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CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

Sessão de 8 de agosto de 1868

PRESIDENCIA DO EX.MO SR. DUQUE DE LOULÉ

Secretarios, os dignos pares

Marquez de Sabugosa

Visconde de Soares Franco

(Assistiram os srs. presidente do conselho e ministros do reino, da guerra, da fazenda e das obras publicas.)

As duas horas e meia da tarde, estando presentes 31 dignos pares, declarou o sr. presidente aberta a sessão.

Lida a acta da precedente, julgou-se approvada, na conformidade do regimento, por não haver observação em contrario.

Deu-se conta da seguinte

Correspondencia

Um officio do ministerio dos negocios ecclesiasticos e de justiça, remettendo 80 exemplares do mappa estatistico das congruas arbitradas aos parochos e coadjutores das freguezias do continente do reino no anno economico de 1864-1865, impresso em 1868, em observancia do artigo 15.° da carta de lei de 15 de julho de 1857, para serem distribuidos pelos dignos pares. Foram distribuidos.

Um officio do ministerio da guerra, remettendo 60 exemplares de cada um dos 1.° e 2.° volumes da obra intitulada Historia da guerra civil e do estabelecimento do governo parlamentar em Portugal, comprehendendo a historia diplomatica, militar e politica d'este reino, desde 1777 até 1831, por Simão José da Luz Soriano, a fim de serem distribuidos pelos dignos pares. Distribuiram-se.

Um officio do digno par José Gerardo Ferreira Passos, participando que o seu estado de saude não permitte comparecer hoje á sessão. Inteirada.

Um officio, enviando 60 exemplares da Segunda memoria sobre os processos de vinificação empregados nos principaes centros vinhateiros do reino, para serem distribuidos pelos dignos pares. Distribuidos.

O sr. visconde de Benagazil communicou que o sr. D. Antonio José de Mello não comparecia por motivo de molestia.

O sr. Jayme Larcher: — Pedi a palavra para participar a V. ex.ª que vou mandar para a mesa os pareceres das commissões de obras publicas e de marinha relativamente ao projecto n.° 14, do qual requeiro a urgencia. Em seguida, sr. presidente, se V. ex.ª me permitte, usarei da palavra para fazer algumas considerações que se referem á situação em que actualmente nos achamos.

Sr. presidente, apresentou-se o novo gabinete, e tanto n'esta camara como na electiva, manifestaram os membros do gabinete a maior repugnancia quanto á apresentação de um programma. Portanto não cansarei ss. ex.ªs com perguntas que aliás ficariam sem resposta, talvez com rasão; porém, como é curto o espaço de tempo que nos restará até se encerrarem as côrtes, apresso-me em deixar consignadas as minhas idéas com relação a certos pontos que julgo dignos da mais seria attenção.

Parece, sr. presidente, querer o governo entrar em uma via de economias, completas e radicaes, com o fim de attenuar e porventura terminar as graves complicações financeiras que a todos assustam, o que eu sinceramente e de coração approvo, como o devem approvar todos que desejam o bem do nosso paiz. Entretanto, como esta apparencia se conclue de manifestação vaga e indefinida, por parte dos srs. ministros, tomarei como typo do systema economico e financeiro que parece quadrar com as idéas da maioria, o que consta de um folheto recentemente publicado sob o titulo de Palavras ao vento ou tentativa financeira, por um homem cujo anonymo respeitarei, limitando-me a declarar que tenho na mais alta consideração e respeito as raras qualidades de honestidade, de intelligencia e de instrucção que o distinguem.

Sr. presidente, em diminuto volume contém este opusculo grande massa util e um completo systema de reforma tanto na receita como na despeza publica, as quaes em resultado se equilibram, acrescendo a esta grande vantagem a extincção da divida nacional em menos de cincoenta annos. Comparando aquelle escriptor o seu orçamento ideal com o do anno economico decorrido, demonstra elle como a receita póde ter facil augmento de 2.291:000$000 réis. E quer v. ex.ª saber como elle obtém este augmento? É principalmente quasi exclusivamente com o maior rendimento do imposto directo, que n'este caso se eleva a réis 8.000:000$000, importando o predial em 4.300:000$000 réis, o pessoal em 2.500:000$000 réis e o industrial em 1.200:000$000 réis. A possibilidade de execução de tão sensata idéa vem por elle magistralmente demonstrada e bem claramente se vê que em nada se exageram as forças do contribuinte, e que a distribuição é equitativa.

Quanto á despeza, ainda a reducção é mais consideravel do que o era o augmento na receita; e posto que o encargo annual da divida publica suba a 8.200:000$000 réis, a eliminação possivel de 3.400:000$000 réis relativos aos juros e amortisações a cargo do thesouro e despeza extraordinaria, tudo do sobredito orçamento de 1867-1868 reunido a um corte de 20 por cento sobre a verba de 12.449:000$000 réis de despeza dos diversos ministerios, prefazem uma economia de 4.336:000$000 réis.

Permittam-me V. ex.ª e a camara que eu preste homenagem sincera de admiração pelo honrado homem que nos mostra até á evidencia como a troco de sacrificios exequiveis e compativeis com as forças da nação se attinge um louvavel desideratum, afastando para sempre a horrorosa idéa de bancarota nacional, por meio de uma sabia e economica administração.

Entretanto um ponto ha em que eu discordo e mesmo declaro formalmente que me não conformo com as idéas do auctor constantes do capitulo intitulado Melhoramentos publicos. Não quer o prudente administrador mais caminhos de ferro, e reduz as despezas a simples feitura de estradas ordinarias, a canalisação, a irrigações e ao desseccamento dos pantanos.

D'aqui posso concluir que durante cincoenta annos vergarão os povos sob um sacrificio constante sem poderem esperar que dentro d'este praso diminua o peso que os carrega, e só no fim de meio seculo é que uma nova geração, achando-se no mesmo ou em peior estado de atrazo relativamente ás nações civilisadas das que não param nem descansam, poderá continuar na via de progresso tão felizmente encetada em 1852.

Sr. presidente, não é assim que eu interpreto a sciencia administrativa e economica. Embora se façam justas economias, eleve-se em termos rasoaveis a receita, equilibrem-se as duas partes componentes do nosso orçamento; mas criem-se e desenvolvam-se ao mesmo tempo as fontes de receita, para que possamos esperar em nossa vida algum allivio aos pesados encargos que aceitámos, e para que deixemos aos que depois de nós vierem o paiz em completo estado de prosperidade e de adiantamento.

Continuando com a discussão n'este ponto da obra citada, vou mais longe e demonstrarei que não é com a parca dotação de 1.155:000000 réis, destinada para o ministerio das obras publicas, que se póde alcançar o que o auctor deseja.

A rede completa de estradas reaes e districtaes do paiz comprehende 12:646 kilometros, segundo consta da consulta do conselho de obras publicas em data de 14 de novembro de 1864, e a este numero modestamente adicionarei mais 5 por cento, differença entre o desenvolvimento calculado sobre um mappa por meio de linhas rectas tiradas entre os diversos pontos e aquelle que resulta das ondulações do terreno, elevando-se por consequencia a totalidade da rede a 13:288 kilometros. Segundo informações exactas importam em 2:776 1/2 kilometros as estradas construidas até fins de 1867, faltando por consequencia 10:512 kilometros para as completar.

Ora, se a construcção annual for de 210 kilometros em cincoenta annos, e não mais cedo, terminará esta rede de nossas communicações ordinarias; em dez annos ou vinte annos, a contar de hoje, pouco estarão mudadas as circumstancias do paiz relativamente a este ponto. Póde-se facilmente calcular o prejuizo enorme que nos trará este progresso tão lento, oppondo-se a que se desenvolvam na escala necessaria os recursos agricolas, industriaes e commerciaes do paiz. Porém vejamos o que acontece ainda n'esta marcha tão prejudicialmente demorada. As estradas não se fazem de graça, e calculando em 4:000$000 réis o preço medio do kilómetro nas diversas regiões, haverá a despeza annual de 840:000$000 réis, restando apenas 315:000$000 réis para os demais melhoramentos.

Sr. presidente, 315:000$000 réis para canalisações, para irrigações, para desseccamentos não bastam, são insignificantes. Muito menos bastam elles para dar á agricultura o impulso forte de que ella carece. Não bastam elles tambem para supportar a despeza que infelizmente nos trará a exploração dos caminhos de ferro, os quaes, segundo vou vendo, mais tarde ou mais cedo ha de ficar por conta do estado.

E de passagem permitta-me v. ex.ª que n'esta camara declare, em contrario ao que sem rasão se tem avançado, que não creio que uma exploração que rende menos de 1:000$000 réis, producto bruto kilometrico, dê para os gastos da mesma, quando n'ella se comprehendam, não só os elementos de administração, guarda e policia, conservação da via e do material circulante, que constituem as despezas da exploração propriamente dita, mas tambem os juros rasoaveis e amortisação do capital empregado.