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extracto da sessão de 17 de março. Presidencia do Em.mo Sr. Cardeal Patriarcha. Secretarios os Sr.s V. de Gouvêa.

V. de Benagazil.

(Assistiam os Srs. Presidente do Conselho, e Ministros da Marinha, Justiça, e dos Negocios Estrangeiros.)

Pela uma e meia hora da tarde, tendo-se verificado: a presença de 42, D. Pares, declarou o Em.mo Sr. Presidente aberta a Sessão. Leu-se a Acta da antecedente, contra a qual não houve reclamação. Não houve correspondencia. O Sr. V. de SÁ — Depois de mandar para a Mesa um requerimento, o qual pediu que ficasse para segunda leitura, convidou a Commissão encarregada de examinar o Projecto de Lei dos pesos e medidas, que desse quanto antes o seu parecer, porque se nesta Sessão se não tractar desse objecto, como ella é a ultima da actual Legislatura, será necessario renovar a Proposta para a outra Legislatura, e haver uma nova discussão na Camara dos Srs. Deputados.

S. Ex.ª aproveita esta occasião para prevenir o Sr. Presidente do Conselho de que brevemente hade trazer á Camara um Projecto de Lei para os melhoramentos da Cidade de Lisboa, e com especialidade para a construcção do Caes da Boa Vista; e que nessa occasião mandará ao Sr. Ministro um exemplar desse Projecto.

Faz igualmente algumas considerações em apoio da proposta, que nesta occasião manda para a Mesa, e que é concebida nos seguintes termos:

«Proponho que a Commissão especial para examinar o Projecto de Lei eleitoral seja nomeada pelo Sr. Presidente, e seja composta de quatro Membros da maioria, e de tres Membros da minoria. — Sá da Bandeira. O N. Orador entende tambem que, attenta a gravidade do objecto que a Lei eleitoral tem de regular, e a importancia, toda especial desta Lei, que bem se pó se chamar a primeira das Leis orgânicas, grande conveniencia haveria em que a Camara adoptasse um modo especial de a discutir, affastando-se para isso das regras estabelecidas no Regimento (Sussurro); e seguindo a pratica usada no Parlamento inglez; e para esse fim manda para a Mesa uma proposta, que leu.

Tanto os requerimentos, como esta proposta ficaram para segunda leitura; e não foi admittida a outra, que vai transcripta.

O Sr. Silva Carvalho mandou para a Mesa um requerimento de João Galvão Mexia de Sousa Moura Telles e Albuquerque, em que pede que o mesmo se junte ao de João Galvão Mexia de Sousa Mascarenhas, que pende nesta Camara, para serem ambos tomados em consideração, quando se houver de resolver o objecto sobre que versam.

foi remettido á Commissão Ecclesiastica e de Instrucção Publica.

O Sr. C. de Lavradio — Sr. Presidente, tenho presente uma carta do Sr. C. de Peniche, Governador Civil de Evora, na qual S. Ex.ª parece notar algumas inexactidões nas observações que fiz aqui sobre os desgraçados acontecimentos de Portel. A imparcialidade exige que a Camara consinta que eu lêa a parte desta carta, era que se notam essas inexactidões (leu).

«Meu Tio e Sr. == Tenho lido no Diario do Governo as allusões feitas per V. Ex.ª na Camara dos D. Pares, aos factos occorridos na Villa de Portel nos dias 14 e 15 do mez passado, e vejo com bastante magoa, que as mãos informadores tem collocado a V. Ex.ª e a mim, em uma posição pouco lisongeira: a V. Ex.ª por ter avançado inexactidões, a mim por ter sido apresentado ao paiz um funccionario menos zeloso no desempenho de seus deveres. Estou convencido de que V. Ex.ª procedeu com a melhor boa fé, acreditando como verdadeiras as informações que o não eram, e é por isso que em logar de responder a V. Ex.ª pela Imprensa, por onde fui censurado appellando para o cavalheirismo de V. Ex.ª, prefiro por meio de uma carta particular, offerecendo-lhe uma narração exacta dos factos que V. Ex.ª com inexactidão referiu, para que V. Ex.ª com ella possa reparar o desconceito, que na opinião publica a ambos nos ha de ter occasionado a infidelidade das informações dadas a V. Ex.ª

«Na Sessão de 20 de Fevereiro apresentou V. Ex.ª informação, de que o aggressor tinha sido o homem criminoso, isto é Joaquim Antonio Bati talha, quando as provocações eram de ha mui tos dias feitas a este por Antonio Joaquim Peres, official de caldeireiro. Na mesma Sessão diz V. Ex.ª que não foi poupado o digno e virtuoso Ecclesiastico, quando fóra ministrar os soccorros espirituaes ás victimas; porém o Parocho no momento da minha partida de Portel ficava incolume, sendo até o ultimo de quem me despedi.

«Na Sessão de 22 refere V. Ex.ª crimes commettidos na Villa de Frades, de que me não faço cargo, por não pertencer a dita Villa ao Districto que administro, mas é corto, que dizendo-se elles commettidos na distancia de 4 legoas de Evora, e no dia 18, são hoje aqui tidos por uma ficção. Diz V. Ex.ª na mesma Sessão, referindo-se ao V. de Algés, que o Administrador do Concelho de Portel deu parte das malfeitorias do Batalha, e por não ser attendido pedíra a sua dimissão; e que depois lhe cortaram duzentos pés de oliveiras. Esta accusação fere-me injustamente. O Administrador não me fez uma queixa contra Batalha, dava-se por amigo delle, e em algumas cousas se utilisava do seu préstimo. O corte das oliveiras era por elle attribuido aos parentes de um recruta, que elle prendeu para servir no Exercito; e offerecendo ao Administrador a força publica para perseguir os culpados deste crime, recusou-a como desnecessaria em Officio de 20 de Dezembro, que tenho á vista. Nem se diga que o Administrador pediu a dimissão por se lhe não darem as providencias que pedíra; as suas exigencias a mim dirigidas foram sempre satisfeitas, e os fundamentos com que pediu a dimissão foram a incompatibilidade com outros empregos de que não póde prescindir, e a falta de «capacidade para exercer o cargo administrativo. « Accresce alem disto, que até á morte do Batalha nenhum cavalheiro de Portel me dirigiu uma só queixa contra os excessos delle.»

Sr. Presidente, a respeito de quem foi o aggressor, é provavel que o Sr. Governador Civil esteja mais bem informado do que eu, nem me parece materia que deva agora discutir-se nesta Camara, pois é já do dominio do Poder Judicial. Quanto ao Ecclesiastico assassinado, eu não disse que foi o Parocho, disse só que um Ecclesiastico quando ia administrar os soccorros espirituaes ás desgraçadas victimas fóra morto. Nesta parte enganei-me: esse Ecclesiastico foi morto, segundo depois fui informado, em sua casa, e não no acto de prestar os soccorros da religião. Além disso devo accrescentar — que tenho aqui um relatorio das medidas tomadas pelo Governador Civil, e devo dizer que ellas me pareceram acertadas, e que S. Ex.ª fez o que podia.

Comtudo a desordem continuou, e eu tenho aqui varias cartas de Portel, e em uma dellas, recebida hoje, refere se me um novo assassinato; porém não me atrevo a lê-la, porque não está assignada, e por isso não sei que valor devo dar-lhe (O Sr. Presidente do Conselho — Já o Sr. V. de Algés fez essa communicação.) O que me parece justo dizer é, que o Sr. Governador Civil de Evora tem feito quanto lhe é possivel para cumprir o seu dever.

Em uma segunda carta que S. Ex.ª me escreveu, invoca o testimunho das pessoas mais respeitaveis de Portel, taes como os irmãos do respeitavel e infeliz Sr. Derramado, e de D. Sebastião Gil de Macedo, cavalheiro bem conhecido daquella terra; e, portanto, estou convencido, torno a repetir, S. Ex.ª fez quanto podia fazer, mas é indubitavel que a ordem ainda alli não está restabelecida (O Sr. Presidente do Conselho — Em Portel está restabelecida). Dentro da Villa creio que sim, mas fóra da Villa ainda ha um bando de assassinos que ataca os povos das visinhanças.

O Sr. V. de Algés — Peço a palavra.

O Sr. Presidente — Tem a palavra.

O Sr. V. de Algés — Disse que o D. Par, o Sr. C. de Lavradio, na leitura do documento, que tinha na mão, se referira a elle Orador; que o Cavalheiro, que occupava o cargo de Governador Civil de Evora, escusava attribuir-lhe o que escrevera naquelle documento; porquanto, o que elle Orador tinha dito a tal respeito, estava escripto no seu discurso, que se achava impresso; que melhor seria, que o Governador Civil se occupasse de suas obrigações, do que de escrever asserções inexactas; taes como que elle Orador havia dito que o Administrador do Concelho de Portel tinha pedido a sua dimissão por medo do Batalha; o que era mais para dizer-se do que para se escrever. Que elle Orador dissera somente, que aquelle Administrador substituto allegara a sua falta de conhecimentos, e outras circumstancias que lhe não permittiam o desempenhar dignamente aquelle logar, sem comtudo dizer que lhe tinham queimado as oliveiras, ou que tinha receios de ninguem.

Notou, que o Sr. C. de Lavradio, quando o Governador Civil se referira ao que elle Orador havia dito, deveria remette-lo para o seu discurso impresso, aonde acharia o que, elle Orador, effectivamente dissera; isto é, que aquelle Administrador pedíra a sua dimissão por motivos justos; e os seus receios, se os communicou a alguem, isso não tem nada com o seu Requerimento.

Concluiu declarando, que entendêra dever apresentar áquellas observações, não obstante o Sr. C. de Lavradio ter, por mera condescendencia, feito esta communicação.

Primeira parte da ordem do dia.

Eleição da Commissão especial para examinar o Projecto de Lei eleitoral.

Fez se a chamada dos D. Pares presentes, e tendo entrado na uma 51 listas, corrido o escrutinio, sairam eleitos os D. Pares: Srs. F. Magalhães, com 47 votos; V. de Sá da Bandeira, 47; Tavares Proença, 31; V. de Laborim, 29; Silva Carvalho, 29; Duarte Leitão, 28; e V. de Castro, 27.

Segunda parte da ordem do dia.

Continuação da discussão do Parecer da Commissão sobre o requerimento do Sr. M. de Vallada. O Sr. V. de Algés — Sr. Presidente, na minha longa carreira parlamentar nunca me encontrei n'uma situação mais melindrosa do que hoje! Assombrado sempre pela falta de conhecimentos proprios para entrar nos debates parlamentares sobre materias importantes, hoje é muito peior ainda a minha condição, porque tenho de foliar depois desta Camara ouvir os discursos eloquentíssimos dos oradores que me precederam; e tenho de fallar era um estado de saude para mira tão oppressivo, que mal posso pronunciar as idéas que tambem só a custo posso conceber. Mas, Sr. Presidente, a isto é obvia a reflexão que se deveria dirigir-me: — mas para que pediste a palavra, e para que usas della? — Sr. Presidente, por dois motivos, porque pedi a palavra, já agora poderia eu ceder do usar della, mas existe ainda um terceiro que me resolve e obriga a entrar nesta discussão. Quando pedi a palavra ainda não tinha ouvido os discursos de dois Oradores daquelle lado da Camara, que seguem as minhas opiniões; e tambem ainda não estava doente, pelo que eu deveria agora ceder da palavra; mas ainda existe outro motivo, que me obriga a fazer o esforço de dar a razão da minha opinião sobre a maioria que se discute, e consiste na pratica que constantemente tenho observado no Parlamento, de não dar o meu voto silencioso em qualquer materia importante, mas de fundamentar sempre a minha opinião, e expressar os motivos era que assenta o meu voto: é isto pois que me obriga a usar da palavra, e peço sobre tudo á Camara que me conceda a sua costumada indulgencia.

Sr. Presidente, antes de entrar na discussão de materia tão grave e importante, como aquella que nos occupa, desejo primeiro que tudo firmar a competencia da Camara; e digo que desejo firmar esta competencia, porque tenho ouvido algumas opiniões sobre este objecto, e de ambos os lados da Camara, com as quaes não concordo. Ouvi a alguns dos illustres oradores, que me precederam que nós devemos tractar este negocio como juizes — e eu não estou de accôrdo com S. Ex.ª, visto que não declararam a qualidade de juizes que somos nesta questão. Se S. Ex.ª tivessem declarado que intendiam a sua asserção n'um sentido mais lato e generico, eu concordaria com S. Ex.ª; mas como não o disseram assim, e ouvi a voz de um illustre Orador do lado direito, que chamou ao parecer da Commissão um libello, eu desejo explicar-me sobre a qualidade de juizes que nos compete. Juizes, no sentido stricto, para proferirmos uma sentença, de certo não somos, pois que para sermos juizes no sentido rigoroso de direito era necessario que a Camara se constituisse em Tribunal de Justiça, e que proferisse sua sentença, guardadas as formulas e solemnidades legaes do processo, e com as devidas garantias, sendo principal a audiencia do réo: e por tanto não é na qualidade de juizes verdadeiramente taes que devemos decidir esta questão. Mas póde objectar-se-me, que se não é na qualidade de juizes, nem de legisladores, porque nós não estamos discutindo um Projecto do Lei, qual é a attribuição que tem a Camara dos Pares para decidir esta questão? Responderei, que temos jurisdicção e competencia para a resolver por aquelle principio que é proprio e inherente á structura dos Corpos collectivos, que tem o direito de examinar e reconhecer as circumstancias daquelle que se apresenta com a pretenção de fazer parte dessa Corporação; e é este mesmo o direito que pertence a esta Camara quando se apresenta alguem que pretende tomar assento nesta parte do Parlamento; e então somos os competentes para decidir este negocio, á similhança da verificação de Poderes que exerce a Camara dos Srs. Deputados sobre a legalidade dos Eleitos (Apoiados). Por tanto não é como juizes verdadeiramente taes, nem como legisladores que devemos decidir este negocio (Apoiados); mas esta especialidade de julgadores ainda exige de nós, se é possivel, maior escrupulo, e circumspecção (Apoiados). Firmada assim, na minha opinião, a competencia da Camara para decidir o objecto de que se tracta, segue-se expor qual elle seja. O objecto que nos occupa é a pretenção de um titular, que sendo o filho varão, unico, e legitimo de outro titular, que foi Par do Reino, o que tendo chegado á idade legal para lhe succeder, apresenta os documentos que provam a sua habilitação o condições, segundo a Lei, para tomar assento nesta Camara, e pede se lhe dê o logar que lhe pertence.

Já se vê, Sr. Presidente, que esta pretenção é

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fundada em direito constitucional, porque a Carta no artigo 39.° diz que o paria-lo é hereditario; e na lei especial que regula o modo de succeder nelle, a qual confere direito, o chama o filho legitimo e primogenito do pai fallecido. Mas, Sr. Presidente, á pretenção de que actualmente nos occupamos obsta o parecer da illustre Commissão, em que se estabelecem os principios, pelos quaes se deduz que o pretendente não tem direito a succeder no pariato a seu pai. Ainda que eu já fiz vêr á Camara, segundo a minha humilde opinião, que nós não somos juizes verdadeiramente taes, com tudo como um D. Par, illustre jurisconsulto, e meu amigo disse, que o parecer da Commissão era um verdadeiro libello sobre o qual nós tinhamos de assentar a nossa sentença.

O Sr. Visconde de Laborim — Peço licença para dizer a V. Ex.ª que isso não é exacto: — eu chamei libello por comparação, e não disse que era um verdadeiro ou rigoroso libello, nem tal podia dizer.

O Orador continuando: — Muito bem, acceito a explicação, e eu mesmo previ que S. Ex.ª só por figura é que o disse; mas eu quero aproveitar a mesma figura para offerecer a contrariedade, a esse figurado libello a que S. Ex.ª se referiu (Apoiados).

Sr. Presidente, no parecer da Commissão pretende-se mostrar que não existe direito no Sr. Marquez de Vallada, porque se nega que o tivesse seu pai para lho transmittir; e eu combatendo o parecer da Commissão pretendo demonstrar duas proposições: a primeira é, que não estou de perfeito accordo com o parecer da illustre Commissão quando dá absolutamente por extincto todo o direito dos antigos Pares, que assignaram a representação em casa do D. de Lafões: — mas concedendo, o que nego, que esse direito esteja extincto, pretendo mostrar, e esta é a segunda parte da minha these, ou segunda proposição, que não podia isso prejudicar ao pretendente de que se tracta.

Sr. Presidente, não é por adulação nem por lisonja que eu assevero prestar homenagens aos talentos e illustração de todos os DD. Pares membros da Commissão, e igual homenagem presto ao D. Par o Sr. Visconde de Laborim, que deffende o mesmo parecer, pois que é dever, convicção minha o reconhecer em SS. Ex.ª todas as qualidades merecedoras de respeito e consideração; mas, Sr. Presidente, com quanto seja difficil e penosa a minha situação, porque tenho que combater com jurisconsultos tão exímios, é com tudo forçoso entrar no combate, desigual pela mingoa de meus cabedaes, porque tenho de expender as razões e principios em que fundo a minha opinião; e a despeito de prever o resultado, que é o de ficar vencido pelos Oradores meus adversarios, fortifica-me o animo a consideração de que em meu soccorro virão as fortes razões e solidos argumentos dos D. Pares que combatem pelo meu lado, e eu entoarei a victoria que SS. Ex.ªs alcançarem em que os acompanho com os meus desejos (Muito bem).

Sr. Presidente, a illustre Commissão produzem diversos argumentos os motivos pelos quaes intende que falta o direito ao pretendente para succeder no pariato a seu pai. A primeira destas razões ou motivos consiste em haver o fallecido M. de Vallada assignado a representação da Nobreza em casa do D. do Lafões; e a esta razão accrescenta a illustre Commissão a de haver tambem concorrido com a sua assignatura no Assento dos tres Estados. Ora, pelas culpas, e pelos crimes que em consequencia destas duas assignaturas se attribuem a esses que as fizeram, e que então eram Pares, e na presença do que dispoz o Decreto de 28 de Maio de 1834, diz a illustre Commissão, que o pretendente de que se tracta perdeu todo o direito ao pariato.

Eu quero, com a devida venia á Commissão, rectificar algumas expressões do Parecer, porque intendo que elle não esta conforme com a lettra do documento a que o mesmo Parecer se refere; porquanto, Sr. Presidente, sendo a Lei que deve regular este negocio o Decreto de 28 de Maio de 1834, e nada mais, eu sinto ter de observar, que a Commissão em logar de appellar só para o conteudo na representação feita em casa do D. de Lafões, que e unica e exclusivamente ao que se refere o Decreto de 28 de Maio de 1834, chamasse tambem para a questão a responsabilidade das assignaturas postas no Assento dos Tres Estados (Apoiados). E ainda, além disso, desejava rectificar em outro ponto a redacção do Parecer, porque elle põe na bocca dos Pares daquelle tempo, o que é só conclusão do Parecer da Commissão.

Eu peço á Camara que preste a sua attenção ao que se diz no Parecer (leu). Ora, a quem lêr isto parecerá que foram os proprios Pares que fizeram esta declaração no papel que assignaram; mas quem lêr a sua representação não acha lá nada disto, nem podia achar; porque na representação feita na casa do D. de Lafões figurou a Nobreza toda, e não os Pares sómente, e nesta qualidade: e no Assento dos tres Estados, figuraram todos quantos alli foram chamados, e que não era só a Nobreza, nos tambem o Clero, e o Povo. Digo pois, que sendo a Lei que temos de intender e applicar o Decreto de 28 de Maio, o qual só tem referencia á assignatura feita em casa do D. de Lafões, é evidente que em presença da lettra desse Decreto não se póde imputar tambem aos Pares daquelle tempo nada do que se acha no Assento dos tres Estados, porque aquelle citado Decreto em nada se refere a esse Assento (Apoiados); e alem disto convem ter em vista que em nenhum destes documentos se encontram as expressões que se fecham no Parecer da illustre Commissão, com uma redacção que litteralmente inculca que foram as proprias declarações dos Pares a que se refere.

Mas, Sr. Presidente, como o texto principal a que se soccorre o Parecer da illustre Commissão, é o Decreto de 28 de Maio de 1834, é necessario que o analysemos como Jurisconsulto, e com todas as regras da hermeneutica logica, e da hermeneutica juridica, proprias em lai exame.

O illustre Relator da Commissão, em uma das partes do seu discurso apostrofou, que não sede signassem como Lais injustas, as que eram Leis do paiz, porque se tal se fizesse, levar-nos hia isso a terriveis e fataes consequencias. Eu estou, a este respeito, de completo accôrdo com S. Ex.ª, e ainda acrescento, que isso deporia contra quem assim procedesse, porque tendo a iniciativa para apresentar a sua proposta de reforma dessas Leis, cedia de um direito para praticar um abuso. Mas, Sr. Presidente, não pugna conego esta observação, porque eu intendo que o Decreto de 28 de Maio de 1834, foi justo, politico, e absolutamente necessario naquella época.

Eu creio firmemente que o Augusto Imperador de saudosa memoria, não podia achar no Seu Conselho um só voto em contrario sobre a adopção daquella medida: mas porque ella foi justa e politica em tal conjunctura e circumstancias, nem por isso se segue que não fosse provisoria, mas sim permanente (Apoiados).

Que era justo e necessario não dar entrada então nesta Casa aos Pares do Reino, que tinham assignado a representação em casa do D. de Lafões, isso não haverá quem com fundamento, o contrarie: porquanto, Sr. Presidente, seria compativel com as circumstancias daquelle tempo, que tractando-se de plantar um systema novo, ainda sobre resistencias do antigo, se desse entrada nesta Camara a esses que em maioria haviam de oppôr-se com todas as suas forças ao necessario desenvolvimento das idéas liberaes? Ninguem sustentará a affirmativa: e em igual grau de evidencia me parece poder avançar, que as circumstancias do paiz não comportavam então, que se fizesse uma nomeação de Pares, em numero sufficiente para inutilizar os exforços dos dissidentes.

Portanto, justificado foi o motivo, porque o Imperador impediu que continuassem a funccionar aquelles Pares: mas essa medida provisoria deve por ventura considerar-se definitiva, e permanente? Intendo que não (Apoiados), e intendo que não pelos motivos que vou apresentar á consideração da Camara.

Sr. Presidente, um dos primeiros exames a que deve proceder o Jurisconsulto, tractando-se de entender e applicar a disposição de qualquer Lei, é ver qual foi o seu fim principal, e bem assim os motivos, e bases de suas prescripções. Applicando esta regra de hermeneutica juridica vejamos qual fosse o fim e motivo do que dispõe o Decreto de 28 de Maio de 1834. Este Decreto foi principalmente estabelecido para a convocação das Côrtes de 1834, e como medida para esse fim necessaria determinou, que na Camara dos Pares não tomassem assento aquelles que haviam assignado a representação da Nobreza em casa do Duque de Lafões. (Leu a parte correspondente do Decreto.)

Vê-se pois que foi uma medida de necessidade, e transitória; e vê-se tambem que se acaso o Imperador, como fim principal, concebesse a idéa de effectivamente demittir Pares do Reino, não deixaria de o fazer em documento especial, como o exigia a magnitude do objecto, para só estabelecer como medida complementar do fim do Decreto a inhibição de tomarem assento aquelles Pares (Apoiados). É tambem de notar que a expressão = não tomar assento = com relação a Pares que ainda não tivessem funccionado, póde entender-se, que seria priva-los de uma posse o exercicio que confere o verdadeiro direito; mas applicada a Pares que já o eram effectivos, o que importa na censura de direito é = suspensão — (Apoiados). Outra razão encontro eu ainda na consideração de que despojar do direito do Pariato aquelles que o não podiam perder senão por uma sentença é alem de contravenção dos principios, e preceitos communs a respeito de Empregados perpetuos, a violação de uma prescripção mais sagrada, porque sendo o Pariato a parte de um Poder politico do Estado, com attribuições co-legislativas, e sendo as funcções dos Pares o exercicio de um direito politico e individual desses cidadãos, era essa uma prerogativa constitucional, que não podia perder-se senão pelos meios que a Carta estabelece nos artigos 140 a 144 (Apoiados. — Leu). Logo esse direito constitucional não se póde perder por um acto simplesmente dictatorial, o sim em virtude de uma sentença dada pela fórma que a Carta estabelece (Apoiados).

Ainda tenho outro argumento que concorre no sentido da minha demonstração. É outra regra de bem entender a Lei a confrontação de suas disposições, ou logares parallelos e similhantes; e por tanto examinemos o que mais se acha estabelecido no Decreto de 28 de Maio de 1834, com verdadeira applicação do preceito a que me refiro. Esse Decreto diz que tomarão sómente assento na Camara aquelles Pares, que se conservaram sempre fieis ao solemne juramento que haviam prestado á Carta Constitucional da Monarchia Portugueza, e que não assignaram como outros a representação sellada com o cunho do perjúrio, dirigida ao ex-Infante D. Miguel, para que se abolisse a Carta Constitucional, e se consummasse a usurpação, etc.... Os Pares que assignaram esta representação ficaram impedidos de poderem entrar nesta Casa; mas, accrescenta o mesmo Decreto — e por quanto alguns destes (que assignaram a representação) adheriram depois á causa da legitimidade em 24 de Julho de 1833, havendo um de entre elles que emigrou para paizes estrangeiros. Sou servido declarar que ácerca de uns, e de outros as Côrtes decretarão o que mais justo lhe parecer: — pois então se este Decreto é reputado com força bastante para definitivamente tirar a dignidade de Pares aos individuos que tinham assignado a representação em casa do Duque de Lafões; se a disposição do Decreto, segundo o parecer da illustre Commissão, não fez mais do que reconhecer a formal renuncia que do Pariato fizeram aquelles signatarios, se elles por seu procedimento, ipso facto, perderam a dignidade de Pares, como é que o Decreto a resuscita a favor daquelles que adheriram á causa da legitimidade em 1833? Que modo é este do crear novos Pares? Pois esse Decreto é uma verdadeira sentença, pela qual certos Pares foram privados da dignidade a que tinham sido elevados, e apesar de todos terem o mesmo crime, podia, e quereria o Imperador crealos novamente Pares? Com que direito o faria por modo indirecto, e de excepção? Só porque tinham adherido á causa da liberdade?... Não, Senhores, é porque o Imperador conheceu que só os suspendia do exercicio de Pares e nada mais, e este é o modo e unico pelo qual se póde entender o pensamento daquelle Decreto, e explicar suas disposições sem contradicção entre si (Apoiados). Mas não foram ainda aqui os meus argumentos, e se sou prolixo em adduzi-los perdoe-me a Camara, porque a minha profissão é de jurista, e como tal devo recorrer aos argumentos de hermeneutica juridica. Se pois eu achar que algum dos Ministros que referendaram aquelle Decreto segue a minha opinião sobre a intelligencia que lhe dou, terei demonstrado por um modo muito competente que é exacta a minha interpretação. Um dos Ministros referendários do Decreto de 28 de Maio de 1834 é o D. Par, o Sr. Silva Carvalho, cuja capacidade, e virtudes eu muito respeito, e que não ha ninguem que deixe de ss reconhecer; pois é a opinião de S. Ex.ª que eu chamo em meu apoio. Eu vou dar conhecimento á Camara do que encontro no Diario desta Camara de 1842 a pag. 40, por occasião em que aqui se discutiu a pretenção ao Pariato do Sr. Conde de S. Lourenço, disse o D. Par Sr. Silva Carvalho Mas, Sr. Presidente, ora muito cedo (com referencia a 1834) os males da usurpação ainda não tinham acabado inteiramente, as feridas ainda o gotejavam sangue; e por isso era necessario de morar o ingresso de taes individuos para algum tempo, mais tarde (Apoiado). Como era muito cedo! Refere se ao anno de 1834 1 Que era necessario demorar o ingresso daquella individuos para algum tempo, mais tarde! Isto disse o D. Par, logo não ha duvida nenhuma que aquella medida era provisoria e não permanente, e é o proprio Ministro que referendou o Decreto quem o confessa: eis-aqui tem a Camara outro justo fundamento para a sustentação da minha opinião (Apoiados), de que o Decreto de 28 de Maio de 1834 não podia ser entendido senão como uma medida tranzitoria, e nunca como permanente; mas entenda-se bem, que posto tivesse sido uma medida tranzitoria, circumstancias teem feito com que ainda hoje tenha effeito, e seja considerada Lei do Estado. E per esta occasião pretendo que se rectifique uma asserção que se acha no parecer da Commissão, e vem a ser, que o Decreto de 28 de Maio, posto que promulgado no tempo da Dictadura, foi posteriormente confirmado por Lei das Cartas geraes, e eu peço que se entenda «que confirmado» quer dizer = tacitamente = por não haver sido revogado, pois não tenho a menor idéa de que até hoje as Côrtes tenham tractado espacialmente do Decreto de 28 de Maio de 1838, que suspendeu certos individuos do exercicio das funcções de Pares (Apoiados).

Sr. Presidente, já tambem disso á Camara que me parece necessario rectificar outra asserção que se acha no parecer da Commissão, no qual se pretende inculcar que os Pares que assignaram a representação em casa do Duque de Lafões declararam no Assento dos Tres Estados, que haviam renunciado á dignidade de Pares, dando como nullo tudo quanto tinham praticado.

Sr. Presidente, o que esses individuos praticaram nos chamados Tres Estados não foi na qualidade de Pares, porque alli não havia Pares; o que lá praticaram de nada importa ser hoje analysado, porque todos nós sabemos a historia contemporanea; todos nós sabemos o que deu motivo não só a assignar-se em casa do D. de Lafões a representação a que se allude, como ao que se praticou nos Tres Estados, e ai de nós se todos aquelles que concorreram nos Tres Estados com os suas assignaturas estivessem convencidos de que praticavam um acto justo, legitimo e verdadeiro! Ai de nós repito, se assim tivesse acontecido! (Apoiados.) Todos nós sabemos o que alli se fez, e porque é que se fez! (Apoiados.) E escusado será portanto irmos ainda hoje aggravar feridas que já deviam estar cicatrisadas! (Vozes — Muito bem.) Não analysemos esses factos, nem tão pouco as suas causas e consequencias: e não os analysemos porque, alem das razões que disse, mesmo nada veem para o nosso caso, porque o Decreto de 28 de Maio de 1834 não se refere aos que assignaram o assento dos Tres Estados, mas tão sómente á representação em casa do D. de Lafões. (Apoiados.)

Sr. Presidente, proseguindo na analyse do Parecer da illustre Commissão devo occupar-me de outro seu fundamento, e consiste no aresto, que tivera logar nesta Camara, isto é, refere-se á discussão e resolução que. esta Camara tomára por occasião do requerimento do Sr. C. de S. Lourenço, apresentado aqui pelo D. Par o Sr. C. da Taipa, com a pretenção de entrar nesta Camara como filho primogenito de seu pai, o Sr. M. de Sabugosa. A Camara denegou a entrada nesta Casa ao Sr. C. de S. Lourenço, não sei eu se com justiça ou contra o direito, o que me não pertence agora avaliar; mas o que sei é que os arestos em geral, e até no Foro Contencioso de nada valem, senão para esclarecimento da materia sujeita, e que quando ha principios a observar, e regras da Carta Constitucional para cumprir, cahem na sua presença, e desapparecem os arestos. (Apoiados.)

Mas para objectar esta mesma jurisprudencia dos arestos, que a Commissão allega, eu vou demonstrar, que nenhuma paridade ha entre o caso do Sr. C. de S. Lourenço e o do Sr. M. de Vallada, de que nos occupamos.. É verdade que o Sr. C. de S. Lourenço pretendia (aliás o seu Procurador) entrar nesta Camara por direito de successão no pariato de seu pai, porém S. Ex.ª linha fados proprios seus, e praticados quando era de maior idade (Apoiados) o Sr. C. de S. Lourenço não só tinha assignado a representação em casa do D. de Lafões, mas, segundo a intelligencia da illustre Commissão, tambem lhe prejudicava haver assignado o assento dos Tres Estados; logo a resolução que esta Camara tomou ácerca da pretenção do Sr. C. de S. Lourenço não póde de modo algum ser applicada ao caso em que está o Sr. M. de Vallada (Apoiados), que apenas contada tres annos quando todos esses actos se praticaram. Mas diz a Commissão no seu Parecer — a Camara votou então um principio que, sem duvida nenhuma, prejudica o actual pretendente, porque a Camara votou que os Pares que haviam assignado a representação em casa do D. de Lafões haviam perdido a dignidade de Pares, e que, seus filhos por legitima consequencia não tinham! a faculdade de succeder n'um direito que se extinguira.

Peço pois licença ao D. Par, e illustre Relator da Commissão, para lhe observar que o negocio do Sr. C. de S. Lourenço era muito differente do que diz respeito ao Se. M. de Vallada, e com quanto o nosso illustre Relator da Commissão e o D. Par o Sr. V. de Laborim lembrassem á Camara as palavras então pronunciadas por esse grande homem, por esse nome illustre cuja saudade ainda hoje tanto penetra e penetrará sempre tio coração de todos os membros desta Camara, eu não me posso conformar com a opinião de SS. Ex.ªs; lembraram pois os D. Pares, a que referi, que na occasião em que se ia votar sobre a pretenção do Sr. C. de S. Lourenço, o nobre D. de Palmella esclarecem attendei, Senhores, veja a Camara que ss vai votar sobre um principio geral, e que votado lhe fossem excluidos de entrarem nesta Casa por direito de sucessão os filhos de todos aquelles que assignaram a representação em casa do D. de Lafões — Sr. Presidente, ninguem mais do que eu respeita a memoria do nobre D. de Palmella, parque ninguem mais do que eu reconhecia-o saber profundo, e talento transcendente, a superioridade a todos, do nobre Duque, a quem sempre tributei a devida homenagem (Apoiados), mas permittam-me os D Pares que eu lhe diga que o illustre D. de Palmella não fez então mais do que emittir uma opinião, e nenhuma outra cousa; porque a votação da Camara não reinaria, nem podia recahir sobre a opinião do nobre Duque, mas sim sobre o Parecer da Commissão ácerca da pretenção do Sr. C. de S. Lourenço. (Apoiados.) E ainda mais, Sr. Presidente, para que a Camara não ficasse em duvida, á nobre D. de Palmella na Sessão immediata, de 29 de Julho de 1812, declarou solemnemente que esse era o sentido em que se tinha votado, para que se não ficasse entendendo que pela votação do dia antecedente ficavam privados de succeder no pariato os filhos daquelles que haviam assignado a representação a que se refere o Decreto de 28 do Maio, porque a Camara só tinha resolvido sobre a pretenção do Sr. C. de S. Lourenço I. Mas o meu nobre amigo o Sr. V. de Laborim até disse que o nobre D. de Palmella tinha feito aquella advertencia á Camara á cadeira da Presidencia; e no entanto S. Ex.ª está enganado, porque o nobre Duque estava nessa occasião na cadeira de Par, e a Presidencia fóra occupada então pelo Sr. C. do Sobral; por conseguinte não foi opinião da Presidencia, mas ainda que o tivesse sido, a votação só recahia sobre a pretenção do Sr. C. de S. Lourenço, e não sobre uma opinião que emittia o nobre de Palmella, que neste negocio não passava de uma opinião individual, e nada mais. E não pareça estranho que eu nela parte manifestaste da opinião que primeiro emittira o nobre D. de Palmelia, com o qual eu muito me honro de haver quasi sempre concordado, mas o de que eu me maravilho é que os dois D. Pares os Srs. V. da Granja, e V. de Laborim queiram agora dar tanto peso, e importancia a uma opinião do nobre D. de Palmella, quando havia muito tempo que S. Ex.ª votavam nesta Camara quasi sempre contra as opiniões do mesmo Duque! (Apoiados.)

Julgo portanto ter demonstrado, pelo menos segundo o que a minha intelligencia me dieta, que em vista das disposições do Decreto de 28 de Maio de 1834 a extincção absoluta do direito do pariato d'aquelles que assignaram a representação em casa do Duque de Lafões, não é uma materia tão corrente e averiguada como pretende demonstral-o a Commissão no seu Parecer (Apoiados). O D. Par o Sr. V de Laborim, por occasião de pronunciar o seu discurso, disse nesta Camara que — insistências da natureza d'agricola de que se tracta poderiam conduzir a Camara a ser contradictoria nas decisões que tomasse, e que se attendesse bem a que já tres decisões se haviam tomado sobre casos analogos ou identicos ao que agora se nos apresentava. — Em primeiro logar pretendo contestar a S. Ex.ª o facto, porque, ao menos que eu saiba, é esta a primeira questão que se apresenta desta natureza (Apoiados): Quanto, porém, aos desejos de S. Ex.ª estou perfeitamente d'accordo com elles, porque eu tambem desejava que este negocio se resolvesse de uma vez para sempre, e que nunca mais se tractassem aqui questões pessoaes desta natureza, porque quem as defende ou impugna, está sempre em máo terreno, por isso mesmo que quasi sempre se attribuem a mãos motivos as opiniões sobre interesses de individuos, e eu pela minha parte declaro, que muito desejaria concorrer com as minhas poucas idéas e fraca opinião para se acabarem similhantes questões: acabe-se, pois, de uma vez e para sempre com a decisão sobre o direito que certos individuos lêem ao pariato; decida-se — injuria, — que as pessoas que assignaram a representação em casa do Duque de Lafões, perderam o direito de Pares, e que, seus filhos tambem nenhum direito têem a succeder no pariato; decida-se isto e decida-se por uma vez; ou se acaso se resolver que os filhos d'aquelles in

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dividuos lêem direito de succeder a seus pais no pariato, ou que, ainda mais, os proprios pais, esses que assignaram a representação a que se allude, devem ser admittidos, venham todos para dentro desta Casa; discutam aqui o votem connosco I (Apoiados).

Pois que Sr. Presidente; que receio tem esta Camara, de que entre por aquella porta dentro o limitadíssimo numero de Pares ainda vivos, que assignaram a representação em casa do Duque de 'Lafões; e que creio já não são mais de oito?

Que receio podemos ter de que entrem os filhos que requerera por direito de successão? Receio não póde haver nenhum Sr. Presidente (apoiados). Mas diz-se: vem aqui fazer opposição (Fozes Quem o disse?) Lembrou o o meu nobre amigo o Sr. Fonseca Magalhães. Era primeiro lugar devo dizer que quanto aos Pares velhos (perdoe-se-me chamar-lhe assim) duvido que quizesse m vir, por isso mesmo que duvido muito que elles se entendessem com este modo de viver. (Riso). Quando eu pela primeira vez tive a honra de ser chamado aos conselhos de Sua Magestade, concebi a idéa, e fiz um Projecto que apresentei na outra Camara, apesar de conhecer que a occasião era menos propria por falta de opportunidade, no qual tinha por fim justo, e ainda mais politico chamar ao exercicio da magistratura os magistrados velhos, para entrarem em secções supplementares do Supremo Tribunal de Justiça e das Relações, confirme as suas cathegorias, ou serem aposentados segundo os seus annos de serviço e mais circumstancias: sempre entendi que não escolheriam a primeira alternativa, porque não quereriam ir para as Relações, nem para o Supremo Tribunal de Justiça, por isso mesmo que tendo aprendido por outra cartilha, não quereriam servir-se da Reforma Judiciaria, do Código Administrativo e mais Leis deste tempo; o mesmo digo dos Pares velhos, porque estou certo que V. Ex.ª não havia de ter o incommodo de lhes conceder muitas vezes a palavra. E quanto aos novos, creados debaixo do imperio das idéas modernas, esses, Sr. Presidente governam-se por si, não estão adstrictos ás doutrinas velhas, e já que fallei na geração nova observarei quanto é necessario prover sobre a sua illustração; este objecto deve chamar a attenção e cuidado do Governo e do Parlamento, porque o elemento mais indispensavel no Governo Representativo é a instrucção publica (Apoiados).

Mas virão fazer opposição? Sr. Presidente opposição a que, pergunto eu? Se fôr aos principios constituidos da nossa Sociedade, se fôr opposição á Carta Constitucional, e á legitimidade do Throno da Senhora D. Maria II, embora, deixa-los vir, que hão-de estar n'uma minoria insignificante porque a Camara se levantará como um só homem, sem haver direita, nem esquerda, nem centro, e todos venceremos a combater os direitos do Principe proscripto (Muitos apoiados). Se esta opposição, porém, se dirige ao Ministerio, póde isso justificar alguem de fechar os olhos aos principios mais sagrados? (Apoiados repetidos) Supponhamos que para este fim vem unir-se á opposição que já cá está; se o Governo, não fallo deste, nem de outro qualquer, mas refiro me ao ente moral Governo, segue uma politica que entende ser boa; se tem a maioria na Camara electiva, e a opposição aqui o estorva, não está o remedio nas attribuições do Poder Moderador, que lhe dá os meios de evitar a Victoria dessa opposição se fôr facciosa? De que serve a faculdade de nomear Pares, a qual todavia deve ser exercida com toda a parcimonia, se não para conservar o equilibrio dos Poderes? (Apoiados) Pois se aqui entrassem, essas cabelleiras empoadas, essa aristocracia pura, não podiam tambem ser elevados ao Pariato outros do povo, como eu, e muito superiores a mim? Por ventura a nossa pobreza de homens de merecimento será tal, que ss não podesse obter esse equilibrio preciso?

Sr. Presidente, nesta Casa já está um Projecto de Lei eleitoral; espero na sabedoria da Camara e no Governo, que ha-de aconselhar a Sua Magestade que preste a sua sancção, que teremos uma boa Lei de eleições, e então não virão alguns miguelistas á Camara dos Srs. Deputados? Sim, senhor, devem vir, e eu se como homem particular sou pequeníssimo e insignificante, como homem publico e politico não tenho medo de ninguem, e quero ver todas as opiniões representadas no verdadeiro campo dos debates (Apoiados); venham pois para a arena parlamentar — coram populo - aqui é que tem logar o combate legal, e desse não tenho eu medo (Apoiados); o que temo são as intrigas particulares, as afluências pessoaes que transtornam o bem-estar da Sociedade; mas note-se que este meu receio não é o medo de que seja subvertido o systema politico que nos rege (Apoiados), mas sim o de que se vá retardando a união da familia portugueza, cuja divisão produz resultados fataes (Apoiados): portanto não tenhamos medo de que esses homens combatam no campo legal, e do raciocinio, e não lh'o neguemos, porque isso tem maiores inconvenientes. (Apoiados).

Sr. Presidente, tenho concluido a primeira proposição, que me propuz demonstrar: convem saber, que o Decreto de 28 de Maio de 1834 suspendeu, e não extinguiu de todo o direito dos Pares, a que o mesmo Decreto se refere; e que ainda depende de resolução d'uma medida geral, que eu muito desejo para acabar este estado de duvidas, a verdadeira e propria decisão deste objecto. Cumpre-me, pois, passar á segunda proposição, isto é, que concedido, o que nego, que aquelles Pares houvessem perdido o seu direito, nem por isso se extinguiu nos filhos o de succederem no Pariato. Diz a illustre Commissão, que o artigo 5.º da Lei de 11 de Abril de 1845, tia parte em que dispoz, que não prejudicaria o filho do Par o ter este sido, por sentença, legalmente excluido do Pariato, ou o haver renunciado, não póde aproveitar ao Sr. M. de Vallada por quanto a disposição dessa Lei é, como ella diz, para ter lograr dalli em diante, e não póde olhar para traz, o seu effeito seria retroactivo! Sr. Presidente, a não retroactividade das Leis é um principio santo e justo, contra o qual ninguem póde combater; mas o artigo 5.º da Lei de 11 de Abril á 1845 que estabeleceu e regulou o modo de succeder no Pariato, não tem applicação ao negocio de que se tracta, e se a tivesse, voltar-se-ia o argumento contraproducente, como pretendo demonstrar. Não se precisa da disposição desta Lei, que no artigo 5.° não estabeleceu cousa nova, nem alterou a regra que existia, porque o não podia fazer, e por isso não produz effeito retroactivo.

Sr. Presidente, a Lei de 11 de Abril quando estabelece que o acto do Par, na Sentença contra elle proferida não prejudica o filho, não é mais do que um pleonasmo; pois que esta determinação, esta doutrina está em todas as Leis, em todos os principios, e a Lei de 11 de Abril não podia restringir um principio justo e de moral universal, e para nós expressamente estabelecido na Carta Constitucional §. 19.0 do artigo 145.° (Apoiados). Pois então para se saber que o acto pessoal do pai não prejudicava ao filho precisava-se da Lei de 11 de Abril de 1845? De maneira nenhuma (Apoiados). Se se seguisse o que diz o Parecer da Commissão, e os D. Pares que o sustentam; se tão sómente depois da publicação da Lei de 11 de Abril de 1845 é que podia ter logar e observancia o não ser prejudicado o filho por qualquer acto pessoal de seu pai, então é que se verificava amais flagrante retroactividade, porque a despeito dos principios, e do preceito da Carta Constitucional contrariava-se assim o que estava era vigor antes da Lei de 11 de Abril! Por tanto o argumento torna-se contraproducente (Apoiados) e perdoe-se-me que diga, que foi uma perfeita ociosidade o disposto naquelle artigo 5.°, porque todos sabiam que o acto pessoal de um homem não póde por direito criminal prejudicar a outro, a não haver peccado original que podesse passar ao successor. E porque o crime é verdadeiramente pessoal segundo os principios e regras de imputação geralmente sabidos, por isso diz a Carta no artigo 145.° §. 19.° II Nenhuma pena passará da pessoa « do delinquente. Por tanto não haverá em caso « algum confiscação de bens, nem a infamia do réo «se transmittíra aos parentes em qualquer grau, « que seja. » Para que era pois necessario que a Lei de 11 de Abril de 1845 dissesse que o acto do pai não prejudicava ao filho, se o direito que tem o filho lhe vem da Lei? (muitos apoiados). Peço licença para uma pequena pausa porque estou extremamente fatigado (Apoiados).

Sr. Presidente, o illustre Relator da Commissão disse; não si, como S. Ex.ª se expressou, mas estou certo de lh'o ouvir, que se não havia paridade, ao menos havia muita similhança entre o morgado e o pariato; e o Sr. V. de Laborim no seu discurso impugnou esta asserção do seu collega, e exclamou muito emphaticamente (como S. Ex.ª costuma pela sua eloquencia) dizendo: « o pariato não é de direito civil, mas sim de direito publico. » S. Ex.ª porém não se dignou fazer a demonstração, e eu preciso por isso desenvolver a meu modo esta 'proposição, apesar de conhecer que S. Ex.ª sabe muito mais do que eu, não só porque é erudito, sabio, Juiz ha 41 annos, e por consequencia muito mais velho do que eu, e em tudo superior. S. Ex.ª sabe que sobre a classificação, e definição dos direitos applicados á Sociedade ha diversidade de opiniões entre muitos Publicistas; havendo alguns delles que por ironia, ou para castigarem o mau uso que certos povos teem feito do chamo o direito publico, fortemente clamam contra elle: podem consultar-se entre outros o grande philosopho Etienne Jony no seu excellente Tractado da moral applicada á politica, o qual diz, que o direito publico tem sido a arte de dar pretextos á violencia; e o famoso auctor do espirito das Leis, asseverando que é o modo de gerir a iniquidade em systema: mas isto, Sr. Presidente, são auctores que nas suas obras querem aproveitar-se do mau uso que muitas vezes se tem frito do que »e diz direito publico para invectivarem não o uso, mas o seu abuso. O direito natural é a base de todos os outros direitos, que não são mais do que as ramificações daquelle, applicadas ou ás Sociedades collectivamente, ou a cada uma de per si, e com relação ao seu regimen, e aos direitos e obrigações dos Cidadãos. Assim nas differentes relações se definem todos os direitos na Sociedade, e póde sem inconveniente, e segundo bons auctores, como Laferriere, e Bouchené Lefer, chamar-se direito publico o que marca a organisação, attribuições, e relações geraes dos poderes Legislativo, Executivo, e Judiciario, e que regula os direitos, e deveres dos Cidadãos no exercicio das liberdades publicas = Jus publicum, quod speetat cid slatum reipubliew — Mas, Sr. Presidente, o direito civil que o D. Par quer que não pertença ao pariato, mas só o direito publico, tambem é parte desse mesmo direito publico, e lá tem S. Ex.ª auctores de primeira nota, que não quererá impugnar, como Bacon, que diz — Jus privatum sub tutela júris publiei latct — (Apoiados).

Portanto, eu não sei como S. Ex.ª podia estabelecer a proposição de que o Pariato não é do direito civil, e que não póde em causa alguma assimilhar-se á instituição dos morgados. S. Ex.ª ha-de permittir que eu sustente que o Pariato pertence a varios direitos, conforme o modo e relações porque S. Ex.ª o considerar: se fôr com respeito a esta Camara é um ramo do Corpo Legislativo, e fórma parte do direito politico nacional estabelecido pela Carta Constitucional; se fôr com relação á faculdade de nomear os Pares é um Poder politico chamado Moderador, que é a chave de todos os Poderes, como diz a Carta, e pertence ao Chefe do Estado; se fôr com referencia a esta Camara, como Corpo social, que tem attribuições, e jurisdicção, é o direito publico que estabelece as suas relações com o Estado em geral; mas se, e finalmente, se considerarem os direitos e regras da successão no Pariato, estabelecidas por uma Lei especial, que se incluo no Código, ou Corpo do direito civil, então ha-de S. Ex.ª permittir-me que o Pariato nesta relação é verdadeiramente de direito civil. Portanto, não estou d’accordo com o D. Par quando genericamente estabelece a sua proposição, de que o Pariato é só do direito publico, e não do direito civil; e como não ouvi a demonstração de S. Ex.ª, por aqui fico, e depois de ouvir o D. Par, senão concordar com S. Ex.ª, então responderei o que tiver por acertado. Agora o que me parece que S. Ex.ª tambem me não poderá impugnar é que a instituição dos morgados se parece muito com a instituição do Pariato. A Lei de 11 de Abril de 1845 que regulou a successão do Pariato estabeleceu a tal respeito as principaes regras da successão nos vinculos, ou morgados. A linha que se prefere; o varão primogenito, e outros preceitos estabelecidos para a successão do Pariato attestam a grande similhança que existe entre as duas instituições, e parece-me por isto que bem disse o Sr. Relator da Commissão quando asseverou que os morgados se assimilhavam ao Pariato: e não pareça ao D. Par, o Sr. V. de Laborim, que isto é uma opinião minha, ou singular, não sr. é de quem tem estudado as materias, e S. Ex.ª, que é mais illustrado do que eu, não ha de ignorar que muito se tem escripto, principalmente em França, sobre a não hereditariedade do Pariato, e que muitos dos argumentos são fundados na similhança da instituição hereditaria dos morgados, e dos graves inconvenientes publicos que d'ahi resultam.

Portanto, Sr. Presidente, sendo certo que a successão nos morgados é tão parente, ou similhante da do Pariato, não parecerá mal que eu argumente com razões tiradas desta similhança (Apoiados).

Quando morre o administrador do vinculo, assim como quando morre o Par do Reino, que tem um filho varão mais velho, havido de legitimo matrimonio, succede aquelle no vinculo, e este no Pariato, não por nomeação, escolha, ou arbitrio do pai, mas unicamente pelo effeito da Lei, que o chama independente inteiramente de todo o acto daquelle que primeiro gosou do vinculo, ou do Pariato: por conseguinte um facto qualquer do antecessor, seja o mais digno de louvor e recompensa, ou, por hypothese, o crime merecedor de maior castigo, não se transmitte ao successor, a quem pertence o vinculo ou Pariato pelo direito da Lei, e regra do §. 19 do artigo 145 da Carta Constitucional (Apoiados). Sr. Presidente, eu podia adduzir no sentido de sustentar a minha proposição os argumentos de escriptores insigne, e a historia principalmente de França e Inglaterra; porém eu não quero carregar o meu discurso com mais citações, e talvez já seja taxado de pedante, e certamente o seria se fosse viva de Staell, pois que ella censurava o uso das citações de outras opiniões, e preferia a liberdade do raciocinio segundo os bons principios, e melhores doutrinas; mas permitta-me a Camara que eu addusa a opinião de um Jurisconsulto, que honra a Nação Portugueza, e que primeiro redigiu o compendio de direito civil portuguez para uso da Universidade de Coimbra. Já todos sabem que eu fallo do exímio Jurisconsulto o Sr. Paschoal José de Mello, que V. Em.ª não conheceu, mas estudou as suas instituições, o qual estabelece na sua obra a mesma doutrina, que eu tenho sustentado; e referindo-se ao direito romano, prova, que por aquella Legislação se adoptavam tambem iguaes principios, expressamente estabelecidos no fragmento do Jurisconsulto Alfeno na L. 3.ª de interd et releg. infine — «Quaevero non a patre, sed a genere, a civitate, a rerum natura tribuerentur, ca manere eis incolumia» — áquellas cousas, diz Alfeno, que não provém do direito do pai, do direito do possuidor, mas que provém doestado, da Lei, da natureza das cousas, ou da disposição geral, essas devem passar inteiras e incólumes para quem lhe succede — porque o direito não provém da successão, mas provém da Lei, quando se verifica a successão (Apoiados).

Parece-me pois, Sr. Presidente, lêr demonstrado primo, que não está extincto, mas suspenso, u direito dos Pares antigos que assignaram as Representações em essa do D. de Lafões; mas secundo, que mesmo quando estivesse extincto, não era isso sufficiente para privar o pretendente, o Sr. M. de Vallada de tomar assento nesta Camara (Apoiados).

Sr. Presidente, desde que eu tenho demonstrado, que pelos verdadeiros principios é fundada a pretenção do pretendente, não era necessario recorrer a outra razão para concluir contra o Parecer da Commissão; e razão que na minha propria opinião não póde correr paralello com os fundamentos que tenho produzido; mas como ex abundante, pretendo chamar a attenção da Camara sobre um acto que attesta a sua sabedoria, a sublimidade do seu espirito, e a magnanimidade do seu coração!

Sr. Presidente, quando na Sessão de 1849 se discutiu nesta Camara a Lei da aposentação dos Magistrados Judiciarios, levantou-se daquelle lado da Camara uma voz, que ainda soa aos meus ouvidos, repercute no meu coração, e com respeito me faz curvar a cabeça! Era a voz do Sr. D. de Palmella (Muitos apoiados). Que disse S. Ex.ª? Naquella Lei não se comprehendiam, para as aposentações, os Magistrados das alçadas de D. Miguel, e S. Ex.ª que tinha sido condemnado á norte por esses Magistrados, disse — contemplemos tambem esses Juizes, e o pão do alimento seja tambem repartido por esses homens (Apoiados). E a voz de S. Ex.ª achou nesta Camara, e alguns D. Pares, que foram tambem processados, e condemnados á morto por aquelles Magistrados, votaram tambem que esses homens fossem contemplados na mesa chamada do orçamento! (Apoiados) E então a mesma Camara, que teve a sabedoria, a sublimidade de espirito, e a magnanimidade de coração para comprehender aquelles Magistrados, q que tanta honra lhe faz,

hade hoje fechar as portas deste templo civil, desta representação nacional a um Cavalheiro que diz aqui está a Carta Constitucional, e o meu direito, para ser admittido nesta Casa?! Não o creio, e quando o vir, direi ainda que não creio a verdade, e que estou allucinado (Apoiados).

Sr. Presidente, eu estou cançado, peço á Camara que me desculpe o mal alinhavado do meu discurso, e receba os meus maiores agradecimentos pela benignidade com que me escutou. (Sensação. Vozes — Muito bem, muito bem. Apoiados repetidos. — S. Ex.ª é cumprimentado por muitos dos seus amigos).

Interrompeu se a discussão para se dar conta da seguinte correspondencia, que tinha chegado.

Um officio do Presidente da Camara dos Srs. Deputados, remettendo uma Proposição de Lei, fixando a forca de mar para o anno economico de 1851 a 1852.

A Commissão de Marinha e Ultramar. Outro do mesmo Presidente, enviando uma Proposição de Lei que fixa a força de terra para o mesmo anno economico.

Remettida á Commissão de Guerra. Continuou a discussão, e teve a palavra O Sr. Silva Carvalho — Sr. Presidente, eu tambem começarei como principiou o meu nobre amigo o Sr. V. de Algés. Talvez seja a primeira vez que me levanto nesta Camara com o maior sentimento, e debaixo das impressões mais desfavoraveis, depois de terem fallado nesta materia tão differentes e distinctos Oradores, que a tractaram tão dignamente como a Camara acaba de ouvir. Os seus discursos, tão cheios de eloquencia, parece-me que deviam fazer com que eu não dissesse uma só palavra sobre este negocio; mas ha ainda outra razão, e é, que desejando muito tractar esta questão em these, não o posso fazer sem comtudo me referir á illustre personagem, que se apresenta como candidato para entrar nesta Camara, e por quem tenho a maior consideração, respeito e sympathias que eu posso ter.

Mas, Sr. Presidente, eu fui chamado aqui á authoria, e não tenho remedio senão fallar, e dar a razão do meu procedimento no Parlamento, assim nesta, como em outra occasião similhante. Para mim este negocio é um caso julgado, e isso era motivo sufficiente para me abster de fallar; e digo que é um caso julgado, porque no anno de 1842 se apresentou um negocio inteiramente identico a este que agora se discute. Eu fui Relator da Commissão, que deu o Parecer sobre essa pretenção, e votei então como agora hei de votar, ainda que muito me peza (Apoiados).

O Sr.. C. de S. Lourenço veiu a esta Camara, por seu procurador, pedir a entrada nella como filho e successor do Sr. M. de Sabugosa, e a Camara decidiu — que não tendo o Sr. M. de Sabugosa direito ao Pariato, não o podia transmittir a seu filho. Houve neste Paiz um grande acontecimento, que todos sabem, que está na memoria de todos: foi a Carta Constitucional da Monarchia dada pelo Senhor D. Pedro IV; chegou a este Reino; ouvi dizer ao meu nobre amigo o Sr. Rodrigo da Fonseca Magalhães que todo o mundo a recebeu com os braços abertos, tanto de amigos, como de inimigos, e que fóra recebida com o maior regosijo. Eu tambem apoio este dito do meu illustre amigo, mas não em tanta extensão como elle fez, porque vi estes abraços e regozijos; mas ha-de permittir que eu diga que não foram tão geraes como elle diz, porque logo se começou a tramar contra a Carta. Primeiro, intrigando-se contra o juramento que o Imperador mandava prestar á Carta Constitucional, esteve muito tempo sem effeito, e foi necessario grandes esforços de homens liberaes e nacionaes, pura que ella se jurasse; e jurou se; mas immediatamente houve uma revolução neste Paiz, era que tomaram parte dois Regimentos de Infantaria e um de Cavallaria, que foram para um Paiz estrangeiro.

Que a Carta não foi tão geralmente abraçada, como affirma o meu illustre amigo, e que desde, logo se tramou contra ella, não ha duvida alguma; e disso tenho eu aqui um documento, que é a Proclamação, ou antes Exposição que se publicou, feita pelo Sr. Ministro da Justiça, o Sr. José Antonio Guerreiro, em 23 de Setembro de 1826 á Senhora Infanta Regente. — Diz assim:

« Quando a este Reino chegou a Carta Constitucional que o Senhor Dom Pedro IV, nosso legitimo Rei, foi servido decretar, dar, e mandar jurar para reger estes Reinos de Portugal, Algarves, e seus Domínios, levantou-se logo uma opposição a mais absurda, e louca, de que os annaes da historia offerecem exemplo: uns poucos de portuguezes degenerados, acostumados a viver á custa da miseria, e da oppressão dos povos, estremeceram ao ouvir que se ia estabelecer o imperio da justiça, e da boa ordem: a futura reforma dos abusos, que tanto tem concorrido para precipitar a nação na decadencia era que se acha, foi por elles olhada como a maior calamidade; incapazes de trabalho honesto, sem talentos uteis e sem virtudes, estes miseraveis não sabem viver senão á custa alheia, e por isso se pozeram logo em campo para por todos os meios defenderem suas usurpadas honras e riquezas. As mudanças, commoções, e attentados politicos, acontecidos nestes Reinos desde o anno de mil oitocentos e vinte, foram crer a todos os ambiciosos, aos homens que nunca tiveram que perder, ou que, por desgoverno perderam o que tinham, e aos maus, a quem a consciencia acusadora fazia a cada momento receiar o meti revido castigo de suas maldades, e prevaricações, que as revoluções são meio para se conseguir a impunidade do passado, e honras, poder, e riqueza para o futuro: a esperança de uma amnistia para o caso de se mallograrem seus damnados intentos dava-lhes novas ansas; o unidos todos nos mesmos criminosos desejos conceberam o atroz, e horrendo projecto de resistirem á vontade do Soberano, de se oppôrem ao cumprimento, e execução da mais importante de todas as Leis, e de romperem os vinculos sociaes,

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«sacrificando s tranquillidade publica aos « interesses do seu egoismo, e expondo a nação a todos os horrores da guerra civil. O seu primeiro cuidado foi seduzir a massa dos cidadãos pacificos; mas a fidelidade portugueza soube resistir a todos os artificios dos malvados: o povo firme no amor, e fidelidade ao Rei, e a Vossa Alteza, que o representa, foi inabalavel; e os malvados viram-se obrigados a ir buscar asylo no Reino visinho; mas dahi mesmo... etc. etc.... »

Continua a descreverão progresso da desordem, e termina pedindo providencias.

(Continuando). Houve como ahi se diz a retirada de tropas, e de muitos dos compromettidos para um paiz estrangeiro, para depois virem invadir o Reino, como effectivamente vieram, com os auxilios que alli receberam; e não obstante serem derrotados nas Provincias do Norte pelo invicto D. da Terceira, assim mesmo foi necessario que o Ministerio desse tempo pedisse auxilio a outra nação estrangeira, cujo auxilio veiu para, aqui se demorar até se julgar que a Cai ta Constitucional estava firmada, e a ordem estabelecida. Eu trago isto para mostrar que nem todos abraçaram de boa vontade a Carta Constitucional, e muitos daquelles mesmos que então tomaram assento na Camara dos Pares nunca acceitaram de boa mente aquella Magistratura que o Imperador lhes tinha conferido; e não a acceitaram porque?... Porque julgaram que o titulo da sua nomeação tinha procedido de uma fonte impura; e tanto assim que depois se juntaram, e foram a casa do D. de Lafões fazer uma representação para pedir ao Usurpador que abolisse a Carta Constitucional, que tinha sido dada por um Monarcha incompetente, que o não era destes Reinos. Ora, se isto não é renunciar a mercê que o Imperador lhe havia feito não sei o que seja Isto é da historia do nosso tempo, e desejo que esteja na memoria de todos. Disseram elles:

«.... A Nobreza tem pois a h um de expor a Vossa Alteza a necessidade de levar a effeito seus puros e leaes desejos, representando-lhe, que o meio mais seguro de o conseguir, e o mais conte forme á dignidade de Vossa Alteza e ás Leis fundamentaes desta Monarchia, é a convocação ruce mediata dos Tres Estados do Reino, feita segundo os antigos usos e costumes, para nelles se tractar legitimamente materia da maior importancia, qual é a de reconhecer solemnemente os legitimos direitos de Vossa Alteza á Corôa de Portugal, e seus dominios, e de abolir a intitulada Carta Constitucional da Monarchia Portugueza, por isso que foi dada por um Monarcha antes de ser jurado e reconhecido pela Nação, se como Rei de Portugal, e que alterou essencialmente a fórma da successão do Reino contra as Leis fundamentaes do mesmo. Da Alta Sabedoria de Vossa Alteza, etc... etc....»

Em virtude de que titulo se tinham estes senhores sentado na Camara dos Pares?... Em virtude da Carta Constitucional que elles não reconheciam. Pergunto mais. Qual foi o titulo por que elles lá se sentaram?... A Carta Regia dada por um Monarcha incompetente, como elles não tiveram duvida em o declarar.

Fallou se aqui ha pouco em Lei de morgados, para de algum modo a applicarem ao caso presente (refiro-me ao Sr. V. do Algés); mas se isto era um morgado ainda não estava radicado na Família do primeiro Administrador daquelle vinculo, porque o primeiro chamado não o tinha acceitado. (O Sr. V. de Algés — Peço a palavra.) Sr. Presidente, se eu instituir um vinculo, chamar para elle um administrador, e elle disser não acceito, não podia de certo transmittir um direito que não tinha; seria caso differente, se o instituidor estivesse de posse do morgado, e depois passasse á sua linha. Mas deixemos isso. Digo portanto que elles nunca foram Pares de direito, porque não acceitaram essa mercê; e não a acceitaram pelas razões que já tenho feito. Em consequencia deste peditório que elles fizeram, chamou o usurpador as Côrtes, e houve uma proposição do Bispo de Vizeu, e de José Acúrcio das Neves. Não tracto de ponderar estas circumstancias senão para dizer que elles naquelle assento foram ratificar o mesmo que já haviam dito, isto é, que se os Pares juraram a Constituição feira por modo dos ameaços, das intrigas, e tracções a que elles não poderam resistir, porque sendo esse o motivo, eu tiro d'aqui esta consequencia — que elles nunca acceitaram a mercê de Pares do Reino, que lhes tinha sido feita.

Depois destes acontecimentos Sua Magestade Imperial creou uma Regencia na Ilha Terceira; e no Decreto da sua installação, que eu aqui tenho, está o seguinte:

«Havendo Eu, pelo meu Real Decreto de tres de Março do anno proximo passado, Ordenado que os Reinos de Portugal, Algarves, e seus dominios fossem governados em Nome de Minha Muito Amada e Querida Filha D. MARIA II. (já anteriormente sua Rainha, na fórma da Carte ta Constitucional por mira dada para aquella Monarchia, e alli jurada pelo Clero, Nobreza, e Povo) Declarando Eu muito expressamente ser chegado o tempo, que em Minha Alta Sabido ria Havia marcado para completar a Minha Abdicação á Corôa Portugueza, e não pretender ter mais direito algum á mesma Corôa, e seus Domínios, aconteceu que o Infante D. Miguel, Meu Irmão, e Meu Logar -Tenente, e Regente d'aquelles Reinos, a quem a execução, e publicação do Meu Decreto de tres de Março era commettida, não sómente o não publicou, nem cumpriu, mas com manifesto abuso da Minha \ Confiança, e com quebra não menos manifesta da Obediência e Fidelidade, que do modo mais publico, e formal repetidas vezes Me havia promettido, e jurado como a seu Rei, e Legitimo Soberano; e outro sim contra o expresso, e for mal Reconhecimento, que havia feito da Minha muito Amada e Querida Filha D. MARIA II, como Rainha Reinante por Minha Abdicação; com a qual nessa reconhecida qualidade havia contraindo Solemnes Esponsaes, só levantou com os mesmos Reinos, chamando-se e fazendo-se chamar Rei, e Senhor enleies, com os quaes factos aniquillou o Titulo de Logar - Tenente, e Regencia d'aquelles Reinos, que. Eu nelle Lia-te via delegado, usurpou uma Corôa, que por nenhum Titulo lhe pertence, e destruiu de facto as Instituições emanadas do Meu Soberano, e Legitimo Poder, para promover, e assegurar a grandeza, e a prosperidade d'aquelles Reinos, as quaes elle proprio á face da Europa havia jurado fielmente guardar e fazer guardar. De todos estes acontecimentos succedidos depois do Meu Real Decreto de tres de Março do anno proximo passado tem resultado com todos os males, que actualmente opprimem os Reinos de Portugal, Algarves, e Dominios, as outras funestissimas consequencias de se acharem os mesmos Reinos sem Governo algum legitimo para os Reger, e administrar, de ficar sem publicação, e sem execução o sobredito Decreto de tres de Março, emanado do Meu Real, Legitimo, e Reconhecido Poder, e de estarem os Direitos da Minha muito Amada e Querida Filha sem Authoridade, que os proteja, defenda, te e os faça reconhecer, e respeitar. E como não haja no Direito Publico Portuguez Lei alguma, e que seja applicavel ao presente caso, acompanhado de circumstancias ião extraordinarias como imprevistas; nem haja em Portugal Governo algum, que para supprir com Formulas Legislativas esta omissão, pôs a legitimamente convocar uma nova Camara do Deputados, e de novo organisar a Camara dos Pares, hoje quasi extincta pela voluntaria renuncia de grande parte dos seus Membros; sómente da Minha muito Amada e Querida Filha D. MARIA II, como Legitima Rainha Reinante (supprindo Eu como te Tutor, e Natural Protector, o que falta em sua idade) póde sahir o remedio para tão grandes males, para occorrer aos quaes Ella é authorisada pela grande miseria, e oppressão, em que se acham os Povos, que a Divina Providencia confiou ao Seu Maternal Cuidado, pela necessidade urgentissima de restituir os Reinos de Portugal, e Algarves, e seus Dominios á Communicação Politica das mais Nações, de que os se parou a usurpação; pelo natural, e imprescritivel Direito de defender contra todo o invasor, ou de recuperar de qualquer usurpador a Corôa, que por tão legitimos, e por tão conhecidos titulos é sua, lhe pertence; e finalmente pelo exemplo do que em casos similhantes, ou analogos tem sido praticado em outros Estados da Europa.

«Por todas estas razoes, na qualidade de Tutor, e Natural Protector da Sobredita Minha muito Amada e Querida Filho D. MARIA II, etc....

Conclue com a nomeação da Regencia do Reino.»

Não nomeou um só Par, organisou a Camara dos Pares com os que tinham sido fieis ao seu juramento, e deixou á nossa Augusta Soberana o nomear aquelles que lhe parecesse. Onde estava então a Camara dos Pares, não sei, mas foi convocada segundo a Carta.

Restaurada a Carta Constitucional, e depois de extincta a usurpação da Monarchia, o primeiro acto do Imperador para com aquelles que o tinham atraiçoado, foi perdoar-lhes como o fez. por Decreto do dia 27 de Maio de 1834; e desse perdão começou.... Não passo d'aqui (Vivíssimos Apoiados).

No dia immediato 28 de Maio desse mesmo anno, publicou-se o Decreto para a convocação das Côrtes, e nesse Decreto se dispõe o seguinte:

«Tendo Eu por Decreto de quinze de Agosto de mil oitocentos trinta e tres convocado as Cortes Geraes da Nação Portugueza, Fui constrangido a prorogar pelo Decreto de vinte e sete de Setembro seguinte o dia marcado para as Eleições dos Deputados por se achar ainda naquella época a maior parte do Reino em poder da extincta usurpação; havendo porém cessado as circumstancias extraordinarias, que motivaram aquella demora, achando-se felizmente restabelecida a ordem, e a authoridade legitima era « todo o Reino por effeitos da Divina Providencia, vontade Nacional, e valor, e constancia do bravo Exercito, que Me Prezo de commandar em « Chefe; E Querendo que a reunião das Camaras Legislativas se não retarde, salvo por aquelle tempo que for absolutamente necessario para ella vir a effeito: Hei por bem, em Nome da Rainha, Mandar proceder immediatamente ás Eleições para Deputados na fórma das Instrucções de sete de Agosto de mil oitocentos e vinte e seis, que se expediram acomodadas ás circumstancias presentes. Designando o dia quinze de Agosto proximo futuro para a Sessão Real da abertura das Camaras Legislativas» — Eu desejo que, isto fique na imaginação de todos, para poderem depois, por meio de uma analyse séria, tirarem as suas conclusões. (Continuou lendo) E Hei outro sim por bem, em Nome da Mesma Augusta Senhora, Declarar que na Camara dos Pares sómente tomarão assento aquelles, que se conservaram sempre fiéis ao solemne Juramento prestado á Carta Constitucional da Monarchia Portugueza, e que não assignaram como outros a Representação sellada com o cunho do perjúrio, e dirigida a Meu Irmão, para que aboliu aquelle novo Pacto de Alliança entre o Soberano e os Súbditos, fosse consumada a obra da usurpação do Throno de Sua Magestade Fidelissima a Senhora DONA MARIA SEGUNDA, por cujo facto vieram esses Membros perjuros e a renunciar voluntariamente a alta Dignidade de Pares, como é expresso no Decreto, datado do Palacio da Imperial Quinta da Boa - Vista era quinze de Junho de mil oitocentos vinte e nove; e porquanto alguns ha destes, que adheriram depois á Causa da Legitimidade no dia vinte e quatro de Julho do anno passado da gloriosa Restauração de Lisboa, havendo um de entre elles, que emigrou para Paizes Estrangeiros; Sou Servido Declarar, que ácerca de um e outros as Côrtes Decretarão o que mais justo lhes parecer. Os Ministros e Secretarios de Estado de todas as Repartições assim o tenham entendido e façam executar. Palacio das Necessidades, em viole e oito de Maio de mil oitocentos te trinta e quatro. = D. PEDRO, Duque de Boa. = Bento Pereira do Carmo = José da Silva Carvalho = Agostinho José Freire — Joaquim Antonio de Aguiar = Francisco Simões Margiochi.»

Ora tanto não julgou este Decreto transitorio, que incluiu os que tinham perdido o direito, e a respeito daquelles que tinham emigrado, disse que as Côrtes haviam determinar o que lhe parecesse. E como é que as Côrtes o poderiam determinar? Por uma lei, porque as Côrtes não podem tomar determinação alguma que não seja segundo as formulas que a Constituição prescreve, não é só por uma decisão da Camara dos Pares, é pela decisão de ambas as Camaras, e confirmação do Poder Moderador. Mas não se fez isto, nem a respeito do Sr. C. de Paraty, nem a respeito do Sr.

C. de Penafiel, ainda que estes não estivessem no mesmo caso: entretanto eu reconheço que houve essa falta. Vaus agora ao Decreto, que acabei de citar. Eu estava nos Conselhos de Sua Ma gostado nessa occasião, e fui um dos referendários do mesmo Decreto, e antes que o Imperador o assignasse, foi muito ponderado na sua presença porque não era homem que cedesse a infancias estranhas que se não conformassem com oscos principios de honra e de justiça, e que assignasse sem saber o que assignava mas não me lembro que houvesse o facto que se citou de ele se soccorrer a Mr. Dupin, nem eu sei como o poderia consultar; elle saem de França em Janeiro de 1832, e o Decreto em 28 de Maio de 1834 é que foi publicado, por consequencia tinham passado dois annos. O que eu sei, é que o Imperador não se referia a estes casos: e tambem estou persuadido que não era esse o seu animo, isto posso eu dizer, e o povo a coherencia do pensamento do Decreto da Boa Vista em 1829 com o de 1835.

Ora, disse o meu particular amigo, o Sr. Fonseca Magalhães, que isto era uma lei transitória. Pôde ser mesmo que seja uma lei injusta, tudo póde ser; mas uma lei segundo o systema que nos rege não póde ser alterada unicamente por uma decisão desta Camara, para isso é necessario, t roo a repetir, o concurso das duas Camaras, e a Sancção Regia. Pois como era possivel que estando este negocio decidido por uma lei, fossemos agora destrui la por uma simples decidio dessa Camara? É verdade que eu disse n'outra occasião que ainda era certo para facilitar o ingresso nesta Camara aos candidatos que se apresentassem; e agora digo que não é cedo nem tarde (Apoiados), mas onde ha lei não se póde esta destruir por uma decisão desta Camara, é necessario que seja por uma outra lei; venha pois a lei, ou seja para maiores ou menores, que eu não me opponho á sua discussão. Só o supplicante era menos, se seu pai estiva demente quando assignou, tu do isto assim será; venha a lei, e se nella fôr comprehendido o candidato actual, desde já declaro que lhe dou o meu voto (Apoiados).

Ora, que era muito conveniente o chamar todos esses homens para a Camara, e que isso contribuiria para uma fusão dos partidos, nosso concordo eu, e desejo-o, e nesse desejo não cedo a D. Par o Sr. C. de Lavradio, porque delle de provas quando ainda com as armas na mão, e com os ressentimentos proprios do tempo não tive a menor duvida em obedecer a Sua Magestade o Imperador escrevendo do Porto a dois Generaes miguelistas para virem para nós: e elles não quizeram. Depois disso escrevi de Lisboa a pessoas que estavam com D. Miguel, e com quem tinha tambem relações de amisade, para que viessem para nós: e elles não quizeram. Ultimamente sei eu, que se fez um convite a certo individuo para tomar parte em certa incumbência honrosa que queria dar se-lhes: e elle respondeu, que estava velho, e que não queria tomar nenhuma parte nisso.

Além de que, Sr. Presidente, pergunto, eu que é o acto que esses homens teem feito para prestarem obediencia á Rainha, e para virem para nós? Nem um ó (Muitos apoiados.) Pulo contrario, todos os actos que elle praticára são em sentido contrario, e em opposição a isso. (Apoiados) Declaro comtudo, que por isso não lhes quero eu mal; não lhes tenho odio algum: nada me importa que elles se correspondam com D. Miguel; que lha dêem vivas nos seus festins particulares; que lhe escrevam a pedir-lhe licença para cassarem seus filhos; que dêem bailes em auxilio dos seus partidarios, etc.... nada disso me importa, estão como se costuma dizer no seu direito:, o que me importa, e o que eu sustento é. que os filhos desses Fidalgos que estão nas circumstancias do pretendente de quem actualmente se tracta, não podem entrar nesta Casa sem uma carta de Sua Magestade a Rainha, ou sem que haja uma Lei que os favoreça para isso, porque lhes é contraria a Legislação actual. (apoiados.) E tanto essa Lei é precisa, Sr. Presidente, que uns dizem que a Lei actual é transitória; outros dizem que não o é; outros sustentam que é uma Lei injusta porque os filhos desses não devem pagar o que seus pais fizeram, outros querem que aproveite aos filhos, etc.... logo como é que se ha-de remediar isto? Fazendo a Camara uma Lei: venha pois um Projecto de Lei a tal respeito, e vêr-se-ha o que se deve fazer. (Sussurro da esquerda.) Eu bem sei que esta doutrina é amarga, e por isso não póde agradar, mas tenham paciencia de a ouvir, porque eu tambem ouço aos D. Pares daquelle lado, cousas de que não gosto. (Riso.)

Ora, Sr. Presidente, disse-se tambem que devem vir esses homens para esta Camara, porque elles são os descendentes dos fundadores da Monarchia; Venham: mas permitta-se que eu observe que todos foram fundadores da Monarchia, a differença está era que uns foram a cavallo, e outros a pé; uns foram com espadas, e outros com chuços: mas quando se tractou de dar para baixo tanto deram uns como os outros, e tanto morreram uns como os outros: na partilha é que os peões não fiaram bem, porque uns ficaram com as terras, e os outros continuaram a trabalhar pelo suor do seu rosto. (Apoiados.) Venham pois todos á Camara pelos meios legaes, porque do resto eu ponho tudo de parte só pelo desejo que tenho de vêr unida a Familia portugueza, porque em quanto isto não succeder nós não havemos de ter paz, nem quietação; o isto desejo eu que se faça quanto antes.

Tenho concluido, Sr. Presidente, nada mais digo, nem tanto diria se não fosse, obrigado a isso pela minha posição especial; e declaro que não fiz referencia a ninguem, tractei a questão em these, e em these desejava eu que ella se tivesse tractado, sem me referir ao Candidato de quem se tracta, pelo qual tenho a maior deferencia e sympathia; mas isso não obsta a que eu vote pelo Parecer da Commissão. (Apoiados.)

Tendo dado a hora, declarou o Em.mo Sr. Presidente levantada a Sessão, dando para Ordem do dia de ámanhã a continuação desta discussão. — Eram quatro horas e meia.

Relação dos D. Pares que estiveram presentes na Sessão de 17 do corrente.

Os Srs. Cardeal Patriarcha, Cardeal Arcebispo Primaz, D. de Palmella, D. de Saldanha, D. da Terceira, M. de Castello Melhor, M. de Fronteira, M. de Loulé, M. das Minas, M. de Niza, M. de Ponte de Lima, Arcebispo de Evora, C. das Alcaçovas, C. das Antas, C. do Bomfim, C. da Cunha, C. do Farrobo, C. de Ferreira, C. de Lavradio, C. de Linhares, C. de Mello, C. da Ribeira Grande, C de Rio Maior, C. de Semodães, C. da Taipa, C. de Thomar, C. do Tojal, C. de Vimioso, Bispo de Beja, Bispo de Lamego, Bispo de Vizeu, V. de Algés, V. de Benagazil, V. de Campanhã, V. de Castellões, V. de Castro, V. de Fonte Arcada, V. de Fonte Nova, V. de Gouvêa, V. da Granja, V. de Laborim, V. de Oliveira, V. de Ovar, V. de Sá da Bandeira, B. da Arruda, B. do Monte Pedral, B. de Porto de Moz, B. de S. Pedro, B. da Vargem da Ordem, Pereira Coutinho, Pereira de Magalhães, Margiochi, Tavares de Almeida Silva Carvalho, Albergaria Freire, Portugal e Castro, Serpa Machado, Fonseca Magalhães, e Mello Breyner.

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