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CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

SESSÃO DE 20 DE MARÇO DE 1865

PRESIDENCIA. DO EX.MO SR. SILVA SANCHES

PRESIDENTE SUPPLEMENTAR

Secretarios, os dignos pares

Conde de Peniche

Visconde de Gouveia

Ás duas horas e tres quartos da tarde, sendo presentes 36 dignos pares, foi declarada aberta a sessão.

O sr. Presidente: — Convido o digno par o sr. visconde de Gouveia a servir de secretario.

Lida a acta da precedente sessão julgou-se approvada, na conformidade do regimento, por não haver observação em contrario.

Deu-se conta da seguinte correspondencia:

Um officio do monte pio geral, enviando cincoenta exemplares do relatorio da direcção, e outros tantos do relatorio da mesma e parecer da commissão revisora da caixa portugueza dos seguros mutuos sobre a vida, a fim de serem distribuidos pelos dignos pares do reino.

Mandaram-se distribuir.

O sr. Rebello da Silva: — Sr. presidente, eu pedi a palavra para ler o relatorio da commissão especial nomeada por esta camara, para dar o seu parecer sobre a moção do sr. conde d'A vila (leu).

(Entrou o sr. ministro da guerra)

O sr. Presidente: — Manda-se imprimir. Tem a palavra o sr. marquez de Vallada.

O sr. Rebello da Silva: — Peço perdão. Eu não remetti os documentos porque estão na secretaria; mas este parecer e acompanhado de documentos que a commissão deseja tambem que sejam impressos.

O sr. Marquez de Vallada: — Sendo-lhe concedida a palavra, expoz que a pedíra na ultima sessão da camara dos dignos pares, e tambem para explicações; mas não as tendo podido dar, por isso não podéra votar em favor da moção de estar discutida a materia, porque tinha de condenar muitas das asserções dos srs. ministros, especialmente as do sr. ministro dos negocios ecclesiasticos e da justiça...

O sr. Presidente: - Se o digno par me dá licença, observo-lhe que as explicações hão de ser dadas em occasião opportuna.

O sr. S. J. de Carvalho: — Apoiado.

O Orador: — Era exactamente para o que pedíra a palavra; para (Observar que estando unicamente presente o sr. ministro da guerra não presumia opportuna esta occasião para fallar sobre o objecto de que tencionava occupar-me; mas pedia de novo ao ex.mo sr. presidente que o inscrevesse para quando presentes os srs. ministros da fazenda, do reino e da justiça.

O sr. Presidente: — Para explicações estão inscriptos os srs. conde de Thomar, ministro da fazenda, Miguel Osorio e visconde de Gouveia. Para antes da ordem do dia tem a palavra o digno par o sr. Vellez Caldeira.

O sr. Vellez Caldeira: — Na sessão de 15 de março disse eu a V. ex.ª (leu). Mas na sessão que hoje se distribuiu torna a apparecer no fim da sessão — Castello Branco achando-se n'essa mesma sessão, que Vellez Caldeira pedíra a palavra e dissera o que já mencionei; ora sr. presidente isto é uma contradição: tanto mais que na mesma acta que hoje acaba de se approvar sou tratado pelo appellido de que uso; é verdade que me assigno Manuel Antonio Vellez Caldeira Castello Branco, mas como sou mais conhecido por Vellez Caldeira, podem algumas pessoas julgar, vendo no Diario — Castello Branco - que eu não compareço ás sessões: peço portanto a V. ex.ª que mande rectificar o engano.

O sr. Presidente — Já se ordenou á secretaria para fazer a rectificação, e fique V. ex.ª certo que o seu pedido ha de ser satisfeito.

O sr. Conde de Torres Novas: — Eu pedi a palavra para que V. ex.ª tenha a bondade de me inscrever para fazer uma interpellação ao sr. ministro da marinha, de que mandarei uma nota para a mesa; não á tenho já feita, porque não tenho o regimento d'esta camara para saber o modo porque devo andar n'este negocio; comtudo fui prevenido pelos meus amigos e collegas, de que era necessario mandar por escripto a nota para a mesa. Peço portanto a V. ex.ª para me inscrever, para quando estiver presente o sr. ministro da marinha.

Aproveito este momento para fazer uma declaração que entenda necessaria, mas que me não foi possivel ainda fazer, em consequencia dos debates que tem havido n'esta camara. Quando tive a honra de ser chamado por Sua Magestade para formar um gabinete, Sua Magestade não me impoz restricção alguma; deixou-me em perfeita liberdade para escolher os meus collegas como julgasse conveniente. Devo fazer esta declaração, porque se tem fallado de uma maneira menos exacta, tanto n'uma das casas do parlamento como na imprensa periodica.

O sr. Presidente: — Emquanto á interpellação, o digno par terá a bondade de a mandar por escripto para a mesa, a fim de ser remettida ao sr. ministro da marinha, para que s. ex.ª designe o dia em que se acha habilitado a responder-lhe.

O sr. Conde d'Avila: — Sr. presidente, peço a V. ex.ª, que me reserve á palavra para quando se entrar na ordem do dia.

O sr. Marquez de Niza: — Leu e mandou para a mesa o seguinte requerimento:

«Requeiro que pela mesa seja pedido com urgencia á secretaria da justiça, o processo relativo ao concurso, em virtude do qual foi provido o logar de tabellião Rodrigues Grillo, assim como todos os documentos apresentados pelos concorrentes.

«Sala das sessões, em 20 de março de 1865. = Marquez de Niza.»

ORDEM DO DIA

O sr. Conde d’Avila: — Sr. presidente, na ultima sessão, quando se leu na mesa o parecer n.° 5, eu requeri a V. ex.ª que o mandasse imprimir com urgencia, e que se mandasse distribuir por casa dos dignos pares, porque entendi que este negocio deve ser resolvido com a maior brevidade possivel, e eu pedia a V. ex.ª e á camara que elle fosse discutido quanto antes. Este projecto é relativo ao subsidio pedido pelo governo, para a exposição internacional que deve ter logar na cidade do Porto, e propunha eu, que começássemos a ordem do dia pela discussão d'este parecer (apoiados).

Consultada a camara foi approvado que se começasse pôr esta discussão.

Leu-se na mesa o seguinte parecer e projecto:

PARECER N.° 5

Senhores. — A commissão de fazenda examinou o projecto de lei n.° 6, vindo da camara dos senhores deputados, e relativo á exposição internacional, que esta annunciada para o proximo mez de agosto na cidade do Porto.

A commissão, tendo ouvido as informações que lhe foram prestadas pelo governo, e considerando que aquelle honroso commettimento procede da iniciativa individual, que muito importa animar e favorecer;

Considerando que o convite dirigido aos expositores estrangeiros foi satisfactoriamente acolhido; devendo esperar-se a concorrencia que é para desejar, de productos tanto nacionaes como estrangeiros;

Considerando que o subsidio de 73:550$000 réis pedido pela companhia que fundou o palacio de crystal, é pela mesma companhia declarado o unico auxilio pecuniario que precisa receber do estado;

Considerando que a disposição do § unico do artigo 2.° do projecto se deve entender como restrictamente applicavel ao tempo em que durar a exposição e aos productos mandados á mesma exposição, sem que possa invocar-se a faculdade concedida pelo artigo 4.° do decreto de 10 de julho de 1834, interpretação esta que estava na mente do governo, e que será especificada no regulamento respectivo, como o governo declarou perante a commissão:

Em vista do que fica exposto, e conformando-se com as ponderações apresentadas no relatorio que precede a proposta do governo, a commissão é de parecer que o referido projecto de lei esta nos termos de ser approvado por esta camara para subir á sancção real.

Sala da commissão, em 17 de março de 1865. = Conde d'Avila = Barão de Villa Nova de Foscôa — Joaquim Filippe de Soure (vencido) = José Augusto Braamcamp — José Lourenço da Luz.

PROJECTO DE LEI N.° 6

Artigo 1.° E o governo auctorisado a conceder á companhia de commercio denominada «sociedade do palacio de crystal portuense» um subsidio de 73:550$000 réis para as despezas da exposição internacional, que deve verificar-se na cidade do Porto no futuro mez de agosto, podendo emittir as inscripções necessarias para este fim.

Art. 2.° Os productos estrangeiros que forem remettidos á exposição serão sujeitos ao pagamento dos direitos marcados na pauta das alfandegas, unicamente no caso de não serem reexportados.

§ unico. O palacio de crystal da cidade do Porto será considerado como armazem de deposito da alfandega da mesma cidade.

Art. 3.° O governo fará os regulamentos necessarios para a execução do artigo antecedente.

Art. 4.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, 14 de março de 1865. = Cesario Augusto de Azevedo Pereira, deputado presidente = Joaquim Xavier Pinto da Silva, deputado secretario = José de Menezes Toste, deputado secretario.

O sr. Margiochi: — Não assignei o parecer que se discute, apesar de ser membro da commissão de fazenda, porque não me foi possivel comparecer á reunião em que foi apresentado e assignado esse parecer. Na reunião da commissão, em que foi discutido o projecto de lei de que elle trata, votei, bem como o digno par o sr. Filippe de Soure, contra a doutrina d'este projecto. Julgo do meu dever fazer esta declaração á camara, visto não ter assignado o parecer que se discute e ter de votar contra elle.

Não me parece que a cidade do Porto esteja em circumstancias de fazer uma exposição internacional de industria, e receio que tal empreza, em logar de ser util para o nosso paiz, nos traga algum descredito (apoiados). Lendo ha dias o relatorio feito ao governo pelo sr. conde d'Avila, na qualidade de commissario regio junto á commissão da exposição universal de París, notei que s. ex.ª entendia que exposições d'esta natureza só podiam ser feitas em Londres ou París. Nações muito mais poderosas do que a nossa, e de uma industria muito mais adiantada, não têem, até hoje, feito exposições internacionaes. Não me parece portanto que o Porto, cidade pequena em relação ás principaes capitaes da Europa, esteja nas condições de poder hospedar os expositores ou visitantes que hajam de concorrer á exposição de que se trata, se ella for de alguma importancia, salvo se ella for tão insignificante que se torne ridicula. Alem d'isto parece-me que a quantia de 73:550$000 réis que se pede para auxiliar os emprezarios é insufficiente (apoiados), e receio que depois nos venham pedir muitos multiplos d'esta quantia para ser levado a effeito o que tão indiscretamente se tentou (apoiados), isto é, que o estado venha a fazer as despezas avultadas de uma empreza que não nos acredite.

Parece-me que mesmo quando fosse approvado na sua generalidade o projecto de lei que se discute, não deve ser approvado como esta redigido o § unico do artigo 2.°, em que se determina que o palacio de crystal da cidade do Porto será considerado como armazem de deposito da alfandega da mesma cidade, e creio que esta disposição deve ser restricta aos productos que se expozerem n'elle durante o tempo da exposição. O thesouro publico tem despendido avultadas sommas com a construcção de uma alfandega na cidade do Porto, que contenha armazens apropriados não só para fiscalisação dos direitos das mercadorias, mas tambem para o deposito dellas. Se for permittido que o palacio de crystal seja considerado permanentemente como deposito de generos, receio que possa haver extravio de direitos, e assim compromettida uma parte importante da receita publica. Por todas estas rasões, voto contra o projecto e contra o parecer que o approva.

O sr. Presidente: — Se me permittem rectificarei a inscripção.

Pediram unicamente a palavra quatro dignos pares, que estão inscriptos por esta ordem (leu).

Devo tambem ler á camara o seguinte artigo, que é regimental:

«Art. 46.° Nenhum par usará da palavra sem a pedir e lhe ser concedida pelo presidente. Os pares no acto de pedir a palavra deverão declarar se é pró ou contra o assumpto que se discute.»

Os dignos pares não têem declarado o seu voto, se é a favor ou contra, e n'este caso...

O sr. Osorio: — Eu fallo contra.

O sr. Rebello da Silva: — Eu a favor.

O sr. S. J. de Carvalho: — Eu a favor.

O sr. Presidente: — Bem, agora fallou um dos dignos pares contra a materia do projecto, segue-se um a favor, que é o sr. conde d'A vila, que pediu a palavra por parte da commissão. Tem s. ex.ª a palavra.

O sr. Conde d'Avila: — Eu desejava ouvir fallar o sr. Joaquim Filippe de Soure, mas como outros dignos pares pediram a palavra, eu submetterei á consideração da camara algumas breves reflexões a favor do projecto.

Se se tratasse absolutamente d'esta questão, sem attenção ás circumstancias actuaes, o meu voto seria pelo adiamento da exposição. Mas a commissão achou-se collocada n'uma tal situação que entendeu não poder rejeitar a proposta do governo, e entende que a camara não póde tambem deixar de a approvar.

Vozes: — Ouçam.

O Orador: — Esta exposição é filha do pensamento de um grupo de homens respeitaveis, pensamento que foi submettido á approvação do governo...

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O sr. Vaz Preto: — Peço a palavra.

O Orador: — E foi approvado por elle. Aquelles cavalheiros mandaram uma deputação a Lisboa para solicitar de El-Rei o Senhor D. Luiz I, que lhe fizesse a honra de se declarar protector da exposição, e Sua Magestade annuiu benignamente a este pedido. Essa deputação pediu tambem a El-Rei o Senhor D. Fernando, que se dignasse aceitar a presidencia da exposição, e El-Rei aceitou tambem esta nomeação. Depois solicitou-se e obteve-se do governo, que pelos representantes de Sua Magestade nas diversas côrtes fizesse constar aos governos, junto a que estavam acreditados, que havia esta exposição, a fim de que podessem concorrer a ella, com o seu auxilio, productos dos seus diversos paizes. Tudo isto esta feito (apoiados). Não é portanto já possivel recuar. Que nos cumpre pois fazer? Cumpre-nos empregar, cada um pela sua parte, todos os meios de que podermos dispor para que esta exposição se faça o melhor possivel (apoiados).

Repito, que se antes de terem chegado as cousas a este ponto me viessem consultar sobre a conveniencia de uma exposição internacional no Porto, eu por muitas rasões, que é inutil expor agora, e tendo em vista que d'aqui a dois annos ha de ter logar em París uma exposição internacional, e persistindo na mesma opinião que tive quando fiz o relatorio que o meu amigo o digno par, o sr. Margiochi, me fez a honra de citar, isto é, que as exposições internacionaes só podem ser feitas de maneira que correspondam a esta denominação em Londres e París, havia aconselhar que adiássemos para mais tarde a realisação daquella idéa, até para examinarmos mais de espaço se ella era realisavel, e quando o fosse, para termos mais tempo para nos prepararmos para ella e podermos ahi apparecer de uma maneira digna de nós; mas as cousas estão em tal estado, como expuz á camara, que nada d'isto é já possivel, e a rejeição do projecto, não evitando a exposição, só concorreria, pelo desfavor a que daria logar, para que esta fosse ainda inferior ao que póde ser. Esta responsabilidade pesará tambem sobre nós se não approvarmos a proposta.

Por outra parte é preciso não perder de vista, que os cavalheiros que promovem a exposição redobram de esforços para se desempenharem da sua ardua tarefa, e são efficazmente coadjuvados pela cidade do Porto, que é uma cidade briosa, e comprehende que é do seu pundonor e do seu interesse que esta tentativa seja coroada com o melhor resultado.

A somma que se pede não é realmente uma somma que nos deva assustar, e ha de ser coberta em grande parte, se o não for no todo, pelos direitos dos artigos que vierem á exposição e ficarem no paiz. Mas, diz o digno par, o sr. Margiochi, é muito provavel que a esta somma se siga o pedido de uma outra muito maior. Respondo que esta na nossa mão o recusa-la. Esta somma foi a que a commissão da exposição declarou ser precisa, e por consequencia o governo e os poderes publicos têem o direito de dizer: «Vós pedistes esta quantia, que julgastes sufficiente, e não vos damos mais».

Ora, a outra observação do sr. Margiochi foi muito debatida na commissão, o em resposta á qual direi que o governo declarou e auctorisou a commissão a declara-lo á camara que a disposição do § unico do artigo 2.°, que diz (leu) é unicamente em relação aos productos que vierem á exposição e pelo tempo que a mesma durar. O receio dos srs. Soure e Margiochi é que o palacio de crystal fique permanentemente servindo de armazem de deposito; e a este respeito já eu respondi, que é unicamente pelo tempo que durar a exposição, e para os productos que a ella vierem, a fim de poderem ser reexportados. Quem ler com attenção o projecto ha de ver que este é effectivamente o pensamento que se queria exprimir. Eu entendo e a commissão fez-me a honra de concordar comigo n'esta parte, que esta declaração seja inserida no regulamento para evitar que o projecto vá á outra camara, e não se demorar mais tempo; mas se, apesar d'isto, tiver os mesmos receios do sr. Margiochi, então não ha remedio senão inserir esta declaração no projecto. Mas, torno a dizer, que não merece a pena mandar o projecto á outra casa do parlamento sómente para isto.

Parece-me que não tenho mais nada a dizer em resposta ao sr. Margiochi, e acabarei repetindo, e lembrando á camara, que El-Rei o Senhor D. Luiz I se declarou protector da exposição, El-Rei o Senhor D. Fernando seu presidente, e que a exposição foi notificada officialmente a todos os governos, preparando-se já algumas nações para concorrerem a ella. Eu vi algumas correspondencias que o provam, em relação á França, á Inglaterra e a alguns paizes da Allemanha. O nosso dever é pois auxiliar, animar tambem quanto podermos esta tentativa, em que Portugal esta já compromettido, e fariamos precisamente o contrario se rejeitássemos o parecer que se discute.

O sr. Vaz Preto: — Aproveitaria esta occasião se estivesse presente o sr. ministro da fazenda, para fazer algumas considerações sobre as nossas finanças e estado critico em que a fazenda publica se acha, resultado da emissão continuada de papeis de credito; como s. ex.ª não esta presente, notarei quo quando se trata de votar uma verba de despeza, posto que insignificante, como disse o sr. conde d’Avila, mas que no meu entender, não é tão pequena como parece, a presença de s. ex.ª é necessaria, e é mau precedente que s. ex.ª nos auctorise com uma omissão indisculpavel a, votar e a discutir na sua ausencia.

O sr. ministro da fazenda, na outra casa do parlamento, respondendo a differentes preguntas sobre o orçamento, disse e assegurou que havia um deficit, mas que estava resolvido por todos os modos, por todas as formas que a sciencia aconselha a acabar completamente com elle e n'este caso, já sei vê que s. ex.ª tem medidas e projectos que ha de apresentar à camara, e que nós havemos de discutir profunda e seriamente, projectos em que s. ex.ª tem toda a confiança e que hão de ser a traducção fiel das suas concessões, e talvez uma innovação brilhante no systema tributario, e a revolução completa nas finanças d'este paiz, victima continuada ou dos rotinados ministros, ou dos arrufos de pretendidos e ousados politicos, sem previdencia nos seus actos, projectos de grande alcance, que segundo s. ex.ª diz, melhorarão e aperfeiçoarão o nosso systema financeiro, e virão acabar assim com o deficit. Eu declaro que não tenho confiança alguma nessas medidas, nem esperança nesses projectos, attendendo ás explicações do sr. ministro dadas na outra casa do parlamento, que revelam a duvida, a perplexidade, a irresolução e a ausencia de principios fixos e idéas assentadas; comtudo é preciso que s. ex.ª esteja presente a este debate, porque desde o momento em que se fez similhante declaração nós não devemos votar mais verba alguma de despeza, sem que s. ex.ª nos diga o modo como ha de crear-lhe receita correspondente, pois a emissão de inscripções, como o projecto indica, não é systema, e se o é, é um systema erradíssimo, de que sómente se deveriam servir nas grandes difficuldades, pois a emissão continuada de papeis de credito, traz o desprecio d'elles, a falta de confiança no governo e por fim a bancarrota.

Firme n'estas idéas, sem fazer mais considerações, mando para a mesa uma moção, para que se adie esta discussão até estar presente o sr. ministro da fazenda. Seria muito bom que o sr. ministro das obras publicas estivesse tambem presente, porque o projecto em discussão diz principalmente respeito á pasta que s. ex.ª gere.

Com estas observações não quero dizer que me opponho á idéa da exposição, que julgo ser conveniente, mas o que eu careço é de ouvir as explicações do sr. ministro da fazenda.

Por consequencia, sr. presidente, eu mando para a mesa a minha moção.

Leu-se na mesa, e foi admittida á discussão. E do teor seguinte:

«Proponho que se adie a discussão d'este projecto até que estejam presentes os srs. ministros da fazenda e das obras publicas. = Vaz Preto.»

O sr. S. J. de Carvalho: — Não preciso para votar este projecto da presença do sr. ministro da fazenda, porque esta certo que s. ex.ª nada dirá sobre os seus planos economicos. Portanto vota contra o adiamento.

O sr. Vaz Preto: — Sr. presidente, eu apresentei a proposta de adiamento do projecto que estava em discussão, e agora confirmo-me mais na necessidade do adiamento, depois do que ouvi ao digno par que me precedeu.

O adiamento, sr. presidente, são os corolarios tirados logica e impreterivelmente dos discursos do sr. conde d’Avila e sr. Sebastião José de Carvalho, que em diversas considerações que fizeram, mostraram a necessidade de se fazer passar este projecto; pois sendo um projecto de tanta urgencia, estando compromettido o governo, tendo a exposição por protector Sua Magestade El-Rei o Sr. D. Luiz, e por presidente o Sr. D. Fernando, como se explica a ausencia dos ministros? Ninguem (a meu ver) deve ter mais necessidade de o fazer approvar quanto antes, do que o proprio governo; é exactamente o governo que aqui não esta, e é exactamente a presença d'elle que eu reclamo para se discutir o projecto; de mais, sr. presidente, eu não desejo que se estabeleça um precedente que, me não parece dos mais acertados, qual é o votar verbas de despezas sem estar presente o competente ministro, para nos dar os esclarecimentos que lhe forem pedidos, e assim podermos votar com conhecimento de causa; como devemos votar, principalmente no estado melindroso em que se acham hoje as nossas finanças. Portanto continuo a insistir pela minha proposta de adiamento, porém a camara a considerará como bem entender, e de qualquer modo que o faça, eu aceitarei sempre com respeito e acatamento todas as suas resoluções.

O sr. Visconde de Gouveia: — Sr. presidente, se este projecto não fosse da iniciativa do governo, se elle se apresentasse n'esta camara sem ter ido á outra casa do parlamento, eu então votaria pelo adiamento, especialmente não estando presente o sr. ministro da fazenda; mas este projecto vem directamente do governo, já passou na outra camara, o sr. ministro da fazenda foi presente e havia de dar as explicações que lhe pedissem. E foi discutido e approvado pela commissão de fazenda d'esta camara. Ha portanto a base necessaria para a discussão, e ali esta o digno relator da commissão, que já expoz o que era mister, e que sem duvida não se negará a dar todas as explicações, que os dignos pares lhe pedirem. Não vejo portanto motivo para se esperar pelo sr. ministro da fazenda, e para se adiar a discussão com esse fundamento.

Alem d'isso os dignos pares que fallaram não apresentaram duvidas ou objecções, a que seja mister responder o sr. ministro, quando as apresentassem, e lhes não podesse satisfazer, o digno relator, só então se poderá justificar a proposta de adiamento; devo ponderar que não se trata de discutir a exposição. Essa esta decretada. Vae annunciada officialmente ás nações. Já não se póde retrogradar. Já não póde mesmo adiar-se sem graves prejuizos, e sem um certo desar, de que se trata é do subsidio. E este não se póde negar. E não vejo que se addusam rasões para alterar a cifra apresentada.

O adiamento poderia trazer grandes inconvenientes para a empreza, por tanto o tempo é diminuto. E a demora de dias é sensivel quando o praso é tão curto. Entendo portanto que não devemos pôr embaraços á realisação de tão nobre sentimento. E voto contra a proposta de adiamento.

O sr. Marquez de Vallada: - Principia declarando que não tendo confiança no ministerio, comtudo reconhece que os actuaes srs. ministros, exercem seus cargos em virtude da regia prerogativa. Concordando com o digno par Sebastião de (Carvalho, que as explicações do sr. ministre da fazenda não hão de satisfazer a camara, principalmente a sua maioria, presume comtudo necessario que a camara tambem concorde em que o sr. Mathias de Carvalho é considerado por algumas pessoas como o regenerador das nossas finanças. Assim, elle orador, tem de fazer algumas observações a s. ex.ª em relação ao ministerio da fazenda. É necessario, pois que o sr. ministro da fazenda, por isso mesmo que não é muito conhecido pelas suas opiniões e pelos seus actos como homem publico e como homem politico, seja chamado a dizer como se desempenhará, da responsabilidade que tomou sobre os seus hombros. E necessario que de uma vez para sempre se entenda que os srs. ministros devem estar presentes n'esta camara, porque o paiz não esta regido pelo governo absoluto, e nos governos constitucionaes são os cargos do gabinete conquistados pelos homens que, pelo seu merito, serviços, e com a palavra, têem direito á consideração do paiz.

Os pares do reino não podem ficar calados e extasiados diante de um governo que se cala, que precisa absolutamente de todos os seus amigos para usar de um estratagema funesto, que denuncia certa tendencia para um governo que elle, orador, ha de constantemente combater, que é o governo absoluto, que é o absolutismo illustrado, como alguns lhe chamam, e a que chamará absolutismo disfarçado. É necessario combater com todas as forças estas tendencias, e o orador esta resolvido a pedir a todos os ministros a responsabilidade dos seus actos, e ha de continuar a mostrar as contradições em que se acham envolvidos, suppondo que são homens d'estado, e que têem por si a opinião do paiz. Se acaso ss. ex.ªs vem apenas á camara dizer que se espere pelos seus estudos, triste do paiz! que se vê forçado a esperar sempre pelos estudos dos ministros novos, desconhecidos do mundo politico, onde se ignoram os seus serviços.

O orador estava resolvido hoje a chamar a attenção do sr. ministro do reino para certas questões, que ha necessidade venham á téla da discussão, e s. ex.ª se pronuncie sobre ellas. Não estava presente porém senão um dos srs. ministros, por quem elle, orador, tem mui devida consideração, sentindo ao mesmo tempo muito que s. ex.ª faça parte da actual administração. Isto dizia sinceramente, porque se honra com a sua amisade. Reportava-se ao sr. marquez de Sá.

Comtudo, apesar da amisade que lhe tributa, se alguma vez, o orador, se vir forçado a censurar alguns dos seus actos, não deixará de o fazer, ainda que contra sua vontade, e apesar de respeitar muito s. ex.ª, não só pelos seus serviços passados, como tambem por ser um cavalheiro muito conhecido dentro e fóra do seu paiz.

O sr. José Estevão disse, não ha muitos annos, que havia historicos de tres especies: historicos que têem boa historia; historicos que têem má historia; e historicos que não têem nenhuma historia! Deus livre o paiz d'estes ultimos. Dos historicos que têem historia, applaude, o orador, os serviços, e curva-se diante d'elles. Emquanto aos historicos que têem má historia, já por esse facto o paiz os conhece, e póde portanto acautelar-se d'elles; mas os que não têem historia nenhuma, esses pertencem a uma especie de companhia que se chama mocidade esperançosa, de quem, o orador, nada espera.

Portanto, perdoe-lhe o sr. Sebastião José de Carvalho, se não se conforma n'esta occasião com o que disse s. ex.ª No fundo ambos estão de accordo, mas na fórma é que dissentem; porque se bem se não confia nos actuaes srs. ministros, é comtudo necessario não descançar um instante, e chamar constantemente a attenção de ss. ex.ªs sobre os estudos que dizem respeito ás repartições de que estão encarregados, para que se devem achar sufficientemente habilitados e com as forças necessarias.

Concorda com o digno par, o sr. Vaz Preto, em que se não deve discutir este projecto sem estar presente o sr. ministro da fazenda. Via-se que o digno par apresentou duvidas em discutir o projecto na ausencia do ministro competente, e elle, orador, lembraria que n'esta mesma camara o sr. conde de Lavradio se levantou em uma occasião para contrariar outro digno par, por isso que se levantavam duvidas sobre discutir-se um assumpto na ausencia do ministro.

Desde o momento, disse aquelle illustrado cavalheiro, que qualquer digno par tem duvidas em discutir um assumpto na ausencia do ministro competente, devemos decidir com liberdade, e para decidir com liberdade e conscienciosamente, não podemos deixar de nos unir ao pedido do digno par, e esperar pela presença do ministro competente para que dê as explicações precisas.

Vozes: — Votos, votos.

O sr. Marquez de Niza: — Fez algumas observações sobre o assumpto em discussão, lembrando se addicionasse tambem á proposta a necessidade da presença do sr. ministro das obras, publicas, e se mandasse saber se estavam na outra camara, e podiam comparecer n'esta.

O sr. Presidente: — Manda-se saber se os srs. ministros estão na outra camara. Tem a palavra o sr. ministro da guerra.

O sr. Ministro da, Guerra (Marquez de Sá da Bandeira): — Sr. presidente,. Em primeiro logar agradeço ao digno, par o sr. marquez de Vallada as palavras que se dignou dirigir-me.

Emquanto ao projecto em questão, devo dizer que eu não tive hoje occasião de ver o sr..ministro das obras publicas; portanto não sei as rasões de serviço que teve para não, estar presente n'esta, camara, seguramente não foi por faltar, á attenção para com a camara, mas sim por algum motivo de serviço.

Agora, emquanto á urgencia de que passe este projecto,

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não posso acrescentar cousa alguma ao que expoz o sr. conde d'Avila, que esta mais ao corrente d'este negocio do que eu, porque foi na commissão de fazenda que o ministro respectivo deu as explicações e esclarecimentos necessarios ácerca da conveniencia d'essa concessão e da necessidade de fazer quanto antes essa mesma concessão, porque a cidade do Porto tem a fazer trabalhos importantes, e vinte e quatro ou quarenta e oito horas são alguma cousa, quando se trata de ter a certeza de póder contar com um fundo necessario para concorrer para taes disposições (apoiados); parece-me pois que não havia inconveniente para a camara que se votasse o projecto. E emquanto ás questões que a este respeito se pretendem tratar com os srs. ministros da fazenda e das obras publicas, se isso se julga indispensavel, acho que se poderia adiar para ámanhã ou depois de ámanhã, sem maior inconveniente.

(Entrou o sr. ministro da justiça.)

O sr. Vaz Preto: — Sr. presidente, eu peço a palavra para uma explicação quando V. ex.ª entender que m'a deve dar.

Vozes: — Votos, votos.

O Orador: — A explicação não é a respeito da proposta em discussão, mas da votação que teve logar na ultima sessão.

O sr. Presidente: - Vae ler-se a proposta de adiamento. (Leu-se.)

Posto á votação o adiamento, foi rejeitado.

(Entrou o sr. ministro das obras publicas.)

O sr. Soure: — Sr. presidente, direi poucas palavras para dar as rasões porque assignei vencido, e o motivo que me obrigou tambem a não votar pelo adiamento, foi porque desejo que este projecto seja rejeitado.

São breves as rasões que eu tenho a apresentar á camara para fundamentar o meu voto: é a primeira porque entendo que Portugal não esta em circumstancias de fazer uma exposição internacional. Basta ver como estas exposições tem sido feitas n'outros paizes; quaes são os que se tem atrevido a faze-las, e quaes os que se tem abstido, receiando expor-se a não representar um papel decoroso; a segunda é que quando Portugal estivesse nas circumstancias de o fazer, não se deveria verificar senão em Lisboa, porque entre nós, nenhuma outra cidade tem condições adequadas para este fim. Mas as circumstancias em que se esta hoje? Os annuncios que se tem feito? As providencias que já se tem tomado? Para tudo isso não tenho eu, nem esta camara concorrido, e portanto estou nas circumstancias de poder votar contra o projecto, I

A iniciativa d'esta exposição d'onde nasceu? Nasceu de uma empreza meramente particular, e assim, quando ella não fosse feita de uma maneira digna, uma vez que o governo não interviesse, nenhum desar vinha ao paiz; deixassem portanto á empreza do palacio de crystal no Porto fazer essa exposição como ella entendesse e quizesse, não fizesse o governo mais do que consentir; mas intervir o corpo legislativo, dando-lhe um subsidio, intrometter-se o governo dando-lhe um caracter official, não me parece que seja prudente de fórma alguma.

Diz-se: «que são 73:000$000 réis?» Todos sabemos que não é uma somma avultada. Se a empreza estava sufficientemente habilitada, e tinha ponderado quaes eram os encargos que pesavam sobre si, essa empreza devia ser de tal importancia que 73:000$000 réis para ella seria uma somma insignificantíssima; mas se ella precisa realmente d'esses 73:000$000 réis, é porque não esta sufficientemente habilitada, é porque calculou mal as despezas, é n'este caso estou convencido que ha de vir em pouco tempo pedir mais ao governo, para elle fazer nova proposta ao corpo legislativo.

As outras difficuldades do projecto diz-se que estão removidas: parece-me todavia que a redacção d'esta ultima parte é clara; aqui não se põem restricções algumas. E assim não sei até que' ponto o governo, por um regulamento, possa contrariar esta disposição legal. É verdade que o sr. ministro no seio da commissão, disse que a intelligencia fôra essa, e absurdo é que o não seja; mas nós temos visto commetter tantos absurdos que não é de admirar que se commettesse mais este, principalmente podendo cohonestar-se com a letra expressa da lei.

O digno par tambem fallou na receita. As receitas todos sabemos como ellas se fazem entre nós.

Sr. presidente, nós estamos n'um caminho erradíssimo (muitos apoiados). Mas eu estou ha muito tempo a clamar por esta fórma, e tenho sido pouco apoiado! Continuarei com esta impertinência. As despezas entre nós votam-se sem nos importar d'onde ha de vir a receita! Porque não é crear receita emittir titulos de obrigação, e offerece-los no mercado para obter por elles algum preço. Este uso de credito, ou antes abuso, não póde durar. Não por certo.

O sr. Vaz Preto: — É pessimo systema.

O Orador: — Nem é systema, desenganemo-nos, não é nem póde ser (muitos apoiados). A par da despeza cá vem já immediatamente creada a receita. Mas como? Emittem-se as inscripções necessarias para esse fim! Este meio só póde servir para um caso extraordinario, mas nunca como meio permanente e systema de administração.

O illustre presidente da commissão de fazenda declarou e fez ver as circumstancias apuradas em que estamos. Pois talvez isso mesmo fosse um meio de nós para o futuro nos podermos apresentar mais airosamente, fazendo uma exposição internacional, que fosse digna de nós, rejeitando agora este projecto, para se adiar para mais tarde a realisação d'este pensamento, e poderem tomar-se providencias para receber convenientemente o grande numero de estrangeiros que provavelmente hão de concorrer. A idéa é nobre, mas parece-me demasiado. arrojada. No Porto apenas poderia fazer-se com vantagem e dignidade uma exposição regional ou nacional, quando muito. São tão obvios os inconvenientes d'este projecto que prescindo de fazer mais considerações á camara para fundamentar o meu voto.

O sr. Visconde de Gouveia: — Não posso prescindir de dizer á camara algumas breves palavras a favor da proposta de lei que se apresentou á discussão, parava concessão de um subsidio á sociedade do palacio de crystal da cidade de Porto, para as despezas da sua exposição internacional, que ali vae effectuar-se.

A cidade do Porto merece a consideração dos poderes publicos pela sua vigorosa iniciativa, e esforçado arrojo no desenvolvimento das grandes idéas politicas, economicas e sociaes, e na realisação dos mais importantes melhoramentos. Foi lá que soou o primeiro grito da liberdade em 1820. E eu sinto que por poucos dias de differença senão inaugure a exposição n'esse memoravel anniversario.

As instituições e a dynastia que nos regem devem-se principalmente ao esforço e aos sacrificios de seus valorosos habitantes. E depois d'essa epocha, trocadas as lidas da guerra, pelos trabalhos do commercio e da industria, não ha idéa grandiosa que ali não tenha fructificado. Emquanto na capital os estabelecimentos de credito, e muitas emprezas industriaes abraçadas ao nefasto systema da protecção, do privilegio e da tutela official, vivem no marasmo e na obscuridade; ali aonde tudo é liberdade, onde os bancos, as associações, as emprezas, a propria benificencia, vivem dos seus recursos e da sua acção livre e intelligente; ali tudo prospera, tudo fructifica, tudo se engrandece.

A empreza do palacio de crystal é mais generosa que utilitaria. Bem sabe a associação que a gloria do commettimento, o enobrecimento da cidade, e as vantagens do commercio e das industrias portuguezas, são o verdadeiro, talvez o unico lucro a auferir de tão magnânimos esforços. Obra tão arrojada concluiu-se em poucos mezes. E apenas concluida, projecta-se e consegue-se uma exposição internacional, que não é só uma festa para a cidade, mas um grande serviço a todas as industrias do paiz, uma grande gloria para a nação. Esta festa é de todos e esta n'ella compromettido o nosso brio nacional. E mister portanto coadjuva-la. E não é por certo excessiva a cifra que o governo propoz, para quem conhecer as necessidades de uma exposição de tal ordem. Convenho em que o tempo urge; em que mais brilhante seria a festa, dando-se mais espaço para todos, e tudo se preparar. Mas hoje é impossivel o adiamento. Ajudemos portanto os poderes publicos, para que se realise com o maior explendor possivel.

Faço justiça ás boas intenções dos dignos pares que combatem a proposta, mas não posso concordar em que se negue um subsidio a um acto, em que o governo e o paiz estão compromettidos.

O governo tem mostrado que toma a peito aquelle commettimento, porque õ seu intelligente e competentissimo delegado de confiança n'aquelle districto, não tem poupado esforços para auxiliar a empreza.

E por esta occasião não posso deixar de apresentar o meu voto de louvor, e mesmo de admiração a um cidadão prestante d'aquella cidade, membro da direcção, e competentissimo pelas suas luzes theoricas e praticas naquellas materias, a cujos esforços, dedicação, perseverança e civismo se devem em grande parte a realisação d'aquella notavel empreza. Refiro-me ao sr. Alfredo Allen, cujo nome pronuncio com orgulho, e recommendo aos poderes publicos.

Não me demorarei mais em considerações porque me parece que a camara abunda n'estas ideias, e quererá sem duvida dar uma nova prova de consideração pela cidade do Porto, approvando esta proposta.

O sr. Osorio de Castro: — Eu não vinha preparado para entrar n'esta discussão, apenas esperava, obtendo a palavra para uma explicação, dar os meus agradecimentos ao sr. Sebastião José de Carvalho, pelas expressões que elle na ultima sessão benevolamente me dirigiu, quando disse e acrescentou que os seus cumprimentos eram sinceros, mais sinceros do que aquelles que eu já estava acostumado a receber dos meus amigos. Ora, era justamente n'este ponto que eu queria fazer sentir a necessidade da minha explicação, para pedir ao digno par que não fosse menos benevolo para com os meus amigos, pois que eu não os posso considerar menos sinceros, mas do mesmo modo possuidos de grande benevolencia, demasiado indulgentes mesmo; mas tudo isto por motivo d'essa sua amisade.

Agora, fallando da questão que nos occupa, começo por dizer, que eu lamento, e lamento muito, que ao passo que estamos sempre fallando da necessidade de fazer economias nas despezas publicas, quando chegam as occasiões em que se póde ir dando algum passo n'esse caminho, falta-nos a coragem, e nada fazemos! Pois, sr. presidente, é este justamente um daquelles casos em que esta camara sem inconveniente algum, antes muito a proposito, e muito louvavelmente, se podia desprender de todas as considerações, muito melhor do que o governo e do que a outra camara, para dizer n'este momento: «é necessario parar, não se gasta assim, essa despeza não é rasoavelmente justificada, em vez de" ser productiva póde ser, prejudicial, dando logar a que figuremos mal, e que tenhamos de nos arrepender de annuir a um tal commettimento, quando faltam tantas condições, tantas circumstancias para emprehender aquillo que só as principaes cidades da Europa podem levar a effeito de um modo digno e com as commodidades precisas» (apoiados).

E depois, sr. presidente, é necessario que se repare e attenda bem a que os dignos pares que sustentam o projecto quasi concordam com nós outros que o combatemos, pois effectivamente a unica cousa em que fazem consistir a sua argumentação é na difficuldade e impossibilidade, que me parece que se quer suppor de voltar a traz, dizendo-se que na altura em que o negocio esta não póde deixar de caminhar-se d'esta fórma; isto não me convence, não prova de

certo que estejamos privados da nossa liberdade de discussão e voto (apoiados), póde-se rejeitar do mesmo modo que se rejeita qualquer outro projecto que vem aqui (apoiados). Mas não é só, sr. presidente, a questão da despeza, se bem que ella ha de ser muito maior do que aquillo que se pede agora, é porém a questão de considerar que o palacio de crystal no Porto poderia servir para uma exposição de productos da peninsula e das nossas possessões, mas não para uma exposição internacional, dando-se-lhe toda esta solemnidade, fazendo-se todos esses convites a todos os paizes estrangeiros, sem ali termos capacidade para tanto, nem os alojamentos necessarios para hospedar tanta gente (apoiados). De maneira que isto se se levar a effeito nunca na de ser uma verdadeira exposição internacional, não o póde ser, será quando muito um vinte avos, que é o que lá póde caber de uma exposição.

Ora, sr. presidente, quando ha uma exposição universal, nós temos sempre que deplorar, porque vemos que os governos nomeiam individuos para exporem productos que o governo compra, e ainda não vi algum resultado feliz destes sacrificios. O nosso paiz esta ainda muito atrazado, e virá um dia em que o não esteja, mas hoje elle, n'esta materia, ainda não tem idéas claras, ainda não conhece a vantagem immediata que d'ahi lhe resulta, e por isso apenas se promptifica a dar os seus productos mal arranjados, tendo é governo a necessidade de ser o unico expositor; quem não conhecer isto é porque não tem trabalhado nas exposições. Ha excepções honradissimas, mas uma grande parte dos nossos productos têem sido mandados para os paizes estrangeiros muito mal arranjados, e portanto eu entendo que, quando se quizesse fazer uma exposição internacional no nosso paiz, devia ser de modo que nos não causasse vergonha, porque n'uma exposição onde se reunem os productos de todas as nações deviamos apresentar-nos com dignidade, e para isso parece-me que era necessario deixar passar mais algum tempo. Alguns economistas já deploram a continuação das exposições com prasos tão curtos, porque muitos paizes se não podem aproveitar das vantagens que podiam tirar, e nós, n'um cantinho da Europa, queremos fazer uma exposição em tão pouco tempo, quando as nossas industrias ainda se não podem comparar com as de outras nações; porque, a respeito da agricultura, que é a nossa industria primaria, essa mesma esta tão desprezada, que os estrangeiros chegam a dizer — que nós temos materias primas magnificas, mas que as não sabemos aproveitar; e quando elles dizem isto, grita-se n'esta camara que já não é tempo para recuar.

Eu deploro muito que os srs. ministros não tivessem a coragem de dizer que o governo não só não admittia a exposição, mas tambem não admittia a concorrencia, se isto fosse possivel.

Agora, sr. presidente, todos nós conhecemos o Porto e os milhares de virtudes que têem os seus habitantes. Tomáramos nós que todas as cidades do reino fossem como a do Porto, não só pela sua industria mas pelos seus sentimentos liberaes (apoiados). Do Porto e das provincias do norte é que depende a vida do nosso paiz,. se tem de viver um dia; mas aqui não se trata do Porto, e portanto não devemos concorrer para a fraqueza do governo. Hontem dizia-se que o governo era fraco, e hoje, que conhecemos um acto de fraqueza, é que queremos votar para que elle dê esse passo. Alguns homens, demovidos do maior desejo de promover o desenvolvimento da nossa industria, reuniram-se no Porto e disseram — vamos aqui fazer uma exposição para aquelle fim, reuniram-se capitaes.

Esta idéa agradou naquella cidade, por isso que a idéa tem uma certa popularidade, e baixinho diziam alguns homens de bom senso — para que havemos combater uma cousa que não tem senso commum —? A execução d'este projecto deve-se a um homem de muita energia, a quem o sr. visconde de Gouveia se referiu, o sr. Allen, que não tenho a honra de conhecer; mas que sendo dominado por uma idéa grandiosa fez impossiveis, porque impossiveis se têem feito, porque o palacio de crystal, como esta feito, é um impossivel (apoiados); e n'esta cidade dizia-se, advogando a idéa — para que havemos levantar a voz contra uma cousa que depende de uma sociedade particular, para que se diga depois que não quizemos concorrer para o desenvolvimento da industria do paiz; eu é que sempre esperei que se havia depois recorrer ao governo para poder realisar esta grande empreza. Nestas circumstancias o governo foi fraquíssimo, no meu entender, por se não oppor á falsa popularidade d'esta idéa, e, sobretudo, receiar os excessos dos individuos que entravam n'aquella empreza, que eram incapazes de os commetter; e talvez que o governo accedesse á pretensão daquelles individuos pela popularidade que tinham, e não querer que apparecessem movimentos que desagradassem.

Eu não sei se foi esta a causa, porque não respondo pelo governo, respondo pelo que a mim se me representa. Havia uma cousa que na verdade feria a todos; quando se fallava em particular a respeito d'esta exposição dizia-se que esta idéa era uma asneira; quando se reuniam mais quatro pessoas dizia-se então, isto é que é progresso. As cousas chegaram a este ponto; veiu á camara dos senhores deputados, que approvou a idéa, e eu não a censuro por isso, antes a desculpo, porque aquella camara tem obrigação de respeitar a popularidade, porque ella é filha da popularidade, nem devemos exigir dos homens maiores esforços do que aquelles que elles podem fazer; mas a camara dos dignos pares não esta no mesmo caso, porque ella deve moderar todos os excessos, e entendo na minha consciencia que o contrario seria um acto de fraqueza.

É por esta rasão, sr. presidente, que eu voto contra este projecto, porque não quero dar o meu voto para concorrer para uma vergonha do nosso paiz, e para uma despeza que

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não ha de ser só «Testa quantia que se pede agora, mas de muitos centenares de contos de réis. Se o governo se encher do mesmo fogo sagrado para fazer depois uma cousa que seja propria da nossa dignidade, como deve ser, e então vier aqui pedir 200:000$000 ou 300:000$000 réis para cobrir as despezas que fez com a exposição internacional, como convem ao nosso decóro, tem já o meu voto para tudo quanto for preciso para nos apresentarmos de uma maneira digna e que nos não envergonhe diante das outras nações civilisadas. Agora não tem o meu voto, porque não estamos ainda em circumstancias de fazer uma exposição universal, e porque podemos obstar-lhe, mas dada a auctorisação havemos de correr as consequencias; não estamos em circumstancias de competir com a industria dos paizes mais adiantados; e quanto á gloria para o paiz, qual gloria nem meia gloria, não póde haver gloria nenhuma em querer apresentar uma cousa que é vergonha; e pergunto, que industria se ha de lá apresentar?

Quanto á exposição ser no Porto ou em Lisboa, parece-me que as associações as podiam fazer onde quizessem, e isso para mim não me importa para nada, comtanto que a exposição fosse feita de maneira que não compromettesse o decoro do paiz.

Quanto ás explicações que se pediram ao governo, eu não fallei no adiamento, mas parece-me que a censura feita ao governo, por não estar presente, era mal cabida, porque elle esta no mesmo caso de muitos dignos pares, que faltam ás sessões d'esta camara, porque não sabia que este projecto se discutia hoje, e por isso parece-me mal cabida esta censura que se fez aos srs. ministros, porque elles têem estado ha muitos dias no parlamento, e não têem comparecido tambem nas suas repartições por serviço do estado.

O sr. Ministro das Obras Publicas (João Chrysostomo): — Deu explicações sobre este projecto de lei, concluindo por não ver motivo para contestar a utilidade da exposição industrial de que se trata.

O sr. S. J. de Carvalho: — Pediu se prorogasse a sessão até se votar o projecto em discussão.

O sr. Presidente: — Antes de pôr á votação este requerimento, devo ler o § 2.° do artigo 46.° do regimento, que foi approvado em 22 de abril de 1864, que diz o seguinte:

«Quando pedirem a palavra em nome do governo, os ministros terão o direito de fallar immediatamente, mas em nenhum caso poderá dar-se por finda a discussão sobre o seu discurso, e sem que primeiro seja ouvido o orador inscripto contra, que se lhe seguir na ordem do debate.»

O sr. S. J. de Carvalho: — O orador que segue na inscripção esta inscripto a favor, e ha de insistir nas rasões que apresentou o sr. ministro das obras publicas; e então peço a V. ex.ª que consulte a camara se quer dispensar essa disposição regimental.

O sr. Presidente: — Era o que ía fazer.

Consultada a camara sobre se dispensava a disposição do regimento, resolveu affirmativamente.

Consultada a camara sobre se julgava a materia discutida, tambem resolveu n'essa conformidade.

Posto á votação o projecto na sua generalidade, foi approvado.

Passou-se á especialidade.

Leu-se na mesa o artigo 1.º

O sr. Vellez Caldeira: — Sr. presidente, como vejo que a camara quer votar o projecto, não lhe tomarei tempo; mas como tenho obrigação de explicar o meu voto, declaro que votei contra por diversos motivos que agora não exporei, visto o desejo manifestado pela camara de concluir já.

O sr. Rebello da Silva: — Sr. presidente, não quero tomar tempo á camara fallando sobre esta questão, mas parece-me que tendo eu ainda ha pouco cedido da palavra para facilidade do debate, tinha o direito de dar a explicação do meu voto; e creio que não ha ninguem que não saiba, que eu não costumo interromper a camara com questões pequenas, e que não levanto difficuldades, e portanto tinha o direito de ser ouvido sobre a questão. Não tenho mais nada a dizer.

Foi approvado o artigo 1.º

Passou se ao artigo 2.º

O sr. Conde de Thomar: — Se a camara se contenta com a declaração que fez o sr. ministro das obras publicas, ácerca d'este projecto, peço que essa declaração seja lançada na acta, a fim de que para o futuro possa haver um documento pelo qual se peça ao governo a responsabilidade dos seus actos.

O sr. Conde d'Avila: — Estou certo que os srs. ministros não poderão recusar-se a fazer a declaração que já fizeram no seio da commissão; e eu pediria ao sr. ministro das obras publicas, que declarasse á camara, qual é a interpretação que dá ao artigo 2.°, a fim de que ella lhe dê o seu voto sem hesitação.

O nobre ministro declarou no seio da commissão, que o palacio de crystal era convertido em armazem de deposito, unicamente para os productos mandados á exposição, emquanto esta durasse; foi n'este sentido que a commissão approvou o artigo 2.° d'este projecto, e é d'esse modo que elle deve ser interpretado.

O sr. Ministro das Obras Publicas: — Declarou annuir á declaração que se exigia.

O sr. Conde de Thomar: — Em tal caso, devo declarar, que estou satisfeito com as declarações expendidas; não tenho duvida alguma em votar o artigo 2.°

Artigo 2.° — approvado.

Artigo 3.° — approvado.

Artigo 4.° — approvado.

O sr. Presidente: — Os dignos pares que hão de compor a deputação que ha de apresentar a Sua Magestade os authographos das leis que têem passado n'esta camara serão antecipadamente avisados.

A primeira sessão terá logar na proxima sexta feira, e a ordem do dia será a mesma que vinha para hoje. Esta fechada a sessão. Eram cinco horas da tarde.

Relação dos dignos pares que estiveram presentes na sessão de 20 de março de 1865

Ex.mos. srs. Silva Sanches, vice-presidente.

Marquez de Ficalho.

Marquez de Fronteira.

Marquez de Niza.

Marquez de Vallada.

Conde d’Avila.

Conde de Mello.

Conde de Peniche.

Conde de Santa Maria.

Conde de Thomar.

Conde de Torres Novas.

Visconde de Benagazil.

Visconde de Gouveia.

Visconde de Monforte.

Visconde de Soares Franco.

Barão de Villa Nova de Foscôa.

Macedo Pereira Coutinho.

Teixeira de Queiroz.

Rebello de Carvalho.

Francisco Simões Margiochi.

Moraes Pessanha.

Osorio e Sousa.

Joaquim Antonio de Aguiar.

Joaquim Filippe de Soure.

Pinto Basto. Reis e Vasconcellos.

José Maria Baldy. Baião Matoso.

Rebello da Silva.

Castro Guimarães.

Vellez Caldeira.

Cabral e Castro.

Menezes Pita.

Sebastião José de Carvalho Ferrer.

Entraram durante a sessão:

Ex.mos srs. Marquez de Sá da Bandeira.

Conde de Alva.

Conde de Bretiandos.

Conde de Fonte Nova.

Conde de Rio Maior.

Conde de Terena.

Visconde da Borralha.

Visconde de Condeixa.

Visconde de Fornos de Algodres.

Visconde de Ribamar.

D. Antonio José de Mello.

Vaz Preto Geraldes.

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