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N.º 41

Presidencia do exmo. sr. Duque d’Avila e de Bolama

Secretarios — os dignos pares

Visconde de Soares Franco
Montufar Barreiros

Ás duas horas e um quarto da tarde, sendo presentes 23 dignos pares, foi declarada aberta a sessão.

Leu-se a acta da precedente, que se julgou approvada na conformidade do regimento, por não ter havido reclamação em contrario.

Não houve correspondencia.

(Entraram os srs. ministros dos negocios estrangeiros e da fazenda.)

O sr. Gosta Lobo: — Em tempo desejei interrogar o sr. ministro dos negocios estrangeiros a respeito do estado em que estavam as negociações entre o governo portuguez e o hespanhol com relação ao conflicto havido nas aguas do Algarve entre os pescadores das duas nações.

Avisei o sr. ministro particularmente do meu intento, mas s. exa. declarou-me que não podia dar informações algumas, porque era um negocio pendente aquelle a que eu me referia.

Desisti, pois, do meu intento. Agora, porém, como leio nos jornaes que o sr. ministro dos negocios estrangeiros do reino vizinho acaba de declarar no congresso dos deputados qual era o modo de ver do seu governo, parece-me conveniente que o sr. ministro dos negocios estrangeiros diga tambem qual o aspecto por que o governo portuguez encara esta questão.

Eu, sr. presidente, entendo ser da maxima conveniencia que negociações d’esta ordem sejam conhecidas pelo paiz, tanto quanto for compativel com o bem publico, e não creio que haja a menor duvida na resposta a esta pergunta, por isso que já sobre ella houve declarações por parte do governo da nação vizinha.

É escusado dizer que da minha parte não ha a menor idéa de causar assim embaraços ao governo.

O meu desejo é que o paiz seja informado de cousas que lhe importa saber.

O sr. Ministro dos Negocios Estrangiros (Andrade Corvo): — Começo por agradecer ao digno par, o sr. Costa Lobo, a maneira benevola por que acaba de fazer a sua interpellacão.

Sr. presidente, v. exa. e a camara sabem que em consequencia de acontecimentos a que foram estranhos os governos de Portugal e Hespanha, e em que a acção dos dois governos se manifestou unicamente com o fim de chegarem á conciliação; defendendo o que julgaram o seu reciproco direito, se levantou um conflicto no Algarve entre pescadores dos dois paizes.

Sabe v. exa. tambem que d’esse conflicto resultaram negociações, ainda pendentes quando houve a ultima crise ministerial no nosso paiz. Essas negociações, sr. presidente, têem proseguido da maneira mais cordata e conforme ás boas relações que felizmente existem entre o governo portuguez e o de Hespanha, a fim de se chegar a uma solução que satisfaça todos os interesses, e afaste as causas de futuros conflictos.

A declaração a que o digno par se referiu, e que eu fiz particularmente a s. exa., é a confirmação do mesmo que o sr. Silvela, ministro dos negocios estrangeiros do reino vizinho, declarou no parlamento, isto é, que haviam negociações pendentes entre os dois governos, no intuito não só de pôr termo ao ultimo conflicto, mas tambem de regular de futuro o uso da pesca nas aguas territoriaes dos dois paizes, de fórma que sejam protegidos os interesses dos que se entregam a esta industria, e a fim tambem de que se não originem novos acontecimentos, que possam inspirar cuidados, e levantarem inopportunas questões como aquellas que se passaram, e que foram de certo pouco agradaveis, tanto para nós como para o governo hespanhol.

Posso, pois, declarar a v. exa., á camara e ao digno par que essas negociações se acham pendentes e em via de prompta solução, e que da parte do governo hespanhol tenho encontrado a melhor vontade n’este negocio.

Nem é para admirar que assim succeda, porque á frente dos negocios publicos d’aquelle paiz está um distincto homem de estado, o sr. Canovas del Castillo, que comprehende bem as vantagens de se manterem as boas relações entre paizes vizinhos, a quem unem laços de amisade e reciprocos interesses; e porque está actualmente gerindo os negocios estrangeiros o sr. Silvela, que eu tive occasião de conhecer e apreciar durante a minha missão em Madrid, a quem o distinguem altas faculdades e perfeito conhecimento dos negocios, por ter sido por differentes vezes ministro, e que sempre tem mostrado a melhor vontade para com o nosso paiz.

Assim, pois, assegurando á camara que a resolução prompta d’este negocio não se fará esperar; posso tambem dizer que tenho esperança, direi quasi certeza, de que d’essa resolução ha de provir a vantagem de se pôr termo ás causas que têem dado origem aos conflictos que têem havido; por isso que se hão de n’uma convenção definir os direitos e as obrigações das duas nações, no que respeita á pesca, attendendo ao interesse e á harmonia de todos; e se hão de tomar disposições taes que previnam a repetição de conflictos entre os que se entregam á industria da pesca, resolvendo-se esta questão por uma vez.

O sr. Barros e Sá: — Mando para a mesa o parecer da commissão especial encarregada de examinar o projecto vindo da outra camara, reformando a lei eleitoral.

Leu-se na mesa e mandou-se imprimir.

O sr. Vaz Preto: — Mais uma vez insisto com os srs. ministros, para que mandem a esta camara os esclarecimentos que pedi, com relação ás gratificações e ajudas de custo que se dão aos empregados dos differentes ministerios sem serem auctorisadas por lei.

Preciso d’estes esclarecimentos para que esta camara e o paiz possam avaliar bem como as leis são cumpridas.

Insto, pois, com os srs. ministros para que satisfaçam a este meu pedido, porque de outra fórma me obrigarão a insistir n’elle com mais vehemencia.

S. exas. têem obrigação de enviar ás camaras quaesquer esclarecimentos que os membros do parlamento pedem com relação aos negocios publicos, quando não haja inconveniente para o estado.

Parece-me que a nota que eu peco não póde ter esse inconveniente, e por consequencia não sei a rasão por que não tem vindo, estando eu aqui a requerel-a quasi todos os dias.

Não posso admittir este systema do governo de estar a occultar o que se passa nas secretarias, quando o governo representativo deve ser governo de publicidade.

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Os srs. ministros estão constantemente a apresentar projectos que augmentam a despeza, sem crear a receita correspondente, e ao mesmo tempo estão dando gratificações illegalmente, a importancia das quaes poderia servir para satisfazer, pelo menos, alguns dos encargos que trazem ao thesouro aquelles projectos, e por isso eu desejaria fazer conhecer á camara e ao paiz em quanto importara essas gratificações.

Será isto systema de governar?

Peço á camara a sua attenção para estes factos.

O sr. Ministro da Fazenda (Serpa Pimentel): — Já declarei noutra occasião, que dei ordem positiva na secretaria para se enviarem para esta casa todos os esclarecimentos que fossem pedidos pelos dignos pares.

É preciso notar que ás secretarias chegam todos os dias uma infinidade de pedidos de esclarecimentos por parte dos membros do parlamento, o é impossivel satisfazer immediatamente a todos.

As copias dos documentos levam ás vezes tempo bastante, porque são numerosas e extensas, e, como succede na minha secretaria, ser diminuto o numero de empregados até para o serviço do expediente ordinario.

No ministerio da fazenda ha hoje cincoenta empregados a menos dos que havia em 1869 quando só fez a reforma dos quadros.

Esta falta de pessoal influe no serviço, e para este se fazer regularmente e estar em dia tem sido necessario fazer trabalhar extraordinariamente os empregados, e por esse trabalho extraordinario é que se entendeu dever ciar aos funccionarios que o fazem uma gratificação com que se lhes remunerasse o excesso de trabalho, e d’isto se tem tirado grande vantagem, como já disse na outra casa do parlamento quando ali se levantou esta questão.

Essas gratificações, que se não podiam deixar de dar, não vem descriptas no orçamento, mas estão incluidas nas verbas de despeza eventual, e figuram depois nas contas dos ministerios.

Digo isto, não porque deseje n’este momento entrar n’esta questão e explicar desenvolvidamente a concessão das gratificações, porque o caso não é agora este; mas simplesmente para mostrar ao digno par, o sr. Vaz Preto, que a demora que possa ter havido na remessa para esta casa, de quaesquer esclarecimentos que se tenham pedido, nunca é devida ao intuito da parte do governo de os occultar; porém, como a camara ve, dão-se circumstancias que se não podem remover de prompto, e são ellas que originam essa demora. Torno a dizer, na minha secretaria ha hoje cincoenta empregados menos que em 1869, e tendo augmentado consideravelmente o serviço desde então, o unico meio de que se tem podido lançar mão com vantagem, para remediar os inconvenientes para o serviço d’essa diminuição de pessoal, tem sido fazer trabalhar extraordinariamente os empregados, mas assim mesmo o serviço é tanto, que não tem sido possivel satisfazer com promptidão aos pedidos de esclarecimentos feitos por um grande numero de dignos pares e senhores deputados. Todavia, a ordem está dada para que se mandem ás camaras todos os esclarecimentos que por ellas sejam pedidos.

O sr. Vaz Preto: — Agradeço as explicações que o sr. ministro acaba de dar. Não desejo senão o que é possivel. Se, porém, no ministerio de s. exa. as causas que o illustre ministro apresentou explicam, e impedem que venham a esta camara com brevidade os esclarecimentos que pedi, não succede outro tanto nos outros ministerios. Por consequencia, a minha instancia agora é que, pelo menos, se remetta a esta casa a nota das gratificações que são dadas por esses ministerios.

Quanto á parte a que se referiu o sr. ministro, relativamente a ter no seu ministerio cincoenta empregados a menos do que tinha noutro tempo, não é rasão: pois se os empregados não são sufficientes para o serviço, deve propor a creação de mais logares, de fórma que o serviço se faça regularmente.

Se os logares d’esses empregados estão vagos, trate o nobre ministro de os preencher, o se o quadro da secretaria está completo então não ha empregados a menos.

Agora se s. exa. entende que esses empregados fazem serviço extraordinario e que se lhes deve dar uma gratificação, attendendo mesmo a que os seus ordenados são pequenos; apresente o illustre ministro a esta camara um projecto de lei, que o auctorise a conceder essas gratificações, porque, se for de justiça, nós não o impugnaremos. Mas o que não póde continuar, sr. presidente, é este systema, systema do cada ministro ilegalmente dar a seu bello prazer gratificações, systema este que nos conduz por um caminho errado.

O sr. Ministro da Fazenda: — É unicamente para dizer ao digno par, o sr. Vaz Preto, que não ha logares vagos.

A reforma que teve logar em 1869 diminuiu consideravelmente o quadro d’aquella repartição, ficando muitos empregados addidos, assim como ficaram addidos os do contrato do tabaco, e por consequencia a reforma não produziu logo o effeito desejado, que era o da economia, ou menor despeza.

Ora, desde 1869 até ao presente, têem morrido e tilem sido reformados cincoenta empregados. Eu tencionava trazer á camara um projecto de lei, que tivesse por fim augmentar o quadro da secretaria a meu cargo, porém nem tudo só póde fazer ao mesmo tempo.

Na camara dos senhores deputados ha um projecto, que de alguma fórma satisfaz a esta necessidade, mas tende a augmentar a despeza, e por isso pareceu-me mais conveniente demoral-o para a seguinte sessão. Aqui tem o digno par a rasão por que não tenho instado para que o projecto seja convertido em lei.

ORDEM DO DIA

O sr. Presidente: — Vamos entrar na ordem do dia. Deviamos principiar pela discussão do parecer n.° 299, mas como não está presente o sr. ministro da marinha, passamos a discutir o parecer n.° 308.

Foi lido na mesa e é do teor seguinte, assim como o respectivo projecto.

Parecer n.° 308

Senhores. — Foi presente á commissão de fazenda o projecto de lei n.° 311, pelo qual se auctorisa o tribunal de contas a applicar a prescripção de trinta annos no julgamento das responsabilidades sujeiras á sua jurisdicção fiscal, a fim de que possam ser declaradas livres, e entrar em circulação, grande numero de propriedades indefinidamente oneradas, ou sujeitas a responsabilidade, cujo julgamento porém é impossivel por falta dos elementos indispensaveis.

No mesmo projecto se estabelece uma outra disposição tendente a resolver uma duvida ácerca do resultado e dos effeitos dos accordãos do tribunal de contas julgando contas da epocha antiga.

A commissão, convencida de que as disposições do projecto são fundadas em principios de justiça e uteis para o paiz, é de parecer que seja approvado.

Sala da commissão, em 5 de abril do 1878. = Antonio de Paiva Pereira da Silva = Visconde da Praia Grande = Visconde de Bivar = Augusto Xavier Palmeirim = Barros e Sá.

Projecto de lei n.° 311

Artigo 1.° E applicavei a prescripção de trinta annos, sem distincção de boa ou má fé, no julgamento das contas dos exactores e mais responsaveis sujeitos á jurisdicção do tribunal de contas, tanto no que respeita ao capital como no que respeita aos juros.

Ari. 2.° O tempo da prescripção é contado desde o ultimo dia da gerencia.

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Art. 3.° A prescripção póde ser supprida de officio pelos tribunaes, e allegada e applicada em qualquer estado do processo, assim no tribunal de contas, como no supremo tribunal administrativo.

Art. 4.° A prescripção regulada por esta lei interrompe-se:

1.° Por citação ou intimação judicial ou administrativa do responsavel;

2.° Pelo reconhecimento expresso do direito da parte a quem a prescripção póde prejudicar.

Art. 5.° O effeito da interrupção é inutilisar para a prescripção todo o tempo decorrido anteriormente.

Art. 6.° Não se conta para os effeitos d’esta lei o tempo decorrido desde a distribuição do processo no actual tribunal de contas, quando no mesmo processo existirem os elementos indispensaveis para o julgamento.

Art. 7.° As disposições d’esta lei serão applicaveis ás gerencias findas antes da sua publicação quando tenham decorrido dois annos, contados desde o dia em que ella começar a obrigar.

Art. 8.° Os empregados que, por sua negligencia ou falta de zelo no cumprimento de seus deveres, contribuirem para a prescripção de quaesquer direitos, alem de incorrerem nas penas actualmente estabelecidas nas leis e regulamentos em vigor, ficarão solidariamente responsaveis para com a parte prejudicada.

Art. 9.° A responsabilidade de que trata o artigo antecedente será julgada no mesmo accordão que applicar a prescripção, se o processo offerecer os necessarios elementos ou prova, e com previa audiencia dos mesmos empregados.

Art. 10.° E permittido o encontro dos creditos comias dividas dos responsaveis á fazenda publica, quando assim os creditos como as dividas forem o resultado dos accordãos definitivos do tribunal de contas, que julgarem contas anteriores á epocha corrente, e disserem respeito ao mesmo responsavel.

Art. 11.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 5 de abril de 1878. = Joaquim Gonçalves Mamede, presidente = Francisco Augusto Florido da Mouta e Vasconcellos, deputado secretario = Alfredo Filgueiras da Rocha Peixoto, deputado secretario.

O sr. Presidente: — Está em discussão na sua generalidade.

Posto á votação foi approvado sem discussão, tanto na generalidade como na especialidade.

O sr. Presidente: — Passamos a discutir o parecer n.° 298.

Foi lido na mesa o parecer, que é do teor seguinte e respectivo projecto.

Parecer n.° 298

Senhores. — As vossas commissões de fazenda e obras publicas, reunidas, examinaram attentamente o projecto de lei n.° 300, vindo da camara dos senhores deputados, e que tem por fim auctorisar o governo a adjudicar em hasta publica a construccão do caminho de ferro do Algarve e a conclusão das linhas de sul e sueste.

De ha muito que se apresenta a idéa de nos aproveitarmos do caminho de ferro do sul e sueste, para por meio do seu valor obtermos a construccão de novas vias ferreas ou pelo menos attenuar muito os encargos que resultariam para o estado da sua construcção.

Tem por fim o presente projecto de lei a realisação d’este pensamento, e por meio d’elle se obtêem vantagens incontestaveis, como a construccão do caminho de ferro do Algarve, e por consequencia a communicação estabelecida entre aquella provincia e a capital do reino; a continuação do ramal de Extremoz até ao caminho de ferro de leste e a conclusão da linha de Beja, desde Serpa até á fronteira de Hespanha, na direcção do caminho de ferro de Huelva. E com isto não aggravamos de fórma alguma as circumstancias financeiras do thesouro, pois estas linhas serão construidas sem subvenção alguma, nem garantia de juro, e é mesmo conservado ao governo o actual rendimento liquido das linhas de sul e sueste.

Em compensação d’estas vantagens é concedida á companhia adjudicataria a exploração, por um periodo determinado, do actual caminho de ferro do sul e sueste, com todo o seu material fixo e circulante e suas dependencias.

Se o augmento de rendimento da rede do Alemtejo tem sido até hoje vagaroso, é de esperar que com a conclusão d’essa rede e com a sua ligação com a provincia do Algarve, esse rendimento cresça mais rapidamente, e n’esse caso, e logo que exceda a quantia de 3:000$000 réis por kilometro, fica o governo interessado, n’uma certa proporção, n’esse augmento de receita.

Vêem, pois, as vossas commissões que este projecto de lei tende, sem encargos para o thesouro, a dotar o paiz com um importante melhoramento material, com um poderoso instrumento de producção, que muito ha de contribuir para o augmento da riqueza publica, e são por consequencia de opinião que deve ser approvado e convertido em lei do estado o projecto de lei n.° 300.

Sala das sessões das commissões reunidas de fazenda e obras publicas, 3 de abril de 1818. = Marquez de Ficalho = Conde do Casal Ribeiro = Visconde de Bivar = Antonio de Azevedo Coutinho Mello e Carvalho = Jayme Larcher (vencido) = Augusto Xavier Palmeirim = Marino João Franzini = João Baptista da Silva Ferrão de Carvalho Mártens = Barros e Sá = Visconde da Praia Grande = D. Affonso de Serpa Leitão Pimentel, relator.

Projecto de lei n.° 300

Artigo 1.° É auctorisado o governo a adjudicar em hasta publica, precedendo concurso de quarenta dias, sem subvenção nem garantia de juro:

1.° A construccão do caminho de ferro do Algarve;

2.° A construccão dos prolongamentos das linhas do sul e sueste, desde os pontos que forem marcados nos projectos até ao caminho de ferro portuguez de leste, e até á fronteira na direcção da linha hespanhola de Huelva;

3.° A exploração das linhas construidas em virtude dos n.ºs l.° e 2.°;

4.° A exploração dos caminhos de ferro do sul e sueste, que actualmente são explorados pelo estado.

§ 1.° A construccão do caminho de ferro do Algarve será feita com via larga ou reduzida, como o governo o entender mais conveniente.

§ 2.° A construccão e exploração, a que se referem os numeros precedentes, serão concedidas e feitas nos termos d’esta lei, e segundo as clausulas e condições dos contratos approvados pelas leis de 29 de maio de 1860 e de 23 de maio de 1864; de modo que nunca possam as inclinações ser superiores a Om,015 por metro, nem os raios de curva inferiores a 300 metros para a via larga e 120 para a via reduzida.

§ 3.° A exploração será concedida por noventa e nove annos contados da data da adjudicação.

Art. 2.° A empreza adjudicataria será obrigada a pagar, e a assegurar ao estado, durante o praso da exploração, uma annuidade pelo menos igual ao producto liquido dos caminhos do sul e sueste, calculado pelo producto medio dos ultimos tres annos, contados até á publicação da presente lei, excluido o imposto de transito, que continuará a ser pago como actualmente.

§ unico. Quando o producto bruto kilometrico das linhas concedidas e exploradas em virtude d’esta lei exceder réis 3:000$000, 30 por cento d’esse excesso ficarão pertencendo ao governo, livres para elle de quaesquer despezas.

Art. 3.° A licitação versará sobre a annuidade que deve ser paga ao governo, não podendo essa annuidade em caso nenhum ser inferior ao producto liquido calculado e fixado nos termos do artigo 2.°

§ 1.° Ninguem será admittido a licitar sem ter previamente depositado no banco de Portugal, em dinheiro ou em

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titulos de divida publica pelo seu valor no mercado, a quantia de 135:000$000 réis.

§ 2.° O deposito definitivo será igual a duas vezes a annuidade que for estipulada em resultado da licitação. A empreza adjudicataria, depois de paga a primeira annuidade, e de construidas obras no valor d’este deposito, poderá substituir por titulos fiduciarios que ella emitta, com juro e amortisação, o valor do mesmo deposito.

§ 3.° O deposito definitivo só poderá ser levantado, depois de serem examinadas e approvadas pelo governo, e abertas á circulação publica, as linhas que a empreza fica obrigada a construir.

Art. 4.° A empreza adjudicataria obriga-se a começar os trabalhos de construcção daninha do Algarve, e dos prolongamentos, no praso de dois mezes; e a concluil-os no praso de quatro annos, contados da data do contrato.

Art. 5.° A empreza adjudicataria obriga-se tambem afazer na estação do Barreiro todas as obras necessarias, assim nos edificios e officinas, como nos cães e pontes, para se fixar ali a estação terminus da rede dos caminhos de ferro do sul e sueste.

Art. 6.° O governo é auctorisado a conceder á empreza os trabalhos feitos na linha do Algarve e no prolongamento de Quintos. E igualmente lhe concederá todo o material fixo e circulante das linhas de sul e sueste, officinas, machinas, instrumentos, estacões, telegraphos, edificios e obras accessorias e vapores.

Art. 7.° Quando, por meio de rescisão dos contratos, ou depois de terminado o praso de noventa e nove annos, por que se faz a adjudicação, o estado novamente tomar conta das linhas, a empreza adjudicataria entregará a este todo o material circulante, vapores e mais objectos, que d’elle tiver recebido na epocha da adjudicação, ou o seu valor correspondente, procedendo-se nas duas epochas- á avaliação, para que o estado não seja nunca defraudado pelo uso que tiverem tido esses mesmos objectos.

Art. 8.° Ficam sendo consideradas como fazendo parte d’esta lei as clausulas do decreto de 15 de julho de 1875, relativo á concessão do ramal do Pinhal Novo a Cacilhas.

Art. 9.° O governo dará conta ás côrtes do uso que fizer das auctorisações concedidas n’esta lei.

Art. 10.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 1 de abril de 1878. = Joaquim Gonçalves Mamede, presidente. = Francisco Augusto Florido da Monta e Vasconcellos, deputado secretario == Alfredo Filgueiras da Rocha Peixoto, deputado secretario.

O sr. Presidente: — Está em discussão na sua generalidade.

O sr. Larcher: — Sr. presidente, eu pedi a palavra para explicar por que assignei vencido o parecer das commissões de fazenda e obras publicas, relativo ao projecto que agora se discute; e se venho lançar este tributo sobre a paciencia dos meus illustres collegas, quando podia limitar-me a caracterisar por esta fórma a minha opinião, é isto devido ás condições especiaes em que me encontro, as quaes v. exa. e a camara porventura attenderão.

Sr. presidente, eu sou um dos dois engenheiros civis que têem assento n’esta casa desde 1865; quando me coube a honra de dar aqui entrada, não se apresentou questão alguma sobre caminhos de ferro, sem que eu n’ella tomasse parte mais ou menos activa, e, salvo raras excepções, defendendo como melhor sabia e podia os projectos que se discutiram. Parece-me portanto, que não teria interpretação favoravel o meu silencio n’esta occasião, uma das taes excepções em que me acho em desaccordo, até agora pelo menos, com o governo e com a maioria das commissões.

Digo até agora, porque este retrahimento do meu voto, significando apenas duvidas que me impressionam, e receios derivados d’estas duvidas, é possivel que as explicações que houverem de dar-se durante a discussão me esclareçam e soceguem, circumstancia que considerarei feliz para mim?

por cessar esta divergencia que realmente me peza, e me traz apprehensivo sobre o estado da minha inteliigencia.

Dito isto, e asseverando a v. exa. e á camara que este meu procedimento não envolve idéa alguma de censura nem de desconfiança pelo actuai governo, cujas eminentes qualidades muito prezo, e cujas boas intenções reconheço, entrarei no assumpto.

- Sr. presidente, assignei vencido o parecer, porque não vejo no projecto disposição alguma .que possa convidar o capital, seja qual for a sua nacionalidade, a arriscar-se no acabamento da rede do sul do Tejo, e ao mesmo tempo por ver annunciada no relatorio que acompanha o projecto a existencia de propostas tendentes áquelle fim.

O artigo 2.° diz:

(Leu.)

Ora, se nos regularmos pelo rendimento liquido dos tres ultimos annos economicos, cuja especificação tenho aqui presente, esta media representa um pouco mais ou menos de 186:000$000 réis, maior será ainda a obrigação para a empreza adjudicataria se esta media se deduzir, como parece dever succeder, dos tres ultimos annos civis, pois que o resultado do anno de 1877 foi mais favoravel que o dos precedentes.

Mas, quer seja a media de 186:000$000 réis, quer ella seja maior, é certo que para esta annuidade basta o rendimento liquido actual da rede.

Mas, alem d’isto, a empreza será obrigada, pelos n.ºs 1.° e 2.° do artigo 1.° d’este projecto, a construir o caminho de ferro do Algarve e os prolongamentos da rede do sul até Paimogo e até á linha de leste; e pelo artigo 5.° a fazer as obras seguintes.

(Leu.)

Ora, com os dados que a pratica da construcção e da exploração d’esta rede nos fornece, e calculando por baixo, encontra-se que: para a construcção de novos troços de linha ferrea, para acabada terraplenagem e as obras de arte na secção de Portella da Silveira a Boliqueime, e a construcção do cães do Barreiro; para assentar a via entre Cazevel e Faro; para o material circulante e edificios na linha do Algarve e nos dois prolongamentos, são necessarios 4.000:000$000 réis, que exigem uma annuidade de 260:000$000 réis para serem amortisados em vinte e nove annos, e para terem os juros pagos a rasão de 6 1/2 por cento.

Verdade é que este encargo, que a empreza terá de supportar, será attenuado com o augmento do rendimento liquido, não só nos 312 kilometros já explorados, mas tambem nos prolongamentos que estão projectados.

Para calcular este auxilio recorri tambem ao que deu a pratica de oito annos nas linhas em exploração, e encontrei que desde 1870 a 1877 houve um augmento annual medio de 11:600$000 réis.

N’esta apreciação do futuro, appliquei esta mediana devida proporção, tanto á exploração dos 312 kilometros, como á dos 98 kilometros dos dois prolongamentos que hão de unir a rede do sul com o caminho de ferro hespanhol de Huelva, e á linha de leste.

Quanto á linha propriamente do Algarve, disseram-me engenheiros, que por ali trabalharam nas differentes secções, que a exploração d’este caminho de ferro dará logo no primeiro anno uma perda de mais de 70:000$000 réis, asserção esta que alguns proprietarios do Algarve não desmentiram.

Tambem acceitei esta informação, mas para lhe applicar, como attenuante tambem na devida proporção, os mesmos 11:600$000 réis já citados.

Pois, sr. presidente, com estas bases mais ou menos contestaveis, mas que aproveito como as mais exactas de que posso dispor, encontro no fim de quatro annos, que deve durar a construcção, um desembolso para a empreza de cerca de 1.000:000$000 réis, e que só no decimo anno é que haverá equilibrio entre a annuidade dos 260:000$000

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réis e o rendimento liquido da rede, tendo a companhia gasto 2.300:000$000 réis.

Póde sem duvida objectar-se que o rendimento liquido ha de crescer progressivamente quando se ligar a rede do sul do Tejo com as linhas de leste e di Huelva, e que a linha do Algarve não dará aquella perda, no principio da exploração, e que a dará muito menor do que os 70:000$000 réis noticiados.

Mas, sem discutir estas vantagens, cuja realisação muito desejo, o que posso dizer é que o deficit é de tal marca, e tão largo o praso em que elle se exerce, que haverá logar a intervenção benéfica de todas as modificações melhoradoras, mas tambem para serias apprehensões que devem afugentar os concorrentes.

Differente seria se a par d’este onus houvesse no projecto concessões de terrenos marginaes, disposições tendentes a promover a colonisação n’estes terrenos, privilegios para crear e desenvolver rapidamente a industria e a agricultura, em summa a previsão de um movimento extraordinario de passageiros e de mercadorias. Mas o que apparece é simplesmente uma construcção e uma exploração de linhas, que certamente não darão lucro durante um a serie de annos não pequena, e que provavelmente darão perda consideravel.

Nem os precedentes havidos até agora nos auctorisam a crer que se apresentem concorrentes.

A companhia real dos caminhos de ferro portuguezes tem perdido o seu capital, porque ha perto de quinze annos que não paga juro das suas acções.

A companhia dos caminhos de ferro do norte, apesar de ter recebido 2.700:000$000 réis em 1869, contra a disposição expressa do artigo 15.° do contrato de 14 de outubro de 1865, contra as do decreto de rescisão de 23 de maio de 1866, e da sentença do tribunal arbitral em 10 de novembro de 1866, pouco satisfeita ficou, segundo me consta.

É talvez pelo effeito que estes factos devem ter produzido lá fóra, que nos concursos que successivamente se abriram para a adjudicação do caminho de ferro da Beira Alta appareceram exigencias de subvenção de 27:000$000 e de 28:000$000 réis, e entretanto tratava-se de uma região populosa, rica e productiva, completamente differente das provincias do sul de Portugal.

Por todas estas rasões parece-me que nenhuma empreza se apresentará a este concurso cuja abertura é, portanto, inutil.

Mas se alguma concorrer, ou ella será inepta e se arruinará consumindo-se em esforços estereis para si e para nós: ora nunca este paiz quiz nem quererá contribuir scientemente para a ruina de ninguem, como bem o prova o decreto de 10 de março de 1869; ou então contará com recursos extraordinarios, cujo alcance não posso medir: ou calculará, talvez, a exemplo da companhia dos caminhos de ferro portuguezes, que poderá attenuar o seu deficit ou augmentar o seu lucro á custa da bondade do serviço de exploração; ou poderá mesmo ser um jogo de bolsa, legitimo talvez para os capitalistas que o tentarem, mas ao qual me parece que o estado se não deve associar.

Em todos os casos, tenho diante de mim o desconhecido, e por isso tenho receios — receio de ver adiar para, Deus sabe quando, o acabamento da nossa rede do sul do Tejo.

Todos conhecem perfeitamente os meios que as emprezas d’esta ordem costumam empregar para alcançarem adiamentos successivos e quasi indefinidos, e portanto escusado é entrar em detalhes de historia. Receio da pressão que a empreza desilludida possa exercer sobre qualquer governo d’este paiz, o que não seria caso novo, mas simples repetição da desastrosa campanha de 1866 até 1869, cujas circumstancias nenhum dos dignos pares ignora.

Receio, finalmente, de ver no caso que a muitos pareceria o melhor e que seria o da realisação d’este projecto, a nossa viação acelerada constituindo monopolio de companhias poderosas, que, infalivelmente, se uniriam em defeza de seus proprios interesses ainda quando o paiz tenha que soffrer com a satisfação d’elles.

Tendo assim exposto as minhas duvidas e os meus receios, não concluirei sem confirmar o que em principio disse relativamente á confiança que me merece o actual governo.

Sr. presidente, li no Diario da camara dos senhores deputados, que o nobre ministro das obras publicas dissera, em sessão de 26 do mez passado, que, se não apparecesse concorrente algum á adjudicação de que se trata, o governo apresentaria na proxima sessão legislativa uma proposta com o fim de dotar o estado com os meios necessarios para acabar promptamente a rede dos caminhos de ferro do sul do Tejo. Pois eu comprazo-me em declarar que, se o meu amigo o sr. Lourenço de Carvalho, em vez de a adiar para d’aqui a um anno, quizesse apresentar hoje uma proposta n’este sentido, eu daria a s. exa. o mais franco e decidido apoio, sentindo-me com forças bastantes para provar a esta camara; 1.°, que o estado póde levantar o capital necessario para o prompto acabamento da rede, sobre a base do rendimento liquido já existente, note bem a camara, sem complicar por fórma alguma as transacções analogas relativas aos caminhos de ferro do Minho e do Douro e ao da Beira Alta, cuja construcção foi ha pouco approvada; 2.°, que longe de haver déficit a preencher haveria lucro directo sempre crescente alem do beneficio indirecto do paiz e do thesouro, que a exploração por conta do estado promoveria por fórma muito mais certa e efficaz do que sendo ella confiada a uma companhia.

É quanto me cabe dizer n’esta occasião.

Leu-se na mesa o seguinte officio.

Um officio do ministerio das obras publicas, remettendo os documentos pedidos pelo digno par visconde de Bivar, ácerca do caminho de ferro do Algarve.

Para a secretaria.

O sr. Presidente: — Tem a palavra o sr. conde de Cavalleiros.

O sr. Conde de Cavalleiros: — Uma vez que o nobre relator da commissão tambem pediu a palavra, desejava ma concedesse depois de eu ouvir o digno par.

O sr. Presidente: — Tem a palavra o sr. D. Affonso de Serpa.

O sr. D. Affonso de Serpa (relator): — Sr. presidente e a primeira vez que tenho a honra de fallar n’esta casa, não admira, portanto, que eu sinta em mim um certo receio respeitoso ao levantar pela primeira vez a minha voz n’esta assembléa tão illustre, tão illustrada e a todos os respeitos tão digna de consideração. Vejo diante de mim muitos dos homens mais notaveis do meu paiz. É natural por isso o meu acanhamento, e não menos natural a convicção em que estou da pouca ou nenhuma auctoridade que a minha voz póde ter n’esta camara.

Em todo o caso, não posso nem quero eximir-me á obrigação que me impõe a honra que me fizeram as commissões de fazenda e obras publicas nomeando-me para relator do sou parecer sobre este projecto.

Ha inda uma circumstancia, sr. presidente, que me torna muito difficil o eu fallar hoje n’esta casa. Existem aqui apenas dois engenheiros civis, o meu collega o sr. Jayme Larcher, e eu, e é exactamente esse collega que vem levantar-se e fallar contra o projecto; é esse collega, tão distincto e de um merito tão reconhecido, que eu tenho de combater, e de quem tenho de me defender.

E tão modesta a minha posição, são tão pequenos os meus conhecimentos e a minha illustração com relação a qualquer dos membros d’esta casa, que me sinto acanhado; mas quanto maior é a distancia que me separa de s. exa., tanto mais direito eu julgo ter á sua benevolencia, benevolencia que esta casa nunca negou a ninguem, de que eu muito careço, e com a qual conto.

Sr. presidente, as opiniões do sr. Jayme Larcher, meu distincto collega e meu amigo, são perfeitamente conheci-

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das n’esta casa, porque s. exa. mais de uma vez as tem aqui manifestado.,

O digno par é partidario decidido das construcções dos caminhos de ferro por conta do estado. Eu tambem o sou sr. presidente, mas isso não impede que eu mais de uma vez tenha julgado conveniente a construccão de caminhos de ferro por conta de companhias. Tive a honra de ser relator do parecer das commissões sobre a construcção do caminho de ferro da Beira Alta, e defendo hoje este. Sou partidario das construcções por conta do governo, sou partidario em theoria, mas na pratica reconheço que ha circumstancias especiaes que nos aconselham a pôr de parte este modo de construccão para dar a preferencia a construcções feitas por companhias.

O digno par não approva este projecto, entendendo que o governo devia apresentar que um projecto de lei para fazer a construccão por conta do estado.

Parece-me que o digno par com a sua opinião vae um pouco longe, julgando favoravelmente de mais as circumstancias em que se nos apresenta a fazenda publica.

Sr. presidente, nós estamos sobrecarregados com a construccão das linhas1 ferreas do Douro e Minho, para a conclusão das quaes o governo pede por um projecto de lei que está pendente n’esta camara, a quantia de 1.700:000$000 réis, e temos alem d’isso dentro em pouco a construccão do caminho de ferro da Beira Alta.

Com todos estes encargos seria difficil para o governo o ter de se sobrecarregar ainda com a construccão de mais este caminho de ferro. E não se diga que isso está no modo por que o digno par entende que se póde fazer esta construccão por conta do estado.

O digno par quer que se levantem os fundos necessarios para a construccão, designando-se já o actual rendimento liquido das linhas do sul e sueste para pagamento do juro e amortisação d’esse capital levantado.

Mas, sr. presidente, para o thesouro tanto importa que o dinheiro necessario para, pagamento dos juros e amortisação saia d’esse rendimento, como de outro qualquer; é sempre uma construccão por conta do estado, o thesouro fica sempre, igualmente onerado.

O unico meio, quanto a mim, que se apresenta ao governo, nas actuaes circumstancias, para poder construir esta linha, é entregal-a a uma companhia.

Haverá, porém, uma companhia que queira tomar esta construccão? E este tambem um dos argumentos apresentados.

O projecto que hoje se apresenta não traz encargos para o thesouro, e se os não traz, porque se não ha de fazer a tentativa?

Na difficuldade da minha posição sustentando este projecto, encontro ainda mais um espinho. O digno par, para combater este projecto, exalta-lhe um certo numero de vantagens, por fórma que, querendo ser accusador, é realmente o seu defensor.

S. exa., que ataca o projecto, só encontrou vantagens para o governo; e eu, que sou o seu defensor, é que tenho de procural-as para a companhia. É uma posição difficil.

O digno par, tratando dos encargos que devem resultar para a companhia, avaliou em perto de 4.000:000$000 réis as despezas da construccão da linha do Algarve, e dos prolongamentos de sul e sueste, e para a acquisição do material fixo e circulante necessario para a exploração, e calculou que, com a annuidade que deve ser paga ao governo, ficava um encargo annual de 400 e tantos contos de réis, não contando os prejuizos que deve dar nos primeiros annos a exploração da linha do Algarve.

O meu illustre collega conhece perfeitamente as vantagens que resultam sempre da conclusão de caminhos de ferro, e, por consequencia, não póde desconhecer quantos não devem resultar da ligação entre si das linhas ao sul do Tejo. Vamos fechar as malhas de uma rede descontinua, vamos por meio de novos elos unir troços separados da mesma cadeia.

Nós vamos ligar a linha de sul e sueste com a quasi construida linha hespanhola, com o porto de Huelva, que tem uma grande exportação para Portugal, e que parece deverá passar a ser feita pelo caminho de ferro, com grande proveito do commercio e da empreza que explorar estas linhas.

Pois será inutil, n’um paiz como o nosso, todo elle estendido de norte a sul, onde ha uma grande variedade de culturas, uma diversidade immensa de productos, ligar um com outro os extremos d’esse paiz?

E que outra cousa fazemos nós construindo o caminho de ferro do Algarve e ligando a linha de sueste á de leste? (Apoiados.) Vamos estabelecer uma communicação entre Faro, ao sul do Algarve, e Valença, ao norte do Minho.

Será isto inutil, desvantajoso e indifferente para o paiz? Parece-me que não.

Receia o digno par que não haja companhia que pretenda a adjudicação d’estas linhas, e que, quando appareça alguma, ella não cumpra o contrato, porque os caminhos devem dar prejuizo. Eu tenho uma opinião contraria. Confio no bom resultado dos caminhos de ferro, e acredito que ha de haver companhia que contrate nas condições que se acham consignadas n’este projecto, e que as cumpra; todavia, se ella faltar ao seu dever, o governo póde evitar o prejuizo, porque tem na sua mão o deposito.

O exemplo citado com relação ao que se passou com a companhia ingleza dos caminhos de sul e sueste, não me parece que possa ser adduzido. O governo foi dar a essa companhia uma somma de 2:700 e tantos contos de réis, que não estava obrigado a dar em virtude das condições do contrato; entretanto, se eu, sr. presidente, tivesse de lamentar alguma cousa, não era de certo o dinheiro que se deu de indemnisação á companhia do caminho de ferro do sul e sueste, porque ainda não ha muitos dias, na outra casa do parlamento, o nobre ministro das obras publicas disse, e provou pelas contas apresentadas, que o governo obteve prompto e em exploração este caminho de ferro, com 323 kilometros, pela quantia de 1.500:000$000 réis, creio eu; não tenho, portanto, que lamentar. (Apoiados.)

Sr. presidente, quanto á questão, ha para mim uma circumstancia, que me serve de argumento fortissimo, para que eu me anime a não ter medo das grandes companhias, a que o digno par alludiu. Eu tenho a certeza intima de que não ha governo nenhum, absolutamente nenhum, em Portugal, que não queira bem ao seu paiz, venha esse governo de onde vier, seja de que partido for. (Apoiados.)

Todos teem a peito, primeiro que tudo, o bem do paiz, sr. presidente; mas eu, desde que os argumentos do meu illustre collega, o sr. Larcher, não provam senão a favor do governo, vejo-me na posição de atacar o projecto, e a verdade é que já não tenho mesmo ponto algum por onde o possa fazer.

O digno par ve no projecto tudo vantagens para o governo. Eu estive procurando as vantagens para a companhia, e isto por uma rasão bem simples, porque estimando os interesses do governo, e as vantagens dos melhoramentos materiaes do paiz, quero tambem os interesses das companhias.

Por mais que procure, não vejo no projecto difficuldades algumas que possam obstar, a que uma companhia aufira uns lucros rasoaveis e licitos d’esta empreza.

Sr. presidente, contra o que eu me insurjo é contra o systema - como os caminhos de ferro do sul, sueste e Algarve teem sido construidos; contra isso é que eu me revolto. Applicar para caminhos de ferro 300:000$000 réis por anno, não é querer fazer caminhos de ferro. Pois, que é construir 14 kilometros por anno? E um dinheiro despendido que se poderia considerar perdido. Não se construem caminhos de ferro como se construem estradas ordinarias. Eu não vejo outra maneira de construir a rede dos cami-

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nhos de ferro do sul e sueste senão a que o governo deseja. O sr. ministro não apresentaria este projecto á camara se não tivesse muitas indicações de que havia companhias que o quizessem tomar; portanto o, receio, que me pareceu existir, de que nenhuma companhia tomaria o caminho de ferro nas condições que se pretende, é infundado.

Sr. presidente, eu não sei se algum ponto mais haverá no projecto sobre que o digno par deseje que eu lhe de mais algumas explicações. Se s. exa. entender que deixei de responder a qualquer das duvidas que s. exa. enumerou, estou prompto a tornar a palavra novamente para responder ao digno par.

Peço desculpa á camara do tempo que lhe tomei, e agradeço-lhe a sua benevolencia em me ouvir.

O sr. Conde de Rio Maior: — Em 23 de junho de 1664 escrevia, as seguintes palavras o padre Antonio Vieira a D. Rodrigo de Menezes: «E finalmente, senhor, quando entre todas estas rasões considero a resolução tornada, não posso deixar de entender que ha debaixo d’ella algum intento da Providencia Divina, que o tempo mostrará qual seja».

E effectivamente, sr. presidente, quando todos os dias se prova o augmento desregrado da despeza, o deficit enorme que nos ataca, e a inconveniencia politica de muitos projectos apresentados á discussão, os quaes nem ha tempo para examinar, e que nos chegam á ultima hora, lembro-me e penso qual será o intento que a Providencia Divina nos reserva, e que o futuro nos mostrará qual seja?

Sr. presidente, não se trata hoje de novas despezas, não se trata de pôr em risco por meio de novas aventuras os corpos do estado; trata-se, e n’este ponto tenho opinião opposta ao meu digno collega, o sr. Larcher, de cercear uma importante receita do estado, entregando o caminho de ferro de sul e sueste á especulação de uma empreza particular.

Sr. presidente, não sou engenheiro, nem tão pouco financeiro, limitar-me-hei, pois, a apresentar singelas observações, fundadas nos esclarecimentos que adquiri sobre este assumpto, levado pelo desejo de elucidar a minha consciencia e. de determinar o meu voto, de modo que não praticasse um erro quando tivesse de votar sobre este projecto.

Pelo projecto dá-se á empreza adjudicataria, como subvenção, o caminho de ferro do sul e sueste, hoje em exploração pelo estado; e pelo artigo 2.° a empreza é obrigada a pagar, e a assegurar ao estado, durante o praso da exploração, uma annuidade igual ao producto liquido dos caminhos do sul e sueste, calculada pelo producto medio dos ultimos tres annos, contados até á publicação da presente lei, excluido o imposto de transito, que continuará a ser pago como actualmente.

Ora o sr. ministro, na camara dos senhores deputados declarou que este caminho de ferro tinha rendido liquido, comprehendendo o imposto de transito:

Em 1874............ 163:000$000 réis

Em 1875............. 159:000$000 »

Em 1876............. 155:000$000 »

E sendo a media, portanto, 159:000$000 réis, deduzindo-se o imposto de transito em virtude do artigo 2.° do projecto, cuja media nos mesmos tres annos é de réis 16:000$000, fica 143:000$000 réis a garantir ao estado pela empreza adjudicataria.

Este calculo varia um pouco, porque os tres annos são contados até á publicação da presente lei; mas a differença não será grande.

A somma necessaria para a conclusão dos prolongamentos, comprehendendo a construcção das estacões, etc., é, segundo as indicações e calculos que foram apresentados na camara dos senhores deputados, por occasião de só discutir este projecto, de 3.700:000$000 réis. E este o custo provavel da conclusão da linha do sul e sueste, conforme os algarismos fornecidos pelo sr. Braamcamp, e que não foram contrariados pelo sr. ministro das obras publicas. Logo o encargo para a empreza, calculando em 7 por cento o juro dos 3.700:000$000 réis, será de 259:000$000 réis, e mais 143:000$000 réis, que é o que a empreza tem de pagar ao estado, o que tudo perfaz a somma de 402:000$000 réis. É indubitavel que feitos os prolongamentos do caminho de ferro do sul e sueste, e ligado este pelo Algarve com Faro pelo leste com o caminho de ferro de leste, estabelecendo communicação directa com a Beira Alta e norte de Portugal, e pelo lado da Hespanha com Huelva; é indubitavel, digo, que o rendimento d’esta linha, quando for posta em exploração, ha de augmentar na proporção d’estas muitas vantagens, e seria caso nunca visto se tal não acontecesse. Este caminho de ferro por ora não tem pés nem cabeça, e por consequencia não póde andar nem governar.

Creio que esta minha asserção não será contestada por parte dos srs. ministros, que eu vejo constantemente virem aqui dizer que a opposição não comprehende o alcance dos caminhos de ferro. Pois eu agora direi ao governo, que estou convencido que ha de ser tanto o rendimento d’esta linha, quando ella estiver concluida, que ha de deixar atrás de si todas as prophecias, e mesmo as melhores esperanças, que se tenham concebido.

Eu li tambem, sr. presidente, que na discussão que houve na camara dos senhores deputados, desculpe-me camara, se me refiro tantas vezes á discussão da outra casa do parlamento, mas não tive outros meios de me esclarecer, nem o tempo me sobejava para examinar relatorios officiaes, ou procural-os; eu li, digo, que o rendimento liquido kilometrico é calculado actualmente em 600$000 réis, e como as despezas de exploração por conta do estado nunca são tão economicas, como sendo feitas por uma companhia, esta consideração, junta á que resulta da vantagem provavel de estar a rede toda completa em exploração, leva-me a poder affirmar, sem ser taxado de exagerado, que pelo menos o rendimento ha de duplicar, e que a receita liquida kilometrica dará a somma redonda de 1:200$000 réis.

Pois, pelos factos passados com relação aos caminhos de ferro do Minho e Douro e do norte e leste, não se poderá suppor que este rendimento bruto kilometrico ha de ser de 2:000$000 réis? E contando para as despezas da exploração com um encargo de 40 por cento, não nos ficará liquida a verba de 1:200$000 réis, como tive a honra de indicar á assembléa? Certamente que sim.

Eu fui indagar qual era a despeza de exploração no caminho de ferro do norte e leste, e segundo um documento official, que me foi mostrado, esta despeza anda entre 33 a 35 por cento.

Se eu calcular na hypothese do § unico do artigo 2.°, hypothese que no futuro, á vista d’este mesmo § unico, devemos suppor ser uma realidade, pois senão o sr. ministro não a meteria no projecto, a receita liquida kilometrica ainda assim não será inferior.

O § unico diz «quando o producto bruto kilometrico exceder 3:000$000 réis, 30 por cento d’esse excesso ficarão pertencendo ao governo, livres para elle de quaesquer despezas».

Sr. presidente, temos já 322 kilometros em exploração; consta-me, pelo que li, que haverá a construir 204 kilometros, o que nos dará um total de 526 kilometros. Se os multiplicarmos pelo rendimento liquido de 1:200$000 réis, teremos 631:200$000 réis, os quaes abatidos de 402:000$000 réis, que, como disse atrás, é o encargo da empreza, resta a favor da mesma empreza a importante quantia de réis 229:000$000, que ella sem maior incommodo obterá annualmente.

Isto é por um lado. Mas, sr. presidente, se eu capitalisar ao juro de 7 por cento os 143:000$000 réis que o estado .tem de receber annualmente, dá-me a operação réis 2.000:000$000, e addicionando-os aos 3.700:000$000 réis, preço do resto da linha a construir, fica á empreza uma despeza total de 5.750:000$000 réis, que, divididos por

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526 kilometros, faz sair a 11:000$000 reis o preço da construcção de cada kilometro para a companhia adjudicataria! Note-se que este caminho liga-se com Faro, Huelva e norte de Portugal.

Pergunto: n’estas condições, com as vantagens o que acabo de indicar, não será melhor habilitar-se o governo, por meio de um emprestimo, que, se o governo o propozesse, estou certo que não seria contrariado a poder concluir estas linhas em circumstancias que tragam um importante rendimento para o estado? Como a camara sabe, eu não sou competente n’estes assumptos; mas pelo estudo que pude fazer d’esta questão, parece-me que haveria para o paiz uma vantagem immensa, em construir estes caminhos de ferro por conta do thesouro.

Debaixo d’este ponto de vista, não percebo a utilidade da approvação d’este projecto. Ha ainda outro ponto que eu não posso comprehender tambem, ainda que, em parte, acho-lhe a explicação. Refiro-me ao facto de ver incluido n’este projecto, no artigo 8.°, a seguinte disposição: «Ficam sendo consideradas como fazendo parte d’esta lei as clausulas do decreto de 15 de julho de 1875, relativo á concessão do ramal do Pinhal Novo a Cacilhas».

Penso que a rasão por que este artigo está incluido no projecto é porque, tornando-se disposição legislativa, é uma garantia para que o concessionario da linha e o Cacilhas não possa baixar as suas tarifas, com prejuizo da linha do sul e sueste.

Todavia a concessão da linha de Cacilhas, devo-o aqui dizer com toda a franqueza, pelas circumstancias que se tem dado, tem de tal modo disposto a opinião publica, que o facto de apparecer aqui n’este projecto este artigo, póde ser mal interpretado por aquelles que não conhecem este negocio, e ser uma difficuldade para que apparecam concorrentes a licitar a exploração e construcção das linhas. Ainda que eu reconheça as vantagens da doutrina d’este artigo, preferia comtudo vel a em lei separada, e não confundida com este projecto.

Não desejava ver aqui uma disposição, que podo ter o risco (permitta-se-me a expressão) de parecer destinada a metter medo a quem concorrer.

Nada mais me resta a dizer. Quiz justificar o meu voto, e mostrar as rasões que o determinam. Póde ser que a falta de conhecimentos especiaes faça com que eu esteja em erro; estimarei muito que assim seja, e que se provo que o paiz lucra mais com a realisação das idéas d’aquelles que sustentam o projecto de lei tal qual está formulado. Digo isto, porque já sei como ha de votar a maioria; a sua approvação é certa.

O sr. Conde de Cavalleiros: — Em primeiro Jogar permitta-me o illustre relator da commissão, que o felicite pelo modo delicado e claro com que defendeu o projecto de que é relator. (Apoiados)

Tenho poucas palavras a dizer. O meu fim não é analysar as vantagens que podem resultar á companhia de contratar com o governo, não é analysar se os calculos estão feitos com as prescripcões da sciencia.

Os dois oradores que me precederam, no principio d’esta discussão, são assas conhecidos e instruidos para nos escurecerem n’esta questão.

Sr. presidente, eu não receio que os srs. ministros se esqueçam do seu dever, a ponto de nos trazerem aqui um projecto d’esta ordem, para nos entreterem; mas e que é verdade é que ha vinte e cinco annos, que entrei no parlamento, e que tenho visto sempre nos finaes das sessões um borborinho de interesses pessoaes. D’esta vez, porém, entra o governo; agora não são só os particulares, é o governo que quer despezas e mais despezas!

Sr. presidente, quando tanto se pretende gastar, como é que vem o governo apresentar um projecto em que não só gasta cousa alguma, mas em que se vae fazer bem a uma companhia, vendendo-se-lhe uma propriedade que vale alguns milhares de contos, para ser paga com o seu proprio rendimento?

Sr. presidente, eu tenho medo das companhias! Tenho, e muito; e para attestar esse medo, ahi estuo os Diarios da camara dos senhores deputados. Desde 1856, que eu vejo uma companhia preponderar em Portugal, tendo tido declarações repetidas no seu contrato, e favores incriveis, sendo o ultimo a ponte sobre o Douro; ponto em que nós gastariamos muito menos se a construissemos e a dessemos do graça á companhia.

N’esse tempo de certo havia o mesmo zêlo e a mesma probidade da parte dos srs. ministros. Para honra d’elles, desde essa epocha até hoje ainda não tive motivos para duvidar da probidade de s. exas., e comtudo combati estas questões gravissimas no começo da construcção do caminho de ferro do norte.

Todos sabem que esta companhia começou per contratar este caminho com duas vias, depois passou para uma, e tem tido varias alterações na exploração; e o resultado é que os governos sempre se têem vergado ás exigencias d’esta companhia.

Eu lastimo ter de dizer cortas verdades, porque não quero ferir os srs. ministros; mas, de facto, esta restauração, esta resurreição, foi feita do uma maneira tão positiva, voltando os mesmos homens aos mesmos logares que occupavam, que faz acreditar que elles quizeram atar o fio dos negocios que tinham em mão, e que os interromperam durante um pequeno espaço de tempo, ou para tomarem novas forças, ou para prepararem as cousas, a fim de alcançarem o penacho eleitoral, para fazerem todas as eleições, o desde já dou os parabens a, s. exas. da sua popularidade no paiz.

Mas, para que vem n’este projecto o artigo 8.º?

Não é isto a resurreição de um negocio de favor feito pelo sr. ministro á maioria, a um amigo seu, a um deputado da nação? (Apoiados.)

Nós discutimos esta questão ha dois annos, e mostrámos então que o governo exorbitara, porque illegalmente concedera o caminho de ferro de Cacilhas, com mais de 30 kilometros do extensão, sendo parallelo a um caminho de ferro do estado, com grave inconveniente da receita publica, mudando-se a testa do caminho de ferro do sul e sueste.

Pois, sr. presidente, fez-se um contrato, e por um alvará deu-se o caminho de ferro de Cacilhas a um deputado da maioria, a um amigo do governo, e por isso muita rasão acho ao meu nobre amigo, o sr. visconde de Fonte Arcada, em querer uma lei de incompatibilidades para os membros do parlamento. (Apoiados.)

O sr. Visconde de Fonte Arcada: — Juiz e parte ao mesmo tempo, nada, não póde ser.

O Orador: — E quem tem interesses particulares, quem pertence a companhias não póde entrar n’esta casa. (Apoiados.)

Concedeu-se por um alvará de 22 de abril de 1874 o caminho de ferro de Cacilhas; no anno seguinte, decreto de 10 de julho co 1875, concedendo o caminho a Filippe de, Carvalho, houve modificação com relação ao praso da sua construcção: no outro anno houve nova modificação — era atravessar o desgraçado Alfeite! E por fim houve uma portaria de 13 de março de 1877, que mandou começar o caminho em quatro mezes.

Pergunto: já está começado o caminho? Não. Pois já passou mais de um anno. Então para isto é que serve o artigo 8.° do projecto? É para resuscitar este negocio?

Sr. presidente, eu sou do tempo em que uma simples falla de um governador do ultramar trazia uma discussão de moralidade á camara, discussão que levava muitas sessões que interessava a todos, e acabava por fazer alterar o orçamento dentro do parlamento. Ninguem póde hoje alterar o orçamento.

N’aquelle tempo o governo foi forçado a alterar o orçamento dentro da camara! Estão aqui muitos pares, que fo-

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ram deputados, que hão de lembrar-se d’isso. Noutro tempo até por uma questão de moralidade entre juiz e delegado houve umas poucas de sessões, sendo tres ou quatro secretas, e acabando tudo pela queda do governo. Hoje já não se falla em moralidade, hoje apresentam-se contratos, que morrem duas e tres vezes, e tornam a reviver! Hoje discutem-se graves faltas de differentes empregados do estado, e não se ve proceder contra elles! Hoje ha uma certa teima dos srs. ministros, que parece mais uma obstinação systematica, e é d’isso que eu me queixo.

Sr. presidente, o negocio apresentado como aqui está póde ter grande vantagem para o estado; eu não contesto; mas isso é se houver quem esteja pelas condições que aqui se estabelecem, porque duvido que no estado geral em que se acha a Europa appareçam companhias ou particulares que se queiram sujeitar a estas estipulações, a não ser com a intenção reservada de pedir mais tarde acclarações, contando com a franqueza dos nossos governos para os seus fins.

Eu tremo das companhias.

Ha uma companhia que até certo ponto nos tem humilhado, chegando as cousas ao estado que não se condemna um comboio que se retardou, nem se impõe a multa, só para não offender a companhia!

Sr. presidente, se uma companhia nos tem até hoje humilhado a ponto de não condemnarmos um comboio que se retarda e não lhe impormos as multas que a lei marca, para a não offender, o que fará quando tivermos tres ou quatro?

Certamente ficam de commum accordo e dão as mãos, a fim. de exercerem grande pressão sobre os srs. ministros.

Sr. presidente, eu pediria a s. exas. que me digam se effectivamente têem alguns dados, têem alguma certeza do que estamos aqui a discutir, porque a palavra de s. exas. era bastante, para talvez ao menos eu mudar de linguagem e votar o projecto; mas primeiramente desejava saber onde está aqui a segurança, onde está o positivismo e a exactidão de tudo quanto se tem dito?

Eu vejo os calculos, filhos da grande intelligencia dos srs. engenheiros, que são todos homens muito dignos, muito conhecedores, mas ninguem ainda disse onde está a companhia que ha de tomar conta d’esta linha.

Emquanto ao caminho de ferro de Cacilhas, pediria a s. exas. que me dissessem, para que é esta recommendação, para que se quer tornar uma portaria em lei, e para que se quer fazer reviver um negocio que tanto aflige s. exas. e a nós? (Apoiados.)

Sr. presidente, não se trata só de dar dinheiro ás emprezas com as quaes o governo está compromettido, bastam os projectos que estão sobre a mesa, que se v. exa. os der a todos para discussão, e nós apenas fallarmos cinco ou seis minutos sobre cada um d’elles, não ha tempo para mais: mas o que peço a s. exas. é que parem n’esta marcha desordenada de dispendios incriveis e incalculaveis, que nos hão de levar á bancarota infallivelmente, se isto já não é a enunciação do testamento de s. exas.

O sr. Ministro das Obras Publicas (Lourenço de Carvalho): — Sr. presidente, eu procurarei ser muito conciso no que vou dizer, limitando o mais que poder as considerações que tenho que apresentar á camara; mas antes de começar, permitta-me v. exa. que eu pela minha parte, e estou persuadido que interpreto os sentimentos d’esta assembléa, felicite o digno par, o sr. D. Affonso de Serpa, pela maneira brilhante como desempenhou as funcções de relator das commissões reunidas de fazenda e obras publicas n’um discurso que a todos encantou, e que não foi só uma brilhante estreia, mas ainda um honroso e cabal desempenho da alta missão que lhe fôra confiada.

Cumprindo este grato encargo, permittam-me v. exa. e a camara que eu diga, que me vejo seriamente embaraçado n’esta discussão, pela fórma por que ella tem sido apresentada pelos dignos pares que têem impugnado o projecto.

Esta minha perplexidade, que já o digno relator accusou no seu discurso quando tomou a palavra, cresce de ponto na minha situação, por isso que vejo que n’esta camara ha quem combata o projecto pelas excellencias que apresenta com relação ao estado, e com grande pasmo meu vejo esse mesmo projecto combatido por altamente prejudicial aos interesses publicos.

Sr. presidente, o governo não partilha nenhuma das opiniões extremas que sobre esta questão aqui têem sido apresentadas.

Ao governo parece este projecto não só opportuno, mas conveniente nas actuaes circumstancias. E creio, que o governo vae muito bem no meio termo das opiniões extremas que consideram o projecto por qualquer dos prismas illusorios do optimismo ou pessimismo. Parece que o governo se inspirou no prudente conselho do poeta latino «medio tutis-simus ibis.»

Com este projecto nem se promove a ruina de companhia alguma, que, aliás, pelo seu livre arbitrio e bom criterio saberia subtrahir-se a quaesquer riscos, nem tão pouco se vae felicitar de uma maneira extraordinaria a companhia que venha a tomar em hasta publica a adjudicação de que se trata.

Não cumpre, porém, ao governo estudar e considerar os interesses das companhias, mas sim attender ás conveniencias publicas, e é sob este ponto de vista unico que elle o apresenta, sustenta e justifica, como medida opportuna e vantajosa.

O projecto que o governo traz a esta camara não contem em qualquer das suas disposições referencia alguma nem a companhias futuras, nem a companhias passadas, nem a nenhum concessionario, como se tem pretendido inculcar.

O sr. Vaz Preto: — E o que é o artigo 8.°?

O Orador: — O artigo 8.° não é mais do que a consignação solemne de uma garantia para toda e qualquer companhia que possa apresentar-se a fazer a construcção projectada; garantia que o governo não julgava necessaria, na proposta de lei que apresentou em 1876 e que as commissões de fazenda e obras publicas da camara dos senhores deputados entenderam conveniente inserir no projecto.

Na minha opinião o caminho de ferro de Cacilhas a Cezimbra nunca poderia prejudicar o caminho de ferro de sueste; tive sempre aquella concessão como uma cousa sem rasão de ser economica ou industrial, digo-o diante de pessoas que têem conhecimentos muito especiaes do caminho de ferro do sul e sueste.

Vejo presente o sr. Larcher, que póde confirmar as mi- nhãs palavras, pois estou persuadido de que nunca se lhe offereceu ao espirito a minima duvida ou receio de prejuizo ou perigo de concorrencia que, em relação ás linhas do sul e sueste, podesse vir da pequena rede de Cacilhas a Cezimbra, com o ramal da Quinta do Conde ao Pinhal Novo. E a rasão d’isto é clara e intuitiva; basta olhar para o mappa; é questão de simples operação arithmetica, basta ver que do Pinhal Novo ao Barreiro são 15 kilometros, emquanto que do mesmo ponto a Cacilhas são 35.

Alem d’isso, no decreto de 15 de julho de 1875, que fez esta concessão, determinou-se que as tarifas nunca podessem ser inferiores ás d’aquelle caminho de ferro.

Como é possivel, portanto, acreditar que o resultado das tarifas ha de ser igual sequer, e muito menos inferior aos preços estabelecidos entre o Pinhal Novo e Barreiro? Entendeu-se, comtudo, que convinha estabelecer a garantia expressa na lei, como ella se achava expressa no decreto do governo.

D’este modo se removiam os receios, a meu ver infundados, que podessem offerecer-se a qualquer companhia pelo facto da concessão do caminho de Cacilhas a Cezimbra com o ramal do Pinhal Novo.

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Aqui tem v. exa. o que é.

O sr. conde de Rio Maior reconhece vantagem em se consignar esta disposição, mas receia que ella possa ser interpretada pela companhia de uma maneira diversa. Eu julgo a disposição tão clara, que não me parece que possa haver companhia que se apresente a licitar sem ter a certeza perfeita do valor d’esta disposição.

Como eu ía dizendo, sr. presidente, o governo, apresentando á camara este projecto, só tem um fim, e esse é o objecto mais nobre que o governo deve ter em vista, que é obrigação sua que o tenha, e de que não faz motivo de gloria para si; essa idéa é muito simples, e limita-se ao desejo de ver completar a rede dos caminhos de ferro ao sul do Tejo, e com muito mais empenho ainda podendo fazel-o sem encargos para o thesouro.

Ha, porventura, quem desconheça a necessidade de ligar esta rede?

Ha quem desconheça a necessidade de soldar estes elos, servindo-me da phrase elegante do illustre relator da commissão, elos d’esta cadeia que não póde exercer toda a sua acção benéfica e fecundante senão depois de inteiramente completa?

Não ha ninguem que o combata, e se ha apenas divergencia, é no modo de a realisar; e se o estado, pelas circumstancias especiaes que foram apontadas, tem difficuldade em poder emprehender a construcção por sua conta, podendo-se obter a conclusão da rede feita por conta de uma companhia, porque se não ha de a rede concluir?

O que não é possivel é continuar no systema seguido até hoje, applicando a receita liquida á construcção dos prolongamentos, e construindo na rasão de 14 kilometros por anno!

Os caminhos de ferro não estão nas condições das estradas ordinarias. As estradas construem-se por lanços, que se vão successivamente abrindo ao uso do publico, sem que qualquer demora na sua conclusão possa causar prejuizos graves.

Os caminhos de ferro pelo contrario carecem de ser construidos no menor praso de tempo, não só para que o estado, ou a companhia constructora, possa alcançar a receita compensadora de capital empregado; mas tambem, e este interesse é superior, para que o paiz possa auferir os beneficios que lhe advem d’este systema de viação aperfeiçoada.

O pensamento do governo, sr. presidente, é perfeitamente claro; o seu fim. é completar a rede ao sul do Tejo no menor espaço de tempo e pelo modo menos oneroso, e para isso apresenta este projecto. Se elle for approvado, attentas as vantagens que eu penso que elle dá; e havendo, como espero, companhia que acceite as condições, o governo realisa o seu pensamento no mais curto espaço de tempo, e sem encargo para o thesouro, por isso que conserva a actual receita liquida d’este caminho.

Alem das vantagens directas d’esta construcção, obtem-se ainda uma outra occasional, mas digna de considerar-se, e vem a ser o proporcionar-se assim um vasto campo de trabalho a população do Algarve, que, como v. exa. sabe, se acha hoje soffrendo uma grande crise, embora um pouco attenuada pelas chuvas que ultimamente têem caído.

Para o anno as vantagens d’esta rede seriam as mesmas, mas quanto mais depressa as podermos realisar tanto melhor.

Sr. presidente, não se trata de vir pedir á camara nenhum augmento de despeza; pelo contrario, procura-se completar a rede dos caminhos de ferro ao sul do Tejo sem nenhum encargo para o thesouro.

A companhia, que concluir esta rede de caminho» da ferro, ha de garantir ao estado uma annuidade igual, pelo menos, á receita liquida dos caminhos de sul e sueste, avaliada pela media dos ultimo;, tres annos, receita que, segundo já declarei na camara dos senhores deputados, approxima-se de 160:000$000 réis, e não fica, como disse o digno par, sr. conde de Rio Maior, reduzida a 143:000$000 réis. (Leu.)

O sr. Conde de Rio Maior: — S. exa. disse, n’essa occasião, que a receita liquida comprehendia o imposto do transito, e o projecto diz que não é comprehendido esse imposto.

O Orador: — É possivel que esteja isso no Diario da camara, porque raras vezes posso rever as notas tachygraphicas, mas o que posso assegurar a s. exa., e estimo muito ter assim occasião de ratificar qualquer inexactidão a este respeito, é que o rendimento liquido dos caminhos de ferro de sul e sueste foi o seguinte em numeros redondos: em 1874 163:000$000 réis, em 1870 159:000$000 réis, em 1876 l55:000$000 réis, dando a media d’estes tres annos 159:621$000 réis, ou proximamente 160:000$000 réis.

O rendimento de 1877 não é ainda exactamente conhecido por se não achar liquidada a despeza até á data d’estes apontamentos.

Ora, já v. exa. ve que esta cifra de 160:000$000 réis é livre do imposto de transito, que regula em media por 16:000$000 réis.

Se se comprehendesse esse imposto, as receitas seriam: em 1874 188:084$970 réis, em 1875 182:404$110 réis, em 1876 171:274$759 réis.

Por consequencia o caso é muito simples. O governo mantem a mesma receita para o thesouro, e a companhia que se apresentar e satisfizer ás clausulas do concurso, complete as linhas nas condições que acabei de expor.

Não creio que devamos ser nós os encarregados de apreciar as rasões de conveniencia que possam determinar uma companhia qualquer a acceitar a adjudicação d’estas linhas ferreas; entretanto, direi que não é tão triste e desoladora a perspectiva, como a descreveu o digno par, o sr. Larcher, nem tão seductora e brilhante como o sr. conde de Rio Maior a apresentou nos seus cálculos.

O sr. Conde de Rio Maior: — Eu calculei o rendimento bruto kilometrico em 2:000$000 réis, e o rendimento liquido em 1:200$000 réis.

O Orador: — O que eu lamento é que s. exa. fosse considerar como uma hypothese, como uma presumpção para o seu calculo actual, esse rendimento de 3:000$000 réis, que está previsto no § unico do artigo 2.°; mas sem se designar o periodo em que deve verificar-se, quando se conseguir esse rendimento, a companhia, a quem for adjudicada esta rede de caminhos de ferro, terá de concorrer em beneficio do thesouro com uma percentagem sobre o que exceder essa quantia na proporção de 30 por cento.

S. exa. calculou um rendimento liquido de 1:200$000 réis por kilometro, mas não é esse o estado actual, nem o será logo que se completem as linhas.

Recordo-me de uma proposta do meu antecessor, na qual o rendimento das linhas de sul e sueste, na parte explorada, era avaliado em 621$000 réis por kilometro, na ligação com a linha de leste em 500$000 réis, e na linha do Algarve em 400$000 réis.

Ora realmente, sr. presidente, não se póde ter grande confiança na conclusão de cálculos fundados em base que não é mais do que uma simples conjectura; mas eu julgo muito mais approximados da realidade os calculos do meu antecessor do que os do digno par o sr. conde de Rio Maior; mas estou perfeitamente convencido de que s. exa. não era capaz de apresentar nenhuns calculos, que não fossem a expressão sincera do seu pensamento.

(Oservação do sr. conde de Rio Maior, que se não ouviu.)

Para se conhecer exactamente o rendimento liquido kilometrico não era essa a forma, por isso que ha a deduzir a receita liquida de 160:000$000 réis do rendimento bruto que attinge a 400:000$000 réis proximamente, o dividir aquella importancia pelo numero de kilometros explorados.

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(Observação do sr. Vaz Preto, que se não ouviu.)

Essa era a hypothese do meu antecessor se os caminhos se fizessem por conta do estado. Ainda assim é uma hypothese muito mais approximada da verdade, que não a do sr. conde do Rio Maior, a qual me parece desde já contraria aos resultados actuaes da exploração, e a meu ver, por largos annos ainda aos resultados mais provaveis em caminhos de ferro d’esta natureza.

Vejamos, porém, mais precisamente quaes são os elementos d’este problema. A extensão que falta a construir é de 243 kilometros, sendo 64 no ramal de Extremoz ao caminho de ferro de leste, 143 de Casevel ao Algarve e 36 de Serpa á fronteira em direcção a Paimogo e Huelva. Não conto de proposito os 10 kilometros de Quintos a Serpa, porque estão hoje concluidos e serão abertos á exploração no proximo domingo. pestes 243 kilometros só 59 se acham em construcção na linha do Algarve desde Faro até á Portella das Silveiras. O caminho n’esta extensão acha-se muito adiantado, e póde dizer-se quasi concluido na sua infrastructura, mas falta ainda o material fixo e circulante; o que póde calcular-se approximadamente em réis 500:000$000.

Nada ha começado nas tres secções de Casevel até á Portella das Silveiras na extensão de 84 kilometros, nem nos 100 kilometros dos prolongamentos de Extremoz a Serpa.

A despeza total a fazer para a conclusão de toda a rede é de 4.300:000$000 réis. Na proposta do meu antecessor calculava-se a despeza em 3.700:000$000reis, mas não só comprehendiam os 36 kilometros de Serpa á fronteira calculados em 600:000$000 réis. Estes algarismos concordam perfeitamente com os calculos apresentados pelo digno par, o sr. Larcher, que computou na mesma somma as despezas que qualquer companhia teria a fazer na construcção das linhas projectadas. O digno par, o sr. conde de Rio Maior, tambem calculou as som mas a despender pela companhia em quantia superior a 4.000:000$000 réis.

Ninguem, pois, contesta este ponto, quer as linhas tenham de ser feitas por uma companhia, quer seja o estado que haja de construil-as.

Ambos os dignos pares, sob pontos1 de vista inteiramente oppostos, procuraram apreciar a situação economica da companhia que possa apresentar-se a licitar no futuro concurso.

O que mais importa, a meu ver, é definir e apreciar as condições do projecto em relação aos interesses do estado; mas se quizermos apreciar a situação economica da companhia ou companhias que tenham de licitar não é difficil nem destituida de interesse essa indagação.

Já vimos que a quantia a despender póde ser calculada em 4.300:000$000 réis, capital este que representa um encargo annual computado pelo sr. Larcher em 260:000$000 réis, que eu acceito. Por outro lado a annuidade que a companhia terá de dar ao estado, importancia da receita liquida, é de 160:000$000 réis. Será, pois, o encargo total de 420:000$000 réis.

É por certo muito difficil calcular desde já qual ha de ser o rendimento total da rede, depois de explorada em toda a sua extensão. Na proposta, isto é, no relatorio da proposta de lei apresentada pelo ministro meu antecessor, era calculado o rendimento liquido nas importancias de 6210000 réis, 500$000 réis e 400$000 reis, conforme as secções da rede e as probabilidades do seu trafego.

Por estes calculos o rendimento liquido dos caminhos do sul e sueste e do Algarve, na extensão de 526 kilometros, seria de 301:000$000 réis; devendo, porém, notar-se que se não acham nelles comprehendidos os 36 kilometros, desde Serpa até á fronteira, na direcção de Huelva, cuja receita liquida póde ser calculada, com perfeita analogia, em 19:000$000 réis.

Sendo assim, o rendimento liquido da exploração de toda a rede, com a extensão de 565 kilometros, seria de réis 320:000$000.

Realisadas estas hypotheses a situação da companhia seria, no principio pelo menos, desvantajosa, tendo de fazer face a encargos na importancia de 420:000$000 réis, com uma receita apenas de 320:000$000 réis, o que representaria um deficit desde logo de 100:000$000 réis. E digo que a situação seria desvantajosa no principio, pelo menos, porque me persuado que pelo augmento natural da receita e pelo total desenvolvimento da riqueza d’aquellas regiões, aquelle deficit em pouco tempo se acharia extincto e transformado em saldo de lucro para a companhia.

Repito, que é difficil calcular o rendimento d’estas linhas. Não ha elementos para apreciar o producto das novas secções a construir. Parece provavel que elle será inferior ao da parte hoje explorada.

Por outro lado tambem é muito de presumir que o rendimento dos kilometros actualmente explorados ha de augmentar com o subsidio de passageiros e mercadorias que as novas secções lhes hão de necessariamente trazer.

Ha, pois, nesta situação da futura companhia uma parte verdadeiramente aleatoria que, na minha opinião, nem ameaça uma ruina desastrosa, como pensa o digno par, o sr. Larcher, nem promette um futuro tão deslumbrante de lucros como anteve o sr. conde de Rio Maior.

O estado, porém, é que não tem nada a perder com a execução d’este projecto, porque, - sem crear novos encargos, antes reservando o actual rendimento d’aquellas linhas, promove a construcção e conclusão de toda a rede, o que é, a meu ver, o principal objectivo que se deve ter em vista. Não esqueçamos um momento que o acabamento d’estas linhas não deve de modo algum ser adiado.

Se não houver companhia que queira encarregar-se de o fazer nas condições do projecto, cumpre ao governo fazel-o. E um sacrificio sem duvida, mas não ha declinal-o perante a urgencia dos factos., A mais desfavoravel das hypotheses que por consequencia se póde dar é achar-se a companhia, ou o estado, se for elle que construa o caminho por sua conta, em um certo desembolso nos primeiros tempos da exploração. É isto ainda assim póde offerecer vantagem pelo lado dos interesses economicos donde hão de provir os futuros interesses da companhia, porque as porções de caminho novamente construidas vão apresentando sempre um alargamento de commercio e um augmento de população, que sem duvida são uma nova riqueza para as provincias do Alemtejo e do Algarve, para as quaes as vias de communicação accelerada são o primeiro elemento de prosperidade.

O sr. Vaz Preto: — Por que não applicou v. exa. essa doutrina á Beira Baixa?

O Orador: — Perdão. A Beira Baixa não se póde como parar neste ponto com o Alemtejo.

A Beira Baixa tem as suas riquezas, sobretudo a riqueza agricola; mas, na minha opinião, não se póde comparar o augmento de riqueza que lhe levaria um caminho de ferro, com a verdadeira creação de nova riqueza que os caminhos de ferro vão realisar nas regiões ao sul do Tejo. É incalculavel a valorisação de terrenos eminentemente aptos para cultura, que por este meio se vae promover e se tem j já hoje conseguido.

Com respeito á construcção ser feita pelo governo, eu não acho rasão para o estado acceitar sacrificios que trazem mais um grande encargo, quando por este projecto o póde conseguir, evitando taes sacrificios.

Os caminhos de ferro do Alemtejo representam um adiantamento feito áquella provincia e ao Algarve, com o fim de desenvolver a riqueza publica n’aquellas provincias.

Eu não sei se os votaria na epocha em que foram decretados, preterindo outras linhas que, a meu ver, eram reclamadas com maior urgencia, e, porventura, com maior justiça na distribuição d’estes melhoramentos. Mas a questão hoje não é essa. Estas linhas estão construidas em granei

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parte. É um facto consummado. É necessario concluil-as. Eis o que se pretende com este projecto.

E, comtudo, declaro com toda a franqueza, que não me maravilharei se, em resultado d’este concurso, não apparecer nenhuma companhia a licitar, sujeitando-se ás condições aqui exaradas, as quaes, consideradas nas suas verdadeiras proporções, é incontestavel que importam para o estado grande vantagem, e é a isso que sobretudo tenho a attender.

Não quero, de modo algum, dizer com isto que me é indifferente a, sorte e situação das companhias. Entendo que, em grande numero de casos, os seus interesses se podem perfeitamente harmonisar com os do estado. E quando se podem conciliar os interesses do estado com os das emprezas particulares, não vejo rasão para que se ponha de parte qualquer circumstancia que póde concorrer para se alcançar esse fim. Não posso prever se qualquer companhia que se apresente a licitar ache mais conveniente construir o caminho de ferro do Algarve de via larga ou de via estreita. Na duvida, pareceu-me conveniente por esta rasão, alem de outras considerações que se offereceram, e que julguei attendiveis, que devia concordar n’uma modificação com relação ao systema de construcção que poderia facilitar a execução d’este projecto. Não devia, n’um caso d’estes, determinar peremptoriamente a opinião do governo, porque podia dar-se o facto de tomarem uns como um encargo para a companhia adjudicataria, sem resultados economicos directos para o paiz, o que para outros, longe de ser encargo, fosse um beneficio.

Na alternativa de ser verdadeira uma ou outra opinião, entendi conveniente manter a dualidade de hypotheses. De modo algum eu quereria ficar com o remorso, se me inclinasse decididamente para uma ou para outra das duas opiniões, de ter, por uma resolução definitiva, prejudicado completamente qualquer tentativa que tivesse por fim realisar o pensamento do governo, e por consequencia a execução de uma lei que elle julga vantajosa para o paiz.

Não pretendo discutir agora qual dos dois systemas póde ser mais acceitavel. A minha opinião a este respeito é conhecida; mas pareceu-me, fosse qual fosse a minha opinião, que era de vantagem adoptar a modificação que só acha n’este projecto.

Sr. presidente, uma das maiores preoccupações que domina o espirito e a imaginação da maior parte dos dignos pares que têem impugnado este projecto, é o receio de que esta lei se não possa cumprir, porque não ha de haver companhia que acceite as condições aqui estipuladas, ou se a houver será com o proposito de não cumprir, ou procurar illudir o contracto.

Declaro muito categoricamente a v. exa. e á camara, que se eu tivesse o menor receio de que este projecto, depois de ser lei, não podesse ser cumprido, se elle não tivesse rasão de ser, não o apresentaria.

Parece-me realmente que s. exas. dão demasiadas proporções a uns perigos que eu não posso antever, nem julgo de modo algum fundamentados.

O meu distincto amigo e collega, o sr. Larcher, referiu aqui em breves palavras a historia das companhias dos caminhos de ferro de Portugal, e apresentou, a meu ver, n’esta parte, a mais concludente opinião que póde haver sobre o assumpto.

Na realidade o capital das acções da companhia dos caminhos de ferro de leste e norte é um capital morto.

Desde a sua applicação até hoje esse capital ainda não recebeu remuneração alguma, e já lá vão passados quatorze annos.

Póde-se dizer que é um capital perdido.

Com respeito á companhia dos caminhos de ferro do sul e sueste, todos sabem perfeitamente quaes têem sido os factos, e é exacta a referencia que os dignos pares fizeram ácerca do seu resultado final.

Seja como for ou em nome da magnanimidade do paiz, ou considerado como um acto de favor governativo, em vista do decreto de 11 de março de 1869, mandou-se pagar á companhia do caminho de ferro do sul e sueste 2:700:000$000 réis.

O que é certo é que o estado, por uma somma relativamente diminuta, entrou na posse d’aquelle caminho, e usofrue o seu rendimento.

O resultado d’esta operação que, para assim dizer, deriva dos proprios factos, é facil de provar com os seguintes dados.

Os 322 kilometros hoje explorados representam para o estado o seguinte desembolso:

Subvenções até Vendas Novas e Setubal 907:l67£163

Compra da linha do Barreiro a Vendas Novas e Setubal.............939:730$950

Subvenções de Vendas Novas a Evora e Beja....................... 1:967:270$496

Construcção dos prolongamentos desde 1869 838:112$013

Indemnisação de 11 de marco do 1869.. 2:705:625$000

Somma tudo isto proximamente 7:358 contos, nos quaes se acham comprehendidos 256 contos de indemnisação pelos trabalhos feitos na linha do Algarve, sendo assim 7:102 contos a parte relativa aos 322 kilometros.

O desembolso do estado se vigorassem os contratos de 1860 e 1864, seria de 6:186000$000reis, o que quer dizer que a differença de 966:000$000 réis é o que o estado despendeu a mais ficando desde já na posse e usufruto das linhas.

O estado tinha despendido a mais 954:000$000 réis, alem de não ter usufruido a receita que tem usufruido da exploração d’este caminho.

Sem querer de modo algum entrar na historia de todos estes factos, devo dizer que o resultado final, longe de prejudicar os interesses publicos, deu um resultado favoravel.

Isto que acabo de dizer é a pura verdade que resulta das cifras.

Sr. presidente, eu sinto ter tomado tanto tempo á camara, sem ter a certeza de haver respondido a todos os pontos em que os dignos pares tocaram. Em todo o caso, se não respondi a todos, creio ter respondido aos mais essenciaes. Se, porém, os dignos pares quizerem tomar do novo a palavra para fazer quaesquer perguntas ao governo, terei o maior desejo de satisfazer quanto em mim caiba ás perguntas de ss. exas. e ás obrigações do meu cargo.

O sr. Presidente: — Vae ler-se um officio que veiu do ministerio das obras publicas.

Leu-se na mesa.

O sr. Presidente: — Esto documento vae para a secretaria, e fica á disposição do digno par.

Tem a palavra sobre a ordem, o sr. Vaz Preto.

O sr. Vaz Preto (sobre a ordem): — Eu não quero tirar a palavra a nenhum digno par; mas entendi, para o debate correr com certa regularidade, que devia pedir a palavra sobre a ordem, para dirigir, sem as motivar, algumas perguntas ao sr. ministro das obras publicas. Parece-me conveniente que s. exa. responda a estas perguntas, porque o projecto vem desacompanhado do todos os esclarecimentos e dados precisos para nos elucidar, e a resposta ás minhas perguntas podem servir talvez de esclarecimentos para que se possa esclarecer bem a camara.

Primeira pergunta

Qual a rasão por que o governo, tendo destinado o caminho de ferro do sul, para com o producto da sua venda occorrer ás despezas de construcção das linhas da Beira Alta e Baixa, que considerava de primeira ordem, o não vendeu?

Segunda pergunta

Qual a rasão por que sendo o caminho de ferro do sul uma propriedade de alto valor e de futuro auspicioso, vão fazei: d’ella um aforamento para construir uma linha de se-

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gunda ordem (conforme a opinião do sr. Lourenço de Carvalho) sem o por em praça para conhecer o seu valor real?

Terceira pergunta

Emquanto importam os prolongamentos de Extremoz ao Grato, e de Serpa a entroncar com a linha hespanhola que se dirige ao Huelva; e em quanto importaria se, em logar de ir ao Grato o entroncamento com a linha de leste, fosse em Eivas? N’estes dois casos qual o encargo que d’aqui ré saltaria para o thesouro?

Quarta pergunta

Quanto custa o caminho de ferro de Cazevel a Faro de via larga, e quanto custa de via reduzida, e qual será o encargo para o thesouro por cada um d’estes systemas?

Quinta pergunta

Qual é o quantum, ou annuidade minima pela qual o governo entende poder aforar (permitta-se-me a expressão) o caminho de ferro do sul?

É preciso saber claramente a opinião do governo a respeito do assumpto que se discute, que é de alta importancia e de grande alcance, e por isso eu dirigi ao sr. ministro das obras publicas algumas perguntas formuladas com toda a precisão.

Sobre os differentes pontos a que se referem as perguntas é preciso que o sr. ministro das obras publicas seja claro, e de as explicações devidas, porque tem já compromettida a sua opinião, salvo se s. exa. quizer retratar-se agora.

Perguntei qual seria o producto liquido que a companhia adjudicataria teria de dar ao governo, porque tendo o sr. ministro das obras publicas tirado a media dos tres. annos, de 1874 a 1876, não attendeu ao que está expresso no projecto, e por isso eu entendo que a media deve ser tirada dos ultimos tres annos, porque já findou o anno de 1877. Portanto, devia-se fazer o calculo com relação aos annos de 1875, 1876 e 1877.

São estes os esclarecimentos que o sr. ministro das obras publicas deve, dar á camara sobre o projecto, que vem completamente destituido de dados.

Se o governo satisfizer cabalmente ás minhas perguntas, poderemos melhor avaliar o alcance d’esta medida, e votal-a com conhecimento de causa.

O sr. Presidente: — Queira v. exa. ter a bondade de mandar para a mesa as suas perguntas, ou envial-as ao sr. ministro das obras publicas, a fim de s. exa. se poder habilitar a responder.

O sr. Vaz Preto: — E o que eu vou fazer.

O sr. Conde de Rio Maior: — Eu uso da palavra apenas para fazer algumas rectificações a respeito do que eu disse ha pouco.

N’esta discussão, sr. presidente, não trato senão de justificar o meu voto.

A camara sabe que eu não posso entrar n’este debate como homem conhecedor da especialidade do assumpto. Eu não digo que o estado perde em relação ás despezas feitas até hoje por elle com a acquisição, construccão e exploração do caminho de ferro do sul e sueste, porque isto é um negocio financeiro em que eu não quero entrar; a minha questão é outra.

Eu estou persuadido, e convencido, de que este caminho de ferro, nas circumstancias em que vae ser alienado, vae cercear uma importante fonte de receita publica em proveito de uma companhia. Porque é que não ha de ser applicado para este negocio tão productivo o systema que o governo tem seguido com relação a outras despezas que não se justificam? Os srs. ministros estão todos os dias a propor despezas, e dizem que só o juro das mesmas pesarão sobre o estado. Essas despezas são na maior parte improductivas e injustificaveis, e quando os srs. ministros as querem justificar dizem: «São apenas 100:000$000 réis, ou 200:000$000 réis, que se vão gastar; mas como é por meio de emprestimo, o paiz soffre só o encargo resultante do juro a pagar». Assim muitos contos de réis têem desapparecido; verdade é que temos o Pimpão, e todos estes magnificos armamentos, gloria da situação actual!

Nós ficamos fortes e promptos para resistir ao inimigo, que não sei onde está; ficamos armados, fortificados, e com todos os elementos de resistencia para fazer frente a qualquer invasão; porém Deus queira que ella não venha, porque ver-se-ha que o dinheiro, se gastou, e que o nosso estado militar pouco ou nada se encontra melhorado.

Mas, insisto ainda, porque não se ha de applicar á construccão d’esta linha o systema de emprestimo, que o governo tem seguido para fazer outras despezas? Parece-me que valia a pena, em um negocio tão importante como é este, estudar pausadamente este alvitre; e tanto mais que, segundo as opiniões que tenho ouvido, pelo que tenho concluido da discussão, e mesmo pelos esclarecimentos dados pelo governo, afigura-se-me que ninguem póde dizer, nem saber ao certo, qual é a despeza real dos prolongamentos a fazer, e qual será o rendimento futuro d’este caminho de ferro.

Portanto, entendo que se deve estudar mais este negocio, a ver se é possivel fazer uma operação, aproveitando qualquer ensejo favoravel para isso, e obtendo-se- os meios necessarios para se construir esta linha por conta do estado, ou antes, se se deve entregar a construccão e exploração d’ella a uma companhia.

Parece-me que a quantia necessaria para esta construccão não é tão grande que não se possa realisar facilmente. Esta é a minha opinião, e d’este ponto capital não saio. Realmente eu não tenho elementos para pelejar n’esta batalha com tão distinctos adversarios.

Não sou engenheiro, sou homem completamente estranho á materia de que tratamos, por consequencia faltam-me os recursos para combater; mas como o argumento que apresentei, satisfaz a minha rasão, e satisfaz a minha consciencia metto-me dentro d’elle, e d’aqui não me tiram.

Em relação ao famoso artigo 8.°, tem excitado tanto as attenções; declaro que estou de accordo, embora alguns dos meus illustres collegas pensem de outro modo. Para mim é convicção que aquelle artigo não será inutil.

Mas, direi ainda: qual o motivo por que não se executou a portaria de 13 de março de 1877, que mandava começar as obras dentro de quatro mezes?

Se os trabalhos apenas começaram, e logo pararam, rescinda-se o contrato, porque manifestamente não se cumpriram as suas condições.

Pergunto mais: qual o motivo por que, em circumstancias taes, se faz agora outra concessão ao concessionario? Eu entendo que tem havido já muita benevolencia para com elle, e, portanto, insto que se cumpra a portaria em que fallei.

A vista das differentes opiniões apresentadas, e do que se tem dito sobre as vantagens ou encargos problematicos, que podem resultar d’este caminho de ferro ser construido por conta do estado, mando para a mesa a seguinte proposta.

(Leu.)

O sr. Larcher: — Mando para a mesa um parecer da commissão de obras publicas. Peço a v. exa. que mande dar-lhe o destino conveniente.

Leu-se na mesa e foi a imprimir.

O sr. Presidente: — Vae ler-se a proposta de adiamento mandada para a mesa pelo sr. conde de Rio Maior.

É do teor seguinte:

Proposta

A camara dos pares, considerando que a construccão da prolongamentos das linhas do sul e sueste, desde os pontos que forem marcados nos projectos até ao caminho de ferro portuguez de leste, e até á fronteira na direcção da

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linha hespanhola do Huelva deve trazer um augmento consideravel de rendimento á rede do Alemtejo;

Considerando que os encargos resultantes do custo e exploração da linha podem com probabilidade ser satisfeitos pelo rendimento, que necessariamente ha de resultar da conclusão completa d’esta importante via de Communicação:

Resolve, pelo muito que a camara deseja acautelar todas as receitas, que podem provir para o thesouro, que o projecto volte ás commissões reunidas de fazenda e de obras publicas, para que estas examinem, de accordo e harmonia com governo, quaes os encargos provenientes que resultarão da construcção e conclusão completa, e da exploração das linhas de sul e sueste e caminho de ferro do Algarve; examinando as commissões ao mesmo tempo qual a receita bruta e liquida mais approximada, que se deva esperar obter, logo que fique terminado este importante melhoramento publico; e a camara, adiando portanto a discussão do projecto, passa á ordem do dia. = O par do reino, Conde de Rio Maior.

Leu-se na mesa, foi admittida e ficou em discussão juntamente com a materia.

O sr. Presidente: — Esta proposta será votada antes da generalidade do projecto.

Tem a palavra o sr. visconde de Bivar.

O sr. Vaz Preto: — O sr. ministro das obras publicas tinha pedido a palavra.

O sr. Ministro das Obras Publicas: — O fim para que eu pedira a palavra era para rogar a v. exa. que tivesse a bondade de me enviar as perguntas por escripto que o digno par o sr. Vaz Preto, tinha mandado para a, mesa. Agora, porém, prescindo de fazer este pedido, porque v. exa. prevenindo o meu desejo, se dignou remetter-m’as para eu as examinar.

O sr. Ornellas: — Tenho a honra de mandar para a mesa dois pareceres da comniissão de negocios externos sobre os tratados de commercio com a Hespanha e com a Grecia.

Leram-se na mesa e foram a imprimir.

O sr. Visconde de Bivar: — Para não faltar a este projecto a cortezia que ordinariamente costuma acompanhar todas as discussões sobre caminhos de ferro, vieram as suspeitas mais ou menos disfarçadas, e em seguida o adiamento.

Assignei o parecer que se discute; vou tratar do defendel-o pelo modo que me for possivel, mas creiam os dignos pares que se eu julgasse que n’elle havia a minima cousa que podesse offender a moralidade publica, não lhe teria dado o meu voto, e entendo que de igual modo procederiam os demais signatarios do mesmo parecer.

Quando noutra epocha se combatia a construcção de caminhos de ferro, e então v. exa. era membro, como eu, da outra casa do parlamento, que de suspeitas se não levantaram, o que se não disse a respeito dos homens que approvavam essas medidas?!

Mas depois que ellas se converteram em leis, depois que o paiz começou a receber os beneficios da viação accelerada, o que foi feito d’essas suspeitas? Ninguem fallou mais n’ellas. O mesmo ha de acontecer a respeito das que agora se levantam.

Sr. presidente, eu defendo este projecto, porque desde que entrei na vida publica tenho sempre feito todos os esforços possiveis para que um melhoramento, coma o dos caminhos de ferro, vá beneficiar a provincia do que sou natural.

Desde a linha do Barreiro ás Vendas Novas até aos prolongamentos de Evora e Beja eu trabalhei constantemente para que essas construcções se levassem a effeito, porque sem ellas o caminho de ferro não chegaria ao Algarve.

É, obedecendo a este sentimento, que eu ainda hoje venho pugnar por este projecto, combatendo, quanto em mim couber, o adiamento proposto pelo sr. conde de Rio Maior.

Sr. presidente, diz-se que estes caminhos de ferro devem ser construidos por conta do governo, e que o projecto deve voltar á commissão para estudar o assumpto debaixo d’este ponto de vista.

Para mim, desde que apparece a possibilidade de realisar de prompto estas obras por meio de uma companhia, e não por conta do governo, dar preferencia a este alvitro é pôr de banda a construcção d’estes caminhos de ferro; e eu, que a desejo com a brevidade possivel, já pelo melhoramento em si, já pela opportunidade dos trabalhos que se hão de fazer, não posso deixar de votar o projecto e combater o adiamento.

O sr. Conde de Rio Maior: — Peço perdão a s. exa.; eu desejo e quero o caminhe de ferro, mas o que desejo é que um assumpto d’esta ordem seja estudado convenientemente.

O sr. Visconde de Bivar: — O que s. exa. quer é que se estude o negocio bem. Estude-se indefinidamente, e emquauto se estuda não se faz cousa alguma.

O sr. Vaz Preto: — É melhor não fazer nada, do que andar ás cegas.

O sr. Visconde de Bivar: — «É melhor não fazer nada, do que andar ás cegas a, diz o digno par. De accordo; mas nós approvando esto projecto, não andamos ás cegas.

Em negocios d’esta ordem, nós temos obrigação de ter muito em conta a opinião do governo, e quando elle nos diz: «Eu não posso realizar já a conclusão d’estas linhas, pelos meus meios proprios, mas consta-me que ha companhias que pretendem tomar conta d’ellas para as acabar, sem novos encargos para a fazenda publica», havemos, n’estas condições, de insistir para que os caminhos de ferro sejam feitos por conta do estado?

Aos que reputam as construcções feitas por companhias como uma calamidade, dou-lhes rasão; para os que, como eu, as não reputam assim, para os que têem approvado caminhos de ferro, tanto feitos pelo estado como pelas companhias, não vejo que possa haver um unico fundamento que os leve a votar o adiamento proposto.

Se este emprehendimento se poder realisar agora, tanto melhor, e não se perca o ensejo; se não houver uma companhia que tome conta da empreza, então esperaremos, mas com a consciencia tranquilla de termos empregado todos os meios para que estes caminhos de ferro se construam com a brevidade desejada.

Sr. presidente, eu quando ouvi a palavra auctorisada do distincto engenheiro que se senta nas cadeiras superiores, palavra que eu tenho obrigação de respeitar, como todos nós, pelo muito que consideramos o saber do digno par, e vi que se atacava o projecto pelo optimismo; mas depois, quando fallou o sr. conde de Rio Maior, conheci que a cousa tinha mudado de figura, e que se dizia: não se de o caminho de ferro, porque a companhia vae ganhar sommas fabulosas, de que o estado se privará!

Sr. presidente, eu sou parlamentar antigo, e tenho assistido a muitas discussões da natureza d’esta; creio que não ha caminho de ferro em Portugal que eu não tenha votado, e sei a tactica que empregam os que os combatem.

Quando se apresenta uma proposta para a adjudicação de algum caminho de ferro a qualquer companhia, os que não querem que elle se construa dizem: não se entregue o caminho a uma empreza particular, porque, em troca de alguns linguados de ferro, vem sugar os dinheiros da nação, e é preferivel a construcção por conta do estado.

Quando, porém, se trata de construir alguma linha por este systema, argumenta-se de outro modo, asseverasse que as previsões dos engenheiros são inexactas; que a carestia da mão de obra e dos materiaes é immensa; e, finalmente, que as finanças ficarão arruinadas!

Mas o discurso do sr. Larcher apresentou uma especie nova para mim, pois é a primeira vez que ouço dizer no parlamento, que não só temos obrigação de zelar os inte-

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resses do thesouro, mas tambem os das companhias, pois affirmou s. exa. que um contrato nas condições do projecto tem encargos taes, que elle seria a ruina da companhia que o acceitasse.

Seguiu-se depois a fallar o digno par, o sr. conde de Rio Maior, e a sua argumentação baseou-se nos grandes interesses que deve auferir qualquer companhia que tome conta da construcção dos caminhos de ferro ao sul do Tejo, e tentou s. exa. demonstrar os prejuizos que o estado deve sofrer se os não construir por conta propria.

Ao sr. Larcher opponho o sr. conde de Rio Maior, um dizendo que a companhia perde, outro asseverando que ella ganha,

Temos ao sul do Tejo uma rede de caminhos de ferro incompleta, e, como muito bem disse o nobre relator da commissão, é preciso ligar os elos d’essa cadeia.

Eu não creio que os sacrificios que o paiz tem feito, tenham unicamente por fim levar o caminho de ferro do Barreiro a Serpa, e não o levar até á fronteira para nos ligar com as linhas da Andaluzia, julgo que levámos a viação accelerada a Extremoz para a prolongar até á linha de leste, e que a continuámos de Beja a Casevel para a fazer terminar no Algarve, estabelecendo por este modo a communicação rapida das provincias do sul com o norte dó paiz. E esta communicação, sr. presidente, a meu ver, é importantissima.

Nós, pelas discussões que tenho ouvido, ligámos a maior consideração á viação accelerada que tende a desenvolver as nossas relações com o reino vizinho; e parece que não temos em tanta conta a que deve servir as nossas communicações interiores; pois tanta attenção deve merecer uma como outra, e devemo-nos lembrar que o sul do paiz está quasi privado de meios de communicação, por terra, com o norte do reino. Tratemos, pois, de obviar a este grande inconveniente, para o qual os poderes publicos não podem olhar com indifferença. Alem d’isto, debaixo do ponto de vista administrativo, eu estou convencido de que a conclusão d’estas linhas ferreas é uma urgente necessidade.

O capital empatado nas linhas do sul do Tejo está longe de produzir ainda para o estado a compensação dos sacrificios feitos, e não dará resultado satisfactorio senão depois d’esta rede concluida.

Se o rendimento kilometrico ainda é baixo, elle subirá quando as diversas linhas chegarem á sua natural conclusão.

Eu não quero questionar se o traçado dos caminhos de ferro ao sul do Tejo foi bom ou mau; nós não tratamos agora do passado, tratamos do presente. Mas, sr. presidente, se ha alguma linha no paiz que possa merecer, pelas circumstancias especiaes em que se acha, rasões de preferencia sobre todas as outras, é a do Algarve. (Riso do sr. Vaz Preto.) O digno par ri-se? Pois o digno par não sabe que esta linha custou já ao estado a quantia de 580 contos? Não sabe que o encargo para o paiz é, pelo menos, de 30 e tantos contos? Sabe. Pois se este caminho for abandonado, teremos um capital morto que não renderá cousa alguma. Eis aqui as circumstancias especiaes a que eu me referi.

Eu sei que a area do nosso paiz não é tamanha que, quando se faz um caminho de ferro no norte, não cheguem os seus beneficios ajo sul, e que fazendo-se no sul não cheguem ao norte.

Sei isto perfeitamente; e por isso não tenho negado o meu voto a qualquer das linhas ferreas que temos emprehendido.

Os dignos pares, que combatem o projecto, pretendem aterrar os seus defensores com os desastres de 1868. Houve desastres n’aquella epocha, é verdade; mas ainda ha poucos dias eu folguei de ouvir a um digno par, meu amigo (que gosta de me interromper quando fallo), fazer um elogio bem merecido á reforma administrativa do digno par o - sr. Mártens Ferrão.

Ainda bem, sr. presidente, que voz tão auctorisada se levantou para tecer encomios a uma tal medida. Mas o que é para lastimar é que, quando houve quem excitasse o paiz contra ella, tambem não houvessem vozes auctorisadas que lhe dissessem: parae, guiam-vos por mau caminho, não continueis.

Mas, sr. presidente, quanto ao desastre que se deu com os caminhos de sul e sueste, que obrigou a dar a uma companhia a indemnisação de 2:700 e tantos contos de réis, já o sr. ministro demonstrou que elle não foi tão pernicioso nas suas consequencias, que nos faça receiar a sua repetição.

Apesar de todas as circumstancias que se têem dado com a linha de sul e sueste, ora comprando o estado á parte do Barreiro a Vendas Novas, ora adjudicando-a depois a uma companhia, como subvenção, ora dando-se uma indemnisação para se desfazer um contrato, ora finalmente continuando-se a construcção por conta do governo, o resultado não tem sido tão mau para o paiz como se inculca.

Eu, não obstante ser leigo em assumptos de construcção de caminhos de ferro, tambem fiz os meus calculos á face de um documento auctorisado, que é o relatorio do sr. ministro das obras publicas de 2 de janeiro de 1878.

Esses calculos deram-me o resultado seguinte:

Numero de kilometros construidos — 322.

Custaram:

Subvenção em dinheiro do Barreiro a Vendas Novas.............. 549:916$630

Subvenção em madeiras............. 357:250$533

Compra do caminho de ferro do Barreiro ás Vendas Novas....... 939:730$950

Subvenções de Vendas Novas a Evora e Beja.....................1.967:270$496

Indemnisação á companhia ingleza.......2.705:625$000

Construcção por conta do governo....... 838:112$013

Total..........7.357:905$622

ou, por cada kilometro................ 22:850$638

Ora, examinando as contas dos outros caminhos de ferro eu não vejo que elles tenham ficado tão baratos como os de que se trata.

Quando este projecto se apresentou na camara dos senhores deputados, eu e alguns cavalheiros que têem igualmente muito interesse na prosperidade do Algarve, tivemos apprehensões de que este caminho de ferro se não levasse a effeito pelo modo proposto, porque tambem então nos diziam, como agora se repete, que não haveria companhia que quizesse contratar a sua construcção, porque as perdas seriam infalliveis.

Tratei de consultar todas as informações a que pude recorrer, e reconheci que com effeito havia uma companhia que pretendia tomar conta da empreza.

Diz-me o meu digno collega e amigo, o sr. Vaz Preto, que tem sempre a bondade de me interromper, que já deu a hora.

Vou, portanto, terminaras minhas reflexões. Não desejo mesmo tomar mais tempo á camara, que está fatigada, nem tão pouco ficar com a palavra reservada para ámanhã.

Já n’uma occasião interrompi o meu discurso para o continuar no dia seguinte, mas protestei nunca mais fazer tal.

Abreviarei, pois, quanto possivel, o que me propunha dizer.

Cuidei tambem de saber quem eram os individuos que formavam essa companhia, e informaram-me muito bem a respeito d’elles. Serão ainda os mesmos? Não sei. Mas parece-me que, depois d’este negocio ter estado tanto tempo sem resolução, a insistencia, por parte seja de quem for, de entrar n’elle, não é indicio de que seja tão ruim como alguns dignos pares o apresentam.

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O sr. ministro das obras publicas de certo não trata á discussão parlamentar este projecto se não estivesse convencido de que, depois de approvado e convertido era lei, não poderia ter resultados práticos em beneficio do paiz.

O sr. ministro das obras publicas declarou no seio da commissão, que não obstante não se lhe haver apresentado oficialmente alguma companhia, comtudo tinha informações de que havia quem se propunha a ir a qualquer concurso que se abrisse nas condições formuladas no projecto que discutimos.

Ora quando &e nos apresenta a possibilidade de completarmos as linhas do sul sem gastar um ceitil, conservando para o estado o rendimento que elle actualmente tira, e ter ainda em perspectiva o seu augmento muito em breve, segundo os cálculos do sr. conde de Rio Maior, creio que faremos um bom serviço ao paiz votando este projecto, que póde realisar um grande melhoramento, que tanto deveremos desejar.

O sr. Visconde da Silva Carvalho: — Peço a v. exa. que queira consultar a camara, para que amanhã haja sessão nocturna, das oito ás onze horas da noite, e para maior commodidade da camara a sessão ordinaria comece á uma hora da tarde e finde ás quatro horas.

O sr. Presidente: — Vou consultar a camara sobre a proposta do digno par, o sr. visconde da Silva Carvalho, dividindo-a em duas partes.

Primeiramente consultarei a camara se approva que haja sessão nocturna, e em segundo logar sobre a hora em que ha de começar e acabar a sessão ordinaria.

Os dignos pares que approvam que ámanhã haja sessão nocturna, começando ás oito horas e acabando ás onze, tenham a bondade de se levantar.

Foi approvado.

O sr. Presidente: — Os dignos pares que approvam que a sessão diurna de ámanhã comece á uma hora da tarde e acabe ás quatro horas, tenham a bondade de se levantar.

Foi approvado.

O sr. Visconde de Seisal: — Mando para a mesa um parecer de commissão.

Leu-se na mesa e mandou-se imprimir.

O sr. Presidente: — A ordem do dia para ámanhã, 12, é a continuação da que estava dada para hoje.

Lembro aos dignos pares que a sessão ámanhã começa á uma hora da tarde.

Ficam inscriptos para fallar sobre a materia em discussão os dignos pares os srs. Carlos Bento e Vaz Preto.

Está levantada a sessão.

Eram cinco horas da tarde.

Dignos pares presentes na sessão de 11 de abril de 1878

Exmos. srs.: Duque d’Avila e de Bolama; Duque de Loulé; Marquezes, de Ficalho, de Fronteira, de Monfalim, de Vallada; Condes, das Alcaçovas, dos Arcos, do Bomfim, de Cabral, de Cavalleiros, de Fonte Nova, da Ribeira Grande, de Rio Maior; Viscondes, do Alves de Sá, de Bivar, de Fonte Arcada, dos Olivaes, de Porto Covo, da Praia, da Praia Grande, do Seisal, da Silva Carvalho, de Soares Franco; D. Affonso de Serpa, Ornellas, Mello e Carvalho, Sousa Pinto, Barros e Sá, D. Antonio de Mello, Serpa Pimentel, Costa Lobo, Barjona de Freitas, Cau da Costa, Xavier da Silva, Palmeirim, Carlos Bento, Eugenio de Almeida, Sequeira Pinto, Montufar Barreiros, Larcher, Andrade Corvo, Mamede, Pinto Bastos, Reis e Vasconcellos, Vaz Preto, Franzini, Menezes Pita, Fontes Pereira de Mello.

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Codigo administrativo, a que se refere o projecto de lei n.° 273 e que deve ler-se a pag. 313, col. l.ª

TITULO I

Da divisão do territorio

Artigo 1.° O reino de Portugal e Algarves e as ilhas adjacentes dividem-se em districtos administrativos, os districtos em concelhos, e os concelhos em parochias.

§ unico. Os concelhos de Lisboa e Porto subdividem-se em bairros.

Art. 2.° São reconhecidos para todos os effeitos da presente lei os districtos e concelhos actualmente existentes.

Art. 3.° Qualquer alteração que de futuro haja de fazer-se na circumscripção dos districtos ou dos concelhos, só póde ser determinada pelo poder legislativo.

§ 1.° Póde todavia o governo, para todos os effeitos administrativos, annexar duas ou mais freguezias, que em separado não tenham os elementos necessarios para a administração parochial.

§ 2.° A circumscripção das parochias póde ser alterada pelo governo, de accordo com a auctoridade ecclesiastica.

Art. 4.° As duvidas suscitadas ácerca da demarcação e limites das circumscripções administrativas serão resolvidas pelo governo, ouvidas as corporações interessadas nas mesmas circumscripções.

TITULO II

Dos corpos electivos, magistrados e tribunaes que funccionam nas circumscripções
administrativas

Art. 5.° Os corpos administrativos são: no districto a junta geral; no concelho a camara municipal; e na freguezia a junta de parochia.

§ unico. No districto funcciona tambem uma commissão executiva delegada da junta geral.

Art. 6.° Os magistrados e funccionarios administrativos são: no districto o governador civil; no concelho o administrador; e na freguezia o regedor de parochia;

Art. 7.° Em cada districto funcciona um tribunal administrativo denominado conselho de districto.

TITULO III

Disposições communs a organisação e modo de o funccionar dos corpos administrativos

CAPITULO I

Da organisação dos corpos administrativos

Art. 8.° As micções dos corpos administrativos são, em regra, gratuitas e obrigatorias.

§ unico. São todavia motivos de escusa:

1.° Idade superior a sessenta e cinco annos;

2.° Moléstia chronica, de que resulte impossibilidade ou grave difficuldade para o exercicio das funcções;

3.° O exercicio de funcções de vogal effectivo no mesmo corpo administrativo no quadriennio immediatamente anterior.

Art. 9.° O serviço dos corpos administrativos é quadriennal, havendo porém renovação dos vogaes de dois em dois annos, pela fórma seguinte:

§ l.° No segundo anno de todos os biennios, sempre que todos os vogaes em exercicio tiverem sido eleitos na mesma eleição, o respectivo corpo administrativo, no primeiro domingo do mez de outubro, procederá ao sorteio dos vogaes que no fim d’esse biennio devem retirar-se da administração, e que hão de ser metade do numero par immediatamente inferior ao numero impar que constituir o quadro pleno da corporação.

§ 2.° No mez de novembro seguinte proceder-se-ha á eleição dos vogaes que hão de preencher os logares dos vogaes cessantes.

§ 3.° No fim do biennio immediato serão substituidos, independentemente de sorteio, os vogaes restantes; e assim successivamente de dois em dois annos.

Art. 10.° Não podem pertencer ao mesmo corpo administrativo parentes por consanguinidade ou affinidade dentro do terceiro grau da linha recta ou transversal, contado segundo o direito civil.

§ unico. Se forem eleitos para o mesmo corpo administrativo dois ou mais cidadãos, entre os quaes haja o parentesco declarado n’este artigo, terá a preferencia o mais votado, e o mais velho no caso de igualdade de votação.

Art. 11.° Para cada corpo administrativo serão eleitos tantos substitutos, quantos forem os vogaes effectivos.

Art. 12.° Ninguem póde pertencer ao mesmo tempo a mais de um corpo administrativo.

§ unico. Quando algum cidadão for eleito para diversos corpos administrativos, prevalecerá a eleição pela circumscripção superior.

Art. 13.° Os corpos administrativos têem presidentes e vice-presidentes, eleitos annualmente pelos vogaes.

§ 1.° Nos impedimentos temporarios e simultaneos dos presidentes e vice-presidentes presidirão os vogaes mais votados.

§ 2.° Nas faltas e impedimentos permanentes e simultaneos dos presidentes e vice-presidentes, proceder-se-ha a nova eleição para os respectivos cargos.

§ 3:° Emquanto houver vogaes effectivos os presidentes e vice-presidentes não serão tirados dos substitutos.

Art. 14.° Perde o logar no corpo administrativo a que pertencer, o vogal que acceitar cargo que o torne inelegivel para os cargos do mesmo corpo, ou exercer funcções que o obriguem a residencia fóra da area da respectiva circumscripção, durante todo o anno ou a maior parte d’elle.

§ unico. O logar de qualquer corpo administrativo não se perde pelo exercicio das funcções de deputado ou par do reino.

Art. 15.° Antes de entrarem em exercicio, os membros dos corpos administrativos prestam, nas mãos do presidente ou de quem suas vezes fizer, juramento de fidelidade ao rei e de obediencia á carta constitucional, ao acto addicional e ás leis do reino.

§ 1.° Se não comparecer o presidente ou quem o deva substituir, o juramento poderá ser deferido pelo respectivo magistrado administrativo.

§ 2.° Os vogaes substitutos, quando forem chamados a servir, prestam juramento nas mãos do presidente em exercicio.

Art. 16.° Os corpos administrativos podem ser dissolvidos pelo governo com audiencia do procurador geral da corôa em conferencia, e quando o aconselharem motivos ponderosos de conveniencia publica.

Art. 17.° Sempre que for dissolvido qualquer corpo administrativo, se procederá a nova eleição dentro de um praso não excedente a quarenta dias.

Art. 18.° Nos casos de falta e impedimento dos vogaes dos corpos administrativos, ou da dissolução dos mesmos corpos, serão chamados a servir os respectivos substitutos; e quando estes não bastem para completar o quadro da corporação, serão chamados os necessarios vogaes effectivos ou substitutos dos annos anteriores, sendo preferidos os effectivos aos substitutos, os mais votados aos menos votados, e os do anno mais proximo aos do anno mais remoto.

Art. 19.° A condemnação em processo criminal de qualquer vogal de um corpo administrativo, por motivo de abusos praticados no exercicio das suas funcções, priva-o con-

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demnado do seu cargo durante todo o tempo por que teria de servir.

Art. 20.° Os vogaes dos corpos administrativos funccionam, ainda alem do tempo para que foram eleitos, emquanto não estiverem legalmente substituidos.

Art. 21.° Os vogaes dos corpos administrativos eleitos fóra da epocha ordinaria, funccionam sómente até ao fim do biennio ou do quadriennio por que teriam de servir, se tivessem sido eleitos na epocha ordinaria immediatamente anterior.

CAPITULO II

Das reuniões e deliberações

Art. 22.° Os corpos administrativos não podem funccionar validamente sem que esteja reunida em sessão a maioria dos seus vogaes.

Art. 23.° Na falta e impedimento permanente ou. temporario dos vogaes effectivos, são chamados a servir os vogaes substitutos pela ordem da maior votação, preferindo os mais velhos no caso de igualdade de votos.

Art. 24.° É da competencia dos corpos administrativos conceder licenças aos seus vogaes e conhecer da legitimidade das suas faltas e impedimentos.

Art. 25.° As sessões dos corpos administrativos suo publicas.

Art. 26.° As deliberações dos corpos administrativos são tomadas a pluralidade de votos dos vogaes presentes.

§ unico. Nos casos de empate o presidente tem voto de qualidade.

Art. 27.° Os negocios são resolvidos por votação nominal.

§ 1.° Serão feitas por escrutinio secreto todas as votações que envolverem apreciação do merito ou demerito de qualquer pessoa.

§ 2.° Quando haja empate na votação por escrutinio secreto, ficará o negocio adiado para a sessão ou sessões immediatas até se obter vencimento.

Art. 28.° Os vogaes dos corpos administrativos não podem assistir ás sessões ou á parte d’ellas em que se tratar de negocios que lhes digam respeito, ou a pessoa a quem representem, ou com quem tenham parentesco, por consanguinidade ou affinidade, dentro do terceiro grau por direito civil.

Art. 29.° Nenhum vogal póde escusar-se de votar e deliberar em qualquer negocio que se tratar em sessão, e em que não esteja inhibido de intervir pela disposição do artigo antecedente.

Art. 30.° Aos presidentes dos corpos administrativos pertence dirigir as discussões, regular a ordem dos trabalhos das sessões a que presidirem, e tomar as providencias necessarias para que se não perturbe a corporação no exerci cio das suas funcções.

Art. 31.° As sessões dos corpos administrativos são ordinarias ou extraordinarias.

Art. 32.° Os corpos administrativos, que funccionam permanentemente, celebram as suas sessões ordinarias nos dias que designarem na primeira sessão de cada anno.

Art. 33.° Os corpos administrativos, a que se refere o artigo antecedente reunir-se-hão em sessão extraordinaria, todas as vezes que o interesse publico assim o exigir.

§ l.° Aos presidentes pertence fazer as convocações, sempre que o julguem necessario, ou lhes for requisitado pela auctoridade administrativa ou por dois vogaes da respectiva corporação.

§ 2.° Na convocação deve declarar-se o negocio ou negocios que têem de ser tratados na sessão extraordinaria.

Art. 34.° Nas sessões extraordinarias dos corpos administrativos, a que se referem os dois artigos antecedentes, não é permittido tratar de assumptos estranhos áquelles para que tiver sido feita a convocação.

Art. 35.° São nullas as deliberações dos corpos administrativos:

1.° Quando forem tomadas sobro objectos estranhos á sua competencia e attribuições;

2.° Quando forem tomadas em sessões ordinarias celebradas fóra dos dias para ellas designados;

3.° Quando forem tomadas em sessões extraordinarias sobre assumptos não declarados na convocação;

4.° Quando forem tomadas antes da abertura ou depois do encerramento da sessão, ou fóra do local para ella destinado;

5.° E em geral quando forem oppostas ás leis e regulamentos de administração publica.

Art. 38.° De tudo o que occorrer nas sessões se lavrará acta em livro especial, com termo de abertura e encerramento, numerado e rubricado pelo presidente da corporação.

Art. 37.° As actas das sessões serão escriptas pelos secretarios ou escrivães, e assignadas pelos vogaes que forem presentes.

§ 1.° Se algum vogal deixar de assignar, declarar-se-ha a falta e o motivo d’ella.

§ 2.° O vogal que não se conforma com alguma deliberação póde assignar vencido, mas não póde fundamentar o seu voto nem recorrer da deliberação.

Art. 38.° As deliberações dos corpos administrativos, só podem provar-se pelas respectivas actas.

TITULO IV

Das juntas geraes de districto

CAPITULO I

Disposições especiaes sobre organisação, reuniões e deliberações

Art. 39.° A junta geral do districto é composta de procuradores eleitos directamente pelos concelhos.

§ 1.° Pelo districto de Lisboa serão eleitos vinte e cinco procuradores; pelo districto do Porto vinte e tres; e por cada um dos outros districtos vinte e um.

§ 2.° A junta geral do districto pertence designar o numero de procuradores, que compete a cada concelho, na proporção do numero total fixado no artigo antecedente.

Art. 40.° O procurador eleito por mais de um concelho representará o da sua naturalidade; na falta d’esta circumstancia o da residencia; na falta d’esta aquelle em que tiver obtido o maior numero de votos; e em igualdade de votos o que a sorte designar.

§ unico. A eleição para o logar de procurador effectivo prefere á eleição para o logar de substituto.

Art. 41.° A junta geral do districto terá duas sessões ordinarias em cada anno, uma que começará em 1 de maio e outra em 1 de novembro, e que poderão durar, segundo parecer á mesma junta, até ao ultimo dia dos referidos mezes.

§ unico. Poderá alem d’isso a junta geral reunir-se extraordinariamente, quando por motivo urgente for convocada pelo governo, ou assim estiver determinado por disposição de lei.

Art. 42.° As sessões da junta geral, que, segundo o disposto nas leis, devem abrir-se em dias ou epochas determinadas, não carecem de convocação.

Art. 43.° As sessões da junta geral são abertas e encerradas pelo governador civil do districto em nome do rei.

Art. 44.° As sessões da junta geral poderão, a pedido da mesma junta, ser prorogadas pelo governo; porém só por causas urgentes e extraordinarias poderá o governo transferir a abertura das mesmas sessões.

Art. 45.° As sessões extraordinarias consideram-se terminadas com a resolução dos negocios que determinaram a convocação.

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Art. 46.° A junta geral de districto reune-se e funcciona no edificio do governo civil.

Art. 47.° O governador civil póde assistir ás sessões da junta geral, será ouvido quando o pedir, e toma assento ao lado direito do presidente.

Art. 48.° O expediente da junta geral está a cargo da secretaria do governo civil.

§ unico. Poderá todavia a junta geral, quando occorram trabalhos extraordinarios, nomear empregados para esses serviços, e arbitrar-lhes a correspondente gratificação.

Art. 49.° A junta geral corresponde-se com todas as auctoridades e repartições publicas dos districtos.

§ unico. Com o governo porém e com os tribunaes e repartições superiores do estado só poderá corresponder-se por intermedio do governador civil.

Art. 50.° Na primeira reunião de cada anno, ajunta geral constitue-se debaixo da presidencia do mais velho, servindo de secretario o mais novo dos procuradores presentes; e procederá em seguida á eleição do presidente, vice-presidente, secretario e vice-secretario.

§ unico. Nas faltas ou impedimentos simultaneos do secretario e vice-secretario servirá de secretario o procurador mais novo.

Art. 51.° Da eleição da mesa e constituição definitiva da junta se lavrará acta, que será enviada por copia ao governador civil.

CAPITULO II

Competencia e attribuições da junta geral de districto

Art. 52.° A junta geral do districto pertencem attribuições:

1.° Como administradora e promotora dos interesses districtaes;

2.° Como auctoridade tutelar da administração municipal e parochial;

3.° Como auxiliar da execução de serviços do interesse geral do estado.

Art. 53.° É da competencia da junta geral do districto como administradora e promotora dos interesses districtaes:

1.° Administrar todos os bens e estabelecimentos do districto, e applical-os aos usos e fins a que são destinados;

2.° Deliberar sobre a acquisição dos bens necessarios ao desempenho dos serviços districtaes, e sobre a alienação dos que forem dispensaveis d’esses serviços;

3.° Deliberar sobre a acceitação de heranças, legados e doações feitas ao districto, ou a estabelecimentos districtaes;

4.° Regular e dirigir a administração dos expostos e creanças desvalidas e abandonadas;

5.° Crear estabelecimentos districtaes de beneficencia, instrucção e educação;

6.° Subsidiar estabelecimentos de beneficencia, instrucção e educação, de que não seja administradora, uma vez que esses estabelecimentos sejam de reconhecida utilidade a alguma povoação importante ou a alguma classe digna da protecção publica;

7.° Mandar proceder, na conformidade das leis respectivas, á abertura, construcção, reparação e conservação das estradas districtaes;

8.° Crear os empregos necessarios ao desempenho dos serviços da administração e interesse do districto, arbitrando-lhes a correspondente remuneração, e extinguindo-os quando se tornem desnecessarios;

9.° Nomear os empregados da administração districtal, cujos vencimentos estejam a cargo do respectivo cofre, suspendel-os e demittil-os, depois de ouvidos, quando commettam faltas graves ou se tornem indignos de exercer as suas funcções;

10.° Nomear e demittir os professores pagos pelo cofre districtal na conformidade do que for disposto nas leis especiaes;

11.° Deliberar sobre os pleitos a intentar e a defender por parte do districto e transigir sobre elles;

12.° Contrahir emprestimos para a realisação de melhoramentos districtaes, estabelecendo a respectiva dotação e estipulando as condições da sua amortisação;

13;° Contratar com emprezas individuaes ou collectivas a execução de quaesquer obras, serviços ou fornecimentos de interesse parar o districto;

14.° Celebrar accordos com outras juntas geraes para a realisação de melhoramentos de utilidade commum dos respectivas districtos;

10.° Fazer regulamentos para a execução de todas as providencias e serviços permanentes;

16.° Fazer regulamentos de policia sobre todos os assumptos de policia municipal, que convenha regular uniformemente em todos os concelhos do districto;

17.° Nomear a commissão districtal encarregada de executar as suas deliberações, e substituir os seus membros quando o julgar conveniente;

18.° Fixar as quotas com que as camaras municipaes devem concorrer para as despezas districtaes, e a percentagem addicional ás contribuições directas e geraes do estado, que constitue receita do districto;

19.° Fixar a dotação de todos os serviços e regular todas as despezas da administração districtal;

20.° Deliberar, na conformidade das leis respectivas, sobre a conveniencia de serem expropriadas por utilidade publica as propriedades necessarias aos melhoramentos do districto;

21.° Approvar o orçamento districtal.

Art. 54.° Como auctoridade tutelar da administração municipal e parochial compete á junta geral:

1.° Conceder ou negar approvação a todos os actos, deliberações e accordos das camaras municipaes e juntas de parochia, que nos termos d’este codigo carecem d’essa approvação para se tornarem executorios;

2.° Recommendar á iniciativa das camaras municipaes e juntas de parochia os melhoramentos das respectivas administrações, dando-lhes todas as indicações e instrucções necessarias ao bom desempenho dos serviços dependentes da confirmação tutelar.

Art. 55.° Como auxiliar da execução de serviços de interesse geral do estado incumbe ajunta geral:

1.° Exercer as attribuições que lhe são commettidas por disposições das leis;

2.° Propor ao governo a lista triplice para a nomeação do conselho de districto;

3.° Emittir voto consultivo em todos os assumptos sobro que for consultada pelo governo.

Art. 56.° As deliberações da junta geral do districto no exercicio das attribuições administrativas enumeradas no artigo 53.° são executorias, independentemente de confirmação de qualquer tribunal ou auctoridade.

§ unico. São exceptuadas da disposição d’este artigo, por carecerem de confirmação do governo:

1.° A acquisição e alienação de bens immobiliarios e as transacções sobre pleitos;

2.° O levantamento de emprestimos, quando os respectivos encargos, só de per si, ou juntos aos encargos de emprestimos já contrahidos, absorvam mais da decima parte da receita calculada no orçamento ordinario do respectivo anno;

3.° A demissão de empregados.

Art. 57.° As deliberações tomadas pela junta geral, no exercicio das attribuições administrativas designadas no artigo 53.°, e que não estão sujeitas á confirmação do governo, bem como as deliberações, tomadas no exercicio das attribuições tutelares declaradas no artigo 54.°, não podem ser revogadas ou alteradas senão por meio de resolução contenciosa do conselho de districto, e sómente nos casos seguintes:

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1.° Quando d’esses actos ou deliberações resultar offensa de direitos;

2.° Quando as deliberações forem nullas por algum dos motivos enumerados no artigo 35.°

Art. 58.° São competentes para recorrer das deliberações da junta geral: nos casos de que trata o n.º 1.° do artigo antecedente, as pessoas cujos direitos se reputam offendidos; e nos casos a que se refere o n.° 2.°, o secretario geral do governo civil do districto, como representante do ministerio publico.

CAPITULO III

Da fazenda do districto, e contabilidade da administração districtal

SECÇÃO I

Da receita e despeza

Art. 59.° A receita do districto é ordinaria ou extraordinaria:

§ 1.° Constituem receita ordinaria:

l.° Os rendimentos dos bens proprios districtaes;

2.° Os juros de creditos e fundos consolidados pertencentes ao districto;

3.° Os dividendos de acções de que o districto seja possuidor;

4.° O rendimento dos estabelecimentos districtaes;

5.° As quotas derramadas pelas camaras municipaes para as despezas do districto;

6.° O producto da percentagem addicional ás contribuições geraes e directas do estado;

7.° O producto das multas impostas nos regulamentos de policia districtal ou de outras quaesquer que por lei ou regulamento devam reverter em proveito do districto;

8.° Outros quaesquer rendimentos applicados por leis para as despezas districtaes.

§ 2.° Constituem receita extraordinaria:

1.° As heranças, os donativos, legados e doações;

2.° O producto dos emprestimos;

3.° O producto de alienação dos bens;

4.° Os subsidios do estado para auxiliar melhoramentos

do districto;

5.° Outros quaesquer rendimentos incertos e eventuaes.

Art. 60.° As despezas do districto são obrigatorias ou facultativas.

§ 1.° São obrigatorias:

1.° As despezas com estabelecimentos districtaes de beneficencia, instrucção e educação;

2.° As despezas com as estradas districtaes:

3.° As despezas com os vencimentos dos empregados e funccionarios pagos pelo cofre districtal;

4.° As despezas com a instrucção publica nos termos das leis;

5.° As despezas de construcção e conservação das cadeias e mais edificios districtaes, e d’aquelles em que funccionarem as secretarias dos governos civis, e mobilia dos governos civis e das repartições publicas districtaes;

6.° As despezas com os expostos e creanças desvalidas e abandonadas;

7.° O pagamento das dividas exigiveis;

8.° As despezas com a amortisação dos emprestimos e execução de contratos legalmente celebrados;

9.° As despezas com a sustentação de presos pobres que orem residentes no districto ao tempo da prisão;

10.° As despezas com o expediente da junta geral;

11.° Todas as outras despezas postas por lei a cargo dos districtos.

Art. 61.° São facultativas todas as despezas não enumeradas no artigo antecedente, que forem de utilidade publica para o districto, e consequentes do exercicio de attribuições legaes da junta geral.

SECÇÃO II

Do orçamento districtal

Art. 62.° O orçamento do districto comprehende o calculo da receita que se espera arrecadar, e a descripção das despezas, que deverão fazer-se, para occorrer ás necessidades da administração districtal.

Art. 63.° O orçamento districtal é ordinario ou supplementar.

§ 1.° O orçamento ordinario é destinado a auctorisar a cobrança e applicação, durante um anno civil, de todos os rendimentos districtaes.

§ 2.° O orçamento supplementar é destinado

1.° A crear receita quando a votada no orçamento ordinario for insuficiente para occorrer ás despezas auctorisadas;

2.° A occorrer a despezas urgentes, que não tenham sido contempladas no orçamento ordinario;

3.° A dar applicação aos saldos de contas ou á receita excedente á calculada no orçamento ordinario;

4.° A alterar a applicação da receita votada no orçamento ordinario.

Art. 64.° Os orçamentos districtaes, quer ordinarios quer supplementares, não podem ser organisados de fórma que a despeza seja excedente á receita.

Art. 65.° O orçamento ordinario do districto será discutido e approvado pela junta geral 1.ª sua sessão ordinaria do mez de maio; os orçamentos supplementares serão votados todas as vezes que a urgencia das circumstancias o reclamar.

Art. 66.° Os orçamentos districtaes, tanto ordinarios como supplementares, serão remettidos por copia ao governo, que os mandará publicar na folha official.

Art. 67.° Quando a junta geral deixe de votar os orça» mentos necessarios ao regimen do districto, ou quando n’elle deixe de incluir despezas obrigatorias, ou quando a receita, devidamente calculada, não for bastante para occorrer ás referidas despezas, o governo, em conselho de ministros, usará das attribuições da junta geral, quanto for necessario para estabelecer o equilibrio do orçamento.

Esta resolução só póde ter effeito depois de approvado pelo governo.

Art. 68.° Quando por qualquer motivo o orçamento districtal não se achar votado antes do começo do anno para que tem de reger, continuará em vigor o anterior orçamento, mas sómente quanto á receita e quanto ás despezas obrigatorias de execução annual e permanente.

SECÇÃO III

Da contabilidade da administração districtal

Art. 69.° Nenhuma despeza poderá ser ordenada sem que esteja votada em orçamento regularmente organisado nos termos d’este codigo.

Art. 70.° O serviço financeiro dos districtos executa-se em periodos de gerencia e de exercicio.

§ 1.° A gerencia abrange os actos financeiros realisados durante um anno civil.

§ 2.° O exercicio abrange o periodo de mais tres mezes alem do anno de gerencia.

§ 3.° Findo o exercicio caducam as auctorisações do orçamento, e ficam sem vigor as ordens de pagamento passadas e não pagas.

Art. 71.° Dentro do praso de sessenta dias, depois de findo o periodo do exercicio, será organisada e enviada ao tribunal de contas a conta do mesmo exercicio, na qual se descreva em columnas separadas a receita cobrada e a despeza effectuada, pela mesma ordem e pelos mesmos dizeres com que as respectivas verbas estiverem descriptas nos orçamentos.

§ unico. Em tudo mais que for relativo ao processo a seguir na apresentação das contas e documentos, com que estas devem ser instruidas, se observará o que for deter-

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minado nos regulamentos geraes de contabilidade publica e regimento do tribunal de contas.

Art. 72.° As contas do districto, antes de serem enviadas ao tribunal de contas, estarão patentes ao publico durante oito dias uteis, o que se fará constar por editaes e annuncios nos jornaes da sede do districto, com a antecipação, pelo menos, de tres dias.

§ unico. Todos os cidadãos do districto têem direito de apresentar reclamações e observações por escripto ácerca das contas, a fim de serem presentes com o respectivo processo ao tribunal do julgamento.

Art. 73.° O ministerio publico junto dos tribunaes de justiça é competente para, como parte principal, intentar as acções necessarias, a fim de fazer entrar no cofre do districto as quantias em que os gerentes forem condemnados, ou porque, de qualquer fórma, sejam responsaveis para com a fazenda do districto.

CAPITULO IV

Do thesoureiro do districto

Art. 74.º O thesoureiro do districto é o encarregado de receber e arrecadar todos os rendimento districtaes, e de pagar todas as despezas devidamente ordenadas.

Art. 75.° O thesoureiro do districto é de livre nomeação da junta geral, e vence a percentagem que lhe for arbitrada nos orçamentos districtaes.

Art. 76.° O thesoureiro do districto prestará fiança idónea na importancia que for fixada pela junta geral.

§ unico. Os procuradores á junta geral são solidariamente responsaveis pela falta ou insuficiencia da fiança.

Art. 77.° O thesoureiro pagador do districto póde ser nomeado thesoureiro dos rendimentos districtaes, e n’este caso vencerá a gratificação que a junta geral lhe arbitrar.

Art. 78.° A caução prestada pelo thesoureiro pagador será proporcionada ao acrescimo de responsabilidade resultante da arrecadação dos dinheiros districtaes.

Art. 79.° O thesoureiro é obrigado a remetter á commissão districtal, no principio de todas as semanas, e extraordinariamente quando ella lho pedir, um balanço do respectivo cofre, referido ao ultimo dia da semana finda.

TITULO V

Da commissão districtal, sua competencia e attribuições

Art. 80.° A junta geral de districto, na sua primeira reunião depois de eleita, elege tres dos seus vogaes, os quaes constituirão a commissão districtal.

§ 1.° Na mesma occasião nomeará a junta outros tres vogaes, os quaes, pela ordem da nomeação, serão chamados a supprir as faltas e impedimento dos vogaes effectivos.

§ 2.° Na falta e impedimento de uns e outros, poderão tambem ser chamados como supplentes os procuradores que residirem no concelho da séde do districto, preferindo os mais velhos.

Art. 81.° A junta geral designará os vogaes que hão de servir de presidente e de secretario da commissão districtal, servindo, na falta d’essa designação, de presidente o mais velho e de secretario o mais novo dos procuradoras nomeados.

Art. 82.° A junta geral, sempre que o julgar conveniente, póde substituir os vogaes da commissão districtal.

Art. 83.° A commissão districtal funcciona na sede do districto, no edificio em que estiver estabelecido o governo civil, e reunir-se-ha todas as vezes que o julgar necessario para o desempenho das suas funcções.

Art. 84.° A commissão districtal funcciona permanentemente.

Art. 80.° O expediente da commissão districtal está a cargo da secretaria do governo civil, nos termos do artigo 48.°

Art. 86.° Das sessões da commissão districtal se lavrarão actas em livro especial.

§ unico. São applicaveis ás actas é deliberações da commissão districtal as disposições dos artigos 36.°, 37.° e 38.°

Art. 87.° Sem que haja conformidade de dois votos, não são validos nem executorios os accordos e resoluções da commissão districtal.

Art. 88.° A dotação da commissão é de 900$000 réis.

§ unico. Esta dotação será distribuida aos membros da commissão pela junta geral, em harmonia com os principios de equidade, e attendendo ao facto de ter ou não cada um dos membros residencia permanente na séde do districto.

Art. 89.° A commissão districtal corresponde-se com todas as auctoridades e repartições publicas, nos termos do artigo 49.º

Art. 90.° A commissão districtal compete:

1.° Executar e fazer executar todas as deliberações e accordos tomados pela junta geral;

2.° Representar o districto;

3.° Propor o orçamento districtal;

4.° Na ausencia da junta geral, exercer as attribuições que competem á mesma junta em todos os negocios, cuja resolução não possa ser adiada sem prejuizo para a administração, e cuja importancia não justifique a convocação extraordinaria da junta geral.

§ unico. Serão sempre da exclusiva competencia da junta geral as deliberações ácerca dos objectos de que tratam os n.ºs 2.°, 3.°, 5.°, 6.°, 8.°, 12.°, 15.°, 16.°, 17.°, 18.°, 19.° e 21.° do artigo 53.°

Art. 91.° Em todas as reuniões, quer ordinarias quer extraordinarias, da junta geral do districto, a commissão districtal lhe dará conta circumstanciada de todas as providencias, que tiver adoptado, e resoluções que houver tomado, desde o encerramento da ultima sessão.

Art. 92.° As resoluções da commissão districtal resultantes das attribuições designadas no n.° 4.° do artigo 90.°, vigoram provisoriamente até que a junta geral delibere sobre a sua approvação ou reprovação.

§ unico. A junta geral póde revogar as resoluções da commissão districtal, quando da revogação não resulte damno irreparavel ou prejuizo de direitos adquiridos.

Art. 93.° Os vogaes da commissão districtal são solidariamente responsaveis para com a fazenda do districto pelas resoluções que tomarem em desaccordo com as deliberações da junta geral e com o disposto nas leis e regulamentos de administração publica.

Art. 94.° A commissão districtal compete ordenar todos os pagamentos.

§ unico. Os mandados, para serem executorios, carecem de ser rubricados por dois vogaes, pelo menos, da commissão districtal.

Art. 95.° Dos actos da commissão districtal só póde recorrer-se para a junta geral do districto.

§ unico. Se a junta geral não estiver reunida ou não quizer revogar o acto da commissão, póde recorrer-se para o conselho de districto, se houver offensa de direitos ou violação da lei.

Art. 96.° Quando a commissão districtal julgar necessaria a convocação extraordinaria da junta geral, assim o levará ao conhecimento do governo com a exposição dos motivos que justifiquem a convocação solicitada.

Art. 97.° As contas de que tratam os artigos 71.° e 72.°, são prestadas pela commissão districtal, como encarregada da gerencia dos rendimentos do districto.

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TITULO VI

Das camaras municipaes

CAPITULO I

Disposições especiaes sobre organisações reuniões e deliberações

Art. 98.° A camara municipal é composta de sete vereadores.

§ unico. Exceptuam-se a cambra municipal de Lisboa, que é composta de treze vereadores, o a do Porto, que é composta de onze.

Art. 99.° Os vereadores eleitos tomam posse no dia 2 do mez de janeiro immediato á eleição.

§ unico. Se a eleição tiver sido extraordinaria, ou ordinaria, mas effectuada depois do referido dia, a posse será tomada immediatamente ao apuramento.

Art. 100.° A camara municipal tem uma sessão ordinaria por semana, e as extraordinarias que o bem do serviço exigir.

Art. 101.° O administrador do concelho tem entrada e voto consultivo em todas as sessões da camara, o toma assento ao lado esquerdo, junto ao presidente.

§ unico. Nos Concelhos de Lisboa e Porto esta attribuição pertence aos administradores dos bairros, que a exercerão por turno designado pelo governador civil.

CAPITULO II

Attribuições

Art. 102.° A camara municipal pertencem attribuições:

1.° Como administradora e promotora dos interesses municipaes;

2.° Como auctoridade policial ao concelho;

3.° Como auxiliar da execução de serviços de interesse geral do estado e do districto.

Art. 103.° Como administradora e promotora dos interesses municipaes, compete á camara:

1.° Administrar todos os bens a estabelecimentos do concelho, e dar-lhes a applicação a caie são destinados;

2.° Deliberar sobre a acquisição dos bens necessarios ao desempenho dos serviços do concelho, e sobre a alienação dos que forem dispensaveis d’esses serviços;

3.° Deliberar sobre a acceitação de heranças, doações e legados deixados ao concelho ou a estabelecimentos, municipaes;

4.° Crear estabelecimentos municipaes de beneficencia, instrucção e educação;

5.° Subsidiar estabelecimentos de beneficencia, educação e instrucção, que não estejam a cargo da sua administração, mas que sejam de utilidade do concelho;

6.° Mandar, na conformidade das leis especiaes, abrir, construir, reparar e conservar as das e estradas do concelho;

7.° Crear partidos para facultativos, boticarios, parteiras e veterinarios, e bem assim os empregos necessarios ao desempenho dos serviços da administração municipal e interesse do concelho, arbitrando-lhes a correspondente remuneração e extinguindo-os quando se tornem desnecessarios;

8.° Nomear os empregados da administração municipal, cujos vencimentos estejam a cargo do respectivo cofre, suspendel-os e demittil-os, depois de ouvidos, quando pratiquem faltas graves, ou se tornem indignos de exercer as suas funcções;

9.° Nomear os professores de instrucção primaria, cujos vencimentos, ou a maior parte d’elles, estejam a cargo do cofre municipal, suspendel-os e demittil-os depois de ouvidos, quando pratiquem faltas graves ou se tomem indignos de exercer os seus logares, tudo na conformidade das leis especiaes;

10.° Deliberar ácerca dos pleitos a intentar e a defender por parte do concelho e das transacções sobre elles;

11.° Contrahir emprestimos para a realisação de melhoramentos municipaes, estabelecendo-lhes a dotação e estipulando as condições da sua amortisação;

12.° Contratar com emprezas individuaes ou collectivas a execução de quaesquer obras, serviços ou fornecimentos do interesse do concelho;

13.° Mandar proceder á construcção, conservação e reparação das fontes, pontes e aqueductos do concelho;

14.° Regular o modo de fruição e exploração dos bens, pastos e fructos do logradouro commum dos povos do concelho, ou pertencentes a mais de uma freguezia, podendo estabelecer pelo seu uso taxas em beneficio do cofre municipal;

l5.° Deliberar sobre a conveniencia de serem expropriadas por utilidade publica as propriedades necessarias aos melhoramentos do concelho;

16.° Lançar nos termos d’este codigo contribuições directas e indirectas para occorrer ás despezas do concelho;

17.° Lançar taxas pelas licenças policiaes;

18.° Fazer os regulamentos para a cobrança e arrecadação das contribuições municipaes;

19.° Deliberar sobre a aposentação dos empregados municipaes;

20.° Administrar os celleiros communs;

21.° Deliberar sobre o estabelecimento, duração, suppressão ou mudança de feiras e mercados;

22.° Organisar serviços ordinarios ou extraordinarios para extincção dos incendios, e para prevenir ou attenuar os males resultantes de quaesquer calamidades publicas;

23.° Celebrar accordos com outras camaras municipaes para a realisação de melhoramentos de utilidade commum dos respectivos concelhos;

24.° Fixar a dotação de todos os serviços municipaes;

25.° Organisar os orçamentos da receita e despeza do municipio;

26.° Estabelecer cemiterios municipaes, tendo em vista os regulamentos sanitarios;

27.° Determinar a denominação das das e logares publicos e a numeração dos predios.

Art. 104.° Como auctoridade policial do concelho compete á camara, fazer posturas:

l.0 Para a policia dos cães e das aguas não navegaveis nem fluctuaveis, das estradas, dos campos, da caça e da pesca nas aguas concelhias e particulares;

2.° Para o regimen e policia das aguas communs municipaes;

3.° Para a policia dos vendilhões e adellos, ou sejam ambulantes ou tenham logares fixos;

4.° Para a limpeza das chamines e fornos, e o serviço para a extincção dos incendios, e contra inundações;

5.° Para impedir a divagação pelas das de animaes nocivos;

6.° Para impedir que nas janellas, telhados, varandas se colloquem objectos que ponham em risco a segurança dos cidadãos;

7.° Para regular nos termos da lei respectiva o prospecto e alinhamento dos edificios dentro das povoações;

8.° Para ordenar a demolição dos edificios arruinados, que pozerem em risco a segurança dos individuos ou das propriedades, precedendo vistoria e as mais formalidades requeridas pela legislação respectiva;

9.° Para prover á conservação e limpeza das ruas, praças, cães, boqueirões, canos e despejos publicos;

10.° Para regular a policia das feiras e mercados;

E em geral sobre todos os objectos de policia tanto urbana como rural.

Art. 105.° Compete á camara, como auxiliar da execução de serviços de interesse geral e do districto, desempenhar a este respeito as funcções que lhe forem commettidas pelas leis e pelos regulamentos geraes e districtaes; e bem emittir voto consultivo em todos os assumptos de ir

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teresse publico, sobre que for consultada pela auctoridade administrativa ou pela junta geral do districto.

Art. 106.° Não são executorias, sem previa approvacão da junta geral do districto, as deliberações das camaras municipaes tomadas:

1.° Sobre os emprestimos, cujos juros e amortisação, sós de per si, ou juntos aos encargos de emprestimos já contrahidos, absorvam a decima parte da receita auctorisada no orçamento do anno respectivo;

2.° Sobre a suppressão de empregos e de estabelecimentos municipaes;

3.° Sobre o lançamento de contribuições;

4.° Sobre os orçamentos ordinarios ou supplementares;

5.° Sobre o estabelecimento, suppressão, duração ou mudança de feiras ou mercados periodicos;

6.° Sobre os accordos celebrados com outras camaras para interesse commum;

7.° Sobre aposentação de empregados;

8.° Sobre as posturas e regulamentos de execução permanente;

9.° Sobre a acquisição e alienação de bens immobiliarios e transacções sobre pleitos;

10.° Sobre demissão de empregados e suspensão por mais de trinta dias;

11.° Sobre contratos para fornecimentos e execução de obras, quando a despeza annual resultante d’esses contratos, só de per si, ou junta á despeza annual com outros contratos similhantes, absorver a decima parte da receita ordinaria da camara.

§ unico. Todas as demais deliberações das camaras municipaes são executorias independentemente da approvacão de qualquer outro corpo administrativo ou auctoridade.

Art. 107.° As deliberações das camaras municipaes podem ser revogadas ou alteradas pelos tribunaes do contencioso administrativo, sempre que resulte d’ellas offensa de direitos ou alguma das nullidades enumeradas no artigo 35.°

§ unico. São competentes para promover a revogação as partes interessadas e o administrador do concelho.

Art. 108.° A execução das deliberações da camara compete ao seu presidente, com sujeição á auctoridade da mesma camara, e sem prejuizo da responsabilidade solidaria dos vereadores.

Art. 109.° O presidente da camara é especialmente encarregado, nos termos do artigo antecedente:

1.° Da publicação das posturas e regulamentos municipaes, e de quaesquer outras resoluções e avisos;

2.° Da policia municipal, na conformidade das leis, regulamentos e posturas;

3.° Da proposta do orçamento municipal;

4.° Do ordenamento das despezas, na conformidade do orçamento;

5.° Da inspecção sobre a contabilidade municipal;

6.° Da conservação e administração das propriedades do concelho;

7.° De effectuar todos os actos de acquisição, alienação, transacção, arrendamento, arrematação, e similhantes para os quaes se ache devidamente auctorisado pela camara, e de assignar as competentes escripturas e obrigações;

8.° De representar o concelho em juizo, ou seja como auctor ou como réu;

9.° Da inspecção de todos os estabelecimentos municipaes;

10.° De corresponder-se com as auctoridades a quem a camara tiver de dirigir-se, e regular os trabalhos da secretaria;

11.° De vigiar no modo por que os diversos empregados municipaes desempenham as suas obrigações;

12.° De todo o expediente necessario para a regularidade dos trabalhos da camara municipal, e para a execução das resoluções legaes da mesma camara, á qual deve dar conta dos actos da sua gerencia.

Art. 110.° E permittido a camara dividir os trabalhos

da vereação pelos respectivos vereadores, tendo em vista os differentes ramos de serviço ou pelouros, para que cada um d’elles tiver mais aptidão.

§ unico. Esta divisão, porém, não póde prejudicar nem as attribuições deliberativas da camara, nem as executivas do seu presidente.

CAPITULO III

Da fazenda municipal

SECÇÃO I

Da receita municipal

Art. 111.° As receitas da camara municipal são ordinarias ou extraordinarias.

Constituem as receitas ordinarias:

1.° Os rendimentos dos bens proprios, municipaes;

2.° Os juros de creditos e de fundos consolidados pertencentes ao municipio;

3.° Os dividendos de acções de que o municipio for possuidor;

4.° O producto ou rendimento de estabelecimentos ou officinas municipaes;

5.° As contribuições municipaes;

6.° O producto de multas e outras condemnações que revertam em proveito do municipio;

7.° As taxas policiaes pelas licenças que a camara conceder;

8.° As taxas do serviço dos cemiterios municipaes, e o preço da concessão dos terrenos para sepulturas nos mesmos cemiterios;

9.° O producto do aluguer dos terrenos do uso publico municipal para estabelecimentos temporarios de commercio, ou quaesquer outros;

10.° O rendimento das taxas estabelecidas pela aferição dos pesos e medidas;

11.° Quaesquer outros rendimentos applicados por leis especiaes em beneficio dos municipios.

Art. 112.° Constituem as receitas extraordinarias:

1.° As heranças, os legados e os doações;

2.° Os emprestimos;

3.° O producto da alienação de bens;

4.° O producto de qualquer outra receita accidental.

Art. 113.° As contribuições municipaes serão lançadas na conformidade das disposições seguintes.

Art. 114.° As contribuições municipaes directas podem ser lançadas em dinheiro de contado, em serviço das pessoas e bens, ou em todas estas especies.

Art. 115.° As contribuições municipaes directas consistirão n’uma percentagem addicional ás contribuições geraes do estado, predial, pessoal e industrial.

§ unico. A quota lançada sobre os rendimentos isentos das contribuições mencionadas n’este artigo será proporcionada á quota dos que lhe estão sujeitos.

Art. 116.° Os jornaleiros que não pagam quota alguma de contribuição só podem ser collectados pelas contribuições directas até dois dias de trabalho, ou no dinheiro correspondente calculado pelo termo medio dos jornaes no concelho.

Art. 117.° A contribuição geral do trabalho é lançada sobre os chefes de familia, na conformidade das leis que regulam a viação municipal.

Art. 118.° As camaras podem lançar impostos sobre os vehiculos dos seus concelhos.

Art. 119.° Podem as camaras municipaes estabelecer um direito de caça, que será cobrado por meio da concessão annual da licença de caçar nos terrenos municipaes, ou nos terrenos particulares alheios, onde o exercicio do direito de caçar é permittido a qualquer.

Art. 120.° Nos concelhos onde póde exercer-se a industria da pesca em aguas communs municipaes, poderão as camaras estabelecer um direito de pesca cobrado por meio da concessão annual da licença de pescar nas ditas aguas.

Art. 121.° Podem tambem as mesmas municipalidades

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lançar impostos sobre cães e bestas do serviço, que uno se acharem tributadas no lançamento das contribuições geraes do estado, ou que por lei não forem isentas do imposto.

Art. 122.° O rol da contribuição municipal de repartição, depois de approvado pela camara, será publicado por editaes, e estará patente por quinze dias na casa da camara a todos os contribuintes do concelho.

§ unico. Nos oito dias immediatos a camara julga as reclamações que S8 apresentarem contra o rol, salvo o recurso para o conselho de districto.

Art. 123.° As contribuições municipaes indirectas consistirão em uns tantos réis lançados sobre o valor dos generos consumidos no concelho.

§ 1.° Nos generos expostos á venda ao publico o imposto será devido de todas as quatidades vendidas por grosso ou a retalho.

§ 2.° Com relação aos generos consumidos pelos vendedores, ou pelos productores, provenientes da sua propria producção, o imposto será calculado sobre o consumo provavel, tendo era vista o numero de pessoas de familia, os meios de fortuna e mais circumstancias do contribuinte.

§ 3.° Nos casos de que trata o § antecedente, o quantitativo do imposto será determinado por avencas, quando haja accordo entre o contribuinte e a administração, e por arbitramento na fórma que for determinada nos respectivos regulamentos, quando deixar de haver esse accordo.

§ 4.° Tambem são permittidas as avenças sobre os impostos devidos pelos generos expostos á venda.

Art. 124.° Os concelhos de Lisboa, Porto e Villa Nova de Gaia continuam a reger-se por leis especiaes, quanto aos impostos sobre o consumo.

Art. 125.° Os rendimentos e contribuições municipaes, á excepção d’aquelles para os quaes as leis e os regulamentos tiverem prescripto um modo especial de arrecadação, serão arrecadados da mesma fórma e com as mesmas formalidades prescriptos para a arrecadação dos rendimentos e contribuições do estado.

§ 1.° As questões movidas ácerca da legalidade das contribuições municipaes indirectas são da competencia dos tribunaes administrativos.

§ 2.° As camaras municipaes gosam dos privilegios que pelos artigos 885.° e 887.° do codigo civil pertencem á fazenda publica, mas sem prejuizo d’«esta.

Art. 126.° Nas ilhas adjacentes os generos importados pelas alfandegas pagarão no acto do despacho, alem dos direitos da pauta, a que estiverem sujeitos, o imposto indirecto votado para os generos similares nos orçamentos dos concelhos, a que pertencem as alfandegas, em que os mesmos generos forem despachados.

§ 1.° O producto do imposto, de que trata este artigo, será mensalmente entregue ás camaras municipaes dos concelhos a que pertencerem as alfandegas.

§ 2.° As juntas geraes dos districtos, ouvidas as camaras interessadas, compete fazer os regulamentos necessarios para regular a cobrança d’este imposto.

§ 3.° Com relação aos generos produzidos nos concelhos, o imposto será calculado e cobrado nos termos dos artigos 123.° e 125.°

SECÇÃO II

Da despeza municipal

Art. 127.° As despezas da camara municipal são obrigatorias ou facultativas: são obrigatorias:

1.° As despezas com os paços do concelho, tribunaes e outras repartições publicas, cujas attribuições ou jurisdicção são circumscriptas pela area do municipio;

2.° Os ordenados e vencimentos dos empregados, e em geral as despezas com o serviço municipal;

3.° A assignatura da folha official do governo;

4.° A despeza do recenseamento da população;

5.° A despeza dos registos que estiverem a cargo do municipio;

6.° A despeza da policia e segurança publica do concelho;

7.° A retribuição dos partidos municipaes a dos funccionarios e empregados administrativos e o pagamento das despezas do serviço administrativo:

8.° As despezas com a instrucção primaria, com os hospicios de creanças abandonadas e com quaesquer outros estabelecimentos de beneficencia a cargo do municipio, tudo na conformidade das leis respectivas;

9.° Os vencimentos de aposentação dos funccionarios da camara e da administração do concelho, que forem pagos pelo cofre do municipio nos termos d’este codigo;

10.° As despezas de reparação e conservação de propriedades municipaes;

11.° As despezas com o alineamento das das e praças;

12.° As despezas com a illuminação das povoações do concelho, quando essa despeza tiver sido incluida, durante tres annos successivos, nos orçamentos legalmente approvados;

13.° As despezas do serviço da extincção de incendios;

14.° As despezas da construcção, conservação e reparação das estradas municipaes, nos termos das leis respectivas;

15.° As despezas com livros, papel, urnas, cofres, e com quaesquer outros objectos relativos ao expediente do recenseamento e ao das eleições;

16.° As despezas com os livros e expediente do registo civil;

17.° O pagamento de dividas exigiveis;

18.° As despezas para a construcção e conservação dos cemiterios municipaes;

19.° As quotas arbitradas pela junta geral para a despeza do districto;

20.° Os impostos a que estiverem sujeitas as propriedades e rendimentos municipaes;

21.° As despezas feitas com os litigios da camara;

22.° As despezas feitas com os diversos estabelecimentos administrados pela camara e a cargo d’ella;

23.° As despezas que resultarem de contratos devidamente auctorisados;

24.° As despezas com a aposentadoria e residencia dos juizes, agentes do ministerio publico e officiaes de justiça que os acompanharem, por occasião de qualquer diligencia de serviço publico;

25.° Ás despezas do custeamento e expediente da administração do concelho, quando os seus emolumentos não forem sufficientes;

26.° As despezas com a casa e mobilia para a secretaria da administração do concelho, quando nos paços d’elle não houver accommodação conveniente;

27.° As despezas com as prisões, nos termos das leis respectivas;

E em geral todas as outras despezas que estiverem a cargo da camara por disposição ou auctorisação de lei.

Art. 128.° São facultativas todas as despezas não enumeradas no artigo antecedente, que forem de utilidade para o concelho e consequentes do exercicio e attribuições legaes da camara municipal.

SECÇÃO III

Do orçamento municipal

Art. 129.° É applicavel aos orçamentos municipaes o que fica disposto nos artigos 62.°, 63.°, 64.° e 68.°

Art. 130.° O orçamento ordinario será proposto á camara pelo presidente, discutido e approvado pelos vereadores, exposto ao publico por dez dias e remettido á junta geral do districto até ao 1.° de novembro de cada anno.

Art. 131.° A junta geral do districto póde rejeitar ou reduzir as despezas propostas nos orçamentos, mas não póde introduzir verbas de despeza nem augmentar as propostas, senão quando essas despezas forem obrigatorias.

Art. 132.° Quando, em virtude do artigo antecedente,

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o orçamento municipal for alterado, e a sua receita ficar insuficiente para occorrer ás despezas obrigatorias, será o orçamento devolvido á camara, para que vote a receita necessaria.

Art. 133.° Se a camara não votar a receita precisa, no praso que lhe for marcado pela junta geral, cumpre a esta supprir a omissão da camara, podendo tambem reduzir a despeza, se assim lhe parecer mais conveniente para equilibrar o orçamento.

SECÇÃO IV

Da contabilidade municipal

Art. 134.° É applicavel á contabilidade municipal o que fica disposto nos artigos 69.°, 70.° e 73.°

Art. 135.° Ao presidente da camara compete ordenar todos os pagamentos; os mandados serão subscriptos pelo escrivão da camara e deverão especificar:

1.° O exercicio a que pertence a despeza a pagar;

2.° A verba do respectivo orçamento que á auctorisa.

Art. 136.° Recusando o presidente da camara ordenar o pagamento de despezas regularmente auctorisadas e liquidadas, a commissão districtal tem direito de as ordenar.

§ 1.° A ordem da commissão terá os mesmos effeitos que teria o mandado do presidente, e o thesoureiro do concelho é obrigado a satisfazel-a, sob sua responsabilidade pelos seus bens e pelo seu fiador.

§ 2.° A ordem da commissão terá força executiva.

Art. 137.° O presidente da camara não deve, sob sua responsabilidade, ordenar o pagamento de nenhuma despeza sem que lhe sejam presentes os documentos que a comprovem.

Art. 138.° Dentro do praso de sessenta dias, depois de findo o exercicio, apresentará o presidente á camara a conta do mesmo exercicio, descrevendo em columnas separadas a receita cobrada e a despeza feita, com a mesma numeração e dizeres que cada verba tiver no orçamento.

Art. 139.° A conta deve especificar, pelo que diz respeito á receita:

1.° A natureza dos rendimentos;

2.° A importancia em que no orçamento foram calculados;

3.° A somma cobrada durante o respectivo anno;

4.° A somma não cobrada que fica como divida activa.

E pelo que diz respeito á despeza:

l.° A natureza das despezas;

2.° A importancia das verbas votadas;

3.° A importancia dos pagamentos ordenados e pagos durante o exercicio;

4.° As sommas em divida;

5.° Os saldos que devem passar para a gerencia seguinte.

Art. 140.° A conta mencionada nos dois artigos antecedentes deve ser acompanhada dos documentos e explicações necessarias.

Art. 141.° A camara deliberará sobre a conta apresentada pelo presidente, e organisará a da gerencia municipal durante o exercicio.

§ 1.° O presidente deixará a presidencia nas sessões em que der conta da sua gerencia;

§ 2.° O presidente póde assistir ás ditas sessões, para prestar esclarecimentos, mas não estará presente no acto da votação.

Art. 142.° As contas da camara, organisadas tambem nos termos do artigo 138.°, serão apresentadas no governo civil do districto dentro do praso de tres mezes depois de findo o exercicio.

§ unico. Estas contas serão julgadas pelo conselho de districto ou pelo tribunal de contas, conforme a legislação em vigor.

Art. 143.° As contas municipaes estarão patentes durante dez dias na casa da camara, o que o presidente fará constar por meio de editaes.

Art. 144.° Todos os eleitores e proprietarios do concelho

são partes legitimas para reclamar e recorrer perante os tribunaes competentes a respeito das contas municipaes.

Art. 145.° Todos os vereadores, pelo facto de juramento e posse, assumem a responsabilidade solidaria pela gerencia dos dinheiros e fazenda do municipio.

§ unico. Os vereadores que não tomarem parte, nos termos d’este codigo, nas deliberações ou actos de que resultar a responsabilidade imposta no julgamento das contas, ou que, tendo tomado parte n’ellas, as assignarem vencidos, ou protestarem contra as mesmas deliberações em acto continuo, serão proporcionalmente relevados da responsabilidade solidaria imposta á camara.

CAPITULO IV

Dos empregados da camara

SECÇÃO I

Do escrivão e empregados da secretaria

Art. 146.° A camara municipal tem um escrivão, ao qual incumbe:

1.° Assistir ás sessões da camara, lavrar as actas e fazer todo o serviço de expediente que lhe for ordenado;

2.° Subscrever todos os actos officiaes da camara;

3.° Exercer as funcções de tabellião em todos os actos e contratos em que a camara for outorgante;

4.° Conservar sob sua guarda e responsabilidade, nos paços do concelho, o archivo da camara;

õ.° Responder pela boa ordem e regularidade dos trabalhos da secretaria;

E em geral exercer as mais funcções de que for encarregado pela camara ou pelo presidente.

Art. 147.° O escrivão é nomeado pela camara, precedendo concurso, como for determinado em regulamento do governo.

Art. 148.° O escrivão da camara é substituido nos seus impedimentos temporarios pela pessoa que a camara nomear.

Art. 149.° A camara terá os empregados de secretaria que forem necessarios para o prompto expediente do serviço.

SECÇÃO II

Do thesoureiro do concelho

Art. 150.° A camara municipal nomeia livremente o seu thesoureiro nos mesmos termos e com a mesma responsabilidade com que o faz a junta geral a respeito do thesoureiro do districto.

§. unico. É applicavel ás camaras municipaes e seu thesoureiro o que se dispõe a respeito da junta geral e thesoureiro do districto nos artigos 74.° a 79.°

SECÇÃO III

Dos outros empregados municipaes

Art. 151.° Alem dos empregados mencionados n’este capitulo a camara terá. os mais empregados que forem necessarios para o serviço do concelho; ou que as leis e regulamentos determinarem.

Art. 102.° Os facultativos, pharmaceuticos, parteiras e veterinarios providos nos partidos municipaes não podem ser suspensos nem demittidos, nem se lhes póde alterar os vencimentos e condições dos partidos, sem que sejam previamente ouvidos, e sem que preceda approvação da junta geral do districto.

Art. 153.° Os partidos de que trata o precedente artigo só poderão ser providos por meio de concurso annunciado na folha official do governo.

Art. 154.° É da competencia da camara conceder licença aos seus empregados.

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TITULO VII

Das juntas de parochia

CAPITULO I

Disposições especiaes sobre organisação e reuniões

Art. 105.° A junta de parochia compõe se de cinco membros eleitos pela parochia ou parochias aggregadas.

§ unico. O presidente será escolhido pela junta, de entre os membros que a compõem, nos termos do artigo 13.° d’esta lei.

Art. 156.° A posse dos vogaes da junta de parochia é applicavel o disposto no artigo 99.°

Art. 157.° A junta de parochia tem uma sessão ordinaria de quinze em quinze dias, e as extraordinarias que o bem do serviço exigir.

Art. 158.° As juntas de parochia poderão reunir-se na sacristia da igreja parochial ou em qualquer casa de despacho, mas nunca na igreja.

§ unico. As duvidas que a este respeito se moverem serão resolvidas pelo administrador do concelho.

Art. 159.° O regedor de parochia assiste com voto consultivo ás sessões da junta, e toma assento ao lado esquerdo junto ao presidente.

CAPITULO II

Attribuições

Art. 160.° A junta de parochia pertence:

1.° A administração da fabrica da igreja;

2.° A administração dos bens e interesses da parochia;

3.° O desempenho de todos os actos que na qualidade de commissão de beneficencia lhe forem incumbidos.

§ unico. Não são sujeitos á administração da junta de parochia as fabricas:

1.° Das cathedraes;

2.° Das igrejas em que as collegiadas ou irmandades forem ou se prestem a ser fabriqueiras;

3.° Dos templos que, por serem monumentos do arte ou de gloria nacional, estão a cargo do estado;

4.° Dos templos que, sendo parochiaes, são tambem destinados a outros usos religiosos.

Art. 161.° Como encarregada da fabrica, compete á junta:

!. A administração de todos os bens e rendimentos da fabrica;

2.° A administração dos bens e rendimentos doados á freguezia com applicação geral ou especial para despezas do culto ou para obras pias;

3.° A administração dos bens e rendimento das ermidas ou capellas dependentes da igreja parochial e das irmandades illegalmente erectas.

Art. 162.° São exceptuados da administração da junta de parochia:

1.° Os bens e rendimentos das irmandades e confrarias legitimamente erectas;

2.° Os bens e rendimentos de qualquer ermida pertencente a algum particular, ou aos vizinhos ou moradores de algum logar da parochia;

3.° Os bens e rendimentos dos hospitaes e albergarias:

4.° Os passaes e casas de residencia dos parochos ou de quaesquer outros empregados no serviço do culto;

5.° Os rendimentos, benesses e quaesquer emolumentos applicados á sustentação dos parochos.

Art. 163.° Como administradora dos bens de parochia pertence á junta:

1.° Administrar os bens communs da parochia;

2.° Regular, nos termos das leis, o modo de fruição dos bens, pastos e quaesquer fructos do logradouro commum Q exclusivo dos moradores da parochia.

Art. 104.° O modo de fruição dos logradouros que pertencerem em commum a mais de uma parochia ou a moradores de alguns logares de diversas parochias, será regulado, quando haja desaccordo entre as respectivas juntas, pela camara municipal se as ditas parochias pertencerem ao mesmo concelho, e pela junta geral de districto, ouvidas as respectivas camaras, se as parochias ou logares pertencerem a concelhos differentes.

Art. 1G5.° Como commissão de beneficencia, incumbe á junta de parochia, conjunctamente com o regedor, era conformidade com as leis e regulamentos:

1L.° Promover a extincção da mendicidade;

2." Arrolar os que carecem de ser soccorridos pela beneficencia publica;

3.° Promover e solicitar os soccorros do que carecerem;

4.° Fiscalisar a creação dos expostos, informando a auctoridade competente dos abusos que notar;

E em geral praticar todos os actos de beneficencia e de piedade, que lhe forem incumbidos por lei ou por ordem das auctoridades superiores.

Art. 166.° É da obrigação da junta de parochia:

1.° Inventariar todos os bens e rendimentos pertencentes á parochia e á fabrica da igreja quando a junta for fabriqueira;

2.° Inventariar separadamente os paramentos, vasos sagrados, alfaias e quaesquer utensilios pertencentes á fabrica da igreja.

§ 1.° Nos inventarios se fará menção das escripturas, sentenças, titulos ou quaesquer documentos que digam respeito aos objectos inventariados.

§ 2.° Os inventarios serão escriptos em um livro especial.

§ 3.° Os inventarios serão revistos e conferidos logo depois de installada a nova junta, e das alterações que n’elles se notarem se lavrará auto no livro.

§ 4.° O regedor de parochia assisto á feitura o á revisão dos inventarios.

§ 5.° Tanto os inventarios como o auto da revisão serão assignados pelos vogaes da junta, pelo regedor, pelo thesoureiro e pelo escrivão.

§ 6.° Uma copia authentica de ambos os inventarios e do auto da revisão será enviada ao governador civil por via do administrador do concelho.

Art. 167.° Ajunta da parochia tambem delibera:

1.° Sobre contrahir emprestimos e estabelecer-lhes hypothecas;

2.° Sobre fazer contratos para se effectuarem obras do interesse da parochia;

3.° Sobro a acquisição, alienação e troca das propriedades da parochia;

4.° Sobre a acceitação de donativos, doações, heranças e legados feitos á parochia;

5.° Sobre a conveniencia de intentar ou defender algum pleito para interesse da parochia e transigir sobre elles;

6.° Sobre a conveniencia de ser declarada de utilidade publica a expropriação de predios necessarios para o serviço da parochia;

7.° Sobre o lançamento de contribuições directas parochiaes;

8.° Sobre a nomeação dos empregados parochiaes;

9.° Sobre o estabelecimento de cemiterios parochiaes, na conformidade dos respectivos regulamentos;

10.° Sobre a construcção, conservação e reparação dos caminhos vicinaes do uso exclusivo da parochia.

Art. 168.° Todas as deliberações das juntas de parochia são executorias independentemente da approvação superior.

§ unico. Exceptuam-se as de que tratam os n.ºs 1.°, 3.°, 5.° e 7.c do artigo antecedente, as quaes carecem da approvação da junta geral do districto.

Art. 169.° É applicavel ás deliberações das juntas de

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parochia, com as modificações necessarias, o que em relação ás das camaras municipaes se dispõem nos artigos 106.°, 107.°, 108.° e 109,°

CAPITULO III

Da receita e despeza

Art. 170.° As receitas da parochia são ordinarias ou extraordinarias.

As receitas ordinarias compõem-se:

1.° Do rendimento dos bens proprios da parochia que não são do logradouro commum dos vizinhos;

2.° Do rendimento dos .bens que estão applicados para a fabrica;

3.° Do producto dos direitos que a fabrica por lei ou estylo estiver auctorisada a levar nos baptismos, casamentos e óbitos;

4.° Do producto das multas impostas por lei ou postura a beneficio da parochia;

5.° Do rendimento dos celleiros communs parochiaes;

6.° Do producto das contribuições directas parochiaes;

E em geral do producto de toda a receita permanente que a junta esteja auctorisada a receber em virtude de alguma disposição ou auctorisação de lei.

Art. 171.° As receitas extraordinarias compõem-se:

1.° Do producto da alienação de bens parochiaes devidamente auctorisada;

2.° Do producto de donativos, doações, heranças, legados e esmolas;

3.° Do producto de emprestimos devidamente auctorisados;

4.° Do rendimento proveniente dos cemiterios parochiaes;

5.° Do producto de qualquer outra receita accidental.

Art. 172.° As contribuições parochiaes consistem em uma percentagem sobre as contribuições geraes, predial, pessoal e industrial.

§ 1.° A quota lançada sobre os rendimentos isentos de alguma d’estas contribuições será proporcionada á quota dos que lhes estão sujeitos.

§ 2.° As irmandades e confrarias que não estiverem sujeitas a algumas d’aquellas contribuições serão collectadas na proporção dos seus rendimentos.

Art. 173.° As despezas parochiaes são obrigatorias ou facultativas.

São obrigatorias:

1.° As despezas da conservação e reparo da igreja parochial e suas dependencias;

2.° As despezas com a residencia parochial, exceptuadas as das reparações ordinarias que incumbem ao parocho como usufructuario, nos termos do artigo 2228.° do codigo civil;

3.° As despezas do culto em paramentos, vasos sagrados, alfaias o guisamentos;

4.° Os vencimentos do escrivão do regedor e dos empregados parochiaes;

5.° As despezas da secretaria da junta;

6.° As despezas com a cobrança dos rendimentos parochiaes;

7.° Os impostos a que estiverem sujeitas as propriedades e rendimentos parochiaes;

8.° O pagamento das dividas exigiveis;

9.° O cumprimento dos legados a que estiverem sujeitas as propriedades e rendimentos da parochia;

10.° As despezas feitas com os litigios em que ajunta for parte;

11.° As despezas com a construcção e conservação dos cemiterios parochiaes;

12.° As despezas com a compra dos livros necessarios para o registo parochial;

E em geral todas as outras despezas que estiverem a cargo da junta de parochia por disposição das leis;

Art. 174.° São facultativas todas as outras despezas de utilidade para a parochia, alem das mencionadas no artigo antecedente e que forem consequentes das attribuições legaes da junta.

CAPITULO IV

Do orçamento e contas

Art. 175.° Os orçamentos das juntas de parochia são approvados pela junta geral do districto.

Art. 176.° Com relação aos orçamentos e contabilidade das juntas de parochia se observará, em tudo quanto for applicavel, o que n’este codigo se dispõe sobre os orçamentos e contas municipaes.

CAPITULO V

Dos empregados da junta de parochia

Art. 177.° A junta de parochia tem um escrivão, que poderá ser o do respectivo regedor.

Art. 178.° A junta tem um thesoureiro, que nomeará dentre os seus vogaes ou de fóra d’elles.

§ 1.° Nas parochias em que houver thesoureiro ecclesiastico pertence a este a guarda dos vasos sagrados, ornamentos, alfaias, roupas e quaesquer utensilios da fabrica, o que tudo lhe será entregue pela junta, lavrando-se auto.

§ 2.° Nas parochias em que não houver thesoureiro ecclesiastico serão os referidos objectos confiados, pelo mesmo modo, á guarda do parocho.

Art. 179.° A junta de parochia terá os demais empregados que forem precisos para o desempenho dos serviços parochiaes.

TITULO VIII

Dos magistrados e empregados administrativos

CAPITULO I

Do governador civil e dos empregados da secretaria do governo civil

SECÇÃO I

Do governador civil

Art. 180.° O governador civil é da livre nomeação do governo, o presta juramento nas mãos do ministro e secretario d’estado dos negocios do reino.

Art. 181.° O governador civil é obrigado a residir na capital do districto.

Art. 182.° O governador civil tem substituto nomeado pelo governo.

§ unico. Nas faltas e impedimentos simultaneos do governador civil e do substituto, servem interinamente os vogaes do conselho de, districto pela ordem da nomeação.

Art. 183.° Como delegado e representante do governo, compete ao governador civil:

1.° Mandar proceder ás eleições de todos os corpos e auctoridades electivas, nos dias para esse fim designados pelas leis;

2.° Abrir e encerrar as sessões da junta geral do districto;

3.° Fixar o numero dos amanuenses e officiaes de diligencias das administrações dos concelhos, precedendo audiencia da camara municipal;

4.° Transmittir as leis, regulamentos e ordens superiores ás auctoridades subalternas, dando-lhes as instrucções convenientes para a sua execução;

5.° Exercer inspecção geral e superior sobre a execução de todas as leis e regulamentos de administração;

6.° Mandar organisar a estatistica e cadastro do districto;

7.° Mandar processar as folhas dos ordenados e outros vencimentos dos empregados, nos termos dos regulamentos;

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8.° Nomear para todos os empregos de administração para que a lei lhe dá competencia, ou que não têem por lei modo especial de nomeação;

9.° Dar ou mandar dar posse a todos os empregados que estão debaixo da sua direcção, e suspendel-os do exercicio e vencimento, dando immediatamente conta ao governo;

10.° Demittir os empregados de sua nomeação;

11.° Conceder licença aos empregados seus subordinados;

12.° Tomar ou mandar tomar por seus delegados o juramento aos funccionarios publicos;

13.° Exercer, a respeito dos bens e rendimentos da fazenda publica, as diversas funcções que lhe incumbem as leis e regulamentos fiscaes;

14.° Approvar, ouvido o conselho de districto, os estatutos das associações e institutos de recreio, instrucção publica, piedade e beneficencia;

15.° Superintender os estabelecimentos de instrucção primaria e secundaria, nos termos das leis respectivas, dando annualmente conta ao governo;

16.° Examinar, sempre que o julgar necessario, o estado dos cofres, quer publicos, quer das corporações G estabelecimentos publicos, e verificar a sua escripturação;

17.° Vigiar no exercicio da auctoridade ecclesiastica, dando conta dos abusos que notar;

18.° Superintender em todos os magistrados, funccionarios e corpos administrativos do districto, e em todos os objectos da competencia d’elles.

Art. 184.° No que respeita á policia do districto compete ao governador civil:

1.° Dar, executar e fazer executar todas as providencias necessarias para manter a ordem e segurança publica, auxiliando-se para esse fim da força que tiver á sua disposição, ou requisitando a que for necessaria;

2.° Conceder licença, ouvido o conselho de districto, aos estabelecimentos insalubres, incommodos ou perigosos, nos termos dos regulamentos;

3.° Exercer a fiscalisação necessaria sobre os estrangeiros residentes no seu districto;

4.° Conceder passaportes, nos termos dos regulamentos;

5.° Promover a sustentação dos presos e melhoramento das cadeias;

6.° Regular, com approvação do governo, a policia das mulheres prostitutas;

7.° Conceder licenças para theatros e espectaculos publicos, na capital do districto;

8.° Dirigir o serviço sanitario do districto;

9.° Conceder licenças para as casas de emprestimos sobre penhores, não se comprehendendo na disposição d’este numero os bancos., monte pios, montes de piedade e sociedades de soccorros mutuos e outros estabelecimentos, cujos estatutos são approvados pelo governo;

10.° Tomar providencias policiaes sobre as loterias e rifas auctorisadas, casas publicas de jogo, hospedarias, estalagens e similhantes;

11.° Tomar providencias policiaes sobre mendigos, vadios e vagabundos;

12.° Tomar providencias policiaes sobre musicos ambulantes, pregões nos logares publicos, toques de sinos, fogueiras e fogos de artificio;

13.° Tomar providencias policiaes ácerca dos estabelecimentos onde se inculcam quaesquer serviços;

E em geral executar e fazer executar todas as leis e regulamentos de policia.

Art. 180.° O governador civil, ouvido o conselho de districtos, póde fazer regulamentos de execução permanente sobre os assumptos de que trata o artigo antecedente, em tudo quanto não estiver regulado por lei ou pelos regulamentos geraes de administração publica.

Art. 186.° Ao governador civil compete a tutela da administração das confrarias, irmandades, e institutos de piedade ou de beneficencia, e no exercicio d’estas funcções pertence-lhe, precedendo consulta do conselho de districto:

1.° Regular a sua administração, em harmonia com os fins dos respectivos estatutos;

2.° Approvar os seus orçamentos;

3.° Dissolver as mesas ou administrações, nomeando commissões que administrem provisoriamente até á epocha da eleição ordinaria, quando não julgue conveniente antecipar a eleição.

§ unico. Não são comprehendidos n’este artigo os monte pios nem quaesquer outras associações exclusivamente de soccorros mutuos, as quaes todavia ficam sujeitas á vigilancia e inspecção do governo civil, que dará parte ao governo dos abusos que notar.

Art. 187.° O governador civil é obrigado a visitar annualmente o districto, provendo ás necessidades publicas quanto couber em suas attribuições, e dando conta ao governo do estado d’elle e dos melhoramentos de que é susceptivel.

Art. 188.° Nos casos omissos e urgentes o governador civil é auctorisado a dar as providencias que as circumstancias exigirem, dando immediatamente conta ao governo.

Art. 189.° As resoluções tomadas pelo governador civil podem, em todos os casos e a todo o tempo, ser revogadas pelo governo.

§ unico. Das resoluções tomadas pelo governador civil ha recurso para o supremo tribunal administrativo nos casos de incompetencia, excesso de poder, violação de lei e offensa de direitos.

SECÇÃO II

Dos empregados do governo civil

Art. 190.° Em cada governo civil ha um secretario geral nomeado por decreto do governo, precedendo concurso como for determinado em regulamento.

Art. 191.° Para ser nomeado secretario geral do governo civil é necessario ser formado em direito, e haver servido, pelo menos, dois annos os cargos de administrador de concelho, de official ou amanuense da secretaria distado dos negocios do reino, ou de official das secretarias dos governos civis.

Art. 192.° Compete ao secretario geral:

1.° Dirigir, sob as ordens do governador civil, o expediente e trabalhos da secretaria, podendo corresponder-se com todos os funccionarios e repartições subordinadas ao governador civil;

2.° Exercer as funcções do ministerio publico junto do conselho do districto, e de quaesquer tribunaes e estações administrativas, cuja jurisdicção comprehenda a area da circumscripção districtal, podendo assistir ás sessões, reclamar e recorrer para os tribunaes competentes, sempre que o exigir o interesse publico e o bem do estado.

Art. 193.° Os quadros das secretarias dos governos civis são fixados por lei.

Art. 194.° Os empregados das secretarias dos governos civis são nomeados pelo governo, em concurso documental.

§ 1.° Para estes logares têem preferencia os que tiverem serviços de administrador do concelho.

§ 2.° Para os logares de official têem preferencia, em igualdade de circumstancias, os amanuenses das mesmas secretarias.

§ 3.° O governador civil nomeia o porteiro, continuos e os outros empregados menores da secretaria e os que devem fazer as vezes dos que faltarem ou estiverem impedidos.

Art. 195.° O governador civil nomeia interinamente de entre os empregados da secretaria os que devem fazer as vezes dos que faltarem ou estiverem impedidos,

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CAPITULO II

Do administrador do concelho e empregados da administração

SECÇÃO I

Do administrador do concelho

Art. 196.° O administrador do concelho é nomeado por decreto, sobre proposta do governador civil, e presta juramento nas mãos d’este magistrado.

Artigo 197.° Para ser administrador do concelho é necessario ter um curso de instrucção superior.

§ unico. Na falta de pessoas habilitadas nos termos d’este artigo, póde a nomeação recair em individuo que tenha um curso de instrucção secundaria.

Art, 198.° O administrador do concelho vence, ordenado pago pela camara municipal, e perceberá os emolumentos que por lei lhe competirem.

Art. 199.° O administrador do concelho póde ser suspenso pelo governador civil, mas não póde ser demittido senão por decreto.

Art. 200.° O administrador do concelho terá um substituto, que fará as suas vezes nos casos de ausencia, falta ou impedimento.

§ unico. São applicaveis aos substitutos as disposições dos artigos 196.° e 199.°

Art. 201.° No caso de ausencia ou impedimento do administrador do concelho e do seu substituto, e emquanto o governador civil não nomear quem interinamente o substitua, faz as suas vezes o presidente da camara.

§ unico. O presidente, emquanto substituo o administrador, não póde exercer funcções de vereador.

Art. 202.° O administrador de concelho é encarregado, sob a auctoridade e inspecção do governador civil, da execução immediata das leis e regulamentos da administração publica.

Art. 203.° Ao administrador do concelho compete:

1.° Vigiar pela execução de todos os serviços e de todas as leis e regulamentos de administração publica, que são desempenhados e executados na area da circumscripção do concelho;

2.° Superientender a, administração das irmandades, misericordias, confrarias, hospitaes e quaesquer outros institutos de piedade e de beneficencia, dando conta ao governador civil de todas as irregularidades que encontrar, e das providencias que convier adoptar para melhorar os ditos estabelecimentos;

3.° Superintender, nos termos das leis especiaes, as escolas e estabelecimentos de instrucção e educação;

4.° Fiscalisar o modo por que são cumpridos os regulamentos ácerca, da administração dos expostos.

Art. 204.° É da competencia do administrador do concelho como auctoridade policial:

1.° A execução das leis e regulamentos de policia geral;

2.° A concessão de bilhetes de residencia;

3.° A vigilancia pela segurança das cadeias e sustentação dos presos;

4.° A concessão de licenças policiaes que por disposição legal não competir a outra auctoridade;

5.° A policia relativa ás casas publicas de jogo, hospedarias, estalagens e similhantes;

6.° A concessão de licença para uso e porte de armas e a policia respectiva;

7.° A policia relativa ás mulheres prostitutas;

8.° A policia sobre mendigos, vadios e vagabundos;

9.° A policia sanitaria, nos termos dos regulamentos;

10.° A manutenção da boa ordem nos templos e em todas as solemnidades religiosas;

11.° A policia das festas e divertimentos publicos;

12.° A concessão de licenças para theatros e quaesquer espectaculos publicos fóra da capital do districto e a policia; respectiva

13.º As providencias para impedir a divagação de pessoas alienadas e de animaes malfazejos;

14.° A policia rural;

l5.° As providencias necessarias nos casos de incendio, inundações, naufragios e similhantes, e promover a distribuição de soccorros no caso de calamidade publica;

16.° A protecção da liberdade, propriedade e segurança dos habitantes do concelho;

17.° A execução das providencias de segurança publica;

18.° A adopção das medidas de prevenção erepressão contra quaesquer actos contrarios á ordem e tranquillidade publica, requisitando a força armada que julgar necessaria;

19.° As licenças aos estabelecimentos insalubres, incommodos ou perigosos, nos termos dos regulamentos;

20.° A fiscalisação sobre pesos e medidas;

21.° Vigiar pela execução das posturas e regulamentos de policia municipal;

22.° A formação de autos de investigação de todos os crimes que chegarem ao seu conhecimento e remettel-os, com informação sua, ao ministerio publico;

23.° Participar ao ministerio publico as contravenções de que a ver noticia;

24.° Capturar ou mandar capturar os culpados, nos casos em que se não exige à previa formação de culpa, pondo-os immediatamente á disposição do juiz competente;

25.° Prestar auxilio aos empregados fiscaes e de justiça quando lhe requisitarem;

26.° Dar buscas é proceder a apprehensões, guardadas as formalidades prescriptas para estes actos ás auctoridades judiciaes.

Art. 205.° Nos concelhos de Lisboa e Porto a concessão de bilhetes de residencia, licenças para uso e porte de armas, para hospedarias e estalagens, para jogos e similhantes, pertence ao governador civil.

Art. 206.° Compete ao administrador do concelho:,

1.° Abrir e registar testamentos nos termos do codigo civil;

2.° Receber as escusas dos testamenteiros, nos termos do mesmo codigo;

3.° Tomar conta dos legados destinados a alguma fundação ou applicação pia ou de utilidade publica;

4.° Fazer o registo civil.

Art. 207.° E das attribuições do administrador do concelho:

1.° Suspender e demittir, com a approvação do governador civil, os empregados de sua nomeação;

2.° Suspender os outros empregados administrativos, que lhe estiverem subordinados;

3.° Tomar juramento aos empregados do concelho e fazer-lhes dar posse dos respectivos empregos;

4.° Conceder licença aos empregados administrativos seus subordinados;

5.° Delegar nos seus subalternos, com auctorisação do governador civil, algumas das suas attribuições, quando as necessidades do serviço assim o exigirem;

6.° Prestar á camara municipal e ao seu presidente a coadjuvação que lhe for requisitada para execução das deliberações legaes da mesma camara;

7.° Promover o cumprimento de todas as obrigações da camara municipal e das juntas de parochia, dando conta ao governador civil das faltas e abusos que notar, e interpondo os recursos competentes nos casos designados no artigo 35.°

§ unico. Nos concelhos de Lisboa e Porto são competentes para o exercicio da attribuição de que trata o n.° 7.°, com relação ás camaras municipaes, todos os administradores de bairro, dentro da area da sua jurisdicção, ou aquelle que o governador civil designar, quando o acto ou a omissão da camara respeitar a todo o concelho.

Art. 208.° O administrador do concelho exerce na execução dos serviços de interesse geral do estado as funcções

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que lhe estão determinadas nas leis e regulamentos especiaes.

Art. 209.° O administrador do concelho é juiz nos processos de execução administrativa nos termos dos regulamentos respectivos.

Art. 210.° Nos casos omissos e urgentes o administrador do concelho é auctorisado a dar as providencias que as circumstancias exigirem, dando immediatamente conta ao governador civil.

Art. 211.° Tudo quanto fica disposto a respeito dos administradores de concelho é applicavel aos administradores dos bairros de Lisboa e Porto, salvas as disposições especiaes.

Art. 212.° Em Lisboa e Porto os administradores dos bairros não teem as attribuições policiaes que as leis commettem aos corpos de policia civil.

SECÇÃO II

Dos empregados da administração do concelho

Art. 213.° O administrador do concelho tem um escrivão por elle proposto e nomeado pelo governador civil.

Art. 214.° O escrivão da administração do concelho não póde ser demittido senão, depois de ouvido, por erros de officio ou mau procedimento.

§ 1.° Da demissão ha recurso para o governo.

§ 2.° O escrivão da administração póde ser transferido para outro concelho do mesmo districto.

Art. 215.° O escrivão da administração é substituido nos seus impedimentos temporarios pela pessoa que o administrador, sob sua responsabilidade, nomear.

§ unico. Esta nomeação carece da confirmação do governador civil, se o impedimento exceder a trinta dias.

Art. 216.° Haverá os amanuenses necessarios para o prompto expediente do serviço da administração. A nomeação d’elles pertence ao administrador do concelho.

$ unico. O numero de amanuenses é fixado pelo governador civil, sobre proposta do administrador do concelho, e ouvida a camara municipal.

Art. 217.° A administração do concelho terá os officiaes de diligencias necessarios para o seu serviço. A nomeação d’elles pertence ao administrador do concelho.

§ unico. O numero de officiaes de diligencia é fixado pelo governador civil, sobre proposta do administrador do concelho, e ouvida a camara municipal.

Art. 218.° Os officiaes de diligencias do administrador do concelho são tambem competentes para accusar as transgressões das posturas municipaes; mas não podem ser condemnados em custas, ainda que a queixa seja julgada improcedente.

Art. 219.° Os empregados da administração do concelho vencem os ordenados que lhes forem votados nos orçamentos municipaes, e perceberão os emolumentos que por lei lhes competirem.

Art. 220.° Tudo quanto fica disposto a respeito dos escrivães dos administradores de concelho é applicavel aos escrivães dos administradores dos bairros de Lisboa e Porto.

CAPITULO III

Do regedor de parochia e seus empregados

Art. 221.° O regedor de parochia é nomeado por alvará do governador civil, sobre proposta do administrador do concelho, e presta juramento nas mãos d’este magistrado.

Art. 222.° Só póde ser regedor de parochia o eleitor que tiver domicilio na parochia ou parochias annexadas.

Art. 223.° O regedor de parochia não póde ser obrigado a servir por mais de um anno.

Art. 224.° As funcções de regedor são compativeis com as de juiz de paz.

Art. 225.° O regedor de parochia póde ser suspenso pelo administrador do concelho, que dará parte ao governador civil, mas não póde ser demittido senão por alvará do mesmo governador civil.

Art. 226.° O regedor de parochia tem um substituto.

§ unico. São applicaveis ao substituto as disposições dos artigos antecedentes.

Art. 227.° O regedor de parochia não vence ordenado ou gratificação, mas emquanto servir o seu emprego e isento de aboletamentos de tropas em tempo de paz, e de quaesquer contribuições municipaes directas lançadas em serviço das pessoas ou dos bens dos habitantes e proprietarios do concelho. Perceberá alem d’isso os emolumentos que legalmente lhe competirem.

Art. 228.° Incumbe ao regedor de parochia:

1.° Dar parte ao administrador do concelho das deliberações da junta que julgar exorbitantes da sua jurisdicção, ou offensivas das leis ou dos interesses publicos;

2.º Abrir os testamentos, na conformidade do artigo 1933.° § unico do codigo civil;

3.º Executar as ordens do administrador do concelho;

4.° Prover á limpeza das ruas e desobstrucção das estradas concelhias e caminhos vicinaes nos limites da respectiva parochia;

5.° Dar parte circumstanciada ao administrador do concelho, de quaesquer crimes ou delictos commettidos na parochia;

6.° Exercer quaesquer outras funcções administrativas que por delegação do administrador do concelho lhe forem commettidas, salva sempre a ratificação do administrador;

7.° Superintender na policia dos cemiterios parochiaes, e exercer as funcções de policia sanitaria, que lhe forem commettidas nas leis e regulamentos;

8.° Praticar quaesquer outros actos que por lei ou regulamentos lhe forem encarregados.

Art. 229.° O regedor de parochia tem um escrivão por elle nomeado, e confirmado pelo administrador do concelho.

Art. 230.° O regedor de parochia é coadjuvado no exercicio das suas funcções por cabos de policia.

§ 1.° A nomeação dos cabos de policia é feita pelo administrador, sobre proposta annual do regedor de parochia.

§ 2.° O regedor indicará ao administrador do concelho o numero dos cabos de policia de que carecer, e as secções da parochia que devem ser designadas a cada um d’elles.

§ 3.° Os cabos de policia são subordinados ao regedor da parochia, e receberão d’elle as instrucções do serviço que lhes cumpre desempenhar.

§ 4.° Os cabos de policia não são obrigados a servir por mais de um anno, nem fóra da povoação em que residirem, salvo se for para logar pertencente á sua freguezia.

§ 5.° Os cabos de policia podem ser suspensos pelo regedor de parochia, que dará immediatamente conta ao administrador do concelho, mas só podem ser demittidos por este magistrado.

CAPITULO IX

Dos conselhos de districto

CAPITULO I

Organisação e reuniões

Art. 231.° O conselho de districto é composto do governador civil, presidente, e de quatro vogaes nomeados pelo governo sobre lista triplice proposta pela junta geral.

Art. 232.° Dois, pelo menos, dos vogaes do conselho de districto, serão bachareis formados em direito.

Art. 233.° Haverá quatro substitutos nomeados pela mesma forma que os vogaes effectivos.

Art. 234.° Os vogaes do conselho de districto vencem, de gratificação annual 240$000 réis, pagos pelo cofre do districto.

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§ unico. Os substitutos vencem a gratificação correspondente ao tempo por que servirem.

Art. 235.° Os vogaes do conselho de districto servem por quatro annos; findos os quaes podem ser reconduzidos.

Art. 236.° O conselho de districto póde ser dissolvido pelo governo.

Art. 237.° O cargo de vogal do conselho de districto é incompativel com qualquer outro cargo administrativo de eleição ou nomeação.

Art. 238.° Junto do conselho de districto exercerá as funcções de ministerio publico o secretario geral do governo civil.

Art. 239.° O secretario do conselho de districto é o official da secretaria que o governador civil designar.

Art. 240.° O conselho terá uma sessão ordinaria por semana e as extraordinarias que o serviço publico exigir.

CAPITULO II

Competencia e attribuições

Art. 241.° As attribuições do conselho de districto são consultivas e contenciosas.

Art. 242.° Como corpo consultivo incumbe ao conselho de districto emittir o seu parecer em todos os assumptos sobre que as leis exigem o seu voto, ou em que for consultado pelo governador civil.

Art. 243.° Como tribunal de contencioso administrativo compete ao conselho de districto conhecer e julgar em primeira instancia:

1.° As reclamações contra as posturas, regulamentos e deliberações das camaras municipaes e juntas de parochia;

2.° As reclamações relativas ás eleições das diversas auctoridades, dos corpos administrativos, confrarias e administrações de estabelecimentos pios e de beneficencia, salvo o disposto n’este codigo a respeito das eleições dos procuradores á junta geral;

3.° As reclamações, em materia de contribuições directas do estado, nos termos das leis especiaes;

4.° As reclamações sobre o lançamento, repartição e cobrança das contribuições municipaes;

5.° As questões que sobre o sentido e execução das clausulas dos contratos se suscitarem entre a administração do districto, municipio ou parochia, e os emprehendedores e arrematantes de quaesquer rendas, obras ou fornecimentos publicos;

6.° O contencioso da administração de todos os estabelecimentos de piedade e beneficencia;

7.° As reclamações para escusa dos cargos districtaes, municipaes os parochiaes;

8.° As reclamações sobre questões de servidões, distribuição de aguas e usufructo de terrenos baldios ou arvoredos e pastos de logradouro commum dos vizinhos do concelho, que tiverem por fim a utilidade geral e por fundamento algum acto da auctoridade publica, ou em que esta seja parte, salvo quando se tratar da verificação e liquidação de indemnisações;

9.° As contas das camaras municipaes. juntas de parochia, irmandades, confrarias, hospitaes, e quaesquer outros estabelecimentos de piedade ou beneficencia, cujo rendimento annual, calculado pela media da receita ordinaria cobrada nos ultimos tres annos, for inferior á alçada do tribunal de contas;

10.° Finalmente todas as questões que tiverem por causa a offensa de direitos fundados nas leis e regulamentos de administração publica, ou a mera violação d’essas leis o regulamentos.

CAPITULO III

Forma do processo e decisões

Art. 244.° Aos membros do conselho de districto, como tribunal do contencioso administrativo, podem ser oppostas as mesmas suspeições que são applicaveis aos juizes dos tribunaes civis.

Art. 24õ.° Ao julgamento das suspeições são applicaveis as regras estabelecidas no livro 3.°, titulo 4.°, capitulo 1.° do codigo do processo civil.

Art. 246.° Quando for julgada procedente a suspeição com relação a tantos membros do conselho de districto, effectivos e substitutos, que este não possa julgar a causa principal, será competente para a julgar o conselho de districto cuja sedo for mais proxima.

Art. 247.º A suspeição e considerada como impedimento para os effeitos das substituições.

Art. 248.° As partes que contenderem perante o conselho de districto podem fazer-se representar por advogados nos processos e nas sessões de julgamento.

Art. 249.° São permittidas as allegações oraes nas sessões de julgamento.

Art. 250.° As decisões do conselho de districto serão tomadas em conferencia secreta, escriptas e, publicadas até á sessão immediata.

Art. 251.° O conselho de districto não póde recusar-se a julgar nenhuma causa da sua competencia, com o fundamento da falta da lei applicavel, ou de obscuridade ou omissão d’ella.

Art. 252.° As questões sobre titulos de propriedade ou de posse pertencem exclusivamente aos tribunaes de justiça.

Art. 253.° O conselho do districto não póde proferir accordão definitivo sobre nenhum negocio contencioso sem que tenha precedido audiencia contradictoria das partes interessadas..

Art. 254.° Quando se reclame contra o acto ou deliberação de qualquer auctoridade ou corpo administrativo, cuja execução possa trazer damno irreparavel ou de difficil reparação, poderá o conselho de districto, quando o reclamente assim o requeira, mandar por uma decisão interlocutoria sobre estar na execução do acto ou deliberação contra que se reclamar.

Art. 205.° Nos casos em que a instrucção dos negocios contenciosos póde ser esclarecida por informação das auctoridades locaes ou por exame de peritos, o conselho do districto ordenará estas diligencias.

§ unico. Os peritos empregados nestas diligencias vencerão por ellas os emolumentos que lhes competirem, como se fossem feitas por mandado da auctoridade judicial.

Art. 256.° Os accordãos dos conselhos de districto em materia contenciosa devem conter: o objecto da contestação, os nomes e qualidades das partes, o extracto das suas allegações e os fundamentos da decisão.

Art. 207.° As decisões do conselho de districto serão intimadas ás partes pelos agentes da administração.

Art. 258.° As decisões definitivas do conselho de districto em assumptos contenciosos têem força do sentença com execução apparelhada.

Art. 259.° De todas as decisões definitivas do conselho de districto ha recurso para o supremo tribunal administrativo.

§ 1.° O recurso será interposto para o tribunal de contas, quando os decisões do conselho forem proferidas sobre as contas da competencia do mesmo conselho.

Art. 260.° De todas as decisões proferidas pelo conselho de districto contra o estado recorrerá sempre o ministerio publico, nos termos do artigo antecedente.

Art. 261.° Nos processos instaurados perante os conselhos de districto é admissivel todo o genero de provas reconhecido no direito civil.

Art. 262.° Os recursos para o tribunal superior serão interpostos nos proprios autos, perante o conselho de districto, no praso de 15 dias, contados da intimação.

§ 1.° É livre ás partes instruir os recursos, até final, perante o conselho de districto, ou reservar a defeza para depois dos autos subirem ao tribunal superior.

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§ 2.° Os processos serão remettidos pelo governador civil, devidamente informados pelo tribunal recorrido.

§ 3.° Os interessados podem protestar perante o tribunal superior contra as demoras que houver na decisão das reclamações contenciosas, na instrucção ou na remessa dos processos, com tanto que se prove haver expirado o praso assignado para o julgamento para a instrucção ou para a remessa: no primeiro caso, considera-se indeferida a reclamação e tem logar a instrucção immediata do recurso; no segundo e terceiro caso, o tribunal superior ordenará que os autos subam immediatamente.

Art. 263.° Um regulamento do governo estabelecerá, em conformidade com o que acima fica disposto, o modo pelo qual as partes devem deduzir, justificar e seguir as suas reclamações e recursos: o processo das informações e diligencias, com audiencia de terceiros interessados? havendo-os as prasos que teem de ser assignados a cada um d’estes octos, e ao julgamento das reclamações; e a fórma das decisões, notificação e execução d’ellas.

TITULO X

Das eleições dos corpos administrativos

CAPITULO I

Disposições geraes

Art. 264.° Os corpos administrativos districtaes, municipaes e parochiaes são eleitos directamente pelos cidadãos portuguezes que têem direito de votar.

Art. 265.° As eleições são feitas nas epochas determinadas no artigo 9.°, devendo ser no primeiro domingo do mez de novembro as districtaes e municipaes, e no terceiro domingo as parochiaes.

§ 1.° Quando os corpos administrativos forem dissolvidos ou as eleições annulladas, as novas eleições serão feitas nos dias que forem designados no decreto da dissolução, ou na decisão que tiver julgado a nullidade.

§ 2.° Na primeira hypothese do paragrapho antecedente, o dia da eleição deve ser designado para dentro do praso fixado no artigo 17.°, e na segunda hypothese mandar-se-ha proceder immediatamente a nova eleição.

Art. 266.° As eleições parochiaes serão feitas por freguezias; as municipaes e districtaes por concelhos.

CAPITULO II

Dos eleitores e elegiveis

Art, 267.° São eleitores para os cargos districtaes, municipaes e parochiaes todos os cidadãos portuguezes residentes nos respectivos concelhos e parochias, que tiverem o direito de votar nas eleições de deputados.

Art. 268.° São elegiveis para os cargos districtaes os eleitores do respectivo districto, para os municipaes os eleitores dos respectivos concelhos, e para os parochiaes os eleitores da respectiva freguezia, comtanto que saibam ler, escrever e contar.

Art. 269.° Não podem ser eleitos:

1.° Os ministros e secretarios d’estado;

2.° Os conselheiros d’estado;

3.° Os empregados no corpo diplomatico ou consular;

4.° Os militares em activo serviço no exercito ou na armada, salvo sendo professores ou exercendo emprego civil legalmente compativel com as funccões administrativas;

5.° Os clerigos de ordens sacras;

6.° Os magistrados do ministerio publico e os officiaes de justiça;

7.° Os juizes e membros dos tribunaes judiciaes, administrativos e fiscaes;

8.° Os empregados administrativos de nomeação do governo e os da fazenda nacional;

9.° Os empregados dependentes das corporações, de cuja eleição se tratar;

10.° Os que tiverem contratos de arrematação de rendimentos, de empreitadas ou fornecimentos com a corporação de cuja eleição se tratar, e os respectivos fiadores;

11.°. Os accionistas de companhias organisadas para tomarem de empreitada quaesquer obras, serviços ou fornecimentos;

12.° Os cidadãos privados ou suspensos do uso dos seus direitos politicos por sentença ou despacho judicial passado em julgado.

Art. 270.° O recenseamento eleitoral para as eleições de deputados servirá tambem para a inscripção dos eleitores e elegiveis para os cargos administrativos.

CAPITULO III

Da eleição

Art. 271.° As assembléas eleitoraes são convocadas por alvará do governador civil dirigido aos administradores do concelhos e ás commissões recenseadoras.

Art. 272.° Para as eleições parochiaes cada parochia constituirá uma só assembléa eleitoral na sede da freguezia.

Art. 273.° Para as eleições parochiaes farão os administradores do concelho publicar por editaes, affixados á entrada das respectivas igrejas parochiaes e nos mais logares do costume, o local, dia e hora da reunião das respectivas assembléas eleitoraes.

Art. 274.° As assembléas parochiaes serão presididas pelos membros da commissão do recenseamento do concelho, e não sendo estes sufficientes, ou na falta de algum, pelos cidadãos que a commissão escolher.

Art. 275.° Haverá o numero de assembléas que for necessario para commodidade dos povos.

§"1.° As camaras municipaes designarão, com approvação da junta geral, o numero das assembléas eleitoraes que deve haver em cada concelho, a sede d’ellas e a area eleitoral que devem abranger, a qual em nenhum caso deve conter menos de duzentos eleitores.

§ 2.° Esta designação, depois de feita pela primeira vez, ficará permanente, e só poderá ser alterada, se for necessario, em rasão de consideravel alteração na densidade da população do respectivo conselho, ou nos meios de communicação d’elle, ou de augmento ou diminuição da sua area.

§ 3.° A designação das assembléas será publicada por edital com a antecipação de quinze dias, pelo menos, do acto eleitoral, sob pena da nulidade da eleição.

Art. 276.° A convocação das assembléas eleitoraes para as eleições municipaes e districtaes será feita pela forma declarada no artigo 273.°, devendo tambem o administrador do concelho dar conhecimento do facto com oito dias de antecipação, pelo menos, ao presidente da commissão de recenseamento.

§ 1.° Havendo no concelho uma só assembléa, preside-lhe o presidente da commissão recenseadora.

§ 2.° Havendo mais de uma assembléa, o presidente da commissão recenseadora preside á que se reunir na parochia principal do concelho, e ás outras assembléas presidem os respectivos vogaes e seus substitutos. Se estes não forem bastantes, presidirão cidadãos idoneos nomeados pela commissão recenseadora.

§ 3.° A parochia principal do concelho é a da cathedral, e onde a não houver, a da igreja matriz da cabeça do concelho.

Art. 277.° As commissões recenseadoras remetterão aos presidentes das assembléas eleitoraes, pelo menos dois dias antes do designado para a eleição, cadernos em duplicado, contendo o recenseamento dos eleitores das respectivas assembléas, e tambem cadernos em duplicado contendo o recenseamento dos elegiveis para os cargos municipaes ou parochiaes sómente quando se trate da eleição d’esses cargos.

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§ 1.° Estes cadernos serão fielmente trasladados do recenseamento definitivo, terão termos de abertura e de encerramento assignados pela commissão, e serão por ella rubricados em todas as suas folhas.

§ 2.° Podel-os-ha tambem rubricar e assignai o respectivo administrador do concelho.

§ 3.° As mesmas commissões enviarão tambem aos presidentes das assembléas dois cadernos com termo de abertura e rubricas, na conformidade d’este artigo, para n’elles

se lavrarem as actas da eleição.

CAPITULO IV

Votação nas assembléas primarias

Art. 278.° No domingo destinado para se proceder á eleição, pelas nove horas da manhã, reunidos os eleitores no local designado, lhes proporá o presidente dois de entre elles para escrutinadores, dois para secretarios e quatro para os revezarem, convidando os eleitores que approvarem a proposta a passar para o lado direito d’elle e para o esquerdo os que a rejeitarem.

§ 1.° Para a approvação da proposta são necessarias tres quartas partes dos eleitores presentes.

§ 2.° Se a proposta não tiver obtido a approvação do numero fixado no § 1.°, será a mesa composta a aprazimento assim dos eleitores que a approvaram, como dos que a rejeitaram.

§ 3.° Por parte dos que approvaram ter-se-hão como escolhidos de entre os propostos pelo presidente para escrutirnadores, secretarios e dois revezadores os primeiros indicados para estes Jogares na ordem da proposta.

§ 4.° Por parte dos que a rejeitaram serão os restantes membros da mesa approvados por acclamação, sob proposta de qualquer eleitor de entre elles. Não sendo esta proposta approvada pela maioria d’esta secção, serão immediatamente eleitos por maioria relativa e escrutinio secreto, em que ella só votará. Servirão de vogaes da mesa d’esta eleição os mencionados no § antecedente.

§ 5.° Se a eleição for parochial, a mesa será composta sómente de dois secretarios e dois escrutinadores.

Art. 279.° Da formação da mesa se lavrará a acta, e o secretario que a lavrar a terá immediatamente á assembléa.

§ unico. Uma relação dos nomes dos approvados ou eleitos para comporem a mesa, assignada pelo presidente e por um dos secretarios, será logo affixada nas portas do edificio onde a assembléa estiver reunida.

Art. 280.° A eleição da mesa feita antes da hora designada no artigo 278.° é nulla.

Art. 281.° Se uma hora depois da fixada para a reunião da assembléa o presidente ainda não tiver apparecido, ou se apparecer e se ausentar, tomará a presidencia o eleitor que para isso for escolhido pelo maior numero de eleitores presentes.

Art. 282.° Se á mesma hora se não tiverem recebido na casa da assembléa, nem os cadernos do recenseamento dos eleitores e elegiveis, nem os cadernos para se lavrarem as actas, que a commissão recenseadora do concelho ou bairro devia ter remettido ao respectivo presidente, a eleição poderá fazer-se por quaesquer copias authenticas do respectivo recenseamento, que houverem sido extrahidas do livro competente e que qualquer eleitor, apresentar, e as actas poderão lavrar-se em cadernos com termos de abertura e rubrica da mesa que a assembléa escolher.

Art. 283.° Se em alguma assembléa eleitoral se não apresentar, duas horas depois da marcada para a eleição, numero sufficiente de eleitores para compor a mesa, o presidente fará auto, em que se declarem todas as circumstancias do facto. O auto será assignado pelo presidente, pelo parodio ou por quem suas vezes fizer.

§ unico. Se o caso se der n’um concelho de uma só assembléa ou nas eleições parochiaes, o auto será enviado pelo presidente ao governador civil. Se acontecer num concelho de mais de uma assembléa, será o auto remettido ao presidente da commissão de recenseamento, para o apresentar na assembléa geral do apuramento.

Art. 284.° Não haverá eleição nos concelhos" de uma só assembléa eleitoral em que, pela contagem das listas da eleição, se verificar não haverem concorrido eleitores em numero dobrado pelo menos d’aquelle que é necessario para formar a mesa.

§ 1.° O presidente fará lavrar auto, que será assignado por todos os vogaes da mesa, do qual conste o numero dos eleitores, o numero dos votantes, e o numero de listas que se extrahiram de cada urna, e o haverem-se cumprido as formalidades marcadas na presente secção até a contagem das listas.

§ 2.° Este auto será enviado pelo presidente da commissão do recenseamento ao governador civil.

Art. 285.° Quando no concelho houver mais de uma assembléa eleitoral, será procedente a eleição em cada uma d’ellas, ainda que não haja concorrido eleitores em numero dobrado d’aquelle que e necessario para se formar a mesa.

§ 1.° As actas d’estas assembléas serão remettidas á assembléa geral do apuramento.

§ 2.° Se na assembléa do apuramento se verificar que o numero de votantes nas diversas assembléas não foi igual ao dobro, pelo menos, do numero total dos vogaes que compozeram as mesas em iodas as assembléas, a mesa do apuramento formará auto destas circumstancias, e o entregará ao presidente da commissão do recenseamento para ser remettido ao governador civil.

Art. 286.° No caso de não haver eleição por falta de concorrencia de eleitores, serão novamente convocadas as assembléas eleitoraes dentro do praso de trinta dias e consecutivamente dentro de iguaes praso e, até que haja eleição nos termos d’este codigo.

Art. 287.° A mesa da eleição será collocada no corpo do edificio, de maneira que todos os eleitores possam por todos os lados ter livre accesso a elle e observar todos os actos eleitoraes.

Art. 288.° Constituida a mesa, são validos todos os actos eleitoraes que legalmente forem praticados, estando presentes pelo menos tres vogaes d’ella.

Art. 289.° Os parochos e os regedores das parochias que constituem a assembléa eleitoral, assistirão á eleição para informar sobre a identidade dos votantes.

§ l.° Faltando o parocho ou o regedor, a mesa nomeará pessoas idóneas que façam as suas vezes.

§ 2.° As mesas eleitoraes não começarão o acto da eleição sem que os parochos e os regedores, ou quem os substituir, estejam presentes.

§ 3.° O parocho ou quem suas vezes fizer terá logar na mesa ao lado direito do presidente, emquanto se estiver procedendo á chamada da respectiva freguezia.

§ 4.° Se a eleição for de cargo districtal ou municipal, e houver uma só assembléa no concelho ou bairro, assistirá ahi á eleição o administrador respectivo; se houver duas assistirá a uma o administrador, e á outra o seu substituto; se houver mais de duas, ou algum d’elles estiver impedido, escolherá o administrador em exercicio pessoa ou pessoas que o representem, e em quem delegue as attribuições conferidas por esta lei.

Art. 290.° As mesas decidirão provisoriamente as duvidas que se suscitarem ácerca das operações eleitoraes.

§ 1.° Todas as decisões da mesa sobre quaesquer duvidas ou reclamações serão motivadas.

§ 2.° As decisões serão tomadas á pluralidade de votos; no caso de empate o presidente tem voto de qualidade.

Art. 291.° Nas assembléas eleitoraes não se póde discutir ou deliberar, sob pena de nullidade, sobre objecto estranho ás eleições.

Art. 292.° Aos presidentes das mesas incumbe manter a

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liberdade dos eleitores, conservar a ordem e regular a policia da assembléa.

§ unico. Todas as auctoridades darão inteiro cumprimento ás requisições que as mesas, em observancia deste artigo, lhes dirigirem, e são sob sua responsabilidade obrigadas a evitar que por qualquer modo se attente contra a segurança, dos eleitores.

Art. 293.° Nenhum individuo póde apresentar-se armado nas assembléas eleitoraes, e ao que o fizer ordenará o presidente que se retire.

Art. 294.° Se o presidente da assembléa eleitoral o julgar conveniente para a ordem da mesma assembléa, poderá mandar sair do local, onde ella se achar reunida, todos ou alguns dos individuos presentes não recenseados.

Art. 295.° A nenhuma força armada é permittido apresentar-se no local onde estiverem reunidas as assembléas eleitoraes, ou na proximidade d’elle, excepto em virtude de requisição feita em nome do presidente.

§ 1.° A força só poderá ser requerida quando seja necessario dissipar algum tumulto, ou obstar a alguma aggressão dentro do edificio da assembléa, ou na proximidade d’elle, no caso de ter havido resistencia ou desobediencia ás ordens do presidente.

§ 2.° Apparecendo a força armada no edificio da assembléa, ou na sua proximidade, suspender-se-hão os actos eleitoraes, e só poderá proseguir-se nelles meia hora depois de se haver retirado a dita força.

§ 3.° Nas terras onde se reunirem as assembléas eleitoraes, a força armada conservar-se-ha nos quarteis e alojamentos durante os actos das ditas assembléas.

§ 4.°- As disposições deste artigo e dos seus §§ não comprehendem a força indispensavel para o serviço ordinario, nem individualmente os militares que estiverem recenseados.

Art. 296.° A nenhum cidadão é permittido votar em mais de uma assembléa.

Art. 297.° A votação e por escrutinio secreto, de modo tal que de nenhum eleitor se conheça ou possa vir a saber o voto.

§ 1.° Não são admittidas listas em papel de cores ou transparentes, ou que tenham qualquer marca, signal ou numeração externa.

§ 2.° Considera-se tambem signal externo a designação do cargo.

Art. 298.° Cada lista deve conter, em separado e com a competente designação, os nomes dos cidadãos escolhidos para vogaes effectivos e os nomes dos escolhidos para vogaes substitutos.

§ unico. Qualquer lista a que falte este requisito, será annullada.

Art. 299.° Nas eleições parochiaes ou municipaes devem as listas conter, tanto a respeito, de effectivos como de substitutos, um numero de nomes igual ao dos membros do corpo administrativo, de cuja eleição se tratar na eleição de procuradores á junta geral conterão as listas tantos nomes quantos foram os procuradores e respectivos substitutos, que o concelho tem a eleger.

§ unico. O presidente da mesa assim o annunciará á assembléa antes de acceitar as listas.

Art. 300.° Quando a eleição se fizer simultaneamente para mais de um corpo administrativo, na parte interna da lista e no alto della irá escripto o nome do corpo administrativo para cuja escolha for destinada.

§ unico. É nulla qualquer lista a que falte este requisito.

Art. 301.° São nullas as listas inintelligiveis e as que não forem manuscriptas ou lithographadas com tinta preta.

Art. 302.° Para o apuramento de votos e para o calculo, da maioria não se contarão, nem as listas nullas, nem as listas brancas, as quaes serão tidas como não existentes.

Art. 303.° Sobre a mesa estarão tantas urnas quantos forem os cargos para que se tratar de eleger, e cada uma d’ellas terá um distico que indique a eleição a que é destinada.

§ unico. Durante as operações da assembléa estarão sempre patentes os cadernos de recenseamento dos eleitores e elegiveis, que devem ter sido recebidos das commissões recenseadoras, em virtude do disposto no artigo 277.°

Art. 304.° Os vogaes das mesas votam primeiro que todos os eleitores; e tendo elles votado, mandará o presidente fazer a chamada dos outros, principiando pelas freguesias mais distantes.

Art. 305.° Ninguem póde ser admittido a votar, se o seu nome não estiver, inscripto no recenseamento dos eleitores; exceptuam-se:

1.° Os presidentes das mesas, que podem votar na, assembléa a que presidirem, ainda que ahi se não achem recenseados;

2.° Os cidadãos que se apresentarem munidos de sentença do poder judicial passada em julgado mandando-os inscrever como eleitores, e .que ainda não estiverem inscriptos;

3.° Os administradores do concelho ou bairro ou os seus delegados, quando nelle sejam eleitores, que podem votar na assembléa a que assistirem, ainda que ahi se não achem recenseados.

Art. 306.° Nenhum cidadão póde ser impedido de votar, quando se achar inscripto no respectivo recenseamento, excepto se contra elle se apresentar sentença judicial, passada em julgado, que o exclua.

Art. 307.° A proporção que cada um dos eleitores chamados se approximar á mesa, os dois escrutinadores ou os seus revezadores lançarão a respectiva nota da descarga nos dois cadernos de que se faz menção no artigo 277.°, escrevendo o appellido d’elles escrutinadores ao lado do nome dos votantes. O eleitor só então «entregará ao presidente a lista da votação, dobrada e sem assignatura, e o presidente a lançará na urna.

§ unico. Nas eleições simultaneas para diversos corpos administrativos, o eleitor não será admittido a votar sem apresentar ao presidente um numero de listas igual ao dos cargos.

Art. 308.° Não se apresentando mais eleitores, o presidente ordenará uma chamada geral dos que não tiverem votado.

Art. 309.° Duas horas depois desta chamada o presidente fará contar as listas que se acharem na urna, e confrontar o numero d’ellas com a nota de descarga posta no caderno do recenseamento. .

§ unico. O resultado d’esta contagem e confrontação será mencionado na acta, e immediatamente publicado por edital affixado na porta da casa da assembléa.

Art. 310.° Concluida a contagem das listas, mais nenhuma póde ser recebida.

Art. 311.º A contagem das listas seguir-se-ha o apuramento dos votos, desdobrando o presidente successivamente cada uma das listas, e entregando-a alternadamente a cada um dos escrutinadores, o qual a lerá em voz alta e a restituirá ao presidente. O nome dos votados será escripto por ambos os secretarios ao mesmo tempo com os votos, que forem tendo, numerados por algarismos, e sempre repetidos em voz alta.

§ unico. Nas eleições simultaneas para os cargos districtaes e municipaes o apuramento começará pelos cargos districtaes.

Art. 312.° Não se contarão para nenhum effeito:

1.° Os nomes a que vier annexa qualquer designação, que não seja a da residencia do cidadão votado, do cargo ou profissão que exerça.

2.° Os nomes de quaesquer cidadãos não inscriptos nos cadernos dos elegiveis, quando se tracte de eleições municipaes ou parochiaes.

3.° Os ultimos nomes que excederem o numero legal dos

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cidadãos que devem ser eleitos para a corporação de que se tratar.

Art. 313.° As mesas eleitoraes não podem recusar nem deixar de apurar os votos que recaírem em pessoas, cujo nome se ache inscripto no recenseamento dos elegiveis, quando se trate de eleições municipaes ou parochiaes, salvo a excepção do n.° 3.° do artigo antecedente.

Art. 314.° As listas que as mesas declararem viciadas ou nullas serão rubricadas pelo presidente, e juntar-se-hão ao processo eleitoral. A mesma disposição se observará quanto ás listas declaradas validas contra a reclamação de alguns dos cidadãos que formarem a assembléa.

§ unico. Os votos que se contiverem nas listas annulladas serão em todo o caso apurados, mas em separado, e separadamente escriptas nas actas.

Art. 3l5.° Se houver duvida sobre a numeração dos votos, ou se o numero total d’elles não for exactamente igual á somma dos que as listas contiverem, e uma quarta parte dos eleitores presentes reclamar a verificação d’elles, proceder-se-ha a novo exame ou leitura das listas.

Art. 316.° Terminando o apuramento, uma relação de todos os votados será publicada por edital affixado nas portas da casa da assembléa; em presença da mesa serão queimadas as listas que não estiverem nos casos declarados nos artigos 298.°, 300.°; 301.°, 302.° e 312.°, e d’estas circumstancias se fará expressa menção na acta.

Art. 317.° As operações eleitoraes não podem continuar alem do sol posto.

§ 1.° Não se tendo concluido a votação ou o escrutinio no primeiro dia, o presidente da mesa eleitoral mandará pelos dois secretarios rubricar no verso as listas recebidas, e fal-as-ha depois fechar com os mais papeis concernentes á eleição num cofre de tres chaves, das quaes ficará uma na sua mão e as outras na de cada um dos dois escrutinadores. Este cofre deverá ser sellado pelo presidente, e podel-o-ha ser por qualquer dos eleitores presentes que assim o requeira, sendo depois guardado com toda a segurança no mesmo edificio em que se procedeu á votação, podendo sel-o em logar exposto á vista e guarda dos eleitores se vinte d’estes, pelo menos, o exigirem, e aberto no dia seguinte pelas nove horas da manhã, em presença da assembléa, para se proseguir na votação.

§ 2.° Publicar-se-ha por edital affixado na porta principal do edificio o resultado do apuramento em cada dia, até se concluir a eleição.

Art. 318.° Da eleição deve lavrar-se acta em duplicado nos cadernos de que trata o § 3.° do artigo 278.°, assignados e rubricados pela mesa, na qual acta se mencionarão, alem das mais circumstancias relativas á eleição:

1.° Todas as duvidas que occorreram e reclamações que se fizeram, pela ordem com que foram apresentadas, e a decisão motivada que sobre ellas se houver tomado;

2.° Quantos dias a eleição durou e quaes as operações eleitoraes effectuadas em cada um d’elles;

3.° Os nomes de todos os votados e o numero de votos que cada um teve escripto por extenso;

4.° Os votos annullados e o motivo por que o foram.

Art. 319.° Um dos exemplares da acta será remettido ao presidente da camara do respectivo concelho para ser guardado no archivo da camara municipal, o outro exemplar, com uma relação dos nomes e morada dos cidadãos eleitos, com os cadernos e todos os outros papeis relativos á eleição, será enviado ao administrador do concelho, que mandará logo todos esses documentos ao governador civil, se a eleição for parochial, ou se tiver havido uma só assembléa eleitoral.

Art. 320.° Os exemplares da acta serão assignados por todos os vogaes da mesa, proprietarios e supplentes, devendo comtudo julgar-se validos quando forem assignados pelo menos por tres de entre elles. Se algum deixar de assignar; o secretario mencionará esta circumstancia.

Art. 321.° A qualquer cidadão é permittido pedir; e os presidentes das camaras são obrigados a mandar-lhe passar certidões authenticas das actas, recenseamento e mais documentos relativos ás eleições que estiverem guardados nos archivos das respectivas camaras.

Art. 322.° Se houver uma só assembléa eleitoral, a eleição ter-se-ha terminada pela votação e apuramento n’essa assembléa, e a mesa procederá como lhe prescreve o artigo 335.° d’este codigo. Se porem houver mais de uma assembléa, far-se-ha o apuramento na cabeça do concelho, no domingo immediato áquelle em que houver sido feita a eleição.

Art. 323.° Para execução do artigo antecedente, os dois escrutinadores serão os portadores de um dos exemplares da acta da respectiva assembléa, e apresental-o-hão no dia designado na cabeça do concelho.

§ 1.° Quando algum dos escrutinadores tiver motivos que o estorvem de ir á cabeça do concelho, será substituido pelos secretarios ou pelos revezadores.

§ 2.° Tanto o exemplar da acta que é entregue aos escrutinadores, como o outro exemplar d’ella, os cadernos e mais papeis que, na conformidade do artigo 319.°, são remettidos á camara municipal e administrador do concelho, serão fechados e lacrados, e alem d’isso levarão no reverso do sobrescripto os appellidos dos membros da respectiva mesa, postos por letra de cada um.

CAPITULO V

Das assemblèas de apuramento

Art. 324.° No domingo immediato ao da eleição, pelas nove horas da manhã, reunir-se-hao na casa da camara os portadores das actas de todo o concelho com o presidente da commissão do recenseamento; proceder-se-ha logo á formação da mesa, conforme o disposto nos artigos 278.° e seguintes deste codigo, e observar-se-hão todas as mais disposições applicaveis com respeito á formação das mesas das assembléas eleitoraes primarias, e ao modo de manter ahi a liberdade e fazer a policia, competindo para esse fim ao presidente e mesa das assembléas eleitoraes de apuramento as mesmas attribuições, que pelos citados artigos competem aos presidentes e mesas d’aquellas assembléas.

§ 1.° Se o presidente não comparecer á hora assignada n’este artigo, prover-se-ha á sua falta pelo modo indicado no artigo 281.°

§ 2.° O administrador do concelho assistirá a todos os actos da assembléa.

§ 3.° Nas cidades de Lisboa e Porto assistirá o administrador do bairro onde estiver situada a casa da camara.

Art. 325.° Constituida a mesa, o presidente da commissão do recenseamento, que fica sendo o presidente da assembléa, lhe apresentará fechado e lacrado o duplicado da acta que, na conformidade do artigo 319.°, tiver sido remettido ao presidente da camara municipal, que para tal fim o entregará; os portadores das actas apresentarão tambem os duplicados que lhes tiverem sido entregues, e o administrador do concelho apresentará os cadernos e mais papeis que houver recebido nos termos do artigo 319.°,

§ unico. Feita esta apresentação, nomear-se-hão, pelo modo indicado no artigo 278.°, as commissões que se julgarem necessarias para a mais prompta expedição dos trabalhos, e por estas commissões se distribuirão proporcionalmente as actas das assembléas do concelho, de maneira porém que o exame da acta de uma assembléa não seja nunca encarregado á commissão de que forem membros os portadores da acta d’essa assembléa.

Art. 326.° As commissões procederão immediatamente a examinar as actas que lhes forem distribuidas, e apurar os respectivos votos. Do resultado darão conta á assembléa.

Art. 327.° Os pareceres das diversas commissões serão lidos e approvados ou reformados pela assembléa geral de, apuramento.

Art. 328.° Approvados ou reformados os pareceres, a mesa procederá immediatamente ao apuramento geral, na

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conformidade d’elles a fira do averiguar o numero total de votos que cada um dos cidadãos votados tiver em todo o concelho, e sobre isto lavrará um parecer, que será tambem lido e approvado ou reformado pela assembléa.

Art. 329.° As funcções das assembléas de apuramento reduzem-se a examinar, pela comparação das actas trazidas pelos portadores com os duplicados apresentados pelo presidente da commissão do recenseamento, e tambem com os cadernos do recenseamento, se aquellas actas são realmente as mesmas que foram confiadas aos portadores pelas mesas, e se os votos que d’ellas consta haver tido cada cidadão na respectiva assembléa são realmente os que elles ahi tiveram, e bem assim a apurar esses votos.

§ unico. De maneira nenhuma porem deixarão de contar votos a qualquer cidadão, ou poderão annullar as actas das quaes elles constam, com o fundamento de que houve alguma nullidade no recenseamento, na formação das mesas, no processo eleitoral, de que algum dos cidadãos votados é absoluta ou respectivamente inelegivel, ou com qualquer outro que não seja a falta de authenticidade ou exacção expressamente especificadas n’este artigo.

Art. 330.° Quando por qualquer motivo imprevisto deixar de ser apresentado á assembléa de apuramento algum dos exemplares das actas, far-se-ha o apuramento pelos que apparecerem.

Art. 331.° Concluido o apuramento, escrever-se-ha em dois cadernos, assignados e rubricados pela mesa, o numero de votos que teve cada cidadão.

Art. 332.° Serão considerados como eleitos aquelles cidadãos que reunirem maior numero de votos.

§ 1.° Quando dois cidadãos tiverem o mesmo numero de votos, preferirá o mais velho.

§ 2.° O nome d’aquelles que sairem eleitos publicar-se-ha por editaes affixados na porta da casa da assembléa.

Art. 333.° Do apuramento deve lavrar-se acta, na qual serão declarados os nomes dos cidadãos eleitos e o numero de votos que cada um teve.

Art. 334.° Da acta do apuramento se entregará duplicado ao administrador do concelho ou bairro que estiver presente.

§ unico. Nas cidades de Lisboa e Porto será remettida uma copia aos administradores dos outros bairros.

Art. 335.°,A mesa que proclamar a eleição remetterá a cada um dos eleitos um extracto da acta assignado por todos os vogaes, que será o, diploma da sua nomeação.

Art. 336.° A acta do apuramento com as actas das assembléas primarias, reclamações apresentadas, cadernos e mais papeis relativos á eleição, serão remettidos pelo presidente da assembléa ao governador civil do districto, até ao domingo immediato ao do apuramento ou ao da eleição, nos casos em que não ha assembléa de apuramento.

§ unico. Os duplicados apresentados pelo presidente da camara municipal volverão ao archivo da mesma camara.

CAPITULO VI

Reclamações e recursos

Art. 337.° Todo o eleitor tem direito de reclamar contra a illegalidade das operações eleitoraes, relativas á corporação, em cuja eleição tiver direito de votar.

§ 1.° As reclamações podem ser feitas, ou no proprio acto da eleição, ou no do apuramento, quando este tenha logar; podendo neste ultimo caso ter por objecto tanto as operações do apuramento como as das assembléas primarias.

§ 2.° As reclamações poderão ser feitas verbalmente ou por escripto; no primeiro caso, serão inseridas nas actas como forem dictadas pelos reclamantes; no segundo caso, far-se-ha simples menção dellas na acta, e as reclamações originaes, com todos os documentos que lhes digam, respeito, serão juntas ao processo, depois de tudo rubricado pela mesa e pelos eleitores, que o pedirem. Dar-se-ha tambem recibo aos interessados que o exigirem.

§ 3.° As mesas, quer das assembléas primarias, quer das do apuramento, darão na acta a sua informação ácerca do objecto das reclamações apresentadas contra os actos draticados nas mesmas assembléas.

§ 4.° Se as reclamações apresentadas nas assembléas de apuramento tiverem por objecto as operações das assembléas primarias, o presidente da assembléa convocará immediatamente os cidadãos que compozeram as mesas eleitoraes, para que informem o que se lhes offerecer ácerca das mesmas reclamações; e a resposta que derem será junta ao processo eleitoral.

Art. 338.° As juntas geraes de districto pertence verificar a validade das eleições dos procuradores, e resolver ácerca das reclamações e protestos contra ellas apresentados.

Art. 339.° Aos conselhos de districto pertence julgar as reclamações e protestos relativos ás eleições municipaes e parochiaes.

Art. 340.° Todas as reclamações e protestos relativos aos actos eleitoraes serão resolvidos até ao segundo domingo immediato ao do apuramento, ou ao da eleição nos casos em que não ha assembléa de apuramento.

§ unico. Se as reclamações e protestos de que trata este artigo, não forem resolvidos dentro do praso fixado n’este mesmo artigo considera-se confirmada a eleição a respeito da qual se tenham feito as referidas reclamações ou protestos.

Art. 341.° O secretario geral do districto como representante do ministerio publico é competente para reclamar e recorrer ácerca da validade das eleições dos corpos administrativos.

Art. 342.° Da decisão do conselho de districto ha recurso para o supremo tribunal administrativo.

Art. 343. A nullidade da eleição em uma ou mais assembléas não invalida a eleição geral do circulo, senão nos casos em que a nullidade da eleição parcial possa influir no resultado geral da votação.

§ unico. Annullada porem a eleição, repete-se o acto eleitoral em todas as assembléas do circulo.

TITULO XI

Do serviço e da aposentação dos magistrados e empregados administrativos

Art. 344.° Os magistrados e empregados administrativos são obrigados a apresentar-se pessoalmente a servir os logares para que forem nomeados, promovidos ou transferidos:

1.° Se a nomeação, promoção ou transferencia lhes for communicada directamente, no praso que lhes for assignado na communicação, ou no de trinta dias, se não for assignado praso algum;

2.° Se a nomeação, promoção ou transferencia não lhes for communicada directamente, no praso de trinta dias contados desde a publicação da nomeação, promoção ou transferencia na folha official do governo.

§ unico. Em relação ás nomeações, promoções ou transferencias feitas para logares das ilhas adjacentes, os prasos assignados n’este artigo serão sempre em dobro.

Art. 345.° A auctoridade que fizer a nomeação, promoção ou transferencia pôde, quando para isso haja motivo grave, prorogar o praso primitivamente assignado para a apresentação, com tanto que tal praso assim prorogado não exceda a noventa dias.

§ unico.- Qualquer prorogação fóra do praso assignado n’este artigo só poderá ser concedida pelo governo.

Art. 346.° O serviço dos magistrados e empregados administrativos é sempre pessoal, e só se conta desde que el-

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les começam a servir effectivamente os respectivos logares.

Art. 347.° Até trinta dias em cada anno, não havendo prejuizo do serviço publico, póde ser concedida licença:

1.° Pelo administrador do concelho aos empregados seus subordinados;

2.° Pelo governador civil aos empregados do governo civil e aos administradores do concelho dos respectivos districtos.

§ 1.° Compete igualmente ao governador civil conceder licença aos empregados mencionados no n.° 1.° quando a licença for por mais de trinta dias, mas não exceder a noventa.

§ 2.° A concessão de licença por um praso superior aos marcados n’este artigo compete só ao governo.

§ 3.° Tambem só ao governo compete conceder licenças para sair do reino sem distincção do praso por que são concedidas.

Art. 348.° Os magistrados e empregados administrativos, durante os impedimentos ou licenças por motivo de molestia, teem direito aos seus ordenados por inteiro, comtanto que não deixem de servir por mais de trinta dias consecutivos.

§ unico. Se o impedimento ou licença por motivo de moléstia exceder aquelle praso, vencerão sómente dois terços do ordenado.

Art. 349.° Os substitutos ou funccionarios interinos percebem os vencimentos a que têem direito os proprietarios, todas as vezes que O logar estiver vago, ou não tiverem os proprietarios direito a receber alguma parte d’elle.

Art. 350.° Consideram-se para todos os effeitos como serviço effectivo em qualquer cargo as commissões extraordinarias, ou a ausencia temporaria por motivo de serviço publico.

§ unico. Nenhum empregado administrativo tem direito a augmento de ordenado pelo serviço interino de que for encarregado.

Art. 351.° Os empregados administrativos teem direito aos seus vencimentos desde a data da posse dos respectivos empregos.

§ unico. Nos casos de accesso, promoção ou transferencia, os vencimentos dos novos empregos contar-se-hão desde as datas dos respectivos diplomas, uma vez que os empregados promovidos ou transferidos tomem posse dos novos logares nos prasos fixados n’este codigo.

Art. 352.° Em todos os casos de impedimento ou licença não especificados nos artigos antecedentes, cessa o direito ao ordenado.

Art. 353.° Podem ser aposentados com o ordenado por inteiro, os governadores civis, os empregados das juntas geraes de districto, os das secretarias dos governos civis, os das secretarias das camaras municipaes, e os das secretarias das administrações dos concelhos ou bairros, que tendo pelo menos trinta annos de bom e effectivo serviço soffrerem impossibilidade physica ou moral, devidamente comprovada, de continuar a servir.

§ unico. Verificada a impossibilidade mencionada n’este artigo, a aposentação só póde ser concedida com metade do ordenado aos empregados que tiverem vinte ou mais annos de bom e effectivo serviço, e com um terço do ordenado quando esse serviço houver durado por quinze annos ou mais.

Art. 354.° Os empregados administrativos só podem ser aposentados com as vantagens correspondentes aos logares que exerçam, quando n’elles tenham cinco annos ou mais de serviço effectivo; aliás só o poderão ser com as vantagens correspondentes ao ultimo logar que anteriormente houverem servido.

TITULO XII

Dos emolumentos

Art. 355.° Os emolumentos pertencem sempre a quem está no effectivo exercicio do logar, ainda que o serviço seja interino, e seja qual for o impedimento do substituido.

Art. 356.° Os emolumentos, que se hão de receber-nas secretarias dos governos civis, nas administrações dos concelhos e dos bairros, nas secretarias das camaras municipaes e nas regedorias de parochia, são os designados, na tabella que for decretada pelo governo.

Art. 357.° Os peritos empregados nas diligencias, a que as auctoridades ou tribunaes administrativos mandarem proceder, para instrucção dos negocios da sua competencia, vencerão os mesmos emolumentos que estabelecer a tabella judicial por identicas diligencias.

TITULO XIII

Disposições penaes

Art. 308.° Os vogaes dos corpos administrativos, que, sem motivo justificado nos termos d’este codigo, deixarem de comparecer em qualquer sessão, pagarão a multa de réis 2$000 por cada dia em que faltarem.

§ 1.° Se as faltas excederem o numero de dez, incorrerão, alem d’isso, na pena de perdimento do cargo e suspensão dos direitos politicos por um anno.

§ 2.° As multas impostas por este artigo constituem receita da respectiva corporação.

§ 3.° Os vogaes dos corpos administrativos, que se recusam a votar e a deliberar nos negocios tratados nas sessões, a que assistirem, consideram-se como não presentes ás mesmas sessões, o ficam sujeitos ás penas impostas aos que faltam sem causa justificada.

Art. 3õ9.° Nenhum funccionario administrativo póde ausentar-se do logar da sua jurisdicção sem licença da auctoridade competente, sob pena de ser demittido, sem prejuizo de applicação das mais penas em que houver incorrido;

Art. 360.° A suspensão de funcções produz a perda dos vencimentos do suspenso.

Art. 361.° Todas as corporações ou gerentes, obrigados por este codigo a dar contas de suas gerencias, que não as prestarem no tempo e pelo modo prescripto nas leis, incorrem na multa, graduada segundo as circumstancias, de 10$000 até 400$000 réis, a qual será imposta pelo tribunal competente para julgar a conta.

§ unico. A imposição da multa, de que trata este artigo, hão obsta á imposição, pelos meios competentes, das mais penas comminadas por qualquer outro abuso.

Art. 362.° O tribunal que impozer a multa, de que trata o artigo antecedente, marcará novo praso para a apresentação dá conta.

§ unico. Se, findo o praso a que se refere este artigo, o responsavel não apresentar a conta em devida forma, o mesmo tribunal o condemnará no dobro da multa imposta pela primeira falta, e tomará a conta em vista dos elementos que existirem nas estações publicas.

Art. 363.° O producto das multas, de que tratam os dois precedentes artigos, constitue receita e é cobrado por execução administrativa.

Art. 364.° Os responsaveis que despenderem sem auctorisação ou com excesso d’ella serão condemnados pelo tribunal que julgar a conta, ou a restituir a importancia das quantias assim despendidas, ou em multa de 10$000 a 400$000 réis, segundo a gravidade das faltas ou dos abusos commettidos.

§ unico. A multa a que este artigo se refere não póde nunca exceder a quantia illegalmente despendida, e constitue a receita da corporação de cuja conta se tratar.

Art. 365.° As penas comminadas neste codigo ou nas posturas e regulamentos por elle auctorisados serão julgadas pela auctoridade judicial competente na conformidade das leis.

§ 1.° Em. todo o caso em que deva applicar-se alguma das penas aqui mencionadas, os magistrados administrativos e os presidentes dos corpos administrativos mandarão lavrar auto em que se refiram todas as circumstancias do mesmo caso, e o remetterão ao agente do ministerio publico.

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§ 2.° Dos autos que pela sobredita fórma se loccarem remetterá copia ao governador civil.

§ 3.° Se o presidente de qualquer corpo administrativo não podér mandar lavrar o auto por não se haver reunido o corpo, pertence ao respectivo magistrado administrativo mandal-o lavrar e remetter ao agente do ministerio publico.

§ 4.° Não são comprehendidas na disposição d’este artigo as penas de suspensão ou demissão e as multas tratam os artigos 301.°, 362.° e 364.°

Art. 366.° As disposições penaes estabelecidas na eleitoral são applicaveis ás eleições dos corpos administrativos.

TITULO XIV

Disposições geraes

Art. 367.° O districto, o concelho e a parochia são havidos por pessoas moraes para todos os effeitos declarados nas leis.

Art. 368.° O ministerio publico é competente para, como parte principal, propor as acções necessarias a fazer valer quaesquer direitos do districto, municipio ou parochia, nos casos em que todos ou a maior parte dos gerentes em exercicio devam ser demandados.

Art. 369.° É permittido a qualquer cidadão eleitor, intentar em nome e no interesse do districto, municipio ou parochia, em que for domiciliado, as acções judiciaes competentes para revindicar e rehaver para as respectivas administrações quaesquer bens ou direitos que lhes tenham sido usurpados, ou estejam indevidamente possuidos por terceiros.

§ 1.° As acções permittidas por este artigo não podem ser intentadas senão quando a respectiva administração se recusar a propol-as, depois de lhe ter sido apresentada uma exposição circumstanciada ácerca do direito que se pretende fazer valer, e dos meios de que se dispõe para o tornar effectivo, devendo alem d’isso preceder auctorisacão da junta geral do districto, se se tratar de direitos do municipio ou parochia, e do governo se se tratar dos direitos da junta geral.

§ 2.° Os individuos que obtiverem vencimento, no todo ou em parte, nas acções de que se trata, teem direi tu a ser indemnisados das despezas que fizerem com os pleitos.

Art. 370.° Serão feitos em hasta publica, precedendo editos, pelo menos de vinte dias, os contratos de alienação, arrematação de rendimentos, empreitadas e fornecimentos, em que forem interessadas a junta geral do districto, a camara municipal ou a junta de parochia.

Art. 371.° Os magistrados e os vogaes dos corpos administrativos e os empregados na administração não podem de forma alguma ter parte ou tomar interesse em qualquer contrato, que for estipulado sob a administração ou Inspecção dos mesmos magistrados, corpos e empregados.

Art. 372.° Os gerentes dos rendimentos e dinheiros pertencentes aos corpos administrativos são solidariamente responsaveis pelos prejuizos a que derem causa, em virtude de resoluções tomadas em desaccordo com as deliberações respectivas ou com o disposto nas leis e regulamentos da administração publica.

Art. 373.° Não ha nenhuma outra incompatibilidade para o serviço dos cargos administrativos alem das que se acham expressamente marcadas na lei.

Art. 374.° Em toda a jerarchia administrativa, singular e collectivamente considerada, as auctoridades inferiores são subordinadas ás superiores e obrigadas a cumprir todas as suas decisões e ordena legaes, salvo o direito de respeitosa representação ás mesmas auctoridades.

Art. 375.° Nenhum magistrado ou funccionario administrativo póde ser perturbado no exercicio das suas funcções pela auctoridade judicial, nem por qualquer outra.

Art. 376.° Os magistrados ou funccionarios administrativos podem ser demandados civil ou criminalmente por factos relativos ás suas funcções, sem auctorisação do governo.

§ unico. Os magistrados ou funccionarios administrativos, pronunciados por despacho passado em julgado, ficam por esse facto suspensos do exercicio das suas funcções.

Art. 377.° Os magistrados administrativos ou seus delegados, que no exercicio de suas funcções forem ameaçados ou insultados, devem, immediatamente fazer prender o culpado, formando auto, que remetterão no termo de vinte e quatro horas ao agente do ministerio publico.

Art. 378.° Os magistrados administrativos têem o primeiro logar em todos os actos e solemnidades publicas, segundo a sua jerarchia, o na conformidade das leis e regulamentos do governo.

Art. 379.° São applicaveis á eleição dos juizes electivos as disposições d’este codigo relativas á eleição dos corpos administrativos, observando-se os mais preceitos da legislação respectiva.

Art. 380.° As contribuições directas lançadas pelos corpos administrativos, serão cobradas pelas repartições, de fazenda, cumulativamente cem as contribuições do estado, a que forem addicionaes.

Art. 381.° E o governo auctorisado a fazer os regulamentos necessarios para a execução d’este codigo.

Disposições transitorias

Art. 382.° Não são obrigados a nova nomeação os actuaes magistrados e empregados que estiverem servindo logares para cujo provimento este codigo altera a legislação anterior.

§ unico. Os actuaes empregados das secretarias dos governos civis são dispensados de novo encarte, e considerados para todos os effeitos como nomeados pelo governo, na conformidade d’este codigo.

Art. 383.° Os actuaes empregados das secretarias dos governos civis que tiverem mais de dois annos do bom e effectivo serviço na classe em que actualmente se acharem, poderão ser promovidos independentemente de concurso.

Art. 384.° Podem continuar a servir os empregos que actualmente exercem, os empregados que não reunam todas as condições exigidas per este codigo para se obter a nomeação para os mesmos empregos.

Art. 385.° Ficam pertencendo ás juntas geraes de districto, nos termos d’este codigo, todas as attribuições dadas pelas leis aos conselho de districto e que não sejam consultivas ou contenciosas.

Art. 386.° Os empregados das repartições administrativas, que forem extinctas, serão preferidos, quando tenham a necessaria aptidão, para os empregos analogos das repartições em cujas circumscripções ficam comprehendidas as circumscripções das repartições a que pertenciam.

§ unico. Os empregados, a que se refere este artigo, podem ser addidos ás repartições subsistentes, se as respectivas administrações d’elles carecerem e os julgarem para esse fim com a necessaria aptidão.

Art. 387.° São comprehendidos na disposição do artigo 353.°, os empregados actualmente addidos aos governos civis.

Art. 388.° Depois da publicação d’esta lei, o governo mandará proceder á eleição de todos os corpos administrativos.

Art. 389.° Somente depois de installados os corpos administrativos eleitos na conformidade desta lei, começará esta a ter plena execução.

Art. 390.° O corrente anno civil considera-se o primeiro do quadriennio para os effeitos d’esta lei.

Art. 391.° As actuaes juntas geraes designarão o numero de procuradores que cada concelho tem de eleger na eleição geral ordenada pelo artigo 388.°

Art. 392.° Emquanto o governo não decretar a nova tabella dos emolumentos a que se refere o artigo 358.°, applicar-se-ha a que está em vigor.

Palacio das côrtes, em 2 de marco de 1818. = Joaquim Gonçalves Mamede, presidente = Francisco Augusto Florido da Monta e Vasconcellos, deputado secretario = Alfredo Filgueiras da Rocha Peixoto, deputado secretario.

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