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CAMARA DOS DIGNOS PARES.
SESSÃO DE 20 DE MAIO DE 1848.
Presidiu — O Em.mo e Rev.mo Sr. Cardeal Patriarcha, e por um intervallo, o Sr. V. de Laborim.
Secretarios, os Sr.s V. de Gouvêa.
Margiochi.
ABERTA a Sessão pela uma hora e um quarto da tarde, estando presentes 32 D. Pares, leu-se e approvou-se a Acta da ultima Sessão. — Concorreu o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros.
O Sr. SECRETARIO V. DE GOUVÊA — Tenho aqui sobre a Mesa um requerimento do Sr. João Carlos do Amaral Osorio, filho de um D. Par, fallecido, o Sr. B. de Almeidinha, em que pede o ingresso nesta Camara, pelo direito hereditario: junta varios documentos, e refere-se a outros, que estão na Secretaria.
Em virtude do artigo 6.º da Carta de Lei de 12 de Abril de 1845, parece-me, que se deverá nomear uma Commissão composta de membros tirados á sorte, que apresentará o seu parecer, e a Camara depois resolverá.
O Sr. PRESIDENTE — Em conformidade da Lei citada, proceder-se-ha á nomeação de uma Commissão para examinar o requerimento, e mais do-
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cumentos, que acabam de ser apresentados. Vão-se fazer os bilhetes para á votação, isto é, contendo os nomes daquelles que estão na Capital, porque do contrario poderia acontecer não se constituir a Commissão por falta de numero.
O Sr. Sousa Azevedo — Em uma das Sessões passadas, haverá uma semana, pouco mais ou menos, apresentou o D. Par, o Sr. Silva Carvalho um requerimento com certos itens, ou perguntas ao Sr. Ministro da Fazenda, pedindo-lhe esclarecimentos ácerca da distribuição dos fundos, que se achara na Caixa de amortisação: desejava eu portanto, que V. Em.ª tivesse a bondade de informar-me, se esse requerimento fui expedido ao Sr. Ministro.
O Sr. Secretario V. de Gouvêa — Posso dizer, que segundo a pratica constante da Mesa, no mesmo dia, em que se apresenta qualquer requerimento para ser presente ao Governo, a mesa immediatamente o envia ao Governo.) Sr. Presidente, sinto que ainda não tenha vindo resposta alguma, porque na verdade, o negocio é urgente. Em quanto existe na Caixa de amortisação a quantia avultada de mais de 200:000$000 réis, aquelles a quem essa somma pertence ahi andam morrendo de fome, e rebatendo as suas cedulas, ou recibos, por um insignificantíssimo preço; e não me parece justo, que a quem já em Janeiro tinha o direito de receber, ainda se lhe não pague em Maio, havendo meios para isso! Não se diga, Sr. Presidente, que a maior parte das acções sobre o fundo de amortisação não existem na mão de seus proprietarios: existem; e quer-se saber a razão porquê existem? É porque não teem valido nada, ou quasi nada, visto que o seu preço no mercado é, alem de nominalmente muito diminuto, contra notas do Banco de Lisboa; mas quando se pagasse aos portadores, quaesquer, ainda revertia em favor dos Empregados Publicos, que achariam melhor preço no rebate de seus vencimentos. Se pois existe essa somma, que eu referi, é preciso que vá para a mão daquelles a quem de direito pertence. (O Sr. Presidente — Pede o D. Par que se renove o requerimento?) Não, Senhor; mas se se demorar a sua resposta renova-lo-hei.
O Sr. Pereira de Magalhães — Pedi a palavra sobre este incidente, porque não podia deixar passar a idéa emittida pelo D. Par o Sr. Sousa Azevedo, de que era Janeiro já existia no cofre da amortisação, uma quantia sufficiente para se repartir pelos seus credores; porque é agora que ella existe, e desejo muito que quanto antes se reparta. Tenho respondido.
O Sr. Sousa Azevedo — O D. Par creio que me não entendeu. O que eu disse foi, que em Janeiro já existia o direito, e que havendo este direito em Janeiro, não era muito que se satisfizesse em Maio, quando havia para isso meios sufficientes: por conseguinte, não fallando em dinheiro que existisse em Janeiro, mas sim em direito, parece-me que ainda procedem as mesmas razões, que expendi, é pelo contrario cabem as que em opposição apresentou o D. Par.
O Sr. Pereira de Magalhães — Estou satisfeito.
O Sr. Pereira de Magalhães — Vou mandar para a Mesa uma representação, assignada por 60 e tantos habitantes da Freguezia de S. Mamede desta Cidade, na qual pedem que senão approve o projecto de lei vindo da Camara dos Srs. Deputados sobre coimai, e expõem as razões em que se fundam para mostrarem, que a authoridade, que actualmente conhece das coimas, satisfaz perfeitamente ao seu fim á contento dos povos, e que não ha necessidade; antes gravame, de encarregar o Conhecimento destas coimas ao Juiz de políeis correccional.
Como a respectiva Commissão já deu o seu parecer, pedirei que esta representação fique sobre a Mesa, a fim de ser consultada no decurso da discussão. (Apoiados.)
O Sr. Presidente — Não ha duvida nenhuma, em que fique sobre a Mesa para poder Ser consultada.
O Sr. C. de Thomar — Tenho a mandar tambem pára á Mesa uma igual representação dos habitantes da Freguezia de S. Pedro de Alcantara.
O Sr. Presidente — Fica tambem sobre a Mesa. Agora tem a palavra o Sr. C. das Antas.
O Sr. C. das Antas — Sr. Presidente, sinto bastante ser ainda obrigado a fallar nesta questão, porque estou persuadido de que não trazendo ella interesse algum ao paiz, consome comtudo um tempo precioso, que mais deveria Ser empregado em cousas de maior utilidade; mas impossivel é deixar de responder a algumas asserções expendidas pelo D. Par o Sr. C. de Thomar, e fa-lo-hei com a maior brevidade que me fôr possivel.
S. Ex.ª o Sr. C. de Thomar teve a bondade de me pôr debaixo da tutela do D. Par o Sr. Fonseca Magalhães, e não só a mim, como a todos os illustres cavalheiros, que se assentam deste lado da Camara: pela minha parte declaro que não preciso de tutela, porque, se interesses meus soffressem pela falta de um eximio orador, eu sem duvida nenhuma queria do meu lado a eloquencia do D. Par o Sr. Fonseca Magalhães, em quem reconheço profundos conhecimentos; mas nesta occasião eu não necessito da cooperação de S. Ex.ª, porque aqui tracto de expor sentimentos, sentimentos que são meus, e filhos de uma intima convicção; e se o não faço pomposamente, é com eloquencia ao menos fa-lo-hei com toda a franqueza é verdade, porque são Verdadeiros.
O Sr. C. de Thomar pretendeu pôr-me em divergencia de opiniões com o Sr. Fonseca Magalhães, divergencia esta que não existe, porquê nos achamos convencidos de uma e a mesma cousa; mas talvez que eu tivesse o infortunio de me expressar mal, ou não fosse bem entendido.
A divergencia, que S. Ex.ª nota, é sobre o facto da união dos realistas com a junta do Porto. Eu digo o que aconteceu, ou, pára melhor dizer, repeti-lo-hei do melhor modo que possa, esperando que a maneira por que O faço não admitta mais interpretações, a fim de vir á carga todos os dias, e com idéas tão particulares, a respeito dá mesma cousa.
Sr. Presidente, eu disse o que se passou na verdade: a junta do Porto, apresentando o seu programma recebeu debaixo das suas ordens e das soas bandeiras todos os individuos que se lhe quizeram unir; e para isto não houveram condições nem tractado algum por escripto; muitos realistas se apresentaram a junta, pedindo alistarem-se debaixo das suas bandeiras, e a junta não lhes perguntou quaes tinham sido as suas antigas opiniões, pois, vendo que elles tinham tirado o laço azul e encarnado, substituindo-o pelo azul e branco, servindo debaixo do seu programma, entendeu, e entendeu muito bem, que elles abraçavam as suas ideias governativas, não quiz saber quaes haviam sido as suas antigas opiniões, e esperou pelos actos posteriores praticados por esses cavalheiros, e os actos foram servirem elles com honra e dignidade debaixo da bandeira nacional da junta do Porto. Mas disse o Sr. C. de Thomar — «esses cavalheiros, quando se uniram á junta do Porto, não abjuraram as suas crenças dynasticas, nem os seus principios politicos, nem a junta o exigio, como disse, nem lhes perguntou quaes eram as suas convicções; contentou-se em que elles adherissem ao seu programma, e confiou no seu cavalheirismo; elles vieram servir a junta debaixo desse programma, e por conseguinte modificaram as suas idéas ou antigas opiniões, isto é innegavel, e ninguem o póde contestar, porque é a verdade dos factos» e S. Ex.ª ainda accrescentou — «á junta foi de rastos e humildemente pedir a cooperação dos realistas!» Sr. Presidente, a junta nunca se abaixou a ir rojar-se aos pés de ninguem, nunca praticou actos de uma humilhação tal!... A junta estimou, sim, a união dos realistas á sua bandeira, como estimaria que outros individuos, pertencentes a qualquer partido, se viessem reunir a ella, uma vez que fossem fieis ao seu programma. Demais, Sr. Presidente, eu acredito que muitos individuos, que serviram a usurpação, e alguns até ao fim della, e que sem serem Bispos, foram empregados pelo Sr. C. de Thomar quando Ministro, e que se acham desfructando empregos rendosos, não fizeram profissão de fé politica, nem prometteram esquecer ou moderar os seus principios, e até alguns, furiosos miguelistas, o não fizeram; e nem eu, Sr. Presidente, o julgo necessario, pois que os homens devem ser julgados pêlos seus actos, e não pelas suas idéas. (O Sr. C. de Thomar — Juraram a Carta.) Juraram a Carta, porque lhe deram empregos, e se aos outros se lhes dessem, tambem a jurariam; no entanto, a junta prescindiu d'esse juramento, e tudo confiou da sua honra; e eu, Sr. Presidente, confio na maior parte delles, tanto como em mim proprio. (O Sr. C. de Thomar — Essa formula ainda cá não chegou, por ora ha o juramento.)
Mas emprasou me o D. Par o Sr. C. de Thomar a que eu lhe provasse em como o Governo de Lisboa tinha provocado o levantamento de guerrilhas miguelistas, e eu empraso a S. Ex.ª a que prove em como a junta fizera levantar essas guerrilhas, porque quem accusa é que é obrigado a provar. (O Sr. C. de Thomar — A accusação veio de lá.) V. Ex.ª nunca me ouvio tal. Mas que admirava que o Governo de Lisboa as mandasse formar! (O Sr. C. de Semodães — O Governo de Lisboa! O Governo da Rainha.) Sr. Conde, peço ordem, e espero que V. Ex.ª, Sr. Presidente, a faça manter. Mas, dizia eu que não admirava que o Governo de Lisboa mandasse formar aquellas guerrilhas, quando por sua ordem existiam algumas, como aquella do celebre Marcai, que assolava os povos, roubava-os, e assassinava loucamente, commettendo toda a qualidade de excesso!
S. Ex.ª fallou ainda no General Povoas. O General Povoas annuiu ao programma da junta como particular, e a sua proclamação é dirigida aos Seus amigos; mas eu lastimo que um homem illustre, que um official dignissimo, quasi no fim da sua vida, soffresse improperios como aquelles, que hontem lhe atirou o Sr. C. de Thomar, que nem ao menos leu o que ha pouco elle publicou pela imprensa.
Disse tambem o D. Par — os bons militarei nem sempre são bons politicos—é verdade, não pretendo eu as honras de rábula, nem nesta Camara tenho feito alarde d'isso; e posto que me falleça a eloquencia de bom orador, nem por Isso deixarei de responder Horn verdade é firmeza, sempre que seja provocado, apresentando as minhas idéas taes quaes as possuo.
Accrescentou porém o Sr. C. de Thomar, que — «se tivera debaixo das suas ordens 16:000 homens, como á junta tinha no Porto, elle sem duvida nenhuma, iria atacar esses escassos 2 000, que estavam em Oliveira d'Azemeis.» — É muito natural que o Sr. C. de Thomar, achando-se no Porto com esses 16:000 homens ás suas ordens, dotado d'um genio fogoso, e impellido pela muita coragem, que lhe é proverbial, viesse atacar as forças do General D. de Saldanha, que occupavam as posições de Oliveira d'Azemeis, apesar de serem boas, e estarem fortificadas. Se S. Ex.ª fosse feliz, vêr retirar o inimigo para o Vouga; e S. Ex.ª, não podendo forçar a ponte, o flanquearia, para o obrigar a ir sobre Coimbra, aonde S. Ex.ª daria ainda duas ou tres acções, e rio fim de tudo isto pouco menos distante estaria da Capital, pois era só alli que a questão se podia decidir. Eu, porém, não sendo talvez tão versado na tactica militar, e pesando, além d'isso, sobre mim a grande responsabilidade de arriscar uma causa, que se reputava ganha, e querendo poupar vidas, porque em fim todos os que combatiam eram Portuguezes, pensei milito seriamente no plano com que mais facil é promptamente acabasse a questão, e a final concebi aquelle que, sem muito derramamento de sangue, conseguiria o triumpho da causa nacional, vindo n'uma expedição sobre Lisboa, de cujo bom resultado não podia duvidar.
Mas eu acceito a declaração franca do Sr. C. de Thomar, de que só no Porto tinha a junta 16:000 homens, em quanto que o General D. de Saldanha apenas commandava 2:000: é esta, Sr. Presidente, á miseravel causa nacional, que não tinha quem a seguisse, ao passo que o Governo de Lisboa tinha apenas 2:000 homens no seu principal Exercito, debaixo do commando do Marechal D. de Saldanha!... Bem se vê a necessidade que houve de se ir implorar a intervenção de tres grandes nações, para virem esmagar esse partido forte e eminentemente nacional!
Repito, Sr. Presidente, que esta e outras similhantes discussões, trazidas aqui em resultado d'um mesquinho e miseravel plano, em nada interessam o paiz, e por isso concluo assegurando que não fallarei mais sobre este objecto.
O Sr. C. de Thomar — Peço a palavra unicamente para uma explicação. Fico satisfeito com o que acaba de dizer o Sr. C. das Antas, isto é, que á Junta do Porto não exigiu ao partido realista, que se lhe uniu, abjurar, e que effectivamente não abjuraram os seus principios politicos, e crenças dynasticas! Eita declaração destroe completamente o accordo em que S. Ex.ª diz estar com o Sr. Rodrigo da Fonseca Magalhães; porque a proposição que um estabelece, está em diametral opposição com a que estabelece o outro. Eu estou satisfeito com a explicação que S. Ex.ª acaba de dar.
Sr. Presidente, quando eu pedi, que provasse o Sr. C. das Antas, que o Governo de Lisboa tinha mandado crear essas guerrilhas miguelistas, de que tracta o officio do militar Bernardino, entendi que estava de accordo com os principios, e com o que S. Ex.ª estabelece; mas segue-se, diz S. Ex.ª, que quem accusa deve provar: estou de accordo. O militar Bernardino, e o Sr. C. das Antas accusam o Governo da Rainha de ter feito levantar guerrilhas miguelistas: cumpre-lhes provar este facto, sem o que será reputado calumnioso: o Governo accusa o facto, cumpre ao accusador a prova! (Apoiados.) — (O Sr. C. das Antas — Peço a palavra para uma explicação. Sr. Presidente, não sei a que se refere a expressão de rábula, que S. Ex.ª apresentou aqui: quererá S. Ex.ª referir-se a mim, como o fizeram já o Lusitano, e a Revolução? (O Sr. C. das Antas — Não appliquei a V. Ex.ª. Estas expressões não vão proprias para dellas se fazer uso nesta Casa. nem ainda a menor applicação a algum dos seus Membros. (O Sr. C. das Antas — Não fiz nenhuma. Então se não fez nenhuma applicação, e menos a mim, estou satisfeito com a explicação de S. Ex.ª: no entanto ámanhã verão os D. Pares como esses dous jornaes hão de dizer, que me fóra com razão applicada uma tal fraze pelo Sr. C. das Antas!...
Quanto á razão, que S. Ex.ª deu para se justificar de não haver atacado o Marechal Saldanha, não sou General para julgar este negocio; mas sei que todo o mundo se ha de admirar deste feito de S. Ex.ª (Riso). O Marechal Saldanha commandava dous mil homens, e occupava Oliveira de Azemeis, Villa aberta, e não fortificada; o Sr. C. das Antas commandava dezeseis mil homens occupando o Porto, Cidade bem fortificada, e magnificamente artilhada, e tendo um rio caudaloso na frente, o que tudo, em caso de um revés, lhe garantia defeza segura. Os militares julgarão a defeza apresentada por S. Ex.ª!!!... O Sr. C. das Antas pareceu mostrar-se muito satisfeito com a confissão que eu fiz, de que o exercito da Junta se compunha de dezeseis mil homens, em quanto o de Sua Magestade a Rainha se compunha apenas de dous mil: desta confusa. pretendeu S. Ex.ª tirar a consequencia, de que a Nação estava do lado da Junta! Admiro a logica do Sr. C. das Antas! S. Ex.ª não viu, que esses dous mil homens eram a vanguarda da Nação, que na retaguarda delles estavam para sustentar o Throno e a Rainha! S. Ex.ª não quiz observar, que as tropas da Junta só tinham por si o terreno que pisavam! E se não é assim, porque se conservaram nos pontos fortificados, e porque sendo muito maior o seu numero, não sahiram a atacar ás tropas da Rainha? é que a Nação estava na retaguarda delles! (Muitos apoiados). Pois se era a causa da Junta a causa nacional, porque não se levantava toda essa Nação em Seu favor? Que seriam então esses dous mil homens? (Apoiados.) Effectivamente existiam no Porto esses dezeseis mil homens; mas não representavam a Nação, porque eram os inimigos da Dynastia, e da liberdade do Paiz, e a Nação quer a Dynastia, e a liberdade (Apoiados repetidos).
O Sr. C. das Antas — Eu prometti não fallar mais, e por isso só darei curtas explicações — O que S. Ex.ª diz, ainda que com tanta energia, não é nada, e accrescento — que S. Ex.ª não tem direito para me pedir provas, pois é o accusador quem deve apresenta-las; e se a junta andou mal ou commetteu crimes, que a accuse quem para isso se julgar authorisado, e ella responderá. Tenho dito tudo.
O Sr. Presidente — Vai-se entrar na ordem do dia
Ordem do dia.
Parecer n.º 27 sobre a proposição de lei n.º 21, regulando a administração, e venda dos bens da Universidade de Coimbra.
Parecer n.º 27.
A Commissão de Fazenda examinou com toda a circunspecção a Proposição n.º 21, vinda da Camara dos Sr.s Deputados, aonde tinha sido apresentada pelo Governo, e adoptada por aquella Camara com algumas alterações, para regular a administração e venda dos bens da Universidade de Coimbra; e assenta que esta Proposição deve ser approvada por esta Camara, e apresentada a Sua Magestade, para poder obter a Sancção Real.
Sala da Commissão, em 15 de Maio de 1818. = C. de Porto Côvo = José da Silva Carvalho = C. do Tojal = J. A. M. de Sousa e Azevedo = B. de Chancelleiros = Felix Pereira de Magalhães.
O Sr. V. de Fonte Arcada — Pedia a palavra sobre a ordem (O Sr. Presidente — Tem a palavra), Sr. Presidente, parece-me que e impossivel, que este Projecto se possa discutir sem estar presente o Sr. Ministro competente.. (O Sr. Presidente — Eu já o mandei convidar á outra Camara, e como ainda não são duas horas, por isso talvez não viesse já.) Uma vez que V. Em.ª mandou avise, é preciso esperar. (O Sr. Presidente — Mais poderia ser, que algum D. Par fosse fallando.) Bera.
O Sr. Presidente — Se acaso algum D. Par pede a palavra, sem ser para esclarecimentos...
O Sr. Fonseca Magalhães — Peço a palavra. (O Sr. Presidente — Tem a palavra.) Mas é unicamente para requerer esclarecimentos e só o Governo os póde dar. (O Sr. V. de Fonte Arcada — É verdade.) Apresenta-se um projecto, que tem de ser discutido; e nelle se tracta de bens que se hão de allienar, e não se sabe nada do que importa sobre estes bens. Parte delles poderá) ficar para serviço da Universidade, e o resto será vendido. Ora isto assim exposto não dá o menor conhecimento das circumstancias indispensavel para similhante alienação, se fazer convenientemente. O Governo não está presente, mas póde Ser que os membros da Commissão se considerem habilitados para dar estes esclarecimentos, porque a mim custar-me-ha, sem mais noções do que as do projecto, votar por elle.
Sr. Presidente, o artigo 1.º, 2.°, 3.º, e ainda o 4.º (O Sr. Silva Carvalho — Peço a palavra), me parecem pouco claros; ao menos para mira não são, e mau é que hoje alguem os ache escuros. Em tal caso força é que se esclareça o sentido delles.
Tenho por mais de uma vez lamentado que nas nossas reformas não tivessemos tido mais parcimonia; e que em cenas circumstancias para seguir as theorias administrativas, e os principios de sciencia, não attendessemos a certas peculiaridades, e sobre tudo a certos habitos inveterados, que não é sem risco interromper de repente. A Universidade, ainda depois da extincção dos dizimos, tinha bens preciosos: assentou se que não devia ella administra-los, e fundar nelles a sua dotação. Razões graves houve para isso; mas se se corrigissem os deffeitos dessa administração, que na verdade eram muitos, e se conservasse uma n mia desses bens para pagamento das despezas daquella corporação, não leriam chegado os Lentes, e empregados della á situação desgraçada de que se queixam. Não comparo a importancia do serviço dos diversos funccionarios do Estado; mas digo que para os Professores não ha, geralmente fallando, outro recurso alem do seu ordenado: se este lhes falta, é impossivel que elles possam continuar sem gravissimo incommodo. Mas já agora estes males não teem remedio. Já não podemos deixar á Universidade bens proprios, como outros ainda teem; porém se o Governo expõe o que verdadeiramente se quer; e se este projecto de Lei a apresentado á sollicitação da Universidade, ou ao menos tendo-a ouvido sobre elle, então as circumstancias mudam; e poderemos desde já saber o que eu reputo indispensavel.
Finalmente entrou agora o nobre Ministro que não só pêlo conhecimento da materia de que se tracta, mas pelo muito zêlo que tem, dirá quaes são as informações que o Governo teve da Universidade, e o que deu logar a este projecto São os esclarecimentos que peço em assumpto tão importante.
O Sr. Silva Carvalho — Sr. Presidente, convenho em que são precisos, os esclarecimentos, que disse o D. Par necessitava para poder entrar nesta materia: a Commissão não os teve todos; mas julgou-se habilitada para poder dar um Parecer, que offereceu á discussão desta Camara. O certo é, que pelo Decreto de 5 de Maio de 1832, firam os bens da Universidade incorporados na Corôa, e nessa occasião se mandou, que a Junta da Fazenda da Universidade ficasse sujeita ao Thesouro; e por um Decreto de 1811, mandou se, e auctorisou-se o Governo para crear uma junta de administração destes bens, composta dos Lentes da mesma Universidade, e que exercessem estas funcções gratuitamente. Essa junta não se chegou a crear, continuou a administração por conta da Fazenda, os bens administrados vão-se deteriorando, e o seu rendimento converteu se em despezas, que eram necessarias para conservação dos predios. Agora velo o Governo á Camara, e disse que esta administração era muito prejudicial, e não se podia fazer, por que os bens eram em differentes partes, é seria necessario crear agentes em todas, ou pagar a pessoas que os administrem, e ahi não podia vir senão prejuizos: portanto deseja o Governo, que estes bens sejam vendidos, reservando-se para a Universidade aquelles, que são necessarios para os estabelecimentos a que eram applicados.
É dos meus principios não admittir corporações administrando bens, e principalmente pagas pelo Estado, e a respeito destes está no Orçamento consta de 80:000$000 réis applicados para as suas despezas; e não podia admittir-se a administração de todos os bens, porque o Estado satisfaz todas as suas despezas. Portanto a Commissão não teve dúvida nenhuma em adoptar o Projecto, que veio da Camara dos Sr.s Deputados conforme está, quer dizer — vender-se os bens da Universidade pelo modo, que o Projecto estabelece, e conservar-se aquelles que estavam applicados para certos estabelecimentos. Eis aqui os esclarecimentos que posso dar, e agora se o D. Par quer mais alguns, o Sr. Ministro os dará, e V. Em.ª tambem nos poderá dar muitos esclarecimentos a este respeito, Sé tiver a bondade de vir para a discussão, convidando a quem compete, a occupar o seu logar, porque sei que está muito ao facto disto.
O Sr. M. de Ponte de Lima — Sr. Presidente, começarei o meu discurso por fazer uma pergunta, e ainda bem, que está presente o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros, que talvez me possa satisfazer.
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Eu desejava saber, se ha algum Projecto para reduzir as despezas da Universidade de Coimbra; se o ha poderá esta Lei ter alguma utilidade, se não o ha, não serve de nada.
A Universidade tinha muitos bens, e V. Em.ª e muitos D. Pares, que estão presentes sabem desta materia melhor do que eu; mas o que vejo é, que vamos espoliar a Universidade de Coimbra dos seus bens, e se não se diminuir a sua despeza, muito menos hade haver para o que carecer; e vamos vender estes bens a que? A notas do Banco de Lisboa, e para as amortisar bastava só uma Lei com quatro linhas, e que dissesse — que ninguem era obrigado a acceita-las (Apoiados), e obrigar os accionistas a paga-las pelos seus bens, como se faz a uma casa de commercio fallida, pois o Banco quebrou; e escusamos de estar todos os dias a fazer Leis para dar meios ao Governo, é que não sirvam de nada para a amortisação das notas. (O Sr. C. de Thomar— Peço a palavra). Eu vi ha poucos dias no Diario a quebra de um negociante, parece-me que elle quererá pagar as suas letras, e creio que as notas do Banco estão no mesmo caso. Portanto, isto não serve de nada, não se satisfaz ás despezas do Estado, e fica como tem ficado quasi tudo.
O D. Par que me precedeu, e com cujas idéas não tenho concordado muitas vezes, disse — não vamos desmantelar tudo: — mas ha muitos annos que não se faz em Portugal senão tirar bens, e por isso não posso vetar em similhante Lei.
O Sr. V. de Fonte Arcada — Este Projecto, como muito bem disse o D. Par o Sr. Fonseca Magalhães, veio a esta Camara sem informações algumas; não sabem se a quantidade, a qualidade destes bens, nem o quanto elles rendem; mas virem aqui Projectos desacompanhados da esclarecimentos é já costume, e por isso não estranho que tambem agora viesse este.
Sr. Presidente, em um Paiz bem administrado, é muito mais util que todas as despezas do Estado se façam só por uma Repartição, e que esta Repartição proveja os estabelecimentos publicos; e isto convem muito para centralizar a administração do Paiz; mas para isso se conseguir é necessario, que haja dinheiro prompto, e não faça falta para outras despezas do Estado, a fim de não ficarem expostos a perder-se esses estabelecimentos, quando por ventura haja de se lhes tirar quaesquer outros recursos que possuam.
Entendo pois, que approvar-se este Projecto em discussão, corresponde a tirar os bens da Universidade, que, bem administrados por ella, podem servir-lhe de patrimonio, e estar segura a sua conservação.
Ora, Sr. Presidente, contarei uma historia acontecida comigo, pela qual se verá se eu tenho ou não razão. Em 1834, quando eu tive a honra de ser Deputado da Nação Portugueza, por occasião de se estar discutindo o Projecto de Lei para a venda dos Bens Naciomes, propuz eu que desses bens se separasse uma parte para se dotar com ella o Hospital das Caldas da Rainha, porque o costeamento desse Hospital era feito pelo producto das jogadas e oitavos da Camara de Alemquer, e que tinham sido comprados á Corôa pela Sr.s Rainha D. Leonor, para com elles o dotar. Pareceu me então, que a Camara estava inclinada a approvar a minha proposta; mas o Sr. Ministro da Fazenda, que então era, o Sr. J sé da Silva Carvalho, oppoz-se, servindo-se, pouco mais ou me dos, dos mesmos argumentos que empregou agora, e o resultado foi, que o Hospital não ficou dotado como eu pretendia que o fosse, e daqui resultou fechar-se o Hospital o anno passado, por falta de meios; e neste anno abrir-se-ha? Não sei.
Ora, Sr. Presidente, trouxe este exemplo para mostrar, que o mesmo póde vir a acontecer á Universidade de Coimbra, se lhes tirarem esses bens, que a podem conservar no explendor em ella deve estar. Não se diga para combater esta opinião, que já se ordenou, que houvesse uma Commissão para os administrar, e que esta não chegou a trabalhar: isto não é argumento que faça com que não sejam outra vez entregues á Universidade os seus bens, para por ella serem administrados.
Por todas estas razões voto pois contra este artigo.
O Sr. Silva Carvalho — O que disse o D. Par é verdade; mas eu já declarei, que não é dos meus principios, que estabelecimentos pagos pelo Estado sejam administrados por elles; e o pagar-lhes o Governo bem ou mal, isso é outra cousa, não tem nada com o facto.
Ora, eu tenho aqui os extractos da Legislação que ha a este respeito, os quaes vou lêr (leu-os.) Resultou pois ficar a administração desses bens em muito más circumstancias, e os predios rusticos iam-se arruinando de dia para dia. Quando ha annos eu fui a Coimbra, tive occasião de examinar os prazos, e vi que elles eram muitos, mas muito pequenos. Se a Universidade tivesse hoje o privilegio, de que já gosou, isto é, de chamar a responder em Coimbra os seus devedores, por que tinha o seu Juiz Conservador, ella podia administrar os seus bens; mas hoje, que ninguem quer pagar, não póde ser isso, porque teria a Universidade, que sustentar demandas em muitas partes, e por pequenas sommas, o que não é possivel. Eis aqui pois as razões, que teve a Commissão para approvar este Projecto.
O Eminentissimo Sr. Cardeal Patriarcha — Se a Camara quer ouvir alguns esclarecimentos de facto, eu os posso dar, porque fui Deputado da Junta de Fazenda da Universidade, e de alguma fórma fui eu quem promoveu a Lei, que agora se tracta de revogar. (Muitos apoiados.) Como vejo que a Camara annue, convido por isso ao D. Par o Sr. V. de Laborim para tomar a Cadeira, (Efectivamente foi S. Em.ª substituido pelo D. Par. e tomando logar na Camara continuou.) Eu tenho visto, que alguns D. Pares estão enganados quando pensam, que estes bens servem actualmente, e directamente, para pagar aos empregados da Universidade, e para sustentação dos seus estabelecimentos: não é assim, S.ª Ex.ª estão n'um equivoco, porque aquelles bens foram logo no principio incorporados nos bens nacionaes, e a sua administração concentrada no Thesouro Publico, para onde se pertendeu logo no principio, recolher o Cartorio da Fazenda da Universidade. Eu era, havia muito tempo Deputado da Junta da mesma Fazenda, e reconhecendo os males que resultariam para a Fazenda Publica, e para os particulares, de se confundir, e desbaratar o vastissimo, e bem ordenado Cartorio da Fazenda da Universidade, tirando-o d'alli, e conduzindo-o para o Thesouro, lembrei n'uma representação dirigida ao meu nobre amigo o Sr. Silva Carvalho, que era então Ministro dos Negocios da Fazenda, a vastidão, e importancia deste Cartorio, que enche tres grandes, e magnificas salas, a necessidade de alli se conservar na ordem, em que se achava, para com segurança, e maior facilidade se conservarem, consultarem, e poderem obter os titulos, e documentos de importantes direitos, assim do Thesouro, como de muitos particulares; que este Cartorio sendo conduzido para Lisboa, ficaria logo reduzido a um cahos; e assim se perderiam muitos prazos, que a Universidade tinha misturados com as rendas de dizimos nos respectivos districtos destas rendas; e que não constando da relação dos fóros, que tinha o cobrador deites, só podiam conhecer-se, e apurar-se pelos titulos, e tombos, que existiam naquelle Cartorio em boa ordem, e pelos quaes devia continuar a fazer-se o importantissimo trabalho de apurar, e fazer de novo pautas de cobrança dos fóros, e direitos de cada uma das rendas. Na presença destas razões, cedeu o illustre Ministro em parte; porque apezar de ser logo depois extincta a junta da Fazenda da Universidade, e concentrada no Thesouro a administração especial desta, ordenou, que se conservasse na Universidade o Cartorio da sua Fazenda; e que uma Secção de Officiaes do Governo Civil de Coimbra, sendo seu Chefe o antigo Secretario da Junta, ficasse encarregado não só da conservação, e expediente deste Cartorio, mas tambem da continuação dos exames, e trabalhos necessarios para o apuramento das pautas, ou réis de cobrança de fóros, e mais direitos subsistentes, que o Governo Civil de Coimbra, devia transmittir para o Thesouro, e para os Governos Civis, em cujos districtos se deviam cobrar esses fóros, ou direitos; e ao mesmo tempo devia conjunctamente essa Secção ter a administração especial do patrimonio proprio dos tres Hospitaes, que ha em Coimbra, o da Conceição, da Convalescença, e dos Lázaros, que não é de bens nacionaes, mas de bens proprios destes antigos Estabelecimentos pios, que só foram annexos á Universidade, para servirem a escóla pratica da Medicina, e Cirurgia, e que por isso deve continuar a ser alli administrado; e assim se tem feito.
Portanto, pelo systema de centralisação acabou a Junta de Fazenda da Universidade, ficando com tudo o antigo Secretario della, como empregado do Governo Civil, Chefe de uma repartição especial para tractar da conservação, e expediente do Cartorio, e das ditas funcções relativas, não só aos bens da Universidade que já eram nacionaes, mas tambem aos que são propriedade desses Hospitaes, de que acabei de fallar.
Convém porém saber, que o producto total desses bens, entra todo no cofre central do Districto, porque as mesmas propinas das Matriculas, que se pagam, e entram no cofre da Universidade, são d’ali transferidas para o dito cofre central, de maneira que a Universidade hoje não administra nada dos seus proventos; não applica o producto destes á sustentação dos seus Estabelecimentos, nem ao pagamento dos seus empregados; uma e outra cousa entra na regra geral, observada para com os bens nacionaes, e para com os Empregados Publicos, e conseguintemente fica demonstrado, pelo que acabo de dizer, que pelo projecto em discussão não se vai privar a Universidade de cousa alguma, que sustente seus Estabelecimentos, ou pague a seus empregados.
Em 1841 principiaram apparecer listas do Thesouro para a venda de muitos desses bens da Universidade: achava-me eu então aqui Deputado ás Côrtes, e reflectindo eu sobre a necessidade, e conveniencia que haveria de assegurar a subsistencia dos Hospitaes, a subsistencia dos Estabelecimentos da Universidade, que são de natureza tal, que fazem despezas diarias, que senão podem defferir, ou suspender-se, como é evidente, por exemplo, nos Hospitaes, Jardim Botanico, e Laboratório Chymico, e outras; foi, digo, na presença de tudo isto, e pelo conhecimento que eu tinha dos bens da Universidade, e da importancia dos fóros que ainda se poderiam apurar, havendo uma Junta zelosa, que fizesse os devidos exames no Cartorio da Fazenda da Universidade, que resolvi-me por todas estas considerações a fallar com varios amigos de uma e outra Camara, pro-pondo-lhes as minhas idéas a tal respeito, e tive a satisfação de vêr, que quasi sem discussão, foi approvada a Lei de 6 de Novembro de 1841, que se tracta hoje de revogar. O fim desta Lei era apurar no Cartorio da Universidade todos os bens, que lhe pertencessem, ou aos Hospitaes; procurar por uma zelosa administração especial, amais regular, e efficaz cobrança, e arrecadação de seus rendimentos; e com o producto delles. e das Matriculas, que poderia tudo chegar a 30:000$000 réis, assegurar a manutenção dos Hospitaes, e dos Estabelecimentos da Universidade, sendo regularmente transferido, o que sobejasse, para o cofre central por onde são pagos os seus empregados. Eis aqui pois as vistas, que presidiram á confecção daquella Lei.
Se houvesse no futuro alguma mudança de legislação, que restaurasse os rendimentos antigos, que tinha a Universidade (que consistiam pela maior parte em dizimos), então eu seria tambem da opinião do D. Par, para que se conservasse a dotação, que tinha a Universidade, e com a qual ella se manteve sempre com decoro, e sem dependencia nem gravame do Thesouro Publico; mas não havendo os dizimos, que constituiam a mais principal parte dos seus rendimentos, os fóros, os predios da Universidade, e dos hospitaes, e as matriculas, não poderiam fazer um rendimento actualmente, que passe de 25 a 30:000$000 réis; e não póde servir para dotação sufficiente da Universidade, cuja despeza orça por 80:000$000 réis. Quando foi publicada esta Lei de 6 de Novembro fui eu encarregado de fazer, o Regulamento para a sua execução; e para que ella podesse produzir os fructos, que se desejavam, neste Regulamento, propuz todas as providencias que me pareceram necessarias ou convenientes: destas pareceram ao Procurador Geral da Corôa algumas excessivas, e julgou que não podiam ter logar segundo a Legislação actual. Queria eu um fiscal especial para a administração e cobrança judicial das rendas da Universidade, e que fosse conservado o privilegio de responderem em Coimbra os foreiros ou rendeiros da Universidade: foram estas as duas medidas que acharam resistencia; mas eu ainda hoje estou persuadido de que nenhuma dellas, na sua essencia, encontrava as Leis, e Instituições actuaes do Reino; e que a segunda não era um privilegio, mas a declaração de um direito geral, proveniente das clausulas dos emprazamentos, e dos arrendamentos, conforme a Lei geral, que mantem a competencia por contracto. Queria que a junta fosse composta dos Lentes mais versados nos objectos desta especial administração, e mais zelosos, e que servissem gratuitamente, ao menos em quanto não se apurasse um rendimento tal, que valesse a pena de lhes dar algumas justas gratificações; porque, observando-se o mesmo na Escóla Polytechnica, onde os Lentes administravam os bens do extincto Collegio dos Nobres gratuitamente, eu, que sempre como filho agradecido, desejei a honra e a dignidade da Universidade, não queria que ella em cousa alguma parecesse inferior em zêlo do bem publico a outra qualquer corporação; mas, como disse, o Regulamento não chegou a decretar-se, porque alem das duvidas para a sua approvação, depois succederam mudanças politicas; sahi eu da Universidade, e nada mais se fez a este respeito.
No entanto devo accrescentar, que indo eu, logo depois de publicada a dita Lei, para Coimbra, muito contente, por entender que assegurava assim a manutenção dos estabelecimentos da Universidade, achei alli com desgosto meu, grande frieza, e desconfiança nos meus collegas, que pela maior parte assentaram, que a Lei obtida não convinha, porque o Governo se visse alli uma administração, que rendia 20 a 30:000$000 réis, não lhes pagaria os seus ordenados pelos apuros do Thesouro, e mais facilmente lhes diria paguem-se do que lá têem, o que não podia ser; e grassou de tal modo esta opinião entre os Lentes, que apezar de eu trabalhar incessantemente com o Reitor, e mais alguem, para que a Junta se constituisse com os mais Lentes respectivos, achei repugnancias, que até hoje não foi possivel destruir.
Sendo pois aquelles os bens, que eu tive em vista quando promovi a adopção daquella Lei, vendo-os agora totalmente frustrados, e sem execução alguma util á dita Lei, sou de opinião que é necessario, pelo modo disposto no Projecto, ou por outro algum, dispor-se dos predios da Universidade, principalmente dos urbanos, de que terá duas ou tres duzias na Cidade de Coimbra; procurar-se o apuramento, e aproveitamento dos fóros da Universidade, que bem apurados poderão ser para cima de 3:000, e alguns importantissimos.
Já era numerosissima a relação dos fóros, que tinha o Cobrador, que era um officio que existia no tempo da Junta de Fazenda da Universidade; mas fóra desta relação havia muitos e importantissimos fóros, que cobravam os rendeiros, e que só poderão encontrar-se e relacionar-se pelo exame dos titulos, tombos, e pautas de cobrança existentes no Cartorio da Universidade; porque muitos havia, que andavam misturados com as rendas dos dizimos. Em algumas destas rendas havia uma infinidade de fóros, que se arrematavam conjunctamente com os dizimos; muitos destes andavam já desconhecidos ou sonegados nos ultimos tempos da Junta de Fazenda da Universidade, porque os rendeiros desde longo tempo tinham deixado de entregar as pautas de cobrança, com as annotações devidas, como eram obrigados; faziam disto segredo e monopolio, ou para não concorrerem outros lançadores ás rendas, que elles queriam, ou para as venderem por 20 e 30 moedas aos novos arrematantes.
Quando fui Deputado da Junta, considerando eu, e os meus collegas, a grande perda que com isto ia progressivamente soffrendo a Fazenda da Universidade, determinámos e forcejámos constantemente, para que depois dos mais escrupulosos exames dos titulos, tombos e documentos respectivos, se fizessem novas pautas de cobrança para cada uma das rendas, com a maior exactidão, clareza e legalidade, e que estas ficassem registadas nos livros da Universidade, a fim de se poderem promptamente dar aos novos arrematantes, se os antecedentes rendeiros as não restituíssem, e de se evitar assim o segredo e monopolio dos mesmos rendeiros; mas este grande trabalho achava-se ainda em menos de meio, quando foi extincta a Junta, e a sua administração especial.
Consta-me que a Universidade alguns predios rusticos tem ainda, mas são poucos. Nos ultimos annos, em que eu estive na Junta, porque eu estive alli até 1831, ainda se aforaram herdades e hortas, que a Universidade possuia no Alemtéjo, e no Algarve, por fóros iguaes, senão superiores ás rendas que davam as mesmas herdades e hortas, por quanto os rendeiros, ficando com ellas por meio de emprazamentos, podiam fazer, e segurar para si, as bemfeitorias importantissimas, de que eram susceptiveis, e assim davam-se por muito contentes por as aforarem pela mesma quantia, porque ai tragara de renda; de modo, que nos ultimos annos em que eu estive na Junta, ainda assim, depois de observadas todas as formalidades legaes dos emprazamentos de bens, ou predios rusticos, que a Universidade possuia em pleno dominio, se constituiram fóros em dinheiro, que montariam a perto de 6:000$000 réis; e na verdade lastimei quando se publicou e executou o Decreto de 13 de Agosto de 1832, e que um rasgo de penna privassse a Universidade destes 6:000$000 réis, e fosse locupletar com elles os emphyteutas, que não requereram, nem mereceram, nem esperavam tal beneficio, e que ainda um ou dous annos antes tinham empregado seus esforços, e diligencias, pêra obter aquelles emprazamentos, e que com elles ficaram mui contentes.
Este Projecto não toca nas dotações dos hospitaes, porque é propriedade particular destes; são antigos Estabelecimentos pios da Cidade, posteriormente annexados á Universidade; são tres — é o hospital da Conceição, da Convalescença, edo S. Lazaro — os quaes conservam os seus patrimónios, e tem a sua administração especial; que é comtudo hoje exercida no Governo Civil de Coimbra por um chefe, e empregados especialmente encarregados delta; de modo que hoje a Universidade não tem administração alguma de bens, nem seus, nem dos hospitaes, tudo é administrado pelo Governo Civil de Coimbra, ou pela Repartição delle destinada para isso, a qual arrecada, e faz entrar no cofre geral os fóros, ou rendas cobraveis, dentro do Districto de Coimbra, e manda para o Thesouro, ou para os outros Governos Civis, os róes, ou pautas de cobrança dos fóros, ou bens existentes em outros Districtos Administrativos; porém na verdade, não havendo uma Junta zelosa, que fiscalise a exactidão e legalidade dessas pautas de cobrança, e a effectiva arrecadação dos fóros, e rendas nellas relacionados, não acho seguro nem util este systema actual de administração dos bens e rendas que foram da Universidade, e hoje são nacionaes, e por isso não tenho duvida em approvar o Projecto, e muito principalmente em quanto á avaliação dos predios urbanos, que não forem necessarios para o serviço da Universidade, os quaes progressivamente se vão arruinando, e tornando-se mais gravosos á Fazenda, pela despeza de reparos.
Eis-aqui os esclarecimentos de facto, que tinha a apresentar.
O Sr. C. de Thomar — Eu, Sr. Presidente, vejo que as explicações que tinha a dar, foram mui bem e sabiamente expendidas por S. Em.ª o Sr. Cardeal Patriarcha; e por conseguinte, cedendo da palavra, declaro que voto pelo projecto na sua generalidade.
O Sr. Serpa Machado — Sr. Presidente, depois do que acabou de dizer S. Em.ª o Sr. Cardeal Patriarcha, escusado seria eu fallar sobre esta materia: todavia, sempre direi duas palavras sobre os interesses de uma Corporação a que pertenço.
Se acaso os rendimentos da Universidade estivessem naquelle estado de augmento, a que a munificencia da maior parte dos Reis de Portugal o tinha levado, eu era de opinião, que se lhes dessem os bens, que actualmente existem, para a boa manutenção de uma Corporação de tal natureza, que não deve estar exposta a eventualidades; mas depois dos seus rendimentos estarem por assim dizer, quasi extinctos, pela abolição dos dizimos, e de muitos outros direitos que percebia, restando apenas uma pequena cousa, entendo que seria de grande prejuiso não se tomar esta medida. Os rendimentos estão reduzidos aquillo, que disse o Emminentissimo orador, que me precedeu, e administrados debaixo da direcção da fazenda publica; são já despojos mortaes daquelle Estabelecimento; e uma vez que a Junta senão installou, e tractou de os administrar, hoje difficil será fazer-se isso, e tanto mais, que as pessoas a quem incumbe o ensino, não se devem, nem bem se podem dedicar amais cousa alguma de tão difficil administração, e por conseguinte nenhuma duvida tenho em approvar este projecto.
Farei por esta occasião menção de uma Representação que a Camara Municipal» de Coimbra fez ao Corpo Legislativo na outra Camara relativamente a dous predios urbanos, que a Universidade possue nos Rocios da Cidade isto é no Terreiro chamado da Feira, ou da Sé e que pede sejam demolidos, pela sua insignificancia, e deformidade daquella Praça; e como o Governo fica authorisado para fazer a separação dos bens que hão de ficar pertencendo á Universidade, poderia separar aquelles para serem demolidos.
Nada mais tenho a accrescentar, e nem mesmo teria pedido licença para fallar, se soubesse que havia de fallar primeiramente o orador, que me precedeu.
O Sr. Sousa Azevedo — Sr. Presidente, eu tambem serei muito breve, e farei poucas observações sobre a materia na generalidade, porque a Camara se acha esclarecida, depois das explicações que acaba de dar o Sr. Patriarcha; e entendo, que sobre a discussão do Projecto na generalidade, não póde haver questão, e sómente poderá talvez haver duvida de algum D. Par na especialidade, sobre as provisões que se conteem nos artigos e paragraphos; mas quanto ao principio, não me parece, que a possa haver.
A generalidade deste Projecto não tende senão a constituir na Repartição competente do Thesouro, e na administração superior dos bens da Nação, aquelles que estavam exceptuados por uma Legislação, que caducou, quaesquer que fossem os motivos por que se estabeleceu; e S. Em.ª, o Sr. Patriarcha, já declarou as razões por que aquella administração não póde ter logar. É para observar, que desde a Lei de 6 de Novembro de 1841, que tirou da regra geral a administração destes bens, ainda ate hoje não se tinha tomado nenhuma medida geral, nem especial sobre o objecto; e por Isso o Tribunal do Thesouro Publico dirigiu varias representações ao Governo pelo Mi
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nisterio competente, fazendo vêr os inconvenientes que resultavam de estarem aquelles bens fóra da regra geral de administração, e não podendo por isso o mesmo Tribunal exercer sobre elles a jurisdicção, que lhe competia pela Carta Constitucional, e respectivas Leis; concluindo pela necessidade de uma providencia a este respeito. Por tanto é claro, que a generalidade deste Projecto não é mais do que a observancia do principio geral sobre a administração dos bens nacionaes, que teem estado desviados de regra commum; e que não só se acham deteriorados, mas até a seu respeito não se tem procedido convenientemente, como ácerca dos outros bens: fallo do Cadastro geral dos bens da Nação, do qual os D. Pares teem conhecimento, porque se distribue com o Diario do Governo uma folha deste Cadastro.
O Tribunal do Thesouro Publico entendeu, que aquillo que era necessario para o bom governo de um particular, que deve ter uma relação dos seus bens com todos os esclarecimentos, tambem a nação o devia ter; e como esta ha pouco tempo adquirira uma porção de bens, cuja existencia, e circumstancias teem sido de difficil conhecimento, porque quem os possuia cedeu-os de máo grado (fallo das casas religiosas extinctas); era necessario supprir a falta, que provinha da irregular entrega dos antigos Cartorios, e da occultação ou extravio de muitos livros, e cadernos, que desappareceram, achando-se assim a administração publica n'um cahos, sem se saber com alguma exactidão qual era a massa dos bens, que pertenciam á Nação. Na presença desta difficuldade, entenderam os Membros do Tribunal do Thesouro Publico, que não deviam recuar diante dos obstaculos (Apoiados), e dedicaram-se ao trabalho de estabelecer as bases, e methodo de confeccionar o trabalho do Cadastro geral dos Bens Nacionaes, cujo desenvolvimento pratico foi incumbido a uma Commissão especial. O Sr. C. do Tojal, que então era Ministro da Fazenda, approvou a proposta do Tribunal em conveniencia do serviço publico, do que muita honra lhe resulta. Convém saber-se, que a despeza que se faz com este importante trabalho é muito diminuta, porque se escolheram de entre os Empregados do Thesouro Publico os mais capazes para darem conta desta incumbencia, com uma insignificantíssima gratificação, que consta do Orçamento. Este importante objecto vai em consideravel progresso, pois alem do que se acha publicado no Diario do Governo, ha trabalhos promptos para mais de quarenta folhas, que serão publicadas, e distribuidas com o mesmo Diario. Tem-se procedido ao mencionado exame de todos os Cartorios das casas religiosas extinctas, dos registos dos Tribunaes do Conselho de Fazenda, e da Mesa da Consciencia e Ordens, e em resultado desta laboriosa averiguação tem-se obtido o conhecimento da existencia de muitos direitos, e creditos da Fazenda Publica, de que nada constava, e por isso estavam fóra de administração, e cobrança. Mais de dez mil fóros e capitães a juros, só da Provincia da Estremadura, se acham já extractadas, e em cada extracto se declara a qualidade do fôro, quantidade, especie, e demais circumstancias; e quanto a dividas se mostra o nome do devedor, sua habilitação, o anno do contracto, a nota do Tabellião em que se fez a Escriptura, que a hypotheca, situação da propriedade, seu titulo, e quanto mais é necessario para se chegar ao conhecimento das pessoas actualmente responsaveis por essas dividas. Sendo, como disse, mais de doze mil os extractos, porque se mandou examinar sobre a existencia dos responsaveis, reconheceu o Tribunal, que era necessario mandar proceder a esta diligencia com a maior actividade; e, para auxiliar as Authoridades locaes administrativas, nomeou um Empregado de zêlo e intelligencia, e obteve em resultado, que nos livros das respectivas Administrações não havia conhecimento, quasi da totalidade daquelles direitos, e creditos da Nação! Já se vê, que entre doze mil extractos ha de necessariamente haver muitas falhas, pessoas insoluveis por seu estado de falta de meios, e mesmo distractes, que se não averbassem; mas ainda com esses descontos, grande conveniencia ha de resultar á Fazenda Publica desta diligencia, podendo eu asseverar á Camara, que só de capitães a juro já se apurou a quantia de 132:159$411 réis. É pois evidente, que o mesmo exame e diligencias, empregadas ácerca dos bens da Universidade, ha de produzir iguaes resultados.
S. Em.ª já disse, que eram mais de dous mil os fóros da Universidade de Coimbra, e que talvez existissem outros, de que não houvesse conhecimento, o que tenho como certo, e bem assim, que applicados os meios ha de obter-se o fim o de augmentar legalmente o cathalogo dos Bens Nacionaes. Por tanto, não ha razão nenhuma para se duvidar da approvação deste Projecto, cujo fim é tão sómente fazer comprehender na administração central da Fazenda, os bens que estavam fóra della, por virtude da Lei de 6 de Novembro de 1841, e por consequencia nenhuma duvida póde haver em approvar-se a generalidade do Projecto, a que dou o meu voto, como já dei na Commissão de Fazenda.
O Sr. Presidente — Tem a palavra o Sr. Rodrigo da Fonseca Magalhães.
O Sr. Fonseca Magalhães — Cedo da palavra.
O Sr. Presidente — Não ha mais nenhum D. Par inscripto sobre a generalidade do Projecto, e por tanto a vou pôr á votação da Camara.
Approvada a Proposição na generalidade..
O Sr. Presidente — Está approvada. Passamos á especialidade; do Projecto.. Art. 1.º Os predios rusticos e urbanos, os fóros, censos e pensões, e os capitães dados a juro, pertencentes á Universidade de Coimbra, que se acham incorporados nos Próprios Nacionaes, continuarão a ser administrados pela mesma fórma que se observa na administração de iguaes bens, que estão, na posse da Fazenda Nacional. _ Foi approvado sem discussão.
Art. 2.º O Governo designará e "separará por um Decreto, e por uma só vez, as propriedades indispensaveis para o serviço da Universidade, as quaes continuarão a ter essa applicação.
O Sr. Fonseca Magalhães — Eu tenho pouca fé na utilidade deste Projecto; e o estado em que se acham os bens de que se tracta concorre para diminui-la. Ha tanto tempo que se mandou organisar, já não digo um cadastro, mas a simples relação delles, e tudo em vão! Pelo que respeita ao artigo (leu) estes que se mandam separar para serviço da Universidade, são predios rusticos ou urbanos? (Uma voz — Urbanos.)Por um Decreto, e por uma vez sómente, se ordena, ou antes authorisa essa separação. Talvez fosse melhor não restringir tanto esta faculdade; porque póde acontecer que successivamente appareçam alguns bens, que venham a ser considerados necessarios para uso e serviço da mesma Universidade. Acontecendo isto, mais trabalho e demora haveria em obter a propriedade de taes bens.
Isto pouco vale — bastaria modificar a redacção do artigo. Em quanto á qualidade dos bens, entendo que seria boro comprehender na expressão quaesquer que elles fossem rusticos ou urbanos. (O Sr. Presidente — O D. Par faz favor de mandar para a Mesa.) Ouvirei, Sr. Presidente, a explicação de algum D. Par, que falle neste objecto, e depois conforme parecer necessario mandarei ou não.
O Sr. Presidente — Muito bem.
O Sr. Patriarcha — Peço a palavra para uma explicação.
O Sr. Presidente — Tem V. Em.ª a palavra uma explicação.
O Sr. Cardeal Patriarcha — Eu principio pela explicação. — O D. Par parece-me, que talvez intendesse do que eu disse — que não se tem apurado nada dos fóros e bens da Universidade neste tempo — e eu devo dar uma explicação. O Chefe da Repartição do Governo Civil que está encarregado destes trabalhos, é um homem dignissimo, que tem trabalhado incesssantemente neste objecto, e que tem (segundo me consta) extrahido relações muito importantes de fóros da Universidade: é José Maria Pereira, antigo Empregado da Junta da Fazenda da Universidade, e que era Deputado Secretario della, quando foi extincta, continuou sempre como Chefe da Repartição encarregada desta administração e cartorio da Fazenda da Universidade e dos Hospitaes a dirigi-la com muita honra, zêlo, assiduidade, e capacidade; era dever de justiça, e para mim mui grato, dar esta explicação, e testimunho de seu merecimento e bons serviços. Ha trabalhos importantes, e -muitas relações se tem já extrahido dos bens e fóros pertencentes á Univerdade, que tem sido transmittidos ás Administrações dos logares em que são situados os fofos ou os bens; e por onde devem cobrar-se os rendimentos. Agora quanto á doutrina do artigo 2.º do Projecto, parece-me que o Governo não separará propriedades algumas para uso proprio da Universidade, senão em consequencia de consulta ou representação da Universidade ou dó seu Reitor, mostrando a necessidade ou grande conveniencia dessas propriedades para o desempenho das funcções da Universidade, para uso e commodidade dos seus estabelecimentos, para bem do ensino: póde isto ter logar assim em predios urbanas como em predios rusticos, e nisto me parece que não poderá haver duvida: por exemplo, ácerca do Collegio dos Bentos, póde julgar-se necessario para os exercicios agronomicos, e para complemento do jardim botanico. Por consequencia a Universidade deve representar, e o Governo verificar quaes são os predios rusticos ou urbanos, que são necessarios para os laboratorios e estabelecimentos da Universidade, para a imprensa, e para o jardim botanico; e para os hospitaes, que estão annexos, para a escola pratica da Medicina; assim, por exemplo, o Collegio dos Jeronymos, foi já applicado e está servindo de hospital de convalescença, que antes os doentes tinham no mesmo hospital da Conceição, em que se tractam as doenças; e este e outros edificios urbanos, que pertenceram aos Regulares, e dos quaes foram provisoriamente applicados para a Universidade os do bairro alto, podem ser separados definitivamente, e applicados para uso dos estabelecimentos da Universidade ou a ella annexos. Por tanto, não me parece que seja objecto de grande reparo este artigo 2.º, e confiu que o Governo não ha de fazer isto de leve, mas sobre representação fundada e verificada (O Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros — Peço a palavra), e sem uma consulta fundada do Reitor da Universidade, ou da Corporação, e então pelas razões apresentadas verá se a conveniencia do serviço pede que tal ou tal edificio seja separado.
O Sr. Presidente — Tem a palavra o Sr. Rodrigo da Fonseca Magalhães para uma explicação.
O Sr. Fonseca Magalhães — Sr. Presidente, está longe, e muito longe de minha idéa a supposição de que algum empregado da Universidade merecesse menos confiança. Não alludi a falta de capacidade, ou a falta de zêlo de nenhum. Se ha esses trabalhos e esclarecimentos que S. Em.ª menciona, e decerto os ha, o Governo terá conhecimento delles; e talvez tivesse rido util haver apresentado á Camara áparte de taes esclarecimentos, que illustrasse a discussão do projecto.
Desejara eu saber que bens são esses que cumpre separar, não só para o serviço da Universidade, mas tambem para o dos Hospitaes. Estes parece-me que teem bens proprios seus, e os administram independentes da Universidade: em tal caso, para que é preciso separa-los, se eu já os considero separados? Desejo saber porque essa provisão sobre os bens dos Hospitaes se julga dever ter logar neste projecto, uma vez que as corporações a que elles pertencem os administram fóra da superintendencia da Universidade.
Que difficuldade pois poderá haver em se inserir aqui, que o Governo, sobre consulta da Universidade, designará e separará o que entender ser preciso, e conveniente? Aqui diz-se isto (leu.)
Entendo que na Universidade deve haver uma escola de agricultura pratica, e eu conheço uma propriedade muito propria, e contigua, que é a antiga cêrca dos Bentos, a qual é um excedente, terreno para poder ser destinado a uma escola de agricultura, se é que ainda não tem alguma applicação; mas é provavel, ou quasi certo que terá. Quando eu e alguns outras Membros desta Camara fomos Deputados, discutimos uma Lei de instrucção publica; e pareceu-nos que havia necessidade de estabelecer escólas de agricultura; e até algumas foram decretadas; mas ficaram em Leis, como muitas vezes acontece no nosso Paiz. É preciso porém desenganar-nos de que isso succede menos pela imperfeição de taes Leis, do que pela sua não observancia; e daqui vem a falsa necessidade que temos de estar sempre a fazer Leis novas: disto é exemplo a com que agora nos occupamos. Mas vamos ao ponto principal.
Nessa Lei de instrucção publica, decretou-se o estabelecimento de mais de uma dessas escólas praticas de agricultura, encabeçando, e muito bem, taes creações no systema geral de instrucção publica; porém nenhum desses estabelecimentos se fundou. A Universidade é o nosso principal, e mui respeitavel estabelecimento de instrucção superior e secundaria; e de certo lhe pertence superintender e dirigir uma boa escóla pratica de agronomia. Ha lá Um jardim botanico, e fôra de certo util alem de decoroso, que junto ou proximo a elle houvesse uma quinta modelo. Este jardim, segundo me consta, apresenta hoje uma prova do progresso que fazemos, muito differente do que fóra algum dia logo depois de creado pelo nosso illustre sabio, o Sr. Brotéro, cuja sciencia illustrou o nome portuguez em toda a Europa. Se se entender que falta esta escóla pratica de agricultura, e que importa estabelece-la, tenha-se isso em vista antes da alienação dos bens; e não succeda como a mim aconteceu com uma porção de terreno defronte do convento da Estrella nesta Capital em 1835: porque havendo-o destinado o Governo para um parque, ou passeio publico, quando quiz separa-lo dos bens que deviam vender-se, achei-o já em mãos do compra dor; e tarde veiu a ser adquirido de novo, e pago a seu dono. (Uma voz — O terreno lá está) É verdade que o terreno lá está, mas a obra nunca se fez. (Uma voz—Não ha dinheiro.) Eu não duvido que falte o dinheiro; mas é sabido de todos, que eu algum obtive para isso, e algumas medidas tomei; porém debalde. Bom que o terreno seja do Governo, porque ainda se fará a obra que reputo util e até necessaria. Insisto pois que, se houver algum terreno proprio para o estabelecimento de que tracto, ou para outro que se julgue conveniente, não se aliene, ainda quando se não possa logo entrar na feitura da obra. Espero que o D. Par, o Sr. Serpa Machado offereça alguma proposta neste sentido. (O Sr. Presidente — Rogo «o D. Par que queira mandar para a Mesa o seu additamento.) Sim, Senhor.
Additamento ao artigo 2.º
Art. 2.º O Governo designará; sobre consulta da Universidade, as propriedades urbanas, e rusticas indispensaveis para o serviço da mesma Universidade. — Fonseca Magalhães.
Admittido.
O Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros — Eu convenço-me de que o D. Par cederá do seu additamento, se eu lhe mostrar, que no projecto está comprehendida a sua idéa. S. Ex.ª sabe, que quando se falla de propriedades, são comprehendidas debaixo desta denominação as rusticas, e as urbanas: logo dizendo se aqui isto (leu o artigo), já o D. Par vê, que não procede a sua duvida. Em quanto porém á consulta da Universidade, de que falla o artigo, ella é precisa por ser a regra, modo, e pratica para se levar a effeito cousas taes, nem o Governo tem outro meio de se esclarecer. Se ainda houvesse alguma duvida, o D. Par ficaria tranquillo, vendo que a sentença do artigo é para conservar, e não para vender: se fosse para vender teria S. Ex.ª razão, pelo exemplo que referiu, de que quando quiz acudir para que senso vendesse um terreno, elle já o estava. Parece-me pois, que dadas estas explicações o artigo póde passar tal qual está.
O Sr. Fonseca Magalhães — Eu cedo do meu additamento.
O Sr. Serpa Machado — Essa imperfeição que apparece no projecto, está remediada pelo que acaba de dizer o Sr. Ministro da Corôa na declaração, que fica consignada; e na presença da explicação dada por S. Ex.ª certamente ficará satisfeito o D. Par o Sr. Fonseca Magalhães.
Agora observarei, que pelo projecto em discussão sómente se tracta da venda dos bens da Universidade, e esse terreno de que se fallou não é da Universidade. Se o Governo vir, que cêrca dos Bentos é conveniente para o estabelecimento da escola de agricultura como se acha provisoriamente sanccionado, faça esta acquisição ou transformação, pelos meios de que póde dispor.
Observarei por esta occasião que o laboratorio chymico tem tambem uma pequena cêrca, quê se não póde dispensar, porque está ligada com elle, e outras áreas ha, que tambem me podem deixar de pertencer á Universidade, pela precisão que ha dellas, por fazerem parte, e estarem ligadas com edificios que lhe pertencem, ou devem pertencer. Parece-me pois que se póde considerar perfeita a redacção do artigo na palavra propriedade, e passar como está.
Eu lembrei, que no rocio da Sé, ou da Cathedral de Coimbra, ha dous pequenos predios urbanos, que necessitam ser demolidos, e que assim o pede a Camara Municipal, para conservar o embellezamento da Cidade, os quaes tambem devem ser excluidos de alienação geral; mas diz-me o Sr. Ministro da Coro», que o Governo póde depois fazer isso por qualquer outro modo, como é apresentar um projecto separado para esse fim: eu concordo pois nisso, mesmo para senão ir agora intorpecer a passagem desta lei.
O Sr. Sousa Azevedo — Eu fui muito prevenido, sobre, o que tencionava dizer, pelo Sr. Ministro da Corôa. Tinha pedido a palavra para explicar, pôr parte da Commissão de Fazenda, quaes as razões porque esta entendia, que o artigo devia passar como está redigido, e para mostrar tambem, que no laconismo do mesmo artigo se diz mais, do que inserindo nelle o additamento do D. Par, o Sr. Fonseca Magalhães. Sr. Presidente, o artigo assim redigido fica mais claro, fica mais amplo, e extensivo, porque no termo — propriedades — estão comprehendidos os predios rusticos, os urbanos, e os mistos; mas te fôr inserido o additamento do D. Par, o Sr. Fonseca Magalhães— predios rusticos — longe de ampliar limita-se aquelle termo geral, e mais comprehensivo, como é sabido em direito. Ora, quanto á segunda parte do mesmo additamento piri que se estabeleça no artigo que o Governo ouvirá a Universidade, tambem tende a limitar a doutrina, porque dizendo-se no artigo, que o Governo designará os bens que devam separar para o serviço da Universidade, entende-se que elle o não fará sem cumprir o seu dever, e preencher os meios administrativos de todas as informações necessarias, para, sob sua responsabilidade levar a effeito o que esta Lei lhe incumbe, e neste caso com um voto de confiança; mas se de Lei se estabeleces e, que o Governo ouvirá a Universidade de Coimbra, poderia dizer-se que, preenchida esta solemnidade, a nenhuma outra ficava obrigado o Governo, por ser a unica que a Lei exigia; mas isto seria contrario a, todas as regras, e principios de administração; porque, o Governo deve ouvir as authoridades administrativas das respectivas localidades, e quaesquer outras, que possam esclarecer os objectos de que se tractar; e por conseguinte ficando redigido o artigo debaixo do principio geral comprehendo muito mais do que com o additamento do D. Par, no que S. Ex.ª me parece que concordará.
Persuado-me ter explicado bem o sentido de redacção do artigo, e termino, por não querer cançar mais a Camara, em objecto que entendo ser claro.
O Sr. Fonseca Magalhães — Peço licença para retirar o meu additamento.
Foi-lhe concedido.
O Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros — Pedi a palavra para dar uma simples explicação, e em resposta ao que disse o D. Par o Sr. Serpa Machado.
Sr. Presidente, o Governo, quando passe esta Lei, não se julga authorisado a poder fazer a separação, que o D. Par indicou, porque o Governo pão póde ceder cousa alguma pelo pedido de uma Camara Municipal; mas verificada que seja a conveniencia da demolição dos predios, a que S. Ex.ª se referiu, para o Governo não haverá cousa mais facil, do que vir apresentar ás Côrtes um Projecto de Lei a esse respeito, e sem duvida nenhuma as Côrtes resolverão favoravelmente; mas não me parece que isto possa fazer interromper um Projecto desta natureza.
Foi approvado o artigo 2.°
Art. 3.º Os predios rusticos e urbanos, os fóros, censos e pensões, os capitães dados á jure, e quaesquer outros rendimentos, que constituam a dotação especial dos Hospitaes administrados pela Universidade, continuarão a ter a mesma applicação..
§. 1.° Os predios urbanos comprehendidos neste artigo poderão ser vendidos, precedendo licença do Governo, requerida pela Authoridade, que tiver a seu cargo a administração desses bens, e á qual fica incumbindo a demonstração da necessidade, ou utilidade da venda.
§. 2.º O producto da venda será applicado na compra de outros bens, ou de Titulos de divida fundada; e os rendimentos dos bens ou Titulos assim adquiridos, farão igualmente parte da dotação dos mesmos Hospitaes.
§. 3.° O Governo regulará por um Decreto a fórma de execução deste artigo.
O Sr. Sousa Azevedo — Pedi a palavra, a fim de dar uma simples explicação sobre o §. 1.º, porque poderia algum D. Par fazer-me reconvenção sobre o que eu sustentei na redacção do artigo 2.º, e a que se acha neste §.;
Diz o §. 1.º do artigo 3.º—e á qual fica incumbido. — Ora isto era realmente escusado, por que se o Governo é que ha de dar a licença para a venda desses bens, quando seja requerida pela authoridade, que os administra, é certo que o Governo não concederá a licença, sem que essa mesma authoridade demonstre a necessidade de taes vendas. No entanto, a Commissão julgou dever deixar passar esta redacção, porque não propondo nenhuma alteração do projecto, e reconhecendo a sua utilidade, entendeu que por uma simples emenda de redacção, de que aliás não póde resultar prejuizo, não devia propôr, que voltasse o projecto á outra Casa.
Approvado o artigo 3.º
Art. 4.º Todos os predios urbanos e rusticos pertencentes á Universidade de Coimbra, que não são comprehendidos nas disposições dos artigos 2.º e 3.º, serão immediatamente vendidos em hasta publica.
§. 1.º O preço da arrematação será satisfeito pela seguinte maneira cinco decimas partes em Notas do Banco de Lisboa, pelo seu valor nominal, tres decimas partes em Acções com vencimento de juro sobre o Fundo especial de amortisação, pelo seu valor nominal, e duas decimas partes em Acções sem vencimento de juro, sobre o Fundo especial de amortisação, pelo seu valor, nominal.
§. 2.º, As Notas do Banco de Lisboa serão, entregues pelos arrematantes dentro de quinze dias, e as Acções dentro de sessenta dias, depois da arrematação..
§. 3.º Qualquer que seja a localidade da arrematação, os compradores poderão entregar no Thesouro Publico as Notas do Banco de Lisboa, e as Acções que tiverem a satisfazer.
§. 4.º Quando as Acções sobre o Fundo es-
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pecial de amortisação, apresentadas para satisfazer o preço de qualquer compra, forem de quantia superior á que ha a satisfazer, lançar-se-ha nellas a quota de abatimento pela quantia que tem a pagar, ficando as ditas Acções valendo sómente pela quantia restante.
Art. 5.º É livre aos arrematantes pagar em moeda corrente a totalidade ou parte do preço, que, na conformidade do artigo 4.°, tem de ser satisfeito em Acções sobre o Fundo especial de amortisação.
§. unico. As quantias entregues em moeda corrente, na conformidade do presente artigo, pertencem ao Fundo especial de amortisação.
Art. 6.º Todos os fóros, censos e pensões, pertencentes á Universidade de Coimbra, serão vendidos pelo mesmo modo estabelecido nos artigos 4.° e 5.º
Art. 7.º É permittida a remissão dos fóros, censos, e pensões, de que tracta o artigo antecedente.
§. 1.º O preço da remissão será o de vinte pensões.
§. 2.º O prazo para requerer a remissão será de seis mezes, contados da promulgação desta Lei.
§. 3.º As disposições dos artigos 4.º e 5.º são extensivas ao pagamento do preço da remissão.
Art. 8.º O distrate dos capitaes dados a juro poderá ser realisado nas especies, e pela fórma determinada nos artigos 4.° e 5.°, dentro de um anno, contado da promulgação da presente Lei.
Art. 9.º As Notas do Banco de Lisboa, e as Acções sobre o Fundo especial de amortisação, que se receberem em execução da presente Lei, serão golpeadas e trancadas na presença dos portadores, e remettidas depois á Junta do Credito Publico, para serem solemnemente queimadas.
Art. 10.º Todas as outras disposições que regulam ou regularem a avaliação, arrematação, e remissão dos bens e fóros pertencentes á Fazenda Nacional, serão applicaveis aos bens o fóros de que tracta a presente Lei, na parte em que se não oppozerem ás disposições dellas.
Art. 11.º O rendimento proveniente dos predios urbanos e rusticos, dos fóros, censos e pensões, os laudemios, e os juros dos capitaes, de que tractam os artigos 4.º e seguintes da presente Lei, em quanto similhantes bens não forem vendidos, remidos ou distractados, será applicado para o Fundo especial de amortisação.
Todos estes artigos (de 4.º a 11.°) foram approvados sem discussão.
Art. 12.° O Governo proverá de maneira que o Cartorio dos bens pertencentes á Universidade de Coimbra se conserve na mesma Universidade como archivo publico.
O Sr. M. DE PONTE DE LIMA — Eu desejava que me explicassem, que utilidade póde haver, em que no Cartorio da Universidade se conservem os titulos dos bens já vendidos. (O Sr. C. de Thomar — São os titulos dos proprietarios.) Os titulos pertencem a quem compra: logo, entreguem-se aos compradores desses bens.
O Sr. CARDEAL PATRIARCHA — A conservação do CartOrio da Universidade é muito interessante não só ao publico como tambem aos particulares (Apoiados), a maior parte dos proprietarios de certos Districtos que pertenciam á Universidade, eram foreiros della, a sua propriedade constava de prasos, cujos titulos se acham no Cartorio da Universidade, e para as suas questões particulares precisam muitas vezes de tirar as certidões das instituições dos seus prasos ou das suas investiduras. Durante á administração da Junta da Fazenda, acontecia em cada uma das duas Sessões que tinha por semana, apparecerem, muitos requerimentos de particulares a pedirem certidões de empresamentos; em algumas vezes appareceram vinte e trinta destes requerimentos, para se extrahirem por certidões documentos interessantes a particulares, que existem neste Cartorio, e daqui se vê a grande vantagem que resulta da sua conservação para os particulares; porque existem a certeza de ter guardado naquelle Cartorio todos os titulos e documentos desta ou daquella propriedade em quanto que para o publico necessariamente vem a haver uma grande vantagem em se guardarem e conservarem juntos e ordenados os titulos primitivos das rendas da Universidade, os seus tombos, e os quadernos de cobrança: o Cartorio da Junta da Universidade é vastissimo; enche tres grandes salas quasi iguaes a esta: ora se os livros, titulos, e papeis dalli se tirassem e viessem em carradas para o Thesouro, sem duvida alguma, tudo se confundiria, e ninguem mais saberia de documentos alguns (Apoiados), por conseguinte parece-me que é de interesse publico e particular a conservação daquelle Cartorio.
O Sr. SERPA MACHADO — Sr. Presidente, felizmente aquelle Cartorio escapou ao vandalismo sobre Cartorios e papeis que tem assolado o nosso Paiz durante esta época, e escapando a tanta invasão, tem por este modo salvado os interesses não só do publico, mas dos particulares; porque todo o proprietario de fóros daquella Corporação tão antiga, tem alli os seus documentos, e alli recorre quando se suscita qualquer questão; e eu mesmo delle me tenho servido por ser senhorio util de um importante prazo do dominio directo da Universidade. Olhando-o porém como archivo publico, eu o considero muitissimo interessante, pois nelle se acha, por assim dizer, uma serie de documentos desde o principio da monarchia, que são de grande subsidio para a Historia. Pena é que aquelle Cartorio só tenha um official encarregado do seu arranjo, o homem mais habil que conheço, de grande honra e experiencia; porém infelizmente não tem nem sequer um guarda chaves, nem quem tire o pó aos papeis, e cuide da limpeza, de modo que o official é quem abre e fecha as portas; mas eu espero que o Governo haja de o tomar em consideração dando-lhe o servente ou serventes necessarios; porque, depois da Torre do Tombo, não existe um Cartorio mais importante do que este.
Foi approvado o artigo 12.º
Art. 13.° Fica revogada a Carta de Lei de 6 de Novembro de 1841, e mais legislação em contrario.
Palacio das Côrtes, em 13 de Março de 1848. = (Com a assignatura da Presidencia da Camara.)
Approvado sem discussão.
O Sr. PRESIDENTE — Como o Projecto não soffreu alteração alguma, vou propôr á votação da Camara a sua redacção.
Approvada.
O Sr. PRESIDENTE — SUA MAGESTADE Destinou receber a Deputação, que lhe ha de apresentar os authographos dos Projectos de Lei, que nesta Camara foram approvados, para receberem a Sua Sancção, na Segunda feira (22) ao meio dia.
(O Sr. Cardeal Patriarcha torna a exercer a Presidencia.)
Passando-se á eleição da Commissão, que ha de examinar o requerimento do Sr. João Carlos do Amaral Osorio, pedindo a sua admissão na Camara, como filho do D. Par nomeado, B. de Almeidinha, sahiram eleitos
Os Sr.s Arcebispo de Evora.
C. de Thomar.
Gomes de Castro.
Pereira de Magalhães.
C. de Semodães.
M. Duarte Leitão.
D. de Saldanha.
O Sr. V. DE LABORIM — Pedi a palavra para ser informado, se já vieram do Governo os esclarecimentos sobre a indicação feita pelo D. Par o Sr. C. de Thomar, isto é, se ao conhecimento do Governo tinham chegado algumas representações de outras Camaras do Reino, ácerca do Projecto sobre coimas, porque me convem saber isto.
O Sr. Secretario V. DE GOUVÊA — Por ora ainda a Mesa não recebeu esclarecimento algum do Governo a esse respeito.
O Sr. PRESIDENTE — Segunda feira (22) haverá Sessão, e entrará em ordem do dia, a continuação do Parecer sobre a melhor, e regular publicação das Sessões da Camara, seguindo-se, se houver tempo, o Parecer n.º 26 sobre a Proposição de Lei n.º 16, transferindo para os Juizes Correccionaes o conhecimento das causas de coimas, e policia municipal. Lembro que ámanhã ha de reunir-se a Commissão Mixta — Está fechada a Sessão.
Eram quasi quatro horas.