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APPENSO AO N.º 257 DO DIARIO DO GOVERNO.

CAMARA DOS SENADORES.

36.ª Sessão, em 25 de Agosto de 1840.

(Presidencia do Sr. Duque de Palmella.)

Á uma hora e meia da tarde foi aberta a Sessão; presentes 39 Srs. Senadores. Leu-se a Acta da Sessão precedente; ficou approvada, e na desta se mandou lançar a seguinte

Declaração. Declaro que se estivesse presente á votação da Lei que se questionou Sabbado passado, votaria contra o 1.º Artigo da mesma. — Manoel de Sousa Raivoso. Mencionou-se a correspondencia seguinte: 1.° Um Officio do Sr. Senador Visconde de Semodães, participando que negocios de interesse particular o obrigavam a ir á Cidade do Porto, donde espera voltar o mais breve possivel.

2.º Um dito do Sr. Senador Leitão, fazendo sciente que, por indisposição de saude, lhe não é possivel comparecer em algumas das proximas Sessões.

De ambos ficou a Camara inteirada.

3.º Um dito da Presidencia da Camara dos Deputados, acompanhando uma Mensagem da mesma Camara que incluia um Projecto de Lei sobre ser authorisada a Camara Municipal do Concelho de Tavira para contrahir um emprestimo, a fim de levar a effeito o desentupimento do rio daquela Cidade. — Passou á Commissão de Administração.

4.° Outro dito da dita que acompanhava outra dita incluindo um Projecto de Lei sobre ser a elevado a tres o numero actual dos Contadores dos Juizos de Direito de 1.ª Instancia da Comarca do Porto. — Foi remettido á Commissão de Legislação.

5.° Outro dito da dita, que acompanhava outra dita incluindo um Projecto de Lei sobre serem as Camaras Municipaes das Cidades de Ponta Delgada, na Ilha de S. Miguel, e da Horta, na Ilha do Fayal, authorisadas para contrahirem emprestimos, a fim de construirem mercados publicos nos seus respectivos Districtos. — Mandou-se á Commissão de Administração.

6.º Outro dito da dita, que acompanhava outra dita, incluindo um Projecto de Lei sobre ser authorisado Manoel Rodrigues Teixeira Pena para construir á sua custa, e em terreno seu uma ponte de Madeira sobre o rio Sadão. — Enviou-se á mesma Commissão.

7.º Outro dito da dita, que acompanhava uma dita incluindo um Projecto de Lei, sobre ser concedido ao Governo um credito extraordinario para se applicar exclusivamente a reparar os estragos que nos tres Districtos dos Açôres, causou a tempestade no dia 5 de Dezembro de 1839. — Foi remettido á mesma Commissão.

8.° Outro dito da dita, que acompanhava outra dita incluindo um Projecto de Lei sobre poderem os Empregados Publicos jubilados, apresentados ou reformados, quando forem nomeados para novo emprego accumular meio vencimento desse novo emprego. — Passou ás Commissões de Administração e Fazenda.

9.º Outro dito da dita, participando terem sido approvadas, na Camara dos Deputados, as emendas por esta feitas ao Projecto de Lei sobre serem extensivas a diversos Officiaes as disposições da Concessão d'Evora-monte.

10.° Outro dito da dita, participando terem sido approvadas, naquella Camara, as emendas por esta feitas sobre o Projecto de Lei relativo a suspender-se a garantia expressa no § unico do Artigo 20.° da Constituição.

De ambos ficou a Camara inteirada.

11.º Um dito pelo Ministerio dos Negocios do Reino, acompanhando a Acta da eleição, para um Senador e um Substituto, que ultimamente tivera logar no Circulo das Ilhas de S. Thomé e Principe. — Foi mandada á Commissão, de Poderes.

A de Legislação se remetteu uma Representação da Junta de Parochia da Freguezia e Concelho de S. Martinho de Mouros, pedindo a discussão e approvação do Projecto de Lei sobre a responsabilidade dos Ministros da Corôa.

Obtendo a palavra, disse

O Sr. Arouca: — Sr. Presidente, é contra minha vontade que sou obrigado hoje a tomar o tempo á Camara com um objecto que não interessa o publico, mas que todavia me parece não ser estranho a esta Assembléa por isso que é relativo a um de seus Membros. Distribuiu-se ha dias nesta Casa um folheto com o titulo de — Resposta Official do Brigadeiro Marinho, como Governador de Cabo Verde, sobre varias accusações contra elle dirigidas, ou feitas ao Governo por cento e tantos moradores d'aquella Provincia. — Neste folheto são insultados não só eu, mas todos os habitantes daquella Provincia, que se tem atrevido a dar um ai, a soltar uma queixa, contra o Governo de ferro daquelle Governador; os doestos, a polemica a mais indecente e abjecta, a lingoagem mais dissoluta e torpe, são os argumentos desse parto hediondo da immoralidade! Pelo que pertence á minha vida privada, eu exigirei a satisfação que pede a minha honra; pelo que pertence aos actos do meu Governo já em 1837 dirigi á Camara uma justificação documentada, na qual, narrando os actos governativos do meu adversario e os meus, fiz um perfeito contraste aos meios, tão indignos de homem Cavalheiro, com que sou hoje agredido nesse immundo folheto que se distribuiu: a essa mesma exposição remetto os illustres Senadores, para que, confrontando-a com o indecente libello do Brigadeiro Marinho, possam avaliar os dous Governadores, e pronunciar entre a probidade d'um e d'outro.

Sr. Presidente, neste folheto não ha um facto verdadeiro, nem um raciocinio ao menos! É facil escrever quando as razões e a defeza se limitam a individualidades indecentes, e a insinuações torpes e falsarias; mas não fui só eu o vilipendiado, foi muita gente boa da Provincia de Cabo Verde, foi o meu Secretario, a quem se assaca ter dado a uma embarcação um Passaporte, que não foi dado por elle, e ter recebido 600 patacas por esse Passaporte, sendo a prova d'uma accusação tão horrivel uma conta de reducção de 600 patacas a onças hespanholas que se diz achada no seu quarto, á sua retirada, como que se algarismos se podesse conhecer quem os escreveu! Para conhecer, Sr. Presidente, a torpeza do accusador basta ponderar, que tendo o Pai desse meu Secretario sido Governador em Guiné, sendo morto ha vinte annos, não o tendo conhecido o Brigadeiro Marinho, e tendo fallecido na elevada classe dos Officiaes Generaes, Marinho desenterra hoje as cinzas desse Militar defunto, para insultar seu filho, accusando o Pai de se haver enriquecido por meio de sua authoridade, e isto por informação que refere ter-lhe dado um homem, que tambem nunca o viu nem o conheceu, nem era talvez nascido quando o Brigadeiro José Antonio Pinto, Pai do meu Secretario, deixou o Governo da Costa de Guiné, em 1812!

Um Official que estava ás minhas ordens, é insultado com o epitheto de —- barbeiro d'Almada! — E todavia, Sr. Presidente, esse Official foi despachado pelo Governo da Rainha, e a sua fé d'officio não o dava tirado da classe dos barbeiros, mas dos Voluntarios do Exercito, tendo feito a Guerra da Restauração! É assim, Sr. Presidente, que se mordem reputações adulterando-se os factos, faltando-se á verdade, e assacando calumnias contra a reputação alheia! A tarefa é facil, mas nenhum homem de bem de certo a invejará....

Terminarei, Sr. Presidente, com uma observação breve, porque em fim não devo tomar mais tempo á Camara. — Sr. Presidente, não se tendo podido evitar a minha entrada nesta Camara, serviu o nome de Brigadeiro Marinho como d'instrumento, manejado por mãos estranhas, para ferir a minha reputação e a dos meus amigos, distribuindo-se esse calhamasso de indecencias, que razões de politica externa tinham feito guardar, e pelas quaes o espirito de partido saltou, exhibindo documentos que as conveniencias do serviço publico, e que o decoro d'alguem, e do mesmo que as publica exigia que se occultassem!!! Sr. Presidente, eu não fusilei homens sem processo, não fiz casamentos forçados, não dessipei os dinheiros publicos com gratificações e despezas illegaes, não fui finalmente Governador d'um partido; mas tenho um crime imperdoavel, e tal é o de ter resistido a um acto de sedicção e rebellião forjado pelo Brigadeiro Marinho, Recusando-lhe o Governo da Provincia que pertendeu arrebatar-me com a força bruta, e entregando-lho só depois que, nomeado legitimamente por Sua Magestade, deixou de ser um chefe de conspiradores! E este o meu crime, Sr. Presidente, não tenho outros, mas este não é crime para quem tem a consciencia dos seus deveres, e para quem respeita a religião de seus juramentos. — Tenho dito o que basta, Sr. Presidente, não passarei d'aqui....

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: - Sr. Presidente, não é minha intenção fallar neste folheto (que recebi, e do qual nem uma só folha ainda abri) nem tão pouco entrar no merito do queixume do illustre Senador o Sr. Arouca; é minha obrigação declarar que o Brigadeiro Marinho tem merecido muito conceito a todos os Governos, debaixo de cujas ordens tem servido, e deu muito fiel execução ás ordens do Governo nas Ilhas de Cabo Verde emquanto ás medidas para a suppressão da escravatura, trafico em que outros, compromettendo o Governo, se enriqueceram. Foi despachado pelo Sr. Visconde de Sá da Bandeira para esse mesmo fim, para a Provincia de Moçambique, e fez-se justiça ao seu zelo. Em quanto eu tive a honra de conservar a Pasta dos Negocios da Marinha não recebi de todos os seus subordinados, senão testemunhos de affecto e respeito para com elle, menos de um homem, que, por seu cabedal, guerrêa quem o não deixa disfructar aquellas Ilhas. Por tanto não será esta a occasião de fazer uma diatribe contra um Empregado Publico que está tantas legoas distante de Portugal; e se a materia é de folhetos, responda-se com folhetos; e não se venha aqui á sombra da dignidade senatorial fallar de modo pouco lisongeiro, ácerca de um homem que está ausente.

O Sr. Visconde de Sá da Bandeira: — Não tenho nada a dizer sobre o folheto do Brigadeiro Marinho, e só alguma cousa pelo que me respeita. O Sr. Marquez de Loulé quando era Ministro da Marinha, procurando nomear um homem de probidade e conhecimentos para Governador das Ilhas de Cabo Verde, nomeou o Brigadeiro Marinho; e quando eu entrei depois naquelle Ministerio, conservei-o por uma razão; e era que, ainda que o Governo conhecia que da parte delle poderia haver algum erro, com tudo considerou que tinha uma qualidade indispensavel para bem governar em Ultramar a probidade, e o ser desapegado dos desejos de fazer dinheiro. O Governo deve ter o maior cuidado em procurar gente capaz para empregar naquellas paragens e mesmo assim, muitas vezes se engana; porque ha empregados, que indo alli, em logar de fazerem aquillo que se obrigaram; em logar de executarem as ordens do Governo no desempenho dos seus deveres, não tractam se. não de adquirirem dinheiro em pouco tempo. Não me quero referir a individuo nenhum em particular: digo porém que aquella fôra a razão principal porque o Governo conservou no governo de Cabo Verde o Brigadeiro Marinho,

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e pela mesma razão o nomeou posteriormente para o de Moçambique. É preciso ter attenção ás diversas circumstancias criticas em que se achou o Brigadeiro Marinho, especialmente na occasião em que houve uma contestação entre elle, e o Sr. Senador Arouca que agora fallou. — Não approvo seguramente a linguagem do folheto que se publicou; mas tambem não venho fazer o processo de quem não está aqui presente, e por tanto não entrarei na materia de que nesse folheto se tracta.

O Sr. Miranda: — Eu não quero entrar na questão pessoal, nem a minha intenção é dizer cousa alguma em desabono do Governador actual de Moçambique; mas não posso approvar, e nisso vou de accôrdo com o illustre Senador que me procedeu, não posso approvar, digo, a linguagem daquelle folheto, que bem se vê ser filha de paixão e da irritação, produzida por circumstancias, que não estavam a cargo do Governo daquelle tempo. Sabe-se muito bem o que se passou nas Ilhas de Cabo de Verde, antes e depois dos acontecimentos de Novembro de 1836; sabe-se que tractou de seu moto proprio de insultar o Governador ou Governo então existente, e que nesse tempo o meu nobre collega o Sr. Arouca manteve a sua authoridade, como effectivamente a devia manter, e não é de certo para elogiar o procedimento do Brigadeiro Marinho que pelo menos, foi muito irregular. Por consequencia não é da minha intenção justificar o Governador que alli se achava, hoje Membro desta Camara; mas tambem ninguem poderá com justiça elogiar o Brigadeiro Marinho, nem approvar a linguagens daquella obra; deveria ser mais moderada e mais conforme á sua patente e ao logar que actualmente occupa. Não quero dizer mais nada; concordo com o nobre orador; porém não acho proprio que assim escreva um Governador de Provincia, e ainda menos proprio me parece que um folheto escripto em tal linguagem se distribua nesta Camara.

O Sr. General Raivoso: - Sr. Presidente, pedi a palavra só para dizer uma palavra. — Conheço muito de perto o General Marinho, servi com elle quatro annos na Terceira e depois no Porto; e estou persuadido, e muito altamente persuadido que elle não merece o nome que eu ouvi repetir ao Sr. Senador Arouca; conheço-o muito de perto. É só o que digo, e nada mais. (Vozes: — Ordem do dia, ordem do dia.)

O Sr. Mello e Carvalho: — Era simplesmente para pedir a V. Ex.ª que houvesse de propôr á Camara (por isso que ha pouco a fazer) que o Parecer da Commissão de Legislação sobre a admissão dos Conselheiros do Supremo Tribunal de Justiça, e Juizes de Primeira e Segunda Instancia, que perderam os seus logares em virtude dos acontecimentos de Setembro de 1836 entrasse hoje mesmo em discussão, no caso que houvesse tempo.

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: — Eu declaro que voto por esse Projecto, mas não me parece que á sua materia seja de tal modo urgente que se deva alterar todo o Regimento só com o fim de o discutir, visto que é objecto de interesse particular.

O Sr. Mello e Carvalho: — A minha proposta não tem por objecto alterar as formulas do Regimento; parece-me sim que, havendo hoje poucos assumptos a tractar, se poderia decidir este, que, por sua natureza, creio, não terá grande discussão, quando nenhuma.

O Sr. General Zagallo: - Sr. Presidente, eu não posso deixar passar a asserção de que hoje tenhamos poucos assumptos a tractar: está dado para ordem do dia o Parecer da Commissão de Guerra N.º 19, sobre alguns artigos do Projecto de Regulamento para a organisação do Exercito... (Vozes: — Não está; é o do Sal.) O que se segue dahi, é haver mais uma preterição na discussão daquelle Parecer, que umas poucas de vezes tem sido dado para ordem do dia, e outras tantas se tem deixado de discutir; se isto é com justiça, o publico O decidirá.

O Sr. Presidente: — Em resposta ao Sr. Zagallo devo dizer, que eu não fui quem deu a ordem do dia, mas sim o Sr. Secretario que servia de Presidente naquella occasião; todavia, não acho que se possa dizer preterição, antepôr a qualquer objecto da Casa a discussão de um Projecto vindo da Camara dos Deputados, cuja urgencia, como neste caso, é reconhecida por todos os Srs. Senadores: concluo dizendo, que a minha intenção era dár para discussão, logo seguidamente aos que se devem tractar hoje, o Parecer da Commissão de Guerra a que alludio o illustre Senador.

O Sr. General Zagallo: — Acho muito conveniente que os Projecto que vem da outra Camara tenham aqui alguma preferencia na ordem das discussões, mas é preciso que haja uma certa igualdade neste objecto: se dermos sempre exclusiva preferencia aos assumptos que nos forem remettidos da Camara dos Deputados, occupando-nos só desses trabalhos, o que se segue é que concluidos elles, nós ficaremos sem ter mais nada que fazer, e de facto se acabará a iniciativa do Senado, e a Constituição nesta parte de nada servirá, sendo escuzado fazer-se aqui qualquer proposta, porque effectivamente se não discutira. Entendia eu que era mais rasoavel e economico que entre esta e a outra Camara se trocassem os trabalhos, e que em quanto lá se discutissem os seus, fossemos nós tambem discutindo os nossos; até para que não acontecesse agora o mesmo que aconteceu na Legislatura passada, pois que então a Camara dos Deputados não só não discutio tres ou quatro Projectos que o Senado lhe remetteu, mas até lá se deixaram perder alguns delles desgraçadamente. Concluo que, a continuar-mos neste methodo de preferencia absoluta, o resultado será ficar-mos sem iniciativa, e á Constituição rasgada por culpa nosso. (Apoiados)

O Sr. Presidente: — Em these será isso muito exacto, mas parece-me que não póde ter applicação ao caso presente; repito que eu tinha tenção de dar o outro Parecer, para se discutir logo depois deste.

O Sr. Secretario Machado: — Não posso deixar de dizer o motivo por que dei este Projecto para ordem do dia: estão setenta e tantos navios em Setubal á espera desta decizão para carregarem de sal, e a requerimento de muitos Srs. Senadores que reputaram o objecto da maior urgencia, foi que me pareceu conveniente da-lo para ordem do dia de hoje.

O Sr. Azevedo e Mello: — Nós sabemos pela bocca do Sr. Ministro da Justiça que alguns Tribunaes estão fechados por falta de Juizes, S. Ex.ª aqui o declarou pedindo a urgencia deste Projecto ao que a Camara manifestou annuir: não vejo que haja defficuldade em que depois de discutido o Parecer que foi dado para Ordem do Dia, se siga a discas são do outro Parecer, sobre o Projecto da Camara dos Deputados para a reintegração dos magistrados; quanto mais que a materia é tão simples que pouca reflexão demanda, e que o nobre Senador se não oppõe antes disse que o apoiava e dava ao Projecto todos Os seus Votos: por tanto eu proponho isto, e insisto em que se defira ao requerimento do Sr. Senador que pedio essa discussão para hoje.

O Sr. Visconde de Sá da Bandeira: — O Sr. General Zagallo prevenio-me. Quando se disse que se devia tractar deste Projecto com preferencia por ter vindo da outra Camara, queria eu responder que o anno passado foram á aqui quatro ou cinco Projectos, de que alli se não tractou, e ficaram sem discussão: por tanto nós não nos devemos restringir a seguir formulas que a outra Camara não segue, discutindo, com preferencia aos nossos, os trabalhos que ella nos manda, -visto que alli se não dá muita pressa aos que nós para lá remettemos.

O Sr. Miranda: — Eu não acho fundamento nenhum nos argumentos que se deduzem do procedimento da outra Camara; o Projecto não foi dado para ordem do dia por ter vindo da outra Camara, mas sim pela urgencia do seu objecto, urgencia reclamada por grande numero de Membros desta Camara e da outra: e não se póde fazer arguição ao Sr. Presidente, ou áquem suas vezes fazia, por lhe haver dado preferencia na ordem das discussões. O Projecto é muito simples, e o tempo que se tem gasto na discussão de Ordem, podia-se ter economisado para o approvar. O tempo que muitas vezes gastamos em questões desta natureza, é tempo precioso, que poderia aliás empregar-se com vantagem da Nação. (Apoiados.) O outro Projecto ácerca dos ministros demittidos, é tambem de muita importancia, porque tende a fazermos um acto de justiça, principalmente, depois de se terem approvado outros de igual natureza. Por tanto eu proponho que logo que se approve o Projecto sobre a Lei relativa á exportação do Sal, se entre na discussão do Projecto N.º 36; a approvação deste Projecto presentemente não é um acto de generozidade é um acto de justiça, e todos os Membros da Camara confessam que votarão unanimemente por elle. Depois teremos todas as largas necessarias para tractar pausadamente do Projecto do Sr. Zagallo.

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: — Ainda bem que eu comecei dizendo, que approvava o Projecto cuja urgencia o nobre Senador Presidente da Relação de Lisboa reclama, porém o que eu combati era essa urgencia extemporanea de entrar já já em discussão esse Projecto só porque assim o mande o Sr. Ministro das Justiças: é isto o que eu combato, porque desejo que ao menos fique algumas horas sobre a Mesa, para sabermos o que é. Eu quero que se discuta; mas não quero que se peça sempre, e ás cegas, urgencia, e mais urgencia a tudo quanto recomenda um Ministro, porque isso é um precedente terrivel, e que uma vez nos póde levar a funestos resultados.

O Sr. Visconde de Porto Côvo: — Esta discussão vai progredindo, e a meu modo de vêr ella não devia continuar, porque nenhuma razão ha para isso. — Um illustre Senador pedio que se discutisse este Projecto, e, sendo isto uma Proposta, segue-se o pôla V. Ex.ª á votação, e a Camara resolverá se deve ou não discutir-se. Em quanto porém ao Projecto sobre o Sal, esse foi dado para ordem do dia de hoje, e então nenhuma duvida póde haver em que elle deve discutir-se. Agora pelo que respeita ao que disse o Sr. Zagallo, permita S. Ex.ª que eu lhe observe que nenhum logar tem as suas reflexões, por quanto ainda não foi remettido á actual Camara dos Deputados, durante esta Sessão, nenhum Projecto de Lei que tivesse origem no Senado, e o que aconteceu com a Camara passada, uso vem muito mal applicado para o caso presente. Faço por tanto meu o requerimento do illustre Senador o Sr. Mello e Carvalho, e rogo a V. Ex.ª que o proponha á Camara.

O Sr. Mello e Carvalho: — Desejo dár uma explicação a qual se reduz a declarar, que eu não disse que pedia a discussão do Projecto ácerca da reintegração dos Conselheiros do Supremo Tribunal Justiça, e dos Juizes; unicamente fiz ponderações a respeito da Justiça delle, e accrescentei que se fosse possivel entrar hoje em discussão seria isso muito conveniente pelas razões de todos nós conhecidas, não sendo menor, Sr. Presidente a razão importantissima da falta de Membros nos Tribunaes. — Insisto por tanto no meu requerimento, e peço a V. Ex.ª o queira propôr.

Consultada a Camara, resolveu que o Projecto de Lei, a que alludira o Sr. Mello e Carvalho fosse discutido logo depois do negocio seguinte.

Parecer.

A Commissão de Fazenda examinou o Projecto de Lei approvado na Camara dos Deputados, e dirigido a esta Camara, o qual tem por objecto ampliar as disposições da Lei de 11 de Abril de 1839, favorecendo a exportação do Sal, e facilitando ao mesmo tempo m exportação de outros generos da nossa producção, que igualmente convem favorecer.

A Lei de 11 de Abril de 1839 isenta de direitos de tonelagem todas as Embarcações Nacionaes, e Estrangeiras, que sairem de nossos Portos com carga completa de Sal. Acontece, porém que em muitos Navios com carga completa de Sal, em os quaes, attenta a naturesa da carga, fica sempre um espaço vasio, em que podem arrumar-se alguns artigos de producção do Paiz, todavia estes artigos não tem sido recebidos pelos Carregadores, por que esta carga addicional deixa, e se tem entendido deixar os Navios expostos a pagarem a tonelagem por inteiro.

A Commissão reconhece a grande vantagem, que ha em remover-se este embaraço, que fica remediado pelas providencias, que se acham neste Projecto de Lei. Por estas razões a Commissão é de Parecer que o Projecto deve ser approvado por esta Camara. Casa da Commissão 30 de Agosto de 1840. = Visconde da Sobral = Barão de Villa Nova de Foscôa = Luiz José Ribeiro = Barão do Tojal = Manoel Gonçalves de Miranda = Visconde de Porto Côvo.

Projecto de Lei (a que se refere o Parecer.)

Artigo 1.° As Embarcações Estrangeiras, que carregarem de Sal, pelo menos dous terços da sua lotação, serão consideradas com carga inteira para os effeitos do Artigo 1.° da Lei de 11 de Abril de 1839.

§ unico As Embarcações Estrangeiras as sim carregadas poderão completar o seu carregamento com generos Nacionaes, ou Estrangeiros, pagando o direito de tonelagem, que

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lhes corresponder, segundo a natureza dos mesmos generos, e na conformidade das Leis.

Art. 2.º São comprehendidas nas disposições da presente Lei as Embarcações Portuguezas, que carregarem Sal para Portos Estrangeiros, gozando do favor especial do Decreto de 14 de Novembro de 1836.

Art. 3.º Fica revogada a Legislação em contrario.

Palacio das Côrtes em 4 de A gosto de 1840. = João de Soma Pinto Magalhães, Presidente = José. Marcellino de Sá Pargos, Deputado Secretario = João Antonio Lobo de Moura, Deputado Secretario.

Sobre a generalidade deste assumpto, disse

O Sr. Miranda: — Levanto-me simplesmente para explicar o que deu motivo a este Projecto de Lei, o qual é, propriamente fallando, uma emenda da Lei de 11 de Abril de 1889. A Lei de 11 de Abril de 1839 com o fim de proteger a exportação do Sal, isentou de direitos de tonelagem todos os navios que sahissem com carga inteira de Sal; porém acontece que tomando os navios a bordo toda a carga de Sal, e podendo ainda levar algumas caixas de laranja, ou fruta da terra, ou outra encomenda, entendeo-se na Alfandega, como era natural pela falta de declaração na Lei, que a carga não era completa de Sal, por levar outra carga addiccional, por minima que fosse, e que assim o navio não podia gozar do beneficio da Lei, donde contra o espirito e fim da Lei resultava o inconveniente de não se podérem exportar, por pequenas partidas, algumas producções do paiz, que os navios com toda a carga de Sal poderiam ainda receber a bordo. Todos sabem, ou, pelo menos, aquelles que têem alguma idéa de carregeção de navios, ou de architetura naval, que nem toda a carga é propria para occupar em um navio toda a tonelagem de volume, porque esta é diversa da tonelagem de peso. Um navio póde levar toda a carga de Sal, mas ainda lhe resta algum espaço, no qual, sem inconveniente, póde levar alguns volumes, que não sejam de grande peso. Em Setubal têem carregado caixas de fruta, ou outro qualquer genero; mas como na Alfandega obrigam a pagar por inteiro, os carregadores representaram; e é em consequencia destas representações que se apresentou este Projecto de Lei para favorecer ainda mais a exportação do Sal, e ao mesmo tempo de alguns outros productos da nossa industria rural, que devemos animar e promover por todos os meios a nosso alcance. Parece-me pois que esta Camara tendo em consideração a utilidade do paiz, deve approvar este Projecto, tal qual está redigido,

O Sr. Barão da Ribeira do Sabrosa: — Eu começo por declarar que dou o meu voto a todo o Projecto, porque o meu desejo é apoiar todas as medidas que tenderem a auxiliar o Commercio, e a Agricultura do nosso Paiz; porém como esta Camara não tem a iniciativa sobre impostos, eu quero lembrar que devem tambem ser aliviados os vinhos do Douro, do pagamento dos doze mil réis que pagam de direitos de exportação por cada pipa, (Repetidos apoiados.) não só para se favorecer assim a exportação dos nossos vinhos, como tambem para evitar a pesada excepção em que estão os vinhos do Douro. Se eu pois não posso apresentar aqui um Projecto de Lei a este respeito, nem posso vêr muitas vezes nesta Camara o Sr. Ministro da Fazenda, quero ao menos aproveitar esta ocasião para tocar na materia, a fim de chegar ao conhecimento de S. Ex.ª e da outra Camara. (Apoiados.)

O Sr. Vellez Caldeira: — Já o anno passado, Sr. Presidente, esta Camara estava disposta a fazer o beneficio que hoje se apresenta neste Projecto de Lei; porém como senão queria embaraçar o bem que já vinha feito no Projecto que então se apresentou, vindo da outra Camara, o a Sessão estivesse no fim, deixou-se passar tal qual estava, para depois na Sessão seguinte, que é esta, melhor se poder tractar a materia. Em consequencia digo que voto pelo Projecto na generalidade; e quiz dar esta explicação para que se saiba que o Senado esteve sempre deste accordo.

O Sr. L. J. Ribeiro: — Ninguem ainda disse que se oppunha ao Projecto que está em discussão; e ainda bem. Porém como alguns illustres Senadores fallaram sobre a necessidade de se diminuírem o direitos a alguns dos generos de nossa producção, por assim o pedir a equidade, eu apoiarei S. Ex.ª quando for tempo opportuno; e accrescentarei agora, que muito folgo em vêr que a Camara vai entrando no verdadeiro caminho, pelo qual se podem promover os interesses nacionaes, a par dos interesses do Thesouro. Eu ainda espero, Sr. Presidente, que chegue uma época em que se possam aliviar do pagamento dos direitos de exportação, tudo quanto fôr de producção nacional: (Apoiados.) são estes os meus principios, e os meus desejos, os quaes confio vêr ainda verificados quando se abandonarem de todo idéas mesquinhas e apoucadas, e se entender geralmente, que os direitos fortes, atenuam a Agricultura, a Industria, e o Commercio; e não aproveitam ao Thesouro tanto como alguem pensa. A diminuição dos direitos por saída não e que ha de pôr o Governo em embaraços, porque essa supposta falta ha de ser supprida pelos direitos que pagarem os generos que vierem em retorno: e note-se, que estes principios são tão exactos, quanto o mostra o expediente acertado, que têem tomado alguns Governos de outros Paizes, nos quaes até se offerecem premios a quem exporta maior quantidade de productos nacionaes, como sabem muito bem os illustres Senadores. Por conseguinte, approvo o Projecto tal qual está, e apoio as idéas dos illustres Senadores que me precederam, estimando eu muitissimo vêr tanto as Camaras, como o Governo, resolvidos a prestarem todo o auxilio a tudo quanto é nosso, a fim de facilitar aos productos nacionaes a sua prompta saída. (Apoiados.)

O Sr. Barão do Tojal: — Esta materia é muito clara, e tudo quanto se disser a respeito della é ocioso; e eu só referirei um facto que teve logar quando fui Ministro dos Negocios da Fazenda. — Procuraram-me individuos pertencentes a uma casa estrangeira aqui estabelecida, propondo-me para tomar sobre mim a responsabilidade quanto a dez navios estrangeiros que aqui deveriam vir d'Hamburgo com dez pipas de genebra cada um para o mercado de Buenos-Ayres, para aqui completar as suas cargas com sal: eu tinha toda a vontade de tomar esta responsabilidade sobre mim, mas a Lei era tão positiva que não pude de maneira nenhuma condescender com a vontade do proponente, nem com a minha propria, posto que de tão evidente utilidade aos interesses do Paiz; e daqui resultou não se carregarem os dez navios de sal, porque a Lei da Tonelagem o embaraçava.

Sr. Presidente, os nossos generos de exportação devem ser aliviados de todo e qualquer onus: como objecto de represalia para aquellas Nações Commerciaes que restringem o nosso Commercio, para isso é muito bom que hajam, em certos casos, direitos de Tonelagem, mas nada bom, nem util é em principio geral para Portugal, que tem generos de exportação como é a fructa, sal, vinho, e outros, aos quaes nós precisamos dor despejo. (Apoiados.) O direito de doze mil réis imposto sobre cada pipa de vinho do Porto, é realmente um direito muitissimo pernicioso, e condemnavel por todas as Leis de economia politica, e se eu fosse hoje Ministro da Fazenda, declaro, que viria propôr aqui sem mais demora a extincção desse direito, reduzindo-o á regra geral de um por cento que pagam todos os outros vinhos, e mais productos nossos por exportação. — Sr. Presidente, neste momento temos nas Docas, quarenta e oito mil pipas de vinho do Porto: este immenso deposito estagnado, daquelle vinho que existe em Inglaterra, é ainda aggravado nos seus grandes inconvenientes, não só pelo custo e gastos primitivos, mas ainda muito mais pelos doze mil réis de direitos de exportação que paga á sua saída, o maior de todos os estorvos e disfavor imaginavel á generalisação, e extensão do seu consumo em o Reino-Unido da Grã-Bretanha e Irlanda, pois que o tal direito de doze mil réis por pipa, vem talvez a importar um direito de 20 por cento, sobre o custo de generalidade dos vinhos que para alli se exportam do Porto: isto pois é certamente um estorvo muito grande para a maior prosperidade e desenvolvimento daquelle nosso Commercio, e Agricultura, estorvo este que deve tractar de remover-se; e por isso convêm muitissimo que o Governo se apresse quanto antes a propôr um meio que equilibre aquella receita, propondo ao mesmo tempo a reducção daquelle direito como já disse, para um por cento á saída; aliás soffrerá de certo este ramo da nossa Industria. O primeiro Ministro da Fazenda que se podér conservar no seu logar tempo bastante para poder cuidar nas nossas finanças, quando um systema de maior extensão e regularidade do que aquelles em que temos até aqui caminhado, esse Ministro ha de fazer grandissimas alterações, no modo de lançar os Impostos directos em relação ás posses da Nação, e á situação especial dos contribuintes. Em Inglaterra nunca se collectaram os productos, mas sim a terra, e principalmente os objectos fabris, sendo este direito restituído quando taes Artigos são exportados, o direito sobre a terra (Land tax) foi abolido de todo ha tempos, e hoje nada rende para o Estado. Entretanto os nossos productos estão onerados de maneira tal que, a continuarem os annos estereis, não me causará a menor admiração se quasi todos os Agricultores, que não tenham grandes reservas, abandonarem os seus arrendamentos, ou a cultura de seus predios, porque é impossivel que possam forrar com que satisfazer aos encargos que estão sujeitos, tanto das rendas que pagam como de impostos, segundo a maneira arbitraria em que presentemente são lançados em muitos casos. Por consequencia, considero da maior importancia que por todos os possiveis modos tractemos de animar a nossa Agricultura, e Industria, que realmente carecem de todo o nosso apoio e protecção, e que para prosperarem, como todos desejamos, é mister que seja aliviada quanto for compativel com o estado das nossas finanças, e promovidas por Leis previdentes e protectoras.

Julgando-se a materia sufficientemente discutida, foi o Projecto approvado na sua generalidade, e se passou a tracta-lo em especial.

O Artigo 1.° approvou-se sem discussão.

Lido o § unico, disse

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: — Sr. Presidente, eu são ser se este paragrapho estará assás explicito, para o fim que se deseja conseguir, mesmo já o perguntei a alguns dos meus illustres collegas, conhecedores da materia; a mim parece-me que não. Se esta Lei houvesse de ser publicada com o respectivo preambulo, todas as duvidas ficariam desvanecidas; mas como não é acompanhada de Relatorio algum, penso que nesta parte póde haver alguma confusão. — Peço por tanto aos nobres Senadores, versados neste negocio, ou a algum dos Membros da Commissão, queiram ter a bondade de vêr se com a redacção deste paragrapho, se chega ao ponto que se deseja alcançar; porque me parece que não está tão explicito quanto conviria.

O Sr. Miranda: — Na Commissão ponderou-se alguma falta de clareza que podia tia ver neste Artigo, e creio que a falta é esta que referiu o nobre Senador que acaba de fallar. Segundo me parece esta doutrina é clara, todo o excesso de carga além da carga de sal que houver a bordo, pagaria, ou deveria pagar o direito de Tonelagem, segundo a natureza dos generos carregados; porque ha generos que tem sua Tonelagem por peso, e outros generos que a tem por volume, e nesta conformidade são e devem ser regulados os seus direitos. Por tanto aqui não ha equivoco, ha referencia á Lei, e ninguem póde entender outra cousa. Por Isso assentou a Commissão que não havia necessidade de fazer declaração alguma neste Artigo.

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: — Eu creio que a mente da illustre Commissão, como o seu Relator, o Sr. Miranda, acaba de expôr, é que a letra do Projecto é explicita; póde ser, mas a Grammatica deixa duvida, e faz alguma confusão; e alguns Srs. dizem que não; a mim fica-me esta duvída, e eu não tenho sal que carregar.

O Sr. Barão do Tojal: — Sr. Presidente, na Commissão houve uma discussão longa sobre a redacção deste Artigo; entretanto, posto que alguma cousa pareça obscuro, refere-se claramente ao modo de calcular os direitos da tonnelada de peso, e a de medição: a maior parte dos generos que tem de ser recebidos depois do navio ter carregado dous terços da soa carga de sal, hão de ser, por exemplo, cortiça e caixas de fructa, etc. que são calculados por tonnelada de medição e não por tonneladas de peso; o Artigo diz assim: (leu) este = lhes = é relativo ao genero; por consequencia o calculo por caixas de fructa por tonnelada de medição diz caixas de laranja ou de limão é uma tonnelada; e por tanto são cinco tostões de direitos de tonnelagem que deve pagar o navio, por dez caixas assim como pelos mais artigos chamados de medição, e na Alfandega ha de-se entender esta linguagem technica que á primeira vista parece confusa, mas que não o é para quem está no uso de executar estas Leis.

O Sr. Luiz José Ribeiro: — A duvida ponderada pelo illustre Senador foi tambem lem-

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APPENSO AO N.º 257

brada na Commissão: á Commissão pareceu-lhe á primeira vista pouco explicita a redacção do Artigo, e com effeito ella poderia estar mais clara; mas examinando-se a Legislação a que esta Lei se refere viu-se então que não ha aqui tão pouca clareza como se pertende indicar. Ponderou-se que ha tonnelada de peso, e tonnelada de medida; e então ainda que se quizesse mencionar que os navios que carregassem dous terços de sal e um terço de qualquer outra mercadoria houvessem de pagar direitos de tonnelagem pela differença do augmento da parte da carga, além do sal, se se dissesse com relação expressa ao peso, que estas fazendas occupariam um terço do navio que ficava por carregar não seria esta redacção mais clara?... por isso mesmo que uma tonnelada de peso occupava um espaço menor, do que se fosse lans, cortiça, etc. Então parece-me que não haverá inconveniente em passara Lei como está; porque os Empregados, nas Alfandegas costumados a executar a Lei nesta parte sabem bem quaes são os usos e estylos que devem pratica nesta occasião; por exemplo, um navio de 300 tonneladas, que carregar 200 de sal, e admittir outras fazendas que occupem o resto das tonneladas, o direito será exigido só pela differença ou augmento destas fazendas que admittir. Eu convenho que o Artigo se podia redigir com mais clareza; mas parece-me que passando como está redigido não haverão os inconvenientes notados; e a Commissão entendeu que era melhor prescindir desta perfeição para quanto antes facilitar este favor que o commercio e a industria nacional effectivamente vão ter.

O Sr. Serpa Machado: — Sr. Presidente eu não fallarei da justiça da medida, tracta mos da redacção, e por tanto é objecto puramente grammatical; o reparo que se faz ainda que pareça muito attendivel, bem examinado o Artigo tira toda a duvida: aqui todo o reparo é na construcção grammatical, e to da a duvida se este pronome = lhes = se refere a embarcações, ou a generos; segundo as regras grammaticaes está claro que é aos generos, por ser o substantivo mais proximo a elle; e quando houvesse alguma duvida, lendo para diante = segundo a natureza destes mesmos generos = esta segunda clausula vem a tirar toda a ambiguidade: e o direito é em referencia a esses generos, e não temos nada a emendar. O nobre Senador tendo attenção á construcção da oração, achará que segundo os principios grammaticaes, o periodo está com toda a clareza.

O Sr. Miranda: — Neste artigo o lhes não faz duvida, o lhes é em referencia aos generos estrangeiros, e não ha nesta oração outro sujeito a que se refira, senão a generos. — Em segundo logar o Artigo não daria logar a reparo algum se nelle se declarasse que deveria pagar-se a tonnelagem correspondente, o mais seria um puro é inutil pleonasmo.

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: — Sr. Presidente, eu direi que o lhes se póde chamar commum de tres; masculino, femenino, e neutro. (Susurro.)

Julgada a materia discutida, approvou-se o § unico tal qual estava.

Os Artigos 2.° e 3.° foram approvados sem discussão.

Conforme a deliberação da Camara, foi lido o seguinte

Parecer.

A Commissão de Legislação examinou o Projecto de Lei vindo da Camara dos Deputados para a reintegração dos Juizes, que, em consequencia dos acontecimentos politicos posteriores ao dia 9 de Setembro de 1836, se acham fóra dos seus Logares; e a Commissão é de Parecer que o mesmo Projecto se póde approvar tal qual vem daquella Camara. = Casa da Commissão em 21 d'Agosto de 1840. = Manoel Duarte Leitão = Marcellino Maximo d'Azevedo e Mello = José Nogueira Soares Vieira = Antonio d'Azevedo Mello e Carvalho = Barão de Renduffe = Manoel Antonio Vellez Caldeira Castello Branco.

Projecto de Lei (a que se refere o Parecer.)

Artigo 1.° Os Membros do Supremo Tribunal de Justiça, e os Juizes de Segunda Instancia, que, em consequencia dos acontecimentos politicos, posteriores ao dia 9 de Setembro de 1836, perderam os seus Logares, são. reintegrados nelles.

Art. 2.º O Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, e os das Relações, que pelo referido motivo perderam os seus Logares, terão exercicio de Juizes nos mesmos Tribunaes ou em outros de igual graduação.

Art. 3.° É alterado, sómente para os effeitos desta Lei, o quadro actual do Supremo Tribunal de Justiça, e dás Relações; e os Logares, que vagarem de futuro, não serão providos em quanto excederem o numero ordinario estabelecido nas Leis existentes.

Art. 4.° Os Juizes de Direito de Primeira Instancia, que, pelo referido motivo, perderam seus Logares, são desde já considerados como taes na ordem da Magistratura Judicial, e com direito a ser providos nos Logares, que forem vagando, ou de Primeira Instancia, ou mesmo de Segunda, cabendo-lhes por antiguidade: podendo, até entrarem em effectivo exercicio, acceitar Logares de Commissão, ou Empregos equivalentes áquelles.

§ unico. Em quanto não forem empregados por algum dos modos declarados neste Artigo vencerão metade do ordenado de Juizes de Primeira Instancia.

Art. 5.° Fica sem effeito para os casos declarados nesta Lei toda a Legislação em contrario. = Palacio das Côrtes em 19 d'Agosto de 1840. = João de Sousa Pinto de Magalhães, Presidente = José Marcellino de Sá Vargas, Deputado Secretario = José Avellino da Silva e Motta, Deputado Secretario.

A requerimento do Sr. Azevedo e Mello se dispensou a discussão na generalidade, deveu do logo passar-se á dos Artigos do Projecto.

Lido por tanto o 1.°, teve a palavra

O Sr. Costa e Amaral: — Eu approvo a doutrina do Projecto em geral e a do Artigo 1.º em particular, mas vejo-me obrigado a fazer uma reflexão sobre o mesmo Artigo, para a qual desde já peço desculpa, porque não tenho outro conhecimento deste negocio mais do que o que pude adquirir quando elle aqui chegou. Diz o Artigo: (leu.) entro em algum escruplo se esta reintegração importa uma invasão no Poder Executivo: o reintegrar n'um logar, corresponde a provê-lo, e isso é uma attribuição do Poder Executivo. Eu já disse que não tive tempo de meditar no Projecto, submetto esta observação á Camara, ella decidirá como entender.

O Sr. Vellez Caldeira: — As Leis tem fixado o numero de Membros que devem ter os Tribunaes, mas agora augmenta-se esse numero Com mais estes Juizes, tanto nas Relações como no Supremo Tribunal de Justiça: alguns delles tinham pedido a sua demissão, outros tinham sido demittidos, estes, se lhe não obstasse a fixação do numero dos Membros dos Tribunaes podiam ser admittidos pelo Governo, porque haviam sido demittidos sem se lhes formar culpa; mas tractando-se de uns e outros, como os havia o Governo de reintegrar, se os Tribunaes tinham um numero fixo, e esse numero estava prehenchido? Era por tanto necessaria uma medida legislativa, e é para este fim que n'um dos Artigos do Projecto se diz = que tanto uns como outros sejam reintegrados e considerados como Membros do Tribunal = e por tanto fica derrogada a disposição que manda que todos os Tribunaes tenham numero certo de Membros.

O Sr. Serpa Machado: — Sr. Presidente, vou fazer uma observação importante, em relação a este Artigo e a todos os outros do Projecto, e tanto mais acho esta observação a proposito, que sobre este objecto já eu preveni a Camara de que tinha a fazer uma Proposta ampliando a que actualmente nos occupa; lembrei-me portanto de vêr se esta providencia é, em primeiro logar, justa; segundo, se é necessaria; terceiro, se é defectiva, e julgando-se tal, se apesar disso deve passar reservando o suprimento dos seus defeitos para outra Lei. Em quanto á justiça desta providencia, que se reduz a reintegrar Magistrados que renunciaram seus empregos, os quaes tinham a qualidade de perpetuos, perpetuidade não tanto a favor delles como a favor da boa administração da Justiça e da sua independencia, sendo clausula constitucional, porque existia assim na Constituição anterior como na actual, está claro que o priva-los deste direito é pôr em perplexidade esse direito de perpetuidade que agora se dá aos novos Magistrados, providos em consequencia da reforma do Pacto Social.

Por consequencia esse procedimento é um antecedente na realidade injusto, foi anticonstitucional, e o unico modo de o reparar é este, tanto a respeito dos que renunciaram como dos outros que foram privados de seus logares em consequencia de mudanças na organisação da Magistratura. As duas Comarcas foram convertidas em uma, e depois nomearam-se nella Substitutos para os Juizes proprietarios; os que até então eram proprietarios perderam a sua propriedade, e creados os Substitutos obteve-se o meio de provêr nesses logares a um homem differente que era o que se per; tendia. Por tanto esta mudança não era necessaria, foi artificiosamente preparada e disposta para despachar novas pessoas, tirando os empregos a outros que nelles se achavam. Isto pelo que pertence áquelles Magistrados que delles foram privados pela mudança de organisação. Aquelles porém que perderam os logares pela renuncia que delles fizeram, esses mesmos estão na razão de serem attendidos, porque a sua renuncia foi não em relação á vida da Magistratura, mas sim pelo que dizia respeito aos logares que serviam, isto pelo desgosto em que estavam por se haver alterado o Pacto Social, o qual depois se ligitimou em consequencia do juramento da Constituição de 1838: por tanto aquellas renuncias não tem o caracter de renuncia voluntaria, antes se podem reputar um procedimento filho da honra e da probidade, que por modo algum deve servir de prejuizo a quem o praticou. Consequentemente, a medida é justa e necessaria; um celebre Escriptor diz que o mesmo é ser liberal e ser justo; por tanto se queremos ser liberaes devemos começar por ser justos, e eu considero eminentemente justo empregar estes homens que assim soffreram a privação dos seus logares.

Agora chamo a attenção da Camara para outra especie: esta medida ainda que vai occorrer á reintegração de todos aquelles que ficaram privados dos seus logares em consequencia dos acontecimentos de 1836, deixa com tudo de fóra outros muitos Magistrados que tambem se acham lesados em seus direitos, não digo só os Magistrados que depois da Restauração haviam sido empregados, e que depois ficaram fóra do quadro da Magistratura, mas tambem aquelles que antes dessa época não tinham comettido delictos, e que deviam ser contemplados nesse mesmo quadro: o Governo parece não se julgar authorisado para os empregar, nem a levantar-lhes uma tal ou qual excommunhão politica que sobre elles, e sem conhecimento de causa tem sido comminada. Entretanto, Sr. Presidente, como o Projecto que vem da Camara dos Deputados se não referiu a estes antigos Magistrados, façamos nós então primeiro este acto de justiça, e depois eu mesmo me encarrego de offerecer um Projecto em que apresente estas mesmas razões a favor daquelles que referi, e que estão segundo se pensa, inhabilitados para entrar, podendo o Governo lançar mão de muitos delles para occuparem os logares vagos, sem attenção a opiniões politicas; mas a merecimento, talentos, e virtudes: e peço que se me não extranhe o eu fallar assim, porque hoje em Portugal tem sido tão variada a politica, e tantos os juramentos, que não podemos atirar com a pedra de adultera do Evangelho uns aos outros. (Repetidos apoiados.) Lancemos pois mão do merecimento, e aproveite-se, esteja elle em que homens estiver, porque com isto póde a Nação tirar muitissima utilidade. (Apoiados.) Vão mesmo buscar-se os Magistrados antigos, os quaes muitos delles faziam o ornamento da classe da Magistratura, e o podem continuar a ser. — É esta, Sr. Presidente, a minha opinião.

O Sr. Visconde de Sá da Bandeira: — Sr. Presidente, approvo o principio do Projecto de Lei em discussão: approvo-o porque é conveniente e politico, que cesse quanto antes o resultado das nossas desavenças, e que todos os individuos que por ellas tenham soffrido possam vir tomar parte, e igual interesse no systema que hoje nos rege. (Apoiados.) No entretanto, não posso dizer que concordo em todas as disposições deste Projecto, e faço esta declaração com sentimento bastante, porque vai oppôr-se aos interesses de alguns dos dignos Membros deste Senado. — Digo que não approvo todas as disposições, porque vejo que aquelles que foram Juizes de primeira Instancia ficam com a metade do ordenado, emquanto que aos ex-Juizes dos Tribunaes Superiores se dá o ordenado por inteiro. Eu concordo, Sr. Presidente, em que todas as pessoas privadas dos seus empregos, quer sejam ex-Juizes, quer sejam outros, que ainda não fossem contemplados, sejam admittidos ao serviço publico, dando-se-lhes uma parte do ordenados, abrindo-se-lhes a porta, para entrarem nos seus logares, e ficando o Governa habili-

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DO DIARIO DO GOVERNO.

tado para assim o fazer; mas não posso concordar com a disposição que concede ordenados por inteiro, porque isso vai servir de motivo para exigirem ordenados por inteiro todos os individuos que sahiram dos seus logares em consequencia dos movimentos politicos que tem havido neste Reino: e, Sr. Presidente, havendo já um deficit tão grande, esse deficit crescerá necessariamente, porque são muitas as pessoas que hão dé pretender ser contempladas: por exemplo, Conselheiros de Estado, Conselheiros do Thesouro, Lentes das Escholas, é muitos outros; pára pagar aos quaes, será necessario lançar novos impostos. O Senado Votando agora ordenados por inteiro para os ex-Juizes, não podera com justiça negallos aos mais ex-Empregados que os requererem: é eis aqui mais uma razão para que tu, approvando o principio da Lei, não possa adoptar todas as suas disposições.

O Sr. L. J. Ribeiro: — Sr. Presidente, eu começo por declarar que não approvei a revolução de Setembro de 1836; que não tomei parte em nenhuma das que a precederam, nem será facil que venha a approvar revolução alguma futura; por mais justificados que sejam os motivos com que as pretendem defender, porque, na minha opinião; poucos motivos honestos poderão justificar uma revolução qualquer; e com tudo continuei a servir o meu emprego com toda a lealdade depois da revolução, porque sirvo a Rainha, e a Nação, e não partidos.

Fallando agora do Projecto que nos occupa, digo que eu dezejo muito a reconciliação de toda a familia Portugueza, porque estou persuadido que sem isso será difficil que os negocios do Estado possam caminhar bem; mas seja-me licito observar, que a mim me custa muito a considerar nas mesmas circumstancias, os Portugueses que foram leaes á Rainha e á Constituição, pondo-os em parallelo com aquelles que nos flagellaram, e commetteram atrocidades de toda a ordem. (Apoiados.) Eu entendo, Sr. Presidente, que é conveniente o habilitar para servir esses individuos todos, levantando-se essa excomunhão, para que o Governo os possa aproveitar quando queira, porém não estipendia-los desde já, porque convem ter em muito séria attenção o estado actual em que se acham os rendimentos da Nação, e considerar-se o grande deficit que hoje pésa sobre nós. Eu dezejava muito que se não fizessem promessas que se não possam cumprir, porque isso em logar de accreditar o Governo, o desaccreditará; e os Governos são mais ou menos duradouros, conforme o melhor ou peior desempenho das suas promessas. Ora, eu já vi um Projecto que se apresentou na Camara dos Deputados, que como está redigido, se passar ficarão duas terças partes da Nação a receber só de uma terça parte. Sr. Presidente, eu reconheço que entre os Empregados antigos ha muitos homens de reconhecido prestimo e probidade, os quaes eu dezejo vêr aproveitados, como é de justiça, e quero que fiquem habilitados para entrar nos empregos publicos, mas sem ficarem estipendiados desde logo: por esta fórma, Sr. Presidente, se lhes dá uma prova de generosidade, e mostra a grande differença que ha entre o Governo dispotico, e o Governo Constitucional: por quanto, os que nos flagellaram passeiam por ahi muito a seu commodo, e outro tanto não nos acontecia a nós, porque estivemos emigrados, presos, ou escondidos, e soffremos muitissimo; pela parte que me respeita estive tres annos sem vêr sol, nem lua.

Termino pois, Sr. Presidente, dizendo que desejo se levante esse stygma, que pésa sobre taes individuos, com tanto porém que não fiquem estipendiados desde já.

São estas as reflexões que eu julgo dever fazer na presente occasião.

O Sr. Serpa Machado: — Eu pedi permissão de fallar para uma explicação com o fim de dizer, que quando fallei neste assumpto disse que o Projecto era um tanto defectivo, mas que eu me propunha apresentar depois outro Projecto mais amplo sem detrimento deste; porque os meus desejos tendem a habilitar, esses individuos para que possam ser providos convenientemente, sem que eu pertenda Que elles sejam estipendiados desde já. — Sr. Presidente, se eu quizesse apresentar exemplos de injustiça pregnante e de preterição escandalosa poderia bem faze-lo, a começar pelo nosso digno collega o Sr. Conde de Terena, antigo Magistrado, e Presidente de uma Relação, que tão perseguido foi pela Causa da

Liberdade e da Rainha, que é um daquelles que estão nas circumstancias a que eu me referi, sem consideração alguma na Magistratura, e muitos outros ha no mesmo caso, que carecem uns de subsidios, outros de honras e de proveito, podendo elles faze-lo á Causa Publica.

O Sr. L. J. Ribeiro: — Eu quero dizer cogulo explicação, que, no que disse não me referi a pessoas, nem podia nunca comprehender entre o numero daquelles de quem fallei, ao nosso digno collega á Sr. Conde de Terena, que ha muitos annos tenho a honra de conhecer, e cujo saber, e eminentes qualidades são geralmente reconhecidas. (Apoiados.)

O Sr. Lopes Rocha: — Sr. Presidente, tudo quanto se disser contra este Projecto é perder tempo, porque a accusação que se lhe faz não é fundada: essa accusação consiste em que se dá muito aos Membros dos Tribunaes superiores, e muito pouco aos Membros da Relação; mas a differença consiste em que uns começam a trabalhar logo, e é necessario dar-lhes util ordenado que corresponda ao seu trabalho: e os outros Hearn na espectativa, e então é claro que só quando elles começarem a trabalhar é que têem direito a receber o ordenado que se lhes designar, e que corresponderão cargo que exercerem. Approvo por tanto o paragrapho em discussão.

O Sr. Abreu Castello-Branco: — Este Projecto, Sr. Presidente, é na verdade de muita conveniencia; mas depois de tantas razões que para a sua approvação tem produzido os illustres Senadores que me precederam, com as quaes em grande parte me conformo, seria gastar tempo inutilmente o fazer progredir a discussão: com tudo a particular posição em que me considero, relativamente a este negocio, pede que eu aproveite este momento para fazer uma declaração que rogo á Camara tenha a bondade de attender.

Sr. Presidente, tambem eu que até agora tenho vivido em quasi perfeita nullidade politica, não pude escapar á calumnia de alguns periodicos desta Capital. — A historia dos acontecimentos que a isto deram logar, seria longa, e agora talvez intempestiva; por este motivo, e porque creio que muitos dos illustres Senadores a não ignorarão, julgo dever limitar-me ao facto, a que me refiro, o qual exporei nas menos palavras que me fôr possivel.

Todos sabem que na Sessão passada appareceu na Camara dos Deputados uni Projecto, tendente ao mesmo fim de chamar aos seus logares os Magistrados que por motivos politicos se achavam fóra delles; e a razão que então se dava para a sua sustentação, era a mesma que agora se produz, e que nos deve principalmente decidir a approvar o que se acha em discussão nesta Casa; isto é, a união e reconciliação de todos os Portuguezes; parque então se entendeu que esta medida, attendendo aos interesses de muitas pessoas consideraveis, conciliando muitas opiniões diversas, muito concorreria tambem para diminuir animosidades, e firmar cada vez mais a paz, e tranquilidade da nossa Patria.

Mas, Sr. Presidente, algumas pessoas houve que naquella occasião tiveram é pensamento de que para este fim se conseguir, não seria bastante a restituição daquelles Magistrados aos seus logares, uma vez que de qualquer modo se offendessem os direitos daquelles que tão legitimamente se achavam servindo, ou se attendesse menos á honrosa consideração que por todas as razões de conveniencia e politica lhes era divida; e que em taes circumstancias seria conveniente, e a ninguem prejudicial ou offensivo, o dirigir ao Corpo Legislativo uma representação concebida neste sentido, e nos termos e limites da maior moderação, só para ressalvar direitos e considerações que por ventura poderiam esquecer-se, evitando toda a idéa de animosidade que effectivamente não havia, e ainda mais a de que se quizesse fazer alguma opposição ao bom resultado do Projecto, no que era tocante á reintegração de que se tractava: perguntou-se-me então se eu teria duvida de assignar esta representação, ao que respondi que nenhuma, se ella assim fosse escripta, e se os meus collegas (principalmente os que compunham a Rellação de Lisboa, á qual eu naquelle tempo tinha a honra de pertencer) a assignassem. Desta opinião, Sr. Presidente, não fui eu só; a muitos dos meus collegas ouvi dizer o mesmo, e declarar que não dezejavam obstar á reintegração, mas sim fazer vêr que aquelles Magistrados que se tinham conservado no serviço publico da sua Patria, no meio de crizes taes, não eram menos dignos da consideração do Governo, e do Corpo Legislativo, do que aquelles que tinham então deixado os seus logares inamoviveis, para depois os tornarem a occupar. — Apresentou-se pois na Secção, a que eu pertencia, uma representação, da qual eu nem fui author, nem o apresentante; e invoco o testemunho do meu illustre collega e amigo o Sr. Mello é Carvalho, que já então presidia áquelle Tribunal, o qual presenciou os meus sentimentos, e de todos os meus collegas ácerca deste negocio, e sem duvida vio que a dita representação, apezar de ser alli mesmo reduzida a termos ainda de maior moderação, e que inteiramente excluiam toda a idéa de opposição directa ou indirecta, não foi por alguem assignada. Este papel passou depois para a mão do Sr. Mello e Carvalho, para o fim de ser apresentado ás outras duas Secções: não sei o que se seguio; mas o que sei é que nenhum resultado mais teve, e que eu nunca o vi senão naquella occasião, em que os meus collegas o viram tambem. — Isto é verdade, Sr. Presidente, e tornando a invocar o testemunho dos meus collegas, convido a contradizer a verdade desta facto alguem que o possa fazer. Mas não obstante ser isto assim, que se seguio? Seguio-se, Sr. Presidente, que dous periodicos desta Capital, que não nomeio agora, sem lhes importar a verdade do caso, sem nenhuma attenção a considerações pessoaes, e sem tal papel apparecer na Camara, aonde nunca foi, asseveraram que eu, e outro illustre Magistrado ao qual, com igual injustiça censuraram de attrabilário, tinhamos sido os seus auctores, e os principaes influentes para obstar á referida reintegração! Declaro que não tive nenhuma outra parte neste negocio. Mas, Sr. Presidente, os calumniadores não se contentaram com isto só, outras calumnias aventaram sobre o mesmo objecto, que eu desprézo como falsas, e injuriosas aos meus sentimentos a tal respeito; e isto talvez fez que alguns dos meus collegas, com quem me presava de, manter relações de amizade, deixassem até de praticar para comigo aquelles actos que a civilidade demanda!

Eu não cansaria a Camara com esta mesma explicação senão me parecesse dever aproveitar a opportunidade de invocar o testemunho do illustre Senador o Sr. Mello e Carvalho, e para que todos os meus collegas fiquem sabendo que eu nenhuma influencia particular tive neste negocio, e que sómente manifestei, como fica dito, a minha opinião. E solemne mente declaro agora, que então mesmo, se eu tivesse a honra de pertencer ao Corpo Legislativo, votaria pelo Projecto, (Apoiados) ainda sacrificando os meus interesses, uma vez que se não sacrificasse o pundonor, e a honra da Classe a que pertenço, nem a paz e tranquilidade publica que no Projecto se invocava. E a Camara me fará a justiça de crer, que eu não offenderia nem a justiça do Projecto, nem o interesse de algum dos meus collegas.

Por ultimo, Sr. Presidente, na approvação do presente Projecto, não se desconsideram os Magistrados que sem interrupção occuparam os seus logares, no que muito bem serviram a Patria, por outra parte o serviço publico, é a boa administração da justiça muito certamente ganharão com a acquisição de tão dignos Magistrados; e por isso, coherente com os meus principios, voto, approvando o parecer da Commissão. (Apoiados.)

O Sr. Ministro dos Negocios do Reino: — Sr. Presidente, eu tenho só que dizer uma cousa em obsequio á verdade e á justiça. Ouvi com muita razão louvar o procedimento dos Juizes da Relação de Lisboa sobre este assumpto, procedimento generoso e nobre, qual se devia esperar de uma Corporação tão distincta; mas tambem me parece que aqui se deve fazer menção de que foi igual o procedimento dos Juizes da Relação do Porto sobre este objecto, quando pela primeira vez se apresentou Projecto identico na outra Casa, porque alli um Depurado dando-se legitimamente como orgam da opinião dos seus collegas da Relação do Porto, enunciou a franca vontade, o ardente desejo que todos tinham de que estes Juizes, de cuja reintegração se tractava, fossem de facto reintegrados. Digo eu que se não podia esperar menos dos Juizes das duas Instancias de Lisboa e Porto, e seja dito tambem o mesmo em caso identico a respeito dos Officiaes do Exercito Portuguez, os quaes mais estimaram, e geralmente mostraram seus de-

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APPENSO AO N.º 257 DO DIARIO DO GOVERNO.

sejos, de que fossem reintegrados os seus camaradas, que por motivo de acontecimentos politicos tinham sido postos fóra das fileiras do Exercito. (Apoiados,) Este modo de proceder da parte de Corporações tão distinctas, em que está o brilho da nobreza da Nação mostra a disposição que ha para a feliz conciliação, com a qual espero venham a acabar as nossas dissenções civis, dando os Membros da grande familia Portugueza um documento incontrastavel dos nobilíssimos sentimentos que a todos animam. (Apoiados geraes.)

O Sr. Vellez Caldeira: - Sr. Presidente, eu sou contra esta especie de explicações, porque julgo não ser este o logar proprio onde se venha dizer que os periodicos nos atacam.... (O Sr. A. Castello Branco: — Peço a palavra.) Esta é a minha convicção, e costumo sempre dizer o que intendo. — Como se fallou, e explicou tanto a respeito de uma projectada representação relativa a este assumpto, devo dizer que no Supremo Tribunal de Justiça nem idéa houve de fazer similhante representação. Quanto a mim, desde a Sessão de 1839 que voto por esta medida.

O Projecto já se approvou na sua generalidade; o que se acha em discussão é o Artigo 1.°, e como á sua materia não ha opposição nenhuma, peço a V. Ex.ª proponha á Camara se a julga sufficientemente discutida.

O Sr. Abreu Castel-Branco: — Em resposta ao que disse o Sr. Vellez Caldeira, sempre direi que muito me admira o que ouvi a S. Ex.ª em opposição com a pratica que tenho observado, e que mais de uma vez se tem usado por alguns do illustres Senadores que occupam logares nesta Casa; principiando por V. Ex.ª mesmo, Sr. Presidente, que ainda não ha muitos dias tractou de arguir de falsidade, e menos exactidão asserções de periodicos as quaes lhe diziam respeito. Eu não o fiz só por esta razão, mas pela consideração que devo a alguns dos meus collegas interessados neste negocio, que talvez estariam persuadidos de factos que não existiram; e eu julguei dever nesta occasião, em que delles se tracta, declarar publicamente os meus sentimentos, e a minha opinião. (Apoiados.)

O Sr. Presidente: — Já que o illustre Senador que acaba de fallar citou o meu exemplo, direi duas palavras. Eu sou de opinião diversa da do meu illustre amigo o Sr. Vellez Caldeira; e julgo que as respostas aos periodicos (com tanto que sejam dadas com parcimonia e dignidade) tem melhor cabimento nesta Camara, do que estabelecendo uma polemica com elles.

Consultada a Camara sobre o requerimento do Sr. Vellez Caldeira, julgou a materia sufficientemente discutida, e sendo o Artigo 1.° posto á votação ficou approvado.

Os outros Artigos de que o Projecto se compunha approvaram-se sem discussão.

(Pausa.)

O Sr. Presidente: — Antes de dar a Ordem do dia, peço licença á Camara para aproveitar estes momentos a fim de lhe dirigir uma observação, e mesmo consulta-la sobre um objecto que entendo ser de alguma importancia. — O Artigo 40 da Constituição diz = Nenhuma das Camaras póde tomar resolução alguma tem que esteja presente a maioria da totalidade de seus Membros. = É claro que, segundo a disposição deste Artigo, temos nós de proceder em nossos trabalhos; mas circumstancias se tem dado de não haver presentes 36 Senadores que constituem a metade e mais um que a Constituição exige para que possamos deliberar. Por em quanto não consta o resultado de algumas eleições do Ultramar, e mesmo alguns Membros faltam pelos Circulos do Continente; e então parecia-me a mim que essa metade e mais um se não devia computar da totalidade do numero dos Senadores segundo a Lei eleitoral, mas sim da totalidade do numero daquelles que effectivamente existem. — É uma questão que eu proponho á Camara, não para a decidir agora, mas para a tomar em consideração a fim de ser opportunamente resolvida.

O Sr. Serpa Machado: — Eu acho que seria conveniente consultar o parecer da Commissão do Regimento a este respeito.

O Sr. Vellez Caldeira: — A Camara já tomou uma decisão relativamente ao que V. Ex.ª propõe, (creio que no principio da Sessão de 1839) e declarou que a metade e mais um devia ser contada do numero total dos Membros que competem ao Senado. (Apoiados.)

O Sr. Presidente: — Direi ao illustre Senador que eu não estava sciente disso, porque nesse tempo nem mesmo me achava em Portugal: todavia como uma decisão da Camara não póde oppôr-se á Constituição, talvez que em todo o caso conviesse entregar este objecto á consideração da Commissão do Regimento: entretanto não insistirei.

(Pausa.)

O Sr. Costa e Amaral: — (Para uma declaração.) Sr. Presidente, eu votei por todos os Artigos do Projectos de Lei que ha pouco se discutiu, e para não parecer contradictorio com a reflexão que fiz no começo da discussão entendo que devo declarar o seguinte. A minha duvida consistia em que, á primeira vista, a disposição do Artigo 1.º importava uma invasão nas attribuições do Poder Executivo; mas como depois appareceu o Sr. Ministro dos Negocios do Reino e não impugnou essa disposição sendo elle a quem pertencia faze-lo, se no Artigo importasse usurpação das prerogativas da Corôa, por esta razão, digo, entendi que aquella duvida não podia inhibir o meu direito de votar pelo Projecto; como effectivamente votei, por isso que não houve reclamação da parte das pessoas a quem incumbe zelar as attribuições do Poder Executivo.

O Sr. Vellez Caldeira: — Sr. Presidente, mais de uma vez tenho pedido a discussão do Projecto para a creação de um Tribunal de Contas; a Commissão de Fazenda fez este Projecto seu, e deu já sobre elle o seu Parecer; peço por tanto a V. Ex.ª que o queira dar para Ordem do dia com a brevidade possivel, attenta a importancia da sua materia. (Apoiados.)

O Sr. Miranda: — Todos, os dias se está clamando nesta Camara contra a má cobrança da receita; contra os vicios dos Orçamentos, e contra a falta de clareza e de explicação em muitos Artigos de debito e de despeza, n'uma palavra, contra as consequencias necessarias da falla de contas; porque, Sr. Presidente, contas publicas não as ha; o Orçamento é incomprehensivel, e por mais que se estude a ninguem é possivel entende-lo por falta de notas, e de explicações que se deixam no escuro: a unica providencia efficaz é a que esta Camara tem como tal reconhecido, é a creação do Tribunal de Contas: fez-se e approvou-se nesta Camara, o anno passado, um Projecto de Lei a este respeito, foi remettido á outra Camara, e la não se tractou delle; tornou-se a apresentar este an. no nesta Camara o mesmo Projecto; a Commissão já deu o seu Parecer sobre elle, e não resta senão entrar em discussão. Se ha algum Projecto nesta Camara que demande a primasia sobre todos os outros, é certamente este, o da creação do Tribunal de Contas; é o Projecto dos Projectos; porque em quanto esta Lei não apparecer, não é possivel haver, nem economia na administração, nem reconhecer quaes são as despezas necessarias e indispensaveis, e quaes as superfluas e desnecessarias; n'uma palavra, não é possivel haver fiscalisação publica, e sem esta, os trabalhos das Camaras não podem ser tão uteis em materia de Fazenda publica, como cumpre e convém que sejam. Por tanto, proponho que este Projecto se dê immediatamente para discussão com toda a urgencia, porque a sua urgencia é reconhecida por toda esta Camara. (Apoiados.)

O Sr. Ministro dos Negocios do Reino: — Sr. Presidente, eu por parte do Governo declaro que reputo esse Projecto de summa urgencia; a apresentação delle nesta Camara embargou o Governo, por uma justa deferencia para com ella, de apresentar igual medida na Camara dos Deputados, esperando que fosse aqui discutido com brevidade; e como tivesse de decorrer tempo antes que viesse a passar na outra Camara, não quiz o Governo embaraçar este com a apresentação do outro, porque em vez de avançar atrazaria a conclusão do negocio. Por parte do Governo declaro a V. Ex.ª e ao Senado, que é de summa importancia a discussão do mesmo Projecto.

O Sr. Presidente: — Estou inteiramente conforme com as idéas que se acabam de expender, mas eu tenho sido mais de uma vez indiciado de ter postergado a discussão de um Projecto de Lei, apresentado ha muito tempo nesta Camara, que tendo sido em diversas occasiões dado para ordem do dia, por varias fatalidades não tem tido até agora discussão: por estes motivos não posso hoje deixar de dar para ordem do dia da seguinte Sessão, o Parecer da Commissão de Guerra, sobre uma parte do Projecto do Sr. Zagallo.

O Sr. Barão do Tojal: — O Projecto sobre a creação do Tribunal de Contas, é mais antigo do que o outro do Sr. Zagallo, e a respeito da maior importancia daquelle sobre este, acho que não podem haver duas opiniões. (Apoiados geraes.)

O Sr. Presidente: — Nesse caso, e querendo corresponder ao desejo que a Camara acaba de manifestar, seguirei um exemplo, não digo illustre, mas antigo — lavo as minhas mãos, — e a ordem do dia será a discussão do Projecto de Lei da Commissão de Fazenda sobre a creação do Tribunal de Contas. — Está fechada a Sessão.

Passava das tres horas e meia.

Na Imprensa Nacional.

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