de agua potavel aquella villa.

Estão adiantadissimas as obras para tão indispensavel como rendoso melhoramento: está perfurado o tunnel na extensão de 170 metros, completes dez galerias de captagem, um reservatorio para 500 metros cubicos de agua oito aqueductos de passagem um ribeiras, quasi construido um aqueducto de cinco arcos, assente uma canalisação importante e paga grande, parte da que é precisa. Em tudo isto estão gastos perto de 22 contos.

Mas de mais 9 contos a camara precisa para poder completar esta tão utilissima obra.

A camara tem receita para o augmento dos encargos provenientes d'este emprestimo de 9 contos que pretende contrahir, mas esta receita só agora principiou a augmentar-se e assim, sommada com a dos ultimos annos para tirar a media que o codigo administrativo imoõe, não dá o resultado que se deseja. Teriam, pois, de parar aquellas obras, perdendo ou devendo inutilisar-se muitas das já feitas e, o que é peior ainda, ficando aquella villa privada do mnior e melhor beneficio a que lhe é licito aspirar, o seu municipio privado d'esse rendimento que o excesso das aguas certamente lhe daria, aproveitadas pelos particulares para a agricultura.

Assim, em circumstancias excepcionaes como imperiosas, parece da maior justiça que mereça a vossa attenção o seguinte, projecto de lei:

Artigo 1.º É auctorisado o governo a conceder a camara municipal do concelho de Redondo auctorisação para contrahir um emprestimo de 9 contos destinados á conclusão da obra de canalisação de aguas potaveis n'aquella villa, ainda quando os encargos d'este emprestimo por si ou juntos aos dos emprestimos anteriores igualem ou excedam a quinta parte da sua receita ordinaria calculada nos termos do codigo administrativo pela media da cobrada no triennio immediatamente anterior.

Art. 2.ª Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões, em 3 de julho de 1899. - O deputado, Tavares Festas.

Lida na mesa foi admittido e enviado á commissão de administração publica.

Projecto de lei

Senhores. - A falta de um tabellião na séde do concelho de Vianna do Alemtejo está causando sos viannenses grandes transtornos e prejuizos, obrigando os a ir a Evora, sempre que lhes é necessario recorrer ao tubelhonato.

Mas Vianna do Alemtejo dista de Evora, séde da comarca, uns trinta kilometros, sem entrada macadamisada: ha apenas uma pessima estrada antiga, cortada por sete ribeiros sem pontes, o que em tempo de cheias torna impossivel o transito.

Por isso Vianna teve sempre tabellião, desde o tempo dos juizes de fóra, teve o depois quando foi séde de um julgado ordinario e de um julgado municipal e mais reconhecimento como séde de uma comarca. Pela extinção d'esta, em 1895, ficou exercendo o seu logar de tabellião privativo o antigo escrivão e tabellião privativo, fallecido há dois annos.

Desde então deixou de haver tabellião em Vianna do Alemtejo e aquelles povos são forçados a ir a Evora para um simples reconhecimento de assinatura. A falta de um tabellião em Vianna do Alemtejo causa ás vezes prejuizos gravissimos, e insanaveis, como quando pela falta do funccionario que approve um testamento in articulo mortis, deixa de tornar-se effectiva da vontade o testador.

Por isso tenho a honra de submetter á vossa approvação o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É creado um logar de tabellião na séde do concelho de Vianna do Alemtejo

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, 3 de julho de 1899. - Alfredo Cesar de Oliveira.

Lida na mesa, foi admittido e enviado á commissão de legislação civil.

O sr. Ferreira da Fonseca: - Pedi a palavra para mandar parti a mesa uma representação da camara municipal do concelho de Almeida, pedindo que se façam algumas modificações na proposta de lei da reforma eleitoral, com o fim de ser mantida a séde do circulo n'aquella villa.

Não faço considerações sobre os fundamentos d'esta representação, e limito-me a recommendal-a á camara, especialmente ao sr. Tavares Festas, illustre relator da commissão que tem de dar parecer sobre a reforma eleitoral, cujo talento e competencia são sufficientes garantias para a boa solução d'este assumpto, que é de justiça ser resolvido favoravelmente.

(S. exa. não reviu.}

O sr. Franco Frazâo: - Vou chamar a attenção da camara para um assumpto, cuja importancia não quero exaggerar, mas que não deixa todavia de ter alguma, sob o duplo ponto de vista da riqueza publica, e particular.

Refiro-me ao desapparecimento da caça, que vae rareando de uma maneira assustadora em muitos pontos do paiz.

Este desapparecimento gradual de um genero alimenticio, que em muitas localidades se póde considerar um artigo de primeira necessidade, e que constitue um genero de exportação bastante procurado, deve merecer os cuidados previdentes do estado.

É, pois necessario que o poder legislativo tome algumas providencias sobre este assumpto.

Varias são as circumstancias que têem concorrido para este desapparecimento; mas, a meu ver, a duas principalmente só póde attribuir este facto.

A primeira é a desigualdade da legislação patria em materia de caça, porque sendo ella regulada pelas posturas municipaes, embora o codigo civil, o codigo administrativo e os codigos do processo civil e criminal tambem legislem sobre o assumpto, succede que essas posturas são de grande variedade e muito differentes de concelho para concelho, mesmo nos mais vizinhos, o que torna quasi improficuo o seu effeito.

A outra causa é a falta de logares de abrigo que facilitem o repovoamento, e tambem a de propriedades reservadas para a industria da venda de caça viva para aquelle effeito.

Basta a enunciação d'estes factos para demonstrar ser necessario buscar remedio para este estado de cousas.

A primeira providencia, a meu ver, era unificar-se a legislação actual, compendiando n'uma lei geral as disposição esparsas por dezenas e dezenas de posturas e alguns codigos, e dando assim á legislação sobre caça a unidade de que tanto carece.

Só assim se póde tornar a legislação efficaz e a fiscalisação effectiva.

Em segundo logar convem, á similhança do que existe na maioria dos paizes, ligar, quanto possivel, o direito de caçar ao direito de propriedade.

O codigo civil estabeleceu um regimen mixto, concedendo em certos casos ao proprietario o direito exclusivo de caçar nas suas propriedades.

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Para não alterarmos esta disposição do nosso direito civil, pareceu-nos que o melhor caminho a seguir seria adoptar o regimen dos coutamentos facultativos, mediante o pagamento de um imposto para o estado.

Isto equivalia apenas a estender a certos casos o direito já concedido pelo codigo civil para outros.

Não me alargarei por agora em mais considerações, deixando indicados os dois principios geraes que me parece deverem presidir a qualquer diploma equitativo que pretenda pôr uma barreira a este mal, que cada dia se aggrava mais, o desapparecimento gradual da caça.

Vou ter a honra de mandar para a mesa um projecto de lei que obedece áquella orientação, e toma como ponto de partida estes dois principios - unificar a legislação, tornando assim mais efficaz a fiscalisação, e facilitar tambem a reproducção da caça por meio da creação das industrias, a que ha pouco me referi, e da adopção do principio dos coutamentos.

O sr. Tavares Festas: - Tambem é prohibida a caça das codornizes?

O Orador: - É, durante o periodo ordinario do defezo.

Este projecto não é só trabalho meu proprio, mas é sobretudo devido á collaboração de pessoas de reconhecida competencia no assumpto, e que a elle dedicaram toda a attenção e cuidado que merece, procurando dar satisfação a todas as necessidades do nosso paiz. Entretanto, é possivel e natural que este projecto tenha defeitos e que não corresponda absolutamente a essas necessidades e aos desejos de todos.

Por isso, sem querer que elle seja adoptado pela camara sem modificações de especie alguma, parece-me que elle deve merecer a sua attenção e o seu estudo.

Peço a v. exa. e á camara que me dispense de fazer a leitura do projecto por ser muito extenso, e para elle requeiro a urgencia.

Consultada a camara, esta concedeu a urgencia.

Leu-se na mesa o seguinte

Projecto de lei

Senhores. - A caça, que a muitos se afigura apenas como ensejo para um divertimento usual, é, no emtanto, elemento bastante apreciavel de riqueza publica e particular, e o exercicio de direito de caçar anda ligado a questões de direito de propriedade, de segurança publica e de administração geral que tornam necessaria a sua regulamentação cuidadosa.

Por isso, em quasi todos os paizes da Europa, com excepção talvez apenas da Turquia e de Portugal, existem leis codificadas sobre a caça que abrangem os preceitos juridicos e administrativos que regulam o assumpto.

Entre nós é actualmente o direito de caçar regulado pelo codigo civil, codigo administrativo, regulamentos districtaes, posturas municipaes, codigo penal e leis de processo respectivo.

Esta multiplicidade de leis, augmentada sobretudo pela variedade das posturas municipaes torna difficilimo o conhecimento da legislação sobre a caça, e embaraça extremamente a sua fiscalisação. Um effeito mais grave ainda, produz o estado cahotico da nossa legislação e a liberdade absoluta, verdadeiramente anarchica com que se exerce o direito de caçar, é o desapparecimento gradual da caça que toma proporções assustadoras.

Estes factos são conhecidos geralmente, e por isso bastará relembral-os, dispensando-nos de longos commentarios.

Será bastante dizer que um dos pontos mais graves n'este assumpto, como é a duração do defeso, está sujeito ás mais incomprehensiveis variedades. Assim, por exemplo, a abertura da caça no concelho de Elvas é no dia 30 e junho, e no concelho de Campo Maior, que lhe está vizinho, é em 15 de agosto!

O mesmo delicto é reputado de maior ou menor gravidade, conforme os concelhos; assim, o individuo que caçar em tempo defeso, é punido em Arcos de Valle de Vez com 500 réis, em Olhão com 3$000 réis e em Lisboa com 10$000 réis!

Com o fim de remediar este estado de cousas, cujos effeitos nocivos são evidentes, foi elaborado este projecto de lei, que é devido ao estado o collaboração de algumas pessoas, que todas, com excepção apenas do signatario do projecto, têem sobre este assumpto reconhecida competencia.

Foram tambem consultadas algumas associações, a quem esta ordem de assumptos mais interessa, e é o resultado d'este trabalho feito com a unica preoccupação de evitar os males do regimen actual, que tenho a honra de submetter á approvação do parlamento.

Os principios fundamentaes que este projecto de lei teve em vista, podem resumir-se nos seguintes:

1.° Evitar a diminuição da caça, que em alguns pontos chega quasi á extincção completa;

2.° Unificar a legislação, tornando as suas disposições harmonicas e o seu conhecimento e applicação mais faceis;

3.° Tornar efficaz a fiscalisação e simplificar a fórma do processo;

4.° Favorecer a creação de novas industrias de avicultura destinadas á repovoação.

Para conseguir o primeiro e ultimo d'estes intuitos, julgou-se conveniente adoptar o principio dos coutamentos não gratuitos, que está em pratica em grande numero de paizes da Europa com os mais beneficos resultados.

Este principio é apenas o alargamento de um direito já concedido pelo codigo civil e alem da sua utilidade manifesta para o augmento da caça, alguns proventos trará ao estado.

O producto do imposto sobre os coutamentos e as receitas provenientes das multas e das licenças para caçar augmentarão as receitas do estado, o que é de conveniencia, para o thesouro.

É certo que as camaras municipaes perdem as receitas, que cobravam das licenças e multas, mas, com excepção de dois ou tres municipios, esta fonte de receita era insignificante, pois que em alguns nem ha posturas especiaes sobre a caça e n'aquelles onde as ha quasi não eram cumpridas.

Parece, pois, incontestavel a conveniencia d'este projecto de lei, que, sem grandes innovações e respeitando quasi todos os principios já existentes na nossa legislação, a unifica e harmonisa, evita o desapparecimento e extincção da caça, permitte a creação de novas industrias e traz augmento de receita para o thesouro.

Talvez este projecto tenha defeitos, talvez se lhe devam accrescentar disposições novas ou modificar as que n'elle se contêem Mas o elevado criterio e o bom senso pratico dos membros do parlamento por certo saberá convertel-o na lei geral sobre a caça que o paiz tanto necessita

N'estes termos, tenho a honra de submetter á vossa approvação o seguinte projecto de lei:

CAPITULO I

SECÇÃO I

Do direito de caçar

Artigo 1.° Caçar é o acto de procurar, perseguir ou apprehender os animaes bravios.

§ 1.° Animaes bravios ou selvagens são os que vivem no estado de liberdade e não podem, ser apprehendidos senão pela força ou pela astucia, e bem assim os animaes domesticados que tenham recobrado a sua primitiva liberdade.

§ 2.° Animaes domesticados são os animaes bravios

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occupados pelo homem, e com elle mais ou menos habilitados.

Art. 2.º Os animaes bravios são inoffensivos, damninhos ou uteis á agricultura, e podem ou não ser apprehendidos por meio da caça, em harmonia com as disposições d'esta lei.

Art. 3.° A todos, sem distincção de pessoas, é licito caçar durante o tempo em que a caça for livre, estando o curador munido da respectiva licença, a qual dá direito ao uso e porte de arma de fogo no exercicio da caça.

Art. 4.º O caçador apropria-se do animal pelo facto da apprehensão, mas adquire direito ao animal que feriu emquanto for em seu seguimento, salvo o disposto no artigo 33.º

§ unico Considera-se, apprehendido o animal que é morto pelo caçador, emquanto dura o acto venatorio.

SECÇÃO II

Das licenças

Art. 5.º A licença para caçar seu á passada na administração do concelho ou bairro onde o individuo tiver o seu domicilio; é valida pelo espaço de um anno no continente do reino o ilhas adjacentes, e só poderá ser recusada com fundamento nos artigos 10.°, ll.º, 12.° e 13.°

§ unico. Cada licença pagará 2$000 réis de sêllo, e a falta de licença corresponde á falta de sêllo para os effeitos fiscaes.

Art. 6.º A licença será requerida em papel sellado e passada n'um cartão com a assignatura da pessoa a quem é concedida, sempre que esta formalidade possa ser precachida, e quando o interessado não souber escrever a auctoridade competente assim o declarará no mesmo documento

Art. 7.º Podem caçar sem licença todas as pessoas da familia real.

Art. 8.º Os creados de um caçador que façam o effeito de batedores, não andando armados de espingarda, estão isentos de licença, se o caçador a tiver.

Art. 9.° O administrador do concelho ou bairro póde recusar licença para caçar:

l.º Aos individuos que estejam sob a vigilancia policial ou condemnados a qualquer pena;

2.º Pelo espaço de dois annos a todo o individuo que tiver sido condemnado como reincidente por infracções da presente lei.

Art. 10.º Não podem ser concedidas licenças para caçar:

1.º Aos dementes;

2.º Aos surdos mudos.

Art. 11.º As licenças para caçar podem ser concedidas a menores, mas só quando requeridas por seus paes ou tutores

§ unico As licenças concedidas a menores de dezeseis annos não dão direito ao uso e porto de arma de fogo.

Art. 12.º Em caso algum será concedida licença para crear aos policias, guardas fiscaes, cantoneiros das estrada, guardas campestres, florestaes, ruraes e fluviaes.

Art. 13.º A licença aos individuos que tenham sido condemnados pelos crimes de vadiagem, mendicidade, furto ou abuso de confiança só poderá ser concedida tres annos depois de cumprida a pena

Art. 14.º Todo aquelle que caçar é obrigado a apresentar a sua licença aos individuos encarregados da fiscalisação d'esta lei, quando estes a reclamarem, o ao proprietario ou rendeiro dos terrenos em que se encontre o caçados ou pessoa que os represente, quando a reclamarem.

Art. 15.º Ao caçador que for encontrado sem licença [...] aprehendidos, sendo possivel, as armas e os caes.

§ 1.º O portador das armas e dos caes apprehendidos poderá resgatal-os no praso de oito dias, pagando as despezas feitas, se apresentar a respectiva licença ao administrador do concelho onde elles estiverem.

Passando este praso, as armas terão o destino legal e ou cães serão vendidos em hasta publica por preço não inferior a 2$000 réis cada um e respectivas despezas, aliás serão abatidos.

§ 2.º As armas e os cães apprehendidos serão logo entregues ao caçador mediante deposito na administração do concelho de 10$000 réis por cada arma e 2$000 réis por cada cão, deposito que terá o destino marcado no artigo 75.°, caso a licença não seja apresentada no praso marcado no paragrapho anterior.

Art. 16.º Quando o caçador apresentar licença que lhe não pertença será esta apprehendida e annullada.

CAPITULO II

Dos direitos e deveres de proprietario e do caçador

Art. 17 ° É permittido caçar:

1.° Nos terrenos proprios cultivados ou não cultivados;

2.° Nos terrenos publicos, municipaes ou parochiaes não cultivados nem murados ou não exceptuados administrativamente;

3.° Nos terrenos particulares com excepção dos cultivados, coutados ou murados e d'aquelles que não podendo ser coutados estejam vedados por sebe viva ou morta, arame, ferro ou madeira.

Art. 18.° Os terrenos publicos, municipaes ou parochiaes podem ser exceptuados administrativamente; os primeiros, pelo governo por meio de portaria publicada no Diario ao governo a qual será executada pelo administrador do concelho em harmonia com o disposto n'esta lei; oa segundos, pelos governadores civis dos respectivos districtos em virtude de deliberação das corporações interessadas.

Art. 19.º O proprietario, usufructuario, emphyteuta ou rendeiro devidamente auctorisado, de um ou mais predios contiguos, ou o rendeiro da caça d'esses mesmos predios cuja superficie singular ou collectivamente seja superior a 100 hectares, póde coutar esses terrenos.

Art. 20.° O coutamento será concedido pelo administrador do concelho ou bairro a que pertença a maior parte da superficie dos terrenos cujo coutamento se pediu.

Art. 21.º Quem pretender o coutamento requerel-o-ha juntando o recibo da quota da licença a que se refere o paragrapho seguinte.

§ unico. Pela licença para coutamento pagar-se-ha para o estado 5 por cento da contribuição predial relativo ao predio ou grupo de predios a coutar.

Art. 22.º Considera-se renovado o coutamento quando o individuo que o houver feito apresentar na administração do concelho ou bairro, quinze dias antes d'elle terminar, o recibo de pagamento da respectiva quota.

Art. 23.º Quem pretender coutar fará para isso uma declaração ao escrivão de fazenda o requererá a liquidação da respectiva quota a pagar.

§ unico. Na declaração serão mencionadas as confrontações dos predios e respectivos numeros de matriz, o que será tambem exarado no recibo do pagamento, do qual constará a importancia da contribuição predial que paga cada predio

Art. 24.° A licença é annual é caduca quando mude o rendeiro do predio, se o coutamento lhe tiver sido concedido, ou o rendeiro da caça, se este e não sublocar.

Art. 25.° Para que se possa tornar effectivo o coutamento é necessario que a pessoa a quem foi concedido mande collocar pelas extremas do predio ou grupos de predios coutados, em terrenos descobertos, de 250 em 250 metros, e em terrenos arborisados de 50 em 50 metros, um distico com a designação do couto, bem patente e com letras não inferiores a dois decimetros.

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Art. 26.° Nos terrenos publicos, municipaes ou parochiaes, em que o direito de caçar seja exceptuado administrativamente, será tambem obrigatoria a collocação dos disticos a que se refere o artigo 25.°

Art. 27.º Se os signaes indicativos do coutamento forem destruidos por malvadez ou por incidentes fortuitos, não perde o proprietario os seus direitos provando que cumpriu o preceituado no artigo 25.°, mas fica obrigado a repor o distico no praso de um mez.

Art. 28.° Será permittido que os donos de propriedades confinantes se reunam para o direito de coutamento quando a superficie das propriedades reunidas seja superior á marcada no artigo 19.°

Art. 29.° Serão permittidos coutamentos especiaes para exploração de caça viva para repovoação.

§ unico. Pela licença para este coutamento pagar-se-ha 10 por cento sobre a contribuição predial respectiva ao predio ou predios coutados.

Art. 30.° O proprietario ou possuidor de predio em que a caça não seja livre é obrigado a indemnisar os proprietarios dos predios vizinhos do prejuizo que ella n'elles causar.

Art. 31.° O direito de caçar nos terrenos coutados pertence a quem fez o coutamento e as pessoas a quem elle previamente tiver auctorisado por escripto.

§ unico. Nos predios murados, ou n'aquelles que, não podendo ser coutados, estejam vedados por sebe viva ou morta, arame, ferro ou madeira, o direito de caçar pertence ao proprietario, emphyteuta ou usufructuario.

Art. 32.º O coutamento e a prohibição administrativa de caçar será publicada por meio de editaes affixados, um na administração do concelho e outro na porta da igreja da freguezia a que pertença o predio.

Art. 33.° Se o animal ferido ou perseguido se refugiar em predio coutado ou vedado por muro, ou em predio que, não podendo ser contado, esteja vedado por sebe viva ou morta, arame, ferro ou madeira e ahi for morto pelos cães que vão em sua perseguição, o caçador póde exigir que o dono do predio ou quem o representar, estando presente, lh'o entregue ou permitta que o vá buscar, mas sem nenhum sequito, e o mesmo succederá quando o animal ahi caír morto.

§ unico. Se, porém, o animal se refugiar, ferido, em predio murado ou contado, ou em predio que, não podendo ser coutado, esteja vedado por sebe viva ou morta, arame, ferro ou madeira, e não for morto pelos cães, não poderá o caçador ir buscal-o sem licença do possuidor do predio ou de quem o representar, estando presente.

Art. 34.° O caçador é responsavel pelo damno que causar.

§ 1.° Sendo mais de um caçador, são todos solidariamente responsaveis pelos damnos.

§ 2 ° O facto da entrada dos cães em predio coutado ou murado, ou n'aquelles que, não podendo ser coutados, estejam vedados por sebe viva ou morta, arame, ferro ou madeira, independentemente da vontade do dono, em seguimento do animal que haja penetrado no dito predio, só produz a obrigação de mera reparação dos damnos que causarem.

§ 3 ° A acção para a reparação do damno prescreve passado trintas dias, contados desde aquelle em que foi commettido.

CAPITULO III

Da veda

Art. 35.° Nos districtos de Lisboa, Beja, Castello Branco, Evora, Faro, Leiria, Portalegre, Santarem e nos das ilhas adjacentes é prohibido caçar desde 1 de março a 14 de agosto inclusive, e nos restantes districtos desde o dia 1 de março a 31 de agosto inclusive.

§ unico. Nos terrenos abortos povoados de pomares e vinha estende-se o periodo da prohibição até ao fim da colheita dos respectivos fructos.

Art. 36 ° O proprietario ou possuidor de predios murados ou vedados por fórma que a caça de pello não possa entrar ou sair livremente póde caçar essa especie de caça nossas propriedades por qualquer modo e em qualquer tempo.

Art. 37.º É permittido aos proprietarios e cultivadores destruir em qualquer tempo nos seus terrenos cultivados os animaes bravios, que se tomarem visivelmente prejudiciaes ás suas sementeiras e plantações

§ 1.° Para poderem usar da faculdade concedida n'este artigo deverá ser pedida licença á auctoridade administrativa, a qual a concederá depois de se informar do que o motivo alegado é verdadeiro e marcará para aquelle effeito um certo numero de caçadas e um praso para a sua realisação.

§ 2.° Igual faculdade teem os proprietarios e cultivadores com relação ás, aves domesticas, no tempo em que nos campos houver terras semeadas, ou cereaes, ou outros fructos pendentes em que possam causar prejuizo.

Art. 38.° É permittido destruir os animaes damninhos ou nocivos, podendo dar-se-lhes caça em todo o tempo o por qualquer processo.

§ unico. Consideram-se animaes damninhos ou nocivos o lobo, o lynce, o javali, a rapoza, a lontra, o texugo, o tourão, a foinha, o gato, a doninha, o rato, a aguia, o abutre, o falcão, o gavião, o milhafre, o bufo, o corão, a gralha, a pêga, o gaio e o melharuce ou abelharuco.

Art. 39.° O individuo que tiver coutado um predio especialmente para exploração de caça viva para repovoação póde apprehendel-a por qualquer fórma e em qualquer epocha

Art. 40.° Somente é permittido caçar desde o começo do crepusculo da manhã ao fim do crepusculo da tarde excepto as aves aquaticas de arribação, que poderão caçar-se de noite a tiro.

Art. 41.º É permittido caçar a salto com ou sem cães de mostra, e ás lebres e coelhos tambem a corricão.

§ unico É prohibida a caça da perdiz a corricão ou a sua perseguição a cavallo.

Art. 42.° È, prohido no exercicio da caça, o uso ou emprego de substancias venenosas, corrosivas ou inebriantes assim como de reclamos, abuizes, laços fios, rêdes, ramos, esperas, ratoeiras, furões e chozes, perdigões ou perdizes de chamada ou qualquer outra especie de armadilhas ou artificios.

§ 1.° Igualmente é prohibido apprehender ou matar os animaes bravios na occasião das roças de mato, das queimadas ou quando se achem cercados pela agua das cheias.

§ 2.° É prohibida a venda de armadilhas a que este artigo se refere.

§ 3.° É prohibido caçar por qualquer processo quando os terrenos se achem cobertos de neve.

Art. 43 ° É prohibido apropriar-se ou destruir em predios alheios e nos predios proprios que não estejam coutados ou vedados por muro, os ninhos, ovos, ninhadas, ou creação de caça de qualquer especie.

Art. 44.° É prohibido caçar ou destruir os pombos correios em todo o tempo e por qualquer processo, salvo o disposto no § 2.° do artigo 37.º

Art. 45.° Por serem uteis á agricultura, é prohibido malar ou apprehender por qualquer fórma as seguintes aves: alveloas, andorinhas, gaivões, guinchos ou ferreiros, taralhão, papa-moscas, toutinegras, fulosas, fuinhos, rouxinol, phylomelas, rabiruivos, piseus, caiadas, cartaxos, petinhas, carriças, solitarios, estrelinhas, chapins, cedovem, foguete, trepadeiras ou marinheiras, pica-paus, papa-formigas ou torcicolo, papa-figos, poupa, rabilongo, rolheiro, calandras ou lavercas, sombrias, cochichos, cotovias, carreirolas, pin-

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6 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

[...] cegonhas, mochos, curoja, lavandiscas, milheiriçoa grifo, pica-osso, noitibó

§ unico. Os governadores civis poderão conceder auctorisações especiaes a pessoas de sua confiança para em todo o tempo apprehenderem aves de qualquer especie, ninhos ou ovos, contanto que seja com um fim scientifico ou util.

Art. 46.º É prohibido deixar caçar os cães durante a veda, ou em qualquer tempo utilisar para o exercicio da caça os cães de guarda de rebanhos.

CAPITULO IV

Transporte e venda

Art. 47.° É prohibida a receptação, transporte, compra ou venda de qualquer especie de caça prohibida durante o tempo defezo, excepto a venda nos tres primeiros dias e a indicada no artigo

Art. 48.º É prohibido vender, transportar ou receptar caça que não tenha sido morta pelos processos permittidos n'esta lei.

Art. 49.º As buscas para apprehensão de caça só podem ser feitas nos hoteis, hospedarias, lojas e domicilios dos negociantes de comestiveis, fabricas de conservas, nos domicilios dos individuos reconhecidos como caçadores furtivos nas estações dos caminhos de ferro, nas ruas e logares abortos ao publico, e a caça apprehendida será entroque ao estabelecimento de beneficencia mais proximo do local da apprehensão.

Art. 60.º Os proprietarios de caça a que se refere o artigo 29.º podem transportal-a a vendel-a mediante auctorisação, por escriptoi, do administrador do concelho a que pertence a propriedade.

CAPITULO V

Fiscalisação

Art. A superintendencia para a execução d esta lei compete aos governadores civis, administradores de concelho ou bairro, commissarios de policia, aos commandantes das secções da guarda fiscal e aos agronomos e silvicultores officiaes.

Art. 52.º Poderão tambem fiscalisar o cumprimento d'esta lei os sociaes das associações da caçadores, que estejam para isso superiormente auctorisados.

Esta auctorisação será concedida pelo governador civil por meio de alvará, em virtude do pedido feito pela direcção das referidas associações.

Art. 53.º São fiscaes directos d'esta lei os regedores, os fiscaes do governo justo das companhias de caminhos de ferro e os empregados dos caminhos do ferro do estado, officiaes de deligencia judiciaes e administrativas, policias, guardas fiscaes, cantoneiros das estradas, guardas, capestras, florestaes ou ruraes, guardas fluviaes, cabos de policia e os guardas particulares ajuramentados.

As associações de caçadores poderão nomear guardas-casa especiaes, os quaes prestarão juramento perante o juiz de direito da respectiva comarca, com o officio de presidente da direcção das referidas associações.

Os guardas particulares poderºao ser ajuramentados, para os effeitos da fiscalisação d'esta lei, a requerimento da proprietario ou arrendatario dos predios ou da caça.

Art. 54.º Os empregados aduaneiros, os fiscaes do sêllo e quaesquer empregados administrativos ou das contribuições indirectas serão considerados como fiscaes accidentaes da lei de caça e deverão levantar o respectivo auto todas as vezes que, no exercicio das funcções do seu cargo, encontrem infracção da presente lei.

CAPITULO VI

Disposições geraes

Art. 55.° Os governadores civis, em casos extraordinarios e por motivo de ordem publica, poderão suspender as licenças para caçar concedidas no seu districto.

Art. 56.° A auctoridade districtal poderá interdizer uma determinada especie de caça pelo espaço de tempo que achar conveniente, para evitar a extincção da mesma especie.

Art. 57.º Os administradores de concelho ou bairro têem o dever de mandar publicar editaes, recordando o cumprimento d'esta lei, quinze dias antes de começar o concluir a veda, sem que o não cumprimento do disposto n'este artigo isento das obrigações impostas n'esta lei.

Art. 58 ° Sempre que haja apprehensão de armadilhas de qualquer especie, serão estas mandadas destruir pela auctoridade competente.

Art. 59.° Quem passar com cães por predio coutado deverá leval-os presos ou açamados.

CAPITULO VII

Fórma do processo

Art. 60.° Os administradores do concelho ou bairro, quando recebam ou mandem levantar qualquer auto por infracção da presente lei, remettel-o-hão, no praso de quarenta e oito horas, ao delegado do procurador regio da comarca onde ella tenha sido commettida.

§ 1.° Se ao administrador do concelho ou bairro for apresentada qualquer queixa por infracção da presente lei, mandará levantar o auto e procederá á competente investigação no praso de quarenta e oito horas, quando as testemunhas sejam residentes no concelho ou bairro e em igual praso remetterá o auto ao delegado do procurador regio da comarca onde a infracção foi commettida.

§ 2.° Quando as testemunhas forem de concelho ou bairro differente, mandará lavrar o competente auto de queixa, que no referido praso remetterá ao delegado do procurador regio, para este promover a formação do respectivo corpo do delicto.

Art. 61.° Os individuos a que se referem os artigos 52.°, 53.° e 54.°, logo que encontrem ou tenham conhecimento de qualquer infracção da presente lei, levantarão d'isso o competente auto, que terá fé em juizo até prova era contrario.

§ unico. Igualmente terão fé em juizo, até prova em contrario, os autos que forem mandados levantar pelas autoridades mencionadas no artigo 51.°

Art. 62.° Os autos a que se refere o artigo antecedente e seu paragrapho serão enviados ao administrador do concelho ou bairro, no praso de quarenta e oito horas.

Art. 63.° Quando a qualquer infracção da presente lei for unicamente applicavel a pena de multa, poderá esta ser voluntariamente paga pelo infractor perante a auctoridade onde pender o processo, sendo cobrada pelo minimo, suspendendo-se o seu proseguimento.

§ unico. Se o processo estiver pendente do poder judicial, ao pagamento de multa acresce e das respectivas custas.

Art. 64.° A indemnisação dos prejuizos causados por infracção d'esta lei póde ser pedida pelo ministerio publico, cumulativamente com a accusação quando o proprietario assim o requeira, declarando a importancia da indemnisação e o juiz apreciará tudo na mesma sentença.

§ l.° Quando seja pedida indemnisação o juiz, antes de marcar dia para julgamento, mandará notificar ao réu a importancia pedida, a qual deverá ser contestada no praso de tres dias, e, send-o, ordenar-se-ha vistoria para determinar a sua importancia.

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SESSÃO N.º 102 DE 4 DE JULHO DE 1899 7

§ 2.° N'este caso as custas da vistoria serão pagas na proporção do vencido.

Art. 65. Todos os delictos e contravenções previstos n'esta lei serão perseguidos perante os tribunaes competentes pelos respectivos agentes do ministerio publico, podendo tambem sel-o por qualquer parte interessada e o processo competente é o de policia correcional.

CAPITULO VIII

Disposições penaes

Art. 66.° Incorre na pena de prisão correcional de cinco dias a tres mezes o multa do 10$000 a 30$000 réis:

1.° Aquelle que caçar durante os mezes em que por esta lei é prohibido o exercicio da caça,

2.° O que em qualquer tempo caçar por qualquer dos modos prohibidos por esta lei.

Art. 67.° Incorre na pena de tres a trinta dias de prisão e multa de 6$000 a 30$000 réis:

1.° O que, sem licença para contar, collocar quaesquer signaes indicativos de coutamento;

2.° Os que, tendo licença, abrangerem com os signaes maior extensão de terreno do que aquella para que têem licença;

3.º Os que conservarem os signaes de coutamento passados trinta dias depois de ter caducado a respectiva licença;

4.° Quem infringir o disposto do artigo 40;

5.° O que, som licença do proprietario ou arrendatario da caça, caçar em terrenos murados, ou coutados, ou vedados, ou que estando em propriedade sua ou auctorisada, ou estrada publica, ou particular, fizer caçar os cães em terrenos circumvejantes e defezos;

6.° O que importar, vender ou subministrar qualquer armadilha para a apanha da caça, e igualmente o que as transportar ou conservar em casa quando não sejam para collecções;

7.° Os proprietarios ou cultivadores que abusarem da auctorisação a que se refere o artigo 37.° e seus paragraphos:

Art. 68.º Será punido com a multa de 6$000 a 10$000 réis.

1.° O que se apoderar da caça agarrada pelo cão em tempo defezo;

2.° Aquelle que durante o tempo da veda deixar vaguear os cães pelos campos sem açamo;

3.° O que, tendo licença, não a apresentar quando lhe for pedida pelas pessoas para isso auctorisadas pela presente lei;

4.° O que apanhar caça pertencente a outrem e se recusar a entregar-lha;

5.° O dono do predio coutado ou murado, ou em predio que não podendo ser coutado, esteja vedado por sebe viva ou morta, arame, ferro ou madeira, ou quem as suas vezes fizer que se recuse a entregar a caça pertencente ao caçador;

6.° O caçador que entrar sem licença em predio coutado ou murado ou em predio que não podendo ser coutado, esteja vedado por sebe viva ou morta, arame, ferro ou madeira.

7.° O que infringir as disposições dos artigos 46.° e 47.°

8.º O que vender, transportar ou receptar caça que tenha sido morta pelos processos prohibidos.

Art. 69.° Incorrem na pena de multa estabelecida no artigo antecedente, quando o transporte seja feito pelo caminho de ferro, os chefes da estação onde for feito o despacho e os conductores dos comboios onde seja feito o transporte, e os chefes das estações de recepção, e quando o transporte seja pela via fluvial o dono, o commandante ou patrão do respectivo barco.

Art. 70.° Incorre na multa de 2$000 a 6$000 réis:

1.° Quem infringir as disposições do artigo 59.°;

2.° Quem infringir as disposições do artigo 45.°;

3.° O que sem licença do dono ou quem as suas vezes fizer, caçar ou seguir animal ferido em terrenos cultivados abertos durante a epocha em que se achem semeados de cereaes ou de outra qualquer sementeira ou plantação annual;

4.° O que caçar ou seguir animal ferido em terrenos que se achem de vinha desde o tempo em que as plantas começam a abrolhar, até á colheita do respectivo fructo;

5.° O que caçar em pomares desde o começo da maturação dos fructos até á sua colheita.

Para proseguir por qualquer das infracções punidas nos n.ºs 3.°, 4.° e 5.°, é preciso queixa do offendido.

Art. 71.° No caso de primeira ou segunda reincidencia de qualquer infracção da presente lei, a pena nunca será inferior a 2/3 do maximo da applicavel.

No caso de terceira ou mais reincidencias, a pena poderá ser elevada ao triplo do maximo da applicavel, sem alteração da fórma do processo, não podendo comtudo ser inferior ao maximo da applicavel pela primeira condemnação e na de privação de licença para caçar por tempo não inferior a dois annos nem superior a cinco.

No caso de condemnação de setima ou mais reincidencias, o delinquente, depois de cumprida a pena, será entregue á disposição do governo para lhe dar o destino mencionado no artigo 10.° da lei de 21 de abril de 1892 e não lhe poderá ser concedida fiança.

Art. 72.° No caso de não ser possivel apprehender as armas e os cães, como determina o artigo 15.°, ou de não ter sido apresentada a licença no praso de vinte e quatro horas concedidas para a sua apresentação, será o delinquente condemnado no mesmo processo correccional na quantia de 10$000 réis de multa por cada arma como indemnisação pela não apprehensão das mesmas e 2$000 réis por cada cão.

Art. 73.° Os pães, tutores são responsaveis civilmente pelo pagamento da indenmisação de damnos, multas e custas do processo impostas ou provenientes de actos praticados em infracção da presente lei pelos filhos menores, pelos tutelados.

Art. 74.° A obrigação de pagamento das multas por transgressão d'esta lei passa aos herdeiros do contraventor quando a sentença tenha passado em julgado.

Art. 75.° Das multas que forem impostas e pagas pertencerá um terço ao denunciante, um terço ao encarregado da fiscalisação que fizer a autuação e um terço para o estado.

Quando não haja denunciante, dois terços da multa pertencerão ao empregado da fiscalisação que fizer a autuação, e no caso da participação ser feita directamente a qualquer das auctoridades encarregadas da superintendencia da execução d'esta lei, os dois terços da multa pertencerão ao participante.

Art. 76.º Para se perseguir por contravenção ou delicto previsto n'esta lei, qualquer funccionario administrativo ou qualquer agente do ministerio publico não é precisa auctorisação do governo.

Art. 77.º O procedimento criminal por contravenções ou delictos previstos n'esta lei prescreve no praso de um anno.

Art. 78.° Fica revogada a legislação em contrario.

Lisboa, 4 de maio de 1899. = O deputado por Macau e Timor, José Capello Franco Frazão.

Lido na mesa foi admittido e enviado ás commissões de administração publica e de legislação civil.

O sr. Tavares Festas: - Presta homenagem aos talentos do sr. Franco Frazão, mas parece-lhe que s. exa. nada sabe do que seja a caça, porque, se assim não fosse, não viria apresentar á camara o projecto que acaba de mandar para a mesa,

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Este projecto não representa só um retrocesso, representa a ultima palavra da reacção.

Pela sua parle, entende que não ha parlamento que o possa votar, desde que elle visa a nada menos do que ao estabelecimento de um monopolio contra os pobres e a favor dos ricos, o que é uma verdadeira iniquidade.

N'este sentido espraia-se o orador em considerações, e conclue protestando contra o projecto, e declarando que ha de combatel-o nas commissões de administração publica e de legislação civil, de que faz parte.

(O discurso será publicado na integra, quando o orador o restituir.)

O sr. Guilherme de Abreu: - Manda para a mesa duas representações: uma da camara municipal do concelho do Cabeceiras do Basto, e outra da camara municipal do concelho de Vieira, pedindo modificações no projecto de reforma eleitoral no sentido do se manter o circulo actual, que o formado por aquelles dois concelhos.

Apresenta algumas considerações em apoio d'estas representações, e pede que sejam publicadas no Diario do governo.

Foram mandadas publicar, e vão por extracto no fim da sessão.

(O discurso será publicado na integra quando o orador o restituir.)

O sr. Presidente: - Vae passar-se á ordem do dia. Os srs. deputados que tiverem papeis a mandar para a mesa podem fazel-o.

O sr. Visconde da Ribeira Brava: - Mando para a mesa o seguinte

Projecto de lei

Artigo 1.° É auctorisado o governo a applicar ao major reformado do exercito, Jorge Higgs, as disposições do artigo 6.° e § 1.° do artigo 7.° da carta de lei de 17 de julho do 1855.

§ unico. Não lhe será abonado maior vencimento antes de na respectiva verba se ler dado vacatura correspondente.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario. = Visconde da Ribeira Brava.

Ficou para segunda leitura.

O sr. Simões Baião: - Apresenta uma justificação de faltas do sr. Avellar Machado.

Vae no fim da sessão.

O sr. Dias Costa: - Mando para a mesa um parecer da commissão de fazenda sobre um requerimento em que Francisco de Paula Gomes da Costa, como representante actual dos herdeiros de Antonio Pedro Virgolino, pede para serem postas á disposição do juizo da 6.ª vara civel de Lisboa varias quantias pertencentes á herança inventariada do tenente general Manuel Gomes de Carvalho e Silva, sua viuva o filho, quantias estas provenientes da venda de bens depositados no extincto deposito publico e erario regio, umas anteriormente a 1833 e outras posteriormente a esse anuo.

Foi a imprimir.

ORDEM DO DIA

O sr. Presidente: - Vae entrar em discussão o projecto de lei n.° 74, reforma eleitoral.

Leu-se na mesa o seguinte

PROJECTO DE LEI N.° 74

Senhores. - "Um projecto eleitoral o sempre, sem contradicção, um dos mais delicados assumptos de que póde occupar-se o parlamento de um paiz; toda a vida politica do um povo se nutro da sua vida parlamentar, se engrandece pela superioridade dos seus representantes, em uma palavra, pela expressão verdadeira e elevada da soberania nacional.

"As propostas de lei que envolvem materia de suffragio são sempre da maior importancia para a vida politica e social dos povos."

Assim escrevia o sr. Augusto Fuschini nos seus relatorios dos projectos eleitoraes de 1883 e 1884, relatorios que, a despeito da critica mais ou menos apaixonada que soffreram, constituem ainda hoje a mais larga e a mais extensa dissertação que sobre o assumpto se tem publicado no nosso paiz.

N'esse mesmo anno de 1884, discutindo aquelles projectos, dizia o illustre estadista o sr. Dias Ferreira:

"Ninguem, por maior que seja o seu talento, e por maior que seja a sua auctoridade, é capaz de resolver com proveito publico as difficuldades que assoberbam a fazenda e a administração sem o concurso directo, immediato e decidido do paiz, e essa cooperação só póde relisar-se de modo decisivo pela eleição de verdadeiros representantes do povo.

Sem eleições livres pedem os governos viver; mas não póde a nação prosperar.

Convencido de que será baldado todo o nosso trabalho para a reorganisação da fazenda ou da economia publica, sem conseguirmos a inteira liberdade do suffragio, ponho duplicado empenho n'este assumpo, e considero a reforma da lei eleitoral como questão vital, que deve prender todas as nossas attenções e obrigar-nos a empenhar todos os nossos esforços."

Estas idéas, que ainda hoje, ou que hoje mais do que nunca são de uma incontestavel actualidade, preoccupam e preoccuparão sempre os homens mais eminentes de todos os paizes regidos pelo systema representativo.

Não póde um paiz levantar-se por largas reformas economicas e financeiras sem que primeiro se levante pela sua situação politica, sem que primeiro affirme pela genuidade da representação parlamentar a força da sua opinião. E, que este tem sido o modo de ver da maior parte dos nossos homens publicos, prova-o á evidencia o numero de decretos e leis eleitoraes que entre nós se tem publicado desde o decreto de 11 de julho de 1822 até á lei de 21 de maio de 1896.

E desde já notaremos para melhor comprovar o nosso asserto, para melhor demonstrar que este estudo preoccupa os nossos homens publicos, que ainda hontem, na ultima situação regeneradora, e a despeito da gravidade do problema economico e financeiro e das durezas da politica internacional, essa situação, em menos de quatorze mezes, publicou dois diplomas, bem differentes e bem diversos nos seus principios e nos seus fins, reformando a legislação eleitoral.

Se a experiencia de poucos mezes bastou para que o mesmo governo, e quasi por completo, modificasse a sua propria reforma, nada póde surprehender, senhores, que, decorridos mais de tres annos, o governo actual, ou o seu chefe, olhando como lhe cumpria aos ensinamentos da pratica que poz em relevo os defeitos da lei de 1896, e mais que tudo ainda ás suas idéas proprias, tão elevadamente defendidas nos seus relatorios, nos seus discursos e nos seus commentarios á legislação eleitoral, viesse, como o fez, apresentar ao estudo e analyse do parlamento a sua proposta de lei n.° 30-A.

Não tem por fim esta proposta fazer uma larga e radical reforma da nossa legislação eleitoral. Alheia a toda a idéa do partidarismo ou facciosismo politico, na accepção restricta da palavra, visa apenas a corrigir em materia essencial alguns defeitos graves que a experiencia poz em loco, e a accrescentar preceitos, por igual imperiosos e

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indispensaveis, que a opinião reclamava. E não está n'isto o seu menor valor.

Não é de um momento para o outro, bruscamente, que reformas radicaes e completas se podem implantar o sobretudo em assumptos d'esta natureza.

«O que se procura traduzir, diz um dos nossos primeiros escriptores politicos, o que é só possivel realisar na organisação social de um povo, não é o edialismo mais ou menos puro de um pensador isolado, mas as idéas e os principios de governação roborados pela força numerica das opiniões homogeneas».

Esperar a lição proveitosa da pratica, o ensinamento da experiencia, dever é este que ao legislador mais que nenhum outro se, impõe.

Não póde nem deve promulgar-se uma larga reforma eleitoral sem que primeiro se estude bem o povo, a que se applica, na sua civilisação especial, nas suas affinidades e tendencias, nas condições do seu temperamento e da sua tradicção historica. Importa primeiro que tudo preparar e educar o meio para depois se fazer a reforma.

«Por mais philosophicas e bem combinadas que sejam as providencias vigentes no estrangeiro, se não forem perfeitamente accommodadas ás circumstancias especiaes em que se acha o nosso paiz, eu pela minha parte não as adopto nem as posso acceitar, porque estou encarregado pelo mandato popular de fazer leis para a nação portugueza e não para qualquer paiz estrangeiro». Assim dizia, e sem rasão, o sr. Dias Ferreira em 1884.

Será pretendermos, pois, fazer uma larga critica ou exposição da multiplicidade dos diversos systemas eleitoraes, como se fez nos relatorios que citámos e na critica a esses relatorios feita pelo sr. Pimenta de Castro e por muitos outros, mesmo porque isso seria impossivel para quem, como nós, de tão pouca força dispõe, e sem mesmo procurarmos referir-nos a tantas publicações que sobre assumptos eleitoraes modernamente se têem publicado no paiz e no estrangeiro, vamos, o mais resumidamente que nos for possivel expor, a nossa opinião sobre os pontos essenciaes da proposta que analysâmos.

Se bem que na proposta do governo se encontrem, porque não foram alterados, a maior parte dos artigos da lei de 1896, e especialmente nos capitulos I, VI, VIII e IX, outros ha que fundamentalmente o foram e, entre estes, alguns cuja doutrina demandaria larga explanação, se essa explanação não estivesse tão brilhantemente feita no relatorio que acompanha a reforma.

Poucas palavras, pois, precisaremos de accrescentar.

1.ª

Inelegibilidades e incompatibilidades

Ha largos annos que entre nós se ventilam as questões relativas á inelegibilidade para deputados e incompatibilidade para o exercicio de suas funcções.

Aqui, como em parte alguma, importa attender ás condições especiaes do nosso meio.

É certo que n'outros paizes ha restricções, e n'alguns importantes, quanto ás condições de elegibilidade prescriptas na lei.

Mas lá mesmo, n'aquelles onde essas condições mais se apertam, nem por isso o parlamentarismo tem vivido em atmosphera mais limpida e mais serena. Nunca, felizmente o par ou deputado portuguez foi descripto com aquella côres sombrias com que, referindo-se aos de outros paizes o fazem Frary e Donnat.

E nada como a experiencia.

Ne nosso parlamento têem entrado quasi todos ou a maio parte dos nossos homens de valor, incluindo aquelles que outros paizes a legislação respectiva não deixaria entrar ela sua lista de incompatibilides. Pois bem: a despeito da pequenez do meio, onde todos e tudo se conhece, é consolador registar que d'este facto não tem resultado, nem para o paiz, nem para o prestigio do parlamentarismo, deslustre algum.

Não abundam infelizmente no nosso paiz tantos homens de saber e de experiencia, que de muitos possamos prescindir no parlamento.

Comprehende se que lá fóra, n'ooutros paizes onde diversas sejam as condições, diversa seja a legislação. Mas lá mesmo, quer-nos parecer, se supprimidas fossem algumas das incompatibilidades, nada com isso soffreria o parlamentarismo no seu prestigio, ou o paiz na sua vida.

Entre nós a experiencia está feita. Viu-se o que davam as prescripções do decreto de 1890 e da lei de 1896.

As disposições da lei de 21 de setembro de 1897 foram, e com rasão, bem acceites.

Ou revogar em grande parte os preceitos estabelecidos, ou amplial-os mais. Não se comprehende que os escolhidos pelos governos perante as companhias ou emprezas tivessem privilegios excepcionaes.

E todos sabem, todos conhecem como é facil illudir n'este ponto a lei. Para que, pois, tal disposição? A quem visa? Aos homens de bem? Para esses seria certamente inutil, porque acima de todas as conveniencias o homem que se presa põe sempre a austeridade do seu caracter e o amor do seu paiz. Para os outros, se os ha, nada aproveita: entrariam da mesma fórma no parlamento e mais a coberto poderiam então praticar o que a lei queria evitar. É contradictoria até tal disposição.

A pratica falla mais alto que todas as theorias que sobre o assumpto possam bordar-se.

Brilhantemente, de uma maneira tão logica como irrefutavel, plenamente se justifica o que affirmamos, na lucidissima exposição que sobre o assumpto faz no seu relatorio o nobre auctor da proposta.

Isto ainda quando para o caso não quizessemos attender aos principios liberaes que nos regem. Será justo o tolher a faculdade que os cidadãos de um paiz livre devem ter de escolher para seus representantes aquelles que, por um conjuncto especial de qualidades, lhes merecem a sua confiança?

Em 4 de março de 1892, combatendo o projecto sobre incompatibilidade que mais uma vez sossobrou, n'essa sessão dizia o illustre chefe do partido regenerador, o sr. Serpa.

«Mas porque ha de privar-se do ser membro do parlamento o par ou deputado que for membro de uma companhia de seguros, de uma companhia para a fabricação de rolhas de cortiça, de uma companhia de exportação de vinhos, de fiação de tecidos ou minas?

«Isso está em completo desaccordo com as tendencias economicas da epocha. Nós temos hoje muito maior numero de sociedades anonymas do que tinhamos ha vinte ou trinta annos, e quem sabe se chegará tempo em que nem mesmo os proprietarios possam explorar as suas terras convenientemente, sem recorrera emprezas ou sociedades?

«Diz muito liem o sr. relator:

«A agricultura, as industrias, o commercio, as artes, as companhias que representam esforços de actividade fomentadora de riqueza nacional, todo o capital que se aventura em emprezas uteis ao paiz, todo o trabalho proficuo individual ou collectivo têm direito incontestavel a serem ouvidos e attendidos nos conselhos da nação.

«Todo o trabalho, todo o capital, o commercio, todos têem direito a ser ouvidos pelos poderes publicos.

«As camaras devem ser representantes de todos os interesses. Pois então os banqueiros podem ser membros do

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parlamento e os gerentes das sociedades anonymas não quando as sociedades anonymas podem ser ámanhã tudo?»

Tal era em 1892 a opinião do illustre chefe do partido regenerador.

Sem a acceitarmos em todos os seus pontos, com ella concordamos na sua generalidade.

E, o que deixamos dito quanto a inelegibilidade, em grande parte o applicâmos ao principio das incompatibilidades.

Não temos, repetimos, tantos homens de assignalado valor que possa prescindir-se no parlamento, como n'outros paizes se prescinde em parte, do nosso funccionalismo. N'elle se encontra grande numero de homens eminentes, cuja falta no parlamento se torna desnecessario avolumar.

E o que, em hypothese nenhuma se comprehende, é que todos estes funccionarios, a que nos referimos, podessem tomar parte no parlamento desde que dispensassem os seus proventos. Parece que era d'estes que resultava a incompatibilidade.

Approva, pois, ainda n'este ponto a vossa commissão a doutrina da proposta.

Commissões de recenseamento

É importantissima a modificação feita pela proposta. Não offerece já hoje discussão que aquellas commissões não podiam ser electivas. Ter a commissão era ter a eleição, como a pratica bem evidentemente o demonstrou.

Se, pois a commissão, formada como o era, representava já um elevado progresso, importava ainda tornal-a quanto mais possivel, estranha á influencia da politica partidaria.

Foi esse o objectivo principal que a proposta leve em vista.

Excessivamente politicas o partidarias, em regra, as commissões districtaes, não podiam pôr de parte a sua origem na nomeação dos membros para as commissões do recenseamento. E, peor que tudo, desconhecendo na maior parte dos concelhos do districto as qualidades das pessoas entre as quaes tinham do fazer a escolha, por isso que os seus membros eram, em geral, da capital do districto curando por informações, geralmente enviadas pelos empregados de confiança dos governos - os administradores dos concelhos - não raro essas nomeações recaírem em quem, como principaes qualidades de recommendação, tinha uma maior falta de escrupulos politicos e quasi sempre o mais vivo facciosismo partidario.

É certo que, tendo esta funcção, que a lei conferia aos eleitos pela commissão districtal, passado para os conservadores, se não póde tambem dizer que a politica fique de todo posta de parte. O que, porém, não póde contestar-se é que ha muitos conservadores que são estranhos á politica partidaria, e que, quanto aos outros, o facto de seguirem idéas politicas diversas, representa já uma notavel compensação e melhoria, accrescentando, o que muito é do registar, que, pela propria dignidade do seu grau e da sua posição, certamente se não prestarão a fazer o que faziam, em geral, os nomeados pela commissão districtal.

E o que com os conservadores pessoalmente se dá, por igual se dará tambem com os individuos por elles nomeados. Não se prestarão certamente, visto terem conhecimento directo das pessoas, a indicar para seus delegados quem não esteja á altura d'essa missão.

Apoiamos tambem o principio de que em logar de ser a camara que nomeie de entre si um membro da commissão, esse membro soja o seu proprio presidente. Pela sua posição especial, dá mais garantias que qualquer outro.

Quanto ao processo para a confecção do orçamento tambem á vossa commissão, senhores, só afigura que, no momento actual, nenhum outro poderia indicar-se que melhores garantias offerecesse.

Em 29 de agosto de 1892 dizia, no prefacio do seu commentario á legislação eleitoral, o illustre e nobilissimo estadista, auctor da proposta que estamos analysando:

«Concentrar o trabalho e a responsabilidade do recenseamento n'um só empregado, sujeito a severas penas impostas pelos tribunaes judiciaes, ás quaes não possa applicar-se a amnistia, pelo menos durante um largo periodo e dar ao recenseamento, depois de organizado, a maior publicidade, fazendo-o imprimir e expor á venda, ainda antes de principiar o praso da recursos, taes são, a nosso juizo, os pontos essenciaes da reforma d'este importantissimo serviço.»

N'estas idéas, expostas ha sete annos, se filia n'este ponto a disposição da proposta que estamos analysando, o quer-nos parecer, senhores, que a sua vantagem é incontestavel.

O secretario da camara que, como tal, tem de viver com camaras das mais diversas cores politicas, e que assim precisa de, como em geral succede, mostrar-se o menos faccioso possivel, estava por esta rasão e ainda mais que tudo pelas especiaes condições da responsabilidade que sobre elle pesa, indigitando para este serviço. Demais, as expressas disposições da proposta quanto á inscripção e eliminação dos eleitores, publicação do recenseamento, etc., deixam de tal fórma a descoberto a responsabilidade do secretario que certamente raro será aquelle que se queira expor á sancção penal.

De tudo isto concluimos que, se não é perfeita, e de certo o não é, a constituição da commissão do recenseamento e o processo da organisação d'este, é comtudo no momento actual o que melhores garantias offerece.

Quanto ainda, senhores, á parte penal da proposta em exame, por igual mereceu ella o nosso apoio. Inuteis se tornariam as disposições que analysâmos, se á sua transgressão não correspondessem penalidades equivalentes.

Em alguns pontos ainda, senhores, entendeu a vossa commissão dever alterar a proposta do governo.

D'entre elles, os principaes são os que se referem aos circulos de Lisboa e Porto e á nomeação dos presidentes das mesas eleitoraes.

Quanto ao primeiro, sente a vossa commissão não estar de accordo com a proposta do governo, mas não póde deixar de preferir aos circulos uninominaes n'estas cidades os circulos plurinominaes, como se acham na legislação em vigor. A intima ligação de interesses e relações entre os habitantes d'estas cidades e a sua illustração, condições estas bem differentes das de todos os outros pontos do paiz, assim o exigem

Centros de excepcional actividade, importa que a lista dos seus representantes attenda ás multiplas condições do seu interesse, e isto só póde fazer-se sendo essa lista plurinominal.

Só assim podem reunir-se os nomes de cidadãos que, pela diversidade das suas aptidões, garantam no seu conjuncto a legitima communhão de aspirações e interesses dos seus mandatarios.

Quanto ao outro ponto - nomeação de presidentes para as mesas eleitoraes - tambem a vossa commissão modificou a proposta do governo. Entendeu ella que a nomeação feita pelo juiz da comarca, podia ter inconvenientes para elle e para a nobilissima classe da magistratura portugueza, que póde e deve conservar-se absolutamente estranha ás luctas politicas locaes.

Assim, e tendo em vista que a commissão do recenseamento é formada o mais imparcialmente que possivel se tornava fazel-o, resolveu deixar á mesma commissão a responsabilidade d'este encargo.

Muitos artigos, como por exemplo nos designados sob os n.ºs l, 3, 5, 6, 20, 22, 24, 42, 43, 45, 53, 55, 69, 73 e 75, fez ainda a vossa commissão ligeiras modificações! perfeitamente em harmonia com o espirito e economia do

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projecto e tendentes apenas a melhor esclarecer as suas disposições.

Entendeu ainda a vossa commissão dever, quanto a formação dos circulos eleitoraes, fazer algumas alterações tendentes a satisfazer os justos interesses dos povos, agrupando-os em harmonia com as suas affinidades, tendencias e tradições, e tendo em vista a sua população, ligações de interesse e vias de communicação.

Concluindo, julga a vossa commissão que merece a vossa approvação o seguinte projecto de lei:

CAPITULO I

Dos eleitores

Artigo l.° São eleitores de cargos politicos e administrativos todos os cidadãos portugueses, maiores de vinte e um annos e domiciliados em territorio nacional, nos quaes concorra alguma das seguintes circumstancias:

1.° Ser collectado em quantia não inferior a 500 réis em uma ou mais contribuições directas do estado;

2.° Saber ler e escrever.

§ unico. Podem ser recenseados com menos de vinte e um annos todos aquelles que tiverem qualquer curso de instrucção superior ou especial.

Art. 2.º Não podem ser eleitores:

1.° Os interdictos, por sentença, da administração de sua pessoa ou de seus bens, e os fallidos não rehabilitados;

2.° Os indiciados por despacho de pronuncia com transito em julgado, e os incapazes de eleger para funcções publicas, por effeito de sentença penal;

3.° Os condemnados por vadios ou por delicto equiparado, nos cinco annos immediatos á condemnação;

4.° Os indigentes; os que não tiverem meios de vida conhecidos; os que se entregarem á mendicidade, ou que para a sua subsistencia receberem algum subsidio da beneficencia publica ou particular;

5 ° Os creados de galão branco da casa real, e os creados de servir, considerando-se como taes os individuos obrigados a serviço domestico na fórma definida pelo codigo civil;

6.° As praças de pret do exercito e da armada, e os assalariados dos estabelecimentos fabris do estado.

CAPITULO II

Dos deputados

Art. 3.° Todos os que têem capacidade para ser eleitores são habeis para ser eleitos deputados, sem condição de domicilio ou residencia.

§ unico. A presumpção legal da elegibilidade só cessa pela prova em contrario.

Art. 4.° São absolutamente inelegiveis para o logar de deputado:

1.° Os estrangeiros naturalisados;

2.° Os membros da camara dos pares;

3.° Os que, nos termos do artigo 7.° do primeiro acto addicional á carta constitucional, não forem habilitados com um curso de instrucção superior, secundaria, especial ou profissional, ou que não tiverem de renda liquida annual 400$000 réis, provenientes de boas de raiz, capitães, commercio, industria ou emprego inamovivel.

Art. 5.º São respectivamente inelegiveis e não podem ser votados para deputados nas divisões territoriaes a que respeitar o exercicio das suas funcções:

1.° Os magistrados administrativos, judiciaes e do ministerio publico;

2.° As auctoridades militares;

3.° Os empregados dos corpos administrativos e os dos governos civis e administrações dos concelhos, e o conservador do registo predial;

4.° Os empregados fiscaes e de justiça;

5.° Os empregados dos serviços technicos dependentes do ministerio das obras publicas.

§ 1.° A inelegibilidade prevista n'este artigo subsiste ainda durante sessenta dias, depois que, por qualquer motivo, o funccionario deixou de servir o cargo na sua circumscripção.

§ 2.° A mesma inelegibilidade abrange os substitutos e interinos que exerçam o cargo em todo, ou em parte do tempo da eleição.

§ 3.º Para todos os effeitos eleitoraes considera-se tempo da eleição todo o decorrido desde a publicação do diploma que designar o dia da eleição até á conclusão do apuramento.

§ 4.° A inelegibilidade prevista n'este artigo não comprehende os funccionarios cuja jurisdicção abrange todo o continente do reino, ilhas adjacentes ou provincias ultramarinas.

Art. 6.º É incompativel o logar de deputado:

1.° Com qualquer emprego da casa real, estando o empregado em effectivo serviço;

2.° Com o logar de concessionario, arrematante ou empreiteiro de obras publicas;

3.° Com o logar de director, administrador, gerente ou membro dos conselhos administrativos ou fiscaes de quaesquer companhias ou sociedades, que recebam subsidio do estado ou administrem alguns dos seus rendimentos;

4.° Com os logares de governador civil e secretario geral e com outro emprego dos governos civis;

5.° Com o logar de administrador de concelho ou bairro, e com os logares das secretarias das administrações do concelho ou bairro, e das secretarias das camaras municipaes;

6.° Com os logares de delegados ou sub-delegados do procurador regio;

7.° Com os logares de governadores das provincias e districtos ultramarinos, respectivos secretarios e chefes de repartições ou serviços; com os logares de juizes de primeira e segunda instancia, ou quaesquer empregos militares das mesmas provincias;

8.° Com os logares das repartições de fazenda dos districtos, e dos concelhos ou bairros;

9.° Com os logares do quadro do serviço interno das alfandegas;

10.º Com as funcções do corpo diplomatico ou consular;

11.° Com o logar de commandante de estação naval.

Art. 7.° Os empregados comprehendidos nas disposições do artigo 6.° podem optar, depois de eleitos, pelo logar de deputado, ou pelo emprego ou commissão.

Art. 8.° Julgadas as eleições e reunida a camara de modo que possa começar legalmente a funccionar, os individuos que houverem de optar não poderão prestar juramento sem que declarem, estando presentes, que optam pelo logar de deputado.

§ 1.° Se estiverem ausentes, a camara lhes fixará logo um praso rasoavel para darem conta da sua opção, sob pena de se entender que resignam o logar do deputado.

§ 2.° Os cidadãos comprehendidos nas disposições dos n.ºs 2.° e 3.° do artigo 6.° não poderão ser admittidos a prestar juramento sem que mostrem, nos referidos prasos, ter cessado legalmente o motivo da incompatibilidade.

Art. 9.° Perde o direito de deputado:

1.° O que acceitar do governo titulo, graça ou condecoração que não lhe pertença por lei;

2.° O que tomar assento na camara dos pares;

3.° O que perder a qualidade de cidadão portuguez;

4.° O que, por sentença com transito em julgado, incorrer em interdicção ou incapacidade previstas no n.° 1.º 6 na ultima parte do n.° 2.° do artigo 2.°;

5.° O que acceitar emprego, commissão, serviço ou situação que o torne incompativel com o logar de deputado;

6.° O que acceitar logar mencionado no n.° 5.° do § unico do artigo 11.°

7.° O que não comparecer a tomar assento na camara na primeira sessão da respectiva legislatura;

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8.° O que abandonar o logar, nos termos do artigo 104.°

§ l.° Todos os deputados que perderem os seus logares em virtude da disposição do n.° 1.°, sómente poderão ser reeleitos passado seis mezes.

§ 2.° Sómente á camara dos deputados compete declarar a perda do logar, em que incorrer algum dos seus membros, fundando-se, salvo nos casos dos n.ºs 7.° e 8.°, em documento authentico comprovativo do facto que a motivar.

Art. 10.° A disposição restricta do artigo antecedente cessa no caso regulado no artigo 33.° da carta constitucional; de modo que, se por algum caso imprevisto, de que dependa a segurança publica ou bem do estado, for indispensavel que algum deputado sáia para outra commissão, ainda que subsidiada, ou emprego retribuido amovivel, a respectiva camara o poderá determinar sem que elle por isso perca o seu logar.

§ unico. Se a camara não obtiver reunida, determinal-o-ha então o governo, dando depois conta ás côrtes.

Art. 11.° Nenhum deputado, depois de proclamado na assembléa de apuramento, póde ser nomeado pelo governo, durante o tempo da legislatura, para cargo, posto retribuido ou commissão subsidiada a que não tenha direito por lei, regulamento, escala, antiguidade ou concurso.

§ unico. Exceptuam-se: 1.°, os cargos de ministro d'estado e de conselheiro d'estado, cuja acceitação não importa a perda do logar de deputado, e cujo exercicio não é incompativel com este logar, 2.°, as commissões auctorisadas pela camara, sem prejuizo do logar de deputado, nos casos previstos no artigo 33.° da carta constitucional; 3.°, o cargo de governador civil; 4.°, as transferencias ou nomeações de funccionarios para logares de igual categoria ou que não tenham maior vencimento; 5.°, as nomeações de funccionarios para logares que por elles possam ser exercidos em commissão, segundo a lei organica dos quadros a que pertencem.

CAPITULO III

Do recenseamento eleitoral

Art. 12.° O direito de votar e verificado em cada concelho ou bairro pelo recenseamento eleitoral, no qual se apurará tambem a elegibilidade absoluta para cargos administrativos.

Art. 13.° O recenseamento eleitoral é organisado na conformidade d'esta lei e revisto annualmente.

Art. 14.° A idade para a inscripção no recenseamento eleitoral deverá completar-se até o dia 30 de junho do anno em que o recenseamento for organisado ou revisto.

Art. 15.° Os eleitores deverão ser recenseados no concelho ou bairro onde residirem a maior parte do anno; os empregados publicos n'aquelle onde exercerem as suas funcções na epocha do recenseamento, e os militares n'aquelle em que na mesma epocha estiver o seu quartel de habitação.

§ 1.° O eleitor que, em concelho ou bairro differente d'aquelle onde estiver residindo, for collectado em alguma das contribuições do estado, predial, industrial, de renda de casas ou sumptuaria, poderá ser inscripto no recenseamento d'esse concelho ou bairro, se assim o declarar perante as commissões de recenseamento de um e de outro, instruindo a sua declaração com documento comprovativo da collecta que tiver pago.

§ 2.° Em Lisboa e Porto poderão ser recenseados no bairro da sua residencia, quando n'outro exerçam as suas funcções, os empregados publicos que assim o declarem perante as commissões de recenseamento dos dois bairros.

Art. 16.° São despezas obrigatorias das camaras municipaes todas as que se fizerem com o expediente do recenseamento eleitoral e das eleições, comprehendendo urnas, cofres e mais objectos indispensaveis.

Art. 17.° As operações do recenseamento serão feitas em cada concelho pelo secretario da camara municipal, auxiliado, sem prejuizo do serviço a que estiverem obrigados, pelos empregados da respectiva secretaria ou pelos da administração do concelho, que elle requisitar.

§ 1.° Nos bairros de Lisboa e Porto o recenseamento será organisado pelos secretarios das administrações, coadjuvados, sem prejuizo do serviço a que estiverem obrigados, pelos empregados das secretarias respectivas ou pelos das camaras municipaes, que elle requisitar:

§ 2.° Os secretarios e os seus auxiliares vencerão a gratificação que a camara lhes arbitrar, sobre proposta da commissão de recenseamento, dentro da verba orçada para este fim como despeza obrigatoria.

Art. 18.° O secretario da camara municipal ou da administração dos bairros de Lisboa e Porto, por editaes affixados com quinze dias de antecedencia, tornará publico o praso dentro do qual são recebidos os documentos e requerimentos a que se referem os n.ºs 2.° e 3.° do artigo 20.°, e passará recibo de todas as petições e documentos que lhe forem entregues pelos interessados.

§ unico. Todos os documentos a que se refere este artigo serão polo secretario classificados e reunidos por freguezias, para servirem de base ás operações do recenseamento.

Art. 19.° O secretario da camara municipal ou da administração dos bairros de Lisboa e Porto não poderá inscrever ou eliminar o nome de nenhum eleitor, ou alterar as circumstancias que a elle respeitem, senão fundando-se em documento ou informação escripta, que requisitar de quaesquer estações officiaes.

§ 1.º As exclusões com fundamento nas disposições dos n.ºs 1.°, 4.°, 5.° e 6.º do artigo 2.° poderão ter por base os esclarecimentos que as auctoridades, funccionarios ou quaesquer pessoas prestem ao secretario, e que serão sempre reduzidos a termo assignado por este e pelos declarantes.

§ 2.° O secretario deverá convocar os parochos e regedores para prestarem informações, que serão da mesma fórma reduzidas a termo.

Art. 20.° A organisação do recenseamento terá por base os seguintes documentos, que até o decimo dia anterior ao começo das operações do recenseamento devem ser enviados ao secretario da camara municipal ou da administração dos bairros de Lisboa e Porto:

1.° Relações, por freguezias, organisadas pelo escrivão de fazenda do concelho ou bairro, contendo os nomes de todos os contribuintes que no lançamento immediatamente anterior foram collectados pelo estado em quantia não inferior a 500 réis de contribuição predial, industrial, de renda de casas, sumptuaria ou decima de juros, sommando-se para este effeito as collectas das mesmas contribuições;

2.° Documentos apresentados pelos interessados provando que, pelo lançamento immediatamente anterior effectuado n'outro concelho ou bairro, perfizeram a quota censitica das contribuições designadas no numero antecedente ou que, tendo sido tributados no anno immediatamente anterior em imposto mineiro ou do rendimento, attingiram igual quota, sommando-se para este effeito a importancia de todas as mencionadas contribuições;

3.° Relações, por freguezias, organisadas pelos parochos, contendo os nomes de todos os que tiverem qualquer curso de instrucção especial ou superior;

4.° Relações organisadas por todos os chefes de serviços publicos do concelho, contendo os nomes de todos os seus empregados, residentes no mesmo concelho, que estiverem nas condições do artigo 1.°;

5 ° Relações organisadas por todos os commandantes de forças militares, contendo os nomes de todos os officiaes que tiverem residencia no concelho;

6.° Requerimentos dos interessados pedindo a propria inscripção no recenseamento pelo fundamento de saber ler e escrever, quando sejam por elles escriptos e assignados, e reconhecidos por tabellião nos termos prescriptos no § unico do artigo 2:436.° do codigo civil, ou authenticados pelos respectivos parochos e visados pelos regedores;

7.° Uma relação de todos os individuos que no anno anterior incorreram nas incapacidades previstas nos n.ºs 2.° e 3.º do artigo 2.°, organisada, segundo o ultimo do-

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micilio que constar, pelos encarregados do registo criminal junto dos tribunaes de l.ª e 2.ª instancia;

8.° Declarações de transferencia de domicilio, em conformidade do disposto nos §§ 1.° e 2.° do artigo 15.°

§ 1.° A contribuição predial sobre fóros, censos ou pensões será attendida em favor d'aquelle por conta de quem for paga.

§ 2.° O imposto do rendimento sobre titulos sómente será levado em conta quando estiverem averbados ha mais de um anno, ininterruptamente, a favor do seu possuidor.

§ 3.º Ao marido se levarão em conta os impostos correspondentes aos bens da mulher, posto que entre elles não haja communhão de bens, e ao pae os impostos correspondentes aos bens do filho, quando por documento authentico se provar que lhe pertence o usufructo d'elles.

§ 4.º A contribuição directa paga por uma sociedade, companhia ou empreza, será attendida para o recenseamento dos socios ou accionistas, em proporção do interesse que cada um provar, por documento authentico, ter na mesma sociedade, companhia ou empreza. A mesma disposição se observará achando-se o casal indiviso, por viverem em commum os membros da mesma familia.

Art. 21.º O secretario da camara municipal ou da administração dos bairros de Lisboa e Porto, examinando todos os documentos e ouvidos os parochos, regedores e informadores das contribuições directas do estado, fará a inscripção dos eleitores e dos elegiveis para cargos administrativos, organisando, por freguezias, relações de todos os eleitores inscriptos, por elle datadas, assignadas e rubricadas, podendo tambem rubrical-as o administrador do concelho ou bairro.

§ 1.° Quando algum dos contribuintes comprehendidos nas relações do escrivão de fazenda não deva ser recenseado, nas mesmas relações ou em folha addicional, o secretario lançará nota, declarando o motivo da exclusão, a qual será rubricada pelo parocho ou regedor, se for fundada em informação de um ou de outro.

§ 2.º A relação deverá declarar a respeito de cada eleitor o seu nome, idade, estado, profissão e morada, o fundamento da sua inscripção, nos termos dos n.ºs 1.° e 2.° do artigo 1.°, mencionando-se no caso do n.° 1.° a collecta respectiva, e se é elegivel para cargos administrativos.

Art. 22.° Organisadas as relações do recenseamento, serão revistas por uma commissão composta de tres vogaes, que serão o presidente da camara municipal, o conservador privativo da comarca e um cidadão officiosamente nomeado pelo juiz de direito de entre os elegiveis para cargos administrativos com residencia no concelho. Nos concelhos que não forem séde de comarca, a commissão será composta do presidente da camara municipal e de dois vogaes officiosamente nomeados, um pelo juiz do direito da comarca ou pelo juiz de direito da vara a que pertencer a séde do concelho, e outro pelo respectivo conservador, de entro os cidadãos elegiveis para cargos administrativos o residentes no mesmo concelho. Nas comarcas onde não houver conservatoria privativa, serão os conservadores substituidos, para os effeitos do recenseamento, pelos delegados do procurador regio. Nos bairros de Lisboa e Porto as commissões serão compostas tambem de tres vogaes, sendo um nomeado pela camara municipal do entre os seus membros effectivos ou substitutos, e outro pelo juiz da vara civel da séde do bairro, e o terceiro pelo juiz do districto criminal da mesma séde, um o outro elegiveis para cargos administrativos e residentes no respectivo bairro.

§ 1 ° O presidente da camara municipal e o conservador ou delegado do procurador regio serão substituidos nas suas faltas e impedimentos por quem do direito for; os vogaes de nomeação do juiz de direito, do conservador ou delegado do procurador regio e das camaras municipaes de Lisboa e Porto serão substituidos, nas suas faltas e impedimentos, por supplentes nomeados pelo mesmo juiz, conservador ou delegado e camaras na occasião da nomeação dos vogaes effectivos, e escolhidos de entre cidadãos com os mesmos requisitos exigidos para estes vogaes.

§ 2.° As nomeações a que se refere o presente artigo serão feitas annualmente e logo communicadas aos nomeados, ao presidente da camara municipal e ao administrador do concelho ou bairro. Estas nomeações, depois de communicadas, são irrevogaveis.

§ 3.° Quando no mesmo cidadão recaír a nomeação feita pelo juiz de direito, conservador, delegado, juiz da vara civel, juiz do districto criminal e camara municipal, preferirá:

1.º A feita pela camara municipal;

2.° A feita pelo juiz de direito; e, em Lisboa e Porto, a feita pelo juiz da vara civel preferirá á do juiz do districto criminal. O administrador do concelho ou bairro participará immediatamente a occorrencia á corporação, cuja nomeação ficar prejudicada e que logo deverá proceder a nova escolha.

§ 4.° A falta de nomeação pelo juiz ou pelo conservador ou delegado será respectivamente supprida pelo presidente da relação ou pelo procurador regio, aos quaes o governador civil, segundo participação do administrador o concelho ou bairro, communicará a omissão; a falta de nomeação pela camara municipal de Lisboa ou Porto será supprida pela commissão districtal.

§ 5.° As nomeações illegalmente feitas pelo juiz de direito, pelo conservador ou delegado, pela commissão districtal ou pela camara municipal serão annulladas pelo presidente da relação, precedendo reclamação da auctoridade administrativa, ou de qualquer eleitor recenseado no respectivo concelho, apresentada dentro de tres dias, depois de findo o praso para as nomeações, sendo ouvido o magistrado, funccionario ou corporação, cuja nomeação é impugnada e que procederá a nova nomeação logo que lhe for communicada a annullação.

§ 6.° Na falta ou impedimento simultaneo de algum vogal da commissão e do seu supplente, será chamado pelo presidente, e na falta d'este pelo vogal mais velho em exercicio, o vogal do anno immediatamente anterior, nomeado pelo respectivo magistrado, funccionario ou corporação, preferindo o effectivo ao supplente.

§ 7.° A commissão será presidida pelo presidente da camara municipal, e nos bairros de Lisboa e Porto pelo vereador designado pela camara municipal.

§ 8.° O cargo de vogal da commissão é gratuito e obrigatorio.

Art. 23.° A commissão de recenseamento funcciona nos paços do concelho ou nas casas da administração dos bairros, devendo a camara fornecer-lhe outra casa quando nos alludidos edificios não possa reunir-se.

Art. 24.° A commissão de recenseamento installa-se, independentemente de convocação, no dia designado por lei, pelas dez horas da manhã, e reune-se diariamente ás horas que designar no dia da sua installação, as quaes serão immediatamente publicadas, bem como o local das reuniões, por meio de editaes.

§ 1.° De todas as sessões da commissão se lavrará acta em livro authenticado com termos de abertura e de encerramento assignados pelo presidente, que numerará e rubricará todas as folhas.

§ 2.° Qualquer eleitor que o requeira, verbalmente ou por escripto, tem direito a rubricar e assignar as actas.

§ 3.° O expediente da commissão é encargo do secretario e empregados designados no artigo 17.° e seu § 1.º

Art. 25.° A commissão não poderá funccionar sem estarem presentes todos os seus membros ou quem legalmente os substitua, e sómente serão validas as suas deliberações quando tomadas por dois votos conformes.

§ unico. No caso de faltar um dos membros da commissão, o seu presidente, ou, na sua falta, o mais velho dos vogaes presentes, convocará por officio para o dia immediato o substituto do vogal que faltar, e, caso este ou o effectivo

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não compareçam, a commissão poderá funccionar só com dois vogaes.

Art. 26.º O administrador do concelho ou bairro assiste ás sessões da commissão e, sobre os assumptos sujeitos a deliberação d'ella, poderá emittir parecer.

Art. 27.º A commissão examinará as relações do recenseamento organisadas pelo secretario da camara municipal ou pelo secretario da administração do bairro e, usando do faculdades iguaes ás d'estes funccionarios, sob as mesmas restricções a que elles estão subordinados, fará nas relações, ouvidos os ditos secretarios, todas as alto rações que julgar justas, mandando proceder á impressão, por freguezias, dos exemplares das relações que lhe parecerem necessarios, para serem affixados nas igrejas das freguezias respectivas, expostos a exame e reclamação na secretario da camara municipal ou da administração do bairro, e distribuidos a todos os parochos e regedores e ás pessoas que os reclamarem, o que tudo se tornará publico por editaes affixados nos logares do estylo.

§ 1.º Da affixação dos editaes e das relações do recenseamento ficarão certidões na secretaria da camara municipal ou da administração do bairro

§ 2 .° Um exemplar da relação dos eleitores de cada frrguezia, authenticada pela commissão, será remettido ao juiz de direito da comarca da séde do concelho, o nas comarcas de Lisboa e Porto ao juiz da primeira vara civel, para ficar archivado em juizo. O juiz, sempre que lhe seja requerido por qualquer eleitor, facultará o exame das mesmas relações.

Art. 28.° Contra a indevida ou inexacta inscripção e contra a omissão de algum cidadão no recenseamento, poderá reclamar, perante a commissão, o proprio interessado, qualquer cidadão do circulo recenseado como eleitor no anno antecedente, com relação a terceiro, e o administrador do concelho ou bairro, e n'um só requerimento se poderá reclamar por muitos ou por todos os que só julgarem prejudicados.

§ 1.° Estas reclamações serão sempre feitas por escripto, assignadas pelo reclamante ou por seu procurador, sendo a assignatura devidamente reconhecida se o reclamante não for a auctoridade publica, e serão logo instruidas com quaesquer documentos que lhes sirvam de prova.

§ 2.° As commissões decidirão publicamente, com a assistencia da auctoridade administrativa e dos interessados, que quizerem assistir, todas as reclamações que lhes tiverem sido feitas; e as decisões, tanto para inscrever como para excluir, serão tomadas summariamente e motivadas com a disposição d'esta lei applicavel ao caso e referencia ao documento em que assenta a applicação d'ella, o que tudo será extractado na acta.

§ 3.° Se contra qualquer inscripção no recenseamento, fundada no facto de saber ler e escrever, houver reclamação contestando esse facto, a commissão fará intimar o eleitor inscripto, para que no praso de tres dias compareça perante ella para escrever e assignar novo requerimento. Não comparecendo, será julgada procedente a reclamação.

§ 4.° As decisões que excluam do recenseamento serão, dentro de tres dias precisos da sua data, notificadas ao excluido pelo secretario da camara municipal ou pelo da administração do bairro ou por outro empregado municipal ou administrativo que a commissão designar para este effeito especial.

§ 5.º Km conformidade com as decisões, a commissão addicionará ás relações do recenseamento de cada freguezia o nome dos que foram, novamente admittidos e eliminará o d'aquelles que forem excluidos, publicando por editaes, afincados nas portas das igrejas parochiaes, as alterações que só houverem feito. Da affixação dos editaes se passará certidão, que ficará archivada, na secretaria da camara municipal ou da administração do bairro, desde as nove horas da manhã até ás tres da tarde, a todas as pessoas que as queiram examinar, as quaes poderão d'ellas tirar copias e fazel-as authenticar por quaesquer officiaes publicos, na fórma das leis.

§ 6.° Dos addicionamentos e eliminações relativos a cada freguezia enviará a commissão relações authenticadas ao juiz de direito da comarca da séde do concelho ou ao juiz de direito da l.ª vara civel nas comarcas de Lisboa e Porto, para ficarem archivadas em juizo. O juiz, sempre que lhe seja requerido por qualquer eleitor, facultará o exame d'estes documentos.

§ 7.° As commissões sómente entregarão aos reclamantes, que as procurarem, as suas petições de reclamação e documentos com as decisões motivadas e assignadas, quando forem integralmente indeferidas; os restantes processos ficarão archivados na secretaria da camara municipal ou da administração do bairro

Art. 29.° Das decisões das commissões do recenseamento, sobre as reclamações que perante ellas tiverem sido interpostas, ha recurso para o juiz de direito da comarca da séde do concelho, que são legitimas para reclamar.

§ 1 ° O recurso interpõe-se perante o juiz de direito por via de petição em que se declarem os seus principaes fundamentos, será instruido com todos os documentos que o recorrente queira offerecer, e será sempre acompanhado do processo da reclamação, quando ao recorrente haja sido entregue.

§ 2.º As reclamações que não forem entregues aos reclamantes serão requisitadas do secretario da commissão do recenseamento pelo juiz de direito, para serem juntas ao recurso que ás mesmas respeitar.

§ 3.° As decisões dos juizes de direito serão motivadas e notificadas aos recorrentes, aos recorridos e á commissão do recenseamento. As notificações dos cidadãos residentes fóra da comarca serão requisitadas por carta de officio do juiz da comarca onde residirem.

§ 4.° A commissão fará nas relações do recenseamento todas as rectificações determinadas nos despachos dos juizes de direito, e tornará publicas as mesmas rectificações por editaes affixados nas portas das igrejas, passando-se certidões da affixação para ficarem archivadas na secretaria respectiva.

Art. 30.° Póde igualmente reclamar se para o juiz de direito competente, nos casos seguintes:

1.° Illegal constituição da commissão de recenseamento em qualquer das suas sessões;

2.° Inobservancia de formalidades e prasos legaes;

3.° Omissão de inscrever cidadãos nas relações de recenseamento quando a commissão tenha decidido recenseal-os;

4 ° Omissão ou recusa de decidir as reclamações apresentadas dentro dos prasos legaes

§ 1.° Nas hypotheses dos n.ºs 1.° e 2.º, os juizes de direito, se considerarem procedentes as reclamações, devem declarar nullas as decisões da commissão do recenseamento o apreciar em seguida a materia das mesmas decisões, julgando-a como for de justiça.

§ 2.° Na hypothese dos n.ºs 3.° e 4.°, serão as reclamações consideradas como indeferidas pela commissâo para o effeito de serem decididas.

§ 3.° Para a decisão das reclamações de que trata este artigo, poderão os juizes requisitar das commissões do recenseamento, das auctoridades administrativas e dos parochos, os esclarecimentos que julgarem convenientes. Não sendo prestados dentro do tempo designado pelos mesmos juizes, serão as reclamações decididas independentemente d'esses esclarecimentos, nos prasos estabelecidos na presente lei.

§ 4.° Os processos das reclamações e recursos a que se referem, este artigo e o antecedente não serão entregues ás partes.

Art. 31.º Das decisões do juiz do direito poderão recorrer para a relação do districto os mesmos que são habeis para recorrer para o juiz de direito, sendo o recurso interposto

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perante aquelle magistrado, independentemente de termo, por meio de petição em que se exponham os seus fundamentos, instruida com os documentos convenientes, podendo ainda juntar se outros dentro de tres dias, findos os quaes o processo será officialmente expedido ao tribunal superior.

§ 1.° O recurso será distribuido na relação como os feitos da 6.ª classe, e o relator o mandará com vista ao ministerio publico, que responderá no praso improrogavel de vinte e quatro horas.

§ 2.° Findo este praso, o escrivão cobrará o feito, fal-o ha concluso ao relator, e este o proporá logo em sessão publica com cinco juizes, sendo a decisão tomada em conferencia por tres votos conformes.

§ 3.° Para o julgamento d'estes feitos poderá haver sessão todos os dias, ainda em tempo de ferias.

Art. 32.° Do accordão da relação podem recorrer para o supremo tribunal de justiça as pessoas designadas no artigo anterior, sendo o recurso interposto independentemente de termo, por meio de petição, que poderá ser instruida com documentos, e dentro de quarenta e oito horas officialmente enviado, sem ficar traslado, áquelle tribunal, onde será decidido sem mais termos que os determinados para o julgamento nas relações nos §§ 1.°, 2 ° e 3.° do artigo antecedente.

§ unico. Não são admissiveis sobre o recenseamento eleitoral outras reclamações ou recursos alem dos estabelecidos n'esta lei.

Art. 33.° Do supremo tribunal de justiça e da relação, logo que transitem em julgado, baixarão officiosamente, sem ficar traslado, todos os recursos eleitoraes; as respectivas decisões serão notificadas ao secretario da camara municipal ou da administração do bairro; e este funccionario, tendo em vista as mesmas decisões e as relações de recenseamento, devidamente organisadas pela commissão e modificadas segundo as decisões d'esta e do juiz de direito, procederá, sob sua responsabilidade, á organisação do livro de recenseamento, seguindo-se na inscripção a ordem alphabetica dos nomes em cada freguezia e agrupando se ou dividindo-se as freguezias conforme a divisão das assembléas. A respeito de cada eleitor se mencionarão as circunstancias exaradas nas relações, nos termos do § 2.° do artigo 21.°

§ unico. O livro do recenseamento será numerado e rubricado em todas as suas folhas pelo presidente da commissão, e terá termos de abertura e encerramento, subscriptos pelo secretario da camara municipal ou da administração dos bairros de Lisboa e Porto, e assignados pelos vogaes da commissão, declarando-se no termo de encerramento o numero de eleitores inscriptos em cada freguezia. Nenhuma alteração poderá ser feita no mesmo livro por ordem de auctoridade alguma.

Art. 34 ° Organisado o recenseamento pela fórma declarada nos artigos antecedentes, será revisto nos annos subsequentes, observando-se nas operações de revisto as disposições seguintes, e ouvindo-se os parochos, regedores e informadores das contribuições directas do estado, nos termos do artigo 19.°:

1 ° O secretario da camara municipal ou da administração dos bairros de Lisboa e Porto, tomando por base o recenseamento vigente, requisitado n'estes bairros ao funccionario competente, deverá eliminar da relação de cada freguezia:

a) Os fallecidos, sendo o obito comprovado por certidão ou pelas relações que, até o decimo dia anterior ao começo das operações do recenseamento, os parochos e officiaes do registo civil devem remetter ao mesmo secretario, relativamente aos obitos occorridos no ultimo anno;

b) Os individuos incursos nas incapacidades previstas nos n.ºs 2.° e 3.° do artigo 2.°, em vista da relação que, até á mesma data e a respeito do mesmo periodo de tempo, devem remetter ao mesmo secretario os encarregados do registo criminal;

c) Os que deixarem de ter o seu domicilio no concelho ou bairro, segundo o que constar ao mesmo secretario, nos termos do artigo 19.°;

d) Os que deverem ser excluidos, em conformidade do disposto no § 1.° do mesmo artigo;

e) Os que no lançamento immediatamente anterior deixarem de ser collectados na indispensavel quota censitica proveniente de contribuição predial, industrial, de renda de casas, sumptuaria ou decima de juros, segundo se mostrar das relações que para esse effeito serão organisadas pelo escrivão de fazenda e por este enviadas ao secretario da camara municipal ou da administração dos bairros de Lisboa e Porto, até o decimo dia anterior ao começo da revisão do recenseamento, e os que no anno immediatamente anterior deixarem de ser tributados em igual quota proveniente de outras contribuições, que servissem de base a sua inscripção, quando o facto se prove por documento.

2.° O secretario da camara municipal ou da administração dos bairros de Lisboa e Porto addicionará ao recenseamento de cada freguezia:

a) Os cidadãos que attingirem a idade legal segundo o disposto no artigo 14.°, em vista de certidão de idade ou de relações remettidaa pelos parochos e officiaes de registo civil ao mesmo secretario, até o decimo dia anterior ao começo da revisão do recenseamento, e do que ao secretario constar sobre as respectivas collectas de contribuições directas do estado, pelas relações enviadas da repartição de fazenda no anno corrente ou nos anteriores;

b) Os que no lançamento immediatamente anterior attingiram a indispensavel quota censitica de contribuição predial, industrial, de renda de casas, sumptuaria ou decima de juros, segundo se mostrar das relações que para esse effeito serão organisadas pelo escrivão de fazenda e por este enviadas ao secretario da camara municipal ou das administrações dos bairros, até o decimo dia anterior ao começo da revisão do recenseamento;

c) Os que deverem recensear-se em vista dos documentos e requerimentos apresentados pelos interessados, nos termos dos n.ºs 2.° e 3.º do artigo 20.°, ou em vista da transferencia de domicilio auctorisada pelas §§ 1.° o 2.° do artigo 15.°

d) Os que se acharem comprehendidos nas disposições do § unico do artigo l.° e nas dos n.ºs 3.°, 4.° e 5 ° do artigo 20.°

§ 1.° A inscripção por saber ler e escrever será mantida, sem novo requerimento, nos recenseamentos dos annos seguintes á primeira inscripção.

§ 2.° São applicaveis ás operações de revisão as disposições dos §§ 1.°, 2.°, 3.° é 4 do artigo 20.° e as dos artigos subsequentes, relativas á organisação do recenseamento, ás reclamações e aos recursos, processando-se em cada anno um livro novo e completo, com os nomes de todos os eleitores que ficarem definitivamente recenseados.

Art. 35.° O secretario da camara municipal é obrigado a guardar e conservar, sob sua responsabilidade, o livro do recenseamento eleitoral, e d'elle, remetterá copia authentica ao governador civil, por intermedio do administrador do concelho ou bairro, e ao juiz de direito da comarca da séde do concelho, e nas comarcas de Lisboa ou Porto ao juiz da 1.ª vara civel, para ficar archivado em juizo.

§ 1.° Dentro de oito dias, e independentemente de despacho, o secretario da camara passará, sem sêllo, todas as certidões que lhe forem pedidas do recenseamento, mediante o emolumento de 5 réis por cada nome transcripto, e conferirá e authenticará, tambem sem sêllo, todas as copias impressas ou lithographadas que para esse effeito lhe forem apresentadas, mediante o emolumento de 1 real por cada nome conferido.

§ 2.º Da copia do recenseamento archivada no governo civil, o secretario geral, nos mesmos termos do paragrapho antecedente e mediante igual emolumento, passará certidões e authenticará, depois de conferidas, as copias impressas ou lithographadas que lhe forem apresentadas. Da

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mesma fórma procederá o competente escrivão de direito em relação á copia do recenseamento archivada em juizo.

§ 3.° Todos os documentos e processos relativos ás operações do recenseamento, que não hajam sido remettidos para juizo, ficarão archivados na secretaria da camara municipal ou da administração do bairro, sob responsabilidade do respectivo secretario.

Art. 36.° Todo o processo eleitoral, comprehendendo o recenseamento, as reclamações, os recursos, os documentos com que forem instruidos, as petições ou requerimentos que a tal respeito se fizerem, o que nos tribunaes judiciaes se ordenar, conforme as disposições d'esta lei, e os reconhecimentos de assignaturas das mesmas petições, requerimentos ou documentos, é isento do imposto do sêllo e de quaesquer emolumentos ou salarios.

§ unico. Os documentos a que se refere este artigo deverão declarar o fim para que são passados e para nenhum outro poderão utilizar-se.

Art. 37.º Todas as auctoridades, funccionarios e repartições publicas são obrigados a passar impreterivelmente, dentro de tres dias, as copias, certidões e attestados que lhes sejam requeridos, para o effeito do recenseamento eleitoral, das reclamações ou dos recursos sobre o mesmo objecto. A mesma obrigação incumbe aos parochos.

Art. 38.º Os prasos para as diversas operações de recenseamento eleitoral são os fixados no quadro junto á presente lei.

§ unico. Quando em algum concelho ou bairro as operações do recenseamento se não effectuarem nos prasos legaes, poderá o governo, ouvidos os fiscaes da corôa e fazenda, em conferencia, fixar novos prasos, analogos aos designados na lei para a realisação das mesmas operações.

Art. 39.° Só é considerado legal para o acto da eleição o recenseamento eleitoral encerrado no dia 30 de junho, immediatamente anterior ao da mesma eleição.

§ unico. No caso de força maior, devidamente comprovado, e na falta de copias authenticas, será considerado legal o recenseamento original ou copia authentica, immediatamente anterior.

CAPITULO IV

Dos circulos eleitoraes, das assembléas primarias e dos actos preparatorios da eleição

Art. 40.° A eleição de deputados é directa e feita pelos circules eleitoraes, designados no mappa junto a esta lei, elegendo cada circulo um só deputado, com excepção dos circulos de Lisboa e Porto que elegerão o primeiro 6 deputados e o segundo 3.

§ unico. A circumscripção dos circulos eleitoraes e o numero de deputados que devem eleger só por lei póde ser alterado.

Art. 41.° No praso de oito dias, contado sobre a data do encerramento do primeiro recenseamento eleitoral organisado sob o vigor da presente lei, as commissões de recenseamento procederão á divisão dos concelhos em assembléas eleitoraes, que serão compostas de 500 a 1.000 eleitores approximadamente, agrupando se na rasão directa da sua proximidade as freguezias que de por si não possam formar uma só assembléa, e no mesmo praso as commissões designarão os edificios publicos ou municipaes em que as assembleias devem reunir-se.

§ 1.° Se n'algum concelho, dentro do praso fixado, a commissão não proceder á divisão de assembléas e designação das suas sédes, ao governo compete supprir a omissão.

§ 2.° A constituirão das assembléas eleitoraes será publicada, logo que findo o praso designado n'este artigo, por editaes affixados nas igrejas parochiaes e na casa da reunião da commissão do recenseamento, e contra ella poderão reclamar perante a commissão, dentro de quinze dias desde a publicação, o administrador do concelho ou bairro, e os eleitores do circulo, observando-se na decisão das reclamações e nos recursos, que subsequentemente forem interpostos, sem effeito suspensivo, para o juiz de direito, para a relação e para o supremo tribunal de justiça, os prasos e mais disposições applicaveis por que se regem as reclamações e recursos sobre recenseamento eleitoral.

Art. 42.° A constituição das assembléas eleitoraes, depois de fixada na forma do artigo anterior, é permanente e só por lei póde ser modificada; porém, quando haja de soffrer alteração por causa da que se fizer na circumscripção de algum circulo eleitoral ou de algum concelho, será convocada por decreto a commissão de recenseamento para proceder ás indispensaveis modificações na constituição das assembléas, observando-se na parte applicavel as disposições do artigo antecedente.

§ 1.° No caso de se verificar pelo recenseamento que o numero de eleitores de uma assembléa desceu a baixo de 500 ou subiu acima de 1:000, o governo por decreto poderá, auctorisar a commissão do recenseamento a alterar a constituição das assembléas eleitoraes do concelho.

§ 2.º A constituição de assembléas fixada para as eleições politicas vigorará igualmente para as eleições municipaes.

§ 3.° São nullos os actos eleitoraes realisados fóra do recinto competentemente designado, salvo o disposto na parte final do § unico do artigo 50.°

Art. 43.° As assembléas eleitoraes serão convocadas por decreto do governo, que designará o dia em que deve proceder-se á eleição, e, no domingo immediatamente anterior ao fixado para este acto, o presidente da commissão de recenseamento, por editaes affixados nos logares do estylo e lidos pelos parochos á missa conventual, tornará publicas as assembléas em que o concelho se divide, os seus limites e os logares de reunião, declarando tambem o dia e a hora em que as assembléas devem reunir-se e a ordem das freguezias por que deve fazer-se a chamada dos eleitores, nos termos do artigo 63 °

Art. 44.° As assembléas primarias serão presididas pelos cidadãos eleitos até ao domingo anterior ao da eleição pela commissão de recenseamento, de entre os elegiveis para cargos administrativos, residentes no concelho ou bairro.

§ 1.° As nomeações serão immediatamente communicadas pelo presidente da commissão aos nomeados e á auctoridade administrativa.

§ 2.º Os nomeados poderão reclamar dentro de quarenta e oito horas, a sua escusa perante a, commissão do recenseamento, que, julgando-a fundada em comprovado impedimento, procederá a nova nomeação dos supplentes até á quinta feira anterior á eleição, communicando logo as novas nomeações aos nomeados e á auctoridade administrativa.

Art. 45.° O presidente da commissão de recenseamento enviará aos presidentes das assembléas eleitoraes, pelo menos dois dias antes do domingo em que deve effectuar-se a eleição, dois cadernos dos eleitores que podem votar nas assembléas, a que elles tiverem de presidir, e cobrará recibo da remessa.

§ 1.° Estes cadernos, que poderão ser impressos ou lithographados, serão a copia fiel do recenseamento original, requisitado do funccionario competente, terão termos de abertura e encerramento assignados pela commissão, e serão por ella rubricados em todas as suas folhas.

§ 2 ° O administrador do concelho ou bairro, e bem assim qualquer eleitor que verbalmente ou por escripto o requeira, poderão assignar e rubricar os mesmos cadernos.

Art. 46.° O presidente da commissão de recenseamento enviará tambem aos presidentes da assembléa, dentro do praso fixado no artigo antecedente, quatro cadernos com

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termo de abertura e rubricas, na fórma por que acima se dispoz, para n'elles se lavrarem as actas da eleição.

CAPITULO V

Da eleição

Art. 47.º No domingo designado por decreto especial do governo para se proceder á eleição, pelas novo horas da manhã, reunidos os eleitores no local competente, lhes proporá o presidente dois de entre elles para escrutinadores, dois para secretarios e dois para supplentes, convidando os eleitores que approvarem a proposta a passar para o lado direito d'elle e para o esquerdo os que a rejeitarem.

§ 1.° Fará a approvação da proposta são necessarias tres quartas partes dos eleitores presentes.

§ 2.° Se a proposta do presidente for approvada por menos de tres quartas partes, mas por mais da quarta parte dos eleitores presentes, ficará a mesa composta do escrutinador, do secretario e do supplente, que o presidente primeiro indicar na ordem da sua proposta, e dos restantes membros indicados por um eleitor de entre os que rejeitarem, se n'essa indicação accordar por acclamação a maioria dos eleitores d'esta parte da assembléa se esta não concordar, procederá á eleição nos respectivos vogaes por escrutinio secreto em que ella só votará, considerando-se eleitos os que obtiverem a maioria relativa.
Servirão de vogaes da mesa d'esta, eleição os vogaes que já fazem parte da mesa eleitoral pela proposta do presidente.

§ 3.° Quando a proposta do presidente for rejeitada por tres quartas partes ou por mais de tres quartas partes dos eleitores presentes, os vogaes da mesa serão eleitos por acclamação, sob proposta de um dos eleitores, que a tenham rejeitado, ou por escrutinio secreto, conforme os casos indicados no paragrapho antecedente. Quando tenha de proceder-se á eleição por escrutinio secreto, a mesa para esta eleição será composta do presidente, de um escrutinador e de um secretario por elle nomeado, cada um de differente lado da assembléa.

§ 4.° A quarta parte do numero dos eleitores presentes, não incluindo o presidente, quando este numero não for multiplo de 4, é a quarta parte do multiplo de 4 immediatamente inferior, sommada com a unidade.

§ 5.° Se em alguma assembléa eleitoral, até duas horas depois da fixada para a eleição, não comparecerem eleitores em numero sufficiente para comporem a mesa, o presidente lavrará ou mandará lavrar auto em que se declare esta falta, e que será assignado por elle, pelo parocho e pela auctoridade administrativa, e logo remettido ao presidente da assembléa de apuramento.

Art. 48.° Da formação da mesa se lavrará acta, e o secretario, que a lavrar, a lerá immediatamente á assembléa.

§ unico. Uma relação contendo os nomes dos approvados ou eleitos para comporem a mesa, assignada pelo presidente e por um dos secretarios, será logo affixada na porta principal do edificio em que a assembléa estiver reunida.

Art. 49.° A mesa eleita antes da hora fixada no artigo 47.° é nulla, e nullos serão todos os actos eleitoraes em que ella interferir.

Art. 50.° Se uma hora depois da fixada para a reunião da assembléa o presidente ainda não tiver apparecido, ou se apparecer e se ausentar antes de constituida a mesa, tomará a presidencia o cidadão que para isso for escolhido pelo maior numero dos eleitores presentes.

§ unico. Presume-se legal a eleição feita no local competente e sob a presidencia do cidadão para esse fim designado. Esta presumpção cessa em vista das provas de tumultos e violencias, que obrigassem uma parte dos eleitores a escolher outro local e presidencia para manifestarem livremente o seu voto.

Art. 51.° Se á mesma hora se não tiverem recebido na casa da assembléa nem os cadernos do recenseamento dos eleitores, nem os cadernos para se lavrarem as actas, que o presidente da commissão de recenseamento devia ter remettido ao presidente da assembléa, a eleição poderá fazer-se por quaesquer copias authenticas do recenseamento, que houverem sido extrahidas do livro competente, e que qualquer cidadão apresentar, e as actas poderão lavrar-se em cadernos com termo do abertura e rubrica da mesa que a assembléa escolher.

Art. 52.° A mesa da eleição será collocada no corpo do edificio, de maneira que todos os eleitores possam por todos os lados ter livre accesso a ella e observar todos os actos eleitoraes.

Art. 53.° Constituida a mesa, serão validos todos os actos eleitoraes que legalmente forem praticados, estando presentes, pelo menos, tres vogaes, sendo o presidente substituido, nos seus impedimentos, pelo escrutinador eleito ou approvado pela maioria da assembléa, preferindo o mais velho, quando ambos hajam sido eleitos ou approvados pela mesma maioria.

Art. 54.° Os parochos e os regedores das freguezias, que constituirem a assembléa eleitoral, assistirão á eleição para informar sobre a identidade dos votantes.

§ 1.° Faltando o parocho ou o regedor, a mesa nomeará pessoas idoneas que façam as vezes d'elles.

§ 2.° As mesas eleitoraes não começarão o acto da eleição sem que o parocho e o regedor da freguezia chamada a votar, ou quem os substituir, esteja presente.

§ 3.° O parocho, ou quem suas vezes fizer, terá logar na mesa ao lado direito do presidente em quanto se estiver procedendo á chamada da respectiva freguezia.

§ 4.° Se houver uma só assembléa no concelho, assistirá ahi á eleição o administrador respectivo; se houver duas, assistirá a uma o administrador e a outra o seu substituto; se houver mais de duas, ou algum d'elles estiver impedido, escolherá o administrador em exercicio pessoa ou pessoas que o representem e em quem delegue as attribuições conferidas por esta lei.

§ 5.° A falta da auctoridade administrativa não impede os actos eleitoraes.

Art. 55.º As mesas decidem provisoriamente as duvidas que se suscitarem ácerca das operações da assembléa.

§ l.° Todas as decisões da mesa sobre quaesquer duvidas ou reclamações, verbaes ou escriptas, serão motivadas.

§ 2.° As decisões serão tomadas á pluralidade de votos. No caso de empate, o presidente tem voto de qualidade.

§ 3.° Qualquer eleitor póde apresentar por escripto, com a sua assignatura ou com outras, se todas forem de eleitores do circulo, protesto relativo aos actos do processo eleitoral e instruil-o com os documentos convenientes.

§ 4.° O protesto e documentos, numerados e rubricados pela mesa, que não poderá jamais negar-se a recebel-os, com o parecer motivado d'esta ou com o contra-protesto de qualquer outro cidadão ou cidadãos tambem eleitores, se assim o tiverem por conveniente, serão appensos ás actas, mencionando-se n'estas simplesmente a apresentação dos protestos e contra-protestos, o seu numero e o nome do primeiro cidadão que os assignar, bem como os pareceres da mesa nas mesmas condições. Os protestos, contra-protestos e documentos que os acompanhem poderão ser, immediatamente á sua apresentação, assignados e rubricados por qualquer eleitor que o requeira verbalmente ou por escripto.

Art. 56.º Nas assembléas eleitoraes não se póde discutir ou deliberar sobre objecto estranho ás eleições. Tudo que alem d'isso se tratar é nullo e de nenhum effeito.

Art. 57.° Aos presidentes das mesas incumbe manter a liberdade dos eleitores, conservar a ordem, regular a policia da assembléa e providenciar para que esta seja livremente accessivel.

Art. 58.° Nenhum individuo póde apresentar-se armado

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nas assembléas eleitoraes e, ao que o fizer, ordenará o presidente que se retire.

Art. 59.° Se o presidente da assembléa eleitoral o julgar conveniente, para a ordem da mesma assembléa, poderá mandar sair do local, onde estiver reunida, todos ou alguns dos individuos presentes, não recenseados, indicando immediatamente na acta o motivo d'esse procedimento.

Art. 60.° A nenhuma força publica é permittido, sob pretexto algum, apresentar-se no local onde se reunirem as assembléas eleitoraes ou na sua proximidade, demarcada por um raio de 100 metros, excepto a requisição feita pelo presidente.

§ 1.º Estando constituida a mesa, o presidente a consultará antes de fazer a requisição.

§ 2.º A força só poderá ser requerida quando seja necessario dissipar algum tumulto ou obstar a alguma aggressão dentro do edificio da assembléa ou na proximidade d'elle, no caso de ter havido desobediencia ás ordens do presidente, duas vezes repetidas.

§ 3.° Apparecendo força publica no edificio da assembléa ou na sua proximidade, suspendem-se os actos eleitoraes, e só poderá proseguir-se n'elles meia hora depois da sua retirada.

§ 4.° Nas terras em que se reunirem as assembléas eleitoraes, a força armada, com excepção dos militares recenseados, conservar-se-ha nos quarteis ou alojamentos durante os actos das assembléas.

Art. 61.° A nenhum cidadão é permittido votar em mais de uma assembléa.

Art. 62.° A votação é por escrutinio secreto, de modo tal que de nenhum eleitor se conheça ou possa vir a saber o voto.

§ unico. Não serão recebidas listas em papeis de côres ou transparentes, ou que tenham qualquer marca, signal, designação ou numeração externa.

Art. 63.° Os vogaes das mesas votam primeiro que todos os eleitores; e, tendo elles votado, mandará o presidente fazer a chamada dos outros, principiando pelas freguezias mais distantes e sempre em harmonia com a publicação feita nos editaes a que se refere o artigo 42.°

Art. 64.° Ninguem póde ser admittido a votar se o seu nome não estiver inscripto no recenseamento dos eleitores. Exceptuam-se:

1.º O presidente da mesa, que póde votar na assembléa a que presidir, ainda que não esteja ali recenseado;

2.° O administrador do concelho ou bairro, ou seu representante, que póde votar na assembléa a que assistir, ainda que n'ella esteja recenseado;

3.° Os cidadãos que se apresentarem munidos de accordãos das relações ou do supremo tribunal de justiça, mandando-os inscrever como eleitores, e que não foram inscriptos antes do encerramento do recenseamento, devendo juntar-se á acta o documento que apresentarem.

§ 1.° Qualquer eleitor inscripto no recenseamento tem o direito de, até quinze dias antes do acto eleitoral, requerer carta de identidade.

§ 2.° Verificada a identidade do requerente, esta carta será passada pela commissão de recenseamento no praso de tres dias, a contar da data da entrega do requerimento ao secretario da camara, o deverá conter o nome, idade o profissão do requerente, mencionando todos os seus signaes caracteristicos, e sendo pelo mesmo requerente assignada, se elle souber escrever.

§ 3.° Se a commissão do recenseamento se negar a passar esta carta, será ella, nas mesmas condições, passada pelo escrivão depositario do recenseamento eleitoral, depois de, por elle, verificada a identidade.

§ 4.° Esta carta poderá ser requerida por um ou por varios eleitores no mesmo requerimento.

§ 5.° A mesa eleitoral não poderá, em hypothese alguma, negar-se a acceitar o voto de qualquer cidadão que, para esse effeito, se apresente com a carta de identidade.

§ 6.° O eleitor que se apresentar com carta de identidade entregará esta com a sua lista ao presidente da mesa.

Art. 65.° Nenhum cidadão, qualquer que seja o seu emprego ou condição, póde ser impedido de votar quando se achar inscripto no respectivo recenseamento, excepto se, contra elle, se apresentar sentença judicial, passada em julgado, que o exclua do recenseamento, ou certidão de despacho de pronuncia, com transito em julgado.

Art. 66.º Ao passo que cada um dos eleitores chamados se approximar á mesa, os dois escrutinadores descarregarão o nome d'elle nos dois cadernos de que se faz menção no artigo 45.°, escrevendo o proprio appellido ao lado do nome dos votantes. O eleitor só então entregará ao presidente a lista da votação, dobrada o sem assignatura, e o presidente a lançará na urna.

§ unico. As listas devem conter um só nome, e o presidente da mesa assim o communicará á assembléa antes de começar a votação.

Art. 67.° Concluida a primeira chamada, o presidente ordenará uma chamada geral dos que não tiverem votado.

Art. 68.° Duas horas depois d'esta chamada, o presidente perguntará se ha mais alguem que pretenda votar, recebendo as listas dos que, immediata e successivamente, se apresentarem. Recolhida qualquer lista, considerar-se-ha encerrada a votação, quando dentro da assembléa não haja eleitor algum que se apresente a votar.

Art. 69.° Encerrada a votação, o presidente fará contar devidamente o numero das descargas postas no caderno do recenseamento e immediatamente o publicará por edital affixação na porta principal da casa da assembléa.

§ 1.° Feita a contagem a que se refere este artigo, serão os cadernos immediatamente fechados e lacrados n'um só maço, devendo este ser rubricado pelos membros da mesa e por qualquer eleitor que verbalmente ou por escripto o requeira, o qual igualmente o poderá sellar com o seu sêllo.

§ 2.° A mesa é obrigada a certificar immediatamente o resultado da contagem das descargas a todo o eleitor que verbalmente ou por escripto o requeira.

§ 3.° Depois de feito o que n'este artigo e seus §§ 1.° e 2.° se prescreve, proceder-se-ha á contagem das listas e o sou resultado será tambem immediatamente publicado por edital affixado na porta da casa da assembléa.

§ 4.° Do resultado obtido pela contagem a que se refere o paragrapho antecedente, é a mesa obrigada a passar immediatamente certidão nos termos do § 1.° d'este artigo.

§ 5.° Na acta se mencionará o resultado da contagem das descargas e das listas.

Art. 70.° Seguir-se-ha o apuramento dos votos, tomando o presidente successivamente cada uma das listas, desdobrando-a e entregando-a alternadamente a cada um dos escrutinadores, o qual a lerá em voz alta e a restituirá ao presidente; o nome dos votados será escripto por ambos os secretarios, ao mesmo tempo que os votos que forem tendo, numerados por algarismos e sempre repetidos em voz alta.

§ unico. O resultado do apuramento de cada dia, até se concluir o escrutinio, será publicado por edital, affixado na porta principal do edificio da assembléa. Do mesmo resultado a mesa é obrigada a passar certidão a qualquer eleitor que a requeira.

Art. 71.º São válidas as listas dos votantes, ainda quando contenham mais de um nome, não se contando, porém, os derradeiros nomes excedentes.

Art. 72.° As mesas eleitoraes apurará os votos que recaírem era qualquer pessoa, sem que hajam de verificar se essa pessoa é absoluta ou relativamente inelegivel, e sem embargo dos protestos que sobre este assumpto podem ser apresentados, nos termos dos §§ 3.° e 4.° do ar-

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tigo 55.°, excepto se os votos forem contidos em listas não conformes ao disposto no § unico do artigo 61.° N'este caso serão taes listas declaradas nullas.

§ unico. As listas annulladas por este ou por outro fundamento legitimo não se contam para effeito algum.

Art. 73.º As listas que as mesas declararem viciadas ou nullas serão rubricadas pelo presidente, e juntar-se-hão ao processo eleitoral, sob pena de nullidade das operações de apuramento. A mesma disposição, e sob a mesma pena, se observará quanto ás listas declaradas válidas contra a reclamação de algum dos cidadãos que formarem a assembléa.

§ 1.° As listas a que se refere este artigo serão tambem rubricadas por qualquer eleitor que o reclame.

§ 2.° Os votos que se contiverem nas listas annulla das serão em todo o caso apurados, mas em separado e separadamente escriptos nas actas.

Art. 74.° Se houver duvida sobre a numeração dos votos, ou se o numero total d'elles não for exactamente igual á somma dos que as listas contiverem, e uma quarta parte dos eleitores presentes reclamar a verificação d'elles, proceder-se-ha a novo exame ou leitura das listas.

Art. 75.º A constituição das mesas, a votação, a contagem das listas e o escrutinio são operações eleitoraes que se praticarão sempre antes do sol posto.

§ 1.° Se a votação se não concluir no primeiro dia, o presidente da mesa eleitoral mandará pelos dois secretarios rubricar nas costas as listas recebidas, e fal-as-ha depois fechar com os mais papeis concernentes á eleição n'um cofre de tres chaves, das quaes ficará uma na sua mão e as outras na de cada um dos escrutinadores. Este cofre deverá ser sellado pelo presidente e por qualquer dos eleitores presentes que assim o requeira, sendo depois guardado com toda a segurança no mesmo edificio em que se procedeu á votação, em logar exposto á vista e guarda dos eleitores, se vinte d'estes, pelo menos, o exigirem, e aberto no dia seguinte, pelas novo horas da manhã, em presença da assembléa, e depois de examinado pelos eleitores que o quizerem fazer, para se proseguir nos actos eleitoraes.

§ 2.° Não havendo reclamação de qualquer eleitor da assembléa, as listas, em vez de rubricadas uma a uma, poderão ser reunidas em um só maço ou em mais, conforme a capacidade do cofre onde têem de ser depois encerradas, nos termos d'este artigo, e fechadas por um envolucro de papel lacrado e sellado, no qual os secretarios lançarão as suas rubricas, sendo facultativo a qualquer dos eleitores presentes rubricar tambem o envolucro e imprimir-lhe algum sêllo ou sinete.

§ 3.° A rubrica das listas ou dos maços de listas e seu encerramento no cofre poderão effectuar-se depois do sol posto.

Art. 76.° Terminando o apuramento, uma relação de todos os votados será publicada por edital, affixado na porta principal da casa da assembléa; em presença da mesma serão queimadas as listas que não estiverem no caso declarado no artigo 73.°, e d'estas circumstancias se fará expressa menção na acta.

§ unico. Dos votos que obtiver cada votado a mesa deverá passar sempre certidão, a requerimento de qualquer eleitor.

Art. 77.° Da eleição se lavrará acta em um dos quatro cadernos de que trata o artigo 46.°, assignada e rubricada pela mesa, e na acta se mencionarão, alem das mais circumstancias relativas á eleição:

1.° Todas as duvidas que occorrerem e reclamações que se fizerem, pela ordem em que foram apresentadas, e decisão motivada que sobre ellas se haja tomado, observando-se ácerca dos protestos escriptos o disposto no § 4.° do artigo 55.º;

2 ° Quantos dias a eleição durou, e quaes as operações eleitoraes effectuadas em cada um d'elles;

3.° O nome de todos os votados e o numero do votos que cada um teve, escripto por extenso;

4.° Os votos annullados e o motivo por que o foram;

5 ° A declaração de que os cidadãos que formam a assembléa outorgam ao deputado que, em resultado dos votos de todo o circulo eleitoral se mostrar eleito, os poderes necessarios para que, reunido com os dos outros circulos eleitoraes da monarchia portugueza, faça, dentro dos limites da carta constitucional e dos actos addicionaes á mesma, tudo quanto for conducente ao bem geral da nação.

§ 1.° As actas poderão ser lithographadas ou impressas nos seus dizeres geraes, e a sua redacção poderá realisar-se depois do sol posto.

§ 2.° Terminada a acta, a requerimento de qualquer eleitor, a mesa será obrigada a passar por certidão o numero de votos obtido por qualquer candidato, segundo o que da mesma acta constar.

§ 3.° Esta acta será assignada e rubricada por todos os eleitores que verbalmente ou por escripto o requeiram.

Art. 78.° D'esta acta tirar-se-hão tres copias authenticas, escriptas nos outros tres cadernos de que trata o artigo 46.°, igualmente assignados e rubricados pela mesa.

§ 1.° Uma d'estas copias será logo remettida ao presidente da assembléa de apuramento do circulo eleitoral, com um dos cadernos de que trata o artigo 45.° e mais papeis relativos á eleição, acompanhados de uma relação escripta por um dos secretarios da mesa, de onde conste especificadamente quaes elles são. A remessa far-se-ha pelo seguro do correio, havendo-o, ou por proprio, que cobrará recibo de entrega.

§ 2.° A outra copia será tambem logo entregue, com outro dos cadernos de que trata o artigo 45.°, ao administrador do concelho ou bairro a que a assembléa pertencer, para que tudo remetia com a devida segurança ao administrador do concelho ou bairro da séde do circulo eleitoral, do qual cobrará recibo.

§ 3 ° A terceira copia será remettida ao presidente da camara municipal do concelho a que a assembléa pertencer, para ahi ser archivada.

Art. 79.° Tanto as actas originaes, como as copias a que se refere o artigo antecedente, serão assignadas por todos os vogaes da mesa, effectivos e supplentes, devendo, comtudo, julgar-se válidas quando forem assignadas, pelo menos, por tres do entre elles. Se algum deixar de assignar, o secretario mencionará esta circumstancia.

Art. 80.° A qualquer cidadão é permittido pedir, e os secretarios das camaras municipaes são obrigados a passar, independentemente de despacho, gratuitamente, sem sêllo e dentro de tres dias, certidões authenticas das actas e mais documentos relativos ás eleições que estiverem guardados nos archivos das respectivas camaras. Todos estes documentos serão, para os effeitos d'esta lei, considerados originaes e authenticos, e dar-se-ha inteiro credito a qualquer certidão legal que d'elles se extraia.

Art. 81.° Os dois escrutinadores serão os portadores da acta original da respectiva assembléa e apresental-a-hâo, no dia designado, na séde do circulo eleitoral.

§ 1.° Quando algum dos escrutinadores tiver motivos que o estorvem de ir á séde do circulo, será substituido pelos secretarios ou pelos supplentes.

§ 2.° Tanto as actas originaes, que são entregues aos portadores, como as copias authenticas e mais papeis que, na conformidade do artigo 78.°, são remettidos para a séde do circulo eleitoral, por via do presidente da assembléa e do administrador do concelho ou bairro, serão fechadas e lacradas, e alem d'isso lavrarão no reverso do sobrescripto os appellidos dos membros da respectiva mesa, postos por letra de cada um

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CAPITULO VI

Do apuramento

Art. 82.° No domingo immediato ao da eleição, pelas nove horas da manhã, reunir se-hão na casa da camara da séde do circulo eleitoral os portadores das actas de todo o circulo, sob a presidencia do presidente da commissão de recenseamento eleitoral; proceder-se-ha logo á formação da mesa, conforme o disposto nos artigos 47.° e seguintes, e observar-se-hão todas as mais disposições applicaveis com respeito á formação das mesas das assembléas primarias e ao modo de manter ahi a liberdade e fazer a policia, competindo para este fim ao presidente da mesa das assembleias do apuramento as mesmas attribuições que pelos citados artigos competem aos presidentes e mesas d'aquellas assembléas.

§ 1.° Se o presidente não comparecer á hora fixada n'este artigo, prover-se-ha á sua falta pela fórma indicada no artigo 50.°

§ 2.° O administrador do concelho da séde do circulo ou do bairro onde se reunir a assembléa de apuramento assistirá a todos os actos da mesma assembléa.

§ 3.° Verificando-se pela reunião dos portadores de actas que não estão ainda concluidos todos os trabalhos de alguma assembléa primaria, ficará adiada para o domingo immediato a constituição da assembléa de apuramento, lavrando-se auto da occorrencia, que será assignado pelo presidente, portadores presentes e auctoridade administrativa.

Art. 83.° Constituida a mesa, o presidente da assembléa lhe apresentará, fechadas e lacradas, as copias das actas que, na conformidade do artigo 78.°, § 1.°, lhe devem ter remettido as assembléas eleitoraes do circulo; os portadores das actas apresentarão tambem os originaes que lhes tiverem sido entregues, e o administrador do concelho ou bairro da séde do circulo apresentará tambem as outras copias legaes que, na fórma do § 2.° do mesmo artigo, lhe devem ter remettido os administradores dos outros concelhos ou bairros do circulo.

Art. 84.° Feita esta apresentação, nomear se hão, pela fórma indicada no artigo 47.° para a formação das mesas das assembléas primarias, as commissões que se julgarem necessarias para a mais prompta expedição dos trabalhos, e por estas commissões se distribuirão proporcionalmente as actas das diversas assembléas do circulo, de maneira, porém, que o exame das actas de uma assembléa não seja nunca encarregado a uma commissão de que sejam membros cidadãos recenseados na mesma assembléa.

Art. 85.° Estas commissões procederão immediatamente ao exame das actas que lhes forem distribuidas, e ao apuramento dos respectivos votos. Do resultado darão conta á assembléa.

Art. 86.° Os pareceres das diversas commissões serão lidos e approvados ou reformados pela assembléa geral dos portadores das actas.

Art. 87.° Approvados ou reformados os pareceres, a mesa procederá immediatamente ao apuramento geral, na conformidade d'elles, a fim de averiguar o numero total de votos que cada um dos cidadãos votados teve em todo o circulo, e sobre isto lavrará um parecer, que será tambem lido e approvado ou reformado pela assembléa.

Art. 88.° As funcções das assembléas de apuramento reduzem-se exclusivamente a examinar, pela comparação das actas originaes trazidas pelos portadores com as copias authenticas subministradas pelo presidente da assembléa e respectivo administrador do concelho ou bairro, e tambem com os cadernos do recenseamento, se aquellas actas originaes são realmente as mesmas que foram confiadas aos portadores pelas mesas, e se os votos que d'ellas consta haver tido cada cidadão na respectiva assembléa são realmente os que elles ahi tiveram, e bem assim
a apurar esses votos. De maneira nenhuma, porém, deixarão de os contar a qualquer cidadão ou poderão annullar as actas das quaes elles constam, com o fundamento de que houve alguma nullidade no recenseamento, na formação das mesas, no processo eleitoral, com o fundamento de que algum dos cidadãos votados é absoluta ou relativamente inelegivel ou com qualquer outro que não seja a falta de authenticidade ou genuinidade expressamente especificadas n'este artigo.

§ unico. Quando, por qualquer caso imprevisto, deixar de ser apresentada á assembléa de apuramento alguma acta original ou alguma das copias a que se referem os artigos antecedentes, far-se ha o apuramento pelas que apparecerem.

Art. 89.° Concluido o apuramento, escrever-se-ha em dois cadernos, assignados e rubricados pela mesa, o numero de votos que teve cada cidadão.

Art. 90.º Será considerado como eleito deputado pelo circulo o cidadão mais votado.

§ 1.° Quando dois ou mais cidadãos tiverem o mesmo numero de votos, proferirá:

1.° O que tiver mais tempo de deputado;

2.° O mais velho;

3.° O que a sorte designar.

§ 2.° O nome do deputado eleito publicar-se-ha por editaes affixados na porta principal da assembléa, e o presidente proclamal-o-ha tambem em voz alta diante de toda ella.

Art. 91.° Qualquer eleitor do circulo poderá apresentar protestos, nos mesmos termos determinados para as assembléas primarias, perante a assembléa de apuramento, que será tambem obrigada a receber os protestos ou contra-protestos que as mesas das assembléas primarias não tenham querido acceitar.

§ unico. Se os protestos apresentados nas assembléas de apuramento tiverem por objecto as operações das assembléas primarias, o presidente da assembléa ouvirá immediatamente os cidadãos que compozeram as mesas das mesmas assembléas, para que informem o que se lhes offerecer ácerca dos protestos, e a resposta, que derem, será junta ao processo eleitoral.

Art. 92.º Do apuramento se lavrará acta, na qual se declarará o nome do deputado eleito, o numero de votos que teve, o como pelas actas das assembléas de todo o circulo eleitoral consta que os eleitores d'elle outorgaram ao cidadão, que se mostrasse haver sido eleito deputado, os poderes do que falla o artigo 77.º

Art. 93.° Da acta do apuramento se entregará copia, assignada por toda a mesa, ao deputado, se presente estiver. Quando este esteja ausente enviar-se-lhe-ha com participação official do respectivo presidente.

Art 94.° A acta de apuramento, conjunctamente com as actas originaes, cadernos o mais papeis que tiverem vindo das assembléas primarias, serão immediatamente remettidos ao presidente do supremo tribunal de justiça, dando-se logo da remessa conhecimento ao ministro e secretario d'estado dos negocios do reino.

§ unico. As copias authenticas das actas, que houverem sido apresentadas pelo presidente, ficarão guardadas no archivo da camara municipal da séde do circulo, e aquellas que tiverem sido apresentadas pelo administrador do concelho ou bairro da mesma séde serão remettidas ao respectivo governador civil, para serem por elle archivadas; excepto no caso em que umas ou outras tenham servido de fundamento para sobre ellas assentar alguma decisão da assembléa de apuramento, porque, n'este caso, terão o mesmo destino do processo eleitoral, ao qual serão juntas.

CAPITULO VII

Do tribunal de verificação de poderes

Art. 95.º O tribunal de verificação de poderes tem por fim conhecer de todos os processos das eleições de depu-

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tados, julgando as reclamações ou protestos apresentados, e, independentemente de reclamações ou protestos, declarando válidas eu nullas as mesmas eleições

§ unico. Contra os actos eleitoraes das assembleias primarias ou de apuramento, e contra a elegibilidade dos deputados eleitos, qualquer eleitor do respectivo circulo póde apresentar reclamação ou protesto escripto e documentado, perante o presidente do tribunal, até á distribuição do processo eleitoral.

Art. 96.° O tribunal de verificação de poderes será composto:

1.° Pelo presidente do supremo tribunal de justiça, que será presidente do tribunal de verificação de poderes, e por tres juizes do mesmo supremo tribunal designados pela sorte;

2.° Por tres juizes da relação de Lisboa e dois juizes da relação do Porto, tambem designados pela sorte.

§ 1.° Quando algum dos magistrados de que tratam os n.ºs 1.° e 2.° d'este artigo, faltar ou estiver impedido, será chamado, para substituir o presidente, o juiz mais antigo do supremo tribunal e, para os restantes juizes, os que lhes forem immediatos em antiguidade.

§ 2.° O sorteio, a que se referem os n.ºs l.° e 2.º d'este artigo, será feito em sessão publica perante o supremo tribunal de justiça.

§ 3 ° O tribunal constituir-se-ha por iniciativa do seu presidente, no dia immediato ao do apuramento da eleição geral de deputados no continente do reino.

Art. 97.° Os processos eleitoraes, contra os quaes não houver protestos ou reclamações, serão julgados no praso maximo de quinze dias, contados desde a sua recepção no tribunal, e os restantes deverão ser julgados no praso maximo de trinta dias, contados de igual data.

Art. 98.° As sessões do tribunal de verificação de poderes serão publicas e anteriormente fixadas em hora e dia por aviso do presidente publicado na folha official.

§ 1.° As discussões serão oraes.

§ 2.° O dia do julgamento será notificado com tres dias de antecedencia, por aviso publicado na folha official, aos candidatos, que poderão comparecer pessoalmente, fazer-se representar por advogados, ou produzir novos documentos até vinte e quatro horas antes do dia fixado para o julgamento. Se algum processo não poder ser julgado na sessão prefixada, ser-lhe-ha no fim d'esta determinado novo dia de julgamento sem necessidade de outra notificação.

§ 3.° Será sempre facultada aos candidatos, ou aos seus advogados, a inspecção directa, na secretaria do tribunal, dos processos eleitoraes e de quaesquer documentos que lhes digam respeito, não estando com vista aos juizes.

§ 4.° O tribunal poderá requisitar de todas as estações officiaes os documentos que entender convenientes e que urgentemente lhe serão remettidos, e no continente poderá mandar proceder a inqueritos, dentro do praso fixado para o julgamento, delegando para esse fim as suas attribuições em magistrados judiciaes, que terão direito de fazer citar testemunhas, nomear peritos e deferir-lhes juramento, corresponder-se com todas as auctoridades e requisitar-lhes as diligencias necessarias para o desempenho da sua commissão, e que enviarão sempre ao tribunal um relatorio em que exponham imparcialmente o seu pensar sobre os factos sujeitos ao inquerito. O magistrado ou magistrados delegados vencerão, a titulo de ajuda de custo, a retribuição que lhes for arbitrada pelo tribunal, e que não excederá 4$500 réis por dia.

§ 5.° O inquerito, quando seja requerido por qualquer dos candidatos nas eleições contestadas, só poderá ser recusado por accordão fundamentado.

Art. 99.° O tribunal de verificação de poderes é competente para conhecer da legalidade de todas as operações eleitoraes dos processos que lhe são affectos e da elegibilidade absoluta e relativa dos deputados a que os mesmos processos respeitam)

§ 1.° São causas de nullidade da eleição as infracções de lei e as faltas de formalidades, bom como, os actos de violencia ou corrupção, devidamente comprovados, que possam influir no resultado geral da votação.

§ 2.° Os actos eleitoraes repetir-se-hão em todo o circulo quando as irregularidades que possam influir no resultado da eleição invalidarem as operações de mais de uma assembléa primaria, aliás sómente se repetirá o acto eleitoral na assembléa primaria em que hajam occorrido taes irregularidades.

§ 3.° As decisões do tribunal designarão individualmente todos os cidadãos votados no circulo e o numero de votos obtidos, qualquer que elle seja, e concluirão sempre por declarar válida ou nulla a eleição do deputado eleito, ou por declarar a necessidade de repetição dos actos eleitoraes em alguma ou em todas as assembléas, consoante os casos previstos no paragrapho antecedente.

§ 4.º As decisões do tribunal serão sempre motivadas e d'ellas não haverá recurso.

§ 5.° Os processos definitivamente julgados, depois de registadas as decisões proferidas, serão remettidos á camara dos deputados, dentro de quarenta e oito horas desde o julgamento, só a camara estiver funccionando, ou logo que se reuna; e as decisões, que determinarem por qualquer motivo a repetição de actos eleitoraes, serão immediatamente communicadas ao governo, que, no praso designado no artigo 100.°, contado da data da decisão, convocará as respectivas assembléas.

§ 6.° As decisões proferidas nas eleições contestadas serão sempre publicadas na folha official.

§ 7.° O tribunal conhecerá das questões relativas á sua constituição e organisará o seu regulamento.

CAPITULO VIII

Da junta preparatoria, da constituição da camara dos deputados e modo de preencher as vacaturas

Art. 100.° Todos os deputados eleitos deverão concorrer no dia e logar aprasado para a reunião das côrtes geraes.

Art. 101.° Logo que se tenha reunido metade e mais um dos deputados eleitos pelos circulos do continente do reino, não se contando para cada deputado a eleição por mais de um circulo, constituir-se hão em junta preparatoria, á qual serão presentes todos os processos, com os respectivos julgamentos, enviados do tribunal de verificação de poderes.

§ unico. Os deputados serão proclamados em conformidade com os julgamentos do tribunal.

Art. 102.° O deputado eleito por mais de um circulo eleitoral representará o da naturalidade; não sendo eleito por este, o da residencia; na falta d'este, o circulo em que tiver obtido maior numero de votos, e em igualdade de votos, o que a sorte designar.

Art. 103.° O deputado eleito póde livremente renunciar o seu logar de deputado, antes de tomar assento na camara, fazendo-o assim constar por escripto á mesma camara.

Art. 104.° O deputado, depois de tomar assento na camara, não póde renunciar o seu logar sem approvação d'ella.

Art. 100.° O deputado, depois de tomar assento na camara, não póde escusar-se a desempenhar as funcções do mesmo logar senão por causa legitima ou justificada perante a camara.

§ 1.° Se, contra o disposto n'este artigo, deixar de comparecer ás sessões por quinze dias consecutivos, será primeira e segunda vez convidado por officio do presidente, precedendo para esse fim deliberação da camara.

§ 2.° Se ainda, apesar d'isso, não se apresentar ou não

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justificar motivo que o impossibilite de comparecer, resolver-se-ha que perdeu o logar de deputado, o qual será declarado vago.

§ 3.° Esta vacatura não poderá ser declarada pela camara sem que, primeiramente, pelo exame de uma commissão, á qual o assumpto seja commettido, se verifique terem-se pontualmente observado todas as solemnidades d'este artigo e seus paragraphos.

Art. 106.° Declarada a vacatura de qualquer logar de deputado, será este facto immediatamente communicado ao governo, para que mande proceder á eleição supplementar no praso de quarenta dias, desde a data da resolução da camara, se o circulo pertencer ao continente do reino, ou no mais breve praso que for compativel com as distancias e meios de communicação, se o circulo pertencer ás ilhas adjacentes ou ao ultramar.

§ unico. Nos actos eleitoraes, que houverem de repetir-se observar-se-hão as formalidades estabelecidas n'esta lei, para a eleição geral de deputados.

CAPITULO IX

Disposições especiaes

Art. 107.° Nas provincias ultramarinas os vogaes da commissão do recenseamento eleitoral serão nomeados pelo conselho de provincia, e o governador escolherá de entre elles o presidente.

§ 1.° Nas mesmas provincias as assembléas primarias serão presididas por cidadãos da livre escolha das commissões do recenseamento.

§ 2.º Continúa em vigor o disposto no artigo 118.° do decreto eleitoral de 30 de setembro de 1852, e em decretos especiaes serão designadas as contribuições directas das mesmas provincias, que deverão levar-se em conta para o calculo da quantia exigida pelo artigo 1.°, alem das contribuições mencionadas no artigo 20.º

Art. 108.° Os governadores das provincias ultramarinas são auctorisados a fixar, com os indispensaveis intervallos e attendendo ás distancias e meios de communicação, os prasos para as operações de organisação e revisão do recenseamento eleitoral e para os diversos actos das eleições

Art. 109.° No caso de annullação da eleição de algum circulo do ultramar, será chamado a represental-o o mesmos cidadão, que o representava na legislatura anterior, até que se apresente á camara, devidamente julgado, o processo eleitoral do respectivo circulo.

Art. 110.° As funcções dos deputados pelas provincias ultramarinas cessam logo que finde a legislatura para que foram eleitos ou em que tomaram assento.

§ 1.° No caso, porém, da dissolução da camara, os deputados das provincias ultramarinas continuarão a represental-as unicamente até que seja apresentado á camara, devidamente julga-lo, o processo eleitoral dos respectivos circulos.

§ 2.° Quando seja reduzido o numero de circulos das mesmas provincias, serão chamados a represental-as, nos termos do paragrapho antecedente, os deputados da anterior legislatura pela ordem designada nos n.ºs 1.°, 2.° e 3.° do § 1.° do artigo 190.°

Art. 111.° Os governadores civis dos districtos insulanos designarão para os recursos eleitoraes, quando os haja, para os subsequentes actos do recenseamento e para a reunião das assembléas de apuramento, os prasos e dias que forem compativeis com os meios de communicação.

CAPITULO X

Disposições penaes e geraes

Art. 112 ° Os parochos, os encarregados do registo criminal, officiaes do registo civil e escrivães de fazenda que deixem de remetter, nos prasos devidos, aos secretarios das camaras municipaes ou aos secretarios das administrações dos bairros de Lisboa e Porto as relações e informações a que são obrigados por esta lei para a organisação e revisão do recenseamento, incorrerão na multa de 40$000 a 100$000 réis

Art. 113.° Os membros das commissões de recenseamento que deixarem de comparecer ás reuniões a que são obrigados ou que, comparecendo, deixarem de cumprir as obrigações que esta lei lhes impõe, incorrerão na multa de 40$000 a 100$000 réis por cada vez que o fizerem.

§ unico. Na mesma pena incorrem todas as pessoas, auctoridades ou funccionarios que deixarem de prestar qualquer esclarecimento ou informação exigido por esta lei para a organisação e revisão do recenseamento eleitoral.

Art. 114.° Os parochos, funccionarios e mais pessoas a que se referem os dois artigos antecedentes, no caso de prestarem falsas declarações, incorrerão na pena de suspensão temporaria dos direitos politicos e na de prisão até seis mezes.

§ unico. Incorrerá na pena de suspensão o escrivão de fazenda que omittir o nome de qualquer contribuinte nas relações que é obrigado a fornecer para a organisação ou revisão do recenseamento eleitoral e, no caso de reincidencia, será demittido.

Art. 115.º Os portadores das actas que deixarem de comparecer na assembléa de apuramento no loca], dia e hora marcado por esta lei, ou que, comparecendo, ahi deixarem de cumprir as obrigações que esta lei lhes impõe, incorrerão em uma multa de 40$000 a 100$000 réis.

Art. 116.° As auctoridades administrativas ou ecclesiasticas que deixarem de comparecer nas assembléas eleitoraes primarias ou de apuramento, para os fins indicados por esta lei, os cidadãos eleitos para vogaes effectivos ou supplentes da mesa que se recusarem a servir ou cumprir alguma obrigação, que lhes for incumbida, incorrerão na multa de 40$000 a 100$000 réis.

Art. 117.° Os presidentes de quaesquer assembléas eleitoraes primarias ou de apuramento que não comparecerem para presidir ás respectivas assembléas no dia, hora e local competente, incorrerão na multai de 50$000 a 100$000 réis.

§ 1.° E se, deixando de comparecer por impossibilidade absoluta, não mandarem entregar no mesmo local, ao presidente que a assembléa houver escolhido para o substituir, todos os papeis concernentes á eleição, que lhes houverem sido entregues, em virtude da lei, uma hora depois d'aquella a que se refere o principio d'este artigo, incorrerão na multa do 100$000 a 200$000 réis.

§ 2.º Serão punidos com a mesma pena aquelles que começarem ou interromperem os actos eleitoraes antes das horas marcadas n'esta lei.

Art. 118.° As auctoridades que se negarem a passar, dentro do praso competente, as copias, certidões ou attestados que lhes forem pedidos, para demonstração do algum direito garantido por esta lei, ou por qualquer modo embaraçarem, ou com qualquer outro pretexto demorarem a passagem d'esses documentos ou a entrega de quaesquer outros que lhes hajam sido confiados, incorrerão na multa de 50$000 a 200$000 réis, e soffrerão a pena de suspensão do emprego pelo espaço de seis mezes a um anno.

§ unico. Se d'este procedimento da auctoridade resultar para algum cidadão a perda do exercicio do direito eleitoral ou de elegibilidade, a multa será duplicada e a pena será de prisão de seis mezes a um anno

Art. 119.° O secretario da camara municipal ou da administração do bairro que deixar de cumprir as obrigações prescriptas n'esta lei, incorrerá na multa de 100$000 a 200$000 réis, e suspensão de um a seis mezes; e, no caso de reincidencia, na pena de demissão, sem prejuizo das penas que lhe sejam applicaveis pelo crime de falsifi-

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cação de documentos, ou por qualquer outro previsto n'esta lei.

Art. 120.° Os juizes de qualquer ordem ou jerarchia, que deixarem de cumprir, dentro dos prasos fixados por esta lei, as obrigações que ella lhes impõe, incorrerão na multa de 50$000 a 100$000 réis e soffrerão a pena de dois a seis mezes de suspensão.

Art. 121.° Todas e quaesquer pessoas particulares ou auctoridades, ás quaes, individual ou collectivamente, seja imposta por esta lei alguma obrigação, se deixarem de a cumprir, incorrerão na multa de 40$000 a 100$000 réis quando outra pena lhes não seja comminada por alguma disposição especial d'ella.

Art. 122.° Todos aquelles que se fizerem inscrever a si ou a outros, ou concorrerem para que elles proprios ou esses outros sejam inscriptos no recenseamento com falso nome ou falsa qualidade, ou encobrindo ou concorrendo para que se encubra uma incapacidade prevista na lei, ou tiverem feito ou concorrido para que se faça a inscripção de um mesmo eleitor em duas ou mais relações de recenseamento, incorrerão na pena de suspensão dos direitos politicos por tempo não inferior a seis annos e na multa de 50$000 a 200$000 réis.

§ unico Todos aquelles que, sendo encarregados por esta lei de fazer o recenseamento dos eleitores e elegiveis inscreverem ou deixarem de inscrever indevidamente e com dolo no recenseamento qualquer cidadão, serão punidos com a pena duplicada.

Art. 123 ° Todo aquelle que, tendo perdido o direito de votar por algum dos motivos indicados n'esta lei, votar não obstante isso, será punido com a pena de prisão de quinze dias a tres mezes e multa de 10$000 a 50$000 réis.

Art. 124.° Todo aquelle que votar em qualquer assembléa eleitoral, quer seja em virtude de uma inscripção obtida ilegitimamente pelo modo previsto no artigo 122.°, quer seja tomando falsamente os nomes e as qualidades de um outro eleitor inscripto, será punido com a pena de prisão de um mez a um anno e multa de 20$000 a 100$000 réis.

§ unico. Será punido com a mesma pena todo o cidadão que se aproveitar de uma inscripção multipla para votar mais de uma vez.

Art. 125.° Todos aquelles que falsificarem ou concorrerem para que seja falsificado o escrutinio: acceitando listas declaradas illegaes por esta lei ou contando os votos que ellas contiverem; pondo ou consentindo que se ponha nota de descarga em eleitores que não votaram; introduzindo illegalmente listas na urna, tirando ou substituindo as que n'ella tiverem sido legalmente lançadas, trocando na leitura das listas o nome dos votados, ou diminuindo votos a uns e accrescentando-os a outros no acto de os assentarem; ou falsificando por qualquer modo a verdade da eleição, serão punidos, em qualquer d'estes casos, com a pena de prisão não inferior a dois annos e multa de 200$000 a 1:000$000 réis.

Art. 126.° Incorrerão na pena comminada pelo artigo anterior todos aquelles que, por qualquer maneira, falsificarem o recenseamento nos cadernos que forem enviados pelas commissões aos presidentes das assembléas eleitoraes primarias, ou quaesquer outros documentos que por ellas lhes forem remettidos; todos aquelles que falsificarem os cadernos, actas e mais papeis respectivos á eleição, que pelas diversas vias estabelecidas por esta lei devem ser remettidos ás assembléas de apuramento; e, em geral, todos aquelles que falsificarem, concorrerem para que se falsifique ou consentirem que se falsifique qualquer documento respectivo ao recenseamento ou ás eleições, e ainda aquelles que deixarem extraviar estes documentos, havendo-lhes sido confiados.

Art. 127.° Todos os portadores das actas que na assembléa de apuramento, contra a disposição do artigo 88.°, as annullarem, por quaesquer motivos que não sejam o de falta do genuidade e authenticidade expressamente marcados n'esta lei; que deixarem, com qualquer fundamento, de contar os votos aos cidadãos votados ou de se conformar com as disposições do mesmo artigo em que lhes são taxativa, restricta e expressamente marcadas as suas funcções; ou que, por qualquer modo, adulterarem a verdade da eleição, incorrerão na pena de prisão não inferior a dois annos, na multa de 200$000 a 1.000$000 réis e na inhabilidade para todas as funcções publicas por espaço de seis annos.

Art. 128.º A cada um dos membros da assembléa primaria ou de apuramento que se oppozer ao exacto cumprimento das disposições dos §§ 3.° e 4.° do artigo 55.°, dos preceitos do artigo 69.°, §§ 1.° e 2.º do artigo 75 °, do § unico do artigo 76.°, do § 2.° do artigo 77.° e do disposto no artigo 91.°, será applicada a pena de prisão de quinze dias a seis mezes e multa de 50$000 a 200$000 réis. O maximo da pena será sempre applicado nos mesmos casos ao presidente da assembléa.

Art. 129.° Aquelles que por via de noticias falsas, boatos calumniosos, promessas ou quaesquer outros artificios fraudulentos, surprehenderem ou desviarem votos, determinarem ou tentarem determinar um ou muitos eleitores a abster-se de votar, um ou muitos portadores de actas a deixar de cumprir as obrigações que lhes são impostas por esta lei, serão punidos com a multa de 20$000 réis a 200$000 réis.

§ unico. Se o delinquente for empregado publico, a pena será, alem da multa, a suspensão de direitos politicos de um mez a um anno.

Art. 130.° Aquelles que, por vias do facto, violencias ou ameaças contra um eleitor, fazendo-lhe recear algum damno para a sua pessoa, familia ou fortuna, o determinarem ou tentarem determinar a votar ou abster-se de votar, influirem ou tentarem influir sobre o seu voto, serão punidos com a pena de prisão de dois mezes a dois annos e multa de 20$000 a 200$000 réis.

§ 1.° Se as vias de facto e violencias forem taes que mereçam pena maior que o maximo aqui estabelecido, ser-lhes-ha essa pena applicada.

§ 2.° Se o delinquente for funccionario publico, a pena será de prisão de dois mezes a dois annos e suspensão dos direitos politicos até tres annos.

Art. 131.° Todo aquelle que entrar armado em uma assembléa eleitoral primaria ou de apuramento será punido com a pena de prisão de um a tres mezes e multa de 10$000 a 100$000 réis.

Art. 132.° A auctoridade militar, por cuja ordem alguma força armada se apresentar no local onde estiverem reunidas as assembléas eleitoraes ou na sua proximidade, sem requisição do respectivo presidente contra o disposto no artigo 60 ° d'esta lei, será punida com a pena de presidio militar até um anno.

§ 1.° Nenhuma ordem vocal auctorisará a infracção do referido artigo.

§ 2 ° Nenhuma ordem por escripto relevará o infractor, excepto a original requisição do presidente da mesa.

Art. 133.° Todos aquelles que, por via de tumultos, vozerias ou quaesquer outras demonstrações ameaçadoras, pretenderem ou tentarem, perturbar as operações da assembléa primaria ou de apuramento, ou attentarem contra exercicio do direito eleitoral ou contra a liberdade de votar, e bem assim todos aquelles que em tumulto entrarem ou tentarem entrar com violencia na assembléa eleitoral, com o fim de impedir a eleição de qualquer cidadão, ou de impor a de um outro, serão punidos com a pena de prisão de seis mezes a dois annos o multa de 100$000 500$000 réis.

§ unico. Se os delinquentes forem armados ou se o escrutinio for violado, a prisão não será inferior a dois annos e a multa será de 200$000 a 1.000$000 réis.

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Art. 134.° Todos aquelles que, durante a reunião das assembléas eleitoraes primarias ou de apuramento, insultarem ou violentarem a mesa, ou lhe faltarem a devida obediencia, insultarem ou violentarem algum dos membros da assembléa, serão punidos com a pena de prisão de tres mezes a dois annos e a multa de 50$000 a 500$000 réis.

§ 1.° Se o escrutinio for violado, a prisão não será inferior a dois annos e a multa será de 200$000 a 1:000$000 réis.

§ 2.° Se as violencias forem taes que mereçam, pea legislação commum, pena maior, ser-lhes-ha essa applicada.

Art. 135.° Aquelle que roubar a uma com as listas recebidas, mas ainda não apuradas, ou roubar algumas listas, será punido com a pena de prisão de seis mezes a dois annos e multa de 100$000 a 500$000 réis.

§ unico. Se o roubo for effectuado em tumulto e com violencia, a prisão não será inferior a dois annos e a multa será deu 200$000 a 1:000$000 réis, e se maior pena, pela legislação commum, couber ás violencias perpetradas, essa deverá applicar-se

Art. 136 ° Todas as auctoridades administrativas e policiaes que, por negligencia, deixarem de empregar todos os meios á sua disposição para obstarem a que se pratiquem as contravenções e delictos prevenidos por esta lei, dentro da area da sua jurisdicção, serão punidas com a pena de demissão ou suspensão do emprego, conforme o grau da culpa.

§ unico. Se o fizerem por malicia, reputar-se-hão cumplices n'essas contravenções ou delictos e, como taes, serão punidas com as penas que estiverem comminadas aos proprios delinquentes.

Art. 137.° Todos os magistrados, auctoridades e empregados que nas circumscripções territoriaes, pelas quaes forem respectivamente inelegiveis, espalharem cartas, proclamações ou manifestos eleitoraes, ou angariarem votos, serão punidos com a pena de prisão de um mez a um anno e suspensão de direitos politicos até seis annos.

Art. 138.° Será punida com a pena de prisão de seis mezes a dois annos e inhabilidade para todos os cargos publicos por quatro a seis annos, toda a auctoridade, seja qual for a sua classe ou categoria, que no dia das eleições fizer, sob qualquer pretexto, e ainda mesmo por motivo de serviço publico, sair do seu domicilio ou permanecer fóra d'elle qualquer eleitor, para que não possa votar.

Art. 139.º Será igualmente punida com a mesma pena toda a auctoridade que conduzir, por si ou por intermedio dos seus subordinados, os eleitores ao local da eleição para darem o seu voto ou os impedir ali de communicarem e tratarem com os outros para accordarem no melhor modo de exercerem o seu direito.

Art. 140.º É prohibido aos administradores de concelho, sob pena de inhabilidade para todos os cargos publicos por quatro annos e multa de 50$000 a 200$000 réis, nomear cabos de policia quinze dias antes das eleições. Durante o mesmo tempo o sob igual fórma é prohibido aos regedores do parochia deferir juramento aos cabos de policia nomeados.

Art. 141.º As auctoridades administrativas ou policiaes que deixarem de participar aos agentes do ministerio publico as contravenções e delictos previstos n'esta lei, e os agentes do ministerio publico que deixarem do immediatamente os perseguir, incorrem na pena de demissão e inhabilidade para qualquer emprego publico por cinco a dez annos, alem da responsabilidade que, por qualquer omissão ou negligencia, lhes caiba para com a fazenda publica.

Art. 142.° Todas as contravenções e delictos que offenderem as disposições d'esta lei ou o direito eleitoral e o exercicio d'elle, comprehendidos nos diversos artigos d'este capitulo, serão sempre perseguidos, perante os tribunaes competentes, pelos respectivos agentes do ministerio publico, e tambem o podem ser por qualquer eleitor inscripto no recenseamento, instaurando-se o processo devido segundo a legislação em vigor.

Art. 143 ° O procedimento criminal por contravenções ou delictos previstos n'esta lei prescrevo no praso de seis mezes desde que forem commettidos.

§ unico. Sómente prescreve no praso de tres annos o procedimento pelo delicto previsto no artigo 132.° e o procedimento contra as auctoridades administrativas ou policiaes e contra os agentes do ministerio publico que para a punição do mesmo delicto deixarem de cumprir o preceito do artigo 141.°

Art 144.° Para se perseguir um funccionario de qualquer ordem ou categoria, ou qualquer agente da auctoridade publica, pelos crimes previstos na presente lei ou pelos que contra o exercicio dos direitos politicos estão previstos no codigo penal, não é necessaria auctotisação do governo.

Art. 145.° Os processos por estes crimes não suspendem em caso algum as operações eleitoraes nem podem prejudicar o segredo do escrutinio.

Art. 146.° A condemnação, quando for pronunciada, não importará nunca a annullação da eleição declarada válida pelo tribunal competente.

Art. 147.° Continuam a ser permittidas todas as reuniões para objectos eleitoraes, tanto publicas como particulares, nos termos da legislação respectiva.

Art. 148.° Fica revogada a lei de 21 de maio de 1896 e toda a legislação em contrario.

MAPPA DOS CIRCULOS ELEITORAES QUE FAZ PARTE DA PRESENTE LEI

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Sala das sessões da commissão especial da lei eleitoral, 11 de junho de 1899. = Frederico Ressano Garcia - Jeronymo Barbosa - Antonio Maria Dias Pereira Chaves Mazziotti = Antonio Cabral = Luiz José Dias = Queiroz Ribeiro = João Pinto aos Santos (com declarações) = Antonio Tavares Festas, relator.

N.º 30-A

Senhores: - Na conclusão do relatorio, que precedeu o decreto dictatorial de 28 de março de 1895, pelo qual foi remodelada, na sua origem e na sua constituição, a camara dos deputados, escreveram os ministros que o assignaram, alludindo ás providencias reformadoras n'elle comprehendidas, estas palavras:

«Julgâmos, senhor, que todas estas disposições são uteis e opportunas, bem como confiâmos, que da sua fiel e leal execução resultará restaurar-se, com o prestigio e a auctoridade de que carece, o regimen parlamentar entre nós, assegurando assim, como é mister, o regular funccionamento das instituições representativas.»

N'este decreto estabeleceu-se a eleição de deputados por districtos administrativos, adoptaram-se disposições restrictivas sobre a elegibilidade e incompatibilidades, limitou se

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a 40 o numero dos funccionarios publicos civis, ecclesiasticas e militares, e a 20 o numero de medicos o advogados que podiam fazer parte, da camara, ordenou-se o sorteio guando os eleitos excedessem aquelles limites, supprimiram-se as commissões de recenseamento electivas, substituindo-as por outras de nomeação das camaras municipaes, das commissões districtaes e dos juizes de direito das respectivas comarcas, e eliminou-se a categoria eleitoral conferida aos chefes de familia.

E com estas providencias suppoz o governo ter fixado preceitos rasoaveis para dar á camara electiva o caracter adequado a uma representação exacta do paiz, a uma imagem fiel, um transumpto verdadeiro dos elementos essenciais da vida nacional.

Como a experiencia deve ter desilludido os que pensaram levantar o prestigio, o engrandecer a auctoridade do regimen representativo, publicando aquella reforma, sabem-n'o todos os que viram eleger e funccionar a camara eleita em execução das suas disposições.

O seu primeiro e immediato effeito foi afastar as opposições da lucta eleitoral, obrigando-as a absterem-se pela impossibilidade de competirem com a influencia da auctoridade em tão vastas circumscripções, como são os districtos administrativos.

A abstenção, como simples expediente politico, sem rasão que a torne justa, sem necessidade que a imponha, não é serio impedimento para os governos, e póde debilitar consideravelmente as opposições.

Quando estas não luctam, porque toda a esperança de exito lhes é defeza, o retruhimento é mais do que um protesto; é a peremptoria e inappellavel condemnação do acto governativo que lhes deixou a inactividade politica por unico recurso de combate.

A nova camara só vieram, em regra, os parciaes do governo que presidiu á eleição. Não foi, portanto, necessario recorrer ao sorteio dos funccionarios publicos e dos advogados e medicos excedentes á taxa legal. A relação dos candidatos propostos ao suffragio popular foi organisada por maneira que não houvesse necessidade de recorrer ao sorteio. Por isso a primeira experiencia da lei não tropeçou n'esta difficuldade.

Não é preciso fazer aqui a apreciação do modo como essa camara foi constituida, como foram organisadas as suas commissões, como funccionou e trabalhou Pertence a historia imparcial essa tarefa. Basta-nos appellar para a consciencia publica. Que ella diga, serena e imparcialmente, se os resultados da experiencia feita no decreto dictorial de 28 de março de 1895 corresponderam ás esperanças, com que tão fernorosamente pareciam contar os ministros que o referendaram.

E tão profunda e rapida foi a sua desillusâo, que elles proprios, abertas as côrtes, não duvidaram reformar a sua reforma, concordando em que fosse alterada pela lei de 21 de maio de 1896, em algumas das suas disposições, e designadamente na que respeitava á divisão dos circulos eleitoraes - ponto fundamental, que principalmente determinára a abstenção das opposições - voltando aos circulos uninominaes com excepção de Lisboa e Porto.

Assim se reconheceu o gravissimo erro commettido na primeira edição da reforma eleitoral, e a inanidade dos argumentos, com que no relatorio do decreto dictatorial com vigoroso dialetica se tentou pôr em evidencia a grande e notavel superioridade do systema de lista, sobre o da representação uninominal, invocando-se o exemplo de cultissimas nações, e a opinião de eminentes publicistas. Em poucos mezes a experiencia estava feita. Os proprios reformadores que fiavam a restauração das instituições representativas da efficacia dos remedios, que lhes applicavam com mão ousada e firme, deram-se logo por convencidos, e não hesitaram em confessar a sua desillusão, rendendoi-se á verdade da doutrina, que pouco antes tinha impagnado.

As outras disposições do decreto dictatorial sobre inelegibilidades e incompatibilidades, que tinham concorrido para arredar da camara alguns dos nossos mais illustres parlamentares, sem proveito da causa publica, nem engrandecimento do regimen constitucional, foram mantidas. E porque nos parece que n'esse e n'outros pontos carece de promptas modificações a lei de 21 de maio de 1896, entendemos dever consignal-as na presente proposta de lei.

Carecia a lei de 21 de maio de 1884 e a legislação anterior de algumas alterações indicadas pela experiencia. As commissões de recenseamento, electivas e essencialmente partidarias, não deviam continuar, porque não recenseavam eleitores e elegiveis, segundo as prescripções legaes: recenseavam, em geral, apenas os seus parciaes, e excluiam os que se lhes figuravam adversos. As accumulações, como foram postas em execução, estavam tambem condemnadas pela opinião imparcial. A representação das minorias, em regra, não produzira os resultados que esta idéa fizera esperar aos seus defensores, e se deu larga representação ás opposições, abriu caminho aos accordos e combinações particulares que substituiram para todos os effeitos os actos eleitoraes, com certo desdouro para o regimen representativo.

A alteração da rganisação das commissões e do processo do recenseamento, constituiram incontestavelmente um melhoramento importante sobre o que estava estabelecido desde o decreto de 30 de setembro de 1852. Cremos, porém, que a organisação, que propomos, das referidas commissões, bom como as modificações no processo do recenseamento, melhoram ainda consideravelmente o que sobre o assumpto se dispoz no mencionado decreto, e na lei de 21 de maio de 1896.

Constituidas, em regra, as commissões pelo presidente, da camara, pelo conservador do registo predial e por um vogal nomeado pelo juiz de direito da respectiva comarca, darão as possiveis garantias de isenção partidaria, e de escrupuloso cumprimento das suas funcções.

Nos concelhos, onde não houver conservador, nem juiz de direito, são dois vogaes nomeados, um pelo conservador e outro pelo juiz de direito da respectiva comarca, entre os elegiveis para os cargos administrativos.

Em Lisboa e Porto adoptaram-se principios analogos, sendo um vogal nomeado pela camara municipal e os outros dois, um pelo juiz de direito da respectiva vara civel, e outro pelo juiz do respectivo districto criminal. Afigura-se-nos que esta organisação assegurará, quanto possivel, a illustração, competencia e imparcialidade das commissões recenseadoras.

Nas operações do recenseamento propõe-se alterações de algum valor. (Concentra-se a organisação do primeiro trabalho nos secretarios das camaras, que a exemplo dos escrivães de fazenda, aos quaes a lei incumbe a feitura das matrizes das contribuições directas do estado, são chamados a formar a matriz eleitoral.

Sob sua immediata responsabilidade hão de proceder a este serviço. Depois vem a commissão do recenseamento revel-o, corrigil-o, supprir-lhe as lacunas, eliminar os eleitores indevidamente inscriptos, addicionar os que o deviam ser, e, concluido esse trabalho, manda-o imprimir, affixar nos logares publicos e expor ao exame dos interessados. Apresentadas quaesquer reclamações, são estas pela commissão examinadas e resolvidas, com recurso para os tribunaes judiciaes.
Julgadas as reclamações e recursos, e encerrado o recenseamento, é este archivado na secretaria da camara municipal e n'um dos cartorios judiciaes, a fim de assegurar a todo o tempo a sua conservação e authenticidade.

Aos tribunaes judiciaes deixa-se apenas o julgamento

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dos recursos, dispensando-os de intervirem no processo, propriamente administrativo, do recenseamento. O restante serviço passa para os secretarios das camaras e para as commissões recenseadoras.

Tambem não acceitâmos as disposições do decreto de 28 de março de 1895 e lei de 21 de maio de 1896, sobre inelegibilidade e exclusão da camara dos administradores, directores, gerentes ou fiscaes de emprezas ou sociedades constituidas por contrato ou concessão especial do estado, ou que d'este hajam privilegio, não conferido por lei generica, subsidio ou garantia de rendimento.

Tendo-se procedido a duas eleições geraes depois da publicação do referido decreto de 28 de março de 1895, póde-se já, em vista da experiencia, apreciar a efficacia e utilidade das disposições restrictivas, que procuraram afastar do parlamento aquella categoria de cidadãos, por se considerar infesta aos interesses publicos a sua concorrencia nos trabalhos legislativos.

Pondo de lado todas as referencias pessoaes, cremos poder affirmar, sem receio de sermos desmentidos pelos factos, que aquellas disposições não influiram sensivelmente nem na composição, nem nas deliberações das camaras. Os que têem querido occupar o seu logar entre os representantes da nação, não acharam nas restricções legaes impedimento sufficientemente efficaz para lhes tolher o accesso ás suas cadeiras. E dos que por cumprirem a lei deixaram de concorrer ás sessões parlamentares, não poderá com rasão dizer-se que a sua ausencia favoreceu os interesses da patria; antes da illustrada cooperação de alguns, insignes pelas altas qualidades do seu espirito, e assignalados pela sua auctoridade e larga experiencia, poderia resultar grande utilidade na direcção dos debates e no acerto das deliberações. Depois, se a exclusão dos que tomam parte na gerencia das emprezas ou sociedades, comprehendidas na lei, é necessitada e imposta pelas conveniencias publicas, porque se hão de exceptuar da excommunhão legal os que por delegação do governo representam n'ellas os interesses do estado? Acaso são estes menos affeiçoados ou dependentes das companhias por serem nomeados pelo governo? Mas sendo tanto os eleitos pelas assembléas geraes, como os de nomeação regia, membros e vogaes das mesmas administrações, e igualmente interessados na sua prosperidade, como se poderá fazer praticamente distincção entre uns e outros sob o ponto de vista da integridade moral e da independencia parlamentar? E quando assim não fosse, a nomeação regia, com todas as suas consequencias, não poderá influir na consciencia e no voto d'aquelles em que recaisse? Os que á escolha do governo deverem a sua entrada e a sua conservação nas companhias, poderão exercer as suas funcções de legisladores com tanto desassombro como os que nada devem senão aos seus eleitores?

A diversidade do processo da designação dos directores ou gerentes d'aquellas sociedades não basta para lhes fechar ou abrir as portas da representação nacional. Uma vez eleitos ou nomeados, prende-os n'uma acção commum a solidariedade dos interesses que representara, e se a defeza d'esses interesses deve considerar-se impedimento legal para o exercicio do mandato legislativo, não é justo que a uns se consinta a accumulação de funcções moralmente incompativeis, ao passo que os outros, só porque não devem os seus logares ao favor o benevolencia dos governos, mas á confiança dos interessados, são afastados das camaras, por suspeitos de sacrificarem a consciencia e o dever ás suas particulares conveniencias, e ás imposições das companhias, que dirigem ou administram.

E se se admitte que a nomeação regia os torna independentes perante essas companhias, não poderá contestar-se que d'ahi mesmo lhes provém em relação ao governo, a que devem a sua escolha, e porventura a permanencia nos sem logares, uma situação pouco desafogada, que não é perfeitamente consentanea á liberdade e desassombro com que deve ser exercido o mandato parlamentar.

É, pois, difficil defender com solidos argumentos a distincção estabelecida na legislação vigente sobre a inelegibilidade dos directores, administradores e fiscaes das sociedades, a que nos referimos; e se as considerações, que deixâmos expostas, são procedentes, ou se ha de ampliar a uns e outros a restricção legal, ou se deve expungir para todos.

Por outra parte, temos para nós que se no simples interesse dos individuos ou collectividades, que em dadas occasiões se possa, achar em conflicto com as conveniencias publicas, se ha de assentar uma suspeição, e n'essa suspeição um impedimento para o desempenho das funcções legislativas, muito longo tem de levar-se a eliminação dos elegiveis para deputados. Maior, muito maior interesse terão muitas vezes na votação de certas leis e na discussão de certos actos os grandes accionistas de poderosas companhias, os abastados proprietarios, os opulentos industriaes, commerciantes e banqueiros, os professores, os magistrados, os militares, os membros do clero, todas as classes, emfim, que constituem a sociedade.

E se os directores, administradores ou fiscaes das companhias não devem ler ingresso nas camaras, tambem o não deveriam ter os seus advogados, consultores, procuradores e empregados. E assim, de inelegibilidade em inelegibilidade, de incompatibilidade em incompatibilidade, chegaremos ao absurdo de tomar impossivel a representação dos grandes interesses nacionaes.

Allega-se a necessidade de pôr o nome e o decoro dos homens publicos ao abrigo de qualquer suspeita: mas a esta consideração poderá responder-se, que melhor defendidos serão esse nome e esse decoro pelo sentimento do dever e pela susceptibilidade e brio individual, do que por quaesquer disposições legaes. E se assim não for, não faltarão meios aos homens de consciencia facil, para, apesar de excluidos pela lei dos logares suspeitos, servirem os interesses das emprezas ou sociedades, que desejarem proteger, e não será tambem difficil ás collectividades protegidas descobrir a maneira de retribuir, sem offensa dos preceitos legaes, os serviços recebidos.

Por outro lado, a propria accumulação de funcções legislativas com as d'aquelles logares será nos homens de honesta consciencia invencivel obstaculo a qualquer procedimento parlamentar, que possa ser attribuido a favor ou cumplicidade com os interesses das companhias que administram ou fiscalisam.

E, depois, onde estão, na historia do nosso parlamento, os abusos com que possa justificar-se a necessidade ou a simples conveniencia de legalisar essa suspeição contra os homens publicos? Quaes são as leis arrancadas á consciencia das maiorias pelos representantes das sociedades ou emprezas, a que alludimos, em favor d'estas, e com prejuizo do paiz? E por outra parte, qual é o resultado das disposições restrictivos até hoje publicadas? Confrontado o periodo anterior a essas disposições com o que vae decorrido depois da sua vigencia, terá subido o prestigio parlamentar, e estará a coberto das suspeitas o decoro dos homens publicos?

A resposta a estas interrogações está nos factos de todos conhecidos. Nem ha abusos em que possa fundar-se a inelegibilidade, ou exclusão, à que alludimos, nem se depara differença sensivel nos actos e deliberações parlamentares posteriores á reforma de 1895.

Do que deixâmos exposto concluimos que foi um erro alterar a disposição do artigo 13.°, n.° 3.° do decreto de 30 de setembro de 1852, que continha o principio mais justo n'esta materia - a incompatibilidade limitada ás exigencias do bem publico; e porque este apenas exige

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que se não permitiu, a accumulação de funcções, que pela divergencia e antagonismo dos interesses, que representam, não podem ser desempenhadas pelos mesmos individuos, sem pôr em conflicto os seus deveres de mandatarios do paiz com os dos cargos que exercem nas sociedades ou emprezas, subsidiadas ou dependentes do estado, parece-nos que só deverão declarar-se incompativeis com as funcções legislativas as de director, administrador, gerente ou fiscal de quaesquer companhias ou sociedades que recebam subsidio do estado ou administrem alguns dos seus rendimentos. E não propomos a inelegibilidade por se nos afigurar injustificavel, visto que o transitorio exercicio d'estes logares não póde constituir uma incapacidade absoluta, nem a influencia, que d'elles resulta, póde tolher a liberdade e a independencia dos eleitores em todos os collegios eleitoraes.

De resto é nossa opinião que, por mais severas prevenções que na lei se preceituem para evitar os abusos que podem resultar da accumulação de funcções legislativas com as de directores, administradores ou fiscaes das companhias, mais ou menos dependentes do estado, taes disposições ou serão inuteis ou inefficazes: inuteis, para os que põem o culto da honra e o respeito da sua dignidade acima de todos os interesses; inefficazes, para os que não escrupulisarem em procurar em faceis expedientes os meios de illudir as comminações legaes. E, assim, estas virão a recair exclusivamente sobre os que, em nenhum caso, ainda que a accumulação lhes fosse consentida, poderiam prejudicar o estado!

Quanto a incompatibilidades dos funccionarios publicos, tambem não concordâmos com todas as que foram estabelecidas na lei de 21 de abril de 1896 revogada já em parte pela de 21 de setembro de 1897. N'um paiz onde não abundam as grandes fortunas, e onde em geral os homens de maior illustração e merecimento têem por unica profissão e carreira o funccionalismo, eliminar directa ou indirectamente da representação nacional os que pela experiencia e peol trato dos negocios têem adquirido a competencia e auctoridade indispensaveis para collaborar nos trabalhos legislativos, não é bem servir a causa publica; é antes privar a camara dos seus mais prestimosos membros, o condemnar o regimen parlamentar a inevitavel decadencia. Não é que nas outras classes não avultem homens de verdadeiro merito e de incontestaveis serviços; mas esses, por eminentes que sejam as suas faculdades, não dispensam, nem supprem de certo a illustrada cooperação dos que na diuturna convivencia com as variadas questões e assumptos do serviço publico, nos seus differentes ramos, adquiriram a idoneidade, que não vem só do talento e da capacidade individual.

Comprehendo-se que n'uma grande nação como a Italia, onde é facil escolher os deputados em todas as outras classes officiaes, se possa prescindir em regra da presença nas camaras dos funccionarios publicos, o que só por excepção sejam ali admittidos os ministros e os sub-secretarios d'estado, os secretarios geraes dos ministerios, os presidentes, vice-presidentes, e membros do conselho d'estado, o procurador geral do thesouro, os presidentes e membros do tribunal de cassação, os presidentes e conselheiros dos tribunaes de appellação, os officiaes superiores de mar e terra, os membros do conselho superior de instrucção publica, de saude, de trabalhos publicos, e de minas, e os professores ordinarios das universidades, e dos institutos em que se conferem graus academicos. Ainda se comprehende que n'esse paiz, onde sem prejuizo da boa constituição do parlamento se podem estabelecer taes incompatibilidades, determinadas especialmente pela conveniencia de não afastar os empregados do exercicio dos seus logares, se reduza a quarenta o numero de deputados, que, por servirem logares não exceptuados da incompatibilidade legal, podem fazer parte da representação nacional, não excedendo os professores a 10, os magistrados a 10, e os restantes funccionarios a 20. E admittida esta limitação, inevitavel era o sorteio, com todas as suas consequencias.

O que da Italia dizemos, é applicavel á Hespanha, onde se adoptaram analogas disposições.

Mas acceitar e não acceitar a incompatibilidade, estabelecel-a de facto para os que não podem prescindir dos proventos dos seus logares, e dispensal-a para os que não carecem d'esses proventos, declarar prejudicial ao estado a intervenção de certas categorias de empregados nos trabalhos parlamentares, e permittil-a desde que renunciem a perceber os seus honorarios durante a legislatura, isso é o que se não pratica na Italia, nem em qualquer outro paiz.

Os funccionarios publicos, a que a lei se refere, isto é, os juizes de direito de l.ª instancia, os officiaes do exercito e da armada em effectivo serviço, com excepção dos officiaes generaes e dos officiaes superiores, os secretarios geraes, directores ou administradores geraes, e directores de serviços de qualquer ministerio, os chefes de repartição de contabilidade, ou de repartição ou secção independentes das direcções dos ministerios, são ou não são prejudiciaes nas camaras? Se são prejudiciaes, pelo que lá podem fazer, ou pelo que deixam de fazer nos seus logares, prohiba-se-lhes absolutamente a sua entrada ali. Se o não são, supprima-se-lhes a incompatibilidade, e mantenha-se o que na nossa legislação desde 1852 até ao decreto de 28 de março de 1895 estava disposto.

A nosso juizo, não ha factos que tornem necessarias as incompatibilidades que se estabeleceram. Nunca os funccionarios publicos declarados incompativeis impediram a approvação de quaesquer providencias que os prejudicassem. A lei de 26 de fevereiro de 1892, que profundamente feriu os interesses do funccionalismo, foi approvada por uma camara onde abundavam os seus representantes. Tambem nunca lhes faltou a independencia para emittirem desassombradamente o seu voto. As opposições contaram sempre entre os seus membros alguns dos nossos mais insignes funccionarios. Alem d'isso, não é tão abundante o numero dos que estão habilitados a bem representar o paiz nas camaras, que possa facilmente dispensar-se o concurso d'aquella classe de cidadãos, e não é justo que, sem demonstrada necessidade, se restrinja o direito de livre escolha dos eleitores. E pelo que respeita ao prejuizo que possa resultar para o serviço publico da ausencia de certos funccionarios durante a temporada parlamentar, deve essa consideração ser attenuada pela vantagem proveniente da sua cooperação nos trabalhos legislativos. O serviço parlamentar não é de certo menos importante do que os outros. Quanto aos militares, as rasões que podem aconselhar a incompatibilidade dos officiaes subalternos, são applicaveis aos superiores. Não sendo estes incompativeis, não o devem ser aquelles.

Por estas rasões omitto na proposta as incompatibilidades estabelecidas no artigo 7.º n.°s 2.°, 3.° e 4.° da lei de 21 de maio de 1896, e não proponho a modificação ou substituição das disposições da lei de 21 de setembro de 1897 que as alteraram.

Mantemos a prohibição da nomeação de deputados, depois de proclamados na assembléa de apuramento, só durante o periodo da legislatura, para cargo, posto retribuido, ou commissão subsidiada, a que não tenha direito por lei, regulamento, escala, antiguidade ou concurso.

Parece-nos que não ha fundamento bastante para prolongar alem do periodo da legislatura as restricções impostas á nomeação de certos logares e funcções publicas,

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alem do periodo legal da legislatura. Terminada esta e findo o mandato parlamentar, os que o exerceram volvem á situação de simples cidadãos, e não seria justo que contra elles se estabeleça ou mantenha uma excepção que os póde prejudicar, por terem sido investidos em funções legislativas, muito honrosas, mas gratuitas.

Restringida a prohibição legal ao tempo da legislatura, cremos que se assegurará a inteireza do mandato, e ficará sufficientemente defendido o decoro parlamentar. Levar mais longe essa prohibição, não só se nos afigura desnecessario, mas poderia afastar das camaras homens de verdadeiro merito, sem vantagem publica, antes com detrimento dos trabalhos parlamentares.

Para a eleição proponho a divisão do reino e ilhas adjacentes em circulos de um só deputado, voltando com algumas modificações ao regimen estabelecido na lei de 1859. A representação das minorias, por meio da votação em lista incompleta, não deu os resultados que se esperavam. O mesmo aconteceu na Italia. Fóra de Lisboa e Porto aquelle generoso principio, destinado a dar aos partidos a sua verdadeira e justa representação, prejudicou toda a vida politica nos circulos plurinominaes onde as eleições passaram a ser feitas por meros accordos entre os dirigentes locaes. Em Lisboa e Porto houve sempre, é verdade, porfiada lucta, mas isso não obstou a que importantes fracções da minoria ficassem por vezes sem representação parlamentar. Com o systema dos circulos uninominaes é possivel dar ás forças eleitoraes, convenientemente disciplinadas, maiores facilidades de triumpho. E a prova está em que, durante a vigencia da referida lei de 1859, sempre as minorias obtiveram tão larga representação parlamentar, que muitas vezes se tomou difficil a marcha dos governos pela exiguidade numerica das maiorias. Não raro acontecia que a differença entre estas e a opposição não excedia a 5 ou 6 votos. Para remediar esto inconveniente, e para fazer economias nas despezas publicas, o decreto de 18 de março 1869 reduziu o numero de deputados e o dos circulos por tal maneira, que se tornou accentuadamente preponderante a influencia official nos actos eleitoraes, chegando a ficar quasi completamente aniquilada a representação das minorias. De um excesso caíu-se n'outro excesso. A estes defeitos se procurou acudir com a representação das minorias legislada em 1884, por accordo entre os partidos. Para que agora se não reincida nos mesmos erros, convirá que os circulos nem sejam tantos como os de 1859, nem tão poucos como os de 1869. Sob a impressão d'estas idéas foi organisado o mappa dos circulos, que acompanha esta proposta de lei e que é baseado na actual circumscripção dos concelhos. Esta divisão não é de certo perfeita, mas a camara corrigirá os seus defeitos.

São estas as principaes alterações que propomos na legislação vigente. Outras de menor importancia, como as que se referem á organisação das mesas eleitoraes e do tribunal de verificação de poderes, não carecem de desenvolvida explanação. Facilmente se apreciam.

Senhores. - Como acabaes de ver, não nos propomos fazer uma radical e profunda reforma das leis eleitoraes: desejâmos apenas modificar o que nos pareceu defeituoso, eliminar o que temos por inconveniente, e acrescentar o que se nos afigurou util ou necessario. Na sua maxima parte acceitâmos as disposições em vigor desde largos annos, que não tinham encontrado difficuldades na sua execução. Essas e as novas disposições vão todas compiladas para serem mais facilmente comprehendidas. O nosso proposito não é destruir para termos o prazer de reformar: apenas queremos melhorar o existente, alterando e modificando só o que tivemos por indispensavel.

Em vista do que deixamos exposto, temos a honra de submetter á vossa approvação a seguinte

Proposta de lei

CAPITULO I

Dos eleitores

Artigo 1.° São eleitores de cargos politicos e administrativos todos os cidadãos portuguezes, maiores de vinte e um annos e domiciliados em territorio nacional, nos quaes concorra alguma das seguintes circumstancias:

1.° Ser collectados em quantia não inferior a 500 réis de uma ou mais contribuições directas do estado;

2.° Saber ler e escrever.

Art. 2.° Não podem ser eleitores:

1.° Os interdictos, por sentença, da administração de sua pessoa ou de seus bens, e os fallidos não rehabilitados;

2.° Os indiciados por despacho de pronuncia com transito em julgado e os incapazes de eleger para funcções publicas, por effeito de sentença penal condemnatoria;

3.° Os condemnados por vadios ou por delicto equiparado, durante os cinco annos immediatos á condemnação;

4.° Os indigentes ou que não tiverem meios de vida conhecidos; e os que se entregarem á mendicidade, ou que para a sua subsistencia receberem algum subsidio da beneficencia publica ou particular;

5.° Os creados de galão branco da casa real, e os creados de servir, considerando-se como taes os individuos obrigados a serviço domestico na fórma definida pelo codigo civil;

6.º As praças de pret do exercito e da armada, e os assalariados dos estabelecimentos fabris do estado.

CAPITULO II

Dos deputados

Art. 3.° Todos os que têem capacidade para ser eleitores são habeis para ser eleitos deputados, sem condição do domicilio ou residencia.

Art. 4.° São absolutamente inelegiveis para o logar de deputado:

1.° Os estrangeiros naturalisados;

2.° Os membros da camara dos pares;

3.° Os que, nos termos do artigo 7.° do primeiro acto addicional á carta constitucional, não forem habilitados com um curso de instrucção superior, secundaria, especial ou profissional, ou que não tiverem de renda liquida annual 400$000 réis, provenientes de bens de raiz, capitães, commercio, industria ou emprego inamovivel.

Art. 5.° São respectivamente inelegiveis e não podem ser votados para deputados nas divisões territoriaes a que respeitar o exercicio das suas funcções:

1.° Os magistrados administrativos, judiciaes e do ministerio publico;

2.° As auctoridades militares;

3.° Os empregados dos corpos administrativos;

4.° Os empregados fiscaes e de justiça;

5.° Os empregados dos serviços technicos dependentes do ministerio das obras publicas.

§ 1.° A inelegibilidade prevista n'este artigo subsiste ainda durante sessenta dias, depois que, por qualquer motivo, o funccionario deixou de servir o cargo na sua circumscripção.

§ 2.° A mesma inelegibilidade abrange os substitutos e

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interinos, que exerçam o cargo em todo ou em parte do tempo decorrido desde a publicação do diploma, que designar o dia da oleiro, até á conclusão das operações eleitoraes.

§ 3.º A inelegibilidade prevista n'este artigo não comprehende os funccionarios cuja jurisdicção abrange todo o continente do reino e ilhas adjacentes ou tambem as provincias ultramarinas.

Art. 6.° É incompativel o logar de deputado:

l.° Com qualquer emprego da casa real, estando o empregado em effectivo serviço;

2.° Com o logar de concessionario, arrematante ou empreiteiro de obras publicas;

3.° Com o logar de director, administrador, gerente ou membro dos conselhos administrativos ou fiscaes de quaesquer companhias ou sociedades, que recebam subsidio do estado, ou administrem alguns dos seus rendimentos;

4.º Com os logares do governador civil e secretario geral e com outro emprego dos governos civis;

5.º Com o logar de administrador do concelho ou bairro e com os logares das secretarias das administrações de concelho ou bairro, das secretarias das camaras municipaes e dos estabelecimentos de beneficencia ou caridade subsidiados pelo estado;

6.° Com os logares de procurador regio perante as relações, seus ajudantes, delegados e sub-delegados;

7.º Com os logares de governadores das provincias ultramarinas, respectivos secretarios e chefes de repartições ou serviços; e com os logares de juizes, de primeira e segunda instancia, ou quaesquer empregos militares das mesmas provincias;

8.º Com os logares das repartições de fazenda dos districtos e dos concelhos ou bairros;

9.º Com os logares do quadro de serviço interno das alfandegas;

10.º Com as funcções do corpo diplomatico ou consular;

11.º Com o logar do commandante de estação naval.

Art. 7.° A disposição restricta do artigo antecedente cessa no caso regulado no artigo 33.° da carta constitucional; de modo que se, por algum caso imprevisto, do que dependa a segurança publica ou bem do estado, for indispensavel que algum deputado sáia para outra commissão, ainda subsidiada, ou emprego retribuido amovivel, a respectiva camara e poderá determinar sem que elle por isso perca o seu logar.

§ unico. Se a camara não estiver reunida, determinal-o-ha então o governo, dando depois conta ás côrtes.

Art. 8.° Os empregados comprehendidos nas disposições do artigo 6.° podem optar, depois de eleitos, pelo logar de deputado ou pelo emprego ou commissão.

Art. 9.° Julgadas as eleições e reunida a camara de modo que possa começar legalmente a funccionar, os individuos que houverem de optar não poderão prestar juramento sem que declarem, estando presentes, que optam pelo logar de deputado.

§ 1.° Se estiverem ausentes, a camara lhes fixará logo um praso rasoavel para darem, conta da sua opção, sob pena de se entender que resignam o logar de deputado.

§ 2.° Os cidadãos comprehendidos nas disposições dos n.ºs 2.° e 3.° do artigo 6.° não poderão ser admittidos a prestar juramento sem que mostrem nos referidos prasos ter cessado legalmente o motivo da incompatibilidade.

Art. 10.° Perde o logar de deputado:

1.° O que acceitar do governo titulo, graça ou condecoração que não lhe pertença por lei;

2.° O que tomar assento na camara dos pares;

3.° O que perder a qualidade do cidadão portuguez;

4.º O que por sentença com transito em julgado incorrer em interdicção ou incapacidade prevista no n.° 1.° e na ultima parte do n.° 2.° do artigo 2.°;

5.° O que acceitar emprego, commissão, serviço ou situação que o torno incompativel com o logar do deputado;

6.° O que acceitar logar mencionado no n.° 5.° do § unico do artigo 11.°

7.° O que não comparecer a tomar assento na camara na primeira sessão da respectiva legislatura;

8 ° O que abandonar o logar, nos termos do artigo 104.°

§ 1.° Todos os deputados que perderem os seus logares em virtude da disposição do n.° 1.° sómente poderão ser reeleitos passados seis mezes.

§ 2.° Sómente á camara dos deputados compete declarar a perda de logar, em que incorrer algum dos seus membros, fundando-se, salvo nos casos dos n.ºs 7.° e 8.°, em documento authentico comprovativo do facto que a motivar.

Art. 11.° Nenhum deputado, depois do proclamado na assembléa de apuramento, póde ser nomeado pelo governo, durante o tempo da legislatura, para cargo, posto retribuido ou commissão subsidiada, a que não tenha direito por lei, regulamento, escala, antiguidade ou concurso.

§ unico. Exceptuam-se: 1.°, os cargos de ministro d'estado e de conselheiro d'estado, cuja acceitação não importo a perda do logar de deputado, e cujo exercicio não é incompativel com este logar; 2.°, as commissões auctorisadas pela camara, sem prejuizo do logar de deputado, nos casos previstos no artigo 33.° da carta constitucional; 3.°, o cargo de governador civil; 4.°, as transferencias ou nomeações de funccionarios para logares de igual categoria ou que não tenham maior vencimento; 5.°, as nomeações de funccionarios para logares que por elles possam ser exercidos em commissão, segundo a lei organica dos quadros a que pertencem.

CAPITULO III

Do recenseamento eleitoral

Art. 12.° O direito de votar é verificado em cada concelho ou bairro pelo recenseamento eleitoral, no qual se apurará tambem a elegibilidade absoluta para cargos administrativos.

Art. 13.° O recenseamento eleitoral é organisado na conformidade d'esta lei e revisto annualmente.

Art. 14.° A idade para a inscripção no recenseamento eleitoral deverá completar-se até o dia 30 de junho do anno em que o recenseamento for organisado ou revisto.

Art. 15.° Os eleitores deverão ser recenseados no concelho ou bairro onde residirem a maior parte do anno; os empregados publicos n'aquelle onde exercerem as suas funcções na epocha do recenseamento, e os militares n'aquelle em que na mesma epocha estiver o seu quartel de habitação.

§ 1.° O eleitor que, em concelho ou bairro differente d'aquelle onde estiver residindo, for collectado em alguma das contribuições do estado, predial, industrial, de renda de casas ou sumptuaria, poderá ser inscripto no recenseamento d'esse concelho ou bairro, só assim o declarar perante as commissões de recenseamento de um e de outro, instruindo a sua declaração com documento comprovativo da collecta que tiver pago.

§ 2.° Em Lisboa e Porto poderão ser recenseados no bairro da sua residencia, quando n'outro exerçam as suas funcções, os empregados publicos que assim o declarem perante as commissões de recenseamento dos dois bairros.

Art. 16.° São despezas obrigatorias das camaras municipaes todas as que se fizerem com o expediente do recenseamento eleitoral e das eleições, comprehendendo urnas, cofres e mais objectos indispensaveis.

Art. 17.° As operações do recenseamento serão feitas em cada concelho pelo secretario da camara municipal auxiliado pelos empregados da respectiva secretaria ou pe-

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los da administração do concelho, que elle requisitar, sem inconveniente do serviço a que estiverem obrigados.

§ 1.° Nos bairros de Lisboa e Porto o recenseamento será organisado pelos secretarios das administrações coadjuvados pelos empregados das secretarias respectivas ou pelos das secretarias das camaras municipaes, requisitados sem inconveniente do serviço a que estiverem obrigados.

§ 2.° Os secretarios e os seus auxiliares vencerão a gratificação que a camara lhes arbitrar, sobre proposta da commissão de recenseamento, dentro da verba orçada para este fim como despeza obrigatoria.

Art. 18.° O secretario da camara municipal ou da administração dos bairros de Lisboa e Porto, por editaes affixados com quinze dias de antecedencia, tornará publico o praso dentro do qual são recebidos os documentos e requerimentos a que se referem os n.ºs 2.° e 3.° do artigo 20.°, e passará recibo de todas as petições e documentos que lhe forem entregues pelos interessados.

§ unico. Todos os documentos a que só refere este artigo serão pelo secretario classificados e reunidos por freguezias para servirem de base ás operações do recenseamento.

Art. 19.º O secretario da camara municipal ou da administração dos bairros de Lisboa e Porto não poderá inscrever ou eliminar o nome de nenhum eleitor ou alterar as circumstancias que a elle respeitem senão fundando-se em documento ou informação escripta que requisitar de quaesquer estações officiaes.

§ 1.° As exclusões com fundamento nas disposições dos n.ºs 1.°, 4.°, 5.° e 6.° do artigo 2.° poderão ter por base os esclarecimentos que as auctoridades, funccionarios ou quaesquer pessoas prestem ao secretario e que serão sempre reduzidos a termo assignado por este e pelos declarantes.

§ 2.° O secretario deverá convocar os parochos e regedores para prestarem informações, que serão da mesma fórma reduzidas a termo.

Art. 20.° A organisação do recenseamento terá por base os seguintes documentos, que até o decimo dia anterior ao começo das operações do recenseamento devem ser enviados ao secretario da camara municipal ou da administração dos bairros de Lisboa e Porto:

1.° Relações por freguezias, organisadas pelo escrivão de fazenda do concelho ou bairro, contendo os nomes de todos os contribuintes que no lançamento immediatamente anterior foram collectados pelo estado em quantia não inferior a 500 réis de contribuição predial, industrial, de renda de casas, sumptuaria ou decima de juros, sommando-se para este effeito as collectas das mesmas contribuições:

2.° Documentos apresentados pelos interessados provando que, pelo lançamento immediatamente anterior effectuado n'outro concelho ou bairro, perfizeram a quota censitica das contribuições designadas no numero antecedente ou que, tendo sido tributados no anno immediatamente anterior em imposto mineiro ou de rendimento, attingiram igual quota, sommando-se para este effeito a importancia de todas as mencionadas contribuições;

3.° Requerimentos dos interessados pedindo a propria inscripção no recenseamento pelo fundamento de saber ler e escrever, quando sejam por elles escriptos o assignados, e reconhecidos por tabellião nos termos prescriptos no § unico do artigo 2:436.° do cidigo civil, bastando, porém, a authenticação pelos chefes dos serviços de que dependam os requerentes, quando estes sejam serventuarios do estado ou dos corpos administrativos;

4.° Uma relação de todos os individuos que no anno anterior incorreram nas incapacidades previstas nos n.ºs 2.° e 3.° do artigo 2.°, organisada, segundo o ultimo domicilio que constar, pelos encarregados do registo criminal junto dos tribunaes de l.ª e 2.ª instancia;

5.° Declaraões de transferencia de domicilio, em conformidade do disposto nos §§ 1.º e 2.° do artigo 15.°

§ 1.° A contribuição predial sobre fóros, censos ou pensões será attendida em favor d'aquelle por conta de quem for paga.

§ 2.° O imposto de rendimento sobre titulos sómente será levado em conta quando estiverem averbados ha mais de um anno, ininterruptamente, a favor do seu possuidor.

§ 3.° Ao marido se levarão em conta os impostos correspondentes aos bens da mulher, posto que entre elles não haja communhão de bens, e ao pae os impostos correspondentes aos bens do filho, quando por documento authentico se provar que lhe pertence o usufructo d'elles.

§ 4.° A contribuição directa paga por uma sociedade, companhia ou empreza, será attendida para o recenseamento dos socios ou accionistas, em proporção do interesse que cada um provar, por documento authentico, ter na mesma sociedade, companhia ou empreza. A mesma disposição se observará achando se o casal indiviso, por viverem em commum os membros da mesma familia.

Art. 21.° O secretario da camara municipal ou da administração dos bairros de Lisboa e Porto, examinando todos os documentos e ouvidos os parochos, regedores e informadores das contribuições dilectas do estado, fará a inscripção dos eleitores e dos elegiveis para cargos administrativos, organisando por freguezias relações de todos os eleitores inscriptos, por elle datadas, assignadas e rubricadas, podendo tambem rubrical-as o administrador do concelho ou bairro.

§ 1.° Quando algum dos contribuintes comprehendidos nas relações do escrivão de fazenda não dera ser recenseado, nas mesmas relações ou em folha addicional, o secretario lançará nota, declarando o motivo da exclusão, a qual será rubricada pelo parocho ou regedor, se for fundada em informação de um ou do outro.

§ 2.° A relação deverá declarar a respeito de cada eleitor o seu nome, idade, estado, profusão e morada, o fundamento da sua inscripção, nos termos dos n.ºs 1.° e 2.° do artigo 1 °, mencionando-se no caso do n.° l.° a collecta respectiva, o se é elegivel para cargos administrativos.

Art. 22.° Organisadas as relações do recenseamento, serão revistas por uma commissão composta de tres vogaes, que serão o presidente da camara municipal, o conservador privativo da comarca e um cidadão officiosamente nomeado pelo juiz de direito de entre os elegiveis para cargos administrativos com residencia no concelho. Nos concelhos que não forem séde de comarca, a commissão será composta do presidente da camara municipal e de dois vogaes officiosamcnto nomeados, um pelo juiz de direito da comarca ou pelo juiz de direito da vara, a que pertencer a séde do concelho, e então pelo respectivo curador, de entre os cidadãos elegiveis para cargos administrativos e residentes no mesmo concelho. Nas comarcas onde não houver conservatoria privativa, serão os conservadores substituidos para os effeitos do recenseamento pelos delegados do procurador regio. Nos bairros de Lisboa e Porto as commissões serão compostas tambem de tres vogaes, sendo um nomeado pela camara municipal de entre os seus membros effectivos ou substitutos, e outro pelo juiz da vara civel da séde do bairro, e o terceiro pelo juiz do districto criminal da mesma socio, um e outro elegiveis para cargos administrativos e residentes no respectivo bairro.

§ 1.° O presidente da camara municipal e o conservador ou delegado do procurador regio serão substituidos nas suas faltas e impedimentos por quem do direito for; os vogaes de nomeação do juiz do direito, do conservador ou delegado do procurador regio e das camaras municipaes de Lisboa e Porto serão substituidos, nas suas faltas e impedimentos, por supplentes nomeados pelo mesmo juiz, conservador ou delegado e camaras na occasião da

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nomeação dos vogues effectivos e escolhidos de entre cidadãos com os mesmos requisitos exigidos para estes vogaes.

§ 2.° As nomeações a que se refere o presente artigo serão feitas annualmente e logo communicadas aos nomeados, ao presidente da camara municipal e ao administrador do concelho ou bairro. Estas nomeações, depois de communicadas, são irrevogaveis.

§ 3.° A falta de nomeação pelo juiz ou pelo conservador ou delegado sem respectivamente supprida pelo presidente da relarão ou pelo procurador regio, aos quaes o governador civil, segundo participação do administrador do concelho ou bairro, communicará a omissão; a falta de nomeação pela camara municipal de Lisboa ou Porto será supprida pela commissão districtal.

§ 4.° As nomeações illegalmente feitas pelo juiz do direito, pelo conservador ou delegado, pela commissão districtal ou pela camara municipal serão annulladas pelo presidente da relação, procedendo reclamação da auctoridade administrativa, ou de qualquer eleitor recenseado no respectivo concelho, apresentada dentro de tres dias, depois do findo o praso para as nomeações, sendo ouvido o magistrado, funccionario ou corporação, cuja nomeação é impugnada e que procederá a nova nomeação logo que lhe for communicada a annullação.

§ 5.° Na falta ou impedimento simultaneo de algum vogal da commissão e do seu supplente, será chamado pelo presidente e na falta d'este pelo vogal mais velho em exercicio, o vogal do anno immediatamente anterior, nomeado pelo respectivo magistrado, funccionario ou corporação, preferindo o effectivo ao supplente.

§ 6.° A commissão será presidida pelo presidente da camara municipal e nos bairros de Lisboa e Porto pelo vereador designado pela camara municipal.

§ 7.º O cargo de vogal da commissão é gratuito e obrigatorio.

Art. 23.° A commissão de recenseamento funcciona nos paços do concelho ou nas casas da administração dos bairros, devendo a camara fornecer-lhe outra casa quando nos alludidos edificios não possa reunir-se.

Art. 24.° A commissão de recenseamento installa-se, independentemente de convocação, no dia designado por lei, e reune-se diariamente ás horas que designar no dia da sua installação, as quaes serão immediatamente publicadas, bem como o local das reuniões, por meio de editaes.

§ 1.° De todas as sessões da commissão se lavrará acta em livro authenticado com termos de abertura e de encerramento assignados pelo presidente, que numerará e rubricará todos as folhas.

§ 2.° O expediente da commissão é encargo do secretario e empregados designados no artigo 17.º o seu § 1 °

Art. 25.° A commissão não poderá funccionar sem estarem presentes todos os seus membros ou quem legalmente os substitua, e sómente serão validas as suas deliberações quando tomadas por dois votos conformes.

Art. 26.° O administrador do concelho ou bairro assiste ás sessões da commissão e sobre os assumptos sujeitos a deliberação d'ella poderá emittir parecer.

Art. 27.° A commissão examinará as relações do recenseamento organisadas pelo secretario da camara municipal ou pelo secretario da administração do bairro e, usando de faculdades iguaes ás d'estes funccionarios, sob as mesmas restricções a que elles estão subordinados, fará nas relações, ouvidos os ditos secretarios, todas as alterações que julgar justas, mandando proceder á impressão, por freguesias, dos exemplares das relações, que lhe parecerem necessarios, para serem affixados nas igrejas das freguezias respectivas, expostos a exame e reclamação na secretaria da camara municipal ou da administração do bairro e distribuidos a todos os parochos e regedores e ás pessoas que os reclamarem, o que tudo se tornará publico por editaes affixados nos logares do estylo.

§ 1.° Da affixação dos editaes e das relações do recenseamento ficarão certidões na secretaria da camara municipal ou da administração do bairro.

§ 2.° Um exemplar da relação dos eleitores de cada freguezia, authenticado pela commissão, será remettido ao juiz de direito da comarca da séde do concelho e nas comarcas de Lisboa e Porto ao juiz da primeira vara civel, para ficar archivado em juizo. O juiz, sempre que lhe seja requerido por qualquer eleitor, facultará o exame das mesmas relações.

Art 28.° Contra a indevida ou inexacta inscripção e contra a omissão de algum cidadão no recenseamento poderá reclamar, perante a commissão, o proprio interessado, qualquer cidadão do circulo, recenseado como eleitor no anno antecedente, com relação a terceiro, e o administrador do concelho ou bairro, o n'um só requerimento se poderá reclamar por muitos ou por todos os que se julgarem prejudicados.

§ 1.º Estas reclamações serão sempre feitas por escripto, assignadas pelo reclamante ou por seu procurador, sendo a assignatura devidamente reconhecida se o reclamante não for a auctoridade publica, e serão logo instruidas com quaesquer documentos que lhes sirvam de prova.

§ 2.° As commissões decidirão publicamente, com a assistencia da auctoridade administrativa e dos interessados, que quizerem assistir, todas as reclamações que lhes tiverem sido feitas e as decisões, tanto para inscrever como para excluir, serão tomadas summariamente e motivadas com a disposição d'esta lei applicavel ao caso e referencia ao documento em que assenta a applicação d'ella.

§ 3.° Se contra qualquer inscripção no recenseamento, fundada no facto de saber ler o escrever, houver reclamação contestando esse facto, a commissão fará intimar o eleitor inscripto, para que no praso de tres dias compareça perante ella para escrever e assignar novo requerimento. Não comparecendo, será julgada procedente a reclamação.

§ 4.° As decisões que excluam do recenseamento serão, dentro em tres dias precisos da sua data, notificadas ao excluido pelo secretario da camara municipal ou pelo da administração do bairro ou por outro empregado municipal ou administrativo que a commissão designar para este effeito especial.

§ 5.° Em conformidade com as decisões, a commissão addicionará ás relações do recenseamento de cada freguezia o nome dos que forem novamente admittidos e eliminará o d'aquelles que forem excluidos, publicando por editaes, affixados nas portas das igrejas parochiaes, as alterações que se houverem feito. Da affixação dos editaes se passará certidão, que ficará archivada na secretaria da camara municipal ou da administração do bairro.

§ 6.° As relações do recenseamento, assim modificadas, estarão patentes, durante o praso legal, na secretaria da camara municipal ou de administração do bairro, desde as nove horas da manhã até ás tres da tarde, a todas as pessoas que as queiram examinar, as quaes poderão d'ellas tirar copias e fazel-as authenticar por quaesquer officiaes publicos, na fórma das leis.

§ 7.° Dos addicionamentos e eliminações relativos a cada freguezia enviará a commissão relações authenticadas ao juiz do direito da comarca da séde do concelho ou ao juiz do direito da primeira vara civel nas comarcas de Lisboa e Porto, para ficarem archivadas em juízo. O juiz, sempre que lhe seja requerido por qualquer eleitor, facultará o exame d'estes documentos.

§ 8.° As commissões sómente entregarão aos reclamantes, que as procurarem, as suas petições de reclamação e documentos com as decisões motivadas e assignadas, quando forem integralmente indeferidas; os restantes processos

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ficarão archivados na secretaria da camara municipal ou da administração do bairro.

Art 29.° Das decisões das commissões de recenseamento sobre as reclamações que perante ellas tiverem sido interpostas ha recurso para o juiz de direito da comarca, da séde do concelho, sendo habeis para recorrer as mesmas pessoas que são legitimas para reclamar.

§ 1.° O recurso interpõe-se perante o juiz de direito por via de petição em que se declarem os seus principaes fundamentos, será instruido com todos os documentos que o recorrente queira offerecer, e será sempre acompanhado do processo da reclamação quando ao recorrente haja sido entregue.

§ 2.° As reclamações que não forem entregues aos reclamantes serão requisitadas do secretario da commissão de recenseamento pelo juiz de direito, para serem juntas ao recurso que ás mesmas respeitar.

§ 3.° As decisões dos juizes de direito serão motivadas e notificadas aos recorrentes, aos recorridos e á commissão de recenseamento. As notificações dos cidadãos residenses fóra da comarca serão requisitadas por carta de officio do juiz da comarca onde residirem.

§ 4.° A commissão fará nas relações do recenseamento todas as rectificações determinadas nos despachos dos juizes de direito e tornará publicas as mesmas rectificações por editaes affixados nas portas das igrejas, passando-se certidões da affixação para ficarem archivadas na secretaria respectiva.

Art 30.° Póde igualmente reclamar-se para o juiz de direito competente, nos casos seguintes:

1.° Illegal constituição da commissão de recenseamento em qualquer das suas sessões;

2.° Inobservancia de formalidades e prasos legaes;

3.° Omissão de inscrever cidadãos nas relações de recenseamento quando a commissão tenha decidido recenseal-os;

4.° Omissão ou recusa de decidir as reclamações apresentadas dentro dos prasos legaes.

§ 1.º Nas hypotheses dos n.ºs 1.° e 2.° os juizes de direito, se considerarem procedentes as reclamações, devem declarar nullas as decisões da commissão do recenseamento e apreciar em seguida a materia das mesmas decisões, julgando-a como for de justiça.

§ 2.° Na hypothese dos n.ºs 3.° e 4.° serão as reclamações consideradas como indeferidas pela commissão para o effeito de serem decididas.

§ 3.° Para a decisão das reclamações de que trata este artigo, poderão os juizes requisitar das commissões de recenseamento, das auctoridades administrativas e dos parochos, os esclarecimentos que julgarem convenientes. Não sendo prestados dentro do tempo designado pelos mesmos juizes, serão as reclamações decididas independentemente d'esses esclarecimentos, nos prasos estabelecidos na presente lei.

§ 4.° Os processos das reclamações e recursos a que se referem este artigo e o antecedente não serão entregues ás partes.

Art. 31.° Das decisões do juiz de direito poderão recorrer para a relação do districto, os mesmos que são habeis para recorrer para o juiz de direito, sendo o recurso interposto perante aquelle magistrado, independentemente de termo, por meio de petição em que se exponham os seus fundamentos, instruida com os documentos convenientes, podendo ainda juntar-se outros dentro de tres dias, findos os quaes o processo será officialmente expedido para o tribunal superior.

§ 1.° O recurso será distribuido na relação com os feitos da 6.ª classe, e o relator o mandará com vista ao ministerio publico, que responderá no praso improrogavel de vinte e quatro horas.

§ 2.º Findo este praso, o escrivão cobrará o feito, fal-o-ha concluso ao relator, e este o proporá logo em sessão publica com cinco juizes, sendo a decisão tomada em conferencia por tres votos conformes.

§ 3.° Para o julgamento d'estes feitos poderá haver sessão todos os dias, ainda em tempo de ferias.

Art. 30.° Do accordão da relação podem recorrer para o supremo tribunal de justiça as pessoas designadas no artigo anterior, sendo o recurso interposto independentemente de termo, por meio de petição, que poderá ser instruida com documentos, e dentro de quarenta e oito horas officialmente enviado, sem ficar traslado, áquelle tribunal, onde será decidido sem mais termos que os determinados para o julgamento nas relações nos §§ 1.°, 2.° e 3.° do artigo antecedente.

§ unico. Não são admissiveis sobre o recenseamento eleitoral outras reclamações ou recursos alem dos estabelecidos n'esta lei.

Art. 32.° Do supremo tribunal de justiça e da relação, logo que transitem em julgado, baixarão officiosamente, sem ficar traslado, todos os recursos eleitoraes; as respectivas decisões serão notificadas ao secretario da camara municipal ou da administração do bairro; e este funccionario, tendo em vista as mesmas decisões e as relações de recenseamento, devidamente organisadas pela commissão e modificadas segundo as decisões d'esta e do juiz de direito, procederá, sob sua responsabilidade, á organisação do livro do recenseamento, seguindo-se na inscripção a ordem alphabetica dos nomes em cada freguezia e agrupando-se ou dividindo-se as freguezias conforme a divisão das assembléas. A respeito de cada eleitor se mencionarão as circumstancias exaradas nas relações, nos termos do § 2.° do artigo 21.º

§ unico. O livro do recenseamento será numerado e rubricado em todas as suas folhas pelo presidente da commissão, e terá termos de abertura e encerramento, subscriptos pelo secretario da camara municipal ou da administração dos bairros de Lisboa e Porto, e assignados pelos vogaes da commissão, declarando-se no termo de encerramento o numero de eleitores inscriptos em cada freguezia. Nenhuma alteração poderá ser feita no mesmo livro por ordem de auctoridade alguma.

Art. 33.° Organisado o recenseamento pela fórma declarada nos artigos antecedentes, será revisto nos annos subsequentes, observando-se nas operações de revisão as disposições seguintes, e ou vindo-se os parochos, regedores e informadores dão contribuições directas do estado, nos termos do artigo 19.°:

1.° O secretario da camara municipal ou da administração dos bairros de Lisboa e Porto, tomando por base o recenseamento vigente, requisitado n'estes bairros ao funccionario competente, deverá eliminar da relação de cada freguezia:

a) Os fallecidos, sendo o obito comprovado por certidão ou pelas relações que, até o decimo dia anterior ao começo das operações do recenseamento, os parochos e officiaes do registo civil devem remetter ao mesmo secretario, relativamente aos obitos occorridos no ultimo anno;

b) Os individuos incursos nas incapacidades previstas nos n.ºs 2.º e 3.° do artigo 2.°, em vista da relação que, até á mesma data e a respeito do mesmo periodo de tempo, devem remetter ao mesmo secretario os encarregados
do registo criminal;

c) Os que deixarem de ter o seu domicilio no concelho ou bairro, segundo o que constar ao mesmo secretario, nos termos do artigo 19.°;

d) Os que deverem ser excluidos, em conformidade do disposto no § 1.° do mesmo artigo;

e) Os que no lançamento immediatamente anterior deixarem de ser collectados na indispensavel quota censitica proveniente de contribuição predial, industrial, de renda de casas, sumptuaria ou decima de juros, segundo se mostrar das relações que para esse effeito serão organisadas pelo escrivão de fazenda e por este enviadas ao secretario

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da camara municipal ou da administração dos bairros de Lisboa e Porto, até o decimo dia anterior ao começo da revisão do recenseamento, e os que no anno immediatamente anterior deixarem de ser tributados em igual quota proveniente de outras contribuições, que servissem de base á sua inscripção, quando o facto se prove por documento.

2.° O secretario da camara municipal ou da administração dos bairros de Lisboa e Porto addicionará ao recenseamento de cada freguezia:

a) Os cidadãos que attingirem a idade legal, segundo o disposto no artigo 14.°, em vista do certidão de idade ou de relações remettidas pelos parochos e officiaes de registo civil ao mesmo secretario, até o decimo dia anterior ao começo da revisão do recenseamento, e do que ao secretario constar sobre as respectivas collectas de contribuições directas do estado, pelas relações enviadas da repartição de fazenda no anno corrente ou nos anteriores;

b) Os que no lançamento immediatamente anterior attingiram a indispensavel quota censitica de contribuição predial, industrial, de renda de casas, sumptuaria ou decima de juros, segundo se mostrar das relações que para esse effeito serão organisadas pelo escrivão de fazenda e por este enviadas no secretario da camara municipal ou das administrações dos bairros até o decimo dia anterior ao começo da revisão do recenseamento;

c) Os que deverem recensear-se em vista dos documentos e requerimentos apresentados pelos interessados, nos termos dos n.ºs 2.° e 3.º do artigo 20.°, ou era vista da transferencia do domicilio auctorisada pelos §§ 1.° e 2.° do artigo 15.°

§ 1.° A inscripção por saber ler o escrever será mantida, sem novo requerimento, nos recenseamentos dos annos seguintes á primeira inscripção.

§ 2.° São applicaveis ás operações de revisão as disposições dos §§ 1.°, 2.°, 3.° e 4.° do artigo 20.° e as dos artigos subsequentes, relativas á organisação do recenseamento, ás reclamações e aos recursos, processando-se em cada anno um livro novo e completo, com os nomes de todos os eleitores que ficarem definitivamente recenseados.

Art. 34.° O secretario da camara municipal é obrigado a guardar o conservar, sob sua responsabilidade, o livro do recenseamento eleitoral, e d'elle remetterá copia authentica ao governador civil, por intermedio do administrador do concelho ou bairro, e ao juiz do direito da comarca da séde, do concelho e nas comarcas de Lisboa ou Porto ao juiz da 1.ª vara civil, para ficar archivado em juizo.

§ 1.° Dentro de oito dias o independentemente do despacho, o secretario da camara passará, sem sêllo, todas as certidões que lhe forem pedidas do recenseamento, mediante o emolumento de 5 réis por cada nome transcripto, e conferirá e authenticará, tambem sem sêllo, todas as copias impressas ou lithographadas, que para esse effeito lhe forem apresentadas, mediante o emolumento de 1 real por cada nome conferido.

§ 2.° Da copia do recenseamento archivada no governo civil, o secretario geral, nos mesmos termos do paragrapho antecedente e mediante igual emolumento, passará certidões e authenticará, depois de conferidas, as copias impressas ou lithographadas que lhe forem apresentadas. Da mesma fórma procederá o competente escrivão de direito em relação á copia do recenseamento archivada em juizo.

§ 3.° Todos os documentos e processos relativos ás operações do recenseamento, que não hajam sido remettidos para juizo, ficarão archivados na secretaria da camara municipal ou da administração do bairro, sob responsabilidade do respectivo secretario.

Art. 35.° Todo o processo eleitoral, comprehendendo o recenseamento, as reclamações, os recursos, os documentos com que forem instruidos, as petições ou requerimentos que a tal respeito se fizerem, o que nos tribunaes judiciaes se ordenar, conforme as disposições d'esta lei, e os reconhecimentos de assignaturas das mesmas petições, requerimentos ou documentos, é isento do imposto de sêllo e de quaesquer emolumentos ou salarios.

§ unico. Os documentos a que se refere este artigo deverão declarar o fim para que são passados e para nenhum outro poderão utilisar-se.

Art. 36.° Todas as auctoridades, funccionarios e repartições publicas são obrigados a passar impreterivelmente, dentro de tres dias, as copias, certidões e attestados que lhes sejam requeridos, para o effeito do recenseamento eleitoral, das reclamações ou dos recursos sobre o mesmo objecto. A mesma obrigação incumbe aos parochos.

Art. 37.° Os prasos para as diversas operações do recenseamento eleitoral são os fixados no quadro junto á presente lei.

§ unico. Quando em algum concelho ou bairro as operações do recenseamento se não effectuarem nos prasos legaes, poderá o governo, ouvidos os fiscaes da corôa e fazenda, em conferencia, fixar novos prasos, analogos aos designados na lei para a realisação das mesmas operações.

Art. 38.° Só é considerado legal para o acto da eleição o recenseamento eleitoral encerrado no dia 30 de junho, immediatamente anterior ao da mesma eleição.

§ unico. No caso de força maior, devidamente comprovado, e na falta de copias authenticas, será considerado legal o recenseamento original ou copia authentica, immediatamente anterior.

CAPITULO IV

Dos circulos eleitoraes, das assembléas primarias e dos actos preparatorios da eleição

Art. 39.° A eleição de deputados é directa e feita pelos circulos eleitoraes, designados no mappa junto a esta lei, elegendo cada circulo um só deputado.

§ unico. A circumscripção dos circulos eleitoraes e o numero de deputados que devem eleger só por lei póde ser alterado.

Art. 40.° No praso de oito dias, contado sobre a data do encerramento do primeiro recenseamento eleitoral organisado sob o vigor da presente lei, as commissões do recenseamento procederão á divisão dos concelhos em assembléas eleitoraes, que serão compostas de 500 a 1:000 eleitores approximadamente, agrupando-se na rasão directa da sua proximidade as freguezias que de per si não possam formar uma só assembléa, e no mesmo praso as commissões designarão as igrejas ou edificios publicos ou municipaes em que as assembléas devem reunir-se.

§ 1.º Se n'algum concelho, dentro do praso fixado, a commissão não proceder á divisão de assembléas e designação das suas sédes, ao governo compete supprir a omissão.

§ 2.° A constituição das assembléas eleitoraes será publicada, logo que finde o praso designado n'este artigo, por editaes affixados nas igrejas parochiaes e na casa de reunião da commissão de recenseamento, e contra ella poderão reclamar perante a commissão, dentro de quinze dias desde a publicação, o administrador do concelho ou bairro, e os eleitores do circulo, observando-se na decisão das reclamações e nos recursos, que subsequentemente forem interpostos, sem effeito suspensivo, para o juiz de direito, para a relação o para o supremo tribunal de justiça, os prasos o mais disposições applicaveis por que se regera as reclamações e recursos sobre recenseamento eleitoral.

Art. 41.° A constituição das assembléas eleitoraes, depois de fixada na fórma do artigo anterior, é permanente e só por lei póde ser modificada; porém, quando haja de soffrer alteração por causa da que se fizer na circumscripção de algum circulo eleitoral ou de algum con-

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celho, será convocada por decreto a commissão de recenseamento para proceder ás indispensaveis modificações na constituição das assembléas, observando-se na parte applicavel as disposições do artigo antecedente.

§ 1.° A constituição de assembléas fixada para as eleições politicas vigorará igualmente para as eleições municipaes.

§ 2.° São nullos os actos eleitoraes realisados fóra do recinto competentemente designado, salvo o disposto na parte final do § unico do artigo 49.°

Art. 42.° As assembléas eleitoraes serão convocadas por decreto do governo, que designará o dia em que deve proceder-se á eleição, e, no domingo immediatamente anterior ao fixado para este acto, o presidenta da commissão de recenseamento, por editaes anisados nos legares do estylo e lidos pelos parochos á missa conventual, tornará publicas as assembléas em que o concelho só divide, os seus limites e os logares de reunião, declarando tambem o dia e a hora em que as assembléas devem reunir-se.

Art. 43.° As assembléas primarias serão presididas pelos cidadãos designados, até o domingo anterior ao da eleição, pelo juiz de direito da comarca da séde do concelho e nas comarcas de Lisboa e Porto pelo juiz da vara civel a que pertencer a séde do respectivo concelho ou bairro, sob proposta, em lista triplice, feita pelas commissões do recenseamento d'entre os elegiveis para cargos administrativos, residentes no concelho ou bairro, organizada no penultimo domingo anterior ao da eleição e logo communicada ao juiz de direito. Se as commissões de recenseamento não apresentarem a proposta, deverão os competentes juizes de direito independentemente d'ella fazer a nomeação dentro os mesmos cidadãos.

§ l.º As nomeações serão immediatamente communicadas pelos juizes aos nomeados, às commissões proponentes e á auctoridade administrativa.

§ 2.° Os nomeados poderão reclamar dentro de quarenta e oito horas a sua escusa perante o juiz de direito, que, julgando-a fundada em comprovado impedimento, designará os supplentes de entre os cidadãos propostos, havendo-os, até á quinta feira anterior ao dia da eleição, communicando-se logo as novas nomeações aos nomeados, á commissão do recenseamento e á auctoridade administrativa.

§ 3.° Os juizes de direito poderão proceder á designação dos presidentes e seus supplentes por meio do sorteio entre os cidadãos propostos.

Art. 44.° O presidente da commissão de recenseamento enviará aos presidentes das assembléas eleitoraes, pelo menos dois dias antes do domingo em que deve effectuar se a eleição, dois cadernos dos eleitores que podem votar nas assembléas, a que elles tiverem de presidir, e cobrará recibo da remessa.

§ 1.° Estes cadernos, que poderão ser impressos ou lithographados, serão a copia fiel do recenseamento origina], requisitado do funccionario competente, terão termos de abertura e encerramento assignados pela commissão, e serão por ella rubricados em todas as suas folhas.

§ 2.° O administrador do concelho ou bairro poderá tambem rubricar e assignar os mesmos cadernos.

Art. 45.° O presidente da commissão de rencenseamento enviará tambem aos presidentes da assembléa, dentro do praso fixado no artigo antecedente, quatro cadernos com termo de abertura e rubricas, na fórma por que acima se dispoz, para n'elles se lavrarem as actas da eleição.

CAPITULO V

Da eleição

Art. 46.° No domingo designado por decreto especial do governo para se proceder á eleição, pelas nove horas da manhã, reunidos os eleitores no local competente, lhes proporá o presidente dois de entre elles para escrutinadores, dois para secretarios e dois para supplentes, convidando os eleitores que approvarem a proposta a passar para o lado direito d'elle e para o esquerdo os que a rejeitarem.

§ 1.° Para a approvação da proposta são necessarias tres quartas partes dos eleitores presentes.

§ 2.º Se a proposta do presidente for approvada por menos de tres quartas partes, mas por mais da quarta parte dos eleitores presentes, ficará a mesa composta do escrutinador, do secretario e do supplente, que o presidente primeiro indicar na ordem da sua proposta, e dos restantes membros indicados por um eleitor de entre os que rejeitarem, se n'essa indicação accordar por acclamação a maioria dos eleitores d'esta parte da assembléa. Se esta não concordar, procederá á eleição dos respectivos vogaes por escrutinio secreto em que ella só votará, considerando-se eleitos os que obtiverem a maioria relativa. Servirão de vogaes da mesa d'esta eleição os vogaes que já fazem parte da mesa eleitoral pela proposta do presidente.

§ 3.° Quando a proposta do presidente for rejeitada por tres quartas partes ou por mais de tres quartas partes dos eleitores presentes, os vogaes da mesa serão eleitos por acclamação, sob proposta de um dos eleitores, que a tenham rejeitado, ou por escrutinio secreto, conforme os casos indicados no paragrapho antecedente. Quando tenha de proceder-se á eleição por escrutinio secreto, a mesa para esta eleição será composta do presidente, de um escrutinador e de um secretario por elle nomeado, cada um de differente lado da assembléa.

§ 4.° A quarta parte do numero dos eleitores presentes, não incluindo o presidente, quando este numero não for multiplo de 4, é a quarta parte do multiplo de 4 immediatamente inferior, sommada com a unidade.

§ 5.° Se em alguma assembléa eleitoral, até duas horas depois da fixada para a eleição, não comparecerem eleitores em numero sufficiente para comporem a mesa, o presidente lavrará ou mandará lavrar auto em que se declare esta falta, e que será assignado por elle, pelo parocho e pela auctoridade administrativa e logo remettido ao presidente da assembléa de apuramento.

Art. 47.° Da formação da mesa se lavrará acta, e o secretario, que á lavrar, a lerá immediatamente á assembléa.

§ unico. Uma relação contendo os nomes dos approvados ou eleitos para comporem a mesa, assignada pelo presidente e por um dos secretarios, será logo affixada na porta principal do edificio em que a assembléa estiver reunida.

Art. 48.° A mesa eleita autos da hora fixada no artigo 46.° é nulla, e nullos serão todos os actos eleitoraes em que ella interferir.

Art. 49.° Se uma hora depois da fixada para a reunião da assembléa o presidente ainda não tiver apparecido, ou se apparecer e se ausentar antes de constituida a mesa, tomará a presidencia o cidadão que para isso for escolhido pelo maior numero dos eleitores presentes.

§ unico. Presume-se legal a eleição feita no local competente e sob a presidencia do cidadão para esse fim designado. Esta presumpção cessa em vista das provas de tumultos e violencias, que obrigassem uma parte dos eleitores a escolher outro local e presidencia para manifestarem livremente o seu voto.

Art. 50.° Se á mesma hora se não tiverem recebido na casa da assembléa nem os cadernos do recenseamento dos eleitores, nem os cadernos para se lavrarem as actas, que o presidente da commissão de recenseamento devia ter remettido ao presidente da assembléa, a eleição poderá fazer-se por quaesquer copias authenticas do recenseamento, que houverem sido extrahidas do livro competente, e que qualquer cidadão apresentar, e as actas poderão lavrar-se em cadernos com termo de abertura e rubrica da mesa que a assembléa escolher.

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Art. 51.º A mesa da eleição será collocada no corpo do edificio, de maneira que todos os eleitores possam por todos os lados ter livre accesso a ella e observar todos os actos eleitoraes.

Art. 52.° Constituida a mesa, serão validos todos os actos eleitoraes que legalmente forem praticados, estando presentes, pelo menos, tres vogaes, sendo o presidente substituido, nos seus impedimentos, pelo escrutinador eleito ou approvado pela maioria da assembléa, preferindo o mais velho, quando ambos hajam sido eleitos ou approvados pela mesma maioria.

Art. 53.° Os parochos e os regedores das freguesias, que constituirem a assembléa eleitoral, assistirão á eleição para informar sobre a identidade dos votantes.

§ 1.° Faltando o parocho ou o regedor, a mesa nomeará pessoas idoneas que façam as vezes d'elles.

§ 2.° As mesas eleitoraes não começarão o acto da eleição sem que os parochos e os regedores ou quem os substituir estejam presentes.

§ 3.° O parocho, ou quem suas vozes fizer, terá logar na mesa ao lado direito do presidente, emquanto se estiver procedendo á chamada da respectiva freguezia.

§ 4.° Se houver uma só assembléa no concelho, assistira ahi a eleição o administrador respectivo; se houver duas assistirá a uma o administrador e a outra o seu substituto; se houver mais de duas, ou algum d'elles estiver impedido, escolherá o administrador em exercicio pessoa ou pessoas que o representem e em quem delegue as attribuições conferidas por esta lei.

§ 5.° A falta da auctoridade administrativa não impede os actos eleitoraes.

Art. 54.° As mesas decidem provisoriamente as duvidas que se suscitarem ácerca das operações da asaembléa.

§ 1.º Todas as decisões da mesa sobre quaesquer duvidas ou reclamações, verbaes ou escriptas, serão motivadas.

§ 2.° As decisões serão tomadas á pluralidade de votos. No caso de empate, o presidente tem voto de qualidade.

§ 3.º Qualquer eleitor póde apresentar por escripto, com a sua assignatura ou com outras, se todas forem de eleitores do circulo, protesto relativo aos actos do processo eleitoral e instruil-o com os documentos convenientes.

§ 4.° O protesto e documentos, numerados e rubricados pela mesa, que não poderá jamais negar-se a recebel-os, com o parecer motivado d'esta ou com o contra-protesto de qualquer outro cidadão ou cidadãos tambem eleitores, só assim o tiverem por conveniente, serão appensos ás actas, mencionando-se n'estas simplesmente a apresentação da protestos o contra-protestos, o seu numero e o nome do primeiro cidadão que os assignar, bom como os pareceres da mesa nas mesmas condições.

Art. 55.º Nas assembléas eleitoraes não se póde discutir ou deliberar nobre objecto estranho ás eleições. Tudo que alem d'isso se tratar é nullo e de nenhum effeito.

Art. 56.° Aos presidentes das mesas incumbe manter a liberdade dos eleitores, conservar a ordem, regular a policia da assembléa e providenciar para que esta seja livremente accessivel.

Art. 57.° Nenhum individuo póde apresentar-se armado nas assembléas eleitoraes e, ao que o fizer, ordenará o presidente que se retire.

Art. 58.° Se o presidente da assembléa eleitoral o julgar conveniente, para a ordem da mesma assembléa, poderá mandar saír do local, onde estiver reunida, todos ou alguns dos individuos presentes, não recenseados.

Art. 59.º A nenhuma força publica é permittido, sob pretexto algum, apresentar-se no local onde se reunirem as assembléas eleitoraes ou na sua proximidade, demarcada por um raio de 100 metros, excepto a requisição feita em nome do presidente.

§ 1.° Estando constituida a mesa o presidente a consultará antes de fazer a requisição.

§ 2.° A força só poderá ser requerida quando seja necessario dissipar algum tumulto ou obstar a alguma aggressão dentro do edificio da assembléa ou na proximidade d'elle, no caso de ter havido desobediencia ás ordens do presidente duas vezes repetidas.

§ 3.° Apparecendo força publica no edificio da assembléa ou na sua proximidade, suspendem-se os actos eleitoraes, e só poderá proseguir-se n'elles meia hora depois da sua retirada.

§ 4.° Nas terras em que se reunirem as assembléas eleitoraes, a força armada, com excepção dos militares recenseados, conservar-se-ha nos quarteis ou alojamentos durante os actos das assembléas.

Art. 60.° A nenhum cidadão é permittido votar em mais de uma assembléa.

Art. 61.° A votação é por escrutinio secreto, de modo tal que de nenhum eleitor se conheça ou possa vir a saber o voto.

§ unico. Não serão recebidas listas em papel de cores ou transparentes, ou que tenham qualquer marca, signal, designação ou numeração externa.

Art. 62.° Os vogaes das mesas votam primeiro que todos os eleitores; e, tendo elles votado, mandará o presidente fazer a chamada dos outros, principiando pelas freguezias mais distantes.

Art. 63.° Ninguem póde ser admittido a votar se o seu nome não estiver inscripto no recenseamento dos eleitores. Exceptuam-se:

1.° O presidente da mesa, que póde votar na assembléa que presidir, ainda que não esteja ali recenseado;

2.° O administrador do concelho ou bairro, ou seu representante, que póde votar na assembléa a que assistir, linda que n'ella não esteja recenseado;

3.° Os cidadãos que se apresentarem munidos de accordãos das relações ou do supremo tribunal de justiça, mandando-os inscrever como eleitores, e que não foram inscriptos antes do encerramento do recenseamento, devendo juntar se á acta o documento que apresentarem.

Art. 64.° Nenhum cidadão, qualquer que seja o seu emprego ou condição, póde ser impedido de votar, quando se achar inscripto no respectivo recenseamento, excepto se contra elle se apresentar sentença judicial, passada em julgado, que o exclua do recenseamento, ou certidão de despacho de pronuncia, com transito em julgado.

Art. 65.° Ao passo que cada um dos eleitores chamados se approximar á mesa, os dois escrutinadores descarregarão o nome d'elle nos dois cadernos de que se faz monção no artigo 44.°, escrevendo o proprio appellido ao lado do nome dos votantes. O eleitor só então entregará ao presidente a lista da votação, dobrada e sem assignatura, e o presidente a lançará na urna.

§ unico. As listas devem conter um só nome e o presidente da mesa assim o communicará á assembléa antes de começar a votação.

Art. 66.° Concluida a primeira chamada, o presidente ordenará uma chamada geral dos que não tiverem votado.

Art. 67.° Duas horas depois d'esta chamada, o presidente perguntará se ha mais alguem que pretenda votar, recebendo as listas dos que immediata e successivamente se apresentarem. Recolhida qualquer lista, considerar-se-ha encerrada a votação, quando dentro da assembléa não haja eleitor algum que se apresente a votar.

Art. 68.º Encerrada a votação, o presidente fará contar as listas que se acharem na uma e confrontar o seu numero com as notas de descarga postas nos cadernos do recenseamento.

§ unico. O resultado d'esta contagem e confrontação será mencionado na acta e immediatamente publicado por edital affixado na porta principal da casa da assembléa.

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Do mesmo resultado é a mesa obrigada a certificar qualquer eleitor que o requeira.

Art. 69.° Seguir-se ha o apuramento dos votos, tomando o presidente successivamente cada uma das listas, desdobrando-a e entregando-a alternadamente a cada um dos escrutinadores, o qual a lerá em voz alta e a restituirá ao presidente; o nome dos votados será escripto por ambos os secretarios, ao mesmo tempo que os votos que forem tendo, numerados por algarismos e sempre repetidos em voz alta.

§ unico. O resultado do apuramento de cada dia, até se concluir o escrutinio, será publicado por edital, affixado na porta principal do edificio da assembléa. Do mesmo resultado a mesa é obrigada a passar certidão a qualquer eleitor que a requeira.

Art. 70.° São validas as listas dos votantes, ainda quando contenham, mais de um nome, não se contando, porém, os derradeiros nomes excedentes.

Art 71.° As mesas eleitoraes apurarão os votos que recaírem em qualquer pessoa, sem que hajam de verificar se essa pessoa é absoluta ou relativamente inelegivel, e sem embargo dos protestos que sobre este assumpto podem ser apresentados, nos termos dos §§ 3.° e 4.º do artigo 54.°, excepto se os votos forem contidos em listas não conformes ao disposto no § unico do artigo 61.° N'este caso serão taes listas declaradas nullas.

§ unico. As listas annulladas por este ou por outro fundamento legitimo não se contam para effeito algum.

Art. 72.° As listas que as mesas declararem viciadas ou nullas serão rubricadas pelo presidente, e juntar-se, hão ao processo eleitoral, sob pena de nullidade das operações de apuramento. A mesma disposição e sob a mesma pena se observará quanto ás listas declaradas validas contra a reclamação de algum dos cidadãos que formarem a assembléa.

§ unico. Os votos que se contiverem nas listas annulladas serão em todo o caso apurados, mas em separado e separadamente escriptos nas actas

Art. 73.° Se houver duvida sobre a numeração dos votos, ou se o numero total d'elles não for exactamente igual á somma dos que as listas contiverem, e uma quarta parte dos eleitores presentes reclamar a verificação d'elles, proceder-se-ha a novo exame ou leitura das listas.

Art. 74.° A constituição das mesas, a votação, a contagem das listas e o escrutinio são operações eleitoraes que se praticarão sempre antes do sol posto.

§ 1.° Se a votação se não concluir no primeiro dia, o presidente da mesa eleitoral mandará pelos dois secretarios rubricar nas costas as listas recebidas, e fal-as-ha depois fechar com os mais papeis concernentes á eleição n'um cofre de tres chaves, das quaes ficará uma na sua mão e as outras na de cada um dos escrutinadores. Este cofre deverá ser sellado pelo presidente e por qualquer dos eleitores presentes que assim o requeira, sendo depois guardado com toda a segurança no mesmo edificio em que se procedeu á votação, em logar exposto á vista e guarda dos eleitores, se vinte d'estes, pelo menos, o exigirem, e aberto no dia seguinte, pelas nove horas da manhã, em presença da assembléa, para se proseguir nos actos eleitoraes.

§ 2.° Não havendo reclamação de qualquer eleitor da assembléa, as listas, em vez de rubricadas uma a uma, poderão ser reunidas em um só maço ou em mais, conforme a capacidade do cofre, onde têem de ser depois encerradas, noa termos d'este artigo, e fechadas por um envolucro de papel lacrado e sellado, no qual os secretarios lançarão as suas rubricas, sendo facultativo a qualquer dos eleitores presentes rubricar tambem o envolucro e imprimir-lhe algum sêllo ou sinete.

§ 3.° A rubrica das listas ou dos maços de listas e seu encerramento no cofre poderão effectuar-se depois do sol posto.

Art. 75.° Terminado o apuramento, uma relação de todos os votados será publicada por edital, affixado na porta principal da casa da assembléa; em presença da mesma serão queimadas as listas que não estiverem no caso declarado no artigo 72.°, e d'estas circunstancias se fará expressa menção na acta.

§ unico. Dos votos que obtiver cada votado a mesa deverá passar sempre certidão, a requerimento de qualquer eleitor.

Art. 76.° Da eleição se lavrará acta em um dos quatro cadernos de que trata o artigo 45.°, assignada e rubricada pela mesa, e na acta se mencionarão, alem das mais circumstancias relativas á eleição:

1.° Todas as duvidas que occorrerem e reclamações que se fizerem, pela ordem em que foram apresentadas, e decisão motivada que sobre ellas se haja tomado, observando-se ácerca dos protestos escriptos o disposto no § 4.° do artigo 54.°;

2.° Quantos dias a eleição durou, e quaes as operações eleitoraes effectuadas em cada um d'elles;

3.° O nome de todos os votados e o numero de votos que cada um teve, escripto por extenso;

4.° Os votos annullados e o motivo por que o foram;

5.° A declaração de que os cidadãos que formam a assembléa outorgam ao deputado que, em resultado dos votos de todo o circulo eleitoral se mostrar eleito, os poderes necessarios para que, reunido com os dos outros circulos eleitoraes da monarchia portugueza, faça, dentro dos limites da carta constitucional e dos actos addicionaes á mesma, tudo quanto for conducente ao bem geral da nação.

§ 1.° As actas poderão ser lithographadas ou impressas nos seus dizeres geraes e a sua redacção poderá realisar-se depois do sol posto.

§ 2.° Terminada a acta, a requerimento de qualquer eleitor, a mesa será obrigada a passar por certidão o numero de votos obtido por qualquer candidato, segundo o que da mesma acta, constar.

Art. 77.° D'esta acta tirar-se-hão tres copias authenticas, escriptas nos outros tres cadernos de que trata o artigo 45.°, igualmente assignadas e rubricadas pela mesa.

§ l.° Uma d'estas copias será logo remettida ao presidente da assembléa de apuramento do circulo eleitoral, com um dos cadernos de que trata o artigo 44.° e mais papeis relativos á eleição, acompanhados de uma relação escripta por um dos secretarios da mesa, donde conste especificadamente quaes elles são. A remessa far-se-ha pelo seguro do correio, havendo-o, ou por proprio, que cobrará recibo de entrega.

§ 2.° A outra copia será tambem logo entregue, com outro dos cadernos de que trata o artigo 44.°, ao administrador do concelho ou bairro a que a assembléa pertencer, para que tudo remetta com a devida segurança ao administrador do concelho ou bairro da séde do circulo eleitoral, do qual cobrará recibo.

§ 3.° A terceira copia será remettida ao presidente da camara municipal do concelho a que a assembléa pertencer, para ahi ser archivada.

Art. 78.° Tanto as actas originaes, como as copias a que se refere o artigo antecedente, serão assignadas por todos os vogaes da mesa, effectivos e supplentes, devendo, comtudo, julgar-se validas quando forem assignadas, pelo menos, por tres de entre elles. Se algum deixar de assignar, o secretario mencionará esta circumstancia.

Art. 79.° A qualquer cidadão é permittido pedir e os secretarios das camaras municipaes são obrigados a passar, independentemente de despacho, gratuitamente, sem sêllo e dentro de tres dias, certidões authenticas das actas e mais documentos relativos ás eleições, que estiverem guardados nos archivos das respectivas camaras. Todos estes documentos serão, para os effeitos, d'esta lei, consi-

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derados originaes e authenticos, e dar-se-ha inteiro credito a qualquer certidão legal que d'elles se extráia.

Art. 80.° Os dois escrutinadores serão os portadores da acta original da respectiva assembléa e apresental-a-hão, no dia designado, na séde do circulo eleitoral.

§ 1.º Quando algum dos escrutinadores tiver motivos que o estorvem de ir á séde do circulo, será substituido pelos secretarios ou pelos supplentes.

§ 2.° Tanto as actas originaes, que são entregues aos portadores, como as copias authenticas e mais papeis que, na conformidade do artigo 77.°, são remettidos para a séde do circulo eleitoral, por via do presidente da assembléa e do administrador do concelho ou bairro, serão fechadas e lacradas, e alem d'isso levarão no reverso do sobrescripto os appellidos dos membros da respectiva mesa, postos por letra de cada um.

CAPITULO VI

Do apuramento

Art. 81.° No domingo immediato ao da eleição, pelas novo horas da manhã, reunir-se-hão na casa da camara da séde do circulo eleitoral os portadores das actas de todo o circulo, sob a presidencia do presidente da commissão do recenseamento eleitoral; proceder-se-ha logo á formação da mesa, conforme o disposto nos artigos 40.° e seguintes, e observar-se-hão todas as mais disposições applicaveis com respeito á formação das mesas das assembléas primarias e ao modo de manter ahi a liberdade e fazer a policia, competindo para ente fim ao presidente da mesa das assembléas de apuramento as mesmas attribuições que pelos citados artigos competem aos presidentes e mesas d'aquellas assembléas.

§ 1.° Se o presidente não comparecer á hora fixada n'este artigo, prover-se-ha á sua falta pela fórma indicada no artigo 49.°

§ 2.° O administrador do concelho da séde do circulo ou do bairro onde se reunir a assembléa do apuramento, assistirá a todos os actos da mesma assembléa.

§ 3.º Verificando-se pela reunião dos portadores de actas que não então ainda concluidos os trabalhos de alguma assembléa primaria, ficará adiada para o domingo immediato a constituição da assembléa de apuramento, lavrando-se auto da occorencia, que será assignado pelo presidente, portadores presentes e auctoridade administrativa.

Art. 82.° Constituida a mesa, o presidente da assembléa lhe apresentará fechadas e lacradas as copias das actas que, na conformidade do artigo 77.°, § 1.°, lhe devem ter remettido as assembléas eleitoraes do circulo; os portadores das actas apresentarão tambem os originaes, que lhes tiverem sido entregues, e o administrador do concelho ou bairro da séde do circulo apresentará tambem as outras copias legaes, que na fórma do § 2.° do mesmo artigo lhe devem ter remettido os administradores dos outros concelhos ou bairros do circulo.

Art. 83.° Feita esta apresentação, nomear-se-hão, pela fórma indicada no artigo 46.° para a formação das mesas das assembléas primarias, as commissões que se julgarem necessarias para a mais prompta expedição dos trabalhos, e por estas commissões se distribuirão proporcionalmente as actas das diversas assembléas do circulo, de maneira, porém, que o exame das actas de uma assembléa não seja nunca encarregado a uma commissão de que sejam membros cidadãos recenseados na mesma assembléa.

Art. 84.° Estas commissões procederão immediatamente ao exame das actas, que lhes forem distribuidas, e ao apuramento dos respectivos votos. Do resultado darão conta á assembléa.

Art. 85.° Os pareceres das diversas commissões serão lidos e approvados ou reformados pela assembléa geral dos portadores das actas.

Art. 86.° Approvados ou reformados os pareceres, a mesa procederá immediatamente ao apuramento geral, na conformidade d'elles, a fim de averiguar o numero total de votos que cada um dos cidadãos votados teve em todo o circulo, e sobre isto lavrará um parecer, que será tambem lido e approvado ou reformado pela assembléa.

Art. 87.° As funcções das assembléas do apuramento reduzem-se exclusivamente a examinar, pela comparação das actas originaes trazidas pelos portadores com as copias authenticas subministradas pelo presidente da assembléa e respectivo administrador do concelho ou bairro, e tambem com os cadernos do recenseamento, se aquellas actas originaes são realmente as mesmas que foram copiadas aos portadores pelas mesas, e se os votos que d'ellas consta haver tido cada cidadão na respectiva assembléa são realmente os que elles ahi tiveram, e bem assim a apurar esses votos. De maneira nenhuma, porém, deixarão de os contar a qualquer cidadão ou poderão annullar as actas das quaes elles constam, com o fundamento de que houve alguma nullidade no recenseamento, na formação das mesas, no processo eleitoral, com o fundamento do que algum dos cidadãos votados é absoluta ou relativamente inelegivel ou com qualquer outro que não seja a falta de authenticidade ou genuinidade expressamente especificadas n'este artigo.

§ unico. Quando por qualquer caso imprevisto deixar de ser apresentada á assembléa de apuramento alguma acta original ou alguma das copias a que se referem os artigos antecedentes, far-se-ha o apuramento pelas que apparecerem.

Art. 88.° Concluido o apuramento, escrever-se-ha em dois cadernos, assignados e rubricados pela mesa, o numero de votos que teve cada cidadão.

Art. 89.° Será considerado como eleito deputado pelo circulo o cidadão mais votado.

§ 1.° Quando dois ou mais cidadãos tiverem o mesmo numero de votos, preferirá:

l.° O que tiver mais tempo de deputado;

2.° O mais velho;

3.° O que a sorte designar.

§ 2.° O nome do deputado eleito publicar-se-ha por editaes affixados na porta principal da assembléa, e o presidente proclamal-o-ha tambem em voz alta diante de toda ella.

Art. 90.° Qualquer eleitor do circulo poderá apresentar protestos, nos mesmos termos determinados para as assembléas primarias, perante a assembléa de apuramento, que será tambem obrigada a receber os protestos ou contra-protestos, que as mesas das assembléas primarias não tenham querido acceitar.

§ unico. Se os protestos apresentados nas assembléas de apuramento tiverem por objecto as operações das assembléas primarias, o presidente da assembléa ouvirá immediatamente os cidadãos, que compozeram as mesas das mesmas assembléas, para que informem o que se lhes offerecer ácerca dos protestos, e a resposta, que derem, será junta ao processo eleitoral.

Art. 91.° Do apuramento se lavrará acta, na qual se declarará o nome do deputado eleito, o numero de votos que teve, e como pelas actas das assembléas de todo o circulo eleitoral consta que os eleitores d'elle outorgaram ao cidadão, que só mostrasse haver sido eleito deputado, os poderes do que falla o artigo 76.°

Art. 92.° Da acta do apuramento se entregará copia, assignada por toda a mesa, ao deputado se presente estiver; quando esteja ausente enviar-se-ha com participação official do respectivo presidente.

Art. 93.° A acta de apuramento, conjuntamente com as actas originaes, cadernos e mais papeis que tiverem vindo das assembléas primarias, serão immediatamente remettidos ao presidente do supremo tribunal de justiça, dando-se logo da remessa conhecimento ao ministro e secretario d'estado dos negocios do reino.

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§ unico. As copias authenticas das actas, que houverem sido apresentadas pelo presidente, ficarão guardadas no archivo da camara municipal da séde do circulo, e aquellas que tiverem sido apresentadas pelo administrador do concelho ou bairro da mesma séde serão remettidas ao respectivo governador civil, para serem por elle archivadas; excepto no caso em que umas ou outras tenham servido de fundamento para sobre ellas assentar alguma decisão da assembléa de apuramento, porque, n'este caso, terão o mesmo destino do processo eleitoral, ao qual serão juntas.

CAPITULO VII

Do tribunal de verificação de poderes

Art. 94 ° O tribunal de verificação de poderes tem por fim conhecer de todos os processos das eleições de deputados, julgando as reclamações ou protestos apresentados, e, independentemente de reclamações ou protestos, declarando validas ou nullas as mesmas eleições.

§ unico. Contra os actos eleitoraes das assembléas primarias ou de apuramento e contra a elegibilidade dos deputados eleitos, qualquer eleitor do respectivo circulo póde apresentar reclamação ou protesto escripto e documentado, perante o presidente do tribunal, até á distribuição do processo eleitoral.

Art. 95.° O tribunal de verificação de poderes será composto:

1.° Pelo presidente do supremo tribunal de justiça, que será presidente do tribunal do verificação de poderes e por tres juizes do mesmo supremo tribunal designados pela sorte;

2.° Por tres juizes da relação de Lisboa e dois juizes da relação do Porto, tambem designados pela sorte.

§ 1.° Quando algum dos magistrados, de que tratam os n.ºs 1.° e 2.° d'este artigo, faltar ou estiver impedido, será chamado, para substituir o presidente, o juiz mais antigo do supremo tribunal, e, para os restantes juizes, os que lhes forem immediatos em antiguidade.

§ 2.° O sorteio, a que se referem os n.ºs 1.° e 2.° d'este artigo, será feito em sessão publica perante o supremo tribunal de justiça.

§ 3.° O tribunal constituir-se-ha por iniciativa do seu presidente, no dia immediato ao do apuramento da eleição geral de deputados no continente do reino.

Art. 96.° Os processos eleitoraes, contra os quaes não houver protestos ou reclamações, serão julgados no praso maximo de quinze dias, contados desde a sua recepção no tribunal, e os restantes deverão ser julgados no praso maximo de trinta dias, contados de igual data.

Art. 97.° As sessões do tribunal de verificação de poderes serão publicas e anteriormente fixadas em hora e dia por aviso do presidente publicado na folha official.

§ 1.° As discussões serão oraes.

§ 2.° O dia do julgamento será notificado com tres dias de antecedencia, por aviso publicado na folha official, aos candidatos, que poderão comparecer pessoalmente, fazer-se representar por advogados, ou produzir novos documentos até vinte e quatro horas antes do dia fixado para o julgamento. Se algum processo não poder ser julgado na sessão prefixada, ser-lhe-ha no fim d'esta determinado novo dia de julgamento sem necessidade de outra notificação.

§ 3.° Será sempre facultada aos candidatos, ou aos seus advogados, a inspecção directa, na secretaria do tribunal, dos processos eleitoraes e de quaesquer documentos que lhes digam respeito, não estando com vista aos juizes.

§ 4.° O tribunal poderá requisitar de todas as estações officiaes os documentos que entender convenientes e que urgentemente lhe serão remettidos, e no continente poderá mandar proceder a inqueritos, dentro do praso fixado para o julgamento, delegando para esse fim as suas attribuições em magistrados judiciaes, que terão direito de fazer citar testemunhas, nomear peritos e deferir-lhes juramento, corresponder-se com todas as auctoridades e requisitar-lhes as diligencias necessarias para o desempenho da sua commissão, e que enviarão sempre ao tribunal um relatorio em que exponham imparcialmente o seu pensar sobre os factos sujeitos ao inquerito. O magistrado ou magistrados delegados vencerão, a titulo de ajuda de custo, a retribuição que lhes for arbitrada pelo tribunal, o que não excedera 4$500 réis por dia.

§ 5.º O inquerito, quando seja requerido por qualquer dos candidatos nas eleições contestadas, só poderá ser recusado por accordão fundamentado.

Art. 98.° O tribunal de verificação de poderes é competente para conhecer da legalidade de todas as operações eleitoraes dos processos que lhe são affectos e da elegibilidade absoluta e relativa dos deputados a que os mesmos processos respeitam.

§ 1.° São causas de nullidade da eleição as infracções de lei e as faltas de formalidades, bem como os actos de violencia ou corrupção, devidamente comprovados, que possam influir no resultado geral da votação.

§ 2.º Os actos eleitoraes repetir-se-hão em todo o circulo quando as irregularidades que possam influir no resultado da eleição invalidarem as operações de mais de uma assembléa primaria, aliás sómente se repetirá o acto eleitoral na assembléa primaria em que hajam occorrido taes irregularidades.

§ 3.° As decisões do tribunal designarão individualmente todos os cidadãos votados no circulo e o numero de votos obtidos, qualquer que elle seja, e concluirão sempre por declarar valida ou nulla a eleição do deputado eleito, ou por declarar a necessidade de repetição dos actos eleitoraes em alguma ou em todas as assembléas, consoante os casos previstos no paragrapho antecedente.

§ 4.° As decisões do tribunal serão sempre motivadas e d'ellas não haverá recurso.

§ 5.° Os processos definitivamente julgados, depois de registadas as decisões proferidas, serão remettidos á camara dos deputados, dentro de quarenta e oito horas desde o julgamento, se a camara estiver funccionando, ou logo que se reuna; e as decisões, que determinarem por qualquer motivo a repetição de actos eleitoraes, serão immediatamente communicadas ao governo, que, no praso designado no artigo 105.°, contado da data da decisão, convocará as respectivas assembléas.

§ 6.° As decisões proferidas nas eleições contestadas serão sempre publicadas na folha official.

§ 7.° O tribunal conhecerá das questões relativas á sua constituição e organisará o seu regulamento.

CAPITULO VIII

Da junta preparatoria, da constituição da camara dos deputados e modo de preencher as vacaturas

Art. 99.º Todos os deputados eleitos deverão concorrer no dia e logar aprasado para a reunião das côrtes geraes.

Art. 100.° Logo que se tenha reunido metade e mais um dos deputados eleitos pelos circulos do continente do reino, não se contando para cada deputado a eleição por mais de um circulo, constituir-se hão em junta preparatoria, á qual serão presentes todos os processos, com os respectivos julgamentos, enviados do tribunal de verificação de poderes.

§ unico. Os deputados serão proclamados em conformidade com os julgamentos do tribunal.

Art. 101.° O deputado eleito por mais de um circulo eleitoral representará e da naturalidade; não sendo eleito por este, e da residencia; na falta d'este, o circulo em que tiver obtido maior numero de votos, e em igualdade de votos, o que a sorte designar.

Art. 102.° O deputado eleito póde livremente renunciar o seu logar de deputado, antes de tomar assento na camara, fazendo-o assim constar por escripto á mesma camara.

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Art. 103.º O deputado, depois de tomar assento na camara, não póde renunciar o seu logar sem approvação d'ella.

Art. 104.° O deputado, depois de tomar assento na camara, não póde escusar-se a desempenhar as funcções do mesmo lugar senão por causa legitima ou justificada perante a camara.

§ 1.º Se, contra o disposto n'este artigo, deixar de comparecer ás sessões por quinze dias consecutivos, será primeira e segunda vez convidado por officio do presidente, precedendo para esse fim deliberação da camara.

§ 2.º Se ainda, apesar d'isso, não se apresentar ou não justificar motivo que o impossibilite de comparecer, resolver-se-ha que perdeu o logar do deputado, o qual será declarado vago.

§ 3.° Esta vacatura não poderá ser declarada pela camara sem que, primeiramente, pelo exame de uma commissão, á qual o assumpto seja commettido, se verifique terem-se pontualmente observado todas as solemnidades d'este artigo e seus paragraphos.

Art. 105.° Declarada a vacatura de qualquer logar de deputado, será, este facto immediatamente communicado no governo, para que mande proceder á eleição supplementar no praso de quarenta dias, desde a data da resolução da camara, se o circulo pertencer ao continente do reino, ou no mais breve praso, que for compativel com as distancias e meios de communicação, se o circulo pertencer ás ilhas adjacentes ou ao ultramar.

§ unico. Nos actos eleitoraes que houverem de repetir-se observar-se-hão as formalidades estabelecidas n'esta lei para a eleição geral de deputados.

CAPITULO IX

Disposições especiaes

Art. 106.° Nas provincias ultramarinas os vogaes da commissão do recenseamento eleitoral serão nomeados pelo conselho de provincia, e o governador escolherá de entre elles o presidente.

§ 1.º Nas mesmas provincias as assembléas primarias serão presididas por cidadãos da livre escolha das commissões de recenseamento.

§ 2.º Continúa em vigor o disposto no artigo 118.º do decreto eleitoral de 30 de setembro de 1852, e em decretos especiaes serão designadas as contribuições directas das mesmas provincias, que deverão levar-se em conta para o calculo da quantia exigida pelo artigo l.º, alem das contribuições mencionadas no artigo 20.º

Art. 107.° Os governadores das provincias ultramarinas são auctorisados a fixar, com os indispensaveis intervallos e attendendo ás distancias e meios de communicação, os prasos para as operações de organisação e revisão do recenseamento eleitoral e para os diversos actos das eleições.

Art. 108.° No caso de annullação da eleição de algum circulo do ultramar, será chamado a represental-o o mesmo cidadão, que o representava na legislatura anterior, até que se apresente á camara, devidamente julgado, o processo eleitoral do respectivo circulo.

Art. 109.° As funcções dos deputados pelas provincias ultramarinas cessam logo que finde a legislatura para que foram eleitos ou em que tomaram assento.

§ 1.° No caso, porém, da dissolução da camara, os deputados das provincias ultramarinas continuarão a represental-as unicamente até que seja apresentado á camara, devidamente julgado, o processo eleitoral dos respectivos circulos.

§ 2.° Quando seja reduzido o numero de circulos das mesmas provincias, serão chamados a represental-as, nos termos do paragrapho antecedente, os deputados da anterior legislatura pela ordem designada nos n.°s 1.°, 2.° e 3.º do § 1.° do artigo 89.°

Art. 110.° Os governadores civis dos districtos insulanos designarão para os recursos eleitoraes, quando os haja, para os subsequentes actos do recenseamento e para a reunião das assembléas de apuramento os prasos e dias que forem compativeis com os meios de communicação.

CAPITULO X

Disposições penaes e geraes

Art. 111.° Os parochos, os encarregados do registo criminal, officiaes do registo civil e escrivães de fazenda, que deixem de remetter, nos prasos devidos, aos secretarias das camaras municipaes ou aos secretarios das administrações dos bairros de Lisboa e Porto, as relações e informações a que são obrigados por esta lei para a organisação e revisão do recenseamento, incorrerão na multa de 40$000 a 100$000 réis.

Art. 112.º Os membros das commissões do recenseamento que deixarem de comparecer ás reunidos a que são obrigados ou que, comparecendo, deixarem de cumprir as obrigações que esta lei lhes impõe, incorrerão na multa de 40$000 a 100$000 réis por cada vez que o fizerem.

§ unico. Na mesma pena incorrem todas as pessoas, auctoridades ou funccionarios que deixarem de prestar qualquer esclarecimento ou informação exigido por esta lei para a organização e revisâo do recenseamento eleitoral.

Art. 113.° Os parochos, funccionarios e mais pessoas, a que se referem os dois artigos antecedentes, no caso de prestarem falsas declarações, incorrerão na pena de suspensão temporaria dos direitos politicos e na de prisão até seis mezes.

§ unico. Incorrerá na pena do suspensão o escrivão de fazenda que omittir o nome de qualquer contribuinte, nas relações que é obrigado a fornecer para a organisação ou revisão do recenseamento eleitoral e, no caso de reincidencia, será demittido.

Art. 114.° Os portadores das actas que deixarem de comparecer na assembléa do apuramento no local, dia e hora marcado por esta lei, ou que, comparecendo, ahi deixarem da cumprir as obrigações que esta lei lhes impõe, incorrerão em uma multa do 40$000 a l00$000 réis.

Art. 115.° As auctoridades administrativas ou ecclesiasticas que deixarem de comparecer nas assembléas eleitoraes primarias ou do apuramento, para os fins indicados por esta lei, os cidadãos eleitos para vogaes effectivos ou supplentes da mesa, que se recusarem a servir ou cumprir alguma obrigação, que lhes for incumbida, incorrerão na multa de 40$000 a 100$000 réis.

Art. 116.° Os presidentes de quaesquer assembléas eleitoraes primarias ou de apuramento que não comparecerem para presidir ás respectivas assembléas no dia, hora o local competente, incorrerão na multa de 50$000 a 100$000 réis.

§ 1.° E se, deixando de comparecer por impossibilidade absoluta, não mandarem entregar no mesmo local, ao presidente que a assembléa houver escolhido para o substituir, todos os papeis concernentes á eleição que lhes houverem sido entregues, em virtude da lei, uma hora depois d'aquella a que se refere o principio d'este artigo, incorrerão no multa de 100$000 a 200$000 réis.

§ 2.º Serão punidos com a mesma pena aquelles que começarem ou interromperem os actos eleitoraes antes das horas marcadas n'esta, lei.

Art. 117.° As auctoridades que se negarem a passar, dentro do praso competente, as copias, certidões ou attestados que lhes forem pedidos, para demonstração de algum direito garantido por esta lei, ou que por qualquer modo embaraçarem, ou com qualquer outro pretexto demorarem a passagem d'esses documentos ou a entrega de quaesquer outros que lhes hajam sido confiados, incorrerão na multa do 50$000 a 200$000 réis e, soffrerão a pena de suspensão do emprego pelo espaço de seis mezes a um anno.

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§ unico. Se d'este procedimento da auctoridade resultar para algum cidadão a perda do exercicio do direito eleitoral ou de elegibilidade, a multa será duplicada e a pena será, de prisão de seis mezes a um anno

Art. 118.° O secretario da camara municipal ou da administração do bairro, que deixar de cumprir as obrigações prescriptas n'esta lei, incorrerá na multa de 100$000 a 200$000 réis, e suspensão de um a seis mezes, e no caso de reincidencia, na pena de demissão, sem prejuizo das penas que lhe sejam applicaveis pelo crime de falsificação de documentos, ou por qualquer outro previsto n'esta lei.

Art. 119.° Os juizes de qualquer ordem ou jerarchia, que deixarem de cumprir, dentro dos prasos fixados por esta lei, as obrigações que ella lhes impõe, incorrerão na multa de 50$000 a 100$000 réis e soffrerão a pena de dois a seis mezes de suspensão.

Art. 120.° Todas e quaesquer pessoas particulares ou auctoridades, ás quaes, individual ou collectivamente, seja imposta por esta lei alguma obrigação, se deixarem de a cumprir, incorrerão na multa de 40$000 réis a 100$000 réis, quando outra pena lhes não seja comminada por alguma disposição especial d'ella.

Art. 121.° Todos aquelles que se fizerem inscrever a si ou a outros, ou concorrerem para que elles proprios ou esses outros sejam inscriptos no recenseamento, com falso nome ou falsa qualidade, ou encobrindo ou concorrendo para que se encubra uma incapacidade prevista na lei, ou tiverem feito ou concorrido para que se faça a inscripção de um mesmo eleitor em duas ou mais relações de recenseamento, incorrerão na pena de suspensão dos direitos politicos por tempo não inferior a seis annos e na multa de 50$000 a 200$000 réis.

§ unico. Todos aquelles que, sendo encarregados por esta lei de fazer o recenseamento dos eleitores e elegiveis, inscreverem ou deixarem de inscrever indevidamente e com dolo no recenseamento qualquer cidadão, serão punidos com a pena duplicada.

Art. 122.° Todo aquelle que, tendo perdido o direito de votar por algum dos motivos indicados n'esta lei votar não obstante isso, será punido com a pena de prisão de quinze dias a tres mezes e multa de 10$000 a 50$000 réis.

Art. 123.º Todo aquelle que votar em qualquer assembléa eleitoral, quer seja em virtude de uma inscripção obtida illegitimamente pelo modo previsto no artigo 121.°, quer seja tomando falsamente os nomes e as qualidades de um outro eleitor inscripto, será punido com a pena de prisão de um mez a um anno e multa de 20$000 a 100$000 réis.

§ unico Será punido com a mesma pena todo o cidadão que se aproveitar de uma inscripção multipla para votar mais de uma vez.

Art. 124.° Todos aquelles que falsificarem ou concorrerem para que seja falsificado o escrutinio: acceitando listas declaradas illegaes por esta lei ou contando os votos que ellas contiverem; pondo ou consentindo que se ponha nota de descarga em eleitores que não votaram; introduzindo illegalmente listas na urna, tirando ou substituindo as que n'ella tiverem sido legalmente lançadas; trocando na leitura das listas e, nome dos votados, ou diminuindo votos a uns, e acrescentando os a outros no acto de os assentarem; ou falsificando por qualquer modo a verdade da eleição, serão punidos, em qualquer d'estes casos, com a pena de prisão não inferior a dois annos e multa de 200$000 a 1:000$000 réis.

Art. 125.° Incorrerão na pena comminada pelo artigo anterior todos aquelles que por qualquer maneira falsificarem o recenseamento, nos cadernos que forem enviados pelas commissões aos presidentes das assembléas eleitoraes primarias, ou quaesquer outros documentos que por ellas lhes forem remettidos; todos aquellas que falsificarem os cadernos, actas e mais papeis respectivos á eleição, que pelas diversas vias estabelecidas por esta lei devem ser remettidos ás assembléas de apuramento; e, em todos aquelles que falsificarem, concorrerem para que se falsifique ou consentirem que se falsifique qualquer documento respectivo ao recenseamento ou ás eleições; e ainda aquelles que deixarem extraviar estes documentos, havendo-lhes sido confiados.

Art. 126.° Todos os portadores das actas que na assembléa de apuramento, contra a disposição do artigo 87.°, as annullarem, por quaesquer motivos que não sejam o de falta de genuidade e authenticidade expressamente marcados n'esta lei; que deixarem com qualquer fundamento de contar os votos aos cidadãos votados ou de se conformar com as disposições do mesmo artigo em que lhes são taxativa, restricta e expressamente marcadas as suas funcções; ou que por qualquer modo adulterarem a verdade da eleição, incorrerão na pena de prisão não inferior a dois annos, na multa de 200$000 réis a 1:000$000 réis e na habilidade para todas as funcções publicas por espaço de seis annos.

Art. 127.° A cada um dos membros da assembléa primaria ou de apuramento que se oppozer ao exacto cumprimento das disposições dos §§ 3.° e 4.° do artigo 54.°, dos preceitos do artigo 68.°, dos §§ 1.º e 2.° do art. o 74.°, do § unico do artigo 75.°, do § 2.° do artigo 76.° e do disposto no artigo 90.°, será applicada a pena de prisão de quinze dias a seis mezes e multa de 50$000 a 200$000 réis. O maximo da pena será sempre applicado nos mesmos casos ao presidente da assembléa.

Art. 128.° Aquelles que por via de noticias falsas, boatos calumniosos, promessas ou quaesquer outros artificios fraudulentos, surprehenderem ou desviarem votos, determinarem ou tentarem determinar um ou muitos eleitores
abster-se de votar, um ou muitos portadores de actas a deixar de cumprir as obrigações que lhes são impostas por esta lei, serão punidos com a multa de 20$000 a 200$000 réis.

§ unico. Se o delinquente for empregado publico, a pena será, alem da multa, a suspensão de direitos politicos de um mez a um anno.

Art. 129.° Aquelles que, por vias de facto, violencias ou ameaças contra um eleitor, fazendo-lhe receiar algum damno para a sua pessoa, familia ou fortuna, o determinarem ou tentarem determinar a votar ou abster-se de votar, influirem ou tentarem influir sobre o sou voto, serão punidos com a pena de prisão de dois mezes a dois annos e multa de 20$000 a 200$000 réis.

§ l.° Se as vias de facto e violencias forem taes que mereçam pena maior que o maximo aqui estabelecida, ser-lhes-ha essa pena applicada.

§ 2 ° Se o delinquente for funccionario publico, a pena será de prisão de dois mezes a dois annos e suspensão dos direitos politicos até tres annos.

Art. 130.° Todo aquelle que entrar armado em uma assembléa eleitoral primaria ou de apuramento será punido com a pena de prisão de um a tres mezes e multa de 10$000 a 100$000 réis.

Art. 131.° A auctoridade militar, por cuja ordem alguma força armada se apresentar no local onde estiverem reunidas as assembléas eleitoraes ou na sua proximidade, sem requisição do respectivo presidente, contra o disposto no artigo 59.° d'esta lei, será punida com a pena de presidio militar até um anno.

§ 1.° Nenhuma ordem vocal auctorisará a infracção do referido artigo.

§ 2.° Nenhuma ordem por escripto relevará o infractor, excepto a original requisição do presidente da mesa.

Art. 132.° Todos aquelles que, por via de tumultos, vozerias ou quaesquer outras demonstrações ameaçadoras, pretenderem ou tentarem perturbar as operações da assembléa primaria ou do apuramento, ou attentarem contra o exercicio do direito eleitoral ou contra a liberdade de votar, e bem assim todos aquelles que em tumulto entra-

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rem ou tentarem entrar com violencia na assembléa eleitoral, com o fim de impedir a eleição de qualquer cidadão, ou de impor a de um outro, serão punidos com a pena de prisão de seis mezes a dois annos e multa de ré 100$000 a 500$000.

§ unico. Só os delinquentes forem armados ou se o escrutinio for violado, a prisão não será inferior a dois annos e a multa será de 200$000 a 1:000$000.

Art. 133.º Todos aquelles que, durante a reunião das assembléas eleitoraes primarias ou de apuramento, insultarem ou violentarem a mesa, ou lhe faltarem á devida obediencia, insultarem ou violentarem algum dos membros da assembléa, serão punidos com a pena de prisão de tres mezes a dois annos e a multa de, 50$000 a 500$000 réis.

§ 1.° Se o escrutinio for violado, a prisão não será inferior a dois annos e a multa será de 200$000 a 1:000$000 réis.

§ 2.° Se as violencias forem taes que mereçam, pela legislação commum, pena maior, ser-lhes-ha essa applicada.

Art. 134.° Aquelle que roubar a urna com as listas recebidas, mas ainda não apuradas, ou roubar algumas listas, será punido com a pena de prisão de seis mezes a dois, annos e multa de 100$000 a 500$000 réis.

§ unico. Se o roubo for effectuado em tumulto e com violencia, a prisão não será inferior a dois annos e a multa será de 200$000 a 1:000$000 réis, e se maior pena, pela legislação commum, couber ás violencias perpetradas, essa deverá applicar-se.

Arr. 135.º Todas as auctoridades administrativas e policiaes que, por negligencia, deixarem de empregar todos os meios a sua disposição para obstarem a que se pratiquem as contravenções e delictos prevenidos por esta lei dentro da area da sua jurisdicção, serão punidas com a pena de demissão ou suspensão do emprego, conforme o grau da culpa.

§ unico. Se o fizerem por malicia, reputar-se-hão cumplices n'essas contravenções ou delictos e, como taes, serão punidas com as penas que estiverem comminadas aos proprios delinquentes.

Art. 136.º Todos os magistrados, auctoridades e empregados que nas circumscripções territoriaes, pelas quaes forem respectivamente inelegiveis, espalharem cartas, proclçamações ou manifestos eleitoraes, ou angariarem votos, serão punidos com a pena de prisão de um mez e um anno e suspensão de direitos politicos até seis annos.

Art. 137.° Será punida com a pena de prisão de seis mezes a dois annos e inhahilidade para todos os cargos publicos por quatro a seis annos, toda a auctoridade, seja qual for a sua classe ou categoria, que no dia das eleições fizer, sob qualquer pretexto, e ainda mesmo por motivo de serviço publico, sair do seu domicilio ou permanecer fóra d'elle qualquer eleitor, para que não possa votar.

Art. l38.º Será igualmente punida com a mesma pena toda a auctoridade que conduzir, por si ou por intermedio dos seus subordinados, ou eleitores ao local da eleição para darem o seu voto ou os impedir ali de communicarem e tratarem com os outros para accordarem no melhor modo de exercerem o seu direito

Art. 139.° É prohibido aos administradores do concelho, sob pena de inhabilidade para todos os cargos publicos por quatro annos e multa de 50$000 a 200$000 réis, nomear cabos de policia quinze dias antes das eleições Durante o mesmo tempo e sob igual fórma é prohibido aos [...] de parochia deferir juramento aos cabos de policia nomeados.

Art. 140.º As auctoridades administrativas ou policiaes que deixarem de participar aos agentes do ministerio publico as contravenções e deliectos previstos n'esta lei, e os agentes do ministerio publico, que deixarem de immediatamente os perseguir, incorrem na pena de demissão e inhabilidade para qualquer emprego publico, por cinco a dez annos, alem da responsabilidade que, por qualquer omissão ou negligencia, lhes caiba para com a fazenda publica-

Art. 141.° Todas as contravenções e delictos, que offenderem as disposições d'esta lei ou o direito eleitoral e o exercido d'elle, comprehendidos nos diversos artigos d'este capitulo, serão sempre perseguidos, perante os tribunaes competentes, pelos respectivos agentes do ministerio publico, e tambem e podem ser por qualquer eleitor inscripto no recenseamento, instaurando-se o processo devido segundo a legislação em vigor.

Art. 142.° O procedimento criminal por contravenções ou delictos previstos n'esta lei prescreve no praso de seis mezes desde que forem commettidos.

§ unico. Sómente prescreve no praso de tres annos o procedimento pelo delicio previsto no artigo 131.° e o procedimento contra as auctoridades administrativas ou policiaes e contra os agentes do ministerio publico que para a punição do mesmo delicto deixarem de cumprir o preceito do artigo 140.°

Art. 143.° Para se perseguir um funccionario de qualquer ordem ou categoria ou qualquer agente da auctoridade publica pelos crimes previstos na presente lei ou pelos que contra o exercicio dos direitos politicos estão previstos no codigo penal, não é necessaria auctorisação do governo.

Art. 144.° Os processos por estes crimes não suspendem em caso algum as operações eleitoraes nem podem prejudicar o segredo do escrutinio.

Art. 145.° A condemnação, quando for pronunciada, não importará nunca a annullação da eleição declarada valida pelo tribunal competente.

Art 146.° Continuam a ser permittidas todas as reuniões para objectos eleitoraes, tanto publicas como particulares, nos termos da legislação respectiva.

Art. 147.° Fica revogada a lei de 21 de maio de 1890 e toda a legislação em contrario.

Paço, em 3 de maio de l899. = José Luciano de Castro = José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral = Manuel Affonso de Espergueira - Sebastião Custodio de Sousa Telles. = Antonio Eduardo Villaça = Francisco Antonio da Veiga Beirão - Elvino José de Sousa e Brito.

Mappa dos circulos eleitoraes que faz parte da presente lei

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Paço, em 3 de maio de 1899. = José Luciano de Castro.

O sr. Tavares Festas (relator): - Mando para a mesa as seguintes

Propostas

Proponho que a discussão e votação do projecto se faça por capitulos. = Tavares Feitas.

Proponho que no quadro dos prasos para as operações de recenseamento se façam as seguintes substituições: a seguir «25 de janeiro» por a 15 de janeiro», «20 de fevereiro» por «l de fevereiro», «6 de março» por «3 de março», «18 de março» por «14 de março», «24 de março» por «22 de março», «17 de abril» por «15 de abril»,

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«25 de abril» por «23 de abri», e «29 de abril» por «27 de abril», e assim epal sua ordem o numero de dias será alterado, passando 12 a 10, 2 a 4, 7, 2 a 4, 10 a 8, e o mais como Na proposta do governo. = O relator A. Festas.

Proponho que o § 1.° do artigo 42.° seja substituido polo seguinte:

«§ 1.º No praso do vinte dias, a contar da publicação d'esta lei, serão nomeados os vogaes da commissão do recenseamento eleitoral a que ella se refere, os quaes dentro de dez dias procederão á divisão das assembleias eleitoral, nos termos prescriptos no artigo antecedente. = A. Festas.

Declaro que por erro typographico no § 5.° do artigo 28.° foi incorporada parte do § 6.° do mesmo artigo, desapparecendo a outra parte e todo o paragrapho.

Assim o § 5.° deve terminar com as palavras «administração do bairro» e o § 6.° deve ser redigido da seguinte fórma:

«§ 6.° As relações do recenseamento assim modificadas, estarão patentes, durante o praso legal, na secretaria da camara municipal ou da administração do bairro, desde as novo horas da manhã até ás tres da tarde, a todas as pessoas que as queiram examinar, as quaes poderão d'ellas tirar copia e fazel-as authenticar por quaesquer officiaes publicos, na fórma das leis. = O relator, A. Festas.

Foram todas admittidas

O sr. Presidente: - Vae ler-se, para se votar, a primeira, das propostas mandadas para a mesa pelo sr Tavares Festas.

Lida na mesa, foi approvada.

O sr. Presidente: - Km virtude da deliberação que a camara acaba de tomar, está em discussão o capitulo 1.º

As propostas mandadas para a mesa pelo sr. Tavares Festas, ficam em discussão com este capitulo.

O sr. Arroyo: - Pedi a palavra, não propriamente para usar d'ella na discussão do projecto que v. exa. acaba de submetter ao exame da camara, mas unicamente para fazer uma declaração, por parte da opposição regeneradora d'esta casa do parlamento.

Esta declararão não é senão a consequencia d'aquella que, no inicio da actual sessão legislativa, aqui foi feita pelo meu illustre amigo e collega, o sr. João Franco.

O partido regenerador, como o illustre leader da opposição declarou, entende que os trabalhos parlamentares devem, no momento actual, ter por objecto, unica e exclusivamente, as medidas de ordem economica e financeira, que possam conter em si formulas e meios de melhorar a actual situação do paiz, no que respeita aos recursos do thesouro, á sua economia interna, ao seu commercio e á sua agricultura.

O partido regenerador absteve se então, como hoje se abatem, de collaborar, de qualquer maneira, nas discussões do caracter exclusivamente politico. (Apoiados.)

A opposição regeneradora tem dado, na presente sessão legislativa, a prova do que póde a cordura, a modelação e a dedicarão ao bem publico, não se recusando e antes mostrando desejo e vontade sincera de collaborar, dentro das leis, e nos termos do regimento d'esta casa, na discussão o aperfeiçoamento da legislação patria. (Apoiados.)

A opposição regeneradora, pela sua attitude e pelo seu procedimento, durante esta longa e fatigante sessão, creio ter dado uma demonstração clara da comprehensão do seu dever civico, nunca excedido em dedicação pelo bem publico! (Apoiados.)

N'estes termos, sr. presidente, reconhecendo esse partido a absoluta inopportunidade e impropriedade das discussões politicas, afasta-se por completo d'ellas e faz a declaração, a mais completa e absoluta, de que não coopera n'este debate. (Apoiados.)

Vozes: - Muito bem.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (João Luciano de Castro): - Nada tenho que oppor á declaração que acaba de fazer o illustre deputado, o sr. João Arroyo, em nome dos seus amigos politicos. Já esperava essa declaração, que é a perfeita consequencia das palavras, que já tinham sido proferidas n'esta camara pelo illustre leader da opposição regeneradora, o sr João Franco.

Quer o partido regenerador occupar-se só do questões economicas o financeiras? Pois, exactamente para não impedir a discussão d'esses assumptos, é que ou, propositadamente, demorei a da reforma eleitoral.

A reforma eleitoral já tinha, ha tempo, parecer da commissão respectiva, mas eu só concordei em que ella entrasse em discussão, quando d'esse facto não podesse resultar nenhum prejuizo, nem nenhum impedimento, para a discussão dos projectos de ordem financeira ou economica, sujeitos á apreciação da camara.

O procedimento do governo mostra, portanto, bem, sr. presidente, que nós não queremos que a discussão das reformas consideradas como exclusivamente politicas, se faça com prejuizo dos projectos de ordem financeira e economica (Muitos apoiados.}, de contrario teria feito discutil-as e votal-as pelo parlamento, antes de se discutirem o votarem esses projectos.

Eu entendi sempre que as questões do ordem economica e financeira deviam preceder as questões de ordem politica, e assim tenho procedido, dirigindo a discussão parlamentar, de accordo com o illustre presidente d'esta camara, de maneira que aquelles projectos entrassem em discussão primeiro do que estes. Mas se penso assim, e assim tenho procedido, crendo tambem que se podem conciliar os interesses de ordem economica com os interesses do ordem politica, eu não podia, sem faltar ao compromisso que, solemnemente, tinha tomado perante a minha consciencia, perante a camara, perante o paiz o perante os meus amigos politicos, deixar encerrar a ultima sessão legislativa, sem apresentar os projectos de ordem politica a que me havia compromettido.

O que eu fiz, foi proceder de maneira que as questões financeiras não fossem demoradas na discussão por causa das questões politicas.

Já vê, pois, o illustroe deputado que estou de accordo com s. exa. Nós não queremos que as questões de ordem financeira sejam preteridas pelos assumptos do ordem politica, mas o que s. exa. não póde exigir de mim, é que falte aos compromissos que solemnemente tomei perante o paiz, quando nós podemos satisfazer esse compromisso, sem perturbar os desejos do illustre deputado na discussão dos assumptos de ordem economica.

Creio que o illustre deputado declarou tambem que o seu partido se reservava o direito de proceder como entendesse...

O sr. Arroyo: - Não senhor, não declarei, mas se por acaso isso convem para o seu ataque, faça s. exa. de conta que eu declarei.

O Orador: - Não preciso absolutamente de tal declaração, e se alludi a ella foi porque, não tendo ouvido perfeitamente bem todas as declarações que s. exa. fez, lembrei-me de que, visto que o illustre deputado representava n'esta occasião o seu amigo o distincto parlamentar sr. João Franco, repetiria todas as declarações que o illustre leader fez a proposito da reforma eleitoral, quando ella foi apresentada á camara.

As suas declarações, n'essa occasião, foram no sentido do que o partido regenerador se reservava o direito de, assumindo de novo o poder, proceder como entendesse, o suppuz, portanto, não tendo ouvido perfeitamente todo o

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discurso do illustre deputado, que s. exa. em conformidade com essas declarações, tinham tambem feito essa affirmação.

Não creia s. exa. que eu viesse dizer qualquer cousa que podesse maguar os illustres deputados, ou que precisasse das declarações de s. exa. de que se reservava o direito de reformar, modificar ou alterar o que fôra disposto sobre estas questões de caracter politico, para effeito as minhas palavras.

Quer s. exa. fizesse ou não essa declaração, ninguem póde deixar de lhes reconhecer o direito de, por qualquer meio legal, proporem a modificação dos projectos agora apresentados á camara.

Essa declaração seria necessaria, se s. exa. votasse, se desse a sua approvação ao projecto, mas desde que s. exa., não só não se conforma com elle, como declara que a opposição o não discute, todos reconhecem ao partido regenerador o direito de proceder depois como quizer, e julgar mais conveniente aos interesses do paiz.

E visto que s. exa. não fez essa declaração, nada mais tenho a dizer e limito-me a registar a declaração de s. exa.

Declarou o illustre deputado que não entrava na discussão do projecto de reforma eleitoral, porque elle é do caracter politico; comtudo, como a declaração de s. exa. diz respeito á generalidade, se quizer, na discussão da especialidade, apresentar algumas propostas de alteração, alguns alvitres para melhorar o regimen eleitoral, eu, e a commissão, aprecial-os-hemos da melhor boa vontade, e desde que sejam acceitaveis, não temos duvida alguma em os adoptar, assim como qualquer proposta de outro sr. deputado.

Tenho dito.

(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)

O sr. Presidente: - Está esgotada a inscripção.

Vae votar-se o capitulo 1.°, sobre o qual não foi mandada para a mesa nenhuma proposta.

Vae ler-se.

Lido na mesa, foi approvado.

O sr. Presidente: - Vae ler-se o capitulo 2.°

Leu-se.

O sr. Presidente: - Está em discussão.

O sr. Alexandre Cabral: - Mando para a mesa as seguintes

Propostas

Proponho que se substitua o n.° 3.° do artigo 6.° pelo seguinte:

«3.° Com o logar de director, administrador gerente ou membro dos conselhos administrativos ou fiscaes de quaesquer companhias ou sociedades que recebam subsidio do estado ou que administrem alguns dos seus rendimentos, salvo quando esses funccionarios representarem n'ella os interesses do estado por delegação do governo.» = Alexandre Cabral.

Proponho:

1.° Que no artigo 11.° as palavras «durante o tempo da legislatura» sejam substituidas pelas seguintes «senão depois da ultima sessão da terceira sessão ordinaria da legislatura ou depois de dissolvida a camara».

2.° Que ao § 6.° do artigo 22.° se acrescente o seguinte periodo:

«No primeiro anno da execução d'esta lei, havendo necessidade de chamar os vogaes do anno anterior, será isso feito pela fórma seguinte: para substituir o presidente da camara municipal, será chamado o vogal de nomeação da camara; para substituir o conservador, será chamado o vogal de nomeação da commissão districtal; e para substituir o vogal nomeado pelo juiz de direito, será chamado o que fóra nomeado pelo mesmo magistrado.»

3.° Que as palavras «as listas contidas no § unico do artigo 72.°» sejam substituidas pelas seguintes aos nomes contidos nas listas».

4.° Proponho que no artigo 81.° se inscreva o seguinte:

«§ 1.° Quando os escrutinadores, ou quem os substituir, não accordarem sobre qual d'elles ha de conservar a acta original em seu poder, será isso decidido pela sorte.» = O deputado, Alexandre Cabral.

Foram admittidas e ficaram em discussão conjunctamente com o capitulo.

O sr. Conde de Burnay: - Sustenta que tem graves inconvenientes a disposição de lei pela qual foi supprimido o subsidio dos deputados. D'essa suppressão resulta o deixarem de vir á camara cidadãos que, estando, aliás, no caso de serem deputados, não podem, comtudo, acceitar o mandato, por não terem meios de se sustentarem na capital. Entende, portanto, que o subsidio deve ser restabelecido.

Nada significa a disposição do n.° 3.° do artigo 6.°, que estabelece a incompatibilidade entre as funcções de deputado e as de director, administrador, gerente ou membro dos conselhos administrativos ou fiscaes do quaesquer companhias ou sociedades que recebam subsidio do estado, ou administrem alguns dos seus rendimentos, porque esta disposição se sophisma facilmente por meio de uma substituição temporaria.

Conclue mandando para a mesa as seguintes

Propostas

Additamento ao capitulo 2.°:

Os deputados receberão como subsidio de presença de cada uma das sessões da camara 4$000 réis. Os deputados que forem funccionarios publicos remunerados terão a faculdade de optar entre os seus vencimentos e o subsidio como deputado. = Conde de Burnay.

Proponho a suppressão do n.° 3.° do artigo 6.° do capitulo 2.° = Conde de Burnay.

Foram admittidas e ficaram em discussão conjunctamente com o capitulo.

(O discurso será publicado na integra, quando o orador o restituir.)

O sr. Tavares Festas: - Declara que, por sua parte, rejeita a proposta relativa ao subsidio; mas a commissão a apreciará e tomal-a-ha na devida conta, bem como todas as outras.

(O discurso será publicado na integra, quando o orador o restituir.)

O sr. Adriano Anthero: - Manda para a mesa uma proposta, e em seguida pergunta se o n.° 3.º do artigo 6.°, que estabelece a incompatibilidade entre as funcções de deputado e as de directores ou administradores de companhias, se refere só ás que administram bens do estado por conta do estado, ou tambem ás que administram bens do estado por conta d'ellas, como as companhias coloniaes.

Suppõe que estas não estão incluidas no n.° 3.° d'aquelle artigo, mas deseja que este ponto fique bom claro.

Proposta

Proponho que o artigo 6.° n.° 3.° se redija de modo que fique bem claro, que o final d'elle se refere só aos rendimentos proprios e directos do estado, e por conta do mesmo estado, por fórma que, por exemplo, os directores das companhias ultramarinas, que administram rendimentos do estado ou de categoria dos rendimentos do estado, mas por concessão d'este e por conta propria d'ellas, não estão comprehendidas na incompatibilidade d'este artigo. = O deputado, Adriano Anthero.

Foi admittida, ficando em discussão conjunctamente com o capitulo.

(O discurso será publicado na integra, quando o orador o restituir.)

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O sr. Presidente do Conselho de Ministros (José Luciano de Castro): - Pedi a palavra, simplesmente para dizer ao illustre deputado, que o n.º 3.° do artigo 6.°, que diz respeito ás incompatibilidades dos directores das companhias, é a repetição de uma disposição da lei de 1852, e só ss refere ás companhias que administram bens do estado por conta do estado, como, por exemplo, a companhia dos phosphoros e a companhia dos tabacos.

Era esta a explicação que ou tinha a dar ao illustre deputado.

(S. exa. não reviu.}

O sr. Arthur Montenegro: - Occupando se do artigo 6.°, que se refere ás incompatibilidades, divide estas em duas categorias: incompatibilidades de ordem disciplinar e da ordem moral.

Ás primeiras não se oppõe; mãe as segundas entendo que não têem rasão de ser, porque o melhor fiador da independencia do deputado é o seu caracter.

E só um tal principio devesse subsistir, as incompatibilidades deviam então começar pelos funccionarios do estado que accumullam as funcções com as directores de companhias ou de representantes do governo junto d'essas companhias.

Desejando isto não quer lançar qualquer suspeição sobre esses funccionarios, mas simplesmente mostrar onde nos levar!» o principio das incompatibilidades.

Faz o orador sobre o assumpto muitas outras considerações, concluindo por mandar para a mesa a seguinte

Proposta

Proponho:

1.º A eliminação dos n.ºs 2.° e 3.° do artigo 6.°;

2.° A inclusão no capitulo 11.° de um artigo nos termos seguintes:

«Os deputados da nação, que forem accionistas, directores, administradores, gerentes ou membros dos conselhos administrativos ou fiscaes de quaesquer companhias ou sociedades que recebam subsidios do estado ou administrem alguns dos seus rendimentos, não poderão tomar parte na discussão, nem na votação de qualquer assumpto que diga respeito ás referidas companhias ou sociedades. = Arthur Montenegro.

Foi admittida.

(O discurso sem publicado na integra quando S. exa. o restituir.}

O sr. Tavares Festas (relator): - Ouviu com toda a attenção as considerações do sr. deputado Montenegro, e quando as suas propostas forem apresentadas na commissão, terá occasião de as apreciar e de expor a sua opinião.

(O discurso será publicado na integra quando s. exa. o restituir.}

O sr. Queiroz Ribeiro: - Pedi a palavra para mandar para a mesa a seguinte

Proposta

Proponho que antes do § 1.º do artigo 5.° se insiram os seguintes paragraphos:

«§... O conservador privativo do registo predial poderá exonerar-se definitivamente do cargo de vogal da commissão de recenseamento e só n'esse caso deixará de existir a ineligibilidade de que trata este artigo.

«§ ... O conservador que quizer fazer uso da faculdade concedida no paragrapho antecedente, assim o communicará por escripto ao presidente da commissão do recenseamento, dentro de um mez, a contar da publicação d'esta lei.

«§ ... N'este caso, o contador da comarca ou o funccionario que suas vezes fizer, substituirá o conservador como vogal da commissão». = Queirós Ribeiro.

Foi admittida.

O sr. Visconde da Ribeira Brava: - Pedi a palavra para mandar para a mesa uma proposta de emenda ao n.° 3.º do artigo 5.°, que está em discussão.

A minha proposta tem em vista exceptuar da inelegibilidade do artigo 5.°, n.° 3, os facultativos municipaes, pois não vejo, francamente, rasão alguma para que estes funccionarios sejam incluidos n'aquelles que podem ter qualquer influencia ou qualquer acção sobre os municipes ou seus administrados.

Mandando a minha proposta para a mesa, peço a v. exa. que a fará sujeitar á apreciação da commissão.

Proposta

No artigo 5.°, n.° 3.°:

O conservador do registo predial, ou empregados dos governos civis e administrações dos concelhos e os empregados dos corpos administrativos, excepto os facultativos municipaes. - Visconde da Ribeira Brava.

Foi admittida.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Conde de Burnay: - Referindo se novamente ás incompatibilidades, diz que exactamente aquelles que por ellas deviam ser attingidos, são os que a lei exclue.

Sobre o restabelecimento do subsidio aos deputados, manda para a mesa um additamento á proposta que apresentou o que se lhe afigura de toda a justiça, attendendo a que os membros da mesa estão, durante o periodo parlamentar, immensamente sobrecarregados de serviço.

É a seguinte

Proposta

Em additamento á minha proposta de subsidio aos deputados, proponho que este seja do triplo para o presidente e do dobro para os secretarios. = Conde de Burnay.

Foi admittida.

(O discurso será publicado na integra quando s. exa. o restituir.)

O sr. Alexandre Cabral: - Pedi a palavra, porque desejo que o sr. relator me esclareça sobre um ponto do artigo ll.° do projecto em discussão, que diz o seguinte.

(Leu.)

Pergunto ao sr. relator da commissão como entende a duração do tempo da legislatura a que se refere o projecto. Termina em 31 de dezembro do anno em que se encerra a legislatura com a terceira e ultima sessão ordinaria, ou entendo a commissão que, para os effeitos do artigo l1.°, a legislatura finda no dia em que se encerram as côrtes, isto é, com a ultima sessão da terceira sessão ordinaria da legislatura?

Desejo ouvir sobre este assumpto a opinião do sr. relator, e, em todo o caso, para que a este respeito se não levantem duvidas na pratica, mando para a mesa uma proposta de emenda, que é a seguinte:

(Leu.)

O sr. Tavares Feitas (relator): - Explica que o tempo da legislatura se considera findo com o encerramento da ultima sessão.

E, em resposta ao sr. conde de Burnay, declara que os directores do banco de Portugal não são attingidos pelas incompatibilidades, por isso que não administram bens do estado.

(O discurso será publicado na integra quando s. exa. o restituir.)

O sr. Carlos Ferreira: - Mando para a mesa a seguinte:

Proposta

Proponho:

l.° Que entre as incompatibilidades consignadas no n.° 2.º do artigo 6.° se inclua a do individuo que, por qualquer fórma, pertencer, dirigir ou tiver ingerencia em casa bancaria que tenha contratos com o governo;

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SESSÃO N.º 102 DE 4 DE JULHO DE 1899 51

2.° Que entre as incompatibilidades referidas no n.° 3 do mesmo artigo se inclua a do individuo que for socio de firma, directoria, administradoria, gerente que membros dos conselhos administrativos ou fiscaes das companhias ou sociedades de que trata este artigo. = Carlos Ferreira.

Foi admittida.

O sr. Presidente: - Está esgotada a inscripção.

Vae proceder se á votação do capitulo 2.°, sem prejuizo das propostas, que serão enviadas á commissão.

Foi approvado.

O sr. Presidente: - Vae ler-se, para entrar em discussão, o capitulo 3.°

Foi lido na mesa.

O sr. Presidente: - Está em discussão.

O sr. Fialho Gomes: - Observa que em toda a parte a discussão de reformas eleitoraes é origem de renhidas controversias, e que, se entre nós não se dá agora o mesmo, a culpa não é da maioria, mas da opposição que, por um criterio que elle, orador, se abstem de apreciar, entendeu não dever discutir o projecto.

A missão da maioria limita-se, portanto, a procurar melhorar o projecto, e é isso o que pela sua parte faz, mandando para a mesa a seguinte

Proposta

1.°

No artigo 22.° substituir o «conservador da comarca» por «um cidadão nomeado pela commissão districtal, de entre os elegiveis para cargos administrativos, com residencia na séde do concelho respectivo».

2.º

Eliminar o § 3.º do artigo 28.° = Fialho Gomes.

Foi admittida.

(O discurso a que este extracto se refere será publicado na integra, guando s. exa. o restituir.)

O sr. Simões dos Reis: - Mando para a mesa a seguinte

Proposta

Artigo 22.°, § 3.°, n.° 3:

Proponho que a palavra «corporação» seja substituida por «entidade».

Artigo 24.°:

Proponho que a palavra a diariamente» se substitua pelas seguintes: «nos dias, e etc.».

Artigo 35.°:

Proponho que ás palavras «e d'elle» se acrescente «no praso de trinta dias, depois de terminado, remetterá...». = Simões dos Reis.

Foi admittida.

O sr. Presidente: - Está esgotada a inscripção.

Vae votar-se o capitulo 3.°, sem prejuizo das emendas, que serão enviadas á commissão.

Foi approvado.

O sr. Presidente: - Vae ler-se, para entrar em discussão, o capitulo 4.°

Leu-se na mesa. - O sr. Presidente: - Está em discussão.

O sr. Fialho Gomes: - Mando para a mesa as seguintes

Propostas

Artigo 41.°:

§ 1.° Se nalgum concelho os eleitores forem em numero inferior ao minimo designado n'este artigo, constituirão, apesar d'isso, uma assembléa eleitoral.

O § 1.° passa a 2.°, e assim successivamente. = Fialho Gomes.

No artigo 41.°

A séde de cada uma das assembléas eleitoraes será sempre na freguezia que tenha maior numero de eleitores. = Fialho Gomes.

Artigo 41.° 200 a 1:000, em vez de 500 a 1:000. = Fialho Gomes.

Substituir o artigo 44.° pelo 43.º e seu paragrapho da carta de lei de 21 de maio de 1896. = Fialho Gomes.

Foram admittidas.

O sr. Dias Costa: - Mando para a mesa o parecer da commissão de marinha sobre a proposta de lei n.° 48-D, auctorisando o governo a reorganisar o ensino professado na escola naval, e estabelecendo diversos preceitos sobre a admissão de aspirantes de marinha no corpo de alumnos da armada.

A imprimir.

O sr. Alvaro Castellões: - Pedi a palavra para mandar para a mesa a seguinte

Proposta

Proposta do emenda do mappa dos circulos eleitoraes:

O concelho de Villa Nova de Famalicão tem, segundo o censo de 1890, 7:711 fogos com 31:519 habitantes, dos quaes são do sexo masculino 14:379, sabendo ler e escrever 3:900. Sem entrar no computo dos eleitores com o numero de contribuintes que pagam ao estado contribuição annual superior a 500 réis, e contando apenas os que n'aquelle censo estão recenseados como sabendo ler e escrever, vemos que o numero de eleitores d'aquelle concelho é de cerca de 4:000, o que é rasão bastante para que elle, de per si só, fique constituindo um circulo separado.

O concelho de Espozende tem, segundo o mesmo censo, 3:318 fogos com 15:085 habitantes, dos quaes são do sexo masculino 6:562, sabendo ler e escrever 2:203.

É este concelho só por si pequeno para formar um circulo, mas tendo o concelho contiguo da Povoa de Varzim 6:004 fogos, com 22:606 habitantes, dos quaes são varões 10:379, e sabem ler e escrever 3:655, póde-se constituir o circulo com os dois concelhos de Espozende e Povoa de Varzim, o qual terá então 9:322 fogos e um numero de eleitores approximado a 5:000.

Em virtude d'estas considerações tenho a honra de mandar para a mesa a seguinte proposta de emenda:

Proposta

Proponho que o circulo eleitoral n.° 12 seja constituido apenas pelo concelho de Villa Nova de Famalicão e que o concelho de Espozende seja ligado ao da Povoa de Varzim, fundando o circulo eleitoral n.° 26. = Alvaro de Castellões.

Foi admittida.

O sr. Simões dos Reis: - Pedi a palavra para mandar para a mesa a seguinte

Proposta

Art. 64.° § 2.° Proponho que se córte a palavra «n'ella» e se accrescente ao paragrapho «no concelho».

Art. 68.° Proponho que se lhe accrescente o seguinte:

§ unico. Durante as duas horas a que se refere este artigo serão admittidos a votar todos os eleitores que se apresentem para esse fim.

Art. 78.° § 2.° Proponho que á palavra «pertence» se accrescente «ou ao seu delegado que assistiu a essa assembléa».

Art. 128.° Proponho que ás palavras «preceitos do artigo» se accrescente «64.° § 5.°».

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Art. 24.° Proponho que a palavra «diariamente» só substitua pelas seguintes: «nos dias e...».

Art. 35.° Proponho que as palavras «e d'elle» se acrescente «no praso de trinta dias depois do terminado».

Art. 41.° Proponho que os n.ºs 500 a 1:000 se substituam por 300 a 800, acrescentando-se «salvo o caso de uma só freguezia ter mais de 800 eleitores».

Art. 54.º § 3.° Proponho que adiante da palavra «apresentar» se accrescente « verbalmente». = Simões dos Reis.

Foi admittida.

O sr. Presidente: - Está esgotada a inscripção. Vae votar se o capitulo 4.°, sem prejuizo das propostas, que serão enviadas á commissão.
Foi approvado o capitulo.

O sr. Presidente: - Vae ler-se, «para entrar em discussão, o capitulo 5.°

O sr. Fialho Gomes (para um requerimento): - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro que s. exa. consulte a camara se quer que se discutam conjunctamente todos os restantes capitulos do projecto. - Libanio Fialho Gomes.

Foi approvado.

O sr. Presidente: - Vão ler-se, para entrar em discussão, em conformidade com a resolução que a camara acaba de tomar, os capitulos n.ºs 5, 6, 7, 8, 9 e 10.

Leram-se na mesa.

O sr. Presidente: - Estão em discussão.

O sr. Abreu Castello Branco: - Mando para a mesa a seguinte

Proposta

Proponho que ao artigo 114.° se accrescentem as seguintes palavras: «exceptuam-se, porém, aquelles que, sendo domiciliados n'uma ilha de qualquer dos archipelagos, Madeira e Açores, tiverem de passar a outra ilha em que se effectue o apuramento». - J. F. Abreu Castello Branco.

V. exa. comprehende bem que os individuos que residem em uma ilha, sendo escrutinadores; e tendo de levar as actas para uma outra ilha, têem de abandonar as suas (casas durante quinze dias e fazer despezas com que muitas vezes não podem. Não devem, portanto, ser onerados com esta multa.

Quando a Terceira era circulo plirinominal, tinham de ir ali os portadores das actas da Graciosa e de S. Jorge, o que fazia com que se recusassem os eleitores a fazer parte das mesas para não terem de ir á Terceira.

Para que elles ali fossem um necessario que lhe afiançasemos que lhe pagavamos as despezas, e grande favor nos faziam ainda assim. Para evitar isto é que ou entendo conveniente a adopção da proposta que mando para a mesa.

Lida na mesa foi admittida.

O sr. Alexandre Cabral: - Mando para a mesa o parecer da commissão de redacção nobre o projecto de lei n.º 36, a que a commissão não faz nenhuma alteração.

Foi approvado.

O sr. Simões dos Reis: - Mando para a mesa a seguinte

Proposta

Proponho que ao § unico do artigo 66.° se accrescente depois da palavra «nome»: «excepto Lisboa e Porto, onde terão tantos nomes quantos os deputados. = Simões dos Reis.

Foi admittida.

O sr. Ferreira da Fonseca: - Mando para a mesa a seguinte

Proposta

Proponho que o concelho da Lourinhã passe a fazer parte do circulo n.° 88 (Cadaval), como pelas leis eleitoraes de 23 de novembro d 1859 e 8 de maio de 1878, ficando o circulo n.° 86 composto unicamente do concelho de Torres Vedras. = J. A. Ferreira da Fonseca.

Foi admittida.

O sr. Chaves Mazziotti: - Mando, para a mesa a seguinte

Proposta

Proponho que o circulo n.° 85 (Cintra) fique constituido por aquelle concelho, e que o concelho de Cascaes continue como estava até aqui, fazendo parte do circulo plurinominal de Lisboa. = O deputado pelo circulo de Cintra, Chaves Mazziotti.

Foi admittida.

O sr. Christovão Pinto: - Mando para a mesa as seguinte»

Proposta

Proponho, em relação aos n.°s 1.° e 2.º do artigo 1.° do projecto, que sejam considerados eleitores sómente os cidadãos que reunam simultaneamente as duas circumstancias do ser collectados em quantia não inferior a 1$000 réis e de saber ler e escrever. = Christovão Pinto.

Proponho que se inclua no projecto um capitulo de disposições transitorias, que regulem as proximas eleições politicas, determinando sobretudo:

1.º Se se consideram dissolvidas as actuaes commissões de recenseamento, para se installarem as orçadas pela lei em projecto.

2.° 8e subsiste a divisão vigente das assembléas eleitoraes ou se as novas commissões deverão proceder á nova divisão. = Christovão Pinto.

Capitulo 4.°, artigo 40.°:

Proponho que sejam restabelecidos no mappa os circulos eleitoraes das provincias ultramarinas que tinham sido reduzidos pela lei de 21 de maio de 1893 = Christovão Pinto.

Capitulo 7.°, artigo 95.°:

Proponho que o tribunal de verificação de poderes seja incumbido de conhecer sómente dos processos eleitoraes sobre que haja protestos ou reclamações, ou quando quinze deputados requeiram a sua remessa para o mesmo tribunal, segundo estava estatuido na lei de 21 de maio de 1884.= Christovão Pinto.

Foram admittidas.

O sr. Abreu Castello Branco: - Mando para a mesa a seguinte

Proposta

Proponho que o concelho do Cascaes, com todas as freguezias de que é composto, fique fazendo parte do circulo plurinominal de Lisboa. = J. F. Abreu Castello Branco.

Foi admittida.

O sr. Visconde da Ribeira Brava: - Manda para a mesa a seguinte

Proposta

Artigo 41.°:

Em vez de 500 a 1:000», «300 a 1:500». = Visconde da Ribeira Brava.

Foi admittida.

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O sr. Conde de Silves: - Apresento a seguinte

Proposta

Proponho que o conservador, em vez de fazer parte da commissão do recenseamento, nomeie um dos membros d'ella como o faz o juiz de direito. = O deputado, Conde de Silves.

Foi admittida.

O sr. Abel da Silva: - Mando para a mesa a seguinte

Proposta

Proponho que o circulo do Tabuaço passe a designar-se de Armamar. = Abel da Silva.

Foi admittida.

O sr. Telles de Vasconcellos: - Apresento tambem a seguinte

Proposta

Em harmonia com o pedido dos interessados, e de accordo com um projecto de lei votado na sessão passada sem impugnação, na camara dos senhores deputados, e que ficou pendente na camara dos dignos pares do reino, tendo já parecer favoravel da respectiva commissão, proponho que fique consignada na lei eleitoral a creação de uma assembléa eleitoral na freguezia de Paderne, concelho de Albufeira, aonde já existiu antes da ultima reforma eleitoral, visto a grande distancia a que os eleitores da freguezia de Paderne ficam da actual séde da assembléa.

Esta nova assembléa podaria ficar só com a freguezia de Paderne, em harmonia com o projecto referido, ou composta da freguezia de Paderne e da freguezia da Guia, visto ficarem vizinhas. = O deputado, Manuel Telles Vasconcellos.

Foi admittida.

O sr. Presidente: - Está esgotada a inscripção. Vão ler-se os capitulos e os mappas respectivos para se votarem.

Lidos na mesa, foram approvados.

O sr. Presidente: - Está approvado o projecto. As emendas vão á commissão.

Vae ler-se, para entrar em discussão, outro projecto de lei.

Leu-se na mesa.

É o seguinte:

PROJECTO DE LEI N.° 83

Senhores. - A vossa commissão de administração publica examinou com toda a attenção as emendas votadas pela camara dos dignos pares com relação a algumas das bases do projecto de lei n.° 69 ido d'esta para aquella camara e ponderando as rasões que fundamentam, as emendas notadas bem como que ellas não alteram o pensamento dos artigos a que dizem respeito antes tendem a esclarecel-o e a completal-o de modo a evitar duvidas que poderiam suscitar-se é de parecer que devem ser approvadas.

Sala das sessões da commissão de administração publica, 19 de junho de 1899. = Martinho Tenreiro = Simões dos Reis = Vieira de Castro = Antonio Cabral = Oliveira Baptista = Fortuna Rosado = Simões Ferreira = Alexandre Cabral = Carlos José de Oliveira, relator.

Alterações feitas pela camara dos dignos pares às bases que acompanham a proposição de lei da camara dos senhores deputados, que tem por fim reformara organisação administrativa

Os artigos n.ºs 1.º e 2.º do projecto de lei foram approvados.

As bases 1.ª, 2.ª e 3.ª - approvadas.

Na base 4.ª determinou-se que adiante das palavras: - impostos até 3 por cento, se accrescente: «addicionaes às contribuições directas do estado, predial, industrial, de renda de casas e sumptuaria ou áquellas que as substituirem».

A bases 5.ª, 6.ª, 7.ª, 8.ª, 9.ª e 10.ª - approvadas.

A base 11.ª foi approvada pelo modo seguinte:

«Serão definitivas as deliberações das camaras municipaes sobre emprestimos, sua dotação e encargos, se estes, ou sós de per si ou juntos aos encargos de emprestimos anteriores não excederem a decima parte da media da receita ordinaria cobrada no ultimo triennio e ficarão dependentes, quando os ditos encargos excedam este limite, de approvação do governo ou de auctorisação do poder legislativo, segundo o excesso for inferior ou superior á quinta parte d'aquella media.»

Na base 12.ª determinou-se que adiante das palavras finaes do primeiro periodo se accrescente: «findo o qual, sem ter havido resolução, a auctorisação se considera negada».

O § unico d'esta mesma base foi approvado do modo seguinte:

«Fica auctorisado o governo a regular o imposto municipal sobre minas, tendo em vista as disposições vigentes sobre os outros impostos municipaes directos.»

As bases 13.ª e 14.ª - approvadas.

A base 15.ª - approvada.

O § unico d'esta base passou para § 1.°

Accrescentou-se:

§ 2.° Os thesoureiros dos corpos administrativos, que á data da publicação d'esta lei estiverem exercendo esses cargos por encarte, poderão continuar n'elles nos termos da legislação anterior.

Na base 16.ª as palavras finaes: «de entre os cidadãos elegiveis da circumscripção» collocaram-se adiante de: - «nomeados triennalmente».

O resto foi approvado.

As bases 17.ª e 18.ª - approvadas.

Na base 19.ª § 5.°, adiante das palavras «actuaes auditores administrativos» accrescontou-se: «que sejam magistrados».

Na base 20.ª o praso de - sessenta dias para - trinta dias.

Na base 21.ª accrescentou-se:

§ unico. Os julgamentos do supremo tribunal administrativo sobre contribuições geraes do estado não carecem de confirmação do governo nem mesmo quando é recorrido algum dos conselhos das direcções geraes do ministerio da fazenda.

Bases 22.ª e 23.ª - approvadas.

Na base 24.ª accrescentou-se:

§ 3.° Exceptuam-se os empregados das camaras e administrações dos concelhos de Lisboa e Porto, e os empregados a cargo dos outros municipios do reino, que tenham ordenados superiores, anterior e legalmente estabelecidos, que conservarão os seus actuaes vencimentos.

Na base 25.ª accrescentou-se:

§ unico. Poderão tambem as camaras municipaes representar sobre quaesquer assumptos de administração

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publica á junta geral do districto, ao governador civil, ao governo e ás côrtes.

Na base 26.ª emendou se o erro typographico «formularios estabelecidos» para: «formularias estabelecidas».

Bases 27.ª e 28.ª - approvadas.

Na base 29.ª § 5.º adiante das palavras finaes: - que dêem direito á aposentado, - accrescentar:

«Ou que pela actual lei de aposentações devam ser levados em conta para a aposentação, embora por si não dêem direito a ella».

Base 30.ª - approvada.

Base 31.ª - accrescentar:

§ 1.° Se, porém, a licença requerida tiver por fim o tratamento de doença devidamente comprovada por attestado, será concedida no praso maximo de oito dias a contar da apresentação do respectivo requerimento ao presidente da camara.

§ 2.º Nenhum partido clinico poderá ser constituido por freguezias pertencentes a differentes concelhos, e são mantidos aos respectivos facultativos os vencimentos que tinham á data da publicado do decreto de 13 de janeiro de 1898, embora em virtude d'esse decreto, alguma freguezia tenha passado para outro concelho; exceptuam-se, porém, d'esta regra os partidos clinicos constituidos por accordo de diversas camaras, que continuam a ser permittidos nos termos do n.° 10.° do artigo 51.° do codigo administrativo.

As bases 32.ª, 33.ª, 34.ª, 35.ª, 36.ª e 37.ª - foram approvadas.

Palacio das côrtes, em 30 de maio de 1899. = João Maria Rodrigues de Carvalho = Julio Carlos de Abreu e Sousa = Luiz Rebello da Silva.

Parecer n.º 133

Senhores. - Á vossa commissão de administração publica foram presentes as propostas de emendas, substituições e additamentos às bases da reforma administrativa, mandadas para a mesa durante a discussão na camara dos dignos pares, e do resultado do seu estudo vem a vossa commissão dar-vos conta.

Levantaram se duvidas sobre se os 3 por conto de impostos, de que falla a base 4.º, eram 3 por cento sobre o rendimento collectavel, ou 3 por conto addicionaes ás contribuições geraes e directas do estado; a intenção da proposta de lei, e cremos que da votação na commissão da camara dos senhores deputados, e n'esta, e na commissão da camara dos dignos pares, foi que, estes 3 por cento fossem addicionaes as contribuições geraes e directas do estado, nos termos do n.° l.° do artigo 68.º do codigo vigente, ou nos do artigo 59.° do codigo de 1886; é, pois, a vossa commissão de parecer que isto se declare expressamente na dita base 4.ª

Á base 9.ª apresentou o digno par, sr. Oliveira Monteiro, uma proposta de substituição, que, compondo se a camara municipal de Lisboa de dezassete vereadores e a do Porto de treze, como está na mesma base, quer todavia que em todos os corpos administrativos se admitta a representação das minorias e que os municipios de Lisboa e do Porto não se dividam em circulos, por cada um dos quaes seja obito um determinado numero de vereadores mas constitua cada um d'elles um só circulo eleitoral.

A vossa commissão não desconhece a importancia theorica da representação das minorias, introduzida pela primeira vez, entre nós, nos corpos administrativos pelo § 2.° do artigo 318.° do codigo administrativo de 17 de julho de 1886; mas a representação das minorias, muito propria das assembléas deliberativas, parece sel-o menos das corporações que são ao mesmo tempo deliberativas e executivas, e se em alguns municipios essa representação deu seus resultados, o que a commissão não nega, na maior parte dos concelhos deu logar á abstenção das minorias e a concentração das attribuições da maioria; n'outros ainda, em vez da fiscalisação que se esporava, a accordos que contribuiram para um sensivel augmento de despezas; no seu conjuncto a experiencia não foi, pois, favoravel á representação das minorias nos corpos administrativos; a vossa commissão não vos propõe, por isso, que a acceiteis. Não desconhece tambem a vossa commissão os inconvenientes que se dão quando um mesmo concelho se divido em circulos eleitoraes e a divisão se faz mal, reunindo-se freguezias não contiguas; mas isso não prova contra a divisão em circulos, mas contra a arbitrariedade d'essa divisão; a divisão de grandes e populosos municipios, como Lisboa o Porto, em circulos eleitoraes, é, em certo modo, um meio de supprir a falta de representação das minorias; é natural que nem em todos os circulos predominem as mesmas correntes de opinião, os mesmos interesses, o mesmo partido, e por isso que a representação municipal por essa fórma seja mais variada e mais completa; a vossa commissão propõe-vos, pois, que mantenhaes a base 9.ª tal qual está.

Á base 12.ª apresentou o mesmo digno par uma proposta de dois paragraphos, o primeiro dos quaes foi que indo o praso marcado na base, se tornavam executorias todas as deliberações n'ella enumeradas, sobre as quaes não haja resolução tutelar.

A vossa commissão não póde approvar este additamento, de todo contrario ao pensamento da base a que se refere.

Se para determinadas deliberações das camaras municipaes - organisação ou dotação de serviços, fixação de despezas, orçamentos, percentagens, taxas ou outros impostos - é necessaria, pela importancia d'ellas, a approvação da auctoridado tutelar, essa approvação deve ser expressa; a experiencia prova que quando se admittia que o silencio, dentro de determinados prasos, equivalia a approvação, ficavam approvadas por esta fórma muitas deliberações a que não se ousaria dar uma approvação expressa.

Se no fim dos trinta dias marcados, a auctorisação não estiver concedida, nem negada, o que se devo entender é que é negada, e a vossa commissão vota que isto se declare expressamente.

O segundo paragrapho proposto para additamento é que «as camaras serão relevadas da responsabilidade da execução de obras municipaes sem approvação previa do respectivo orçamento, quando essas obras correspondam a uma necessidade publica urgente e inadiavel».

A vossa commissão julga perigosa e podendo dar logar a grandes abusos uma auctorisação tão ampla, pensa por isso que não deve ser approvada; e como, pela base 26.ª, as disposições relativas a orçamentos dos corpos administrativos serão objecto de diploma especial, poderão n'elle inserir se algumas regras, especiaes tambem, para os orçamentos supplementares que corresponderem a obras urgentes e inadiaveis.

O artigo 354.° do codigo administrativo vigente dispõe, no seu n.° 2 °, que não carecem de confirmação do governo os julgamentos do supremo tribunal administrativo sobre contribuições geraes do estado, salvo sendo recorrido algum dos conselhos das direcções geraes do ministerio da fazenda; na commissão propoz-se que se eliminasse a excepção relativa ao caso de ser recorrido algum dos conselhos das direcções geraes do ministerio da fazenda, excepção que não tinha motivo justificativo, que obrigava a demoras prejudiciaes, e á publicação dos decretos confirmativos das consultas. Pareceu á vossa commissão justo o eliminar-se tal excepção, e propõe isso, como additamento á base 21.ª, additamento que não collide com essa base.

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Á base 24.ª apresentou o sr. conde do Restello uma proposta para que se accrescentasse o seguinte: «§ 5.º Exceptuam-se os empregados das camaras e administrações dos concelhos de Lisboa e Porto, que conservarão os seus actuaes vencimentos».

A intenção da camara dos senhores deputados, que introduziu a base 24.ª, e a da vossa commissão, votando-a, não foi diminuir os ordenados existentes, legalmente estabelecidos, mas dar aos que se estatuiam nos artigos 113.º e 115.° do codigo vigente, que, por meio da disposição transitoria do artigo 461.°, tinha respeitado os direitos adquiridos, um pequeno augmento, compensador do desfalque que soffriam esses ordenados, já exiguos, com a obrigação que lhes foi imposta pelo § 3 ° da base 29.ª de contribuirem para a caixa das aposentações com as quotas por idade marcadas na lei; não tem pois a vossa commissão duvida em acceitar a proposta do sr. conde do Restello, ampliando-a aos ordenados a cargo dos outros municipios, que, sendo superiores aos indicados na base, estejam anterior e legalmente estabelecidos, e que serão respeitados.

Á base 25.ª propoz o digno par, sr. Oliveira Monteiro, que se additasse o seguinte: «Poderão tambem as camaras municipaes representar sobre quaesquer negocios de interesse publico á junta geral do districto, ao governador civil, ao governo e às côrtes.» É a disposição textual do artigo 131.º do codigo administrativo de 21 de julho de 1870, que, na phrase do relatorio, era direito consuctudinario, que às vezes se tem tentado negar.

A vossa commissão discutiu a proposta e parece-lhe que, sem se negar às camaras municipaes o direito de representarem às estações e auctoridades superiores, ao governo e às côrtes, não se deve dar a esse direito uma amplitude tal, que as converta em corporações politica; julga, pois, que o additamento se póde approvar, substituindo as palavras «quaesquer negocios de interesse publico» por «quaesquer assumptos de administração publica»; querendo com esta alteração significar a exclusão de votos politicos.

Á base 29.ª apresentou o mesmo digno par o seguinte additamento:

«§ 8 ° Aos facultativos do partido municipal será garantida a aposentação ordinaria com o ordenado por inteiro, quando, preenchidas as formalidades legaes, contem sessenta annos de idade e trinta de bom e effectivo serviço aos mesmos facultativos, quando aposentados extraordinariamente e por virtude de doença contrahida no exercicio das suas funcções, será tambem garantida a totalidade do ordenado, se tiverem vinte annos de bom o effectivo serviço.»

Este additamento parece corresponder a uma representação de diversos facultativos, publicada no Diario do governo de 5 de maio, n.º 101, na qual se diz que pela nova reforma administrativa a idade para a aposentação é de sessenta e cinco annos e o serviço effectivo que se exige de trinta e cinco annos, o que é inexacto.

As disposições actualmente em vigor sobre aposentação ordinaria e extraordinaria dos empregados dos corpos administrativos, e que, no que respeita a idade, tempo de serviço exigido, calculo de aposentação extraordinaria, não são alteradas pela base 29.ª da reforma, são os artigos 379.° a 395.° do actual codigo, o primeiro dos quaes diz:

«São condições indispensaveis para a aposentação ordinaria:

«1.° Ter sessenta annos de idade a trinta de serviço effectivo;

«2.° Absoluta impossibilidade physica ou moral para continuação do serviço activo.»

A idade e o tempo de serviço são, pois, os que os facultativos desejam, e supprimir para elles a segunda condição de aposentação - a impossibilidade physica ou moral de continuação de serviço - seria uma excepção, que não se justificaria, e que destruiria uma das regras fundamentaes das aposentações; parece mesmo das representações que elles não pedem tal excepção e o additamento proposto não é claro a este respeito.

A aposentação extraordinaria é regulada pelo artigo 380.°, que diz:

«A aposentação extraordinaria é concedida:

«1.° Ao empregado que, contando quarenta annos de idade e quinze de serviço, se impossibilite de continuar na actividade, por motivo de molestia não contrahida ou accidente occorido no exercicio das suas funcções;

«2.° Ao empregado de qualquer idade que, tendo dez annos de serviço, se impossibilite de continuar em actividade, em rasão de molestia provadamente contrahida no exercicio das suas funcções e por causa d'elle;

«3.° Ao empregado que, independentemente de qualquer outra condição, se torne inhabil para o serviço por desastre, que resulte directamente do exercicio das suas funcções, por ferimento ou mutilação em combate ou lucta no desempenho do cargo, por molestia adquirida na pratica de algum acto humanitario ou de dedicação á causa publica.»

As pensões correspondentes a estas diversas hypotheses são marcados no artigo 382.°, que diz:

«No caso de aposentação ordinaria a pensão do aposentado é a estabelecida no artigo 376.°; nas aposentações extraordinarias será, nos casos dos n.ºs 1.° e 2.° do artigo 380.°, igual a metade do vencimento do ultimo cargo exercido durante, ao menos, cinco annos, com o augmento de 3 1/2 por cento no primeiro caso e de 2 1/2 por cento no segundo por cada anno de serviço a mais do minimo ali designado, e no caso do n.° 3.° a pensão será igual ao vencimento do ultimo cargo exercido durante cinco annos.»

Ha, pois, um caso, o do n.º 3.°, em que a legislação vigente é mais favoravel aos facultativos do que o additamento proposto, e essa legislação accommoda-se bem às diversas circumstancias que se podem dar no tempo de serviço; e por isso a vossa commissão de parecer que essa legislação se mantenha.

Á base 31.ª apresentou o mesmo digno par o seguinte additamento:

«Se, porém, a licença requerida tiver por fim o tratamento de doença devidamente comprovada por attestado, será concedida no praso maximo de oito dias, a contar da apresentação do respectivo requerimento ao presidente da camara, ficando exclusivamente a cargo d'esta a substituição do facultativo doente, durante o seu impedimento.»

A vossa commissão é de parecer que se approve este additamento até às palavras «ao presidente da camara»; regulando a respeito da substituição a regra estabelecida na base.

Á mesma base 31.ª propoz o digno par, o sr. conde do Restello, que se accrescentasse o seguinte:

«Nenhum partido clinico poderá ser constituido por freguezias pertencentes a differentes concelhos, e são mantidos aos respectivos facultativos os vencimentos que tinham á data da publicação ao decreto de 13 de janeiro de 1898, embora, em virtude d'esse decreto, alguma freguezia tenha passado para outro concelho.»

O decreto de 13 de janeiro, a que o additamento se refere, e que restaurou diversos concelhos supprimidos, dispoz no artigo 6 °:

«Ficam a cargo dos concelhos restaurados:

«5.° Os ordenados dos partidos municipaes, cuja area se comprehenda integralmente nos concelhos restaurados e a quota que, segundo a população legal, lhes competir para pagamento dos ordenados dos partidos, que abranjam freguezias de mais de um concelho.»

Era justiça que assim se decretasse para se occorrer a uma situação que resultava rapidamente da mudança de

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freguesias de uns para outros concelhos; mas essa situação não póde deixar de ser transitoria; ha concelhos que, tendo só um medico á sua disposição, estão pagando a tres, porque dois, cuja séde do partido ficou n´outro concelho, tinham e continuam a fazer serviço n´alguma freguezia d´aquelle concelho; é conveniente regularisar as cousas de modo que cada facultativo fique só dependente da camara a que pertence a parte principal da area do seu antigo partido, e sómente por ella seja pago, distribuindo a camara de cada concelho o serviço clinico das diversas freguezias que o constituam pelos facultativos que tenha ou venha a ter, de modo que se restabeleça a unidade d´esse serviço municipal; é, por isso, a vossa commissão de parecer que seja approvado este additamento.

Apresentou tambem o digno par o sr. Oliveira Monteiro uma proposta de additamento, que devia constituir a base 38.ª, e que é a seguinte:

«Base 38ª:

«Todas as camaras municipaes dos concelhos de 1.ª ordem são obrigadas a crear um partido para um agronomo, que residirá na séde do concelho, prestando os serviços da sua especialidade em harmonia com os regulamentos para tal fim elaborados pelo ministro das obras publicas, commercio, industria e agricultura.

«§ l.° Para os effeitos d'esta base os concelhos de 2.ª ordem, ouvidas as commissões districtaes de agricultura, serão anexados aos de 1.ª ordem, segundo a sua contiguidade, e affinidades agricolas, ficando a cargo de toda a circumscripção do agronomo as despezas inherentes a este novo serviço.

«§ 2.° Os logares de agronomos municipaes serão providos em concurso documental, podendo ser dados a individuos habilitados pelas escolas officiaes estrangeiras de agricultura.

«§ 3.º Quando, pela ausencia de concorrentes, se verifique que não existe pessoal technico em numero sufficiente para a satisfação do disposto n´esta base, as camaras municipaes da circumscripção agricola incluirão nos seus orçamentos ordinarios a verba necessaria e equitativamente raleada para subsidio a um rapaz pobre, residente na circumscrição, que frequentará o instituto de agronomia, e servirá a círcumscripção que o subsidiou, como agronomo do partido, durante dez annos, pelo menos.

«§ 4.° Estes subsidios só poderão ser concedidos em concurso documental, realisado perante a camara municipal do concelho de l.º ordem da circumscripção agricola, segundo o regulamento para ella elaborado para esse fim, e devidamente approvado pela auctoridade tutelar.»

A vossa commissão pensa que não se devem sobrecarregar as camaras com mais esta despeza obrigatoria e que os agronomos districtaes podem ser obrigados a prestar aos concelhos dos respectivos districtos os serviços que elles precisem, pagando as camaras apenas as despezas a que dêem origem; se as camaras entenderem que esse agronomo não é sufficiente, têem nos n.º 18.º do artigo 50.° e 10º do artigo 51º do codigo vigente as faculdades necessarias para a creação de partidos de agronomos por uma camara só ou por mais de uma, por accordo; a vossa commissão pensa que a faculdade não se deve converter em obrigação.

O mesmo digno par, sr. Oliveira Monteiro, apresentou mais duas propostas de additamento, relativas a syndicatos agricolas, sob a base 39.ª e base 40.ª, que são as seguintes:

Base 39.ª:

As camaras municipaes promoverão nos respectivos concelhos a organisação de syndicatos agricolas, segundo a lei de 3 de abril de 1896, aproveitando para a sua installação e exercicio de funções os edificios municipaes.

Estes syndicatos terão como presidente da direcção o presidente da camara, e como secretario e agronomo municipal, havendo e; quando o não haja, será secretario e da camara, ou qualquer outro empregado municipal, julgado idoneo pelo presidente.

Base 40.ª:

As camaras municipaes são auctorisadas a dotar nos seus orçamentos os syndicatos agrícolas municipaes com as verbas que forem julgadas necessarias para a existencia e desenvolvimento de tão uteis instituições.

A lei de 3 de abril de 1896 permitte, no seu artigo 1.°, aos agricultores e aos individuos que exerçam profissões correlativas á agricultura, a fundação de associações locaes, com a denominação de «syndicatos agricolas», tendo por fim principal estudar, defender e promover tudo quanto importe aos interesses agricolas geraes e aos particulares dos associados.

Estes syndicatos, que têem a faculdade de promover tudo quanto caiba no seu programma geral, e, nomeadamente, promover a instrucção agricola, facilitar aos associados a acquisição de adubos, sementes e plantas em condições vantajosas, procurar mercados para os productos agricolas dos socios, celebrar contratos de transportes, adquirirem e consentirem aos associados o uso em commum de animaes reproductores e machinas agricolas, realisar emprestimos aos socios sob determinadas garantias, promover a constituição de caixas de soccorros mutuos, cooperativas, etc., só se podem constituir com mais de vinte socios, sempre maiores e no uso dos seus direitos civis, constituírem-se por escriptura publica, que comprehenda os estatutos, e têem individualidade juridica, podendo exercer todos os direitos relativos a interesses legitimos do seu instituto, demandar e ser demandados.

Os syndicatos são absolutamente necessarios aos agricultores, que serão explorados e esmagados pelas outras industrias, se não se adaptarem á fórma associativa que vão assumindo todas ellas, a dos transportes, a do commercio, a transformadora. Uma parte das crises da agricultura e do mal-estar dos agricultores vem de conservar uma fórma simplesmente individualista, quando as outras industrias já attingiram em grande escala uma fórma superior, a fórma associativa, de maior productividade e maior força.

Sendo isto innegavel, pergunta-se: deve prescrever-se ou permittir-se ás camaras municipaes que promovam nos seus concelhos a organisação de syndicatos agricolas? No caso affirmativo, que ligação devem, ter esses syndicatos com a camara? Deverão elles ser um corpo completamente separado d´ella, aproveitando apenas para a sua installação e exercido de funcções os edificios municipaes, se não tiverem edificio proprio e mais conveniente, ou devem o presidente, algum ou alguns vereadores da camara e alguns dos seus empregados ter funcções no syndicato agricola, constituindo elle ou não um pelouro municipal?

São problemas interessantes e dignos de attenção.

As camaras municipaes tiveram sempre entre nós, alem de funcções administrativas, funcções economicas, e o numero e a importancia das d´esta natureza tende, em toda a parte, a augmentar.

No antigo regimen os celleiros communs, institutos de credito agricola, foram já creados pelo governo, já pelos municipios, parochias ou irmandades, já por particulares; mas os fundados pelo governo brevemente se tornaram municipaes; o serviço dos talhos foi sempre directa ou indirectamente municipal, e de 1885 e 1886 por diante quasi todos os codigos administrativos dão ás camaras o direito de estabelecerem açougues por conta propria, quando os conluios dos arrematantes justifiquem esta providencia excepcional 1; muitas vezes n´alguns paizes se

1 Codigo administrativo de 17 de julho de 1886, artigo 118°, n.° 26.

Codigo administrativo de 2 de março de 1895, artigo 49.º n.º 15..º

Codigo administrativo de 4 de maio de 1896, artigo 50.°, n.º 15.°

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SESSÃO N.º 102 DE 4 DE JULHO DE 1899 57

têem reprimido conluios de moageiros e de padeiros por meio de padarias municipaes, sendo estas entre nós, depois da lei de 13 de julho de 1885, sobre o municipio de Lisboa, que auctorisava a camara a organisar serviços ordinarios ou extraordinarios para obviar á carestia de subsistencias de primeira necessidade, claramente indicadas, como sendo o seu estabelecimento, quando o exijam imperiosas conveniencias da alimentação publica, da attribuição das camaras; não é tambem muito difficil prever que, n'um futuro mais ou menos proximo, os serviços de agua, de luz e de viação, nas grandes cidades, serão serviços municipaes, cujo rendimento poderá e deverá substituir a maior parte dos impostos actuaes de consumo.

D´esta evolução innegavel seguir-se-ha, porém, que se deve impor ás camaras municipaes a promoção do estabelecimento de syndicatos agricolas, onde a iniciativa particular para os fundar ou conservar falleça ou desfalleça?

As camaras municipaes nunca souberam transformar os antigos celleiros communs no que elles se podiam tornar em pequenos e uteis bancos ruraes; nunca comprehenderam esta transformação, nem reclamaram lei que a facultasse; recentemente a lei de 7 de julho de 1898, que pretendeu operar esta transformação, confia para a administração d´estes institutos mais em sociedades agricolas, já constituidas ou que venham a constituir-se, do que nas camaras municipaes e nas juntas de parochias, e auctorisa a entrega de taes celleiros, pertencentes a esses corpos administrativos, ás ditas sociedades; as camaras municipaes, só onde não se constituirem sociedades agricolas que tomem conta dos celleiros communs, podem administrar os celleiros fundados por ellas ou pelo governo, formando n´esse caso um novo pelouro de fomento agricola.

Os syndicatos agricolas têem muitas affinidades com os celleiros communs; quem ler as duas leis vê que são identicas algumas das suas operações; todavia, as duas instituições são diversas; o celleiro commum é um pequeno banco; o syndicato póde ter tantos fins quantos são os meios e os fins da agricultura; tudo que lhe aproveita, tudo que a auxilia transportes, compras e vendas em commum, instrumentos, instrucção, credito, armazens, adegas sociaes, associação de propriedades, experiencias culturaes, explorações, captações e canalisações de aguas, etc. tudo póde ser objecto de syndicatos agricolas; por esta complicação de assumptos os syndicatos são, pois, menos proprios para os corpos administrativos do que o são os celleiros communs, e se já é difficil impor a creação d´estes, é impossivel impor a promoção d´aquelles, e para a promoção voluntaria têem as camaras, nos n.ºs 27.° e 28.° do artigo 50.° do codigo vigente, as faculdades necessarias, sem que seja necessario additar a legislação.

Não basta que uma instituição social seja boa para se poder impor ou mesmo realisar voluntariamente; é preciso que haja nas localidades, onde a instituição se quer realisar, elementos intellectual, moral e economicamente adaptados para ella, aliás a instituição morre apenas se cria; podiamos d´isto dar milhares de exemplos com sociedades de soccorros mutuos, cooperativas, etc.; a vossa commissão não póde, por todos estes motivos, acceitar que se imponha ás camaras municipaes a promoção de syndicatos agricolas, não havendo, porém, nada que impeça, como já dissemos, que ellas os promovam, que os installem nos paços do concelho, que lhes dêem secretarios ou quaesquer outros empregados que os auxiliem no seu expediente

I Codigo administrativo de 1895, artigo 49.°, n.º 16.°; de 1896 artigo 50.°, n.° 16.°

Em harmonia com as idéas expostas, tem a vossa commissão a honra de vos propor o seguinte:

1.°

Que á base 4.ª, adiante das palavras «impostos até 3 por cento», se accrescente «addicionaes ás contribuições directas do estado (predial, industrial, de renda de casas e sumptuaria) ou áquellas que as substituirem».

2.°

Que na base 12.ª, adiante das palavras finaes do primeiro periodo, se accrescente «findo o qual, sem ter havido resolução, a auctorisação se considera negada».

3.°

Que na base 21.ª se accrescente:

«§ 1.° Os julgamentos do supremo tribunal administrativo sobre contribuições geraes do estado não carecem de confirmação do governo, nem mesmo quando é recorrido algum dos conselhos das direcções geraes do ministerio da fazenda.»

4.º

Que na base 24.ª se accrescente o seguinte:

«§ 3.° Exceptuam-se os empregados das camaras e administrações dos concelhos de Lisboa e Porto, e os empregados a cargo dos outros municipios do reino que tenham ordenados superiores, anterior e legalmente estabelecidos, que conservarão os seus actuaes vencimentos»

5.°

Que na base 25.ª se accrescente o seguinte:

«§ 1.° Poderão tambem as camaras representar sobre quaesquer assumptos de administração publica á junta geral do districto, ao governador civil, ao governo e ás côrtes.»

6.°

Que na base 31.ª se accrescente o seguinte:

"§ 1.° Se, porém, a licença requerida tiver por fim o tratamento de doença devidamente comprovada por attestado, será concedida no praso maximo de oito dias, a contar da apresentação do respectivo requerimento ao presidente da camara.

«§ 2.° Nenhum partido clinico poderá ser constituido por freguezias pertencentes a differentes concelhos, e são mantidos aos respectivos facultativos os vencimentos que tinham á data da publicação do decreto de 13 de janeiro de 1898, embora, em virtude d'esse decreto, alguma freguezia tenha passado para outro concelho.»

7.°

Que as restantes propostas de emendas, substituições e additamentos sejam rejeitadas.

Sala da commissão de administração publica, 17 de maio de 1899. = Telles de Vasconcellos - Hintze Ribeiro (vencido) = Antonio Egypcio Quaresma = Pereira Dias = Pereira de Miranda = Conde de Bertiados = Vaz Preto = Conde do Restello = Casal Ribeiro (vencido) = José Frederico Laranja, relator.

Parecer n° 122

Senhores. - Á vossa commissão de administração publica foi presente o projecto de lei, vindo da camara dos

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senhores deputados, approvando bases para a reforma de alguns artigos do codigo administrativo vigente, bases que têem por fim, já restabelecer instituições, que, sem estarem condemnadas na theoria ou na pratica, tinham sido extinctas, como as juntas geraes de districto; já dar existencia a outras, adoptadas n´outras paizes o que ahi têem dado bons resultados, como o conselho administrativo da fabrica da igreja parochial; já distribuir por outra fórma a tutela sobre os corpos administrativos, tornando a do governo menos extensa e menos intensa, restituindo a esses corpos direitos e fóros que sempre todos tiveram, pelo menos em todo o decurso do regimen liberal, como o de nomearem os seus presidentes; dando-lhes a acção autonoma compativel com a administração publica geral, com os interesses do estado e os das circumscripções que esses corpos representam; já restituir aos cidadãos direitos, que sem motivo plausivel lhes tinham sido violentamente negados, sem utilidade sequer para a força e prestigio do poder executivo que lh´os absorvia, antes com graves inconveniente para elle proprio, como o recurso dos actos o despachos do governo, que offendessem direitos baseados em leis administrativas para o supremo tribunal administrativo , já organisar de um modo mas simples o contencioso administrativo de primeira instancia; fazer na relativa competencia dos corpos administrativos as alterações resultantes de todas as que precedem; e, finalmente, consignar preceitos de justiça e conveniencia para os empregados dos corpos administrativos e para elles proprios, como as que se referem a aposentações d´esses empregados e a outros assumptos; - e do seu estudo sobre o projecto vem a vossa commissão dar-vos conta.

Depois do decreto n.º 23 de 16 de maio de 1832, de Mousinho da Silveira, pelo qual, pela primeira vez entre nós se organisou a administração publica em harmonia com o principio da divisão dos poderes estabelecido na carta constitucional, e do codigo administrativo de 1836, de Manuel Passos, demasiadamente descentralisador, n´um tempo em que a experiencia ainda não tinha demonstrado que a principios do apparencia eminentemente democratica correspondem muitas vezes consequencias de natureza opposta, regeu-se por muito tempo o paiz pelo codigo administrativo de 18 de março de 1842, obra de um partido accentuadamente auctoritario e centralisador.

Admittia esse codigo duas circumscripções administrativas - districtos e concelhos - e duas corporações correspondentes - juntas geraes de districto e camaras municipaes; a parochias e as juntas de parochia não faziam parte da organisação da administração publica, limitando-se as attribuições d´estas á administração da fabrica da igreja e dos bens da parochia e ao desempenho dos actos que lhe fossem confiados na qualidade de commissão de beneficencia.

Junto de cada camara havia um conselho municipal, tirado dos maiores contribuintes, e que com a camara resolvia sobre emprestimos, contribuições e approvação de orçamentos adoptados.

Junto de cada junta geral havia um conselho de districto presidido pelo governador civil e composto por mais quatro vogaes, nomeados pelo Rei sobre proposta da junta geral em lista triplice, e que tinha attribuições consultivas, deliberativas e contenciosas, estas com recurso para o conselho d´estado.

Eram auctoridades administrativas no districto o governador civil, no concelho o administrador do concelho, am-

1 Codigo administrativo do 18 de março de 1842, artigo 306.° 2 Cod. cit. de 1842, artigos 165.º, 170.º a 172.° 3 Codigo administrativo de 18 de março de 1 812, artigo 266.º, 277.º, 278.º, 280.º e seguintes.

bos do nomeação regia; na parochia, o regedor não era magistrado administrativo, mas exercia as funcções de administração publica que lhe fossem expressamente delegadas.

Nas camaras e nas juntas geraes, todos os membros, incluindo os presidentes, eram do eleição; apenas nas juntas de parochia, o parocho era o presidente nato, sendo os vogaes electivos; quando, porém, a eleição das camaras se não realisava por falta de concorrencia de eleitores, a nomeação d´ellas devolvia-se ao conselho de districto; quando se não realisava a das juntas de parochia, tinha o direito de nomeação dos vogaes a camara municipal, e quando, depois de duas convocações successivas, os procuradores se não reuniam em maioria ou só separavam sem terem deliberado ácerca dos objectos da sua competencia, pertencia ao governador civil, em conselho de districto, prover nos negocios urgentes.

Era ampla, embora marcada taxativamente, a tutela dos corpos administrativos superiores sobre os inferiores e mesmo a tutela das auctoridades administrativas e do governo ou do poder legislativo sobre algumas das deliberações d´esses corpos; assim as das camaras e das juntas geraes sobre emprestimos e hypotheca e sobre contratos para obras com quaesquer companhias dependiam de auctorisação por lei especial sob proposta do governo 6; os orçamentos das camaras eram sujeitos á approvação do conselho do districto, ou eram approvados por decreto conforme a sua importancia; finalmente, a junta de parochia estava sujeita a uma estreita tutela, já da camara municipal, já do governador civil só ou no conselho do districto, já do proprio governo 7.

Era amplo o direito de desolução por decreto do governo, das camaras municipaes e das juntas geraes; sómente a ordem de dissolução era nulla se não vinha acompanhada de ordem para a nova eleição; as juntas de parochia podiam ser dissolvidas por alvará do governador civil, e o proprio conselho de districto podia ser dissolvido por decreto 8.

Os magistrados administrativos gosavam do que se chamou a garantia administrativa 9.

O codigo continha algumas disposições especiaes relativas ás ilhas adjacentes, reforçando ahi as attribuições dos governadores civis, que podiam dissolver os corpos administrativos, e os dos conselhos do districto, que podiam approvar e supprir os orçamentos das camaras, fosse qual fosse a sua importancia 10;

Este codigo, em que o legislador mediu com tanta parcimonia as attribuições autonomas dos corpos administrativos, desconfiando tanto das suas aptidões e do seu bom senso, em que se talhou tão larga a parte das auctoridades, delegadas do governo e a d´este, foi revogado pela primeira vez pela lei de administração civil de 26 de junho de 1867, da iniciativa do sr. Martens Ferrão, que reduzindo o numero dos districtos, e dos concelhos e o das parochias civis, dando-lhes maior extensão, maior população, mais abundante materia collectavel, lhes deu tambem muito mais largas faculdades, mesmo em materia de emprestimos, obras, aquisições e alienações, o impostos 11. Pouco tempo durou, porém, esta lei; em muitos

4 Cod. cit., artigo 341.º

3 Cod cit, artigos 9.º, 202°, 291 °; 93.º, 299.°, 212.º"

6 Cod. cit, artigos 126 º e 216.°, n.º V e vi.

7 Cod. cit, artigos 149.º, 318.º, 321.º, 325.º, 326.º

8 Cod. cit, artigos 106º e 107º , 214.º, 304.°, 273.º

9 Cod cit., artigo 357.°

10 Cod. cit., artigos 347°, 348.°. 319.°

11 Lei de 26 de junho de 1867 artigo 1.º, 2.º, 5.º, 7.º e 29º, n.º 9.º, 30.º, 85.º, n.º 1.º, 22.º, 23.º, 84.º, 85º, 86º, 87.º, 88.º, 89.º, 127.º, 128.º, 129.º e seguintes 247.º, 248.º, 249.º, 250.º, 258.º e 258.º

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pontos merecedora de ser memorada com elogio; prejudicou-a a reluctancia dos districtos e dos concelhos extinctos; contribuiu isso para a quéda do ministerio que a promulgou, declarou-a sem effeito o decreto de 14 de janeiro de 1868, que poz outra vez em vigor o codigo de 1842.

Volvidos pouco mais de dois annos, publica-se, por decreto de 21 de julho de 1870, novo codigo administrativo de iniciativa do sr. Dias Ferreira. Era esse codigo ainda mais descentralisador do que o de 1868. "A reforma, lia-se no relatorio, assenta sobre duas bases fundamentaes, ampliação das faculdades e garantias dos corpos administrativos, isentando-os quanto possivel da tutela do poder central e descentralisação para as localidades de muitos serviços e encargos que pesavam sobre o governo do estado, dotando-as ao mesmo tempo com as mais altas faculdades tributarias para poderem satisfazer convenientemente ao augmento de despezas que importa esta alteração no novo systema de administração. Por estes dois principios foram inspiradas as profundas alterações que se encontram no novo codigo administrativo."

Com effeito, juntas de parochia, camaras, juntas geraes têem largas attribuições sobre emprestimos, obras, aquisições e alienações, e as duas primeiras sobre contribuições, que as juntas geraes só podem recolher por meio de quotas lançadas ás camaras para as despezas districtaes, e mesmo em todas estas attribuições a tutela n´alguns casos era nulla, n´outros minima 12.

Encontramos n´este codigo, em disposição expressa, que as camaras municipaes podem representar sobre quaesquer negocios de interesse publico á junta geral do districto, ao governador civil, ao governo e ás côrtes 13; direito consuetudinariamente reconhecido, mas que ás vezes se tem tentado negar.

Mas as disposições d´este codigo deviam começar a vigorar no 1.° de janeiro de 1871, e em agosto precedente caiu o governo que o promulgara, que é substituido pelo ministerio Avila-Vizeu; a lei de 27 de dezembro de 1870, relevando aquelle gabinete da responsabilidade em que incorrêra pelas providencias de natureza legislativa publicadas de maio por diante, revoga algumas d´ellas, e entre ellas o codigo administrativo, voltando assim de novo a ser lei, emquanto se não promulgasse outro, o de 1842, que durou até á promulgação do codigo approvado por lei de 2 de maio de 1878, referendado por Antonio Rodrigues Sampaio.

Como nos dois codigos anteriores, o de 1867 e o de 1870, as parochias fazem parte da organisação administrativa; diversamente do que n´aquelle se dispozera, os districtos e os concelhos, então existentes, são reconhecidos; apparece nos districtos uma instituição nova em Portugal, uma commissão executiva, delegada da junta geral, e que a substitue, quando ella não está reunida, em parte das suas attribuições 14.

Os codigos precedentes tinham feito, embora nem sempre o dissessem, uma distincção profunda; uns entre as juntas de parochia, as camaras municipaes e as juntas geraes dos districtos; outros entre as juntas de parochia e as camaras de um lado, o as juntas geraes do outro; para o codigo de 1842 o concelho e a camara são a circumscripção e o corpo administrativo naturaes, historicos, vivos; a parochia é quasi apenas uma circumscripção ecclesiastica, a junta geral alguma cousa convencional; uma associação de conveniencia transitoria, nada mais; os codigos

12 Decreto de 21 de junho de 1870, artigos 96.º, 121.º, 123.º, 137.º, n.º V, VIII e IX

13 Dec cit, artigo 131.º

14 Codigo administrativo de 1878, artigo 5.º, 90º, n.º 4º

de 1867 e de 1870 reconhecem o caracter organico civil tambem á parochia; mas ajunta geral, apesar de lhe darem tambem o nome e os fóros de pessoa moral, continúa a parecer-lhes menos natural, por isso nenhum d´esses codigos lhe dá a faculdade de lançar impostos, senão por quotas ás camaras; no codigo de 1878 já não é assim; entre os tres corpos administrativos já não ha differença e não de grandeza; todos são de eleição directa; as suas attribuições são parallelas, symetricas; os corpos administrativos superiores tutelam, nos casos em que a tutela se admitte, os inferiores; e a acção tutelar de auctoridades administrativas sobre esses corpos converte-se quasi sempre n´uma acção de simples fiscalisação para a interposição de recursos, quando as deliberações são eivadas de qualquer motivo de nullidade.

Largas attribuições foram dadas á junta geral, que póde adquirir e alienar, crear ou subsidiar estabelecimentos de beneficencia, instrucção e educação, abrir, construir, reparar as estradas districtaes, crear empregos, contrahir emprestimos, contratar obras, celebrar accordos com outras juntas, fixar as quotas com que as camaras deviam concorrer para as despezas districtaes e a percentagem addicional ás contribuições directas e geraes do estado, deliberar sobre expropriações necessarias para os melhoramentos do districto, etc. 15

De todas as deliberações da junta só careciam de approvação do governo as de aquisição e alienação de bens immobiliarios, e as transacções sobre pleitos e levantamento de emprestimos, quando os respectivos encargos, só per si ou juntos aos encargos de emprestimos já contrahidos, absorviam mais da decima parte da receita calculada no orçamento ordinario do respectivo anno, e a demissão de empregados; as restantes só se podiam alterar ou annullar por via contenciosa 16.

Analogas attribuições tiveram as camaras municipaes, para as quaes passaram as despezas com instrucção primaria e a nomeação dos professores; não sendo executorias, sem previa approvação da junta geral do districto, as deliberações sobre emprestimos, cujos juros e amortisação, só de per si ou juntos aos encargos de emprestimos já contrahidos, absorvessem a decima parte da receita auctorisada no orçamento do anno respectivo, as sobre lançamento de contribuições directas e indirectas e algumas outras, podendo todas ser revogadas ou alteradas por via contenciosa 17.

Tambem a junta de parochia podia contrahir emprestimos, lançar contribuições directas, sendo tambem executorias as suas deliberações, excepto as dos emprestimos, as de aquisições e alienações, as de transacções sobre pleitos e as de lançamento de contribuições, que careciam de approvação da junta geral do districto 18.

Este codigo, que deu ás juntas geraes do districto uma supremacia e uma importancia de que nunca até então tinham gosado, preparou-lhes, sem o querer, a queda posterior; deixando os procuradores á junta de ter um subsidio diario, durante as sessões, como tinham pelo codigo de 1842 10, tendo a commissão districtal uma remuneração importante, 900$000 réis 20, começou a ser pesado ser procurador á junta e a valer a pena pertencer á commissão, que dentro em pouco se tornou mais importante que a junta.

O conselho de districto continuava a ser composto do governador civil, presidente, e de quatro vogaes, nomeara Decreto de 21 de julho de 1870, artigos 96.°, 121.°, 123.º e 137 n.ºs V, VIII e IX

"Dec cit, artigo 131°

" Codigo administrativo de 1878, artigos 5.º, 90.º, n.º 4.º

15 Cod. cit, artigo 53.º

16 Cod. cit, artigos 56 ° e 57.º

17 Cod cit., artigos 103º, 106º e 107

18 Cod. cit, artigos 167º , 168.º e 169 º

19 Codigo de 1842, artigo 213.º

20 Cod. De 1868, artigo 88.º

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dos pelo governo sobre lista triplice proposta, pela junta geral; mas agora dois, pelo menos dos vogaes deverão ser bachareis formados em direito, e os vogaes do conselho, que até então fôra gratuito, venciam cada um a gratificação annual de 240$000 réis, pagos pelo cofre do districto 21.

O tribunal conservava uma parte dos seus vicios do origem - ter por presidente uma auctoridade administrativa de caracter politico, provir, embora indirectamente, da eleição e poder ser dissolvido; mas a obrigação de haver n´elle dois bachareis formados em direito e a remuneração offereciam uma transição facil para tribunaes especiaes de contencioso administrativo independentes.

Os resultados das largas faculdades dadas por este codigo ás juntas do parochia, ás camaras municipaes e ás juntas geraes de districto sobre contribuições e emprestimos foi recorrerem amplamente a umas e outras, lançando-se com avidez no caminho dos melhoramentos, enredando as suas finanças o diffilcultando-as do estado; eram as folias naturaes dos alvoroços da emancipação. Ao mesmo tempo ou professores de instrucção primaria eram pagos com muito atrazo pelas camaras e queixavam-se; na capital revelava se mais tarde que a transferencia do serviço da instrucção primaria para a camara tinha serios inconvenientes de natureza politica; no entretanto, em 1885, por lei de 18 de julho, o municipio de Lisboa recebe, uma organisação autonoma; ahi, como nas juntas geraes de districto, a camara é pouco, a commissão executiva é muito ou quasi tudo.

Em 1886 era já evidente a necessidade de deter os corpos administrativos no movimento accelerado dos melhoramentos, das contribuições e dos emprestimos; movimento em que de certo nem tudo era perdido, mas que, por isso mesmo que fôra accelerado e febril, era necessario moderar; a esta necessidade e a outras correspondeu o codigo administrativo approvado por decreto de 17 de julho d´esse mesmo anno.

"Os ponto principaes da reforma, lê-se no relatorio, são:

"A reducção do serviço dos corpos administrativos a tres annos civis, e a suppressão das renovações;

"A classificação dos concelhos em tres ordens, segundo a sua população, e o estabelecimento de algumas condições de estabilidade para os administradores de concelho de primeira ordem;

"A representação das minorias, applicada ás eleições dos corpos! administrativos;

"A organização da fazenda local, sem prejuizo das finanças do estudo, fixando-se limites ás faculdades tributarias das corporações administrativas;

"A constituição, nas sédes dos districtos, de tribunaes administrativos independentes, tanto da pressão dos governo, como da influencia dos interesses partidarios, que assegurem a todos os cidadãos a recta e imparcial applicação da justiça;

"A organização de um regimen especial, largamente descentralisador, nos concelhos de mais de 40:000 habitantes, quando o requeiram as respectivas camaras municipaes e dois terços dos elegiveis para os cargos administrativos

Os corpos administrativos são os mesmos que no codigo anterior; a junta geral continua a ter uma commissão executiva, mas que se torna gratuita; passam para a junta geral das deliberações sobre administração do expostos ou desvalidos ou abandonados desde sete até dezoito annos; são definitivas as suas deliberações sobre obras cuja despeza não exceda 1 conto de réis; sobre emprestimos quando

21 Cod. cit., artigo 231.º a 231.º

estes, só de per si ou juntos aos encargos dos emprestimos anteriores, não cheguem a absorver a decima parte da receita ordinaria, auctorisada nos orçamentos do anno corrente; são provisorias as deliberações sobre estes assumptos, quando se excedem estes limites, e sobre impostos e orçamentos, podendo ser suspensas por decreto de governo, mas tornando-se definitivas se a suspensão não se realisar dentro de quarenta dias depois do recibo do seu recurso, passado pelo governador civil 22.

Os impostos districtaes consistiam em uma percentagem addicional ás contribuições directas do estado, predial, industrial, de renda de casas e sumptuaria ou aquellas que as substituíssem; o maximo d´esta percentagem seria fixado annualmente pelas côrtes.

Parecia que se conservava ás juntas geraes toda a importancia que lhes dava o codigo de 1878; mas não havia no de 1886 disposição igual á do n.° 70.° do artigo 52." D´aquelle codigo, que lhes dava o direito de mandarem proceder, na conformidade das leis respectivas, á abertura, construcção, reparação e conservação das estradas districtaes, o pelo artigo 114.° do decreto de 24 de julho d'esse mesmo anno, sobre organisação dos serviços de obras publicas, o governo toma conta do todas as obras publicas districtaes, evitando assim a duplicação de direcções d'essa natureza na capital do cada districto, tornando d'esse modo tambem mais facil systematisar e harmonisar os traçados das diversas classes de estradas; as juntas geraes perdiam, por esta providencia, uma grande parte da sua importancia; ser procurador á junta perdia a maior parte do seu interesse.

Como as das juntas as deliberações das camaras foram tambem divididas em definitivas e provisorias; eram definitivas as deliberações sobre obras cuja despeza total não excedesse a 1:000$000 réis nos concelhos de primeira ordem, a 500$000 réis nos de segunda e a 300$000 réis nos de terceira, sobre construcções, reparação e conservação de estradas municipaes, sobre emprestimos, sua dotação e encargos, quando estes sós de per si ou juntos aos encargos de emprestimos anteriores não chegavam a absorver a decima parte da receita ordinaria auctorisada nos orçamentos do anno corrente; eram provisorias quando sobre estes assumptos se passavam estes limites e as que versavam sobre orçamentos e impostos 23.

Para as deliberações sobre emprestimos, dotação de serviços, orçamentos, impostos, era necessaria a convocação dos quarenta maiores contribuintes da contribuição predial, cujo parecer devia ser remettido ao governador civil 31.

O maximo da percentagem addicional lançado pelas camaras ás contribuições directas do estado e sobre os generos sujeitos ao real do agua era annualmente fixado pelas côrtes; a quota sobre os outros generos, incluidos em pauta decretada pelo governo, não podia exceder 25 por cento do preço corrente, no mercado do concelho; os addicionaes ao real de agua podiam ser cobrados cumulativamente com o imposto do estado 25.

Para as camaras organisadas em municipio autonomo o limito entre as deliberações definitivas e provisorias, nos emprestimos e nos impostos, era de 25 por cento 26, estes municipios autonomos não contribuiam para as juntas geraes nem n´ellas tinham representantes.

22 Codigo de 17 de julho de 1886, artigos 3.º, 34.º, § unico, 93.º e 54 °, n.ºs 4 °, 5 °, 17 º, 55 ° e 56º

Cod cit, artigos 117.°, n.ºs 5 °, 7 º e 18 º; 118.º, n.ºs 2.°, 3 °, 4.º e 12.° 121 °

Cod. cit, artigo 119.º

Codigo de 17 de junho de 1886, artigos 134 º e 138.º, §§ 1 º, 2°. 3.º e 1.º

Cod. cit, artigos 125 °, n.º 3º , 4.º e 5.º; 126.°, n.ºs 2 °,3.º e 4.º; 127.º

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SESSÃO N.º 102 DE 4 DE JULHO DE 1899 61

Na junta de parochia, o parocho, ainda que não fosse vogal d'ella, tomava parte o votava em todas as deliberações sobre assumptos relativos aos interesses ecclesiasticos da parochia e á administração da fabrica 27.

À junta de parochia delibera definitivamente, entre outros assumptos, sobre obras até 100$000 réis, sobre caminhos vicinaes, contratos cujo effeito não excedesse um anno, emprestimos cujos encargos, sós ou juntos aos de emprestimos anteriores, não excedessem a decima parte da receita; provisoriamente sobre lançamento de impostos e orçamentos e sempre que se passavam aquelles limites, etc 28.

Continuando a evolução começada no codigo de 1878, realisando um ideal da sciencia, satisfazendo uma aspiração da justiça, o codigo de 1886 creou na séde de cada districto um tribunal administrativo, composto de tres magistrados nomeados por decreto do governo, de entre os candidatos legaes á magistratura judicial ou de entro os juizes de 3.ª classe que requeressem a sua transferencia para estes logares, servindo um triennio e podendo ser reconduzidos outro.

As funcções do ministerio publico junto d'estes tribunaes eram exercidas por um agente privativo, nomeado pelo governo de entre os delegados do procurador regio que o requeressem ou de entre os habilitados em concurso para aquelles lugares e de entre os bachareis formados em direito com exercício de administradores de concelho ou do advogado, durante tempo determinado 29.

Estes tribunaes, a que tambem pertenciam attribuições consultivas, julgavam tres ordens de negocios:

1.ª Em regra, as questões contenciosas de administração publica no districto;

2.ª As contas de gerencia dos corpos administrativos, irinandades, confrarias, associações, e estabelecimentos de piedade e beneficencia, cujo julgamento não pertença ao tribunal de contas;

3.º As reclamações em materia de recrutamento, de contribuições directas do estado, de lançamento, repartição e cobrança das contribuições municipaes e parochiaes.

Os julgamentos destes tribunaes, passados em julgado, tinham força de sentença; e, era regra, de todas as suas decisões se podia recorrer, ou para o supremo tribunal administrativo ou para o tribunal de contas, em materia de contas que elles julgassem, ou para a relação do districto em materia de reclamações sobre recrutamento 30.

Parece que se poderia parar, pelo menos por muito tempo, no prudente meio termo de tutela e de liberdade d'este codigo, e que os tribunaes do contencioso administrativo, que, como mostramos, saíram naturalmente da evolução dos factos, seriam respeitados por todos; mas com o anno de 1890 começou para a sociedade portugueza uma crise que perturbou profundamente os espíritos; com ella se travaram outras, resultantes de uma conjuncção de circumstancias internas que vinham de longe, e de circumstancias externas de diversas naturezas e procedências; parecia chegada a epocha das economias violentas, dos retrocessos indispensáveis, e, n'esse caminho, embora com intercorrencias de outra natureza, se foi até muito para trás do codigo de 1842.

primeiro golpe, embora indirecto, nos tribunaes administrativos, foi-lhe descarregado pelo decreto n.° 4, de 29 de março de 1890, que, augmentando os ordenados das diversas classes do juizes, deixou sem augmento os dos tribunaes administrativos, que depois, por decreto de 2 de dezembro do anno seguinte, se pretenderam transformar n'uma especie de relações de 2.ª classe.

Pelo decreto de 10 de março de 1890 foi dissolvida a camara municipal de Lisboa o auctorisado o governo a reformar a organisação administrativa do município de Lisboa, no sentido de tornar mais intimas as suas relações com o estado, fazendo-se a reforma por decreto de 26 de setembro do 1891.

Veiu depois a lei denominada de a salvação publica", de 26 de fevereiro de 1892, c, em virtude das auctomações que ella conferia o artigo 18.°, os tribunaes administrativos districtaes foram extinctos por decreto de 21 de abril d'esse mesmo anno; o imposto addicional às contribuições directas do estado que se cobrava, nos termos do artigo 284.° do codigo, para satisfazer a despeza dos ordenados e gratificações dos tribunaes administrativos districtaes. continuava a ser lançado e arrecadado como receita do estado; os emolumentos da, respectiva tabella passavam tambem para o estado; as attribuições consultivas dos ditos tribunaes, o julgamento das contas dos corpos administrativos, com recurso para o tribunal de contas, e a expedição dos ordens de pagamento, auctorisadas e liquidadas, mas recusadas pelos presidentes das camaras ou das juntas de parochia, passavam para as commissões executivas das juntas. geraes; o que propriamente ora contencioso administrativo ficava pertencendo ao juiz de direito da comarca, segundo as regras de competencia judicial, e com os mesmos recursos que cabiam dos accordãos dos tribunaes administrativos, que assim se substituíam; as funcções do ministerio publico ficavam pertencendo aos delegados do ministerio publico perante os mesmos juizes de direito.

No uso ainda da auctorisação concedida pela mesma lei de 26 de fevereiro, por decreto de 6 de agosto do mesmo anno, extinguiram se as juntas geraes de districto, que se substituíam por uma commissão districtal, composta de cinco vogaes effectivos e cinco substitutos, eleitos trienualmente por delegados das camaras municipaes, e, na falta de eleição, nomeados pelo governo, sob proposta do governador civil, junto da qual exercia as funcções de ministerio publico o secretario geral, e cujas funcções eram obrigatorias e gratuitas.

O estado cobrava as percentagens sobre as contribuições que votavam as juntas geraea, e pelo seu producto satisfazia as annuidades dos emprestimos districtaes, legalmente contrahidos, e bem assim os outros encargos que, para elle ou para as camaras municipaes, eram transferidos.

As receitas districtaes dividiam-se entre o estado e as camaras inunicipaes e do mesmo modo as despezas.

D'estas, uma das que passavam para as camaras era a dos expostos e menores desvalidos ou abandonados dos respectivos concelhos, excepto Lisboa, até á idade de dezoito annos; a de reparação dos governos civis e repartições dependentes ou annexas e da mobília necessaria tornava-se onus das camaras da capital do districto.

Os orçamentos das commissões districtaes eram approvados pelo governo e as contas julgadas pelo tribunal de contas.

As attribuições da junta de parochia como representante de uma circumscripção administrativa civil, mas sem prejuízo da posse exclusiva, que nos bens, pastos ou fructos de logradouro commum tivessem os parochianos ou parte d'elles, passaram para as camaras municipaes; às juntas de parochia ficou pertencendo simplesmente a administração dos bens e rendimentos da fabrica da igreja parochial

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As suas dependentes e as deliberações correlativas, e, alem d´isto, o encargo de serem commissões de beneficencia.

O parocho era vogal nato da junta de parochia, mas a presidencia era electiva, podendo ou não recair no parocho.

As junta podiam collectar, para as despezas da fabrica da igreja parochial, as irmandades e confrarias n´ella erectas na proporção dos seus rendimentos e sem prejuizo das suas despesas obrigatorias.

As deliberações dos corpos administrativos, incluindo as da camara municipal de Lisboa, eram desde logo executorias, salvo quando recaiam sobre organisação e dotação de serviços e fiscalisação de despezas, sobre orçamentos, emprestimos, percentagens, contribuições, taxas ou quaesquer impostos, acquisição ou alienação de bens immobiliarios ou equivalentes, transacções e desistencias de pleitos, contratos que devessem durar por mais de um anno, estabelecimento, ampliação ou suppressão de cemiterios, viação municipal e vicinal.

Sobre emprestimos, contribuições e augmentos de despezas as camaras tinham de ouvir os quarenta maiores contribuintes, vinte da contribuição predial, vinte da industrial.

Para quaesquer emprestimos era sempre necessaria auctorisação do governo; as outras deliberações não definitivas dos corpos administrativos estavam sujeitas á approvação do governo, quando essas deliberações pertenciam á camara municipal de Lisboa ou a outras camaras com organisação especial, e á approvação das commissões districtaes quando as deliberações eram das camaras restantes ou das juntas de parochia.

A approvação devia ser concedida ou negada pelas estações tutelares no praso de quarenta dias, havendo recurso para o governo no praso de dois mezes, podendo este supprir as omissões d´aquellas estações.

A rejeição de qualquer verba do orçamento invalidava as respectivas deliberações, ainda que executorias.

As estações tutelares suppriam as faltas de orçamentos e outras dos corpos tutelados.

O governo não podia auctorisar os corpos administrativos ou qualquer instituto sujeito á sua fiscalisação a contrahir emprestimos cujos encargos por si ou juntos aos de emprestimos anteriores igualassem ou excedessem a quinta parte da sua receita ordinaria calculada pela media do triennio anterior, e nenhuma auctorisação podia ser dada senão por meio de decreto publicado na integra.

O governo podia escolher de entre os objectos sujeitos ao imposto indirecto os que só podiam ser tributadas para o serviço do estado.

Este decreto tão centralisador, tão tutelar, era da iniciativa do mesmo estadista a quem pertencia o codigo de 1870. Tão outros eram os tempos!

As antigas tendencias liberaes reflectiam-se, porém, ainda n´estes ou n´outros pontos, por exemplo, no que reconhecia aos corpos administrativos o direito de emittirem votos consultivos, de sua iniciativa, e leval-os á presença dos poderes superiores do estado em todos os assumptos em que aos cidadãos é livre o direito de petição 31.

Tinham-se feito economias, mas tinham-se desorganisado seviços; aos que vieram em seguida as economias pareceram exageradas, a tutela sobre os corpos administrativos ainda pouca; não se parou, pois, aqui, e por decreto de 2 de março de 1895 publicou-se novo codigo administrativo.

Os corpos administrativos continuaram a ser no districto a commissão districtal, nos concelhos a camara municipal, na freguezia a junta de parochia; mas na commissão districtal entram o governador civil, presidente, e um bacharel formado em direito, nomeado por decreto; torna-se, portanto, mais dependente do governo e da auctoridade superior do districto. Os concelhos são divididos em tres ordens; a camara de Lisboa é uma camara de l.ª ordem, sujeita a algumas disposições especiaes, principalmente relativas á receita, despeza e obras, devendo todas as ordens de pagamento ser visadas pelo chefe da contabilidade do ministerio do reino e continuando a haver junto da camara um inspector geral da fazenda municipal, escolhido pelo tribunal de contas 33.

Os concelhos de 3.ª ordem eram agrupados a outro de l.ª ou 2.ª; a esses concelhos, assim dependentes, pertencia-lhes administrar os bens e os institutos proprios do concelho; tinham ainda algumas attribuições de natureza policial; mas em tudo o mais era á camara da séde da comarca que pertencia a gerencia principal dos interesses municipaes do concelho agrupado; os concelhos que tinham outro ou outros agrupados, dividiam-se em tantos circulos eleitoraes quantos fossem os concelhos componentes e por elles se dividiam os vereadores a eleger 33.

Outra innovação d´este codigo era que os presidentes das camaras em favor das quaes estivesse descripto no orçamento geral do estado subsidio especial superior a 1 conto de réis eram nomeados annualmente pelo governo de entre os vereadores; funccionavam emquanto não fossem pela mesma fórma substituidos ou reconduzidos, mas nunca alem da posse da camara novamente eleita. Entes presidentes podiam ser destituidos por decreto fundamentado, por motivos determinados, ouvida a procuradoria geral da coroa, ouvida tambem a qual os corpos administrativos podiam ser dissolvidos, em casos especificados, com excepção para a commissão districtal, cuja dissolução se podia dar, quando o aconselhassem motivos ponderosos de conveniencia publica 34.

Com as juntas de parochia era o codigo mais liberal do que a lei de 1892, dando-lhes attribuições para lançarem derramas e contrahirem emprestimos sob determinados limites e cautelas 35.

O contencioso administrativo da l.ª instancia foi dividido por tres entidades distinctas: as commissões districtaes, os auditores administrativos, e os juizes de direito; ficou pois mais complicado; pertencendo á commissão districtal, principalmente, o julgamento de contas que não pertencesse ao tribunal de contas; ao auditor as reclamações contra as deliberações dos corpos administrativos, contra os actos dos administradores do concelho e as relativas a eleições e a assumptos connexos; ao juiz de direito as reclamações sobre recrutamento, sobre contribuições do estado, municipaes e parochiaes 36. O secretario geral era o representante do ministerio publico perante a commissão districtal e o auditor; perante o juiz de direito representava-o o delegado 37.

O auditor é remunerado; a tabella de emolumentos nos processos de contencioso administrativo e de contas continuava em vigor, mas esses emolumentos passavam do estado para a auditoria e para a commissão districtal, com excepção do presidente, para o secretario geral, e para o secretario da commissão e empregados encarregados do exame dos processos de contas 38.

32 Codigo approvado por decreto de 2 de março de 1895, artigos 42.º, 43.º, 145 º a 172.º

33 Cod cit, artigos 43°, 53º, 54º a 57°, 58.°, 60º, 6l.º a 63º

34 Cod cit., artigos 70° a 72º, 17º e 41 °

35 Cod. cit, artigos 190º a 215º 3°

36 Cod. cit, artigos 325º a 343°

37 Cod. cit, artigos 346° e 347.°

38 Cod. cit., artigos 338.°, 479 °

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Outras innovações, e estas da peor especie, foram na competencia do supremo tribunal administrativo e na homologação das suas consultas pelo governo.

Este tribunal, que amplamente conhecia dos actos e despachos do governo, lesivos de direitos, agora só póde conhecer d´elles nos recursos dos officiaes do exercito, da armada e do ultramar ou de empregados civis com graduação militar, que se julgarem illegalmente preteridos em posto ou antiguidade; nos interpostos contra a concessão de patentes de introducção de novas industrias, e nos expressamente estabelecidos em leis especiaes!

Alguns julgamentos do tribunal, como os relativos a eleições, a contribuições geraes do estado, salvo sendo recorridos alguns dos conselhos das direcções geraes do ministerio da fazenda, a impostos municipaes, congruas e derramas parochiaes, concessões de patentes de novas industrias e os declarados em leis especiaes não careciam de confirmação do governo; mas para os que precisavam d´ella a homologação julgava-se denegada para todos os effeitos, quando o decreto não fosse devolvido com a sancção regia e a referenda ministerial no praso de sessenta dias, a contar da respectiva remessa á competente secretaria de estado 39.

O governo, em diplomas especiaes, deveria proceder á revisão das circumscripções administrativas e á classificação dos concelhos, podendo supprimir os que não tivessem as precisas condições e recursos de autonomia municipal 40.

Breve passou a idéa dos concelhos de terceira ordem agrupados a outros de primeira ou segunda; o legislador voltou á idéa de 1867, preferindo supprimir um grande numero de municipios, alterando ao mesmo tempo as circumscripções judiciaes, para o que se auctorisou por decreto de 12 de julho de 1895. N´essa mesma data altera os concelhos e as comarcas dos districtos de Evora, Guarda e Vianna do Castello; a 14 de agosto os de Braga, Bragança e Faro; a 7 de novembro os de Castello Branco, Coimbra, Leiria e Vizeu; a 26 de setembro os de Lisboa, Portalegre e Villa Real; a 18 de novembro os de Angra, Horta, Ponta Delgada e Funchal e a 21 de novembro os de Aveiro, Beja, Porto e Santarem.

Fazendo-se as suppressões não todas de uma vez, mas pouco a pouco, e de cada vez em diversos pontos, remotos uns dos outros, e espaçando-se, impediram-se as resistencias; mas os concelhos extintos pugnaram dentro dos limites legaes pela volta á existencia; de alguns d´elles nunca se conseguiu fazer sair o foral e a bandeira, symbolos queridos de uma autonomia com raizes vigorosas nas profundezas da historia, continuado pelo geração actual o amor com que os alcançaram e os defenderam as gerações passadas.

Segue-se o codigo approvado por lei de 4 de maio de 1896, que é o codigo vigente.

Os corpos administrativos continuam a ser a commissão districtal, a camara municipal e a junta de parochia.

A commissão districtal é composta como no codigo precedente. Tem na execução dos serviços do interesse geral do estado as attribuições commettidas pelas leis ou da competencia das extinctas juntas geraes; tem alem d´isso attribuições consultivas, a superintendencia na administração municipal e faz regulamentos, em assumptos de mais de um concelho, funccionando tambem como tribunal de contas de primeira instancia, nos casos não exceptuados.

Os concelhos são classificados em primeira e segunda ordem; a camara de Lisboa continua sujeita às mesmas disposições especiaes que no codigo de 1895.

39 Codigo approvado por decreto de 2 de março de 1895, artigos 368º, nº 6.°, 471º, 703º e 371º

40 Cod. cit., artigo 467º.

Na sua receita ordinaria, alem de uma parte do imposto do consumo em Lisboa e dos addicionaes ás contribuições directas do estado, predial, industrial, de renda de casas e sumptuaria, não excedentes a 50 por cento, entram outros elementos.

Nas despezas o estado satisfaz-lhe os encargos dos emprestimos; fixa-se por decreto a importancia maxima da despeza annual nos serviços de fazenda, beneficencia, obras, salubridade, limpeza e regas, policia e segurança, não podendo a dotação d´estes serviços, depois de fixada, alterar-se senão por lei; todas as ordens de pagamento para serem satisfeitas devem estar auctorisadas em orçamento executorio e ser visadas pelo chefe da repartição da contabilidade do ministerio do reino, continuando a haver um inspector geral da fazenda municipal, escolhido pelo tribunal de contas, sendo extincta a commissão de obras publicas. Não se leva a effeito nenhuma obra de abertura de ruas, praças, avenidas ou de quaesquer vias de communicação sem approvação do governo, ouvido o conselho superior de obras publicas e minas, não só podendo effectuar nenhuma outra obra de valor excedente a 200$000 réis sem approvação pelo ministerio do reino, e devendo as de despeza inferior estar dotadas com verba sufficiente em orçamento exectorio, a camara deve mandar formular um plano geral de viação publica 44.

Não são executorias sem approvação do governo por meio de decreto as deliberações das camaras municipaes sobre emprestimos, creação ou augmento de dotação de empregos, percentagens addicionaes ás contribuições directas do estado ou relativas a rendimentos em que estas não incidam, quando excedam 50 por cento das mesmas contribuições e sobre contratos de concessão de exclusivos, que, quando importem restricção de direitos de propriedade, dependem de lei especial que os auctorise.

Não são igualmente executorias sem approvação do governo com relação aos municipios de primeira ordem, ou da commissão districtal em relação aos de segunda, alem de outras, as deliberações sobre organisação ou dotação de serviços e fiscalisação de despezas, orçamentos, percentagens, todos ou quaesquer impostos, quando as percentagens, excedam 50 por cento.

As estações tutelares não podem approvar as deliberações das camaras sobre emprestimos, creação e augmento de dotação de empregos e aggravamento de percentagens do impostos directos ou indirectos sem parecer da maioria dos quarenta maiores contribuintes, vinte da contribuição predial, vinte da industrial nos concelhos de primeira ordem e todos os da contribuição predial nos de segunda.

A approvação deve ser concedida ou negada pelas estações tutelares dentro do praso de quarenta dias, findos os quaes se tornam executorias as deliberações sobre que não haja resolução tutelar.

Contra a approvação ou rejeição das deliberações municipaes, por parte da commissão districtal podem as corporações interessadas reclamar para o governo no praso de trinta dias 42.

Os impostos municipaes são directos e indirectos.

Os directos são as percentagens addiccionaes ás contribuições directas do estado, predial, industrial, renda de casas e sumptuaria ou aquellas que as substituirem, e uma percentagem sobre os rendimentos em que estas contribuições não incidirem, com as unicas excepções marcadas no codigo ou em leis especiaes, e, alem d´isto, a prestação de trabalho e diversas taxas.

O maximo das percentagens é de 75 por cento, as excedentes só por lei podem ser auctorisadas.

41 Codigo approvado por lei de 4 de maio de 1896, artigos 132.° a 158.º
42 Cod, cit, artigos 55.º a 58.°

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64 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

A prestação de trabalho comprehende o serviço de pessoas e cousas em um dia de cada anno e não é devida a distancia superior a 6 kilometros.

Os impostos indirectos consultem em uns tantos reis lançados sobre os generos vendidos na circumscripção municipal para consumo. Sobre os generos sujeitos ao real de agua os impostos limitam-se a uma percentagem addicional até 100 por cento. Dos generos que não estão sujeitos ao real de agua só podem ser tributados aquelles que forem designados em pauta decretada pelo governo, e a quota sobre estes generos não podem exceder 25 por cento do preço corrente no mercado do concelho.

Os addicionaes ao real de agua podem ser cobrados comulativamente com o imposto do estado.

São despezas obrigatorias das camaras, alem de outras, as da construcção, reparação e conservação das pontes, ruas e estradas municipaes, as dos expostos e creanças desvalidas ou abandonadas, e as da instrucção primaria em conformidade das leis especiaes.

São julgadas pelo tribunal de contas as contas das camaras municipaes dos concelhos de primeira ordem e as das demais camaras cuja receita ordinaria exceda réis 15:000$000, segundo o calculo do respectivo orçamento ordinario; as das restantes camaras são julgadas pela commissão districtal 43.

A junta de parochia, da qual o parocho é vogal nato e presidente, póde deliberar sobre emprestimos e lançamento de derramas; mas as deliberações sobre emprestimos não podem ser approvadas pela estação tutelar sem previo parecer da maioria dos vinte eleitores da parochia, maiores contribuintes da contribuição predial; as derramas sobre os parochianos somente podem ser lançadas, na falta ou insufficiencia de outras receitas para custear as despezas do culto, as de construcção e de reparação da igreja parochial ou suas dependentes, as de cemiterio parochial, as de reparação da residencia do parocho ou os encargos de emprestimos auctorisados; o producto da derrama não pode exceder quantia igual a 15 por cento sobre as contribuições directas do estado, predial, industrial, de rendas de casa e sumptuaria ou sobre aquellas que as substituirem.

A junta julga as reclamações contra o rol da derrama, cabendo da sua decisão recurso para a camara municipal e d´esta para a commissão districtal.

Ajunta é tambem permittido exigir dos parochianos até dois dias de trabalho em cada anno.

Não são executorias sem approvação do governo por meio de decreto as deliberações parochiaes sobre creação de empregos e augmento de dotação dos legalmente creados e sobre emprestimos, que sómente podem ser applicados exclusivamente a obras de construcção e reparação da igreja e cemiterio parochial, ou ainda para outros fins, mas n´este caso sómente quando os respectivos encargos sejam custeaveis pelas receitas ordinarias da junta, depois de satisfeitas as despezas obrigatorias.

Não são executorias sem approvação do governador civil entre outras as deliberações sobre orçamentos, dotações e fixação de despezas parochiaes 44.

As innovações do codigo de 1895 sobre a nomeação e destituição, pelo governo, dos presidentes das camaras com subsidio especial do estado; a distribuição do contencioso administrativo de primeira instancia por tres entidades a commissão districtal, o auditor e o juiz de direito; a não admissão de recursos, para o supremo tribunal administrativo, dos actos e despachos do governo, senão nos casos excepcionaes indicados, foram mantidas;

43 Codigo approvado por lei de 4 de maio de 1896, artigos 68º, 69º, 72º, 74º, 75º, 76º, n.º 16º, 22º, 23º, 107º.

44 Cod. Cit., artigos 159º, 176º, nº 17º e 18º; 177º, 189º, 190º, 193º, § 1º e 2º, 196º, 179º, 180º.

a falta de homologação das consultas do supremo tribunal administrativo dentro de sessenta dias, equivalendo a denegação d´ella, foi, porém, substituida pela disposição de que, quando o governo se não conforme com a consulta, resolverá o assumpto por meio de decreto enviado ao tribunal, em que se exponham claramente os motivos da divergencia e as rasões da decisão 45.

Expostas assim a evolução das instituições administrativas e as circumstancias que as determinaram, é facil avaliar e justificar a idéa geral da proposta do governo e do projecto approvado pela camara dos senhores deputados.

Nem o governo nem a camara pretendem alterar todo o codigo vigente, voltando ao codigo de 1886; - quer-se apenas corrigir o que haja de demasiado na centralisação actual, dando mais alguma vida aos corpos locaes, restituindo-lhes, e aos cidadãos, fóros e direitos que, sem proveito do estado, lhes tinham sido absorvidos, e aperfeiçoar, modificando-as, disposições de lei que, ou eram pouco justas no seu principio, ou incoherentes e contradictorias com outras, e por isso nocivas; é essa a rasão por que, em vez de se apresentar ao parlamento um projecto de codigo, se pede uma auctorisação para modificar o actual, determinando-se as bases d´essa modificação, devendo o governo dar conta ás côrtes na proxima sessão legislativa do uso que fizer da auctorisação que se lhe conceda.

São faceis de perceber e de justificar a maior parte d´essas bases; daremos por isso apenas ligeiras indicações a respeito de cada uma d´ellas, apontando os artigos do codigo actual ou da legislação avulsa a que se refiram e que tenham em vista alterar.

A base 1 ª do projecto, um pouco differente da da proposta do governo, altera o n.° 9.° do artigo 8.° do codigo actual, que diz que não podem ser vogaes dos corpos administrativos os empregados dos corpos de cuja eleição se trata e os que recebam vencimentos dos seus cofres; amplia por um lado a incapacidade, applicando-a nos empregados dependentes de qualquer corpo administrativo, e restringe-a por outro lado, exceptuando d´essa incapacidade os aposentados. Torna tambem essa dependencia ou remuneração incapacidade para se ser auctoridade administrativa.

A base 2ª, identica á do governo, modifica os artigos 17.° e 41.° do codigo vigente, que, para os casos de dissolução, exigiam consulta da procuradoria geral da corôa; substitue-se a estação consultada e impõe-se ao governo a obrigação de publicar a consulta, quando contraria á dissolução.

A base 3ª, identica á da proposta do governo, restabelece as juntas geraes do districto; modifica o artigo 4.° do codigo vigente; conserva o artigo 10.° do decreto de 6 de agosto de 1892, que, extinguindo as juntas geraes, transferiu para o estado as percentagens que ellas votavam e a satisfação dos encargos para que ellas serviam.

A base 4.ª é um pouco differente da proposta pelo governo, não só porque esta marcava os artigos do codigo de 1886, que tendia a pôr em vigor, o que naturalmente se julgou desnecessario, visto que se dizia que teriam attribuições analogas e não identicas; mas principalmente porque additou a essa base tudo que vae adiante das palavras na parte applicavel, tornando o limite sobre dotação de serviços, impostos e emprestimos muito mais restricto do que no codigo de 1886.

A base 5.ª, identica á da proposta do governo, restitue ás juntas a attribuição que sempre tiveram, emquanto existiram, de repartirem pelos concelhos a contribuição predial e o contingente militar, e de formularem annualmente consultas e relatorios, como se vê dos artigos 216.°,

45 Codigo approvado por lei de 4 de maio de 1896, artigos 63.°, 64.º, l7.º, 41.°, 307.º a 309.º, 323.º a 325.º, 352.º n° 6.º, 351.º, 355.º

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218.° e 219.° do codigo de 1842; modifica o artigo 40.° n ° 1.° e o n.° 18.° do artigo 250.° do codigo vigente.

A base 6.ª, differente na redacção da do governo, que marcava os artigos do codigo de 1886, é uma consequencia da restauração das juntas geraes.

A base 7.ª differe da proposta pelo governo, que começava dizendo que, emquanto houver auditores administrativos ou juizes addidos, continuarão estes a fazer parte das commissões districtaes, para as quaes, n´este caso, as juntas geraes elegerão dois membros. Esta parte foi eliminada; no resto é identica. O artigo 40.° n.° 2.° do codigo de 1896 é referente á emissão do parecer pela commissão districtal em todos os assumptos para que for consultada pelo governador civil ou em que o seu voto é exigido por lei.

Na base 8ª accrescentou-se, na camara dos senhores deputados, á proposta do governo "Angra do Heroismo", por haver para a reducção do numero de procuradores para Angra rasão identica á que havia para Ponta Delgada, e ser impetrada essa reducção pela junta ou por deputados açorianos.

A base 9.ª, identica á da proposta do governo, modifica o § unico do artigo 43.° do codigo vigente, que compõe a camara de Lisboa de quinze vereadores e a do Porto de onze; o augmento corresponde, como se diz no relatorio do governo, a solicitações da camara de Lisboa, para melhor se poder organisar o serviço de extincção de incendios.

A base 10.ª revoga o artigo 63.° do actual codigo, relativamente a presidentes das camaras com subsidio especial do estado.

A base ll.ª, como veiu da camara dos senhores deputados, é differente da proposta do governo. Esta foi: "Serão definitivas as deliberações das camaras municipaes sobre emprestimos, sua dotação e encargos, se estes, ou sós de per si, ou juntos aos de emprestimos anteriores, não excederem a decima parte da media da receita ordinaria cobrada no ultimo triennio, e ficarão dependentes quando os ditos encargos excedam este limite, de approvação do governo ou de auctorisação do poder legislativo, segundo o excesso for inferior ou superior á quinta parte d´aquella media". O que a camara dos senhores deputados approvou foi: "Serão definitivas as deliberações das camaras municipaes sobre emprestimos, sua dotação e encargos, se estes, ou sós de per si, ou juntos aos de emprestimos anteriores, não excederem a sexta parte da media da receita ordinaria cobrada no ultimo triennio, e ficarão dependentes, quando os ditos encargos excedam este limite, da approvação do governo».

Mudou pois o limite alem do qual as deliberações sobre emprestimos precisam de approvação do governo da decima para a sexta parte da media da receita ordinaria do triennio, e, contentando-se com a appovação do governo, não exigiu nunca a do poder legislativo. A vossa commissão julga preferivel, por mais preventiva de abusos, a proposta do governo; submette pois á vossa approvação a base 11.ª como o governo a formulou, e que mesmo assim representa para as camaras uma faculdade importante, pois que pelo n.° 1.° do artigo 55.° do actual codigo não são executorias sem approvação do governo, por meio de decreto integralmente publicado na folha official, as deliberações municipaes sobre emprestimos.

A base 12.ª, como veiu da camara dos senhores deputados, differia da proposta do governo, porque accrescentou ás palavras finaes da primeira disposição "que será dada no praso de trinta dias" e ainda um "§ unico. Os impostos municipaes não podem recair sobre minas.

A proposta do governo e o primeiro additamento julga a vossa commissão que se podem approvar; alteram os §§ 1.° e 2.° do artigo 56.° do codigo vigente, que declaram que a approvação do governo ou das commissões districtaes sobre organisações ou dotação de serviços e fixação de despezas, sobre orçamentos, percentagens, taxas, etc., deliberadas pelas camaras municipaes deve ser dada no praso de quarenta dias, e que findo o praso se tornam executorias todas essas deliberações sobre as quaes não haja resolução.

O governo e a camara quizeram, e com rasão, que o silencio e o desleixo não valessem por approvação; taes deliberações, pela sua importancia, precisam de approvação expressa; sem ella não são executarias; entendeu-se, e tambem com rasão, que só devia marcar um praso dentro do qual o governo deve conceder ou negar a approvação, e marcou-se o de trinta dias.

A doutrina, porém, do § unico, isentando as minas do imposto municipal, suscitou na vossa commissão justificadas duvidas que levaram a um estudo do assumpto, ainda incompleto por falta de tempo e de informações, que se pediram, mas já sufficiente para se ver que o paragrapho não se póde approvar tal qual está.

Uma camara municipal de um concelho onde ha uma empreza mineira importantissima lança-lhe todos os annos imposto, sob a fórma de addicionaes á contribuição que a mina paga ao estado; a empreza recorre da contribuição assim lançada, em geral tem sentença contra na primeira instancia, mas no supremo tribunal administrativo tem algumas vezes, e principalmente nos ultimos annos, obtido julgamento favoravel; a camara continua, apesar d´isso, a tributar a mina e esta a recorrer; o § unico pretendeu erigir em lei, que desfizesse duvidas, a interpretação que o tribunal superior do contencioso administrativo tem dado ultimamente á legislação existente sobre o assumpto, pelo menos nos termos em que a questão lhe tem sido apresentada. Era nobre o intuito e parecia sem inconvenientes, visto que era esse o estado legal de facto, segundo os tribunaes; logo, porém, que se votou o § unico, varias camaras de diversos districtos do paiz representaram contra a sua doutrina á camara dos dignos pares, representações que foram presentes á vossa commissão. Allegam as camaras que o artigo 68.° n.° 2.° do actual codigo administrativo não isenta as minas de impostos municipaes directos, e que tal isenção seria odiosa, visto que obrigaria a tributar mais outros ramos de industria, que podem ser mais pobres, quando é certo que as emprezas mineiras são as que mais estragam as estradas municipaes, e têem o direito de se aproveitarem de aguas, lenhas e pastos communs que haja no concelho; o § unico, se fosse approvado, tiraria a algumas das camaras representantes uma parte importante dos seus recursos, obrigando-as a elevar os addicionaes e as percentagens sobre outros rendimentos, ao passo que, subsistindo o imposto municipal sobre as minas, esses addicionaes ou percentagens poderão de futuro baixar-se em proveito de todos.

É innegavel o que as camaras allegam; o codigo administrativo vigente não isenta as minas de contribuição municipal, nem ha, a nosso ver, lei especial que as isente. O artigo 8.º do decreto de 30 de setembro de 1892, que se allega, em sentido contrario, e que diz "aos impostos estabelecidos nos artigos 1.°, 2.º e 3.° não será applicado qualquer dos addicionaes decretados até á data da promulgação do presente decreto" parece-nos que não tem nada com o imposto municipal e que se refere a addicionaes decretados em leis geraes em proveito do estado. Os accordãos do supremo tribunal administrativo, como se póde ver no de 27 de abril de 1898, nem são unanimes, nem têem voto favoravel de todos que o assignam e mais parecem referir-se á fórma do lançamento da contribuição por meio de addicionaes do que á contribuição em si.

Ainda, porém, que a legislação vigente isentasse as minas de impostos municipaes, apresentava-se a questão se era justo que a isenção continuasse; ora, tal isenção só se poderia manter se o imposto de minas para o estado fosse de tal fórma oneroso e productivo que as em-

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prezas não podessem sustentar a par d´elle, o imposto municipal; pelas investigações que a vossa commissão fez, é, porém, o contrario que succede.

O imposto de minas é calculado no orçamento de 1898-1899, em todo o paiz, na mesquinha quantia de 26:200$000 réis, que é a media do producto d´esse imposto no ultimo triennio; no orçamento de 1899-1900 o imposto é calculado em 23:600$000 réis, media do que produziu no triennio anterior; parece que ao imposto não se applica o decreto com força de lei de 30 de setembro de 1892, segundo o qual devia ser bastante mais productivo, mas o decreto de 31 de dezembro de 1852 e a lei de 25 de junho de 1879; dizemos parece, porque é esta ultima a legislação que vemos citada no orçamento; e se assim é, o decreto de 30 de setembro de 1892 não se applica, provavelmente porque não se publicaram ainda as instrucções regulamentares necessarias para a execução completa do mesmo decreto, preceituadas no seu artigo 20.º Para tudo isto chamámos a attenção do governo.

Pensou a vossa commissão em marcar um limite ás percentagens municipaes sobre o imposto de minas, mas, em vista do mesquinho producto do imposto para o estado, foi-lhe isto impossivel; dez ou vinte por cento sobre vinte e tantos contos, dividido por tantas camaras, seria pouco mais que zero para cada uma d´ellas; entende, pois, a vossa commissão, que deve continuar o imposto municipal sobre minas ; mas pensa ella tambem que não se deve consentir as camaras o abuso possivel de descarregarem todo ou a maior parte do peso do imposto municipal sobre as emprezas mineiras; e não podendo resolver a questão por si, por falta de informações, que pediu, mas que não chegaram ainda, resolveu propor-vos que auctoriseis o governo a regular o imposto municipal sobre minas, de modo a ficar proporcionado aos outros impostos municipaes directos.

A base 13ª identica á do governo, altera em parte o artigo 94.° do codigo vigente accrescentando a palavra - exagero - e revoga o artigo 93.° do codigo vigente, que diz - a rejeição de qualquer verba orçamental por parte da estação tutelar, invalida as deliberações respectivas, ainda que executorias - porque é contradictorio e trazia graves embaraços na administração.

A base 14.ª, idêntica á do governo, é justificada, na sua primeira parte, no relatorio do governo, em que se diz que, restauradas as juntas geraes, é consequente que se lhes confira a tutela das camaras municipaes, exceptuando a de Lisboa, porque esta, pela sua importancia e condições privativas como capital do reino, pela extensão e amplitude dos negocios municipais, pela estreiteza de relações e conjuncção de interesses geraes e municipaes nos diversos serviços, viação, obras, beneficencia, salubridade e segurança, e especialmente nos da fazenda, justifica se que esteja sujeita á exclusiva tutela do governo. Altera esta base o artigo 56.° do codigo vigente que estende a todos os municipios de primeira ordem a tutela do governo sobre diversos assumptos. A parte da base relativa ás receitas especiaes de serviço de segurança municipal refere-se as receitas com que as companhias de seguros contra inccudios devem contribuir para a despeza d´esse serviço na camara municipal de Lisboa.

A base l6.ª cria um conselho administrativo da fabrica da igreja parochial, reparando as suas funcções das das juntas de parochia, nas quaes têem até agora estado incluidas.

É uma entidade que existe n´alguns paizes de alta civilisação, como a França, onde por muito tempo se tem regido pelo decreto de 30 de dezembro de 1809, tendo, nos ultimos nove annos sido assumpto de alguns projectos de lei; não foi, porem, o vão prurido de imitar e de innovar que levou a propor que se adoptasse a instituição entre nós; foi a necessidade de obviar a conflictos, muitas vezes repetidos entre os parochos e as juntas de parochia em materias ecclesiasticas, como o uso do templo, a posse das chaves da igreja e das torres, o uso dos sinos, os actos do culto, etc., conflictos que não raro têem obrigado o poder central a intervir por meio de portarias ou pelas suas auctoridades.

A base como a votou a camara dos senhores deputados differe da proposta pelo governo, não só porque n´esta o conselho administrativo da fabrica compunha-se do parocho, presidente, e de quatro vogaes effectivos e quatro substitutos, ou de dois effectivos e dois substitutos, quando a população da freguezia era inferior a 1:900 habitantes, nomeados, em qualquer dos casos, metade pelo governador civil e metade pelo prelado diocesano, mas tambem porque a camara accrescentou a materia dos §§ 3.°, 4.° e 5.°, que constitue uma transição e uma transacção entre o regimen actual n´algumas parochias e o novo regimen do conselho administrativo da fabrica.

O § 3.° é doutrina estabelecida no artigo 195.° do codigo de 1886 e no artigo 183.° do codigo vigente; a doutrina dos §§ 4.º e 5.º está quasi toda nos artigos 196.° do codigo de 1886, e 182.º n.° 3.°, 183.° § unico, 184.° § 1.° do codigo actual, cuja disposição do § 1.° do artigo 184.°, - as duvidas que a este respeito se suscitarem entre os parochos e as juntas ou irmandades e contrarias serão resolvidas pelo governador civil com recurso para o governo - nos parece que não fica revogada de todo, porque não póde ser intenção do § 4.° conceder sómente ao parocho o direito de recorrer; o que parece especial ao seu recurso é o effeito suspensivo em virtude da lei.

Separados das juntas de parochia os interesses ecclesiasticos e de beneficencia da freguezia, não havia motivo para o parocho continuar a ser vogal nato e presidente da junta, como actualmente é pelo § 1.° do artigo 159.° do codigo; póde, porem, sel-o, se for eleito, como podem ser vogaes d´ella os do conselho administrativo da fabrica.

A base 17.ª é uma consequencia necessaria da anterior.

A base 18.ª differe da proposta pelo governo, que não marcava limite ás derramas, nem declarava expressamente que eram despezas obrigatorias os subsidios aos conselhos administrativos das fabricas, quando necessarios, o que são naturalmente, por isso que são na lei vigente despezas obrigatorias da parochia, as do culto, paramentos, vasos sagrados, alfaias e guizamentos. A parte da base que attribue o conhecimento dos recursos dos julgamentos das juntas ácerca das reclamações contra o rol da derrama aos tribunaes administrativos altera os §§ 1.º e 5.° do artigo 193.° do codigo vigente em que da decisão da junta ácerca das reclamações contra o rol da derrama cabia recurso para a camara municipal e d´esta para a commissão districtal; é bem mais conforme aos principios, que taes recursos, visto que são materia administrativa contenciosa, vão para os tribunaes do contencioso.

A base 19ª, um pouco differente da proposta do governo, porque lhe accrescentou a materia dos §§ 1.° e 2.°, que n´aquella proposta não estava expressa, embora se subentendesse da excepção que se estabelecia, tem tres partes: uma que organisa o contencioso administrativo da primeira instancia, que é entregue aos juizes de direito da respectiva comarca, segundo as regras geraes de competencia judicial, servindo de ministerio publico o respectivo delegado do procurador regio; outra a dos §§ 1.°, 2.°, 3.° e 4.°, que decidem duvidas sobre quaes são os tribunaes competentes para decidir questões de real de agua municipal, se os tribunaes communs, se os do contencioso fiscal; outra a do § 5.°, que declara addidos á magistratura judicial os actuaes auditores administrativos.

Sobre a primeira parte, organisação do contencioso administrativo de primeira instancia, diversas opiniões appareceram na commissão; parecia a alguns que seria conveniente restaurar os tribunaes administrativos, dando-lhes todas as attribuições do codigo de 1886, seria esse o ideal

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da sciencia e da justiça, e valeria a pena da despeza, para a qual se está cobrando a receita que para elles foi creada, porque haveria assim em cada districto o mesmo tribunal para questões administrativas contenciosas e para julgamento de contas, que, segundo o calculo de alguns, que é reputado diminuto, andara annualmente por valor superior a 2.000:000$000 réis.

«O julgamento das contas, escreve o sr. dr. Bernardo de Albuquerque, n'um folheto: - Apreciação das bases de 14 de abril de 1898, para a reforma do codigo administrativo - é um encargo de muita ponderação, que não póde ser confiado a funccionarios electivos, temporarios e ligados, pelas relações de naturalidade, parentesco, ou residencia, á circumscripção em que têem de desempenhar as suas attribuições.

«Por via de regra, só os que exercem a profissão de julgar; devidamente assegurada e remunerada, é que serão capazes de examinar detida e escrupulosamente as contas dos responsaveis, e de os obrigar a restituir os valores irregularmente despendidos, e a pagar as multas legaes, segundo a gravidade das faltas.

"A triste e longa experiencia dos conselhos de districto confirma quanto acabámos de dizer.

"Póde, certamente, o lucro dos emolumentos instigar as commissões districtaes a tomar promptamente as contas, mas não a julgal-as com o cuidado e imparcialidade com que o devem ser. Nem os emolumentos constituem sufficiente remuneração do estudo attento e demorado d´estes processos, nem, ainda que fossem consideravelmente augmentados, poderiam desviar as commissões districtaes da parcialidade e relaxação, proprias de quem exerço, provisoriamente e por influencia dos seus amigos, as funcções de julgador.

"Consequentemente, pertencendo ás commissões districtaes o julgamento das contas, não será devidamente fiscalisada a applicação dos rendimentos annualmente sujeitos á superintendencia das mesmas commissões, no valor approximado de 2.000;000$000 réis."

E n´outra parte:

"Em harmonia com as disposições d´esta base, têem os juizes de julgar: 1.°, as questões relativas á eleição de todos os corpos e corporações administrativas, á escusa e exclusão dos eleitos e á perda dos seus logares; 2.°, ás reclamações contra as deliberações dos mesmos corpos e corporações, por motivos de nullidade ou offensa de direitos; 3.°, ás reclamações contra os actos dos administradores de concelho, por incompetencia, excesso de poder, ou offensa de direitos; 4.°, finalmente, outros quaesquer assumptos do contencioso administrativo, que as leis especiaes lhes commetterem ou commettiam aos extinctos conselhos de districto.

"Estando os juizes de direito onerados com bastantes encargos, e tendo quasi sempre estes litigios do contencioso administrativo, nas terras pequenas principalmente, um caracter politico e irritante, não poderão muitas vozes aquellas auctoridades julgal os nem com a devida celeridade e reflexão, nem com a inteireza e desassombro indispensaveis. Mais rasões a favor dos tribunaes administrativos."

Confessava o governo que seria melhor esta organisação, sómente a não adoptava por causa da despeza.

Queriam outros os tribunaes administrativos, embora, para se diminuir a despeza, em numero menor, segundo a idéa do professor que citamos, tantos quantos eram as antigas provincias, o que repugnava a muitos, porque tinha o inconveniente de difficultar a justiça ás partes pela grandeza das distancias a percorrer; diminuiu-se a despeza ao thesouro e augmentava-se aos corpos locaes e aos cidadãos.

Partindo do estado actual das cousas, propunha o relator, no intuito de estabelecer em todos os districtos um tribunal administrativo, que julgasse ao mesmo tempo o contencioso e as contas, unidade de tribunal que é sempre um desideratum, que em Lisboa e Porto o tribunal administrativo fosse composto de tres juizes especiaes, segundo as regras do codigo administrativo de 1886, nos outros districtos do juiz de direito da capital do districto, que seria o presidente, com voto, de um juiz especial, o actual auditor, ou, onde já o não houvesse, um magistrado nomeado segundo as regras do mesmo codigo, e de um dos membros da commissão districtal, escolhido pelo governo para cada triennio, tendo preferencia aos bacharéis formados em direito, se na commissão os houvesse; só os juizes especiaes de Lisboa e Porto e os auditores ou juizes especiaes dos outros districtos teriam ordenado, repartindo-se, porém, os emolumentos por todo o tribunal e pelo ministerio publico.

Era assim diminuta a despeza e congregavam-se no tribunal elementos que agora se dispersavam por tres e na proposta por tribunaes de duas especies-juizes de direito e commissões districtaes.

O governo pensava que n´esta proposta do relator os juizes de direito da capital de districto ficavam muito sobrecarregados de trabalho, concentrando-se n´elles todo o contencioso de l.ª instancia, ao passo que na proposta do governo não havia esses inconvenientes, pois que as questões se distribuiam por todos os juizes de direito do districto, segundo as regras da competencia; julgava tambem inconveniente entrar no tribunal um elemento electivo, o membro da commissão districtal.

Depois de bastantes hesitações, por considerações de despeza, votou-se a parte l.ª da base, como estava; é o que dispoz o sr. Dias Ferreira no decreto de 21 de abril de 1892, com a differença que pertencem aos tribunaes e ás commissões districtaes os emolumentos que elle passara para o estado e que pelo codigo actual já pertenciam aos juizos de direito, aos auditores e ás commissões distritaes.

Na terceira parte da base, § 5°, entendeu a vossa commissão que só deviam accrescentar as palavras que sejam magistrados -, para se não poder entender que o dito paragrapho só applicava tambem a auditores interinos.

A base 20.ª differe da proposta do governo, que ia só até ás palavras por tres votos conformes. Refere-se a reclamações relativas a actos eleitoraes, que pelos artigos 230 e 231 do codigo vigente devem ser resolvidas pelo auditor dentro de vinte dias, havendo da resolução ou da falta d´ella recurso para o supremo tribunal administrativo, que devia ser julgado em conferencia por todos os membros presentes do tribunal; a base muda isto para a regra ordinaria tres votos conformes. O praso do julgamento segundo o § 1.° do mesmo artigo 231.° é a segunda sessão seguinte á resposta do ministerio publico; á camara dos senhores deputados pareceu este praso muito curto, mudando-o para sessenta dias, a contar da distribuição; pereceu á vossa commissão que trinta dias são bastantes.

À base 21.ª identica á da proposta do governo, altera o n.° 6.° do artigo 352.°, restituindo aos cidadãos um direito de recurso que tinham ha muito e que era ao mesmo tempo preventivo e repressivo de abusos. Não ha rasão para se declarar que os governos são infalliveis e impeccaveis nos seus actos e despachos, nem para se distinguir entre lesão de direitos de militares e de funccionarios civis.

A base 22.º é uma consequencia do facto do supremo tribunal administrativo não ter jurisdicção propria e uma providencia necessaria para não se annullar na pratica a disposição da base antecedente pela recusa tacita da homologação.

O artigo do codigo administrativo citado na base 23.ª, identica á do governo, diz que "os corpos e corporações administrativas e todos os magistrados e funccionarios administrativos incorrem na multa de 50$000 a 200$000

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réis: «1.º Por violação manifesta da lei em seus actos ou deliberações.» Os juizes não conhecendo da actos de que se trata senão nos julgamentos dos recursos contra elles, podem julgar que a lei não foi cumprida, sem todavia haver manifesta violação d'ella, caso que se dá sempre que a lei é de interpretação difficil ou dubia; o que se quer punir é a violação voluntaria da lei; é, pois, necessario que o juiz declare se houve a violação manifesta, para se poder applicar o n.° l.º do artigo.

A base 24.ª foi introduzida pela camara dos senhores deputados; modifica os artigos 113.° e 115.° do codigo vigente, dando um pequeno augmento aos ordenados ali estabelecidos. Se a disposição se applicar aos empregados da camara munucipal de Lisboa, isso representa para alguns d'elles uma diminuição do ordenado que têem, o que não parece justo; não houve, porém, na commissão nenhuma proposta a este respeito.

A base 25.ª, identica á do governo, sancciona um direito que na pratica se reconhecia aos corpos o corporações administrativas, mas que a letra da lei lhes negava, annullando-lhes todas as deliberações tomadas sobre objectos estranhos á sua competencia e attribuições, e não incluindo n'ellas os assumptos a que esta base se refere.

Na base 26.ª, a proposta do governo não continha os dois §§ 1.º e 8.°; a commissão da camara dos senhores deputados, concordando em que devem constituir objecto de diplomas especiaes as disposições relativas a baldios, organisação de orçamentos e contas, porque disposições especiaes e muitas regulamentares não devem, pela sua instabilidade, fazer parte de um codigo, accrescentou lhe a doutrina dos paragraphos, a do 1.° para dissipar duvidas, como ali se diz, a do 2.° para facilitar a venda de pequenos baldios, aquiparando-a á dos fóros, quando o valor seja inferior a 100$000 réis.

A base 27.º foi introduzida pela commissão da camara dos senhores deputados, que a justifica no seu relatorio

A base 28.ª, identica á do governo, revoga o artigo 431.° do codigo vigente, segundo o qual nenhuma acutoridade, magistrado ou funccionario póde ser demandado criminalmente, sem previa auctorisação do governo, por fatos relativos ás suas funcções, ainda que estas hajam cessado, a base dispensa a licença para a demanda; sómente em favor d'esses funccionarios protrahe o effeito da suspensão resultante da pronuncia até que ella passe em julgado, como faziam o § único do artigo 376.º do codigo administrativo de 1878 e os artigos 395.º e 396.º do codigo de 1886.

A base 29.ª correspondente á 24.º do projecto do governo, é muito differente d'esta.

O artigo 375.º do codigo vigente dispõe que a aposentação dos empregados administrativos, cujos vencimentos são pagos pelo estado, é regulado pelas leis geraes de aposentação dos funccionarios publicos, a aposentação dos empregados, cujos vencimentos são pagos pelos corpos administrativos, é regulada pelas disposições d'este codigo.

O artigo 376.º dispõe que os empregados, cujos vencimentos forem pagos pelos corpos administrativos, só poderão ser aposentados com as vantagens correspondentes aos logares que exerçam, quando n'elles tenham cinco annos, ou mais, de serviço effectivo, aliás só o poderão ser com as vantagens correspondentes ao ultimo logar que anteriormente houveram servido.

O artigo 377.º dispõe que os vencimentos das aposentações são encargo do cofre por onde se pagavam os vencimentos de actividade ao tempo da aposentação; e para este effeito conta-se cumulativamente o tempo de serviço em cargos ou empregos que dêem direito á aposentação.

Pela extincção de concelhos em 1895 foram passados passados os secretarios das camaras dos concelhos supprimidos para outras camaras, e alguns lá foram collocados definitivamente, pelo artigo 377.º do codigo são as camaras, para onde taes empregados foram transferidos, que pagam a sua aposentação, embora lá também muito pouco tempo de serviço, o que não é justo.

Pela base proposta pelo governo, para as aposentações dos empregados administrativos, sómente se contaria o tempo de serviço remunerado pelos cofres por onde se pagam os vencimentos de actividade ao tempo da aposentação; portanto, aquelles empregados, transferidos contra sua vontade, perdiam todo o tempo que tinham servido nas localidades do que foram transferidos, o que muitas vozes é perder o direito á aposentação, e não é justo.

A commissão da camara dos senhores deputados, desenvolvendo uma proposta apresentada na camara pelo sr. Marianno de Carvalho, pretendeu resolver essa e outras questões, instituindo na caixa nacional de aposentações uma secção especial para os empregados pagos pelos cofres dos corpos administrativos, regulando-se, na parte applicavel, pelas mesmas disposições que regem aquella caixa e pelas disposições dos paragraphos da base.

O § 1.° não offerece duvidas; o 2.° põe talvez as aposentações mais incertas do que eram; o 3.° não resolve de todo a difficuldade levantada pelo caso de empregados transferidos de um corpo administrativo para outro, mas attenua-a muitissimo; o 4.° tende a corrigir a incerteza resultante do § 2.°; no 5.º preceitua-se, como era de justiça, que se conte cumulativamente todo o tempo que se serviu em empregos que dêem direito a aposentação; neste paragrapho accrescentou, porém, a vossa commissão as palavras - ou que pela actual lei de aposentações, devam ser levados em conta, embora por si não dêem direito a ella; - e isto para respeitar os direitos de alguns funccionarios do estado, aos quaes a lei de 1 de setembro de 1887 no artigo 2.°, modificação 3.ª, § unico, mandou levar em conta o serviço prestado como governadores civis; administradores de concelho, e empregados das secretarias dos governos civis, direito que o codigo vigente respeita no artigo 375.°

Não tem a vossa commissão meio de avaliar promptamente que peso lançará na secção que se organisa na caixa de aposentações a faculdade de se aposentarem, que sob diversas condições o § 7.º d'esta base dá a diversos empregados dos corpos administrativos, que até agora não tinham direito de aposentação; suppôe que, principalmente no que respeita aos que excedem o limite da idade, marcado no § unico do artigo 1.° do decreto de 17 de julho de 1886, n'este periodo de transição, o peso será grande; como porém as pensões serão custeadas pela secção da caixa e dentro das forças d'ella, entendeu a vossa commissão que não devia modificar por esta conjectura esta parte da base, da iniciativa da commissão da camara dos senhores deputados.

As bases 30.ª, 31.ª, 33.ª, 34.ª, 35.ª 36.ª, 37.ª, que não vinham na proposta do governo, não carecem de explicação; a base 32.ª, correspondente á ultima da proposta do governo, continua lhe uma auctorisação tendente a diminuir despezas o que por isso se não deve negar.

Em harmonia com as idéas expostas, temos a honra de submetter á vossa approvação o seguinte projecto de lei:

Artigo l.º É o governo auctorisado a modificar o actual codigo administrativo, em harmonia com as bases que constituem parte integrante d'esta lei, dando conta ás côrtes na proxima sessão do uso que fizer d'esta auctorisação.

Art. 2.ª Fica revogada a legislação em contrario.

BASES A QUE SE REFERE A LEI D'ESTA DATA

Base 1.ª

Não poderão ser vogaes dos corpos administrativos nem auctoridades administrativas os empregados dependentes de algum d'elles; ou remunerados pelos seus cofres, em rasão do serviço activo que prestarem.

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§ unico. Por auctoridades administrativas entendem-se tanto os effectivos, como os substitutos e interinos.

Base 2.ª

Os corpos administrativos não podem ser dissolvidos sem preceder consulta do supremo tribunal administrativo, a qual será publicada com o decreto motivado da dissolução, quando contra esta houver opinado o mesmo tribunal.

Base 3.ª

Serão restabelecidas as juntas geraes dos districtos, continuando, porém, o estado a cobrar as percentagens que as ditas corporações votavam, e a satisfazer por esta receita os encargos com que, para elle, foram transferidas.

Base 4.ª

Estas juntas geraes terão attribuições analogas ás que lhes conferia o codigo administrativo de 17 de julho de 1886, regulando-se na sua organisação, reuniões e deliberações pelas disposições do titulo III do mesmo codigo na parte applicavel, e ficando em todo o caso dependentes de approvação expressa do governo as suas deliberações sobre dotação de serviços e impostos até 3 por cento, e dependentes de auctorisação por lei especial as suas deliberações sobre emprestimos e sobre impostos que excedam aquelle limite.

Base 5.ª

Ás mesmas juntas compete tambem:

a) Repartir pelos concelhos e bairros o contingente militar e o da contribuição predial;

b) Representar e dar o seu parecer ácerca da classificação de estradas a cargo do estado;

c) Formular annualmente uma consulta sobre as necessidades dos districtos, melhoramentos do que sejam susceptiveis e dos meios de os conseguir.

Base 6.ª

As commissões districtaes terão attribuições analogas ás que lhes conferia o codigo administrativo de 17 de julho de 1886, regulando se na sua organisação, reuniões e deliberações pelas disposições do titulo III do mesmo codigo na parte applicavel.

Base 7.ª

Pertencerão tambem ás commissões districtaes as attribuições designadas no artigo 40.° n.° 2.º do codigo administrativo de 4 de maio de 1896,e o julgamento das contas dos corpos e corporações administrativas que não competir ao tribunal de contas, exercendo junto d´ellas as funcções de ministerio publico os secretarios geraes dos governos civis.

Base 8.ª

Continuarão em vigor as disposições do decreto de 2 de março de 1895, respectivas nos districtos administrativos dos Açores, e os decretos de 18 de novembro do mesmo anno e de 6 de outubro de 1898 relativos aos districtos administrativos de Ponta Delgada e Angra do Heroismo, com as seguintes modificações;

a) Será reduzido o numero dos procuradores ás juntas geraes dos districtos de Ponta Delgada e Angra do Heroismo, e distribuido pelos concelhos na proporção da população e das tres contribuições directas, que são receita das mesmas corporações.

b) As ditas juntas geraes poderão emittir votos consultivos sobre todos os assumptos de interesse dos respectivos districtos.

c) As mesmas juntas geraes terão thesoureiro privativo, com o vencimento que, sobre proposta d´ellas, for fixado pelo governo.

Base 9.ª

A camara municipal de Lisboa será composta de dezesete vereadores e a do Porto de treze, dividindo-se para os effeitos da eleição ambos estes municipios em circulos, por cada um dos quaes será eleito um determinado numero de vereadores effectivos e substitutos.

Base 10.ª

Os presidentes de todas as camaras municipaes serão eleitos de entre si pelos respectivos vereadores.

Base 11.ª

Serão definitivas as deliberações das camaras municipaes sobre emprestimos, sua dotação e encargos, se estes, ou sós do per si ou juntos aos do emprestimos anteriores, não excederem a decima parte da media da receita ordinaria cobrada no ultimo triennio, e ficarão dependentes, quando os ditos encargos excedam este limite, da approvação do governo ou de auctorisação do poder legislativo, segundo o excesso for inferior ou superior á quinta parte d´aquella media.

Base 12.ª

As deliberações municipaes sobre organisação ou dotação do serviços, fixação de despezas, orçamentos, percentagens, taxas ou outros impostos, não serão executorias, sem approvação expressa da auctoridade tutelar, que será dada no praso de trinta dias.

§ unico. Fica auctorisado o governo a regular o imposto municipal sobre minas, tendo em vista as disposições vigentes sobre os outros impostos municipaes directos.

Base 13.ª

A esta auctoridade competirá tambem supprir a falta dos orçamentos municipaes ordinarios ou supplementares, corrigir a comissão, insufficiencia ou exagero da dotação das despezas obrigatorias, o reduzir ou supprimir as facultativas, abolindo-se, porém, o disposto no artigo 93.° do codigo administrativo de 4 de maio de 1896.

Base 14.ª

Só a tutela da camara municipal de Lisboa pertencerá exclusivamente ao governo, o qual poderá tambem, por uma só vez, fixar o quantitativo das receita especiaes do serviço de segurança municipal.

Base 15.ª

Os recebedores de concelho exercerão tambem as funcções de thesoureiros municipaes, e por este serviço terão como unico vencimento uma percentagem, arbitrada pelas camaras municipaes, não excedendo a 2 por cento da receita effectiva fonte cobrada por elles, com exclusão da proveniente de subsidios, emprestimos e rendimentos cobrados por mero addicionamento às contribuições do estado

§ 1.° Os mesmos recebedores exercerão as funcções de thesoureiros dos legados pios não cumpridos, pertencentes ao hospital do Sr. José, recebendo por este serviço a mesma percentagem.

§ 2.° Os thesoureiros dos corpos administrativos que, á data da publicação d´esta lei, estiverem exercendo esses cargos por encarto, poderão continuar n´elles, nos termos da legislação anterior.

Base 16.º

Em cada freguezia haverá um conselho administrativo da fabrica da igreja parochial, composto do parocho, que

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séra o presidente, e de dois vogaes effectivos e dois substitutos, nomeados triennalmente, um dos effectivos e um dos substitutos pela junta de parochia, e os restantes pelo governador civil, sob proposta do respectivo parocho.

§ 1.° Tanto o parodio como os vogaes do conselho administrativo poderão fazer parte da junta de parochia.

§ 2.° Ao conselho administrativo pertencerá exclusivamente:

a) Administrar os bens e rendimentos da fabrica da igreja parochial e suas dependentes;

b) Arrecadar as receitas e applical-as às despezas estrictamente inherentes a esta administração;

c) Exercer as funcções das actuaes commissões de beneficencia da respectiva freguezia.

§ 3.° Será permittido ao conselho administrativo ceder a administrado da fabrica da igreja parochial, ou das suas dependentes, a qualquer irmandade ou confraria, erecta nas mesmas igrejas, que, precedendo deliberação da respectiva assembléa geral, para isso for auctorisada pelo governador civil, quando a cedencia importe diminuição do encargos para os parochianos

§ 4.° Nas freguezias onde, á data da promulgação do codigo administrativo, organisado segundo estas bases, houver irmandades legalmente auctorisadas a ser fabriqueiras, e que concorram com recursos proprios para as despojas da fabrica, continuarão essas irmandades a administrar os bons e rendimentos da mesma fabrica com todos os encargos a ella inherentes, e com as mesmas attribuições e resitricções com que esta administração pertence aos conselhos administrativos, competindo ao parocho presidir com voto a todas as sessões das respectivas mesas em que se tratem assumptos relativos aos interesses ecclesiasticos da parochia e á administração da fabrica, podendo reclamar perante o governador civil, com recurso para o governo, e com effeito suspensivo, contra os actos e deliberações das mesas que julgue prejudiciaes á mesma administração ou áquelles interesses.

§ 5.° A administração da fabrica, concedida ou mantida a irmandade fabriqueiras, será retirada pelo governador civil quando estas corporações deixem de concorrer com recursos proprios para o custeio dos encargos da fabrica.

Base 17.ª

As disposições actualmente em vigor, ácerca da organização e deliberações das juntas de parochia, serão modificadas em harmonia com o estabelecido na base 16.ª, transferindo se para os conselhos administrativos das fabricas a parte applicavel.

Base 18.ª

As juntas de parochia poderão votar derramas, não excedentes a 10 por cento, sobre, as contribuições geraes do estado, na conformidade dos n.º 7.º e 8.° do § 1.° do artigo 199.º do codigo administrativo de 17 de julho de 1886, para todas as despezas que forem obrigatorias, considerando-se como taes os subsidios aos concelhos administrativos das fabricas quando necessarios; e o conhecimento da recursos dos julgamentos das mesmas juntas ácerca das reclamações contra o rol da derrama competirá aos tribunaes do contencioso administrativo.

Base 19.ª

O desempenho das funções designados nos artigos 224.°, 228.° e 229.° do codigo administrativo de 4 de maio de 1896, e o julgamento das questões do contencioso administrativo, mencionadas no artigo 288.° do codigo administrativo de 17 de julho de 1886, pertencerá, com os correlativos emolumentos, ao juiz de direito da comarca a que pertencerem, segundo as regras geraes de competencia judicial, e as do ministerio publico ao respectivo delegado do procurador regio.

§ 1.° A instrucção dos processos por descaminho de direitos devidos por generos sujeitos a impostos indirectos municipaes e por transgressões dos respectivos regulamento, ficará pertencendo aos administradores de concelho nas suas respectivas circumscripções; e o seu julgamento em primeira instancia, havendo contestação, ao juiz do direito da respectiva comarca, com recurso para o supremo tribunal administrativo.

§ 2.° A instrucção o julgamento d´esses processos, e a fiscalisação, liquidação e cobrança dos respectivos impostos, quer por administração propria da camara, quer por meio de arrematação, serão regulados pelas disposições applicaveis dos regulamentos do real de agua.

§ 3 ° Quando, porém, esses impostos forem cobrados cumulativamente com o real de agua, ou pelo pessoal empregado na sua fiscalisação e arrecadação, serão os respectivos processos da exclusiva competencia das auctoridades e tribunaes a que pertencerem as questões relativas á liquidação e cobrança d´aquelle imposto.

§ 4 ° A auctoridade ou tribunal que julgar estes processos será tambem competente para impor aos transgressores as multas comminadas nos respectivos regulamentos fiscaes ou municipaes.

§ 5.° Ficarão addidos á magistratura judicial os actuaes auditores administrativos, que serão magistrados.

Base 20.ª

Os recursos a que se refere o artigo 231.° do codigo administrativo, de 4 de maio de 1896, serão julgados em sessão do supremo tribunal administrativo, por tres votos conformes, no praso de trinta dias, a contar da distribuição.

Base 21.ª

Poderá recorrer-se para o supremo tribunal administrativo dos actos e despachos do governo por violação de lei ou regulamento, excepto em questões do propriedade ou de posse, ou que estejam sujeitas á competencia de outros tribunaes.

Base 22.ª

Quando o governo não se conformar com a consulta do supremo tribunal administrativo nos recursos contenciosos, será publicada no Diario do qoverno a mesma consulta, conjunctamente com o decreto que resolver o recurso.

Base 23.ª

Os juizes de direito ficarão, quando conhecerem dos actos das auctoridades, corpos e corporações administrativas, obrigados a julgar, e declarar se houve ou não manifesta violarão de lei para os effeitos do n.° 1.° do artigo 409.° do codigo administrativo de 4 de maio de 1896.

Base 24.ª

Os secretarios das camaras municipaes e das administrações do concelho ou bairro terão o ordenado de 400$000 réis nos concelhos de 1.ª ordem, de 270$000 réis nos de 2.ª ordem e de população superior a 15:000 habitantes, a de 200$000 réis nos restantes, alem dos emolumentos que lhes competirem pelas respectivas tabellas.

§ 1.° Os secretarios de todas as camaras municipaes receberão os emolumentos correspondentes aos actos que praticarem como tabelliães privativos das mesmas camaras, quando devam ser pagos pelas partes, não podendo, porém, exigil-os das respectivas camaras.

§ 2 ° Os amanuenses das mesmas camaras e administrações terão de ordenado nos concelhos de l.ª ordem 180$000 réis, e nos de 2.ª ordem 140$000 réis.

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Base 25.ª

Todos os corpos e corporações administrativas poderão emittir votos de congratulação ou de sentimento, que não envolvam offensa ás instituições politicas, aos poderes do estado, ás auctoridades ou aos particulares; e poderão tambem as camaras municipaes incluir nos seus orçamentos as verbas de despeza, devidamente dotada, que forem approvadas pela competente auctoridade tutelar, para festejos nacionaes ou para solemnisação ou commemoração de actos ou acontecimentos importantes para o reino ou em especial para o respectivo municipio.

Base 26.ª

Serão objecto de diplomas especiaes as disposições relativas a baldios, e a organisação de orçamentos e contas das corporações administrativas, podendo tambem ser supprimidas ou alteradas as disposições regulamentares ou formularios estabelecidos no codigo administrativo de 21 de maio de 1896.

§ 1.° Emquanto não forem publicados os diplomas, a que se refere esta base, continuará em vigor a legislação anterior ao codigo administrativo de 2 de março de 1895, confirmado pelo de 4 de maio de 1836, relativamente á alienação de baldios, seu aforamento e fóros municipaes.

§ 2.° A alienação de qualquer terreno baldio, de valor inferior a 100$000 réis, será feita pelas camaras municipaes, com as formalidades determinadas para a venda dos fóros, na lei de 21 de abril de 1873 e regulamento de 25 de setembro do mesmo anno, podendo tanto a alienação de baldios como a de fóros, fazer-se independentemente de inventario, quando este não esteja concluido.

Base 27.ª

Serão ampliadas as disposições do artigo 52.° do codigo administrativo de 4 de maio de 1896, concedendo ás camaras municipaes mais amplas faculdades sobre a organisação de posturas, e entre estas:

Para impedir que possa ser apascentado, em todos ou em alguns pontos do concelho, gado caprino ou lanigero, podendo estabelecer multas aos infractores e ordenar a apprehensão do gado como garantia d´ellas, alem da competente indemnisação por perdas e damnos, prescripta na lei civil pelos prejuizos causados pelo referido gado.

Base 28.º

As auctoridades, magistrados ou funccionarios administrativos ou agentes da auctoridade administrativa poderão ser demandados sem licença do governo, mas o respectivo despacho de pronuncia, ainda que não admitta fiança, nenhum effeito produzirá, sem que seja previamente intimado, e passe em julgado, ficando então o indiciado suspenso do exercicio das suas funcções.

Base 29.ª

Haverá na caixa nacional de aposentações dos empregados civis uma secção especial de aposentações para os empregados pagos pelos cofres dos corpos administrativos, regulando-se na parte applicavel pelas mesmas disposições que regem aquella caixa.

§ 1.° As pensões de aposentação concedidas até á data da promulgação do codigo administrativo organisado na conformidade d´estas bases continuarão a ser encargo dos mesmos cofres que actualmente são obrigados a pagal-as.

§ 2.° As pensões de aposentação concedidas depois d´essa data serão pagas pela caixa de aposentações creada por esta base, mas só pelas receitas proprias das mesma caixa e dentro das forças d'ella.

§ 3.° Todos os corpos administrativos ficarão obrigados a pagar mensalmente a esta caixa de aposentações, por conta de cada um dos actuaes empregados pagos pelos seus cofres com direito a aposentação e dos que de futuro forem nomeados com mais de trinta annos de idade, as quotas por idades fixadas na tabella annexa ao decreto n.º 1 de 17 de julho de 1886, e por conta do cada um dos empregados de futuro nomeados com mais de trinta annos de idade a quota de 6 por cento, fazendo para isso os respectivos descontos nas folhas ou recibos de vencimento de qualquer natureza.

§ 4.° Os mesmos corpos serão obrigados a subsidiar annualmente, quando necessario, esta caixa de aposentações com uma quantia proporcional ao numero e á importancia dos vencimentos dos seus respectivos empregados, que será fixada e repartida pelo governo, e que poderá sair do fundo de viação municipal, na falta de outros recursos.

§ 5.º A aposentação dos empregados administrativos, quer os seus vencimentos sejam pagos pelo estado, quer pelos corpos administrativos, será regulada pelo disposto n'esta base e pelas leis geraes de aposentação dos funccionarios publicos, contando-se sempre cumulativamente, para este effeito, todo o tempo de serviço prestado a qualquer d'esses corpos ou ao estado em cargos ou empregos que dêem direito á aposentação, ou que pela actual lei de aposentações devam ser levados em conta para a aposentação, embora por si não dêem direito a ella.
§ 6.° A aposentação dos empregados pagos pelos cofres dos corpos administrativos será concedida ou a requerimento do interessado, ou por determinação da auctoridade ou corporação que os nomeou, na fórma do respectivo regulamento.

§ 7.° Os empregados pagos pelos cofres dos corpos administrativos que actualmente não têem direito a aposentação, poderão adquiril-o na conformidade do § unico do artigo 1.° do decreto n.° 1 de 17 de julho de 1886, e nos termos applicaveis do decreto de 14 de outubro do mesmo anno; mas aos que ao tempo da promulgação d´este codigo excedam o limite de idade marcado n'esse § unico do artigo 1.° do decreto de 17 de julho de 1886, só poderá ser concedida aposentação quando, tendo as demais condições legaes d´ella, paguem, pelo menos, para a caixa de aposentações, quinze annuidades de 12 por cento sobre os seus vencimentos, devendo n´este caso a aposentação realisar-se passados seis mezes, durante os quaes continuarão a pagar a mesma quota.

Base 30.ª

O presidente da camara que assignar e o secretario que subscrever quaesquer ordens de pagamento passados era contravenção do disposto no artigo 103.º do codigo administrativo de 4 de maio de 1896, serão solidariamente responsaveis pela restituição das quantias indevidamente pagas, e, no caso de reincidencia, incorrerão, alem da responsabilidade civil, nas multas impostas pelo artigo 409.° do mesmo codigo.

Base 31.ª

Os facultativos municipaes não poderão, sem licença da camara, sair para fóra do concelho, em cada mez, por mais de tres dias, seguidos ou intercalados, devendo em todo o caso participar a salda ao presidente da camara, e fazer-se substituir, quanto haja um só facultativo, por outro approvado pela camara, havendo o na localidade.

Base 32.ª

Continúa auctorisado o governo a collocar os empregados addidos nos logares dependentes das auctoridades, corpos e corporações administrativas, e a incumbil os de qualquer commissão de serviço publico.

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Base 33.ª

De todas as deliberações tomadas e assumptos discutidos pelos corpos e corporações administrativas em cada uma das suas sessões ordinarias ou extraordinarias fará immediatamente o secretario um resumo fiel, que deverá conter o proprio teor de qualquer d´essas deliberações quando algum dos vogaes assim o reclame, e que será, no fim da respectiva sessão, assignado o rubricado por todos os vogaes que a ella assistiram.

§ 1.° Se algum vogal deixar do assignar este resumo, o secretario declarará essa falta e o motivo d´ella, considerando-se valido o resumo sem essa assignatura ou assignaturas desde que esteja assignado ou rubricado pela maioria dos presentes.

§ 2.º Até á sessão seguinte deverá ser escripta e subscripta, ou sómente subscripta pelo secretario, em livro especial, com termos de abertura e encerramento, numerado e rubricado pelo presidente, uma acta em que circunstanciadamente ao menciono, com a maior exactidão e clareza, tudo o que na sessão anterior se houver discutido e deliberado.

§ 3.° O vogal, que não se conformar com alguma deliberação ou com a redacção da acta, póde assignar vencida, explicar resumidamente o seu voto no resumo, ou na acta da sessão, ou em seguida á sua assignatura, e reclamar contra a mesma deliberação ou contra outro qualquer em que não haja intervindo.

§ 4.° Emquanto não for lavrada e devidamente assignado a respectiva acta, poderão provar-se as deliberações pelo resumo d´ellas, e as certidões, tanto d'este resumo, como d´aquella acta, devem ser passadas, independentemente do despacho, pelo respectivo secretario, dentro de cinco dias depois de requeridas pelos interessados ou requisitadas pela auctoridade publica.

Base 34.ª

O imposto de prestação de trabalho poderá ser exigido pelas camaras municipaes até dois dias em cada anno, e pelas junta de parochia até um dia, salvo o disposto no § 7.° do artigo 72.° do codigo administrativo.

Base 35.ª

São dispensados da hasta publica os contratos para obras de reparação em que forem interessadas as camaras municipaes, do valor não excedente a 100$000 réis.

Base 36.ª

No exercicio das suas attribuições contenciosas compete aos juizes do direito julgar:

Sobre reclamações relativas ás eleições das associações litterarias ou de instrucção e recreio, á admissão ou exclusão dos socios, e aos actos das respectivas direcções, que envolvam violação de lei ou regulamento de administração publica, dos seus estatutos, ou offensa de direitos.

Base 37.ª

É o governo auctorisado a rever e alterar o mappa das quotas com que as camaras municipaes têem de contribuir annualmente para o hospital real de S. José e annexos.

Sala da commissão de administração publica da camara dos dignos pares, 1 de maio de 1899. = Telles de Vasconcellos (com declaração) = Hintze Ribeiro (vencido) = Casal Ribeiro (vencido) = Pereira de Miranda = Conde do Restello = Antonio Egypcio Quaresma = Marquez da Graciosa = Conde da Borralha = Pereira Dias = Conde de Bertiandos = José Joaquim Fernandes Vaz = José Frederico Laranja, relator.

Projecto de lei n.° 137

Artigo 1.° É o governo auctorisado a modificar o actual codigo administrativo, em harmonia com as bases que constituem parte integrante d´esta lei, dando conta ás côrtes, na proxima sessão, do uso que fizer d´esta auctorisação.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 10 de março de 1899. = Luiz Fisher Berquô Poças Falcão, presidente = Frederico Alexandrino Garcia Ramirez - Carlos Augusto Ferrreira.

BASES A QUE SE REFERE A LEI D'ESTA DATA

Base 1.ª

Não poderão ser vogaes dos corpos administrativos nem auctoridades administrativas os empregados dependentes de algum d´elles, ou remunerados pelos seus cofres, em rasão do serviço activo que prestarem.

§ unico. Por auctoridades administrativas entendem-se tanto os effectivos, como os substitutos e interinos.

Base 2.ª

Os corpos administrativos não podem ser dissolvidos sem preceder consulta do supremo tribunal administrativo, a qual será publicada com o decreto motivado da dissolução, quando contra esta houver opinado o mesmo tribunal.

Base 3.ª

Serão restabelecidas as juntas geraes dos districtos, continuando, porém, o estado a cobrar as percentagens que as ditas corporações votavam, e a satisfazer por esta receita os encargos com que, para elle, foram transferidas.

Base 4.ª

Estas juntas geraes terão attribuições analogas ás que lhes conferia o codigo administrativo de 17 de julho de 1886, regulando-se na sua organisação, reuniões e deliberações, pelas disposições do titulo III do mesmo codigo, na parte applicavel, e ficando em todo o caso dependentes de approvação expressa do governo as suas deliberações sobre dotação de serviços e impostos e dependentes de auctorisação por lei especial as suas deliberações sobre emprestimos e sobre impostos que excedam aquelle limite.

Base 5.ª

Ás mesmas juntas compete tambem:

a) Repartir pelos concelhos e bairros o contingente militar e o da contribuição predial;

b) Representar e dar o seu parecer ácerca da classificação de estradas a cargo do estado;

c) Formular annualmente uma consulta sobre as necessidades dos districtos, melhoramentos de que sejam susceptiveis e dos meios de os conseguir.

Base 6.ª

As commissões districtaes terão attribuições analogas ás que lhes conferia o codigo administrativo de 17 de julho de 1886, regulando-se na sua organisação, reuniões e deliberações pelas disposições do titulo III do mesmo codigo na parte applicavel.

Base 7.ª

Pertencerão tambem ás commissões districtaes as attribuições designadas no artigo 40.° n.° 2.° do codigo administrativo de 4 de maio de 1896, e o julgamento das contas dos corpos e corporações administrativas que não

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SESSÃO N.º 102 DE 4 DE JULHO DE 1899 73

competir ao tribunal de contas exercendo junto d´ellas as funcções do ministerio publico os secretarios geraes dos governos civis.

Base 8.ª

Continuarão em vigor as disposições do decreto de 2 de março de 1895 respectivas aos districtos administrativos dos Açores, e os decretos de 18 de novembro do mesmo anno e de 6 de outubro de 1898 relativos aos districtos administrativos de Ponta Delgada e Angra do Heroismo, com as seguintes modificações:

a) Será reduzido o numero dos procuradores ás juntas geraes dos districtos de Ponta Delgada e Angra do Heroismo, e distribuido pelos concelhos na proporção da população e das tres contribuições directas, que são receita das mesmas corporações.

6) As ditas juntas geraes poderão emittir votos consultivos sobre todos os assumptos de interesse dos respectivos districtos.

c) As mesmas juntas geraes terão thesoureiro privativo, com o vencimento que, sobre proposta d´ellas, for fixado pelo governo.

Base 9.ª

A camara municipal de Lisboa será composta de dezessete vereadores e a do Porto de treze, dividindo-se para os effeitos da eleição ambos estes municipios em circulos, por cada um dos quaes será eleito um determinado numero de vereadores effectivos e substitutos.

Base 10.ª

Os presidentes de todas as camaras municipaes serão eleitos de entre si pelos respectivos vereadores.

Base 11.ª

Serão definitivas as deliberações das camaras municipaes sobre emprestimos, sua dotação e encargos, se estes, ou sós de per si ou juntos aos de emprestimos anteriores não excederem a sexta parte da media da receita ordinaria cobrada no ultimo triennio e ficarão dependentes, quando os ditos encargos excedam este limite, da approvação do governo.

Base 12.ª

As deliberações municipaes sobre organisação ou dotação de serviços, fixação de despezas, orçamentos, percentagens, taxas ou outros impostos, não sei ao executarias sem approvação expressa da auctoridade tutelar, que será dada no praso de trinta dias.

§ unico. Fica auctorisado o governo a regular o imposto municipal sobre minas, tendo em vista as disposições vigentes sobre os outros impostos municipaes não podem recair sobre minas.

Base 13.ª

A esta auctoridado competirá tambem supprir a falta dos orçamentos municipaes ordinarios ou supplementares, corrigir a comissão, insufficiencia ou exagero da dotação das despezas obrigatorias, e reduzir ou supprimir as facultativas, abolindo-se, porém, o disposto no artigo 93.º do codigo administrativo de 4 de maio de 1896.

Base 14.ª

Só a tutela da camara municipal de Lisboa pertencerá exclusivamente ao governo, o qual poderá tambem, por uma só vez, fixar o quantitativo das receitas especiaes do serviço de segurança municipal.

Base 15.ª

Os recebedores de concelho exercerão tambem as funcções de thesoureiros municipaes, e por este serviço terão como unico vencimento uma percentagem, arbitrada pelas camaras municipaes, não excedente a 2 por cento da receita effectivamente cobrada por elles, com exclusão da proveniente de subsidios, emprestimos e rendimentos cobrados por mero addicionamento ás contribuições do estado.

§ unico. Os mesmos recebedores exercerão as funcções de thesoureiros dos legados pios não cumpridos, pertencentes ao hospital de S. José, recebendo por este serviço a mesma percentagem.

Base 16.ª

Em cada freguezia haverá um conselho administrativo da fabrica da igreja parochial, composto do parocho, que será o presidente, e de dois vogaes effectivos e dois substitutos, nomeados triennalmente, um dos effectivos e um dos substitutos pela junta de parochia, e os restantes pelo governador civil, sobre proposta do respectivo parocho, de entre os cidadãos elegiveis da circumscripção.

§ 1.° Tanto o parocho como os vogaes do conselho administrativo poderão fazer parte da junta de parochia.

§ 2.° Ao conselho administrativo pertencerá exclusivamente:

a) Administração dos bens e rendimentos da fabrica da igreja parochial e suas dependentes;

b) Arrecadar as receitas e applical-as ás despezas estrictamente inherentes a esta administração;

c) Exercer as funcções das actuaes commissões de beneficencia da respectiva freguezia.

§ 3.° Será permittido ao conselho administrativo ceder a administração da fabrica da igreja parochial ou das suas dependentes a qualquer irmandade ou confraria erecta nas mesmas igrejas, que, precedendo deliberação da respectiva assembléa geral, para isso for auctorisada pelo governador civil, quando a cedencia importe diminuição de encargos para os parochianos.

§ 4.º Nas freguezias onde, á data da promulgação do codigo administrativo, organisado segundo estas bases, houver irmandades legalmente auctorisadas a ser fabriqueiras, e que concorram com recursos proprios para as despezas da fabrica, continuarão essas irmandades a administrar os bens e rendimentos da mesma fabrica com todos os encargos a ella inherentes, e com as mesmas attribuições e restricções com que essa administração pertence aos conselhos administrativos, competindo ao parocho presidir com voto a todas as sessões das respectivas mesas em que se tratem assumptos relativos aos interesses ecclesiasticos da parochia e á administração da fabrica, podendo reclamar perante o governador civil, com recurso para o governo, e com effeito suspensivo, contra os actos e deliberações das mesas que julgue prejudiciaes á mesma administração ou aquelles interesses.

§ 5.° A administração da fabrica concedida ou mantida a irmandades fabriqueiras será retirada pelo governador civil quando estas corporações deixem de concorrer com recursos proprios para o custeio dos encargos da fabrica.

Base 17.ª

As disposições actualmente em vigor ácerca da organisação e deliberações das juntas de parochia serão modificadas em harmonia com o estabelecido na base 16.º, transferindo-se para os conselhos administrativos das fabricas a parte applicavel.

Base 18.ª

As juntas de parochia poderão votar derramas, não excedentes a 1O por cento, sobre as contribuições geraes do estado, na conformidade dos n.ºs 7.° e 8.° do § 1.° do artigo 199.° do codigo administrativo de 17 de julho de 1886, para todas as despezas que forem obrigatorias, considerando-se como taes os subsidios aos conselhos admi-

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74 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

distrativos fabricas quando necessarios; e o conhecimento dos recursos dos julgamentos das mesma juntas ácerca das reclamações contra o rol da derrama competencia aos tribunais do contencioso administrativo.

Base 19.ª

O desempenho das funcções designadas nos artigos 224.°, 228.º e 229.º do codigo adinmistrativo de 4 de maio de 1896, e o julgamento das questões de contencioso administrativo, mencionado no artigo 288.º do codigo administrativo de 17 de julho de 1886, pertencerá, com os correlativos emolumentos, ao juiz do direito da comarca a que pertencerem, segundo as regras geraes de competencia judicial, e as do ministerio publico ao respectivo delegado do procurador regio.

$ l.° A instrucção dos processos por descaminho de direitos devidos por generos sujeitos a impostos indirectos municipaes e por transgressões dos respectivos regulamentos, ficará pertencendo aos administradores do concelho nas suas respectivas circumscripções; e o seu julgamento em primeira instancia, havendo contestação, ao juiz de direito da respectiva comarca, com recurso para o supremo tribunal administrativo

§ 2.º A instrucção e julgamento d'esses processos, e a fiscalisação, liquidação e cobrança dos respectivos impostos, quer por administração propria da camara, quer por meio de arrematação, serão regulados pelas disposições applicaveis dos regulamentos do real de agua.

§ 3.º Quando, porém, esses impostos forem cobrados cumulativamente com o real de agua, ou pelo pessoal empregado na sua fiscalisação o arrecadação, serão os respectivos processos da exclusiva competencia das auctoridades e tribunaes a que pertencerem as questões relativas á liquidarão e cobrança d'aquelle imposto.

§ 4.° A auctoridade ou tribunal, que julgar estes processou, será tambem competente para impor aos transgressores as multas comminadas nos respectivos regulamentos fiscaes ou municipaes.

§ 5.º Ficarão addidos a magistratura judicial os actuaes auditores administrativos.

Base 20.ª

Os recursos a que se refere o artigo 231.º do codigo administrativo, de 4 de maio do 1896, serão julgados em sessão do supremo tribunal administrativo, por tres votos conformes, no praso de sessenta dias, a contar da distribuição.

Base 21.

Poderá recorrer se para o supremo tribunal administrativo dos actos e despachos do governo por violação de lei ou regulamento, excepto um questões de propriedade ou de pouse, ou que estejam sujeitas á competencia de outros tribunaes.

Base 22.ª

Quando o governo não se conformar com a consulta do supremo tribunal administrativo nos recursos contenciosos, será publicada no Diario do governo a mesma consulta, conjunctamente com o decreto que resolver o recurso.

Base 23.ª

Os juizes de direito ficarão, quando conhecerem dos actos das auctoridades, corpos e corporações administrativas, obrigados a julgar e declarar se houve ou não manifesta, violação de lei para os effeitos do n.° 1.° do artigo 409.° do codigo administrativo de 4 de maio de 1896.

Base 24.ª

Os secretarios das camaras nunicipaes e das administrações de concelho ou bairro terão o ordenado de 400$000 réis nos concelhos de 1.ª ordem, de 270$000 réis nos de 15:000 ordem e de população superior a 15:000 habitantes, e do 200$000 réis nos restantes, alem dos emolumentos que lhes competirem pelas respectivas tabellas.

§ 1." Os secretarios de todas as camaras municipaes receberão os emolumentos correspondentes aos actos que praticarem como tabelliâes privativos das mesmas camaras, quando devam ser pagos pelas partes, não podendo, porém, exigil os das respectivas camaras.

§ 2.º Os amanuenses das mesmas camaras e administrações terão de ordenado nos concelhos de l.ª ordem 180$000 réis, e nos de 2.ª ordem 140$000 réis.

Base 25.ª

Todos os corpos e corporações administrativas poderão emittir votos de congratulação ou de sentimento, que não envolvam offensa as instituições politicas, aos poderes do estado, ás auctoridades ou aos particulares; e poderão tambem as camaras municipaes incluir nos seus orçamentos as verbas do despeza, devidamente dotada, que forem approvadas pela competente auctoridado tutelar, pura festejos nacionaes ou para solemnisação ou commemoração de actos ou acontecimentos importantes para o reino ou em especial para o respectivo municipio.

Base 26.°

Serão objecto de diplomas especiaes as disposições relativas a baldios, e a organisação de orçamentos e con-regulando se, na parte applicavel, pelas mesmas disposições que regem aquella caixa.

§ 1.° As pensões de aposentação concedidas até á data da promulgação do codigo administrativo organisado na conformidade d'estas bases continuarão a ser encargo dos mesmos cofres que actualmente são obrigados a pagal-as.

§ 2.º As pensões de aposentação concedidas depois d'essa data serão pagas pela caixa de aposentações creada por esta base, mas só pelas receitas proprias da mesma caixa e dentro das forças d'ella.

§ 3.° Todos os corpos administrativos ficarão obrigados a pagar mensalmente a esta caixa de aposentações, por conta de cada um dos actuaes empregados pagos pelos seus cofres com direito a aposentação e dos que de futuro forem nomeados com mais do trinta annos de idade, as quotas por idades fixadas na tabella annexa ao decreto n.° 1 de 17 de julho de 1886, e por conta de cada um dos empregados de futuro nomeados com menos de trinta annos de idade a quota de 6 por cento, fazendo para isso os respectivos descontos nas folhas ou recibos de vencimento de qualquer natureza.

§ 4.° Os mesmos corpos serão obrigados a subsidiar annualmente, quando necessario, esta caixa de aposentações com uma quantia proporcional ao numero e á importancia dos vencimentos dos seus respectivos empregados, que será fixada e repartida pelo governo, e que poderá saír do fundo de viação municipal, na falta de outros recursos.

§ 5.º A aposentação dos empregados administrativos, quer os seus vencimentos sejam pagos pelo estado, quer pelos corpos administrativos, será regulada pelo disposto n'esta base e pelas leis geraes de aposentação dos funccionarios publicos, contando se sempre cumulativamente, para este effeito, todo o tempo do serviço prestado a qualquer d'esses corpos ou ao estado em cargos ou empregos que dêem direito á aposentação.

§ 6.° A aposentação dos empregados pagos pelos cofres dos corpos administrativos será concedida ou a requerimento do interessado, ou por determinação da auctoridade ou corporação que os nomeou, na fórma do respectivo regulamento.

§ 7.° Os empregados pagos pelos cofres dos corpos administrativos que actualmente não têem direito a aposen-

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tas das corporações administrativas, podendo tambem ser supprimidas ou alteradas as disposições regulamentares ou formularias estabelecidas no codigo administrativo de 21 de maio de 1896.

§ 1.° Emquanto não forem publicados os diplomas, a que se refere esta base, continuará em vigor a legislação anterior ao codigo administrativo de 2 de março de 1895, confirmado pelo de 4 de maio de 1896, relativamente á alienação de baldios, seu aforamento e fóros municipaes.

§ 2.° A alienação de qualquer terreno baldio, de valor inferior a 100$000 réis, será feita pelas camaras municipaes, com as formalidades determinadas para a venda dos fóros, na lei de 21 de abril de 1873 e regulamento de 25 de setembro do mesmo anno, podendo, tanto a alienação de baldios como a de fóros, fazer-se independentemente de inventario, quando este não esteja concluido.

Base 27.ª

Serão ampliadas as disposições do artigo 52 ° do codigo administrativo de 4 de maio de 1896, concedendo ás camaras municipaes mais amplas faculdades sobre a organisação de posturas, e entre estas:

Para impedir que possa ser apascentado, em todos ou em alguns pontos do concelho, gado caprino ou lanigero, podendo estabelecer multas aos infractores e ordenar a apprehensão do gado como garantia d´ellas, alem da competente indemnisação por perdas e damnos, prescripta na lei civil pelos prejuizos causados pelo referido gado.

Base 28.ª

As auctoridades, magistrados ou funccionarios administrativos, ou agentes da auctoridade administrativa, poderão ser demandados sem licença do governo, mas o respectivo despacho de pronuncia, ainda que não admitta fiança, nenhum effeito produzirá, sem que seja previamente intimado, e passe em julgado, ficando então o indiciado suspenso do exercicio das suas funcções.

Base 29.ª

Haverá na caixa nacional de aposentações dos empregados civis uma secção especial de aposentações para os empregados pagos pelos cofres dos corpos administrativos, tacão, poderão adquiril-o na conformidade do § unico do artigo 1.° do decreto n.° 1 de 17 de julho de 1886, e nos termos applicaveis do decreto de 14 de outubro do mesmo anno; mas aos que ao tempo da promulgação d´este codigo excedam o limite de idade marcado n´esse § unico do artigo l.º do decreto de 17 de julho de 1886, só poderá ser concedida aposentação quando, tendo as demais condições legaes d´ella, paguem, pelo menos, para a caixa de aposentações, quinze annuidades de 12 por cento sobre os seus vencimentos, devendo n´este caso a aposentação realisar-se passados seis mezes, durante os quaes continuarão a pagar a mesma quota.

Base 30.ª

O presidente da camara que assignar e o secretario que subscrever quaesquer ordens de pagamento passadas em contravenção do disposto no artigo 103.° do codigo administrativo de 4 de maio de 1896, serão solidariamente responsaveis pela restituição das quantias indevidamente pagas, e, no caso de reincidencia, incorrerão, alem da responsabilidade civil, nas multas impostas pelo artigo 409.° do mesmo codigo.

Base 31.ª

Os facultativos municipaes não poderão, sem licença da camara, sair para fóra do concelho, em cada mez, por mais de tres dias, seguidos ou intercalados, devendo em todo o caso participar a saída ao presidente da camara, e fazer-se substituir, quando haja um só facultativo, por outro approvado pela camara, havendo-o na localidade.

Base 32.ª

Continúa auctorisado o governo a collocar os empregados addidos nos logares dependentes das auctoridades, corpos e corporações administrativas, e a incumbil-os de qualquer commissão de serviço publico.

Base 33.ª

De todas as deliberações tomadas e assumptos discutidos pelos corpos e corporações administrativas em cada uma das suas sessões ordinarias ou extraordinarias fará immediatamente o secretario um resumo fiel, que deverá conter o proprio teor de qualquer d´essas deliberações quando algum dos vogaes assim o reclame, e que será, no fim da respectiva sessão, assignado e rubricado por todos os vogaes que a ella assistiram.

§ 1.° Se algum vogal deixar de assignar este resumo, o secretario declarará essa falta e o motivo d´ella, considerando-se valido o resumo sem essa assignatura ou assignaturas desde que esteja assignado ou rubricado pela maioria dos presentes.

§ 2.° Até á sessão seguinte deverá ser escripta e subscripta, ou sómente subscripta pelo secretario, em livro especial, com termos de abertura e encerramento, numerado e rubricado pelo presidente, uma acta em que circumstanciadamente se mencione, com a maior exactidão e clareza, tudo o que na sessão anterior se houver discutido e deliberado.

§ 3.° O vogal que não se conformar com alguma deliberação ou com a redacção da acta, póde assignar vencido, explicar resumidamente o seu voto no resumo, ou na acta da sessão, ou em seguida á sua assignatura, e reclamar contra a mesma deliberação ou contra outra qualquer em que não haja intervindo.

§ 4.° Emquanto não for lavrada e devidamente assignada a respectiva acta, poderão provar-se as deliberações pelo resumo d´ellas, e as certidões, tanto d´este resumo, como d´aquella acta, devem ser passadas, independentemente de despacho, pelo respectivo secretario, dentro de cinco dias depois de requeridas pelos interessados ou requisitadas pela auctoridade publica.

Base 34.ª

O imposto de prestação de trabalho poderá ser exigido pelas camaras municipaes até dois dias em cada anno, e pelas juntas de parochia até um dia, salvo o disposto no § 7.° do artigo 72,° do codigo administrativo.

Base 35.ª

São dispensados da hasta publica os contratos para obras de reparação em que forem interessadas as camaras municipaes, de valor não excedente a 100$000 réis.

Base 36.ª

No exercicio das suas attribuições contenciosas compete aos juizes de direito julgar.

Sobre reclamações relativas ás eleições das associações litterarias ou de instrucção e recreio, á admissão ou exclusão dos socios, e aos actos das respectivas direcções, que envolvam violação de lei ou regulamento de administração publica, dos seus estatutos, ou offensas de direitos.

Base 37.ª

É o governo auctorisado a rever e alterar o mappa das quotas com que as camaras municipaes têem de contribuir annualmente para o hospital real de S. José e annexos.

Palacio das côrtes, em 10 de março de 1899. = Luiz Fisher Berquó Poças Falcão, presidente - Frederico Alexandrino Garcia Ramires = Carlos Augusto Ferreira.

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76 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

O sr. Presidente: - Está em discussão.

(Pausa.)

Como ninguem se inscreve vae votar-se.

Foi approvado.

O sr. Presidente: - Vae ler-se, para entrar em discussão, outro projecto de lei.

Leu-se na mesa. É o seguinte:

PROJECTO DE LEI N.° 18

Senhores. - A vossa commissão estudou a proposta de lei n.° 13-M da iniciativa do illustre ministro da fazenda sr. Manuel Affonso de Espregueira e entende que é digna da vossa approvação.

Não envolve a sua materia grande e elevado alcance financeiro, mas prova o muito zêlo, escrupulo e intelligente actividade, com que o infatigavel ministro gere os negocios da sua pasta e procura por todos os modos desafogar o thesouro antes pelo recto e bem entendido aproveitamento dos actuaes recursos do que pelo aggravamento dos sacrificios existentes.

O artigo 1.° da proposta prende com a necessaria e indispensavel remodelação de serviços, imposta pela desapparição de algumas entidades e estações officiaes, que leis posteriores aos diplomas citados n´este artigo substituiram sem comtudo fixarem as respectivas competencias determinando por esse motivo a sua correlativa suspensão, em prejuizo dos direitos da fazenda nacional.

O assumpto do artigo 2.° da proposta tem por fim realisar parcial e successivamente operações financeiras, que devem influir no melhor regimen da divida publica; e a vossa commissão é de parecer que se dê a este artigo uma redacção tal que d'ahi não resulte prejuizo para os serviços actualmente dotados com o capital, a que elle se refere, e se consiga ao mesmo tempo o fim intentado pelo illustre proponente.

Em harmonia com estas ligeiras considerações, a vossa commissão de accordo com o governo, tem a honra de submetter ao vosso esclarecido juizo a mencionada proposta convertida no seguinte projecto de lei:

Artigo l.° É o governo auctorisado a reformar os serviços a que se referem os alvarás de 23 de maio de 1775 e 7 de março de 1791, decreto de 16 de janeiro de 1837, regulamento de 28 de junho de 1842 e portarias de 10 de novembro de 1845, 23 de março de 1853, 1 de outubro de 1860, 16 de setembro de 1862, harmonisando as percentagens e a fórma do processo com as disposições analogas do actual direito fiscal, civil e do processo determinando as competencias.

Art. 2.º Os pagamentos directos e inversão do preço da remissão de fóros ou da venda d´elles e de quaesquer bens e direitos pertencentes a conventos de religiosas supprimidos depois da lei de 4 de abril do 1861 e que actualmente se podem realisar em titulos de divida fundada interna, conforme permitte o regulamento de 25 de novembro de 1869, serão de futuro realisados em titulos de divida fundada externa amortisavel, devendo o producto da amortisação d´esses titulos ser convertido em outros de divida fundada externa, nos termos que forem determinados no regulamento.

§ unico. Não podem os fundos ou valores, a que se refere este artigo, ter applicação differente da que está designada na actual lei vigente.

Art. 3º. Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões, 3 de abril do 1893. = Frederico Ressano Garcia = Adriano Anthero = Francisco Felisberto Dias Costa = Henrique de Carvalho Kendall = Queirós Ribeiro = Marianno de Carvalho (vencido em parte) = Luis José Dias, relator.

N.º 13-M

Artigo 1.° É o governo auctorisado a reformar o serviço a que se referem os alvarás de 23 de maio de 1775 e 7 de março de 1791, decreto de 10 de janeiro de 1837, regulamento de 28 de junho de 1812, e portarias de 10 de novembro de 1845, 23 da março de 1853, 1 de outubro do 1860 e 17 de setembro da 1862, harmonisando as percentagens e a fórma de processo com as disposições analogas do actual direito fiscal, civil e do processo, e determinando as respectivas competencias.

Art. 2.° Os pagamentos directos e inversão do preço da remissão de fóros ou da venda d´elles e de quaesquer bens e direitos, que pertenceram a conventos de religiosas supprimidos depois da lei de 4 de abril de 1861, actualmente realisados em titulos de divida fundada interna, nos termos do regulamento de 25 de novembro de 1869 serão de futuro feitos em titulos de divida fundada externa amortisavel.

Art. 3.º Fica revogada a legislação contraria a esta.

Secretaria d´estado dos negocios da fazenda, aos 16 de março de 1899. = Manuel Affonso de Espregueira.

O sr. Presidente: - Está em discussão.

O sr. Cabral Moncada: - Não occupará por muito tempo a attenção da camara, com as considerações que vae fazer sobre o projecto; mas antes de entrar propriamente na sua discussão, quer fazer notar que o sr. relator, em vez de engrandecer a situação da fazenda publica, como geralmente se costuma fazer, limitou-se a reconhecer que este projecto está longe de representar uma medida de elevado alcance financeiro, e que apenas prova o muito zêlo, escrupulo e actividade com que o sr. ministro da fazenda se propõe occorrer ás necessidades do thesouro.

Ora, se esse escrupulo, zêlo e actividade não vae mais longo do que á apresentação de medidas d´esta natureza, é evidente que as condições do thesouro hão de continuar a ser as mesmas que têem sido até aqui.

O primeiro artigo do projecto tem, no seu entender, uma accentuada feição de inutilidade, e o segundo tem uma redacção manhosa.

Passando a justificar a apreciação que fez d´esses artigos, diz que o primeiro é uma inutilidade porque as corporações que por elle se dizem existentes, foram substituidas por outras; e o segundo é manhoso, porque, sob a apparencia de uma ingenua auctorisação para um fim innocente, o governo naturalmente usará d´ella para a realisação de outro pensamento que não é o que se encontra expresso no projecto.

Estas affirmações sustenta-as o orador com variadas considerações.

(O discurso será publicado na integra, quando o orador o restituir )

O sr. Luiz José Dias (relator): - Abstendo-se de responder ás considerações do orador que o precedeu, sobre a situação da fazenda publica, e a que o illustre deputado imprimiu uns laivos de politica partidaria, passa a responder precisamente ao que o s. exa. disse sobre os dois artigos do projecto em discussão.

Em relação ao artigo 1.° não está longe de concordar com s. exa. em que elle é realmente inutil; mas explica que elle figura no projecto por ter sido aconselhado por uma estação official que o governo sobre elle ouviu.

Quanto ao artigo 2 ° não lhe pareço que elle possa dar logar ás duvidas por s. exa. apontadas; porquanto no § unico do mesmo artigo claramente se preceitua que não podem os fundos ou valores, a que esse artigo se refere, ter applicação differente da que está designada na actual lei vigente.

Em resposta a um áparte feito pelo sr Luciano Monteiro, explica que a compra de bens nacionaes, como no artigo 2.º se preceitua, só poderá ser feita em titulos de divida fundada externa amortisavel.

(O discurso será publicado na integra quando o orador o restituir.}

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SESSÃO N.º 102 DE 4 DE JULHO DE 1899 77

O sr. Presidente: - Ámanhã ha sessão, devendo a primeira chamada fazer-se ás dez horas e meia da manhã.

A ordem do dia é a mesma que vinha para hoje, mais os projectos de lei n.º 51 e 33, começando-se a discussão pelo projecto de lei relativo ao caminho de ferro de Benguella.

Esta encerrada a sessão.

Eram duas horas e um quarto da tarde.

Documentos enviados para a mesa n´esta sessão

Representações

Das camaras municipaes de Cabeceiras de Basto e de Vieira, pedindo modificações na proposta de lei sobre a reforma eleitoral.

Apresentada pelo sr. deputado Guilherme de Abreu, enviada á commissão especial encarregada de dar parecer sobre a proposta de lei eleitoral.

Da camara municipal do concelho de Almeida, fazendo igual pedido.

Apresentada pelo sr. deputado Ferreira da Fonseca, e enviada á commissão especial encarregada de dar parecer sobre a proposta de lei eleitoral.

Justificações de faltas

Participo a v. exa. que o sr. deputado Avellar Machado faltou á sessão nocturna de hontem e á sessão de hoje por motivo de doença. = Simões Baião.

Para a secretaria.

O redactor = Sá Nogueira.

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