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CAMARA DOS PARES DO REINO.

SESSÃO DE 18 DE JULHO DE 1848.

Presidiu — O Sr. Cardeal Patriarcha.

Secretarios — Os Srs. M. de Ponte de Lima.

Margiochi.

Aberta a Sessão pouco depois das duas horas, estando presentes 34 D. Pares, leu-se e approvou-se a Acta da ultima Sessão — Concorreram os Srs. Ministros dos Negocios Estrangeiros, e da Justiça.

O Sr. C. da Ponte de Santa Maria — Peço a palavra antes da Ordem do dia.

O Sr. Presidente — Não ha correspondencia, e tem a palavra o Sr. C. de Santa Maria.

O Sr. Fonseca Magalhães — Peço a palavra antes da Ordem do dia.

O Sr. C. da Ponte de Santa Maria — Por parte da Commissão de Guerra tenho a apresentar dous Pareceres, sendo um sobre a Proposição de Lei n.º 50, e o outro sobre a de n.º 51.

O Sr. C. de Thomar — Peço a palavra antes da Ordem do dia.

O Sr. Presidente — Creio que a Camara dispensa a leitura destes Pareceres (Apoiados). Então mandam-se imprimir para se distribuirem e darem para Ordem do dia (Apoiados). Tem a palavra o Sr. Fonseca Magalhães.

Foram os Pareceres a imprimir (1).

O Sr. Fonseca Magalhães — Pedi a palavra para lêr um Parecer da Commissão de Administração Publica sobre o Projecto de Lei n.º 42 vindo da Camara dos Srs. Deputados. Está assignado por todos, e á excepção do Relator, cuja honra me cabe, os mais Srs. assignaram ou vencidos, ou com declarações.

Foi a imprimir (2).

O Sr. Presidente — Tem a palavra o Sr. C. de Thomar.

O Sr. C. de Thomar — Mando para a Mesa a seguinte

Proposta.

Proponho que se recommende ao Governo que faça inserir no Orçamento do anno futuro o quadro do pessoal da Secretaria e Empregados da Camara dos Pares, com declaração dos seus ordenados; e bem assim a verba necessaria para as despezas a cargo da mesma Camara. Em 18 de Julho de 1848. = C. de Thomar.

Approvada.

O Sr. Secretario Margiochi — Está sobre a Mesa a informação, que se exigiu á Secretaria da Camara dos D. Pares a respeito do modo como é administrada a Bibliotheca das Côrtes; informação pedida pelo D. Par o Sr. Sousa Azevedo na ultima Sessão, e não sei se a Camara quererá que se leia, ou o D. Par quererá que lhe seja remettida.

O Sr. Sousa Azevedo — Como a Camara quizer.

O Sr. Presidente — Será melhor que lhe seja enviada.

O Sr. Sousa Azevedo — Se a Mesa quizer que me seja remettida, eu a examinarei, e verei o que é conveniente fazer.

O Sr. Secretario Margiochi — Tambem está sobre a Mesa um Requerimento feito a esta Camara pelo Conselho Vogal de Beneficencia, comprehendido nas Classes inactivas, em que pede lhe seja conservada a outra parte dos vencimentos que lhe fôra eliminada do Orçamento.

O Sr. Sousa Azevedo — V. Ex.ª sabe, que a Commissão de Fazenda juntamente com as outras do Orçamento tem os seus trabalhos muito adiantados, e já teve em vista este objecto: portanto, parece-me que o Requerimento deve ficar sobre a Mesa para na occasião da discussão ser tomado em consideração; mas se V. Em.ª o quer mandar á Commissão... (O Sr. Presidente — Fica sobre a Mesa para ser considerado na occasião da discussão do Orçamento). E V. Em.ª quando tiver logar a discussão, tem o cuidado de annunciar á Camara que existe este Requerimento sobre a Mesa.

Assim se resolveu.

O Sr. Presidente — Ninguem mais tem a palavra e vamos á Ordem do dia...

O Sr. Sousa Azevedo — Peço a palavra para um objecto importante (O Sr. Presidente — Tem a palavra). Ha um Parecer da Commissão de Fazenda, sobre materia urgente, e como não está presente o Sr. Relator, poderia lê-lo o Sr. Presidente da Commissão, se V. Em.ª o permittisse.

O Sr. Presidente — Sim Sr.

O Sr. C. de Porto Côvo — É o Parecer sobre a Proposição de Lei n.º 60.

O Sr. Presidente — Manda-se imprimir.

O Sr. Sousa Azevedo — Sr. Presidente, é necessario lembrar á Secretaria, que ha de escrever-se o Projecto em harmonia com o Parecer, e que deve vir impresso em duas columnas.

Mandou-se imprimir na fórma indicada (3).

O Sr. Presidente — Continúa a discussão do art.º 1.º do Projecto n.º 29, e as emendas que foram admittidas á discussão; tem a palavra o Sr. Ministro da Justiça.

ORDEM DO DIA.

Parecer n.º 48 sobre a Proposição de Lei n.º 29, relativa á transferencia dos Juizes de Direito, cuja discussão tem começo a pag. 1072, col.ª 2.ª

Reproduziu-se a discussão, por não ter ficado votado, do Art.º 1.º Os Juizes de Direito de primeira e segunda Instancia no Continente do Reino e Ilhas adjacentes, poderão ser mudados pelo Governo de umas para outras Comarcas ou Relações, quando o bem do serviço publico assim o exigir, precedendo audiencia, por escripto, dos Juizes, cuja transferencia se pretender effeituar, e voto affirmativo do Conselho de Estado.

§. unico A transferencia se effeituará para logar que esteja vago. Senão estiver logar algum vago na occasião que se decretar a transferencia, o Governo designará o primeiro que vagar, ficando entretanto o Juiz sem exercicio com o ordenado por inteiro.

Proposta do Sr. C. de Lavradio ao art.º 1.º

Proponho a eliminação do art.º 1.º = C. de Lavradio.

Proposta do Sr. B. de Chancelleiros sobre o dito art.º

Proponho que se supprimam no art.º 1.º as palavras = segunda Instancia. = B. de Chancelleiros.

O Sr. Ministro da Justiça — Sr. Presidente, eu tinha hontem pedido a palavra quando o nobre D. de Palmella estava orando contra as transferencias, fundando as suas observações principalmente no defeito, que encontrava na inamovibilidade dos Juizes. Eu direi muito poucas palavras em resposta á objecção de S. Ex.ª, direi que seria muito logica se tractassemos de reformar artigos da Carta, mas como nós não tractamos senão do desenvolvimento dos principios da mesma Carta, as observações de S. Ex.ª cahem em vista da mesma Carta, e já tinha mostrado pela lettra da segunda parte do artigo 120.º que os Juizes, não obstante a sua perpetuidade, podem ser mudados de um logar para outro: pois se elles são amoviveis pelas disposições da Carta, e sem distincção da Primeira e Segunda Instancia, está visto que as observações de S. Ex.ª, nesta parte caducam, e a consequencia que devia tirar é, que o defeito estava na perpetuidade, e atacava a independencia do mesmo Poder.

Eu tinha-me esforçado, e o orador que tinha fallado (o Sr. C. de Thomar), em demonstrar que não obstante a perpetuidade dos Juizes, pela Carta elles podem ser amoviveis, tanto os da Primeira como da Segunda Instancia; e visto que a Lei não faz distincção entre uns e outros, aonde a Lei não distingue nós não podemos distinguir, e deixa ao arbitrio comprehender todos. É certo que algumas Leis anteriores comprehendiam os da Primeira Instancia, e outras os da Primeira e Segunda, e portanto na disposição da Carta e Leis regulamentares, que tem havido, vê-se que podia fazer-se a transferencia de uns e outros sem offender a perpetuidade segundo o artigo 120.º, e sem offender a sua independencia consagrada no artigo 118.º; porque já fiz vêr, que a sua independencia consistia unicamente no acto de julgar, cujo principio está consignado no §. 11 do artigo 145.°, que comprehende entre as garantias e direitos individuaes a favor dos cidadãos, a independencia do Poder Judicial; não só pelos effeitos della, mas lá explica, e então especifica ocaso, em que o illustre Legislador da Carta julgou os actos respectivos ao julgamento, e nisto é que já tenho mostrado que não offendia a independencia do Poder Judicial; e na segunda parte do artigo 120.° o Augusto Legislador da Carta decretou, que os Juizes podiam ser amoviveis: falla na generalidade e inclue tanto uns como outros; e tanto comprehendeu os da Primeira e Segunda Instancia, a era esta a mente do Augusto Legislador da Carta, que Elle mesmo na primeira Lei regulamentar, que decretou, diz no artigo 12.º, §. 1.º (leu-o). Portanto, está explicado pelo mesmo Augusto Dador da Carta, que os Juizes da Direito são tanto os da Primeira como da Segunda Instancia, e não se póde tirar a consequencia, de que sejam só os da Primeira, porque o mesmo Augusto Dador da Carta explicou, que são tanto uns como outros.

Isto pelo que pertence á primeira parte do artigo 120.º, e pelo que pertence á segunda parte, que diz respeito á amovibilidade dos Juizes, é priori e na generalidade se entende, que comprehende tanto os da Primeira coma da Segunda Instancia; e vemos tambem á posteriori, que a amovibilidade póde ser applicada a uns e outros, e a Lei de 16 de Maio fallando em geral no artigo 254.º diz uns e outros poderão passar de um Tribunal para outro. Aqui temos, por estes dous logares da Carta e da Lei de 16 de Maio, mestrado que as transferencias, na conformidade da Lei, podem comprehender tanto os Juizes da Primeira como da Segunda Instancia.

Tambem o illustre orador, que se seguiu ao nobre D. de Palmella, o Sr. Rodrigo da Fonseca Magalhães, referiu se outra vez á perpetuidade, e parece-me que se embaraçou um pouco em marcar o assento donde nasce a perpetuidade dos Juizes da Segunda Instancia, e exclamou que os Juízas da Segunda Instancia eram tanto perpetuos, que até os da Primeira o eram. Ora agora, na opinião de S. Ex.ª, a perpetuidade dos Juizes da Primeira Instancia tem o seu fundamento na primeira parte do artigo 120.º e se dahi senão deduz, desejo saber qual é o artigo da Carta aonde se consagra este principio: não ha; o artigo 120.° comprehende uns e outros, e os artigos seguintes tanto comprehendem os Juizes da Primeira como da Segunda Instancia, porque as disposições dos artigos 120.º e 125.º são communs a todos, sem que a Carta faça especificação a respeito de uns e outros. Parece-me que tenho mostrado convenientemente, que a Lei póde comprehender tanto os Juizes da Primeira como da Segunda Instancia (Apoiados).

S. Ex.ª tambem argumentou com a classificação das Comarcas: eu já disse á Camara que as vistas do Governo, durante o intervalo da Sessão, são tractar deste objecto, e tanto que o D. Par o Sr. Sousa Azevedo já tomou a iniciativa em dous projectos, que não tiveram seguimento, e o Governo hade occupar-se em os examinar, e poderá propôr um e outro, a fim de que se apresente um quadro completo relativo á Magistratura Judicial.

O Sr. Presidente = Tem a palavra o Sr. C. de Thomar.

O Sr. C. de Thomar —......

O Sr. Fonseca Magalhães — V. Ex.ª dá-me licença?... Talvez quizesse dizer, mas não disse (Riso). Eu digo o que quiz dizer. Isto de alfange é arma, segundo creio, mourisca; e eu não quero ficar com a responsabilidade de mouriscar as discussões (Riso). O que me parece ter dito é, que as transferencias dos Juizes, ás quaes se seguiriam as residencias, ou conhecimentos do proceder de cada um, eram como um alfange que lhes estaria pendente sobre o cólo, e que o receio de que lhes cahisse em cima os traria sempre cuidadosos no cumprimento dos seus deveres. Eis uma das razões da conveniencia que eu achava nas transferencias periodicas. Aqui está o que eu disse, se não me engano, sobre alfanges, espadas, e não sei se tambem fallei em punhaes. Mas não figurei nenhuma destas armas nas mãos do Governo para ferir os Juizes. Com tudo se o D. Par quer fundar o seu argumento sobre o alfange do Governo póde faze-lo.

O Sr. C. de Thomar —.... O Sr. Fonseca Magalhães — Sobre a ordem. Sr. Presidente, é natural que me seja permittido por benevolencia da Camara dar alguma explicação depois de ter fallado o D. Par o Sr. C. de Thomar, porque a questão da classificação das Comarcas, mui connexa com a que nos tem occupado, encheu grande parte de tempo que durou a discussão passada. Este objecto devia ser, para assim me explicar, o alicerce do edificio de uma Lei de transferencias dos Juizes territoriaes. Mas não vejo que disso se tinha tractado. O Ministerio na Sessão ou Sessões em que se tractou do outro Projecto de tranferencias, conveio em que a Lei da divisão das Comarcas era summamente necessaria; por isso eu esperava que, trazendo elle ao Parlamento uma nova proposta de transferencias, entre as quaes apparecem as periodicas, não deixaria se a acompanha-la de uma tal qual classificação de Comarcas judiciaes. Tenho aqui uma proposta sobre este assumpto, e nella dou um voto de confiança ao Governo para elle proprio mandar proceder á tal divisão. Não se estranhe esta facilidade de votos de confiança — é assim (leu). Agora devo dizer que está diante de mim um Projecto feito por uma das illustrações desta Camara, o D. Par o Sr. Pereira de Magalhães, quando Membro do Senado; e S. Ex.ª ainda agora teve a bondade, de me fazer vêr como considerava as transferencias quando apresentou o seu trabalho, e com elle um Projecto de divisão das Comarcas, e sua classificação. Não ouso dizer que se adopte este systema, porque nisso seria contradictorio, uma vez que peço que dessa tarefa seja encarregado o Governo; mas os tempos que correm como os rios para ornar, não deixam de trazer alterações, e alterações notaveis, como as enchentes que perturbam as agoas e alteram a direcção, das correntes. O tempo decorrido haverá tornado necessarias algumas alterações neste bom trabalho do D. Par, a quem peço que delle faça presente ao Sr. Ministro; porque, ainda não o adoptando em todas as suas disposições, muitas serão aproveitadas. Eu não espero, nem se póde esperar, que uma divisão territorial para o serviço que se pretende das transferencias se fica de um jacto tão perfeitamente como se carece; mas ainda que defeituosa a divisão, muito favoravel será ao Governo livrando-o desde logo da necessidade de usar de arbitrio, um dos maiores inconvenientes para qualquer administração honesta. Por isso de novo rogo ao D. Par que offereça ao Sr. Ministro o seu Projecto.

Insiste-se porém em que eu chamára — monstro ao que ora se discute! Sr. Presidente, a palavra — monstro, não significa um horrendo gigante de cem braços! Ou um Poliphemo de um só olho: significa fenomeno extraordinario, por exemplo, um homem que tenha seis dedos n'uma mão é um monstro; e com tudo ninguem delle se horrorisa! (Riso). Este Projecto tem mais um dedo do que o outro Projecto (Riso) aquelle fallava sómente dos Juizes de primeira Instancia, e este falla tambem dos de segunda Instancia, aqui está o dedo de mais, e é dedo de gigante (Riso).

Disse o D. Par uma cousa que de certo não approva. Perguntei eu se seria um favor feito a um Juiz transferi-lo de Coimbra para Ourique? S. Ex.ª respondeu que sim, ou pareceu-me que respondera; mas depois advertiu que esse Juiz despachado para Ourique nunca o fóra de Coimbra, mas sim que se achava então no quadro da Magistratura (O Sr. C. de Thomar — Esteve lá como Governador Civil) pois bem — foi engano meu esse: ficaremos nisso: — não poderei eu citar outros actos de igual favor aos juizes? Diz-se que não tractemos de vinganças, porque tambem me podem lançar em rosto actos della praticados por mim. Isto veio a proposito de uma transferencia daqui para Mertola. Sr. Presidente, muitos erros tenho commettido, mas actos de vingança, e de odio pessoal, nenhum; bem alto o affirmo, porque não receio que appareça uma contradicta: levante-se da terra, e do abysmo uma voz que me accuse. Appareça um queixoso de mim! A verdade é que a minha tolerancia e o meu esquecimento algumas vezes me tem tornado objecto não sei se diga de desprezo; mas eu obedeço não ao meu systema, porém sim á minha organisação.

E clama-se: para que nos accusais? Quem transferiu o Juiz de Leiria para a Ilha do Fico? Deos bem sabe que não fui eu, e que nem o pedi, nem o lembrei, e que o ignorei até este momento. Obstina-se o D. Par em fazer-me solidario na responsabilidade com o Ministerio de Maio de 46. Aqui estão duas illustres personagens que nelle tiveram parte; não carecem do meu auxilio em sua defensa; mas pois que me aggregam a ellas, permittam-me que vá atado ao seu carro.

Quer-se que ao Conselho de Estado pertença

(1) Serão integralmente consignados quando se discutirem.

(2) Vid. a nota 1.ª

(3) Vid. a nota 1.ª