O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 741

N.º 133

SESSÃO DE 15 DE MAIO DE 1888

Presidencia do exmo. sr. João Chrysostomo de Abreu e Sousa

Secretarios - os dignos pares

Frederico Ressano Garcia
Conde de Paraty

SUMMARIO

Leitura e approvação da acta. - O sr. Miguel Osorio apresenta um parecer da commissão de legislação. - O sr. Camara Leme pede que entre em ordem do dia o projecto de lei de incompatibilidades. Refere-se a uma providencia relativa aos officiaes reformados e aos prejuizos que á barra de Lisboa podem causar as obras do porto. Responde lhe o sr. ministro da fazenda. O sr. presidente responde tambem com respeito ao projecto de lei de incompatibilidades. - O sr. Camara Leme agradece ao sr. ministro, e pergunta se o governo deseja que o projecto das incompatibilidades seja discutido n'esta sessão legislativa. O sr. ministro da fazenda responde affirmativamente. - O sr. Carlos Testa refere-se á noticia da abolição da escravatura no Brazil e propõe que se felicite o representante d'aquelle imperio. - O sr. Vaz Preto pergunta ao governo pelo projecto de responsabilidade ministerial apresentado na outra camara. Responde-lhe o sr. ministro da fazenda. - O sr. Testa pede que seja votada a sua proposta. - Os srs. Thomás Ribeiro e Hintze Ribeiro entendem que a felicitação proposta pelo sr. Testa será precipitada emquanto não houver confirmação official da noticia, sendo bastante manifestação da camara a já feita. O sr. Carlos Testa concorda. - Os srs. Vaz Preto e ministro da fazenda fallam novamente a respeito da proposta de lei de responsabilidade ministerial.

Ordem do dia: é votado o projecto de lei n.° 97, depois de uma declaração de voto do sr. Vaz Preto. - Continúa a discussão do projecto de lei dos tabacos. - Continúa e conclue o seu discurso o sr. Hintze Ribeiro. - São lidos dois officios, remettendo documentos pedidos. - E lido e expedido um requerimento do sr. Arrobas.

Ás duas horas e tres quartos da tarde, estando presentes 23 dignos pares, o sr. presidente declarou aberta a sessão.

Lida a acta da sessão precedente, julgou-se approvada, na conformidade do regimento, por não haver reclamação em contrario.

Não houve correspondencia.

(Estava presente o sr. ministro da fazenda. Entrou durante a sessão o sr. presidente do conselho.)

O sr. Miguel Osorio: - Tenho a honra de mandar para a mesa um parecer da commissão de legislação.

Foi a imprimir.

O sr. D. Luiz da Camara Leme: - Como na sessão de hontem foi distribuido o parecer sobre o projecto de lei das incompatibilidades, eu pediria a v. exa., visto as côrtes estarem prorogadas só até ao dia 22, se dignasse pôr em ordem do dia esse projecto.

Já que estou com a palavra, e sentindo não ver presente ha muito n'esta camara, por incommodo de saude o sr. ministro da guerra, lembrarei ao sr. ministro da fazenda que este seu collega teve a bondade de declarar no seio da commissão de guerra que apresentaria um projecto de lei com relação a melhoria de soldo aos officiaes reformados; esperava obter uns certos esclarecimentos e apresentaria a proposta de lei na primeira semana d'este mez; mas s. exa., ou porque tem estado doente, ou talvez por outra rasão, não tem apresentado essa proposta.

Provavelmente o sr. ministro da fazenda não é alheio a este negocio, e eu pedia a s. exa. para lembrar ao seu collega da guerra que se não esquecesse d'este assumpto em que a camara está empenhada.

Aproveito a occasião de estar com a palavra tambem para chamar a attenção do governo para um facto que me consta, e creio estar averiguado, com relação ás obras do porto de Lisboa.

Consta me, cousa notavel que nunca se viu na barra de Lisboa, que um dos vapores da companhia franceza des Messageries Maritimes, julgo que o ultimo que entrou a barra, esteve á espera talvez duas horas, de que a maré enchesse para poder entrar no porto de Lisboa, um dos principaes da Europa.

Como não sei até que ponto são verdadeiras as minhas informações, ainda que a pessoa que m'as deu tem rasão para as saber, e como este objecto é de alta importancia, eu chamarei a attenção do governo sobre este assumpto, porque seria realmente uma grave responsabilidade para os poderes publicos, que os trabalhos continuassem de modo que viessem a obstruir a barra de Lisboa.

Repito, não sei se este facto é verdadeiro. Como não está presente o sr. ministro da marinha, e correndo este negocio pelo seu ministerio, pedia ao sr. ministro da fazenda me informasse do que soubesse sobre o assumpto, e que o governo o attendesse com toda a urgencia. Vejo presente um digno par que é um distinctissimo official de marinha. Como talvez s. exa. não seja alheio a este negocio, eu pedia-lhe que me auxiliasse n'esta questão.

Por hoje nada mais tenho a dizer por não ter dados para entrar mais detidamente na discussão d'este assumpto, que julgo da mais alta importancia.

(O digno par não reviu.)

O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - Sobre o primeiro assumpto a que se referiu o digno par tenho a dizer que effectivamente o sr. ministro da guerra tomou informações sobre o assumpto da proposta que desejava trazer á camara, e, segundo essas informações, deveria haver um augmento de despeza de 80:000$000 réis a 100:000$000 réis se fossem contemplados todos os officiaes reformados.

S. exa. fez-me a honra de conferenciar commigo a este respeito, e eu fui de parecer que não era admissivel este augmento de despeza no orçamento. Não me repugnava um augmento em vista da justiça da causa, quando fosse muito inferior a esta verba. Lembrei-me então que, com os officiaes reformados, que infelizmente desapparecerão com rapidez em consequencia de suas idades avançadas, e seria possivel fazer com o banco de Portugal uma operação similhante áquella que se fez para as classes inactivas.

Sobre este assumpto conferenciei com o sr. governador do banco, a fim de consultar o conselho d'aquelle estabelecimento sobre esta operação.

Espero uma resposta do banco. Se ella for favoravel, como desejo, e se o que eu propunha exigir pequenas modificações, é possivel que o assumpto se resolva a bem dos officiaes reformados.

Com relação ao outro ponto a que se referiu o digno par, isto é, a respeito das obras do porto de Lisboa, creio que essa obstrucção da barra não é devida aos entulhos que se lançam no Tejo.

Como a camara sabe, a barra de Lisboa tem por assim dizer dois fiadores da conservação das suas excellentes

62

Página 742

742 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

condições, um dos quaes é um verdadeiro abysmo de 2:000 ou 3:000 metros de profundidade, que se enche de uma enorme quantidade de agua, despejando-se na vasante e arrastando rapidamente comsigo todos os entulhos, qualquer que seja o seu volume; o outro é o chamado mar da falha.

Graças a estes dois elementos, tenho sempre ouvido aos technicos, que está perfeitamente garantida a conservação da nossa excellente barra.

Sei tambem que por engenheiros competentissimos está calculado que todo o entulho que nos differentes aterros de todas as obras do porto de Lisboa, tem de ser lançado no Tejo, é todo ellle muito inferior, em quantidade, ao entulho que o Tejo arrasta em occasião de cheia.

Se durante seculos os entulhos das cheias não poderam obstruir a barra, é claro que o entulho dos aterros, quando mesmo fosse arrastado todo, não poderia obstruil-a. Isto não quer dizer que eu deixe de communicar ao meu collega das obras publicas as observações feitas pelo digno par.

A mim, esta rasão que se funda no calculo feito do grande volume de entulhos arrastados em cada cheia do Tejo, deixa-me completamente tranquillo com relação aos perigos que para a conservação da barra podessem resultar das obras de aterros nos trabalhos do porto de Lisboa. Entretanto, este negocio não é da minha conpetencia, e transmittirei ao meu collega as reflexões de s. exa.

(O sr. ministro não reviu.)

O sr. Presidente: - Com relação ao que ponderou o sr. D. Luiz da Camara Leme, ácerca da discussão do parecer da commissão sobre o projecto de incompatibilidades, tenho a dizer ao digno par que a mesa tomará em consideração o pedido de s. exa. em occasião opportuna.

O sr. D Luiz da camara Leme: - Pedi de novo a palavra unicamente para agradecer ao nobre ministro da fazenda as explicações que se dignou dar-me.

Com relação ao primeiro assumpto de que fallei, estou convencido de que s. exa. se ha de occupar d'elle com interesse, resolvendo-o com brevidade.

A respeito do outro ponto, a que me referi, parece-me que não é esta a occasião mais propria para o tratar.

Eu podia agora citar differentes escriptos, e entre elles o de um celebre engenheiro o sr. Baldaque, em que mostrava os inconvenientes que podiam trazer para a barra de Lisboa as obras do seu porto. É um folheto que teve uma menção honrosa nos paizes estrangeiros.

Repito, não é esta a occasião de tratar d'este assumpto; mas espero que o sr. ministro da fazenda chame a attenção do seu collega da marinha para o que acabo de expor.

Com relação ao projecto de incompatibilidades, que v. exa. disse que opportunamente será dado para ordem do dia, eu pergunto ao sr. ministro da fazenda se o governo está de accordo em que o projecto seja discutido antes de se encerrar a actual sessão legislativa.

(O digno par não reviu.)

O sr. Ministro da Fazenda(Marianno de Carvalho): - Eu posso asseverar ao digno par que o governo tem todo o empenho em que o projecto seja discutido ainda n'esta sessão.

O sr. Carlos Testa: - Vi nos jornaes de hoje uma noticia que deve ser muito bem acolhida por todos os portuguezes, e por consequencia por esta camara, que constitue uma parte tão importante da representação nacional.

A noticia a que me refiro, se bem que ainda não fosse confirmada officialmente, tem todavia todos os caracteres de veridica; e ella é certamente de um grande alcance social e humanitario, desde que nos diz ter sido no imperio do Brazil abolido completamente o estado de escravidão.

Sr. presidente, parece-me que esta feição que se dá n'aquelle imperio é um grande passo no caminho do progresso e civilisação, e uma das grandes conquistas da verdadeira liberdade, visto que a propriedade do homem pelo homem não é de direito natural; e por consequencia uma nação como Portugal, que já ha muito tempo aboliu a escravidão em todos os seus dominios, não póde deixar de acolher com grande regosijo uma noticia de tão vasto alcance. (Apoiados.)

Alem d'isso, Portugal póde ser considerado como uma nação irmã do Brazil, por identidade de lingua, de crenças e por tantos outros pontos de contacto; e não será ousadia da minha parte o dizer, que de entre os padrões das nossas passadas glorias, ainda ao presente se póde considerar um dos mais valiosos o ter sido Portugal, por assim dizer, o progenitor d'aquelle vasto e florescente imperio. Alem de que, os nossos interesses commerciaes e politicos, e as intimas relações entre os dois povos irmãos, são tantas e de tal importancia, que constituem outras tantas rasões para nos congratularmos com tudo que tenda a augmentar o brilho e o alto conceito d'aquelle imperio, que occupa já hoje e de ha muito um logar distincto entre as nações cultas e dignas de geral estima.

Eu, n'este sentido, lembrarei a v. exa., que, ou a propria mesa, ou por delegação, ou por outro qualquer meio que a v. exa. melhor apraza, seja enviada uma mensagem de congratulação por parte d'esta camara ao representante do imperio do Brazil n'esta côrte, significando que Portugal não é indifferente a tudo que diga respeito ao progresso e á civilisação d'aquelle imperio a quem nos ligam tantos interesses e tanta e tão justificada amisade.

V. exa. tomará a minha proposta na consideração que julgo merecer.

O sr. Presidente: - Peço ao digno par que mando a sua proposta para a mesa.

O sr. Carlos Testa: - A minha proposta consiste em que v. exa., pelo meio que julgar mais conveniente, faça chegar ao conhecimento do representante do Brazil esta manifestação, se a camara annuir.

O sr. Presidente: - A mesa tomará em consideração o que acaba de dizer o digno par.

O sr. Vaz Preto: - Sr. presidente, o meu collega, o digno par, o sr. Camara Leme, pediu a v. exa. que desse para ordem do dia o projecto que s. exa. apresentou sobre as incompatibilidades, o qual eu tive a honra de assignar conjunctamente com o digno par Coelho de Carvalho. Este pedido é logico e rasoavel. A sua rasão de ser, funda-se principalmente na urgencia com que a camara votou que fosse enviado a uma commissão especial. V exa deve estar lembrado e a camara, que quando esse projecto foi enviado para a mesa o seu auctor requereu a Urgencia, e o camara votou-a.

Isto quer dizer que a camara reconhece a importancia do assumpto, e que é urgente discutil-o e resolvel-o.

N'estas circumstancias v. exa. tem o dever de o dar com brevidade em ordem do dia.

Não foi porém este o motivo porque eu pedi a palavra.

O motivo por que eu pedi a palavra não foi este, foi para saber clara e positivamente a opinião do governo, ácerca da discussão ainda n'esta sessão do projecto de lei sobre responsabilidade ministerial.

A maioria da commissão, nomeada por esta camara, para dar o seu parecer ácerca do projecto de incompatibilidades, rejeitou-o, e um dos seus argumentos era que este projecto não satisfazia ao fim, e que o melhor modo de acautelar os exaggeros e demasias dos ministros eram uma boa lei de responsabilidade dos srs. minitros. O governo que approvou a doutrina da maioria da commissão, para calar os innocentes e os simples, e para lançar pó nos olhos do publico, renovou o projecto de lei sobre responsabilidade ministerial do sr. Adriano Machado, declarando por essa fórma que a urgencia que se pedia para o projecto das incompatibilidades era mais merecida para

Página 743

SESSÃO DE 15 DE MAIO DE 1888 715

o da responsabilidade ministerial, que seria um dique aos abusos, e uma prevenção para o futuro.

Como não está presente o sr. presidente do conselho, perguntarei pois ao sr. ministro da fazenda, como representante do governo, se o projecto sobre ás responsabilidade dos srs. ministros já foi discutido na respectiva commissão da camara dos senhores deputados, se o governo já foi ouvido, e se já ali tem parecer, é desejará tambem saber, se s. exas. fazem tenção de o fazer votar ainda n'esta sessão legislativa?

É um projecto em que a opinião do governo está completamente definida, e tão definida que, tanto a commissão de incompatibilidades como o governo entenderam que este projecto era a substituição racional do projecto de incompatibilidades; a opinião do governo está ligada com a opinião da maioria da commissão, e portanto é urgente a discussão do projecto e responsabilidade ministerial.

Quererá o governo rejeitar o projecto das incompatibilidades, sem fazer votar o da responsabilidade ministerial?

A maioria da commissão, para se recusar a fazer um projecto sobre imcompatibilidades, declarou que o projecto mais conveniente, mais apto, e mais reclamado agora, era o projecto sobre a responsabilidade ministerial, porque esse resolveria certas e determinadas difficuldades, e cohibiria os abusos para o futuro!

Desejo, pois, que o governo acceitando a opinião da maioria da commissão, seja coherente e faça já discutir esse projecto.

Fiz estas singelas considerações para esclarecer a camara sobre os motivos por que eu desejo que se discuta com brevidade o projecto de lei sobre responsabilidade ministerial.

Desejo portanto que o sr. ministro da fazenda, bem clara e precisamente declare qual é a opinião do governo.

Tenho dito.

O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - Em relação á pergunta do digno par, o sr. Vaz Preto, eu não posso n'este momento dar uma resposta que satisfaça a s. exa.

Eu tenho estado ha dias afastado da outra camara n'outros trabalhos, e não sei precisamente se á commissão encarregada de examinar o projecto sobre a responsabilidade ministerial já deu o seu parecer.

O que posso é informar-me, e na proxima sessão responder a s. exa.

O que posso desde já declarar a s. exa. é que o governo tem todo o desejo de que esse projecto seja discutido.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Carlos Testa: - Sr. presidente, eu peço a v. exa. o favor de consultar a camara sobre se approva ou rejeita que seja enviada á mensagem que eu indiquei ao representante do imperio do Brazil n'esta côrte.

O sr. Presidente: - A camara acaba de ouvir o pedido do digna par, o sr. Carlos Testa, para que eu submetta á deliberação da camara a sua proposta, que consiste em se dirigir; creio eu, ao sr. representante do Brazil n'esta côrte, uma mensagem de congratulação pelo Facto da abolição da escravatura no imperio do Brazil.

O sr. Thomás Ribeiro: - Escuso de dizer a v. exa. e á camara que acompanho o voto do meu amigo e collega o sr: Carlos Testa, e que me não opponho a que se leve ao representante do Brazil n'esta côrte á manifestação da camara; mas como s. exa. disse que não ha ainda confirmação official d'esse acontecimento, que, ennobrecendo a humanidade, ennobrece o Brazil, parece-me que talvez haja uma tal ou qual precipitação em apresentar já esse voto ou a significação do sentimento da camara.

Julgo, pois, de muita conveniencia que s. exa. suspenda a sua proposta até que tenhamos a certeza official d'aquelle acontecimento, ou então póde desde já approvar-se essa proposta ou essa moção, para se lhe dar cumprimento ou execução em tempo opportuno.

A manifestação da camara está feita; mas, emquanto a levar ao representante do Brazil o voto da camara, será mais conveniente esperarmos a communicação official d'esse grande acontecimento.

(O digno par não reviu.)

O sr. Hintze Ribeiro: - Sr. presidente, é claro que um paiz liberal como o nosso, não póde deixar de jubilar por ver que o Brazil decreta a completa abolição da escravatura.

Não póde pôr-se em duvida o sentimento unanime d'esta camara; mas o digno par o sr. Carlos Testa, exprimindo o seu desejo, fez logo notar que a noticia a que alludia não tinha caracter official, e, d'esta maneira, julgo de conveniencia, acompanhando n'esta parte a opinião do sr. Thomás Ribeiro, que esperemos a confirmação official da noticia, que nos póde ser apresentada pelo sr. ministro dos negocios estrangeiros.

A manifestação d'esta camara, como disse o digno par que me precedeu, está feita, e certamente que acompanham o voto de louvor proposto pelo sr. Carlos Testa todos os dignos pares, incluindo aquelles que não tomam parte n'este incidente. (Muitos apoiados.)

A manifestação está dada, mas não sei se será um bom precedente estas manifestações de louvor a governos estrangeiros, embora por actos de incontestavel utilidade e excellencia, porque, a taes manifestações, podem corresponder tambem votos de censura.

Entendo que o nosso voto deve ficar expresso na acta, expresso não só pela voz do digno par o sr. Carlos Testa, como tambem pelo voto de todos os membros d'esta camara. (Apoiados.)

Julgo que devemos ficar por aqui; mas se, porventura, se entende que devemos ir mais longe, esperemos que o sr. ministro dos negocios estrangeiros nos communique officialmente a decretação d'aquella medida, e tome-se então uma resolução definitiva em harmonia com as praxes mais adequadas ao assumpto.

(O digno par não reviu.)

O sr. Carlos Testa: - O meu fim está preenchido.

É facto que á noticia a que me referi não tem caracter official, e que consta de um telegramma assignado pelo sr. visconde de S. Salvador de Mattosinhos.

Não tem caracter official; mas, fiado na responsabilidade do cavalheiro que assigna o despacho telegraphico, tenho para mim como certa e indubitavel a realisação do facto.

Não me opponho, entretanto, a que se espere a confirmação official da noticia, nem discuto o modo mais conveniente de significar o voto da camara; mas creio que os meus collegas não devem ficar indifferentes perante o meu requerimento, sobretudo depois das palavras pronunciadas pelos dignos pares que me precederam.

A manifestação está feita, sendo-me indifferente o meio que se empregue para a levar ao conhecimento do representante do Brazil n'esta côrte.

(O digno par não reviu.)

O sr. Presidente: - Creio que ninguem põe em duvida os sentimentos da camara ácerca do decreto que aboliu a escravatura no Brazil. (Apoiados.) Trata-se apenas de ver qual é a fórma pratica por meio da qual a camara deve expressar o sentimento que a anima. O voto de louvor póde ser exarado na acta independentemente de qualquer outra manifestação que a camara posteriormente julgue dever apresentar. Vae, portanto, ser exarado na acta o voto do digno par. (Apoiados.)

O sr. Vaz Preto: - Ouvi a resposta do sr. ministro da fazenda, que realmente foi dada com toda aquella habilidade e finura que o caracterisa; s. exa. fallou, e eu e a camara ficámos sem o comprehender, pois era isso mesmo que s. exa. queria. Eu, porém, que não admitto evasivas nem subterfugios, e como o que eu quero é que s. exa. me responda categorica e positivamente, forçal-o-hei a isso.

Página 744

744 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

Disse s. exa. que o governo tinha desejo de que fosse Discutido o projecto!!! Resposta completamente banal.

É o que tem declarado a respeito de muitos outros projectos, que não chegaram ainda a ser convertidos em lei, nem a ser discutidos sequer!

Como eu quero uma resposta clara, precisa e categoriza, pergunto se o governo está resolvido a usar da influencia de que dispõe nas maiorias de ambas as camaras, para fazer passar ainda n'esta sessão legislativa o projecto de responsabilidade ministerial.

Esta pergunta é simples, clara e precisa.

Espero que s. exa. responderá com a seriedade que se deve a estes logares, e não inventará nenhuma subtileza para illudir a minha pergunta, no que nada lucrará, e só fará esgotar a minha paciencia, com o que muito menos ainda lucra.

Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - Desde que eu disse ao digno par que o governo tinha desejos de que o mencionado projecto fosse discutido com brevidade, é claro que ha de empregar todos os meios ao seu alcance para que o seja.

(Aparte do sr. Vaz Preto.)

O governo tem amigos dedicados que o acompanham, nas duas casas do parlamento, mas não póde dictar-lhes leis nem impor-lhes opiniões. (Apoiados.)

Deseja que o projecto se vote n'esta sessão legislativa, mas não faz, porque não póde fazer, d'isso questão ministerial.

(O sr. ministro não reviu.)

O sr. Vaz Preto: - Todos os partidos têem principios definidos, que lhes cumpre seguir quando estão no poder, todos têem as suas idéas, as suas doutrinas, as suas convicções.

Uma das idéas, uma das principaes aspirações que o partido progressista gravára em letras bem salientes no programma da Granja era a necessidade palpitante de uma lei de responsabilidade ministerial.

Quando o partido progressista subiu ao poder depois d'esse programma, propoz o projecto de lei, mas não o fez passar nas duas camaras! Contentou-se então que a proposta tivesse uma votação na outra camara, e agora de renovar a sua iniciativa!!

Isto é ridiculo e improprio de um governo que se preza, e tanto mais ridiculo e improprio este ar chocarreiro com que o sr. ministro da fazenda responde a perguntas serias que se lhes fazem.

Sr. presidente, estas respostas do sr. ministro da fazenda não são mais do que evasivas menos proprias, embora no entender de s. exa. mais convenientes para a situação. Eu não quero que o governo faça questão ministerial d'esta proposta, posto que fosse do seu dever fazel-o, se encontrasse alguma reluctancia na maioria, que não encontra.

Eu queria apenas que o governo mostrasse, o seu desejo e boa vontade ás maiorias, que seria o bastante. Como imagina o governo a possibilidade das maiorias se opporem? Na verdade este raciocinio do sr. Marianno é de uma ingenuidade incrivel!

A resposta do sr. ministro da fazenda importa dizer que não quer fazer votar o projecto.

É necessario que fique bem descoberto e bem claro, que o publico saiba e veja perfeitamente que este projecto de responsabilidade ministerial foi apenas um manejo para afastar a attenção do outro que se refere ás incompatibilidades.

D'isto não deve restar a mais leve duvida a ninguem.

O governo póde, não obstante, contar commigo que eu não levantarei mão d'esta questão, emquanto não ficar tudo bem liquidado.

O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - O digno par tira das minhas palavras consequencias que ellas não contêem.

O projecto de responsabilidade ministerial não tem nada com a proposta de lei sobre incompatibilidades.

Póde haver responsabilidade ministerial sem incompatibilidades e vice-versa.

(Aparte ao sr. Vaz Preto.)

Não posso saber o que a commissão pensa.

Refiro-me aos factos publicos e notorios.

O partido a que este governo pertence inseriu no seu programma a lei de responsabilidade ministerial. Apresentou-a n'esse anno, trabalhou para que fosse votada; e effectivamente o foi na outra casa do parlamento com algumas alterações; veiu para esta camara e aqui ficou, em consequencia de ter havido dissolução das côrtes.

Decorreram annos desde então até hoje sem que ninguem fallasse em responsabilidade ministerial.

Agora entendeu o governo que podia renovar a iniciativa da proposta.

(Aparte do sr. Vaz Preto.)

Póde o governo fazer questão ministerial para que essa proposta seja votada na presente sessão legislativa?

Não póde e não deve; o paiz, que esperou tantos annos em silencio a renovação do projecto, de certo o não tem por indispensavel ao ponto de que o governo tenha de fazer d'elle questão ministerial.

(O sr. ministro não reviu.)

ORDEM DO DIA

O sr. Presidente: - Vae passar-se á ordem do dia. Está dado para ordem do dia o parecer n.° 143, sobre o projecto n.° 97.

Como na sessão passada se votou sem discussão o projecto relativo ás escolas do exercito e naval, é provavel que este projecto tambem não levante discussão, visto conter materia analoga; podendo por isso entrar em discussão na primeira parte da ordem do dia.

Como vejo que a camara se não oppõe, ponho-o em discussão.

Vae ler-se o projecto.

Leu-se o parecer n.° 143 e o projecto de lei sobre que elle recae, e que é do teor seguinte:

PARECER N.° 143

Senhores. - Foi presente ás vossas commissões reunias de instrucção publica e de fazenda o projecto de lei n.° 97, vindo da camara dos senhores deputados.

Teve este projecto origem na proposta de lei de 5 do corrente, apresentada pelo sr. ministro das obras publicas, e é a applicação dos principios consignados no projecto n.° 59 por vós approvado em sessão de 5 do corrente, em que se transformou a proposta de lei de 4 de junho proximo passado, apresentada pelo sr. presidente do conselho de ministros e ministro do reino.

Todas as rasões que militam em favor d'esta proposta procedem em relação ao projecto que ora apreciâmos, como fôra já reconhecido pelas vossas commissões reunidas.

De facto:

Os vencimentos que os professores de instrucção especial hoje percebem são iguaes aos que foram estabelecidos, salvas poucas excepções, para os professores de instrucção superior na legislação academica de 1836 e 1837 e, comtudo, é sabido que taes ordenados foram decretados quando a nação, mal convalescida de prolongada guerra civil, tinha o seu thesouro exhausto, e um systema governativo mal seguro, sempre ameaçada de continuas guerras civis. N'esta situação, todavia, os ministros, cortando por todas as despezas, abalançavam-se a organisar o ensino em quasi todos os seus ramos, augmentavam as cadeiras e acrescentavam os ordenados dos professores.

Quando mais tarde se organisou o ensino technologico, apesar da differença da situação do thesouro, foram os pro-

Página 745

SESSÃO DE 15 DE MAIO DE 1888 745

fessores dos institutos equiparados, para todos os effeitos, aos das escolas superiores, vencendo ordenados identico, aos d'aquelles.

De então para cá esses vencimentos, em vez de augmentarem com as riquezas das classes abastadas, padeceram reducções, algumas communs a todos os funccionarios, outras especiaes. E todavia a profissão torna-se cada vez mais trabalhosa e mais cara.

Não é ainda, porém, a insufficiencia absoluta dos vencimentos que faz maior damno; é principalmente a sua pequenez em comparação com os vencimentos de outros funccionarios.

No parecer relativo aos estabelecimentos de instrucção superior dependentes do ministerio do reino, tinham as vossas commissões reunidas de instrucção publica e de fazenda formulado o desejo de que os poderes publicos, creada a necessaria receita, habilitassem o pessoal docente dos institutos a preencher desafogadamente a sua importante missão, e se desde logo não attendeu a essa necessidade urgente foi sómente porque não existia receita creada que attenuasse convenientemente os encargos respectivos, como o fazia o projecto que approvastes.

O governo declarou perante as commissões que as disposições do projecto n.° 97, applicaveis aos lentes substitutos ou auxiliares, que dirigirem salas de estudo, são pelo presente projecto extensivas aos lentes de igual categoria dos institutos; satisfeitas essas legitimas exigencias, como o fica pelo presente projecto de lei, somos de parecer que elle deve ser approvado, a fim de ser submettido á sancção regia.

Sala das commissões, 11 de agosto de 1887. = Adriano de A. C. Machado = A. de Serpa (com declarações = Henrique de Macedo = Hintze Ribeiro (com declarações) = Manuel Pereira Dias = A. de Aguiar (com declarações) = Barros e Sá = Thomás de Carvalho = Frederico Ressano Garcia = Francisco de Albuquerque = Jayme Moniz (com declarações) = Conde de Castro = Visconde de Bivar = Candido de Moraes = Joaquim de Vasconcellos Gusmão = Tem voto do sr. Augusto José da Cunha.

Projecto de lei n.° 97

Artigo 1.° Os vencimentos dos lentes cathedraticos e professores proprietarios dos institutos dependentes do ministerio das obras publicas, commercio e industria, constam de duas partes, uma permanente ou de categoria, e outra eventual ou de exercicio. Constitue vencimento permanente ou de categoria o estabelecido na tabella annexa ao decreto de 2 de dezembro de 1886 e no artigo 55.° do mesmo decreto, e nos n.os 2.° e 4.° da tabella n.° 1 annexa ao decreto de 30 de dezembro de 1886. O vencimento eventual ou de exercicio consiste n'uma gratificação mensal de 43$000 réis nas mesmas condições em que igual gratificação for concedida aos lentes cathedraticos e professores proprietarios dos estabelecimentos de instrucção superior dependentes do ministerio do reino.

§ 1.° Para occorrer ao augmento da despeza resultante do disposto n'este artigo, é o governo auctorisado:

1.° A augmentar de 50 por cento o imposto das matriculas no curso superior do commercio nos institutos industriaes e commerciaes, e de 100 por cento o das matriculas e cartas em todos os cursos do instituto de agronomia e veterinaria;

2.° A estabelecer uma tarifa de preços para as analyses, por conta de particulares, feitas nos laboratorios dos institutos e nos das estações chimico-agricolas, creadas pelo decreto com força de lei de 9 de dezembro de 1886;

3.° A augmentar de 40 por cento as pensões diarias dos animaes de grande porte no hospital veterinario, annexo ao instituto de agronomia e veterinaria;

4.° A augmentar de 40 por cento a taxa de reconhecimentos de minas;

5.° A elevar o imposto pelo termo do registo das marcas de fabrica e de commercio a uma quantia não superior ao sêllo do alvará das patentes de invenção;

6.° A elevar de 10 por cento os impostos de qualquer denominação incidentes sobre as patentes de invenção.

§ 2.° As receitas creadas em virtude d'este artigo são rendimento do estado para todos os effeitos.

Art. 2.° Fica revogada a legislação contraria a esta.

Palacio das côrtes, em 9 de agosto de 1887. = José Maria Rodrigues de Carvalho, presidente = Francisco José Machado, deputado vice-secretario = F. de Almeida e Brito, deputado servindo de secretario.

O sr. Presidente: - Está em discussão na generalidade.

O sr. Vaz Preto: - Sr. presidente, nem eu, nem os meus amigos podem approvar este projecto, porque traz augmento de despeza. N'esta minha declaração não faço mais do que ir de accordo com a declaração que varias e repetidas vezes já aqui tenho feito, de que votava contra todos os projectos de lei que importassem augmento de despeza que não fosse impreterivel e inadavel.

Não havendo mais quem pedisse a palavra, foi approvada a generalidade do projecto e em seguida sem discussão a especialidade.

O sr. Presidente: - Continúa agora a discussão da generalidade do projecto de lei n.° 146, sobre os tabacos.

Tem a palavra o digno par o sr. Hintze Ribeiro para continuar o seu discurso começado hontem.

O sr. Hintze Ribeiro: - (Concluiu o seu discurso começado na sessão antecedente. Por indicação do digno par, não se publica extracto d'este discurso, que s. exa. não pôde restituir ainda, e que prefere publicar na integra com a parte d'elle respectiva á sessão antecedente.

O sr. Presidente: - Vão ler-se dois officios remettendo documentos que estão sobre a mesa.

São os seguintes:

Officio do ministerio dos negocios de fazenda, remettendo a nota com differentes esclarecimentos relativos á exportação para Hespanha, e de Hespanha para Portugal, do gado vaccum e suino, e á importação do azeite de oliveira de Hespanha para consumo do paiz, nos cinco annos decorridos de 1883 a 1887, ficando por esta fórma satisfeito o requerimento do digno par o sr. Barbosa du Bocage.

Officio do mesmo ministerio, remettendo copias da portaria de 19 de agosto de 1887, auctorisando o levantamento de um emprestimo da caixa geral de depositos á companhia da fabrica de louça das Caldas da Rainha, e bem assim do contrato celebrado entre a mesma companhia e a referida caixa em 20 d'aquelle mez; ficando assim satisfeito o requerimento do digno par o sr. Arrobas.

O sr. Presidente: - Estes documentos ficam á disposição dos dignos pares.

Os dignos pares que approvam que seja expedido ao governo o requerimento do sr. Arrobas, que vae ser lido, tenham a bondade de se levantar.

Foi lido e approvada a expedição.

É do teor seguinte:

Requerimento

Requeiro que se peça ao governo que, pelo ministerio das obras publicas, remetta a esta camara, com urgencia, copia do relatorio da ultima inspecção feita á escola industrial estabelecida nas Caldas da Rainha.

Sala das sessões da camara dos pares, 15 de maio de 1888. = Antonio Maria Barreiros Arrobas.

O sr. Presidente: - A hora está a dar; aproxima sessão será ámanhã, e a ordem do dia é a mesma que estava dada para hoje.

Está levantada a sessão.

cinco horas da tarde.

Página 746

746 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

Dignos pares presentes na sessão de 15 de maio de 1888

Exmos. srs.: João Chrysostomo de Abreu e Sousa; Marquezes, de Sabugosa, de Vallada; Condes, de Alte, de Bomfim, de Castro, de Gouveia, de Linhares, de Magalhães, de Paraty; Bispo de Bethsaida; Viscondes, de Arriaga, de Bivar, de Porto Formoso, de Silva Carvalho, de Soares Franco, de Valmór; Adriano Machado, Agostinho Lourenço, Braamcamp Freire, Sousa Pinto, Antunes Guerreiro, Barreiros Arrobas, Couto Monteiro, Senna, Serpa Pimentel, Costa Lobo, Telles de Vasconcellos, Barjona de Freitas, Cau da Costa, Augusto Cunha, Bernardo de Serpa, Carlos Testa, Sequeira Pinto, Pinheiro Borges, Hintze Ribeiro, Cardoso de Albuquerque, Costa e Silva, Margiochi, Ressano Garcia, Andrade Corvo, Candido de Moraes, Leandro Valladas, Vasco Leão, Gusmão, Bandeira Coelho, Macedo Pinto, Castro, Fernandes Vaz, Silva Amado, José Luciano de Castro, Lobo d'Avila, Raposo do Amaral, Silvestre Ribeiro, José Tiberio, Bocage, Camara Leme, Luiz, Bivar, Vaz Preto Franzini, Miguel Osorio Cabral, D. Miguel Coutinho, Silvestre Lima, Thomás Ribeiro, Serra e Moura.

Redactor = Fernando Caldeira.

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×