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142 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

gar ha um quarto de hora a esta camara, e os quaes querer-sE-ha tambem que sejam approvados, embora não discutidos, porque, como disse, discussão n'estas circumstancias é impossivel.

O sr. Presidente: - O projecto que está em discussão não veiu para a camara ha um quarto de hora.

O Orador: - Nem eu disse isso. Perdôe-me v. exa. O que eu disse foi que este projecto de lei era muito importante pelos objectos que com elle estão ligados, e que eu não tinha tido o tempo indispensavel para procurar os documentos que eram necessarios e examina-los. Que lamentava, que projectos d'esta ordem e tão importantes, venham aqui á ultima hora para serem discutidos, ou antes sómente approvados.

Eis-aqui está o que eu disse e repito, porque projectos de tanto alcance, e que tanto convem estudar e meditar, apresentam-se no começo das sessões legislativas e nunca no fim d'ellas, quando já não ha tempo para serem examinados detida e seriamente, porque isto equivale o mesmo que dizer-se-nos "aqui está este projecto e votae-o!" E isto, sr. presidente, não póde ser; pois havemo-nos de sujeitar áquella sentença de Mafoma - crê ou morre?!

O sr. Presidente: - Peço licença para observar ao digno par, que este projecto de lei foi aqui apresentado impresso, e depois distribuido aos dignos pares, satisfazendo-se a todas as prescripções mencionadas no regimento, e mediando o tempo conveniente para poder entrar em discussão.

O Orador: - Tudo isso seria assim; mas eu não me referia ao modo por que v. exa. deu este projecto para ordem do dia; eu referia-me, e refiro-me ao modo como o governo tem procedido, trazendo aqui á ultima hora proposta importantissimas, que precisam ser estudadas, e muito meditadas. E quando fallei em projectos que tinham chegado ha um quarto de hora, referia me a outros, e a um parecer que acaba agora mesmo de nos ser distribuido. Mai deixemos esta questão, e entremos na materia.

Sr. presidente, eu tenho mui serias apprehensões a respeito d'este projecto de lei. A carne é um genero indispensavel para a alimentação do homem, e nós por este proje cto vamos fazer com que o povo se veja obrigado a diminuir ainda mais o seu uso que tão necessario é para a sua alimentação e boa saude, e quanto ao vinho este novo imposto que se lhe vae lançar tem muitos inconvenientes.

Diz Liebig, na sua chimica organica applicada a physiologia animal, que as substancias alimenticias se podem ré duzir a duas classes - azotadas e não azotadas; só a primeira é que possue a propriedade de se converter em sangue, a segunda, a que chama respiratoria, promove as funcções da respiração.

As substancias azotadas são a febrina vegetal, a albomina vegetal, a carne e o sangue dos animaes. As não azotadas são a gordura, vinho, cerveja, aguardente, etc.; e ambas são essencialmente necessarias para a boa organisa cão do homem e para a conservação da sua saude.

Longet, no seu tratado de physiologia, para exemplifica que aquellas substancias alimenticias são essencialmente necessarias para a alimentação do homem e faze-lo propri para o trabalho, diz-nos qual é a ração do soldado francez estabelecida ha muito pelos regulamentos militares, que s compõe de 280 grammas- de carne, 700 de pão de munição e 316 de pão alvo, para a sopa, diz o mesmo auctor, alem de hortaliças.

Uma companhia franceza vendo que os seus operarios não trabalhavam tanto como os inglezes, que tinham a seu serviço, conheceu que a rasão era porque os francezes empregavam no seu sustento muito pouca carne, e que d'ahi provinha que não podiam trabalhar tanto como os inglezes que se alimentavam com maior quantidade d'aquella substancia; a companhia augmentou o salario aos operarios francezes para poderem empregar mais carne na sua alimentação, e d'ahi por diante o trabalho dos operarios francezes e inglezes não apresentava differença, com o que a ompanhia veiu a lucrar (apoiados),

Li um artigo do Farmers magazine, sobre a alimentado do homem, que diz - que a rasão por que a população agricola de Portugal não é tão robusta como podia ser, é porque se sustenta quasi exclusivamente de hortaliças e legumes.

O dr. Beaudriz, celebre medico hygienista francez, diz que os impostos sobre os generos de consumo de primeira necessidade, augmentam a mortalidade nas classes pobres.

Á vista do exposto se ve que a pratica confirma a theoria da sciencia. (O sr. Andrade Corvo: - Peço a palavra.)

Alem de tudo isto é necessario ter em vista que as camaras municipaes tambem têem já gravado com impostos os generos de consumo, como a carne, o vinho, etc., ao que se deve attender.

A rasão por que as camaras municipaes muito augmentam os direitos sobre o consumo, é porque, não sendo os conselhos municipaes electivos, não fiscalisam, como aliás deviam, o lançamento d'estes impostos; se o fossem, outro seria o resultado. E a proposito vem o dizer agora aqui, para que todos o saibam, como é a composição do conselho municipal actualmente. Elle é composto dos ma;ores contribuintes que, pela sua posição social, desejam que se façam obras, das quaes muitas vezes a generalidade do povo não tira utilidade, e lançam então novos impostos sobre o consumo, porque mui pouco os vae onerar, como é bem sabido.

Actualmente todas as camaras municipaes têem feito muitas despesas, que talvez podessem evitar; a rasão é bem clara, é porque as pessoas que formam os conselhos municipaes têem interesses diversos do que a generalidade dos contribuintes, e lançam para taes despezas impostos sobre o consumo, que pouco ou nada os vão ferir.

Eis-aqui está a rasão por que eu entendo, que só um conselho municipal electivo é que póde fiscalisar, não só as despezas do municipio, como o lançamento dos impostos, principalmente quando se vão augmentar para as despezas geraes do estado os impostos sobre o consumo.

A reforma, pois, do conselho municipal é uma das mais essenciaes que temos a fazer, e toda a demora que houver em os fazer electivos, dá em resultado grande prejuizo para os povos.

Sr. presidente, este projecto no seu artigo 2.° auctorisa o governo a fazer os regulamentos necessarios para a execução e cobrança d'este imposto, e como depende em grande parte dos regulamentos, a maior ou menor oppressão que esta lei póde causar aos povos, eu desejaria que o governo fosse o mais cauteloso possivel na elaboração d'esses regumentos.

Pecgunto eu, terá o governo tenção de fazer com que haja varejos, e que as auctoridades entrem em casa do cidadão para syndicar do que elle tem? O governo nada diz a este respeito, e eu sinto não ver presente o sr. ministra da fazenda, porque s. exa. de certo me daria algumas informações que me elucidassem e despreoccupassem mais o meu espirito d'esta incerteza em que estou, ignorando a forma, como será feito o regulamento, que poderá ser mais ou menos vexatorio.

Ha de a area fiscal fóra de Lisboa, voltar ao que era antigamente? Não sei; mas se assim for, vae promover em grande escala o contrabando, que para o evitar será perciso um grande numero de officiaes fiscaes, e empregar tropa n'esse serviço, como acontecia antigamente. Não sei quaes sejam os regulamentos que o governo tem em vista fazer, mas não me cansarei em lhe lembrar que d'elles é que depende o maior ou menor vexame que este projecto ha de fazer ao povo. Ouço dizer a muita gente que o povo não come carne, que poucas são, especialmente nas classes pobres, as pessoas que a comem. E isto é verdade, mas, porque? Porque não podem já chegar ao preço elevado