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CAMARA DOS DIGNOS PARES.

EXTRACTO DA SESSÃO DE 12 DE FEVEREIRO DE 1858.

Presidencia do ex.mo sr. Visconde de Laborim,

vice-presidente.

Secretarios, os Srs. Conde de Mello

Visconde de Balsemão.

Achando-se presente o numero legal, o Sr. Presidente declarou aberta a sessão. Leu-se a acta da antecedente. O Sr. Marquez de Vallada pede a palavra sobre a acta.

O Sr. Presidente concede a palavra ao Digno Par.

O Sr. Marquez de Vallada não diz que haja inexactidão, mas declara que ha falta na acta Quando elle orador levara o Sr. Ministro da Guerra a explicar-se, alludindo ao que se tinha passado em outro logar, e que lhe fóra communica do por algumas pessoas que presencearam a allusão que alli se lhe fizera, S. Ex.ª respondêra de maneira muito satisfactoria. O Sr. Avila dissera depois, que estando na Camara dos Srs. Deputados, não tinha ouvido nada contra a sua pessoa, e que se algum orador fizesse qualquer allusão a seu respeito, o Sr. Presidente daquella Camara o teria chamado á ordem. Elle orador logo dissera, que tinha ouvido aquella allusão a algumas pessoas, que assistiram á discussão na outra Camara, e como o que S. Ex.ª lhe respondêra vem muito bem explicado no Diario do Governo, era esta declaração que tambem desejava ficasse consignada na acta.

O Sr. Visconde de Balsemão — Eu devo dizer ao Digno Par que não se póde mencionar tudo quanto se diz, em consequencia de uma observação que fez o Sr. Conde de Thomar sobre este objecto, e por esta razão é que as actas são mais resumidas.

O Sr. Marquez de Vallada expõe ser necessario que se tenha em attenção a sentença de Horácio: Brevis esse laboro obscurus fio. Por tanto, ha alguns objectos que se podem mencionar na acta com menos extensão, mas quando ha uma questão como aquella, deve-se tractar em termos muito claros; e o Sr. Conde de Thomar quando fez essa observação foi em these, entendendo-se que na hypothese se devem fazer certas excepções.

O Sr. Presidente declara que se procederá á alteração indicada pelo Digno Par, e que se não ha mais alguma observação, a acta fica approvada, e se passa á leitura da correspondencia.

O Sr. Marquez de Vallada pede a palavra para antes da ordem do dia.

O Sr. Secretario declara que não ha correspondencia sobre a mesa.

O Sr. Presidente pois que não ha correspondencia, concede em seguida a palavra ao Digno Par que a pedíra para antes da ordem do dia.

O Sr. Marquez de Vallada deseja saber se pela Secretaria da Camara foram feitas as devidas communicações aos Srs. Ministros — de que se tornava necessario e urgente que SS. Ex.ª, principalmente alguns delles, apparecessem nesta Camara; e que havia tambem interpellações pendentes, ás quaes tinham de responder. Segundo lêra no Diario do Governo do dia antecedente, a ordem do dia annunciada para esta sessão são as interpellações, e vê que ainda não está presente nenhum dos Srs. Ministros.

O Sr. Secretario Conde de Mello expõe que se passár aviso a todos os Srs. Ministros, dizendo-lhes — que a ordem do dia para esta sessão era, na primeira parte as interpellações, e na segunda os pareceres que as commissões deviam apresentar, se os tivessem promptos.

O Sr. Marquez de Vallada pede novamente a palavra.

O Sr. Presidente concede-lhe a palavra.

O Sr. Marquez de Vallada vê pela declaração tão explicita do Sr. Conde de Mello — que se fizeram as communicações, e que nenhum dos Srs. Ministros está presente. Que viera elle orador naquelle momento da outra Camara, e vira que o Sr. Ministro da Fazenda ficára ouvindo um orador da opposição a quem tinha de responder. Tambem lá vira o Sr. José Silvestre Ribeiro, que desejava fosse presente nesta Casa, porque tinha perguntas importantes a fazer-lhe; além das que já annunciara ao Sr. Presidente do Conselho. Que os Srs. Ministros não vêm e esta Casa por não quererem; o que nunca se fez desde 1834 (apoiados). Por tanto, como os Srs. Ministros dizem que estão muito occupados, e então não podem comparecer, julga-se no direito de fazer uma proposta nos termos seguintes: «Que a Camara dos Pares em consequencia da pouca consideração com que tem sido tractada pelo Governo, e principalmente pelo Sr. Presidente do Conselho, suspende as suas sessões até que os Srs. Ministros communiquem que podem vir responder ás innumeras interpellações que lhe teem sido repetidas vezes annunciadas.» Declara por sua parte que não póde ser mais prudente, e entende ser já occasião opportuna de marcar limites á sua prudencia e paciencia. Por isso propõe que se suspendam as sessões da Camara dos Dignos Pares do Reino até o Sr. Presidente do Conselho de Ministros declarar, que ha de vir responder ás annunciadas interpellações.

Havia dito igualmente que desejava interpellar o Sr. Ministro da Justiça, mas como S. Ex. não está presente não póde dizer nada.

O Sr. D. Antonio de Mello (sobre a ordem) reporta-se a ter-se queixado o Sr. Marquez de Vallada de não estar presente nenhum dos Srs. Ministros, e elle orador tem a declarar que o Sr. Ministro da Guerra está doente, e neste dia as sim havia participado aos seus collegas que se achava incommodado, e por esse motivo não fóra tambem á sua Secretaria, nem talvez lá possa ir por alguns dias.

O Sr. Marquez de Vallada declara que do Sr. Ministro da Guerra, é de quem tinha menos razão de queixa, porque S. Ex.ª já veiu responder á sua interpellação, e sente muito que esteja doente. Que este é um dos Ministros sobre a comparencia do qual não deve insistir agora.

A respeito do Sr. Ministro da Fazenda, a quem tinha de dirigir nesta occasião uma interpellação, já dissera tambem que não podia comparecer por estar envolvido n'uma discussão importante na outra Camara; mas com relação aos Srs. Ministros do Reino e dos Negocios Ecclesiasticos e de Justiça desejava e pedia que se lhes dirigisse sua proposta «que esta Camara suspende as suas sessões, até SS. EE. virem responder ás interpellações.» Declara que vai mandar a sua proposta para a mesa.

(Pausa.)

O Sr. Marquez de Vallada continuando, declara que cede da proposta, porque alguns Dignos Pares lhe disseram não ser prudente, e julgam que se não deve fazer agora. Desde já diz, em resposta a estas observações, que hade consignar bem na outra proposta que vai mandar para a mesa «que a Camara estranha que S. Ex não venha responder ás interpellações que se lhe dirigem.» Para elle orador é indifferente, que a Camara vote contra a sua proposta, por que poderá fazer o que julgar mais conveniente, mas quando S. Ex.ª continue a não vir á Camara ha de ser o seu defensor, e declarando que para isso tivera fundamento na proposta que fizera, e que a Camara não quizera approvar.

Portanto, ainda que tenha um voto só, como já aconteceu com uma proposta do Sr. Conde de Lavradio, hade elle orador dizer: «agora sou de aqui em diante o defensor do Sr. Presidente do Conselho.»

(Pausa.)

O Sr. Conde de Thomar pede a palavra. O Sr. Presidente concede a palavra ao Digno Par.

O Sr. Conde de Thomar declara que é para enviar á mesa um parecer da commissão de administração publica (leu.)

Este parecer está assignado pelos membros da commissão, presentes á sessão, e tem o voto dos Srs. Conde da Ponte, e José Maria Eugenio de Almeida. Quer dizer que a commissão está toda unanime.

O Sr. Presidente interroga a Camara se dispensa a sua leitura, porque então, manda-se imprimir, e será dado para ordem do dia (apoiados.)

O Sr. Visconde d'Athoguia pede a palavra para um requerimento.

(Entrou o Sr. Ministro das Obras Publicas.)

O Sr. Marquez de Vallada pede licença para dizer algumas palavras, sobre o que acabara de expender, por isso que entrára na Camara o Sr. Ministro das Obras Publicas.

O Sr. Presidente concede a palavra ao Digno Par.

O Sr. Conde de Thomar (sobre a ordem), expõe que havendo o Digno Par o Sr. Visconde de Athoguia pedido a palavra para um requerimento, sobre o parecer que elle orador acabara de mandar para a mesa, lhe parecia melhor que S. Ex.ª fallasse primeiro do que o Sr. Marquez de Vallada, para não confundir um objecto com outro (apoiados.)

O Sr. Presidente concede então a palavra em primeiro logar ao Sr. Visconde d'Athoguia.

O Sr. Visconde d'Athoguia pede á Mesa, que tenha a bondade de avisar os Srs. Ministros, para que compareçam nesta Camara no dia, em que se discutir a proposta que a commissão rejeita (apoiados).

Respeita muito a opinião da illustre commissão, mas não está de accôrdo com ella. É um projecto, relativo á ilha da Madeira, d'onde é filho, e tem boas razões para sustentar a proposta do Governo; e por isso mesmo que ha no Ministerio duas opiniões diversas (O Sr. Marquez de Vallada — Apoiado), pede que se faça saber aos Srs. Ministros o dia em que se hade discutir o parecer, e a necessidade que ha de comparecerem na Camara (apoiados.)

O Sr. Presidente declarou tomar nota, porque o parecer vai-se imprimir, e do dia que fôr dado para ordem do dia hão de ser avisados os Srs. Ministros para assistir á discussão (apoiados.)

Em seguida concede a palavra ao Sr. Marquez de Vallada.

O Sr. Marques de Vallada expõe que, antes de entrar na sala o seu nobre amigo o Sr. Ministro das Obras Publicas, elle orador havia feito algumas reflexões, que, se não tinham relação directamente com S. Ex.ª, comtudo se dirigiam a alguns dos Srs. Ministros.

Manifestara então, como em outras muitas occasiões, a surpresa por alguns dos Srs. Ministros não comparecerem nesta Camara, principalmente o Sr. Presidente do Conselho, e o Sr. Ministro da Justiça, porque tinha differentes objectos a respeito dos quaes precisava interpellar o Sr. Ministro da Justiça, e desejava fazer-lhes outras perguntas, sobre objectos do serviço publico. SS. EE. porém, não comparecem, e então não póde dizer nada.

Ao Sr. Presidente do Conselho de Ministros, tem sido dirigidas por differentes vezes notas de interpellação, e avisos repetidos para comparecer nesta Camara, como o acabara de declarar o Sr. Secretario Conde de Mello, e neste dia estavam dadas para ordem do dia as interpellações. Entretanto S. Ex.ª persiste no mesmo proposito de não comparecer, nem vir responder ás interpellações, sendo este facto unico na historia parlamentar do paiz, e de todos os outros.

Movido destas razões, porquanto cumpre aos Dignos Pares zelar pela execução do systema que rege, elle orador entendêra, que devia mandar para a mesa uma moção; e julga que essa moção, deve ser approvada por toda a Camara. É provavel que o seja só por elle orador, mas quando a sua proposta fosse rejeitada, ainda assim ficava victorioso, e tornava-se o defensor do Sr. Presidente do Conselho de Ministros, porque, quando alguem estranhasse a sua falta de comparencia, diria: «nós é que temos a culpa!»

Movido destas razões escrevêra a moção que tinha a honra de mandar para a mesa, e pedia a sua urgencia.

O Sr. Presidente como o Digno Par pede a urgencia, consulta a Camara.

O Sr. Secretario Conde de Mello conta os votos e declara parecer-lhe que não está approvada.

O Sr. Conde de Thomar pede a contra prova.

(Fez-se.)

O Sr. Secretario Conde de Mello declara, pela contagem dos votos, estar admittida, e que o seu engano proviera de não ter contado com o Sr. Duque da Terceira.

O Sr. Duque da Terceira declara que approva

O Sr. Presidente como foi approvada a urgencia da moção, abre sobre ella a discussão.

O Sr. Ferrão pede a palavra.

O Sr. Presidente concede a palavra ao Digno Par.

O Sr. Ferrão — Sr. Presidente, todos nós deploramos a falta da presença dos Srs. Ministros na occasião em que são necessarios nesta Camara (apoiados).

Cada um dos Dignos Pares tem o direito de manifestar os seus queixumes a este respeito, e qualificar como entender similhante omissão, o que sem duvida imporia uma censura, e a Camara ouvindo taes queixumes aprecia certamente este juizo individual de cada um dos Dignos Pares, como fôr de justiça, e talvez o confirme com o seu silencio.

Mas em logar do seu juizo não conhecido, provocar-se a manifestação delle, formulado por uma proposta, mandada para a mesa, que conduz necessariamente a uma discussão, e votação immediata, é um procedimento muito severo, que póde tomar todas as dimensões de uma pena.

Sendo isto assim, a meu vêr, parece-me que é contra todos os principios do direito natural, positivo, e até muito alheio das conveniencias parlamentares — que a Camara inflija um castigo desta ordem, sem a presença dos Ministro arguidos, para se defenderem ou se explicarem contra a imputação que se lhes faz.

Cada um dos Dignos Pares fará o que entender que deve fazer no exercicio das suas funcções com relação ao apoio de que precisa qualquer Ministerio; mas não se deve, e por esta fórma, empregar similhante remedio, ou providencia, contra a falta dos Srs. Ministros, por isso mesmo que tem um valor muito grande, razão de mais para sermos economicos, e para o reservar para circumstancias extremas, a que ainda não somos chegados.

Em conclusão, Sr. Presidente, eu entendo que com quanto a proposta do Digno Par fosse não só admittida á discussão, mas considerada urgente, ou deve ser remettida a uma commissão, ou quando a Camara não approve este expediente, deve então adiar a sua discussão para quando estiverem presentes os Srs. Ministros, a que se refere; porque elles darão as suas explicações, e á vista dellas a Camara fará o que entender (apoiados).

O Sr. Silva Sanches — Sr. Presidente, é mais para dar uma explicação do que para entrar nesta discussão que eu pedi a palavra. Eu votei contra a urgencia da proposta do Digno Par; e então é necessario que a Camara saiba o motivo porque assim votei.

Esta proposta importa uma grave censura ao Presidente do Conselho de Ministros, como acabou de dizer o Digno Par, um castigo, e um castigo severo. Ora, castigos desta natureza nunca se infligem sem ouvir explicações daquelles a quem se quer censurar. Como não estava presente o nobre Presidente do Conselho para dar essas explicações, que póde ser que satisfaçam á Camara, pois póde ser que S. Ex.ª explique por tal modo o motivo de não ter comparecido aqui, que até o Digno Par, que é rasoavel, julgue neste caso improcedente a sua proposta, pareceu-me que a não devia considerar urgente. E ou o Sr. Presidente do Conselho explique a sua falta bem ou mal, satisfaça ou não á Camara, entendo, Sr. Presidente, que esta proposta é da natureza daquellas que não podem ser votadas sem que o Ministro, a quem se quer impôr a censura, saiba que ella foi apresentada, e seja avisado para vir assistir á sua discussão. Neste caso é claro que não se deve discutir agora a proposta do Digno Par: por isso é que votei contra a urgencia — assim como, se a Camara quizer discutil-a hoje, serei obrigado a rejeital-a, porque antes de condemnar desejo ouvir a parte que póde ser condemnada.

Portanto. Sr. Presidente, o que tenho por mais conveniente é seguir-se officio indicado pelo Sr. Ferrão, para que a proposta vá a uma commissão; e para que, quando esta der o seu parecer, se mande prevenir o Sr. Presidente do Conselho ácerca do dia em que ha de ser discutida, a fim de que S. Ex.ª venha assistir á discussão.

O Sr. Ministro das Obras Publicas pede a palavra porque entende que as accusações que se fizeram ao Ministerio pelo abandono das suas cadeiras nesta casa não são justificadas, por quanto o Governo acha-se representado na pessoa de um dos seus membros. Pôde certificar á Camara dos Dignos Par, que o Ministerio todo tem para com ella a maior deferencia, mas os Dignos Pares sabem que ás vezes ha projectos importantes que chamam a presença de todo o Governo á outra casa do Parlamento para assistir á discussão delles, o que justifica a não comparencia dos Ministros nesta casa; e sabe-se tambem que quando esses mesmos importantes projectos vem a esta Camara, então essa mesma razão chama aqui os Ministros. Quando pois se der esse facto, o Governo comparecerá nesta Camara.

Ora, pelo que respeita ao Sr. Presidente do Conselho dirá, que desde que o Governo está representado, por se achar presente um dos seus membros, a accusação não procede, mesmo porque o Ministerio é solidario. O Digno Par póde portanto fazer a interpellação que entender, que elle orador está prompto a responder. Nestes termos parece-lhe que a proposta deve ser avaliada pela Camara, sem precisão de elle Ministro entrar na sua discussão, e por isso nada mais dirá nesta occasião.

O Sr. Visconde de Balsemão — Os argumentos que acabam de ser apresentados hoje nesta Camara provam a razão que eu tinha quando n'uma das sessões passadas emitti aqui a minha opinião sobre o assumpto em questão. Então disse eu, e agora o repito, que reconhecia que os Ministros eram obrigados a responder ao Parlamento, mas que não eram obrigados a estarem presentes. Ainda sustento, Sr. Presidente, a minha opinião, e cito em abono della a Inglaterra e os Estados-Unidos, paizes esses aonde os ministros respondem sempre por escripto, e isto pela circumstancia de que um ministro, que é membro de uma das camaras, não vai á outra. Naquelles dois paizes entendem que é conveniente o responderem os ministros por escripto, porque esses documentos ficam archivados, e considera-se ter mais força a opinião escripta do ministro sobre um assumpto qualquer, do que sendo dada vocalmente.

Agora observarei que não está nas attribuições desta Camara o apresentar um voto de censura aos Ministros, porque a censura importa uma pena sobre negocio em que ella póde ser chamada a dar o seu voto como Juiz. Não devendo, pois, a Camara pronunciar-se sobre a proposta do Digno Par o Sr. Marquez de Vallada, que importa uma censura, sem ser ouvido o ministro, parece-me, em vista dista que ella deve ser remettida a uma commissão para dar o seu parecer.

O Sr. Conde de Thomar expõe que a presente discussão apresenta uma singularidade, e vem a ser, ter votado elle orador na urgencia da proposta, pela mesma razão por que o Digno Par o Sr. Silva Sanches disse votara contra a urgencia. S. Ex.ª votou contra a urgencia, porque queria que o Governo se habilitasse para podér responder: pois foi essa a razão por que elle orador votou em sentido contrario (O Sr. Visconde d'Algés — Tambem eu). E quem justificou isso bem foi o Sr. Ministro das Obras Publicas quando disse, que estava prompto a responder ás interpellações que se fizessem, porque o Ministerio era solidario, e elle estava presente representando o Governo.

Ainda que a proposta seja verdadeiramente pessoal, ainda que o Digno Par o Sr. Marquez de Vallada se referisse unicamente ao Sr. Presidente do Conselho e Ministro dos Negocios Estrangeiros e do Reino, comtudo não se póde admittir que nas censuras que tiverem de fazer ellas se dirijam só a um Ministro. Devem ser feitas a todos, e tudo quanto se disser é com relação ao Governo.

Já o Sr. Ministro das Obras Publicas declarou que estava prompto a responder á interpelação; mas elle orador prevê tambem que quando se lhe fizer alguma pergunta que não seja relativa a cousas da sua repartição, S. Ex.ª pedirá que se espere venha o seu collega da repartição competente. Isto mesmo fóra o que pediu ha dias o Sr. Ministro da Fazenda com relação ao Sr. Ministro das Obras Publicas.

Não quer ferir a susceptibilidade do Sr. Visconde de Balsemão, que tem uma convicção profunda sobre o modo por que os Ministros são chamados a responder aos membros do Parlamento. S. Ex.ª entende que os Ministros são obrigados a responder, mas que não podem de maneira nenhuma ser obrigados a comparecer, e quiz fortalecer esta sua opinião com argumentos tirados de outros paizes; e nisto, permitta-lhe S. Ex.ª que elle orador diga, que foi infeliz, porque fallou na veracidade da parte historica. A respeito da Inglaterra disse, que não respondiam, mandavam responder....

O Sr. Visconde da Balsemão — Eu disse que em Inglaterra, não podendo ir um ministro da camara dos communs para a dos lords, nem desta para a dos communs, não só respondiam por elle os seus collegas, mas muitas vezes respondiam por escripto.

O Sr. Conde de Thomar replica ao Digno Par que a organisação é inteiramente differente. Na Inglaterra os que são lords não vão á camara dos communs, assim como os da camara dos communs não vão á dos lords. Que paridade tem então esse argumento com a nossa organisação, em que os. Ministros podem comparecer em ambas as Camaras sejam Pares ou Deputados, e ainda mesmo não sendo membros de uma nem de outra Camara? Não vê o Digno Par que a Carta Constitucional quer que os Ministros assistam ás discussões, e respondam parlamentarmente? Não vê que a Carta traz um artigo que diz, que os Ministros que não forem membros da Camara em que estiverem terão de saír na occasião de qualquer votação? O que quer isto dizer senão que teem obrigação de assistir ás discussões para responderem, pois que só na occasião das votações é que os manda saír? Como argumentar com uma organisação differente? Já se vê que similhante doutrina não póde ser admittida nesta Camara.

Declara o orador ter dito estas poucas palavras para o Digno Par não ficar entendendo que todos se convenciam de ser fundamentada tal opinião,

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ou nos principios, ou na historia dos outros paizes, pois que acabava de demonstrar que não colhe, nem nos principios, nem na historia.

Em quanto ao mais, opina que o Sr. Ministro das Obras Publicas tem razão. O Governo acha-se presente. Se estivera no logar do Sr. Marquez de Vallada cedia da proposta, acceitava a declaração do Sr. Ministro das Obras Publicas, e começava a dirigir-lhe as interpellações (apoiados), porque o facto provaria se a sua resposta é ou não justificada (apoiados).

O Sr. Marque: de Vallada pois que abrindo-se o campo da discussão á sua proposta, se apresentaram adversarios a ella, pede licença ao nobre Ministro, e seu amigo, para, não começar pela resposta a S. Ex.ª Um dos primeiros cavalheiros que entrou no campo foi o Sr. Silva Sanches: S. Ex.ª declarou-se então, não diria sectario, porque esta palavra, ainda que não seja para ferir, póde parecer que o é; dirá antes — apologista. Na verdade foi S. Ex.ª o primeiro apologista daquelles que são contrarios á philosophia do sentimento O Sr. Silva Sanches não admitte nem sequer a sensação; S. Ex.ª não quer ao menos que elle ora dor sinta, porque entende que sentindo, e sendo acompanhado neste sentimento por algum amigo seu, esta sensação possa ferir alguem. Se fosse uma accusação, ou uma censura mais forte... mas sendo apenas a manifestação de um sentimento que tem no seu coração, do qual S. Ex.ª, com toda a força da sua eloquencia, não o póde seguramente esbulhar, parece-lhe que não devia incorrer na sua censura. Isto pelo que respeita ao Sr. Silva Sanches, que foi um dos athletas do Ministerio. Renova neste momento os parabens que já no outro dia déra a um empregado, que foi então o primeiro defensor que o Governo teve nesta Camara. Refere-se ao Sr. Sequeira Pinto. Nesta occasião é o Sr. Silva Sanches que vem em reforço do Ministerio. Dá os parabens a S. Ex.ª, e ao Ministerio, porque vê que ao passo que as questões se vão tornando mais animadas, vão surgindo os defensores. Julgo mesmo que por isto o Ministerio, em logar de ficar desobrigado a elle orador, se lhe deve mostrar agradecido.

O Sr. Ministro das Obras Publicas disse «quando chegarmos ás questões importantes verá que os Ministros não hão deixar de comparecer aqui; nós somos solidarios, por consequencia não póde notar-se a falta de um, porque não ha distincção entre Ministro e Ministro.» Elle orador tem a notar, como resposta ao argumento apresentado por S. Ex.ª, que as idéas que apresentára agora estavam em opposição com as que se ouviram nesta casa, em outro dia ao Sr. Ministro da Fazenda, quando disse «que não podia responder por certos negocios, que diziam respeito ás repartições dos seus collegas.» (O Sr. Visconde d'Athoguia — O Sr. Ministro da Marinha tambem disse o mesmo). Por consequencia vê que SS. Ex.ªs estão em idéas inteiramente oppostas. Depois tambem o Sr. Ministro das Obras Publicas disse «que as censuras não deviam ser dirigidas em especial a um Ministro, mas em geral.» Quando se tractar de uma questão grave e momentosa, em que tome parte todo o Gabinete, então poderá caber toda a responsabilidade ao Ministerio (apoiados); mas não nesta de que elle orador tracta, pois lhe parece que seria injusto se quizesse que a responsabilidade fosse igual, quando se queixa da falta de comparencia de certo e determinado Ministro (apoiados). O que nota em tudo isto, e já tem sido notado por mais alguns collegas, é a falta de unidade de pensamento no Ministerio; e isto não só entre os Ministros uns com outros, mas até nos mesmos Ministros; porque, segundo se lê nos extractos das sessões de ambas as casas do Parlamento, um dos Srs. Ministros veio ainda ha pouco dizer a esta Camara uma cousa inteiramente differente do que tinha dito na outra casa; e vinte e quatro horas depois, voltando para lá, desdisse-se daquillo que tinha aqui dito! Era esta uma das razões por que desejava tambem que o Sr. Ministro da Fazenda comparecesse; mas como tem conseguido o seu fim, adopta a lembrança do Sr. Conde de Thomar, e vai dirigir ao Sr. Ministro das Obras Publicas algumas das perguntas que tinha a dirigir aos seus collegas. Espera que S. Ex.ª responda tambem como costuma; mas por muito talento que S. Ex.ª tenha, como elle orador tanto se satisfaz de reconhecer, porque sempre foi muito seu amigo, presuppõe comtudo que S. Ex.ª se acha em máo terreno, por lhe não ser possivel ter conhecimento de tudo, não podendo responder satisfactoriamente a certas perguntas, nem resolver com vantagem certas questões, e certos problemas sobre instrucção publica, que tenciona dirigir ao Sr. Ministro do Reino. Dada esta explicação declara que retira a sua proposta, e vai dirigir ao Sr. Ministro das Obras Publicas algumas perguntas.

O Sr. Presidente pede permissão ao orador para consultar primeiro a Camara se convem em que se retire a sua proposta. Decidiu-se afirmativamente. O Sr. Marquez de Ficalho pede permissão para dizer duas palavras antes de se proseguir na discussão, promettendo não entreter a Camara por mais de dois minutos.

O Sr. Presidente consulta os Dignos Pares se convem em que se dê a palavra ao Sr. Marquez de Ficalho (apoiados). Neste caso dá a palavra ao Digno Par.

O Sr. Marques de Ficalho como no outro dia tomou uma parte muito activa sobre a questão do Sr. Visconde de Balsemão, que hoje tornou a renovar, parece-lhe que não devia ficar silencioso.

A Camara dos Pares rege-se pela Carta Constitucional, que tem preceitos e regras a que se não póde faltar. O Sr. Visconde de Balsemão pediu que se lançasse na acta a sua declaração, e elle orador pede tambem que se lance na acta a decisão da Camara.

Se elle orador se não engana, S. Ex.ª confundiu-se. Se dissesse que os Ministros estavam auctorisados a responder por escripto em certas circumstancias, assim o entendia, e a Camara não se lhe daria disso, porque ficava com um documento escripto, sobre o qual poderia depois estabelecer-se a discussão; mas o que não comprehende é como quer S. Ex.ª que o Par faça a interpellação verbal; que o Ministro responda por escripto, e o Par lhe redargua de palavra?... Desejava que o Digno Par meditasse um pouco, e visse que este intervallo entre a pergunta do Par, e a resposta do Ministro, talvez trouxesse scenas bem ridiculas, como seria estar a Camara com os seus trabalhos suspensos por muito tempo, e muitas vezes em longos espaços a esperar pela resposta que os Ministros haviam de escrever (apoiados). Estas scenas repetir-se-iam por vezes, e não sabe mesmo que tempo levariam.

Portanto, se a Camara decidir que se lance na acta a declaração do Digno Par, elle orador pede que igualmente decida se declare tambem na acta a resolução que se tomou no outro dia.

O Sr. Visconde de Balsemão pediu a palavra só para dizer que não julgava inconstitucional a resposta por escripto, por consequencia faz muita differença daquillo que se lhe attribue, S. Ex.ª disse que não era ponto constitucional, e insta em que não é, porque na Constituição não vê expresso que os Ministros sejam obrigados a comparecer na Camara.

Não entrará na conveniencia ou não conveniencia da comparencia; mas torna a repetir que disse só que não era ponto constitucional, e sustenta ainda a sua opinião, porque effectivamente não vê estabelecida na Carta a obrigação da comparencia dos Ministros nesta Casa.

O Sr. Ferrão — Eu tambem não posso ficar silencioso agora, com relação a duas idéas que foram emittidas nesta discussão, das quaes salvo o devido respeito, discordo plenamente. Uma por parte do Ministerio, adduzida pelo Sr. Ministro das Obras Publicas, e a outra pelo Digno Par o Sr. Visconde de Balsemão.

A primeira é relativa ao principio de solidariedade dos Ministros, a qual hoje contesto. Houve tempo em que geralmente se dizia, e eu o repetia, que os Ministérios eram solidarios, mas hoje as melhores opiniões são a favor de uma asserção opposta, isto é, que elles não são, não devem, nem podem ser solidarios, nos termos absolutos da proposição contraria: e este principio acha-se consignado na Constituição de uma grande nação, de um grande paiz, e n'uma lei patria recente foi expressa e virtualmente adoptado, e foi a que auctorisou a creação de um Presidente sem pasta, distinguindo-se ahi os negocios communs, ou de politica geral, dos negocios especiaes a cada uma das repartições; sendo os primeiros da responsabilidade commum, incluindo então o Presidente, e os segundo da especial e individual a cada um dos respectivos Ministros, ficando assim nestes irresponsavel o mesmo Presidente.

Sem duvida, que desde que está presente um membro do Gabinete, e este declara, que está prompto a responder por todos, ou por alguns de seus collegas, a respeito de qualquer arguição, ou a dar qualquer informação, acabou a questão da presença ou não presença do Ministro respectivo, mas sempre e em todo o caso, a Camara não poderia fazer recahir uma censura sobre o que não tem culpa, nem participou do facto que é objecto da mesma censura; se assim fizesse a pena passaria da pessoa arguida, e similhante procedimento offenderia os mais obvios principios de justiça, que regulam a imputação das acções humanas (apoiados).

A segunda idéa, que igualmente impugno, emittida pelo Sr. Visconde de Balsemão, é a de que, sendo privativo da outra Camara, accusar os Ministros de Estado, e sendo esta o Tribunal que tem de os julgar, cada um dos Dignos Pares como Juizes se deve abster da censura, para não prevenirmos assim um voto que podemos dar, como membros desse Tribunal.

Ora S. Ex.ª labora em um equivoco, por que confunde accusação criminal por factos de abuso de podér, com procedimentos méramente disciplinares: a censura, pena moral, com as penas criminaes.

A Carta falla só da accusação e imposição das penas criminaes, e não comprehende nem podia, comprehender o direito de censura, que compete a cada uma das Camaras (apoiados); o direito de censura, que não significa nem é outra cousa mais do que a manifestação do desagrado que a uma Camara ou a algum ou alguns de seus membros causa o procedimento de um Ministerio ou Ministro, e os precedentes confirmam esta doutrina. A Camara não póde prescindir do exercicio deste direito; se delle se privasse desceria muito e muito da sua dignidade, e comprometteria o exercicio das suas funcções legislativas (apoiados).

Voltando á questão da solidariedade ministerial, repito, que não concordo em attribuir a todo o ministerio as faltas individuaes de cada um dos Ministros, admittindo sómente essa solidariedade a respeito dos negocios geraes, no pensamento, ou marcha politica do Governo.

Assim não me admira que um membro do Gabinete nos diga aqui, que póde responder até um certo ponto por negocio que não seja da sua repartição, mas que desse ponto para diante não póde, porque isso pertence ao Ministro da repartição competente, como está acontecendo todos os dias.

Estou convencido, Sr. Presidente, que ninguem quereria, nem podia ser Ministro se fosse obrigado a saber tudo que se faz nas outras repartições; os Ministros pois não são solidarios senão nos principios geraes de administração, e não nas cousas particulares; e sendo isto assim os membros desta Casa icem sómente o direito de interpellar o Ministro da repartição competente, nos negocios que particularmente lhe pertencem.

Admitto que o Sr. Ministro das Obras Publicas responda por qualquer dos seus collegas, por que então o considero auctorisado pelo mandato que assume, ou que lhe foi confiado; mas para que possa bem desempenhar a tarefa a que se compromette, é preciso que se mostre acompanhado dos necessarios esclarecimentos, e sem isso o Parlamento não póde dar-se, por satisfeito: estão são as minhas opiniões.

O Sr. Ministro das Obras Publicas declara não ter nada a accrescentar, visto que, com a retirada da proposta que se achava em discussão, ficaram inutilisadas as reflexões que poderia fazer.

O Sr. Silva Sanches — Sr. Presidente, o Digno Par, auctor da proposta que já retirou, estranhou que eu nem se quer lhe admittisse, que elle estranhasse, ou sentisse, que o Sr. Presidente do Conselho não compareça.

Sr. Presidente, não tem decorrido muito tempo que eu fallei; por isso estará na memoria de todos o que disse. E diria eu alguma cousa donde se podesse inferir, que eu não admittia que S. Ex.ª podesse sentir a ausencia do Sr. Presidente do Conselho? Entrei eu na apreciação da proposta? De certo que não. E não entrando na sua apreciação, poderia não admittir o que nella se dizia?

Eu disse; que a proposta importava uma censura; que essa censura era o castigo mais forte que o Parlamento podia infligir a um Ministro, excepto o caso de se ter apresentado na Camara dos Srs. Deputados uma accusação contra elle, de vir essa accusação a esta Camara, depois de julgada procedente, e ser aqui o Ministro condemnado. A não ser isto, é certo que o castigo mais severo que se lho póde impôr é uma censura; e, por isso, intendia que essa censura não se podia, ou não se devia impôr sem o Ministro ser ouvido. Seria isto combater a proposta, ou não querer que S. Ex.ª sentisse a ausencia do Sr. Presidente do Conselho?

Agora creio que o Digno Par não deixará de reconhecer, que não teve razão para suppôr que respondi o que effectivamente não tinha dito.

Accrescentou S. Ex.ª, que me felicitava por ter vindo em auxilio dos Srs. Ministros. E eu declaro, que não me recusarei a sustentar o Ministerio, quando podér convenientemente faze-lo; mas tambem não me recusarei a combate-lo, se o que elle propozer fôr contrario aos interesses do paiz. Agora não o defendi, nem o ataquei: pretendi unicamente, que o não castigássemos sem o ouvir. Seria isto ser campeão do Ministerio? Se se trocassem as scenas, se em logar do Sr. Marquez de Vallada ser accusador, fosse accusado, eu pediria que S. Ex.ª fosse ouvido antes de ser censurado.

Agora duas palavras ao Sr. Conde de Thomar: S, Ex.ª disse, que pelas razões porque eu votara contra a urgencia da proposta, votara elle a favor, por isso que o Governo estava presente. O Governo, e permittam-me que diga as cousas como as intendo, não está presente, apenas está representado, porque o membro de um Gabinete que é composto de seis Ministros, não é o Gabinete; nem o Sr. Ministro das Obras Publicas póde responder pelos negocios da Secretaria do Reino, como o Sr. Marquez de Vallada brevemente verificará, se lhe dirigir as interpellações que tencionava fazer ao Sr. Ministro do Reino. Portanto, sendo a proposta dirigida contra este Sr. Ministro, intendia, e intendia ainda, que não bastava, nem basta a presença do Sr. Ministro das Obras Publicas.

Estas são as explicações que eu tinha a dar; mas, já que me acho de pé, e como aqui se tem anunciado uma idéa com que eu não posso concordar, permittir-me-hão que exponha ácerca della a minha opinião.

Eu não posso concordar de fórma alguma com a do Sr. Visconde de Balsemão — que a Camara não tem direito a exigir a presença dos Srs. Ministros — entendo mesmo que, quando se estabelecesse a doutrina do meu nobre amigo, o systema representativo tinha acabado.

Diz o Digno Par, que a Carta não exige a presença dos Srs. Ministros; mas é que ha cousas que, apezar de não estarem na Constituição, são' da essencia do regimen constitucional, estão no uso, e nas praticas parlamentares. Ora, do uso e pratica parlamentar, é que os Ministros venham assistir ás discussões, porque se tem reconhecido ser isso absolutamente indispensavel.

Não quero extender-me mais a este respeito, porque o julgo inutil: o que quero é que fique bem consignada a minha opinião sobre este ponto, e vem a ser: que o systema representativo acabaria, se não fosse do dever dos Srs. Ministros comparecerem nas Camaras.

O Sr. Marquez de Vallada passa ainda a responder ao Sr. Julio Gomes. S. Ex.ª estranhou, que elle orador se surprehendesse de S. Ex.ª não lhe conceder o direito de sentir, e depois déra uma explicação ás suas palavras; porém elle orador tambem precisa explicar-se para S. Ex.ª o entender melhor. Declara que fez aquella proposta em consequencia de que tendo o Sr. Presidente do Conselho sido prevenido por muitas vezes consecutivas, e ha muito tempo, de que lhe deseja dirigir algumas perguntas, da Camara ouvir as respostas de S. Ex.ª ás interpellações que lhe estão annunciadas, não é possivel conseguir que S. Ex.ª compareça, nem que dê uma justificação qualquer da sua falta constante. Isto é claro que a Camara mesmo não póde deixar de o sentir, e até de o estranhar (apoiados).

Em these não póde elle orador deixar de estar de accôrdo com o Sr. Julio Gomes, mas na hypothese, como será possivel rasoavelmente negar-se o direito de manifestar este sentimento tão natural, esta estranheza por um facto tão novo? E de mais, não redigiu elle orador a sua proposta em phrazes cortezes e urbanas? Parece-lhe que sim.

Mas o Digno Par apresentou depois outra idéa, com a qual tambem concorda, e é — «que o Governo tinha agora aqui um representante.» — Isto é verdade, mas ha certas perguntas ás quaes não sabe como ha de responder o Sr. Ministro das Obras Publicas. Confessa que se acha gravemente embaraçado sobre este ponto; mas como S. Ex.ª o nobre Ministro insistiu tanto na solidariedade ministerial, considerando-se prompto a responder a quaesquer perguntas, não tem remedio senão começar, mas é impossivel deixar de reservar alguma cousa, porque sabe de certo que S. Ex.ª não lhe póde responder a tudo.

Pergunta desde já a S. Ex.ª se tem conhecimento do officio dirigido pelo Procurador geral da Corôa, o Sr. José de Cupertino, em que este diz ao Sr. Ministro da Justiça, que lhe não é possivel dar conta de certos negocios que lho foram commettidos, por isso que se acha gravemente occupado com differentes trabalhos?

O negocio da syndicancia do Porto, de que se falla no Parlamento em todas as sessões não está ainda resolvido, e elle orador crê que o illustre funccionario a quem se refere é desse mesmo que falla no dito officio.

No dia em que se tractou nesta Camara pela ultima vez do negocio da syndicancia do Sr. Visconde de Ourem, lembrou a necessidade e urgencia de tomar alguma medida. Agora está ainda mais firme, mais seguro no que disse então, porque vê a impossibilidade, a difficuldade que aquelle magistrado diz ter, para que possa resolver com promptidão os negocios que lhe são commettidos.

Já se vê quanto isto é em prejuizo das partes, que são portuguezes, que pagam tributos e impostos pesados, tendo por isso lodo o direito a que os seus negocios não estejam por tanto tempo parados com detrimento muitas vezes de summa gravidade. É claro pois, que o Governo deve nomear novos ajudantes áquelle logar, ou tomar qualquer providencia que dê algum resultado bom a este respeito. Agora em quanto ao officio do Sr. Ministro da Justiça relativamente ao projecto de inauguração do palacio da justiça deve dizer, que é sua opinião, que antes de se fabricar esse palacio se deve vêr se temos justiça, organisar bem esse ramo, para depois fabricar o palacio.

O palacio da justiça, onde se acham as repartições que lhe são proprias, tem tambem repartições do Ministerio da Guerra. Não sabe pois se S. Ex.ª tomou aquella medida de motu proprio sem consultar o seu collega, e segundo lhe consta ha graves embaraços para se levar a effeito, porque a Secretaria da Guerra não se promptificou a despejar o edificio, occupado em parte por algumas repartições dependentes do seu Ministerio.

Sobre isto tudo deseja ouvir o Sr. Ministro da Justiça, e assim tambem sobre o grave negocio da refórma das cadêas. Não póde agora desenvolver mais este objecto, mas deseja saber o que ha relativamente aos trabalhos de differentes commissões, e com especialidade de uma nomeada em 1839 ou 1840, no Ministerio do Sr. Julio, e do qual fazia parte o Sr. Braamcamp, o Sr. Alves de Sá, e outros cavalheiros. Sabe que os trabalhos desta commissão foram apresentados a uma nova commissão para a refórma das cadêas. Deseja ouvir o Sr. Ministro da Justiça explicar o seu pensamento a este respeito.

Tem ainda a fazer outras observações sobre negocio inteiramente differente. Tencionava expôr tambem certas idéas, mas por acaso logo pela manhã vira um artigo na Revolução de Setembro, cujas palavras exprimem a mesma cousa! Caso raro. (Riso.) Entretanto não tem remedio senão adoptar o artigo que não escreveu, mas que traz as mesmas idéas que elle orador tinha sobre o assumpto, embora seja assignado pelo Sr. Antonio Rodrigues Sampaio.

Sendo no outro dia aqui interpellado o Sr. Ministro da Fazenda em relação a phrases que S. Ex.ª não negou que as havia soltado na outra Camara, como se via dos extractos das differentes sessões, perguntara a S. Ex.ª se era verdade, que por occasião de se estar discutindo na outra Camara um projecto de lei sobre subrogação de bens de raiz por inscripções, dissera S. Ex.ª que, como Ministro e como Deputado havia de fazer tudo quanto podesse para desvincular a terra — declaração esta, que depois de espalhada no publico tinha produzido graves apprehensões em muitos cavalheiros que sustentam os vinculos, e que desejam a continuação delles com aquellas reformas que são necessarias em beneficio da mesma instituição como já se reconheceu aqui nesta Camara. Perguntou pois a S. Ex.ª se em vista de tal declaração o Governo tencionava apresentar algum projecto para extincção dos vinculos, pois a declaração havia realmente feito tanta impressão que muitas pessoas se deliberaram logo a formar uma liga intitulada — Liga conservadora dos vinculos. O nobre Ministro da Fazenda porém respondeu, que de tal cousa se não tractava; que não era esse o seu pensamento; e que nas expressões que soltara na outra casa do Parlamento se referira simplesmente ao projecto sobre as Misericordias e outros estabelecimentos, que entendia lucrarem em se lhes permittir a subrogação de certos bens por inscripções; e quanto ao fundo da questão sobre vinculos que tinha a mesma opinião que elle orador já lhe conhecia, isto é, a opinião favoravel á conservação delles. Agora pede licença para lêr o artigo publicado subsequentemente, bem como o extracto da sessão respectiva.

(Leu o artigo e extracto da sessão no jornal a que se referiu, e continuou:)

De sorte que S. Ex.ª depois de vir aqui explicar a nosso contento o que havia dito na outra Camara, foi logo vinte e quatro horas depois desdizer-se lá!

Parece-lhe que a permissão para troca de bens de raiz por inscripções já está fita. Mas agora o que o Sr. Antonio José d'Avila quer ultimamente é a extincção dos vinculos pouco a pouco. A faculdade para a troca ou subrogação, como dissera, já existe: por consequencia é cousa que já está feita; e o que se deprehende portanto das palavras de S. Ex.ª é que effectivamente quer mais alguma cousa, quer obrigar os senhores de vinculos a trocarem os seus bens por inscripções. Se tal fôr a diante, então elle orador manifestará o seu sentimento, e na occasião de qualquer discussão sobre vinculos exporá as suas apprehensões sobre essa troca ou transformação que se pretende fazer. Se se continuarem a trocar alguns bens de vinculo como até aqui, póde ser

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que muitos senhores de vinculos mudem então de proposito achando não ser conveniente tal troca.

Reserva-se relativamente aos outros pontos sobre que tinha tambem perguntas a fazer, pois que considera ser impossivel ao Sr. Ministro das Obras Publicas podér satisfazel-o nisso. Pede pois ao nobre Ministro, que lhe diga qual o pensamento effectivo do Governo em relação aos vinculos, pois que existem já graves apprehensões, e está resolvida para estes dias proximos uma reunião como liga conservadora dos vinculos, onde se tracte do que fôr necessario fazer a tal respeito, pois se vê, que os amigos do Governo que são ultra-progressistas instam com o mesmo Governo pela abolição dos vinculos, e satisfazem-se por agora dizendo-se-lhe que se tracta disso, que se estão dando os passos convenientes para melhor se seguir tal fim. Embora! Aguarde-se o futuro, e então se conhecerá se o Governo é ou não completamente dominado pelas idéas ultra-revolucionarias.

Aguarda as explicações do nobre Ministro sobre os pontos que lhe indicou, e principalmente sobre o ultimo que acaba de expôr.

O Sr. Ministro das Obras Publicas declara á Camara que foi mais feliz do que esperava. Pôde dizer que se julga habilitado para responder a algumas perguntas que o Digno Par lhe dirigiu, porque ha outras a respeito das quaes S. Ex.ª guardou reserva, e então não póde entrar no intimo do seu pensamento. Antes de se fazer cargo de responder a estas interpellações deve declarar tambem, que quando disse que acceitava a solidariedade ministerial, fizera mais do que um acto politico, porque está persuadido que vendo alguem accusado um seu amigo ausente, se declara seu defensor; e portanto seguiu os mais gratos sentimentos do coração humano. Tomou a defeza do seu collega, porque sendo tambem Ministro, não havia deixar de querer para si a accusação que se dirigia ao Ministro que não estava presente, e que por tal não podia tractar de se defender.

Em quanto ás Interpellações que lhe foram dirigidas pelo seu nobre amigo o Sr. Marquez de Vallada, diz que não era possivel deixar de lêr conhecimento do officio enviado pelo Sr. Procurador geral da Corôa ao Sr. Ministro da Justiça, porque vinha publicado no Diario do Governo, e effectivamente elle orador não póde comprehender bem o alcance da interpellação. Se o Digno Par suppõe que é necessario que o Governo se explique sobre as observações que fez aquelle cavalheiro, não tem duvida em declarar que as observações indicadas pelo digno Procurador da Corôa, provem do serviço que pésa sobre elle, ser superior ás forças humanas; e dirá mais, que ha necessidade da creação de ajudantes. (Uma voz — Já os tem.) É verdade que já existem ajudantes, e comtudo existe essa difficuldade. Mas o Digno Par entende, que a manifestação das indicações daquelle officio, importam uma censura ao Ministerio actual. Elle orador apella para os sentimentos generosos de S. Ex.ª que não póde referir-se á responsabilidade de um cavalheiro que ha pouco tempo é Ministro da Justiça, sobre cousas que duram ha muito tempo.

O Sr. Marquez de Vallada expõe que unicamente perguntara quaes eram as intenções do Governo depois do officio?

O Sr. Ministro das Obras Publicas, responde que não é Ministro da Justiça (riso), mas não é preciso sel-o, para saber que se deve regular o serviço. Entende pela sua parte, que as observações feitas por aquelle illustre Magistrado devem ser attendidas, e até vae mais longe, diz que no negocio a que alludiu o Digno Par, da syndicancia do Ultramar, entende que ha muitas cousas a fazer-se; porque a legislação a tal respeito tem inconvenientes e não faz com isto a menor accusação ao auctor dá Lei. Mas são graves os inconvenientes na execução, (O Sr. Conde de Thomar — São absurdos.) porque entende, que um servidor do Estado, que serve bem o seu paiz, vem achar difficuldades n'uma Lei que na pratica tem inconvenientes (O Sr. Aguiar — Esta Lei não tem nada com a syndicancia), e dizia isto porque o Digno Par tambem fallára nesta syndicancia. — Quanto á syndicancia do Porto, é a respeito della que versa o officio do Sr. Procurador da Corôa, porque o Sr. Ministro da Justiça entendeu, que lhe devia dirigir um officio para apressar o processo daquelle negocio, e então deve entender-se que o Governo tem a peito que elle se ultime; e nesse officio a que o Digno Par se referiu, dá a entender o Sr. Procurador da Corôa, que se occupava daquelle assumpto, e portanto deve S. Ex.ª ter a certeza que este negocio não poderá ser muito demorado, vista a resposta que se deu ao Governo.

Tambem o Digno Par fallou a respeito da necessidade do estabelecimento de certos tribunaes no edificio da Boa Hora, e sobre este objecto não póde dizer que lhe seja inteiramente alheio, porque além de prender com a Repartição das Obras Publicas, o pensamento do. Sr. Ministro da Justiça é o mesmo de toda a Administração (O Sr. Conde de Thomar — Não é só desta, é muito antigo.) A isto replica o orador, que actualmente é desta a realisação. (O Sr. Conde de Thomar — Essa agora?) O orador continua dizendo, que a realisação daquelle pensamento é o mais difficil, e a resposta justamente que apresenta ao á parte do Digno Par, é que muitos homens de estado teem ido ao Ministerio, mas não tem podido adiantar este negocio, e então o Sr. Ministro da Justiça não poderia realisar em poucos dias, o que ha muitos annos se não tem feito, como desejavam muitas outras Administrações. Era esta a resposta que póde dar; mas assegura ao Digno Par, que os Ministros hão de obrar de accôrdo neste ponto, s bendo S. Ex.ª mui bem, que não é facil ter os edificios para estabelecer logo as repartições de que se tracta, e a difficuldade está como já dissera ao Sr. Conde de Thomar, em que sendo esse o pensamento de muitas Administrações ainda se não póde realisar, e S. Ex.ª foi um dos Ministros que prestou toda a attenção a esse projecto.

Havia ainda outra interpellação sobre as cadêas. O Digno Par deseja saber se foram presentes á commissão encarregada deste assumpto todos os esclarecimentos. Este é um ponto de facto a que não póde responder. Diz mais, que estas interpellações quando não são feitas de certo modo, não é possivel podér responder-lhes, e mesmo no caso de terem relação com a sua repartição não o podia de prompto fazer, ignorava que se tractasse desta interpellação, porque fóra só prevenido que estavam dadas para ordem do dia certas interpellações, e o Digno Par lhe dirigira algumas perguntas sobre o regimen das cadêas; portanto não se póde fazer cargo das idéas de S. Ex.ª sobre o objecto, e pede-lhe licença para se escusar disto. Julga que não ha ninguem que tenha lido o que se acha estabelecido lá fóra a respeito de cadêas, e que entre nós não deseje uma refórma. (O Sr. Marquez de Vallada — Mas lá ha um systema.) A respeito de systemas S. Ex.ª, sabe que isto é um objecto muito serio, e que não se tracta em uma interpellação. Este objecto tem occupado as vigilias de muitos homens que teem tractado o assumpto, e portanto não póde responder de repente sobre tal ponto.

Em quanto á interpellação do Digno Par sobre a declaração que fez o seu collega da fazenda na Camara dos Srs. Deputados, responde que se chegasse a abolição dos vinculos pela subrogação forçada, entende que todos os proprietarios de vinculos iriam á subrogação: isto era obrigar aquelles que pedem a abolição dos vinculos, não sobre razões fortes, senão como dando aos proprietarios maiores direitos de propriedade do que teem actualmente. Está claro que, quando fosse abolir, não era obrigando os donos dos vinculos a subrogar, porque neste caso dava-se uma certa garantia, o que se não daria na abolição forçada. Nem o seu collega emittiu esta opinião na outra Camara a respeito da subrogação forçada. Desde que existe a faculdade de trocar os bens vinculados por inscripções, entende que toda a gente que tem desejo de vêr augmentado o credito publico, e á vista do integral pagamento dos juros das inscripções, não póde votar contra isso.

O Sr. Marquez de Vallada entende agora muito differente a questão tractada pelo Sr. Ministro das Obras Publicas nesta casa, daquella que tractou o Sr. Ministro da Fazenda na outra Camara. S. Ex.ª disse, que toda a gente que desejava o augmento do credito publico deve desejar a troca dos bens por inscripções...:

O Sr. Ministro das Obras Publicas explica que o Governo obrigar a subrogar, seria isso uma offensa ao direito de propriedade.

O Sr. Marquez de Vallada explica que S. Ex.ª diz mui bem, que era a offensa de um direito, o obrigar a subrogar. Isto lhe serve de muito, e fica satisfeito. Pede aos Tachygraphos que escrevam este áparte do Sr. Ministro. Nada mais dirá a tal respeito, e em quanto ás outras interpellações que. fez reconhece a difficuldade que S. Ex.ª tem de lhe responder.

Vozes — Já deu a hora.

O Sr. Presidente expõe que já havia dado a hora, e que a maior parte dos Dignos Pares se tinham retirado. Portanto, não podendo, segundo o estylo, haver Camara nos dias seguintes, parece-lhe conveniente haver sessão na proxima sexta-feira (19) (apoiados), sendo a ordem do dia a leitura dos pareceres apresentados pelas commissões. Assim declarou fechada a sessão.

Eram quatro horas e um quarto.

Relação dos Dignos Pares presentes á sessão de 18 de Fevereiro.

Os Srs. Duque da Terceira; Marquezes, de Ficalho, das Minas, de Niza, de Vallada; Condes, das Alcaçovas, d'Azinhaga, de Bomfim, de Fonte Nova, da Louzã (D. João), de Mello, de Thomar, de Linhares; Viscondes, d'Algés, d'Athoguia, de Balsemão, de Benagazil, de Castro, de Fornos d' Algodres, de Laborim, d' Ovar, d' Ourem; Barão de Porto de Moz; D. Antonio José de Mello, Ferrão, Margiochi, Aguiar, Larcher, Silva Sanches, e Brito do Rio.

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