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REPÚBLICA PORTUGUESA
DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS
58.ª SESSÃO
EM 26 DE FEVEREIRO DE 1912
SUMÁRIO. - Lida e aprovada a acta, dá-se conta do expediente, sendo admitidos, em "segunda leitura", os seguintes projectos de lei: - do Sr. Deputado Dias da Silva, determinando que fique restrita à antiga área da cidade de Lisboa a licença para os estabelecimentos compreendidos na 3.ª classe da tabela do regulamento de 21 de Outubro de 1863; do Sr. Deputado Marques da Costa, concedendo a amnistia aos presos políticos do distrito de Aveiro; do Sr. Deputado Tomás da Fonseca, convertendo em distrital a estrada municipal em construção, que há-de ligar os concelhos de Mortágua, Anadia e Águeda: dos Srs. Deputados Tomás da Fonseca, Morais Rosa, Afonso Ferreira, Pires de Campos e Ribeiro de Carvalho, para que o concelho da Pederneira passe a denominar-se concelho da Nazaré; do Sr. Deputado Manuel José da Silva, isentando de quaisquer contribuições a aquisição de terrenos com aplicação às casas compreendidas nos bairros operários do Pôrto, construídas e administradas pela empresa de O Comércio do Pôrto; do Sr. Deputado José Maria Cardoso, abrindo um concurso para a concessão da exploração dos terrenos compreendidos entre a ponte dos Corvos, no Seixal, e Aldeia Galega, e dos Srs. Deputados João Luís Damas, Francisco José Pereira, Carlos Amaro, Santos Moita, Joaquim Ribeiro, Carlos Maria Pereira, José Montez e Nunes Godinho, autorizando o Govêrno a conceder do distrito de Santarém a quantia de 500:000$000 íeis, para reparação de estradas. São, tambêm, admitidas, em "segunda leitura", as propostas de lei: do Sr Ministro do Interior (Silvestre Falcão), autorizando o Govêrno a elevar a 14.200$000 réis a verba de réis 10:200$000, que foi mencionada no artigo 13.° da lei de 29 de Novembro de 1911; do Sr Ministro das Colónias (Cerveira de Albuquerque), referente aos juizes da Relação de Moçambique e à concessão duma pensão à mãe e à viuva do soldado Armando Flores.
Antes da ordem do dia. - O Sr. Deputado José Montez ocupa-se dos prejuízos causados pelos últimos temporais no distrito de Santarém e chama a atenção do Govêrno para êsse assunto, respondendo-lhe o Sr Ministro do Fomento (Estêvão de Vasconcelos) - O Sr. Deputado Joaquim Ribeiro manda para a mesa um projecto de lei confirmando as promoções de soldados, sargentos e oficiais feitas pelo Govêrno Provisório, ocupa-se do procedimento dos tribunais de segunda instância nos processos dos conspiradores e pede ao Govêrno que desminta os boatos relativos a projectos de alienação das colónias, respondendo-lhe o Sr. Ministro da Justiça (António Macieira). - Trocam-se explicações entre o Sr. Deputado Pereira Cabral e o Sr. Presidente sôbre a substituição do Sr. Deputado Vera Cruz, eleito Senador, na comissão de colónias. - O Sr. Deputado Manuel José da Silva justifica um projecto de remodelação do regime dos açúcares, ocupa-se da ligação telefónica de Lisboa com o Pôrto e refere-se, tambêm, à questão tipográfica nesta última cidade, respondendo-lhe o Sr. Ministro do Fomento. - O Sr. Ministro das Finanças (Sidónio Paes) requere a menos e a dispensa do Regimento para uma proposta de lei relativa às isenções da contribuição de lenda de casas A Câmara aprova a urgência e a dispensa do Regimento, resolvendo-se, depois de trocadas explicações entre o Sr. Deputado Inocêncio Camacho e o Sr. Ministro das Finanças, que a proposta seja enviada, imediatamente, à comissão de finanças. - Mandam documentos para a mesa os Srs. Deputados Egas Moniz, Baltasar Teixeira, Manuel Bravo, Ferreira da Fonseca, Inocêncio Camacho, França Borges e Manuel José da Silva.
Ordem do dia. - Entra em discussão o projecto de lei n.º 44, relativo à construção e à exploração dos caminhos de ferro do Alto Minho, que é aprovado, na generalidade e na especialidade, com um aditamento e uma emenda do Sr Deputado Ezequiel de Campos.- Por proposta do Sr Presidente é aprovado um voto de sentimento pela morte da mãe do Sr Ministro da Justiça. - Entra em discussão o projecto de lei n.° 85, autorizando o Govêrno a organizar três companhias mixtas da Guarda Nacional Republicana, com as sedes nas cidades de Setúbal, Santarém e Castelo Branco Sôbre o assunto, usam da palavra os Si s. Deputados Jorge Nunes, Ramos 3 da Costa, José Montez, Macedo Pinto, Morais Rosa, Vitorino Godinho, Joaquim Brandão, Jacinto Nunes, Francisco Cruz, Ministro do Interior, Paiva Gomes e Gastão Rodrigues, sendo aprovado o projecto na generalidade Sôbre a especialidade, usa da palavra o Sr. Deputado Brito Camacho, sendo aprovados todos os artigos do projecto e uma proposta de aditamento do Sr. Deputado Jorge Nunes. - O Sr. Depurado Philemon de Almeida manda para a mesa o parecer da comissão dos negócios estrangeiros sôbre a proposta de lei relativa à convenção de 1 de Janeiro de 1912 entre Portugal e a Bélgica. - Tendo o Sr. Deputado Barros Queiroz enviado para a mesa o parecer da comissão de finanças sôbre a proposta de lei do Sr Ministro das Finanças, relativa às isenções da contribuição de renda de casas, entra êsse parecer em discussão. Sôbre o assunto usam da palavra os Srs. Ministro das Finanças e Deputados França Borges, Brandão de Vasconcelos, João Luís Ricardo, Barros Queiroz, Afonso Ferreira e Jorge Nunes.- Por proposta do Sr. Deputado Pimenta de Aguiar é prorrogada a sessão até se votar o projecto. É aprovado o projecto, na generalidade e na especialidade, com uma emenda do Sr. Deputado Sidónio Paes e um aditamento do Sr. Deputado França Borges - É aprovada a última redacção do projecto de lei n.° 97, autorizando o Govêrno a decretar a importação de centeio ou milho, com redução de direitos, quando se mostre que no país não existe quantidade bastante dêsses cereais para satisfazer as necessidades do consumo.
Antes de se encerrar a sessão - Trocam-se explicações entre o Sr. Deputado Matos Cid e o Sr. Ministro do Fomento sôbre a nomeação do tesoureiro dos caminhos de ferro do Minho e Douro
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Presidência do Exmo. Sr. António Aresta Branco
Secretários Exmos. Srs.
Baltasar de Almeida Teixeira
António Joaquim Ferreira da Fonseca
Abertura da sessão. - Às 14 horas e 50 minutos.
Presentes - 99 Srs. Deputados.
São os seguintes Srs.: - Adriano Gomes Ferreira Pimenta, Afonso Ferreira. Alberto de Moura Pinto, Albino Pimenta de Aguiar. Alfredo Djalme Martins de Azevedo, Alfredo Guilherme Howell, Álvaro Nunes Ribeiro, Álvaro Poppe, Américo Olavo de Azevedo, António Afonso Garcia da Costa, António Alberto Charula Pessanha, António Albino Carvalho Mourao, António Augusto Pereira Cabral, António Barroso Pereira Vitorino, António Brandão de Vasconcelos, António França Borges, António Joaquim Ferreira da Fonseca, António Joaquim Granjo, António José Lourinho, António de Paiva Gomes, António Pires Pereira Júnior, António dos Santos Pousada, António Valente de Almeida, Augusto José Vieira, Aureliano de Mira Fernandes, Baltasar de Almeida Teixeira, Caetano Francisco Cláudio Eugénio Gonçalves, Carlos Amaro de Miranda e Silva, Carlos António Calixto, Carlos Henrique da Silva Maia Pinto, Carlos Maria Pereira, Casimiro Rodrigues de Sá, Eduardo de Almeida, Ezequiel de Campos, Fernando da Cunha Macedo, Francisco Cruz, Francisco José Pereira, Francisco Luís Tavares, Francisco de Sales Ramos da Costa, Gastão Rafael Rodrigues, Gaudêncio Pires de Campos, Guilherme Nunes Godinho, Helder Armando dos Santos Ribeiro, Henrique José Caldeira Queiroz, Henrique José dos Santos Cardoso, Henrique de Sousa Monteiro, Inocêncio Camacho Rodrigues, João Barreira, João Camilo Rodrigues, João Carlos Nunes da Palma, João Duarte de Menezes, João Fiel Stockler, João Gonçalves, João Luís Ricardo, João Machado Ferreira Brandão, João Pereira Bastes, Joaquim António de Melo Castro Ribeiro, Joaquim Brandão, Joaquim José Cerqueira da Rocha, Joaquim José de Oliveira, Joaquim Ribeiro de Carvalho, Jorge Frederico Velez Caroço, Jorge de Vasconcelos Nunes, José Afonso Pala, José António Simões Raposo Júnior, José Augusto Sirnas Machado, José Barbosa, José de Barros Mendes de Abreu, José Bernardo Lopes da Silva. José Botelho de Carvalho Araújo, José Carlos da Maia, José Francisco Coelho, José de Freitas Ribeiro, José Jacinto Nunes, José Luís dos Santos Moita, José Maria Cardoso, José Maria Vilhena Barbosa de Magalhães, José Mendes Cabeçadas Júnior, José Miguel Lamartine Prazeres da Costa, José Montez, José Perdigão, José Pereira da Costa Basto, José do Vale Matos Cid, Luís Augusto Pinto de Mesquita Carvalho, Luís Inocêncio Ramos Pereira, Manuel de Brite Camacho, Manuel José da Silva, Manuel Pires Vaz Bravo Júnior, Miguel de Abreu, Miguel Augusto Alves Ferreira, Pedro Alfredo de Morais Rosa, Pedro Januário do Vaie Sá Pereira, Philemon da Silveira Duarte de Almeida, Rodrigo Fernandes Fontinha, Tomé José de Barros Queiroz, Tiago Moreira Sales, Vítor Hugo de Azevedo Coutinho, Vítor José de Deus Macedo Pinto e Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Entraram durante a sessão os Srs.: - Adriano Mendes da Vasconcelos, Alexandre Augusto de Barros, António Aresta Branco, António Caetano de Abreu Freire Egas Moniz, António José de Almeida, António Maria de Azevedo Machado Santos, António Maria Malva do Vale, António Maria da Silva, António Silva Gouveia, Artur Augusto Duarte da Luz Almeida, Carlos Olavo Correia de Azevedo, Emídio Guilherme Garcia Mendes, Ernesto Carneiro Franco, João Carlos Rodrigues de Azevedo, José Bessa de Carvalho, José Dias da Silva, José da Silva Ramos, José Tomás da Fonseca, Manuel Alegre, Sidónio Bernardino Cardoso da Silva Paes e Vitorino Henriques Godinho.
Não compareceram à sessão os Srs.: - Afonso Augusto da Costa, Alberto Souto, Alexandre Braga, Alexandre José Botelho de Vasconcelos e Sá, Alfredo Balduino de Seabra Júnior, Alfredo Maria Ladeira, Alfredo Rodrigues Gaspar, Álvaro Xavier de Castro, Amílcar da Silva Ramada Curto, Angelo Rodrigues da Fonseca, Angelo Vaz, António Amorim de Carvalho, António Caetano Celorico Gil, António Cândido de Almeida Leitão, António Flórido da Cunha Toscano, António Maria da Cunha Marques da Costa, António Pádua Correia, Aquiles Gonçalves Fernandes, Domingos Leite Pereira, Fernando Baeta Bissaia Barreto Rosa, Fernão Bôto Machado, Francisco Xavier Esteves, Germano Lopes Martins, João José Luís Damas, Joaquim Teófilo Braga, José Cordeiro Júnior, José Tristão Paes de Figueiredo, Jovino Francisco Gouveia Pinto, Júlio do Patrocínio Martins, Luís Maria Rosette, Porfírio Coelho da Fonseca Magalhães, Severiano José da Silva e Tito Augusto de Morais.
Às 14 horas e 50 minutos abria a sessão, estando presentes 66 Srs. Deputados.
Foi lida a acta.
Às 15 horas, estando presentes 79 Srs. Deputados, foi aprovada a acta.
Deu-se conta do seguinte
EXPEDIENTE
Ofícios
Do Sr. Deputado Fernão Bôto Machado, comunicando que resigna o seu lugar de Deputado, visto as dúvidas que se tem levantado sôbre a concessão da licença para aceitar o cargo de cônsul de Portugal no Rio de Janeiro.
Para a Secretaria.
Do Ministério do Interior, remetendo a cópia do processo de transferência dos professores de Muge para as escolas de Veiros.
Para a Secretaria
Do mesmo Ministério, pedindo uma resposta ao ofício n.° 20, de 23 de Janeiro findo, visto ser urgente a nomeação dum servente para a Escola da Arte de Representar.
Para a Secretaria.
Do Senado da República, enviando documentos sôbre
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o projecto de regulamentação de jôgo, para que sejam tidos em atenção pela respectiva comissão.
Para a comissão de legislação civil.
Do Senado da República, comunicando que, em sessão de ontem, aprovou o parecer da comissão de verificação de poderes sôbre a eleição, para Senador, do Sr. Augusto de Vera Cruz, conformando-se, assim, com a resolução da Câmara dos Deputados.
Para a Secretaria.
Telegramas
Coimbra, 26. - Não podendo estar hoje Lisboa, como contava, cumpre-me informar V. Exa. e comissão infracções, que minhas faltas tem sido devidas a impossibilidade de abandonar direcção Escola Normal. = António Leitão.
Para a Secretaria.
Para a comissão de infracção e faltas.
Pôrto, 24. - Congresso Deontológico, encerrando seus trabalhos, reclama novamente contra doutrina projecto Código Administrativo, parte que se refere facultativos municipais, lamentando que na sua elaboração fossem desatentidos votos Congresso Municipal, Fevereiro ano passado, não tendo sido ouvidas associações classe. = Presidente Congresso.
Para a Secretaria.
Pôrto, 24. - Em nome Congresso Deontológico, reunido Pôrto, e como presidente duma das suas sessões e representante ao Congresso Republicano, peço V. Exa. confirmação telegrama dirigido ontem e reitero pedido feito que no Código Administrativo sejam garantidas liberdade e dignidade profissionais médicos municípios. = Senador, Adriano Pimenta.
Para a Secretaria.
Pôrto, 24. - Presidente Congresso Deontológico protesta contra injustiça Câmara Pedrogão Grande demitindo médico Pereira de Almeida.
Para a Secretaria.
Pôrto, 26. - Peço V. Exa. resposta telegramas que médicos Congresso esperam com interesse. = Senador, Adriano Pimenta.
Para a Secretaria.
O Sr. Presidente: - Como a Câmara ouviu ler há pouco, um ofício do Senado participa a esta casa do Parlamento que o mesmo Senado se conformou com a deliberação da Câmara dos Deputados elegendo o Sr. Vera Cruz para Senador. Está, pois, removida a dificuldade. Felicito-me, e â Câmara, por ela ter sido resolvida de modo a satisfazer as duas casas do Parlamento.
Do Sr. Deputado Marques da Costa, concedendo a amnistia aos presos políticos do distrito de Aveiro.
Foi admitido e enviado à comissão de legislação penal.
Do Sr. Deputado Tomás da Fonseca, convertendo em distrital a estrada municipal em construção, que há-de ligar os concelhos de Mortágua, Anadia e Agueda.
Foi admitido e enviado à comissão de obras públicas.
Dos Srs. Deputados Tomás da Fonseca, Pedro Alfredo de Morais Rosa, Afonso Ferreira, Gaudêncio Pires de Campos e Ribeiro de Carvalho, para que o concelho da Pederneira passe a denominar só concelho da Nazaré.
Foi admitido e enviado à comissão de legislação civil.
Do Sr. Deputado Manuel José da Silva, isentando de quaisquer contribuições pela aquisição de terrenos com aplicação ás casas compreendidas nos bairros operários existentes no Pôrto, construídas e administradas pela empresa de O Comércio do Pôrto.
Foi admitido e enviado à comissão de finanças.
Do Sr. Deputado José Maria Cardoso, abrindo, pelo Ministério do Fomento, um concurso para a concessão da exploração por noventa anos dos terrenos compreendidos entre a ponte dos Corvos no Seixal e Aldeia Galega.
Foi admitido e enviado à comissão de obras públicas.
Dos Srs. Deputados João José Luís Damas, Francisco José Pereira, Carlos Amaro de Miranda e Silva, José Luís dos Santos Moita, Joaquim Ribeiro, Carlos Maria Pereira, José Montez e Guilherme Nunes Godinho, autorizando o Govêrno, pelo Ministério do Fomento, a conceder para o distrito de Santarém a quantia de réis 500:000$000 para reparação de estradas.
Foi admitido e enviado à comissão de obras públicas.
Propostas de lei
Do Sr. Ministro do Interior, autorizando o Govêrno, pelo mesmo Ministério, a elevar a 14:200$000 réis a verba de 10:200$000 réis que foi mencionada no artigo 13.° da lei de 29 de Novembro de 1911.
Foi admitida e enviada à comissão de finanças.
Do Sr. Ministro das Colónias, referente aos juizes da Relação de Moçambique.
Foi admitida e enviada à comissão de colónias.
Do mesmo Sr. Ministro, concedendo a Adelaide e Maria Celestina da Palma, mãe e viuva do soldado Armando dos Reis Flores, a pensão de 75 réis diários.
Foi admitida e enviada à mesma comissão.
Segundas leituras
Projectos de lei
Do Sr. Deputado José Dias da Silva, determinando que fique restrita â antiga área, quanto à cidade de Lisboa, a licença para os estabelecimentos compreendidos na 3.ª classe da tabela que faz parte do regulamento de 21 de Outubro de 1863.
Foi admitido e enviado à comissão de finanças.
O Sr. Presidente: - Julgo interpretar o sentimento da Câmara, propondo que o oficio do Sr. Deputado Fernão Bôto Machado fique para ser apreciado quando o assunto, sôbre que êle versa, se discutir em ordem do dia; que o telegrama do Sr. Deputado António Leitão seja enviado à comissão de infracções, para ela o apreciar devidamente; que a mesa oficie ao Sr. Senador Adriano Pimenta, pelo qual toda a Câmara tem a maior consideração, expondo-lhe que a Câmara não pode dar uma resposta ao telegrama dos médicos reúnidos no Congresso Deontológico, visto que o Código Administrativo está pendente da discussão parlamentar, não se sabendo, ainda,
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consequentemente, qual a resolução do Congresso a seu respeito.
Foram aprovados todos êstes alvitres.
O Sr. José Montez: - Pedira a palavra, na sessão anterior, para apresentar um projecto de lei, já admitido, a fim de ser votada uma verba de 500:000$000 réis destinada às reparações indispensáveis do distrito de Santarém, motivadas pelos últimos temporais. Essa verba, porêm, comquanto, à primeira vista, pareça exagerada, ainda não é o bastante para se repararem os prejuízos causados pelas últimas cheias, que foram de extraordinária importância, a ponto de danificar propriedades, arruinar pontes, destruir diques, etc. Ora, necessário se torna acudir a essa necessidade urgente.
Essas cheias que, evidentemente, fazem sofrer o grande proprietário, não há dúvida de que reduzem à miséria o pequeno proprietário, que fica, não só com as suas propriedades destruídas, como tambêm sem meio de adquirir, pelo trabalho, o que é absolutamente necessário para a sua vida e dos seus.
É, pois, preciso que o Estado procure recorrer a essa situação aflitíssima, para que aquela gente tenha trabalho e meios de se alimentar.
Há, ali, povoações, que não tem que comer, sendo, portanto, necessário socorrê-las, para evitar que elas entrem num caminho mais violento, motivado pela fome. Além disso, as contribuições foram, ali, elevadas, e essa gente, tendo de pagá-las, não pode adquirir os meios necessários para o fazer.
Vem, pois, daí, a necessidade de se atender ao referido projecto de lei.
Nessas condições, não pedindo dispensa do Regimento, visto que, o projecto, envolvendo aumento de despesa, tem de ir á comissão de finanças, pede, em todo o caso, para êle, toda a urgência.
Aproveita, tambêm, a ocasião para chamar a atenção do Sr. Ministro do Fomento para o seguinte:
As cheias, em toda aquela região, causaram extraordinários estragos, mesmo na construção do aterro do Setil. A explicação disso só poderá ser dada pelos técnicos, os quais ficaram de apresentar o seu relatório. Diz-se que a Companhia dos Caminhos de Ferro, que êste ano se viu obrigada a desmanchar o aterro do Setil, vai de novo construí-lo. O estado actual de cousas, porem, é altamente prejudicial para aquela região, pelo que êle, orador, chama a atenção do Sr. Ministro do Fomento para o assunto.
O discurso será publicado na íntegra quando o orador restituir as notas taquigráficas.
O Sr. Presidente: - Tenho a declarar ao Sr. Deputado José Montez que já dei ordem à Secretaria para que o projecto seja remetido, imediatamente, à comissão de obras públicas, pedindo a esta a máxima urgência do seu parecer.
O Sr. José Montez: - Agradeço a V. Exa. os seus bons esforços.
O Sr. Ministro do Fomento (Estêvão de Vasconcelos): - Sr. Presidente: chamou o Sr. Deputado José Montez a minha atenção para o aterro do Setil, mas, ao mesmo tempo, disse que o assunto estava afecto ao estudo duma comissão que havia de dar o seu parecer.
O Sr. José Montez: - V. Exa. dá-me licença? Essa comissão de forma alguma pode, impedir que a Companhia faça a construção do aterro. E para isso que eu chamo a atenção de V. Exa.
O Orador: - É claro que se a questão, própriamente em si, estivesse sujeita a uma comissão, eu de modo nenhum podia intervir; mas desde que a Companhia dos Caminhos de Ferro quere construir uma cousa que pode ser bastante prejudicial para os interesses dos povos da região, eu procurarei, por algum modo, evitar que isso se faça.
O Sr. Joaquim Ribeiro: - Sr. Presidente: uso da palavra para apresentar um pequenino projecto de lei, - e se o apresento hoje é simplesmente pela razão de que se deve legalizar a medida tomada pelo Govêrno Provisório.
Para êste projecto de lei peco dispensa do Regimento,- e não o justifico porque julgo absolutamente desnecessário justificá-lo, porquanto êle está no ânimo de todos nós.
Trata-se da confirmação das promoções de oficiais e sargentos, feitas pelo Govêrno Provisório. A Câmara já reintegrou antigos oficiais e confirmou algumas promoções; por consequência, eu entendo que ela deve, imediatamente, discutir êste projecto, confirmando as promoções que o Govêrno Provisório concedeu a diferentes oficiais e sargentos do nosso exército de terra e mar.
Aproveito a ocasião de estar nu uso da palavra para chamar a atenção do Sr. Ministro da Justiça para um caso, que se me afigura deveras estranho. Quero referir-me aos conspiradores.
Sr. Presidente: eu não quero atacar a magistratura; mas o que vejo é que tendo os juizes que investigaram os crimes de que são acusados êsses conspiradores achado provas para os pronunciar, e tendo êles sido, quási iodos, condenados, o Tribunal da Relação, na maioria dos casos, anula essas condenações (Apoiados) e despronúncia até, conspiradores que declararam em manifestos ter fracassado o movimento por lhe não terem indicado o depósito das armas.
Como S. Exa. vê, é preciso dar uma satisfação à opinião pública, (Apoiados) e sendo o Sr. Ministro da Justiça a figura mais alta da magistratura, entendo que S. Exa. deve observar bem o .modo como êsses juizes procedem, a fim de ser dada, como disse, uma satisfação à opinião pública e à justiça. (Apoiados).
Porque, ou S. Exa. confirma as boas intenções e a honestidade dêsse tribunal, ou então terá de proceder energicamente, como o caso requere.
E ainda sôbre êste mesmo assunto eu lamento, Sr. Presidente, que um partido que se formou há dois dias tenha apresentado um programa em que, juntamente com um programa de excursões, se promete uma amnistia aos conspiradores. Isto é tanto mais lamentável quanto é certo que o chefe dêsse partido afirmou, há pouco, numa viagem que fez ao norte do pais, que, com a sua pena de jornalista e a sua autoridade de Ministro (era então), nunca poderia pedir a amnistia para êsses traidores.
Desejaria, tambêm, Sr. Presidente, pedir ao Sr. Presidente do Ministério e Ministro dos Negócios Estrangeiros, se S. Exa. estivesse presente, a fineza de afirmar nesta Câmara, para que todo o país ouvisse e o ouvisse tambêm a imprensa estrangeira, que Portugal nunca pensou, nem pensará, em alienar qualquer parcela do seu território, e que o Parlamento Português tem a coragem de o dizer bem alto e de protestar contra as afirmações que, em contrário se fazem lá fora.
Terminando, mando para a mesa, pedindo para êle a urgência e a dispensa do Regimento, o seguinte
Projecto de lei
Artigo único. São confirmadas as promoções por distinção, feitas pelo Govêrno Provisório, aos oficiais, sargentos e soldados de terra e mar, por serviços feitos à Pátria e à República durante a Revolução. = Joaquim Ribeiro.
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O Sr. Ministro da Justiça (António Macieira): - Sr. Presidente: pedi a palavra para responder ao Sr. Deputado Joaquim Ribeiro. Eu não conheço as circunstâncias, em que se deram essas despronúncias ou anulações de processos a que S. Exa. se referiu...
O Sr. Joaquim Ribeiro: - Eu vou citar um exemplo, entre tantos outros. Há um conspirador, que está refugiado no estrangeiro, e que publicou um manifesto, declarando que tinha entrado em Portugal para cooperar na destruição da República. Pois êsse homem foi ontem despronunciado!
O Orador: - Não quero, neste momento, defender nem atacar a magistratura portuguesa, embora me pareça que neste lugar é mais da minha competência defendê-la do que atacá-la.
V. Exa. compreende que, para bem se saber das razões que determinaram os juizes da Relação a proceder dessa forma, é necessário verificar os processos; e só assim, depois dum exame detido dos autos, é que qualquer pode ter uma opinião sôbre o assunto.
Não conheço qual a decisão do tribunal; não conheço qual a prova que consta dos autos.
É preciso acentuar que os juizes não julgam por actos apontados fora dos processos. O juiz julga em face do processo que tem na mão; e, em face da prova que êle contem, é que profere a sentença. V. Exa. compreende que o juiz que assim não fizesse lavraria sentenças ao sabor da opinião, o que seria altamente injusto e imoral. (Apoiados).
As minhas palavras não significam defesa nem acusação à magistratura portuguesa.
Apenas direi que êsse caso não está absolutamente julgado, pois deve ir, ainda, ao Supremo Tribunal de Justiça. O que há a fazer é instruir o processo devidamente, caso êle não esteja devidamente instruído.
Relativamente ao segundo ponto a que o Sr. Deputado se referiu, aos boatos da alienação das nossas colónias, eu, sem querer tirar os direitos que competem ao ilustre chefe do Govêrno, e por ser uma cousa que está no espírito de todos os membros do Gabinete, devo declarar que nunca o Govêrno, nem de perto nem de longe, pensou em alienar, sequer, um palmo do território português.
Ao ouvir dizer semelhante cousa, todos os membros do Govêrno, cada um dêles e juntos, só sentem a maior mágoa em que haja uma imprensa, seja ela estrangeira ou portuguesa - sobretudo portuguesa - que se lembre de insinuar no espírito público que a República Portuguesa carece de alienar as suas colónias para viver, para arranjar a sua economia e as suas finanças (Apoiados).
Não. A Pátria Portuguesa, apesar das mil campanhas de descrédito das pessoas de má fé, da acção nefasta dos monárquicos e dos reaccionários, contêm em si elementos bastantes para viver, sem que seja necessário recorrer a êsse expediente desgraçado de alienar as suas colónias. (Apoiados).
Por conseguinte, sem que eu queira, de modo algum, tirar o lugar que de direito compete ao ilustre Presidente do Ministério, devo, desde já, visto que porventura êle pode demorar-se algum tempo, e o caso exige resposta imediata, dizer, peremptória, formal e expressamente, que nunca ninguêm se lembrou de semelhante cousa, e que estou convencido de que nenhum bom republicano, nenhum membro do Parlamento português, se lembraria jamais de praticar semelhante acção, em desprestígio para o país e para as novas instituições. (Apoiados).
Assim terei respondido às perguntas que o ilustre Deputado se dignou fazer-me.
S. Exa. não reviu.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Joaquim Ribeiro mandou para a mesa um projecto de lei, para o qual pediu dispensa do Regimento. Vai ler-se.
Foi lido na mesa o projecto de lei do Sr. Deputado Joaquim Ribeiro.
O Sr. Manuel Bravo: - Peço a palavra.
O Sr. Presidente: - O projecto não está em discussão. Eu simplesmente consulto a Câmara sôbre a urgência.
Consultada a Câmara, sôbre a urgência pedida, foi esta rejeitada por 46 votos contra 39, indo o projecto a publicar no "Diário do Govêrno" para ser submetido à admissão, em segunda leitura.
O Sr. Carlos Calixto: - Pedi a palavra para quando estivesse presente o Sr. Ministro do Interior.
Como S. Exa. não está, peço que ela' me seja reservada para quando S. Exa. comparecer.
O Sr. Pereira Cabral: - Lembrava a V. Exa. a necessidade de se eleger um vogal para a comissão de colónias, visto ter sido eleito senador o Sr. Vera Cruz, que era membro dessa comissão.
O Sr. Presidente: - Em uma das sessões passadas a Câmara declinou no Presidente desta casa a nomeação dum membro para a comissão de colónias, para substituir o Sr. Vera Cruz.
Se a Câmara entende agora o contrário, e quere imediatamente proceder à eleição, resolverá como julgar mais conveniente.
No emtanto, parece-me que, o outro dia, tinha ficado assente que o Presidente nomearia um Sr. Deputado para substituir o Sr. Vera Cruz.
Os Srs. Deputados que entendem que seja o Sr. Presidente Aresta Branco o incumbido do fazer substituir o Sr. Vera Cruz, tenham a bondade de se levantar.
A Câmara resolveu afirmativamente.
O Sr. Manuel José da Silva: - Sr. Presidente: numa das sessões da semana passada, um Sr. Deputado referiu-se à questão da classificação dos açúcares nas alfândegas.
Creio que foi o Sr. Américo Olavo.
Êsse assunto é um assunto muito grave para a população do país; tem muita importância e merece a nossa atenção. Por conseguinte, eu que tinha pedido a palavra para ouvir do Sr. Ministro do Fomento uma explicação para que há muito tempo mandei uma nota de interpelação para a mesa, aproveito a ocasião para falar da questão do açúcar.
Os Srs. Deputados devem saber que há anos já essa questão da classificação dos açúcares causou imensas dificuldades aos governos da monarquia, e que não houve, que não se encontrou, maneira de resolver essa questão, de modo a terminar com as reclamações, senão permitindo que o açúcar continuasse a ser classificado pela escala chamada do tipo inferior ao número vinte da escala holandesa.
Eu que me interesso em especial por essa questão do açúcar, porque é de todos os géneros de consumo o que abaixo do pão, assume verdadeira importância para a alimentação pública, devo dizer que se é verdade que há uma lei que determina essa classificação, o que é certo é que essa lei é inconvenientíssima, e leis inconvenientes conquanto sejam feitas para se cumprirem há certos casos, e êste é um dêles, em que convêm revogá-las, e em-
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Quanto não o possam ser, deve suspender-se a sua execução.
Não há maneira de poder fazer-se com rigor a classificação dos açúcares como inferiores ou superiores ao tipo vinte, de forma que essa classificação é sempre feita ao modo de entender dos verificadores.
Na Alfândega do Pôrto tem sucedido o seguinte: do mesmo lote e para o mesmo importador há açúcar que tem sido classificado por um verificador como tipo inferior, ínfimo, e por outro verificador classificado como de qualidade superior. De maneira que o negociante pagando 2$100 réis por arroba num despacho vê-se depois obrigado a pagar outro despacho do mesmo lote com o imposto de 2$500 réis. Isto é um grande prejuízo para a classe comercial e ao mesmo tempo para o público consumidor.
Eu entendo, Sr. Presidente, que o açúcar é no nosso país muitíssimo caro, devido a não haver da parte do Parlamento a verdadeira atenção e a dedicação que se deve consagrar à questão dos géneros alimentícios. Alem de a vida ser já bastante cara, o açúcar que constitui no nosso pais e em todos, um género de primeira necessidade, é tomado em Portugal como uma substância de luxo.
Ninguém poderá contestar que a população portuguesa consome pequeníssima quantidade de açúcar, devido sem dúvida â carestia dêsse género que paga um excessivo imposto. A meu ver, deve diminuir-se êsse imposto com proveito para as classes comerciais e industriais e portanto para o público e sem prejuízo para o Tesouro.
Tendo eu já apresentado à Câmara um projecto de lei neste sentido, desejava que estivesse presente o Sr. Ministro das Finanças para ouvir as minhas palavras e para fazer ouvir a sua opinião sôbre êste assunto que é de primeiríssima importância.
Não proponho agora, mas proporei em qualquer seguinte sessão, que a lei que obriga a classificação dos açúcares em duas classes, seja suspensa até que um regime novo se adopte.
Apresentei há tempos à Câmara o referido projecto para remodelar o regime dos açúcares, e, parece-me que a única objecção que podia haver por parte dos defensores dos interesses do Estado, podia ser a alegação de que, nos primeiros tempos essa medida podia trazer prejuízo ao Tesouro.
O Sr. Américo Olavo: - Eu não sou dessa opinião O que eu proponho é a redução de todos os açúcares quer nacionais, quer estrangeiros. Sabe-se que nós temos colónias nas condições de produzir todo o açúcar para consumo, e portanto, em meu entender, basta tornar-se o bónus de 50 por cento a todos os açúcares que as nossas colónias produzam, para imediatamente baixar o preço do género.
O Orador: - No meu projecto está isso acautelado.
O Sr. Brito Camacho: - Mas não é preciso.
O Sr. Morais Rosa: - Diz-se sempre que não é preciso, mas depois lá surgem os óbices.
O Orador: - A Câmara sabe perfeitamente que o nosso país é o que consome menos açúcar, em vista de ser um género muitíssimo caro e considerar-se portanto de luxo. Portugal consome 7 quilogramas por ano por habitante, ao passo que a Inglaterra consome por ano e por habitante 36 quilogramas!
O Sr. Américo Olavo: - Diz um grande industrial que põe em Portugal açúcar mais barato, pagando 120 réis de direitos por cada quilograma, contanto que acabe o bónus, que por lei é concedido a alguns açúcares.
S. Exa. desconhece que uma tonelada de açúcar, transportada num navio português custa o melhor de 10$000 reis, ao passo que transportada num navio alemão ou inglês custa apenas 2$000 réis.
O Orador: - Mas se S. Exa. sabe isso, o melhor é mandar um projecto para a mesa, de maneira que se tomem as providências necessárias.
Se a minha ideia não é boa, apresentem se outras.
Mas, como ia dizendo, pode alegar-se que, nos primeiros tempos, diminuiriam as receitas das alfândegas. Mas eu respondo que para compensar essa diminuição de receitas alvitro uma medida: como a Câmara sabe a aguardente e as bebidas alcoólicas são tributadas no nosso país com um certo rigor, mas êsse rigor de cousa alguma serve, porque dele não se aproveita o Tesouro, nem a população portuguesa, como passo a demonstrar:
Por umas estatísticas que consultei, eu tive ocasião de ver que tanto no Pôrto como em Lisboa nem um quarto da aguardente que se consome é sujeita ao imposto. Cada vez o rendimento dêsse imposto nas duas cidades mais diminui. Em 1901 rendeu em Lisboa 93 contos de réis, baixando a 46 contos de réis em 1910, quando o rendimento dos outros géneros, como ovos, manteiga e vinho, subiu regularmente.
Tenho presente a estatística dos direitos de consumo que é conveniente consultar para bem se apreciar êste assunto. O actual regime da aguardente só serve para beneficiar a classe de contrabandistas.
O Sr. Presidente: - S. Exa. tem apenas um minuto para concluir as suas considerações.
O Orador: - Isso não me chega nem para dizer metade do que teria a dizer.
Vozes: - Fale, fale.
O Orador: - O rendimento da aguardente tende sempre a descer.
Sr. Presidente: há nesta Câmara muitos Srs. Deputados que desconhecem a pequena vida comercial; mas eu, que a conheço, posso garantir a V. Exa. e à Câmara que a tributação da aguardente, que tinha um bom fim, qual era a de restringir o seu consumo, não o tem conseguido, e apenas tem produzido um prejuízo para o Tesouro, porque da aguardente consumida em Lisboa e Pôrto nem vinte pipas por cada cem pagam o imposto. E desta maneira ninguêm lucra, nem mesmo o comerciante, que se vê coagido a ser contrabandista, pela competência que outros lhe fazem. O melhor seria estabelecerem-se as fábricas de aguardente e bebidas alcoólicas, por meio da régie directa do Estado, porque dêsse regime eu prevejo que o Tesouro poderá colher um rendimento regular, para compensar o prejuízo que o rendimento do açúcar sofrer com o regime que propus.
O Sr. Presidente: - Deu a hora de se passar à ordem do dia. Os Srs. Deputados que consentem que o Sr. Deputado Manuel José da Silva continui no uso da palavra, tenham a bondade de se levantar.
Foi autorizado.
O Orador: - Portanto, eu lembrava à Câmara que pensasse bem neste assunto. Sôbre êle eu mando para a mesa a seguinte
Proposta
Considerando que se torna urgente estudar e adoptar uma medida que, sob o duplo ponto de vista dos interesses da nação e da saúde da população portuguesa, regule
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o regime da produção e do consumo do álcool e bebidas alcoólicas no país;
Considerando que o actual regime é prejudicial ao povo por facilitar o desenvolvimento do funesto vicio ao alcoolismo e prejudicial ao Tesouro por animar largamente o contrabando.
Proponho à Câmara a nomeação duma comissão especial que estude e dê parecer:
a) Sôbre se será conveniente converter em regime de régie nacional a produção e fornecimento de aguardentes e bebidas alcoólicas;
b) Em caso afirmativo em que bases deve assentar êsse regime e qual a maneira de o organizar. = Manuel José da Silva.
Sr. Presidente: há pouco tempo, parece que em Dezembro, mandei para a mesa uma nota de interpelação ao Sr. Ministro do Fomento.
O Sr. Ministro do Fomento (Estêvão de Vasconcelos): - Uma nota de interpelação sôbre quê?
O Orador: - Sôbre a questão telefónica e sôbre a crise tipográfica no Pôrto. A interpelação é um pró-forma, porque o que eu desejo é que as declarações do Sr. Ministro do Fomento se tornem públicas.
Mandei em tempo para a mesa um projecto de lei pelo qual se concede aos comerciantes do Pôrto e aos de Lisboa o direito de se organizarem cooperativamente para explorarem o serviço de telefones, e sôbre êste assunto preciso ouvir a opinião do Govêrno.
A Companhia dos Telefones não tem o exclusivo; o exclusivo é do Estado. Portanto, sendo excessivamente caro o serviço dos telefones, eu entendia que o Estado devia explorar êsse serviço, em régie, como explora os correios e telégrafos, ou então, se isso não se pode fazer, o Estado conceder aos comerciantes de Lisboa e Pôrto a faculdade de explorarem êsse serviço cooperativamente. Essas cooperativas tomam conta do material da Companhia velha pelo preço da avaliação, e, no fim de 15 anos, entregam ao Estado todo o material sem nenhuma indemnização. Pelos meus princípios económicos, sou de opinião que o Estado deve tomar conta dos telefones em Lisboa e Pôrto.
Mas do mal o menos. Logo que o serviço telefónico se pode obter por um têrço do actual e o Estado não o pode fazer, não se dificulte o ensaio cooperativista, que traz avultadas vantagens.
O outro ponto que desejo tratar, na presença do Sr. Ministro do Fomento, é a questão da crise tipográfica no Pôrto. Todos os Srs. Deputados que são do Pôrto sabem que, em tempos, os impressos destinados aos correios e telégrafos da região do norte eram confeccionados naquela cidade. Há anos, êsses impressos deixaram de ser confeccionados ali e, de então para cá, tem havido uma crise agudíssima na classe tipográfica. Esta classe estabeleceu relações com o Ministério do Fomento, a fim de conseguir que êsses impressos fossem confeccionados na Cooperativa Tipográfica, que é uma instituição integrada na associação de classe: mas até hoje ainda não foi atendida.
Por isso desejava perguntar ao Sr. Ministro do Fomento se há motivos ponderosos para que não se pense nesse assunto.
Não quero terminar sem deixar aqui consignada a mi nhã opinião de que naquela terra, que é a capital do norte, onde a classe tipográfica tem uma população importante, quando S. Exa. entendesse e pudesse ser, segundo os recursos do Tesouro, se montasse uma sucursal da Imprensa Nacional, porque a crise na classe tem sido grave, principalmente nos últimos tempos, em que a queda dos jornais monárquicos e ainda a instabilidade de alguns jornais republicanos, faz com que no Pôrto ande uma grande plêiade de operários sem trabalho.
Desejava pedir a S. Exa. que dêsse uma solução a isto, porque a crise é grave. Tenho dito.
O Sr. Ministro do Fomento (Estevão de Vasconcelos): - O Sr. Deputado Manuel José da Silva principiou por declarar que já há meses me tinha enviado uma nota de interpelação sôbre a questão telefónica e sôbre a crise que atravessa a classe tipográfica na cidade do Pôrto. Imediatamente, em áparte, declarei que não tinha recebido nenhuma nota de interpelação. Daqui se depreendia que eu não vinha preparado com elementos oficiais para responder a S. Exa. No emtanto, apesar da minha declaração, o Sr. Deputado insistiu em tratar do assunto, e eu vou dar a S. Exa. a resposta que naturalmente lhe posso dar neste momento.
Quaisquer reclamações de indivíduos do Pôrto não podem ser resolvidas sem que haja o cuidado de não ir atentar contra direitos adquiridos da Companhia dos Telefones.
O Sr. Manuel José da Silva: -Segundo a lei, essa Companhia não tem direitos nenhuns.
O Orador: - Parece-me que essa afirmativa é um pouco errónea.
Não vinha preparado com elementos oficiais para responder a S. Exa.; mas pode muito bem ser que a cooperativa a que o Sr. Manuel José da Silva se referiu não se possa formar para explorar o serviço. O Estado é que poderá explorar êsse serviço com. proveito para êle e para o público e sem quaisquer atentados para com a Companhia dos Telefones.
Relativamente à crise tipográfica do Pôrto, compreende S. Exa. que eu tenho o maior desejo em atenuar essa crise; mas S. Exa. compreende, tambêm, que não se pode estar a dar o fornecimento de impressos a quaisquer entidades do Pôrto, independentemente das formalidades a que a lei me obriga. Se bem me recordo, a resolução que tomei sôbre o assunto foi mandar abrir novo concurso para a adjudicação dêsses impressos.
S. Exa. não reviu.
Foi lida na mesa a proposta do Sr. Deputado Manuel José da Silva.
O Sr. Presidente: - A proposta fica para segunda leitura.
Os Srs. Deputados que tenham papéis a mandar para a mesa podem fazê-lo.
O Sr. Ministro das Finanças (Sídónio Paes): - Mando para a mesa, pedindo para ela urgência e dispensa do Regimento, a seguinte
Proposta de lei
Artigo 1.° A contribuição de renda de casas, relativa ao ano de 1912, continuará a ser lançada e regulada pela legislação em vigor, mantendo-se as mesmas isenções e ficando, alem disso, isentas do lançamento as habitações ou suas divisões cujo valor lucrativo for inferior: Nas terras de 3.ª ordem, a 60$000 réis; nas terras de 4.ª ordem, a 45$000 réis; nas terras de 5.ª e 6.ª ordem, nas sedes dos concelhos a que não caiba maior isenção e em todas as terras em que pelo censo de 1900, a população exceda 2:000 almas, a 20$000 réis; nas terras de 7.ª e 8.ª ordem, não compreendidas nas designações anteriores, a 18$000 réis.
Art. 2 ° As isenções estabelecidas no artigo anterior aproveitam aos contribuintes pelas prestações do segundo
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8 DIÁRIO DA CAMARA DOS DEPUTADOS
semestre de 1911 relativas à colecta dêsse ano, podendo a anulação daí resultante ser rateada pelas prestações trimestrais em dívida, quando o contribuinte assim o requeira.
§ único. Aos contribuintes que já tenham pago mais de duas prestações trimestrais ser-lhes há restituída a importância correspondente à isenção estabelecida neste artigo, quando assim o requeiram.
Art. 3.° Em relação ao lançamento de 1911, fica o Govêrno autorizado a atender os recursos sôbre contribuições de renda de casas, fundados na deficiente redacção dos contractos de arrendamento ou nos erros cometidos no lançamento e apresentados no prazo de vinte dias, a partir da publicação desta lei.
Art. 4.° Fica revogada a legislação em contrário.
Consultada a Câmara, foram aprovadas a urgência e a dispensa do Regimento.
O Sr. Presidente: - Peço a atenção da Câmara.
O Sr. Ministro das Finanças pede a urgência e a dispensa do Regimento para a sua proposta de lei. Vou. portanto, consultar a Câmara.
Consultada a Câmara, foram aprovadas a urgência e a dispensa do Regimento.
O Sr. Inocêncio Camacho (por parte da comissão de finanças): - Peço a V. Exa. que me diga se a comissão de finanças não tem de dar o seu parecer sôbre a proposta de lei apresentada pelo Sr. Ministro das Finanças.
A comissão deve ser ouvida.
O Sr. Presidente: - Sem dúvida que é necessário o parecer da comissão de finanças.
O Sr. Ministro das Finanças (Sidónio Paes): - Mas eu tenho a dizer a V. Exas. e ao Sr. Deputado Inocêncio Camacho que a minha ideia era que a comissão de finanças reunisse com urgência e rapidamente dêsse o seu parecer sôbre o assunto, caso isso fôsse possível, para êsse parecer entrar hoje mesmo em discussão.
O Sr. Inocêncio Camacho: - Isso é outra cousa!
O Sr. Presidente: - Perdão. A resolução que a Câmara tomou foi para que a proposta entrasse já em discussão.
Vozes: - Depois do parecer da comissão de finanças.
O Sr. Presidente: - Só para a comissão dar o seu parecer não era necessário requerer-se a urgência e a dispensa do Regimento.
Interpretando, porem, o sentimento do Sr. Ministro e da Câmara, vou enviar já para a comissão de finanças a proposta apresentada.
Vai entrar-se na ordem do dia.
Documentos enviados para a mesa
Requerimentos
Requeiro que me seja enviada cópia do telegrama do inspector de fazenda de Angola para a Direcção de Fazenda do Ministério das Colónias, de 16 de Fevereiro de 1911.
Lisboa, 26 de Fevereiro de 1912. = Egas Moniz.
Mandou-se expedir.
Requeiro que. pelo Ministério do Interior, me seja enviada cópia de todos os documentos relativos à admissão dum padre na escola distrital de Portalegre, depois da publicação da lei que permitiu a matrícula aos ex-seminaristas.
Em 26 de Fevereiro de 1912. = Baltasar Teixeira.
Mandou-se expedir.
Requeiro, com urgência, pelo Ministério das Colónias, nota dos funcionários que nos anos de 1907 e 1908 receberam adiantamentos de dinheiros dos cofres do Estado da Índia, importância dêsses adiantamentos, fundamentos com que foram feitos e por quem foram autorizados.
Sala das Sessões da Câmara dos Deputados, em 26 de Fevereiro de 1912.= O Deputado, Manuel Bravo.
Mandou-se expedir.
Requeiro, com urgência, pelo Ministério das Colónias, uma nota de que conste:
a) A designação da nacionalidade com que é apresentado nas respectivas alfândegas o tabaco da Companhia dos Tabacos de Portugal destinado ao consumo nas colónias portuguesas;
b) A taxa dos direitos fiscais que a referida Companhia tiver pago nas províncias ultramarinas por êsse consumo;
c) A indicação de todos os diplomas legais que tem regulado a cobrança daquela taxa;
d) Se há tratamento pautal diferente para o tabaco da Companhia dos Tabacos de Portugal, em relação ao tabaco doutras procedências;
e) Em caso afirmativo, a indicação dos diplomas legais que autorizam êsse tratamento;
f) A importância dos referidos direitos fiscais, pagos pela Companhia, descriminada por províncias ultramarinas, e anos, até o fim do último ano económico;
g) A importância dos mesmos direitos pagos pelo tabaco doutras procedências, tambêm descriminada por províncias ultramarinas e anos, até o fim do último ano económico.
Evidentemente que os pedidos feitos neste requerimento se referem ao tempo em que a Companhia dos Tabacos de Portugal tem explorado o monopólio no continente. = O Deputado, Manuel Bravo.
Mandou-se expedir.
Requeiro que, pelo Ministério do Interior, me seja enviada, com a maior urgência, copia do contracto feito entre o Estado e a companhia ou empresa espanhola Calleja e Boceta para a exploração do Teatro de S. Carlos. = António Fonseca.
Mandou-se expedir.
Notas de interpelação
Desejo interpelar o Sr. Ministro do Interior sôbre os sucessos ocorridos no Observatório Meteorológico de Lisboa nas suas relações com a antiga Escola Politécnica de Lisboa e actualmente com a Faculdade de Sciências da Universidade de Lisboa. = Inocencio Camacho Rodrigues.
Mandou-se expedir.
Aviso o Sr. Ministro do Interior de que desejo interpelar S. Exa. sôbre factos concernentes ao concurso da cadeira de rabeca no Conservatório de Lisboa e faço votos para que esta interpelação se realize com mais brevi-
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dade que aquela que anunciei em 22 de Janeiro ao mesmo Sr. Ministro, ainda não realizada, porque está era via de ter execução um despacho que eu reputo absolutamente arbitrário.
Lisboa, 26 de Fevereiro de 1912. = O Deputado, António França Borges.
Mandou-se expedir.
Parecer
Da comissão de finanças, sôbre o projecto de lei n.° 26-E, equiparação dos professores de sétimo grupo dos liceus, sendo de opinião que deve ser aprovado.
Foi a imprimir.
Projecto de lei
Do Sr. Deputado Manuel José da Silva : - Restituindo gratuitamente ao trânsito público a ponte D. Luiz I, a contar do dia em que terminar o contracto com o actual arrematante da portagem da mesma ponte.
A publicar no "Diário do Govêrno".
Para "segunda leitura".
ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: - Vai ler-se, para entrar em discussão, na generalidade, o projecto de lei n.° 44.
Foi lido na mesa. É o seguinte:
N.° 44
Senhores. - A Comissão de Obras Públicas da Câmara dos Deputados examinou atentamente êste projecto de lei.
Entre a abertura de novo concurso público e a modificação dos contractos de 27 de Setembro de 1904 e 4 de Março de 1907 é de parecer que se deve fazer esta última.
Quando se fecham os contractos nem sempre estão bem estudadas as condições económicas das obras: e por isso é muito frequente acontecer que êles, feitos nas melhores intenções, não podem ser depois cumpridos, porque os elementos definitivos dos projectos saíram muito mais desvantajosos do que os prováveis do delineamento. Assim, tem sido norma constante do Estado rever os contractos, removendo obstáculos, ou concedendo vantagens em troca de outras, de modo que evite a ruína das empresas seriamente constituídas, sem deixar de salvaguardar os interesses da Nação. Esta é a praxe seguida em todo o mundo, sem obrigação de novo concurso público. Citemos alguns casos dentre nós:
Em 12 de Setembro de 1809 foi celebrado o contracto de concessão das linhas de Norte e Leste. Logo em seguida o, concessionário pediu várias alterações do contracto, sendo a mais importante a relativa á época de assentamento da segunda via.
A lei de 5 de Maio de 1860 autorizou o Govêrno a modificar o contracto. Surgiram depois as dificuldades da construção da quinta secção entre Gaia e o Pôrto.
Em 1865 o Govêrno celebrou um acordo com a Companhia Rial, que foi aprovado por lei de 2 de Marco de 1866, modificando o contracto primitivo. Os embaraços financeiros supervenientes impossibilitaram a Companhia de cumprir o novo contracto. Novamente foi modificado o contracto por lei de 26 de Fevereiro de 1875, cedendo à Companhia o imposto de trânsito sôbre a pequena velocidade nas linhas de Norte e Leste durante 36 anos, o que representa subsídio muito superior ao custo da quinta secção.
Em 11 de Junho de 1864 fora celebrado o contracto de concessão das linhas de Sul e Sueste, com subvenção quilométrica. Por lei de 25 de Janeiro de 1866 foi aprovado novo contracto, substituindo a subvenção pela garantia de considerável rendimento bruto.
A linha de Guimarães tinha sido concedida para via larga por decreto de 16 de Abril de 1879. Por decreto de 5 de Agosto de 1880 foi concedida, sem o mínimo ónus para a companhia, a substituição da via larga pela estreita. Por lei de 2 de Junho de 1882 foi concedida á companhia a isenção de direitos de alfândega para o material da construção, alêm da isenção de diversas contribuições durante 10 anos, sem se impor em troca o mínimo encargo á companhia.
Por alvará de 2 de Abril de 1891 foi-lhe concedido o troço de Guimarães a Fafe. De 1891 a 1900 foram concedidas sucessivas prorrogações de prazo. Por alvará de 2 de Junho de 1898 considerou-se caduca a primeira concessão, sendo renovada. Por decreto de 14 de Julho do mesmo ano foi declarado sem efeito êsse alvará e renovada provisoriamente a concessão com várias isenções tributárias e vantagens de tarifas na linha do Minho. A lei de l de Agosto de 1899 aprovou a concessão provisória, aumentando ainda o prazo de isenção de contribuições.
Por portaria de 23 de Junho de 1900, baseada em parecer da Procuradoria Geral da Coroa, foram concedidas, alêm das vantagens daquela lei, as da base õ.'1 da lei de 14 de Julho de 1899, o que foi tornado executório pelos alvarás de 22 de Novembro de 1901 e 14 de Maio de 1903.
Por alvará de 22 de Setembro de 1887 foi concedido um tramway a vapor entre Vendas ÍSovas e Santarém. O alvará de 13 de Dezembro de 1888 transformou a concessão na de uma linha de via larga em leito próprio. Em 30 de Junho de 1890 é mudado de Santarém para Sant'Ana o entroncamento da linha de Leste.
Sucederam-se as prorrogações de prazo até 1899.
Em 30 de Junho de 1900 é aprovado o entroncamento em Setil. Em 11 de Maio de 1900 foi autorizada a transferência da concessão.
Por alvará de 11 de Julho de 1889 foi concedida a linha do Vale de Vouga com o depósito de 50:000$000 réis.
Foram dadas sucessivas prorrogações de prazo.
Por alvará de 23 de Maio de 1901 foram concedidas várias vantagens previstas na base 5.ª da lei de 14 de Julho de 1899, e entre elas o depósito de 8:000$000 réis em vez de 50:000$000 réis primitivamente fixado.
"Por contracto provisório de 25 de Abril de 1900, foram substituídas algumas dessas vantagens pela garantia de juro. O contracto foi aprovado por lei de 20 de Dezembro de 1906, tendo sido nesse contracto modificada a diretriz".
Esta série de factos mostra que o critério seguido entre nós nas relações do Estado cora. as empresas concessionárias de caminhos de ferro tem sido o auxílio pela revisão dos contractos quando nisso há interesse público.
É tambêm o critério seguido nos outros países; por exemplo, em França, pelas convenções de 1859, que desafogaram as companhias e permitiram o rápido desenvolvimento da rede, fez-se a revisão dos contractos. Essas convenções foram ainda remodeladas em 1863, 1868, 1869, 1875 e 1873.
Exemplos análogos se encontram na história das redes doutros países.
Neste caso ha as seguintes vantagens principais com a remodelação dos contractos:
a) Não se perde tempo em começar a construção, o que traz uma solução à crise de trabalho que apoquenta o norte do país;
b) Não se obtém melhores vantagens cora novo concurso;
c) Não é viável, no estado actual da vida portuguesa, a solução do Estado resgatar as Companhias dos Caminhos de Ferro do Pôrto á Póvoa e Famalicão e de Gui-
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marães, e fazer os caminhos de ferro que os concessioná rios pretendem construir
a) É muito conveniente desenvolver por todas as formas os melhoramentos que vindo a ser produtivos, ocupem .desde já grande número de braços: diminuímos a crise de trabalho e contribuímos para o nosso equilíbrio económico. O começo da actividade segura em obras de fomento traz tambêm consigo o apaziguamento da nossa vida interna e a corrente de simpatia dos capitais portugueses e estrangeiros em busca duma colocação garantida.
b) É sabido de todos que só depois de dois concursos desertos e de assegurada a garantia de juro no terceiro, é que apareceu uma proposta, que por motivos diversos, de que o maior foi a impraticabilidade económica da ponte de Lanheses, o primitivo concessionário transferiu o contracto a outro, que por seu turno fez nossa transferência e até que por outro mais veio êle parar aos concessionários actuais.
Se o Govêrno, cumpridas as formalidades do estilo - perdendo tempo e arruinando uma emprêsa - abrir nova praça nas condições dos contractos actuais, é muito provável que a ela só concorra alguém quando as vantagens tiverem sido muito melhoradas quer para a real extensão do sistema, quer no juro garantido, quer talvez tambêm no quantum quilométrico.
Parece-nos que há toda a vantagem em não correr os riscos de experimentar tal proceder que só pode ser ruinoso para todos.
Suponhamos que o Govêrno, cumpridas as demoras e formalidades do costume, venha a ficar, por uma praça deserta, senhor da concessão. Com isto haveria ainda mais demora e prejuízo para a riqueza do país, e nem por isso o Govêrno obteria capital em melhores vantagens, ou construção e exploração mais lucrativa.
Pelo contracto de 27 de Setembro de 1904 o Estado garante apenas 3 por cento sôbre 20:000$000 réis por quilómetro a 150 quilómetros, ou seja 600$000 réis por quilómetro ou 90:000$000 réis por ano.
Não são 20:000$000 réis uma verba quilométrica total avantajada pára o programa técnico dos estudos, atenta a fisiografia da região interessada; e o Govêrno não obtêm com toda a certeza maiores economias no projecto que uma empresa concessionária.
Nestas condições que tem todas as probabilidades de se realizarem, o Govêrno, pelo estado da nossa vida política e financeira, não poderá levantar tão cedo o capital de cêrca de 3.500:000$000 réis para a empresa, se ela não ficar bem mais cara que êste preço, e com toda a certeza não o obterá com o juro de 3 por cento, correspondente à garantia hoje assegurada, somente 3.000 000$000 réis, que deverá ser apenas nominal, mas por outro muito maior.
Duplo prejuízo: no maior juro e em maior capital empatado. Quere dizer: o Govêrno, revendo o contracto e impondo condições vantajosas para o país, não só aproveita a oportunidade de fomentar a riqueza do Minho na ocasião mais crítica, e com isso captar uma bela simpatia pela República, como tambêm só com um encargo nominal promove o giro de capitais para a construção imediata.
c) De tão evidente que é, não carece de justificação a vantagem económica da fusão duma só companhia das linhas do Pôrto á Póvoa e Famalicão com a de Guimarães e a concessão do caminho de ferro do Alto Minho. De forma que, ou o Govêrno consente que a companhia concessionária dêste último caminho de ferro tenha condições de viabilidade mediante vantagens, ou o Govêrno vai fazer em vez da companhia o resgate das linhas da Póvoa e de Guimarães, apesar de nenhuma disposição em tal sentido estar afirmada nos diplomas de concessão, para depois construir o sistema de via reduzida que aquela delineara.
Pelas condições em que avaliámos a Fazenda Pública não vemos que o Estado possa fazer já, ou em breve, com vantagem, estas operações. E não resta dúvida nenhuma que toda a demora nas medidas do fomento só pode agravar a nossa Vida económica e social.
Quer-nos parecer que hoje mais do que nunca deve o Estado chamar a colaborar com êle toda a Nação pelas empresas honestamente constituídas, para se cobrar o tempo perdido e utilizar a nossa riqueza malbaratada. Os nossos grandes males são: por um lado a falta de iniciativa, a carência duma geração nova desapegada da mesa orçamental; e por outros obstáculos que sistematicamente o Govêrno tem anteposto a toda a manifestação de actividade, isolada ou colectiva Se o espírito scientífico e empreendedor que desde o meio do século passado dá cunho especial á vida moderna não se mostrou em nossa casa, por outro lado o Govêrno não cuidou, como devia, de alentar a germinação dele, quer por uma remodelação da educação nacional, quer pelo auxílio e incitamento franco a todas as honestas actividades nascentes. Razão porque convêm abrir na indústria e nas empresas novas, de carácter particular ou municipalista, campos para a formação da gente nova com energia e vontade.
Grande tarefa tem o Estado para o emprego da sua gente e do seu dinheiro: bem feliz fora do se duma e doutro tivera o bastante para se desempenhar bem. O Estado explora 681 quilómetros de via larga no Sul e Sueste e 343 quilómetros de via larga e 121 quilómetros de via de l metro no Minho e Douro, ou seja um total de 1:145 quilómetros de caminhos de ferro. Para tornar per: feita a exploração dêles carece de os dotar com boas estações terminais , estabelecer segunda via eatre Campanhã e Ermezinde e dentro em pouco entre Barreiro e Pinhal Novo; ampliar várias estações; adquirir e melhorar material circulante. Para os valorizar cabalmente deve construir cêrca de 300 quilómetros de linhas em cada zona.
No Norte, alêm da conclusão do troço de Valença a Monção, a linha de Ermezinde a Leixões, Amarante a Cabeceiras de Basto, Vidago a Chaves, Régua a Vila Franca, Carviçais ao extremo do planalto de Miranda, e em futuro próximo, a linha marginal do Douro a juzante de Mosteiro.
No Sul, conclusão de Barreiro a Cacilhas, Seixal e Cezimbra, linha do Sado, Mora a Ponte de Sor, Vila Viçosa a Elvas, Portimão a Lagos, alêm das linhas de Serpa ou Pias ao Pomarao e do Baixo Alentejo.
Não seria de mais gastar 10.000 ou 12.000 contos de réis nessa valorização.
Os resultados directos e indirectos compensariam sobejamente o sacrifício. Não será, porêm, fácil o recurso de tam elevado crédito ainda que distribuído por um período um tanto largo.
A boa exploração da rede actual, a sua valorização e a melhoria dos serviços dão margem de actividade bastante para o Estado. Por isso toda a colaboração financeira com empresas concessionárias de linhas ainda não construídas nas zonas extremas, que â rede do Estado só pode trazer vantagens, não só revela sensata prudência, como é uma necessidade indeclinável.
Tomar como base o existente, resultante dos factos políticos, administrativos e financeiros da nossa vida constitucional que deu ao regime ferro-viário a sua feição ecléctica, evolucionar e melhorar com prudência, tornando mais intensa a cooperação do Estado com as companhias, fugir de aventuras perigosas para o crédito do país, quais se nos afigura o isolamento do Estado na tarefa de completar a rede ferro-viária bem como o resgate sem elementos de disciplina, energia e finanças das linhas de velha concessão, parece-nos a melhor norma de Govêrno a seguir.
Como primeira dificuldade que já fez fracassar todos os concessionários destas linhas está a definição do traçado
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de Viana a Ponte da Barca: seguir pela margem direita até Lanheses e depois passar para a margem esquerda em ponte dispendiosa; ou um troço em cada margem do Lima, de Viana a Lanheses.
Devemos notar que foi por uma apreciação superficial da carestia da ponte ferro-viária de Lanheses e da travessia da Veiga de Bertiandos por uma inexacta pesagem das dificuldades técnicas, e não por quaisquer primasias de utilidade para a região a servir - que levianamente se arbitrou a travesia do Lima para a margem esquerda como mais conveniente, era vez da directriz pela margem direita através da Veiga de Bertiandos. Esta, completada pela ligação das duas margens com uma ponte de estrada, seria a solução mais vantajosa.
Supondo que o Estado, por falta de concorrentes depois de nova praça deserta, podia ir fazer êste caminho de ferro, não seria de boa economia atravessar o Lima em Lanheses com a directriz, ou fazer dois trocos de Lanheses a Viana:
"... porque um caminho de ferro há-de ter, ou espera-se que venha a ter, um futuro próspero - porque êle é construído pelo Estado por grandes razoes de Estado ou por qualquer outro motivo há-de ter muito dinheiro no Tesouro-não há daí nenhuma justificação, só por êsse facto, de o tornar caro.
Por outro lado, nenhum caminho de ferro é tão pobre que ^ á economizar quando uma certa despesa adicional for claramente muito lucrativa. Se está claramente mostrado, ou apreciado por boas razões, que urna certa despesa adicional pagará 10, 15, 25 ou 50 por cento, como o caso for, pode-se dizer que a companhia, por mais pobre que seja, encontrará processo e meio de obter capital, se os factos forem devida e claramente apresentados". (Rail-may Location, Artur M. Wellington).
Por isso, entendemos que as mudanças de directriz e serventia das margens no ' traçado de Viana a Ponte da Barca não representam mais que aquela solução económica que toda ou qualquer entidade construtora e exploradora - Estado ou companhia - havia de tomar, se logo do começo das negociações estivesse claro o ante-projecto da linha.
Base 1.ª
A 1.ª base, removendo um obstáculo insuperável, apresenta compensações atendíveis, cuja justificação completa obrigava a uma monografia pormenorizada dêste caminho de ferro e a considerar a aplicação a um caso especial da teoria económica das directrizes, estudo complexo, bem formulado por A. M. Wellington e Loring Webb nos seus livros magistrais. Por isso fazemos apenas umas referências sumárias para justificar êste nosso parecer.
As duas primeiras condições desta base definem a directriz geral e a ligação das duas margens - concessões para a companhia - e as quatro restantes as obrigações impostas.
1.° A directriz não é desvantajosa para o tráfego da região: serve-a tam bem como pela margem esquerda. De Viana a Lanheses é muito densa a população; de Lanheses por diante* ambas as margens são muito povoadas, mas na margem direita são mais importantes e populosas as freguesias entre Ponte de Lima e Ponte da Barca. A estação de Ponte do Lima fica melhor situada na margem direita, do que na margem esquerda a cavaleiro da povoação.
A construção de duas linhas, uma pela margem esquerda (sem subsídio nem garantia de juro) e outra pela margem direita de Viana até Lanheses, a que o concessionário se podia sujeitar pelo artigo 55.° n.° 1.° do contracto, adiando a construção da ponte sôbre o Lima em Lanheses até que o rendimento líquido atinja 8 por cento do capital garantido, não só não traz vantagens, como tambêm causou a recusa de capitais para a empresa, que assim não pode ir avante. Esta solução divide o tráfego até Lanheses por dois caminhos de ferro, concorrentes ainda em o Lima, o que não permite que o rendimento liquido de 8 por cento seja atinjido tam cedo. É tambêm grande desvantagem para a linha do Minho seria a inclusão da linha de metro entre Viana e Darque para atingir a margem esquerda, que obrigava a refôrçar a ponte, e principalmente perturbaria e suas sujeições embaraçosas, quando não perigosas, a ambas as linhas.
Depois, se fôsse atingido o rendimento líquido de 8 por cento, construída a ponte, ficaria o caminho de ferro da margem esquerda com pequena utilidade em confronto com o embaraço de duplicação das linhas.
2.° Procedendo-se de acordo com êste artigo atinge-se muito mais cedo a ocasião de construir uma ponte de estrada entre as duas margens, não só porque o caminho de ferro é feito com mais vantagens, sem concorrência de tráfego por um outro troço desfavorecido de subsidio e de garantia de juro, mas tambêm porque se toma o limite de 7 por cento, em vez de 8 por cento, de rendimento líquido para a construção da ponte.
3.° Seria longo calcular a diferença de Orçamento correspondente à alteração das inclinações de 30 para 25 milímetros por metro neste sistema que atravessa uma região desdobrada, por vezes atormentada, sempre semeada de relevos orográficos e sulcada de muitas linhas de água desde Mindelo, do lado esquerdo da bacia do Rio Ave, através desta e das do Cavado e do Lima até a margem esquerda do Minho, com a ramificação descendente do Vale do Lima, e ao mesmo tempo atender ao cuidado permanente que houve em não baixar do raio 100 metros (anormalmente 90 metros), isto é em não utilizar nunca o rato mínimo 75 metros.
Mas era êste cálculo o mais necessário para um engenheiro competente mostrar que esta variação de programa foi a melhor compensão que a Companhia podia ter dado ao Estado em troca das concessões que pede.
O Caminho de Ferro de Guimarães por Braga a Monção sobe primeiramente a Serra da Falperra, que passa na Portela de Balazar, subindo 160m,90, entre as Taipas e aquela, com rampa média de 0m,02433, sem nunca ultrapassar 25 milímetros, num percurso de 6:614m,30, era rampa, para depois descer 156ra,01 com 6:664m,16 em declive antes de subir 20m,80 para atingir Braga. O raio mínimo empregado foi a 100 metros, e a extensão total de Guimarães a Braga é de 28:734m,63.
De Braga em diante desce para o Cávado, havendo até a Ribeira de Sabariz 3:970m,21 em patamar, 3:796K,42 em rampas de 8:032m,04 em declive com inclinação média de 0,02209, não excedendo nunca o limite de 25 milímetros por metro. E daí sobe até a Portela do Vade, na divisória do Cávado e do Lima, em terreno descoberto, vencendo 25431.93 de diferença de nível, só com l:484m,22 em patamar e 53m,95 em declive para 10:763m,98 em rampa dentro do limite do 25 milímetros sem baixar do raio 100 metros em planta. Da Portela do Vade até o Lima nos Arcos de Valdevez o traçado é difícil, pois tem de descer 277m,80 o que obrigou a 12:606m,91 em declive para 4:276m,21 em patamar, e 2:704m,60 em rampa, sem nunca ultrapassar inclinação de 25 milímetros, nem baixar o raio alêm de 90 metros.
Alem dos Arcos será necessário subir a serra do Extremo, obstáculo considerável entre o Lima e o Minho antes de atingir Monção.
Basta considerar que é um caminho de ferro de travessia duma região de relevo muito desdobrado e por vezes áspero, e até só tomar em consideração os números isolados 160m,90 de altitude a subir na Falperra, 254m,93 de Ribeiro de Sabariz à Portela do Vade, com os 277m,80 a descer daqui até os Arcos, para mostrar que só nestes
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693m,63 de altitude a vencer sem atenção à descida da Faiperra até a Ribeira de Sabariz por Braga, que é muito importante, e à travessia da Serra do Extremo e da bacia do Rio Ave, a mudança da rampa 25 milímetros por metro para 30 milímetros dava uma economia de 4:624 metros, isto é, dum sexto do primitivo comprimento nas despesas de construção e expropriações. É necessário tambêm coordenar esta deminuição de inclinação com o aumento de raio nas curvas que torna a inscrição muito mais difícil nos acidentes do terreno, movimento de terras maior, e não permite evitar embaraços de construção que não teriam importância no caso duma maior elasticidade de programa técnico. O caminho de ferro assim ficará muito mais caro por todos os motivos.
É verdade que na exploração, se for até o fim do prazo, colherá em parte a empresa a despesa maior de construção: mas menos certo não é que o caminho de ferro fica por esta forma com muito maior segurança no movimento, de maior carga rebocada pelo mesmo peso de locomotiva e susceptível de comboios mais rápidos, que cobrem em excesso a diferença de traçado a mais, todas vantagens muito atendíveis na serventia da região, e principalmente pode o Estado, se fizer o resgate no fim dos 20 anos, ficar com um caminho de ferro nas melhores condições de ser explorado por conta dele.
Pelos estudos já aprovados de Guimarães a Braga e aos Arcos de Valdevez, vê-se bem que da parte dos engenheiros da empresa houve o melhor critério na combinação do programa para o máximo final de economia; e que sempre se pôs de lado a feição da despesa mínima inicial nos vários factores considerados: inclinações máximas, raios mínimos, expropriações e serventias baratas.
4.° A redução a um ano do prazo de apresentação dos estudos que faltam, de Lanheses a Ponte da Barca e dos Arcos a Monção, bem como:
5.° A redução a cinco anos do prazo de sete da construção do troço dos Arcos a Monção, mantendo o mesmo prazo para o restante do caminho de ferro, é vantagem para a região e para o Estado pelo tráfego e mais proveitos que a exploração dêste troço mais cedo traz à linha do Minho.
6.° E não deixa de convir por todas as formas aos Caminhos de Ferro do Estado e ao país a iniciativa de promover a concorrência de excursionistas ao Monte de Santa Luzia, em complemento da atracção fatal que a linha de travessia do centro do Minho trará ao norte do pais.
Esbocemos, porem, melhor e em traços de aproximada expressão numérica o caso da ponte de Lanheses só para estrada, com a directriz pela margem direita, comparada com o caso do traçado primitivamente obrigado: pela margem direita até Lanheses, travessia aqui do Lima em ponte mixta, e depois traçado pela margem esquerda.
A ponte de Valença de dois taboleiros de via larga custou cêrca de 240:000$000 réis, incluindo as avenidas. Sendo estas da conta do Govêrno na ponte de Lanheses e a via apenas de 1 metro, a ponte de Lanheses de dois taboleiros não custará mais de 200:000$000 réis.
Por outro lado a travessia da veiga de Bertiandos custará 60:000$000 réis. Há assim uma diferença de 140:000$000 réis.
Ora o rendimento anual da ponte de estrada computável em 2:400$000 réis corresponde a 40:000$000 réis, sensivelmente, de capital a 6 por cento. A construção da ponte do estrada não custará menos de 70:000$000 réis, reduzida a dinheiro actual. A deminuição das inclinações e melhoria de todo o programa técnico nos 108 quilómetros dá uma economia de exploração seguramente muito maior que 2:000$000 réis por anno, ou seja garantia de muito mais de 30:000$000 réis.
Somando estas três verbas teremos a equivalência em benefícios para o Estado das concessões reclamadas.
Ainda que elas não sejam inteiramente compensadas por vantagens para, o Estado, caso êle faça resgate no fim do prazo de vinte anos (o que não nos parece razoável concluir, porque a economia de exploração pelo novo programa técnico é uma verba muito importante e que deve ser considerada logo a partir dos primeiros vinte anos) estas considerações mostram pelo menos a liberdade, se não a obrigação que cabe ao Estado de secundar a empresa com as concessões pedidas. Tanto mais que nenhuma outra se fundou até hoje no país em condições tão pouco onerosas para o Tesouro como esta. Assim as linhas da Foz do Tua a Mirandela e Santa Comba Dão a Viseu tem respectivamente a garantia de 5 4/2 por cento sôbre 19:692$300 réis e 22:800$000 réis aplicada à extensão efectiva da linha; o troço de Mirandela a Bragança tem 4 1/2 por cento garantidos sôbre 25:990$000 réis, o que corresponde a 5 por cento sôbre 23:391$000 réis.
Base 2.ª
A fusão das linhas do Alto Minho com as da Póvoa e Guimarães, completadas pelo caminho de ferro de Mindelo a Lousado, é de tal importância para a região, pela homogeneidade de bitola e material que dispensa qualquer transmissão ou baldeação e pela unidade de exploração, que não podendo o Estado fazê-la, só lhe cumpre promover, em. nome do bem público, a sua realização no mais curto espaço de tempo.
Esta fusão foi em princípio admitida pelo Govêrno por despacho de 22 de Julho de 1909.
As condições da segunda base do contracto afiguram-se-nos aceitáveis, afora uma restrição que será prudente fazer.
1.° A linha de Mindelo a Lousado vem completar a serventia da legião agrícola muito povoada dentre o Leça e o Ave até a linha do Minho por leste, a bela terra da Maia caracterizada pelo aproveitamento cuidadoso de todos os campos e montes.
Não foi de boa previsão financeira a parte da linha da Póvoa a Famalicão: faliu de vez a espectativa de explorações mineiras na Serra de Rates, e a região atravessada não tem nem terrenos muito bem expostos e de constituição muito produtiva, como a Maia, nem a densidade de população das terras ao sul do Ave. O serviço especial de comboios para o mercado de Famalicão, a exportação de toros de pinho da linda mancha florestal de Balazar à Esteia, e as fábricas de serração de Laundos e Vila Nova de Famalicão tem animado mais a vida dêste lanço, que por tantos anos pesou sôbre a exploração do outro, da Póvoa ao Pôrto.
O prolongamento de Laundos a Fão e a linha de Mindelo a Lousado tiveram parecer favorável no inquérito aberto nos termos do decreto de 6 de Outubro de 1898.
Por esta primeira condição fica a região litoral muito bem servida, pois tendo duas linhas longitudinais: a do Minho e a do Pôrto à Póvoa, tambêm contará duas transversais - a da Póvoa - Famalicão e a de Mindelo-Lousado - ficando assim a ser a região do país mais favorecida por linhas férreas. Desaparece o inconveniente da inclusão do caminho de ferro de 1 metro da Trofa a Lousado, o que e vantajoso para a linha do Minho.
Peia segunda condição obtêm a linha do Pôrto à Póvoa e Famalicão um melhoramento importante. Uma das primeiras construídas em Portugal, ressente-se a exploração actual, não tanto da bitola reduzida, mas principalmente das locomotivas e material avelhado, dos engates sem molas, e da falta daquela segurança na via que não permite comboios de passageiros pesados e rápidos.
3.° A Companhia da Póvoa explora desde 1893 o ramal de Leixões à Senhora da Hora, em ligação logo com o Pôrto (4 quilómetros).
O movimento de passageiros em todo o caminho de ferro da Póvoa foi em média de 320:000 no quinquénio anterior
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a 1894 e neste ano elevou-se a 375:000, para em 1899 subir a 557:000 e em 1908 atingir 883:000.
O movimento de mercadorias de pequena velocidade e tonelagem, que fora no referido quinquénio de 18:000 toneladas anuais, elevou-se em 1894 a 24:000, cinco anos depois a 35:200, e em 1908 a 80:140 toneladas, graça principalmente à exportação de toros de pinho que avivou
O movimento do troço Póvoa-Famalicão e do aumento do comércio com Leixões.
Isto mostra que a linha do Pôrto-Póvoa-Famalicão, que foi construída sem pedir nada ao Estado, tem no ramal e pôrto da Leixões um elemento indispensável de vida que não pode ser cerceado sem lhe causar enorme diferença.
Merece, porem, um pouco mais de reflexão êste ponto:
a) O pôrto de Leixões não dispensa a ligação directa da linha da Póvoa e de todo o sistema de metro;
b) Esta ligação não dá prejuízo, antes pelo contrário, à linha do Minho;
c) Não pode ficar por mais tempo protelado o acabamento do pôrto de Leixões. Cada vez é mais difícil entrar no Douro, e vergonhosa é a situação de ter construído um ante-pôrto por alguns milhares de contos de réis que só, como está, não serve de quási nada.
Matozinhos e a Senhora da Hora, que se tem desenvolvido muito, esperam somente que o caminho de ferro venha da bifurcação de Ermezinde, tanta gente à cidade, em busca de Leixões.
Mas devemos notar que ao ramal da Senhora da Hora se deve a máxima parte do tráfego que sai por Leixões, pois a linha da Póvoa é a serventia única e sem concorrência de toda a região litoral que do Pôrto se estende até Esposende.
Não é razoável cortar a ligação com êle, porque se a linha não pode dispensar a ligação com Leixões, por ficar privada de exportar a madeira do pinhal da Esteia e Laundos, os vinhos verdes do litoral minhoto e os artigos da indústria de Pedras Rubras, Senhora da Hora e da parte noroeste do Pôrto, não menos prejudicado fica Leixões.
E não é razoável obrigar a construir outra ligação com Leixões da linha Pôrto-Póvoa, dada a existência e bons serviços da actual.
b) É infundado o receio de que as mercadorias da zona servida pelas linhas do Alto Minho e de Guimarães aproveitem estas para as relações com o pôrto de Leixões, de preferência à linha do Minho, depois de ligada com êle de Ermezinde, porque a via larga com menor percurso e tarifas mais baixas - dupla razão de preferência - será a seguida na maior parte dos casos, salvo quando a natureza da mercadoria torna a baldeação enorme e prejudicial. E neste caso prejudicável é, pelo interesse público, que ela não se dê.
Basta olhar para uma carta, em que estejam bem delineados os traçados, e vê se logo que Monção, Viana, Braga, Famalicão, Guimarães e Lousado, em que o sistema de l metro corta ou se encontra com a via larga, são outros tantos pontos de convergência de mercadorias, quer em busca dêles como centros consumidores, e, por isso, sem transporte na via larga (o que se realizará só para uma pequena fracção do tráfego total da linha de 1 metro), quer para buscar pela via larga outras cidades ou centros industriais e de consumo, o Pôrto, sobretudo, ou Leixões. Só o tráfego exclusivo da linha da Póvoa, mais o que naturalmente lhe é devido, e que já tem em parte da região até as imediações da Trofa, que vai ser servida pela linha de Mindelo a Lousado, continuará a ser dirigido para o Pôrto e para Leixões, como de há muito acontece, sem o mínimo prejuízo para a linha do Minho.
Não: o efeito da fusão e a rede de 1 metro a efectivar, só pode ser favorável às linhas do Minho. É olhar para o claro que vai na carta, de Nine por Viana a Valença, para leste, sem uma linha férrea, considerar depois o traçado de Monção a Braga e Guimarães, com a linha do Vale do Lima e de Fafe a Lousado e Mindelo, e vê-se logo quanto não vai ser fecunda para a economia do centro do Minho a facilidade dos transportes que uma linha em tão boas condições técnicas vem trazer. E dessa vida nova colherá um belo quinhão a via larga, porque, tendo cada grupo de linhas a sua função e o seu tráfego a dez - 1 metro de efectuar os transportes para os nós com a via larga e promover indirectamente o desenvolvimento agrícola e industrial da nossa região mais povoada; a via larga de facultar o transporte rápido e económico dêsses pontos nós ao pôrto de Leixões, aos grandes centros de consumo, sem prejudicar em nada, antes pc4o contrário, a afluência crescente do tráfego da sua zona própria.
E assim temos como o pôrto de Leixões é indispensável para as duas linhas, testa natural de ambas, e como elas ambas para êle convergem, sem acção atribiliária no tráfego da região cruzada por elas.
De há muito que a zona noroeste do Pôrto utiliza, para o serviço de passageiros e mercadorias, a ligação Boa Vista-Leixões.
A linha de Ermezinde a Leixões não virá prejudicar aquela ligação, nem se dará o facto recíproco, porque cada uma tem a sua zona própria de influência.
Do Pôrto (S. Bento) há hoje para Matozinhos e Leixões as seguintes linhas:
1.ª Eléctrica marginal do Douro;
2.ª Eléctrica até Boa Vista e depois tramway a vapor;
3.ª Eléctrica até Boa Vista e depois comboio Boa Vista-Leixões.
Pois todas elas vivem e tem farto movimento. Outras que venham terão tráfego, pois êle surge com elas nas zonas suburbanas, como é sabido.
A unidade de bitola dêste ramal com o resto do sistema é indispensável.
4.ª As linhas da Póvoa e Guimarães, com uma soma de 91 quilómetros, foram as únicas construídas com capitais exclusivamente portugueses e sem subsídio do Estado, e, por qualquer motivo, sem. limitação do prazo de concessão, o qual não pode ser considerado perpétuo, em virtude dos princípios do decreto de 31 de Dezembro de 1864.
O período de noventa anos, consignado neste projecto de lei, parece-nos razoável.
Nas circunstâncias actuais, supondo que êle é já aprovado por vós, isto é, que se conta o prazo desde 1912, temos:
[Ver tabela na imagem]
A média aritmética dá um período de 107 anos. Atendendo tambêm à extensão das linhas, a média baricêntrica dá 28:946:288 = 100 anos. Devemos notar que a linha do Pôrto-Póvoa-Famalicão que tem grande influência no valor do tempo médio, como aliás a de Guimarães, tem uma justificação em parte do prazo um pouco mais largo, por êle ter o aspecto de perpétuo no silêncio da concessão. Mas o excesso insignificante alêm dos 99 anos para
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as duas é mais que cerceado pela redução a 90 anos do das linhas do Alto Minho e linha Mindelo-Lousado. Alêm de que ambas, e sobretudo a linha da Póvoa, tiveram uma vida precária por muitos anos; e a média dos prazos das linhas de Guimarães e da concessão do Alto Minho, como efectivadas já, dá apenas 98 anos e meio.
Parece-nos pois que por esta condição 4.ª fica bem regulada a situação das concessões da Póvoa e de Guimarães numa justa pesagem com a nova concessão do Alto Minho.
5.º É necessário e justo introduzir as restrições do artigo 5.°
6.° O contracto primitivo de 27 de Setembro de 1904 impunha o depósito definitivo de 24:000$000 réis; foi êle aumentado em 31 de Janeiro de 1907 em troca duma prorrogação de prazo, para 50:000$000 réis; mais do dobro. Parece-nos que não é necessário aumentá-lo agora mais para garantia dêste contracto.
7.° Define-se conforme o parecer de pessoas entendidas, que não é devida contribuição de registo na agremiação dos capitais, fusão de três entidades, o que não constitui uma transferência de valores.
8.º A letra do Código Comercial, na opinião da Procuradoria Geral da República, não permite a emissão de obrigações nas condições pedidas neste artigo. Êle, que é indispensável para a realização da empresa, tem todos os precedentes das outras companhias nacionais e do quási todas as estrangeiras a seu favor. Assim:
Companhias portuguesas
Capital em contos de réis
[Ver tabela na imagem]
O número primitivo de obrigações de Guimarães era maior.
Companhias francesas
Capital em milhões referido a 31 de Dezembro de 1964
[Ver tabela na imagem]
Em 31 de Dezembro de 1885 a proporção no conjunto das grandes companhias era de 1:6,6. Em 1904 era de 1:9,1 e hoje deve ser maior.
Esta concessão não vai de forma alguma tornar menos segura a situação dos obrigacionistas, porque todo o caminho de ferro construído -capital efectivado na empresa - e a garantia de juro são penhores mais valiosos que a realização prévia do capital acções, igual ao das obrigações.
Se as obrigações não tivessem garantia de juro e fossem em capital igual ao das acções, conforme a lei, se a empresa não der saldo na exploração, de nada serviriam aos obrigacionistas a imobilização das acções; ao passo que, garantido o juro às obrigações, recebiam êstes o seu coupon, ficando os accionistas sem dividendo, realizando-se então o objectivo do Código Comercial.
O número que arbitrámos dá margem folgada para quaisquer eventualidades alem das previstas no projecto de estatutos apresentado com o requerimento de 28 de Junho de 1011 pelos concessionários ao Govêrno, o qual é 1:6,4.
Como a maior parte das obrigações é destinada à construção de linhas que usufruem as vantagens da base 5.a da lei de 14 de Julho de 1899, parece justo generalizar a todo o capital da empresa o disposto na referida base.
É de esperar que passados os primeiros quatro anos seja eliminado o encargo para o Tesouro da garantia do juro. Recorrendo ao relatório da proposta de lei de garantia de juro de 30 de Janeiro de 1904, sabemos que "não é preciso recorrer a cálculos mais ou menos falíveis do tráfego provável, baseados na população da zona tributária, população superior a 300.000 almas, como já foi ponderado, e que compreende a de centros tão importantes como Viana, Braga e Guimarães.
Basta comparar as linhas a construir com as do Minho, da Póvoa e de Guimarães.
O rendimento bruto quilométrico destas (excluindo os impostos), nos primeiros anos da sua exploração foi o seguinte:
Linha do Minho .... 2:200$000
Linha da Póvoa .... 1:3003000
Linha de Guimarães .... 1:400$000
Ou em média 1:600$000 réis, que hoje é superior já a 2:700$000 réis. Não será inferior àquela média o rendimento inicial das novas linhas. A despesa inicial de exploração economicamente organizada não deve exceder réis 700$000 a 800$000, sendo portanto certo um rendimento líquido inicial de 800$000 réis.
A construção das linhas nas condições prescritas no decreto de 27 de Abril, isto é, em curvas de 75 metros de pode ser levada a efeito sem obras de arte dispendiosas, podendo-se fixar no máximo de 20.000$000 réis o capital tomado para base da garantia de juro. Se for garantido aquele capital quilométrico com o juro de 5 por cento, igual ao que foi estipulado para a linha Tôrres-Fi-gueira-Alfarelos, bastará limitar a 3 por cento o máximo adeantadamente constituído pela garantia, limite que naquela linha é de 2 por cento. Convêm notar que tendo sido de 1:200$000 réis a média do seu rendimento quilométrico nos primeiros tempos, bastaram quinze anos para que, o crescimento dele viesse a dispensar a garantia concedida, entrando agora no período do reembolso. Para definir claramente e limitar a responsabilidade assumida, pode-se fixar em 150 quilómetros a extensão garantida, proximamente igual á dos anteprojectos, á qual corresponderá o capital, de 3.000:000$000 réis, não podendo, pois, a garantia exceder o limite de 90:000$000 réis, ou 600$000 réis por quilómetro, para o que seria preciso que o rendimento líquido não excedesse 400$000 réis ou o rendimento bruto 1:100$000 réis.
A encontrar com a garantia recebe o Estado o produto dos impostos de trânsito e selo que excederá 15:000$000 réis, e o aumento de receita líquida nas linhas do Minho e Douro, proveniente do afluxo do tráfego das novas linhas, não inferior a 45:000$000 réis.
Na pior das hipóteses, assas improvável, o encargo será pois de 30:000$000 réis. E se a construção das linhas for gradual, deixando-se a do troço dos Arcos de Valdevez a Monção, a mais cara e menos rendosa,
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para quando esteja concluída a dos outros trocos, o encargo dele proveniente sobrevirá apenas no momento em que se acham já êsses em plena exploração.
Para incitar a concorrência, algumas vantagens mais podem ser proporcionadas ao capital, consistindo nas isenções de impostos e outros auxílios proporcionados pela base 5.ª da lei de 14 de Julho de 1899.
São êstes números do relatório do decreto de 24 de Dezembro de 1903 relativos a uma época em que o desenvolvimento económico do país estava muito atrasado. O rendimento bruto das linhas do Norte aumentou considerávelmente e de então até hoje ; e se já se previa por êstes números de precisão incontestável que a empresa era de garantia de juro apenas nominal no desembolso do Tesouro, com mais razão hoje se pode considerar, não de qualquer ónus para o Estado, mas uma bela fonte de receita sem o mínimo dispêndio.
Estudos de engenheiros abalizados - Vasconcelos e Sá, Justino Teixeira e Xavier Cohen, demonstram que não só os rendimentos das linhas da rede de que se pretende a fusão garantem largamente o juro e a amortização das obrigações, como tambêm que a garantia do Estado não chegará a tornar-se efectiva, devendo até haver dividendo para os 900.000$000 réis de acções.
Estando assim prudentemente assegurado o rendimento inicial das novas linhas, que na máxima parte já estão proficientemente projectadas, parece-nos justa a faculdade de emissão nas bases que propomos.
9.° Concordamos tambêm que, sendo necessário regular as condições de resgate das linhas da Póvoa e Guimarães é boa a unificação de prazo, nos termos do artigo 29.° do primeiro contracto de 27 de Setembro de 1904, sendo o prazo nele fixado contado da data do contracto modificado de acordo com êste projecto de lei.
Em conclusão: somos de parecer que o Estado, visto ter uma zona de acção exclusiva no sul do País que lhe tomará por demais toda a actividade, deve utilizar as concessões feitas no Minho, num regime mixto, e facilitar a unificação do sistema regional remover quaisquer estorvos mediante concessões justificáveis, olhando principalmente para o interesse geral e o progresso económico da nossa província mais laboriosa e de tantas perspectivas de futuro industrial e agrícola, o que não deixa de concordar com a contribuição para a prosperidade maior da linha larga e para a valorização do pôrto de Leixões.
E como tambêm os elementos seguros da perspectiva financeira desta empresa de Caminhos de Ferro regionais mostram um encargo apenas nominal para o Tesouro na garantia do juro, e são atendíveis as outras condições das bases dêste projecto de lei, nós somos de parecer que êle deve ser aprovado sem demorar com a leve modificação introduzida, para evitar que se torne mais desconsoladora a corrente de emigração, e que se agravem mais as precárias circunstâncias dos trabalhadores do norte do país, que irão ter já aqui um belo campo de acção.
Sala das Sessões, 10 de Janeiro de 1912.= João Pereira Bastos = Jorge de Vasconcelos Nunes = Álvaro Pope = João Carlos Nunes da Palma = Joaquim José Cerqueira da Rocha = Ezequiel de Campos, relator.
Senhores.- A vossa comissão de finanças vem dar-vos o seu parecer sôbre o projecto de lei n.° 5-A, que se ocupa das "linhas do Alto Minho" ou, mais propriamente, "das alterações aos contractos de 27 de Setembro de 1904 e 4 de Março de 1907, celebrados para a construção e exploração dos caminhos de ferro de Braga a Guimarães, Braga a Monção e Viana do Castelo a Ponte da Barca e ainda "da fusão das Companhias do Pôrto á Póvoa e Famalicão e a do Caminho de Ferro de Guimarães com a empresa concessionária das linhas acima mencionadas".
Não é da competência desta comissão o estudo do aspecto jurídico do projecto n.° 5-A que será, sem dúvida, apreciado pela comissão competente.
A vossa comissão de obras públicas no seu parecer, que temos presente, ocupou-se dos aspectos técnico e económico do projecto, chegando à conclusão, que a vossa comissão de finanças perfilha, que é de utilidade geral a execução das obras de que o projecto n.° 5-A se ocupa. À vossa comissão de finanças resta apenas dar o seu parecer sôbre o aspecto financeiro do projecto: é sua opinião que, dadas as condições actuais do nosso meio financeiro, deveis dar a vossa aprovação ao projecto n.° 5-A, contanto que dum modo iniludível fique consignado o princípio que, seja qual for a importância e número das obrigações que venham a ser emitidas, o Estado é unicamente obrigado ao pagamento da- garantia do juro estipulado no contrato de 24 de Setembro de 1904, isto é, o Estado dispenderá o máximo de 90:000$000 réis anuais, ou seja a garantia de 600^000 réis por quilómetro numa extensão de 100 quilómetros, ainda que seja superior a êste número o comprimento da linha.
Por outro lado, por informações colhidas nas estações competentes, pode a vossa comissão de finanças informar-vos que as linhas do Alto Minho não vem prejudicar as linhas do Estado, antes determinarão um aumento do seu tráfego; pelos motivos expostos, entende a vossa comissão que deveis aprovar o projecto n.° 5-A.
Sala das Sessões da Comissão de Finanças, em 11 de Janeiro de 1912.= Inocencio Camacho Rodrigues, relator = José Barbosa = António Maria Malva de Vale - Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães = Tomé de Barros Queiroz = Álvaro de Castro = Joaquim José de Oliveira = Aquiles Gonçalves.
5-A
Senhores: - Devendo ser o progresso económico do país objecto dos nossos mais solícitos disvelos, importa dar vigoroso impulso, até onde o permitem os recursos do Estado, à viação acelerada, factor primacial da riqueza pública.
Se há regiões que, pela densa população, actividade laboriosa e possibilidade de atrair excursionismo, tenham jus a êsse melhoramento, é a província do Minho.
Circunstâncias assas conhecidas, que é ocioso relembrar, tem estorvado a pronta construção das linhas de Braga a Guimarães, Braga a Monção e Viana à Ponte da Barca, concedidas por contracto de 27 de Setembro de 1904, que até agora não surtiu o desejado efeito.
Depois de duas transferências acha-se a concessão, ao presente, em mãos de empresa portuguesa, que, depois de elevar de 24 contos a 50 contos de réis o depósito de garantia, mandou elaborar, com esmero, os projectos das linhas, aguardando, porem, desde 1908 solução da questão posta acerca do traçado mais conveniente para a linha do Vale do Lima, conforme a proposta de lei apresentada pelo Govêrno em 25 de Julho daquele ano e aceite pela comissão respectiva da Câmara dos Deputados, em termos tais, porêm, que os concessionários declararam não os poder aceitar, o que fez voltar o projecto à comissão.
A omissão, no contracto primitivo, de autorização explícita para a necessária emissão de obrigações, que tem na garantia de juro base segura e tangível, embora não prevista na lei geral, como em relação a caminhos de ferro seria preciso, tornava indispensável uma providência legislativa.
Preparam entretanto os concessionários as bases duma fusão da sua empresa com as companhias de caminhos de ferro do Pôrto á Póvoa e Famalicão e de Trofa a Guimarães e Fafe.
Foi, em princípio, admitida pelo Govêrno essa fusão por despacho de 22 de Julho de 1909, sob a cláusula de
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ser elevada de 0m,90 a 1 metro a largura da primeira daquelas linhas, de se fixar uma data única para termo de todas as concessões, algumas das quais tem duração indefinida e se poderiam supor perpétuas, se essa perpetuidade não fôsse de encontro aos princípios do decreto de 31 de Dezembro de 1864, que rege a parte do domínio público constituída pelos caminhos de ferro.
É de indispensável conveniência pública essa combinação, que unifica a exploração de perto de 300 quilómetros de linhas, constituindo um grupo homogéneo e define os direitos do Estado á reversão de todo o grupo em prazo determinado.
Tem sido norma geralmente seguida, mesmo no nosso país, dar o Estado justo auxilio às empresas concessionárias de caminhos de ferro, pelas revisões dos seus contractos, quando as circunstâncias o aconselham, quer a concessão resulte do concurso, quer tenha sido feita sem êle.
No parecer de 25 de Agosto de 1908, da comissão de obras públicas, se encontram reunidos numerosos exemplos dessa forma de proceder.
O natural retraimento do capital, perante os empreendimentos ferro-viários, ainda que quando de auspicioso futuro, aconselha a outorga de facilidades que, sem onerarem o Tesouro, amparam iniciativas e favorecem úteis combinações.
A êsse objectivo obedece a presente proposta de lei, que, alem de reproduzir, na essência, a de 25 de Julho de 1908, estabelece as condições para a fusão das empresas em termos equitativos que a facilitem.
Assim, é prevista não só a concessão, nos termos legais da linha de Lousado a Mindelo, que assegura continuidade do grupo e foi objecto do inquérito administrativo, nos termos do decreto de 6 de Outubro de 1898, como o alargamento da linha da Póvoa e a exploração do ramal da Senhora da Hora, que assegura as relações regionais com o pôrto de Leixões, trazendo-lhe valioso tráfego.
Para o termo de todas as concessões fixa-se uma data única, sendo a sua duração inferior à de noventa e nove anos usualmente estipulada.
Torna-se extensiva a todas as linhas a proibição de contractos particulares e o direito de resgate, que figuram no contracto das linhas do Alto Minho.
Definem-se os termos em que a necessária emissão de obrigações deverá ser feita com a base sólida da garantia de juro, não prevista na lei geral, e, em vista da sua aplicação, na maior parte à construção de linhas, usufruindo as vantagens da base 5.ª da lei de 14 de Julho de 1899, torna-se genérico o preceito da isenção prevista no n.° 8.° da mesma, para a conveniente uniformidade.
Define se, o que para pessoas autorizadas é matéria assente, que não é devida a contribuição de registo na agremiação de capitais, que não constitui uma transferência de valores.
Ocioso será pois entrar em mais larga exposição de motivos que me levam a apresentar o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° Os contractos de 27 de Setembro de 1904 e 4 de Março de 1907 para a construção e exploração dos Caminhos de ferro de Braga a Guimarães, Braga a Monção e Viana a Ponte da Barca serão modificados em harmonia com as prescrições das bases anexas à presente lei, que dela ficam fazendo parte integrante.
Art. 2.° É revogada a legislação em contrário.
Base 1.ª
1.° O caminho de ferro do Vale do Lima seguirá a margem direita do Rio Lima em toda a sua extensão, desde Viana até o entroncamento na linha de Braga a Monção.
2.° A Empresa concessionária fica obrigada a construir uma ponte sôbre o Rio Lima em Lanheses para ligação da estrada das duas margens, logo que o rendimento líquido das linhas concedidas com garantia de juro atinja 7 por cento do capital garantido, assistindo à mesma o direito de cobrar as portagens previstas no contracto.
3.° Em nenhum dos troços das linhas a construir poderá ser excedido o limite do 20 milímetros nas inclinações.
4.° Os projectos dos troços de Lanheses a Ponte da Barca e dos Arcos a Monção serão apresentados no prazo dum ano a contar da data do novo contracto feito nos termos da presente lei.
5.° O prazo de sete anos previsto no contracto para a construção do troço dos Arcos a Monção é reduzido a cinco anos, contados da data da aprovação dos respectivos projectos.
Todos os outros troços serão construídos no prazo de três anos, contados da data do novo contracto celebrado nos termos da presente lei, para aquele cujos projectos estejam já aprovados, e da data da aprovação dos projectos para os restantes.
6.° A mesma empresa fica obrigada a estudar e promover desde já, quanto em si caiba, a criação duma estância em Santa Luzia, junto de Viana do Castelo, servida por ascensor e dotada com os atractivos e comodidades precisas para chamarem ali concorrência de excursionistas, devendo submeter à aprovação do Govêrno, no prazo dum ano a contar da data do novo contracto feito nos termos da presente lei, o respectivo projecto elaborado em harmonia com as indicações das estações oficiais competentes.
Base 2.ª
A fusão das companhias do Pôrto à Póvoa e Famalicão e do caminho de ferro de Guimarães com a empresa concessionária das linhas de Braga a Guimarães, Braga a Monção e Viana a Ponte da Barca, aceite em princípio por despacho ministerial de 22 de Julho de 1909, deverá ser sujeita às seguintes condições:
1.ª Será construída e explorada, nos termos da base 5.ª e 6.ª da lei de 14 de Julho de 1899, uma linha férrea dum metro de largura de via de Lousado a Mindelo, com uma estação comum à linha do Minho em Louzado, sendo suprimido o troço comum a esta entre Lousado e Trofa.
2.ª A largura da via da linha do Pôrto à Póvoa e a Famalicão será elevada a um metro, procedendo-se à necessária modificação do material circulante.
3.ª A empresa ou companhia constituída pela fusão atrás indicada continuará a explorar por arrendamento, durante o prazo da concessão, o ramal da Senhora da Hora a Leixões, devendo ser unificada a largura da via com a das outras linhas, sem prejuízo do serviço privativo do pôrto de Leixões.
4.ª A concessão de todas as linhas concedidas à empresa ou companhia resultante da fusão, a saber:
Do Pôrto à Póvoa e Famalicão;
De Trofa a Guimarães e Fafe;
De Braga a Guimarães;
De Braga a Monção;
De Viana a Ponte da Barca;
De Lousado a Mindelo:
é feita pelo prazo de noventa anos, contados da data do novo contracto celebrado nos termos da presente lei.
Findo aquele prazo serão aplicáveis a todas as mencionadas linhas as cláusulas respectivas do contracto de 27 de Setembro de 1904.
5.ª São proibidos os contractos particulares de transporte em todas as linhas da concessão.
As tarifas e horários serão sujeitos ao exame da administração dos caminhos de ferro do Estado antes de serem submetidos à aprovação do Govêrno.
6.ª O depósito de 50.000$000 réis a que se refere o
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contracto de 31 de Janeiro de 1907 subsistirá para garantia do novo contracto.
7.ª Não é devida contribuição de registo pela fusão a que se refere a presente base.
8.ª Para a realização do plano aprovado na presente base é permitida à empresa ou companhia resultante da fusão a criação e emissão das obrigações necessárias, nominativas ou ao portador, ainda que a sua importância exceda a do capital social realizado, contanto que não ultrapasse a proporção de 1 de acções para 8 de obrigações. Essa emissão será feita nos termos dos estatutos da empresa ou companhia e mediante prévia autorização do Govêrno, ficando entendido que da emissão nenhumas responsabilidades advêm ao Estado, obrigado unicamente ao pagamento da garantia do juro estipulado no contracto de 27 Setembro de 1904. A essas obrigações, bem como às acções emitidas pela empresa ou companhia tambêm para a realização do plano aprovado na presente base, é aplicável o disposto na base 5.ª n.° 6, da lei de 14 de Julho de 1899.
9.ª O direito de resgate por parte do Estado tornar se há extensivo a todas as linhas enumeradas na condição 4.a desta base, nos termos do artigo 29.° do contracto de 27 de Setembro de 1904, sendo o prazo nele fixado contado da data do contracto modificado em harmonia com a presente lei.
Sala das Sessões da Câmara dos Deputados, em 30 de Novembro de 1911. = Tito Augusto de Morais = Rodrigo Fontinha = Casimiro Rodrigues de Sá = Carlos Henriques Silva Maio. Pinto = Inocêncio Ramos Pereira.
O Sr. Presidente: - Está em discussão na generalidade.
Pausa.
O Sr.. Presidente: - Como ninguêm pede a palavra vai votar-se.
Foi aprovado o projecto, sem discussão, na generalidade.
O Sr. Presidente:-Está em discussão na especialidade.
Foi lido o artigo 1.°
O Sr. Ezequiel de Campos: - Sr. Presidente: mando para a mesa as seguintes propostas de aditamento e emenda:
Propostas de aditamento e emenda Base 2.ª
Acrescentar ao n.° 5.°: "sem autorização do Governo", e redigir o n.° 6.° assim: O depósito de 50:000$000 réis. que foi imposto pela portaria de 31 de Janeiro de 1907, subsistirá para garantia do novo contracto. = Ezequiel de Campos.
Estas emendas são indispensáveis, a meu ver.
Foram admitidas.
O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à votação do artigo 1.°
Foi lido na mesa e aprovado.
O Sr. Presidente: - Vai ler-se a base 1.ª, para ser votada.
Foi lida na mesa e aprovada.
O Sr. Presidente: - Vai ler-se a base 2.ª, para ser votada.
Foi lida na mesa e aprovada.
O Sr. Presidente : - Vá o ler se as propostas de aditamento e emenda do Sr. Deputado Ezequiel de Campos, para serem votadas.
Foram lidas na mesa e aprovadas.
O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à votação do artigo 2.°
Foi lido na mesa e aprovado.
O Sr. Presidente: - Chamo a atenção da Câmara. Não tendo- feito oportunamente uma comunicação que devia fazer, vou fazê-la agora.
Não fiz essa comunicação na sessão passada porque havia sôbre a mesa uma grande quantidade de expediente, e tenho que pedir desculpa à Câmara dessa falta involuntária.
A mesa cometeu a falta involuntária de não consultar a Câmara sôbre se aprova um voto de sentimento pela morte da mãe do Sr. Ministro da Justiça. Fá-lo, porem, agora pedindo à Câmara que se pronuncie.
A Câmara resolveu afirmativamente.
O Sr. Presidente: - Vai ler-se, para entrar em discussão, o projecto de lei n.° 85.
Foi lido na mesa. É o seguinte:
N.° 85
Senhores Deputados. - A vossa comissão de administração pública é de parecer que deve ser aprovado o presente projecto de lei que corresponde a uma urgente necessidade de serviço público nos concelhos de Setúbal, Alcácer do Sal, Cezimbra, Grândola, S. Tiago de Cacem, Barreiro, Aldeia Galega, Moita, Alcochcte, Seixal, Almada e em todos os dos distritos de Santarém e Castelo Branco.
que altamente prejudica os interesses dos proprietários rurais e a segurança pública, e assim, ouvida a comissão de finanças, deve êste projecto entrar imediatamente em discussão.
Com a organização da guarda republicana no Alentejo, os ratoneiros dessa região emigraram para os concelhos limítrofes assolando as propriedades daqueles districtos e concelhos.
E mester terminar de pronto com êsse estado de cousas
Sala das Sessões, 23 de Janeiro de 1912. = J. Jacinto Nunes = José Vale de Matos Cid = Francisco Luís Tavares = Gaudêncio Pires de Campos = Francisco José Pereira.
Senhores Deputados. - Foi verdadeiramente desgraçada a situação financeira que herdámos da monarquia, mercê da administração perdulária e inconstante e da aplicação leviana e imprudente, quando não era criminosa, dos réditos públicos que caracterizou o regime monárquico-constitucional no nosso país, salvo um ou outro vasio de probidade e de bom senso nessa imensidão de insensatês e de imoralidade.
Má e desgraçada foi a herança e consequentemente penosa e fatigante a tarefa que o regime republicano se impôs de reparar males que vão tam fundo, de reformar hábitos que a tantos interessavam, de colocar a parcimónia, a rectidão e a economia onde só havia o desperdício,
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a injustiça e a prodigalidade. São inúmeros os interesses a ferir, bastantes costumes já radicados a modificar, imensos erros e danos a destruir, muita imoralidade a castigar e fazer desaparecer.
Nesta grande tarefa de saneamento, de moralidade e patriotismo tem uma importante acção e portanto uma enorme responsabilidade a vossa comissão de finanças o que não a amedronta quanto a trabalhos e canseiras, mas que a atemoriza quanto às consequências que para o bom nome e subido crédito do país podem resultar de qualquer acto imprudente, de qualquer resolução precipitada. Assim é que nunca de nós saiu parecer sôbre qualquer projecto ou proposta de lei, que mão fôsse profundamente meditado, atentamente estudado, cuidadosamente discutido. Será fácil obter mais inteligência, mais perfeição, mas não mais cuidado, mais atenção, mais amor ao trabalho, mais dedicação à República e ao País.
Cônscia da grande responsabilidade que sôbre si pesa, resolveu a vossa comissão de finanças, desde que a primeira vez se reuniu e salvo casos verdadeiramente extraordinários e de fôrça maior, ou por motivos de privada justiça, nunca autorizar ou aconselhar a aprovação de leis donde derivem aumentos de despesas ou diminuição de receitas e antes envidar todos os esforços, fazer todas as tentativas e empregar todos os meios ao seu alcance, para que, sem prejuízo do regular funcionamento e da introdução dos necessários progressos e melhoramentos nos serviços públicos, as receitas fossem aumentadas por uma rigorosa, justa e equitativa aplicação das leis e as despesas reduzidas ao mínimo por uma severa, honrada e recta aplicação dos rendimentos públicos.
Há, porem, na vida das nações umas despesas inadiáveis que nunca se devem deixar de fazer, sejam quais forem os sacrifícios a realizar, não só pela produtividade que delas resulta como tambêm pela melhoria que podem trazer à segurança pública e à defesa nacional, que serão sempre um dos factores mais importantes do crédito público e do bom nome nacional.
Foi nesta orientação que já tivemos a honra de vos declarar por várias vezes que há três espécies de despesas, cujo aumento veremos 'sem temor, por mais importante que seja, pois, a todas elas consideramos elevadamente produtivas. Essas três espécies de despesas são as que se referem a medidas de fomento, a melhoramento da instrução e a aperfeiçoamento da defesa nacional. Destas medidas, quando bem orientadas, só vantagens há a esperar, pois de todas, directa ou indirectamente há a esperar o benefício económico, melhoria financeira e aperfeiçoamento social. Depende dessas medidas, a ordem, a educação e o desenvolvimento material que fazem grandes as nações e sem o que não pode haver respeito, progresso ou crédito e sem êstes três factores nenhum país pode viver nos tempos hodiernos.
Foram êstes os princípios por nós fixados e que de maneira alguma queríamos modificar, mas o projecto de lei n.º 30-I veio mais uma vez demonstrar quão e verdadeiro o princípio sociológico de que as sociedades não se podem governar por fórmulas rígidas, e assim é, que nos vimos obrigados a pedir a vossa aprovação para um projecto de lei donde resulta um aumento de despesa relativamente importante.
Destina-se êsse projecto de lei à criação de três companhias da Guarda Nacional, destinadas a parte do distrito de Lisboa que fica na margem esquerda do Tejo e aos distritos de Santarém e Castelo Branco.
São óbvios os motivos que nos levam a ter sôbre êste projecto opinião favorável, pois, as muitas deslocações de fôrças do exército e da guarda republicana que se fizeram por motivo da recente greve, patenteiam bem a necessidade urgente e indispensável de organizar quanto antes em todo o país a guarda republicana e dar-lhe uma subida organização, de forma que para os casos usuais de perturbação pública, nos quais se devem incluir as greves, bastem as suas fôrças para restabelecer e manter a ordem sem se tornar preciso recorrer ao exército, que tem um papel muito diferente e acção muito diversa a desempenhar e que muito prejudica a sua instrução e educação militar e mesmo o seu prestígio com o desempenho de funcções de carácter policial.
Além do exposto e dos grandes benefícios que para os povos sempre resultam da existência duma polícia rural disciplinada e cuidadosa, que lhes assegura o livre trânsito das estradas e caminhos e lhes protege as propriedades contra os frequentes assaltos de vagabundos e malfeitores, um outro facto muito importante há a ponderar como se vê do parecer dado pela vossa comissão de Administração Pública ao presente projecto.
Efectivamente, como tambêm dizem as nossas informações, com a organização da Guarda Republicana no Alentejo os ratoneiros e vadios desta região emigraram para os concelhos limítrofes, tornando-se um constante perigo para as propriedades situadas na zona a que se estende a influência das companhias propostas, pois são vulgares, alêm de mais importantes prejuízos, o roubo das frutas e a danificação das culturas.
Conforme já foi dito, no relatório que precede o decreto com fôrça de lei que organizou a Guarda Nacional Republicana, quando os campos se acham votados a êste estado de abandono nem só os proprietários sofrem os consequentes prejuízos, mas tambêm se fazem sentir na riqueza pública, visto ficarem muitos terrenos por cultivar e daí vem uma perda efectiva para o Estado pela correlativa diminuição das receitas públicas.
Mas ainda há mais considerações a fazer. A agitação constante em que vivem as classes operárias das povoações de Setúbal, Barreiro, Aldeia Galega, Moita, Seixal e Almada obrigam a destacar para ali constantemente fôrças da Guarda Republicana destinadas á cidade de Lisboa, obrigando assim a uma grande despesa, pois cada praça recebe diariamente mais 320 ou 360 réis, o que no fim do ano representa um aumento de despesa dalguns contos de réis, e, alêm desta circunstância, como as fôrças que foram calculadas para a cidade de Lisboa e arredores não são excessivas, antes estão reduzidas ao mínimo, quando se desloca alguma parcela dessas fôrças as que ficam em Lisboa não podem cumprir completamente o serviço para que foram criadas, nem vigiar com o zelo e cuidado que lhes é exigido a zona a que estão destinadas. Daqui resulta manifesto prejuízo do sossego público e da garantia de segurança dos cidadãos.
Para se avaliar bem o quanto é reduzido o efectivo calculado para a Guarda Republicana basta dizer que as secções destinadas a Setúbal e Barreiro, que devem policiar a parte do distrito de Lisboa situada na margem esquerda do Tejo, área extensíssima constituída por 11 concelhos, nalguns dos quais predomina o elemento operário e onde as greves são vulgares, tem apenas o irrisório efectivo de 106 praças. Isto e, 10 praças por concelho, e nós podemos avaliar bem o que serão 6 soldados para manterem a ordem num concelho como Setúbal
Por todos êstes motivos é a vossa Comissão de Finanças de parecer que o projecto de lei n.° 30-I, que organiza três companhias mixtas da Guarda Nacional Republicana destinadas à polícia dos distritos de Santarém e Castelo Branco e da parte do distrito de Lisboa situada na margem esquerda do Tejo, deve merecer a vossa aprovação.
A aprovação do presente projecto ocasiona agora uma despesa de 54:888$700 réis com a instalação das diferentes fracções nas diversas terras a que são destinadas e mais com a manutenção das companhias a despesa men-
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sal de 10:366$352 réis ou seja no presente ano económico e nos quatro meses que decorrem de Março a Junho um total de 41:465$408 réis.
A esta quantia, como já ficou dito, há a abater as verbas despendidas com os abonos extraordinários e com os transportes não só às praças da Guarda Republicana que destacam para fora de Lisboa, como tambêm ás fôrças do exército que constantemente estão a ser empregadas no serviço de polícia.
Mais é necessário ponderar que para o futuro o aumento de despesa não é tam grande como à primeira vista se afigura, visto estar no plano geral da organização da Guarda Republicana destinada uma companhia a cada distrito e, portanto, aos distritos de Santarém e Castelo Branco, onde são colocadas duas das companhias agora organizadas. Quando a Guarda Republicana estiver organizada em todo o país apenas haverá a mais em todo o país e em relação ao actual plano, que sendo mínimo é deficientíssimo, uma companhia mixta em Setúbal e 70 soldados de cavalaria nas companhias de Santarém e Castelo Branco.
Devido á Guarda Nacional Republicana ainda não ter um ano de existência não existem ainda contas liquidadas da sua gerência, razão esta por que não podemos apresentar números exactos da despesa feita num ano em subsídios e transportes com as fôrças que destacam para localidades fora do seu quartel permanente.
Entende mais a vossa Comissão de Finanças que ao projecto de lei deve ser acrescentado um artigo redigido ida seguinte forma:
Art. 2.° - Nas localidades em que, devido à carestia de vida assim se torne necessário, poderá o subsídio de alimentação das praças ser igual ao que é abonado em Lisboa e Pôrto.
Assim parece à comissão.
Sala da Comissão de Finanças, em 12 de Fevereiro de 1912 = 7. Camacho, Rodrigues = José Barbosa = Tomé de Barros Queiroz = Álvaro de Castro = Aquiles Gonçalves = Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães, relator.
30-I
Sendo da maior urgência para a segurança dos indivíduos e das propriedades dos concelhos de Setúbal, Alcácer do Sal, Cezimbra, Grândola, S. Tiago do, Cacem, Barreiro, Aldeia Galega, Moita, Alcochete, Seixal, Almada e de todos que constituem os distritos administrativos de Santarém e Castelo Branco, que se dotem as respectivas áreas com fôrças da Guarda Nacional Republicana, propõem os abaixo assinados, deputados por êstes círculos, que se compõem dos mesmos concelhos, que sejam desde já organizadas três companhias mixtas daquela guarda, com a composição indicada nos documentos juntos, em substituição das fôrças indicadas no projecto da organização da Guarda Nacional Republicana, aprovado por decreto de 3 de Maio de 1911, para o que vai junto um projecto de lei.
Sala das sessões da Câmara dos Deputados, em 4 de Janeiro de 1912. = Francisco de Sales Ramos da Costa = Amílcar Ramada Curto = Gastão Rafael Rodrigues Jorge de Vasconcelos Nunes = Joaquim Brandão = José Montez = Francisco José Pereira.
PROJECTO DE LEI
Artigo 1.° É o Govêrno autorizado a organizar desde já três companhias mixtas da Guarda Nacional Republicana, com o efectivo total de 460 homens e 167 cavalos, com as sedes nas cidades de Setúbal, Santarém e Castelo Branco e com a composição indicada no mapa junto.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário.
MAPA
Composição das companhias de Santarém, Setúbal e Castelo Branco
[Ver mapa na imagem]
ORÇAMENTO
Despesa com a instalação
[Ver tabela na imagem]
Despesa com a manutenção das companhias abaixo designadas
[Ver tabela na imagem]
Sala das Sessões da Câmara dos Deputados, 4 de Janeiro de 1912. = O Deputado, Francisco de Sales Ramos da Costa.
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O Sr. Jorge Nunes: - Sr. Presidente: pedi a palavra para dizer, a propósito dêste projecto, que há mais dum motivo para que sôbre êle caia a atenção e a aprovação da Câmara.
Estamos distraindo fôrças de Lisboa para a manutenção da ordem nas províncias, a requisição dos administradores do concelho, e muitas vezes essas forcas não são fornecidas conforme as necessidades.
Torna-se, pois. necessário e urgente alargar a área da acção da Guarda Republicana, pois que a ela compete o serviço policial, que é aquele de que a província especialmente carece.
Pelo que diz respeito a Setúbal, acho que o número de praças consignado no projecto é pequeno, visto ser a área muito grande, e se não houver uma distribuição muito conscienciosa das praças montadas o resultado poderá não ser satisfatório, pois que os concelhos ficam muito distantes e aqueles campos encontram-se infestados de malfeitores: gente de Lisboa que a polícia tem perseguido e que se foram acoitar naquelas terras.
Chegam à porta de chapéu na cabeça e nem ao menos por favor pedem uma esmola: - exigem, e maltratam as pessoas que não lha dão. Não só exigem a esmola, mas até se permitem fazer a escolha.
Torna-se, portanto, urgente alargar a área de acção da Guarda Republicana, e é disso que a província especialmente carece.
Há uma grande necessidade de abranger todo o país com a organização de novas companhias de Guarda Republicana.
Depois dela se ter criado nos distritos de Évora e Beja, deu-se um êxodo dos malfeitores que infestavam êsses pontos para outros distritos onde não existe a guarda.
Donde resulta que os povos que não estão servidos pela Guarda Republicana e que vivem em regiões limítrofes daquelas em que a guarda está já criada, vêem-se hoje ainda mais assediados pelos malfeitores.
Dou, portanto, a minha inteira aprovação à criação da Guarda Republicana nos distritos de Castelo Branco e Santarém e nos concelhos de Setúbal e outros, desejando que a sua distribuição se vá fazendo com a máxima regularidade por todo o país.
Mando para a mesa uma proposta, que fundamentarei quando se discutir o projecto na especialidade. É a seguinte:
Proposta de aditamento
Artigo 3.° Os soldados de 2.ª classe da Guarda Nacional Republicana, com um ano de serviço efectivo sem impedimento algum, bom comportamento e manifesto zelo pelo serviço policial, passarão à 1.ª classe. = O Deputado, Jorge Nunes.
Foi admitida.
S. Exa. não reviu.
O Sr. Ramos da Costa: - Sr. Presidente: pedi a palavra para declarar a V. Exa. e à Câmara que aceito todas as propostas de aditamento da comissão de finanças, assim como a proposta de aditamento do meu colega e amigo Sr. Jorge Nunes.
Já quando tive a honra de apresentar êste projecto à consideração do Parlamento, eu disse algumas palavras tendentes a justificar a sua oportunidade; mas, agora, se S. Exas. me permitem farei mais algumas considerações.
A organização do exército, decretada pelo Govêrno Provisório, teve em vista realizar o pensamento grandioso da nação armada, isto é, dotar todos os cidadãos com elementos e conhecimentos necessários para defender o torrão pátrio.
A organização militar em vigor determina que durante alguns meses os cidadãos se conservem nas fileiras do exército, mas simplesmente o tempo necessário para adquirirem a instrução militar. Depois são restituídos aos seus trabalhos quotidianos, à agricultura, às artes e, emfim, aos diversos empregos que ocupavam, antes de se alistarem. Mas o que é necessário, para garantia das propriedades e dos cidadãos, é que, em todo o país, haja fôrças públicas devidamente organizadas.
O Govêrno Provisório, pelo decreto de 3 de Maio de 1911, criou a Guarda Nacional Republicana, espalhando os seus batalhões e companhias por diferentes pontos do país; mas nessa ocasião não se atendeu precisamente às necessidades locais, porquanto, para o distrito de Lisboa, que alem da cidade, compreende uma área muito considerável, estabeleceu-se uma pequena forca, que correspondia à fôrça da antiga guarda municipal, ficando, portanto, toda a parte sul do distrito de Lisboa e uma grande parte da do norte completamente desguarnecidas e á mercê de quem as quisesse atacar.
A parte sul compõe-se nada menos de onze concelhos, alguns dos quais de grande área, como são os de Setúbal, S. Tiago do Cacem, Grândola e Alcácer do Sal, e até agora, para sustentar o princípio da autoridade, tem-se destacado, para essas regiões, fôrças de Lisboa.
Ora, se a fôrça para a cidade de Lisboa tinha sido calculada mesquinhamente, com certeza, com os destacamentos de fôrças para as regiões que acabo de citar muito mais pequena ficará, e disso se ressentem, extraordinariamente, os bairros mais afastados do centro da cidade, como é, por exemplo, o bairro oriental, onde o transitar de noite, pelas ruas e estradas, é bastante perigoso, pelas frequentes desordens que ali se manifestam e que são provenientes, principalmente, da falta de polícia.
A despesa que o Estado faz com os destacamentos que, constantemente, mantém em Setúbal, Santarém, Vila Franca e outras localidades, é calculada mensalmente em mais de 2:000$000 réis; e como a Guarda Republicana não pode fornecer toda a fôrça necessária para o bom policiamento daquelas localidades, acontece que o Estado se vê obrigado a recorrer ao exército, para suprir a falta dessas fôrças, o que, alem de agravamento de despesa, como a Câmara sabe, vem desvirtuar completamente a ideia que presidiu à organização do exército, que não é, de maneira nenhuma, a de empregar os soldados no serviço de polícia. Por essa organização os soldados devem primeiramente aprender a instrução militar e estar preparados para defender a Pátria, e não para fazer a polícia de feiras, guarda de cadeias e outros serviços similares. Sr. Presidente: muito conviria que, em vez dêste pequeno e reduzido projecto, que, conquanto pareça trazer um aumento de despesa, traz uma notável economia e melhoria do serviço de segurança pública, muito conviria, digo, que se elaborasse um outro projecto mais amplo e grandioso, estabelecendo a Guarda Nacional Republicana em todo o país e com umas bases mais gerais e amplas do que as mencionadas no decreto de 3 de Maio de 1911. Não podendo nós, duma só vez, estender êste benefício a todo o país, entendo de toda a conveniência que seja aprovado êste projecto, que satisfaz, momentaneamente, a uma das necessidades mais imperiosas que é a garantia da propriedade e das vidas dos cidadãos dos distritos de Santarém e Castelo Branco e duma grande área do de Lisboa.
O relatório apresentado juntamente com êste projecto à consideração da Câmara explica, largamente, as razões da sua oportunidade. Por êle se vê que tanto a comissão de finanças como a comissão de administração pública são de parecer que êle seja aprovado sem demora.
Deve, pois, a Câmara, atendendo não só às considerações que acabo de fazer como àquelas que vem exaradas nos pareceres das duas aludidas comissões, conceder a sua aprovação ao projecto que se discute.
Tenho dito.
S. Exa. não reviu.
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SESSÃO N.° 58 DE 26 DE FEVEREIRO DE 1912 21
O Sr. José Montez: - Visto que estou inteiramente de acordo com as considerações apresentadas tanto pelo Sr. Jorge Nunes como pelo Sr. Ramos da Costa, na apreciação dêste projecto, desisto da palavra.
O Sr. Macedo Pinto: - Sr. Presidente: - devo declarar a V. Exa. e à Câmara que discordo do projecto apresentado - e discordo porque êle não representa uma necessidade só para os distritos de Santarém e Castelo Branco, e para os concelhos da região de Setúbal, mas para todo o país.
Não se compreende que benefícios desta ordem se façam só para determinadas regiões.
O Sr. José Montez: - V. Exa. não reconhece a necessidade de se estabelecer a Guarda Republicana em todo o país?
O Orador: - Sim senhor.
O Sr. José Montez: - Desde que se aprove êste projecto já fica uma menor porção do país a necessitar dêsse benefício.
O Orador: - Mas que razões se apresentam para justificar que sejam estas as primeiras regiões a serem beneficiadas?
Uma voz: - E porque algumas haviam de ser as primeiras.
O Orador: - Dou por findas as minhas considerações declarando, mais uma vez, que não concordo com o projecto.
Tenho dito.
S. Exa. não reviu.
O Sr. Morais Rosa: - Sr. Presidente: não discutirei, agora, a oportunidade da criação da Guarda Republicana, porquanto o assunto é mais complexo do que à primeira vista poderá parecer.
Tem êle as mais íntimas relações com a organização militar do país. Representa um efectivo dalguns milhares de homens, que pela natureza especial da sua missão, exige um dispêndio de grande importância, porque êsses homens são remunerados sem condições muito diferentes dos soldados de linha. É um assunto que demanda muita atenção, e eu não posso deixar de estranhar que êste projecto de aumento de três companhias da Guarda Republicana, não, fôsse à comissão de guerra para ela dar sôbre êle parecer.
Trocam-se ápartes.
O Orador: - Trata-se, evidentemente, da organização duma fôrça militar.
Apartes.
O Orador: - Então tambêm a reforma da Guarda Fiscal não devia ir à comissão de guerra.
A Guarda Nacional Republicana no dia em que se decretar a mobilização passa imediatamente a ficar às ordens do Ministério da Guerra.
É minha convicção que mais tarde havemos de ser fôrçados a estudar novamente êste assunto, e não muito tarde, porque a Guarda Republicana, tal como está, não satisfaz as aspirações dos povos.
Demais, como muito bem disse o Sr. Macedo Pinto, não é de justiça que se acuda a uma região com prejuízo doutras.
Desejava que alguém, não sei quem, me dêsse explicações sôbre uma verba que aqui está.
Refiro-me á verba de 15 contos de réis, destinada à aquisição do armamento para as três companhias que êste projecto de lei organiza.
Desejava saber se esta verba para armamento é uma verba que o Ministério do Interior faz entrar nos cofres do Ministério da Guerra, visto que do armamento usado pela Guarda Republicana existe um grande stock no Arsenal do Exercito, ou se é para o pagamento dalguma requisição de material feita a alguma fábrica no estrangeiro.
S. Exa. não reviu.
O Sr. Vitorino Godinho: - Poucas palavras direi, porque todos os Srs. Deputados que me precederam concordam com o projecto, excepto o Sr. Macedo Pinto, que entende que por êle ser muito restrito, não merece a sua aprovação nem a da Câmara.
Deixe-me V. Exa. que eu, antes de fazer quaisquer outras considerações, estranhe que não se encontre presente o Ministro por cuja pasta corre êste assunto.
Seria natural que, tratando-se dum projecto que corre pelo Ministério do Interior, o Ministro do Interior se encontrasse presente à sua discussão, tanto mais que as minhas considerações visam, principalmente, a chamar a atenção de S. Exa. para o estado a que a falta de organização do Guarda Republicana ou a falta do cumprimenta do decreto de 3 de Maio de 1911 tem levado o Tesouro, obrigando-o a fazer despesas excessivas, mas necessárias, com o movimento de tropas de diferentes guarnições para a de Lisboa, etc.
Eu desejava que o Sr. Ministro, no mais curto prazo de tempo, trouxesse a esta Câmara o projecto ou o decreto de 3 de Maio de 1911, como está ou modificado, de forma a poder executar-se imediatamente a organização da Guarda Republicana para todo o país, como todos reconhecem de necessidade inadiável.
O Sr. Deputado Macedo Pinto, que foi o único que combateu o projecto, porque entende que êle não satisfaz,, visto ser destinado a uma determinada região, parece-me que labora um pouco em êrro, ou, pelo menos em precipitação, não querendo dar a sua aprovação ao projecto.
A verdade é que esta região do Barreiro, Seixal, Setúbal e Santarém se encontra em situação diversa da do resto do país,- e nós temos, necessariamente, de começar a dotar esta regia - assim como Lisboa Pôrto. Temos que começar por ai a organização da Guarda Republicana.
Aqui, simplesmente o que é de estranhar, é que não se tenha procedido para com o decreto de 3 de Maio de 1911 da mesma maneira que se procedeu para com os outros projectos, isto é, quando se discutiu o Orçamento entendeu a Câmara que devia votar as verbas necessárias para pôr em execução todas as leis do Govêrno Provisório, não procedendo da mesma forma com o decreto de 3 de Maio.
A verdade é que é de necessidade inadiável a organização da Guarda Republicana nesta região, o que não quere dizer que o não seja tambêm em outros pontos do país, pois evidentemente é.
Abstenho-me de fazer observações acerca do serviço que tem de fazer o exército e a Guarda Republicana.
Entendo que o projecto deve merecer a aprovação de toda a Câmara, e chamo a atenção do Sr. Ministro do Interior para a necessidade inadiável de trazer ao Parlamento o decreto de 3 de Maio de 1911, para ser revisto, de forma que quando se votar o Orçamento se comece a executar êsse decreto.
Eu tencionava, quando se tratasse da especialidade, mandar para a mesa uma proposta, que era exactamente aquela que apresentou o Sr. Deputado Jorge Nunes.
S. Exa. não reviu.
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22 DIÁRIO DA CAMARA DOS DEPUTADOS
O Sr. Joaquim Brandão: - Eu quero responder às considerações do Sr. Macedo Pinto, dizendo que me parece injusta a razão em que S. Exa. se funda para não dar o seu voto ao projecto.
A área por êle atingida, é uma área muito especial.
Os concelhos que nela se encontram são, na sua grande parte como o de Setúbal, muito pouco populosos, com uma grande área de propriedades, quási desabitada, e onde a defesa, portanto, não é tam efectiva, como pode ser nos outros distritos do país.
Visto que não podemos desde já, pela fôrça das circunstâncias, criar a Guarda Republicana em todo o país, não devemos por isso, deixar de a colocar onde ela se torne mais necessária.
Quanto a Setúbal posso assegurar à Câmara que em vez de haver um aumento de despesa para os cofres do Tesouro, há ainda uma grande economia, porque desde a proclamação da República tem ali estado sempre algumas dezenas de soldados, tanto de infantaria como de cavalaria, o que deve ter trazido uma despesa muito superior àquela que aqui está calculada.
Parece-me, portanto, que não há razão alguma para que não se aprove êste projecto.
Tenho dito.
S. Exa. não reviu.
O Sr. Jacinto Nunes: - Pedi a palavra simplesmente para dizer que se impõe, urgentemente, a aprovação dêste projecto.
O projecto que está em discussão representa uma grande necessidade para os concelhos do sul, porque os lavradores estão fazendo enorme despesa com os vadios que se vêem obrigados a sustentar.
Tenho dito.
S. Exa. não reviu.
O Sr. Garcia da Costa: - Sr. Presidente: não tinha tenção de falar sôbre êste projecto. Como se disse, porem, que não se sabia a razão por que a criação da Guarda Republicana era mais precisa nuns distritos do que noutros eu tenho a dizer que isso é assim porque a densidade da população é diferente.
Ouvi dizer ao Sr. Deputado Morais Rosa que a Guarda Republicana não tinha dado resultados no Alentejo por ser diminuta.
O Sr. Morais Rosa: - O que eu disse foi que havia-mos de ver no futuro o resultado que a Guarda havia de dar.
O Orador: - O resultado já deu. Facilitou, até, o aumento da contribuição predial. Proprietários havia que davam esmolas avultadas aos operários sem trabalho, mas que eram tambêm para os vadios, e essa verba já foi reduzida: pouca esmola dão. E êste ano, no meu concelho nem. uma única bolota se roubou!
S. Exa. não reviu.
O Sr. Ramos da Costa: -Sr. Presidente: desejo dar uma explicação ao Sr. Deputado Morais Rosa. S. Exa. referiu-se ao armamento da Guarda Nacional Republicana receando que fôsse necessário importá-lo do estrangeiro. Tenho a dizer ao Sr. Morais Rosa que tanto o armamento como o equipamento da Guarda serão fornecidos pelo Arsenal do Exército, que está habilitado a fornecer todo o armamento, equipamento e municiamento de que a Guarda Republicana carecer, seja qual for a sua fôrça.
Quanto aos resultados que a criação da Guarda Nacional deve dar, é claro que logo de princípio não se podia conseguir o desideratum que se deseja obter, isto é, organizar dum jacto a Guarda Republicana em todo o país, A sua criação ir se há, tambêm, fazendo à medida que as necessidades obrigarem e as fôrças dos cofres públicos o permitirem. Começou-se pelo Alentejo; depois deve seguir Setúbal, Santarém, Castelo Branco, que são as zonas adjacentes ao Alentejo e criar-se há dentro em pouco no norte do país, que tem jus incontestável aos serviços que lhe podem ser prestados pela Guarda Nacional Republicana.
S. Exa. não reviu.
O Sr. Francisco Cruz: - Sr. Presidente: vou ser breve nas minhas considerações, pois que o assunto tem sido tratado devidamente pelos oradores que tem feito uso da palavra.
Só quero dizer à Câmara que tenho visto nas localidades da província onde se tem mandado fazer serviço a Guarda Republicana, bandos de cincoenta e sessenta vadios fugirem diante dos soldados. Reconheço, pois, toda a necessidade do projecto.
Julgo conveniente estender a Guarda Republicana a todo o país, e posso informar a Câmara de que muitos lavradores estão prontos a pagar as despesas com a manutenção da Guarda Republicana, pois tem experimentado o bom serviço que dois ou três soldados prestam em volta das suas propriedades.
Lamento que alguém queira dificultar a aprovação dêste projecto, visto que a instituição da Guarda Republicana só vem beneficiar o país.
Por todas estas razoes dou o meu voto ao projecto e espero que a Câmara o aprove.
Tenho dito.
S. Exa. não reviu.
O Sr. Macedo Pinto: - Sr. Presidente: continuarei com a minha opinião.
Os lavradores do norte são mais pobres e por isso precisam mais da Guarda Republicana que os do sul.
Muitas vezes ficam com as plantações destruídas.
Eu entendo que a Guarda Republicana tem de ser organizada em todo o país, e não apenas em determinadas regiões.
A Guarda Republicana é uma instituição tão necessária no norte como no sul do país.
Tem-se levantado no país uma corrente que é necessário desfazer: é a corrente da diferença entre o norte e o sul.
Não deve haver uma tal distinção.
O Sr. José Montez (interrompendo): - Porque é que V. Exa. não apresenta um projecto de lei criando a Guarda Republicana no norte do país?
O Sr. Vitorino Godinno: - Uma parte da Guarda Republicana de Lisboa está destacada em Setúbal e Santarém.
O Orador: - Mas se existem destacamentos nessas regiões, não se compreende que não existam, tambêm, no norte do país.
O Sr. Vitorino Godinho: - Mas eu estou de acordo com S. Exa.
O Sr. Morais Rosa: - Se é uma medida económica, criem-se para todo o país destacamentos da Guarda Republicana.
O Orador: - O que eu não quero é que se faça dife-
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renças entre o norte e o sul do país. Eu sou Deputado da Nação, não sou Deputado regional.
Porque é que não criam a Guarda Republicana para todo o país? É porque não há dinheiro? Então há dinheiro para o sul e não há para o norte?!
S. Exa. não reviu.
O Sr. Ministro do Interior (Silvestre Falcão): - Sr. Presidente: evidentemente não é possível organizar, desde já, a Guarda Nacional Republicana e espalhá-la por todo o país. Mas há um facto que não posso deixar de frisar á Câmara, qual é o de estarem distribuídas forcas da Guarda Republicana de Lisboa pelas cidades de Setúbal e Santarém, o que fica caríssimo Como a Câmara sabe, não se destacam fôrças dessa Guarda sem se lhes dar uma gratificação.
Nestas condições, desde que não se pode organizar a Guarda Republicana em todo o país, vai-se organizando pouco a pouco.
A Guarda Republicana é destinada à manutenção da ordem pública e o exército para a defesa da Pátria.
Tenho dito.
S. Exa. não reviu.
O Sr. Paiva Gomes: - Sr. Presidente: a Guarda Nacional Republicana é duma necessidade inadiável, reconhecida por todos para garantir a vida e a pró priedade do cidadão. Argumenta-se que não se pode organizar imediatamente a Guarda Republicana em todo o país e que se vai organizando por parcelas, começando pelo sul.
Diz-se que as necessidades no distrito de Castelo Branco são mais urgentes em virtude do regime da propriedade naquela região; diz-se que a propriedade está bem dividida no norte e que está ali menos sujeita à acção dos ratoneiros que se locupletam com o rendimento dos outros; mas a verdade é que no norte há ratoneiros como no sul, e se no norte a sua acção se faz sentir menos é porque êles distribuem a sua actividade por maior número de freguesias.
A criação da Guarda Republicana nos distritos indicados no projecto representa um privilégio dalgumas regiões em detrimento doutras regiões do país.
É preciso organizar a Guarda Republicana em todo o país, - tanto mais que a lei de 4 de Maio vai pedir sacrifícios a todos os proprietários do país e não só a alguns.
S. Exa. não reviu.
O Sr. Jorge Nunes: - Não esperava que se levantasse tanta animosidade contra o projecto.
O facto dele vir beneficiar distritos do sul não é motivo para se atacar o projecto, porque os lavradores do sul, quando se votaram as providências em favor do Douro não se mostraram desgostosos por isso.
Não há dúvida alguma de que a Guarda Republicana, como há pouco disse, deve ser distribuída por todo o país; mas essa distribuição não se pode fazer já, porque as condições do Tesouro não o permitem. Pergunta-se, por que razão é que estando as finanças em mau estado, essas fôrças vão ser destinadas para Setúbal, Santarém e Castelo Branco? E que, como muito bem disse o Sr. Ministro do Interior, a criação da Guarda não se justifica, somente, pela satisfação de uma necessidade regional, mas como uma economia a realizar, porquanto, criada a Guarda no sul e no centro do país custará muito menos dinheiro à Nação do que custam as fôrças que actualmente por lá se encontram alem do inconveniente do desvio da Guarda Republicana, pertencente á guarnição de Lisboa.
O Sr. Paiva Gomes: - São ocasionais.
O Orador: - São ocasionais desde 5 de Outubro, e ainda ninguêm pode pensar quando essa anormalidade termina. No emtanlo, os meses passam e os encargos são cada vez maiores para o Estado. V. Exa. se for a Setúbal há-de encontrar fôrças numerosas de cavalaria da Guarda Republicana; e, como isso ainda não basta, está tambêm ali uma fôrça de cavalaria 5, não para defender o país dos invasores,' mas para a manutenção da ordem pública.
Assim, as praças que deveriam estar em Lisboa, que não tem outra missão senão a defesa do país, estão ali a desprestigiar-se, porque não podem satisfazer ao mesmo fim para que foi criada a Guarda Republicana.
O policiamento pelas fôrças regulares é mal feito, menos por culpa do soldado do que pela dos regulamentos.
Além disso o policiamento realizado pelas tropas regulares faz-se em detrimento dos interesses públicos, porque a fôrça da Guarda Republicana, em muito menor número, realiza um resultado muito superior.
Há uma freguesia do concelho de Alcácer do Sal, que se estivesse situada no norte, seria um distrito, com exagero e tudo, pois tem mais de sete léguas de extensão, em que não há um só polícia, nem tem caminhos de ferro, e apenas uma estrada, que está distanciada de Lisboa, sede do concelho, de muitas léguas. Êste ano os proprietários dali pediram ao comandante da Guarda Republicana que lhe dispensasse cinco soldados de cavalaria, comprometendo-se êles a pagar todas as despesas. Estão satisfeitos com êles, e todos os meses vem reiterar o pedido, e querem a fôrça ali mantida. Vê se que esta despesa é compensadora ; bastou essa fôrça, pouco numerosa, para que houvesse o respeito pela propriedade alheia.
Disse, ainda agora, o Sr. Paiva Gomes que esta Guarda Republicana ia para o sul, principalmente para defender aqueles grandes proprietários que se viam forcados a dar esmolas de 300$000 réis. Está S. Exa. enganado. O que chama homem rico não é fôrçado a essa esmola, porque em regra não vive no campo e, como o malfeitor vive apenas nos campos, a maior vítima é o pobre, que não pode abandonar a terra que cultiva, que não tem condições de vida para morar em povoações grandes. O argumento de que a Guarda não podendo ser organizada dum jacto, não deve ser organizada parcialmente, não pode colher, pois pela mesma ordem de razoes, amanhã quando viessem pedir para se construir uma estrada, eu como Deputado da Nação, deveria opor-me à construção dessa estrada, ainda que ela fôsse necessária, invocando o mesmo argumento: ou se construíam estradas em todo o país, ou não se autorizava a construção duma só.
S. Exa. não reviu.
O Sr. Barros Queiroz (por parte da comissão de finanças): - Sr. Presidente: é para mandar para a mesa o parecer da comissão de finanças relativo à proposta de lei apresentada a esta Câmara pelo Sr. Ministro das Finanças, sôbre a isenção de contribuição de renda de casas.
O Sr. Philemon de Almeida (por parte da comissão de negócios estrangeiros e internacionais): - Mando para a mesa o parecer dessa comissão sôbre a proposta de lei n.° 69-A relativa à convenção assinada em 1 de Janeiro de 1912 entre Portugal e a Bélgica.
Foi a imprimir.
O Sr. Gastão Rodrigues: - Sr. Presidente: a aprovação do presente projecto redunda não só em benefício dos lavradores, mas do próprio povo. Todos sabem que em vários concelhos do sul do Tejo se está constantemente resussitar fôrças para manter a ordem pertur-
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bada por poderosos elementos agitadores. Por êste motivo a criação da Guarda Nacional é dum grande alcance.
Na região de Setúbal a criação da Guarda Republicana não representa nenhum privilégio.
Satisfaz, apenas, uma grande necessidade de vigilância e manutenção da ordem pública, pois que é raro o concelho desta região que não tem imensa população, mais de 8:000 habitantes e alem duma população flutuante tambêm enorme, que deriva, principalmente aos domingos, para os concelhos de Almada, Barreiro e Seixal.
O Sr. Paiva Gomes: - E as regiões do norte?
O Orador: - Não tem absolutamente nenhuma comparação com estas, porquanto não são frequentadas por agitadores, nem são aí tam frequentes as greves e alterações de ordem pública, como os últimos acontecimentos tem comprovado.
Demais, a Guarda Nacional Republicana já foi criada em Beja, no Alentejo, e em outros distritos; não é, portanto, para admirações que essa Guarda seja criada tambêm na região de Setúbal. De resto, as fôrças da Guarda Republicana, que vão sendo sucessivamente distribuídas, já chegam a Castelo Branco e dentro em breve atingirão o norte do país, conforme os recursos do Tesouro o permitam e onde de maior urgência se comprove ser necessária à sua imediata fixação.
Êste projecto não tem por fim proteger o sul em detrimento do norte.
Apresente S. Exa. à deliberação da Câmara um projecto para a fixação de forcas no norte, e certamente que ela não lhe negará a sua aprovação por espírito de parti-pris.
Todas as regiões do país devem merecer igual atenção dos poderes públicos e, porque se torna necessário e urgente a aprovação dêste projecto, não deve a Câmara negar-lha.
S. Exa. não reviu.
O Sr. Lopes da Silva: - Mando para a mesa o seguinte
Requerimento
Requeiro que se dê por discutido o projecto n.° 85, com prejuízo dos inscritos, e se passe à sua votação. = Lopes da Silva.
Foi aprovado.
O Sr. Cunha Macedo: - Requeiro a contraprova.
Procedeu se à contraprova, dando a votação o mesmo resultado.
O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à votação do projecto na generalidade.
Foi aprovado o projecto na generalidade.
O Sr. Macedo Pinto: - Requeiro a contraprova.
Procedeu-se à contraprova, dando a votação o mesmo resultado.
O Sr. Presidente: - Vai discutir se o projecto na especialidade.
Foi lido na mesa e entrou em discussão ao artigo
O Sr. Brito Camacho: - Sr. Presidente: quero explicar á Câmara as razões porque votei o projecto na generalidade.
Como V. Exa. sabe, o decreto de 3 de Maio de 1911, que criou a Guarda Republicana, é da responsabilidade do Govêrno Provisório e principalmente da responsabilidade do Ministro dó Interior do Govêrno Provisório; mas ao tempo já tinha eu lugar no Ministério e, por consequência, sou solidário nessa responsabilidade, cr que explicaria, já, o meu voto, se outras razões mio tivesse para o dar. O Govêrno Provisório teve, desde o princípio da promulgação dêsse decreto, em vista que a organização da Guarda Republicana se estendesse a todo o país, tanto quanto o permitissem os recursos que eram destinados à antiga Guarda Municipal.
Foi isto o que ficou assente pelo Govêrno Provisório, e é isto que me levaria a dar o meu voto ao projecto, e outras razoes não imperassem, para isso, no meu espirito,
orno já disse. Evidentemente seria uma cousa detestável fazer benefícios para o sul do país sem os fazer para o norte; mas não foi êsse o pensamento do autor do projecto. É necessário atender a que desde a proclamação da República, os proprietários do sul tem-se visto assoberbados com as greves.
O Sr. Charula Pessanha: - E no norte os proprietários tem-se visto assoberbados com ladroes!
O Orador: - No sul aã propriedades são assaltadas por maltezes, B e cada maltez, que pede esmola, e um ladrão que rouba o que pode.
Não é possível, de momento, organizar a Guarda Republicana para todo o país; mas ela tem de se ir organizando pouco a pouco, como se puder.
Todos os lavradores tem sido vítimas da falta da organização da Guarda Republicana.
Não se comparam as condições das propriedades no norte, onde a população é muito densa, com as do sul, onde, a miúdo, os gados são roubados e desvastadas as pastagens.
Para se avaliar os prejuízos que os maltezes fazem, bastará dizer que, em minha' casa, e eu sou um pequeno lavrador, tem sido necessário sustentar em média quarenta a cincoenta maltezes.
Todos os lavradores são obrigados a dar comida e agasalho a êsses maltezes.
Depois da criação da Guarda Republicana essa média de quarenta maltezes a que me referi baixou para doze. Sr. Presidente: a criação da Guarda Republicana, nestes dois pontos do país, não representa, simplesmente, uma necessidade de acautelar os campos, mas representa tambêm uma necessidade para se não estar a destacar fôrças da Guarda Republicana, para fora de Lisboa, a fim de se não repetir o que já sucedeu, de estarem em Lisboa apenas cincoenta cavalos dessa Guarda.
O projecto da organização da Guarda Republicana e a sua aplicação fraccionada, como fôsse exigido pelas circunstâncias, foi uma resolução do Govêrno Provisório. O actual projecto, em discussão, não faz senão definir êsse pensamento.
Tenho dito.
S. Exa. não reviu.
O Sr. Presidente: - Como não está mais nenhum Sr. Deputado inscrito, vai ler-se, para ser vetado o artigo 1.°
Foi lido na mesa, para se votar, o artigo 1.°
O Sr. Presidente: - Os Srs. Deputados que aprovam o artigo 1.°, tenham a bondade de se levantar.
Foi aprovado.
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O Sr. Presidente: - Vai ler-se, para entrar em discussão, o artigo 2.°
Foi lido na mesa e entrou em discussão o artigo 2.°
O Sr. Presidente: - Está em discussão.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Visto que nenhum Sr. Deputado pede a palavra vai votar-se. Os Srs. Deputados que aprovam o artigo 2.°, tenham a bondade de se levantar.
Foi aprovado.
O Sr. Presidente: - Vai ler-se, para entrar em discussão, o artigo 3.°, constituído pela proposta de aditamento do Sr. Deputado Jorge Nunes.
Foi lido e entrou em discussão o artigo 3.° Foi aprovado.
O Sr. Presidente: - Está aprovada a proposta do Sr. Jorge Nunes; mas eu desejava que S. Exa. me elucidasse e à Câmara, sôbre se ela diz respeito, somente, à Guarda Republicana que vai ser posta em vigor nos distritos de Santarém e Castelo Branco e nos concelhos de Setúbal e outros ou se se torna extensiva a toda a Guarda Republicana.
O Sr. Jorge Nunes: - A minha proposta é para se tornar extensiva a toda a Guarda Republicana.
O Sr. Presidente: - Vai ler-se, para entrar em discussão, o artigo 4.°, que era o artigo 3.° do projecto.
Foi lido na mesa e entrou em discussão o artigo 4.°
O Sr. Presidente: - Está em discussão.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Visto que ninguêm pede a palavra, vai votar-se. Os Srs. Deputados que aprovam o artigo 4.°, tenham a bondade de se levantar.
Foi aprovado.
Foram, também, aprovados os mapas da composição das companhias e do orçamento das despesas a fazer com a sua instalação e com a sua manutenção.
O Sr. Presidente: - Vai entrar em discussão o parecer da comissão de finanças sôbre a proposta mandada para a mesa pelo Sr. Ministro das Finanças e para a qual S. Exa. pediu a urgência.
Vai ler-se.
Foi lido na mesa. É o seguinte:
Senhores: - A comissão de finanças, examinando o projecto de lei n.° 97-A, é de parecer que êle merece a vossa aprovação, salvo pelo que diz respeito às isenções propostas para as terras de 7.ª e 8.ª ordem, para as quais entende dever-se aplicar o que se propôs para as de 5.ª e 6.ª ordem.
Assim, tem a vossa comissão de finanças a honra de propor que as isenções fiquem estabelecidas pelo seguinte modo:
Nas terras de 3.ª ordem a 60$000 réis.
Nas terras de 4.ª ordem a 45$000 réis.
Nas terras de categoria inferior às de 4.ª ordem a 30$000 réis.
Sala da comissão, 26 de Fevereiro de 1912. = Inocêncio Camacho Rodrigues = José Barbosa = Âlvaro de Castro = Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães = Tomé José de Barros Queiroz.
O Sr. Ministro das Finanças (Sidónio Paes): - Sr. Presidente: as isenções propostas pela comissão de finanças parecem-me um pouco exageradas, porque nas terras de sétima e oitava ordem são poucas as casas que pagam renda superior a 80$000 réis, - e daí resulta a anulação completa da contribuição de renda de casas nessas terras.
Por isso proponho a diminuição dessa taxa apresentando a seguinte
Proposta
Proponho a seguinte emenda: "que nas isenções para as terras de sétima e oitava ordem seja elevada a renda inferior a 24$000 réis". = Sidónio Paes.
Foi admitida.
O Sr. França Borges: - Sr. Presidente: folgo com a apresentação da proposta do Sr. Ministro das Finanças e com o parecer da respectiva comissão, porque êle representa, neste momento, uma necessidade para a República.
Tem-se encontrado especulações de toda a espécie - e uma delas é a dos supostos aumentos de contribuição.
Não havia razão para se levantar uma grande celeuma no país contra a contribuição de renda de casas; mas, desde que essas especulações se levantam, o Sr. Ministro das Finanças fez muito bem em tirar as armas aos especuladores.
Lamento que um projecto que apresentei à Câmara, quando interpelei o Sr. Ministro das Finanças sôbre êste assunto não tivesse até hoje parecer da comissão, porque êle ia, dalguma maneira, obviar ás justíssimas reclamações que se fizeram por motivo do lançamento da contribuição de renda de casas.
Por isso, aproveito a ocasião para mandar para a mesa a seguinte
Proposta de aditamento
Artigo... A contribuição de renda de casas do ano de 1912 incide sôbre a renda dos prédios ou habitações designadas no respectivo contracto de arrendamento, ainda que essa renda seja inferior ao rendimento colectável exarado na matriz da contribuição predial, podendo, porêm, as secretarias de finanças proceder a averiguações e avaliações quando suspeitem da verdade dos referidos contractos" = António França Borges.
O motivo desta emenda é fácil de compreender.
Os inquilinos foram obrigados a fazer os contractos de arrendamento; todavia, a contribuição, quando o rendimento é maior, aumenta, - e está o contribuinte a pagar uma contribuição por uma renda que não paga.
O Sr. Ministro das Finanças, quando eu fiz a interpelação, proferiu algumas palavras pelas quais conclui que concordava que, realmente, o mal carecia de remédio.
Felicito S. Exa. por ter trazido ao Parlamento êste projecto.
A Câmara certamente o aprovará, dando assim uma prova de que se interessa pela justa causa dos contribuintes.
Tenho dito.
S. Exa. não reviu.
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26 DIÁRIO DA CAMARA DOS DEPUTADOS
O Sr. Brandão de Vasconcelos: - Concordo com a proposta do Sr. França Borges; mas devo referir me a um ponto tratado pelo Sr. Ministro das Finanças.
S. Exa. disse que há discordância entre o projecto que apresentou e o parecer da comissão.
O Sr. Ministro das Finanças eleva á verba de 24$000 réis a isenção para as terras de sétima e oitava ordens, e a comissão é de parecer que as isenções vão, nas terras de terceira ordem, a 60$000 réis; nas de quarta ordem, a 45$000 réis; e nas de quinta e sexta ordens a 30$000 réis.
O Sr. Ministro das Finanças (Sidónio Paes): - Todas as sedes de concelhos tem isenções até 30$000 réis.
O Orador: - O Sr. Ministro das Finanças joga com elementos que eu não tenho.
O que posso apresentar é para regiões de que tenho conhecimento.
Há muitas rendas a 1$500 réis por mês; mas há uma grande parte superior a 1$500 réis.
É possível que isto represente uma discordância.
Portanto, inclino-me para a proposta da comissão ds finanças.
S. Exa. não reviu.
Foi aprovado o projecto na generalidade.
Entrou em discussão na especialidade.
Fui lido na mesa e entrou em discussão o artigo 1.°
O Sr. João Luís Ricardo: - Pedi a palavra para apoiar a proposta que o Sr. Ministro das Finanças acaba de apresentar.
A isenção proposta pela comissão de finanças nas terras de sétima e oitava ordens é, realmente, quási a anulação completa da contribuição de renda de casas, ao passo que sendo de 18$000 réis o limite é baixo.
Concordo com o limite de 24$000 réis, proposto pelo Sr. Ministro das Finanças.
Tenho dito
S. Exa. não reviu.
O Sr. Barros Queiroz (por parte da comissão de finanças): - Sr. Presidente: pedi a palavra para declarar, em nome da comissão de finanças, que estou perfeitamente de acordo com a proposta do Sr. Ministro das Finanças, para que nas terras de 7 d e 8,a ordem seja de 24$000 réis o limite para a contribuição de renda de casas.
A comissão não estava de acordo com a proposta que fixava essa isenção em 18$000 réis, porque lhe pareceu que esta importância era insuficiente para atingir o fim que se tinha em vista.
Efectivamente à comissão pareceu-lhe, e parece-lhe ainda, que uma casa que paga, apenas, 1$500 réis por mês, em qualquer parte do país, deve ser miserável, e não deve ser tributada de modo algum; por isso propunha a sua elevação a 30$900 réis; mas o Sr. Ministro das Finanças, falando comigo, entendeu fazer a sua proposta elevando a sua proposta primitiva a 24$000 réis. A comissão aceita a emenda, acha-a boa e entende que a Câmara a deve, votar, porque estabelece o justo equilíbrio entre as terras de 7.ª e 8.ª ordem e as de 5.ª e 6.ª ordem.
S. Exa. não reviu.
O Sr. Afonso Ferreira: - Eu tinha pedido a palavra para declarar que não concordava com o parecer da comissão de finanças, em relação às terras de 7.ª e 8.ª ordem, e por esta razão : porque dando-se com essas terras mesma isenção que fica estabelecida na proposta para as terras de categoria inferior, resultava que nas aldeias mais ninguêm, absolutamente, pagava contribuição de renda de casas. E, direi mais, mesmo pela proposta do Sr. Ministro, elevando de 18$000 a 24$000 réis, ainda assim muito poucos pagarão contribuição de renda de casas, o que não é justo, porque há muitas aldeias onde proprietários com bens, vivendo bem, habitando boas casas, não vem a pagar contribuição de renda de casas, nas terras que são sedes de concelhos, como Alcobaça outras, onde operários habitam em casas muito inferiores, mas de renda muito superior às das aldeias e vivem mais precariamente do que muitos proprietários das aldeias, ficam sujeitos a pagar colectas com que não podem. Não concordava com a proposta da comissão, e tambêm não concordo com a proposta do Sr. Ministro; entendo que os 18$000 réis estavam muito bem, e já atingiam muita gente.
S. Exa. não reviu.
Foi aprovada a proposta do Sr. Deputado Sidónio Paes.
Foi aprovado o artigo 1.°
Foi aprovado o artigo 2.°
Foi lido na mesa e entrou em discussão o artigo 3 °
Foi admitida e entrou em discussão a proposta do Sr. Deputado Franca Borges.
O Sr. França Borges: - Eu só queria perguntar se o Sr. Ministro das Finanças concorda com a minha proposta, e se a comissão de finanças tambêm concorda com Ia. Desejava que a comissão e o Sr Ministro se pronunciassem, exactamente para que a Câmara se pudesse orientar:
O Sr. Ministro das Finanças (Sidónio Paes): - Não vejo dificuldade em aceitar a proposta do Sr. França Borges, desde que as secretarias de finanças se possam devidamente informar da veracidade das declarações.
O Sr. Barros Queiroz: - Sr. Presidente: é simplesmente para declarar, em nome da comissão de finanças, que, em princípio, estou de acordo com a emenda apresentada pelo Sr. Deputado França Borges.
Realmente a comissão de finanças entende que a contribuição deve incidir sôbre o arrendamento, isto é, sôbre a renda exarada nos contractos de arrendamento; mas entende, tambêm, que não é êste o momento oportuno para se discutir o assunto, porque isso depende da revisão do decreto que alterou a contribuição de renda de casas e da lei de 4 de Maio sôbre a contribuição predial. Só quando estas forem revistas é que haverá ocasião de discutir o caso.
S. Exa. não reviu.
O Sr. Jorge Nunes: - Pedi a palavra, apenas, para fazer uma observação sôbre a proposta do Sr. Deputado França Borges. Afigura-se-me, realmente, de toda a justiça que se consigne na matriz o valor que é objecto da declaração, porquanto, a meu ver, a lei do inquilinato, na província, não foi mais que uma revisão de matrizes prediais urbanas.
Em princípio eu aceito a proposta; mas lamento que ela não se torne extensiva ao artigo 2.° da lei de 4 de Maio, que diz respeito à propriedade rústica.
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SESSÃO N.° 58 DE 2G DE FEVEREIRO DE 1912 27
Não sei porque motivo há de ter mais simpatia um proprietário que possua um prédio do que um que possua uma fazenda.
Eu desejava ouvir a opinião do Sr. Deputado Tomé de Barros Queiroz, quando se tratar da lei de 4 de Maio, sôbre se é necessário mandar proceder a uma inspecção directa para se conhecer a má fé de certos inquilinos.
Tenho dito.
S. Exa. não reviu.
O Sr. França Borges: - Sr. Presidente: pedi a palavra para dar um esclarecimento à Câmara sôbre a minha proposta.
Eu posso citar exemplos de haver prédios em Lisboa que estão na matriz por 200$000 réis e tem rendas inferiores a 150$000 réis.
Em Lisboa houve declarações exactas, como eu sei que foram as da generalidade.
Na província não sucedeu assim, porque lá foi muito maior a má vontade.
Eu não posso ver o inconveniente apresentado pelo Sr. Barros Queiroz, pois que a disposição era apenas transitória. É necessário que a contribuição a lançar seja em harmonia com a renda que está nos arrendamentos.
Mas é claro, aceito a indicação do Sr. Ministro das Finanças.
S. Exa. não reviu.
O Sr. Pimenta de Aguiar: - Requeiro que se prorrogue a sessão até se votar o assunto em discussão.
O Sr. Pereira Vitorino: - Requeiro a contagem dos Srs. Deputados presentes.
Procedeu-se à contagem.
O Sr. Pereira Vitorino: - Desisto do meu requerimento.
O Sr. Presidente: - Os Srs. Deputados que aprovam a prorrogação da sessão, até se votar o assunto em discussão, tenham a bondade de se levantar.
Foi aprovado.
O Sr. Presidente: - Está esgotada a inscrição. Vai ler-se, para se votar, a proposta de aditamento do Sr. Deputado França Borges.
Foi lida na mesa.
O Sr. Ministro das Finanças (Sidónio Paes): - Desejava que ficasse bem expresso na proposta do Sr. Deputado França Borges que a alteração sôbre a maneira de fixar a matriz, se refere, apenas à contribuição que ainda não está lançada, isto é, à do ano de 1912.
O Sr. França Borges: - É claro que se não podia dar à proposta um efeito retroactivo. Concordo com o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Presidente: - Os Srs. Deputados que aprovam a proposta do Sr. Deputado França Borges, tenham a bondade de se levantar.
Foi aprovada a proposta de aditamento do Sr. Deputado França Borges, com a modificação indicada pelo Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Presidente: - Como e uma cousa urgente, eu submeto a aprovação da Câmara a última redacção do projecto de lei n.° 97, autorizando o Govêrno a decretar a importação do centeio ou milho, com redução de direitos, quando se mostre que no país não existe quantidade bastante dêsses cereais para satisfazer as necessidades de consumo.
Vai ler-se.
Foi lida na mesa.
O Sr. Presidente: - Os Srs. Deputados que aprovam esta última redacção, tenham a bondade de se levantar.
Foi aprovada.
O Sr. Matos Cid (Antes de se encerrar a sessão): - Sr. Presidente: pedi a palavra para formular uma pergunta ao Sr. Ministro do Fomento, sôbre o que há a respeito da nomeação dum tesoureiro para os caminhos de ferro do Minho e Douro, que, segundo dizem os jornais, não tem habilitações para exercer êsse lugar e tem sofrido diferentes castigos por faltas cometidas. Pergunto ao Sr. Ministro do Fomento o que há de verdade nessa informação.
O Sr Ministro do Fomento (Estêvão de Vasconcelos): - Sr. Presidente: ainda bem que o Sr. Matos Cid vem aqui levantar esta questão, para eu poder esclarecer, por uma forma positiva e peremptória, que não fiz uma nomeação ilegal, ou que pudesse ter o carácter de ilegalidade e imoralidade.
Sr. Presidente : eu tenho-me revestido da maior serenidade durante a minha gerência como Ministro, para não levantar dificuldades aos trabalhos parlamentares e à obra da consolidação da República; mas neste momento preciso de falar um pouco alto, ou pelo menos suficientemente alto, para que todos saibam que sou absolutamente incapaz de praticar qualquer imoralidade, para favorecer uma determinada pessoa. (Apoiados).
A nomeação dum tesoureiro pagador para os Caminhos do Ferro do Minho e Douro é absolutamente legal, porque é ao Ministro do Fomento que compete fazer essas nomeações. (Apoiados). Mas essa nomeação podia ser legal e, ao mesmo tempo, imoral, se porventura, eu tivesse nomeado, como disseram alguns jornais, um indivíduo que não possuísse as habilitações necessárias e que tivesse sofrido quaisquer castigos. Essa acusação é absolutamente falsa, é retintamente falsa, é completamente falsa! (Apoiados).
Eu nomeei quem podia e devia nomear, dentro da lei, e da Repartição competente do meu Ministério, não me foi fornecida como dizem tambêm alguns jornais, a informação de que êsse indivíduo não tinha habilitações e havia sofrido quaisquer castigos.
E para que ninguêm duvide da honradez das minhas palavras, vou ler à Câmara a seguinte declaração do chefe da Repartição, que desfaz, por completo, a calúnia publicada nesse jornal.
"O abaixo assinado, António Ramalho Ortigão Peres, sub-chefe da 9.ª Repartição da Direcção Geral da Contabilidade Pública, actualmente dirigindo a mesma Repartição, no impedimento, por doença, do respectivo chefe, declara não ser exacto ter dito a S. Exa. o Sr. Ministro do Fomento que o funcionário ultimamente nomeado tesoureiro dos Caminhos de Ferro do Minho e Douro não tinha habilitações, e havia sido repreendido por várias vezes. E não disse, porque teria de faltar à verdade, em relação ao primeiro caso, porque o referido empregado, sendo pagador do quadro privativo do Ministério do Fomento, possui as habilitações legais para o desempenho do
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referido cargo; e sôbre o segundo caso, porque nesta Repartição não consta que o mencionado exactor haja sido repreendido, nem qualquer queixa contra a forma como tem desempenhado as funções do seu cargo.
Lisboa, 26 de Fevereiro de 1912 .= António Ramalho Ortigão Peres".
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem.
S. Exa. não reviu.
O Sr. Presidente: - A próxima sessão é amanhã às 14 e meia horas.
A ordem do dia é a seguinte:
Projecto de lei n.° 74, organizando o Código Administrativo.
Pertence ao projecto, de lei n.° 40, modificando os preceitos estabelecidos pela lei de 4 de Maio de 1911 para as avaliações da propriedade rústica e urbana.
Projecto de lei n.° 76, equiparando às mercadorias do continente e ilhas adjacentes, para os efeitos do regime estabelecido no n.° 1.° do § 1.° do artigo 1.° das instruções preliminares das pautas de Moçambique de 29 de Dezembro de 1892, as mercadorias produzidas em outras províncias ultramarinas.
Está levantada a sessão.
Eram 19 horas e 5 minutos.
O REDACTOR = Melo Barreto.