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N.º 35

Presidencia do exmo. sr. João de Andrade Corvo

Secretarios - os dignos pares

Visconde de Soares Franco
Eduardo Montufar Barreiros

SUMMARIO

Leitura e approvação da acta. - Correspondencia. - O sr. Quaresma insta por documentos do ministerio da fazenda. - O sr. marquez de Ficalho pede que se consulte a camara sobre dever ser aggregado o sr. Margiochi á commissão do commercio e artes. - Ordem do dia. - Discussão do parecer n.° 168. - O sr. conde de Castro requer que pelo ministerio das obras publicas lhe sejam fornecidos dados curtos e positivos ácerca da verba despendida em estradas na região vinhateira do Douro. - O sr. Henrique de Macedo requer que pelo ministerio do reino lhe sejam enviados os documentos relativos á nomeação e aposentação do escrivão de Portalegre. - Approva-se que seja enviado ás commissões reunidas de commercio, fazenda, artes e instrucção publica o projecto referente á creação de algumas cadeiras no instituto industrial. - O sr. Henrique de Macedo interpella o sr. presidente do conselho de ministros ácerca de manifestações collectivas feitas por officiaes do exercito em favor do major Quillinan. - Responde o sr. presidente do conselho, e sobre o mesmo assumpto faliam os srs. viscondes de Seabra e de Moreira de Rey, e Carlos Bento. - O sr. Franzini manda para a mesa o parecer da commissão de marinha, com referencia á fixação e distribuição da força naval no anno de 1883-1884. - O sr. Henrique de Macedo apresenta uma nota de interpellação, relativa á legislação tributaria do sal.

Ás duas horas e um quarto da tarde, sendo presentes 22 dignos pares, o sr. presidente declarou aberta a sessão.

Foi lida e approvada sem reclamação a acta da sessão antecedente.

Deu-se conta da seguinte

Um officio da sra. condessa de Porto Covo da Bandeira, agradecendo á camara o voto de sentimento mandado lançar na acta pelo fallecimento de seu marido, o digno par, conde do mesmo titulo.

Ficou a camara inteirada.

Outro da camara dos srs. deputados, acompanhando a proposição fixando a forca naval para o anno economico de 1883-1884.

A commissão de marinha.

Outro do ministerio do reino, remttendo nota do estado do pagamento dos professores primarios do continente do reino no 1.° do corrente mez, a fim de satisfazer a um requerimento do digno par, sr. Mendonça Côrtez.

O documento ficou sobre a mesa para ser consultado pelo sr. Mendonça Côrtez.

(Assistiram á sessão os srs. presidente do conselho e ministro da marinha.)

O sr. Quaresma: - Em uma das sessões passadas pedi que pelo ministerio da fazenda me fossem enviados uns esclarecimentos de que necessito, e constando-me que elles deram já entrada na secretaria d'esta camara, peço a v. exa. que m'os mande entregar.

O sr. Presidente: - Os esclarecimentos, a que o digno par se refere, ainda não chegaram á secretaria.

O sr. Quaresma: - Peço a v. exa. que os requisite de novo.

O sr.- Marquez de Ficalho: - Peço a v. exa. que consulte a camara sobre se consente que o digno par, o sr. Margiochi, seja aggregado á commissão de commercio e artes.

Consultada a camara, resolveu affirmativamente.

ORDEM DO DIA

O sr. Presidente: -Vae passar-se á ordem do dia, que é a discussão do parecer n.° 168.

Leu-se na mesa, e submettido á votação foi approvado na generalidade e especialidade, o seguinte

PARECEU N.° 168

Senhores. - A vossa commissão de marinha e ultramar foi presente o projecto de lei n.° 99, já approvado na camara dos senhores deputados, pelo qual é o governo auctorisado a contar uma certa antiguidade ao alferes da guarnição de Macau, Sebastião Ignacio de Barros, e a indemnisar consequentemente este official.

A vossa commissão não sé limitou a estudar attentamente os fundamentos d'esta pretensão, exarados no mencionado projecto, pediu e obteve informações do ministerio da marinha e ultramar e consultou todos os documentos que podiam esclarecer esta reclamação, e em resultado de tal exame entendeu dever modificar aquelle projecto.

Considerando que o actual alferes da guarnição de Macau, Sebastião Ignacio de Barros, posto fosse primeiro sargento d'aquella guarnição desde 9 de agosto de Iò62, só em 11 de julho de 1878 foi promovido ao posto de alferes, por lhe faltarem dois predicados essenciaes para esta promoção, isto é, approvação no exame para o posto de primeiro sargento, e um anno de effectivo serviço na fileira;

Considerando que a allegação do requerente, com relação á preterição que diz ter soffrido por outros primeiros sargentos mais modernos, só em parte teria fundamento, mesmo quando se provasse que esses primeiros sargentos careciam tambem do respectivo exame, porque é indubitavel que elles tinham mais de um anno de serviço effectivo d'aquelle posto na fileira, como a lei exige;

Considerando, porém, que o reclamante durante o tempo em que esteve addido á policia do mar no porto de Macau fez serviços distinctos que estão devidamente documentados, e que,. se não supprem a rigorosa disposição da lei a respeito da já citada exigencia de um anno de serviço na fileira, não podem deixar de ser tomados em consideração, sem todavia prejudicar os direitos adquiridos e a antiguidade de promoção no posto de alferes dos primeiros sargentos, embora mais modernos, despachados em 14 de fevereiro de 1876:

Por todas estas considerações é a vossa commissão de parecer que merece a vossa approvação o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É o governo auctorisado a contar ao alferes da guarnição da provincia de Macau e Timor, Sebastião Ignacio de Barros, a antiguidade d'este. posto .de 14 de fevereiro de 1876, unicamente para os effeitos da reforma.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala da commissão, em 18 de abril de 1883. = Visconde de Soares Franco = José Baptista de Andrade = Barros e Sá = V. de S. Januario - Tem voto do sr. Franzini.

Projecto de lei n.° 99

Artigo 1.° E o governo auctorisado a contar de 9 de

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agosto de 1862 a antiguidade do posto de primeiro sargento ao actual alferes da guarnição de Macau, Sebastião Ignacio de Barros, e a indemnisar consequentemente este official na sua antiguidade nos postos de alferes e tenente, quando no quadro deste posto haja vaga.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 12 de junho de!S82.= Luiz Frederico de Bivar Gomes da Costa, presidente = Francisco Augusto Florido de Mouta e Vasconcellos, deputado secretario = Augusto Cesar Ferreira de Mesquita, deputado secretario.

O sr. Conde de Castro: - Pedi a palavra para mandar para a mesa o seguinte requerimento.

(Leu.)

Em uma das sessões passadas instei pela remessa d'estes esclarecimentos, porque tendo-se o governo compromettido a despender uma certa somma para a construção de estradas, na região vinhateira do Douro, no intuito de proporcionar trabalho aos seus habitantes que se encontram em precarias circumstancias, preciso saber positivamente qual é a cifra despendida.

Requeiro, pois, que pelo ministerio das obras publicas me sejam a este fim enviados dados certos e positivos, para que eu possa fazer algumas observações a tal respeito.

Leu-se na mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro que, pelo ministerio das obras publicas, seja enviada com urgencia a esta camara uma nota das sommas despendidas durante o actual anno economico por conta da verba consignada no respectivo orçamento com applicação a obras publicas na região vinicola do Douro. = Conde de Castro.

Mandou-se expedir.

O sr. Henrique de Macedo: - Pedi a palavra para varios fins, e um d'elles é mandar para a mesa o seguinte requerimento.

(Leu.)

O facto a que se referem os documentos que peço n'este requerimento é tão singular que eu, afastando-me das praxes seguidas n'esta camara, vou acompanhal-o de algumas palavras, ao menos para o mencionar.

É o seguinte.

O escrivão da administração de Portalegre foi nomeado no dia 16 de março, e aposentado no dia 18 do mesmo mez.

O meu requerimento, pois requisita documentos, que me são indispensaveis para eu dirigir ao governo as perguntas que julgar necessarias a este respeito.

Aproveito a occasião, para rogar a v. exa. que consulte a camara sobre se consente que o projecto n.° 172, que a mesa, muito naturalmente, remetteu ás commissões de agricultura, de commercio e artes, e de fazenda, projecto que se refere á creação de duas novas cadeiras no instituto industrial de Lisboa, seja tambem remettido á commissão de instrucção publica, isto é, que esta commissão seja ouvida conjunctamente com as outras. V. exa. sabe que a instrucção publica, propriamente dita, está localisada no ministerio do reino; no entretanto a commissão de instrucção publica da camara dos pares, a meu ver, não foi creada, quando se elaborou o regimento, que determina o numero de commissões existentes n'esta camara, para tratar unicamente dos negocios de instrucção relativos ás escolas dependentes do ministerio do reino, mas de todos os que digam respeito á instrucção publica, como aquelle de que se trata.

Portanto, como o projecto é importante, peço a v. exa. que consulte a camara se consente que sobre elle sejam ouvidas não só as commissões de fazenda e commercio e artes, mas igualmente a de instrucção publica.

Leu-se na mesa o requerimento apresentado pelo sr. Henrique de Macedo.

É o seguinte:

Requerimento

Requeiro que, pelo ministerio dos negocios do reino, sejam enviados a esta camara, por original ou por copia, todos os documentos relativos á nomeação e aposentação do escrivão da administração do concelho de Portalegre, Pedro Maria Nunes de Vellez.

Sala das sessões, em 21 de abril de 1883. = O par do reino, Henrique de Macedo.

Foi expedido.

O sr. Presidente: - Eu já tinha tenção de submetter á votação da camara uma proposta identica á do sr. Henrique de Macedo.

Portanto, es dignos purés que approvam que o projecto relativo á creação de algumas cadeiras no instituto industriai e commercial de Lisboa seja enviado as commissões reunidas de fazenda, commercio e artes, e instrucção publica tenham & bondade de se levantar.

Foi approvado.

O sr. Henrique de Macedo: - Se v. exa. me dá licença, eu continuo agora a usar da palavra, pois que desejo dirigir algumas perguntas ao sr. presidente do conselho, relativas a diversos assumptos, alieis connexos.

Em primeiro logar perguntarei a s. exa. se tomou já as providencias necessarias para reprimir o que se me afigura um acto de grave indisciplina, a proposito de uma carta escripta por um militar do exercito portuguez, e tambem funccionario diplomatico, a um membro do parlamento inglez.

Segundo dizem os jornaes, têem sido enviadas áquelle cavalheiro, cujo merito não trato de apreciar por nenhuma fórma, entenda-se bem isto, diversas cartas de felicitação e congratulação, algumas das quaes têem tomado manifestamente, conforme tambem leio nos jornaes, o caracter de manifestações collectivas por parte de alguns agentes da força publica, collocados em diversos graus da hierarchia militar.

Pergunto, pois, ao sr. presidente do conselho, se tem conhecimento d'este facto, e se tomou já algumas providencias, eu se tenciona tomai as, porque se me afigura que o facto que acabo de referir constitue um acto de indisciplina bastante grave.

(O orador não reviu este discurso.)

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Fontes Pereira de Mello): - Sr. presidente, não me consta que tenham sido feitas demonstrações collectivas, como acaba de dizer o digno par.

Sem embargo de me constar que algumas manifestações individuaes se têem feito, embora por individuos que pertencem á classe militar, eu tratarei de averiguar se ha alguma cousa que tenha caracter de collectividade.

Todos sabem que os militares não podem fazer manifestações collectivamente.

Comtudo este assumpto, por melindroso, parece-me que não se ganha muito em o discutir largamente.

O sr. Visconde de Seabra: - Peço a palavra.

O Orador: - Creio, pois, que o bom senso de todos ha de fazer mais do que qualquer deliberação parlamentar que possamos adoptar.

Entretanto eu tomo nota das observações que acaba de fazer o digno par, e tratarei de averiguar se, effectivamente, houve alguma manifestação que tivesse esse caracter.

O sr. Visconde de Seabra: - Disse que ao acto do major Quillinan se tinha dado um vulto exagerado; que conhecia esse digno militar do tempo em que elle, orador, fôra ministro do reino na junta do Porto, aproveitando então os seus serviços e sendo este o começo da sua carreira. Que ao acto por elle praticado actualmente em Londres se tem attribuido aqui um caracter politico, por via de certos fins latentes pouco dignos, sendo que não o tem senão meramente particular, attento que individualmente o sr. Quilli-

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nan, vendo-se insultado a si, como filho de Portugal, podia proceder, segundo procedeu, sem que, todavia, devessem resultar d'este facto complicações internacionaes. Se bem ao chefe da nossa legação em Londres não fosse licito igual procedimento, assistia-lhe, comtudo, o direito de, em casos taes, observar ao governo inglez que e parlamento, ou qualquer membro seu, se havia enganado. Que ainda hoje o podia fazer. Que os inglezes, cujo systema constitucional é a base do nosso systema, como respeitadores dos direitos individuaes, comprehendiam assim tambem a conducta do major Quillinan, o qual, se com ella delinquira, lá estavam os tribunaes em Inglaterra para o punir, convindo, porém, advertir que a injuria ou a calumnia não tornavam inviolaveis os membros do parlamento inglez.

(O discurso do digno par será publicado quando s. exa. o devolver.}

O sr. Henrique de Macedo: - Não pretendo, de modo nenhum, censurar a v. exa., pelo facto de ter interrompido esta especie de dialogo entre mim e o sr. presidente do conselho, mas as praxes d'esta casa permittem estas conversações, e quando um terceiro orador peça a palavra sobre o assumpto.

O sr. Presidente: - Peço perdão a v. exa., mas cingi-me ás prescripções do regimento.

O sr. Henrique de Macedo: - Repito, que da minha parte não ha a minima intenção de censurar a v. exa., e, prpseguindo na minha argumentação, direi que o sr. visconde de Seabra fallou com muita proficiencia, entrando, porém, em considerações completamente estranhas á questão, como eu a puz.

Eu declarei, e muito explicitamente, que não tratava de nenhuma fórma de apreciar os merecimentos do acto praticado pelo sr. Quillinan, e que me limitava a perguntar ao sr. presidente do conselho de ministros e ministro da guerra, se em relação ao mesmo acto tinha havido, como se affirmava em todos os jornaes, manifestações conectivas da força publica, e se, dada a existencia d'essas manifestações, s. exa. as tinha reprimido ou castigado, ou ainda se tratava de as reprimir e castigar. Foi isto o que eu declarei, e foi a esta pergunta que o sr. Fontes me respondeu de uma maneira, que eu reputo pouco satisfactoria para mim e para a camara.

S. exa. disse-nos que não tinha conhecimento de manifestações collectivas ida força publica, e eu pergunto que nome póde dar-se á felicitação que a officialidade da corveta Estephania dirigiu ao sr. Quillinan, e ainda ás felicitações que o commandante e mais officiaes da fortaleza de Peniche dirigiram ao mesmo senhor.

Pergunto em que conta póde tomar-se o acto praticado pelo commandante da divisão do Porto o de todo o seu estado maior, saudando igualmente o sr. Quillinan?

E diz-nos s. exa. que não tem conhecimento de manifestações collectivas, quando os factos que citei são absoluta e positivamente representações collectivas da força publica.

Não são unicamente prohibidas, creio eu, as manifestações collectivas da força publica, que se dirigem aos poderes publicos, mas tambem aquellas cujo fim é elogiar ou condemnar qualquer acto praticado por um camarada.

S. exa. que é militar, que é ministro da guerra, entende, melhor do que eu, que as boas regras disciplinares devem prohibir as manifestações da força publica, sejam de que ordem forem.

O sr. presidente do conselho prometteu que havia de indagar se o facto tinha o caracter de collectividade para então proceder.

Permitta-me s. exa. que lhe diga que a sua resposta foi para mim pouco satisfactoria, porque esta questão se me afigura bastante grave para que s. exa. tivesse obrigação de se preparar para responder no parlamento a uma pergunta d'esta ordem.

Mas, sr. presidente, eu já sabia antecipadamente que s. exa. não me podia responder se não com uma evasiva d'esta ordem, porque uma resposta franca de s. exa. equivaleria a reconhecer a necessidade de abandonar aquellas cadeiras (indicando as cadeiras do governo).

Porque não é só o facto a que me tenho referido, mas ha outros factos similhantes a demonstrarem que a anarchia lavra em todos os ramos de serviço publico, e se não examinemos. Não é preciso fazel-o muito detalhadamente; bastará citar em cada um dos serviços um ou outro facto, para provar a minha asserção.

Se olharmos para o serviço das alfandegas, que encontramos lá?

Encontramos, por exemplo, que o regulamento sobre o imposto do sal é executado n'umas localidades e n'outras não.

Em algumas localidades exige-se uma guia que acompanhe o sal que se vende ou que vae ser armazenado, n'outras nada se exige, ao sabor e talante dos empregados fiscaes.

Vamos á instrucção publica.

Que encontramos nós n'este ramo de serviço publico?

Os municipios, nas barbas da auctoridade superior, organisam os serviços de uma maneira contraria á expressa determinação das leis, e o governo não tem força para evitar estes abusos.

A anarchia, sr. presidente, lavra até no parlamento, pois é certo que se deu ha poucos dias no parlamento portuguez um caso que talvez se não d'esse ainda em nenhum outro parlamento do mundo: foi o facto de um decreto das côrtes geraes ser alterado por uma simples errata.

Esta anarchia toda nasce, sr. presidente, de factos politicos que não vão muito distantes, em que o sr. presidente do conselho representou um papel importante. Refiro-me ás arruaças de 1880, de que a s. exa. cabe grande responsabilidade.

E por ter animado então a anarchia que s. exa. não tem agora para a reprimir a força que tinha em outras epochas. Convencido disso, devia s. exa. concluir que o seu dever, no caso presente, era largar o poder a quem dispozesse da força que a elle lhe falta. Este é o ponto, ouço eu dizer! E sim. Pois eu quando entendo que um ministerio governa mal posso ser accusado de faccioso por desejar a queda d'esse ministerio? Pois desejar que o. paiz seja bem governado não será um desejo patriotico? Quem póde, pois, estranhar-me a opinião de que um governo saído da actual opposição governaria agora melhor do que aquelle que está ahi sentado.

Sr. presidente, repito, as manifestações a que me referi e que se dizem insignificantes, reputo-as eu gravissimas, porque representam um acto de indisciplina.

De novo, portanto, peço ao sr. presidente do conselho que inquira sobre se colectivamente tiveram logar manifestações collectivas, e que, se ellas existiram, proceda convenientemente.

Para isso serei o primeiro a dar-lhe apoio e força.

(O digno par não reviu o seu discurso.)

O sr. Presidente do Conselho de Ministros: - Sr. presidente, é licito e perfeitamente licito, (é até natural que a opposição parlamentar deseje a queda do governo; é da natureza das cousas.

Todas os opposições têem essa aspiração, a qual é filha da confiança que têem em que governariam melhor. E o proprio digno par declarou que governaria melhor.

O sr. Henrique de Macedo: - Eu, não; mas o partido a que pertenço.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros: - Muito bem, o seu partido. O que todavia me parece é que essa declaração veiu tirar á pergunta do digno par o caracter de innocencia de que s. exa. ao principio parecia querei a revestir.

Na realidade uma tal pergunta podia ser simplesmente fundada em que o governo, procedendo no cumprimento

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dos seus deveres, reprimisse essas manifestações, caso existissem.

A essa pergunta, que me pareceu tão innocente, tão natural e tão inclinada á boa administração e aos bons principies governativos, respondi eu, tambem com a mesma innocencia, por não ter conhecimento official de tres manisfestações collectivas, que o governo trataria de averiguar o que houvesse sobre tal assumpto, a um de proceder como julgasse mais conveniente.

O digno par não se contentou com a minha resposta.

É verdade, sr. presidente, que as opposições, em geral, nunca se contentam com as respostas dos ministres. Eu tambem, quando era opposição, nunca me contentava com as respostas dos srs. ministros, e por isso não estranho agora que o digno par proceda de igual maneira.

S. exa. declarou que a anarchia campeava não só no exercito, como tambem em toda a parte; e, para comprovar isto, citou differentes actos.

O primeiro foi que o governo exigia guias para o pagamento do imposto do sal, contra a expressa determinação da lei. Segundo, que o governo não tem reprimido os actos da camara municipal. Terceiro, que a anarchia tinha invadido o parlamento, porque se tinha introduzido uma emenda n'um projecto de lei, já discutido e approvado por ambas as casas do parlamento.

Quanto ao primeiro acto, eu convido o digno par a mostrar-me qual é a determinação da lei. Eu tenho-a aqui e posso-a ler. Não diz uma unica palavra a tal respeito.

Eu declaro a v. exa. e á camara que procedi de accordo com a opinião do illustre procurador geral da coroa, que me parece ter bastante competencia; e se me enganei, foi em muito boa companhia.

Com relação á camara municipal, não sei qual é o assumpto de que se trata.

Com respeito á anarchia que lavra no parlamento, se ella existe, está sanccionada pelos actos do mesmo parlamento, e portanto o digno par, querendo attribuir ao governo a responsabilidade do tal anarchia, r rio fez mais do que lançar sobre o parlamento, sobre os seus collegiio, e sobre as maiorias, que são as que dirigem os actos de governo, uma accusação.

Esta anarchia, a que s. exa. se referiu, supposto haja o apoio das duas casas do parlamento, succede que tão sómente a mim quer o digno par imputar-mo a responsabilidade que d'ella deriva, do modo que, se o governo saísse, parece que elle e as casas do parlamento ficariam d'ella immunes, tende eu que me retirar para minha casa como unico responsavel. Isto é simplesmente inexacto: e não direi outra cousa, porque não costumo nunca dizer phrases, que por qualquer modo se possam julgar ofensivas, nem eu sou capaz de offender pessoa alguma. Por isso digo simplesmente: isto é inexacto.

Mas, vejamos, qual é a anarchia que existe? A mim não me consta que a prohibição das guias exista na lei. Sustento mesmo que não ha tal prohibição.

Permitta-me, pois, o digno par que lhe diga, não me parecer que a sua pergunta, a que a primeira vista attribui desejos de estabelecer uma boa regra de administrado e uma boa ordem na gerencia das cousas publicas, seja tão innocente como apparentava. Tem um fim mais largo, que eu agora comprehendo, e que veiu explicar o segundo discurso do digno par, porque, julgando o primeiro muito sincero, não Mie podia dar a interpretação que lho dou agora, e em vista disso eu repito mais uma vez a s. exa.; que tomarei nota das suas observações e procurarei proceder na conformidade da lei e como for justo.

(O orador não reviu os seus discursos.)

O sr. Carlos Bento: - Eu pedi a palavra por estar inteiramente convencido que, quaesquer que fossem os naturezas das questões que tivessem de tratar-se, n'uma casa de parlamento, como é a camara dos pares, haveria a prudencia necessaria para as tratar: e triste idéa faria eu do systema representativo, se estivesse persuadido que o silencio era a unica precaução a tomar em questões d'esta ordem.

Eu faço justiça aos meus collegas e entendo que mais que tudo é conveniente tomar a palavra era questões d'esta natureza. Sr. presidente, ao ataque injusto individual, feito em um parlamento estrangeiro, respondeu um portuguez, suppondo que a sua nação tinha sido offendida com as declarações que ali se fizeram, declarações que importavam uma idéa de offensa para o nosso credito, e por isso não admira que elle se ressentisse; com isto não quero dizer, que aquellas declarações importavam um acto de hostilidade, que obrigavam á interrupção das relações entre os dois paizes. Longe de mim similhante idéa, porque eu não posso nunca entender, que seja responsavel um paiz inteiro pela opinião de um dos seus membros. N'este momento, eu podia citar em favor d'esta opinião a apreciação injusta, feita á nossa administração colonial por um dos membros do parlamento inglez; mas tambem n'essa occasião lord Granville, na camara dos lords, fez justiça á nossa reforma fiscal, feita, na provincia de Moçambique, que elle devidamente elogiou. Fallo do decreto de 30 de julho de 1877, decreto que depois foi modificado em 23 de janeiro de 1880, nos quaes ficou sempre bem clara uma disposição, pela qual se prova, que nós na nossa provincia de Moçambique ternos um regimen fiscal mais liberal do que o de uma colonia ingleza proxima.

Nós não seguimos a legislação da possessão do Natal, fomos seguir a do Zanzibar, ainda mais liberal; mas como ia dizendo, nós não podemos considerar uma nação inteira responsavel pela opinião de um dos seus membros, porque até mesmo em Portugal nós acabamos de ver um subdito britannico mostrar-se sensivel aos ataques parlamentares de que fomos objecto.

Até acharemos que as opiniões hostis ás nacionalidades estrangeiras nem na mesma familia encontram solidariedade.

Assim vemos que o distincto orador, John Bright, irmão do deputado Jacob Bright, ha pouco tempo saiu do ministerio por não approvar que se empregasse a força contra o Egypto.

Deixou o seu logar, porque entendeu, que apesar das circumstancias extraordinarias em que estava o Egypto, não devia empregar a força contra aquelle estado.

Já se vê, pois, que nós não devemos tornar responsavel uma nação pela manifestação da opinião de um individuo.

Não se póde por isso deixar de reflectir que se explica que manifestações de opinião se apresentem a favor da revindicação do credito nacional contra accusações infundadas.

Sr. presidente, tem-se visto mesmo fazer a força publica manifestações de opinião em um paiz onde existia o regimen militar perfeitamente estabelecido.

Fallo do imperio de Napoleão III.

N'aquella epocha houve uma reunião de coroneis, que fizeram uma manifestação contra o governo inglez, por este dar asylo aos que elles diziam serem conspiradores e assassinos.

Esta manifestação, de caracter bastante hostil, foi publicada no jornal official Le moniteur, e o governo inglez não se deu por offendido.

E por isto que eu digo, sr. presidente, que me parece que o parlamento só deve ligar consideração ás questões que tenham absoluta importancia para as resolver com vantagem.

Os parlamentos são chamados a desempenhar uma missão bastante importante, de que faz parte a solução do todos os negocios que têem gravidade, e não póde nem deve occupar-se em questões estereis.

Não quero dilatar a discussão, mas seja-me licito dizer, que, na situação em que nos achamos, parece-me que o

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desaggravo a quaesquer offensas recebidas está ainda mais na regularidade do nosso procedimento, do que na violencia das respostas.

Entendo, por exemplo, que a melhor resposta, que nós podemos dar áquelles que nos accusam da nossa má administração no ultramar, é melhoral-a.

Procure-se melhorar aquillo que se reputa em mau estado, e será esta a resposta triumphante a oppôr ás accusações feitas, e proseguindo n'este caminho, cada vez trataremos mais de tirar não só motivos, mas até pretextos, a accusações que nos possam ser dirigidas.

Eu, sr. presidente, sem f aliar em nome de nenhum partido, e por me parecer que todos os partidos precisam de indulgencias, applicarei o que disse ha pouco tempo o ministro da fazenda da Belgica. Aquelle ministro disse: o partido opposto accusa-nos d'isto, nós podemos accusal-o d'es'toutro, e eu o que achava conveniente era que nos arrependessemos todos.

Acho esta opinião tão sympathica e tão judiciosa, porque todos temos cousas de que nos não podemos tornar vaidosos, que espero que o parlamento aproveitará a melhor occasião que se lhe offereça para demonstrar, que o conselho d'aquelle illustre homem d'estado não será perdido, porque todos temos muitas cousas de que nos arrepender.

Conclui.

O sr. Visconde de Moreira de Rey: - Sr. presidente, pedi a palavra para uma simples explicação em resposta ao que disse o sr. Henrique de Macedo.

Começarei, pois, por dizer que estou de pleno accordo com o sr. Carlos Bento, em que não ha paiz livre regido pelo systema representativo, onde, por mais importante que seja qualquer questão, não esteja sempre á altura d'ella a representação nacional; mas s. exa. tambem não ignora, que ha assumptos que embora pareçam insignificantes, assumem de momento para o outro proporções muito grandes.

Sr. presidente, sendo assim, e querendo eu, que o parlamento tome pleno conhecimento de todos os assumptos, não é minha intenção, que sobre um de certa gravidade, como este é, as discussões possam de alguma fórma estorvar a acção do governo.

Por isso, se póde haver inconveniente em que a sessão seja publica, creio que o governo deve pedir ou propor sessão secreta toda a vez, que julgue necessario, porque o que não me parece muito proprio, para nenhum dos membros do parlamento, e ainda menos para áquelles que, como eu, se honram de apoiar o governo, é que elles ignorem em qualquer questão circumstancias cujo conhecimento, seja indispensavel para a justa Apreciação da questão.

Portanto, sem que eu queira discutir qualquer questão que se refira ás nossas colonias, como, por exemplo, a do Zaire, e ainda outras, sem que as queira discutir em sessão publica, eu pergunto ao governo e aos membros da maioria se será conveniente tratar d'essas questões em sessão secreta?

Não tenho divida em dizer que me não. faz boa impressão ver que no parlamento inglez se discute livre e completamente aquillo que no parlamento portuguez parece assumpto prohibido, a ponto de se julgar inconveniente que se lhe faça qualquer referencia.

Esta desigualdade notavel entre dos paizes que se regem pelo mesmo systema, não é de certo a favor de Portugal.

Quanto ás declarações feitas no discurso pronunciado por um membro do parlamento inglez numa das sessões da respectiva camara, em consequencia das quaes appareceu uma carta, parece que de um official portuguez e addido á nossa legação em Londres, e que estão dando logar no paiz a manifestações e a felicitações por, varias fórmas, eu desejo tambem dizer a minha opinião.

Creio que esta questão não tem importancia absolutamente nenhuma.

Todos sabem o que é a liberdade parlamentar. O excesso de qualquer dos. membros de um parlamento é cousa absolutamente indifferente para a responsabilidade collectiva d'esse parlamento.

Supponhamos que um homem mais irascivel ou naturalmente mais apaixonado se excedeu; quem póde querer que o parlamento lhe compartilhe a responsabilidade?

Maior excesso que o d'este deputado inglez houve-o já no parlamento portuguez em relação á Inglaterra. E o que fez em consequencia disso a Inglaterra? Não fez caso nenhum, que é a resposta que um paiz dá a uma opinião isolada.

Eu creio, sr. presidente, que, se isto assim se tivesse considerado desde o principio, se não teria levantado toda esta tempestade num copo de agua.

Parece-me alem d'isso que do extracto da sessão da camara dos communs, em que foi pronunciado o alludido discurso de Jacob Bright, consta que ao discurso d'aquelle deputado se seguiu a declaração do chefe do gabinete inglez, de que eram exageradas as apreciações feitas pelo precedente1 orador a respeito de Portugal.

Ora, sr. presidente, desde que a apreciações falsas ou injuriosas, feitas por um membro do parlamento a proposito de uma nação estranha, o chefe do governo faz logo o correctivo, conveniente, não ha rasão para essa nação se julgar offendida pela nação de que aquelle parlamento faz parte. Portanto, todos os homens que em Portugal pensam com juizo devem estar satisfeitos com isto.

Pois se eu não dou importancia á deliberação de um membro do parlamento inglez, quando ella representa uma opinião isolada, que importancia posso eu dar ao desmentido que qualquer individuo lhe dê!?

Isto, é um facto que póde ter impressionado alguem, mesmo porque os meridionais são facilmente impressionaveis; e mais nada.

Portanto, sr. presidente, se, assim como as pequenas faiscas podem produzir um grande incendio, um pequeno assumpto póde transformar-se em um assumpto de importancia; parece-me conveniente esquecer isto e não lhe ligar a menor importancia.

Se por acaso se vae examinar se a força publica póde ou não representar, vemos que não ha representação nenhuma que deva ser considerada senão como um facto simplesmente particular.

Se o governo, mais directa ou menos directamente, indirectamente mesmo, vae tomar conhecimento d'este assumpto, a suprema insignificancia póde transformar-se em cousa importante.

Deixemos, pois, representar quem representa. Muitos dos que representaram apaixonadissimos, no calor da impressão do primeiro momento, dois dias depois já se riam do enthusiasmo que haviam tido e do motivo que o provocara.

Muitos que fallaram n'um dia commigo enthusiasmadissimos, d'ahi a pouco eram os primeiras a rir não só do facto, mas dos diarios em que foi publicado.

Tratemos, pois, esta questão como ella é,; não, demos importancia ao que não a tem; saibamos que um membro de uma camara electiva ou de um senado de qualquer paiz do mundo póde referisse desfavoravelmente a Portugal sem que este haja de estremecer; e que póde tambem um membro de qualquer das nossas camaras legislativas referir-se com desfavor ao governo de algum paiz estrangeiro, porque todos sabem que para estes abusos parlamentares ha sempre um correctivo que é licito, visto que não póde usar-se da palmatoria nem impedir-se a manifestação do pensamento por meio, da palavra. Para corrigir esses abusos basta uma simples advertencia do presidente da camara ou de qualquer dos membros do governo.

Não ha paiz que se preze e tenha condições para ser paiz, que tome por injuria um excesso que, se vae prejudicar alguem, prejudica apenas o individuo que d'elle é auctor.

Limito a este ponto as minhas reflexões.

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Em relação á questão colonial, repito que me parece grave. Se alguma circumstancia importante sobrevier, terei a honra de propor n'esta camara uma sessão secreta em que pergunte, com a franqueza que costumo usar e sem que possam impugnar o meu pedido com as considerações de, negociações pendentes ou de inconvenientes que possam resultar da discussão, qual é a verdade dos factos que julgo indispensavel conhecer-se.

A publicidade é sempre util para o cidadão do paiz livre, e é realmente indispensavel para qualquer representante da nação, que não póde resolver de surpreza nenhum assumpto de que não tenha conhecimento.

(O digno par não reviu o seu discurso.

O sr. Henrique de Macedo: - O sr. presidente do conselho é, sem duvida, um parlamentar habil e consummado; se por acaso, quando ha pouco fallei, notei que 8. exa. perdera a força moral e a energia propria e indispensavel para governar bem em circumstancias difficeis, o que eu não lhe negaria nunca é a sua habilidade parlamentar.

Do calor com que ha pouco fallei, e dalgumas palavras que por ventura proferi sem intenção reservada, deduziu logo s, exa. que eu pretendia fazer uma questão politica, e procurou tirar disto o partido que póde; mas nada mais facil do que destruir-lhe a hypothese, que s. exa. architectou, pois facilmente se comprehende que, se eu quizesse fazer questão politica, não teria terminado ha pouco, dizendo que estava prompto a acompanhar s. exa. no intuito de acabar com esta anarchia que lavra em todos os ramos de serviço publico, e teria concluido por mandar para a mesa uma moção; desde que não fiz isto, é claro que não tive intenção de fazer questão politica, e mesmo pela importancia e gravidade do assumpto não podia estar no meu intento levantal-a.

Mas s. exa. é que, provavelmente, vendo-se mal collocado na posição em que estava, e sendo habil como é n'estas questões parlamentares, chamou a si a sua maioria, acercou-se d'ella, e quiz fazer-lhe ver que tinha descoberto uma questão politica, onde não havia outra cousa mais do que uma simples pergunta.

Devo tambem dizer que o motivo, por que me não dei por satisfeito com a resposta de s. exa., é porque tendo-se passado o facto ha mais de oito ou dez dias, e apparecendo nos jornaes differentes noticias sobre o assumpto, não é licito que o governo não esteja convenientemente informado para responder a qualquer membro do parlamento que o interrogue a tal respeito.

Não podia, pois, satisfazer-me a resposta de s. exa.

Disse o digno par e meu- amigo, o sr. visconde de Moreira de Rey, que não deviamos dar importancia a esta questão, porque vae prender com a questão colonial.

Não quero discutir agora a questão colonial; mas se o quizesse fazer discutil-a-ía em sessão publica, prescindindo das considerações de reserva que não foram adoptadas no outro parlamento.

Tratei unicamente da carta do sr. major Quillinan, cujo merecimento não avaliei, e do facto de se fazerem manifestações da força publica, collectivas, que eu reputo contra a disciplina militar, e perguntei ao sr. presidente do conselho se tinha conhecimento d'essas manifestações e se as reprimira pelo caracter que tinham, e isto não tem analogia nenhuma com a questão colonial. Tratei tambem de demonstrar a anaachia que lavra em todos os serviços publicos, começando por notar o que se está passando com a execução do regulamento do imposto do sal.

Sr. presidente, eu o que admiro é que estando annunciada na outra casa do parlamento uma interpellação sobre este assumpto, que é importantissimo, o sr. presidente do conselho não se dignasse ainda dar-se por halilitado para responder a ella, o que me colloca na obrigação de mandar para a mesa uma nota igual áquella. Espero que s. exa. sobre esta interpellação se ha de dar muito brevemente por habilitado a responder, e que ha de dizer a v. exa. que a de para ordem do dia.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros: - Hoje mesmo, se s. exa. quizer.

O Orador: - Mas, se s. exa. me dá o dia de hoje, eu peco o de amanhã ou emfim o da proxima sessão, e trarei então todos os apontamentos que me são necessarios, e que não tenho presentes, e então demonstrarei cabalmente que a anarchia não é tão insignificante como s. exa. assevera.

(O digno par não reviu e seu discurso.)

O sr. Franzini: - Mando para a mesa o parecer n.° 170, da commissão de marinha, sobre o projecto de lei n.° 176, relativo á fixação e distribuição da força naval no anno economico de 1883-1884.

Foi a imprimir.

O sr. Visconde de Moreira de Rey: - Pedi a palavra simplesmente para uma explicação. Eu não disse, como pareceu ao digno par, o sr. Henrique de Macedo, que o incidente da carta prende com a questão colonial. Eu exprimo-me mal, mas tenho a vantagem, com que a natureza me dotou, de ter uma organisação bastante robusta para poder repetir diversas vezes as minhas palavras, a fim de que não possa haver duvida na sua verdadeira interpretação.

Eu disse, pois, que a opinião individual de um membro do parlamento, em relação ao paiz, é uma verdadeira insignificancia, e é evidente que eu não podia confundir uma insignificancia com a questão colonial que reputo da maxima importancia e gravidade para este paiz.

Tomei nota da declaração do digno par e meu amigo, o sr. Henrique de Macedo, declaração que não tem apenas um valor individual, e que importa a opinião do partido politico a que s. exa. pertence, de que não discute a questão colonial.

O sr. Henrique de Macedo: - N'este momento.

O Orador: - De certo que a não podia discutir n'esta occasião; nem a discussão de qualquer assumpto, n'uma assembléa politica d'esta ordem, depende apenas da vontade de qualquer dos seus membros.

O sr. Henrique de Macedo: - Pois eu declaro que não quero discutir a questão colonial n'este momento.

O Orador: - Mas é preciso que s. exa. saiba que uma discussão qualquer não se ventila pela exclusiva vontade de um só membro da camara; e que é indispensavel que a maioria permitia que se trate esta ou aquelle assumpto, consoante ás praxes regimentaes.

O sr. Henrique de Macedo: - É claro que eu dizendo "não quero" o dizia no sentido legal ou regimental.

O Orador: - Estamos de accordo. O digno par declara que não discute a questão colonial n'esta occasião, e que trata apenas do incidente Quillinan. Pois eu, que apoio o governo com a maior dedicação, não hesito em declarar-lhe que desejo e quero tratar a questão colonial.

O sr. Henrique de Macedo: - Tambem eu quero.

O Orador: - Mas não quer n'este momento, e antepõe a uma questão gravissima, a um assumpto da maior magnitude, áquillo que se discute como questão importante no parlamento inglez, áquillo em que meditam todas as potencias civilisadas, e sobre o que é indispensavel tambem a opinião do parlamento portuguez, uma opinião isolada e sem importancia.

O sr. Henrique de Macedo: - V. exa. dá-me licença. Eu não discuti a questão Quillinan, discuti as manifestações collectivas.

O Orador: - Eu lá vou.

Pois se nós estamos de accordo em que áquella carta é um acto exclusivamente particular, por quanto ninguem deu ainda áquella carta, nem podia dar-se em bom juizo, fôros de representação nacional, pergunto ao digno par o sr. Henrique de Macedo, cuja sciencia eu aliás respeito muito, em que paiz do mundo está prohibido á força publica o direito de manifestar-se sobre um acto puramente particular.

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Pois quando como, por exemplo, a morte de um homem, uma desgraça qualquer que nada tem de politica ou mesmo uma calamidade publica, provocam diversas manifestações, ou lamentando o facto ou minorando a miseria que d'elle resulta, são porventura prohibidas as manifestações collectivas ou individuaes da força publica?

Quanto a mim o que a força publica não póde é representar collectivamente contra os actos do governo, contra os actos dos poderes constituidos, isto entende-se; agora que os membros da força publica manifestem a sua sympathia com respeito a um acto exclusivamente pessoal, que nada tom com a representação do paiz, não é cousa que se possa prohibir.

Sr. presidente, valem pouco ou nada as palavras que pronunciei, mas tenho a consciencia de que toda a questão não vale uma só dessas palavras,

(O digno par não reviu este discurso.)

Leu-se na mesa a nota de interpellação apresentada pelo sr. Henrique de Macedo, que é do teor seguinte:

Nota de interpellação

Desejo interpellar o sr. ministro da fazenda ácerca da legislação tributaria do sal.

Sala das sessões, em 21 de abril de 1883. = O par do reino, Henrique de Macedo.

Mandou-se expedir.

O sr. Presidente: - A primeira sessão terá logar na proxima terça feira 24 do corrente, sendo a ordem do dia o parecer que hoje foi mandado para a mesa, o qual vae ser impresso e distribuido pelos dignos pares, e, alem disso, a apresentação de pareceres de commissões.

Está levantada a sessão.

Eram tres horas e tres quartos da tarde.

Dignos pares presentes na sessão de 21 de Abril do 1883

Exmos. srs. João de Andrade Corvo; Marquezes, de Ficalho, de Penafiel; Condes, de Alte, de Castro, de Gouveia, de Cabral, da Praia e de Monforte; viscondes, de Alves de Sá, da Azarujinha, de S. Januario, de Seabra, de Soares Franco, de Villa Maior, de Bivar; Ornellas, Quaresma, Sousa Pinto, Barros e Sá, D. Antonio de Mello, Henriques Secco, Fontes Pereira de Mello, Telles de Vasconcellos, Palmeirim, Carlos Bento, Montufar Barreiros, Henrique de Macedo, Jeronymo Maldonado, Aguiar, Mártens Ferrão, Pereira de Miranda, Gusmão, Castro, Ponte e Horta, Silvestre Ribeiro, Mendonça Cortez, Costa e Silva, Bocage, Franzini, Placido de Abreu, Calheiros, Vicente Ferrer, Seiça e Almeida, Pinto Basto, Vaz Preto, Margiochi, Francisco Cunha.

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