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1943

Que os cadernos se achavam n'esse estado, diz a acta do apuramento, que nós devemos acreditar, porque é um documento authentico; e tambem é verdade que os cadernos vieram n'este estado á camara; mas da comparação das actas da eleição com a do apuramento, resulta conhecer-se que os cadernos foram alterados e viciados entre a eleição primaria e o apuramento da eleição. Tres actas dizem o estado dos cadernos em 28 de abril, e uma acta diz que esses cadernos estavam em differente estado no dia 5 de maio. Por consequencia deve-se presumir que houve um vicio entre um e outro acto; mas esse vicio é que a camara não póde asseverar.

Para nós acreditarmos que os cadernos não foram viciados é preciso estabelecer como verdade, que as actas da eleição faltaram completamente á verdade, que se falsificaram os factos, que se disse que estavam feitas descargas que não estavam effectivamente feitas, o que seria lançar uma injuria, e uma injuria ponderosa aos membros d'essas mesas, e que é tão pouco aceitavel, quanto é inverosímil a todos os respeitos.

Em primeiro logar cumpre-me notar, e peço a attenção da camara a este respeito: não foi a opposição que nomeou estas mesas, foi a commissão de recenseamento que, na sua quasi totalidade, senão na sua totalidade, pertence ao partido que propoz para candidato o cavalheiro que não venceu a eleição, o sr. José Barbosa e Silva.

Basta vermos os nomes dos membros da commissão de recenseamento do concelho de Vianna, para a camara ver que este facto é verdadeiro. Essa commissão é que designou, nas conformidades legaes, os presidentes para estas tres mesas, e estes presidentes, chegando ás assembléas, designaram os membros das mesas. A opposição aceitou essas mesas taes quaes foram propostas.

Um dos presidentes era irmão do proprio candidato que não venceu a eleição; outro era o sr. Espergueira, amigo intimo do candidato; e na outra mesa serviu o substituto do administrador, que assistiu a todos os actos de contagem das listas, das descargas e confrontação. O substituto do administrador nomeado para aquelle acto é irmão do sr. Espergueira.

Ora, com todos estes elementos veja a camara se se póde acreditar que em logar de haver de mais ou de menos duas descargas, como se menciona nas actas da eleição, se póde crer que houvesse quarenta votos a mais, e que isto se não mencionasse nas actas das assembléas; isto é um facto completamente inverosimil.

Eu disse que a letra e o espirito da lei exige que as actas sejam acreditadas emquanto se não mostrar por documentos authenticos que são falsas, e isto por um modo que exclua toda e qualquer outra explicação; porque, qual é o motivo por que a lei eleitoral exige que antes de se saber o que dizem as listas, antes de se saber qual é o candidato que vence, antes de se saber qual é o resultado da eleição, se faça a confrontação das listas e das descargas, e se publique por edital á porta da igreja? É para evitar as viciações e falsificações posteriores; porque, por via de regra, e a lei de certo assim o suppoz, o partido vencido, quando se convence de que perde a eleição, emprega todos os meios possiveis para a annullar. Foi sem duvida este um dos -motivos por que a lei exigiu que se verificasse previamente ao escrutinio se o numero das listas estava conforme com as descargas, se havia listas de mais ou de menos, e que se publicasse o resultado d'esse exame á porta da igreja.

Este preceito da lei executou-se; publicou-se o resultado da confrontação das listas com as descargas á porta da igreja. Parece que ninguem podia duvidar d'este facto, que podia dizer-se que passou em julgado; já não podia ser alterado.

Mas a commissão aceitou a viciação; e eu hei de chamar-lhe viciação para justificar que as actas eram verdadeiras; porque, feita a confrontação das listas na assembléa, e publicado o resultado por edital na porta da igreja, sem protesto, sem reclamação nenhuma, jamais se podia apresentar resultado differente d'aquelle. Tudo que não fosse conforme com o que se publicou, era e é illegal, porque então o edital á porta da igreja não servia de nada. 01 edital serve para firmar aquelle resultado de modo que depois não possa ser alterado. Este é que é o principio, esta é que é a lei.

Mas a opinião publica explicou logo o facto; a opinião publica começou por clamar que os cadernos tinham sido viciados entre o acto eleitoral e o do apuramento; e por isso eu e mais alguns amigos tratámos de examinar esses -cadernos. O resultado d'este exame foi acharmos logo no principio vestigios visíveis de que os cadernos tinham sido descosidos, e depois cosidos de novo; isto deu-nos a conhecer que não era impossivel que se tivessem mettido n'elles folhas de permeio.

Este facto já se tem querido explicar, dizendo-se que se tendo apresentado estes cadernos depois de rubricados pela commissão do recenseamento, para servirem no acto eleitoral, foi preciso altera-los, porque da assembléa de Serreleis se tinham separado duas freguezias, que tinham ido votar na freguezia de Santa Maria Maior. É certo, mas isto não deu motivo para se alterar o recenseamento, porque as descargas só recaíam em quem votasse. Alem d'isto nada temos aqui com a assembléa de Santa Maria Maior, porque ahi venceu o candidato do governo, ahi não foi preciso viciar, e os mesarios que fizeram as actas estiveram com toda a attenção. Nas outras é que as descarga"? foram tiradas depois, e foram tiradas de que modo? Ao principio disse-se que tinham sido raspadas, e depois disse-se que se tinham tirado e mettido folhas nos cadernos do recenseamento... O illustre deputado, o sr. Placido, está com um arzinho de riso, como quem diz, usando de uma phrase vulgar — elles lá andaram a nadar. Não se admire d'isto, porque estes cadernos tinham sido fechados depois do acto eleitoral até á assembléa do apuramento, e quando os interessados as quizeram ver, respondeu-se-lhes que tinham vindo para a secretaria do reino; de modo que nunca poderam pôr-lhes a vista em cima, e nós mesmos aqui só os podemos ver quando a commissão de verificação de poderes deu o seu parecer.

Ora, eu mesmo confesso que estive a folhear nos cadernos muito tempo para dar com a viciação; mas dei de um modo que me não resta duvida nenhuma. Aqui estão algumas folhas dobradas, e convido os illustres deputados a virem examina-las antes de dar o seu voto. O vicio está aqui tão patente como á luz do dia (apoiados).

Houve para mim alguma difficuldade em acreditar que as folhas tivessem sido tiradas dos cadernos, porque, por mais venal, no sentido politico, que se podesse suppor uma commissão de recenseamento, cujos membros eu não tinha a honra de conhecer, parecia-me impossivel que toda a commissão se prestasse a rubricar folhas nos cadernos aonde as tivesse mettido de proposito para que as descargas apparecessem, julgando que não se podesse conhecer a falsificação. Felizmente foi isso impossivel, e acredito-o mesmo por honra dos membros da commissão.

Chamo a attenção da camara para a rubrica S. Miguel nas folhas dos cadernos do recenseamento da assembléa de Serreleis, e peço que se confrontem umas com as outras, porque quem as examinar, mesmo que não seja com olhos perspicazes, conhecerá immediatamente a falsidade, porque foi isso que aconteceu quando eu e os srs. Bento de Freitas Soares e Alvares Guerra examinámos esses cadernos.

(Interrupção do sr. Placido, que não foi percebida.)

Perdôe-me o meu nobre collega, mas isso não é exacto; agora o que o meu illustre collega podia fazer era convidar todos os nossos nobres collegas para que examinem estas rubricas, e depois formem o seu juizo. Esse convite faço eu a todos em geral. O que eu sinto é ter adoecido exactamente na occasião em que notámos este vicio. Eu notei-o na quarta-feira 12 de junho e no dia 13 já passei incommodado, e no dia 14 caí de cama. Já no dia 12 tinha chamado dois ou tres membros conspicuos desta camara, e mostrei-lhes a falsidade destas assignaturas, e um d'elles foi o meu nobre amigo o sr. Anselmo Braamcamp, e invoco o seu testemunho; e sinto muito que tendo eu escripto, já no estado de doente, uma carta que dirigi ao sr. Seabra, presidente da commissão, em que expuz todas estas circumstancias, lançando sobre mim a responsabilidade de todos os factos que narrava n'essa carta, sinto, digo, que a commissão se não fizesse cargo d'ella, e apesar de que não vejo assignado neste parecer o sr. Seabra, mas estando tanto tempo este processo na sua mão, tinha tido tempo para dar conhecimento aos seus collegas de todas as considerações que eu apresentava n'essa carta que lhe dirigi. Mas estando eu e os meus amigos, os srs. Bento de Freitas Soares e Alvares Guerra, a examinar os cadernos, chegámos a estas duas folhas e achámos que as rubricas S. Miguel e Oliveira faziam uma differença notavel de todas as assignaturas que estão no resto dos cadernos. A rubrica Oliveira liga o o com o r pela parte convexa, e liga por um modo completamente differente do que estão estas rubricas nas outras folhas, a ponto de não haver a menor duvida da differença dellas, logo que se comparem umas com as outras. A rubrica verdadeira S. Miguel custa a ler, emquanto as outras apparecem tão claras, tão nítidas, que se não podem confundir umas com as outras.

Assim que notámos esta differença fomos aos outros cadernos, e não tratámos de escolher as folhas, porque já tinhamos os elementos; porque tinhamos mandado vir de Vianna uns cadernos, e fomos correndo: chegámos a esta folha e achámos differença entre estas duas rubricas: fomos aos outros cadernos e não nos guiámos pelas relações que tinhamos á vista; começámos a folhear e demos immediatamente com a differença das rubricas, porque ella salta aos olhos.

Fizemos mais alguma cousa. O sr. Bento de Freitas Soares tinha um caderno, e o sr. Alvares Guerra outro; um folheou um, e outro folheou outro, e deram ao mesmo tempo com a mesma folha correspondente, e depois começaram a examinar o resto das folhas, folha por folha, e reconheceram que as rubricas são falsas, que a letra com que estão escriptas é falsa, que o papel é muito mais áspero, e que não parece novo, porque está mais sujo. Estas duas folhas para se não conhecerem sujaram-n'as, mas de tal modo que fazem muita differença das outras.

Tive o cuidado de fazer sentir isso ao sr. Anselmo Braamcamp, que, permitta-se-me a expressão, torceu-se, encolheu-se como quem se envergonhava de se ter feito isto; e se me dá licença para aqui referir uma conversação que tivemos, direi que ao mesmo tempo s. ex.ª acrescentou = que era um negocio muito serio, mas que por emquanto ainda não podia emittir opinião. =

Eu disse a s. ex.ª — não me é preciso exame de peritos sobre estas folhas, mesmo porque não tinha precedentes da camara que me auctorisasse a isso. Este é o primeiro fundamento. Aqui já se declarou viciada uma acta, e não foi preciso que se chamassem peritos, nem se fallou em tal. Tenho outro motivo e motivo capital, que é que esta camara não julga só como juiz de direito, mas como juiz de facto, julga segundo a sua consciencia; e cada um pela sua inspecção ocular convence-se por si, e em consequencia d'isso não devo suppor que seja preciso recorrer á opinião de tres tabelliães, que devo suppor que sejam menos habilitados que nós todos, ou pelo menos tão habilitados como nós todos; por isso não requeri exame de peritos. Mas tenho muita pena de não ter vindo á camara n'estes dias, porque queria chamar tres ou quatro dos meus collegas dos mais imparciaes e dos mais conspicuos, para que se convencessem de que este facto foi praticado de proposito para em logar, por exemplo, de trinta descargas, apparecerem vinte e cinco ou vinte, para da differença resultar a nullidadè da eleição. Eu devo desde já declarar que não torno responsavel por esse facto a commissão do recenseamento. Felizmente para mim, é fóra de duvida que as assignaturas são falsas, ou porque os individuos não as quizeram dar verdadeiras quando lhes foram pedidas, ou viram diante de si caracteres tão robustos e tão fortes que não houve coragem para as pedir. Digo mais, a propria rubrica do sr. Espergueira, que é de todos os individuos que figuram n'esta eleição o mais interessado em ver se podia triumphar o seu amigo José Barbosa, creio que é falsa, e sendo falsa quero acreditar que todas são falsas. Não quero acreditar que uma corporação como a commissão do recenseamento chegasse a prostituir-se até ao ponto de falsificar os cadernos para vencer uma eleição que se tinha perdido. Longe de mim similhante idéa. Mas vi, quando este. parecer estava em discussão, por parte de alguns dos seus membros que se apresentava a difficuldade de que a camara não podia julgar da falsificação ou vicio desses cadernos, porque esta declaração da camara podia dar resultados funestos, conflictos a que a camara se não devia arriscar. Que em primeiro logar isto era uma sentença sobre um facto criminoso que podia ir pesar sobre a acção do poder judicial; em segundo logar, que o poder judicial podia a final declarar que não havia vicio; e qual era a posição em que ficava por virtude de uma determinação contraria d'esta camara? A isso respondo bem. Entendo que depois da camara se pronunciar, o governo tem rigorosa obrigação de mandar proceder ás investigações competentes para saber judicialmente se se prova ou não a falsidade, e quem foram os auctores d'ella. Mas a decisão do poder judicial não tem nada com a decisão desta camara. Muitas vezes a falsidade é declarada civilmente, é remettido o processo para o juizo criminal, e os tribunaes absolvem o réu. Muitas vezes succede isso, e o poder civil não se acha embaraçado, nas sentenças que tem de proferir, com o que virá a acontecer nos juizos criminaes. Esta decisão não tem outro effeito senão saber se esta eleição se ha de annullar ou não, se o deputado eleito ha de entrar ou não por aquella porta. São os unicos effeitos. Os effeitos criminaes que podem resultar da falsidade e do dolo pertencem a outro poder. Mas supponhamos que judicialmente se declara que não está provada a falsidade que nós declarâmos que está provada; o que se segue a isto, é que o poder judicial tem de se regular pelas provas judiciaes, e nós regulâmo-nos pelas provas judiciaes e moraes. E longe de mim querer fazer dependente da decisão da camara actos do poder judicial, porque são poderes independentes, cada um póde julgar por aquillo que vê e que entende em sua consciencia.

Agora eu peço á camara que preste toda a attenção a este negocio. O vicio, para mim, está claro. Portanto não é preciso nada mais para que a eleição seja approvada; porque eu repito o que já disse —o principio da lei eleitoral é que este acto da conferencia das descargas com as listas se faça antes de se saber do resultado da eleição. Isto não serve senão para mostrar a rasão que teve a lei quando determinou que isto tenha logar antes do se verificar a eleição para se não saber quem vencia; porque quem ficava vencido, querendo tirar a Victoria ao vencedor, recorreria a meios illicitos e irregulares. Torno a repetir, os nobres deputados examinando os cadernos verão que n'essas folhas, que não estão dobradas, as rubricas estão todas uniformes, e chegando a essas duas folhas vê-se que tem a rubrica visivelmente falsa. Segue-se o caderno de Serreleis, que tem estas duas folhas que são falsas, e isto antes de chegar á folha do meio, e seguem-se todas as outras sem vicio algum, tendo todas as rubricas uniformes. No caderno de Serreleis as folhas falsas são as duas antes de chegar á folha do meio, são visivelmente falsas na sua rubrica; chega-se á folha do meio é verdadeira; passam-se seis, acha-se o mesmo defeito. Os srs. deputados encontrarão isto. Eu entrego este negocio ás suas luzes.

Eu não invoco rasão nenhuma, absolutamente nenhuma, de excepção e podia invoca-la. E a segunda falsificação que vem á camara. A primeira foi feita de proposito para deitar fóra do lado da camara, em que me sento, um deputado que pertencia á parcialidade politica a que eu pertenço. Apresenta-se a segunda falsificação para deitar fóra tambem um deputado realista! Eu peço á camara que seja hoje tão imparcial, tão tolerante, tão justa como foi quando se tratou da primeira falsificação. Refiro-me á eleição de Lamego. O sr. Francisco de Mello Peixoto, dizendo a esta camara que tinha vencido por tantos votos, rasparam com um canivete esse resultado para lhe darem menos votos e augmentar o numero dos que teve o outro candidato, mas por Um modo tão claro, que a camara teve vergonha que se praticasse similhante acto, condemnou essa falsificação e mandou restituir os votos a quem pertenciam. Eu peço á camara que seja hoje igualmente tolerante, igualmente justiceira, igualmente imparcial e que dê ao candidato que effectivamente foi eleito os votos que a fraude lhe tirou.

Voto portanto contra o parecer da commissão, peço que seja rejeitado e que em substituição a elle se approve a eleição.

(O sr. deputado não reviu este discurso.)

O sr. Ministro da Fazenda (A. J. d'Avila): — Sr. presidente, não pedi a palavra para combater os argumentos do nobre deputado, nem para tomar parte na discussão, como s. ex.ª julgou; é uma discussão que pertence á camara, e eu não tenho a honra de ser membro della. Tambem não desejo que este negocio fique sem solução, mas eu pedia á camara que se lembrasse de que estamos hoje a 23 de julho e que a auctorisação para a cobrança dos impostos