6 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO
o faria na ausencia do sr. ministro; no emtanto, reputo do meu rigoroso dever, a fim de fazer desapparecer qualquer apprehensão que porventura possa existir no animo dos meus collegas, declarar, que não foi nenhum acto menos regular praticado pela administração de que eu fazia parte, que provocou aquella resolução.
N’estes tempos que vão correndo é preciso que isto fique bem claro (Apoiados), e por isso passo a expor á camara dos dignos pares os motivos que levaram o governo a publicar o decreto a que me refiro.
Á junta do credito publico baixou uma portaria do mininisterio da fazenda, para que a caixa geral de depositos fizesse um avultado emprestimo ao hospital das Caldas da Rainha em condições que a administração da caixa julgou menos convenientes aos interesses d’essa instituição, interesses que lhe cumpria zelar. N’este sentido representou respeitosamente ao governo. Dois dias depois a junta recebeu uma nova portaria, instando para que o emprestimo se fizesse. Novamente a junta representou, allegando que o seu regulamento lhe impunha o dever e a obrigação de determinar os prasos, a opportunidade, e a taxa do juro por que se faziam os emprestimos, mas que reconhecia que só o governo, nas circumstancias anormaes que atravessavamos, podia ser o juiz para apreciar um negocio que tinha de ser encarado sob diversas phases de interesse publico, e que a junta daria immediato e completo cumprimento á portaria do governo, desde que elle tomasse a responsabilidade do emprestimo.
Esta segunda consulta não mereceu resposta, e oito ou dez dias depois appareceu no Diario do governo o decreto de que a camara tem conhecimento, tirando á junta de credito publico a administração da caixa de depositos e entregando essa administração a empregados aliás dignissimos, mas dependentes do ministerio da fazenda.
Eu não me alongo em mais considerações, porque não quero cansar a attenção da camara.
Tudo o que se passou a este respeito consta em todos os detalhes de duas portarias e duas consultas trocadas entre a junta e o ministerio da fazenda, das quaes a camara póde tomar conhecimento sempre que o julgar conveniente.
Antes de terminar, sr. presidente, eu preciso de tornar bem frisante que o meu fim pronunciando estas palavras não foi discutir, e muito menos atacar o acto do governo, mas simplesmente esclarecer um assumpto em que me pareceu que estava envolvida a minha dignidade pessoal, e fazer ver á camara que, se ella pela nova organisação fica sem ingerencia alguma na administração da caixa de depositos, não foi isso devido a nenhum acta irregular praticado pelo seu representante.
Eram estas as considerações que tinha a fazer.
Terminando, agradeço á camara a benevolencia com que me ouviu.
O sr. Ministro das Obras Publicas (Pedro Victor): — Sr. presidente, o digno par sr. José Augusto da Gama, acaba de declarar que não desejava discutir, nem apreciar o decreto pelo qual foi tirada á junta do credito publico a administração da caixa geral de depositos.
Tendo s. exa. feito esta declaração, eu, pela minha parte, podia deixar de entrar em quaesquer Considerações a este respeito.
O assumpto de que se trata, de mais a mais, prende-se com a pasta da fazenda, e por um dever; de delicadeza para com o sr. presidente do conselho, cumpria-me a mim esperar que s. exa. a viesse responder ao digno par, logo que em qualquer outra conjunctura se levantasse esta questão.
Como o digno par, porem, quiz fazer ver á camara, de uma maneira bem clara, que a sua dignidade pessoal podia achar-se de algum modo compromettida e envolvida no decreto do governo, eu desejo significar a s. exa. que, por parte do governo, não houve a menor intenção de melindrar a s. exa., nem o desejo ou a idéa de deixar de reconhecer em s. exa. um funccionario dignissimo, e um rés-peitabilissimo membro da junta do credito publico.
Por consequencia, as apprehensões que s. exa. manifestou á camara são completamente infundadas.
O sr. ministro da fazenda entendeu que praticava um acto de pura feição economica e de alcance meramente administrativo, não havendo, como não podia haver, a mais ligeira intenção de melindrar nem ao digno par, nem a nenhum dos outros membros da junta n’estes ultimos tempos.
Era isto que, como membro do governo, eu tinha a dizer, é folgo de ter tido esta occasião para manifestar ao digno par toda a consideração e respeito que o governo consagra a s. exa. e aos seus serviços como funccionario.
(S. exa. não reviu.)
O sr. Conde de Thomar: — Sr. presidente, pedi a palavra para aproveitar a presença do sr. ministro das obras publicas, a quem desejo dirigir algumas observações ácerca das aguas de Lisboa.
Toda a camara sabe que se tem travado nos jornaes uma discussão scientifica com relação ás chamadas aguas livres, fornecidas para consumo da capital, discussão proveniente de ter um medico distincto, o sr. dr. Pestana, achado nessas aguas um bacillo que não apparece senão nos entes humanos.
É evidente que a apparição d’este bacillo é resultante de infiltrações que se deram nalgumas das nascentes das aguas que entram no aqueducto. Ora, esta questão é da maior importancia, porque se trata da saude publica. Não me consta que até hoje, por parte da camara municipal ou do governo, se tenham tomado, quaesquer medidas conducentes a evitar o mal, que póde ser gravissimo.
Em resultado das observações feitas pelo sr. dr. Pestana, o director dos hospitaes de Lisboa entendeu por conveniente collocar nos differentes hospitaes filtros Chamberlain, para que os doentes não bebessem uma agua suspeita de estar inquinada de qualquer molestia.
Esta medida é de certo acertadissima; mas, se ás pessoas abastadas é facil munirem-se de um filtro para beberem agua pura, o mesmo não succede á maior parte da população de Lisboa, que bebe agua do aqueducto das aguas livres.
Consta-me que se estão fazendo algumas observações sobre o bacillo do typho e outros, que parece se encontraram n’aquellas aguas e que podem ser prejudiciaes á saude publica.
Se as aguas livres de Lisboa estão de facto inquinadas, já era tempo de se tomarem algumas providencias, e demais, se, como tenho ouvido a muitos homens de sciencia, ha todas as probabilidades de Portugal ser ainda visitado pelo cholera, havendo qualquer infiltração má nas nascentes das aguas, é evidente que se manifestará uma nova epidemia em Lisboa, sendo, como todos sabem, a agua o melhor conductor do cholera e de todos os outros bacillos.
É costume, quando apparece uma epidemia, tomar-se providencias extraordinarias. O conselho de saude reune immediatamente, formam-se os cordões sanitarios, mandam-se caiar os predios, etc.; com respeito ás aguas de Lisboa, porem, não me consta até hoje que se tenham tomado providencias rasoaveis, nem mesmo por parte da camara municipal.
Eu não quero discutir a questão que existe entre a companhia das aguas e o governo.
Diz-se que ha um contrato feito em 1888 por tal fórma oneroso para o thesouro que nenhum dos srs. ministros das obras publicas que se têem succedido no poder depois do contrato, conseguiu chegar a um accordo com a companhia.
Se esta tem direito a receber alguma indemnisação do governo, tambem me parece justo que o governo chegue