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N.° 110

SESSÃO DE 12 DE JULHO DE 1899

Presidencia do exmo. sr. Luiz Fisher Berquó Poças Falcão

Secretarios - os exmos srs.

Joaquim Paes de Abranches
Frederico Alexandrino Garcia Ramirez

SUMMARIO

Approvada a acta da sessão anterior, o sr. presidente propõe que seja exarado na acta d'esta sessão um voto de sentimento pela morte do Tzarewitch, proposta que é approvada, depois de a ella se terem associado os srs. Ressano Garcia, ministro dos negocios estrangeiros e conde de Burnay. - Dá-se em seguida conta do expediente, e o sr. Francisco Machado manda para a mesa um parecer da commissão do ultramar. - O sr. Mazziotti queixa-se de algumas irregularidades commettidas pela guarda fiscal, promettendo-lhe o sr. ministro da fazenda providenciar. - O sr. conde de Burnay justifica com algumas considerações um projecto que apresenta, para ser elevado o ordenado dos ministros de estado. - O sr. Oliveira Matos insta com o sr. presidente para que dê para a discussão o projecto relativo ao arrendamento do edificio do Bussaco, e faz uma declaração com relação á votação do projecto que concede a autonomia a Espinho - A requerimento dos srs. Ressano Garcia e Alexandre Cabral são auctorisadas a reunir durante a sessão as commissões do orçamento e de redacção.

Na ordem do dia continúa a discussão do projecto da lei n.° 87, commissão revisora de contas, que é approvado depois de, sobre elle, usarem da palavra os srs. conde do Burnay e Ressano Garcia - Entra depois em discussão o projecto n.º 21, tributação das obrigações de bancos e companhias, que é approvado depois de, sobre elle, fallarem os srs. conde de Burnay e Dias Costa. - Começa em se guida a discutir-se o projecto de lei n.º 84, remissão das obrigações da companhia dos tabacos, entrando na discussão os Srs. Dias Ferreira e ministro da fazenda. - O sr. ministro das obras publicas manda para a mesa varios documentos, que se resolve sejam publicados no Diario do governo, e approvam-se as ultimas redacções dos projectos n.º 87, 21, 53, 59 e 86. - Sob proposta do sr. Carlos Ferreira foi a commissão de inquerito parlamentar á direcção geral do ultramar auctorisada a funccionar no intervallo parlamentar, sendo-lhe aggregados os srs. Alberto Monteiro e Fortuna Rosado.

Primeira chamada - Ás dez horas e meia da manhã.

Presentes - 10 srs. deputados.

Segunda chamada - Ás onze horas.

Abertura da sessão - Ás onze horas e vinte minutos.

Presentes - 41 srs. deputados.

São os seguintes: - Abel da Silva, Adriano Anthero de Sousa Pinto, Alberto Affonso da Silva Monteiro, Alfredo Cazimiro de Almeida Ferreira, Alvaro de Castellões, Antonio Eduardo Villaça, Antonio Ferreira Cabral Paes do Amaral, Antonio Maria Dias Pereira Chaves Mazziotti, Antonio de Menezes e Vasconcellos, Arnaldo Novaes Guedes Rebello, Arthur Pinto de Miranda Montenegro, Bernardo Homem Machado, Carlos Augusto Ferreira, Conde de Burnay, Conde de Silves, Eusebio David Nunes da Silva, Francisco Antonio da Veiga Beirão, Francisco Barbosa do Couto Cunha Sotto Maior, Francisco Felisberto Dias Costa, Francisco José Machado, Francisco José de Medeiros, Frederico Alexandrino Garcia Ramirez, Frederico Ressano Garcia, Gaspar de Queiroz Ribeiro de Almeida e Vasconcellos, João Antonio de Sepulveda, João Joaquim Izidro dos Reis, João Monteiro Vieira de Castro, Joaquim Augusto Ferreira da Fonseca Joaquim Heliodoro Veiga, Joaquim Paes de Abranches José Alberto da Costa Fortuna Rosado, José da Cruz Caldeira, José da Fonseca Abreu Castello Branco, José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral, José Mathias Nunes, Julio Ernesto de Lima Duque, Loureço Caldeira da Gama Lobo Cayolla, Luiz Fisher Berquó Poças Falcão, Manuel Affonso de Espregueira, Martinho Augusto da Cruz Tenreiro e Visconde da Ribeira Brava.

Entraram durante a sessão os srs.: - Alexandre Ferreira Cabral Paes do Amaral, Alfredo Carlos Le-Cocq, Antonio Carneiro de Oliveira Pacheco, Antonio Simões dos Reis, Antonio Tavares Festas, Augusto José da Cunha, Carlos José de Oliveira, Francisco Furtado de Mello, Henrique Carlos de Carvalho Kendall, Jeronymo Barbosa de Abreu Lima Vieira, João Baptista Ribeiro Coelho, João Catanho de Menezes, João Lobo de Santiago Gouveia, Joaquim José Pimenta Tello, Joaquim Simões Ferreira, José Benedicto de Almeida Pessanha, José Capello Franco Frazão, José Dias Ferreira, José Joaquim da Silva Amado, José Maria de Oliveira Matos, Luiz José Dias e Manuel Antonio Moreira Junior.

Não compareceram â sessão os srs.: - Adolpho Alves de Oliveira Guimarães, Alfredo Cesar de Oliveira, Anselmo de Andrade, Antonio Augusto Gonçalves Braga, Antonio Maximo Lopes de Carvalho, Antonio Teixeira de Sousa, Arthur Alberto de Campos Henriques, Augusto Cesar Claro da Ricca, Conde de Idanha a Nova, Conde de Paço Vieira, Conde da Serra de Tourega, Francisco de Almeida e Brito, Francisco Limpo de Lacerda Ravasco, Francisco Manuel de Almeida, Francisco Pessanha Vilhegas do Casal, Francisco Silveira Vianna, Francisco Xavier Cabral de Oliveira Moncada, Guilherme Augusto Pereira de Carvalho de Abreu, Henrique da Cunha Matos de Mendia, Jacinto Candido da Silva, Jacinto Simões Ferreira da Cunha, Jeronymo Barbosa Pereira Cabral Abreu e Lima, João Abel da Silva Fonseca, João Ferreira Franco Pinto Castello Branco, João Marcellino Arroyo, João de Mello Pereira Sampaio, João Pereira Teixeira de Vasconcellos, João Pinto Rodrigues dos Santos, Joaquim Ornellas João de Matos, Joaquim Saraiva de Oliveira Baptista, José do Abreu de Couto Amorim Novaes, José Adolpho de Mello e Sousa, José Alves Pimenta de Avellar Machado, José Bento Ferreira de Almeida, José Christovão Patrocinio de S. Francisco Xavier Pinto, José Eduardo Simões Baião, José Estevão de Moraes Sarmento, José Gil de Borja Macedo e Menezes (D), José Gonçalves Pereira dos Santos, José Gregorio de Figueiredo Mascarenhas, José Luiz Ferreira Freire, José Malheiro Reymão, José Maria Barbosa de Magalhães, José Maria Pereira de Lima, Leopoldo José de Oliveira Mourão, Libanio Antonio Fialho Gomes, Luciano Affonso da Silva Monteiro, Luiz Cypriano Coelho de Magalhães, Luiz Osorio da Cunha Pereira de Castro, Manuel Pinto de Almeida, Manuel Telles de Vasconcellos, Marianno Cyrillo de Carvalho, Sebastião de Sousa Dantas Baracho, Sertorio do Monte Pereira e Visconde de Melicio.

Acta. - Approvada.

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2 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

O sr. Presidente: - Previno a camara de que se entra na ordem do dia ás onze horas e tres quartos, e de sessão se encerra ás duas horas e um quarto.

O sr. ministro dos negocios estrangeiros acaba de communicar-me a triste noticia do que falleceu em S. Petersburgo o Principe Jorge, irmão de Sua Magestade o Imperador Nicolau o herdeiro da corôa da Russia.

A camara de certo se associa á dôr que n'este momento afllige sua Magestade Imperador, a familia real e aquella nação.

Tenho, pois, a honra de propor que na acta da sessão de hoje se lance um voto de sentimento por tão infausto acontecimento. (Apoiados.)

O sr. Ressano Garcia: - Em nome da maioria da camara, declara que esta se associa, profundamente commovido, ao voto do sentimento que o sr. presidente presidente pelo fallecimento do Principe herdeiro da Russia, (Apoiados geraes.) tão prematuramente victimado pela tubeculose, que, não distinguindo classes, nem os Principes poupa.

A nação, portugueza e portanto, os seus representantes, não podem deixar de associar-se de todo o coração á dôr que n'este momento afflige Sua Magestade o Imperador, que, ainda ha pouco, deu uma prova do seu espirito generoso, tomando a iniciativa da convocação da conferencia da paz, de onde tantos resultados beneficios podem advir para a humanidade. (Apoiados geraes.)

(O discurso será publicado na integra quando s. exa. o restituir.)

O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros (Veiga Beirão): - Pedi a palavra para me associar, em nome do governo, ao voto do sentimento que v. exa. propoz pela morte do Tzarewitch.

Logo que tive conhecimento official do acontecimento, por communicação do nosso representante na Russia, dirigi-me, por parte do governo, á legação imperial da Russia para apresentar os sentimentos de condolencia do governo portuguez.

Agora associo me, como disse, no voto proposto por v. exa. e acompanho as palavras de pezar preferidas pelo sr. Ressano Garcia.

A nação portugueza, que tão amigaveis relações mantém com a Russia, não póde deixar de associar-se á dôr do chefe d'aquelle imperio, que acaba de mostrar o espirito generoso que é dotado, tomando a iniciativa da reunião da conferencia de da paz destinada a produzir o desarmamente das nações. (Apoiados geraes.)

(O sr. Ministro não revia.)

O sr. conde do Burnay: - Não tenho a honra de pertencer á feição politica de nenhum dos lados da camara, mas não deixo, por casa circumstancia, de ser deputado da nação, e não n'essa qualidade, associo me ao voto do sentimento proposto por v. exa. e ás palavras de pezar proferidas pelo lader da maioria, o sr. Ressano Garcia, o pelo sr. ministro dos negocios estrangeiros.

(S. exa reviu.)

O sr presidente: - Em vista da manifestação da camara, considero a minha proposta approvada por acclamação. (Apoiados geraes.)

O voto de sentimento será exarado na acta da sessão de hoje, far se hão as dividas communicações. (Apoiado geraes.)

EXPEDIENTE

Officio

Do ministerio da marinha, remettendo um exemplar da collecção de providencia natureza legislativa que, tendo não julgadas urgentes foram promulgadas por este mim tendo, desde junho a dezembro de 1898, não estando reunidas as côrtes.

Para a secretaria.

O sr. Francisco José Machado: - Mando para a mesa um parecer da commissão do ultramar, sobre o requerimento em que Mathias Trindade, capitão reformado, pede melhoria de reforma.

Foi a imprimir.

O sr. Mazziotti: - Chama a attenção do sr. ministro da fazenda para alguns actos praticados pela guarda fiscal no concelho de Cintra, e que lhe parecem menos regulares

Ha pouco tempo, um d'esses guardas embargou uma obra na praia das Maçãs, declarando, doze dias mais tarde, que se tinha enganado e que a obra podia continuar!

Pouco depois tambem a guarda fiscal embargou as obras de uma estrada que fôra mandada construir pela camara municipal.

São frequentes estes abusos, e diz assim, por lhe parecer que a guarda fiscal não tem a faculdade de embargar obras.

Pede, portanto, ao sr. ministro da fazenda que a faça entrar na ordem.

(O discurso será publicado na integra quando s. exa o restituir.)

O sr. Ministro da Fazenda (Manuel Affonso de Espregueira): - Prestei toda a attenção ás palavras que proferiu o illustre deputado e, em vista do que s. exa. acaba de dizer, vou pedir informações, para depois proceder como for de justiça.

(O orador não reviu.)

O sr. Conde de Burnay: - Referindo-se aos ordenados dos ministros de estado, faz sentir que elles são por tal fórma insufficientes, que de modo algum podem dar-lhes os recursos necessarios para manterem a dignidade do seu cargo.

Manda, por isso, para a mesa o seguinte

Projecto de lei

Artigo 1.º A partir de mez seguinte á publicação d'esta lei no Diario do governo, os honorarios dos ministros o secretarios de estado em exercicio passarão a ser de 400$000 réis por mez. Os honorarios do presidente do conselho de ministros, quando este tiver a gerencia de qualquer das pastas do ministerio, serão de 500$000 réis.

§ unico. Os honorarios de que trata este artigo serão livres de qualquer reducções.

Art. 2.º Fica revogada o legislação em contrario.

Sala das sessões, 12 de julho de 1899. = Conde de Burnay.

(O discurso será publicado na integra quando o orador o restituir.)

O sr. Presidente: - O projecto fica para segunda leitura.

Tem a palavra o sr. Oliveira Matos, mas previno a s. exa. de que faltam apenas seis minutos para se entrar na ordem do dia.

O sr. Oliveira Matos: - Pede novamente ao sr. presidente que, e mais depressa possivel, faça proseguir a discussão do projecto de lei que se refere ás obras do Bussaco. Deseja que ella continue, não para levantar qualquer incidente, mau para destruir qualquer sombra de suspeita que, porventura, possa ter surgido no espirito de alguem.

Declara depois que, se estivesse presente quando se votou o projecto de lei que cria o concelho de Espinho, teria votado e, talvez, fallado contra elle.

Tendo combatido por varias vezes a creação d'aquelle concelho, faltaria ao seu dever se não fizesse agora esta declaração.

(O discurso será publicado na integra quando o orador o restituir.)

O sr. Presidente: - O projecto a que s. exa. se referiu ha de ser discutido ainda n'esta sessão; o que não

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posso é dizer precisamente o dia em que a sua discussão se realisará.

Asseguro, entretanto, a s. exa. que é minha resolução firme que elle seja discutido, como disse, ainda n'esta sessão.

O sr. Ressano Garcia: - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro a v. exa se digne consultar a camara sobre se permitte que a commissão do orçamento se reuna durante a sessão de hoje. = Frederico Ressano Garcia.

Foi approvado.

O sr. Alexandre Cabral: - Mando para a mesa o seguinte requerimento:

Requeiro a v. exa. que se digno consultar a camara, sobre se permitte que a commissão de redacção reuna durante a sessão. = O deputado, Alexandre Cabral.

O sr. Presidente: - Vae passar-se á ordem do dia. Os srs. deputados que tiverem papeis a mandar para a mesa, podem fazel-o.

ORDEM DO DIA

Continuação da discussão do artigo 1.º do projecto de lei n.° 87, pelo qual é creada junto do ministerio da fazenda uma commissão revisora de contas de differentes companhias, sociedades ou emprezas, que tenham, de partilhar os lucros com o estado.

O sr. Conde de Burnay: - Diz que as commissões de natureza similhante á d'aquella de que trata o projecto pouco adiantam.

Ainda não viu nenhuma que denunciasse qualquer irregularidade.

Vê que as pessoas que a hão de compor são de toda a capacidade, mas que não têem pratica de negocios commerciaes, e por isso lhe parece que melhor seria encarregar d'esta fiscalisação um ou dois empregados do ministerio da fazenda, que estão mais habilitados para este serviço.

De outra maneira o projecto não dará nada.

Em todo o caso, entende que, se a commissão tem de funccionar, deve ser devidamente remunerada.

(O discurso será publicado na integra quando s. exa. o restituir.)

O sr. Ressano Garcia: - Pondera que o sr. conde de Burnay não contestou a utilidade do projecto; apenas entende que a commissão não corresponde ao fim que se tem em vista, porque não é remunerada, e porque os seus membros não são idoneos.

Tem a responder, quanto á remuneração, que se trata de uma instituição nova, e que por isso é preciso ver o que ella dá para então se estabelecer a remuneração; e, quanto á idoneidade dos membros da commissão, deve dizer, que, alem da sua capacidade pessoal, elles têem adjuntos alguns funccionarios publicos que lhe preparam os processos.

(O discurso será publicado na integra guando s. exa. o restituir.)

O sr. Conde de Burnay: - Insiste em que o projecto não dá nada, e sustenta que seria mais preferivel que, em vez da commissão, fossem encarregados, sem prevenção, ás companhias interessadas, dois empregados do ministerio da fazenda de fazerem a fiscalisação.

(O discurso será publicado na integra guando s. exa. o restituir.)

O sr. Alexandre Cabral: - Mando para a mesa os pareceres da commissão de redacção sobre os projectos de lei n.ºs 53, 59 e 80.

Foram aprovados.

O sr. Presidente: - Está esgotada a inscripção. Vae ler-se o artigo 1.°, para se vota.

Lido na mesa, foi approvado.

O sr. Presidente: - Vae ler-se o artigo 2.º

Leu-se

O sr. Presidente: - Está em discussão.

(Pausa}

Como ninguem se inscreve, vae votar-se.

Foi approvado.

O sr. Presidente: - Vae ler-se o artigo 3.°

Leu-se.

O sr. Presidente: - Está em discussão.

(Pausa.)

Como ninguem se inscreve, vão votar se.

Foi approvado.

O sr. Presidente: - Vae ler-se o artigo 4.°

Leu-se.

O sr. Presidente: - Está em discussão.

(Pausa.)

Como ninguem se inscreve, vae votar-se.

Foi approvado.

O sr. Presidente: - Vae ler-se o artigo 5.°

Leu-se.

O sr. Presidente: - Está em discussão.

(Pausa.)

Como ninguem se inscreve, vae votar-se.

Foi approvado.

O sr. Presidente: - Vae ler-se o artigo 6.°

Leu-se.

O sr. Presidente: - Está em discussão.

(Pausa.)

Como ninguem se inscreve, vão votar-se.

Foi approvado.

O sr Presidente: - Vae ler-se, para entrar em discussão, outro projecto de lei.

Leu-se.

É o seguinte:

PROJECTO DE LEI N.° 21

Senhores. - Á vossa commissão de fazenda foi presente a proposta de lei n.° 13-1, providenciando sobre a applicação do imposto de rendimento aos juros, ou coupons, das obrigações que de futuro forem emittidas em Portugal por quaesquer sociedades anonymas, ou bancos, quando esses juros sejam pagaveis no estrangeiro.

A necessidade e a conveniencia da referida proposta estão precisamente justificadas no relatorio ministerial que a precede, e por isso a vossa commissão se limita, n'este parecer, a motivar as alterações que julgou conveniente introduzir na proposta para melhor garantia da sua efficacia.

Entendeu a commissão que aos juros de obrigações a emittir de futuro por quaesquer sociedades mercantis deveria ser applicado o imposto de rendimento, ainda quando taes sociedades não forem anonymas, evitando-se assim um regimen de isenção fiscal, que, alem de não corresponder ás intenções do governo, seria lesivo dos interesses do thesouro, e menos harmonico com o principio da possivel igualdade tributaria. N'esta conformidade supprimiu o qualificativo que restringiria a applicação do imposto unicamente as sociedades constituidas sob a fórma especial do anonymato, generalisando assim a incidencia do imposto, e, ao mesmo tempo, a muito acertada doutrina consignada no artigo 19.° da carta de lei de 3 de abril de 1896.

Pareceu tambem á commissão que conviria estabelecer uma disposição comminatoria tendente a evitar qualquer tentativa de infracção directa, ou por meio de artificio, dos preceitos fundamentaes da proposta. Foi attendida essa conveniencia no artigo 4.° do projecto de lei que a commissão sujeita ao vosso esclarecido exame. A nullidade resultante das transacções, ou contratos, referentes

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a titutlo; de obrigação geral não emittidos em harmonia com os mencionados preceitos, constituirá, sem duvida, uma efficaz sancção contra as infracções da nova lei.

As restantes alterações introduzidas na proposta tiveram por objecto ou simplificar a sua redacção, ou generalisar a applicação do seu artigo transitorio. As primeiras disponham qualquer justificação, e a ultima deriva da impossibilidade de tornar effectiva qualquer disposição fiscal em contrario, e corresponde ao pensamento que presidiu á elaboração do referido artigo.

Todas as alterações indicadas foram feitas de accordo com o governo, e n'estes termos a comnissão de fazenda é de parecer que a proposta de lei n.° 13-1 deve ser convertida no seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° A datar da publicação da presente lei o governo não poderá conceder approvação á creação o emissão de obrigações de bancos, ou de quaesquer sociedades, sem que o banco, ou sociedade, requerente satisfaça a todos os preceitos estabelecidos no artigo 18.°, e seus paragraphos, do decreto de 12 de julho de 1894, e se obrigue, alem d'isso, a pagar o imposto de rendimento de todas as obrigações a crear e emittir, ainda que os juros, ou coupons de todas, ou de parte d'ellas, não sejam satisfeitos em Portugal, ou, sendo-o, possam tambem ser exigidos em paiz, estrangeiro.

§ unico. A declaração de que os juros, ou coupons, são sujeitos, em todas as hypotheses de pagamento, ao imposto de rendimento em Portugal, será inscripta no texto de cada titulo.

Art. 2.° No «não do § 1.º do citado artigo 18.° do decreto de 12 de julho de 1894, a emissão só se considerará approvada sob as condições impostas no artigo 1.°, e seu paragrapho unico, da presente lei.

Art. 3.° As disposições precedentes applicar-se-hão a todos os estabelecimentos bancarios, ou sociedades, mesmo aquelles do que trata o artigo 19.º do citado decreto de 12 de julho de 1894, pela creação ou emissão de obrigações que pretenderem realisar de futuro, o que não tenham sido requeridas, ou não tiverem sido auctorisadas até 31 de dezembro de 1898.

Art. 4.° As transacções ou contratos relativos a obrigações, ou a quaesquer titulos de obrigação geral, seja qual for a denominação d'estes titulos, de bancos ou de quaesquer sociedades, serão considerados nullos para todos os effeitos, sempre que a omissão dos referidos titulos não for feita nos termos dos artigos precedentes.

Art. 5.º Todos os juros ou coupons, de obrigações emittidas até á data da presente lei por bancos, ou por quaesquer sociedades, que tenham contrato com o estado e estatuto; approvados pelo governo, e que, nos termos dos estatutos ou contratos, sejam pagaveis em paizes estrangeiros titulos de divida fundada externa portugueza, de juro reduzido, continuam isentos do imposto de rendimento, ainda quando taes juros ou coupons forem pagos em Portugal.

Art. 6.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da commissão de fazenda, 12 de abril de 1899. - Frederico Ressano Garcia = Augusto José da Cunha = Frederico Ramirez = Queiroz ribeiro = Luiz José Dias = Henrique de Carvalho Kendall = Francisco Felisberto Dias Costa, Relator = Tem voto do sr.: Adriano Anthero de Sousa Pinto.

N.º 13-1

Senhores. - As obrigações das companhias, bancos ou sociedades, e os titutos do estado pagaveis no estrangeiro estão de facto isentas do imposto de rendimento, porque é lá fóra que se realisa o pagamento, embora os recursos sejam creados no paiz e pertençam esses titulos em parte a nacionaes. Convem remediar esta falta nas futuras emissões, obrigando os estabelecimentos que collocarem esses papeis no estrangeiro a ficarem responsaveis pelo pagamento ao estado d'aquelle imposto, evitando-se assim que se fórma por este modo uma avultada parte do capital, se retribua annualmente e se amortise sem que o thesouro tenha a compensação devida. Resultará da providencia proposta que muitos d'esses titulos ficarão domiciliados no paiz, collocando-se aqui uma boa parte d'esses reditos em trabalhos nacionaes, pois é sabida a tendencia geral do possuidor de papeis de credito para empregar em emprezas da mesma natureza, e no paiz em que se fazem os pagamentos, o que excede na amortisação ao custo dos titulos, e ao mesmo tempo as economias que póde realisar nas suas despezas pessoaes.

Haverá, portanto, emprego mais util para o paiz dos capitães n'elle produzidos por emprezas industriaes, o que se me affigura de grande vantagem para o nosso desenvolvimento economico.

Diminuirá igualmente, e de um modo progressivo, a procura de cambiaes para o pagamento d'esses titulos no estrangeiro, no que lucrará tambem o estado:

Por todos estes motivos julgo que poderá merecer a vossa approvação a proposta de lei que sobre este assumpto tenho a honra de apresentar.

PROPOSTA DE LEI

Artigo l.º A datar da publicação d'esta lei o governo não poderá conceder approvação á creação e emissão de obrigações de bancos ou de quaesquer sociedades anonymas, sem que a sociedade requerente satisfaça a todos os preceitos estabelecidos no artigo 18.º e seus paragraphos do decreto de 12 de julho de 1894 e alem d'isso se obrigue a pagar o imposto de rendimento de todas as obrigações a crear e emittir, ainda que os juros ou coupons de todas ou de parte d'ellas não sejam satisfeitos em Portugal, on, sendo-o, possam tambem ser exigidos em paiz estrangeiro.

§ unico. A declaração de que os juros ou coupons são sujeitos, em todas as hypotheses de pagamento, ao imposto de rendimento em Portugal será inscripta no corpo de cada titulo.

Art. 2.° No caso do § 1.º do n.° 2 do artigo 18.° do citado decreto de 12 do julho de 1894, a omissão só se considera approvada com a condição imposta no artigo l.º d'esta lei e seu paragrapho unico.

Art. 3.° As disposições dos artigos antecedentes applicar-se-hão a todos os estabelecimentos ou sociedades anonymas, mesmo aquellas de que trata o artigo 19.° do citado decreto de 12 de julho de 1894, pela creação ou emissão de titulos que pretenderem realisar de futuro e que não tenham sido requeridas ou não tivessem sido auctorisadas até 31 de dezembro de 1898, sem embargo de quaesquer disposições de contratos celebrados com o estado ou de estatutos approvados pelo governo.

§ unico. Em relação, porém, a emissões não effectuadas ainda, mas que tenham sido expressamente auctorisadas, não só em relação á quantidade mas ao valor de cada titulo, em virtude de contratos com o governo, continuará a regular a legislação vigente de conformidade com os mesmos contratos e estatutos.

Art. 4.º Todos os coupons ou juros de obrigações emittidas até esta data por companhias ou bancos que tenham contrato com o estado e estatutos approvados pelo governo e que, nos termos dos mesmos estatutos devam ser pagos em paizes estrangeiros, e os titulos de divida fundada externa do governo portuguez de juro reduzido continuam isentos do imposto de rendimento, mesmo quando taes juros ou coupons forem satisfeitos no paiz.

Art. 5.° Fica revogada a legislação contraria a esta.

Secretaria d'estado dos negocios da fazenda, aos 10 de março de 1899. = Manuel Affonso de Espregueira

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O sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 1.°

O sr. Conde de Burnay: - Diz que o projecto é mais um estorvo, mais uma peia ao commercio, á industria e ao desenvolvimento das forças vivas da nação.

Não comprehende que o governo esteja, por um lado, a pedir dinheiro ao estrangeiro, e por outro, a apertar e torniquete, embaraçando as companhias de o conseguirem.

Está convencido, porém, de que o projecto não dará nada, porque os bancos e companhias que precisarem de dinheiro do estrangeiro hão de descobrir meio de o conseguir, fugindo ao imposto. Julga-o, por isso, inutil.

(O discurso será publicado na integra guando s. exa. o restituir).

O sr. Dias Costa (relator): - Responde que o projecto não visa a pôr embaraços ao commercio e á industria; o seu fim é apenas collocar em pé de igualdade as obrigações cujos juros são pagos no estrangeiro e aquellas cujos juros são pagos em Portugal.

Até aqui as primeiras estavam isentas do imposto; agora ficam sujeitas a elle.

(O discurso será publicado na integra guando o orador o restituir).

O sr. Conde de Burnay: - Insiste na sua opinião de que o projecto nada póde render.

Só os titulos do estado poderiam trazer algum resultado, mas esses ficam exceptuados, como tambem o são os titulos do banco de Portugal, do banco ultramarino, da companhia dos tabacos e da companhia dos phosphoros.

A seu ver, o imposto de rendimento seria o mais rasoavel, e por isso não é contra elle, se for achada a fórma pratica de o cobrar.

(O discurso será publicado na integra quando o orador o restituir).

O sr. Presidente: - Como não está mais nenhum sr. deputado inscripto, vae votar-se.

Foi approvado o artigo 1.°

O sr. Presidente: - Vae ler se, para entrar em discussão, o artigo 2.°

Leu-se.

O sr. Dias Costa (relator): - Mando para a mesa a seguinte

Proposta

Proponho que os artigos 2.° a 6.° do projecto de lei n.° 21 sejam discutidos conjunctamente. = F. F. Dias Costa.

Foi approvada.

O sr. Presidente: - Vão ler-se os artigos para entrarem em discussão.

Leram-se.

O sr. Presidente: - Estão em discussão os artigos 2.°, 3.º, 4.°, 5.° e 6.°

O sr. Conde de Burnay: - Observa que o artigo 3.° tem effeito retroactivo, por isso que leva o imposto a companhias que, pelos seus contratos e estatutos, approvados pelo governo, estavam isentas d'elle.

Não comprehende que vão assim rasgar-se aquelles contratos e estatutos.

A disposição do projecto é tão perigosa, que julga do seu dever chamar para ella toda a attenção da camara, ponderando-lhe que não se devem celebrar contratos para se faltar depois a elles.

Pergunta depois em que situação ficam as obrigações dos tabacos, e, notando que o artigo 3.° se refere a obrigações que tenham sido emittidas até 31 de dezembro de 1898, lembra que será melhor substituir esta data pela da publicação da lei, porque desde então talvez já algumas sociedades se tenham constituido.

(O discurso será publicado na integra quando s. exa. o restituir.)

O sr. Ministro da Fazenda (Affonso de Espregueira): - Sr. presidente, poucas palavras direi em resposta ao que acaba de dizer o illustre deputado, porque me parece que s. exa. não alcançou bem o fim d'este projecto. Cingindo-me ás perguntas que s. exa. fez, devo dizer que as disposições do artigo 3.° se referem exactamente a todos os estabelecimentos que estejam em dadas condições, respeitando-se os contratos existentes. Foi este o motivo porque, por deliberação da commissão, com a qual concordei absolutamente, se riscaram as palavras - sem embargo - que inseri na proposta que tive a honra de apresentar á camara. Foi exactamente para que não se lhe desse uma interpretação diversa d'aquella que eu tinha visto, que concordei com a commissão em que se eliminassem do projecto.

(Interrupção do sr. conde de Burnay.).

Não é isso, referem-se a todos os estabelecimentos, respeitando as condições dos contratos que já tenham sido realisados.

Se qualquer contrato com o estado contiver a clausula de que a sociedade a que elle respeita fica dispensada do pagamento do imposto de rendimento, este projecto não invalida essa clausula. Num contrato bilateral, o que faz lei para as duas partes contratantes é o que n'elle se encontra estipulado.

Este projecto não se applica portanto aos contratos n'essas condições, mas aos que de futuro venham a realisar-se, estabelecendo-se a regra geral de que todas as obrigações ficam sujeitas ao imposto, quer os juros sejam pagos no paiz, quer no estrangeiro.

Com respeito á data em que as disposições d'este projecto começam a ter execução, estou de accordo em que seja a data da publicação da lei.

Relativamente ás obrigações dos tabacos, direi que apenas ficam sujeitas ao imposto de rendimento as que de futuro forem emittidas. Esta lei, tem por fim prevenir uma falta grave que havia na nossa legislação, por isso que muitas sociedades estabelecidas posteriormente á data ia lei do imposto de rendimento emittiram as suas obrigações no estrangeiro, onde tambem pagavam os juros, eximindo-se assim ao pagamento do imposto de rendimento, accrescendo ainda a circumstancia de que muitas sociedades, nas condições que acabo de citar, têem, póde dizer-se, todo o seu capital em obrigações. Citarei, como exemplo a companhia da Beira Alta, de que as suas acções são verdadeiras obrigações, o que faz com que estejam isentas do pagamento de qualquer imposto, o que não é justo. (Apoiados.)

Este projecto, portanto, resalvando direitos adquiridos, estabelece regras geraes a que ficam sujeitas todas as sociedades que para o futuro emittirem ou crearem obrigações, muito embora os juros não sejam pagos no paiz.

Parecendo insignificante, este projecto tem por fim regularisar uma situação que era irregularissima.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Conde de Burnay: - Ouviu com toda a attenção a resposta que lhe deu o sr. ministro da fazenda; mas parece-lhe que as declarações de s. exa. estão em contraio com o que se lê no projecto.

Disse s. exa. que o espirito da proposta de lei é excluir das suas disposições todas as sociedades e companhias que pelos seus estatutos e contratos, approvados pelo governo, tinham direitos consignados para a emissão de obrigações; mas o que se deprehende do artigo 3.° é exactamente o contrario, porque n'elle se diz que as disposições do projecto serão applicadas a todos os estabelecimentos bancarios ou sociedades, mesmo aquelles de que trata o artigo 20.° da carta de lei de 3 de abril de 1896.

Para harmonisar este artigo com a declaração do sr. ministro, entende que se devem substituir as palavras «mesmo aquelles» pelas palavras «excepto aquelles».

Entende ainda que, para ficar este artigo perfeitamente harmonico com as declarações do sr. ministro da fazenda, se devem substituir, no final d'elle, as palavras «31 de

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6 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

dezembro de 1898» pelas palavra «á data da publicação da presente lei.»

Disse s. exa. tambem que as obrigações dos tabacos estão incluidas nas disposições relativas ás companhias e outras emprezas que tenham emittido titulos, em virtude dos seus contratos. Ora, as obrigações, das companhias dos tabacos não podem, a seu ver, estar incluidas n'esta disposição, porque não são emittidas pela companhia, mas pelo governo. Não póde, por consequencia, referir-se a elles a primeira parte do artigo 5.°, que visa apenas as obrigações emittidas por sociedades e bancos.

Essas obrigações não, como nos proprios titulos se declara, de divida fundada, e por consequencia encontram-se na situação differente.

Entende, por isto, que se devem supprimir n'esse artigo as palavras de «juro recebido».

No sentido das considerações expostas, o orador manda para a mesa a seguinte

Proposta

l.ª

Proponho que no artigo 3.° sejam substituidas as palavras «31 de dezembro de 1898», pelas seguintes: «á data da publicação da presente lei».

2.ª

Substituir as palavras «mesmo aquellas» por «excepto aquellas».

3.ª

No artigo 5.º supprimir as palavras «de juro reduzido». - Conde de Burnay.»

Foi admittida.

(O discurso será publicado na integra quando s. exa. o restituir.)

O sr. Presidente: - Está esgotada a inscripção. Vae ler-se, para, se votar, a proposta mandada para a mesa pelo sr. conde de Burnay.

Leu-se.

O sr. Dias Costa (relator): - Por parte da commissão de accordo com o governo, declaro a v. exa. que a commissão acceita a primeira parte da emenda do sr. conde de Burnay, com respeito á data da publicação.

Quanto á segunda parte, não a póde acceitar, porque o artigo respectivo refere-se a emissões que se fizerem do futuro, e nenhuma companhia póde fazer emissões, sem auctorisação.

Pelo que respeita á 3.ª parte, sendo as obrigações dos tabacos emittidas pela companhia, embora com a natureza de divida fundada, não ha necessidade de se adoptar essa emenda.

Foi approvada a primeira parte da proposta e rejeitadas as duas outras.

O sr. Presidente: - Vão ler-se, para se votar, os artigos 2.º, 3.º, 4.º 5.º e 6.º

Foram lidos e seguidamente approvados.

O sr. Carlos Ferreira: - Mando para a mesa a seguinte

Proposta

Em nome da commissão do inquerito parlamentar á direcção geral do ultramar, no ministerio da marinha, proponho que ella seja auctorisada a funccionar no intervallo das sessões parlamentares, e lhe sejam aggregados os srs. deputados Alberto Monteiro e Fortuna Rosado. = O secretario, Carlos Ferreira.

Foi approvado.

O sr. Ministro das Obras Publicas (Elvino de Brito: - Mando para mesa e peço que, obtida a permissão da camara, sejam publicados no Diario do governo, os documentos que se referem a um facto, occorrido na fiscalisação do norte e leste, o que destroem, por completo, o valor da accusação, feita em uma das ultimas sessões pelo sr. Alberto Monteiro.

Pela minha parte, em vista d'esses documentos, considero completa e absolutamente isento de qualquer responsabilidade o honrado e intelligente chefe dos serviços da fiscalisação do caminho de ferro do norte e leste.

(S. exa. não reviu.)

Foi auctorisada a publicação.

O sr. Conde de Burnay: - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Projecto n.° 87:

Requeiro que fiquem inseridas na acta as declarações do illustre deputado sr. Dias Costa, relator do projecto, «que as obrigações da companhia dos tabacos estavam incluidas no artigo 5.° do projecto n.° 21. = Conde de Burnay

O sr. Presidente: - O requerimento do illustre deputado fica na mesa para ser submettido á votação na altura conveniente.

Vae ler-se, para entrar em discussão, outro projecto de lei.

Leu-se. É o seguinte

PROJECTO DE LEI N.º 81

Senhores. - Á vossa commissão de fazenda foi presente a modificação feita pela camara dos dignos pares á vossa proposição de lei alterando, de accordo com a companhia os tabacos de Portugal, o contrato de 26 de fevereiro de 1891, approvado pela carta de lei de 23 de março do mesmo anno, e auctorisando tambem o governo a effectuar as operações financeiras indicadas na mesma proposição.

A mencionada companhia não havendo acceitado, nem reservas, as bases que deveriam regular o dito contrato, e que vós aprovastes na sessão legislativa de 1897, e havendo-se tambem modificado as circumstancias que então presidiram á elaboração do projecto de lei n.° 36 referente ao assumpto, entendeu agora o governo que mais conviria aos interesses do estado limitar as auctorisações, que solicitára ás côrtes n'aquella epocha, unicamente á faculdade de reembolsar a importancia devida pelas obrigações emittidas na conformidade das cartas de lei de 23 de março de 1891 e 21 de maio de 1896, e a contratar a emissão e collocação de novas obrigações, amortisaveis em praso não excedente a setenta o cinco annos.

Os termos d'estas auctorisações são as do § 2.° do artigo 2.° do citado projecto, apenas sem a garantia que ao tempo da approvação d'elle era assegurada aos portadores de obrigações tornando-lhes facultativo até 1 de fevereiro de 1900 o reembolso dos seus titulos do credito, e só obrigatorio depois d'aquella data, garantia que resultava das disposições da lei de 23 de março de 1891.

Segundo estas disposições o governo tem a faculdade de fazer o reembolso em qualquer epocha ulterior a 1 de janeiro de 1900, com previo aviso de seis mezes aos portadores das obrigações, e, portanto, se este aviso se fizer até 30 do corrente, desnecessaria se torna a consignação da referida garantia.

N'estes termos a vossa commissão de fazenda é de parecer, de accordo com o governo, que mereço a vossa approvação, e devo ser convertida em lei, a seguinte

Modificação feita pela camara dos dignos pares á proposição de lei da camara dos senhores deputados, que altera, de accordo com a companhia dos tabacos de Portugal o contrato de 26 de fevereiro de 1891.

Artigo 1.° É o governo auctorisado:

A reembolsar a importancia devida pelas obrigações em

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SESSÃO N.° 110 DE 12 DE JULHO DE 1899 7

circulação, emittidas em conformidade com as leis de 23 de março de 1891 e 21 de maio de 1896, com a garantia especial no rendimento dos tabacos;

A contratar a emissão e collocação de novas obrigações, amortisaveis em praso não excedente a setenta e cinco annos, e garantidas pelo rendimento dos tabacos, nos termos e com as condições que forem mais convenientes ao estado, não podendo, todavia, o encargo total d'esta operação exceder a 5 1/2 por cento ao anno do capital novamente emittido.

§ unico. O governo dará conta ás côrtes do uso que fizer d'esta auctorisação.

Art. 2 ° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da commissão de fazenda, 19 de junho de 1899. = José Dias Ferreira (vencido) = Frederico Ressano Garcia = Augusto José da Cunha = Frederico Ramirez = Leopoldo Mourão = Queiroz Ribeiro = Luiz José Dias = Francisco Felisberto Dias Costa, relator = Tem voto do sr.: Adriano Anthero.

Modificação feita pela camara dos dignos pares á proposição de lei da camara dos senhores deputados, que altera, de accordo com a companhia dos tabacos de Portugal, o contrato de 26 de fevereiro de 1891

Artigo 1.° É o governo auctorisado:

A reembolsar a importancia devida pelas obrigações em circulação, emittidas em conformidade com as leis de 23 de março de 1891 e 21 de maio de 1896, com a garantia especial no rendimento dos tabacos;

A contratar a emissão e collocação de novas obrigações, amortisaveis em praso não excedente a setenta e cinco annos, e garantidas pelo rendimento dos tabacos, nos termos e com as condições que forem mais convenientes ao estado, não podendo, todavia, o encargo total d'esta operação exceder a 5 1/2 por cento ao anno do capital novamente emittido.

§ unico. O governo dará conta ás côrtes do uso que fizer d'esta auctorisação.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 12 de junho de 1899. = José Maria Rodrigues de Carvalho = Julio Carlos de Abreu e Sousa = José Vaz Correia de Seabra Lacerda.

O sr. Presidente: - Está em discussão.

O sr. Dias Ferreira: - Historia o que se tem passado, com relação á receita, dos tabacos, accentuando que tem sempre impugnado todos os projectos relativos a este assumpto.

Pelo projecto apresentado á camara, e por ella approvado, em 1897, alienava, se a receita dos tabacos por setenta e cinco annos, com o fundamento de que era necessario contrahir um grande emprestimo em oiro, para fortificar os recursos do banco de Portugal e acudir ás circumstancias precarias do thesouro. Dois annos volvidos, a camara dos dignos pares, apreciando esse projecto, e convertendo-o n'aquelle que hoje se discute, concede auctorisação ao governo para alienar essa receita, mas põe de parte o emprestimo.

Surprehende o um tal procedimento, porque, se o projecto de 1897 se explicava pela necessidade que se dizia imprescindivel do emprestimo, para este não encontra explicação.

Vota, pois, contra este, como votou contra aquelle, e entende que a camara prestava um serviço importante ao paiz rejeitando-o, porque d'elle póde resultar em grave perigo.

Consiste esse perigo em que, sendo essas obrigações garantidas pelo estado, quando o rendimento dos tabacos não chegue, terá o estado de pôr o resto, o que não é impossivel de succeder, porque basta para isso que se eleve bastante o agio do oiro.

Quanto á auctorisação concedida ao governo para o reembolso da importancia devida pelas obrigações em circulação, não lhe parece que ella fosse necessaria, pois que já existia na lei.

O que acha extraordinario é que vão pagar-se a 500 francos obrigações que o governo vendeu a 402 e mesmo a 350 francos.

A emissão de novas obrigações com o encargo de 5 1/2 por cento, de que trata o segundo periodo do artigo 1.°, parece-lhe que devia ser esclarecida, porque não se sabe se n'esse encargo figura 1 por conto para o contratador, que necessariamente ha de haver, 1/4 para a corretagem e lfr ,75 para as despezas de emissão e sêllo, que em França é bastante elevado.

Mas estejam ou não essas despezas comprehendidas, como os 5 1/2 se referem ao nominal, se as obrigações forem emittidas a 50 por cento, o encargo não será de 5 1/2, mas de 11 por cento.

Por todas estas rasões, e ainda outras que o orador expõe, é sua convicção que, se o projecto approvado em 1897 era mau, este é pessimo.

(O discurso será publicado na integra quando s. exa. o restituir.)

O sr. Alexandre Cabral: - Mando para a mesa as ultimas redacções dos projectos de lei n.ºs 21 e 87.

Foram approvadas.

O sr. Presidente: - Vou submetter á votação o requerimento mandado para a mesa pelo sr. conde de Burnay.

Foi rejeitado.

O sr. Ministro da Fazenda (Manuel Affonso de Espregueira): - No adiantado da sessão, não espere a camara que eu vá acompanhar o illustre deputado em todo o seu discurso, não porque não tenha por s. exa. a maior consideração, mas porque muitos dos pontos a que s. exa. se referiu são completamente estranhos ao assumpto que se discute.

Não me referirei ao orçamento da guerra, nem a outros assumptos de que s. exa. se occupou, e limitar-me-hei simplesmente a explicar o pensamento do governo pelo que respeita a este projecto e a responder ás perguntas por s. exa. formuladas.

A camara sabe muito bem que a auctorisação que n'este projecto se pede já foi dada, embora em outros termos, por esta camara, ha dois annos, differenciando-se este projecto do que então aqui foi discutido, simplesmente porque o governo prescindiu de duas das auctorisações que lhe tinham sido conferidas, a que se referia ao supprimento, o que se explica perfeitamente, por isso que o pagamento ou o reembolso das obrigações dos tabacos só começa em janeiro de 1900, e a que, dizia respeito á novação do contrato com a companhia dos tabacos, que é dispensada, porque, alem de terem variado as circumstancias, a propria companhia não acceitou o projecto nas condições em que foi votado por esta camara.

Excluidas estas duas auctorisações, fica de pé unicamente a relativa ao reembolso das obrigações dos tabacos. A esse respeito, devo dizer que, em todo o seu discurso, o sr. Dias Ferreira parece ter-se esquecido de que já estavam em circulação essas obrigações, argumentando como se fosse um emprestimo que vamos estabelecer e com novas condições, quando não se trata de nada d'isso.

Disse tambem o illustre deputado, que a auctorisação concedida por este projecto era desnecessaria, por isso que o governo, pelo contrato celebrado com a companhia dos tabacos, já estava armado com auctorisação identica. Devo dizer a s exa., que é um jurisconsulto distinctissimo e respeitavel, (Apoiados.) que esse argumento não está á altura das aptidões e capacidade de s. exa.

Existe, com effeito, pelo contrato, a obrigação para a companhia de acceitar o reembolso ou pagamento das obrigações decorrido um certo praso, que foi fixado para ja-

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8 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

neiro de 1900, e ha tambem para o estado o direito de fazer esse reembolso; mas o governo é que não estava habilitado com os meios necessarios para o realisar, e é isso o que se póde.

O governo póde reembolsar o emprestimo que contrahiu em 1892, quando e como entender conveniente, a partir de 1 de janeiro de 1900, com a restricção apenas de que deverá, em qualquer epocha, avisar os interessados com seis mezes de antecedencia, mas para isso é necessario que o parlamento dê as auctorisações legaes para que o governo possa obter os meios necessarios para realisar essa operação, quando entender util aos interesses do estado. É isso o que por este projecto se pretende.

Trata-se de fazer um reembolso em condições mais favoraveis para o thesouro e ahi está a vantagem da operação. (Apoiados.)

Disse s. exa. que não comprehende como se vão pagar por 500 francos uns titulos que o estado vendeu a 350 francos.

De facto o governo vendou alguns por esse preço, mas todas as conversões que se fazem de titulos publicos ou de companhias fazem-se por um preço superior ao da emissão d'esses titulos, nem de outro modo se comprehende o que seja uma conversão.

Como s. exa. sabe, e muito bem, todos os governos, inglez, belga e francez, têem feito conversões da divida dos respectivos paizes quando esses titulos attingem o par, excepto nos titulos da divida consolidada, porque paga o nominal.

Esses titulos foram emittidos muito abaixo da cotação que attingiram, e só quando chegam a attingir o nominal, ou o excedera, é que se faz a conversão com essa reducção de encargos.

O que se procura obter, quando se faz um emprestimo, é o menor encargo, e quanto menos for a somma que se paga, qualquer que seja a fórma da amortisação, mais vantajoso fica o emprestimo.

As obrigações dos tabacos são titulos de 4 1/2 por cento, com uma garantia de primeiríssima ordem, pois têem a garantia do estado e a da companhia.

O governo está auctorisado a reembolsar essas obrigações pelo preço de 500 francos, a que se obrigou; mas, ao em vez de 4 1/2 por cento do juro, poder pagar 4 por canto, tem uma vantagem consideravel; e se, em vez da amortisação se fazer em setenta e cinco annos, se puder adiar por mais tempo, maior é ainda a vantagem, porque se reduz a annuidade.

Na situação actual do thesouro, o que convem principalmente é diminuir os encargos presentes, estabelecendo-se uma norma que permitta de futuro um melhoramento na nossa situação financeira, e este projecto ha de contribuir para se obter esse resultado.

Se se realisar a operação, o estado ha de ter uma diminuição de encargos em relação ao capital que está subscripto e existe um circulação, e alem d'isso ha de permittir mais um melhoramento no proprio rendimento da companhia dos tabacos.

Pergunto: ha de o governo hesitar e perder a occasião que se lhe póde apresentar, de fazer uma operação d'esta ordem?

Parece me que não, e, portanto, o que faz o governo? Pede ao parlamento que o auctorise a realisar esta operação, quando se apresente a occasião que permitta uma reducção consideravel nos encargos, em relação ao capital que deve á companhia dos tabacos, no que respeita á conversão ou ao reembolso das obrigações que estão actualmente em circulação. Isso é que é a parte importante d'este projecto.

Mas, diz o illustre deputado, - vae fazer-se um emprestimo. Poderá fazer-se o emprestimo, se com o encargo actual, o governo poder collocar as obrigações que sejam sufficientes, não só para o pagamento do que devo á companhia dos tabacos, mas para as urgencias do thesouro. Desde o momento em que, com o alargamento do praso para a amortisação e a diminuição do juro, o governo possa obter, com o mesmo encargo annual, não só o pagamento da amortisação, mas o capital pelo qual não pagará encargo absolutamente nenhum, o governo não terá duvida em fazer esse emprestimo.

Por este projecto, o governo fica com uma auctorisação legal e permanente, de que elle ou os seus successores poderão utilisar, logo que as circumstancias dos mercados lhe permittam fazer essa operação em condições vantajosas para o estado.

Usará o governo d'esta auctorisação? Não sei. Usarão os seus successores? Tambem não sei.

As circumstancias é que hão de determinar o seu proceder.

Já vê o illustre deputado, pelo que acabo de expor, que, ao contrario do que s. exa. disse, é necessaria esta auctorisação, porque a que se encontra no contrato, feita com a companhia, não é sufficiente.

O fim que este projecto tem em vista é, como disse, conceder ao governo, a este ou a outro qualquer, uma auctorisação para fazer a remissão das obrigações em circulação, quando o julgue conveniente.

É exacto que vão pagar-se a 500 francos obrigações que foram vendidas a preços mais baixo; mas isso não importa, como s. exa. suppõe, encargo para o estado.

As obrigações dos tabacos são de 4 1/2, com garantia de primeira ordem e se o governo em vez de pagar 4 1/2, conseguir pagar 4 por cento, é evidente que ha de tirar uma vantagem consideravel, vantagem que será ainda maior se em vez de fazer a amortisação em trinta e cinco annos a poder adiar para mais tarde.

Parece-me ter respondido às observações do illustre deputado, e dado explicações sufficientes para o satisfazerem, mas se de mais algumas v. exa. necessitar estou inteiramente ao seu dispôr.

Vozes: - Muito bem, muito bem.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Presidente: - Hoje ha sessão nocturna, devendo fazer-se a primeira chamada ás oito horas e meia.

A ordem da noite é a mesma que estava dada para hoje, e mais os projectos n.ºs 83, 98, 61, 109 e 110.

A discussão do projecto n.° 84, deverá continuar na sessão diurna de ámanhã.

Está encerrada a sessão.

Eram duas horas e um quarto da tarde.

O redactor = Sá Nogueira.

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APPENDICE Á SESSÃO N.º 110 DE 12 DE JULHO DE 1899 1

Discurso proferido pelo sr. deputado Dias Ferreira, que devia ler-se a pag. 7 da sessão n.º 110 de 12 de julho de 1899

O sr. Dias Ferreira: - Sr. presidente, temos outra vez no debate o famoso projecto de alienação da receita dos tabacos por setenta e cinco annos!

Sr. presidente. Não vale a pena n'esta aturada sessão fazer largas considerações sobre o assumpto. Mas não deixarei de impugnar o projecto, como tenho impugnado sempre todas as providencias, que reputo fataes para os interesses do paiz. Começa por não ser possivel medir o alcance do parecer sem claras explicações do governo sobre os pontos de mais alta importancia.

Sr. presidente, a primeira cousa que se não comprehende, é que o governo insista na alienação por setenta e cinco annos da receita dos tabacos, ao mesmo tempo que declara que não precisa de emprestimo!

Quando veiu pela primeira vez ás côrtes na sessão legislativa de 1897 o parecer em discussão, o pensamento da medida era fazer mais um emprestimo! Debaixo d'essa impressão se encerraram as camaras, ficando o projecto na camara dos dignos pares, onde dormiu o largo periodo de perto de dois annos!

Grande serviço prestariam as côrtes ao paiz se agora o deixassem a dormir n'esta casa pelo menos outro tanto tempo!

Mas apesar das declarações do governo o projecto da alienação dos tabacos por setenta e cinco annos obedece a final á idéa de levantar um emprestimo, e representa portanto o aggravamento das condições do orçamento pelo augmento de encargos a pagar em oiro!

Ha dois annos que, estando aliás o paiz como hoje em tranquillidade apparente, parecia aos governantes que Catilina já batia ás portas de Roma, e sacrificavam tudo ao levantamento de um grande emprestimo!

Ha dois annos era preciso obter por emprestimo oiro, e muito oiro, para desafogar durante um periodo largo a situação do thesouro, e desenvolver o commercio e a industria, por fórma que findo esse periodo podessemos pagar sem sacrificio não só os encargos da divida já existente, mas ainda os encargos da nova divida que vinha trazer a prosperidade ás finanças do thesouro!

Por este systema quanto maior fosse o emprestimo mais felizes nós ficavamos!

Agora dá se precisamente o caso que, nem no continente africano, nem no archipelago dos Açores, nem na metropole, se tem sentido a acção do governo, quer no desenvolvimento financeiro, quer no desenvolvimento economico!

Tambem então vinha sempre á téla do debate como argumento para fundamentar o emprestimo, a necessidade se reforçar as reservas do banco de Portugal!

Agora já a necessidade de augmentar as reservas do banco de Portugal não é argumento para os grandes emprestimos. Passou de moda este pretexto! A questão de nos empenharmos cada vez mais é agora considerada condição indispensavel para regularisarmos a nossa situação com os credores! Quanto mais devermos melhor estamos de credores!

Tudo isto, porém, era mera conversa! Em Portugal não são necessarios argumentos para justificar um emprestimo!

Os emprestimos estão-nos na massa do sangue!

Por mais que varie a feição de qualquer projecto, no fundo temos o emprestimo e sempre o emprestimo!

Nem ha governo com larga vida, governos d'aquelles que se chamam governos fortes sem o emprestimo!

Tambem agora é argumento para augmentar os encargos do thesouro a conveniencia de acudir á questão dos cambios, como se a sustentação do cambio por meios artificiaes não importasse mais dia menos dia ruina para o thesouro e desgraça para os particulares!

Sr. presidente, na sessão de 1897 vinha a alienação da renda dos tabacos durante setenta e cinco annos ligada ao levantamento de um emprestimo, que a camara com o governo reputava indispensavel para se desenvolver o tal fomento que nunca appareceu, nem apparecerá!

Em todo o caso votou então a camara o projecto da alienação dos tabacos como base para um avultado emprestimo, que se reputava n'aquella epocha uma grande necessidade publica!

Vae o projecto á camara dos dignos pares do reino, e ahi o sr. ministro da fazenda mantem a alienação da renda dos tabacos por setenta e cinco annos, mas declara que não precisa do emprestimo!

Diz o parecer da commissão de fazenda da camara dos dignos pares:

«Senhores. - Tendo o governo pedido á vossa commissão de fazenda que apreciasse e desse o seu parecer sobre o projecto n.° 51, vindo da camara dos senhores deputados na sessão de 1897, declarando n'essa occasião o sr. ministro da fazenda que prescindia do artigo 1.° e seu paragrapho 1.° do artigo 2.° do referido projecto.»

Declarou á commissão de fazenda, pois, o governo na outra casa do parlamento, que prescindia do supprimento em oiro, que era o objecto do artigo 1.° e seu paragrapho e do n.° 1.° do artigo 2.°

Agora pretendo eu saber para que é que o governo quer a alienação da renda dos tabacos por setenta e cinco annos, quando já prescinde do emprestimo?

Agora o governo só pede auctorisação para reembolsar a importancia devida pelas obrigações dos tabacos em circulação. Mas para isso não é precisa a proposta, pois que para remir as obrigações está o governo auctorisado no proprio contrato de emprestimo desde que chegue o anno e 1900.

Para que é então a auctorisação pedida?

Tambem se não percebe a rasão por que o parecer da commissão declara poder annunciar-se já em 30 de junho o reembolso da importancia das obrigações em circulação, por ser de seis mezes o periodo para denunciar o contrato e annunciar aos portadores das obrigações que podem receber o valor do seu titulo, pois que o final do periodo marcado no annuncio ha de coincidir com a epocha do coupon.

O annuncio limita-se a declarar aos portadores de titulos que o coupon a pagar é o ultimo, a fim de elles se prepararem para receber o capital do titulo.

Ora sendo o coupon das obrigações dos tabacos pagavel em 1 de abril e em 1 de outubro, não se percebe bem como o governo possa annunciar o reembolso das obrigações com seis mezes de antecipação a contar de 30 de junho!

Nem esta pressa em realisar similhante operação financeira tem explicação plausivel nas actuaes circumstancias

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2 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

desde que o sr. ministro da fazenda declarou na camara dos dignem pares que não precisa agora de emprestimos!

Sr. presidente, sei perfeitamente que as minhas considerações não calam, nem no animo da camara, nem no espirito publico. Com os interesses do paiz ninguem se importa, nem os representantes, nem o proprio representado!

Mas creio não cumprir a minha missão de deputado, deixando de expor á camara a situação perigosissima que cria ao paiz com este projecto, goste ou não goste o povo de que lhe defendam os seus interesses.

Sr. presidente, alienadas as receitas das alfandegas e o rendimento dos tabacos segue-se n'outro anno a alienação do imposto do sêllo.

Tambem nos paizes que se governavam, como o nosso, alguns dos quaes começaram logo por onde o nosso ha de acabar, as receitas dos tabacos e das alfandegas eram as primeiras alienadas, seguindo-se logo a receita do sêllo.

Os credores estrangeiros escolhem estes rendimentos de preferencia para a consignação, porque são seguros e infalliveis.

O que elles não appetecem para garantir qualquer operação financeira é o imposto do pescado, ou o imposto de matriculas e costas, ou o imposto de carga, ou a contribuição industrial.

Tambem gostam muito de receitas constituidas em monopolios.

Outro aspecto, e extremamente grave, suscita a questão da alienação da receita dos tabacos por setenta e cinco annos, para que chamo a attenção da camara, que ha de resolver como muito bem entender.

Eu, com largos annos de parlamento, nunca me insurgi contra as deliberações da camara.

Procurava porém resalvar o voto, como era meu direito e meu dever.

Sempre que os partidos se congregavam para votar medidas ruinosas para a nação, como para approvar salamancadas, questões da mala real, portos de Lisboa e de Leixões, e outras medidas de igual natureza, limitava-me, findos os debates, em que sempre tomava parte, a pedir votação nominal, para poder figurar só na votação. Agora nem isso faço, porque a minha insistencia sem resultado podia ser tomada como desconsideração pelos meus collegas.

Mas o ponto grave em que eu quero insistir, e para que chamo a attenção da camara, é para o facto de, conjunctamente com a alienação da receita dos tabacos por setenta e cinco annos, compremettermos todas as outras receitas do estado.

Agora já se não definem as operações financeiras nas suas condições e respectivos encargos.

Em 1897 ainda o governo confessava que queria um emprestimo de 10:000 ou 12:000 contos de réis em oiro. Agora, porém, até essa cerimonia acabou! Agora para alcançar a votação d'esse projecto já o governo não precisa de dar satisfação aos representantes do povo. Basta-lhe dizer que as condições da operação são as que o governo julgar mais convenientes!

Podem ser as do contrato de 1891, como o governo declara, ou quaesquer outras.

Ora uma das condições do contrato de 1891 era a prohibição ao governo de fazer outros emprestimos, dentro do praso de dois annos, sem previo accordo com os contratadores, condição que ficará tambem n'este projecto, porque é uma das mais affrontosas em operações financeiras!

O que são essas condições mais vantajosas para o estado que o governo ha de acceitar na operação financeira vou eu dizel-o á camara.

É a primeira dar aos titulos das novas obrigações dos tabacos a natureza de divida publica, pagaveis por quaesquer outros rendimentos, quando o dos tabacos não chegue, porque o estrangeiro não faz o emprestimo, apesar de seguro com a caução sobre a receita dos tabacos, sem os titulos da operação serem considerados para todos os effeitos como divida publica!

Com esta condição vantajosa aos interesses do estado, que é de certo impreterivel no contrato, só o cambio chegar a situação tão desfavoravel que a receita dos tabacos não seja sufficiente para pagar o juro e á amortisação das obrigações, ha de pagar-se o que faltar pelas outras receitas do estado.

Não sei se já mesmo no regimen vigente, no periodo de maior depressão cambial, o governo chegou a supprir com outras receitas do estado o deficit do rendimento dos tabacos para encobrir os encargos das obrigações.

Pelo menos, segundo as minhas informações, a companhia chegou a dirigir-se ao governo, reclamando o cumprimento integral das condições do contrato, n'esta parte, quando o cambio desceu abaixo de 30.

Soffrendo tamanha depressão o cambio, já a receita dos tabacos não chega para pagar os encargos da operação, e estão ipso facto compromettidas todas as outras receitas do estado, e nós sem recursos para occorrer ás necessidades da segurança, da justiça, da instrucção e mais serviços publicos.

Ora a obrigação dos governos e dos parlamentos é prevenir o peor!

Se querem alienar as receitas dos tabacos por setenta e cinco annos, deixem, ao menos, salvos os outros rendimentos do estado e declarem no projecto que as obrigações emittidas nunca poderão absorver senão os rendimentos da caução, e que os pagamentos serão rateados quando a receita dos tabacos não chegar para integral satisfação de juros e da amortisação.

Salvem, ao menos, os outros rendimentos, para occorrer ás necessidades dos restantes serviços do estado!

Se a camara não quer prescindir de auctorisar a alienação das receitas dos tabacos por setenta e cinco annos, como já auctorisou a alienação das receitas das alfandegas por todo o sempre, reserve o resto dos recursos do paiz, quando não seja para outra cousa, ao menos, para acudir ás necessidades da saude publica!

As obrigações dos tabacos são verdadeiros titulos de divida publica, que, pelo facto da consignação especial da receita dos tabacos, não estão privadas do direito de ser pagas por todos os rendimentos do estado.

Se o cambio descer a ponto de não bastarem as receitas consignadas para pagar os juros e a amortisação das obrigações ha de ser satisfeito o resto pelos outros recursos do orçamento.

Não se metta na cabeça de ninguem que é possivel tocar nos encargos da divida dos tabacos sem accordo com os credores.

Uma commoção popular ou uma grande calamidade publica, póde collocar o thesouro na dura situação de não dispor n'um momento dado do oiro preciso para pagar integralmente os encargos dos tabacos.

Mas por decreto ou por lei ninguem, de certo, irá offender os interesses dos portadores dos titulos dos tabacos, por muitas rasões que escusado é enumerar agora.

Se as côrtes resolverem acceitar de vez o projecto approvado na camara dos dignos pares, ao menos salvem o resto da nossos recursos, não deixando obrigadas supplementar e subsidiariamente ao pagamento dos encargos das obrigações dos tabacos as outras receitas do orçamento para o caso de ser sufficiente a receita especial que lhes está consignada para pagar integralmente o encargo dos juros e da amortisação.

Vão-se os rendimentos das alfandegas e vão-se os rendimentos dos tabacos!...

Deixem ao menos intacto o resto, que já não é muito para as necessidades do estado n'um paiz civilisado!

Declare-se bem expressamente na lei «que ás obrigações dos tabacos emittidas em virtude de nova operação

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nos termos da presente lei só ficam obrigadas as receitas que lhes são especialmente consignadas.»

(Interrupção do sr. Menezes de Vasconcellos.)

Respondo simplesmente ao áparte do illustre deputado, que reputo uma grande fortuna para o paiz o mallogro d'esta operação!

A desgraçada situação em que nos achâmos é a consequencia de se ter passado a vida a fazer emprestimos de dois em dois annos.

Emprestimos e mais emprestimos tem sido a preoccupação constante e quasi unica dos governos!

Acreditavam, ao que parece, os nossos governantes que estavamos tanto mais ricos... quantos mais emprestimos fizessemos!

Com que enthusiasmo aqui se celebrou o ter-nos sido aberto o mercado allemão!

Com que alegria se contava o facto de devermos já dinheiro á Inglaterra, á Franca, á Allemanha, á Belgica e á Hollanda, quando por muito tempo era a Inglaterra o nosso unico credor!

A honra de termos tantos credores deu estas consequencias!

Não havia nada melhor do que viver uma vida lauta, sem recursos para a sustentar, e não pensar depois nas consequencias!

Ainda não se descobriu o systema de viver sempre bem sem haver com que!

Mas os nossos governantes entendiam que um paiz pobre podia viver como rico á custa de emprestimos!

Durante muitos annos varios alvitres surgiram para justificar o modo de vida dos emprestimos. Mas ultimamente para os grandes estadistas a questão do emprestimo vinha quasi sempre ligada á questão do fomento!

Umas vezes fallava-se no emprestimo por via do fomento, e outras vezes fallava-se no fomento por via do emprestimo!

O fomento e o emprestimo tornaram-se companheiro inseparaveis!

Tambem teve a sua epocha, para justificar os emprestimos, a questão da reserva do banco de Portugal!

Mas essa phantasia está hoje quasi fóra da circulação.

A questão hoje é o fomento! O fomento hoje é para tudo!

E a questão dos emprestimos não é impopular!

Está na massa do sangue do povo portuguez!

Queixa-se muita gente da redacção dos vencimentos ao funccionalismo, da grande diminuição nos juros da divida e do grande augmento de encargos para o contribuinte.

Mas dos emprestimos, que foi unica e exclusivamente o que nos levou á bancarrota, não se queixa ninguem!

Quantas vezes eu combati o systema dos emprestimos a proposito ou a pretexto do fomento com o argumento de que o fomento para que caminhavamos era o fomento da bancarrota!

Mas respondiam-me os estadistas de linha que eu não estava a par das idéas modernas, que eram viver á custa alheia! Por isso o actual sr. ministro fazenda é um dos melhores ministros que nós cá temos tido!

Para trazer tudo socegado e tranquillo, para alongar a vida do governo com expedientes que arruinam o thesouro, mas que pelo segredo não sobresaltam o contribuinte, ainda se não encontrava melhor!

Na discussão parlamentar é de primeira ordem! Podem estar tranquillos os collegas que elle não os compromette! Por explicações demasiadas não peccará nunca! Para o momento actual, n'esta organisação artificial em que vivemos, não ha mais competente!

As circumstancias do paiz não permittem que continuemos a pairar. Projectos que augmentam a receita em 35 contos de réis, ou em 12 contos, e ainda em cima com prejuizo da vida economica, não servem de nada.

De um momento para outro póde aggravar-se a situação extremamente, e ser necessario resolver por meios tumultuarios e violentos o que agora poderia e deveria fazer-se serenamente, em plena paz.

No entretanto os srs. ministros têem o talento e a experiencia necessaria para comprehender que em Portugal são os expedientes de momento, e não as providencias decisivas, que alargam a vida dos governos!

Mas sigâmas com o exame do projecto.

Como a operação a realisar não ha de ser feita em peores condições que a anterior, feita em conformidade da lei de 1891, segundo as declarações do sr. ministro da fazenda, bem podem ser comprehendidas nos encargos, alem dos 5 1/2 por cento para juros e amortisação das obrigações, percentagens avultadas para os contratadores como no emprestimo de 1891, que só para os portadores dos titulos de D. Miguel se reservaram 450 contos!

Demais, sendo os 5 1/2 por cento computados, não com relação ao dinheiro recebido, mas sim com respeito ao capital nominal emittido, ha de haver margem para tudo!

Os encargos calculados, não sobre o dinheiro recebido, mas sobre o capital nominal emittido, representam uma clausula tão affrontosa, que nem vinha no anterior projecto, aliás ominosissimo, de 1891!

Se as obrigações forem emittidas a 50 por cento, por exemplo, já ficam os encargos em 11 por cento dentro dos limites dos 5 1/2 sobre o capital emittido!

Projecto em taes condições não póde ser votado pelos representantes do povo.

O projecto aqui votado, e depois enviado á outra casa do parlamento, já era mau por que alienava a receita dos tabacos pelo largo periodo de setenta e cinco annos. Mas o projecto emendado pela camara dos dignos pares é pessimo, porque está cheio de alçapões, e todos vieram de lá!

E, cousa singular! A discussão do projecto dos tabacos em 1897 provocou largos debates e grande discussão no parlamento, que a imprensa acompanhou com calor e enthusiasmo. Pois agora, sr. presidente, que estamos discutindo um projecto mil vezes peor que o de 1897, a imprensa não dá a menor noticia de tal projecto nem a elle se refere!

Na imprensa politica o projecto está considerado como uma cousa anodyna, muito simples, e de somenos importancia, como um d'aquelles projectos que costumam vir ás canastradas nos fins das sessões!

A operação é não só bem combinada, mas parece entre todos combinada!

Tambem o parecer em discussão não diz se fica a cargo do thesouro o premio do oiro no juro e amortisação das obrigações.

Mas fica de certo a cargo do estado.

Ora, na discussão do parecer que entregava o rendimenta das alfandegas para sempre aos estrangeiros e a proposito de accordo com os credores, foi sempre considerado ponto capital a fixação de um limite ao premio do oiro, para o estado não ser obrigado a supportar encargos do cambio, para que não fossem sufficientes os recursos do paiz.

É evidente que se o premio do oiro assumir proporções muito desfavoraveis, ou por baixa consideravel na exportação dos generos da metropole, ou por má colheita dos generos ricos no ultramar, ou pelo concurso simultaneo de todas estas circumstancias, nós não podemos pagar os juros da divida externa, que agora pagâmos!

Cá, porém, não se imaginam senão hypotheses favoraveis!

Nunca partimos do principio de que o imprevisto nos póde desarmar completamente.

Tambem o governo ha de julgar mais conveniente á causa publica que os novos titulos que emittir sejam considerados divida publica e os encargos integralmente pagos por conta do thesouro!

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4 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Deixar ao governo o direito de contratar nas condições que julgar mais convenientes, é no fundo nada mais e nada menos que dispensar ou annullar a collaboração parlamentar!

Ora, eu já sei antecipadamente que contratar nas condições mais convenientes é contratar nas condições mais faceis para obter um emprestimo, quaesquer que sejam os encargos!

O serem considerados titulos de divida publica as obrigações dos tabacos, o ser pago o juro e a amortisação em oiro, ficando a penar sobre o thesouro os encargos do cambio e da oscillação da moeda, tudo isso é indifferente! O ponto capital é o emprestimo!

Não se quer saber senão do presente. Pedir hoje aqui, pagar-se amanhã acolá, e ir vivendo dia a dia, é o que se quer! O mais, o futuro, a Deus pertence!

Entretem-se o espirito publico com o annuncio de conversões quando não ha com que pagar os juros e a amortisação da divida existente, quanto mais os encargos da divida augmentada!

Comprehendem-se as conversões nos estados de finanças prosperas, em que os prestamistas não duvidam tomar os mesmos titulos, apesar de receberem menor interesse

Se nós tivessemos administrado bem, ao menos depois da reducção dos juros, não seria difficil impor aos prestamistas das obrigações dos tabacos o juro de 3 por cento, por exemplo, em vez de 4 1/2 que hoje recebem.

Mas quem não tem para pagar, muito menos tem para converter!

A conversão que o governo propõe é de certo por amor da arte!

Emprestimo, sei eu que elle não quer, porque o declarou positivamente na camara dos dignos pares o sr. ministro da fazenda!

Ahi, na commissão de fazenda, fez declarações precisas do que prescindia do emprestimo e de que não precisava do emprestimo para governar!

Não é realmente facil perceber nem explicar como vamos agora comprar por 500 francos obrigações dos tabacos que vendemos a 402, perdendo assim 98 francos em cada uma!

Nem ao preço de 402 francos as vendemos todas, pois bastantes das que vamos comprar a 500 francos, vendemol as a 350 francos!

Parece que estamos a nadar em dinheiro.

Desde que o governo não precisa agora de emprestimos e quer adquirir os titulos dos tabacos, melhor era comprar as obrigações no mercado onde estão por preço muito inferior a 500 francos!

Mas não param aqui os desastres da operação. Vamos ainda emittir novas obrigações com um periodo de amortisação de setenta e cinco annos, que hão de ser vendidas por muito menos de 500 francos para pagar a 500 francos as obrigações actuaes.

É com negocios d'esta ordem que nós chegámos ao estado de ruina em que estamos!

Por outro lado desde que o governo annuncio, que com o pagamento de tal coupon finda a sua obrigação de pagar os juros, ha de estar habilitado a solver o capital n'essa occasião.

Não lhe fica o direito de prolongar o pagamento alem dos seis mezes.

O capitalista precisa de ser prevenido do dia do pagamento com tempo sufficiente para regular a sua vida.

Para os contratadores prepararem a collocação do seu dinheiro é que ficou no contrato que não podiam ser reembolsadas as obrigações antes de 1900, e que mesmo resgatadas depois era indispensavel previo aviso de seis mezes.

Em todo o caso continuo a não perceber como é que, sem necessidade de emprestimo, vão ser alienadas as receitas dos tabacos por setenta e cinco annos, precisamente para pagar de prompto por 500 francos obrigações vendidas a 402 francos e a 350 francos, e vamos de novo collocar no mercado talvez pelo mesmo preço de 402 francos obrigações que teremos depois que pagar a 500 francos!

A operação auctorisada por este projecto é ruinosissima!

Com algum trabalho póde calcular-se approximadamente até onde irão os encargos do thesouro, e os prejuizos resultantes do contrato em discussão.

Mas não é preciso descer a especialidades. Basta apreciar os traços geraes da operação.

A anterior providencia a respeito dos tabacos, que deu em resultado a alienação d'aquella importante receita do estado por trinta e cinco annos, foi votada por ambas as camaras, com excepção do meu voto, e talvez de mais dois ou tres, debaixo da pressão violenta de que a rejeição do projecto importaria a bancarrota que estava imminente por não haver meio de pagar a divida fluctuante no estrangeiro que se tinha avolumado extraordinariamente, e ainda para evitar uma crise politica que os partidos desejavam evitar n'aquelle momento.

Ainda assim foi approvado o projecto da alienação da receita dos tabacos por trinta e cinco annos, porque levava o correctivo do que passados nove annos podiam ser reembolsados os portadores das obrigações, e de que decorridos dezeseis annos podia acabar o monopolio adjudicado á companhia dos tabacos.

Pois agora, em vez dos trinta e cinco annos e dos correctivos decreta-se a alienação d'aquella receita pelo largo espaço de oitenta e tres annos, dos quaes já estão decorridos oito, e restam ainda setenta e cinco!

Ora estando o governo já auctorisado a empenhar, quando muito bem quizer com dependencia apenas da assignatura do sr. ministro da fazenda, as receitas das alfandegas por omnia saecula saeculorum, no dia em que pozermos com dono, consignando-as ao estrangeiro, as duas receitas mais importantes do orçamento, a das alfandegas e a dos tabacos, qual fica sendo a nossa situação economica, financeira e politica na vida externa, e perante os outros estados?

De perfeita independencia e autonomia não será de certo.

Ora ir desembolsar por amor da arte 500 francos por cada obrigação, que o governo vendeu a 402 e a 350 francos, é negocio a que legitimos representantes do paiz não podem dar a sua approvação!

Não ha sequer pretexto para a operação proposta desde que o sr. ministro da fazenda não quer emprestimo.

Já alienar a receita dos tabacos por setenta e cinco annos só para ter o gosto de responder por 500 francos em cada obrigação, que se venderá por 402 ou 405, é facto que carece de explicação, e de explicação clara e precisa!

Alem d'isso a operação é feita em condições tão gravosas e tão violentas que realmente mal póde explicar-se por amor da arte.

Em verdade ainda não percebi o empenho e o interesse que podem ter os governantes em gastar tudo quanto tem o paiz, e com toda a rapidez!

Um dia é a perequação das armas militares. Já temos tambem projecto na camara para a perequação das armeis judiciaes!

Crearam-se comarcas no ultramar a torto e a direito. Fez-se no ultramar o que se fez no continente. Não ha ali causas para tantos juizes. Mas a questão não é de cousas, é de pessoas.

O certo é que os juizes de lá estão prejudicando a promoção e o accesso aos de cá; e, para evitar este transtorno meramente pessoal, apresentou o governo uma proposta de perequação das armas judiciaes para serem promovidos, se bem me lembro, dois do continente por um do ultramar!

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APPENDICE Á SESSÃO N.º 110 DE 12 DE JULHO DE 1899 5

N'isto passámos a vida. Os serviços publicos são apenas encarados sob o aspecto estreito do interesse pessoal.

Os governos não querem entrar n'um caminho largo de regeneração politica e economica que nos ponha ao abrigo de todas as eventualidades, precisamente quando nós atravessámos uma situação difficil, que de um momento para o outro póde tornar-se irreductivel!

Emfim chegou o governo á perfeição, de propor, sem necessidade de fazer emprestimos, a alienação por setenta e cinco annos da receita dos tabacos, que tanto custou a alienar por trinta e cinco annos, fixando o encargo em 5 1/2 com relação ao capital emittido, dando aos titulos o caracter inteiro de divida publica, e deixando assim responsavel o estado pelo premio do oiro, o que compromette todas as outras receitas do orçamento, desde que a depressão cambial assumir grandes proporções!

Quando essas receitas estiverem assim compromettidas, pagar-se-ha á magistratura, á segurança publica, e a todos os outros serviços inadiaveis da administração publica, com deducções!

Conto ainda que a camara resolverá o que for mais util para o paiz.

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