222 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO
Ha de demonstrar que o digno par, na melhor das intenções, por certo, na melhor boa fé, e mantendo-se na linha correcta e propria de um estadista notavel, adduziu argumentos e apresentou considerações, que facilmente podem ser aniquilados.
É seu intento, em primeiro logar, desfazer a má impressão que porventura esses argumentos tenham produzido no espirito de quem os ouviu, e, em segundo logar, mostrar que foram escrupulosa, meticulosa e rigorosamente acautelados os legitimos interesses da agricultura, das industrias, do consumidor e do thesouro.
No que respeita aos actos da sua administração, pretende o orador completar a exposição lucida e brilhante do digno par.
Completal-a-ha com menos colorido, com menos brilhantismo, com menos pompa de recursos oratorios; mas completando-a, levará ao espirito de todos a convicção de que es seus actos furam correctos.
Tem a honra de pertencer ao partido progressista, no qual milita desde que entrou para a vida politica, e por isso, e compartilhando as responsabilidades politicas do governo transacto, procurará justificar os actos praticados na gerencia da pasta das obras publicas pelo seu antecessor o sr. Augusto José da Cunha.
Quer compartilhar essas responsabilidades, porque está acima de tudo o dever de um bom partidario, e porque a solidariedade politica é a base fundamental do prestigio dos partidos.
Procurará conscienciosamente, sinceramente, acompanhando par e passo a argumentação do digno par, justificar os actos praticados por aquelle ex-ministro, que não tem voz n'esta casa do parlamento.
Demonstrará a boa vontade e o proposito honesto, digno e alevantado d'aquelle cavalheiro, nas providencias que adoptou.
Poderia não ter tido, o que vulgarmente succede, a verdadeira previsão dos acontecimentos; mas ha de ficar nitidamente impressa, no espirito dos que o escutam, a convicção firmissima de que aquelle homem de estado procedeu sincera, leal, honesta e dignamente.
Procedeu, como deve proceder um ministro da corôa, que antepõe a tudo a necessidade de acudir ás necessidades da subsistencia publica.
Procedeu, como deve proceder um homem que, forte na sua consciencia, trata de cumprir o seu dever, sem se arrecear dos embates, e sem se importar com os dissabores e desgostos que o seu procedimento possa acarretar-lhe.
Crê que ninguem poderá pôr em duvida a limpidez d'aquelle caracter, as boas intenções e o proposito verdadeiramente patriotico com que elle procedeu no exercicio das funcções que desempenhou.
Passando a responder aos argumentos do digno par Hintze Ribeiro, começará pela questão da legalidade dos diplomas promulgados pelo seu illustre predecessor e pela do decreto de 10 de fevereiro d'este anno.
O digno par, relembrando os principaes diplomas publicados ácerca do regimen cerealifero, n'esta moderna phase de protecção á agricultura, affirmou convictamente que todos os que emanaram do partido politico a que s. exa. pertence, haviam sido publicados em perfeita harmonia com a legislação vigente, ou segundo as praxes constitucionaes, e que, quando porventura não estavam comprehendidos nas disposições taxativas da lei, e promulgados dictatorialmente, foram mais tarde, por meio de um bill, submettidos á sancção parlamentar.
Tambem s. exa. se referiu ao facto dos diplomas serem assignados por dois, por quatro ou por todos os ministros.
O facto de qualquer diploma ser assignado apenas por alguns ministros, não faz caducar a responsabilidade do governo.
Os decretos dictatoriaes, quer assignados por um ministro ou por mais, assumem uma franca e aberta invasão das attribuições do poder legislativo, e, sendo assim, ao poder executivo compete a obrigação de submetter esses diplomas por meio de um bill á sacção do parlamento.
Vae dar nina novidade á camara, não para com ella justificar os seus actos nem para se defender das accusações que lhe foram dirigidas, porque não se defende uma illegalidade com outra illegalidade; mas porque prometteu demonstrar até á saciedade que não vigora o regimen da primeira lei de 1888, nem o da lei de 1889, nem vigora lei alguma pelo que respeita ao regimen cerealifero.
Insiste na sua affirmativa, e demonstrará que, pela legislação respeitante á questão cerealifera, existe um verdadeiro cahos, uma completa anarchia.
A novidade que vae dar á camara é que, tanto o primeiro como o ultimo diploma da responsabilidade do gabinete a que pertenceu o digno par Hintze Ribeiro sobre a questão cerealifera, embora referendados por todos os collegas de s. exa., não foram submettidos á sancção parlamentar.
São esses decretos os de 27 de fevereiro de 1890 e o de 26 de novembro de 1896.
S. exa. argumentou, certamente de boa fé, e com a sinceridade que é propria do seu alevantado caracter; mas scripta manet, e esses decretos constam dos registos parlamentares, e ahi estão a attestar a verdade da affirmativa que apresenta.
O orador combateu a dictadura de 1890, mas por demais sabia que o decreto de 27 de fevereiro não estava incluido na proposta do bill apresentada ao parlamento.
Arguiu o facto, e replicaram-lhe que elle era devido a um lapso.
Póde admittir-se um lapso em materia de simples expediente das secretarias, mas nunca em diplomas emanados dos ministros da corôa.
Vê-se, pois, que não é ao governo actual, como disse o digno par, que cabe a gloria de ter publicado um documento sobre a questão cerealifera sem o sujeitar á sancção parlamentar.
Tambem o digno par censurou asperamente o facto de simultaneamente se ter permittido a entrada do trigo exotico e de farinhas. Pois acto perfeitamente identico praticou o ministerio regenerador em 1890, ministerio de que fazia parte o digno par interpellante.
Islão terá s. exa. que penitenciar-se desse acto, que obedeceu ao imperio das circumstancias; mas o digno par devia recordal-o quando tratou de flagellar o procedimento do sr. Augusto José da Cunha.
Ha de demonstrar que os interesses da agricultura não soffreram absolutamente nada com as providencias decretadas pelo seu predecessor.
Pede desculpa á camara de ser um pouco extenso, mas pretende collocar o seu discurso, embora descolorido, ao lado d'aquelle que proferiu o sr. Hintze Ribeiro.
Um completa o outro.
Diz que, emquanto não tivermos um bom regimen cerealifero, emquanto não for approvada uma boa lei reguladora do assumpto, havemos de ver-nos constantemente enleiados n'estas questões irritantes sempre que tenhamos de abrir os portos aos cereaes estrangeiros.
O orador historia as causas que determinaram as providencias adoptadas pelos ministerios a que o digno par Hintze Ribeiro pertenceu, e diz, analysando varios documentos, que as medidas adoptadas, tanto pelo governo actual, como pelo seu antecessor, obedeceram tambem á intenção recta de attender aos principios de uma boa administração.
Elogia a resposta do nobre presidente do conselho ás perguntas que o digno par lhe dirigiu, e estranha que