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CAMARA DOS DIGNOS PARES.
EXTRACTO DA SESSÃO DE 14 DE JANEIRO DE 1859.
PRESIDENCIA DO Ex.mo SR. VISCONDE DE LABORIM
VICE-PRESIDENTE
Conde de Mello Secretarios, os Srs. Conde de Peniche.
As duas e meia abriu-se a sessão estando presente numero legal. Leu-se a acta da antecedente, que se approvou.
Deu-se conta da seguinte correspondencia: Um officio do Chefe da Repartição de Saude, remettendo 60 exemplares do mappa da gerencia da Repartição de Saude do Exercito. Distribuiram-se.
— da Camara dos Srs. Deputados, enviando fim projecto de lei, sobre ser elevado a 200$000 réis annuaes o ordenado do Guarda do Instituto Industrial.
Á commissão de administração publica.
O Sr. Presidente — Tem a palavra antes da ordem do dia o Sr. Conde de Thomar.
O Sr. Conde de Thomar mandou para a Mesa 16 requerimentos de Officiaes que requerem á Camara dos Dignos Pares haja por bem rejeitar o projecto das indemnisações, e pede que se lhes dê o mesmo destino que tem tido outros, não obstante o projecto estar dado para ordem do dia.
O Sr. Presidente — Ficam sobre a mesa.
O Sr. Conde de Thomar (continuando) diz que sente muito não se achar presente algum dos Srs. Ministros, porque tinha a dirigir-lhe directamente uma pergunta, mas visto que não está presente, limitar-se-ha a fazer um requerimento, o qual espera que a Camara tome em consideração.
Acabava de se publicar um folheto no qual se pertende apresentar como homens reaccionarios contra o partido liberal varios funccionarios publicos das primeiras classes deste paiz, homens que ou tem servido no Ministerio, ou são Conselheiros d'Estado, ou tem mesmo desempenhado o cargo de plenipotenciarios em alguns tractados com potencias estrangeiras. A accusação é demasiado forte, para que ella não deva merecer a attenção não só dos individuos a quem respeita, mas daquelles que se interessam pelas causas publicas.
Não fallará de si, que tem constantemente militado no campo da liberdade (O - Sr. Presidente — Apoiado), e não receia que estes novos liberaes que hoje se apresentam a accusar aquelles que sempre militaram no campo da liberdade, possam dirigir a elle orador, o aos que tem estado ao seu lado, accusações infundadas (apoiados); talvez fosse mais conveniente despresar essas accusações; mas quando vê que é uma associação, á qual pertencem individuos que considera pelo seu talento e capacidade, a que dirige accusações desta ordem, entende que não deve calar-se, porque se acha involvido como reaccionario contra a liberdade deste paiz, conjunctamente com o Ministerio debaixo de cujas ordens serviu, e a que pertenceu um illustre e Digno Par que se acha sentado nos bancos diante delle orador, e outro que foi Presidente desse Ministerio, o Marechal Duque de Saldanha. Achando-se pois involvido nestas accusações, não podia deixar de pedir a palavra hoje, para mostrar em tempo competente, que as accusações que são mencionadas no dito folheto, ou peccam por ignorancia completa dos factos, ou por uma malicia injustificavel (Muitos apoiados — O Sr. Marques de Vallada — Isso é que é), attribuindo-se aos homens d'Estado deste paiz pensamentos que elles nunca tiveram, e que são incapazes de ter (apoiados).
Ao convénio de 27 de Outubro de 1848, que teve a honra de assignar como plenipotenciario do Governo de Portugal, Governo que então era presidido pelo Marechal Saldanha, e em que era Ministro dos Negocios Estrangeiros o seu particular amigo o Sr. Visconde de Castro, attribuem se essas idéas raccionarias, mas invertem-se completamente as disposições daquelle convénio, e vai-se procurar á circumstancia mais innocente que dar-se póde, motivo para fundamentarem essas accusações. Esse convénio continha resoluções que dependiam da approvação das Côrtes, contras que eram só da attribuição do Governo, de accordo com a Santa Sé; o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros, no relatorio publicado por essa occasião, deu conta ás Côrtes das resoluções que dependiam da approvação do Corpo legislativo, deixando de dar conta daquillo que estava inteiramente nas attribuições do Governo. A esta circumstancia se vai ainda buscar motivo para taxar de altamente vergonhoso para a Corôa, e altamente deshonroso para a Nação Portugueza este convénio. Desejava portanto pedir, se estivesse presente o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros, quizesse mandar publicar no Diario do Governo aquelle convénio, para desengano de todos, e para se ver a malicia com que se pertende illudir os incautos (muitos apoiados), mas não se achando presente o Sr. Ministro, manda para a Mesa o seguinte requerimento, pedindo á Camara queira toma-lo em consideração:
«Requeiro que se peça ao Governo, que mande publicar no Diario do Governo o convénio de 21 de Outubro de 1848, celebrado entre o Governo pontificio e o Governo portuguez. Camara dos Pares, 14 de Janeiro de 1859. = Conde de Thomar.»
Proseguiu. — A Camara já vè ser isto um negocio que toca a honra de muitos empregados publicos, e que é indispensavel que seja publicado quanto antes o convénio. Pede portanto que com urgencia se remetta ao Governo este requerimento.
(Leu-se na Mesa.)
O Sr. Presidente — Vou consultar a Camara sobre a urgencia deste requerimento.
Approvada a urgencia, foi em seguida approvado o requerimento.
O Sr. Presidente — Vão expedir-se as ordens necessarias.
O Sr. D. Antonio José de Mello e Saldanha — É para dizer que o Sr. Conde de Penamacor me encarregou de participar a V. Ex.ª e á Camara, que lhe era impossivel comparecer hoje, em consequencia de estar com um ataque de asthma, a que é sujeito, mas que logo que estivesse melhor viria cumprir o seu dever.
O Sr. Conde de Samodães — Vou mandar para a Mesa dois requerimentos assignados por varios Officiaes do Exercito, que alem a esta Camara que approve o projecto que veio da outra casa sobre indemnisações de preterições por motivos politicos. Peço que fiquem sobre a mesa, para serem tomados em consideração, como se fez aos que apresentou ha pouco o Sr. Conde de Thomar.
0 Sr. Presidente — Assim se fará.
O Sr. Conde do Bomfim — Sr. Presidente, pedi a palavra para manifestar a V. Ex.ª e á Camara, que o Sr. Visconde de Sá me incumbiu de declarar, que elle não póde comparecer, em consequencia de estar com uma grande rouquidão, porque saíndo antes de hontem do Arsenal apanhou alli uma tal friagem, que lhe fez muito mal, e posto que hontem estivesse melhor, comtudo, hoje não lhe é possivel comparecer, e talvez ainda por mais alguns dias não poderá saír de casa.
Direi tambem por esta occasião, que S. Ex.ª me encarregou de dizer, que tinha recebido convite para assistir á discussão do projecto de que tracta o parecer n.º 71, relativamente ás antiguidades dos Officiaes; que elle está de accôrdo com o parecer da minoria (O Sr. Marquez de Ficalho — Sobre a ordem), e que estava para communicar a V. Ex.ª e á Camara o que deixo referido em caria que lhe ia dirigir.
O Sr. Presidente — Não sei se isso será conveniente (Vozes — Não póde ser, e inconveniente), porque as declarações de voto costumam ser pessoaes.
O Sr. Conde do Bomfim — V. Ex.ª ha de permittir-me que continue.
Sabendo S. Ex.ª que o projecto estava dado para ordem do dia, mas ignorando se entraria ou não em discussão, visto não poder estar presente, é a razão porque quiz se soubesse que estava de accôrdo com o parecer da minoria.
Agora mandarei para a Mesa alguns requerimentos de Officiaes que pedem a approvação do mesmo projecto; e por ultimo declararei a V. Ex.ª e á Camara, que tenho faltado ás ultimas sessões em consequencia de falta de saude.
O Sr. Marquez de Ficalho — É simplesmente para pedir á Camara, que não acceite a declaração do Sr. Conde do Bomfim (apoiados). Nós não queremos saber como o Sr. Visconde de Sá, Ministro da Guerra, pensa nesta questão, queremos saber como o Governo pensa (apoiados); por consequencia se um dos seus collegas, o Sr. Presidente do Conselho, entende que deve vir a esta Camara dizer como elle encara esta questão, a Camara póde esperar duas, tres, cinco ou seis horas, e está disposta a isto; mas uma declaração do Sr. Ministro feita por -um individuo que não está no Ministerio, que não tem responsabilidade, não se póde acceitar. Eu peço á Camara que de maneira nenhuma deixe passar este precedente, que se não imporia hoje transtorno aos trabalhos da Camara, póde outro dia importar. S. Ex.ª, se tem a fazer uma declaração como individuo particular, é o proprio individuo que a deve fazer, se tem n fazel-a coma Ministro, é preciso que encarregue disso um dos seus collegas (apoiados).
O Sr. Presidente — Eu principio por dizer a V. Ex.ª que o Presidente fez o seu dever, porque avisou o Sr. Conde do Bomfim que não podiam ter logar votos por procuração (apoiados).
O Sr. Conde do Bomfim — Sr. Presidente, parecia-me que devia ter sido bem entendido quando fiz a declaração, que tanta bulha está fazendo, a qual se reduzia a mostrar que o Sr. Visconde de Sá não podia comparecer hoje e mais alguns dias; mas que S. Ex.ª lembrando-se que podia a Camara resolver que se entrasse na discussão do projecto, estando ou não estando presente algum dos Srs. Ministros, queria ratificar aquilo que eu disse no parecer da minoria, que S. Ex.ª já aqui declarou vocalmente, isto é, que a sua opinião era a mesma que estava no parecer da minoria. Isto não é dar um voto sobre o projecto, como se está inculcando (os Ministros só podem votar quando votar a Camara), é declarar a opinião do Ministro, e contra a opinião que teem avançado alguns Dignos Pares entendo que não exorbitei das praticas parlamentares, e que eu não era pessoa estranha a fazer essa declaração, pois que sou membro da commissão de guerra, a qual ouviu sobre este objecto o Sr. Minis
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tro, e a Camara tem constantemente querido que se saiba a sua opinião; e, portanto, não estando presente nenhum dos Srs. Ministros, não considero que eu deva ser censurado por declarar a opinião do Sr. Ministro da Guerra, até porque, assim como qualquer Digno Par vem aqui apresentar escusas, e fazer declarações de qualquer dos nossos collegas não poder comparecer, assim eu a podia fazer, relativamente ao Sr. Visconde de Sá, a respeito do objecto de que se tracta, e porque emfim, eu tinha assegurado no meu parecer que S. Ex.ª era daquella opinião; e então dizendo agora, que elle me auctorisava a ratificar isto mesmo, creio, torno a repetir, não ter proferido proposição que com justiça possa ser censurada.
O Sr. Visconde de Balsemão — Eu desejava saber se estava admittido nesta Camara o lançar-se na acta a declaração de voto de um Digno Par que não esteve presente a qualquer discussão, sobre que a final votara? Creio que já ha este precedente; e se o Sr. Ministro da Marinha já aqui declarou, que não só como Par, mas que como Ministro votava pelo parecer da minoria da commissão, parece-me que nenhum inconveniente ha em se acceitar a declaração que fez o Digno Par o Sr. Conde de Bomfim, que se limitou a declarar que o Sr. Ministro da Marinha o encarregára de dizer que não podia comparecer por motivo de molestia; mas que na supposição de que a Camara entrasse na discussão do objecto de que se tracta, S. Ex.ª unia o seu voto ao do parecer da minoria da commissão.
O Sr. Marquez de Vallada sendo igualmente de opinião que a declaração de voto apresentada pelo Sr. Conde de Bomfim não póde ser acceita, perguntou á Mesa se os Srs. Ministros tinham si do avisados da ordem do dia para a presente sessão.
O Sr. Vrcsidente — Em virtude do requerimento que fizera um Digno Par, eu dei as ordens mais restrictas para que fosse levada á execução a vontade do mesmo Digno Par e da Camara, participándo-se a todos os Srs. Ministros que hoje a Camara entrava na discussão deste projecto; no entanto se S. Ex.ª não comparecem não é por falta de aviso.
O Sr. Visconde d'Athoguia — No que vou dizer não poderei ser suspeito.
Verdade é que os Srs. Ministros se não acham apresentes, como era necessario que estivessem; sei, porém, que dois delles estão empenhados n'uma questão que se ventila na outra casa do Parlamento, e que ambos alli teem a palavra para responderem ás observações que lhes teem sido dirigidas; o Sr. Ministro da Marinha, como um Digno Par acaba de declarar, está doente, por conseguinte só falta um sem motivo, por ora conhecido, o Sr. Presidente do Conselho. Temos, comtudo, de nos occupar de uma questão grave sobre que é indispensavel ouvir a opinião do Ministerio.
O Sr. Presidente — Direi ao Digno Par que eu na declaração que fiz não tive a intenção de censurar os Srs. Ministros, mas tão sómente de mostrar que a Mesa havia cumprido as ordens da Camara.
O Sr. Marquez de Ficalho — Sr. Presidente, alem de tudo quanto se tem dito, eu entendo que é uma cousa inteiramente nova a declaração que acabou de fazer o Digno Par o Sr. Conde de Bomfim. Pois, que é que quer dizer a declaração de voto sobre uma materia que a Camara ainda não discutiu?! (apoiados) A Camara póde porventura admittir a declaração de voto de um dos seus membros sobre uma questão que ainda aqui se não discutiu?... De certo que não (apoiados). Então a que vem a declaração de voto do Sr. Ministro da Marinha? Poderia ella influir no animo de alguem? Tambem não, porque cada um dos membros desta casa ha de votar como entender em sua consciencia (apoiados).
Sr. Presidente, que culpa ternos nós dos Ministerio não estar completo? Nenhuma; e o Ministerio se não está completo, é porque não tem querido completar-e. Obstava-lhe acaso a questão da barca Charles et Georges? De certo que não; porque o Ministerio não deixaria de encontrar na sua maioria, que tem no Parlamento, quem quizesse com elle assumir a mesma responsabilidade que tem tomado apoiando o mesmo Ministerio. Mas, como essa questão já acabou, será agora a questão da concordata com a corte de Roma que ainda obsta a que o Ministerio se complete? Pois não terá o Ministerio duas pessoas na maioria que p apoiem nesta questão? Ha de ter; logo que duvida haverá em que essas pessoas vão para o Ministerio tomar a mesma responsabilidade que tomam como maioria?... A culpa é do Governo que se não quer completar, e nesse caso vá a responsabilidade a quem toca. Pela minha parte, eu declaro que não desejo fazer opposição ao Ministerio, que desejo que elle continue; quero que os Ministros sejam os mesmos, mas quero-os de outro modo (apoiados).
Ora, repito, aqui ninguem póde votar senão depois da materia estar discutida, mas nunca por procuração. E nem eu entendo esta distincção que se faz entre Par e Ministro. Reprovo tal divisão quando se tracta de questões desta ordem, sobre que o Governo deve ser explicito emittindo a sua opinião com toda a franqueza. O Sr. Conde de Thomar confessa' que não sabe o que ha de dizer, em vista do que se está passando nesta Camara, que bem se póde julgar estar-se resando o officio de defunctos ao Ministerio (apoiados).
Não póde o orador de modo algum approvar, que um Digno Par se encarregue de vir expor á Camara, qual é a declaração de voto que um Ministro da Corôa ha de dar sobre qualquer questão que haja de se discutir, e tanto mais na questão que vai occupar esta Camara, que é grave, e que exige toda a franqueza da parte do Ministerio, comparecendo, discutindo, e votando.
No entanto o Digno Par o Sr. Conde do Bomfim alguma razão tem; empenhado, como S. Ex.ª está em que se approve o projecto que veiu da outra Camara, tem procurado influir por todos os modos para que a sua opinião prevaleça, e assim entendeu que enunciando qual era a opinião do Sr. Ministro, poderia isto influir para a approvação do projecto; sem que ao mesmo tempo S. Ex.ª deixasse de conhecer que o meio era singular, porque o Digno Par logo disse, que fazia aquella declaração a pedido do Sr. Ministro.
O orador declara, que não é inteiramente conforme com o espirito da proposta do Digno Par o Sr. Visconde de Alhoguia, que exige a presença de todo o Ministerio nesta discussão do projecto, porque sendo os Ministros solidarios é certo que a opinião de um é a opinião de todos, e elle orador dava-se por satisfeito com a presença de algum delles. Isto pelo que respeita aos principios em geral,
Mas em relação a esta materia, tem pena de se separar da opinião de alguns Dignos Pares, quando entendem que é necessaria a presença do Ministerio nesta discussão. Pois para que é necessaria essa presença? Não ha já a declaração official do Sr. Ministro da Marinha, servindo interinamente a pasta da Guerra? S. Ex.ª que não é homem de torcer, não disse já qual a sua opinião individual, accrescentando comtudo que não sabia então qual era o pensamento dos seus collegas? E não se sabe qual foi a opinião expendida na outra casa. pelo Sr. Ministro da Guerra (que se acha doente), fazendo igual declaração de que era opinião sua, independente da dos seus collegas, que ignorava? Logo, a que proposito exigir agora a opinião do Ministerio, n'uma questão em que o Ministerio não tem opinião, e quando dois de seus membros assim o teem já declarado?
Se elle orador tivesse alguma duvida sobre o contheudo deste projecto, se não estivesse resolvido a votar contra elle, o procedimento do Governo nesta questão, seria razão de sobejo para votar contra a medida, porque esta resistencia de todos os Ministros em não declarar de uma maneira franca se o Ministerio approva ou não o projecto, é mais um forte motivo para que deva ser rejeitado. SS. Ex.ªs o que desejam é não assistirem á discussão, e elle orador desejando tiral-os desta difficuldade, entende que o melhor seria que a Camara passasse á discussão do projecto, ficando certo de que nenhum mal poderá vir da não presença dos Srs. Ministros, que nunca aqui declararam qual é a este respeito a opinião do Governo.
Pergunta, se a Camara quereria dar ao Ministerio um voto de censura, pelo seu procedimento, a respeito do projecto?... Pois, o procedimento de não se achar aqui presente, quando o devia estar, não será motivo bastante para um voto de censura? Julga que sim. Sabem SS: Ex.ª que -a Camara dos Pares ha de hoje occupar-se deste projecto, e não comparecem! Demais, esta questão não deve retrogradar, tanto mais que já ha a certeza de que o Governo o que quer é que se rejeite o projecto; por conseguinte rejeite-se, e para isso passe-se immediatamente á discussão.
Enviou para a Mesa a sua proposta, que é do theor seguinte;
«Proponho, que se entre immediatamente na discussão do projecto que faz a ordem do dia. Camara dos Pares, 11 de Janeiro de 1839. = Conde de Thomar.»,
O Sr. Conde do Bomfim — Sr. Presidente, vejo que não foram bem acolhidas as minhas expressões; vejo que um illustra ornamento desta casa, que acaba da fallar, condemnou o que eu disse em relação ao nobre Visconde de Sá, emittindo a sua opinião, dizendo que era porque estando eu empenhado nesta discussão, e empenhado como estou, em defender o projecto, quereria fazer peso com o nome do Sr. Ministro da Guerra, sobre a opinião dos membros desta Camara, mas que não pertencendo eu á Administração, eu mesmo devia reconhecer que não estava no caso de fazer esta communicação á Camara; mas peço a V. Ex.ª e á Camara, que me dêem alguma attenção.
Lembrando que esta declaração que fiz agora, está de accôrdo com uma feita por escripto por S. Ex.ª, e agora não fiz mais do que repelir, porque tendo estado hontem com S. Ex.ª, e dizendo-me elle que não podia vir hoje, me auctorisava a ratificar o que estava escripto.
Porém. Sr. Presidente, aqui ainda ha mais uma circumstancia que se deve attender, diz-se que o Ministerio o que quer é que esta Lei passe sem que elle se tenha pronunciado, não é assim; na outra Camara dois dos Srs. Ministros, o Sr. Couceiro, e o Sr. Carlos Bento, votaram' pelo projecto, e o actual Ministro interino da repartição competente, declarou aqui e na commissão, que a sua opinião era a favor do projecto; ora, á vista disto, parece-me que se não póde dizer que o Ministerio se não pronunciou, porque, quem falta alem do Sr. Avila, e o Sr. Marquez de Loulé, e de certo nenhum delles póde considerar esta materia, em opposição ao voto dos seus collegas, e da maioria que apoiou o projecto na Camara dos Srs. Deputados.
(Leu-se na Mesa a proposta do Sr. Conde de Thomar.)
O Sr. Presidente — Lembro á Camara que ha uma resolução tomada para que se não entre na discussão deste projecto, sem que estejam presentes os Srs. Ministros.
O Sr. Visconde de Athoguia — Sr. Presidente, daquelle lado da Camara diz-se, que o Governo se não quer explicar, deste lado diz-se que já se explicou, e qual é o meio de se saber quem tom razão? É fazer com que o Governo se apresente aqui, e não entramos na discussão sem que aqui esteja algum dos membros do Ministerio, a fim de sabermos a sua opinião.
O Sr. Presidente — A proposta não está ainda em discussão, e por consequencia quando o estiver, se fôr admittida, então darei a palavra aos Dignos Pares.
(Leu-se a proposta que foi admittida, e entrou depois em discussão.)
O Sr. Visconde d’Athoguia — Tenho insistido e ainda insisto para que estejam presentes alguns dos Srs. Ministros a fim de declararem qual é a opinião do Governo sobre este objecto. Quando não julgasse, por outro motivo que logo direi, que a presença do Ministerio era necessaria, bastava o que ha pouco se passou nesta casa, para eu querer saber positivamente a opinião do Governo.
O motivo porque desejo a presença do Ministerio passo a explical-o.
Esta questão, Sr. Presidente, de indemnisar os officiaes que se acham preteridos e que tem em seu favor circunstancias muito attendiveis para obter a collocação que entendem lhes compele, não é nova, foi uma questão altamente debatia I durante a administração transacta, foi uma questão em que todos os membros daquella administração, levados pelo desejo de congrassar a familia portugueza, procuraram acabar com as causas que dessem motivo a dissensões entre os portuguezes em geral, foi tomada uma deliberação, pela qual fomos censurados, dizendo-se que tinhamos levado ao thesouro uma grande despeza; mas, no em tanto, naquella época, não se julgou que se podesse ir mais longe. Hoje, porém, apparece a questão, é preciso que o Governo nos diga que della não resulta inconveniente algum, para poder ser convertido em lei o projecto do que tracto, e segundo a declaração do Ministerio, é que eu poderei ficar habilitado para votar a favor ou contra o projecto. Se o Ministerio entende que não deve fazer desta que são — uma questão Ministerial — não a faça, e em vista das circumstancias especiaes de alguns de seus membros em relação aos seus camaradas preteridos sobre S. Ex.ª pesará a responsabilidade da pouca attenção que deram na outra casa do Parlamento, e vejo darão nesta a este projecto que, como já disse em outra sessão, é no meu entender de grande trascendencia. A Camara ouviu o Digno Par o Sr. Visconde de Ovar asseverar que entre os Officiaes do Exercito appareceria a sizanía e desharmonia se este projecto fosse approvado, se isto é assim, não é um simples projecto de que vamos tractar. Diz o Digno Par o Sr. Conde de Thomar — os Ministros o que querem é não se pronunciar sobre esta questão; e haja discussão sem a sua presença: se eu não soubesse que S. Ex.ª não apoia o Governo, diria que era um favor que queria fazer ao Ministerio dispensando-o de comparecer nesta casa quando se tracta de tão grave materia, e eu desejo a presença de S. Ex.ª para que sejam responsaveis pelo que disserem, pelo que fizerem, e quero que compareçam na Camara, porque é esse o seu dever, aliás não se é Governo (apoiados). Chamo á memoria da Camara um facto muito notavel. — Sentava-me naquellas cadeiras como Ministro, bem como o nobre Duque de Saldanha, S. Ex.ª queria acabar com as chibatadas no Exercito, e eu não, eramos ambos collegas, cada um dava as suas razões, porque cada um tinha a sua opinião, e eu ainda tenho a mesma; mas isto que então succedeu, podia dar-se agora com o Governo, concorrerem aqui os Srs. Ministros apresentando os motivos do seu accôrdo ou desaccordo sobre a approvação de projecto, porque não hão de S. Ex.ª agora fazer o mesma que então se fez? Porque não vem ao menos o Sr. Presidente do Conselho, que é o mais preciso, por ser aquelle em quem se concentra tedo o pensamento Governativo? porque não ha de apresentar-se aqui e apresentar as razões por que convem, ou não convem que o projecto seja approvado? Isto é o que fazem todos os Governos, nos paizes aonde ha Representação Nacional, e meio precedente seria o de dizerem os Srs. Ministros que não é do seu dever, e no meu entender é dos seus primeiros deveres comparecer no Parlamento quando nelle se tractam questões graves e de interesse publico. (O Sr. Marquez de Vallada — Peço a palavra sobre a ordem.) Sem ouvir o Governo a este respeito posso Sr. Presidente, examinar a questão e formar a minha opinião sobre ella, mas como Par do reino, sem os esclarecimentos que preciso obter do Governo, não posso votar a favor nem contra este projecto.
O Sr. Visconde de Balsemão — Sr. Presidente, eu não posso deixar de apoiar a proposta do Sr. Conde de Thomar para ser coherente com os principios que tenho adoptado. Quando a opinião do Governo se tem feito conhecer, em outra parte onde ella deve ser conhecida, não podemos deixar de dizer que já a conhecemos. O Governo disse na Camara dos Srs. Deputados qual era a sua opinião sobre este objecto, e o Sr. Visconde de Sá tambem disse que como Par e Ministro da Guerra que adoptava o projecto...
(Entrou o Sr. Presidente do Conselho).
Vozes — Acabou a questão (susurro).
O orador — Eu não costumo interromper os Dignos Pares quando estão fallando, e desejo tambem ser ouvido com attenção. O Sr. Couceiro declarou na outra casa, que como Ministro, e como Deputado, não receiava e a adoptava, como a quem pertencia a responsabilidade, os outros dois Ministros votaram n favor deste projecto, e os outros que não se declararam disseram que não receiavam da approvação ou rejeição desta medida, quer dizer que o Governo não faria deste objecto questão Ministerial, e que tomava a responsabilidade de qualquer que fosse o resultado que tivesse este projecto nesta Camara, e então não posso dizer que o Governo se recusa a dar explicações a este respeito. Eu não sou ministerial nesta questão, nem deixo de o ser, hei de votar conforme a minha consciencia, mas entendo que a Camara já está esclarecida, e por tanto voto pela proposta do Sr. Conde de Thomar.
O Sr. Conde de Thomar (sobre a ordem) lembra que toda esta discussão deve acabar com a presença do Sr. Presidente do Conselho (apoiados).
O Sr. Presidente — Acham-se inscriptos os Srs. Marquez de Ficalho, Conde de Samodães e Marquez de Vallada, cumpre que SS. Ex.ª cedam da palavra. 1
O Sr. Marquez de Ficalho — Acabou a razão porque a Unhamos pedido.
O Sr. Conde de Samodães — Eu tambem cedo da palavra.
O Sr. Marquez de Vallada — Eu sou de igual opinião pela mesma razão.
O Sr. Presidente — A ordem do dia primeiramente são as interpellações e depois a discussão do projecto. (O Srs. Conde de Thomar — É melhor ficarem as interpellações para outro dia.) Já vê V. Ex.ª que eu como Presidente não posso deixar de ser coherente com o que está na acta. Portanto a primeira parte da sessão de hoje são as interpellações, mas se a Camara quer passar á segunda parte da ordem do dia eu devo consultal-a.
Approvou-se.
O Sr. Presidente — Então passâmos ao parecer n.º 71 da maioria da commissão, e o respectivo da minoria.
É do theor seguinte:
Parecer n.º 74.
Foi presente á commissão de guerra o projecto da lei n.º 83, que veio da Camara dos Senhores Deputados, tendo por fim indemnisar de preterições, que se suppõe terem soffrido, alguns Officiaes do Exercito, que, desde 11 de Julho de 1843 até ao presente, não fizeram sempre parte dos quadros dos corpos, ou não estiveram empregados em commissões activas.
Tambem foram presentes á commissão 310 requerimentos de Officiaes do Exercito, que se julgam prejudicados em seus direitos, se fôr approvado o supracitado projecto de lei, pedindo a esta Camara que o rejeite, e 2 requerimentos de Officiaes, pedindo que seja approvado.
A commissão, considerando o assumpto na altura que elle merece, abstem-se de vos apresentar uma exposição detalhada das variadas circumstancias em que se acham, quando individualmente, ou em pequenos grupos considerados, os Officiaes que no alludido projecto de lei são julgados preteridos, porque receio fazer sangrar de novo as feridas ainda mal curadas das nossas desgraçadas dissenções politicas, e porque esta Camara já em sua sabedoria e imparcialidade considerou todos os fundamentos das pretenções de que se tracta, quando votou o projecto que foi convertido na Carta de Lei de 17 de Julho de 1855.
Igualmente a commissão não entrará na apreciação dos direitos, que, em presença da legislação militar vigente e derogada, se diz terem os Officiaes de que é questão a algumas promoções que se fizeram no Exercito durante o supramencionado periodo, porque seria como duvidar de que esta Camara já fez essa apreciação muito detida e reflectidamente; sendo certo que o projecto de lei, que agora se apresenta, não contém materia nova e diversa da que foi discutida e considerada para a confecção da Carta do Lei que fica referida.
Quanto ás provisões do projecto entende a commissão que difficilmente ellas se poderão executar, sem um completo transtorno da disciplina militar do Exercito, forçando Officiaes mais antigos a obedecerem a outros mais modernos, embaraçando o accesso regular dos postos, premiando feitos que todas as Leis reprovam, e as conveniencias mandam esquecer, e em todos os casos ferindo direitos adquiridos de um consideravel numero de Officiaes, que teem estado sempre em serviço effectivo nos quadros dos corpos, e que, durante a sua carreira, sem se embaraçarem com politica, teem prestado obediencia passiva na orbita da legalidade aos seus superiores. Tambem traria em resultado a execução das ditas provisões, que muitos Officiaes, que sendo sargentos ou aspirantes gravaram em seus direitos outros de tas classes, mais antigos ou de maior merito, na? promoções de 5 de Setembro de 1837, e de 15 de Fevereiro de 18H, ama segunda vez fariam igual damno áquelles seus camaradas, que, cumprindo religiosamente os seus deveres, foram conduzidos á situação em que se acham, e que lhes compete.
Finalmente, considerando a commissão que o projecto de lei em objecto importa litteralmente uma reconsideração de materia, que já foi definida e julgada pelo Parlamento; que similhante reconsideração daria idéa de precipitação nas resoluções desta Camara, e tiraria toda a segurança e estabilidade que deve haver em taes resoluções;
Considerando, quanto aos requerimentos dos Officiaes do Exercito que allegam os justos titulos por que se acham na escala de accesso existente, e pedem que esta não seja alterada, que os supplicantes merecem ser attendidos na presença dos principios de justiça e de direito, e que em favor dos Officiaes que se dizem preteridos já se fez, attendendo a seus serviços passados, quanto era possivel fazer-se, na Carta de Lei de 17 de Julho de 1855, o mais generoso diploma que se tem publicado em algum paiz da Europa, em circumstancias analogas, de cujos beneficios já se aproveitaram, e estão habilitados para se aproveitarem 168 Officiaes;
Referindo-se a commissão ao que disse no seu parecer n.º 83, de 3 de Julho de 1857, e para não fazer longas citações pelo que respeita a legislação, que póde reger o transcendente negocio de que se tracta, ao parecer da commissão de guerra da Camara electiva n.º 126, de 21 de Julho de 1854:
É de parecer que o projecto de lei n.° 83, que não teve origem em proposta do Governo, deve ser rejeitado por esta Camara, profundamente convencida a vossa commissão de guerra de que o contrario trará graves inconvenientes. Sala da commissão de guerra, em de Dezembro de 1858. — Duque da Terceira — Conde do Bomfim (vencido) = Conde de Santa Maria = Visconde da Luz — Visconde de Villa Nova de Ourem.
PROJECTO DE LEI N.° 83.
Artigo 1.° Os Officiaes do Exercito, actualmente graduados ou effectivos em qualquer posto, que se acharem preteridos pelos motivos designados no artigo 2.°, contarão a antiguidade daquelle posto ou graduação, e ainda de qualquer posto
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anterior, desde a data em que os mesmos lhe pertenciam.
Art. 2.° São considerados preteridos para os effeitos do artigo antecedente os Officiaes que, depois do dia 11 de Julho de 1843, foram prejudicados no seu accesso por se acharem na extincta terceira secção ou em disponibilidade, ou por terem estado ao serviço da Junta do Porto em 1846 e 1847, com tanto que se não encontrem nas excepções seguintes:
1.ª Os que foram collocados na extincta terceira secção ou em disponibilidade, em virtude de processo civil ou militar, não baseado em motivos politicos;
2.ª Os que achando-se dimittidos sem ser por motivos politicos, tenham sido reintegrados nos seus postos;
3.ª Os que saíssem da actividade do serviço por conveniencia propria, ou por molestia não resultante de ferimento em combate;
4.º Os que, na situação de legalmente reformados, tiverem voltado ao serviço effectivo.
Art. 3.° Aquelles Officiaes que, por effeito dos artigos 1.° e 2.°, salvas as excepções do artigo 2.º, não ficarem ainda indemnisados, teem direito a graduação do posto immediato com a data que lhes pertencer, a fim de entrarem na effectividade delle logo que haja vagatura, verificando-se estas indemnisações gradual e successivamente, até que se achem na situação que lhes pertenceria se não tivessem sido preteridos.
Art. 4.° Os Capitães e Majores graduados, a quem pertencer o posto de Major effectivo, só serão promovidos a elle quando satisfizerem ao exame tiuc lhes exige a Lei.
Art. 5.° Na applicação das disposições da presente Lei, relativamente aos Officiaes da arma de artilheria, attender-se-ha ao modo especial por que devem ser reguladas as promoções em relação aos Officiaes habilitados, e não habilitados.
Art. 6.º Nenhum Official passará ao posto immediato em quanto houver outro da mesma classe de antiguidade maior, ainda que não seja senão graduado, uma vez que se ache em effectivo serviço.
Art. 7.º Os Officiaes a quem aproveitar o beneficio desta Lei, que tenham concorrido para o montepio, se fallecerem antes de lhes ser applicada, deixarão ás suas viuvas ou filhas solteiras a pensão que competiria ao posto em que deveriam achar-se.
Art. 8.° São por esta fórma ampliadas as disposições da Carta de Lei de 17 de Julho de 1855, ficando revogada a legislação em contrario.
Palacio das Côrtes, em 1 de Dezembro de 1858. = Manoel Antonio Vellez Caldeira Castel-Branco, Deputado, Presidente = Miguel Osorio Cabral, Deputado, Secretario = Bernardino Joaquim da Silva Carneiro, Deputado, Secretario.
O Sr. Visconde de Balsemão — Peço a palavra sobre a materia.
O Sr. Presidente — Vai-se lêr agora o parecer da minoria da commissão de guerra.
É do theor seguinte:
PARECER N.º 75.
Da minoria da commissão de guerra sobre o projecto de lei n.º 85.
O abaixo assignado sente (como já lhe aconteceu em 7 de Julho de 1857 a respeito do projecto de lei n.º 83) não poder concordar com a opinião da maioria da commissão de guerra, a que tem a honra de pertencer, relativamente ao projecto de lei n.º 83, vindo da Camara dos Senhores Deputados, por quanto, ainda que a maioria o ache contrario ao direito, á conveniencia publica e ao bem da disciplina do Exercito, declarando sentir profunda magoa de que as occorrencias politicas de 1846 e 1847 prejudicassem os Officiaes de que tracta, e lhe mereçam toda a consideração pelos seus bons serviços anteriores e merito, e conclua que o projecto não deve ser approvado; o abaixo assignado, de accôrdo com a opinião do Sr. Ministro da Guerra, entende que elle deve ser adoptado, pois que os principios em que actualmente se funda a maioria da commissão são essencialmente os mesmos em que se fundou naquella época, embora accrescente: 1.°, que foram presentes á commissão trezentos e dez requerimentos de Officiaes que pedem que este projecto de lei seja rejeitado, que lhes julga justiça porque teem servido bem e constantemente nos seus corpos, sem se envolverem em politica; 2.°, que se abstém de apresentar uma exposição detalhada, sobre os direitos dos Officiaes de que tracta o projecto, porque receia fazer sangrar de novo as feridas, ainda mal curadas, das nossas desgraçadas dissenções politicas; 3.°, que seria, um completo transtorno forçar Officiaes mais antigos a obedecer a outros mais modernos, premiando feitos que todas as Leis reprovam; 4.º, que fere direitos adquiridos, de um consideravel numero de Officiaes; 5.°, que não deve ser approvado, porque muitos Officiaes sendo Sargentos ou Aspirantes, gravaram em seus direitos outros destas classes mais antigos ou de maior merito nas promoções de 5 de Setembro de 1837 e 15 de Fevereiro de 1844; 6.°, que approvar o projecto seria litteralmente uma reconsideração de materia que já foi definida e julgada pelo Parlamento; 7.°, que finalmente a maioria da commissão se refere ao que disse no seu parecer n.º 80, de 6 de Julho de 1857, e para não fazer longas citações, pelo que respeita á legislação que póde reger o transcendente objecto de que se tracta, se refere ao parecer da commissão de guerra da Camara electiva n.º 126 de 21 de Julho de 1854.
À vista pois do exposto, o abaixo assignado julga do seu dever referir algumas das razões que existem para que o projecto seja approvado:
Funda-se a maioria da commissão em que não podiam ter accesso os Officiaes collocados na terceira secção, ou que estavam ao serviço da Junta do Porto; mas o que é certo é que o Regulamento de 18 de Julho de 1834 permittia o accesso da terceira secção, e assim foi cumprido por diversos Ministros, sendo o primeiro em 1834, o Sr. Agostinho José Freire, que referendou aquelle Regulamento; em 1834 e 1835, o Sr. Duque da Terceira; em 1837, o Sr. Visconde de Bobeda; em 1838, o Sr. Visconde de Sá da Bandeira; em 1838 é 1840, o Sr. Conde do Bomfim; em 1842, 1844 e 1855, o Sr. Duque da Terceira; era 1847, o Sr. Barão de Ovar; em 1847, o Sr. Barão da Ponte da Barca; em 1848, o Sr. Barão de Francos; e só deixou de ser permittido o accesso pelo Regulamento da nova organisação do Exercito, em 20 de Dezembro de 1849, que estabeleceu a disponibilidade em logar de terceira secção; e deve notar-se, a favor dos Officiaes a quem o projecto é applicavel para serem indemnisados dos prejuizos soffridos pelas promoções de 19 de Abril e 5 de Junho de 1847, que a maior parte delles, em logar de se acharem naquellas épocas na terceira secção, se achavam então nos seus corpos ou commissões de serviço, debaixo das ordens de seus chefes, ao serviço da Junta do Porto, em 1846 e 1847, e os poucos que pertenciam á terceira secção foram para ella mandados em consequencia das occorrencias politicas de 1846 e 1847 (o que tudo é anterior ao Regulamento em 1849, que prohibe o accesso na disponibilidade), não tendo sido por isso incluidos nas promoções a que se allude, por cujo motivo estão soffrendo grave prejuizo, não só em interesses, mas tambem em suas graduações e no seu melindre militar. Se a legislação não favorece o accesso dos Officiaes que serviram a Junta do Porto, tambem ella não favorecia o dos Officiaes que se envolveram nos acontecimentos politicos de 1836 e 1837, e por isso, para remediar esses analogos prejuizos e soffrimentos de um grande numero de Officiaes do Exercito que, como os de que tracta o projecto, haviam prestado relevantes seu icos á patria e ao Throno legitimo, se promulgou a Carta de Lei de 10 de Junho de 1843, e foram restituidos aos postos e antiguidades que lhes pertenciam na respectiva escala, embora na época em que foram prejudicados (Setembro de 1837) elles não pertencessem ao quadro effectivo do exercito.
A Carta de Lei de 17 de Julho de 1855 reconheceu o direito e sanccionou, que os prejuizos provenientes das occorrencias politicas desde 1844 em diante fossem indemnisados, quando os Officiaes não estivessem em circumstancias de poder continuar o serviço, isto é, no acto de serem reformados ou passados a situações sem accessos, e assim se tem cumprido em larga escala, pois que as disposições desta Lei já teem sido applicadas a 139 Officiaes, alguns dos quaes receberam mais de dois postos, ficando assim gravado o Thesouro com uma grande despeza, a qual continuará a ter de se fazer a respeito de 170 Officiaes a quem aproveita este projecto, que optarão pela reforma, se elle não fôr approvado. Deve notar-se, que se a medida é justa para os que saem do serviço activo, parece que ella se torna necessaria a respeito daquelles que estão no serviço activo, coarctando-se deste modo despezas incalculaveis das reformas, e sustentando-se o pundonor militar destes Officiaes, dando-se-lhes os postos que lhes pertencerem, como se propõe no projecto. Pelo que respeita a terem sido presentes á commissão 310 requerimentos de Officiaes, que pedem que o projecto de lei seja rejeitado, e 2 dos quaes pedem que seja approvado, e que a maioria da commissão julga terem justiça os primeiros, por terem servido bem e constantemente nos seus corpos, sem se envolverem em politica, o abaixo assignado observará que não é o numero de requerentes, nem o allegado que constitue a justiça das pertenções; que lhe parece extraordinario apparecerem agora tantos requerentes contra um projecto de lei vindo da outra casa do Parlamento, quando até agora, tendo vindo projectos cuja materia era a mesma como o diz a maioria da commissão, nenhuns requerimentos se tinham apresentado, o que mostrava, que todos confiavam na justiça e imparcialidade desta Camara. Em quanto a apresentarem-se 310 requerentes pedindo a rejeição, os quaes deram o alarme para requererem aquelles a quem o projecto aproveita, abstem-se o abaixo assignado de fazer considerações, mas sente ter de accrescentar, que não são exactas algumas das asserções dos interessados em que o projecto não seja approvado, sendo certo que, embora a maioria da commissão approve os requerimentos dos 310, o que é indubitavel é que alguns dos Dignos Pares que teem de entrar nesta discussão não podiam, sem quebra da imparcialidade que sempre os tem distinguido, assignar iguaes requerimentos se estivessem no caso de lhe prejudicar o projecto, por quanto, como aquelles que agora pertendem ser indemnisados, já elles o foram em 1843, não obstante haverem entrado na revolução de 1837, e de se acharem fóra do quadro do Exercito; pois que alguns subiram, em consequencia dessa restituição de postos, antiguidade e vencimento, para cima de muitos Officiaes daquelles que tinham ficado servindo o Governo.
Em quanto ao segundo argumento, o abaixo assignado só observará que o transtorno de forçar Officiaes mais antigos a obedecer a outros mais modernos, premiando feitos que todas as Leis reprovam, que fere direitos adquiridos de um consideravel numero de Officiaes, fica respondido com o que o abaixo assignado expoz no paragrapho antecedente; mas accrescentará, que quando passou aquella medida da Carta de Lei 10 de Junho de 1843, não houve Official algum que se lembrasse de representar contra essa medida de tanta justiça e transcendencia, e se ella foi justa então e todos a quizeram, e se abraçaram como camaradas e verdadeiros irmãos de armas, como póde ella hoje ser olhada de um medo differente? Se os Officiaes a quem aproveita o projecto não acudiram logo a requerer a approvação, o que isso mestra é que confiavam na justiça desta Camara, e se agora se apresentam muitos daquelles a quem aproveita o projecto, e mesmo outros a quem não aproveita, mas que o acham justo pedindo a approvação (como o abaixo assignado demonstrará á vista da lista dos nomes), é porque receiam que o allegado dos 310 requerentes (que se póde dizer é de chapa) podesse fazer peso.
O abaixo assignado, não querendo, como a maioria da Commissão, fazer sangrar de novo as feridas ainda mal curadas das nossas dissensões politicas, lembrará comtudo que se rigorosamente tivesse sido cumprida a amnistia que as mandou esquecer, e considerar esses feitos como se nunca tivessem existido, já desde então estariam curadas as feridas, e os Officiaes de que se tracta nos seus respectivos logares, como aconteceu aos que foram restituidos pela Carta de Lei de 10 de Junho 1843.
Pelo que respeita a não dever ser approvado o projecto, porque muitos Officiaes, sendo Sargentos ou Aspirantes, gravaram os direitos de outros destas classes mais antigos ou de mais merito, nas promoções de 5 de Setembro de 1837 e 15 de Fevereiro de 1844, o abaixo assignado só observará que para o posto de Alferes segundo a Lei não regula antiguidade, e que lhe não parece proprio que seja na Camara e sem queixa expressa desses Officiaes que se tracte destas circumstancias.
Em quanto a considerar a maioria da commissão que a approvação do projecto seria litteralmente uma reconsideração de materia que já foi definida e julgada pelo Parlamento, o abaixo assignado observará, que a Camara dos Srs. Deputados não o julgou assim, e a prova é o projecto que temos presente, o qual mais de uma vez tem sido approvado com poucas alterações naquella casa, e nunca chegou a ser rejeitado pela Camara dos Pares, e assim, ainda que é certo que a materia foi approvada na Carta de Lei de 17 de Julho de 1853, tambem é evidente que essa Lei só foi a favor dos Officiaes que se reformassem, e o presente projecto é para applicar a mesma razão e justiça aos que continuam no serviço effectivo.
A commissão por fim refere-se ao seu parecer n.° 80 de Julho de 1857, e para não fazer longas citações, a respeito da legislação que póde reger o transcendente objecto de que se tracta, declara que se refere ao parecer da commissão de guerra da Camara electiva n.º 126 de 21 de Julho de 1854.
Pelo que respeita ao parecer da maioria da commissão n.° 80 de Julho de 1857, julga o abaixo assignado haver dito sufficiente para esclarecer o assumpto; e pelo que respeita á referencia ao parecer da commissão de guerra da Camara electiva n.º 126 de 21 de Julho de 1854, o abaixo assignado, seguindo o exemplo que lhe dá a maioria, referir-se-ha tambem ao parecer n.° 92, da commissão de guerra da Camara electiva, que precedeu o projecte de lei n.º 83 de que se tracta; e por isso pede que elle seja distribuido á Camara para elucidar a discussão.
Parece finalmente ao abaixo assignado, que a approvação do presente projecto de lei não póde prejudicar a disciplina do exercito, considerando-se que analogas medidas, em muito maior escala, como deixa referido e é publico, em nada alteraram ou abalaram a sua obediencia e firmeza, e nem tão pouco as muitas e repetidas restituições de antiguidades que o Governo tem dado a grande numero de Officiaes; relativas ás épocas a que se allude, os quaes se achavam nas mesmas circumstancias daquelles a favor de quem se propõe o presente projecto de lei: e assim, sendo a justiça igual para todos, parece que esta medida benefica terá tambem a vantagem de extinguir entre a officialidade do exercito os odios e rivalidades de partidos que convem terminar para sempre.
Sala da commissão de guerra, em 27 de Dezembro de 1858. — Conde do Bomfim.
O Sr. Presidente — Está em discussão na sua generalidade o parecer n.º 71, com o competente projecto, e o parecer da minoria. — Tem o Sr. Visconde de Balsemão a palavra.
O Sr. Visconde de Balsemão — Sr. Presidente, é para mim uma tarefa bem dura ser o primeiro que vou encetar esta discussão, mas julgo que este objecto é de tal transcendencia que seria uma cobardia não fallar eu n'elle, quando me desvio da opinião da maioria, e declaro que sinto separar-me d'ella porque a não posso seguir n'esta questão. Sr. Presidente, para mim ha um principio a que não posso fugir, que é seguir a minha consciencia, porque qua/ido ella me obriga não posso deixar de mostrar os seus fundamentos, e incommodar o parlamento por algum tempo com os meus fracos discursos.
Eu considero que esta questão não se deve considerar politica, mas que a devemos encarar pelo lado da justiça e da imparcialidade. Eu declaro, Sr. Presidente, que não tenho nenhum interesse directo ou indirecto na approvação d'este projecto do lei, porque não pertenço ha bastante tempo á classe militar em que combati a favor da liberdade, mas neste caso não podia deixar de mostrar que seria uma flagrante injustiça se não attendesse aos poucos officiaes que têem interesse neste projecto, e que são beneficiados por esta lei; se eu visse, Sr. Presidente, que nas reclamações que se apresentam não houvessem alguns contemplados, que não estivessem nas circumstancias daquelles que requerem a mesma contemplação; se o Governo declarasse que a segurança publica perigava, eu não votava por esta medida, porque para mim neste caso a segurança publica estava primeiro do que todas as considerações. Mas vejo que o Ministro competente declarou que elle aceitava a medida e estava por ella, e vejo tambem que a opinião individual dos Ministros é que a não reprovam, e portanto deixam o campo livre para cada um votar como quizer, e entendo que a injustiça está da parte dos que não são comprehendidos neste medida. A maior parte dos officiaes que são affectados, são os feridos pela promoção de 1847; mas Sr. Presidente, depois desta promoção que fez ella? Alterou a posição em que estavam collocados alguns officiaes do exercito, porque digamos o que é verdade, pela infelicidade das nossas dissenções politicas é que tinham passado para a terceira secção: eu entendo que tudo quanto for fazer esquecer essas dissenções é em proveito publico, e por esta rasão voto em sentido contrario ao Parecer da maioria da illustre commissão de guerra desta Camara.
Devo dizer tambem que eu neste ponto estou livre para votar de outra maneira, porque nunca entrei em nenhuma revolução, e segui sempre o que julguei ser a ordem legal, e nesta parte tambem não tenho nada que me fizesse fallar pro ou contra esta medida: eu desejo sempre marchar ne campo da legalidade, e não quero com isto censurar quem tem seguido o caminho contrario, mas digo que neste ponto voto imparcialmente, porque não sou affectado; e depois desta revolução houve uma amnistia ou esquecimento de tudo quanto se passou. A amnistia ainda diz mais, porque ha uma Portaria do Sr. Duque de Saldanha, a quem se pediu explicações da maneira como se devia entender esta amnistia, e elle disse que ella entendia-se na cessação de todo e qualquer processo mesmo de deserção. (O Sr. Visconde da Luz = Para as classes.) Pois a amnistia era para o soldado que desertava, mas o decreto diz que é ampla, é o esquecimento de todos os factos passados, e por consequencia os Officiaes que estavam nestas circumstancias estariam hoje collocados acima de alguns que estão actualmente superiores em graduação. Mas dir-se-ha tambem que não é,justo qi/e Officiaes que estão em um grau inferior vão commandar os que já estão superiores; mas este facto dava-se se não tivesse havido essas dissenções, e se esses Officiaes estivessem no exercito: por consequencia não vão prejudicar os seus camaradas, e o que quer dizer é que não houve tal esquecimento (O Sr. Conde de Samodães — Sobre a ordem.) Para os que estavam preteridos não valeu a amnistia, se ficaram nas mesmas circumstancias em que estavam, e não foram amnistiados; e n'isso é que eu acho injustiça, porque entendo que a amnistia foi dada para esse esquecimento do passado: ora, eu não creio que hoje fossem mal recebidos pelos seus collegas esses poucos Officiaes que vão ser admittidos no exercito por este projecto de lei, porque já outros deram um exemplo de abnegação quando elles foram contemplados e o exercito recebeu-os de bom grado. E então digo que não sei a rasão porque foram contemplados cento e tantos e outros não, e vejo que alguns foram excluidos; os motivos que valem para uns tambem militavam para os outros, porque foram os serviços que fizeram; mas a respeito de outros não se fez essa declaração e foi a arbitrio do Ministro, porque se não fosse assim teria de certo attendido tambem aos relevantes serviços publicos, e portanto eu entendo que todos são dignos de contemplação.
Se o Ministerio me dissesse que com esta medida não ficava preso e eram todos indemnisados eu não lhe faria opposição, mas entendo que se esta medida passar o Governo não poderá excluir estes Officiaes de entrarem nas suas respectivas alturas, e não estava livre para os admitir um a um. Ora esse arbitrio é que se pretende evitar com uma medida franca para todos, e devemos notar que esta lei já passou duas vezes na Camara dos Srs. Deputados com grande maioria; da primeira vez podia dizer-se que era um voto particular, mas depois que foi consultada a nação pela nova eleição dos seus representantes, a sua segunda maioria tambem decidiu a favor do projecto, e então esta Camara, sem interesse do Estado, não se deve pôr em opposição com a outra casa do Parlamento. Entendo por consequencia que a justiça deve ser igual para todos, e que os Officiaes que foram preteridos teem tanta justiça como os 158 que já foram contemplados, e portanto voto pelo Parecer da minoria da commissão.
O Sr. Conde de Samodães — Sr. Presidente, eu não sei qual é a opinião da maioria desta Camara: o Digno Par o Sr. Visconde de Balsemão que acabou de fallar, começou por dizer que sentia discrepar da maioria dos seus collegas...
O Sr. Visconde de Balsemão — Peço licença a V. Ex.ª para uma explicação.
O Sr. Presidente — Eu ainda não dei a palavra a V. Ex.ª
O Sr. Conde de Samodães — O direito de não querer ser interrompido é meu, porém eu terei todo o gosto de ouvir a interrupção do Digno Par.
O Sr. Presidente — Também é meu, visto que dirijo os trabalhos da Camara.
O Sr. Visconde de Balsemão — É para dizer, que a opinião desta Camara era esta, porque se manifestou já n'outra sessão.
(Vozes — Não. Não, senhor.)
O Sr. Conde de Samodães — Não me consta que esta Camara manifestasse a sua opinião ainda, o que sei é, que n'uma sessão da legislatura passada, tendo vindo a esta casa a proposta, como agora veio, a Camara entendeu que precisava de alguns esclarecimentos antes de proceder á votação: é só isto o que me consta. Nem eu podia pensar, Sr. Presidente, que a Camara dos Dignos Pares do Reino tivesse formado de antemão uma opinião ácerca desta ou de outra questão, e que nós fossemos aqui o echo daquillo que se diz fóra desta casa, onde corre que esta questão está condemnada por esta Camara, por isso mesmo que diz respeito a individuos que não pertencem á opinião politica da maioria dos membros della.
Na provincia alguem disse que era escusado a este respeito esperar justiça da Camara dos Pares. Ao que eu respondia sempre, que era impossivel que um cidadão portuguez, que appellasse para a Camara dos Pares, a achasse surda, quando a sua pertenção fosse justa. Ora, póde a pertenção, de que se tracta, não ser justa, e a Camara rejeital-a; se ella o fôr, e a sua maioria entender que deve recusal-a, ella não ha de ser votada. Poderia eu estar em discrepancia com a votação que houver; hei de porém sempre acatal-a.
Ainda que a minha convicção seja em sentido opposto, eu hei de persuadir-me que esse veredictum foi o mais justo.
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É assim, Sr. Presidente, que eu sempre obrei como membro, que fui, da Camara dos Srs. Deputados, da qual tive a honra de fazer parte durante muito tempo. Quantas e quantas vezes fui vencido, e em muitas dellas persuadia-me que havia razão da minha parte! Confio ainda no systema representativo; e estou convencido que, tanto nesta como na outra casa do Parlamento, nunca reinou o espirito de facção (apoiados), e sempre me persuadi, que as suas resoluções são as mais justas.
Sr. Presidente, eu pela minha parte sinto bastante de discrepar do parecer da maioria da illustre commissão de guerra, e é na verdade para mim bastante incrivel, que na primeira discussão em que entro nesta Camara, eu esteja em opposição com cavalheiros tão respeitaveis, e aos quaes estou costumado a acatar desde a minha infancia, homens, cujos nomes estão stereotypados nas paginas mais illustres da historia da liberdade deste paiz; mas em compensação tenho um nome respeitavel em favor da minha opinião; esse nome, se bem que numericamente inferior aos outros, é comtudo igual em auctoridade.
Por consequencia, nesta questão e em outras, seguirei unicamente os dictames da minha consciencia, em vista das razões e argumentos que se apresentarem sem me importarem nomes.
Sr. Presidente, esta questão, apesar de parecer velha, apesar de ser sediça por ter vindo differentes vezes á téla da discussão, não julgo, com tudo, que esteja ainda sufficientemente esclarecida, para que sobre ella possa a Camara pronunciar o seu voto com perfeito conhecimento de causa; e eu vou explicar os motivos em que me fundo.
Sr. Presidente, este projecto, que veio da Camara dos Srs. Deputados, tem o aspecto de querer unicamente embaraçar que continuem certas preterições que teem tido logar para com alguns Officiaes do Exercito, visto que elles seguiram certa e determinada politica; porém, Sr. Presidente, se fossem sómente essas as preterições que ha no Exercito, podia então dizer-se que o projecto, tal como está elaborado, satisfazia ao seu fim. Ha, porém, Sr. Presidente, outras preterições, e essas não são consignadas neste projecto. A illustre commissão de guerra, nos seus considerandos, apresentou uma, a que eu não posso deixar de alludir nesta occasião, é essa celebre promoção de 15 de Fevereiro de 1844, promoção contra a qual eu não deixaria de levantar a minha voz tíesta Camara, se por ventura o projecto que veio da outra casa fosse approvado na sua generalidade, ou se algum de seus artigos entrasse em discussão, eu necessariamente faria isso, visto que hoje todas as dissenções estão acalmadas, e ainda bem que o estão, porque ellas bastantes annos dilaceraram o seio da patria!
Sr. Presidente, essas promoções, feitas quasi tres annos depois d'uma certa revolução tendente a recompensar serviços praticados nella, nunca eu as podia approvar. Todos nós sabemos que houve uma sedição militar em 1844, na qual entraram varios corpos, e o chefe dessa sedição entendeu que devia premiar alguns dos sargentos que o acompanharam, e em consequencia disso promoveu-os a alferes; mas só os promoveu quasi no fim dessa mesma sedição, isto é, quando a causa estava perdida, e, em consequencia deter sido supplantada, elles ficaram todos fóra do Exercito. Passado algum tempo veio outra revolução, sustentando o mesmo pendão que a primeira, porém esta foi mais feliz, e em resultado disso subiu ao poder um Governo que entendeu devia recompensar aquelles individuos: mas como entendeu elle que devia recompensal-os? Prejudicando aquelles que tinham sido fieis ao Governo e á causa legitima, e que por conseguinte tinham cumprido com os seus deveres. Era então Ministro da Guerra o nobre Visconde de Sá da Bandeira, o qual julgou mal, quanto a mim, dever dar a estes individuos não só a patente, mas antiguidade superior aquella mesma, que pelo despacho revolucionario elles tinham lido; em consequencia disto foram promovidos esses taes e muitos outros, e até alguns contra as leis expressas, porque não tinham mesmo o posto de primeiro sargento: um delles já foi Governador de Moçambique, e está hoje Major!!
Estas preterições não são com relação aos Officiaes que pertencem ao partido progressista, nem para os que pertencem ao partido cartista; nesta Camara eu não conheço cartistas nem progressistas, para mim só ha justiça, e pela imparcialidade, é o terreno pelo qual só sei marchar, e não outro: é neste terreno que eu encaro a questão.
St. Presidente, se eu fosse encarar a questão pelo lado politico difficil seria o meu voto, porque não sympathiso com a causa que deu logar á maioria das preterições.
Mas estas injustiças onde é que estão ellas consideradas no projecto? Não as vejo de fórma alguma, e entretanto eu fallei só das que me lembrou; mas quantas mais haverá, quantas mais injustiças se terão feito por motivos politicos, em differentes épocas, com differentes Governos, nesta serie de revoluções? Todavia tambem é certo que todos os Governos mais ou menos teem procurado, pelos meios ao seu alcance quanto seja possivel indemnisar e tornar monos sensiveis estes males; forçoso é dizer que o Governo presidido pelo Sr. Duque de Saldanha quiz ver se o mal que este tinha causado como revolucionario se remediava depois, estando S. Ei." Ministro de Sua Magestade a Rainha a Senhora D. MARIA II, e nisso coube grande gloria ao Digno Par o Sr. Visconde da Luz, que foi S. Ex.ª que teve fama no Exercito de ter aconselhado ao nobre Marechal que mudasse de caminho, que não seguisse os impulsos do seu coração para premiar só os que o tinham ajudado, e mesmo os seus amigos posthumos que o não tinham acompanhado, mas que queriam gosar as legitimas consequencias do triumpho de S. Ex.» (O Sr. Visconde d'Athoguia — Peço a palavra).
Digo, pois, que o Ministerio presidido pelo nobre Duque de Saldanha já fez muito, e eu que tomei a iniciativa na outra Camara ácerca desta questão, fui levado unicamente pelo desejo de fazer com que os males que se tinham causado não fossem tão grandes, como via que estavam sendo. Mas o que é certo tambem é que o nobre Marechal querendo fazer um bem foi causar um mal até certo ponto; por quanto, querendo indemnisar muitos Officiaes que tinham sido prejudicados em promnoçães anteriores, e não sendo uma medida completa, mas parcial e mesquinha em relação ao numero, foi causar novas preterições, e foi tornar este objecto mais grave, mais embaraçado, e mais odioso, pois que, alem das preterições dos revolucionarios pelos fieis, foi preterir os revolucionarios pequenos pelos grandes; pois a questão não é daquelles que se revolucionaram uma ou duas vezes, a questão é daquelles que se revolucionaram tres, quatro e cinco vezes; o mal não foi revolucionar-se qualquer uma vez, o que fez mal foi o não se revolucionar mais vezes, pois eu conheço alguns que se revolucionaram tres e quatro vezes, e estão remunerados: revolucionaram-se com Miguel Augusto, revolucionaram-se com o Sr. Conde de Bomfim, revolucionaram-se com a Junta do Porto, e ultimamente com o Sr. Duque de Saldanha, e estão de tudo indemnisados e recompensados; agora aquelles que se revolucionaram uma vez só, esses estão prejudicados. Isto é uma justiça que eu não posso comprehender, o contra a qual me hei de sempre pronunciar; bem sei que os differentes Ministros, depois de entrarem na orbita legal, teem querido fazer com que estes males diminuam, mas ainda nenhum foi tão longe que acabasse com todas ás irregularidades de que esta medida tambem traz a sua origem, pois que se os Governos tivessem feito o que deviam não seria necessario vir agora aqui esta questão, pois tudo isto estava nas attribuições do executivo (O Sr. Conde do Bomfim — Apoiado). Pois o Governo póde indemnisar vinte e trinta Officiaes, e não póde indemnisar sessenta ou oitenta? (apoiados). A culpa é do Governo; queixem-se do Sr. Couceiro e do Sr. Visconde de Sá (apoiados). Eu estou que se hoje se apresentasse afrente do Governo um homem energico, que comprehendesse o seu dever, seria elle o primeiro a tomar iniciativa n'uma medida destas, não trazendo-a ao Parlamento; mas fazendo por si mesmo justiça a quem a ella tivesse direito, porque ha muitas preterições que não sé deram por motivos politicos, mas todos querem que a sua preterição seja como tal considerada (O Sr. Visconde da Luz — Apoiado, apoiado). A isso é que o Governo devia olhar tambem.
Sr. Presidente, eu entendo que tudo quanto a este respeito se discuta é inutil, porque as leis actualmente existentes são sufficientes para que o Governo possa fazer justiça a quem a tiver; mas ha uma cousa muito notavel, e é que as preterições são constantes, e em vez de se dirigirem ao Governo vem sempre ás Côrtes, não direi a esta Camara, mas á outra: é ordinariamente tal a chusma de pretenções particulares, que alli a commissão de guerra, por assim dizer, não tem um momento de descanço; eu tive a honra de ser uma vez relator, e de outra vez secretario da commissão por differentes épocas, e lembro-me bem de que, durante qualquer das sessões, o movimento de requerimentos naquella commissão não andava por menos de trezentos a quatrocentos, porque não havia, por assim dizer, Official que não se julgasse preterido, e alguns allegando que já o eram por terceira ou quarta vez, querendo por isso indemnisações, melhoramentos de reformas, e tudo isto por verem que muitos á força de instancias e insistencias tinham conseguido o seu fim, e o caso é que ainda nesta legislatura se tem dado desses casos, e alguns até confesso que muito me tem maravilhado, porque tenho visto attendidas e reduzidas a lei preterições que sempre reputei inadmissíveis; o que prova que da parte do Corpo legislativo ha toda a tendencia de generosidade, mesmo fóra dos limites da justiça, quando se tracta de fazer bem. Não é, pois, de crer, que tendo-se até agora assim procedido se queira ser hoje demasiado restricto, antes entendo que se deve ser completo, já que essas restricções senão estabeleceram em quanto era tempo para excitar a allegação dos exemplos, e a comparação de circumstancias analogas, ou mesmo identicas. Parecia-me, pois, de uma grande conveniencia que hoje acabassemos com isto por meio de uma medida tão generica que fechasse a porta a todas estas pretenções, ao menos era este o meu desejo, e não ver todos os dias, por assim dizer, estarem as Camaras a discutirem ad hoc e ad hominem, de fórma que saem do Parlamento algumas Leis que parecem mais Decretos do executivo.
O passado, passado, é necessario seguir vida nova; e por isso eu quereria que se nomeasse uma commissão de inquerito que examinasse todas estas questões, que a ella concorressem todos os interessados, que ali expozessem as suas allegações, e que esta commissão viesse depois apresentar a esta Camara um trabalho que estivesse no caso de ser approvado por ella; isto é que eu acho que seria de grande vantagem, pelo menos eu assim o considero, principalmente em vista do proprio parecer da maioria da illustre commissão de guerra, e em vista do parecer dado pela minoria, representada pelo Sr. Conde de Bomfim, com cujas rasões na generalidade concordo, achando-o mil vezes bem escripto. Mas foi mesmo, Sr. Presidente, depois que eu vi estes documentos parlamentares que bem me convenci que esta medida em todo o caso não podia deixar de ser considerada deficiente, sendo então por isso mesmo preciso tornal-a o mais ampla possivel; mas o que eu não posso tambem de fórma alguma pensar é que esta Camara seja capaz de fechar as suas portas a quem quer que for que lhe venha pedir justiça. O que está feito está feito, e o que resta a fazer o que queremos é fazel-o do modo que melhor se acerte, e que evite estas leis sempre parciaes, cujo contexto é de ordinario o seguinte: — é auctorisado o Governo a melhorar a reforma de fulano; a indemnisar sicrano, etc...
O que é preciso attender bem relativamente a este projecto, é que os chefes das revoluções, quaesquer que elles tenham sido, e em geral os Officiaes que tem tide padrinho, tem sido indemnisados, e 03 que o não tem tido é que até agora o não foram. Sanccionemos pois o passado como silencio; e façamos a justiça que se nos reclamar, quando se demonstre que ella é fundamentada com o exemplo do nosso proceder anterior.
Os que são subordinados, que não fizeram senão obedecer não digo todos, porque muitos ha que foram por sua vontade, mas ha outros que foram certamente coagidos por, dever da sua posição os que não tiveram protecção nem valimento na região do Poder, com esses devemos nós ter toda a contemplação; nunca esperei que a Camara dos Dignos Pares a negasse, nem o espero; mas assim como não espero isto, tambem não espero que ella approve uma medida que não tenha um grande alcance, e que não vá cicatrizar por uma vez todas essas feridas.
O unico modo pois de nos livrarmos destes dois escolhos, um da negação completa de justiça, que importa dizer — não vos concedemos nada — o outro de tomar uma medida acanhada e mesquinha, que em vez de fazer bem vá augmentar o mal; o unico modo, digo, de saír destes dois escolhos, é estudar a questão por meio de uma commissão de inquerito, perante a qual se apresentem todas as pretenções, para que sejam discutidas e convenientemente avaliadas. Um trabalho sobre isto, apresentado depois á Camara, estudado por ella, discutido e votado, passando para a Camara dos Srs. Deputados, não póde deixar de merecer a consideração publica e levar aquelle cunho de imparcialidade e justiça que deve caracterisar todas as medidas que sáiam do Corpo Legislativo.
É pois neste sentido que vou mandar para a mesa a minha proposta, que espero sustentar no caso de ser impugnada; e sendo regeitada, inclinar-me-hei a optar entre dois males o menor, que é approvar o parecer da minoria da commissão. Mas eu considero a minha proposta tão logica e justa, que não duvido que a Camara a adopte.
É a seguinte, que vae tambem assignada pelo Sr. Conde de Mello.
Esta proposta era concebida nos seguintes termos:
«Proponho que se nomeie uma commissão de inquerito para examinar quaes são as preterições e outras injustiças que tem tido logar no exercito desde 1843 até hoje, e para apresentar uma medida generica que as possa remediar. Sala das sessões 14 de Janeiro de 1859. = Conde de Samodães. = Conde de Mello.»
O Sr. Presidente — Consultarei a Camara se admitte á discussão a proposta do Digno Par o Sr. Conde de Samodães.
Consultada immediatamente a Camara, foi a proposta admittida á discussão.
O Sr. Conde do Bomfim — Respeito muito as intenções do Digno Par o Sr. Conde de Samodães, e as idéas que apresentou; seja-me, porém, licito dizer, que o projecto que está em discussão foi já formalisado á vista das minuciosas informações que tinham havido, relativamente a uma grande parte da officialidade. É possivel que falte ainda alguma circumstancia attendivel, mas é certamente difficil chegar a um fim tão completo, que não haja ainda alguma a que se deva attender, e por isso digo que reputo essa mais completa investigação quasi impossivel, para, em vista desses esclarecimentos, não haver alguem que se queixe (O Sr. Visconde de Ourem - Peço a palavra); sendo certo que o que se tem tractado, principalmente agora, é de ver se as pretenções dos Officiaes a que se tracta de attender por este projecto são fundadas ou não em Lei, e não se haverá outros que tenham direito a ser indemnisados por outros motivos. (Sussurro.)
O Sr. Presidente — Peço attenção a Camara.
O Sr. Conde do Bomfim (continuando)— Tem-se mostrado as difficuldades que lembram, para que possa ser approvado o projecto de lei; a maioria da commissão referiu-as muito circumstanciadamente no seu parecer, e eu contestei-as no da minoria, e como um e outro stão impressos e distribuidos aos Dignos Pares, seria talvez facil, lendo-os, ver que não são maiores as difficuldades para se levar a effeito esta Lei, do que aquellas que havia para passar a Lei de 10 de Junho de 1843. As primeiras que occorreram á maioria foram, que a Lei não era clara, e muito difficil a sua applicação; mas permitta-me a maioria que eu diga, que tendo pertencido a uma commissão um pouco similhante aquella que o Digno Par, o Sr. Conde de Samodães, propõe, fiz já applicação da Lei que passou no Parlamento para as reformas, cujos principios ou fundamentos derivam das mesmas causas a que se refere o actual projecto, e para isso fui obrigado a ver com a maior attenção toda a legislação a respeito do direito a accesso; não será, pois, para admirar que eu esteja em tão grande divergencia das razões em que se funda a maioria, quando tivesse passado da maioria para a minoria da commissão que a Lei permittia o accesso, pois que effectivamente a Lei que eu aponto no meu parecer era o Regulamento de 1834, que muitos Ministros, que se seguiram até 1848, se não todos, pelo menos a maior parte, o cumpriram, dando accesso na terceira secção; para exemplo da execução, que oito diversos Ministros deram á Lei, bastará lembrar que ha Officiaes que, desde o posto de Capitães, estiveram sempre na terceira secção, e se acham hoje Generaes, como acontece aos Dignos Pares os Srs. Marquez de Fronteira, Visconde d'Athoguia, etc... A questão, pois, hoje reduz-se a examinar o que está effectivamente em presença da Camara, para se ver se ha de ou não administrar justiça aos Officiaes prejudicados na promoção de 1846 e 1847. Tanto pela maioria, como pela minoria da commissão, apresentam-se, creio eu, todas as razões que ha pró e contra: as que ha pró são as de legislação, e o ter passado já uma medida em maior escala a favor de outros Officiaes, que tinham entrado em uma revolução contra o Governo em 1837; e por esta occasião seja-me permittido mandar para a Mesa uma lista impressa em 1843, em que se vê que foi muito maior o numero a que aproveitou a Carta de Lei de 1843, restituindo aos postos Officiaes que tinham entrado em movimentos politicos, e que por isso estavam fóra do quadro do Exercito, do que o que se propõe agora; não sendo por isso de admirar que alguns dos Dignos Pares, que se sentam nestas cadeiras, subissem por esta Carta de Lei bastantes gráos acima dos seus camaradas, que tinham ficado servindo o Governo, em quanto elles estiveram fóra do quadro do Exercito, ou na terceira secção. Agora, demonstrado que a Lei existia, que a applicação della se fez successivamente, que ha um exemplo em muito maior escala do que o que se pertende agora, não alterando em nada então essa Carta de Lei a harmonia no Exercito, parecia que a medida benefica que vem proposta da Camara dos Senhores Deputados iria em grande parte sanar as reclamações a que alludiu o Digno Par, que acaba de fallar, e que será melhor attendel-as desde já, do que entrar ainda em novas investigações, que a final talvez nem possam aproveitar a ninguem, como já aconteceu em outras circumstancias. Mas se acaso se nomear uma commissão de inquerito, e se fôr prescrutar novamente uma materia que ha tantos annos tem sido prescrutada e elucidada por todos os modos, eu receio muito que a questão, em vez de acabar mais depressa, não acabará nunca. É o receio que eu tenho. Em quanto ao mais parece-me que a justiça dos Officiaes a quem este projecto aproveita, e que reclamam que a favor delles se faça o que, como acabo de dizer, já se fez em muito maior escala, em nada prejudicava o serviço, antes pelo contrario restabelecerá a harmonia no Exercito. Eu não posso ouvir dizer que não convem o projecto, que ataca a disciplina, direitos, etc.. porque todos os factos provam o contrario.
Sr. Presidente, de mais a mais a amnistia mandou esquecer todos os factos passados, e em virtude della já estes Officiaes deviam estar naquella altura que lhe compete; por consequencia o projecto é tambem tendente a fazer que se leve a effeito uma das attribuições mais essenciaes que tem o Chefe do Estado, que é a amnistia, e esquecimento, e desde que ella foi decretada, mal estão sendo denominados revolucionarios os Officiaes, que são ainda alcunhados de criminosos, em consequencia de não se lhes ter administrado justiça, como se tem feito a tantos outros que estavam exactamente nas mesmas circumstancias destes a quem aproveita o projecto.
Sr. Presidente, estou inteiramente convencido do que acabo de dizer, isto é, de que as Leis favoreciam para o accesso os que estivessem na terceira secção. Quantos Officiaes que estiveram na terceira secção, não passaram dos postos que alli tinham a outros mais graduados? E com quanto alguns estivessem então exercendo commissões aliás importantes, o certo é que na terceira secção foram promovidos, como já disse, e apontei exemplos de que alguns houve que, do posto de Capitão, passaram até ao de General, estando sempre naquella secção. E se elles tiveram esse accesso é porque a Lei lh'o facultava, logo como é que havemos negar agora a uns aquillo que se não negou aos outros?
A proposta para que se nomeie uma commissão de inquerito, não me parece que deva ser adoptada, porque essa commissão não nos podia provavelmente esclarecer mais do que estamos esclarecidos; e para que é que havemos de ir pôr difficuldades a um projecto que já por duas vezes recebeu a approvação quasi unanime da Camara electiva, e que deve merecer o apoio desta Camara, o qual de certo não deixará de fazer justiça?
O Sr. Visconde de Ourem — Sr. Presidente, usando da palavra, começarei por mandar para a mesa, por parte da commissão de guerra, cento e vinte e cinco requerimentos, com duzentas assignaturas de Officiaes do Exercito, dos quaes cento setenta e cinco pedem que seja approvado o projecto de lei que está em discussão, e vinte e cinco que o mesmo seja rejeitado. São portanto trezentos trinta e cinco os que pedem a rejeição do projecto, e cento setenta e sete os que pedem a sua approvação.
A commissão de guerra, julga occioso fazer um parecer especial sobre taes requerimentos, porque as allegações prò e contra, são as mesmas dos que já teve a honra de apresentar á Camara, as quaes não modificaram a sua opinião.
Agora entrarei na questão, máo grado meu, e com profunda magoa.
O Sr. Presidente — O que está em discussão é a proposta do Digno Par o Sr. Conde de Samodães.
O orador — Está promiscuamente; mas se V. Ex.ª declara, que só está em discussão a proposta do Digno Par, isso então é outro caso. No entanto digo. que o costume é entrar promiscuamente em discussão uma e outra cousa. Eu tencionava ír respondendo ao Digno Par o Sr. Conde de Samodães, e ao Digno Par o Sr. Conde do Bomfim, mas se por em quanto só se tracta da proposta daquelle Digno Par, então só responderei a S. Ex.ª...
O Sr. Visconde de Balsemão — A proposta do Digno Par o Sr. Conde de Samodães, apresenta ou contém uma questão prejudicial, da qual me parece que se deve primeiramente tractar.
Vozes — Nada, nada.
O Sr. Presidente — Eu entendi que a proposta do Digno Par, continha uma questão prejudicial, e por isso julgueis que primeiramente della a Camara se devia occupar, porque se approvasse a proposta, cessava a discussão sobre o projecto, e se não fosse approvada, então entrava-se na discussão do mesmo projecto; no entanto se a Camara quer que se discuta promiscuamente sobre uma e outra cousa, assim se fará.
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O Sr. Visconde de Balsemão — Eu peço que haja uma votação nominal, sobre se a proposta do Digno Par contém ou não uma questão prejudicial.
Vozes — Nada, nada.
O Sr. Conde de Samodães — Eu pedi a palavra sobre a ordem, para explicar o sentido da minha proposta.
Sr. Presidente, que a minha proposta tende a adiar a discussão deste projecto, não tem duvida nenhuma; mas o que eu não sei é que uma cousa esteja de tal modo separada da outra, que discutindo-se uma, se não possa discutir a outra; e a mim parecia-me que pelo bem da ordem, e para se não gastar um tempo duplo, que se gastaria se houvessem duas discussões, conviria que conjunctamente com a minha proposta, se discutisse a generalidade do projecto, que é o pensamento ou a convencia da adopção da sua materia; votando-se no fim da discussão, primeiramente a minha pro-poste, e quando esta não seja approvada, então sobre a generalidade do projecto.
O Sr. Presidente — Vou consultar a Camara se quer que a discussão verse conjunctamente sobre os pareceres da maioria e minoria da commissão, e a proposta do Digno Par.
(Approvado que entre tudo em discussão.)
O Sr. Presidente — Continua a discussão sobre os pareceres da maioria e minoria da commissão, e conjuntamente a proposta do Digno Par, e tem a palavra para progredir no seu discurso o Digno Par o Sr. Visconde de Ourem.
O Sr. Visconde de Ourem — Disse eu que ia entrar na materia mau grado meu, e com profunda magoa; mau grado meu, porque não é muito hygienico com a molestia que me rala sentir de relator em uma questão tão delicado; e com profunda magoa, porque entendo ser da maior inconveniencia, que o alludido negocio tenha vindo á téla parlamentar, e deva nella ser discutido.
Sr. Presidente, doze annos são passados, depois que uma desgraçada dissenção politica dividiu a Nação e o Exercito em dois campos; fazendo-se mutuamente guerra de morte, e quando a irritação emergente deste estado de cousas linha desapparecido, e o bom senso aproximava os homens de todos os partidos para tractarem dos interesses da communidade; quando se manifestava uma tendencia salutar para o esquecimento do passado, e para o amalgama de todas as fracções liberaes, apparecem as exigencias que nos occupam, e o projecto de lei que combato; que foi uma verdadeira boceta de Pandora ou pomo de discordia lançado entre os militares, que por largo periodo perturbará a ordem, e fará reviver odios que estavam adormecidos; e qualquer que seja a resolução que tiver ha de produzir terriveis effeitos. E de que modo tractarei eu do objecto, de fórma que não exacerbe o mal? Os factos e o direito estão ligados nesta questão de tal sorte, que sem fazer a exposição daquelles, não se póde demonstrar a applicação que este póde ter; mas a historia a que me refiro é muito desagradavel, e ha de talvez provocar explicações, e dar logar a redarguições irritantes a que muito desejo fugir, porque o meu fim não é offender alguem: sou nimiamente tolerante em politica, e desejo proceder sempre com justiça para com todos.
Mas, Sr. Presidente, supposto o que fica referido, perguntarei eu, o que significa nesta Camara o projecto de lei em objecto, que não é de iniciativa do Governo? Qual é o seu fim? Que consequencias resultarão se for approvado? Claro está, quanto ao primeiro ponto, que se tracta de reconsideração de materia que já foi largamente discutida, avaliada e julgada, quando se confeccionou a Carta de Lei de 17 de Julho de 1855; pois de então para cá não augmentaram os suppostos direitos dos queixosos, nem outras razões elles adduzem diversas das que então apresentaram. Ora, os juizes da questão são os mesmos, e a materia a mesma, e portanto não é natural que esta Camara tenha alterado a sua opinião em um tão curto espaço de tempo. Em uma Camara electiva em que os elementos mudam de sessão para sessão, e em que muitas vezes as paixões teem. algum predominio, não admira que, sob os mesmos considerandos, se confeccione uma Lei em desharmonia ou em contradicção com outra Lei antecedente; mas em nina Camara hereditaria e permanente, será um documento de leviandade ou irreflexão similhante anomalia, que muito comprometera a sua respeitabilidade, porá em duvida a sua Índole conservadora, e tirará toda a segurança que deve haver nas suas decisões sempre reflectidas. Portanto estou convencido de que esta Camara não se prestará á reconsideração que della se exige, e manterá a sua decisão de 1855, rejeitando o projecto de lei de que é questão.
Agora vou ao segundo ponto. Qual é o fim desta Lei? Indemnisar, diz-se, Officiaes que foram preteridos por outros seus camaradas, que não estavam em melhores circumstancias, ou não lhes assistia tanto direito para terem o accesso. Quem são os preteridos e os que preteriram?
Este é o ponto mais delicado da questão, e logo mostrarei que os que se dizem aggravados foram os aggravantes em muitas occasiões.
Os que se dizem preteridos, são pela maior parte os que estiveram ao serviço da Junta do Porto, e os que se diz que preteriram são os que sustentaram a Lei fundamental da monarchia, e as prerogativas da Corôa em 1846- Aquelles segregaram-se destes por acto espontaneo, voluntario e pronunciado, e o poder a quem obedeciam promoveu-os, excluindo os que estavam fóra do seu gremio politico; promoções que teriam vingado se fossem vencedores; estes, obedecendo ao Chefe do Estado na orbita da legalidade, tiverão o accesso que lhes competia na conformidade das Leis militares, nas vagaturas dos seus camaradas que morreram ou se inutilisaram na guerra, e dos que não estavam presentes nos quadros dos corpos. Quem são pois aqui os roubadores e os roubados. Não o sei. Diz-se que os Officiaes que serviram a Junta do Porto obedeceram aos seus superiores legalmente constituidos, e que cumprindo assim com os seus deveres, na conformidade dos regulamentos militares, não deviam ser privados do seu accesso.
Ora, Sr. Presidente, pondo de parte o principio de subordinação quwse invoca, que adoptado sem restricções conduziria a absurdos inadmissíveis, cumpre notar que entre os que se dizem preteridos estão muitos que desertaram dos seus corpos, que se conservaram obedientes ao legítimo Governo, e não poucos que estando gosando licença em suas casas ou na 3.º secção, foram para o Porto, e não vieram para Lisboa. Dois factos citarei, Sr. Presidente, que succederam comigo.
Um Official superior pediu-me licença para ir a sua casa; observei-lhe que podia ser comprometido se lá fosse, que o podiam obrigar a entrar na revolta; respondeu-me que se alguem lhe fatiasse nisso dar-lhe-ia pancadas, e que de mais a mais os Marechaes que estavam á testa do movimento eram os seus homens; mas pouco depois marchava de sua casa para o Porto!
Outro, Sr. Presidente, a respeito do qual tinha ordens do Governo para vigiar a sua conducta, desejando fazer-lhe beneficio, chamei-o, e perguntei-lhe se estava disposto a servir com fidelidade o Governo da Rainha, ou se queria retirar-se para sua casa? Respondeu-me que queria seu ir e mostrar os seus bons sentimentos; mas tendo-o eu encarregado do uma diligencia, fugiu para o Porto com o piquete que commandava!
E não se diga, Sr. Presidente, que os Officiaes da Junta do Porto, foram illudidos na direcção que tomaram, nem lhes sirva de pretexto terem obedecido aos seus superiores legaes, porque a apparição do nobre Duque da Terceira no Porto, indicava a todos o caminho que deviam seguir. Pois que, Sr. Presidente, havia ahi algum Official do Exercito tão imprudente e arrojado, ou tão obtuso de idéas, que duvidasse da fidelidade do nobre Duque da Terceira ao Rei e á patria, e de sua dedicação á causa da liberdade?! (Apoiados), E todavia este nobre caracter foi encarcerado em uma fortaleza, e os militares consentiram isto! Na minha opinião similhante facto affectou a honra do Exercito.
Tambem se adduz em favor dos queixosos, que muitos estavam na escala de accesso antes da revolução, e que sendo amnistiados, isto é, mandando-te que ficassem em perpetuo esquecimento, e como não succedidos os factos revoltosos por elles praticados, deveriam ou devem ser indemnisados das preterições que soffreram. A subtilesa é boa mas não colhe. Nenhuma Lei militar manda suspender as promoções em quanto houverem Officiaes a quem ellas pertençam que estejam fóra do serviço, nem duplicar os postos no Exercito quando estes Officiaes se apresentarem; apenas o Decreto de 18 de Fevereiro de 1824 os manda considerar nas futuras promoções com o posto immediato, e se me quizerem reforçar os argumentos que pretendo destruir, com o convenio celebrado entre o nosso Governo e as nações estrangeiras, que intervieram naquella desgraçada dissenção politica, responderei que o Governo inglez, indicando a conveniencia de se garantirem os postos aos Officiaes implicados na revolta, dizia ao mesmo tempo, que isto em nada restringia o direito que tinha Sua Magestade Fidelissima de collocar os ditos Officiaes em half pay, isto é a meio soldo e sem accesso. Ora que lerem os Officiaes que serviram a Junta do Porto que os precalços que podiam resultar-lhes de terem entrado em uma revolução, fiquem nullos em consequencia da amnistia, mas que a Lei dos accessos vigore sempre em seu proveito, não se póde admittir. Esquecer um crime póde ser, premial-o não.
Outra questão e, que os Officiaes collocados na 3.º secção tinham accesso em virtude do Decreto de 18 de Julho de 1834. Concedendo a existencia do principio, que todavia na pratica foi sempre lettra morta, redarguirei que esse accesso devia ser em promoções especiaes em caria uma das secções, e na 3.ª sem distincção de armas, nem referencia aos Officiaes das outras secções; e se o Digno Par Conde do Bomfim, sendo Ministit), praticou o contrario, commetteu uma illegalidade. E aqui por incidente direi, que parece ter chegado o tempo das penitencias. Este caso dos Officiaes da 3.* secção é bem analogo ao da abolição do castigo das varadas. Eu, permitta-se-me fallar de mim, em quanto tive a honra de ser Ministro da Guerra, e Ajudante-general do Exercito, não passei um só Official á 3.ª secção, e o nobre General Conde do Bomfim, durante o tempo dos seus Ministerios, passou á alludida situação, por diversos motivos, cento e dezesete Officiaes. É justo, portanto, que S. Ex.ª proceda como procede a favor dos quê gravou em seus interesses: eu não tenho igual motivo.
Toca-se tambem em um ponto grave, dizendo-se, que os Officiaes que serviram a Junta do Porto não estão em peiores circumstancias dos que se envolveram na revolução chamada dos Marechaes em 1837, e que estes foram depois indemnisados das preterições que soffreram, publicando-se em seu favor a Carta de Lei de 10 de Junho de 1843. E parece que o Digno Par Conde do Bomfim fez allusão no seu parecer, que chama da minoria da commissão de guerra, a algum dos indemnisados. Ora, Sr. Presidente, na minha opinião não se dá identidade, nem mesmo analogia entre os dois movimentos (apoiados). O de 1837, vencido em Ruivães, foi para restaurar a Carta Constitucional, que tinha custado a esta nação rios de sangue e montes de oiro para estabelecer (apoiados): o do Porto em 1846 ignoro o pensamento que o regia, e que sustentava. E sobre tudo o projecto de lei em discussão tem uma latitude insolita: absolve todos os factos politicos; ao passo que a Carta de Lei de 10 de Junho de 1843 o beneficio que concede é restricto aos Officiaes, que, tendo direito a accesso, foram illegalmente reformados ou preteridos pelo seu affecto á Carta Constitucional da Monarchia. Redija-se o artigo 1.° deste projecto nos termos da Carta de Lei que se traz para exemplo — diga-se com franqueza que é para premiar os Officiaes que mostraram affecto aos principios da Junta do Porto. Eu não subscreverei á medida, e se ella passar
retirar-me-hei maravilhado. A Carta de Lei a que me refiro diz o seguinte (leu). É portanto uma lei que se póde chamar remuneratória, e fazer uma analoga para os Officiaes que serviram a Junta do Porto seria subversivo, segundo todos os principios de ordem e de disciplina militar. E a allusão que me parece me é dirigida pelo Sr. Conde do Bomfim no seu parecer de minoria acceito-a porque me honro de ter sido indemnisado da preterição que soffri em 1837 pelo meu affecto e adhesão á Carta Constitucional da Monarchia. Era o chefe da minha classe, e passaram-me adiante creio que oito Majores.
Mas, Sr. Presidente, ainda direi, sem o mais leve pensamento de offender o nobre Conde do Bomfim, que S. Ex.ª é a pessoa menos propria para sustentar que se deve approvar o projecto de lei em discussão, trazendo para exemplo a Carta de Lei de 10 de Junho de 1843. Pois S. Ex.ª quer que se faça em 1859 o que altamente reprovou naquella época, com todas as suas forças, porque julgou injusta e attentatoria á ordem estabelecida, e a direitos legalmente adquiridos, a providencia que se reclamava? Ora eu respondo ao Sr. Conde do Bomfim em 1859 com as proprias palavras de S. Ex.ª em 1843, que passo a lêr (leu).
Então quererá S. Ex.ª hoje o que não quiz em 1843? Parece-me que não. Não ha de desejar que «e fim o melindre de tantos dos seus camaradas, sem lhes poder dizer na lei, que os idemnisados obraram melhor aggredindo as prerogativas da Corôa (apoiados).
Sr. Presidente, chego ao terceiro ponto do meu discurso, no qual não poderei ser extenso porque m'o não permitte a minha saude, e porque a Camara deve estar fatigada de me oi>vir. Que consequencias terá este projecto de lei?
Mas, disse eu, e ia esquecendo-me esta especie, que muitos, ou quasi todos os Officiaes que se dizem aggravados, são aggravantes. Vou demonstral-o. Todo o mundo sabe que o nobre Marechal Duque de Saldanha fez uma promoção de Alferes no Chão da Feira, a qual, vencido o movimento em Ruivães, ficou naturalmente nulla. E não só estes inferiores de que tracto, mas todos os outros que serviram nos corpos que adheriram ao movimento, foram preteridos na promoção de 5 de Setembro de 1837, que foi feita sob as condições que vou manifestar á Camara (leu). É a Ordem do Exercito, n.º 49, de 5 de Agosto de 1837.
Não se excluiram só os que tinham entrado na revolução; mas os que lhe tinham manifestado affecto! Ora responde-me o Digno Par Conde do Bomfim, que nas promoções de sargentos não prevalece a antiguidade; mas eu redarguirei, que esta sempre entra em linha de conta com o merecimento, e que nenhum chefe ou Ministro honesto despreza uma e outra cousa, e promove afilhados (apoiados). Então sou logico, e não falto á verdade em dizer, que muitos dos inferiores promovidos no Chão da Feira, e outros que estiveram com os Marechaes na acção de Ruivães, foram literalmente preteridos por camaradas «eus menos antigo» no serviço, e com menos merecimento, os quaes seguiram sempre adiante delles os postos, e agora se acham em Capitães e Majores. A revolução de Almeida, em 1844, oferece outro exemplo desta natureza, e mais immoral. Tinha o Digno Par Conde do Bomfim, quando sitiado na referida praça, promovido a Alferes vinte e tres inferiores, promoção que naturalmente tambem ficou nulla quando capitulou, permittindo-se aos promovidos emigrarem para Hespanha. Fez-se uma promoção de Alferes no Exercito, depois da capitulação da praça, em 16 de Fevereiro de 1846, e outras mais subsequentemente; mas vindo a revolta chamada da Maria da Fonte, regressaram a Portugal os promovidos pelo Digno Par Conde do Bomfim: revalidou-se a sua promoção, e mandou-se contar a antiguidade de 15 de Fevereiro de 1844 aos seus agraciados, para ficarem mais antigos do que os inferiores do exercito fiel, que tinham servido constantemente, em quanto os que os preteriram tinham estado dois annos e meio em ociosidade! (O Sr. Conde do Bomfim — Eu não era Ministro; foi o Governo que fez isso). Bem. mas o facto existe; e note esta Camara que elle está e oi bem pouca harmonia com o procedimento do partido conservador, que nunca solicitou a validação da promoção do Chão da Feira quando foi poder. Ora estes promovidos em 5 de Setembro de 1837, e em 15 de Fevereiro de 1844, é que constituem o maior numero dos que agora se dizem preteridos em consequencia dos successos de 6 de Outubro de 1846, e da revolução do Porto. Quererá esta Camara, que Officiaes, que só foram collocados na posição que lhes pertencia, sejam novamente preteridos pelos seus camaradas, que indevidamente lhes passaram a diante em 1837, o na immoral promoção de 15 de Fevereiro de 1844? Estou convencido que não (apoiados).
Vou terminar. O projecto de lei em objecto terá a consequencia necessaria de fazer uma sci-zão entre os Officiaes do exercito, e despertar odios antigos, e factos muito desagradaveis e pungentes; e não póde ser approvado porque é injusto, porque subverte todos os principios de disciplina militar, e porque se oppõe ao accesso gradual dos postos estabelecido por todas as leis. Dando antiguidades a Officiaes graduados maiores do que as dos effectivos, obriga-os todavia a continuar a obedecer aquelles que no dia seguinte hão de ser seus inferiores; e estabelecendo que os menos antigos que preteriram não passem ao posto immediato em quanto a elle não passarem os a quem se conferir maior antiguidade, torna possivel que, para realisar a indemnisação, seja preciso dar posto e meio ou dois posto na mesma occasião a um Official. O Major de um corpo, por exemplo, é mais antigo do que o seu Tenente Coronel; falta o Coronel; ou não se ha de prover este posto, ou ha de o Major passar a Tenente Coronel e a Coronel effectivo no mesmo dia, o que certamente revoltará a todos. Já se fez em beneficio dos Officiaes que serviram a Junta do Porto, promulgando-se a Carta de Lei de 17 de Julho de 1855, tudo o que podia fazer-se; esta Camara já discutiu a materia, e a julgou com toda a equidade e reflexão: exigir della que altere o seu julgamento, e que hostilise mais de 400 Officiaes, que nunca deslizaram dos seus deveres, e que não teem culpa das revoluções que outros fizeram (apoiados), passa os limites de todas as conveniencias. Disse.
Vozes — É verdade, muito bem.
Tendo dado a hora o Sr. Presidente levantou a presente sessão, eram cinco horas da tarde, destinando que no dia seguinte se reunisse a Camara para continuar na mesma ordem do dia.
Relação dos Dignos Pares que estiveram presentes na sessão de 14 Janeiro de 1859
Os Srs.: Visconde de Laborim; Duque da Terceira; Marquezes: de Ficalho, de Fronteira, de Loulé, das Minas, de Niza, de Pombal, e de Vallada; Condes: das Alcaçovas, d'Alva, dos Arcos, d'Avillez, de Azinhaga, do Bomfim, do Farrobo, de Linhares, de Mello, de Paraty de Peniche, da Ponte de Santa Maria, de Rio Maior, de Sampayo, de Samodães, do Sobral, de Thomar, e de Vimioso; Viscondes: d'Algés, d'Athoguia, de Balsemão, de Benagazil, de Campanhã, de Castellões, de Castro, de Fornos de Algodres, da Luz, de Ovar, e de Ourem; Barões: d'Arruda, de Pernes, de Porto de Moz, e da Vargem da Ordem; Mello e Saldanha, Sequeira Pinto, Ferrão, Margiochi, Proença, Aguiar, Larcher, Silva Sanches, Fonseca Magalhães, Brito do Rio, e Aquino de Carvalho.