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N.º 18. Sessão de 27 de Maio. 1853

PRESIDENCIA DO SR. SILVA SANCHES.

Chamada. — Presentes 81 srs. deputados.

Abertura: — Ao meio dia e um quarto.

Acta; — Approvada.

CORRESPONDENCIA.

Declarações: — 1.ª Do sr. secretario Rebello de Carvalho, participando que o sr. Avila, por haver hoje conselho de estado administrativo, não pode comparecer na sessão ou virá mais tarde. — Inteirada.

2.ª Do sr Castro e Lemos, participando que o sr. D. Antonio José de Mello não póde comparecer, por continuar o seu incommodo de saude. — Inteirada.

3.ª Do sr. S. J. da Luz, participando que por motivo de molestia não póde comparecer á sessão de quarta-feira. — Inteirada.

Officios: — 1.º Do sr. Resende, participando que por motivo justificado não póde comparecer á sessão de hoje — Inteirada.

2.º Do sr. Silva Cordeiro, acompanhando uma certidão, pela qual mostra que o seu máo estado de saude não lhe permitte comparecer na camara — Inteirada.

Uma representação de 91 possuidores de papel moeda, pedindo que na presente sessão legislativa se tome alguma providencia que melhore a sorte dos requerentes. — Á commissão de fazenda.

Um officio de alguns signatarios da representação supra, enviando 150 exemplares impressos da mesma representação, afim de serem distribuidos pelos srs. deputados. — Mandaram-se distribuir.

Segundas leituras.

Requerimento: — Requeiro que se peça no governo que pelo ministerio da marinha envie com urgencia a esta camara uma nota dos navios da armada, que precisando fabrico para poderem saír a barra, o governo tenciona mandar fabricar até ao fim do anno economico de 1853 a 1854. Qual o minimo da despeza que lerá de fazer-se em cada um desses navios para os levar ao estado de poderem saír a liana, distinguindo o que pertence a material do que se refere a jornaes e mais despezas de pessoal.

Que igualmente se declare se até ao fim do anno economico de 1853 a 1851 alguns dos navios do estado que precisam o merecem concerto, para funccionarem como barcaças, receberão um tal fabrico.

No caso affirmativo que se declare qual o navio que tem de receber esse fabrico, e que despeza fará, tanto em material como em pessoal.

Quaes os navio que o governo se propõe mandar demolir, e quaes os que se destinam para serem vendidos até ao fim do mesmo anno economico. — Arrobas.

Foi remettido no governo.

O sr. -Darão de Almeirim; — Alando para a mesa o seguinte requerimento. (Leu)

Não sei se alguns destes documentos que eu peço, estão já na camara a pedido de algum sr. deputado,

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ou apresentados iniciativamente pelo governo; se estiverem basta que a requisição verse sobre os que faltam, que devem vir quanto antes, e a tempo de serem presentes á camara antes de entrar em discussão o contracto do caminho de ferro, pois que é para essa discussão que eu peço estes esclarecimentos.

Sr. presidente, na ultima sessão que estive presente, apresentou-se á camara um parecer da illustre commissão de fazenda indeferindo uma representação da camara municipal de Santarem, em que pedia que lhe fosse pago um credito que tem sobre o estado, allegando-se nesse parecer que não existiam os documentos necessarios e sufficientes para que a commissão podesse basear o seu parecer; por essa occasião declarei eu aqui, que esses documentos existiam desde o anno passado na secretaria desta casa, e aqui mesmo os apresentei. Peço por consequencia a v. ex. e á camara, que se envie novamente aquella representação á commissão de fazenda, juntamente com aquelles documentos, que existem na secretaria desta casa, para que a commissão, em presença delles, possa dar um outro parecer segundo intender que é de justiça.

Tambem desejo que v. ex.ª me dê a palavra logo que esteja presente o sr. ministro das obras publicas, porque desejo dirigir-lhe uma pequena pergunta ácerca de um negocio de utilidade publica em relação ao máo serviço, que estão fazendo os vapôres da companhia da navegação do Téjo, porque o serviço prestado pelos barcos desta companhia não póde ser peior (Apoiados) e intendo que para isto não se deve conceder privilegios exclusivos da fórma que foi concedida a esta companhia, que não preenche o fim para que foi estabelecida. Por consequencia peço a v. ex.ª que me conceda a palavra logo que esteja presente o sr. ministro das obras publicas, porque desejo dirigir-lhe uma pequena pergunta a este respeito.

O sr. Presidente: — Logo que esteja presente o sr. ministro, darei a palavra ao illustre deputado. Agora queira mandar para a mesa a nota dos documentos que deseja sejam mandados da secretaria para a commissão de fazenda com a representação da camara municipal de Santarem, a que o illustre deputado se referiu.

O sr. Barão de Almeirim: — Sim Senhor; eu vou escrevel-a, e depois a mandarei para a mesa.

O sr. Bicar: — Mando para a mesa o seguinte requerimento. (Leu)

Ficou sobre a mesa para ter amanhã o competente destino,

O sr. Casal Ribeiro: — Mando para a mesa a seguinte

Nota de interpellação: — Requeiro que seja avisado o sr. ministro do reino de que pretendo interpellar s. ex.ª sobre o procedimento havido com o sr. O. Fournier, em consequencia de uns artigos publicados no jornal = o Portuguez. = Casal Ribeiro.

Mandou-se fazer a communicação respectiva.

ORDEM DO DIA

Continuação da discussão na especialidade, do projecto n.º 32.

O sr. Presidente: — Na sessão de quarta-feira o ultimo que fallou, foi o sr. Avila contra, segue-se o sr. José Estevão a favor, que tem a palavra.

O sr. José Estevão: — Cedo da palavra.

O sr. Vasconcellos e Sá: — Sr. presidente, um deputado no regimen da carta, e que tem as campanhas da carta, não póde de fórma alguma deixar de querer a instituição do jury; mas tractando-se da applicação desta instituição a uma provincia ultramarina, intendo que senão póde approvar uma lei tal como esta está elaborada, que destroe no segundo artigo o que estatue no primeiro, e por isso votei por todos os adiamentos que se propuseram, e senti sobre tudo que não fosse approvado aquelle que tinha por fim que a commissão de legislação fosse ouvida a este respeito; e como todos os adiamentos foram rejeitados, votei contra o projecto na sua generalidade, assim como agora voto contra o artigo 1.º, e hei-de votar contra o 2.º, que repillo inutil, tanto mais quando no acto addicional tem o governo a faculdade necessaria para attender áquillo a que se propõe o artigo 2.º

Tendo pois pedido a palavra unicamente para declarar qual era o meu voto, tenho conseguido o meu fim, e se por ventura ácerca deste ponto se quer fazer alguma coisa a favor do ultramar, é revogar a lei que suspendeu o jury nas provincias ultramarinas. Não tenho mais nada que dizer.

O sr. Afonso Botelho: — Sr. presidente, tendo de votar sobre esta lei, desejo fazer conhecer o motivo do meu voto. Eu intendo que a India é uma parte integrante da monarchia portugueza; intendo que os nossos irmãos da India tem os mesmos direitos que todos os demais portuguezes. Eu desejava que todas as leis que tem de providenciar sobre as nossas colonias, antes de apparecerem na camara fossem primeiro meditadas pelo ministerio, e que só por via delle aqui viessem; (Apoiados) mas tendo-se apresentado um projecto de lei que vai bolir nos direitos de portuguezes, que eu julgo iguaes em direitos, porque todos os portuguezes o são, intendo que nós devemos sempre dar ás nossas possessões ultramarinas a mais larga, a mais expansiva idéa de consideração, estima, e decidido respeito, e de que não fazemos differença entre nenhum portuguez. (Apoiados.)

Intendo, que depois de ter apparecido na camara uma lei que toca com os direitos de portuguezes, não podemos deixar de a votar, para se não julgar que queremos fazer uma excepção, que eu intendo que se não póde nem deve fazer, para com os nossos irmãos da India. Elles têem direito ao jury, como o tem todos os demais portuguezes, quer do continente quer do ultramar.

A par da consideração geral de que a India é uma parte integrante da monarchia portugueza, vem outra que é — a grande distancia em que estão estes portuguezes, exige que as auctoridades que para ali vão exercer o governo supremo, tenham uma latitude de auctoridade maior do que por ventura é precisa ás que estão encarregadas de administrar os povos do continente.

É preciso tambem considerar que uma lei qualquer não póde ir para a India, e voltar com as considerações que ali se fizerem sobre a sua execução, sem se gastarem 3 mezes entre a ida e vinda, e assim não póde nunca fazer-se uma lei positiva para o ultramar, especialmente ácerca de certos pontos. Por tanto a auctoridade ali collocada deve ter sufficientes meios para evitar que. uma lei qualquer applicada ao ultramar produza prejuizos, em logar do

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beneficios, e por isso muito bem se andou neste projecto a respeito do que se determina no artigo 2.º delle, artigo pelo qual eu voto como pelo primeiro.

Por consequencia todas as razões que se têem opposto contra o projecto de lei que se discute, na minha opinião, fazem minto pouco peso.

Eu desejava que esta lei tivesse apparecido debaixo dos auspicios do governo; que se o governo o julgasse politico, a fizesse apparecer na camara; se o não julgasse, que evitasse que ella apparecesse, guardando para occasião opportuna a sua apresentação; uma vez porém que ella appareceu na camara, e que se discutiu no seio da representação nacional, é força vota-la. (Apoiados.)

Não acho que seja esta occasião propria para provocar a discussão sobre a utilidade ou inconveniencia do jury; não acho que esta seja a discussão de que nos devemos occupar. (Apoiados) O jury está reconhecido, está sanccionado na lei fundamental do estado e para todos os portuguezes; todos são iguaes em direitos, e todos devem gosar das vantagens desta benefica e util instituição.

O argumento que se fez da extensão desta instituição ás outras colonias, intendo que é um argumento inconveniente; porque os representantes dessas colonias ainda o não pediram; nem os povos ainda representaram a esse respeito.

Disse-se, que o segundo artigo annulla o primeiro: eu intendo que não; eu acho que este projecto foi concebido com muita delicadeza, que foi confeccionado com summa politica, e pela minha parte não posso senão louvar a commissão que o exarou. O projecto no artigo 2.º dá, na minha opinião, a força que a auctoridade local deve ter para evitar o mal, quando delle dimanasse mal; e não se diga que a auctorisamos para legislar: não, senhores; porque ella ha-de obrar dentro dos limites da lei: legislar, legislamos nós. Por consequencia, não intendo que seja bem definido esse argumento.

Eu não tenho a honra de conhecer pessoalmente o official que hoje está á lesta dos destinos da India; faço delle o melhor conceito, como um official, como homem probo, porque eu creio que, no caso contrario, nenhum governo sustentaria á testa de uma colonia tão importante pela sua situação geografica, pela sua extensão, e além disso pelas muitas recordações que hão de sempre honrar o nosso nome. (Muitos apoiados) Não creio que esse official deixe de ser uma pessoa capaz de executar a justiça com a imparcialidade que ella deve ser executada. Por tanto intendo que a lei preenche os dois fins — dar áquelles portuguezes, que são uma parte integrante da monarchia portugueza, e são todos portuguezes — assim os devemos considerar, estimar e amar, uma prova da justiça que lhe fazemos; e por outro lado o segundo artigo põe os limites, que a politica e a conveniencia mesmo daquelles povos exige, para a auctoridade estar collocada na situação do não poder dar um mal, quando nós não lemos outro desejo, senão o de lhe dar um bem. E esta a idéa que eu tenho formado da lei; e é esta a rasão porque tenciono votar a favor della (Apoiados).

O sr. Pinto Bastos (Eugenio): — Quando fallei pela primeira vez nesta questão, o illustre deputado que se seguiu, irritou-se, e disse que se admirava de que no seculo 19.º e no anno de 1853 um deputado da nação portugueza pozesse em duvida os principios que deviam estar no coração de todos os portuguezes: agora, que toca a occasião de responder, direi que não me irrito, mas que me admiro de que no mesmo seculo 19.º, e no anno da 1853, um deputado da nação portugueza dissesse, que se admirava de uma manifestação franca, e independente de opinião, que é garantida a todos os deputados pela carta constitucional.

Notou tambem o illustre deputado ter eu dicto, que os livros eram de papel, e que o papel consentia tudo o que se lhe queria escrever. Isto é uma verdade sediça, já sabida pelas velhas da minha terra: muitas das cousas que eu sei, devo-o ás velhas; com as moças é que eu faço pouca tenção de aprender.

Disse-se, que eu atacando os abusos dos jurados, e os abusos do parlamento, seguia-se que eu queria o absolutismo, Parece-me que este ataque não é permittido, porque não é permittido a nenhum sr. deputado alludir ás intenções de ninguem; mas já que se me fez esse ataque, do qual poderia muito bem deixar de defender-me, quero juslificar-me, e para isso preciso fazer as declarações seguintes: — Não sou empregado publico, nem aspiro a se-lo; antes com o meu trabalho sei grangear uma parca, mas independente sustentação, sem ser gravoso ao thesouro, antes para elle contribuo com alguma cousa; — não tenho ambição, nem aspiro á distincção, não tenho nem o habito do esporão; e como em Portugal tem havido uma tão abundante sementeira de graças, e mercês, é preciso ser muito descuidado para não ter apanhado alguma.

Eu não pertenço a partido nenhum politico, porque intendo (espero que os illustres deputados não se irritem com esta declaração) que os partidos em Portugal são grandes companhias de agiotas politicos: e eu não sou agiota politico, nem impolitico, e como homem livre não quero escravisar a minha consciencia e intelligencia ás conveniencias de qualquer partido. Demais eu saí deputado, sem saber como; nunca ambicionei ser deputado, visto que o cargo não dá gloria, nem porveito a quem usa delle, como deve usar; (Apoiados da direita) não dei o menor passo, nem ao menos contei com o meu voto, porque não tenho costume de votar em eleições politicas, porque, se até aqui acreditava pouco na efficacia dos meios parlamentares, hoje muito menos acredito, depois da declaração de um illustre deputado, que se senta no lado esquerdo, que disse — os abusos não se podem remediar, porque estão no coração do homem, e para os remediar era preciso que Deos reformasse o coração do homem.

Por eu atacar os abusos por ora invenciveis na instituição dos jurados, não se segue que não queira esta instituição, como ella deve ser, quando houver moralidade, e força publica para garantir a livre acção dos jurados; e, pelo exemplo que citei — de que apesar da luz do sol ser muito clara, e naquelle momento estar obscurecida pelas nuvens, não se segue que neguei a luz ao sol. O outro illustre deputado disse — que por haver abusos na instituição do jury, não se devia argumentar contra a instituição, mas sim procurar meios de melhorar e reformar esses abusos; e censurou-me por atacar o systema parlamentar com a censura dos abusos commettidos pelos parlamentos. Não intendo porém a logica do sr. deputado, porque

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se se pódem atacar os abusos do jury, mas respeitando a instituição, tambem pelo mesmo principio se podem atacar os abusos dos parlamentos, e respeitar a instituição.

Ouvi a outro illustre deputado, que a consciencia do jurado era um reverbero da divindade, verdade é que Deos quando creou o homem, inspirou-lhe no coração certos reflexos da divindade, que lhe devem servir como de bussola para elle dirigir as suas acções durante a sua vida; mas tambem é certo que o diabo anda sempre a empecer as obras de Deos; muitas vezes encaixa-se no coração do homem, e obriga-o a fazer o contrario daquillo que Deos lhe ordenou. Por consequencia eu não quero um juiz a decidir da minha fortuna, da minha honra, e da minha vida unicamente escudado na sua consciencia, porque eu não sei se elle tem o principio do bem, ou mal dentro da sua consciencia; temo muito as suas decisões, até mesmo porque não sei os recursos, que hei de interpôr contra as suas decisões, nem para que juizes hei de recorrer; e por esta razão é que acho providente as disposições da nossa legislação patria, que prohibem aos juizes de direito o julgarem pela sua consciencia, mas só e unicamente pela verdade sabida dos autos.

Se por eu prescindir por ora de algumas garantias da carta, como é a instituição do jury, pelos motivos que alleguei, é ser absolutista, tambem os que me tem combalido são absolutistas por terem prescindido das garantias, que pela carta pertencem ao poder legislativo, approvando os actos da dictadura.

Outro sr. deputado disse, que na actualidade, em que o systema constitucional está passando pelas maiores provações em outros paizes, é preciso ser muito parco em expressões contra o mesmo systema, para o não desvirtuar e desacreditar; porém não são as minhas expressões de censurar os abusos, mas sim os factos e abusos commettidos pelos que defendem o systema parlamentar, que o tem desacreditado e hão de continuar a desacreditar.

Tambem ouvi dizer que só por acinte é que sequer obstar á introducção do jury na India; mas eu intendo que sendo a instituição do jury um mal entre nós, acinte haverá em levar um mal reconhecido á India; e por isso confirmo o meu voto contra o artigo em discussão.

O sr Placido de Abreu — Sr. presidente, eu não tinha tenção de fallar nesta questão, por ser a pessoa menos competente para tractar, em todas as suas relações, as questões que dizem respeito aos jurados; mas tendo ouvido algumas proposições apresentadas pelo meu nobre amigo o sr. deputado Eugenio Ferreira Pinto Basto, não pude deixar de pedir a palavra, especialmente para arredar de cima da maioria desta camara a censura amarga que sobre ella lançou o illustre deputado, censura que não é merecida, por ser principalmente dirigida a pessoas que tem tido para com o illustre deputado toda a deferencia que elle merece. Eu intendi que não podia ficar silencioso depois que ouvi certas expressões ao illustre deputado; e antes de responder-lhe, seja-me permittido declarar qual é a minha opinião a respeito de uma questão que eu reputo importante, como é a do jury.

Parece-me que a instituição do jury não póde ser objecto de questão nesta camara; a questão versa unicamente sobre a applicação dessa instituição aos estados da India, e se a legislação sobre o jury deve ser modificada em ordem a que não soffra inconvenientes a sua execução alli. Ora a fallar a verdade esta questão não foi aqui apresentada sendo acompanhada de todos os dados e esclarecimentos, que eu repillo indispensaveis para bem se poder avaliar este negocio em todas as suas relações; e effectivamente a commissão apresentou um projecto sem ser estudado devidamente, sem o ter calculado em todas as suas circumstancias, e sem se ter sobre elle ouvido certas corporações. A commissão lançou, para assim dizer, o projecto na camara sem comtudo o ter meditado pausadamente; porque se o tivesse feito, de certo não teriam apparecido tantas questões de adiamento; e se a commissão tivesse pensado mais um pouco, se tivesse mesmo ouvido ácerca delle a commissão de legislação, estou convencido que o projecto não leria soffrido metade da discussão que tem soffrido. (Apoiados)

Agora quanto ao que disse o sr. Eugenio Ferreira Pinto, a respeito de não reputar honrosa a missão de representante do povo, responderei — que eu reputo que a missão mais honrosa que póde receber qualquer individuo, é a de representante do povo (Apoiados) e que a cada um que recebe tal missão, cumpre procurar desempenha-la o mais completamente possivel. (Apoiados) E se o illustre deputado não sollicitou, como disse, o ser deputado; se espontaneamente foi eleito pelos povos; se espontaneamente acceitou a procuração que elles lhe deram, tanto mais nobre e honrosa é esta circumstancia para o illustre deputado, e tanto mais obrigação tem de desempenhar cabalmente essa missão, e corresponder plenamente á confiança que os povos depositaram no illustre deputado. (Apoiados) Estou convencido de que o illustre deputado em desempenho dos deveres que lhe impõe essa procuração, em desempenho e obediencia ao juramento que prestou nesta casa á carta constitucional, não deixará de concorrer, para que daqui saiam leis justas e que promovam a felicidade dos povos. (Apoiados) Espero tambem que o illustre deputado reconhecerá que não tem sufficiente motivo para dizer, que não confia muito nos meios parlamentares. E por esta occasião direi que a efficacia e bondade de um ou de outro parlamento não está na quantidade das leis que faz; está na qualidade e bondade dessas leis. Um parlamento póde ter feito poucas leis, mas todas em vantagem, utilidade, e beneficio do paiz; f Apoiados) e aquellas que as necessidades publicas exigem. (Apoiados)

Agora a respeito do que o illustre deputado disse de que mais absolutistas eram aquelles que votaram as leis da dictadura, por isso que as approvaram, direi a s. ex.ª que isto é uma censura que não mereço, nem merece nenhum dos deputados que votaram os actos da dictadura (Apoiados) Eu votei pelos actos da dictadura, e tenho muita honra em o ler feito; (Apoiados) se se derem as mesmas circumstancias, hei-de votar ainda por outros actos de dictadura; terei muita honra nisso, e não se me póde por isso chamar absolutista. (Apoiados)

Eu levantei-me para dar estas pequenas explicações e ao mesmo tempo para dizer que voto pelo artigo 1.º, isto é, voto o principio da instituição do jurado applicado a India, mas intendo que elle deve ser submeti ido ás circumstancias locaes, a fim de que esta instituição em logar de produzir um bem aos povos, não produza um mal. (Apoiados)

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O sr. Presidente: — Tem a palavra o sr. Tavares de Macedo.

O sr. Tavares de Macedo: — Parece-me que a materia está sufficientemente discutida, e por isso por minha parte cedo da palavra (Muitos apoiados).

O sr. Presidente: — Está concluida a discussão por não haver ninguem mais inscripto. O unico que estava inscripto era o sr. Castello Branco, mas como não está presente, vai propôr-se á votação o artigo 1.º

O sr. Santos Monteiro (Sobre a ordem): — Sr. presidente, eu mandei para a meza uma emenda, e não posso votar senão em conformidade della.

O sr. Presidente: — Tem razão, mas como e para se tornar applicavel a disposição do artigo a todas as provincias ultramarinas, vou primeiramente consultar a camara sobre a materia principal.

Procedendo-se á votação foi approvado o artigo 1.º, sendo successivamente rejeitadas as emendas dos srs. Themudo, e Maia (Francisco) assim como o additamento do sr. Santos Monteiro.

O sr. Cardoso Castello-Branco (Sobre a ardem) — Sr. presidente, eu não estava presente ainda agora, porque estava na commissão de legislação: e tinha pedido a palavra, porque tencionava offerecer uma substituição ao § unico, que não póde passar como está redigido, e vou mandar para a meza uma nova redacção.

O sr. Presidente: — Perdoe o nobre deputado — para isso é preciso consultar a camara.

A camara consentiu que o sr. deputado apresentasse a substituição indicada.

O sr. Cardozo Castello Branco: — Limito-me a mandar para a mesa a seguinte

Substituição: — Exceptuam-se os processos que devam ser julgados no territorio das Novas Conquistas, segundo seus usos e costumes. — Cardozo Castello Branco.

O sr. Jeremias Mascarenhas — A commissão acceita a redacção do sr. Castello Branco, porque a mente da commissão era o mesmo pensamento que o desta proposta.

Não havendo quem pedisse a palavra, foi approvada a substituição ao § unico do artigo 1.º do projecto, offerecida pelo sr. Cardozo Castello Branco.

Entrou em discussão o artigo 2.º do projecto.

O sr. Alves Martins (Sobre a ordem). — Sr. presidente, vou mandar para a mesa uma emenda a esse artigo, e depois peço a palavra sobre a materia.

Emenda: — Fica o governo auctorisado, ouvindo o conselho ultramarino, a regular o cumprimento e execução da presente lei, segundo exigirem as circumstancias especiaes em que se acham aquelles povos, dando depois conta ás córtes. — Alves Martins.

Foi admittida, e ficou tambem em discussão.

O sr. Santos Monteiro: — Sr. presidente, eu pedi a palavra sobre a ordem, para apresentar um novo artigo ao projecto. Eu creio que a minha emenda foi rejeitada unicamente (ao menos quero-me capacitar disso) porque comprehendia a Occeania, porque é impossivel que se repute mais illustração nas tres comarcas das ilhas de Doa, do que em Macáo. Até nem Macáo quizeram comprehender para ter jury! Tambem ainda ha pouco tempo uma lei da dictadura propunha, o nós approvámos, o estabelecimento d'uma relação em Angola, e não se quer lá o jurado! Pois eu quero-o em toda a parte, onde fôr possivel estabelece-lo, porque nesta lei que estamos fazendo, está o correctivo para a propria India, quando offereça algum inconveniente a sua execução. E não sei como nesta camara se pugne pelos principios para se applicar o jury á India, e apresentando-se uma substituição tão ampla, como aquella que eu apresentei,»e não quizesse votar por ella.

Alando pois para a mesa um additamento ao projecto que é um artigo addicional, concebido nos seguintes termos:

ADDiTAMENTO: — As leis e mais disposições vigentes no reino, relativas á instituição do jury, são igualmente applicaveis a Macáo, Moçambique, Cabo-Verde, Angola, S. Thomé e Principe. — Santos Monteiro.

Foi admittido.

O sr. Presidente. — Isto é um artigo addicional, que prende com o artigo 1.º, por isso fica em discussão com preterencia ao artigo 2.º do projecto.

O sr. Alves Martins: — Sr. presidente, eu queria unicamente pedir uma explicação á mesa, porque não comprehendo o estado da questão.

O sr. Presidente. — O estado da questão, se os srs. deputados querem que lhes falle com franqueza, é reproduzir a questão sobre que a camara acabou de votar: essa o que é a materia do artigo addicional; mas como tem connexão com o artigo 1.º do projecto, por isso declarei que ficava em discussão antes do artigo 2.º

O sr. Alves Martins: — Sr. presidente, eu não combino em que a discussão deste artigo addicional seja a reproducção da materia que já se votou, porque o que se rejeitou, foi uma proposta que estendia o jury a todas as nossas possessões ultramarinas, sem excepção nenhuma; agora faz-se uma excepção, porque se determinam os pontos em que se quer applicar o jury, e não se applica a outros em que o artigo não falla.

Por consequencia parece-me que é uma cousa diversa, e que a camara admittindo este artigo da proposta do sr. Monteiro á discussão, não está em contradicção.

O sr. Pegado: — Vou dar á camara uma explicação, na qual ec comprehende tambem a minha opinião.

Na commissão ponderou-se que a instituição dos jurados se devia tambem applicar a Macáo, pois de certo se acha este ponto da monarchia em melhores circumstancias do que muitas outras das nossas possessões. Mas eu reflecti que, como filosofo, seguia a opinião de que — leis quantas menos melhor — se a camara approvasse para Gôa esta instituição, os meus patricios macaistas a pediriam tambem, e neste caso eu ou o governo a proporia ao parlamento. Devo tambem accrescentar que na commissão tambem disse que o magistrado de Macáo havia remettido ao ministerio da marinha um plano de modificações da legislação portugueza para aquelle estabelecimento. Este plano será certamente remettido ao conselho ultramarino, e ahi examinando attentamente, de modo que quando chegar ao parlamento já virá com todos os esclarecimentos e estudo.

Aproveito esta occasião para louvar o zelo daquelle magistrado: bem como felicito a minha patria de possuir neste momento um bom ministro e um bom governador; porque nem sempre a metropoli envia ião bons presentes aos nossos co-irmãos.

Alas tractando-se agora unicamente de pronunciar

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se Macáo está em circumstancias pela sua illustração de admittir aquella instituição, não posso deixar de affirmar que sim; e por consequencia Macau póde tambem incluir-se no projecto.

O sr. Jeremias Mascarenhas: — Por parte da commissão declaro que ella adopta o artigo addicional na parte em que applica a instituição do jury a Macáo.

O sr. Maia (Francisco) (Sobre a ordem e sobre a materia): — Eu rejeito inteiramente os principios que apresenta o sr. deputado pela India sobre direitos de commissões. A camara está discutindo, e ainda não mandou remetter o artigo addicional á commissão do ultramar; se o mandasse remetter a essa commissão, ella leria de interpor o seu parecer; mas por ora o artigo está submettido sómente á consideração da camara. Não estendamos tanto Os poderes das commissões, que nos podem invadir o poder da camara! A camara esta deliberando, e admittiu á discussão o artigo addicional, logo não precisa da annuencia de ninguem, não precisa senão da sua votação pela maioria. Por isso não concordo na necessidade da declaração que acaba de fazer o sr. deputado.

Mas ainda bem que a commissão do ultramar que queria fazer um exclusivo sobre um certo e determinado terreno, quanto á applicação do jury, adoptou que fosse estendida esta bella disposição a outras provincias! Ainda bem que apezar da camara, cujas decisões eu respeito, votar que não se revogasse o artigo de uma lei que atacava directamente a instituição do jury, admittiu á discussão a proposta do meu collega o sr. Santos Monteiro, para se estender o beneficio do jury a mais algumas possessões ultramarinas! As nossas provincias do ultramar são hoje equiparadas ao reino de Portugal, fazem parte da monarchia, e toda a idéa de colonias desappareceu; e desapparecendo a idéa de colonias, resta só vêr se aquelles estados estão em circumstancias de receber esta bella instituição, e eu que os amo mais que os senhores que se teem apresentado como seus mais estrenuos defensores, estimo muito que o meu collega propuzesse que se estabelecesse o jurado ião extensamente, isto é, nas provincias que menciona. Eu intendo que a instituição do jury deve ser applicada a todas aquellas provincias do ultramar que estiverem em estado de a receber.

Em quanto a Macáo parece-me que a camara está disposta a applicar-lhe a instituição do jury, e por isso nada direi em defeza da applicação a esse ponto; mas direi a respeito de Angola. A cidade de Loanda está crescendo successivamente em população; existem lá juizes, e vai estabelecer-se uma relação: ora na verdade parece-me que haveria uma grande inconsequencia na camara se não approvasse o jury para essa provincia, depois de haver lá juizes de direito e de se ter decretado para lá um tribunal de segunda instancia. Por conseguinte eu insistirei em que se estabeleça o jury tambem em Angola, onde fôr a séde da relação.

Em Cabo-Verde tambem me parecia que se podia estabeler o jury; porque o commercio alli vai sempre augmentando, assim como a população; mas não tenho as informações necessarias, assim como as não tenho a respeito das outras possessões a que o artigo addicional se refere; comtudo parecia-me que se remediava tudo, se depois de se designar no artigo addicional Macáo e Angola, se dissesse que o governo ficava auctorisado a estabelecer o jury tambem nas outras provincias mencionadas no artigo, logo que reconhecesse que estavam em circumstancias de o poderem ler; isto é em tendo o numero sufficiente de pessoas para que a instituição do jurado seja tal, por que os jurados não hão de ser só 10, 12, ou 20 homens, isso era uma commissão permanente, não era jury. Deos nos livre disso! Para se estabelecer o jury ha de haver o numero sufficiente de pessoas com as qualidades necessarias, como a lei exige. E nesta conformidade que eu voto, e que mando para a mesa a seguinte:

Emenda. — Que se estendam desde já as disposições do artigo 1.º a Macáo e Angola; e que para os outros pontos, marcados no artigo addicional, fique o governo auctorisado para as fazer extensivas a esses pontos. = Maia (Francisco)

Foi admittida, e ficou tambem em discussão. O sr. Alva Martins: — Eu coherente com a minha primeira votação, approvo o pensamento do artigo, porque desejo que a instituição do jury se estabeleça em toda a parte onde seja possivel; mas estando as nossas possessões ultramarinas tão distantes de nós, não se podendo fazer verdadeira idéa do seu estado real, sómente pelas estatisticas, e sendo o governo quem está mais nas circumstancias de ajuizar, pelas constantes informações que tem, do verdadeiro estado da civilisação dessas possessões, não ha perigo nenhum em se votar o artigo addicional, applicando o principio desde já a Gôa e a Macao, e dando auctorisação ao governo para o applicar nos outros pontos, se o intender conveniente. Por consequencia admitindo-se a boa fé da parte das auctoridades, e do conselho ultramarino, que é o centro donde partem todas as informações das provincias ultramarinas, não ha inconveniente em se votar o principio que se adoptou para a India. Por agora não tenho mais nada que dizer.

O sr. José Estevão: — Tenho sentimento de não poder concordar com as idéas que apresentou o sr. Alves Martins. Eu intendo que se deve designar nesta lei a parte da monarchia portugueza a que se deve applicar a instituição do jury com as modificações, que as auctoridades locaes julgarem convenientes, em conformidade com o acto addicional. Eu creio que, se nós estendermos as disposições desta lei amais algum, is partes da monarchia sem serem aquellas para as quaes nós já reconhecemos, que ha as condições precisas para receber esta instituição, reduz-se a lei a uma simples protestação de principios, e o governo póde tomar esta votação da camara, como um simples desejo, ficando comtudo ao seu arbitrio executar ou não a lei.

Eu não me julgo habilitado para decidir desde já, se ha conveniencia em applicar a instituição do jury a todas as nossas possessões, a que se refere o artigo addicional, que se propoz. A respeito de Macáo declaro que voto desassombradamente para que a instituição do jury lhe seja applicavel, por que além das informações, que acabou de dar o sr. deputado Pegado, sei qual é o seu estado de adiantamento, e que talvez esteja mais adiantado do que muitas cidades do continente. Sei mesmo que Macáo protestou sempre contra a annullação das leis liberaes que lhe foram usurpadas por effeito de certo principio de reacção, que as restringiu em Portugal. A reacção lá foi arbitraria, porém Macáo protestou sempre contra esse arbitrio.

Portanto a respeito de Macáo não tenho duvida

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alguma, em que lhe seja applicavel a instituição do jury, porque lemos as informações que o illustre deputado acabou de apresentar, e por consequencia do conselho ultramarino, porque o nobre deputado, por si mesmo, elle é o conselho, a sua capacidade suppre a organisação collectiva do conselho. A respeito da india temos já milhares de informações, lauto do governador da india, como do secretario geral, ambos membros desta camara, assim como tambem das differentes auctoridades. Agora quanto ás outras possessões não posso votar desde já que lhe seja applicavel a instituição do jury, porque ha falla de informações; e mesmo porque e preciso não deixar de observar que não se prejudique nesta questão a doutrina com a applicação della: porque quando nós dizemos — applique-se o jury á India — dizem do lado direito — o jury é pessimo; tem grandes inconvenientes: é preciso ir pausadamente. — Porém todas estas maldades, todas estas más qualidades dessapparecem uma vez que o jury se applique a toda a parte! De maneira que a maldade do jury apparece absolutamente, quando se refere a uma certa parte da monarchia; porém o jury toma todas as virtudes quando se applique a toda a parte! Portanto eu voto pela applicação do jury para Macáo e Gôa, e o resto voto contra a applicação delle. Note-se bem não voto contra o principio, porque aqui não se esta fazendo ostentação de principios; aqui, o que se está fazendo, é uma lei practica, é a applicação de uma lei aonde for possivel; e eu não sei que a lei que estamos fazendo, só possa ter applicação passados 2 annos, pelo contrario estou certo que ha de ter applicação o mais breve possivel.

O sr. Santos Monteiro — Eu estava capacitado que quando apresentei a substituição ao artigo 1.º, se em logar de lhe ter chamado substituição lhe chamasse emenda, e por consequencia tivesse sido votada em primeiro logar, ella teria sido approvada por acclamação de toda a camara, porque nella estava sanccionado um principio em conformidade com a caria, e por isso não poderia ter sido rejeitada. Mas não aconteceu assim, contra a minha espectativa; e então sem querer invalidar a resolução da camara, intendi dever dar uma nova fórma á minha substituição, comprehendendo possessões nas quaes eu intendo que ha tanta illustração, pelo menos relativamente, como ha na India.

Eu desejo que uma lei saida desta camara não ataque um principio, que eu repillo ser um dos melhores do systema tepieseiitativo, qual é a instituição do jury (Apoiados) instituição que já vi atacarem um das sessões passadas por um facto que não prova absolutamente nada. Atacou-se a instituição pelo facto de não ter nunca tornado a ser empregado o jury nas causas civeis, depois que uma lei permittiu que se podesse optar entre ser ou não applicado o jury a essas causas. Eu digo que esse facto provava contra o jury, se a lei tornasse dependente do accordo de ambas as partes, a interferencia ou não interferencia do jury; porque segundo essa lei para não haver a interferencia do jury nas causas civeis, basta que uma das partes não queira o jury; isto foi o mesmo que determinar que o jury não se applicasse lis causas civeis (Apoiados) por que entre dois contendores sempre um quer uma cousa, e o outro quer outra. Portanto se fosse necessaria a concordancia das duas partes, intendo que este argumento provava contra a instituição; mas como basta só o velo de uma das partes, intendo que este argumento nada prova, e até me parece que ha causas civeis de certa natureza, que talvez nunca possam ser bem julgadas, sem a intervenção do jury.

Eu declaro que sou amante da instituição do jury, e desejo leval-a até onde ella puder ir; o sr. Pegado já declarou que em Macao é possivel haver jurados, e ate disse uma verdade que todos nós sabemos, o de cuja verdade nem mesmo o sr. Jeremias se hade offender, e é que Macáo é comparativamente muito mais illustrada que os estados da India.

Ora eu chamarei a attenção dos meus collegas para uns factos muito recente, que não devem esquecer, são certos acontecimentos que tiveram logar em Angola, havendo deportações por arbitrio dos juizes. Creio que aqui mesmo já ouvi accusar acontecimentos que de certo não teriam logar, se la houvesse nas causas crimes a intervenção do jurado. Conheço o homem deportado de Angola, o foi uma grandissima atrocidade que se lhe fez; e Francisco Joaquim Duarte da Costa, mandado por ordem do juiz para o interior. (O sr. Simão José da Luz — Está enganado) Em Angola, como eu disse: ha pouco, acaba agora mesmo de ser estabelecido um tribunal de segunda instancia. Tal é a importancia daquella provincia! Ora se uma provincia é ião importante que se estabelece para ella um tribunal de segunda instancia, parece-me que deve gozar de todos Os fóros de que goza o resto da monarchia.

Mas eu propondo a primeira substituição e esta, e intendi sempre que não passaria o artigo 2.º do projecto, mas que seria proposto e approvado pela camara um artigo que auctorisasse o governo para executar a lei naquellas panes da monarchia, onde não houvesse inconvenientes na sua execução.

Aqui já se nos ameaçou n'uma das sessões passadas com a separação dos estados da India, se não tivessem jurados. E o que dirão os povos das outras possessões, quando agora um acto do parlamento fôr estabelecer uma excepção desfavoravel para ella! Não se lhes applicar a lei, porque o governo em consequencia das informações que tiver. conhece que não é la applicavel, vá; mas ser o proprio parlamento quem não quer applicar o principio constitucional a uma parte da monarchia, eu pela minha parte não quero partilhar dessa responsabilidade.

Por consequencia sustento o principio de que se tracta, e sustento o principio porque sou amigo da instituição; os senhores que o combatem, fique-lhes a gloriada sua opposição; para mim não quero essa gloria.

O sr. Cunha Sotto-Maior: — Sr. presidente, esta discussão vai correndo de uma maneira que eu não esperava. Pediu-se o jury para a India, e depois de concedido, da parte de muitos que o pediram accusam-se, e invectivam-se aquelles que exigem que esse principio se estenda a outros pontos do ultramar, dizendo-se que querem fazer ostentação de principios! Invoca-se o direito commum, o artigo da carta, as doutrinas, os arestos, os precedentes, tudo isto para a India; e quando um deputado se levanta, e propõe que se estenda o mesmo principio a outras colonia, diz-se que está a fazer o-lenlação de principios! Maravilha-me muito similhante procedimento.

Eu votei contra o artigo 1.º que tracta da instituição do jury applicada á India; mas desde que a ca-

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India reconheceu a efficacia deste principio, ella não póde, sem uma grande aberração dos fundamentos que leve em vista para o votar, excluir as outras colonias da participação delle.

A camara approvou o jury para a India. E por que? — Diz-se — porque foi amplamente esclarecida sobre a utilidade dessa decisão. Mas por quem foi a camara amplamente esclarecida? Quaes foram os esclarecimentos que appareceram? Quem os deu? Quem é que dá noticia delles? Foi amplamente esclarecida por que fallou o sr. Pestana, e o sr. Custodio Manoel Gomes? Parece-me muito que uma camara, para dar uma decisão, se mova simplesmente pelas opiniões de dois srs. deputados. SS. ex.ªs podem ter opiniões, mas as suas opiniões não estabelecem doutrinas. Podiam comtudo ss, ex. dar esclarecimentos; mas quaes foram os esclarecimentos que deram esses srs. deputados? Li com anciedade os seus discursos, e não vi la. esclarecimentos nenhuns; não vi lá dados estatisticos alguns.

Sr. presidente, o sr. deputado Jeremias está no Pantheon; (Riso) está divinisado; ganhou uma popularidade espantosa! E apezar da muita estima e consideração que tenho pelo illustre deputado, nunca esperai que s. s.ª fosse elevado a tão altos destinos! (Riso) Porque realmente o illustre deputado é o mentor o regulador de toda esta questão politica. Mas se ao sr. Jeremias compete a sua iniciativa (orno de pulado, a camara não póde recusar igual iniciativa ao sr. Santos Monteiro. e ao sr. Pegado. A camara depois de reconhecer o principio benefico do jury para a India, ha de recusa-lo para Macáo, para Angola, para Moçambique, e outras provincias? Com que razão?

Eu votei, torno a dizer, contra a transplantação do jury para a India;, mas como desgraçadamente tenho de me sujeitar ás decisões da maioria, e como a maioria reconheceu o principio, uno-me ao sr. Santos Monteiro, e ao sr. Pegado, e peço a applicação do principio tanto para Macáo, que tem muito mais illustração que a India, como para as outras colonias.

A respeito da maior illustração de Macáo relativamente á do estado da India, não é necessario dados officiaes para se conhecer; conhece-se pela illustração com que procede o seu senado, o seu governador, e as outras auctoridades. Todas as correspondencias estão fazendo elogios, e até os jornaes inglezes, á maneira como está sendo governada aquella cidade; e conhece-se tambem por outras circumstancias. E claro que Macáo (em superioridade de intelligencia comparada com os estados da India.

Por tanto se a camara admittiu o jury para a India, admitta-o igualmente para as outras colonias, e por consequencia approve o additamento do sr. Santos Monteiro. Alas como a questão não póde continuar sem estar presente o ministerio, por isso que tomou uma face nova, em consequencia de terem usado da sua iniciativa com o additamento dois srs. deputados, o sr. Santos Monteiro, e o sr. Pegado, o primeiro apresentando-o, e o segundo apoiando-o quanto á sua provincia, vou mandar para a mesa unia proposta de adiamento, para que cesse esta discussão ale estar presente o sr. ministro da matinha.

O sr. Jeremias Mascarenhas: — Sr. presidente, tinha feito tenção de não tomar parte na discussão para a não demorar mais; porque infelizmente tenho visto que se tem feito, o que se não tem practicado

em objectos de maior transcendencia, e mesmo naquelles que excitam as paixões dos partidos: tenho visto adiamentos, additamentos e substituições, que maravilham, e que tem o cunho da novidade nesta camara! Não entrarei na materia, porque já se esgotou tudo quanto se podia dizer; e o que se tem feito, é repelir sempre o mesmo, que sobejamente já está respondido.

Sr. presidente, quanto a Macáo, a commissão do ultramar, pelos conhecimentos de cada um de seus membros, e especialmente pelas informações dos seus dignos membros, o sr. Adrião Acacio, que foi governador daquelle estabelecimento, e o sr. Cabreira que tambem lá esteve, tinha incluido o estabelecimento de Macao, para se lhe restituir o jury, assim como ás 3 comarcas dos estados de Gôa; mas viu-se obrigada a riscar do projecto aquella localidade, porque o sr. Pegado, membro da commissão, e deputado por Macáo, intendeu não ser por ora conveniente o estabelecimento ali do jury, por não o lerem pedido os seus representantes; e isto acaba de ser confirmado pela sua declaração, que acaba de fazer; e consentindo o sr. deputado na applicação do jury para o estabelecimento de Macáo, que tão dignamente representa, a commissão sem a menor duvida, e com muito prazer adopta a parte do artigo addicional, que diz respeito a Macáo.

Sr. presidente, a commissão não tem informações circunstanciadas e sufficientes relativamente ás provincias de Africa; antes, pelas informações geraes, não se considerou habilitada para extender ás mesmas possessões o jury; e seria uma temeridade da commissão propo-lo, sem dados positivos, iguaes aos que tinha relativamente as 3 comarcas de Gôa, e a Macáo. A commissão sobre tudo discorda positivamente da parte do artigo addicional, que respeita a Angola, porque leiu informações de que faltam ali as elementos necessarios para se pôr em execução o julgamento pelo jury; e estes esclarecimentos são dados pelo sr. Adrião Acacio, que ha pouco tempo acabou de governar aquella provincia; e ainda ha um momento um dos srs. deputados por Angola pediu que a commissão não concordasse em fazer o jury extensivo áquella provincia.

Em quanto á = outras provincias a commissão não emittia a sua opinião, isto é, nem acceitará, nem se opporá á sua doutrina.

Sr. presidente, admiro-me muito de que o sr. Maia, depois de ter rejeitado o projecto na generalidade, lenha apresentado substituições, estendendo a applicação do jury a todas as provincias ultramarinas; e admiro-me tanto mais, porque me parece, que, se sinceramente deseja esta ampliação, devia ter primeiramente approvado o pensamento do projecto na generalidade, e depois toma-lo extensivo a todas as provincias; mas rejeitar primeiramente o principio, e depois amplia-lo, não comprehendo, nem posso comprehender!

O sr. Santos Monteiro, depois da camara rejeitar a sua substituição, apresentou o artigo addicional. Eu não devasso as intenções de ninguem, até porque é prohibido pelo regimento; mas attendendo só ás palavras, e á marcha que tem seguido esta discussão, e a tantos adiamentos, substituições, e additamentos, parece que o que se pretende, é levar a camara a votar a applicação do jury para todas as provincias ultramarinas, para se encontrar na sua execução al-

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gum inconveniente, e para assim se justificarem os receios, que tem mostrado os que combatem o projecto, relativamente ás 3 comarcas de Gôa. Eu não affirmo que esta sejam as intenções do sr. deputado; mas não tenho a superior intelligencia, para me convencer de que não obstante o que vejo, outro é o fim de tanta estrategia, ou ao menos quer-se que a camara seja considerada menos liberal. (O sr. Pinto de Almeida: — Tem razão.)

Sr. presidente, o sr. Cunha mostrou se admirado pela celebridade que eu tenho tido nela discussão; pelo credito e consideração que mereci a camara, a ponto de dispor e dirigir a maioria. Pois eu admiro-me de ouvir isto ao sr. deputado; porque eu nem disponho, nem dirijo a maioria. Tanta gloria não me pertence, nem em minha humildade, nunca aspirei n ella; mas se a camara me deu alguma attenção; se tomou em consideração as minhas razões, isto e devido á benevolencia da camara e á sua illustração; porque por ventura intendeu que neste objecto mereciam alguma attenção as minhas informações, como conhecedor do paiz que represento. Donde virá pois este ciume, se o ha? Será da camara não se entregar á direcção do sr. Cunha? Será porque ella não acolhe com enthusiasmo tanto quanto o illustre deputado diz, porque lhe não levanta arcos triunfaes; porque o não leva em ovação? Mas eu não sou culpado disto: não tenho concorrido para não haverem estes triunfos para o sr. Cunha, porque se de mim dependessem, victoriava-o, dava-lhe toda a influencia, e memo divinisava-o, ou o erigia em idolo.

Accrecentou ainda o sr. Cunha que a respeito da India não houve mais informação alguma além das palavras dos srs. Pestana, e Gomes; mas o illustre deputado está muito enganado, porque além das informações muito valiosas destes 2 cavalheiros, que foram delegados do governo, apresentaram-se provas sobejas para mostrar — que em Gôa ha elementos necessarios para a organisação do jury, tirados dos dados estatisticos e documentos officiaes.

Por agora não digo mais. A camara vote como julgar justo e aceitado.

O sr. Presidente: — Vai ler-se a proposta de adiamento mandada para a mesa pelo sr. Cunha. E a seguinte

Proposta: — « (Proponho o adiamento do projecto, e artigos addicionaes até estar presente o sr. ministro da marinha. — Cunha Sotto-Maior.

Sendo apoiado, foi logo rejeitado sem discussão.

O sr. Santos Monteiro: — Esperava não ter de entrar nesta questão outra vez, mas não posso deixar de tomar a palavra depois do que acabou de dizer o sr. Jeremias, que não sei nem se é ministerio, nem se é chefe de maioria, nem se está munido de poderes plenos da commissão do ultramar, para decidir, sem ouvir os membros da mesma, se acceita ou não acceita qualquer proposta; nem creio que aqui haja nada a acceitar ou deixar de acceitar; creio que não ha tractado nenhum entre o sr. Jeremias e a camara, ou entre a commissão e a camara. A commissão apresenta um parecer, ha-de sujeitar-se aos resultados da votação, e não tem que declarar se acceita ou não acceita qualquer emenda ou substituição; ainda que a commissão já faz favor em consentir que em Macáo haja jury; já é muito!.. (O sr. José Estevão — Não é) Então é pouco?

Mas o que ha aqui de extraordinario, e que tambem não posso admittir de mancha nenhuma, e que se devassem as intenções de quem faz propostas, por que é justamente o que o sr. Jeremias acabou de fazer, dizendo que não queria entrar nas minhas intenções; mas effectivamente entrou muito nellas, porque não teve duvida de dizer, que eu apresentava uma proposta para desacreditar a camara! Eu tenho mais obrigação de zelar o credito da camara do que o illustre deputado, porque eu sou membro da maioria, e até agora tenho sempre votado com a maioria em todas as questões importantes; e o illustre deputado que provavelmente intende bem a lingoa portugueza, havia de intender o que eu claramente disse, isto é, que eu apresentando a primeira substituição e agora esta, era na idéa de que haveria um artigo subsequente, para que a applicação do principio, que se estabelece no projecto, tivesse só logar onde fosse possivel. Já sabemos, e não o nego, que é applicavel á India, e que é ainda mais bem applicavel a Macáo, e estou persuadido que tambem é applicavel desde já a Alacáo: não digo que o seja da mesma maneira a outras possessões, mas o que me parece muito mal é, que tractando-se da applicação de um principio constitucional, se esteja aqui regateando esse principio contra umas partes da monarchia, e a favor de outras.

O meu amigo o sr. Maia não precisa sei defendido; mas como eu estou de pé, e estou muito certo, que se se me tivesse feito uma offensa igual á que acaba de ser feita ao illustre deputado, s. ex.ª tomaria a minha defeza; eu tomo a delle.

O sr. Jeremias tem prestado muito pouco attenção a tudo quanto se tem passado nesta discussão, aliás não offenderia o meu amigo da maneira por que o offendeu. É preciso notar que o sr. Maia votou contra a generalidade do projecto muito bem, porque autos dessa votação apresentou uma substituição, que elle intendeu, e que eu intendo rigorosamente constitucional, que era a revogação do artigo respectivo do decreto de 16 de janeiro de 1837, e quem apresenta essa substituição. não admira que votasse contra a generalidade do projecto n.º 32, que é o contrario da proposta do sr. Maia, porque o projecto n.º 32 ao mesmo tempo que invoca um artigo da carta, para poder ser sustentavel, destroe ou põe de lado outro artigo da carta, que diz — que a lei seja igual para todos — pois que o projecto n.º 32 restringe esta igualdade de direitos, os quaes só quer conceder ás illustradas comarcas de Salcele e Bardez do estado da India. Por conseguinte foi muito mal merecida a censura feita ao sr. Maia, e ainda que elle não precisava quem o defendesse, com tudo como deputado da maioria hei de defender o decóro da camara; e não obstante ter o illustre deputado devassado as minhas intenções, eu voto pelo principio, nem nunca disse o contrario, e intendo que é melhor consignar no projecto um artigo, a fim do governo ser auctorisado a fazer a applicação da lei do jury a todas aquellas partes da monarchia, onde ella se possa convenientemente por em execução.

O sr. C. M. Gomes: — Sr. presidente, acha-se sobre a mesa um artigo addicional, ou um novo artigo, no: qual se pertende tornar extensiva a certas e determinadas provincias ultramarinas a instituição do jury, já votada para a provincia do Gôa.

Mas, sr. presidente, o que a camara tem a votar, ou ha de ser preceptivo, ou facultativo: se é facul-

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lativo, nada se ganha com isso, porque neste voto facultativo dá se uma prova da camara não estar plenamente habilitada a decreta-lo por outra fórma, e quanto ao tempo da discussão, elle havia de ser igualmente gasto, quando o governo viesse dar conta ás côrtes da effectiva applicação da lei a cada uma das provincias ultramarinas. Se é preceptivo como foi vencido para Gôa, a camara reconhece que não ha dados sufficientes para assim se resolver.

Alguem disse que os deputados por Gôa não tinham esclarecido a materia. Eu não sei se elles effectivamente a illucidaram ou não; o que me parece, e que a camara estava habilitada a resolve-la, embora um illustre cavalheiro dissesse que se não tinham apresentado esclarecimentos sufficientes. Eu peço licença a s. ex.ª para lhe dizer, que por parte dos deputados de Gôa já se apresentaram argumentos, não seus, que não valeriam nada para o illustre deputado, mas tirados da estatistica official e da correspondencia official, pela qual se mostra qual é a população dele paiz. Por conseguinte já ha uma tal ou qual cópia de esclarecimentos.

A respeito de Angola pergunto, quaes são os esclarecimentos que existem na camara? Se ha os esclarecimentos necessarios, ou se os ha iguaes aos que se apresentam com relação a Gôa, desde já declaro que adopto que a instituição do jury se estenda desde já a Angola. Mas se se não apresentam esses dados estatisticos, se se não apresenta nada, confesso que não posso votar.

Mas dir-me-hão — vote-se a proposta do sr. Alves Martins, para que fique facultativo ao governo, e para que se lhe deixe ao seu bom senso o estabelecer a instituição do jury naquellas provincias, onde ella se possa estabelecer. (O sr. Alves Martins; — Não é esse o meu argumento). Mas se não é este o argumento do illustre deputado, então faço-o eu meu, visto que tambem se póde apresentar: tambem se póde dizer, que nós podemos votar isto como facultativo, deixando ao governo o examinar as circumstancias em que se acha cada uma das provincias ultramarinas. Mas, pergunto eu, que se ganha com isso? E havemos nós ir dar esta faculdade, ao governo? Não havemos de reservar para nós o applicarmos esta instituição onde o intendermos conveniente? Pois não será isto uma delegação muito ampla que se vai dar ao governo?

Mas, sr. presidente, a commissão não póde de maneira nenhuma ser censurada de ter apresentado o seu projecto só com relação á India. E porque? Porque a commissão não tinha pedidos iguaes de outras provincias, senão de Gôa. A commissão não possuia dados estatisticos sufficientes com relação a outras provincias, como os tinha a respeito destas. Ella tinha mesmo esclarecimentos particulares, e dados que já tem apresentado. Lerei á camara o que diz uma auctoridade insuspeita, um cavalheiro respeitavel, que collegiu apontamentos durante a sua longa residencia em Gôa, onde serviu como magistrado, e que os redigiu e publicou no ultimo quartel da vida, achando-se na vida privada, e estranho a todas as influencias. Fallo do conselheiro Manoel José Gomes Loureiro. que nas suas memorias sobre o ultramar diz o seguinte, sobre a epigrafe — jurados na India-«Na India não póde estranhar-se o estabelecimento de jurados, porque de alguma sorte estava em practica por costume e assentos da relação.» — Isto escrevia elle antes de haver a instituição dos jurados em Gôa.

Já referi o que se passou na commissão relativamente a Macáo, e crido que nesta parte a commissão esta completamente justificada; mas em quanto a mim não leria a menor duvida de fazer extensiva a disposição da lei a Macáo, porque com quanto não tenha presente a sua estatistica, louvar-me-ía na opinião geral e constante, de que aquelle povo possue já um elevado gráo de illustração.

Argumentou-se tambem que se não applicassemos a todas as possessões ultramarinas mas o jury, iamos excitar o ciume. Este argumento não colhe. Se se apresentassem iguaes pedidos, iguaes esclarecimentos e iguaes habilitações para todas as outras provincias, então havia razão para se queixarem; mas não havendo esses pedidos, ninguem se póde queixar.

Um illustre deputado, aproveitando um argumento produzido em favor do projecto, disse — que se havia inconveniente para recuar, para não ser votado o jury para a India, depois da questão ter chegado a estas alturas, tambem agora se devia ver o mesmo risco, deixando-se de se tornar a medida extensiva ás demais provincias ultramarinas. — Mas parece-me que o argumento não colhe, porque de Goa ha pedidos como disse, ha estatisticas e informações, o que tudo falla a respeito das outras provincias; o eu folgaria muito que me habilitassem para poder votar esta medida, fazendo-a extensiva a todo o Ultramar. Por agora em vez de dados similhantes aos que se apresentam, só tenho a noticia dada por um membro da camara, de que, em quanto em Goa ha matriculado nas aulas de ensino primario 1:316 estudantes, em Angola apenas se contam 100.

Pergunto, se estando 100 individuos matriculados nas aulas de instrucção que ha em Angola, se póde julgar que ha alli a instrucção necessaria, para se applicar áquella localidade a instituição do jury?

Eu já disse o que se passou na commissão, relativamente a Macáo, o que a justifica plenamente; e. por isso concluo declarando, que voto contra a applicação da medida ás outras possessões, salvo Macáo, a respeito da qual não tenho a menor duvida, apesar de não ter presente a sua estatistica, por ser conhecido de todos o gráo de illustração dos seus habitantes, e as circumstancias especiaes que para isso se dão.

O sr. Maia (Francisco: — Sr. presidente, eu não costumo entrar em polemicas com os ilustres deputados, que se julgam offendidos com a menor cousa que se lhes dirige; e se alguma vez da minha boca saír qualquer expressão que possa offender alguem, hei de ser o primeiro a retira-la.

A commissão do Ultramar arrogou a si as attribuições do ministerio do Ultramar; e se não arrogou tambem as do ministerio da marinha, é porque na camara ha a commissão de marinha. — A commissão com o zelo que tem manifestado, e com o patriotismo que se arroga, devia ter procurado informações para ver, se era possivel estender esta instituição a mais algumas possessões. Era esta a obrigação da commissão, a fim de poder habilitar a camara a ver se era possivel fazer extensiva esta garantia a mais alguma das nossas possessões.

Já o illustre membro da commissão, que acabou de fallar, disse que em quanto a Macáo não tem duvida que o jury alli se estabeleça, apesar de não ter

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Informações, porque é voz geral que Macáo está em um grande adiantamento; e tambem citou um escriptor ácerca da conveniencia de se estabelecer o jury na India; mas tenho que responder que isto não passa de uma opinião, tão boa como a minha, ou a de qualquer nutro sr. deputado; por consequencia importam pouco essas auctoridades, que cada um recebe com a fé que tem por ellas.

O mesmo illustre deputado retira o seu voto em quanto a estabelecer-se o jury em Angola, e dá como argumento que em Africa as escolas não são tão frequentadas, nem alli ha tantas. Não acho que este argumento seja concludente, porque todos sabem que já houve uma época neste paiz, em que os pais não mandavam os filhos ás escolas, só para não virem a ser jurados. Além de que todos sabem de que na cidade de Loanda ha commercio em larga escala, o que prova que alli ha muita intelligencia, e quasi que posso dizer, que para ser jurado basta ler senso commum, para saber se um facto esta ou não provado.

Por ultimo, sr. presidente, perguntarei, se será proprio do decoro e dignidade desta camara fazer uma lei, que o governador geral da India póde dispender, quando, e como muito bem quizer?

Voto, portanto, pelo artigo addicional do sr. Santos Monteiro, com as declarações que a elle offereci.

O sr. Presidente: — Não ha mais nenhum sr. deputado inscripto, e por isso vai proceder-se á votação. Como durante a discussão vogaram differentes idéas sobre a applicação do jury a diversas possessões, intendo ser melhor propor o artigo addicional por partes. (Apoiados) Então consulto a camara, sequer que assim se proceda á votação.

Resolveu-se affirmativamente: e seguidamente votado o artigo por partes, approvou-se que se applicasse a Macáo a disposição do artigo 1.º do projecto, sendo rejeitada a mesma applicação às outras provincias, comprehendidas no artigo addicional do sr. Santos Monteiro. — for esta votação julgou-se prejudicada a emenda do sr. Maia (Francisco) ao mesmo artigo.

O sr. Presidente: — Continúa a discussão do artigo 2.º com a emenda offerecida pelo sr. Alves Martins.

O sr. Maia (Francisco): — Sr. presidente, vejo-me de novo forçado a entrar na discussão, pelo que diz respeito ao artigo 2.º o qual espero que será rejeitado por todos os membros da camara, que tiverem lido o acto addicional.

O artigo 2.º deste projecto auctorisa o governador geral, em conselho, a modificar a lei que se quer applicar á India; isto é, póde fazer uma lei nova de jurados para a India; e perguntarei = póde porventura o governador geral fazer leis, ou revogar leis? Intendo que não; intendo que já o não podia fazer antes do acto addicional, e muito principalmente depois.

O governador geral póde adoptar uma providencia provisoria para obstar a qualquer mal, mas não póde tomar providencia alguma de caracter legislativo, porque isso seria legislar, e esta faculdade só compele ao poder legislativo.

O acto addicional é lei fundamental do paiz; e por conseguinte não se póde ir de encontro ás suas disposições, porque do contrario era estabelecer uma dictadura desastrosa; e nós não havemos de approvar um artigo, que contém disposições tão amplas, que permittem que o governo possa legislar para as provincias ultramarinas na presença das córtes. jámais o consentirei; e não tenho duvida em declarar que aquelles povos não teem obrigação de obedecera uma lei feita pelo governo na presença das côrtes.

Eu sou muito restricto em defender as attribuições dos differentes ramos dos poderes do estado, porque intendo que sem isso o systema representativo é uma confusão.

É minha opinião que o artigo deve ser rejeitado in limine, e mandarei para a mesa uma emenda neste sentido = Não ha logar a votar este artigo pela sua inconstitucionalidade.

Em quanto á substituição do sr. Alves Martins, declaro que não tenho duvida em votar por ella com alguma modificação. Creio que não é conveniente impormos ao governo o modo, porque ha de executar as suas attribuições. O acto addicional confere ao poder executivo, na ausencia das côrtes, o poder tomar medidas legislativas para as provincias ultramarinas, mas não lhe marca o modo como as ha de fazer.

Portanto, sr. presidente, na conformidade do artigo 37.º do nosso regimento, mando para a mesa a seguinte

PROPOSTA. — Não ha logar a votar o artigo 2.º do projecto, — Maia (Francisco).

O sr. Presidente: — A proposta que o sr. deputado Maia acaba de mandar para a mesa, involve uma questão prévia; e, portanto, vou consultar a camara se admitte á discussão.

Não foi admittida.

O sr. Santos Monteiro (Sobre a, ordem): — Eu náo quero resuscitar a questão; mas quero salvar a dignidade da camara e a minha. Não se votaram jurados senão para Goa, por informações do sr. Jeremias; e para Macáo, segundo as informações do sr. Pegado. Não se votaram jurados para as outras partes da monarchia, porque não ha informações, porque quem devia informar não informa; mas eu que hei de sempre pugnar pelos principios, mando para a mesa um artigo addicional, que tambem quero ver rejeitar; o que não me imporia: ha de ser lido daqui a muitos annos; e se soubesse que a minha substituição havia de ter a sorte que teve, teria pedido que a votação fosse nominal, porque queria combinar esta votação com as de alguns annos atraz. — Mando para a mesa este

Artigo addicional. — É o governo auctorisado a pôr em vigor a legislação sobre o jury em todas as partes da monarchia, onde não houver inconveniente. = Santos Monteiro.

Foi admittido.

O sr. Presidente: — Como é um artigo addicional ao projecto, e que nada tem com o artigo 2.º, fica reservado para se tractar delle depois de resolvido o artigo 2.º

O sr. Jeremias Mascarenhas: — Sr. presidente, eu não posso deixar de me admirar que tanto na discussão da generalidade, como na do primeiro artigo, alguns srs. deputados tenham condemnado de anti-constitucional a doutrina do artigo que se discute. Admiro-me ainda que este argumento venha do lado direito; e talvez faça mal em attribuido ao lado direito, porque não sei se todos os que nelle se sentam, o fazem seu; e portanto devo attribuido sómente ao sr. Avila, que foi quem o produziu. Não posso pois

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deixar de admirar-me que s. ex.ª ache esta doutrina inconstitucional.

Que é o que se estabelece neste artigo? Não é senão uma auctorisação que se dá ao governador geral, em conselho, ou ao governo, segundo a substituição do sr. Alves Martins. Pois esquece-se s. ex.ª de que em quasi todas as legislaturas se tem dado auctorisação ao governo para fazer leis, mesmo no reino, não obstante a facilidade de se prorogar o parlamento pelo tempo preciso, ou convoca-lo extraordinariamente? Esquece-se s. ex.ª da auctorisação que recebeu pela lei do 1.º de maio de 1819, para organisar a fazenda? Esquece-se de que o ministerio de que fazia parte, a obteve para a organisação do exercito? Pois o que era constitucional, quando o preceito da carta era absoluto, será inconstitucional, quando o acto addicional habilitou o governo, e os governadores do ultramar para legislar, sob certas condições?

Perguntarei ainda aos illustres deputados, que concorreram com o seu voto para sanccionarem o acto addicional, senão acharam contra o direito constitucional, que um delegado do governo tivesse poder legislativo pela disposição da constituição do estado, e assim se constituisse um poder politico e independente (porque o poder que se recebe da constituição, é independente) e como acham agora que é inconstitucional dar-se auctorisação para tomar algumas medidas legislativas para um caso singular? Não sei como isto se póde conciliar.

Sr. presidente, em todas as leis eleitoraes deu-se auctorisação para legislarem os governadores em conselho; e mesmo esta auctorisação se comprehende nas de 20 de junho de 1851, e de 30 de setembro de 1852; e por conseguinte os que approvaram os actos da dictadura, não podem atacar como inconstitucional o artigo 2.º Sei mesmo que em uma lei se impoz um direito protector sobre certo genero de mercadoria de Moçambique, mas para fixar o quantum foi auctorisado o governador geral.

A commissão habilitada com estes conhecimentos, e conhecedora que tudo quanto o governo propõe ao parlamento relativamente ao ultramar, é aquillo que os seus delegados informam, ao menos quanto á substancia; e ainda mais por intender bem, como intendeu, o alvará de 9 de abril de 1778 = que só na India se podia bem saber, o que na India é precisa = julgou que a auctorisação se devia conceder ao governador geral em conselho. Comtudo não cambaio a substituição do sr. Alves Martins, salva a redacção. E por esta occasião direi ao sr. Santos Monteiro que todas as vezes que eu fallar em nome da commissão, é porque estou auctorisado por ella? (O sr. Santos Monteiro: — E nas materias novas) O Orador. — Tambem nas materias, que o illustre deputado chama novas, porque já meditei melhor, e já tenho tractado dellas; e para fallar em nome da commissão não careço da licença do sr. deputado, mesmo porque represento a commissão, como seu relator especial neste projecto.

Sr. presidente, o mesmo si. deputado disse que a camara resolveu-se neste projecto pelas minhas informações. Muita honra me resulta, como já disse, seus minhas informações foram attendidas, e se por ventura o sr. deputado o não diz por uma especie de achincalhação. Eu, sem fallar á modestia, avançarei que possuo conhecimentos sufficientes das necessidades do paiz que represento, e como filho dalli tenho-os mais abundantes que o sr. deputado, e alguns outros senhores que parecem acompanharem-no nas suas opiniões. Desafio os illustres deputados para este campo; e concluo, dizendo que me reservo para responder a outras considerações que porventura possam fazer-se contra o artigo 2.º do projecto.

O sr. Vellez Caldeira: — Sr. presidente, quando se discutiu este projecto na generalidade, e que vi fallar contra o jury, como está estabelecido, um juiz, pedi a palavra: a camara antes que ella me chegasse, declarou a materia discutida; e não pude por isso dar a minha opinião como desejava. Hoje limito-me a dizer, que todos os juizes se sentem aliviados de um grande peso e responsabilidade na apreciação do facto nas causas crimes, a que a maior parte dos juizes reconhecem a utilidade do jury mesmo como está.

Em quanto ao artigo 2.º do projecto em questão intendo, que elle é inutil em vista do acto addicional; e que se o não é, não se póde sustentar. O artigo 15.º do acto addicional depois de estabelecer que as provincias ultramarinas poderão ser governadas por leis especiaes accrescenta no § 1.º que não estando reunidas as côrtes, o governo poderá decretar para as mesmas provincias as providencias legislativas, que forem urgentes. — § 2.º Em relação a medidas legislativas (assim intendo o acto addicional) igualmente poderá o governador geral de uma provincia ultramarina, tomar, ouvido o seu conselho do governo as providencias indispensaveis para acudir a alguma necessidade tão urgente que não possa esperar pela decisão das córtes ou governo. Assim intendo que em vista da auctorisação concedida por este paragrafo aos governadores geraes, póde o da India modificar a disposição do artigo 1.º do projecto quando convertido em lei, mas se a intelligencia que dou ao acto addicional não é exacta, então o artigo que discutimos, é inconstitucional e não se póde votar. Se a camara porém quer votar uma auctorisação para as disposições regulamentares (o que me parece tambem desnecessario) neste caso mando para a mesa a seguinte:

Substituição: — O governador geral em conselho, com audiencia da junta geral de districto, fica auctorisado para adoptar alguma medida que exigir a especialidade local para remover qualquer obstaculo que embarace a boa e fiel execução da legislação existente em referencia ao julgamento pelos jurados. — Vellez Caldeira.

Foi admittida, e ficou tambem em discussão.

O sr. Alves Martins: — Peço a v. ex.ª que mande ler a substituição que eu enviei para a mesa. (Leu-se) A minha substituição não é mais que o mesmo pensamento da commissão com outra redacção; isto é, em logar de se auctorisar o governador geral da Judia, auctorisar-se o governo, porque a camara não se intende tom os governadores geraes, intende-se com o governo.

Disse-se que aquillo que está no artigo 15.º do acto addicional, é a mesma cousa que está no artigo 2.º do projecto, e que votado o artigo 1.º era escusado o artigo 2.º Não concordo com esta opinião, por que intendo que a disposição do artigo 2.º, e o que se acha estabelecido no acto addicional, são cousas diversas. No artigo 15.º do acto addicional ha dois pensamentos distinctos, o primeiro em quanto ao governo, e depois em quanto ao governador geral da India. O governador geral da India em casos ordinarios go-

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verna pelas leis do paiz que as cortes fizerem, ao menos deve governar; mas póde haver um caso que demande medidas especiaes e promptas, e de cuja demora possa provir maior mal, e então o governador geral provê de remedio com aquellas providencias que o caso reclama — é esta a hypothese do § 2.º do artigo 15.º do acto addicional. Não sigo a opinião do sr. José Estevão — de que aqui ha uma dictadura perpetua: porque o governador geral tem de dar conta dos embaraços que encontrou na execução da lei, e dos motivos que leve para a suspender ou aliciar, a fim de que o governo, reunidas as cortes, submetta á sua decisão as providencias tomadas, porque perante ellas é que tem de verificar-se o caso urgente que levou o governador a adoptar essas providencias.

Mas o pensamento do artigo 2.º é — visto que se votou no artigo 1.º a instituição do jury para Gôa e para Macáo — para se modificar essa legislação segundo as circumstancias especiaes dessas localidades o reclamarem. Isto é muito diverso daquillo que está no acto addicional.

A intenção com que eu votei o artigo 2.º do projecto, foi de que havia de completar-se este pensamento com a condição do artigo 2.º, porque se se quizesse transplantar para a India a organisação do jury, tal qual ella existe em Portugal, depois do que se tem dicto e reconhecido sobre ser ella defeituosa, e que deve melhorar-se, e não se quizesse votar a disposição do artigo 2.º, que auctorisa a modificar e alterar essa legislação, attentas as circumstancias diversas em que está a India, e todas as nossas possessões do ultramar em relação a Portugal, então eu teria antes votado com a direita, pelo receio que leria de que se não colhessem os resultados que se desejam.

Quanto a dizer o sr. Avila, que este artigo 2.º é inutil, que basta o artigo 2.º, notarei que não é esta a primeira auctorisação que se vota, e s. ex.ª tem votado muitas auctorisações ao governo, o todas as camaras as tem dado. Não é possivel prevenir agora todas as circumstancias extraordinarias que podem impedir a execução da lei, e eu não vejo difficuldade nenhuma em dar esta auctorisação, depois de votada a these geral do estabelecimento do jury, para se adoptarem todas as disposições regulamentares segundo as circumstancias o exigirem.

É verdade que neste artigo 2.º vai mais alguma cousa do que a faculdade ordinaria de fazer decretos regulamentares, mas intendo, em minha consciencia, que se se quer fazer algum bem á India, não póde deixar de se proceder desta maneira, dando esta auctorisação ao governo, e impondo-lhe a obrigação de dar conta ás côrtes das medidas que adoptar segundo a substituição que mandei para a mesa, e pela qual voto; porque assim fica o governo auctorisado para modificar a lei naquelles pontos que intender, sem offender a esfera das doutrinas. Já vê o illustre deputado, o sr. Avila, que não ha aqui contradicção alguma, nem da camara, nem da commissão, apresentando o artigo 1.º ligado ao artigo 2.º; e então voto pelo artigo, porque intendo que se póde fazer alguma obra por elle. É verdade que neste artigo 2.º vai mais alguma cousa do que a faculdade ordinaria que o governo tem de poder fazer leis regulamentares; mas eu intendo, em minha consciencia, que se se quer fazer algum bem á India em levar lá a instituição do jury, não se póde fazer isto senão auctorisando o governo para modificar a legislação adoptada em Portugal, segundo o exigirem as circumstancias locaes; impondo-se ao governo a obrigação de dar conta ás côrtes das medidas que adoptou, segundo a substituição que mandei para a mesa, e pela qual voto.

O Sr. Presidente: — Como deram 3 horas vai passar-se ás interpellações.

O Sr. Arrobas; — Desejava antes que v. ex.ª consultasse a camara se queria continuar na ordem do dia para se acabar esta discussão.

Assim se resolveu.

O Sr. Presidente: — Então continúa a discussão sobre o artigo 2.º

O sr. C. M. Gomes: — Sr. presidente, ha quem lenha sustentado na camara que o artigo 2.º é ocioso e inconstitucional; uns dizem que o artigo é inconstitucional, e outros que elle é ocioso, e que a doutrina delle está comprehendida no artigo 15.º do acto addicional; porém eu creio que o artigo não é ocioso, e que a doutrina delle não está comprehendida no acto addicional. O illustre orador, que me precedeu, já explicou, e muito bem, a differença que ha entre o artigo 15.º do acto addicional e o artigo 2.º do projecto. Eu insisto nisto, porque, estando de accôrdo até aqui com o illustre deputado, não o estou comtudo no corollario, e na intelligencia que dá ao artigo 2., suppondo que a execução da medida alli deve depender da previa reforma da legislação sobre o jury.

Sei que o acto addicional tracta dos casos extraordinarios e urgentes, dos casos de força maior; e o artigo 2.º do projecto tracta dos estorvos, que se podem encontrar ao montar a instituição do jury.

Exemplificarei estas duas hypotheses, porque os exemplos, assim como as estampas, fixam mais as idéas. O acto addicional tracta dos casos extraordinarios e inesperados, como aquelle de que falla o Diario de hoje; porque no Diario de hoje vem um destes casos em que se deve providenciar para o ultramar. O Diario deu-nos conta que appareceu uma fome artificial e improvisada na cidade da Horta; e por este motivo o governador civil dispoz, sem para isso ler verba no orçamento, dos dinheiros publicos para obter cereaes, e expôl-os á venda por preço rasoavel, com o fim de destruir os manejos dos monopolistas. Eis-aqui o que o acto addicional quiz providenciar; é este poder extraordinario que o acto addicional confere aos governadores do ultramar; porque attendendo á distancia em que estão da metropoli, não é possivel obter a tempo a necessaria auctorisação.

Vamos agora á segunda hypothese. Eu creio que o artigo 2.º do projecto não é nem mais nem menos do que uma disposição analoga ás que tem apparecido em todas as leis e decretos relativos ao ultramar; é a doutrina mais ou menos similhante que vejo no artigo 113.º do decreto eleitoral de 1851. Neste decreto dá-se recurso no recenseamento para a relação; e diz o decreto que neste caso a relação poderá funccionar com 7 juizes; creio que foi com a idéa de simplificar e tornar este processo mais facil. Este decreto foi para a India para ser executado; mas como alli não ha mais do que 5 individuos que funccionem na relação, o decreto não foi cumprido, e não se procedeu ás eleições.

Aqui está o que o artigo 2.º quer evitar; porque auctorisando-se o governo, e por delegação deste, o governador em conselho, para modificar a lei, quando ao seu litteral cumprimento se oppuzer alguma espe-

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cialidade local, o governador em conselho tinha necessariamente de attender no pessoal da relação, e deste modo estava a estrada desembaraçada para a lei caminhar: ainda que eu estou persuadido que no decreto eleitoral de 1851 ha auctorisação bastante para essa modificação.

Por consequencia a doutrina do artigo 2.º é entidade constante em todas as providencias applicadas ao ultramar; como se póde vêr do decreto da dictadura de 30 de dezembro de 1852, e no decreto eleitoral, onde no artigo 18.º se acha uma disposição analoga. (Leu)

Quando fallei na occasião em que se tractava do artigo 1.º, annunciei que havia de apresentar, por parte da commissão, unia substituição ao artigo 2.º, no sentido de dar ao governo a auctorisação que no projecto se dá ao governador em conselho. E agora devo declarar que a commissão redigiu assim o projecto como está impresso, pela idéa de que o governador em conselho é (piem mais facilmente poderia conhecer dos estorvos practicos, que a lei podesse encontrar; mas reflectindo depois que se faltava nisto às regras constitucionaes, porque perante o poder legislativo quem responde e só o governo, julgou que a camara não podia auctorisar um delegado do poder executivo, e por isso modificou o principio consignado no projecto, e intende que se deve dar esta auctorisação ao governo de Sua Magestade, embora depois o governo a delegue em quem julgar conveniente, mas em todo o caso o governo seja o responsavel.

Ora a substituição que mandou para a mesa o sr. Alves Martins, na essencia, importa o pensamento da commissão, e por isso não tenho duvida em votar por ella, se o seu andor convier em dar-lhe a seguinte redacção — regular o modo practico — que é o pensamento da commissão, e não — fazer os regulamentos — porque para isso não carece o governo de auctorisação, porque tem por lei n obrigação de fazer os regulamentos necessarios. (O sr. Alves Martins: — De accôrdo) Bem; como o illustre deputado concorda, póde-se votar o artigo salva a redacção. No caso que sustentasse o contrario, então mandava para a mesa a substituição por parte da commissão.

O sr. José Estevão: — Sr. presidente, declaro a v. ex.ª e á camara, que eu ganho mais com a interpretação que até agora tenho ouvido dar aos artigos do acto addicional, do que perco em se dar auctorisação ao governo, que se propõe na substituição; mas o que acho, ao menos, extremamente ridiculo, é que se dissimulem as sentenças incontrastaveis do acto addicional, para á sombra disso se darem auctorisações inuteis.

Eu intendo que o § 2.º do artigo 15 do acto addicional dá um velo suspensivo ao governador geral da índia. Eu digo que lho dá; não digo que seja bem ou mal dado; quero deixar bem constatada a minha opinião a respeito do espirito e letra deste artigo, para vêr se no futuro os actos do governador geral da India auctorisam a minha interpretação e a minha doutrina, ou a do illustre deputado que acaba de fallar. Pergunto — se indo uma lei para a India sobre qualquer ponto que ella seja, o governador geral da India, fundado neste § 2.º do artigo 15 do acto addicional, não diz, para acudir a uma necessidade urgente, que não póde esperar pela decisão das côrtes e do governo — eu declaro que esta lei não póde ser executada aqui, e que eu consulto o governo sobre os inconvenientes da sua execução em geral como ella está, ou sobre as modificações que é preciso fazer-lhe para que possa ser executada sem inconveniente? Pergunto — se ha algum governador geral da India, o mais puritano constitucional, o mais abstinente do abuso dos poderes que lhe estão confiados, que com a mão na consciencia e os olhos neste artigo não possa tomar uma tal medida? Appello mesmo para a consciencia de um dos magistrados mais illustrados que lêem apparecido naquelle paiz, o illustre deputado por Gôa o sr. Pestana, e o seu illustre adjunto o sr. Custodio Manoel Gomes. Pergunto: se estando na India, coma mão na consciencia e os olhos neste artigo do acto addicional, não diriam relativamente ás leis que elles reputassem absolutamente oppostas na sua execução prompta ao interesse daquelle paiz — estas leis não podem executar-se; vou consultar o governo sobre as modificações que é preciso que se lhes façam para aqui se executarem! (Apoiados) Apoiado! Então o artigo não está interpretado por mim, mas por aquelles que com menos suspeita de leveza lhe dariam execução: não fallo no que fariam delle os fanfarrões; sem nenhum de taes artigos elles sabem talhar ao largo, e dar-se as attribuições que nunca as leis lhes conferiram, e que nunca nenhum parlamento podia pensar em lhes dar; mas refiro-me só aos constitucionaes, aos homens de lei por consciencia e por principios. Ora estando vigente este artigo, que auctorisações mais querem dar? Nós auctorisamos o governo para fazer na lei do jury as modificações que elle julgar precisas para a lei ser applicada á India; a lei vai assim modificada e feita; mas isto não destroe o direito do governador, o artigo do acto addicional fica em pé, quaesquer que sejam as auctorisações que nós dermos; e elle diz, pelo menos tem direito para isso — não obstante a lei ter passado todos Os tramites, julgo em minha consciencia que não póde ser executada promptamente, sem grandes inconvenientes. Deve assim faze-lo, se prezar os seus deveres, da mesma maneira que faria, se não houvesse delegação das camaras no governo, porque para um governador de principios tanto vale a auctoridade do governo, como a auctoridade das camaras dentro das attribuições que estão marcadas, e porque nós delegamos o poder legislativo no governo, elle não hade respeitar mais as decisões desta delegação do que do direito inicial que é do parlamento. O governo modificou a lei; o governador julga que o governo errou na modificação; representa, e faz o seu dever.

Ora, sr. presidente, se o governador geral da India fica com todo este poder; se a lei ha de passar forçosamente por este veto suspensivo, por esta informação final, para que estamos a dar auctorisações, que caducam, que são desnecessarias, porque não mantem o direito do governador geral, porque não destroem o veto suspensivo desse governador?,

Mas que fazemos mais? Eu não dissimulo as minhas opiniões, porque sou naturalmente franco, e penso que não posso ser homem publico dissimulando as sentenças das leis. A sentença da lei é esta que acabo de dizer. Se ella é dura, se é inconstitucional, é preciso dize-lo para se proceder á sua reforma; mas agora estar a torcer o sentido della, e a deixar em hesitação os homens de consciencia e auctoridade publica, para saberem se hão de ou não usar della, é o que não intendo. Não tracto dos homens arbitrarios; o arbitrio não precisa auctorisação de ninguem;

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faz o que lhe parece. O governador geral da India tem este direito; eu não lho dei, e não sei se lho daria; mas tem-no; está no acto addicional, e ha de exerce-lo; e, exercendo-o, todas essas auctorisações são desnecessarias.

Agora se querem interpretar o artigo do acto addicional, e querem dar aqui um voto authentico, uma interpretação authentica a respeito desse artigo, bem: restrinjam-no porque eu vou para a restricção deste direito, e então á sombra desta interpretação, e em troca della dou a auctorisação ao governo; mas interpretem authenticamente o artigo e digam aqui: o governador geral da India não póde suspender leis por caso nenhum, e não póde tomar senão algumas providencias daquellas que são necessarias para acudir á fome e á séde, a estes casos extraordinarios o superiores a toda a lei.

Eu confesso que o congresso passado foi muito adiante, talvez por um zelo louvavel, por um certo espirito governamentalicio, que principalmente é desculpavel em um paiz que tem carecido por longo tempo de governo, porque neste caso ha desejo de constituir o poder central com toda a força precisa para vêr se satisfaz ás necessidades sociaes; mas o § 8.º do artigo 15.º do acto addicional está em vigor, e as consequencias são obvias.

Eu repito que a auctorisação é desnecessaria; se não fosse isto votava-a sem inconveniente nenhum; mas se a votam, então restrinjam o artigo do acto addicional, e eu peço que se ponha aqui na lei por appenso a interpretação que se dá a esse artigo, por que aliás com a auctorisação não se faz nem mais nem menos do que sem ella. Assim é que se governa no systema constitucional, e é escusado estar a baralhar os dedos, e a fazer exigencias desnecessarias, quando as leis regulam os negocios perfeitamente.

Eu julgo que a minha posição é clara e terminante. Eu sou ministerial; todo o mundo o sabe, e creio que tenho dado provas bastantes, e votei com a maioria no sentido do ministerio nesta questão; mas se se quizesse defraudar o voto da camara; se se quizesse fazer applicação do jury a todas as possessões ultramarinas, aonde o illustre deputado o quer levar, eu reclamava o meu voto, porque eu já declarei que não votava o jury a estas outras partes, onde se queria estabelecer, e tinha razões para isso. Não voto o jury a respeito de Moçambique, porque ahi não ha sociedade, não ha nada; ha terra e exploradores de negros e mais nada. Póde ahi applicar-se com alguma conveniencia o jury?

Agora pelo que diz respeito a Angola, razões de consciencia tenho para votar que não se estabeleça lá o jury.

Sr. presidente, concluo que julgo nas leis existentes a força precisa para serem executadas, e bom accôrdo que reconheço entre a camara e o governo, e que ha tudo o preciso no que se votou para executai a lei de uma maneira que satisfaça ás indicações della.

O sr. Alves Martins: — Sr. presidente, a minha questão é a interpretação do artigo 15.º do acto addicional, é uma questão de hermenêutica com o sr. José Estevão sobre o acto addicional (O sr. José Estevão: — Comigo não, que eu sou um pobre homem) Nós temos obrigação de dar ás palavras a interpretação natural e verdadeira que devem ter, e eu lendo o artigo do acto addicional, intendo que é só uma questão doutrinai ia, e não posso deixar de declarar que sou inteiramente de opinião opposta ao sr. José Estevão Sei que o illustre deputado falla com consciencia em todas as questões, mas eu devo acreditai que o nobre deputado intende que tambem tem consciencia aquelle que sustenta uma opinião contraria a sua.

Ora, eu vou ler o artigo 15.º do acto addicional (Leu) Qual é o pensamento que se leve ao legislar sobre este artigo? Este artigo é uma disposição verdadeiramente excepcional, porque é certo que as provincias ultramarinas estão em circumstancias especiaes em relação ao continente, e por consequencia as providencias que se applicassem ás provincias ultramarinas, deviam ser tambem especiaes.

Agora vamos ao § 1.º desse artigo (Leu) Qual foi o pensamento da camara no momento em que estabeleceu esta disposição? E sabido que quem faz as leis, são as cortes; mas no intervallo das sessões, quando não ha córtes, podem vir informações do governador geral da India, que obriguem o governo a decretar em conselho uma providencia legislativa a respeito de qualquer das nossas possessões do ultramar, e que a demora nessa providencia possa causai prejuiso. Então diz o § 1.º do artigo 15.º — que o governo decrete essa medida, e depois da camara reunida, porque a medida póde ser de natureza lai, ou tão grave que o governo não podesse decreta-la sem o consentimento das córtes, e. neste caso reune as coites extraordinariamente, então, digo, o governo tem de dar conta ás côrtes da medida legislativa, que tiver adoptado. Assim é que eu intendo o acto addicional, e eu peço á camara que me diga despreoccupada de tudo, se é possivel que destas palavras se intenda outra cousa.

Qual é agora a disposição do § 2.º do mesmo artigo 15.º (Leu)

Vamos a vêr o que quiz a camara passada aqui estabelecer. Suppunhamos que se dá um caso extraordinario em qualquer das nossas possessões ultramarinas, e que esse caso extraordinario precisa de uma medida legislativa, mas essa medida e preciso que seja promulgada pelas côrtes, porque o governo não póde decreta-la, mas da demora dessa medida póde resultar um glande mal; então que faz o governador geral? Decreta essa medida, porém é necessario que se dê a condição que exige o § 2.º do artigo 15.º do acto addicional, isto é, que seja de alguma necessidade tão urgente, que não possa esperai pela decisão das coites. Para aqui é que eu chamo o sr. José Estevão, que tem uma opinião contraria (O sr. José Estevão — Peço a palavra) E necessario pois como acabo de dizer, que haja um caso tão extraordinario que não possa esperar pela decisão das côrtes e do governo, para que o governador geral de uma provincia possa tomar alguma medida de urgente necessidade. Ora, applicando esta disposição á hypothese em que estamos, á instituição do jury para a India, supponhamos que chega la a lei, e o governador geral diz — eu suspendo esta ter porque a sua execução trará grandes males, e consulto o governo — digo eu, que não a póde suspender, e só o póde fazer por um abuso, mas não está no seu direito segundo o acto addicional, porque esta lei não e da urgencia daquellas, que não se possa esperar pela decisão das côrtes, ou do governo. O acto addicional legisla para casos extraordinarios, e esta lei é para casos ordina-

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rios, logo esta fora do acto addicional a auctorisação que se propõe no artigo 2.º A camara póde vota-la ou deixar de a votar, mas para o caso ordinario do estabelecimento do jury, não é applicavel o acto addicional, e se quizermos que a lei produza effeito, ha de levar este artigo, cujo pensamento eu traduzi n'uma substituição que mandei para a mesa.

O sr. José Estevão: — Sr. presidente, eu não abandono a questão, mas não a quero irritar, porque tenho dicto bastante para deixar consignada a minha opinião, e louvo que os srs. deputados que sustentam o contrario, tenham dicto bastante para os tornar responsaveis pela interpretação que elles dão ao artigo do acto addicional, interpretação que ninguem lhe deu, que não lhe está dando o governador geral da India, interpretação que eu duvido que elles lhes dêem quando tractarem de o applicar, porque ainda espero de os encontrar interpretando casuisticamente a urgencia das medidas, e lançando um grande véo de absolvição sobre actos practicados pelo governador geral da India fóra dessa urgencia, fóra dessa necessidade, por meio e puro arbitrio; e se eu quizesse inquietar o sr. ministro da marinha, se a minha prudencia não fosse maior do que o zelo de muitos dos meus collegas, eu lhe pediria para me dizer com a lealdade do seu logar, com a lealdade que devem as pessoas do seu cavalheirismo a um homem que sabem que é verdadeiro e honesto, quantas das leis expressamente feitas para ultramar passadas por todos os tramites legaes não estão abolidas, suspensas, esquecidas e calcadas pelo actual governador geral da India? (Uma voz: — Não é a questão) Não é questão para aquelles que votam contra o jury por um principio especulativo. Pois nós vemos as leis interpretadas de um certo modo pelas pessoas que as devem executar; nós vemos uma jurisprudencia de arbitrariedade, assoberbando tudo, e havemos de admittir que esta jurisprudencia ha-de ser abandonada e esquecida e substituida por esta jurisprudencia meliflua e bucólica dos meus illustres collegas, cujo poder de palavra é immenso, mas cujo poder de governo é muito pouco, e cujas doutrinas nunca serão seguidas nem admittidas pelos governadores geraes da India, porque depois delles lá se pilharem, depois de lá estarem enthronisados reconhecem as alias capacidades legislativas, e as grandes intelligencias filosóficas deste paiz, mas têem mais confiança no ferio e na polvora, do que nos bellos discursos dos nobres deputados? Sr. presidente, só quando os governadores geraes pela bondade do seu coração, pela pureza dos seus costumes, e pela boa educação, que seus pais tiveram a fortuna de lhes dar para bem deste paiz, finalmente só quando os governadores geraes são boas pessoas é que tem escrupulos de suspender, rasgar, recortar, emendar e aperfeiçoar a todas as leis que daqui vão, ou sejam simplesmente ou com a sancção das côrtes e recommendação do ministro.

Agora que se quer, depois que uma theoria mais latitudinaria passou para a lei fundamental? Quer-se destruir essa theoria, e estabelecer um regimen mais restricto e mais legal. Eu estimo que se estabeleça e louvo já embasbacado e embaido as altas intelligencias que fizeram enfreiar as tendencias despóticas de quasi todos os governadores do ultramar, fazendo-os abdicar os direitos que a lei lhes dá; para mim já o acto addicional é de um preço inferior; eu guardo o acto addicional, mas guardo-o com os preciosos commentados que se lho tem feito, porque eu sei o que é em materia de legislação a opinião de jurisconsultos, e os illustres deputados que acabam de fallar, que fallaram e que hão de fallar tem para mim muito pezo; aos artigos do acto addicional a respeito do ultramar é necessario juntar os commentarios e apostillas que os illustres deputados lhes tem feito; que eu, sr. presidente, intendo em minha consciencia, que são os mais latitudinarios possivel, são um voto de confiança expresso e continuado, que com estes artigos não é preciso pedir mais auctorisação nenhuma. Que a camara passada quiz armar o governo com todo o poder para reger as colonias sem as opprimir, isso para mim é de fé. Eu sei a discussão que houve então, qual o espirito com que se votaram taes artigos, sei as doutrinas que ficaram vencidas e se: até qual foi o alcance administrativo e politico dos legisladores, que votaram esta parte do acto addicional; a este respeito não ha mais que explicar nem que accrescentar; mas se se quer uma auctorisação, vote-se a auctorisação; eu não a posso votar, comtudo é-me indifferente que a camara vote, mas peço que sejam appensas ao acto addicional estas saneias e moderadas doutrinas que acabamos de ouvir, e que eu creio que nunca pódem ter applicação. Sei de sciencia celta que ha centos de leis, que se tem feito tanto para Portugal como para o ultramar, e que alli ainda não tiveram execução alguma; e por exemplo citarei a lei da reducção das sisas; é uma lei geral; chegou lá, disse o governador geral da India — não cumpro, porque não posso cumprir. — Sobre esta, se fôr sem recommendação do ministro, elle ha de fazer o mesmo que fez então. Ora, senhores, digamos a verdade: as leis do jury que estão em Portugal nunca hão de ser executadas na India, sem que sejam modificadas: (Apoiados) quer-se, deseja-se estabelecer as leis que aqui estão em vigor a respeito do jury, votemos as leis do jury para serem applicadas á India com as modificações que se julgarem convenientes, isto em conformidade com o acto addicional.

Agora quanto ao illustre deputado citar o nome dos deputados que entram nas questões, eu intendo que este systema não é regular; deve-se calar o nome do deputado, porque parece que depois de se pronunciar, é logo o individuo armado de catana; e nem todos tem disposição para andar armados; e principalmente eu, que não cinjo a espada ha tanto tempo. A fallar a verdade não me parece isto muito regular; porque póde muito bem argumentar-se, sem se pronunciar o nome dos deputados. Tenho concluido.

O sr. Nogueira Soares: — Sr. presidente, começarei por declarar que sou partidista decidido do jury — e não só em these e em principio como os nobres oradores daquelle lado da camara (apontando para o lado direito) mas mesmo em hypothese no estado actual da civilisação do nosso povo. (Apoiados)

Mais ainda, sr. presidente; não sustentarei de certo que a organisação actual do nosso jury seja a melhor possivel; não sustentarei mesmo que seja uma boa organisação; pelo contrario creio que póde o deve modificar-se com muito proveito da administração da justiça. (Apoiados) Mas o que tambem creio o que o jury mal organisado como está entre nós, é mesmo assim uma excellente instituição, não só debaixo do ponto de vista politico, mas até debaixo do ponto de vista judiciario. (Apoiados) listou profundamente convencido de que o jury mesmo assim decide todas

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as questões do facto muito melhor do que os juizes, é mais imparcial do que elles; e ha de acertar muito mais Vezes do que elles. (Apoiados) É esta a minha profunda convicção fundada no exame de muitos processos, e na practica do fôro de alguns annos.

Tendo eu sustentado o jury todas as vezes que delle se tem tractado nesta camara, julguei que não devia deixar passar esta occasião sem dar um testimunho solemne dá minha adhesão a este grande principio, e por isso peço perdão a v. ex.ª e á camara de ler fallado n'uma questão que verdadeiramente está já resolvida. A camara votou o jury para a India, todos convem em que a instituição ha de ser lá desenvolvida e regulada por uma maneira diversa daquella porque o e em Portugal. São outras as contribuições que la se pagam, deve ser outra a fórma do recenseamento e da escolha dos jurados, e haverá muitas outras differenças dictadas pela diversidade das circumstancias. Quem ha de fazer estas modificações na legislação do continente, para a accommodar ao estado das cousas na India? Ha de ser o governo, ou a camara? Rejeitado a proposta do sr. Macedo, para que a commissão do ultramar ouvida a de legislação, apresentasse as modificações necessarias, decidimos implicitamente que não devia ser a camara quem as fizesse. E se ellas tem de fazer-se, e não as ha de fazer a camara, e claro que as ha de fazer o governo.

A questão portanto sr. presidente, vem a ser, se o governo tem auctorisação, para as fazer, nos artigos 15.º e 16.º do acto addicional, ou se precisa de uma auctorisação especial. Estes artigos dizem. (Leu)

Vê-se que fallam ião sómente dos casos urgentes e extraordinarios; e como eu não creio que se possa considerar urgente nem extraordinaria a transplantação do jury para a India, não creio tambem que o governo se julgue auctorisado por estes artigos para fazer as modificações em questão.

O sr. visconde de Atouguia: — Não julga, não.

O Orador: — Pois então se o governo senão julga auctorisado, e se querem que o principio não fique sem execução, é necessario votar a auctorisação. Voto portanto pela substituição do meu amigo o sr. Alves Martins, salva a redacção.

O sr. Cardozo Castello Branco — Peço licença para divergir da opinião do illustre deputado que me precedeu acêrca da necessidade, que ha-de dar uma auctorisação ao governador geral da India, para modificar a legislação dos jurados na parte em que encontrar difficuldades na sua execução. Direi em poucas palavras as duvidas que se me offerecem a este respeito.

Se o projecto passar em lei tal qual se acha, se se auctorisar o governador geral da India a modificar e alterar a legislação, intendo que podem dar-se graves inconvenientes.

Supponhamos que o governador geral encontrou difficuldades na sua execução, o mais que póde fazer é suspender a lei, mas não póde de modo nenhum alterar as disposições da lei. E não podendo alterar o sentido nem o espirito da lei, o governador geral da India suspende a execução da lei, e representa ao governo: o governo traz esta modificação ás côrtes, e pergunto — quando é que vem a haver jurados na India? Tarde e a más horas. Portanto parece-me que sendo preciso votar-se uma auctorisação, esta se deve conceder ao governo, e não ao governador da índia. (Vozes: — Votos, votos)

O sr. Presidente — A discussão está concluida, visto que senão acha mais ninguem inscripto, e por isso se a camara quer, vai votar-se o artigo 2.º e propostas a elle offerecidas. (Apoiados.)

O sr. Santos Monteiro — Eu creio que a commissão adoptou a substituição do sr. Alves Martins, e neste caso parecia-me que a substituição do sr. Alves Martins devia ser votada em primeiro logar.

O sr. C. M. Gomes — A commissão adopta a substituição, salva a redacção.

O sr. José Estevão: — (Sobre o modo de propor) Eu votaria por este artigo, se a commissão dissesse que ficava intendido....

O sr. Presidente — Mas permitta-me lhe diga que isso não é sobre o modo de propor.

O Orador: — Permitta-me v. ex.ª que eu exprima o meu voto. Eu desejo saber, se a commissão intende que na presença desta lei a auctoridade que tem o governador geral da India pelo acto addicional, caduca e é nulla?

O sr. Presidente: — Mas isso não é sobre o modo de propor.

O Orador — Pois então voto contra.

O sr. Presidente — Eu consulto a camara, se quer votar primeiramente a substituição do sr. Alves Martins, com a qual se conforma a commissão, salva a redacção, ou se quer votar antes o artigo 2.º

Resolveu-se que se votasse primeiramente a substituição do sr. Alves Martins, com a approvação da qual ficou prejudicado o artigo 2.º, e a substituição do sr. Vellez Caldeira.

O sr. Presidente. — A ordem do dia para ámanhã é a continuação da de hoje, e o artigo novo que o sr. Santos Monteiro mandou para a mesa; o projecto n.º 31 sobre a fixação da força de mar, e havendo tempo o parecer n.º 25 ácerca do requerimento dos proprietarios dos terrenos occupados pela linha de defeza da capital. Está levantada a sessão — Eram mais de 4 horas da tarde.

O REDACTOR

José de Castro Freire de Macedo

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