SESSÃO DE 3 DE ABRIL DE 1888 491
O sr. Presidente: - Eu não posso deixar continuar este incidente.
A hora está muito adiantada e ha ainda alguns dignos pares inscriptos para antes da ordem do dia.
Tem a palavra o sr. Hintze Ribeiro.
O sr. Hintze Ribeiro: - Eu não desejava referir-me a este incidente, mas não posso agora deixar de o fazer em presença das palavras que acaba de proferir o sr. ministro da guerra.
Eu nunca accusei ninguem aleivosamente. Nunca accusei o sr. ministro da guerra na sua honra e tão pouco na sua dignidade; não era isto proprio de mini, nem proprio d´esta camara.
Sustento, porem, e affirmo a contradicção, do sr. ministro da guerra, sem pensamento de o offender, mas em vista dos factos, e como uma apreciação de doutrinas exaradas em documentos officiaes.
Essa contradição affirmo a, sustento-a e vou mas uma vez provai a.
Senão, vejamos,
O sr. ministro dos obras publicas, arguido pelo sr. D. Luiz da Camara Leme e no intuito de se justificar, mostrou ha pouco um documento que era, alvará da concessão do ramal de Cascaes, e leu a sua clausula 25.ª, referente á collocação da estacão de Caxias. Eu vou citar de cor, porque não tenho aqui documentos, e se não f u r exacto, o sr. ministro das obras publicas, que talvez os tenha, poderá rectificar as minhas asserções.
A commissão de defeza, no seu parecer declarou que a collocação da estação de Caxias era prejudicialissima aos interesses militares, e o sr. ministro da guerra disse ha pouco que se havia conformado com esse parecer, e se não fosse assim, digo eu, se o parecer d´aquella commissão, se a opinião dos seus camaradas não devia ter peso para s. exa. então era melhor não os ter ouvido.
Foi essa consulta para o ministerio das obras publicas, é em seguida novamente foi ouvida a commissão de defeza, para que dissesse a menos se alguma modificação se podia fazer no traçado, de maneira a conciliar os interesses da linha ferrea, com os interesses militares.
Novamente a commissão de defeza responde que a collocação da estação em Caxias era prejudicialissima aos interesses militares, (Apoiados.) e depois d´isto o sr. ministro das obras publicas, na portaria que approva o traçado do ramal de Cascaes, manteve a collocação da estação em Caxias.
Andou bem? Andou mal? Não discuto este ponto já largamente discutido; o que quero apenas é frisar a contradicção do sr. ministro da guerra.
Pois a portaria do sr. ministro das obras publicas desconsidera o parecer da- commissão de defeza, e o sr. ministro da guerra diz que está ao lado e de accordo com a opinião da commissão, e com a do sr. ministro das obras publicas?
Não póde ser.
Para que o sr. ministro da guerra esteja de accordo com o seu collega das obras publicas, fica manifesta a divergencia de s. exa. com a opinião da commissão de defeza; e para que entre esta e o sr. ministro da guerra haja conformidade, resulta evidente o desaccordo de s. exa. com o seu collega das obras publicas.
D´aqui não ha fugir, pois que estar simultaneamente de accordo n´um e n´outro caso é absolutamente impossivel, e, por mais que eu respeite o caracter e illustração do sr. ministro da guerra, não posso comtudo deixar de insistir em que a contradicção de s. exa. é flagrante.
Agora desejava perguntar a s. exa. se os documentos que pedi pelo ministerio das obras publicas já foram enviados a esta camara.
(O orador não reviu.)
O sr. Presidente: - Diz o sr. secretario que chegaram n´este momento.
Vae ler-se o officio. Leu-se o seguinte:
" Um officio do ministerio das obras publicas respondendo á primeira parte do requerimento do digno par o sr. Hintze Ribeiro, feito na sessão de 24 de marco proximo passado, que se não encontra nesta secretaria d´estado consulta alguma da procuradoria geral da corôa e fazenda, ácerca do caminho de ferro americano com tracção a vapor."
Foram entregues ao digno par.
O Orador: - Sr. presidente, é para sentir que estes documentos apenas chegassem hoje, quando na ultima sessão, que teve logar ha oito dias, e á qual eu não pude estar presente, o digno par o sr. Manuel Vaz; pediu que esses documentos me fossem enviados, e que eu os facultaria aos dignos pares que os desejassem conhecer.
Passam-se oito dias, e na propria hora em que se vae discutir o assumpto a que elles dizem respeito, é que apparecem; mas visto que apparecem, os lerei, e espero ter ainda tempo de examinal-os devidamente, attendendendo á altura em que estou inscripto, para usar da palavra n´este debate.
O sr. Ministro das Obras Publicas (Emygdio Navarro): - No ultimo dia de sessão d´esta camara deu entrada no meu ministerio requerimento do digno par o sr. Hintze Ribeiro.
S. exa. sabe que depois disso se metteram as ferias, e que não houve sessão n´esta camara.
Portanto, não me era possivel mandar com maior brevidade os documentos que me tinham sido pedidos.
O digno par não quereria de certo que eu faltasse a praxes e mandasse particularmente a s. exa. os documentos que desejava.
(S. exa. não reviu.)
O sr. Hintze Ribeiro: - Eu não podia esperar que s. exa. me mandasse os documentos particularmente, mas sim que os mandasse á camara.
O Orador: - Mandei-os no primeiro dia de sessão, após as ferias, que é hoje.
O sr. Hintze Ribeiro: - Eu sempre esperei que s. exa. remettesse os documentos para a secretaria d´esta camara, e depois o sr. presidente.
O Orador: - Eu. mandei os documentos no primeiro dia de sessão, depois das ferias, e é claro que não os podia mandar antes.
E a este proposito devo declarar que ainda não deu entrada no meu ministerio o requerimento do digno par o sr. Bocage, pedindo outros documentos.
Os documentos que o digno par deseja, tenho-os aqui na minha pasta e posso entregar-lhos particularmente, visto o requerimento de s. exa. não ter ainda dado entrada na secretaria do ministerio das obras publicas.
O sr. Presidente: - Vae ler-se na mesa um officio do sr. ministro das obras publicas, remettendo os documentos pedidos pelo digno par o sr Hintze Ribeiro.
Leu-se na mesa o officio que é do teor seguinte:
Officio do ministerio das obras publicas, remettendo os documentos pedidos pelo digno par o sr. Hintze Ribeiro.
Foram entregues a s. exa.
O sr. Ministro da Guerra (Visconde de S. Januario): - Sr. presidente, eu desejava dizer simplesmente ao digno par o sr. Hintze Ribeiro, que suppõe que effectivamente ha contradicção na minha opinião, pelas rasões que s. exa. apresentou, que essa contradicção deixou de existir desde que enviei o parecer dá commissão de defeza ao ministerio das obras publicas, a fim de serem, attendidas quanto possivel as indicações da mesma commissão.
Quem havia de julgar d´esta possibilidade havia de ser o sr. ministro das obras publicas auxiliado pela respectiva junta consultiva.