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tro; mas nota a gravidade do assumpto e mostra que um bom tratado sobre este objecto resolve em grande parte a crise vinhateira do Douro. É o primeiro a reconhecer que o governo sempre póde concluir os tratados que deseja, porque dependem do mutuo consenso das partes contratantes; mas faz ver que tendo nós na reforma das nossas pautas tantos meios de favorecer a Inglaterra, sem prejuizo, antes com vantagem do nosso paiz, é mais facil ao ministro obter com concessões rasoaveis o que não podermos alcançar de outra maneira, e neste caso está a suppressão da escala alcoolica.

Terminando as suas observações, não quer deixar passar sem correctivo dois argumentos, se assim podem chamar-se, do digno par o sr. Vellez Caldeira, que desdizem da gravidade d'esta camara, e que não podem aceitar-se n'um parlamento serio. Foi o primeiro que o projecto em questão era uma injuria feita ao sr. Casal Ribeiro pelos seus collegas, que parecia não o julgarem apto para reger as duas pastas. Isto não se diz, e mal se póde commentar. Quem duvida da proficiencia, talento e serviços do sr. Casal Ribeiro? E como se póde fazer uma applicação pessoal e mesquinha de um projecto generico e elevado, cuja primeira iniciativa pertenceu a outro governo, em que nem o sr. Casal Ribeiro era ministro? Isto não é serio, não é grave, não é proprio de uma camara illustrada e não tem resposta. O segundo argumento do sr. Vellez Caldeira, que corre parelhas com o primeiro, é que, posto que outro ministerio tivesse proposto esta medida, todavia não tinha instado por ella. Logo o ministro, que a apresentou, quiz enganar a nação, quiz burlar o parlamento, e a apresentação do projecto foi mera impostura. Apresentou-o, mas não instou por elle! Isto não é cousa que se diga. Isto faz rir e não tem resposta séria. E é de lamentar que se ousem dizer taes cousas perante uma camara illustrada e grave como esta.

Pedindo desculpa d'estas observações, que só servem para que não passem desapercebidos e sem correcção argumentos que deslustram a camara, termina votando pelo projecto.

O sr. Silva Cabral: — Sr. presidente, unusquisque suo sensu abundat. Cada um exprime a sua opinião conforme o grau de intelligencia que possue; e devemos felicitar-nos de o poder fazer com toda a liberdade, qualquer que seja a posição que tomemos no debate, seguindo o impulso da consciencia no cumprimento dos deveres, que nos impõe a sociedade (apoiados).

Eu direi poucas palavras, não venho, não quero nem desejo fazer um discurso, e parece-me que a materia não exigiria grande desenvolvimento, e segundo o programma do governo e assentimento geral da sociedade seria ponto de simplicissima comprehensão e deliberação, se por ventura o espirito de partido não tivesse invadido o sanctuario da justiça e da administração, e se o que se chama opinião não tomasse o logar da virtude, da sabedoria, do desinteresse, da independencia, do patriotismo e da energia.

Negar, sr. presidente, que o sr. ministro dos negocios estrangeiros actual tenha a qualidade de energico, intelligente e illustrado, seria realmente uma grave injustiça (apoiados); mas ninguem o negou, nem isso está de certo no espirito de nenhum dos membros d'esta camara (apoiados); não é pois n'este sentido e por este lado que devemos considerar este objecto.

Sr. presidente, eu assignei vencido o parecer que se discute, porque tenho primeiro que tudo obrigação de ser coherente com os principios e com as opiniões sustentadas por mim tanto na imprensa como no parlamento; na imprensa por mais de dez annos, no parlamento por mais de vinte annos. Mas será este meu proceder um indicio ou prolegomeno de hostilidade ao governo? Não, porque adoptei como norma fixa de meu procedimento marchar ao lado do governo coadjuvando-o, quaesquer que sejam os cavalheiros que o componham, consequencia logica de que, livre e curado como estou pela minha idade e experiencia da ambição das pastas, gloria ephemera n'um paiz e n'uma quadra em que predomina o delirio de arrebatamentos imprudentes e illogicos, não sei nem devo considerar as materias senão no campo da justiça e do bem que podem produzir para a sociedade, sem me preoccupar das pessoas que exercem o poder executivo, desejando sempre que marchem por este caminho, condição indispensavel para o meu apoio. A liberdade e franqueza de minhas opiniões e do meu voto não se deixará nunca fascinar, espero o por Deus, pelo ouropel de blandicias tão usuaes em momentos e só em momentos difficeis.

Sr. presidente, poderia de certo modo, para justificar a declaração de vencido, que acrescento á minha assignatura, limitar-me a um non possumus, porque, se para mim é dogma politico a necessidade de economias e reforma, se esta necessidade é assumpto de crença geral da sociedade, se o gabinete espreitando ou respeitando esta crença nos apresentou como moto da sua administração economia e reforma: é evidente que, se para mim, humilde sacerdote d'essa religião, era e é um dever de consciencia o sustenta-la e defende-la, para o governo não é menos urgente e forçoso o acata-la, muito mais olhando para o estado da Europa (apoiados).

Nós vemos em todos os paizes, por um movimento quasi unanime de convicção, proclamarem-se as idéas de economia. Na Inglaterra, modelo de sensata e proficua administração e emporio de recursos pecuniarios, o governo fez e realisou importantes reducções economicas, que tocavam a cifra de alguns milhares de libras esterlinas; a França fez o mesmo; a Austria, no seu estado normal bem entendido, porque hoje não poderia vir para exemplo, fez tambem economias que subiram a muitos milhões de florins; a propria Hespanha tambem as fez; e emfim não houve paiz algum que não levantasse a bandeira das economias, hasteada tambem pelo ministerio actual no começo da sua gerencia nos negocios publicos.

Pois bem, se isto é, como eu o reputo, sincero, a consequencia é que devemos marchar em todos os negocios por este caminho para não quebrar a efficacia da sua influencia no espirito publico, porque, notem v. ex.ª e a camara, o exemplo que vem de cima, assim como é o mais pernicioso quando fementido porque leva a tudo a descrença, do mesmo modo é tambem o mais efficaz quando puro, coherente e de accordo com os principios que se proclamam (apoiados).

Não me importa que as economias que se possam fazer sejam de um real ou de muitos contos de réis ou milhões; o que é preciso é que haja coherencia dos factos com as idéas, e que a religião dos principios proclamados, e na presente hypothese altamente reclamados pelo estado da fazenda do nosso paiz, não seja menosprezada pelos pontifices, que lhe communicaram o valor da sua auctoridade e tardia experiencia.

O sr. Visconde de Fonte Arcada: — Apoiado,

O Orador: — Sr. presidente, é o ministerio dos negocios estrangeiros importante? Ninguem o duvida, todos o reconhecem se bem que, a ter de julgar pelos factos, deviamos decidir que não (apoiados).

Não me refiro a pessoas, não pretendo negar as qualidades eminentes de quem quer que for, pondo em duvida os seus serviços; mas o que não posso entender é como isto conduza a que seja absolutamente necessario separar a pasta dos negocios estrangeiros de alguma das outras pastas! E como em tão curto espaço de tempo se varia de opinião sob influencia das mesmas rasões!

Peço aos srs. ministros tenham a bondade de lerem com reflexão o decreto de 31 de dezembro de 1852, e de attenderem as rasões em que esse decreto se funda, a fim de decidirem, se attento o nosso estado, e conforme o rigor de uma logica que não tenha o sabor de bastarda, não seria mais aceitavel e mais conveniente, em logar de propor a separação de uma pasta, decretar antes a reunião de outras?

De 1852 para cá tem quasi sempre estado diversos ministros com duas e até tres pastas; no tempo do grande marquez de Pombal, com a vastidão de territorio que a nação então dominava, com a multiplicidade de assumptos, em que crises de dolorosa recordação occupavam a attenção dos ministros, com as immensas e importantes reformas e melhoramentos que se introduziram na administração do paiz, os ministros que presidiam á gerencia dos negocios publicos, e que dirigiam a nau do estado, não eram metade do numero dos que actualmente se pretende estabelecer. Como se póde pois justificar este empenho de augmentar pastas a não recorrer a esse espirito de interesse de partido a que acima me referi? (Apoiados.)

Sr. presidente, o decreto com força de lei de 31 de dezembro de 1852 diz que, sendo da maior conveniencia estabelecer toda a economia na administração, e podendo unir-se, sem inconveniente, o ministerio dos negocios estrangeiros a outro ministerio, com a clausula de passar para a repartição das obras publicas o serviço dos correios, se determinava primeiramente que fosse supprimido o logar de ministro e secretario d'estado dos negocios estrangeiros, em segundo logar (artigo 2.º) que essa pasta ficaria annexa ao presidente do conselho, salvo apenas o caso de exigir a conveniencia do serviço, que, por excepção, e em caso especial, fosse servida por algum dos ministros das outras pastas. O fim, o motivo e a significação de uma similhante providencia apparece visivelmente a todos os que não quizerem fechar os olhos á rasão.

Quando é que foi publicado aquelle decreto? Quando as idéas da economia tinham, como agora, segundo se diz que têem, dominado o pensamento ministerial; tinha-se tomado uma exorbitante medida com a qual se entendeu que o deficit ficava morto; tinha-se estabelecido, é verdade, sobre um principio de violencia, o decreto com força de lei de 18 de dezembro, mas adoptada a medida, o caso todo era seguir o pensamento, continuando na idéa de que havia um verdadeiro empenho de economia, unico modo de attenuar ou modificar a má impressão que dentro e fóra do paiz tinha produzido aquella medida; era forçoso alimentar a idéa que o relatorio d'aquelle decreto fazia presentir de que d'ahi em diante as despezas corressem regularmente sem ser necessario de futuro exigir mais sacrificios.

Debaixo do predominio d'esta idéa, ou d'esta esperança, foi que se decretaram aquella e outras providencias de maior ou menor alcance, seguindo-se porém sempre o mesmo principio da coherencia, a idéa de economia, como uma especie de satisfação dada á opinião publica, que então, como sabemos, estiva muito agitada.

Agora vejamos em que conjunctura se estabelece a providencia que vem hoje n'este projecto! É exactamente quando a divida publica tem crescido extraordinariamente, quando o deficit, que então se dava por morto, está elevado a proporções notavelmente desproporcionadas com os nossos actuaes recursos, segundo as declarações do proprio governo, unicas, por que na presente especie me dirijo! É ainda exactamente quando diante de nós está a perspectiva do augmento d'esse deficit, progressivo e constante, a não ser que se recorra ao remedio, o extraordinario augmento de impostos, sobre que o ministerio mais de uma vez tem em suas declarações prevenido o paiz,,embora, para assim dizer, se corra o risco de esterilisar a agricultura, a industria e o commercio, e todos os outros elementos da prosperidade publica. Quando temos diante de nós a nova proposta de um emprestimo de nada menos de 6.500:000$000 réis, assim como presentimos outros encargos muito graves que se têem creado, e que em dois ou tres annos hão de principiar a actuar sobre a administração publica por uma maneira muito onerosa; parte de cujas difficuldades já previ em 1862 que então foram qualificadas de imaginarias, e as minhas advertencias de velharias. Confesso que não entendo como é que em circumstancias mais aggravadas, como são certamente as de hoje, se possa sustentar que não se deve manter uma economia, que em occasião de certo muito mais favoravel se julgou util e necessario fazer-se! (apoiados). Verdade é que se nota ser a quantia muito pequena, mas a isto respondo, que não é a quantia o que determina o meu juizo mas sim a manutenção e guarda do principio, que desejava não ver desprezado; e desprezado é elle todas as vezes que se manifesta a tendencia para augmentar as despezas publicas, desvirtuando-se assim as declarações do proprio governo, aliás tão precisadas de serem inalteravelmente sustentadas pela virtude do principio primeiramente, e depois para que o credito não seja prejudicado, e a descrença não affecte as differentes classes da sociedade.

Já se vê pelo que venho de enunciar que não é a quantia da despeza, que quando muito póde montar a 4:400$000 réis, que me preoccupa; mas sim considerações de outra ordem e todas visivelmente encaminhadas a que a opinião publica não considere fallazes as promessas do governo sobre economia e reforma, o que seria de grande prejuizo para a causa publica e para o proprio credito e competencia administrativa do gabinete, que sinceramente declaro não desejaria ver compromettida por factos que implicam contradicção com as suas declarações.

Por estes motivos e pelas idéas constantes que tenho seguido em relação a economias e reforma, caminho seguro de chegar a desideratum de uma solida organisação, e por ver o bom fundamento com que os quatro ministros de 1852, os srs. duque de Saldanha, Rodrigo da Fonseca Magalhães, Fontes Pereira de Mello e Jervis de Athouguia, assignaram aquelle decreto de 31 de dezembro de 1852, emquanto hoje proclamando-se a mesma necessidade e theoria vem trucidar a propria obra, não posso por maneira alguma julgar que seja indispensavel separar a pasta de que se trata, e não continuarem as cousas como estavam estabelecidas, embora essa pasta fosse servida conservando-se a disposição do decreto relativamente ao presidente do conselho, a quem pertence a mesma pasta em regra geral e primeira linha.

Sr. presidente, estes são os motivos que me levaram para não ser incoherente commigo mesmo, a assignar vencido aquelle parecer, tendo o maior sentimento de o fazer, por que declaro sinceramente que, quando o governo for no caminho do justo, honesto e conveniente para o meu paiz, eu hei de acompanha-lo com toda a franqueza e lealdade, e com os pequenos recursos que possuo; mas quando se trata de qualquer objecto que contrarie as minhas opiniões sustentadas na imprensa e no parlamento, eu não posso deixar de as manter intactas e puras dentro dos limites da rasão e da boa politica.

Sr. presidente, Plutarcho traz um apologo muito engraçado de que eu me servirei para concluir estas poucas palavras; diz que a Lua foi pedir a Jupiter que lhe desse um vestido. Desgraçada! respondeu-lhe Jupiter, pois tu que mudas de phases todos os oito dias, vens pedir um vestido? Qui potest capere capiat. Tenho dado o meu voto.

O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros e das Obras Publicas (Casal Ribeiro): — Entendi que não devia deixar encerrar a discussão sem dar algumas explicações por parte do governo, a que tenho a honra de pertencer, sobre o projecto em discussão.

Para cumprir um dever por occupar esta cadeira, e tambem tendo a honra de ser membro d'esta camara, tinha necessidade de tomar a palavra para defender quanto em mim cabe o projecto que se discute.

O discurso do digno par, que acaba de fallar, o mais extenso, o mais largo de todos com que se tem impugnado este projecto, começou por uma exclamação, e acabou em um apologo; seguiu todas as velhas regras da rhetorica, velhas mas respeitaveis sempre; começou, como recommenda o Quintiliano, pelo proemio e acabou epilogo; faltou-lhe só o que devia estar no meio — demonstração.

Eu atterrei-me quasi com o preambulo do discurso do digno par; julgava e receiava que o governo tivesse commettido peccado grande apresentando este projecto, quando ouvi fallar em sacrificios da rasão e da justiça ás conveniencias partidarias. Mas, felizmente, o digno par veiu tranquillisar o meu espirito, e livrar-me do escrupulo, serenar-me a consciencia, porque me tratou pessoalmente com extrema benevolencia, e teve até a bondade de me attribuir qualidades que sou o primeiro a reconhecer que não possuo, e mais ainda porque affirmando que a sua opposição ao projecto nada tinha de pessoal nem mesmo de politica (O sr. Silva Cabral: — Apoiado.), s. ex.ª estava resolvido, o que eu agradeço cordealmente, a continuar auxiliando os ministros que estão n'estas cadeiras a levar a pesada cruz da governação todas as vezes (bem entendido) que a sua consciencia sempre recta e a sua convicção sempre firme lhe não prescreveram o contrario.

Já se vê por tanto que não é ao governo que se dirige o que podia haver de desagradavel na allusão com que terminou o discurso do digno par, e aqui digo tambem com s. ex.ª qui potest capere capiat.

Se Plutarcho, que apesar de ser um escriptor muito respeitavel e conhecido de todos, e sempre lido com interesse em assumptos astronomicos, tem talvez minguada auctoridade, e foi pelo menos um pouco excedido por Galileu e Copernico, se Plutarcho referindo certas conversas do sol e da lua attribuiu a não sei qual dos astros que mudava frequentemente de vestidos (creio que á lua), não era de certo ao governo, em vista das benevolas declarações do digno par, que póde referir-se qualquer allusão menos grata que se possa tirar do apologo. Não póde ser ao digno par tambem, por que s. ex.ª disse que estava disposto sempre, sempre e sempre, a apoiar todos os governos sem excepção,