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N.º 35

SESSÃO DE 18 DE MARÇO DE 1881

Presidencia do exmo. sr. Vicente Ferrer Neto de Paiva (presidente supplementar)

Secretarios — os dignos pares

Eduardo Montufar Barreiros
Francisco Simões Margiochi

SUMMARIO

Leitura e approvação da acta da sessão antecedente. — A correspondencia é enviada ao seu destino. — O sr. visconde de Chancelleiros manda para a mesa uma representação da camara de obidos a favor do caminho de ferro de Torres Vedras. — Conclusão do discurso do digno par o sr. Pereira Dias. — Reflexões do sr. visconde de Chancelleiros, que manda para a mesa uma proposta, para que o governo seja convidado a declarar que projectos de lei tem dependentes da approvação da camara dos dignos pares.

Ás duas horas e meia da tarde, sendo presentes 39 dignos pares, o sr. presidente declarou aberta a sessão.

Lida a acta da sessão precedente, julgou-se approvada na conformidade do regimento, por não haver reclamação em contrario.

Mencionou-se a seguinte:

Correspondencia.

Um officio da camara dos senhores deputados, remettendo a proposição de lei approvando a convenção entre Portugal e a Hespanha para a reciproca protecção da propriedade litteraria, scientifica e artistica.

Outro, remettendo a proposição fixando a receita do estado para o exercicio de 1881-1882.

Outro, remettendo a proposição isentando de direitos os objectos importados para o monumento que se projecta levantar em Coimbra á memoria de Camões.

Estas proposições foram mandadas ás commissões de negocios externos e de fazenda.

(Estavam presentes os srs. presidente do conselho, e ministros da marinha, e entrou durante a sessão o sr. ministro do reino.)

O sr. Presidente: — Cumpre-mo participar á camara que a deputação, encarregada de apresentar á sancção regia alguns authographos de decretos das côrtes geraes, foi recebida por Sua Magestade com a costumada benevolencia.

O sr. Visconde de Borges de Castro: — Mando paro a mesa uma proposta para que sejam agregados á commissão de negocios externos os dignos pares visconde de Valmor, Daun e Lorena, Agostinho Ornellas e Pereira Dias.

Posta á votação da camara, foi approvada.

O sr. Visconde de Chancelleiros: — Mando para a mesa uma representação da camara municipal de Obidos, a favor da construcção do caminho de ferro de Torres Vedras.

Peço a v. exa. que a mande á commissão que tem de dar parecer sobre aquelle projecto.

Leu-se na mesa, e foi enviada d respectiva commissão.

ORDEM DO DIA

O sr. Presidente: — Vamos entrar na ordem do dia. Continua com a palavra o sr. Pereira Dias.

O sr. Pereira Dias: — Continuando o seu discurso, interrompido na ultima sessão, disse que tratará de provar que todos os partidos são culpados das incongruencias da politica portugueza.

Saído dos bancos das aulas, alistou-se no partido historico na epocha em que se tratava das irmãs de caridade, questão que esse partido soube explorar perfeitamente.

Q seu amor á liberdade indicou-lhe o caminho que seguiu. Em nome d’esse amor tomou parte n’uma conspiração. N’essa conspiração, que só verificou na epocha da notavel escada aerea, resolveu-se em casa do saudoso tribuno da palavra, o fallecido José Estevão Coelho de Magalhães, fazer uma reunião da maioria da camara dos deputados, independentemente do consentimento do ministerio.

Houve com effeito essa reunião, e ahi votou-se uma moção, a mais simples na apparencia, talvez como aquella que se discute.

N’essa moção declarava-se que a maioria da camara popular dava apoio franco e decidido ao nobre presidente do conselho, b sr. duque de Loulé. O que succedeu? Succedeu que, passados dias, sob o pretexto da escada aerea, saíram do ministerio os srs. Antonio José d’Avila, Carlos Bento e Moraes Carvalho. E quem entrou em substituição d’aquelles ministros? Entre outros, que não cita agora, entrou o sr. conde de Valbom. Immediatamente se transformaram as maiorias parlamentares, e com grande pasmo o orador viu que muitos individuos, que se diziam filiados convictamente no partido historico, o abandonaram.

Foi esta a primeira decepção, mas tambem foi a primeira lição.

Depois as mudanças nos homens politicos foram continuadas e frequentes, e o orador, que ia entrando assim nos mysterios da politica, já não ficava surprehendido quando via homens de talento, com serviços ao seu paiz, abandonarem rapidamente o seu partido, fundamentando sempre esse abandono rio interesse do paiz.

Os motivos apparentes eram estes; mas quaes eram os verdadeiros? O mallogro de uma ambição era a causa da mudança. Estas mudanças, ao passo que se operavam nas maiorias, tambem se observavam nas opposições; e, em nome de uma mal entendida tolerancia, teem-se estragado os costumes politicos. Angariava-se, seduzia-se, corrompia-se mesmo, este. ou aquelle representante da nação para mudar de partido.

Lembra-se ainda dos raptos parlamentares, e não desejaria que os homens que foram a causa desses raptos viessem apodar o partido, a que pertenceram, de intolerante e calumniador.

Referindo-se ao sr. conde de Valbom, que disse que este governo subira ao poder pela calumnia, e se conservava tambem por meio d’ella, observa que s. exa. tem sido o mais feliz dos calumniados d’este paiz; e diz calumniado, porque o foi por aquelles que o rodeiam.

Foi calumniado na arrematação dos bens de Arouca, na questão Youle, na questão das farinhas, e não quer agora dizer em que mais. Mas depois os calumniadores premiaram os seus serviços ao paiz, e por cada calumnia deram-lhe uma graça.

Todos os partidos se têem intrigado e colligado nas opposições para combaterem os governos. Tem-se visto os partidos monachicos constitucionaes reunirem se com o legitimista e com o republicano. Estas colligações feitas pelas opposições, embora elle (orador) não as considere muito correctas, não têem a mesma gravidade que as colligações feitas pelos homens que estão no poder; e já se viu um governo colligado com o partido republicano, e os membros d’este partido votarem nas assembléas paramentares as.

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moções de confiança n’esse governo. Isto é que á grave é que é serio, tanto para uns como para outros.

Se os partidos monarchicos têem commettido erros, se têem usado de meios pouco convenientes, [....] se não todos, pelo menos alguns, têem seguido uma marcha similhante, e por isso o povo assevera que tão bons são uns como os outros.

Não lhe admira nada ter visto os homens, que se dizem da idéa nova, approximarem-se dos monarchistas, e apparecerem depois commendadores, conselheiros, viscondes Q até condes.

Alludindo á questão das fornadas e á dos coroneis, que foram consideradas palpitantes para esta camara, vê que nos meetings e nas representações não se falla n’ellas, mas sim no imposto de rendimento e no tratado de Lourenço Marques.

Entende que o primeiro não affecta em geral a maior parte dos que representam contra elle; e quanto ao segundo, observa que nos meetings monarchicos não se falla em similhante tratado, e que até para o do theatro de S. Carlos se convidava o publico a discutir a marcha economica e administrativa do governo e uns certos descuidos nas relações internacionaes!

Com relação aos acontecimentos de domingo, nota que, quando se deram factos analogos, os governos vinham pedir ao parlamento que lhes desse força para restabelecer a ordem, e este dava-lh’a; mas agora succede o contrario, porque a moção do sr. Barjona, mostrando querer afastar qualquer ligação da parte da opposição com os ultimos sucessos, e affirmando o respeito que esta tem pelos principios de ordem publica, acaba por declarar que o governo actual não está á altura da gravidade das circumstancias! O governo não governa, é governado! disse o sr. Barjona. Mas quem governa ahi? É o sr. Barjona, ou o sr. conde de Vai bom?

Declara que se este governo cair, e a vara do commando passar para o sr. Barjona, fica satisfeito. Está intimamente convencido de que elle saberá sustentar a ordem, e haverá então uma verdadeira tranquilidade. Se o conmmando passar ás mãos do sr. conde de Valbom, a camara verá, e o paiz, que o principio da auctoridade não treme. Diz isto, porque já teve a honra de ser ajudante de campo de s. exa. n’aquella celebre campanha de 19 de maio, e acompanhou-o de casa do sr. Braamcamp para o quartel do Carmo, e daqui para a secretaria da guerra. Crê que ninguem como elle (orador) póde affirmar que, se a vara do cominando passar para as mãos do sr. conde de Valbom, não ha de tremer.

O partido progressista, que esteve afastado do poder durante oito annos, fez meetings e representações, mas nunca veiu para a rua tumultuando; e, se viesse levava, e levava bem, porque as arruaças não são meios politicos do um partido serio.

Alludiu aos tumultos de Coimbra por occasião dos exames, onde a tropa desfechou sobre o povo, e o general da divisão não consentiu que seguisse um processo intentado contra o tenente commandante da força; alludiu tambem ao motim que houve em Tavira, em 1872, por causa das novas medidas de capacidade. Comparou, estes acontecimentos com os de domingo ultimo, tirando a conclusão de que aquelles foram mais graves do que este. N’esta epocha era ministro da justiça o sr. Barjona, e por isso entende que s. exa. não tem auctoridade para propor a moção de censura que apresentou.

O governo actual encontrou a fazenda publica em tal estado, que não póde deixar de recorrer ao imposto e aos emprestimos. Não quer dizer que o déficit e a divida fluctuante que o governo actual encontrou não fossem e resultado de despezas reproductivas; mas o facto é que foi preciso attenuar o primeiro, e contrahir um emprestimo para pagar a segunda.

Não acha orthodoxa a doutrina de defender os proprios actos com os precedentes dos adversarios; mas tambem não julga que estes tenham a auctoridade necessaria para centrar um governo por actos iguaes aos que elles praticaram.

Para se não ha governo optimo; tudo é relativo. Se no conjuncto das medidas julga um melhor do que o outro, dá-lhe o seu apoio. Sendo assim a questão dos precedentes é fatal, inevitavel, porque os governos são o que são, não só em, virtude dos seus proprios principios, mas em virtude das circumstancias que os rodeiam.

Concluiu declarando que retira qualquer phrase que possa affectar o melindre de algum dos seus collegas. Affirma que emquanto tiver a honra de pertencer a esta camara ha de cumprir religiosamente o seu dever, porque é incapaz de escolher para theatro dos seus desvarios, que os tem, esta respeitavel assembléa.

Quanto ao modo por que ha de votar, tem a dizer o seguinte:

Como legislador vitalicio, filho da prerogativa da coroa, ha de votar contra a moção do sr. Barjona de Freitas, que considera uma protecção aos arruaceiros, que, insultando, ultrajando, apedrejando a força publica, davam vivas á republica.

(Sussurro na galeria,)

(O discurso do digno par será publicado quando o devolver.)

O sr. Presidente: — Peço ás galerias que se conservem na ordem, aliás terei de fazer cumprir as disposições do regimento.

O sr. Visconde de Chancelleiros (sobre a ordem): — Mandou para a mesa a seguinte proposta:

Proponho que a camara convide o governo a declarar que projectos de lei tem dependentes da approvação desta casa do parlamento, e que deseja ver approvados por ella com urgencia, por assim o reclamar o bem do paiz.

Repete esta proposta, que já fez na ultima sessão, visto que não se lhe deu andamento; e repete-a, porque o sr. ministro do reino disse que a opposição não deixava caminhar o governo.

Não tem duvida de acceitar o additamento feito a esta sua proposta pelo sr. marquez de Sabugosa, para, que se diga tambem á camara quaes são os projectos que se acham pendentes nas commissões.

Respondendo ao orador precedente, disse que s. exa. pretendeu lançar á conta da opposição as arruaças de domingo, e disse que o seu partido, durante o periodo de oito annos em que esteve fóra do poder, nunca recorrera a similhantes meios; mas s. exa. esqueceu-se de dizer que a camara tinha ficado affrontada com a nomeação inconstitucional dos novos pares, e que a opposição actual não recorreu ao expediente inconstitucionalissimo de abandonar o seu logar no parlamento.

Não vae buscar referencias ao passado, porque agora só se trata do que aconteceu no domingo, e que é da responsabilidade cio governo.

Observou que o sr. Pereira Dias arguiu o sr. conde do Valbom, dizendo que lhe dessem a vara do cominando, porque dera provas de o poder exercer em 19 de maio; mas não lembrou ao arguente que, se o argumento podia ferir o sr. conde de Valbom, tambem ia ferir o sr. presidente do conselho e o sr. niinist0 de reino, que eram collegas d’aquelle digno par.

Não quer saber se o governo subiu ao poder por insinuações directas ao chefe do optado, o que se sabe é que a sua permanencia á frente dos negocios compromette as instituições, porque augmenta a opposição que só manifesta no paiz.

Como désse a hora, pediu para ficar com a palavra reservada.

(O discurso do digno par será publicado quando o devolver.)

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Leu-se na mesa a proposta do sr. visconde de Chancelleiros.

O sr. Presidente: — Ámanhã continua a mesma ordem do dia.

Está levantada a sessão.

Eram cinco horas da tarde.

Dignos pares presentes na sessão de 18 de março de 1881

Exmos. srs.: Vicente Ferrer Neto de Paiva; João Baptista da Silva Ferrão de Carvalho Mártens; duque de Palmella;; Marquezes, de Penafiel, de Sabugosa, de Vianna, de Monfalim, de Vallada; Arcebispo de Évora; Condes, de Avillez, de Bomfim, de Cabral, de Castro, da Fonte Nova, de Gouveia, de Linhares, de Paraty, de Podentes, da Ribeira Grande, da Torre, de Valbom; Bispos, de Vizeu, de Bragança; Viscondes, de Almeidinha, de Alves de Sá, de Bivar, de Borges de Castro, da Borralha, de Chancelleiros, da Gandarinha, de S. Januario, das Laranjeiras, de Ovar, de Portocarrero, da Praia, da Praia Grande, de Seabra do Seisal, de Valmór; Barão de Ancede; Mendes Pinheiro, Pereira de Miranda, Mello e Carvalho, Quaresma, Sousa Pinto, Antonio, Machado, Secco, Couto Monteiro, Fontes Pereira de Mello, Magalhães Aguiar, Rodrigues Sampaio, Pequito de Seixas, Serpa "Pimentel, Costa Lobo, Barjona de Freitas, Cau da Costa, Xavier da Silva, Carlos, Bento, Montufar Barreiros, Fortunato Barreiros, Francisco Cunha, Margiochi, Henrique de Macedo, Andrade Corvo, Ferreira Lapa, Mendonça Cortez, Abreu e Sousa, Gusmão, Braamcamp, Baptista de Andrade, Pinto Bastos, Reis e Vasconcellos, Mancos de Faria, Raposo do Amaral, Ponte e Horta, Costa Cardoso, Mexia Salema, Matozo, Camara Leme, Daun e Lorena, Seixas, Pires de Lima, Vaz "Preto, Pereira Dias, Franzini, Canto e Castro, Placido de Abreu, Calheiros, Tnomás de Carvalho, Ferreira Novaes, Seiça e Almeida, Fernandes Vaz.

Discurso proferido pelo sr. ministro do reino, José Luciano de Castro, na sessão de 16 de março, e que devia ler-se a pag. 277, col. l.ª

O sr. ministro do Reino (Luciano de Castro): — Creio que o digno par presenciou que, assim que s. exa. se dirigiu a miro, pedi desde logo a palavra. Se ella me não foi dada, a culpa não foi minha. V. exa., que dirige perfeitamente os trabalhos d’esta casa, julgou dever encerrar a sessão, e eu não podia nem tinha direito a exigir que ella se prorogasse.

Vou, portanto, responder agora á pergunta que o digno par me dirigiu, e para o fazer tão concisamente como devo vou ler á camara a informação, que recebi sobre o assumpto a que s. exa. se referiu, dop digno commandante da guarda municipal de Lisboa.

(Leu.)

Já v. exa. vê por esta narração, que considero verdadeira, pois não tenho rasão para pensar o contrario, que uma força da guarda municipal foi requisitada para fazer evacuar o salão do theatro de S. Carlos. Essa força, ao chegar proximo d’aquelle recinto, soube que não era necessaria, porque os individuos reunidos n’aquelle salão já o tinham abandonado.

Como b povo viu retirar a tropa correu sobre ella, assobiando, apupando-a, e até apedrejando-a. Então, o major Rosa Coelho reclamou uma força de cavallaria, que foi dividida em patrulhas para fazer dispersar o povo. Este serviço foi feito com toda a moderação, mas a força foi igualmente apupada e apedrejada. Em vista disto, e em justa defeza, os soldados viram-se obrigados a desembainhar as espadas para resistir áquelles que os atacavam.

Aqui está como se passaram os factos. Lastimo que algumas contusões e leves ferimentos houvesse. Lamento, nem podia deixar de lamentar, que se dessem esses tristes acontecimentos, porque de certo ninguem folga com a desordem nas praças publicas, e muito menos p governo. Este caso não é d’aquelles em que a força publica tem de fazer os avisos previos a que o digno par se referiu. A força tem de fazer esses avisos quando tem de dispersai qualquer ajuntamento popular; mas quando é logo insultada e apupada não póde proceder d’essa fórma.

Esta é a pratica seguida entre nós. E, se eu quizesse, podia recorrer a auctoridades que de certo são insuspeitas ao digno par.

Quando se deram os fuzilamentos providenciaes de Arada, a que s. exa. se referiu, e os de Machico, a que não sei se algum digno par alludiu, não me corista que se fizessem avisos ao povo. O que n’essa occasião se fez foi o mesmo que se fez agora. Quando a força foi aggredida, respondeu a essa aggressão como lhe cumpria.

Citando estes exemplos, não pretendo senão mostrar que em todos os tempos se tem procedido da mesma maneira.

A força publica, que é chamada para dissolver qualquer tumulto, tem obrigação de avisar previamente antes de carregar sobre o povo; mas a força que foi chamada para acudir á desordem, foi logo apupada, aggredida, insultada, apedrejada, e teve "de defender-se.

Se houvesse excesso na defeza por parte da força, de certo o digno commandante teria procedido contra os soldados que tivessem abusado.

Consta da informação que li, que os soldados tiveram de se defender.

Não foi dada ordem nenhuma pelos seus superiores para aggredirem o povo, mas vendo-se insultados e aggredidos, defenderam- se.

Estes são os factos.

Os soldados não deram cutiladas; deram apenas pranchadas; nem outra cousa podia ser, porque se tivessem usado por outro modo das espadas, teriam havido ferimentos graves, e apenas houve alguns pequenos ferimentos e contusões.

Ao hospital foram só curar-se cinco pessoas, e d’essas tres saíram logo immediatamente, e apenas ficaram duas. Já se vê, pois, que os ferimentos foram leves, e não o teriam sido se em vez de distribuir algumas pranchadas a guarda municipal tivesse acutilado p povo.

A guarda municipal não fez mais do que dar algumas pranchadas para fazer dispersar a multidão.

São estas as informações que posso dar ao digno par.

Responderei agora á outra pergunta de s. exa.

S. exa. quer saber se, no caso de ser aggredido da mesma maneira que o foram os cidadãos, como poderia responder a essa aggressão.

Creio que o digno par não terá de soffrer aggressões de tal natureza, porque não apupa, não assobia, nem insulta á forca publica.

Se contra s. exa. ou contra, qualquer cidadão a força publica abusar das armas que a lei lhe confia para a defeza e segurança publica, o governo não ha de deixar pie proceder com todo o rigor contra aquelles que abusarem. As recommendações que tenho dado ás auctoridades é que empreguem todos os meios de prudencia e de moderação, e só em ultimo caso usem da força.

São estas as instrucções que eu dei, e que daria todo e qualquer governo.

Lamento os acontecimentos que se deram. Q procedimento da força publica foi provocado pelas aggressões que se lhe fizeram. Espero que não se hão de repetir. Se houver abusos, hei de fazer respeitar a lei e castigar aquelles que no exercicio das suas funcções não cumprirem os seus deveres.

Discurso proferido .pelo sr. ministro do reino, José Luciano de Castro, na sessão de 16 de março, e que devia ler-se a pag. 278, col. L.ª

P sr. Ministre) do Reino (Luciano de Castro): — Sr. presidente, pedi a palavra para oppor, por parte do

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governo, alguns reparos ás observações apresentadas á camara pelo sr. Barjona de Freitas.

Nunca neguei, nem por parte do governo se negou a esta camara, o direito de votar moções de censura aos actos do poder executivo.

Se o digno par deduziu a doutrina que attribuiu no governo, de algumas palavras que em uma das sessões passadas proferi n’esta casa, em resposta ao sr. Fontes, enganou-se.

Não fui eu que levantei a questão da incompetencia d’esta camara, a proposito da chamada questão dos coroneis, para propor bill de indemnidade. Achei-a levantada; e tive de a acceitar no terreno em que o sr. Fontes a collocára.

Foi aquelle orador que disse, que não se discutia se a camara dos pares podia ou não votar um bill ao governo, mas se a camara podia ou não propol-o; e s. exa., aceitando a questão n’este terreno, adduziu em favor da sua argumentação algumas rasões derivadas dos artigos 3o.° § 1.° e 139.° da carta e do artigo 14.° do acto addicional.

Eu, respondendo ao digno par, procurei mostrar que a sua argumentação não era procedente,

Não levantei, pois, a questão da incompetencia d’esta camara para propor bills; achei-a levantada. Procurei apenas responder aos argumentos apresentados pelo sr. Fontes,

O que da minha argumentação se deduzia, não era que a camara não podia votar moções de censura, mas que não podia propor bills, o que é muito differente; e reforcei a minha opinião com a auctoridade do sr. duque d’Avila que, num discurso proferido em 1862, n’esta casa, negara até á camara dos pares o direito de votar censuras politicas ao governo. Mas, longe de mim o negar a esta camara o direito de exame ou censura dos actos do governo, porque ella tem attribuições iguaes ás da camara dos senhores deputados no que toca á apreciação dos actos do poder executivo. O que eu quiz apenas mostrar foi que este camara não tinha o direito de propor bills de indemnidade.

Não querendo agora alongar-me n’este debate, direi apenas que o argumento principal em que me fundava era que, pela carta constitucional, o direito da iniciativa da accusação dos ministros pertencia á camara dos senhores deputados, e importando o bill de indemnidade a extincção da responsabilidade, ou a cessação da accusação, só de da ter direito de propor essa cessação quem tinha direito de propor a accusação, que era a camara electiva.

Esta foi a ordem de idéas que expuz, sem querer de modo algum negar a esta camara o direito de propor censuras ou de votar bills de indemnidade. O que apenas procurei mostrar é que não póde nem deve propor estes ultimos.

Quanto ao bill que se discute n’esta casa ha já dias, é necessario fazer uma distincção. Não chamo bill de indemnidade senão ao artigo 2.° do projecto que declara que o governo é relevado da responsabilidade em que incorreu publicando os decretos do sr. João Chrysestomo, porque o artigo 1.° não faz mais que confirmar aquelle s decretos ou dar-lhes força legal.

O artigo 2.°, importando a cessação ou extincção da accusação criminal, que exclusivamente pertence á camara dos deputados, está nas condições?, que ha pouco me referi, isto é, de não dever nem poder ser proposto senão pelo ramo do corpo legislativo a quem cabe o direito de propor a accusação, e ao qual, por conseguinte, cabe tambem o exclusivo direito de propor a sua cessação ou extincção.

Repito, não fui eu que levantei esta questão na camara. Não fiz mais do que responder ás observações de alguns dignos pares que, por mais de uma vez, têem alludido a este assumpto.

E aproveito o ensejo para protestar contra as restricções que pretendem impor aos ministros que não são membros d’esta camara, quando usam da palavra neste recinto. Creio que nós todos, os membros do gabinete, fallâmos aqui em nome do mesmo direito, e que todos somos igualmente representantes do poder executivo.

Nos logares, que occupâmos, não póde haver distincção entre os ministros que são pares do reino e os que não pertencem a esta casa. Somos iodos membros do gabinete, e nesta qualidade fallâmos aqui.

Dadas estas explicações, e ficando bem assentado que nunca foi intenção minha negar o direito a esta camara de votar moções de censura, passarei a tratar do assumpto que principalmente se debate, acrescentando apenas ás considerações que acabo de expender uma breve observação. Desde que a camara dos dignos pares tem direito de votar censuras ao governo, direito que não se póde negar, é conveniente, por todas as considerações, que ella não use d’esse direito senão muito discretamente e em condições excepcionaes.

Lá fóra, em todos os paizes onde ha a segunda camará, — e creio que só a Grecia é a unica nação das que se regem,pelo systeina representativo onde não ha camara sita; lá fóra usa-se sempre d’aquelle direito com grande moderação e prudencia. Quando as segundas camaras não procedera assim, quando não usam d’essa moderação, ou não exercem essa faculdade com o indispensavel criterio, acontece, como ha pouco se viu em França, votarem as censuras, e apesar disso os gabinetes continuarem tranquillos na gerencia dos negocios publicos, porque entendem que têem por si a rasão e o interesse publico. Convem, pois, que as segundas camaras que têem o direito de censura usem sempre d’elle com grande discrição e prudencia.

Sr. presidente, o digno par que acaba de fallar propoz uma- moção clara de censura ao governo, e para isso procurou justificar-se com a perigosa e excepcional situação em que se acha o paiz, com a tremenda e crescente agitação em que se debate e estremece n’este momento a sociedade portugueza!

Eu nã posso ter a vaidade de querer incutir no animo de s. exa. a idéa de que a situação do paiz e perfeitamente tranquilla, que a agitação só existe nos partidos, porque no resto do paiz não ha a menor perturbação da ordem; (Sussurro nas galerias.} se alguma existe é promovida pelos partidos da opposição. O paiz é estranho a esses transparentes manejos.

Eu recebo de toda a parte? alem das informações officiaes, a afirmação expressa de muitas pessoas insuspeitas, de que o paiz está perfeitamente socegado. Esta é a verdade.

A agitação está apenas nos que promovem os meetings por parte da opposição. Pois ha de o governo retirar se diante das representações de dois ou tres meetings da opposição, quando ha igualmente meetings a favor do governo? (Riso nas galerias.)

É certo, sr. presidente, que, se ha representações contra o governo, tambem as ha, e não menos, a favor do governo.

(Grande susurro nas galerias.)

Sr. presidente, se eu não posso n’esta camara usar livremente da palavra, para fallar em nome do governo, eu sento-me. (Apoiados repetidos.}

Se v. exa. não tem a força precisa para manter a ordem nas galerias, e para me garantir o direito de fallar em a defeza do governo, eu não continuo. (Apoiados repetidos.}

O sr. Presidente: — Eu peço ás galerias que não sejam impassiveis, para eu não ter que mandar executar o regimento d’esta camara. Eu desejava não ter de empregar meio algum alem desta admoestação.

O Orador: — Sr. presidente, eu respeito todas as opiniões. Todos têem direito de apreciar e de censurar os actos do governo. O que não é, o que não póde ser permittido é que se façam arruaças nem nas praças publicas, nem nas galerias das camaras. Não é diante d’estes argumentos que o governo ha de retirar-se» Quando chegar o

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momento opportuno o governo ha de deixar estas cadeiras; mas não ha de succumbir em face do vozear desordenado dos agentes da opposição, e dos insultos e assuadas ás auctoridades legalmente constituidas.

O governo não se conservará aqui nem mais um minuto alem d’aquelle em que se convencer que lhe faltem os elementos constitucionaes indispensaveis para exercer a sua missão com proveito publico. Mas tambem não havemos de fugir miseravelmente diante de gritos sediciosos, diante de intimações turbulentas, diante das arruaças e das agitações promovidas por aquelles que nos cubicam as pastas.

Sr. presidente, a voz de um paiz faz-se ouvir pelos meios legaes.

Nós não supprimimos nenhum dos orgãos, pelos quaes póde e deve fallar a opinião. Acatãmos as suas indicações, e não seremos nem cegos, nem surdos, quando ellas se fizerem ouvir claras, inequivocas, eloquentes na implacavel condem nação dos actos do governo.

Creia s. exa. que não será tão grande a nossa obcecação nem tão entranhado o nosso afferro ao poder, que nos demoremos n’estas cadeiras um momento alem d’aquelle em que reconheçamos a necessidade constitucional da nossa queda.

O governo não póde abandonar o poder á simples e summaria intimação de dois ou tres meetings sem faltar ao que deve a si e á causa publica. Nem a essas peremptorias intimações, nem ás dos que mandam representações ao parlamento contra a marcha politica do governo, podemos obedecer.

A violenta agitação que os dignos pares dizem existir em todo o paiz, é exclusivamente partidaria. Não é uma convulsão profunda, nem um movimento serio que possa pôr em perigo as instituições ou a paz publica.

Houve effectivamente em Lisboa no domingo passado alguns acontecimentos que eu sou o primeiro a lamentar. Mas não se segue d’ahi que o governo desse ordem para açu a lar o povo. Nem o governo nem nenhuma auctoridade deu similhante ordem, nem o povo foi acutilado. O que succedeu foi o que todos sabem.

Os soldados da guarda municipal, vendo-se ultrajados e apedrejados, no uso do seu direito de legitima defeza, carregaram sobre os seus aggressoses; mas esse facto não sendo ordenado, como não foi, por nenhuma auctoridade, nem pelo proprio commandante da guarda, como se vê dos documentos que eu apresentei á camara, para que se vem aqui dizer por mais de uma vez que se mandou acutilar o povo?

As minhas ordens foram para que se não empregasse a força senão em ultimo caso, e a força não foz mais do que defender se. Não se póde consentir que a força publica seja apedrejada e offendida, que as auctoridades sejam enxovalhadas e apupadas, sem que a taes demazias opponham algum correctivo.

Querem os dignos pares porventura defender as arruaças ou advogar o direito dos amotinadores de apedrejarem a força? Acredito que s. exas. não podem ter essa pretensão nem querem que os soldados se deixem insultar por centenares de pessoas sem usarem do direito de legitima defeza. Não foi o povo socegado, o povo laborioso e ino-oftensivo, aquelle que trabalha dia e noite, e paga as contribuições publicas, que desattendeu a auctoridade e apedrejou a cavallaria municipal.

Sr. presidente, o grande crime do governo é este! É o não ter evitado que á guarda municipal caísse sobre os desordeiros no uso do seu direito de defeza, quando se viu maltratada e apedrejada, resultando d’hi alguns leves ferimentos, que eu sou o primeiro a lamentar!

Disse-se aqui tambem que o governo não governa, mas que é governado.

Mas qual é o governo que não se rodeia dos seus amigos a quem pede auxilio e conselho, e que são os seus naturaes collaboradores na gerencia dos negocios publicos?

Querem, os dignos pares que o governo se imponha ás maiorias, que os acompanham, e aos amigos, que o fortalecem com a efficaz cooperação da sua palavra e do seu voto? O governo é uma associação de individuos que representa as idéas, os pensamentos, as aspirações do seu partido. Não póde deixar de receber o conselho d’aquelles que com elle concorrem na ardua tarefa da administração do paiz. Se é n’este sentido que o sr. Barjona de Freitas accusa o governo de ser governado, essa accusação não nos incommoda, nem nos envergonha.

Disse s. exa. que o governo tinha tido n’esta casa uma maioria apenas de dois votos, no additamento proposto pela opposição ao projecto de resposta ao discurso da corôa.

Eu não sei se foram dois ou tres votos. Foi pequena a maioria, é verdade; mas, sr. presidente, não é a primeira vez, mesmo fora de Portugal, que um ministerio governa sem a maioria da segunda camara, ou com pequena maioria. Na Belgica, por exemplo, o governo actual não tem na camara dos senadores senão quatro votos de maioria, e governa.

Eu sinto muito que não possamos ter maioria mais numerosa do que a que temos; mas isso não é rasão para que o governo, emquanto tiver maioria com que possa fazer vingar as suas idéas, deixe de occupar o seu logar.

O antigo partido progressista governou durante alguns annos com uma maioria de dois e tres votos. E nesta camara, a lei dos vinculos, que é uma das glorias d’aquelle partido, vingou por uma pequena maioria, sendo o artigo mais importante d’essa lei approvado apenas por um voto, que foi o do sr. duque de Loulé, que era ministro, e aqui veiu expressamente para este fim. Este nobre caracter, talvez contrariando os sentimentos do seu coração e os interesses da sua familia, deu o seu voto áquélla lei, não para satisfazer ambições pessoaes ou politicas, mas para obedecer aos dictames e aspirações do seu partido.

Póde governar-se muito bem cem tres ou quatro votos, a questão é ter idéas e maioria para as fazer vingar.

Por nossa parte, se não temos governado mais e melhor, a culpa não é nossa.

Disse o digno par, que nós não temos feito sair d’esta e da outra casa do parlamento nenhuma medida importante. A asserção de s. exa. carece de ser rectificada. Na outra camara já alguns projectos valiosos, e grandemente uteis, têem sido approvados. Só a reforma administrativa, que está ali em discussão, era bastante para occupar o parlamento por muito tempo; alem de outros projectos que se estão preparando, e que em breve serão discutidos e apreciados pela camara.

A verdade é que esta casa do .parlamento não tem habilitado o governo a poder levar á sancção regia maior numero de leis. A opposição desta camara não nos tem deixado trabalhar. Surgem e multiplicam-se os debates politicos todos os dias. Accumulam-se as questões incidentes. A paixão tomou o logar da rasão fria e tranquilla. Quasi que não temos tempo para respirar. Não fazemos outra cousa senão responder ás interrogações e censuras dos dignos pares.

O sr. visconde de Chancelleiros não deve tornar a culpa ao governo desta desgraçada situação. S. exa. tem peccado muito. É em grande parte a sua politica opposicionista que não deixa trabalhar o governo. O que os dignos pares (querem é fazer cair o ministerio seja de que maneira for. O expediente não é novo; mas nós temos o direito de dizer ao paiz que só não temos trabalhado mais é por que a politica impeditiva não nos tem deixado caminhar tão larga e desassombradamente como desejavamos.

Sr. presidente, até s. exa. veiu enumerar entre os aggravos e crimes attribuidos a esta situação nefasta a tremenda responsabilidade, que assumimos perante o paiz e perante a historia, da restauração do legendario arrema-

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288 DIARIO CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

tante do real de agua! Creio raie este foi o supremo e formidavel argumento com que o digno par procurou ciar-nos o golpe de misericordia. Eu já não sei como possa defender-me das severas accusações fulminadas todos os dias contra o governo, em nome do arrematante do real de agua.

Deve dizer, porém, para tranquiliidade do digne par e do para que o ouve, que o arrematante do real do agua nunca passou da letra morta da lei para ou dominios da pratica, porque o governo não usou da auctorisação que para esse fim lhe foi concedida, e que por isso ficou reservado só para as urgencias da rethorica parlamentar. Por ora ainda o paiz está livro d’este flagello! E quando s. exa., cansado de virulentas accusações contra o governe, vier fallar do arrematante do real de agua, peço-lhe que metta em linha de conta esta pequena consideração, e é que o arrematante do real de agua não veiu ainda a lume.

Mas, sabe o digno par contra quem são mais acerbamente dirigidas as suas accusações? É contra o sr. conde de Valbom, porque foi este digno par quem inventou neste paiz o arrematante dos capitães mutuados devidos á fazenda publica, que foi estabelecido pela lei do 13 de julho de 1863, referendada por s. exa. Esse arrematante é que existe e que funcciona regularmente, e persegue os devedores da fazenda com todos os horrores e vexames das execuções fiscaes, emquanto o arrematante do real de agua nunca teve occasião de perseguir ninguem, porque não existe.

Já vê s. exa. que na profunda agitação que, se diz, revolve e sacode o paiz em violentos abalos contra o governo, não póde entrar como parte, mais ou menos importante, a execução da lei do real de agua no que diz respeito ao arrematante.

Se passássemos em revista os aggravos e attentados contra a liberdade e contra os principios constitucionaes, que se attribuem ao governo, viriamos a saber que se reduzem á nomeação de dezeseis pares do reino, á reforma dos coroneis e ao imposto de rendimento; não na parte contra a qual os dignos pares da opposição votaram, porque essa está em execução e não levanta clamores: mas, na outra parte, que s. exas. approvaram e que ainda não está em execução!

E, comtudo, é principalmente em nome do imposto de rendimento, que foi approvado pelos dignos pares, que se levanta o paiz e se agita, a opinião, para se pedir eu: termos violentos a quéda do governo!

Fallou tambem o sr. Barjona nas crueldades que só tinham praticado nesta capitai no domingo passado.

Essas crueldades, como já disse, reduzem-se apenas a tres ou quatro ferimentos de pequena importancia.

Eu, se quizesse esmerilhar o passado, e procurar confrontos, que edificantes exemplos não acharia para seguir e me defender!

No tempo era que o digno par estava nos conselhos da corôa...

Eu quasi que tenho receio d.e fallar em precedentes; porque, logo que i alio n’elles, levantam-se vozes unisonas contra mim.

O governo não tem direito de fallar era precedentes; tem apenas o dever de corrigir todos os precedestes da administração passada, ainda quando os considera bons, e nunca os desapprovou.

Pois vós accusae-nos todos es dias, fulminae-nos a totós os momentos com as mais terriveis arguições, e nós não podemos defender-nos com a pratica de actos iguaes a muitos que nos censarass, e que nós não condeimámos?!

Parece-me isto demaziada crueldade.

Pela minha parte, não tenho duvida alguma estes precedentes, porque é necessario que o paiz saiba que aquelles que se inculcam seus salvadores praticaram actos
mais censuraveis do que os que hoje estão combatendo; é necessario que o paiz saiba quem são esses salvadores, d’onde vêm, e o que fizeram durante os seus gloriosos consulados.

É preciso que aquelles que fallam agora, ora nome do povo, nas crueldades e violencias com que nós provocámos a colera popular, se lembrem que tomaram a responsabilidade de actos incomparavelmente mais crueis e violentos.

Podia citar ao digno par os fuzilamentos de Coimbra, e mais alguns; mas basta que refira este.

Não sabemos todos que se carregou e desfechou sobre a academia, e que houve ali mortos e feridos?

E houve lá os tres avisos previos?

Não quero insistir n’esta argumentação, porque receio as aggressões dos meus adversarios, que não permittem que eu falle em precedentes.

Os ministros actuaes podem ser accusados todos os dias. Os que o foram, são invulneravel».

Sr. presidente, eu desejaria muito que se tivessem feito as intimações previas, mas é neccessario saber se ellas se podiam fazer.

Quando a força publica, no desempenho da sua missão pacifica, é insultada, como aconteceu no domingo, não póde fazer essas intimações.

A forca publica veiu para desempenhar funcções de ordem e de paz. Foi accommettida pela multidão. Teve de defender-se.

É este o crime, em nome do qual se exige a nossa substituição!

E note-se que não se falla nos serviços que temos prestado ao pai z.

A questão grave, a questão será, a questão de fazenda, aquella da que depende o futuro do paiz, é alheia ás discussões da camara dos dignos pares!

A camara derrama lagrimas sentidas sobre a sorte dos innocentes amotinadores, mas não quer saber dos interesses mais graves do paiz!

O que se trata é de combater o governo.

O que se deseja é arrancar-lhe as pastas.

Tudo o mais é pequeno e insignificante em presença d’esta grande questão!

Temos conseguido, se não acabar com o deficit e resolver completamente a questão financeira, pelo menos caminhar desassombradamente para attingir esse suspirado desideratum.

Temos dinheiro para satisfazer os nossos compromissos. Emquanto era necessario lançar impostos, emquanto era preciso appellar duramente para a bolsa do contribuinte, e exigir do povo os sacrificios que lhe exigiam o credito e a honra nacional solemnemente empenhados, então abandonaram as cadeiras do poder sem que ninguem os compellisse, tendo grandes maiorias. (Apoiados.)

Depois de termos sido chamados ao poder para satisfazer os legados tremendos que nos deixaram; (Apoiados.) de havermos dado largos passos no escabroso caminho, que não poderam percorrer; depois de termos arriscado a nossa popularidade, e fatigado as nossas forcas em remover as grandes difficuldades que crearam, e com as quaes ousadamente luctámos; depois de termos reduzido as despezas? augmentado as receitas, diminuido o deficit, conseguido melhorar consideravelmente as finanças do estado; agora, finalmente, que ha dinheiro, intimam-nos a que nos retiremos. (Apoiados.)

Agora, ministros que tanto lidastes e fizestes em bem do paiz, agora retirae-vos em nome da arruaça, em nome da deserdem, em nome da protecção aos que offendem a força publica no regular exercicio das suas funcções! (Apoiados.)

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