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DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 93

ca o governo), que conviria estabelecer um imposto sobre a exportação do gado bovino. Nada mais nos faltava.

E sobre quem recaíria esse imposto, perguntarei eu? Paga-lo-ia o inglez, para quem se manda o boi gordo? Não; pagava-o o lavrador; pagava-o o creador; pagava-o o paiz, porque se ia matar uma industria nascente e promettedora, que de si nasceu, que vive de si, e não pede protecções. Seria quebrar o ovo para não ter gallinha.

Sr. presidente, todo o trabalho é solidario. Sejamos sinceros. Para que se ha de estar a lisonjear uma parte do povo?

Faz-se um tratado de commercio, gritam em nome dos sapateiros que não podem fazer mais sapatos, porque todos hão de comprar sapatos francezes.

Trata-se da questão das carnes. Sustenta-se que para a carne ser barata nas cidades é preciso que se não se exporte, e que se fira a liberdade e aniquilem os interesses do productor.

Talvez me digam que a gente do campo não quer os arrolamentos. Não é exacto. São certos jornaes que vão tambem estabelecendo como artigo de fé que não haja arrolamentos.

Ora eu pela minha parte não sigo esta opinião, e arrostando outra vez ainda com a impopularidade, confesso que me sinto, quasi enthusiasmado pelos arrolamentos. Não é á palavra que tenho affeição, entenda-se; é á cousa em si. Se os não querem em rol, façam-os em cadernos ou em livros. Se os não satisfazem cadernos ou livros, façam-se em folhas de papel. Mas façam-se os arrolamentos.

Não tenho tambem aversão nem enthusiasmo pela pessoa que os devia fazer, nem pelo governo que os decretou, (embora composto de cavalheiros illustradissimos. Não peço, não requeiro que esse governo volte para decretar os arrolamentos; mas o que peço a todos os governos é que os façam, e que os façam por pessoas de fóra da localidade.

Já, ouvi tambem dizer entre esses artigos de fé, que são a minha substancial leitura da manhã, que se tratava de mandar proceder aos arrolamentos por pessoas das localidades. Se tal é, não o poderei sanccionar com o meu voto, porque será uma despeza completamente inutil, e mais uma illusão.

Falla-se tambem em substituir os arrolamentos por meio de gremios de proprietarios. Que seriam os gremios dos proprietarios? Qual será a taxa media de uma propriedade? A idéa parece sublime; é pena que seja incomprehensivel.

Não ha difficuldade em se fazerem as matrizes approximadas da verdade, o que ha é vontade de que não se façam. Seria longo e despendiosissimo o trabalho, se se tratasse de medir scientincamente todos os predios, organizando um perfeito cadastro parcellar. Porém a difficuldade desapparece se se contentarem com o que é pratico e sufficiente, se fizerem em nome do fisco o que eu faço, o que faz o sr. ministro das o aras publicas, cada um de nós na sua fazenda, quanto trata de a arrendar em leiras ou de imppeccionar a sua cultura. Vae cada um de nós com o seu feitor, percorre o campo, consulta o pratico, e facilmente avalia, era relação a cada pequeno trato de terreno, quanto póde levar de semente, quanto vale de renda, e quanto póde dar de producção media. Quando se diz que isto é difficil é por que se não quer fazer.

São precisos os arrolamentos. Eu peço que me arrolem a propriedade, no meu interesse e no interesse do thesouro. No meu interesse, digo, porque se da minha propriedade urbana em Lisboa pago 15 1/2 por cento como geralmente pagam es proprietarios da capital, da minha propriedade rural pago 23 por cento, e peço um inquerito aos srs. arroladores que lá forem para verificarem se isto é ou não exacto. E sabe v. exa. por que pago 23 por cento? É porque sou em certas cousas de uma simplicidade infantil; é porque dou declarações exactas do producto do que cultivo e do que recebo era rendas e terços.

Como acontece porém que, em vista de declarações exactas, sáia tão exagerada a contribuição? É facil a explicação. Não é culpa dos escrivães de fazenda, é culpa do regulamento feito no thesouro, sem conhecimento do que são praticamente as cousas do campo.

É sabido que a contribuição assenta não no rendimento bruto, mas no rendimento liquido. Como é, porém, que, achado o rendimento bruto, se calcula o rendimento liquido? Dividem-se em tres classes as terras; nas de l.ª classe deduz-se apenas, para despezas de cultura 40 por cento, e consideram-sa liquidos os 60 por cento restantes; nas de 2.ª classe deduz se 50 por cento, e consideram-se liquidos outros 50 por cento; nas de 3.ª classe deduz-se 60 por cento, e considera-se liquido 40 por cento do rendimento bruto. É aqui que vae o erro e o absurdo. Um exemplo basta para o demonstrar.

Segundo o regulamento, em uma terra de 1.ª classe que produziu 1 moio de trigo, gastou apenas o proprietario, para obter este resultado, o equivalente a 24 alqueires em todas as despezas, comprehendida a semente. Quereria que me mostrassem a região onde se alcançam estes resultados fabulosos. Não é de certo n’aquella que eu cultivo. Se para produzir 1 moio de trigo se gastasse apenas o valor de 24 alqueires, nada haveria melhor que ser lavrador. Na minha região uma producção de oito sementes considera-se optima, a de seta sementes é regular. Logo só a semente para 1 moio orça entre 8 e 9 alqueires. Ficam pois, segundo os termos do regulamento, 15 a 16 alqueires para lavrar, para esterroar, para mondar, para ceifar, para debulhar, para sustentar os bois, e para pagar ao abegão! Admiravel calculo! E querem que com sete mil e tantos réis se faça toda esta despeza em relação a cada moio de trigo! Nem o dobro chega na maxima parte das terras.

A culpa não é dos executores da lei, nem da lei, é do regulamento, que n’esta parte é absurdo, e urge reformar.

É este regulamento, impossivel e absurdo, que está convidando o lavrador a não ter a simplicidade que eu tenho de dizer a verdade, e está convidando a mentir, porque de contrario não póde supportar-se a exageração do imposto.

D’aqui resulta o que estamos vendo. Por um lado o regulamento convida o proprietario a esconder, a occultar; por outro lado o fisco não tem meios de apreciar o rendimento, e só não occulta quem não quer occultar. Assim temos lei durissima no papel, e geralmente nulla na execução. Qual é pois o resultado, e qual ha de continuar a ser senão receber o estado metade do que devia receber, pagando alguns o dobro do que deviam pagar.

O escrivão de fazenda sentado no seu gabinete não tem tempo, nem póde sair d’ali, occupado em obrigações numerosas. Quando se trata de formar ou rever matrizes vem dois informadores louvados de cada freguezia, por via de regra analphabetos, d’esses que nem lêem os taes periodicos de 10 réis (e bem lhes haja por isso), e demais interessados sempre directa e indirectamente, os informadores louvados dizem empyricamente a primeira cousa que lhes occorre, o que lhes convem, ou o que lhes fazem dizer quando servem de instrumentos a outros. Perguntam-lhes — o que tem Fulano? Esse (respondem elles) tem muito territorio; é uma cousa muito grande, póde dar 200 ou 300 pipas de vinho; póde dar 50 ou 500.

Esta é a lei na pratica, estes os dados, os elementos que servem para formar as matrizes.

O thesouro não aufere da contribuição predial metade do que devia receber, porque grandissima parte da propriedade anda fóra das matrizes. Quasi toda a inscripta vae avaliada em rendimento bruto muito inferior ao rendimento real. Acontece isto em geral. Na excepção contam-se os que pagam o que devem ou mais do que devem.

Qual o remedio? Não arrolar? Pois não arrolem; encader nem então, mas mandem gente de fóra, seja quem for, comtanto que tenha olhos para ver, e ouvidos para ouvir as informações locaes. Mandem examinar as propriedades,