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N.º2

SESSÃO DE 7 DE JANEIRO DE 1884

Presidencia do exmo sr. João de Andrade Corvo

Secretarios os dignos pares

Visconde de Soares Franco
Henrique de Macedo Pereira Coutinho

SUMMARIO

Leitura e approvação da acta. - Correspondencia.- O sr. ministro das obras publicas apresenta um requerimento para que possam, querendo, accumular com as funcções legislativas as que exercem dependentes do ministerio das obras publicas, os dignos pares marquez de Ficalho, conde de Rio Maior, conde do Casal Ribeiro, Carlos Bento da Silva, João de Andrade Corvo, Serpa Pimentel, Pereira de Miranda, conde de Valbom, Abreu e Sousa, Placido de Abreu, José Augusto Braamcamp, Mello Gouveia, Ferreira Lapa, e Jayme Larcher, proposta que é approvada.- O sr. conde de Castro justifica as faltas do sr. visconde de S. Januario ás ultimas sessões. Manda para a mesa um requerimento pedindo esclarecimentos pelo ministerio das obras publicas. Trata da questão da cultura do tabaco no Douro. Responde-lhe o sr. ministro das obras publicas. - O sr. ministro da fazenda apresenta proposta para que possam, querendo, accumular com as funcções legislativas as que exercem dependentes do seu ministerio os dignos pares visconde de Bivar, Mendonça Cortez, visconde de Moreira de Rey, Gomes Lages e Xavier Palmeirim. É approvada. - O sr. Agostinho Ornellas interroga o sr. ministro das obras publicas ácerca das obras do porto de abrigo no Funchal. O sr. ministro das obras publicas responde.- O sr. marquez de Vallada manda para a mesa duas representações. Falla sobre o projecto de reforma da carta.- O sr. conde do Bomfim manda para a mesa um requerimento pedindo esclarecimentos, pelo ministerio da marinha.- Ordem do dia: eleição de dois dignos pares que, com o sr. presidente, formam a commissão de resposta ao discurso da coroa. São eleitos os srs. Martens Ferrão e Serpa Pimentel.- São approvados, sem discussão, os pareceres, n.° 179 relativo ao projecto de lei n.° 190, e n.° 221 relativo ao projecto de lei n.° 202.

Ás duas horas e um quarto da tarde, sendo presentes 23 dignos pares, o sr. presidente declarou aberta a sessão.

Lida a acta da sessão precedente, julgou-se approvada na conformidade do regimento, por não haver reclamação em contrario.

Mencionou-se a seguinte

Correspondencia

Um officio do ministerio do reino, accusando a recepção do officio dirigido em 3 do corrente, participando achar-se organisada a mesa da camara dos dignos pares para a actual sessão legislativa, e terem sido eleitos para secretarios os dignos pares visconde de Soares Franco e Eduardo Montufar Barreiros, e para vice-secretarios conde da Ribeira Grande e Francisco Simões Margiochi.

Para o archivo.

Outro do ministerio dos negocios da fazenda fazendo igual communicação.

Para o archivo.

Outro da presidencia da camara dos senhores deputados, participando achar-se constituida a mesa d´aquella camara, tendo sido eleitos, para presidente Luiz Frederico Bivar Gomes da Costa, e para vice-presidente João Ribeiro dos Santos; para secretarios Francisco Augusto Florido de Mouta é Vasconcellos e Augusto César Ferreira de Mesquita, e para vice secretarios Francisco de Paula Gomes Barbosa e Luiz Antonio Gonçalves de Freitas.

Para o archivo.

Outro do ministerio das obras publicas, satisfazendo ao requerimento do digno par Pereira de Miranda, remettendo copia authentica do officio em que a companhia geral do credito predial portuguez pedia para crear 50:000 obrigações internacionaes e da consulta da procuradoria geral da corôa e fazenda que se refere á portaria de 25 de julho ultimo.

Para a secretaria.

(Estavam presentes os srs. ministros das obras publicas, dos negocios estrangeiros e da fazenda.)

O sr. Ministro das Obras Publicas (A. A. Aguiar): - Mando para a mesa a lista dos dignos pares que exercem funcções no ministerio das obras publicas e proposta para que possam accumular com as funcções legislativas.

Leu-se na mesa e é do teor seguinte:

Na conformidade do artigo 3.° do acto addicional, tenho a honra de pedir á camara dos dignos pares do reino que permitta possam accumular, querendo, as funcções legislativas com as do serviço publico que exercem no ministerio das obras publicas, commercio e industria os seguintes dignos pares do reino:

Marquez de Ficalho, conde de Rio Maior, conde do Casal Ribeiro, Carlos Bento da Silva, João de Andrade Corvo, Antonio de Serpa Pimentel e Antonio Augusto Pereira de Miranda, vogaes do conselho geral do commercio, agricultura e manufacturas;

Conde de Valbom, João Chrysostomo de Abreu e Sousa e Placido Antonio da Cunha e Abreu, vogaes da junta consultiva de obras publicas e minas;

José Augusto Braamcamp, presidente da junta central dos melhoramentos sanitarios;

José de Mello Gouveia, chefe da repartição de agricultura;

João Ignacio Ferreira Lapa, director do instituto geral de agricultura;

Jayme Larcher, fiscal do governo junto á companhia das aguas.

O sr. Presidente: - A camara acaba de ouvir ler a proposta do sr. ministro das obras publicas, para os dignos pares que exercem funcções n´aquelle ministerio as accumularem, querendo, com as que são obrigados a desempenhar n´esta camara. Os dignos pares que approvam esta proposta tenham a bondade de se levantar.

Foi approvada.

O sr. Conde de Castro: - O digno par o sr. visconde de S. Januario encarregou-me de participar á camara que, por motivo de doença, não tem assistido ás ultimas sessões, e que por igual motivo deixará de comparecer a mais algumas.

Folgo de poder annunciar á camara, que o nosso respeitavel collega e amigo se acha por assim dizer entrado em franca convalescença, e que portanto podemos nutrir a esperança de que muito brevemente virá tomar parte nos trabalhos parlamentares.

Já que estou com a palavra, peço licença para mandar para a mesa o seguinte requerimento.

(Leu.)

Faço este requerimento porque desejo apurar a verdade sobre o ponto a que elle se refere, e que é importante. Pretendo saber quaes são as sommas que o governo tem applicado, da dotação ordinaria para estradas, na região

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vinicola do Douro, e principalmente na parte que se encontra mais assolada pela phylloxera.

E desejo igualmente ser informado de quanto se tem despendido por conta da verba extraordinaria de 240:000$000 réis inserida no orçamento com applicação aos dois districtos de Villa Real e de Bragança.

Eu sei, pouco mais ou menos, a quanto ascende a totalidade d´essas verbas porque as VI ha pouco descriptas em um jornal que eu considero semi-official. Esse jornal indicava a cifra de 263:000$000 réis, numeros redondos; este esclarecimento, porém, não me satisfaz, não só porque esses 263:000$000 réis não correspondem á dotação ordinaria e á verba extraordinaria de 240:000$0000 reis, mas tambem porque d´esta ultima, verba foram applicadas sommas valiosas na construcção de estradas muito distantes da região a que me referi, como são, por exemplo, as estradas de Chaves a Miranda, de Guimarães a Villa Real, e ainda outras.

Tenho o maior interesse em apurar o que ha de mais exacto sobre este ponto, e é isto o que me leva a mandar para a mesa o meu requerimento, instando.com o sr. ministro para que se apresse em enviar-me os esclarecimentos que n'elle vão indicados.

Aproveito esta occasião, não direi para insistir, porque tem havido poucas sessões e o governo não está ainda em falta, mas para pedir ao nobre ministro das obras publicas que faça quanto antes discutir eu ambas as casas do parlamento o projecto que s. exa. apresentou na outra camara para a permissão da livre cultura do tabaco no Douro.

A rasão por que eu faço este pedido é porque, se o governo está, como eu estou, convencido da absoluta .necessidade d´esta providencia para acudir ao Douro, torna-se indispensavel que afaça discutir já, pois está muito proxima a epocha das sementeiras,- e do contrario teremos mais um anno perdido,- isto é, mais um anno em que teremos de assistir ao triste espectaculo de ver aquelles povos luctarem com a miseria, como actualmente estão luctando.

Tenho ainda um outro pedido a fazer ao sr. ministro das obras publicas, pedido que para ser satisfeito não está dependente da approvação do projecto que o sr. ministro apresentou.

Dentro das faculdades do que s. exa. dispõe como membro do poder executivo, e tendo de certo a peito que as suas medidas dêem o melhor resultado possivel, parece-me que o nobre ministro procederia bem se tratasse desde já de fazer contratar na Havana dois ou mais alguns homens praticos que viessem ao Douro ensinar a cura da folha, a sua fermentação, e todos os processos que precedem a manipulação do tabaco.

Para mim a questão da aptidão do solo para aquella cultura e das boas condições climatericas para que ella se possa ali dar, estão resolvidas.

Mas é tambem verdade, sr. presidente, e isto digo eu com aquella serenidade com que entro em todas as discussões, que das ultimas experiencias, isto é, depois de ter provado o tabaco já manipulado, entendo que elle não corresponde á excellencia da qualidade da folha, que foi julgada na sua maior parte de primeira qualidade pelos corretores de Londres, como de todos é sabido.

E, se não corresponde á qualidade da folha, é por não ter sido feita a seca da mesma folha na occasião propria, por não termos quem saiba proceder á fermentação, e finalmente por não haver gente habilitada para todos estes e outros processos, que são preliminares, da manipulação do tabaco.

Portanto, parecia-me muito acertado que s. exa. desde já mandasse contratar esses homens práticos.

Creio que o seu illustre antecessor teve a idéa de mandar á Havana o sr. Rodrigues de Moraes, inspector dos serviços anti-phylloxericos do norte estudar estes processos.

Eu não me opponho a que este agronomo seja ali enviado, por isso mesmo que é elle quem terá de dirigir superiormente este serviço; mas parecia-me ainda assim de alta conveniencia que se ajustassem esses homens praticos para irem ao Douro ensinar os lavradores a fazerem estes trabalhos.

Sr. presidente, pouco mais direi a este respeito, porque não quero antecipar a discussão de um assumpto sobre que ha pendentes dois projectos na outra casa do parlamento; em todo o caso devo dizer que o projecto do sr. ministro das obras publicas, tal como está redigido, não me satisfaz; não digo que não esteja concebido em sentido liberal, em relação á cultura do tabaco; mas julgo inconveniente a liberdade estabelecida por aquella forma. Quero dizer que entendo que o tabaco produzido no Douro deve estar em relação, não com a totalidade, mas com uma parte do consumo nacional, principalmente nos dois ou tres primeiros annos, para que não vamos crear em substituição da actual crise economica uma nova crise, a superabundancia da producção.

Confio tambem que o nobre ministro, a cuja sinceridade de intuitos faço inteira justiça, se não deixará levar n´esta questão pela vaidade, ou amor proprio de fazer vingar o seu projecto, tal como o apresentou, e que desejará que elle saia do parlamento tão perfeito e completo quanto possivel, convindo em acceitar algumas das ampliações que julgo necessarias.

(Apoiado do sr. ministro das obras publicas.)

Eu tenho pugnado pela cultura do tabaco no Douro, e continuarei a instar por ella, porque julgo ser a unica capaz, não digo de resolver, mas ao menos de attenuar a terrivel crise do Douro, por isso; mesmo que o tabaco é uma cultura que produz annualmente, e que assim póde de prompto dar recursos ao lavrador. Mas isto não, basta para vencer a crise. E preciso ampliar o projecto apresentado pelo sr. ministro, com algumas medidas que eu reputo indispensaveis; uma d'ellas é, por exemplo, a revisão das matrizes. Nós, em 1881, mandámos annullar as collectas d´aquellas propriedades que estavam destruidas pela phylloxera, mas a experiencia tem mostrado que essa isenção da contribuição de pouco tem valido, aos habitantes d´esta região atacada pelo flagello; e a rasão está no no modo por que estão feitas as matrizes. A distribuição do valor collectavel foi feita tão arbitrariamente entre a producção da vinha e a das outras culturas, pinhaes, olivedos, etc., que o lavrador a quem se applica o beneficio da lei bem pouco d´elle aproveita, resultando na maior parte dos casos ficar pagando tanto, ou pouco menos, do que paga vá anteriormente. De fórma que se nós queremos realmente attender por este meio á situação precaria em que se encontram os povos d´aquellas localidades, devemos mandar proceder quanto, antes á revisão das respectivas matrizes.

É tambem indispensavel attender á situação difficil dos municipios do Douro, principalmente nos concelhos mais flagelados pela molestia, pois não podem as camaras continuar a lançar os seus impostos, que são uma percentagem sobre as contribuições para o estado, quando este não cobra-as suas pela falta de producção. E faltando ás camaras este recurso, não têem donde tirar o rendimento necessario para fazer face aos pesados encargos que sobre ellas pesam.

Não seria justo que, privando-se o estado de cobrar a contribuição, os municípios continuassem a lançar uma percentagem sobre o que está annullado. Ou permittindo a essas camaras applicar ás despezas ordinarias o chamado fundo de viação municipal, ou por meio de um subsidio directo, nós poderemos obviar a este mal. No mesmo caso estão os parochos, relativamente ás derramas para as suas congruas.

Seria tambem conveniente que algumas, sommas se aplicassem a estudos de irrigação nas margens do Douro, o que pode ter tanto maior importancia quanto é certo que um dos meios reconhecidos como mais efficazes para combater a phylloxera, é o da submersão das cepas.

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Ha dois dias tive eu a honra de entregar ao nobre ministro das obras publicas uma representação da commissão de defeza do Douro, na qual, se não vem mencionadas todas as medidas a que acabo de me referir, se encontra todavia a maior parte d'ellas e ainda outras, e se insta com o governo para as tomar em consideração, quando for discutido o projecto que está na outra casa do parlamento.

S. exa. disse-me em resposta que não podia tomar desde logo compromisso algum sobre o que se expunha nessa representação, mas que me assegurava que a levaria proximamente ao conhecimento do conselho de ministros: Não peço a s. exa. que me declare já o que está resolvido a tal respeito; apenas menciono o facto, porquanto, a meu ver, mostra elle que homens muito dedicados ao estudo d'esta questão e que se interessam verdadeiramente pela causa do Douro, como são os signatarios d'aquella representação, entenderam haver necessidade de ampliar o projecto submettido á decisão do parlamento.

Se o sr. ministro se dignar responder-me, agradecer-lhe-hei muito a sua attenção.

O sr. Presidente: - Na o desejei interromper o sr. conde de Castro; mas peço aos dignos pares, a quem eu conceder a palavra, que previnam a camara ácerca dos assumptos diversos que desejam tratar.

O sr. Conde de Castro: - Creio que estou no meu direito, como membro d'esta camara, desde que pedi a palavra antes da ordem do dia, e sobretudo não exigindo resposta immediata da parte do sr. ministro das obras publicas, de fazer todas as considerações que entendo convenientes.

O sr. Presidente: - A prova de que o digno par está no seu direito, é que não o interrompi.

Sómente, para regularidade das discussões, me parecia mais conveniente tratar cada assumpto em separado.

Leu-se na mesa o seguinte:

Requerimento

Requeiro que, pelo ministerio das obras publicas, sejam enviados a esta camara, com urgencia, os seguintes esclarecimentos.

1.° Nota das sommas despendidas no anno economico de 1882-1883, por conta da dotação ordinaria, com a construcção de estradas de l.ª classe, e subsidios para estradas districtaes e municipaes, comprehendidos na região vinhateira do Douro, assolada pela phylloxera.

2.° Nota das quantias gastas no mesmo periodo e com as referidas estradas, por conta da verba extraordinaria de 240:000$000 réis, que para acudir á crise do Douro foi incluida no respectivo orçamento.

Requeiro mais, que sejam designadas as estradas a que as ditas sommas foram applicadas.

Sala das sessões, em 7 de janeiro de 1884. = Conde de Castro.

Mandou-se expedir.

O sr. Ministro das Obras Publicas: - Tenho a maior satisfação em poder responder ao digno par o sr. conde de Castro.

O assumpto é grave, gravissimo, e não interessa mais a s. exa. do que ao governo.

Posso assegurar ao digno par que, pela sua parte o governo ha de fazer tudo quanto possa para acudir á crise do Douro, se não para a dominar completamente, ao menos para attenuar até onde for possivel, nos seus lamentaveis effeitos, o mal que lhe deu origem.

N´este ponto estamos perfeitamente de accordo.

Emquanto ás estradas, vou dar no meu ministerio as ordens necessarias, para que se, collijam com a maior promptidão todos os esclarecimentos sobre este assumpto, não tardando com as precisas providencias.

Sobre o projecto relativo á cultura, do tabaco, tenho a dizer a v. exa. e á camara, que já na anterior sessão legislativa conferenciei com as commissões de obras publicas, de agricultura e de fazenda, e na actual dar-me-hei pressa em as consultar, e pedir-lhes o seu parecer, logo que estejam eleitas.

No dia seguinte á sua, eleição tratarei de promover que se reunam immediatamente.

Sobre as medidas que se julgue indispensaveis para que se possa ainda n'este anno dar execução áquella lei, se for approvado o projecto, póde o digno par estar certo de que hei de empregar todos os meios ao meu alcance para que ella seja posta em execução de modo a produzir os resultados, que todos desejâmos.

Com respeito á compra das sementes que são indispensaveis, devo declarar que não tenho duvida nenhuma em auctorisar a encommenda d´essas sementes, de accordo com a indicação feita ao governo pela commissão de defeza dó Douro.

Póde o digno par contar com a minha boa vontade, sinceramente lh´o digo.

Emquanto ao projecto apresentado na camara dos senhores deputados, devo acrescentar ainda que tenho naturalmente o maior desejo de que a lei saia o mais completa possivel, e entretanto o governo não cessará de estudar essa questão, bem como, prestando a maior attenção á representação que eu tive a honra de receber por intermedio do sr. conde de Castro.

Póde o digno par estar certo de que, não só eu, como ministro das obras publicas, mas todos os membros do governo, estamos sinceramente animados das melhores intenções com o fim de remediar o desgraçadissimo Bestado em que se encontra o Douro.

E esta a resposta que eu tenho a dar ás observações feitas pelo sr. conde de Castro, concluindo por dizer que a representação a que ha pouco me referi ha de ser apresentada em conselho de ministros, que de certo a tomará na devida consideração.

(O sr. ministro não reviu.)

O sr. Ministro da Fazenda (Hintze Ribeiro): - Mando para a mesa o seguinte pedido de auctorisação.

(Leu.)

Leu-se na mesa e é do teor seguinte:

Senhores. - Em conformidade do artigo 3.° do acto addicional á carta constitucional da monarchia, pede o governo á camara permissão para que os dignos pares do reino abaixo indicados accumulem, querendo, o exercicio dos seus empregos com o das funcções legislativas, a saber: visconde de Bivar, conselheiro do tribunal de contas; João José de Mendonça Cortez, idem; visconde de Moreira de Rey, vogal supplente do mesmo tribunal; José Antonio Gomes Lages, director geral da thesouraria do ministerio da fazenda; Augusto Xavier Palmeirim, presidente dá direcção do monte pio official.

Foi approvado.

O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros (Barbosa du Bocage): - Mando para a mesa o seguinte requerimento.

(Leu.)

Leu-se na mesa o seguinte:

Requerimento

Em conformidade com o artigo 3.° do acto addicional, o governo pede auctorisacão para que o digno par o sr. Eduardo Montufar Barreiros possa accumular, querendo, o exercicio do seu emprego no ministerio dos negocios estrangeiros com as funcções legislativas.

Foi approvado.

O sr. Conde de Castro: É unicamente para declarar a v. exa. e á camara que me dou por satisfeito com a resposta do sr. ministro das obras publicas.

O sr. Agostinho de Ornellas: - Agradeço a v. exa. o ter-me dado a palavra, da qual espero fazer uso dentro

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dos limites por v. exa. marcados a estas conversações antes do ordem do dia. Já preveni o sr. ministro e contentar-me-hei com a resposta que elle possa dar-me sem mais larga preparação.

Eu desejo chamar a attenção, não só do sr. ministro das obras publicas, mas de todo o governo e do paiz para um negocio de summa importancia e da maior urgencia.

Instam commigo os madeirenses para que opportuna e importunamente clame por justiça, para que lembre ao governo que perde as affeições d´aquelles povos, e arrisca os mais caros interesses da nação, desprezando tão justas queixas. Já no fim da sessão passada fallei nas especialissimas circumstancias em que se encontra a ilha da Madeira, ha longos annos votada ao mais completo abandono, sem estradas, sem melhoramentos publicos de especie alguma, sentindo-se ali apenas a acção do governo na cobrança dos impostos e na actividade do recrutamento, vindo os redditos da Madeira e os seus filhos engrossar as receitas do thesouro e as fileiras dos corpos do continente. Este estado antigo, esta indifferença inveterada, contra a qual nada têem podido até hoje as repetidas instancias dos representantes da Madeira, aggrava-se todos os dias.

Está ha longos annos em construcção a doca de Ponta Delgada, e tem custado milhares de contos; trabalha-se activamente na doca da Horta, e sendo as obras que exige o porto do Funchal muito menores que as d´estes portos, são as unicas que se não emprehendem! Pois é urgente que a attencão do governo se volte para o porto do Funchal, se não quer que em pouco tempo desappareça o excesso de receita que ha tantos annos cobra no archipelago da Madeira.

Voltam-se para a Africa as attenções da Europa, promette a região do Congo largo incremento de commercio e de navegação que o transporte, e o governo hespanhol, solicito pelos interesses das suas ilhas Canarias, prepara-se para chamar a ellas a corrente de navegação que sem o nosso desleixo e incuria, iria infallivelmente augmentar o já consideravel movimento do porto do Funchal.

Foi este movimento o anno passado, convem repetir estas cifras, superior a oitocentas embarcações, das quaes mais de seiscentas a vapor, e vapores de grande lotação e conduzindo milhares de passageiros. Quasi todo o movimento de navios e passageiros que da Europa se dirigem a Cabo Verde, á Guiné, á costa da Mina, á Serra Leoa, ao Cabo da Boa Esperança e até alem do Cabo a Natal e Moçambique.

Quando se discutiu n´esta camara o imposto sobre o carvão de pedra, imposto que tive a honra de combater, fiz sentir quaes eram os graves inconvenientes de tal imposto para a industria em geral e em especial para a prosperidade dos nossos portos, que são os pontos de escala naturaes e quasi obrigados da navegação do Atlantico.

Por essa occasião tambem me referi ás situações respectivas dos dois archipelagos, portuguez e hespanhol, e o perigo que estava imminente sobre a Madeira, em risco de perder a qualidade de porto de escala, onde vão refazer-se de viveres e carvão os vapores que são hoje o seu principal recurso, o principal mercado das suas fructas, hortaliças e gados, e das variadas industrias que têem sido creadas pelo influxo constante dos passageiros em transito.

É urgente, é indispensavel evitar por todos os meios que essa navegação, que até agora concorria á Madeira, fuja para as Canarias, onde existe uma legislação fiscal muitissimo mais liberal que a nossa, havendo até portos completamente francos.

O governo hespanhol diligenceia ainda collocar aquelles portos em melhores condições, e acaba de declarar de l.ª classe e de interesse geral a enseada da Luz, na cidade das Palmas, ilha da Gran Canaria, e trata de contratar com uma companhia ingleza a construcção de um porto de abrigo, o que certamente será levado a effeito em circumstancias de chamar ali todos os navios que vão da Europa para a África, e já quatro das companhias que faziam escala pelo Funchal mudaram para as Canarias, o consta-me que emissarios especiaes percorrem em Londres os escriptorios das companhias de navegação, empregando todos os esforços para que desviem os seus vapores do Funchal para os dirigirem ao novo porto, mais seguro e com menores encargos.

Este assumpto é realmente importante; o governo deve estudal-o sob o ponto de vista do mal que nos póde resultar de similhante competencia, e deve tratar quanto antes de construir na Madeira um porto de abrigo, evitando assim que se percam valiosos elementos de riqueza publica.

A historia do porto do Funchal é antiga e infeliz,

Já o grande marquez de Pombal tratou d´este assumpto, não podendo comtudo levar a effeito os seus projectos.

Em 1768 construiu-se um molhe e um cães no sitio da Pontinha, e já então se projectava ligar aquella ponta de rocha com o ilhéu que lhe fica a uns 300 metros de distancia, formando assim uma bacia sufficiente para o movimento do porto.

Caiu, porém, o marquez de Pombal, as obras não continuaram e só passados longos annos se pensou outra vez no porto de abrigo.

Fui eu quem primeiro tive, a honra de apresentar na camara dos senhores deputados, quando ali representei a Madeira, um projecto que tendia a resolver este importante ponto.

Não sei se em consequencia d´essa proposta, se em virtude de anteriores reclamações, foi encarregado o engenheiro Tiberio Blanc de fazer o projecto do porto artificial do Funchal.

Este distincto engenheiro apresentou dois magnificos projectos; eram, porém, de tamanha vastidão e envolviam tão grandes despezas, que ninguem pensou em emprehender obras tão pouco em harmonia com as exigencias reaes do caso e com os recursos de que dispunha o governo portuguez.

Abrigariam as suas vastas docas centenares de navios, mas nem o commercio do Funchal nem o movimento do seu porto podem com tão grandiosas construcções.

Na verdade o porto do Funchal é um porto essencialmente de escala, n´elle tocam centenares de vapores, mas por horas apenas, o tempo necessario para tomarem carvão e se refazerem de viveres.

Ainda que existissem grandes docas nem mesmo n´ellas entrariam estando o tempo bom.

Economisar tempo é hoje o grande cuidado de todos os navios, pois é unico meio de triumphar da concorrencia. Assim com mar chão e vento brando, as barcaças de carvão e as embarcações com viveres vão encontrar os vapores a grande distancia da terra.

No inverno, porém, quando ha temporaes de sudoeste é muitas vezes difficil é muitas é impossivel a communicação com a terra.

Carecemos, pois, de um porto de abrigo, ao qual se possam acolher uns quatro ou cinco vapores, se tanto, e dentro do qual possam, com qualquer tempo, desembarcar passageiros e receber carvão e viveres. E sendo a Madeira um sanatorio para as affecções pulmonares, procurando-a justamente de inverno grande numero de enfermos, é dever de uma nação civilisada não os expor a irem parar a S. Vicente de Cabo Verde, que é o mais proximo perto de escala, o que em muitos casos equivale a uma condemnação á morte.

Ora, nas presentes circumstancias, quando a phylloxera devasta as nossas vinhas e só nos deixa, alem da cultura da canna, que só vive á sombra dos enormes direitos que paga o assucar estrangeiro, que só nos deixa, repito, como meio de subsistencia a concorrencia dos doentes e, a escala da navegação, espero que o illustre ministro das obras pu

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blicas, ao qual se devem os primeiros esforços para combater na Madeira a phylloxera, acuda tambem a este mal, que não é menor. E acabe s. exa., que tem recursos para muito, com o triste espectaculo que damos ao mundo civilisado, deixando privada de todo o esforço humano uma ilha que a natureza se desvelou em ornar com os mais preciosos dotes. Lembremo-nos que está voltada para á nossa capacidade administrativa a attenção da Europa e da America, e, se queremos alargar ainda os nossos vastissimos dominios no continente escuro, não seja a primogenita, das nossas colonias um vivo exemplo de desamparo official, inercia e incuria administrativa.

Pelo que temos feito na Madeira nos julgam e avaliam milhares de estrangeiros que diariamente ali aportam e, cousa estranha, julgam justo e natural que, emigrem para paizes estranhos e longiquos os que tiveram a dita de nascer no mais bello e mais ameno ponto do globo.

Para provar que não invento, que não improviso, seja-me licito fazer aqui menção de um trecho de um relatorio do consul dos Estados Unidos no Funchal, datado de 12 de fevereiro de 1883, e que eu acho digno de toda a attenção do governo, por muitos e varios motivos. Póde até servir de explicação a certos factos politicos cuja causa muitos parecem ignorar.

O consul dos Estados Unidos recommenda ao seu governo que promova a emigração dos habitantes da Madeira para os Estados Unidos, e escreve o seguinte:

(Este relatorio é do principio d´este anno.)

«Considero o momento presente summamente favoravel para promover a emigração da Madeira para os Estados do Sul. O povo acha-se aqui na mais miseravel e o oppressiva situação, extremamente descontente (thoroughly discontented)e anciosos por uma mudança que melhore a sua sorte. As colheitas foram más, a alimentação escassa, os impostos excessivamente onerosos (overwhelmingly heavy). Póde fazer-se idéa da desgraçada sorte dos habitantes da Madeira por uma carta que dirigi ao New- York Herald. Incluo uma copia, que estimarei seja considerada pelo ministerio digna de publicação. N’ella expuz sem receio a minha opinião sobre a miseria d’esta ilha, que clama por soccorro.» (Relatorio do consul Dupont Syle, de 12 de fevereiro de 1883.)

O primeiro soccorro a esta miseria, soccorro que os habitantes da Madeira ainda pedem ao governo portuguez e d’elle esperam, é a prompta construcção do porto de abrigo.

Abandonados os grandes projectos a que me referi, consta-me que se formulou outro mais modesto e mais adequado ás necessidades da ilha e aos recursos do governo. As despezas d’essa obra não excederão talvez de 400:000$000 réis ou 500:000$000 réis, o que representa para o estado um encargo de 30:000$000 réis.

Considerando que o rendimento da Madeira é hoje approximadamente de 400:000$000 réis e a sua despeza pouco excederá á metade d’esta quantia, e que o governo cobra annualmente mais de 30:000 libras, que crescem das despezas do districto, não é muito que consagre uma pequena parte d’essas sobras a crear nova riqueza, se não a impedir que desappareça a actual.

Alem d’isso não me parece que os negociantes estabelecidos no Funchal, que têem o maior interesse em conservar as escalas dos navios que navegam entre a Europa e para a Africa, deixem de se empenhar para que uma companhia ingleza se proponha a fazer a obra do porto de abrigo, contentando-se com uma subvenção, talvez até com uma garantia de juro, sem que o governo tenha maior encargo, ou talvez mesmo se podesse obter o porto sem encargo algum para o estado, e a não ser o producto dos direitos de tonelagem etc., que no interesse da navegação devem sempre ser moderados e representam o preço dos serviços que as embarcações recebem nos portos que vão buscar.

É pois para este urgente negocio que eu chamo a attenção do governo e principalmente do illustre ministro das obras publicas.

Não sei se s. exa. me poderá dar já uma resposta, mas, se poder ao menos dar-me alguma esperança de que o governo dará a maior attenção a este assumpto, esta mesma esperança poderá servir para tranquillisar os animos, que se acham exaltados e inquietos.

O sr. Ministro das Obras Publicas: - Sr. presidente, pedi a palavra unicamente para assegurar ao digno par o sr. Ornellas, que eu tenho tomado em consideração o assumpto de que s. exa. se occupou, e já tive occasião de me occupar d’elle, logo que entrei no ministerio; alem d’isso, sr. presidente, v. exa. não ignora que está pendente uma interpellação na camara dos senhores deputados ácerca d’este mesmo assumpto.

Eu entendo que á ilha da Madeira tem toda a rasão para ser attendida, julgo que o governo alguma cousa poderá fazer, e muito mais faria se as circumstancias não fossem relativamente difficeis, porque por um lado precisamos de fazer economias, e por outro lado temos de attender a um certo numero de obras indispensaveis, e que são as bastantes para que não seja cousa facil attender à tudo ao mesmo tempo.

Póde, porém, s. exa. estar certo de que desde o primeiro dia em que entrei no ministerio, eu teria resolvido a questão da Madeira, se as circumstancias, como disse, fossem outras. É certo que não ha ainda um projecto definitivo ácerca das obras a fazer na Madeira, ha um ante-projecto apenas, e esse exige uma despeza que á primeira vista parece pequena. Mas trata da ligação do porto da Pontinha com o ilhéu. V. exa. sabe o que acontece quasi sempre com as obras hydraulicas. É muito frequente que os orçamentos sejam excedidos. E, com relação á esta, não deixa por isso de ter fundamento o receio de que o seu custo venha a ultrapassar a quantia de 400:000$000 a 500:000$000 réis, em que foi orçado. Entretanto o governo ha de attender ás necessidades da ilha da Madeira, que o digno par acaba de expor com toda a verdade, e fará quanto for possivel, para attender as suas tão justas reclamações.

Creia o digno par que tudo quanto for dependente da nossa vontade se fará; assim não surjam a impedir-nos os nossos bons desejos, difficuldades que não possamos superar.

Este assumpto pertence mais principalmente ao meu collega, o sr. Hintze Ribeiro, na qualidade de ministro da fazenda; mas eu, pela minha parte, já dei e continuarei a dar algumas providencias, a fim de facilitar a entrada dos navios n’aquelle porto.

Relativamente á continuação do dique, farei a s. exa. igual declaração. Hei de fazer quanto esteja ao meu alcance.

(Q sr. ministro não reviu.)

0 sr. A. de Omellas: - Seguindo o precedente que acaba de estabelecer o nosso illustre collega, sr. conde de Castro, uso agora da palavra para agradecer ao sr. ministro as seguranças que me deu de que havia de dedicar a mais solicita attenção ao assumpto para que eu pedi que s. exa. olhasse como elle exige; não posso, comtudo, deixar de insistir sobre este facto, que é muito provavel que, assim como houve uma companhia ingleza que tomou a empreitada da construcção do porto das Canarias, possa o governo, abrindo concurso, achar tambem uma companhia que proceda á construcção do porto de abrigo no Funchal, mediante um pequeno subsidio nos primeiros annos, ou talvez mesmo sem nenhum encargo para o thesouro mais que ceder os direitos de porto a cobrar dos navios que n’elle entrarem.

O sr. Marquez de Vallada: - Mandou para a mesa dois requerimentos de João Antonio Pusich, chefe aposentado da alfandega de Aldeia da Ponte, a proposito de vencimentos não abonados e direitos desattendidos ao requerente.

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Discreteando em seguida ácerca do discurso da corôa, documento politico da responsabilidade dos governos, ponderou que no actual, entre outras designadas providencias se indicava a reforma da constituição do estado, assumpto aliás momentoso, e que, por isso mesmo, importaria saber para onde se caminhava, quaes principies nos regiam, qual a bussola que nos guiava e a estrada que seguir? Que o formular taes perguntas se lhe não deveria haver a infracção de regimento, cujo dispositivo bem conhecia, assim como todas as suas reformas, attento por direito hereditario haver entrado muito novo n'aquella casa. Tanto menos se lhe devera isso estranhar, quanto certo que, como homem de ordem, não exigia desde já uma resposta immediata dos srs. ministros. E buscando transfundir no real e bem aclarar o metaphorico das suas perguntas, citou o Primeiro de janeiro, folha essencialmente progressista, e que suscitara a questão de ser a camara dos pares excluida da discussão das reformas politicas.

Porém o sr. presidente observou-lhe que não era opportunidade para discutir o que tinha relação com as reformas politicas senão o referente á resposta do discurso da corôa:; e melhor, portanto, conviria a s. exa. reservar para depois as suas reflexões politicas ou pelo menos para quando o sr. presidente do conselho estivesse presente.

O sr. marquez de Vallada, agradecendo á Providencia a propria inspiração d'aquelle assumpto é da advertencia do sr. presidente, e, por esta, congratulando-se tambem com s. exa., a quem reputava um homem illustradissimo e verdadeiro patriota, assegurou que aguardaria occasião ensejada a fim de pôr por obra o que tencionava agora, se bem sempre houvesse apoiado e esperasse continuar á apoiar o governo, o qual de certo saberia manter a ordem e obstar ás malfeitorias que contra ella se machinavam. Que não se deixassem os srs. ministros illudir. Quanto a elle, orador, visto haver jurado defender a carta constitucional, a monarchia e o throno, como verdadeiro liberal e cheio de amor patrio, se manteria imperterrito no cumprimento do seu dever.

Que, pois, chegada a occasião de se discutirem as reformas politicas, faria a historia da liberdade do nosso paiz e as confrontações que os factos lhe deparassem, por ser mister aos que estudam mostrar que sabem e alguma cousa valem, conforme o asserto de um academico do seculo passado: " É não só preciso que saibais, mas que todos saibamos, que vós sabeis). E que n'essa accommodada conjunctura manifestaria tambem quaes as suas esperanças é os seus receios, ponderado que em politica diz-se uma cousa um dia e no seguinte faz-se outra, tem-se hoje uma idéa e amanhã a diametralmente opposta, pretextando-se para isso a opinião publica, cuja boa direcção, sem transigencias, aliás cumpria justamente aos homens d'estado.

De certo era este nosso um paiz democratico, mas onde todos queriam excellencia. Sem duvida grande era entre nós a corrente das mais avançadas idéas, porém, não obstante, forcejavam todos por arrogarem-se uma extraordinaria supremacia.

Permittisse-lhe a camara estas divagações: e, n'esse empenho, o orador, fazendo broquel de Quintiliano, invocou os preceitos do formalista dialectico.

Após isto, reportando-se a passados successos, rememorou que fôra elle quem principalmente concorrera em tempo para a união, politica dos srs. Fontes e duque d'Avila e de Bolama; e da notoriedade d'essa efficaz interferencia, e do seu leal e desinteressado apoio ao partido regenerador, adduziu a melhor prova de bem querer aos srs. ministros e de só d'elles poder vir a discrepar em simples questões de opinião.

Comtudo interpellaria o sr. Thomás Ribeiro, se ainda fosse ministro do reino, sendo que s. exa. pelo seu comprovado talento de certo se haveria triumphantemente na replica.

A par d'isto lastimou não haver ali comparecido o sr. presidente do conselho, pois que, estando s. exa. e o partido progressista de accordo, quanto a umas cousas naturalmente, e discordes quanto a outras, todavia suppunha concordarem todos em que o governo incluiria em tantas projectadas reformas a das camaras municipaes. Não sendo assim, o sr. ministro da fazenda, salvo o seu grande merecimento, nada acharia em que impor tributos, por essas camaras tributarem tudo.

Já esta mesma reflexão fizera o sr. conde de Valbom, o qual tambem estava conforme com o governo, afóra n'este unico ponto.

Effectivamente não podia haver absoluta discordancia, onde todos por ora estavam tão de accordo.

Mas que outro tanto succedera em tempo ao sr. duque d'Avila e de Bolama, a quem similhantemente haviam promettido apoio é totalmente desampararam depois, consoante elle, orador, lhe vaticinara. Por isso fazia votos a fim de que o mesmo se não repetisse em breve, a proposito de reformas, em que á excepção de dois periodicos, desde o Minho ao Guadiana jamais alguem se lembrara de fallar.

Depois pediu ao sr. ministro do reino, embora ausente, mas cujo espirito politico estava representado nos seus presentes collegas, lhe fosse enviada uma relação de todos os emprestimos que as juntas geraes e de parochia, bem como as camaras municipaes, haviam contraindo, relação esta desde o anno anterior pedida e agora novamente instada, attribuindo a esquecimento das repartições do ministerio do reino a falta d'esse documento.

Por ultimo desejou saber quando se abriria, a penitenciaria, que, se já em 1878 estava feita, devia agora estar perfeita.

O sr. presidente advertiu ao orador que o projecto ácerca d'este assumpto já estava entregue á commissão respectiva d'aquella camara, para sobre elle dar o seu parecer.

Folgou com isso o sr. marquez, por serem as outras prisões uma aggravante e vergonhosa escola de perversão e as da penitenciaria incutirem no animo dos criminosos mais receio que o proprio degredo.

(O discurso de s. exa. será publicado quando nol-o devolver.)

O sr. Presidente:- A discussão antes da ordem do dia vae extremamente prolongada; no emtanto vou dar a palavra ao sr. conde do Bomfim, que é o unico digno par inscripto.

O sr. Conde do Bomfim: -Pouco tempo tomarei á camara, porque o meu fim principalmente é mandar para a mesa um requerimento pedindo varios esclarecimentos, pelo ministerio dos negocios da marinha e ultramar, relativos1 n'uma concessão feita acerca do prazo Mahindo na provincia de Moçambique.

Tive já a honra de ser deputado por aquella provincia, alem de ali ter residido por algum tempo.; assim tenho tido occasião de apreciar as suas circumstancias especiaes, ede adquirir conhecimento mais de perto dos seus recursos e necessidades.

É por isso que, entendendo que era um principio de boa administração fazer cumprir o decreto que aboliu os prazos da corôa, o que contribuiria muito para augmentar a receita n'aquella nossa possessão ultramarina lembrei este alvitre, na occasião em que estava nos conselhos da corôa um ministerio progressista, instando solicitamente porque se executasse esse decreto para a abolição dos prazos e presto testemunho da minha homenagem ao sr. marquez de Sabugosa, que era então ministro da marinha e ultramar, porque immediatamente deu ordens terminantes a fim de que elle se pozesse em execução, resultando d'este facto vantagens incontestaveis no sentido do augmento dos rendimentos da provincia, resultados que todos já conhecem e que podiam ser mais ampliados se não se tergiversasse, e continuassemos com energia e boa vontade no mesmo trilhar.

Tendo, porém, noticia de que algumas concessões se fi-

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zeram preterindo aquelle principio geral de boa administração, desejo conhecer as rasões que houve para apreciar se havia circumstancias attenuantes que fundamentassem similhante proceder.

É, portanto, esta a rasão que me demoveu a pedir os esclarecimentos precisos ao ministerio dos negocios do ultramar.

E com referencia ainda a assumptos coloniaes, direi mais que n'uma das ultimas sessões, correu aqui sem discussão um projecto relativo á concessão Benchimol, projecto que, por eu não estar, prevenido de que entraria na ordem do dia, por isso passou desapercebido e não pude ter ensejo de pedir a palavra para o discutir, aliás teria manifestado o meu voto, dizendo que não concordava em absoluto com os seus principios, com as clausulas que n'elle se inserem, embora os fundamentos d'aquelle projecto podes sem ter alguma rasão de ser.

É provavel que mais tarde venha ao parlamento alguma questão que tenha immediata relação com o assumpto de que se trata, e então eu Apresentarei os motivos ou rasões porque não concordava com o projecto que aqui foi approvado, o que eu não censuro.

Aproveito o estar com a palavra para dizer tambem que estimei bem que v. exa., sr. presidente, precisasse claramente a resposta que deu ao meu collega que me antecedeu, o sr. marquez de Vallada, dizendo que brevemente entrariamos na discussão da resposta ao discurso da corôa, porque, havendo questões de grande gravidade, que a todos nós cumpre apreciar, eu desejo n'essa occasião, e com effeito a mais conveniente, mostrar qual é a minha attitude em relação ao novo gabinete que hoje se acha á frente dos destinos da nação, e ao mesmo tempo encaminhar a manifestação das minhas idéas pela maneira por que os ministros da corôa responderam a um certo numero de perguntas que eu terei occasião de lhes dirigir do modo mais conciso, tanto com referencia á organisação do gabinete, como á sua marcha politica.

Eu não perguntarei, por certo, porque já não está em moda, e já não é praxe, de onde vem o gabinete, mesmo porque aliás todos nós sabemos que vem da organisação feita pelo sr. conselheiro Antonio Maria de Fontes Pereira de Mello, do sr. presidente do conselho; mas não me dispensarei de saber para onde nós marchamos?

E terminadas estas pequenas reflexões nada mais tenho a dizer n'esta occasião.

Foi lido na mesa o requerimento do digno par; é do teor seguinte:

Requerimento

Requeiro que, pelo ministerio dos negocios da marinha e ultramar, sejam enviados a esta camara os esclarecimentos relativos á concssão feita do prazo Mahindo na provincia de Moçambique.

Sala das sessões, 7 de janeiro de 1884. = Conde do Bomfim.

Mandou-se expedir.

ORDEM DO DIA

O sr. Presidente: -Vamos entrar na ordem do dia. O artigo 9.° do regimento diz o seguinte:

(Leu.)

Por consequencia, convido os dignos pares a fazerem as suas listas para a eleição de dois membros, que, conjunctamente com o presidente, hão de redigir o projecto de resposta ao discurso da corôa.

(Pausa.)

Fez-se a chamada.

O sr. Presidente: - Convido os srs. conde de Grouveia e Joaquim de Vasconcellos Gusmão a servirem de escrutinadores.

Feito o apuramento, verificou-se terem entrado na uma 30 listas, saindo eleitos os dignos pares srs. Mártens Ferrão com 25 votos e Antonio de Serpa Pimentel com 18 votos.

O sr. Presidente: - Vae ler-se na mesa o parecer n.° 17,9.

Leu-se e é do teor seguinte:

PARECER N.° 179

Senhores.- Á vossa commissão de marinha foi presente o projecto de lei n.° 190, vindo da camara dos senhores deputados e que tem por fim applicar á divisão de veteranos de marinha o deposto no artigo 4.° do decreto com força de lei de 22 de outubro de 1868.

A commissão, considerando que não ha rasão alguma que justifique a continuação da desigualdade que existe na remuneração de serviços identicos, é de parecer que o referido projecto merece a vossa approvação para subir á sancção real.

Sala da commissão, em 7 de maio de 1883.= Visconde de Soares Franco = Antonio de Sousa Silva Cosia Lobo = Marino João Franzini = José Baptista de Andrade.

Projecto de lei n.º 190

Artigo 1.° E applicado á divisão de veteranos de marinha o disposto no artigo 5.° do decreto com força de lei de 22 de outubro de 1868.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 4 de maio de 1883.= João Ribeiro dos Santos, vice-presidente = Francisco Augusto Florido de Mouta e Vasconcellos, deputado secretario = Augusto Cesar Ferreira de Mesquita, deputado secretario.

Foi approvado sem discussão na generalidade e especialidade.

O sr. Presidente: -Vae entrar em discussão o pareces n.° 221.

Foi lido na mesa é do teor seguinte:

PARECER N.° 221

Senhores. - A commissão de guerra a cuja apreciação foi submettido o projecto de lei n.° 202, vindo da camara dos senhores deputados, que tem por fim reformar no posto de alferes, o antigo cadete do batalhão de artilheria de primeira linha da ilha da Madeira, Sabino José de Ornellas e Vasconcellos, conclue do seu estudo e do exame dos documentos que serviram de fundamento ao referido projecto, que se prova que Sabino José de Ornellas, sentou praça em 1821 como cadete no batalhão de artilheria de primeira linha, na ilha da Madeira; prestou assignalados serviços á causa liberal em circumstancias gravissimas, com risco de vida, e depois de 1834 seguiu differentes postos no batalhão de artilheria auxiliar, sendo o ultimo como capitão quartel mestre, como se vê da ordem do exercito n.° 1 de 1858.

A vossa commissão, pois, ponderando as circumstancias especiaes deste individuo, os seus distinctos e excepcionaes serviços, e tendo em consideração que elle conta mais de cincoenta annos de serviço militar, entende que a reforma que elle solicita, é uma justa, moderada e bem merecida recompensa; e portanto é de parecer, de accordo com o governo, que o referido projecto deve ser approvado e convertido em lei para subir á sancção real, nos seguintes termos:

PROJECTO DE LEI

Artigo 1.° É o governo auctorisado a reformar no posto de alferes o antigo cadete do batalhão de artilheria de primeira linha da ilha da Madeira, Sabino José de Ornellas e Vasconcellos, tendo só direito aos vencimentos que d'esta reforma lhe provenham, desde a data da publicação do respectivo decreto.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões, 12 de junho de 1883.= Fortunato José Barreiros = V. de S. Januario - A. X. Palmeirim - Jeronymo Maldonado d'Eça = Conde do Bomfim, relator.

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PARECER N.° 221-A

A commissão de fazenda nada tem que oppor ao projecto n.° 202, vindo da camara dos senhores deputados.

Lisboa, 15 de junho de 1883. = Barros e Sá = Francisco Costa = Visconde, de Bivar = A. Palmeirim.

Projecto de lei n.° 202

Artigo 1.° É o governo auctorisado a reformar no posto de alferes o antigo cadete do batalhão de artilheria de primeira linha, da ilha da Madeira, Sabino José de Ornellas e Vasconcellos, tendo só direito aos vencimentos que d´esta reforma lhe provenham, desde a data da publicação do respectivo decreto.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 9 de maio de 1883. = Ribeiro dos Santos, vice-presidente = Francisco Augusto. Florido de Mouta e Vasconcellos, deputado secretario = Augusto César Ferreira de Mesquita, deputado secretario.

Foi approvado sem discussão, tanto na generalidade como na especialidade.

O sr. Presidente: - A proxima sessão será na quarta feira, 9 do corrente, e a ordem do dia á discussão dos pareceres n.ºs 206 e 215.

Está levantada a sessão.

Eram tres horas e quarenta minutos da tarde.

Dignos pares presentes na sessão de 7 de janeiro de 1884

Exmos. srs. João de Andrade Corvo; Marquei: de Vallada; Condes, de Alte, do Bomfim, de Castro, de Gouveia, de Linhares, de Ficalho; Viscondes, de Arriaga, de Moreira de Rey, de Soares Franco, de Villa Maior; Barão de Santos; Ornellas, Aguiar, Sousa Pinto, Barros e Sá, Couto Monteiro, Arrobas, Serpa Pimentel, Palmeirim, Basilio Cabral, Sequeira Pinto, Montufar Barreiros, Francisco Cunha, Henrique de Macedo, Jeronymo Maldonado, Abreu e Sousa, Ferreira Lapa, Gusmão, Gomes Lages, Baptista de Andrade, Pinto Basto, Castro; Ponte, Horta, Mello Gouveia, Mexia Salema, Silvestre Ribeiro, Bocage, Placido de Abreu, Thomás Ribeiro.

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