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EXTRACTO DA SESSÃO DE 7 DE ABRIL. Presidencia do Em.mo Sr. Cardeal Patriarcha. Secretarios os Sr.s Margiochi,
V. de Gouvêa.
(Assistiam os Srs. Presidente do Conselho, e Ministro da Justiça.)
Pelas duas horas da tarde, tendo-se verificado que estavam presentes 33 D. Pares, declarou o Em.mo Sr. Presidente aberta a Sessão. Leu-se a Acta da anterior, contra a qual não houve reclamação..
Não houve Correspondencia. O Sr. C. de Semodães — Leu os pareceres da Commissão Especial, nomeada na ultima Sessão para examinar as Cartas Regias, que nomearam Pares do Reino os Sr.s Arcebispo de Palmyra, e Bispo Eleito de Castello Branco.
Tendo entrado logo em discussão os menciona dos Pareceres, segundo a pratica da Camara, abriu-se o debate sobre o que respeitava ao Sr. Arcebispo Eleito de Palmyra.
O Sr. V. de SÁ — Parece-me que falta alguma cousa no parecer da Commissão, porque na Lei que se fez em 1845 relativamente á herança do pariato, ha uma disposição que eu julgo ser applicavel a todos os Pares sem excepção, e é aquella em que se determina que elles tenham de renda 1000$000 réis pelo menos (Vozes — Isso é para os herdeiros). Eu bem sei isso, mas o espirito desta Lei é, que os Pares sejam independentes, e que tenham um rendimento proprio que lhes de essa independencia. Ora, os membros da outra Camara teem um subsidio, alem de deverem ter pelo menos 400$000 réis de renda annual. — A respeito dos Pares é preciso observar o que dispõe a disposição que citei, porque do contrario seguir-se-hia um absurdo, porque poderia um Ministerio encher esta Camara de Pares proletários, o que é contra o espirito da Carta Constitucional. Parece-me pois que a Commissão devia examinar se os D. Pares nomeados possuem ou não o rendimento de 1:600$000 réis, ou se pagam a contribuição correspondente. Feito isto, e provado, não póde haver duvida em se approvarem estes dois pareceres.
Não havendo mais quem pedisse a palavra, foi o Parecer posto a votos, e approvado.
Entrou em discussão o Parecer relativo á nomeação do Sr. Bispo Eleito de Castello Branco.
Foi approvado sem discussão.
O Sr. Silva Carvalho — Leu os Pareceres da Commissão de Fazenda sobre as Proposições de Lei n.º 261, e 251 da Camara dos Sr.s Deputados.
Mandaram-se imprimir.
O Orador aproveitou esta occasião para requerer que se pedissem ao Governo os documentos e respostas fiscaes sobre que fundamentou a proposta relativa a D. Margarida Amália Pinto Leite Sá Souto Maior.
O Orador (Continuando)— A Commissão do Orçamento esteve já hoje reunida, e algum trabalho já ha feito: — se os D. Pares que são deputados pelas varias Commissões desta Camara, quizerem comparecer ámanhã ao meio dia na Commissão do Orçamento, ella estará reunida.
O Sr. Presidente do Conselho — Eu rogo a V. Em.ª que convide os D. Pares que estão nomeados para isso, a concorrerem á Commissão do Orçamento.
O Sr. Presidente — Os D. Pares ouviram o pedido de V. Ex.ª e do D: Par relator da Commissão.
O Sr. B. da Vargem da Ordem — Leu e arrancou para a Mesa um parecer da Commissão de Petições, relativo ao requerimento em que Joaquim Luiz de Alqueva e Viena pede se lhe confira o subsidio correspondente ao logar que servia de Official da Secretaria do extincto Conselho da Fazenda.
Posto a votos o parecer, foi approvado sem discussão.
O Sr. C. de Lavradio — Leu e mandou para a Mesa um parecer da Commissão do Regimento Interno.
Mandou-se imprimir.
O Sr. V. de SÁ — Eu apresentei ha tempo uma proposta que foi mandada á Commissão do Regimento, relativamente a pertencer sempre a qualquer Commissão o Par que apresentar uma proposta: — até agora esta Commissão não tem apresentado o seu parecer, e por isso peço a V. Em.ª que recommende á mesma Commissão que de o seu parecer quanto antes.
O Sr. Presidente — O Membros da Commissão ouviram a recommendação do D. Pai.
O Sr. Fonseca Magalhães — Participou que o Sr. V. de Laborim faltava a esta Sessão, e faltaria talvez a mais algumas por se achar gravemente doente.
Primeira parte da ordem do dia.
Interpellação do Sr. C. de Lavradio sobre a exigencia de 600 réis na Repartição da Policia de Lisboa.
O Sr. C. de Lavradio — Constando-lhe o anno passado, por um artigo de um jornal, que os cidadãos portuguezes, que entravam pela foz do Tejo, eram compellidos a pagar 600 réis por um bilhete, sem o qual lhes não era permittido desembarcar; que houve uma pessoa que se recusou a pagar aquella quantia, allegando que não havia lei que a isso o obrigasse, de que resultou não sé soffrer algum incommodo, mas até algumas violencias que contra elle se praticaram; julgou elle Orador dever perguntar aos Srs. Ministros se o facto era verdadeiro, j e em; que se fundava o Governo para fazer tal exigencia: e como nessa occasião não estava presente o Sr. Ministro do Reino, a quem mais particularmente pertencia responder a estas perguntas, o Sr. Ministro da Fazenda prometteu que se informaria do facto, e do direito em que o mesmo se fundava; mas fechou se a Sessão Legislativa sem que tivesse havido resposta, e o Orador cuidou que o Governo teria corrigido esta violação de lei. Poucos dias porém lhe durou esta illusão, porque logo no dia 6 de Agosto publicou o Diario do Governo uma Portaria do mesmo mez, documento a que não póde deixar de chamar notavel pelas declarações que faz, e motivos em que se funda (leu).
Depois de a ter lido, passou a analysa-la, chamando a attenção da Camara sobre a parte em que diz, que as Camaras approvaram esta exigencia, porque a não revogaram l E perguntou; quando é que nas Camaras se discutiu esta materia? Na dos D. Pares, observou S. Ex.ª, que só uma vez alli se fallou nesta exigencia, e foi na occasião a que já se referiu; e então não pronunciou a Camara nenhuma opinião, pois tudo o que se passou foi elle, Sr. Conde, fazer a sua pergunta, e o Sr. Ministro da Fazenda prometter uma resposta, que nunca se deu a não ser por esta Portaria, em que se diz que as Camaras tomaram
uma resolução (sem a ter tomado) e que este abuso ha de continuar em quanto as mesmas Camaras não revogarem a legislação existente: o que parece impassivel que se diga, quando a legislação que ha é um Regulamento da policia, relativo aos estrangeiros, os quaes elle D. Par entende que já não estão obrigados a pagar este tributo, que nem foi votado pelas Côrtes, nem é decretado em nenhuma lei; o não sendo os estrangeiros obrigados a este pagamento, muito menos podem se-lo os portuguezes, pelo que bem hajam todos aquelles que se recusaram a satisfazer uma exigencia tão illegal.
O N. Orador, considerando que nesta Portaria se irroga ás Camaras a injuria de ignorancia, quando se diz que ellas reconheceram este tributo, porque deixando mesmo de parte a inexactidão da asserção, para que ellas reconhecessem o que não existe, quando mesmo estivesse em vigor o Regulamento de 1810, mandado observar por um Aviso do Secretario da Regencia, era necessario que ellas tivessem uma grandissima ignorancia.
S. Ex.ª tem entrado muitas vezes pela foz do Tejo. e nunca se lhe fez similhante exigencia, o que faz suppôr que esta extorsão era só para áquellas pessoas, que, ou por ignorantes, ou por fracas para resistirem ás violencias da Auctoridade, não tinham remedio senão pagar: e não póde deixar de ser assim, quando se observa que, mesmo em presença desse Regulamento de 1810, no artigo 5.° do Titulo 1.°, esta quantia de 600 réis pertencia a um Juiz e a um Escrivão que já não existem, sendo por isso até considerada a questão sob este ponto de vista, completamente illegal e abusiva a dita exigencia, que redunda era proveito de um que se diz Encarregado da Policia, como se vê de um bilhete que tem diante de si.
O Orador não querendo prolongar mais esta questão por attenção aos trabalhos mui importantes de que a Camara tem de occupar-se, e convencido de que disse quanto basta para mostrar a illegalidade da exigencia, opina que deve ordenar se desde já que cesse este abuso escandaloso; que todas as sommas que se tem recebido indevidamente sejam restituidas aquelles a quem se extorquiram; e que os Empregados que as exigiram sejam entregues ao Poder Judicial, para serem processados e punidos com todo o rigor das Leis; e, finalmente, que seja censurado o Sr. Ministro do Reino, pela illegal Portaria que mandou publicar, com a data do 1.° de Agosto de 1850 (Apoiados).
(Entraram na Sala os Srs. Ministro da Marinha, e dos Negocios Estrangeiros).
O Sr. Presidente do Conselho....
O Sr. V. de Fonte Arcada — Pediu ao Sr. Ministro tivesse a bondade de o informar do resultado que teem lido os processos que se teem mandado formar a esses individuos que teem resistido ao pagamento dos emolumentos em questão; porque, segundo consta a elle Orador, esses processos foram enviados ao Poder Judicial.
O Sr. Presidente do Conselho — Consta-lhe que effectivamente alguns processos teem sido enviados ao Poder Judicial, mas não sabe qual tem sido o resultado; porque depois desses objectos estarem affectos ao Poder Judicial já lhe não pertencem; é cousa inteiramente separada do seu Ministerio.
O Sr. C. de Lavradio — Se lhe restassem algumas duvidas sobre a legalidade desta exigencia, dissipar-se-lhe-iam depois do que disse o Sr. Ministro do Reino: de suas palavras collige-se que não ha Lei nenhuma que mandasse pagar este imposto, e por isso só pelo Poder Legislativo póde ser votado: porém essa Lei necessaria, indispensavel, a não ser que estejamos no absolutismo, não existe; pelo que declara que fará muito mal o portuguez, a quem se exijam estes 600 réis, se os pagar, pois commetterá uma acção de máo cidadão.
Quanto a si, bem alto e bom som o diz, não os pagará, e sómente poderão te-los se lhe lançarem as mãos ás algibeiras, no qual caso irá queixar-se ao Poder Judicial; que é impossivel que obrigue ao pagamento de um imposto que nenhuma Lei auctorisou.
Observou o Orador que o Sr. Ministro tinha dito que se haviam instaurado processos aos individuos que tinham resistido a este pagamento, do que não esperava resultado nenhum, porque o Poder Judicial não podia deixar de fazer justiça, absolvendo esses cidadãos que resistiram; e porque o Governo ha-de empregar, pelo orgão de seus agentes no Ministerio Publico, todos os meios ao seu alcance para que esses processos não tenham um andamento, que bem prevê lhe será desfavoravel, porque o Poder Judicial é independente, e não ha-de considerar como Lei um Aviso do Secretario da Regencia, feito em tempo de guerra, quando Massena talvez o nosso paiz, quando se desconfiava dos estrangeiros, e, finalmente, quando o que se fez foi uma medida provisoria: accrescendo, que nesse tempo a vontade do Rei, manifestada fosse porque meio fosse, era Lei, não porque isso fosse legal, mas porque o poder absoluto tinha por si a força física, diante da qual não valiam nada Leis, nem direitos por mais evidentes e sagrados, que fossem: mas felizmente esse tempo já lá vai.
Referindo-se á imputação que lhe fez o Sr. Ministro de que, no tempo era que elle Orador fazia parte da Administração, tambem se praticou este abuso; respondeu que muito sentia que nesse tempo não tivessem apparecido representações contra esta violencia, porque não teve della conhecimento, que se o tivesse, não havia de tolerar uma pratica contraria á Carta Constitucional: e esta sua ignorancia de um facto, não póde allega-la o Sr. Ministro do Reino, a quem se tem feito bastantes representações, e que foi quem expediu a Portaria em que se ordena a continuação do imposto, na qual manda que se faça injuria aos Cidadãos, fazendo-os citar perante os Tribunaes.
O Orador conclue manifestando o desejo de que
a Camara declare que não deve Continuar a pagar-se este imposto, que nenhuma Lei auctorisa.
O Sr. Presidente do Conselho...
O Sr. Fonseca Magalhães — Considerando o fim com que este negocio foi apresentado, mostrou que não perdeu o seu caracter do interpellação, apezar da opinião que o Sr. C. de Lavradio emittira da conveniencia de um voto de censura, o que foi reconhecido pelo proprio Sr. Ministro, prestando se a dar as informações que se pretendiam.
Discorrendo sobre ellas entende o N. Orador que tem havido effectivamente abuso nesta exigencia; porque, com quanto saiba que com a apparição do systema constitucional não era possivel que caducassem todos os regulamentos do Governo absoluto, pois do contrario estabelecer-se-ia um cahos; comtudo evidente que tem sido muitas as queixas que contra uma tal exigencia se tem levantado, a qual não é sómente onerosa pela quantia de 600 réis por cada pessoa, ainda que está convencido que se fossem 120 réis ninguem se queixaria, como é tambem absurda, por que pésa sobre as pessoas que já estão legitimadas com um passaporte, que se não dá de graça, ás quaes se obriga a pagar estes 600 réis, de que 400 são para uma pessoa que não tem trabalho nenhum, e 200 para um Escrivão que. escreve meia duzia de lettras; o que torna ainda mais do que vexatorio este encargo, que chega a ser iníquo; e nem por isso se tractou de examinar essas queixas, de attende-las no que tivessem de justas, e de corrigi-las no que tivessem de exaggeradas.
Pareceu ao N. Par de pouca força o argumento de que estas sommas são applicadas ao pagamento de uma Repartição, onde não ha ordenados; tanto porque em principio reprova que li já authoridades, cujas funcções não sejam retribuidas pelo Estado, e sim pelos Cidadãos (Apoiados); como porque, em consequencia desse mesmo inconveniente, não poderá julgar se esse serviço é retribuido de mais ou de menos, ao mesmo tempo que se paga de um tributo que tem de mais a mais a nota de impolitico, pois que opprime por uma faixa exorbitante a liberdade que o Cidadão portuguez deve ter de entrar e sahir por toda a parte, uma vez que mostre que é homem sem crimes (Apoiados).
Fazendo diversas considerações sobre o assumpto, exprimiu a opinião de que importava fazer acabar regulamentos tão odiosos em presença das queixas que se têm erguido, queixas justas e rasoaveis; e que seria possivel que a verificação dos passaportes se fizesse bem por um outro meio, por exemplo, um Empregado do Governo Civil, ou da Alfandega, a quem se pague uma gratificação, que talvez não exceda a 100 ou 120$000 réis por anno; e quando para isto se julgasse necessario offerecer um Projecto de Lei, estaria prompto para o apresentar se o podesse fazer como Membro desta Camara, ainda que lhe parece que destes assumptos convem antes que o Governo tome a iniciativa, que qualquer Membro do Parlamento a quem fallem os conhecimentos praticos que o Governo tem.
O Sr. C. de Lavradio — Para mostrar que não tinha sido inexacto quando disse que o Governo fundava-se para esta exigencia no Regulamento de 1810, leu uma parte da Portaria do Sr. Ministro do Reino, e um bilhete da policia; seguiu mostrando que em vista disto hão podiam os portuguezes que fossem ver aquelle Regulamento, e que não achassem nelle senão disposições relativas a estrangeiros, deixar de considerar a exigencia uma verdadeira extorsão.
Tambem se fez cargo da opinião do Sr. Ministro de que considerava com força de Lei os avisos do poder absoluto, ainda quando applicaveis a impostos, o que taxou de inaudito; pois equivalia a querer impostos decretados por avisos do tempo do governo absoluto, que não podem reger em presença da Carta, que quer que os impostos sejam votados pelo Poder Legislativo; e como a mesma Carta diz que ninguem póde s:t obrigado a fazer, ou a deixar de fazer alguma cousa senão em virtude da Lei, aconselhou a todos do alto da tribuna a que não pagassem, a que resistissem por todas as formas, se a isso os compellissem, e que não pagassem senão quando o Poder Judicial assim o decidisse.
O Sr. Presidente do Conselho....
O Sr. V. de Fonte Arcada....
O Sr. C. de Lavradio — Parece-lhe que a questão está terminada; mas não quer que como tal se considere sem declarar que não está satisfeito; e que protesta contra a theoria da legalidade dos avisos do tempo do absolutismo, e da força que ainda conservára de obrigar, principalmente em materia de impostos.
Terminou a interpellação.
O Sr. Silva Carvalho — Leu e mandou para a Mesa o Parecer n.º 316 da Commissão de Fazenda sobre a representação assignada por varios possuidores de Tenças.
A Commissão de Fazenda, a quem foi presente uma representação assignada por varios possuidores de Tenças, pedindo a esta Camara se digne prover de remedio para que cesse o abandono em que se acham, em consequencia de senão ter por em quanto tomado resolução alguma ácerca de umas Instrucções que, em cumprimento do Decreto de 13 de Novembro de 1846, foram submettidas á approvação do Governo pelo Tribunal de Contas, a fim de com ellas se proceder á liquidação ordenada por Decreto de 15 de Abril de 1846; é de parecer que a referida representação seja remettida ao Governo para a tomar na consideração que lhe merecer.
- Sala da Commissão, em 7 de Abril de 1851. — J. da Silva Carvalho = V. de Castro = C de Porto Côvo = L. C. de Albergaria Freire = B. de Chancelleiros.
O Sr. Presidente — Observando que era um objecto de muita simplicidade propoz que se passasse á discussão deste parecer,
O Sr. V. de Algés — Peço a palavra.