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334 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

ontro. Introduzem-se estes artigos, as malas com ás tampas levantadas, em uma casa fechada, onde estão sujeitos por quarenta minutos á acção do acido sulfuroso.

Vê-se, pois, que a Desinfecção efficaz só tem logar para as roupas da cama e roupas brancas usadas pelos viajantes, porque está demonstrado que o micróbio do cholera, o terrivel bacillo virgula de Kock não resiste ao calor humido de mais de 100 graus centigrados. Escapam á desinfecção as carruagens estofadas, os cobertores de lã, a roupas brancas e fato vestido pelos viajantes, o que equivale a não desinfectar cousa alguma. As malas e pequenos volumes sujeitos á acção do acido sulfuroso, que de certo não penetra em todos os recantos, e ainda que penetrasse, é inefficaz para destruir o microbio ficam exactamente, como antes da operação.

Comprehende-se, portanto, que todos estes processos são absolutamente inuteis para conseguir o fim que se tem em vista. Isto é evidente, e não é preciso ser technico para o affirmar resolutamente.

Comprehende-se o isolamento rigoroso dos viajantes durante o per iodo provavel de incubação, acompanhado da desinfecção de "todos os artigos proveniente do paiz atacado pela moléstia, incluindo os vehiculos; agora a desinfecção parcial, como se está praticando nas nossas frontei-ieiras, é que não tem rasão alguma de ser.

Quaesquer que sejam, porém, as medidas sanitarias empregadas, é quasi impossivel evitar a propagação da molestia entre dois paizes limitrophes, porque está hoje reconhecido que a agua é o principal vehiculo transmissor da terrivel doença asiatica, e, existindo rios communs aos dois paizes, ha grande perigo de contagio.

Desde que se manifestou o cholera na Europa, vae quasi em dois annos tem continuado sempre na nossa fronteira os servidos sanitarios com um rigor unico no nosso paiz.

No anno passado, em outubro, quando o cholera fazia terriveis estragos em Hamburgo, entrei eu em França pela fronteira de leste, e observei que apenas se sujeitavam, os viajantes a uma rapida inspecção sanitaria, não sendo tambem permittida a introducção de mapas sujas, mas não se sujeitavam as bagagens á desinfecção.

Em Hespanha tambem actualmente não se procede á desinfecção, na fronteira, em Irun.

No anno passado existia a mais um inaudito vexame, que,, com a maior sem ceremonia e desprezo pela personalidade humana, se infligia aos que entravam em Portugal. Impunha-se aos viajantes a obrigação, sob pena de prisão de comparecer durante cinco dias á inspecção sanitaria em um gabinete do governo civil, situado no pateo do mesmo edificio, para onde olham as portas de grades e janellas dos calabouços. Aos nacionaes repugnava, de certo, este procedimento pouco delicado da auctoridade administrativa, mas como estão acostumados a estas formalidades vexatorias, não tinha isto grande inconveniente com referencia aos homens. Com respeito ás senhoras era, comtudo; de uma grosseria e inconveniencia dignas da mais severa censura. Obrigal-as a comparecer no pateo do governo civil, nas proximidades do qual muitas vezes de encontram as desgraçadas que a má sorte perdeu, realmente não é digno para um paiz civilisado.

Para os estrangeiros que nos visitavam era realmente insupportavel o vexame, e em Castello de Vide ouvi, com grande magua, dirigir consuras ao nosso paiz, em termos pouco agradaveis para ouvidos portuguezes, mas que a brutalidade da medida até certo ponto justificava. Não comprehendiam como se pretendia obrigar as damas, que vinham em sua companhia, a uma formalidade tão vexatoria.

Em França e Hespanha procedia-se por modo mui diverso, e em harmonia com as regras da boa educação. Chegados os passageiros á fronteira, eram examinados rapidamente pelos facultativos, e, sendo encontrados em bom estado de saude, recebiam um documento, denominado passaporte sanitario, no qual a auctoridade administrativa lhes impunha a obrigação de irem ou mandaram apresentar o referido documento á auctoridade do logar para onde iam residir. Reservava-se tambem a auctoridade administrativa o direito de mandar examinar, na sua residencia, o recemchegado, pelos facultativos officiaes.

Isto é muito differente do procedimento seguido entre nós, e que, provavelmente, tornará a ser posto em pratica, apesar das minhas observações, se infelizmente a epidemia do cholera se desenvolver este anno com maior intensidade. O resultado certo será afastar cada vez mais a concorrencia de viajantes ao nosso paiz, quando o que muito convinha era attrahil-a por todos os modos.

Ainda outro assumpto, sobre o qual desejo fazer algumas observações, é o do systema seguido na fiscalisação das bagagens dos viajantes que entram em Portugal. Tambem tem o privilegio de ser privativo do nosso paiz, e contribue para afugentar os viajantes. Quem entra no nosso paiz, soffre na fronteira um minucioso exame nas suas bagagens, o qual se justifica não sendo excessivamente rigoroso, devendo preferir-se as declarações dos viajantes, com severa penalidade no caso de estas serem falsas.

Certamente, que algum contrabando se fará, mas. nos outros paizes entende-se muito bem que á visita de numerosos estrangeiros compensa qualquer descaminho de direitos.

Procura-se, portanto, não os afugentar com formalidades incommodas e vexatorias.

Mas o que não tem justificação alguma é o duplicado exame de bagagens a que entre nós se procede em Lisboa, Porto e outros pontos sujeitos ao imposto de barreiras. Em Paris e Madrid onde tambem existe o imposto de consumo cobrado nas barreiras, pergunta-se simplesmente aos viajantes se trazem algum genero sujeito áquelle imposto, e nada mais, e, segundo as suas declarações, assim se procede ou não á cobrança dos direitos.

Entre nós suppõe-se que os viajantes aproveitarão a rapida passagem desde a fronteira para atulhar as suas malas com carnes, vinho, azeite e outros generos.

Ora, isto é realmente absurdo, e o rigor é de tal ordem, que nem mesmo os pequenos volumes em que as senhoras incluem os seus artigos de costura e toillete escapam ao exame do fisco.

Ou então suppõe-se que a fiscalisação ha fronteira e nas alfandegas é de tal ordem, que o paiz está sempre inundado de contrabando, e que é preciso perseguir com repetidos exames o viajante até que entre em casa.

Tenciono continuar, era occasião opportuna, a combater estas e outras, originalidades da nossa administração, que tanto contribuem para o nosso descredito..

As observações que acabo de fazer podem, talvez, parecer de pouca importancia e improprias da attenção dos altos poderes do estado. Não me parece que assim seja, porque se trata de facilitar e fomentar as relações internacionaes, e não desejo nunca que pelos nossos processos singulares, demos aos estrangeiros o direito de nos alcunharem de menos civilisados e inimigos do progresso.

Concluindo, pedia, portanto, ao governo, aqui representado pelo sr. ministro da fazenda que olhasse para os assumptos a que me referi, de modo que sejam melhorados estes serviços.

O sr. Presidente: — Tem a palavra o sr. ministro da fazenda.

O sr. Ministro da Fazenda (Fuschini): — Sr. presidente, uma parte das observações que s. exa. acaba de fazer, pertence á competencia do meu collega o sr. ministro do reino; a outra parte refere-se á nossa fiscalisação na fronteira

Eu estou de accordo com o digno par; creio que haverá realmente excessos de zêlo na nossa fiscalisação aduaneira.