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REPÚBLICA PORTUGUESA

DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS

119.ª SESSÃO

EM 25 DE MAIO DE 1912

SUMÁRIO. - Abre-se a sessão. - Lê-se e aprova-se a acta.- Faz-se segunda leitura dum projecto de lei sôbre o regime autónomo do Arsenal do Exército. - O Sr. Deputado Caetano Gonçalves manda para a mesa um parecer, que foi mandado imprimir. - A requerimento do Sr. Deputado Bissaia Barreto entra em discussão, e é aprovado, um projecto de lei referente ao curso de higiene sanitária. É dispensada a última redacção dêste projecto. - Requerem documentos os Srs. Deputados Ezequiel de Campos e Carvalho de Araújo.- Anunciam interpelações os Srs. Deputados Carvalho de Araújo e Tomás da Fonseca.

Primeira parte da ordem do dia. - Continua a discussão, na especialidade, do projecto do Código Administrativo, usando da palavra, e apresentando propostas, os Srs. Deputados Brito Camacho, Bissaia Barreto, Silva Ramos, Alexandre de Barros, João Luís Ricardo, António José de Almeida, Dias da Silva, Jacinto Nunes, Brandão de Vasconcelos e Tiago Sales, sendo aprovada parte dum requerimento do Sr. Deputado Pires de Campos, para que se considere discutida a questão dos médicos municipais, sem prejuízo dos oradores inscritos. Fica esgotada essa inscrição.

Segunda parte da ordem do dia. - Continuam a discutir-se conjuntamente os projectos n.ºs 111 e 159 (colonização em Angola), fazendo uso da palavra os Srs. Deputados Lopes da Silva, Carvalho de Araújo e Francisco Herédia (Ribeira Brava).

Antes de encerrar a sessão. - É dada a palavra aos Srs. Deputados Afonso Pala, sôbre as estações rádio-telegráficas; Manuel Bravo, sôbre as interpelações por S. Exa. anunciadas; e João Gonçalves, sôbre a eleição da comissão de prédios rústicos no concelho de Alenquer e quantias em dívida a comerciantes de Vila Franca de Xira - Encerra-se a sessão as 18 horas e 50 minutos, marcando-se a imediata para 27 do corrente.

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2 DIÁRIO DA CAMARA DOS DEPUTADOS

Presidência do Exmo. Sr. Tomé José de Barros Queiroz

Secretários os Exmos. Srs.

Baltasar de Almeida Teixeira
Francisco José Pereira

Abertura - Às 14 horas e 5 minutos.

Presentes à chamada - 81 Srs. Deputados.

São os seguintes: Adriano Gomes Ferreira Pimenta, Adriano Mendes de Vasconcelos, Afonso Ferreira, Alberto de Moura Pinto, Albino Pimenta de Aguiar, Alexandre Augusto de Barros, Alfredo Balduíno de Seabra Júnior, Alfredo Djalme Martins de Azevedo, Alfredo Guilherme Howell, Alfredo Maria Ladeira, Álvaro Nunes Ribeiro, Álvaro Poppe, Amílcar da Silva Ramada Curto, António Albino Carvalho Mourão, António Amorim de Carvalho, António Augusto Pereira Cabral, António Barroso Pereira Vitorino, António Caetano Celorico Gil, António França Borges, António Joaquim Granjo, António José Lourinho, António Mana de Azevedo Machado Santos, António Maria da Cunha Marques da Costa, António Valente de Almeida, Augusto José Vieira, Aureliano de Mira Fernandes, Baltasar de Almeida Teixeira, Caetano Francisco Cláudio Eugénio Gonçalves, Carlos Amaro de Miranda e Silva, Carlos Olavo Correia de Azevedo, Eduardo de Almeida, Ernesto Carneiro Franco, Ezequiel de Campos, Fernando Baeta Bissaia Barreto Rosa, Fernando da Cunha Macedo, Francisco Correia Herédia (Ribeira Brava), Francisco José Pereira, Francisco de Sales Ramos da Costa, Gastão Rafael Rodrigues, Gaudêncio Pires de Campos, Germano Lopes Martins, Henrique José Caldeira Queiroz, Henrique José dos Santos Cardoso, João Barreira, João Camilo Rodrigues, João Carlos Nunes da Palma, João Duarte de Meneses, João Gonçalves, João Luís Ricardo, João Machado Ferreira Brandão, Joaquim Brandão, Joaquim José Cerqueira da Rocha, Joaquim Ribeiro de Carvalho, Jorge Frederico Velez Carolo, José Afonso Pala, José António Simões Raposo Júnior, José Augusto Simas Machado, José de Barros Mendes de Abreu, José Botelho de Carvalho Araújo, José Dias da Silva, José Francisco Coelho, José Jacinto Nunes, José Miguel Lamartine Prazeres da Costa, José Montez, José Pereira da Costa Basto, Jovino Francisco Gouveia Pinto, Júlio do Patrocínio Martins, Luís Augusto Pinto de Mesquita Carvalho, Manuel Alegre, Manuel de Brito Camacho, Manuel Pires Vaz Bravo Júnior, Miguel de Abreu, Miguel Augusto Alves Ferreira, Pedro Alfredo de Morais Rosa, Pedro Januário do Vale Sá Pereira, Philemon da Silveira Duarte de Almeida, Rodrigo Fernandes Fontinha, Tomé José de Barros Queiroz, Tiago Moreira Sales, Vítor José de Deus Macedo Pinto e Vitorino Henriques Godinho.

Entraram durante a sessão os Srs.: Alberto Souto, Alexandre Braga, Alexandre José Botelho de Vasconcelos e Sá, Alfredo Rodrigues Gaspar, Américo Olavo de Azevedo, António Brandão de Vasconcelos, António Joaquim Ferreira da Fonseca, António José de Almeida, António Maria Malva do Vale, António Pádua Correia, António de Paiva Gomes, António Pires Pereira Júnior, António da Silva Gouveia, Aquiles Gonçalves Fernandes, Carlos António Calixto, Carlos Maria Pereira, Casimiro Rodrigues de Sá, Emídio Guilherme Garcia Mendes, Helder Armando dos Santos Ribeiro, Inocêncio Camacho Rodrigues, João Pereira Bastos, Joaquim José de Oliveira, Joaquim Teófilo Braga, José Bernardo Lopes da Silva, José de Freitas Ribeiro, José Maria Cardoso, José Maria Vilhena Barbosa de Magalhães, José Perdigão, José da Silva Ramos, José Tomás da Fonseca, Luís Inocêncio Ramos Pereira, Manuel José da Silva e Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.

Não compareceram à sessão os Srs.: Afonso Augusto da Costa, Álvaro Xavier de Castro, Angelo Rodrigues da Fonseca, Angelo Vaz, António Afonso Garcia da Costa, António Alberto Charula Pessanha, António Aresta Branco, António Cândido de Almeida Leitão, António Flórido da Cunha Toscano, António Maria da Silva, António dos Santos Pousada, Artur Augusto Duarte da Luz Almeida, Carlos Henrique da Silva Maia Pinto, Domingos Leite Pereira, Francisco Cruz, Francisco Luís Tavares, Francisco Xavier Esteves, Guilherme Nunes Godinho, Henrique de Sousa Monteiro, João Carlos Rodrigues de Azevedo, João Fiel Stockler, João José Luís Damas, Joaquim António de Melo Castro Ribeiro, Jorge de Vasconcelos Nunes, José Barbosa, José Bessa de Carvalho, José Carlos da Maia, José Cordeiro Júnior, José Luís dos Santos Moita, José Mendes Cabeçadas Júnior, José Tristão Paes de Figueiredo, José Vale de Matos Cid, Luís Mana Rosette, Manuel Gregório Pestana Júnior, Porfírio Coelho da Fonseca Magalhães, Severiano José da Silva, Sidónio Bernardino Cardoso da Silva Paes, Tito Augusto de Morais e Vítor Hugo de Azevedo Coutinho.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se á chamada.

Procedeu-se à chamada.

O Sr. Presidente: - Responderam á chamada 52 Srs. Deputados.

Está aberta a sessão.

Vai ler-se a acta. Leu-se a acta.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Vai fazer-se a segunda chamada.

Fez-se a chamada.

O Sr. Presidente: - Encontram-se já presentes 81 Srs. Deputados. Está em discussão a acta.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como ninguêm pede a palavra sôbre a acta, vou pô-la á votação.

Foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Vai ler-se o expediente.

Leu-se o seguinte:

EXPEDIENTE

Representações

Da Camará Municipal de Aldeia Galega do Ribatejo, pedindo ã isenção de quaisquer direitos sôbre o material

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SESSÃO N.° 119 DE 20 DE MAIO DE 1912 3

importado do estrangeiro e que se destine ás instalações da iluminação da luz eléctrica.

(Acompanhada dum ofício do Presidente da Câmara).

Para a comissão de faianças.

Ofícios

Do Instituto Superior de Agronomia, enviando, a fim de serem distribuídos pelos Srs. Deputados, 105 exemplares do Catálogo do Jardim Colonial de Lisboa.

Mandou-se distribuir.

Telegramas

Leiria, 24. - Exmo. Presidente Câmara Deputados, Lisboa. - Câmara Municipal Leiria e colectividades civis desta cidade, em reunião de ontem, resolveram instar Parlamento aprovação imediata construção caminho ferro.

O Sr. Presidente: - Vou consultar a Câmara sôbre a admissão à discussão do seguinte projecto de lei já publicado no Diário do Govêrno.

Segundas leituras

Projecto de lei

Segundo a organização do exército, mandada pôr em execução pelo decreto do Govêrno Provisório datado de 25 de Maio de 3911, é o Arsenal do Exército destinado á aquisição, construção e reparação do material de guerra, à sua conservação, fornecimento e fiscalização.

Para o bom e efectivo funcionamento dêste importante estabelecimento é indispensável que aos seus dirigentes se dê a maior liberdade de acção acompanhada da máxima responsabilidade.

Pelo actual sistema de administração é impossível que o Arsenal do Exército possa cumprir o que justa e indispensávelmente lhe é exigido, e por isso urge dar-lhe uma organizarão administrativa mais em harmonia com a razão para cumprir cora o seu fim.

Está sobejamente demonstrado que a autonomia administrativa é a maneira mais prática e eficaz de obter com o mínimo dispêndio de tempo e dinheiro o que se tem em vista.

São exemplos do que acabo de citar: Pôrto de Lisboa, Serviços dos correios e telégrafos. Manutenção militar, Casa da Moeda, Depósito de fardamentos, Caminhos de ferro, que tem provado exuberantemente a sua eficaz vantagem.

Por estas razões tenho a honra de apresentar à consideração da Câmara o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É estabelecido para o Arsenal do Exército um regime administrativo autónomo.

Art. 2.° A Administração do Arsenal do Exército será exercida pelo Director do Arsenal, general que tenha feito a sua carreira na arma de artilharia ou coronel nas mesmas condições, e por quatro conselhos administrativos, sendo um para cada fábrica e o quarto para os depósitos e restantes serviços.

Art. 3.° As receitas do Arsenal do Exército serão constituídas por todas as verbas inscritas no Orçamento Geral do Estado para aquisição de material de guerra, pelas importâncias recebidas doutros Ministérios ou de particulares pelo fornecimento de artigos de qualquer espécie, por verbas extraordinárias e de qualquer proveniência que forem destinadas a material de guerra, e pelo produto da venda de sucatas e de quaisquer artigos que não tenham aplicação para os serviços do mesmo Arsenal.

Art. 4.° As despesas com a aquisição de todos os materiais, com a féria ao pessoal fabril e com os vencimentos do pessoal que fizer serviço no mesmo Arsenal, alêm daquele, serão pagas pelas verbas consignadas no artigo anterior.

Art. 5.° Anualmente a Direcção do Arsenal dará conta circunstanciada dos serviços feitos no estabelecimento A seu cargo directamente ao Ministro da Guerra, a quem está directa e imediatamente subordinada.

Art. 6.° O Govêrno mandará elaborar com a máxima urgência o regulamento para a execução desta lei.

Art. 7.° Fica revogada toda a legislação em contrário. Sala das Sessões da Câmara dos Deputados, 23 de Maio de 1912. = O Deputado, Francisco de Sales Ramos da Costa.

Admitida. Para a comissão de guerra.

O Sr. Caetano Gonçalves (Por parte da comissão de legislação criminal): - Mando para a mesa o seguinte parecer da comissão de legislação criminal.

Por êste projecto compete ao Supremo Tribunal de Justiça a revisão das sentenças condenatórias em todos aqueles casos em que as leis vigentes sujeitam ao julgamento dos tribunais comuns.

Foi mandado imprimir.

O Sr. Bissaia Barreto (Por parte da comissão de instrução superior): - Peço a V. Exa. que consulte a Câmara, sôbre a urgência e dispensa do Regimento para entrar, já, em discussão o projecto de lei respeitante ao curso do higiene sanitária, ao qual o Senado introduziu umas pequenas emendas.

Êsse projecto é absolutamente indispensável que seja aprovado com urgência, visto que, no caso contrário, e irá prejudicar os alunos que concluíram êste ano o curso de medicina.

Foi aprovada a urgência e dispensa do Regimento.

O Sr. Presidente: - Está em discussão na generalidade.

O Sr. Brito Camacho: - Sr. Presidente: acho bem que se vote êste projecte, por que os alunos a quem êle aproveita, a não ser votado, ficariam em condições bastante inferiores em relação aos seus colegas que fizeram o curso de medicina sanitária.

Mas devo, no entanto dizer, que êsse curso de medicina sanitária não serve absolutamente para nada (Apoiados) nos termos em que está actualmente organizado; e, se estivesse presente o Sr. Ministro do interior, eu pediria a S. Exa. que envidasse todos os seus esforços para que não houvesse, mais uma vez, de fazer-se êste curso, nas condições em que vai ser feito, que é uma verdadeira burla.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Presidente: - Vá votar-se na generalidade. Os Srs. Deputados que aprovam êste projecto, na generalidade, tenham a bondade de se levantar.

Foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Vai discutir-se na especialidade. Vai ler-se o artigo 1.º e §§ 1.° e 2.°

Leu-se na mesa.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

Foi aprovado sem discussão.

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4 DIÁRIO DA CAMARA DOS DEPUTADOS

O Sr. Presidente: - Vai ler se o artigo 3.°, aditado pela comissão.

Lê-se na mesa.

Foi aprovado sem discussão.

O Sr. Bissaia Barreto: - Requeiro que seja dispensada a última redacção dêste projecto, para ser enviado imediatamente para o Senado.

Foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à ordem do dia. Os Srs. Deputados que tenham papéis a enviar para a mesa. podem fazê-lo.

Documentos enviados para a mesa

Requerimentos

Para informar projectos de lei que me foram entregues na comissão de obras públicas da Câmara dos Deputados, careço imprescindívelmente da Legislação dos caminhos de ferro, com urgência. = Ezequiel de Campos.

Para a Secretaria.

Mandou-se expedir.

Requeiro que, pelo Ministério do Interior (Direcção Geral de Saúde), me seja fornecida cópia dos documentos apresentados pelos concorrentes ao lugar de guarda mor da Estação de Saúde de Setúbal, concurso que terminou em 28 de Março passado. = O Deputado, José Botelho de Carvalho Araújo.

Para a Secretaria.

Mandou-se expedir.

Notas de interpelação

Desejo interpelar S. Exa. o Ministro da Marinha sôbre portaria publicada em 18 do corrente em que S. Exa. 5 determinou que nas lotações dos navios, onde os aspirantes de 1.ª classe a maquinistas navais sejam mencionados, se faça a seguinte modificação: guardas marinhas-maquinistas, guardas-maririhas, maquinistas condutores ou aspirantes de 1.ª classe a maquinistas. = José Botelho de Carvalho Araújo.

Para a Decretaria.

Mandou-se expedir.

Desejo interpelar o Br. Ministro do Interior acêrca dum telegrama às Escolas Normais emanado da Direcção Geral de Instrução Primaria, telegrama que pretende revogar o decreto de 8 de Julho de 1911.= Tomás da Fonseca.

Para a Secretaria.

Mandou-se expedir.

O Sr. Ministro da Justiça (António Macieira): - Eu desejava dar uns esclarecimentos à Câmara.

O Sr. Presidente: - Se o assunto é urgente, eu consulto a Câmara.

O Sr. Ministro da Justiça (António Macieira): - Não considero de grande urgência o que desejo dizer.

ORDEM DO DIA

Discussão na especialidade, do projecto do Código Administrativo

O Sr. Brito Camacho: - Sr. Presidente: trata-se, se bem me parece, da questão dos partidos médico-municipais. Eu compreendo a razão da discussão apaixonada que se tem feito a respeito dêste capítulo do Código Administrativo, porque êle realmente envolve interesses de grande importância e de toda a ordem, e mal pareceria se êle passasse nesta casa sem a devida discussão.

Sr. Presidente: eu tinha umas emendas a propor, mas creio que algumas delas já foram apresentadas pelo Sr. Silva Ramos. Uma delas diz respeito ao artigo que não tem número, e que é o seguinte:

Leu.

Eu pensei que todas as opiniões se podiam talvez conciliar, não adoptando o artigo como está, mas dando à junta a faculdade de fazer a classificação por grupos, e ficando as Câmaras com a faculdade de escolherem os concorrentes dentro dêsses grupos à sua vontade conforme a indicação que tivessem da junta.

Não sei se esta emenda já foi apresentada, mas se o não foi, eu pedia a qualquer dos membros da comissão para a fazer sua.

Num outro artigo que diz: "Aos facultativos, alem das condições"...

Eu teria acrescentado - e sanitárias.

Esta disposição fica assim mais completa, e não excluí as autoridades sanitárias que para o caso tem importância especial.

O Sr. Jacinto Nunes: - Tem um contra, é que os sub-delegados de saúde impõem as suas ordens e mandam nos médicos municipais como em escravos.

O Orador: - Parece-me que esta disposição não tem o inconveniente que apontou o Sr. Jacinto Nunes, e que, antes pelo contrário, obsta a êsse inconveniente.

No artigo que diz:

"Os conflitos de jurisdição e serviço entre o médico municipal e as entidades administrativas serão resolvidos pelas juntas".

Parece-me que quanto a êste ponto que tambêm já aqui foi versado, que bastará eliminar a palavra "jurisdição" para estarmos todos de acôrdo.

No artigo que diz:

"A câmara municipal tem competência para aplicar as cenas disciplinares até a suspensão por três dias, podendo os interessados, caso não se conformem, recorrer para a junta".

Pareceu-me que esta disposição tinha levantado aqui alguma celeuma, por se tratar de dar às juntas atribuições que muitos lhes negam, como a de poder demitir os médicos, mas talvez fôsse aceitável esta disposição por esta forma.

Leu.

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SESSÃO N.° 119 DE 25 DE MAIO DE 1912 5

Parecia-me que a Câmara teria, na maior parte dos casos, muitas e melhores razões para julgar da justiça com que deve ser dada a demissão ao médico do que própria mente a junta, mas tirávamos à junta a faculdade de se inteirar sôbre essas razões, e informar a Câmara, evitando-se o recurso para o tribunal administrativo.

Parecia-me esta disposição conciliatória.

Esta junta tem-se dito que funciona como tribunal contencioso.

Parece-me que a idea de quem a propôs foi que ela funcionasse como instrumento de conciliação.

O Sr. João Luís Ricardo: - É um tribunal de transição para preparar as causas para o tribunal.

O Sr. Eduardo de Almeida: - O que não pode é ficar com essa redacção.

O Orador: - Assim interpretada esta disposição inserta nesta proposta, e considerando a junta não como instância do contencioso administrativo, mas como tribunal arbitral ou melhor junta de conciliação, para resolver os conflitos entre os médicos e as câmaras, creio que não repugna a ninguêm deixar a junta criada pelo decreto do Govêrno Provisório.

Desejava chamar a atenção dos meus colegas, que são médicos e tambêm dos que são municipalistas, como o Sr. Jacinto Nunes. Eu não me atrevo a fazer proposta, mas suscito apenas esta idea e desejaria que sôbre ela falassem os competentes.

E que conceder às câmaras o direito de estudar documentos scientíficos, classificá-los, e conforme essa classificação escolher os médicos, é evidentemente uma cousa menos regular, porque em geral as câmaras municipais não tem competência para fazer a análise dêsses documentos. Relegar, porem, essa faculdade só para a junta, é tirar ás câmaras umas certas atribuições de ordem material e de ordem moral, de que elas justamente se mostram zelosas.

Tinha eu pensado que talvez se pudesse conciliar tudo da seguinte maneira, e antes de mais nada devo dizer, para os que não saibam, que a organização dos estudos médicos como está habilitará cada uma das faculdades a certificar da competência scientífica dos seus alunos, mas ao insuficientemente os habilitará a julgar da sua competência profissional. O facto dum dado indivíduo ter, por exemplo, 18 valores, e um outro 14 valores, poderá, quando muito, habilitar-nos a dizer que êste tem uma cultura scientífica inferior à daquele, mas de forma nenhuma nos habilita a dizer que o indivíduo que tem 18 valores tem uma competência profissional superior ao que tem 14 valores, porque as médias altas podem ser adquiridas por indivíduos que tendo uma repugnância pela medicina, como arte, não a tem como sciência.

Interrupção do Sr. Bissaia Barreto.

O Orador: - Ora sucede que na reforma decretada pelo Govêrno Provisório êste inconveniente fica um pouco remediado, porque se dá um ano de tirocínio, e aí é que se avalia da competência profissional dos alunos. De modo que pode acontecer que um indivíduo se tenha mostrado distinto na frequência das disciplinas e nos seus respectivos exames, mas afirmando-se depois sem competência profissional.

Ora, Sr. Presidente, eu calculo que, entrando em execução o decreto do Govêrno Provisório sôbre êste assunto, o mal ficará a pouco remediado, porque alem da competência scientífica, que se apura durante os cinco anos de curso, a competência profissional apura-se num ano de tirocínio.

Como a clínica é uma cousa que feita nos hospitais e feita cá fora é diferente, e como só se sabe que um médico tem qualidades profissionais quando exerce a sua profissão, achava bom que o provimento do médico nunca seja definitivo senão ao cabo dum ano de exercício clinico. Isto já se faz no professorado, e eu não vejo nisso inconveniente algum, porque um ano de exercício clínico é bastante para o médico demonstrar os requesitos que tenha, as aptidões que possua para exercer clínica, alêm doutras qualidades de ordem moral.

Isto não pode escandalizar ninguêm, nem vi ninguêm revoltar se contra o Sr. Jacinto Nunes por isso.

Se as qualidades de ordem moral são necessárias a todos, mais o são ao médico. Portanto, se durante, um ano o médico demonstra capacidades de ordem scientifica e de ordem moral, podemos ficar tranquilos.

Não há maneira de criar dificuldades ao médico quando êle tenha influencia junto dos seus amigos; não há maneira alguma de levar um concelho a protestar contra um médico que mostre serviços e competência junto dos seus doentes.

Foi para expor estas observações que eu, na minha qualidade de médico, mais do que na de Deputado, pedi a palavra, apresentando estas alterações ao Código Administrativo se a Câmara entender que elas são justas e adaptáveis.

Vou redigi-las.

O Sr. Bissaia Barreto: - Julga absolutamente indispensável a criação das juntas dos partidos médicos.

A situação dos médicos municipais é indispensável modificar-se, e não pode, a seu ver, admitir-se a situação que o Sr. Deputado Jacinto Nunes lhes pretende dar, porque é uma situação deprimente e vexatória, quer para os médicos, quer para as câmaras municipais.

Êle, orador, quere uma junta como aquela que se contêm no artigo 5.°, da lei de 25 de Maio de 1911, do Govêrno Provisório.

Entende que é necessário ver a questão da assistência, pública do alto, não querendo liquidá-la segundo o critério mesquinho de qualquer vereação municipal.

Os municípios nunca podem estar à altura de profunda? as questões magnas e importantes da assistência médica e sanitária do país; e não serão elas que hão-de dividir o país em várias zonas de assistência.

É à junta que compete fazer a delimitação dos partidos dos concelhos, obrigando os médicos a ir ocupar a sede do ,seu partido; é a junta que deve tornar igualitária, quanto possível, a remuneração dos partidos médicos.

O orador prova em seguida, com dados estatísticos, que há concelhos com poucos médicos, outros com muitos e outros ainda absolutamente sem um único; demonstra que a remuneração que os médicos municipais percebem é insuficiente 5 e prova tambêm qual tem sido a acção perniciosa e deprimente das câmaras municipais sôbre os médicos e à situação desprestigiaste em que êstes se encontram perante os municípios.

Por último, acentua que não é fácil que um aluno possa sair duma escola médica sem competência scientífica ou profissional, visto que o aluno dos últimos anos do seu curso tem os seus trabalhos práticos, onde demonstra a sua perícia e o seu estudo perante os doentes. Termina, enviando para a mesa a seguinte

Proposta

Organizar todos os anos um relatório da morbilidade na sua área, pondo em evidência as suas opiniões pessoais sôbre a etiologia e marcha das doenças e os resultados da terapêutica adoptada.

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Verificar e estado sanitário dos indivíduos sujeitos a revisão médica por terem vindo de localidades infectadas de epidemia. = Bissaia Barreto.

O discurso será publicado na íntegra quando o orador devolver as notas taquigráficas.

Admitida. Para a comissão de redacção.

O Sr. Silva Ramos: - Mando para a mesa as seguintes

Propostas

Acrescentar o seguinte artigo a seguir ao artigo F:

A nomeação será provisória durante o primeiro ano de exercício, tornando se no fim dêste prazo definitivo caso não haja reclamação fundamentada que será julgada pela câmara, ouvido o médico, podendo êste, caso se não conforme, reclamar para a junta. = José da Silva Ramos.

No artigo P no n.° 3.° dar-lhe a seguinte redacção:

Aconselhar a coadjuvar as autoridades administrativas policiais e sanitárias nas questões de salubridade pública e noutras da sua especialidade em harmonia com os regulamentos em vigor. =José da Silva Ramos.

No artigo P, redija-se assim o segundo período:

A suspensão por maior prazo e a demissão serão pronunciadas pela Câmara, precedendo consulta da junta. = José da Silva Ramos.

O Sr. Presidente: - Vão ler-se as propostas do Sr. Silva Ramos.

Leram-se na mesa. Foram admitidas.

O Sr. Presidente: - Vai ler-se a proposta do Sr. Bissaia Barreto.

Leu-se na mesa.

Foi admitida.

O Sr. Alexandre de Barros: - Vai mandar para a mesa uma proposta de substituição de todo o capítulo 3.º, e supõe que ela poderá satisfazer aqueles que defendem, com muita sinceridade, os municípios, e os que defendem, tambêm com muito entusiasmo, a situação dos médicos municipais.

Tem-se feito uma calorosíssima defesa dos médicos, insurgindo-se de modo vivo e violento contra aqueles que defendem as franquias municipais. E na sua qualidad3 de defensor das regalias municipais, quere dizer á Câmara que julga absolutamente indispensável assegurar aos municípios o direito de escolherem libérrimamente todos os seus funcionários.

Alguns municípios tem bastantes razões de queixa dos seus médicos. E assim, há médicos que nunca compareceram no seu concelho, mas que receberam sempre, intangívelmente, os seus honorários. Se tem pois havido má vontade contra os médicos em algumas câmaras municipais, noutras tem havido um favoritismo desmesurado, com o qual sempre os módicos aproveitam.

Terminando, envia para a mesa a seguinte

Proposta de substituição

Proponho que seja assim redigido capitulo III:

Art. 143.° O do projecto.

Art. 144.° O provimento dos partidos pode ser feito por concurso ou escolha entre os médicos formados nas escolas do continente da República.

Art. 145.° As modificações nos serviços ou nos honorários estabelecidos nos contratos ou condições do concurso só podem ser feitos por acôrdo entre as câmaras e os médicos providos.

Art. 146.° Os médicos, farmacêuticos, parteiras e veterinários não podem ausentar-se dos concelhos sem licença das câmaras, excepto sendo a ausência até três dias durante os quais se devem fazer substituir.

Art. 147.° As câmaras tem o direito:

De censurarem, suspenderem ou demitirem os funcionários a que se refere o artigo 143.°, por desleixo ou falta de cumprimento dos serviços a que se obriguem pelo contrato ou concurso e ainda por incompetência moral.

§ 1.° As censuras e as suspensões até oito dias sem vencimento podem ser impostas pelas comissões executivas.

§ 2 ° As suspensões até trinta dias só podem ser decididas pelas vereações nas suas sessões habituais, ou nas que sejam convocadas com quinze dias de antecedência.

§ 3.° As demissões dos médicos só podem ser decididas em reunião conjunta da vereação e das juntas paroquiais do concelho, convocadas com trinta dias de antecedência.

Art. 148.° Das decisões tomadas pelas câmaras ou comissões executivas ou pelas câmaras em reunião com as juntas paroquiais podem os interessados recorrer para o contencioso respectivo. = Alexandre de Barros.

O discurso será publicado na íntegra quando o orador haja devolvido as notas taquigráficas.

O Sr. Pires de Campos: - Requeiro que se dê a matéria por discutida sem prejuízo dos oradores inscritos, e que se não passe à segunda parte da ordem do dia sem estar esgotada a inscrição e votada a matéria.

Posta à votação a primeira parte do requerimento, foi aprovada.

A segunda parte foi igualmente aprovada.

O Sr. João Luís Ricardo: - Vou procurar ser muito breve e por duas razoes: a primeira, porque não quero concorrer para o obstrucionismo prometido pelo S. Jacinto Nunes, e, segunda, porque a questão tem sido largamente debatida e já está suficientemente esclarecida.

Não posso, no emtanto, deixar de protestar contra o facto de se dizer que os médicos municipais tem nesta discussão defendido os seus interesses, porque não é assim.

Ninguém ainda os ouviu pedir melhoramentos materiais. O que êles pedem, sim, e com toda a justiça, é que se regule a sua situação, por forma a não continuarem a ser vítimas dos vexames e perseguições que. no tempo da monarquia, sôbre êles exerciam as câmaras municipais.

Várias são as propostas que sôbre o assunto tem sido apresentadas, mas a que me merece mais simpatias é a do Sr. Brito Camacho, que modificando em parte a proposta do Sr. Silva Ramos, que eu tambêm assinei, concilia, a meu ver, todas as opiniões.

O Sr. Brandão de Vasconcelos manifestou-se contra o concurso por provas documentais; prefere-lhe o de provas práticas, porque, disse S. Exa., o médico pode, depois de completar o curso, não se dedicar ao exercício da clínica, e mais tarde, porque assim lhe convenha, concorrer a um partido municipal, sem ter a competência profissional que só com a prática se adquire.

Êsse inconveniente, a dar-se, está perfeitamente remediado na proposta do Sr. Silva Ramos, modificada pela do

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Sr. Brito Camacho, alem de que, S. Exa. não deve ignorá-lo, os concursos como S. Exa. queria, não dão, praticamente, os resultados que S. Exa. neles vê.

Portanto, vou limitar as minhas considerações.

Defendo a minha proposta e as do meu colega Sr. Silva Ramos, em tudo que elas possam ser aceitáveis, abstraindo da parte que possa ser julgada anti- constitucional.

Era vasto o assunto para responder a todos os oradores que pretenderam defender as regalias municipais, increpando os médicos municipais, que nesta Câmara as defendem, de quererem contrariar essas regalias.

É que a propaganda republicana, feita pelos médicos municipais, no tempo da monarquia, outra cousa não era senão a defesa das regalias municipais.

E agora mesmo, que se discute o Código Administrativo, são ainda os médicos municipais que tem estado na brecha na defesa dessas regalias.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem.

S. Exa. não reviu.

O Sr António José de Almeida: - Embora o assunto esteja suficientemente esclarecido, entra no debate para justificar o decreto de 25 de Maio de 1911, sôbre as juntas médicas do Govêrno Provisório, decreto que tem sido atacado.

Êsse decreto foi publicado para regular as relações entre os médicos e as câmaras municipais, e fui logo repelido pelo Sr. Jacinto Nunes, que mandou ao orador um telegrama fulminante.

Se êsse decreto, da sua responsabilidade, não agradou aos médicos municipais, êle teve, no emtanto, o intuito de procurar obedecer a um espírito de justiça e de verdade, que certamente não atingiu por completo - é o primeiro a reconhecê-lo - e que por isso precisa dalgumas alterações de ordem secundária.

Só depois de estar em execução durante um ano é que se poderá saber a melhor maneira de obviar a alguns inconvenientes.

Toda a sua obra, como Ministro do Interior, foi feita no desejo sincero de ser útil ao País e à República.

Entende que os municípios devem ser autónomos, livres, mas não podem deixar de estar sujeitos á fiscalização do Poder Central. Se a independência dos municípios fôsse tam larga, aconteceria que dentro da Pátria Portuguesa havia apenas uma multidão de pequenas pátrias.

O orador defende a junta médica, como necessária para regular as relações entre médicos e as câmaras municipais. Nessa junta, onde estão representantes dos médicos municipais, podem melhor ser apreciados os diferentes conflitos entre as câmaras e os médicos, especialmente nas questões profissionais, em que os vereadores não são competentes para apreciar o procedimento scientífico do clínico municipal.

O orador cita vários exemplos em que os vereadores se permitem apreciar o procedimento dos módicos, na maneira como exercem a sua clínica, para o que não tem competência alguma.

A função, do médico é cheia de delicadezas intelectuais e morais tão graves, que os seus actos só podem ser julgados por colegas.

O decreto de 25 de Maio de 1911 teve um carácter meramente provisório para regular as questões que existiam entre médicos e as câmaras. Todos os dias recebia queixas dos médicos acêrca das câmaras, e destas contra os médicos. Por isso, procurou fazer justiça, sendo da maior necessidade, tanto mais que o dever do Govêrno Provisório, como Govêrno saído duma revolução, era legislar sôbre os assuntos mais urgentes e importantes, reclamados pela opinião pública.

Manda para a mesa a seguinte

Proposta

Proponho que seja eliminada do Código Administrativo a doutrina relativa a médicos municipais, continuando a vigorar o decreto de 20 de Maio que, a êsse tempo, será sujeito a revisão da Câmara. =O Deputado, António José de Almeida.

O discurso será publicado na íntegra quando o orador restituir as notas taquigráficas.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Joaquim Brandão.

O Sr. Joaquim Brandão: - Desisto da palavra.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. José Dias da Silva.

O Sr. José Dias da Silva: - É para mandar para a mesa duas propostas de aditamento.

São as seguintes

Propostas

Aditamentos:

Artigo 146.°-A. Nos partidos de facultativos municipais só podem ser providos os médicos que já estejam providos em qualquer partido á data do concurso ou os que tenham obtido essa classificação conferida por júri profissional criado por lei.

§ único. Dentre os concorrentes a câmara nomeará livremente o facultativo que reuna as condições legais e na conformidade do programa que houver aprovado.

Artigo 147.°:

1.° A assistir aos enfermos dos hospitais que não possuam rendimentos para sustentar partidos.

Artigo 140.°-A. Ás faltas cometidas pelos funcionários do partido no exercício das suas funções serão punidas disciplinarmente pela advertência, a repreensão, a suspensão de vencimentos e a demissão.

§ único. A comissão executiva da câmara é competente para a aplicação das penas disciplinares de advertência e repreensão. Á de suspensão de vencimentos e a de demissão só em sessão da câmara municipal podem ser impostas, ouvido o arguido e as juntas de paróquia da área do partido e pelo voto de três quartas partes pelo menos dos vereadores que componham a assemblea deliberativa. = José Dias da Silva.

Lidas na mesa, são admitidas.

O Sr. João de Meneses: - Requeiro que se dê a matéria por discutida, com prejuízo dos oradores inscritos.

Vozes: - Não pode ser.

O Sr. Carlos Olavo:-Esse requerimento não pode ser admitido.

O Sr. Jacinto Nunes: - Não pode ser aceito êsse requerimento.

Só termina a discussão, quando se esgotar a inscrição.

O Sr. Simas Machado: - Sr. Presidente: quando eu substituí V. Exa. na Presidência, o Sr. Deputado Ezequiel de Campos apresentou um requerimento para que fôsse julgada a matéria discutida, com prejuízo dos oradores inscritos.

O Sr. Presidente: - Peço a atenção da Câmara.

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8 DIÁRIO DA CAMARA DOS DEPUTADOS

O Sr. Jacinto Nunes: - Se V. Exa. aceita êsse requerimento, eu peço votação nominal.

O Sr. Presidente: - Não posso deixar de submeter à consideração da Câmara o requerimento do Sr. João de Meneses.

O Sr. Jacinto Nunes: - Não pode ser, porque vai de encontro a uma, resolução da Câmara.

São lidas e admitidas as propostas do Sr. Barbosa de Magalhães.

O Sr. Presidente: - Peço a atenção da Câmara. Vai votar-se o requerimento do Sr. João de Menezes.

O Sr. João de Meneses: - Quantos Deputados estão inscritos?

O Sr. Presidente: - Apenas três.

O Sr. João de Meneses: - Retiro o meu requerimento.

Os Srs. Marques da Costa e Mesquita de Carvalho desistem da palavra.

O Sr. Jacinto Nunes: - Em largas considerações, e continuando a sustentar as suas ideas de autonomia municipal, referiu-se principalmente aos Srs. Silva Ramos e Bissaia Barreto pela matéria das suas propostas.

Restringe-se ao projecto e às propostas, pois que não considera em discussão o decreto de 1911; e a respeito dêste responde ao discurso do Sr. António José de Almeida, impugnando.

Como transigência apresentou, mas não chegou a ser lida na mesa, uma proposta que foi retirada.

O discurso será publicado na íntegra quando o orador restituir os notas taquigráficas.

O Sr. Presidente: - Vão ler-se as propostas enviadas para a mesa pelo Sr. António José de Almeida.

Leram-se na mesa.

Foram admitidas.

O Sr. Brandão de Vasconcelos: - Mando para a mesa a seguinte

Proposta

Emenda ao artigo A da minha proposta de artigos novos e parágrafos dos capítulos III e IV do projecto do código:

Proponho que em vez das palavras:

"A classificação dos concorrentes dos partidos municipais será feita de dois em dois anos, etc.".

Se diga:

"A classificação dos concorrentes dos partidos municipais será feita todos os anos, etc.".= Brandão de Vasconcelos.

O Sr. Tiago Sales: - Mando para a mesa a seguinte

Proposta

É condição de preferencia, tambêm no concurso para médicos municipais, a circunstância do candidato ter prestado serviços clínicos mediante qualquer contrato com a Câmara para abrir concurso. = Tiago Sales.

O Sr. Presidente: - Está esgotada a inscrição sôbre esta parte do Código Administrativo. Vão entrar em discussão os projectos de lei n.ºs 111 e 159.

O Sr. Lopes da Silva: - Sr. Presidente: pedi a palavra para fazer uma rectificação ao que se encontra escrito no Sumário das Sessões. Diz-se no Sumário que eu defendi o projecto sôbre a colonização judaica. Não furam essas as minhas palavras, porque eu não considero êste projecto como sendo o elixir que há-de desenvolver o nosso planalto de Benguela; eu disse que o votava, mas de o votar, a defendê-lo, vai uma grande diferença.

Eu não estava na sala quando o Sr. Camilo Rodrigues falou sôbre êste assunto, porque, se estivesse, teria respondido imediatamente a S. Exa. e se respondo agora é porque desejo que nesta discussão se faça justiça.

Assim, se o relato que vem no Sumário das Sessões é verdadeiro, S. Exa. disse o seguinte:

Leu.

Eu já tive ocasião de apresentar nesta Câmara o relatório duma comissão oficial nomeada pelo Govêrno da República, destinada a estudar a forma por que se podia fazer a colonização dos planaltos.

Dessa comissão faziam parte os Srs. Joaquim José Machado, Silva Teles, secretário geral da Sociedade de Geografia, várias outras autoridades oficiais, e o Sr. Camilo Rodrigues.

O Sr. Deputado Camilo Rodrigues, no relatório dessa comissão, não fez declaração alguma que se parecesse com o que veiu dizer à Câmara, o é por isso que eu não posso deixar passar em julgado estas contradições constantes, que dum momento para o outro aparecem nesta casa do Parlamento.

Em 1911 ou 1910, o Sr. Camilo Rodrigues dava o seu voto favorável ao projecto que agora condena, e dava-o apenas com uma restrição, que era sôbre a taxa de foro dos terrenos.

Estabelecia a criação de núcleos de colonização, o estabelecimento de prémios para a cultura do algodão.

Pois, cousa flagrantíssima, quando nesta Câmara, na comissão de colónias, se apresentou um projecto de iniciativa ministerial, estabelecendo prémios para a cultura do algodão, S. Exa., que na comissão que apresentou êsse relatório deu parecer favorável, na comissão de colónias, deu-lhe desfavorável, sem justificar a razão dessa recusa.

É isto que desejo frisar, a fim de que as questões sejam apreciadas com a devida imparcialidade, que se ponham fora da política, que se atenda apenas à questão da ordem pública e da administração.

Interrupção do Sr. Júlio Martins, que não foi ouvida.

O Orador: - É para dizer a V. Exa. que na Câmara estam taquígrafos que tomam nota das nossas declarações e quando por qualquer circunstância o Deputado a quem essas declarações se refiram, se julgue atingido menos lialmente por elas, resta-lhe o direito de exigir responsabilidade da pessoa que as proferiu.

Eu, que desejo ser sempre o mais correcto e respeitador da função parlamentar, jamais pronunciaria uma palavra ofensiva, principalmente na ausência da pessoa a quem se referisse.

Isto foi só para explicar e pôr em foco a contradição flagrante que encontro nas opiniões dos homens públicos, que dum momento para outro variam, sem que se de a explicação dessa variante.

E com o fim honesto de que a questão se esclareça, de

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SESSÃO N.° 119 DE 25 DE MAIO DE 1912 9

que a Câmara pondere bem aquilo que vai fazer, eu peço licença para ler um trecho duma carta que à Sociedade de Geografia foi enviada por um nosso cônsul, e depois de prestarem atenção a êste trecho da carta, que está guardada no arquivo da Sociedade de Geografia, V. Exa., formarão a sua opinião e darão o seu voto segundo a sua consciência.

Leu.

É esta a informação dum funcionário do Estado, que desempenha funções especiais, a informação que entendo conveniente transmitir à Nação Portuguesa, a fim de que êste assunto seja tratado com o cuidado que demanda.

Feita esta declaração, que eu devia apresentar com toda a lialdade, não desejo por forma alguma tomar mais tempo à Câmara.

Declaro que voto o projecto de colonização judaica com as restrições que se devem fazer, e que resolvam os direitos da soberania portuguesa sempre e sempre, e defendo com todo o entusiasmo o projecto de colonização portuguesa com as alterações que seja necessário introduzir-lhe, a fim de que produza o efeito preciso e indispensável a bem dos interesses da República.

Era isto o que precisava dizer, e dou por terminadas as minhas considerações.

Vozes: - Muito bem.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Carvalho de Araújo: - Sr. Presidente: nesta altura do debate e depois de terem usado da palavra os nossos mais distintos coloniais, é até alguns dos mais brilhantes oradores desta Câmara, e quási uma impertinência da minha parte tomar tempo à Câmara, mas os meus ilustres colegas desculpar-me hão essa impertinência e eu tratarei de reduzir o mais possível as minhas considerações, se bem que julgue que assuntos desta importância devem ser largamente debatidos.

Começarei por dizer que dou o meu voto a qualquer dos projectos em discussão, porque qualquer dêles visa a valorizar os nossos planaltos angolenses e, sobretudo, o planalto de Benguela, que pelas suas condições climatéricas, pela natureza do seu solo e sobretudo porque é atravessado pelo caminho de ferro de Lobito a Katanga, está destinado a transformar uma das mais ricas regiões do nosso extenso domínio ultramarino.

Principalmente as terras de Chiaía, Huambo, Bailundo e Bihé, com altitudes entre 1:500 e 2:000 metros, em que as febres palustres são raras, por que o mosquito dificilmente vive em tais altitudes, com um clima em que as temperaturas máximas raras vezes excedem 32° centígrados e as mínimas não descem abaixo de 4° centígrados, com um solo de natureza sílico-argilosa próprio para as culturas cerealíferas, leguminosas, algodão, etc., com águas abundantes, séria um crime deixál-as abandonadas ou entregues ao mais rudimentar critério do indígena, que se limita a arrancar da terra o que ela produz, sem cuidados de espécie alguma, para vender os seus produtos a intermediários brancos, que, em geral, os explorara ignobilmente.

Sr. Presidente: quando o projecto apresentado a esta Câmara pelo Sr. Freitas Ribeiro foi pôsto à discussão, o acolhimento que êle teve da Câmara e a facilidade com que se resolveu reenviá-lo à comissão de colónias, não para o melhorar, mas apenas para demorar a discussão, fez-me supor que tal tentativa não passaria do papel, e que a intenção dos que fizeram encalhar o projecto era condenarem-o à morte inglória das cousas inoportunas e sobretudo das cousas pelintras porque o único argumento aduzido contra o projecto, foi o já célebre argumento dos quatro vinténs, argumento realmente valioso neste país, em que o Estado e os particulares andam a nadar em capitais.

Realmente, não se pode dizer que êste projecto seja perfeito, mas a verdade é que depois de dormir algumas semanas no seio da comissão, volta à Câmara sem modificação de espécie alguma e de tal modo que eu continuo sem entender as razões que levaram os meus ilustres colegas a adiar a sua discussão e aprovação. Com tam peregrina orientação apenas conseguimos perder um ano, porque a melhor época para os trabalhos preliminares e instalação dos colonos é de Maio a Setembro, e não me parece que nesta sessão legislativa tenhamos já tempo de discutir e votar tam importante diploma.

Contudo com esta demora alguma cousa se aproveitou porque, mesmo aqueles que combateram o projecto estão hoje nas melhores disposições e já se arriscam a despender os célebres quatro vinténs, pelo menos para que os nobres e distintos israelitas tenham quem lhes faça as honras da casa, e quem lhes admire as riquezas que êles se dispõem a enterrar no planalto de Benguela só pelos nossos lindos olhos e porque lhes causa profunda tristeza o ver o planalto entregue aos cuidados dos pretos.

O projecto da iniciativa do Sr. Freitas Ribeiro é. na realidade, um projecto que peça pela extraordinária pobreza, mas era perigoso, tratando-se apenas duma experiência, levar isso mais longe, obrigando o país a arriscar capitais importantes que não possui.

A colonização oficial é apenas uma triste e dura necessidade, mas dalguma maneira devemos tratar de promover a colonização livre, e eu não vejo, outro meio que não seja criar núcleos de colonização que sirvam de atractivo aos nossos emigrantes.

Eu bem sei que as tentativas de colonização oficial tem naufragado miseravelmente.

Não há dúvida; mas sei, tambêm, que as condições, em que se fizeram essas tentativas, não ofereciam garantias, desprezando-se em todas elas os mais elementares princípios de colonização.

Sabe-se que nas tentativas de colonização em Mossâmedes se praticaram tais barbaridades, que apenas se conseguiu gastar algumas centenas de contos de réis e que nada produziram senão um poderoso argumento contra a colonização oficial; quando tal argumento devia ser contra aqueles que fizeram a colonização naquelas condições e que deram bastas provas da sua inépcia e da sua ignorância; tantas provas que deviam ter sido obrigados a restituir ao listado as contentas de contos de réis que desbarataram.

Eu lerei á Câmara um relatório do então Governador de Mossâmedes Sr. Leitão Xavier, que esclarece, perfeitamente, o assunto

Leu.

Está-se vendo a boa gente recrutada para ir agricultar o nosso planalto de Mossâmedes.

Eu podia ler mais passagens do tam eloquente relatório; mas para não fatigar a Câmara acrescentarei apenas mais alguns esclarecimentos.

Como o Estado concedia um subsídio de 300 réis aos adultos, 200 réis às mulheres e 100 réis aos menores, os colonos no Funchal casavam à última hora com meretrizes, arranjavam uma ninhada de filhos emprestados, e apresentavam-se em Mossâmedes a ganhar 2$000 réis diários e até mais, importando-se pouco com os trabalhos agrícolas.

As colónias estabeleceram-se em terrenos impróprios e em direcção técnica, de tal forma que os colonos faziam as plantações em Mossâmedes nas mesmas épocas em que as faziam na Madeira, sem atender ás diferenças do clima e de estação.

Se juntarmos a todas estas misérias o facto do próprio Estado roubar os braços à agricultura para empregar nas

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obras públicas, a falta de toda a direcção e fiscalização, fácil é concluir que em tais condições era de prever, era quási certo o insucesso da colonização oficial.

Eu acho que a única forma possível, no nosso país, de promover a colonização livre é criar núcleos de colonização que sirvam de atractivo á nossa emigração.

O Sr. Ramada Curto, no seu brilhantíssimo discurso, disse que não podíamos pensar em colonizar a terra de África, porque não tínhamos gente, nem dinheiro.

Realmente, os nossos recursos são poucos e êsses poucos são tímidos, acanhados e de curtas vistas, preferindo o lucro certo e positivo dos papéis de crédito e as garantias do Estado, o mais temível concorrente ao capital, às incertezas, às fadigas, aos cuidados e aos duvidosos resultados das explorações agrícolas, industriais, coloniais ou de qualquer outra ordem.

Mas, se S. Exa. tem razão, neste ponto, não a tinha quando disse, que não tínhamos gente para colonizar os nossos planaltos angolenses

Assim, já em 1873, o ilustre brasileiro Meneses e Sousa no seu livro Teses sôbre a colonização do Brasil, dizia acêrca do nosso emigrante.

Leu.

Qualidades estas reconhecidas por todos os que estudam a questão de emigração, e nem a Câmara nem o Sr. Ramada Curto delas duvidará.

Quanto ao número de emigrantes preciso para a colonização do nosso domínio ultramarino, não pode haver dúvidas a tal respeito, e para confirmar tal opinião basta passar um rápido golpe de vista pelas estatísticas dos últimos anos.

Por elas se reconhece que anualmente abandonam a terra pátria cêrca de 38:000 emigrantes, algarismo emigratório enorme, mas que felizmente não é ainda perigoso, porque o excesso dos nascimentos sôbre os óbitos foi. nos últimos quatro anos, respectivamente, de 53:000,59:000, 55:000 e 60:000, o que dá ainda, permita-se-me a expressão, pano para mangas.

Basta um têrço daquela corrente emigratória para podermos colonizar as nossas terras de África.

E não se diga que o nosso emigrante não pode, nos pontos mais salubres dos planaltos dedicar-se aos trabalhos rudes da agricultura, visto que em climas bem piores êle se dedica aos mais rudes trabalhos e às mais baixas profissões.

Todos sabem, por exemplo, que aquela multidão de trabalhadores de Serpa, que emigraram para as ilhas Sandwich, foi para ali substituir a mão de obra chinesa nos trabalhos agrícolas.

Em Demerara e nas Bermudas, climas inferiores ao dos planaltos angolenses, os trabalhos mais violentos são feitos por portugueses.

E se nos dermos ao trabalho de consultar alguns relatórios dos nossos cônsules em países estrangeiros, nós encontraremos cousas verdadeiramente curiosas. Assim: num relatório de 31 de Dezembro de 1909 o cônsul de Portugal no Rio de Janeiro dizia entre outras cousas o seguinte:

Leu.

É afinal o que o nosso economista Basílio Teles nos diz no seu magnífico livro Carestia da vida nos campos quando afirma que o emigrante é apenas o pária das aldeias, o trabalhador, o jornaleiro sem terra.

Vê-se portanto que não nos falta gente, e da melhor, para agricultar o planalto de Benguela e que apenas temos que estudar o processo do desviar essa corrente emigratória, que vai enriquecer países estrangeiros, essa corrente de sangue generoso e bom que vai dar vida a organismos estranhos, para a nossa África, que afinal não é mais do que um prolongamento desta boa terra portuguesa.

Eu julgo que o Sr. Ramada Curto ao declarar que não tínhamos gente para colonizar Angola queria apenas dizer que seria um êrro económico desviar a nossa emigração da sua actual tendência.

Enfileira S. Exa. ao lado dos nossos grandes economistas, desde Oliveira Martins que no seu explendido trabalho O Brasil e as Colónias Portuguesas se manifestou claramente contra a idea de colonizar a África com portugueses até aos Srs. Marnoco e Sousa e Anselmo de Andrade que respectivamente nos seus livros Scitncia Económica e Portugal Económico se manifestaram tambêm na mesma ordem de ideas.

E tambêm o Sr. Afonso Costa na sua tese de concurso à cadeira de Economia Política da Escola Politécnica diz sôbre o mesmo assunto.

Leu.

Mas, Sr. Presidente, apesar de opiniões de tanto valor e com tanta autoridade, quem estuda actualmente o fenómeno da, emigração no nosso país, reconhece facilmente que nos últimos tempos as características dessa emigração tem mudado sensível e continuadamente.

Já o Sr. José Barbosa, no seu brilhantíssimo discurso, cheio de erudição, como costumam ser os discursos de S. Exa., disse que a emigração se estava desnacionalizando.

Realmente, já não é hoje o beirão ou o minhoto, que vão ao Brasil abanar a árvore das patacas para comprar mais uma leira, para melhorar de condições de fortuna e que nas suas terras deixavam as famílias a quem mensalmente enviavam as suas economias. Essa emigração era a emigração lucrativa, era a emigração que nos convinha, pois que ela nos dava o ouro necessário para equilibrar o nosso déficit.

Oliveira Martins no livro a que já me referi, dizia, que o país recebia anualmente dos nossos emigrantes do Brasil a importante quantia de 15.000:000$000 réis. Diz êle nesse livro que só em seis semanas a agência dum banco de 4.ª ordem tinha sacado para Portugal em letras de 100$000 a 400$000 réis cêrca do 130:000$000 réis.

O Sr. Afonso Costa, na sua tese, disse que nós recebíamos, do Brasil, 20.000:000$000 réis.

Mas quem estuda com atenção as características da nossa emigração vê que elas tem mudado constantemente. Por um lado é a emigração de mulheres e menores que está aumentando extraordinariamente, porquanto sendo na Itália essas percentagens já enormes, elas não excedem 23 e 8 por cento, em Portugal as percentagens de mulheres e menores são respectivamente 28 e 20 por cento, tendo até excepcionalmente atingido 35 por cento e acontecendo até que no distrito de Ponta Delgada, nos anos de 1902 e 1903 o número das mulheres que emigraram foi igual ao dos homens.

Se juntarmos a isto a contínua e persistente acção dos países de alêm-mar para desnacionalizar a emigração, prendendo o emigrante ao solo, dando-lhe todas as vantagens e oferecendo-lhe todas as garantias fácil é, concluir, que a emigração tende a passar de temporária a permanente, o que a transformará num perigo para Portugal, pois assim ela será uma constante e dolorosa sangria sem compensações de espécie alguma. Daqui deriva a urgente necessidade de estudar o problema, empregando todos os processos para o resolver. É um dêsses processos afigura-se-me que é a derivação para as nossas colónias duma parte da nossa corrente emigratória e eis a razão por que eu, sem hesitar, dou o meu voto aos dois projectos em discussão, não deixando, contudo, de dizer, que tanto um como outro precisam de modificações.

Sr. Presidente: vou terminar as minhas considerações,

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mas, como mais uma vez aqui foram reeditadas as acusações contra os militares que em África se tem batido pelo seu país, eu, como militar que sou, desejo lavrar o meu mais veemente protesto contra tais afirmações, que reputo cheios dum ódio de classe, que nada justifica, e duma injustiça que deve maguar bem profundamente aqueles que em mil arriscados lances jogaram a vida nas plagas africanas.

Não há colonização sem haver primeiro a pacificação dos indígenas O distrito de Lourenço Marques só progrediu depois de aniquiladas os régulos que ali dominaram O norte da província de Moçambique ainda está num atras inconcebível, porque ali ainda se não completou a pacificação.

A Guiné é apenas nossa no nome, e não me parece que seja fácil ir mais alem, emquanto se não fizer a ocupação definitiva, impondo o nosso domínio às aguerridas raça que a povoam.

Há muita gente que julga dispensável a acção militar e substituível pela acção pacífica dos caminhos de ferro mas o facto é que os caminhos de ferro não passam por regiões insubmissas e lá estão os caminhos de ferro de Kaeis a Basumaka, do Cabo ao Cairo, de Mombaça, Port-Florence e os da África Oriental allemã a demonstrar que sem a pacificação das regiões não há possibilidade de construir caminhos de ferro.

A acção militar da Franca com o general Bugeaud, a campanhas de Gordon, Kitchener e Lord Wolseley no Sudão egípcio, as famosas campanhas na Índia, as campa nhãs de Mauming e Sharzc no Nyassa, a acção da Alemanha na África Ocidental e modernamente as campanhas da França e Espanha em Marrocos, tudo prova que para colonizar é preciso primeiramente pacificar. A França considera Bugeaud uma das suas glórias militares, na Inglaterra há um verdadeiro culto pelos generais Gordon, Kitchener e Wolseley, no Senegal os franceses erigiram uma estátua ao general Faidherbe, o pacificado daquela região; bom é, Sr. Presidente, que tambêm nos aprendamos a respeitar as nossas glórias militares e não continuemos a cobrir de insultos aqueles que na África se tem batido pela sua pátria.

Também, e mais uma vez, Sr. Presidente, se trouxe para êste debate uma nota pessoal, irritante e que só pode prejudicar o debate. Eu não tenho procuração do Sr. Pereira do Nascimento para o defender, mas tratando-se dum camarada, com quem convivi, e com quem aprendi a ser um estudioso, um erudito, um verdadeiro carola pelas cousas coloniais, não podia deixar de lhe render justiça, fazendo votos para que das nossas discussões se arredem todas as notas pessoais e se discuta com nobreza e elevação, pois só assim contribuiremos para o nosso prestígio e para o prestígio do Parlamento.

Tenho dito.

O Sr. Francisco Herédia: - Na altura da sessão não pode fazer, como desejava, largas considerações, limitando-se a mandar para a mesa uma proposta, declarando que dá o seu voto a qualquer dos projectos, mas principalmente ao da colonização israelita, colonização garantida pelos resultados já obtidos por ela na Argentina e em outros países.

Proposta

Aditamento ao artigo 1.°:

§ 1.° O Govêrno fica autorizado a fazer concessões de terrenos ás sociedades de beneficência, mencionadas neste artigo, e que não tenham carácter religioso, para aí construírem edifícios de utilidade pública, tais como escolas, hospitais e outros institutos, e para organizarem as cidades e outros centros urbanos, que projectarem e que merecerem a aprovação do Govêrno.

§ 2.° O Govêrno poderá conceder provisoriamente em globo, ás sociedades referidas neste artigo, os terrenos que elas destinarem aos emigrantes e que serão divididos por êstes nos termos desta lei quando se estabelecerem na região colonizável.

As sociedades citadas neste artigo poderão proceder à sua custa á construção de estradas, pontes, esgotos, canalizações de água, canais e outras obras públicas, contanto que os projectos respectivos tenham sido aprovados pelo Govêrno.

Artigo novo, artigo 5.° É livre o estabelecimento de bancos e agencias bancárias em todos os núcleos de colonização israelita na província de Angola.

Os artigos 5.°, 6.°, 7.°, 8.°, 9.°, 10.° e 11.° passarão a ser, respectivamente, 6.°, 7.°, 8.°, 9.°, 10.°, 11.° e 12.° = Ribeira Brava.

O discurso será publicado na íntegra guando o orador restituir as notas taquigráficas.

O Sr. Presidente: - Vai ler-se a proposta do Sr. Francisco Herédia.

Leu-se na mesa.

Foi admitida.

O Sr. Afonso Pala: - Sr. Presidente: pedi a palavra para dar á Câmara uma pequena explicação sôbre o que disse o Sr. António Maria da Silva, relativamente ao que se passou na comissão de correios e telégrafos acêrca do projecto sôbre a criação de estacões rádio-telegráficas.

Diz-se no Sumário das Sessões o seguinte:

Leu.

Ora aqui há um pequeno lapso. A comissão de correios e telégrafos e instalações eléctricas reuniu várias vezes para estudar o assunto da rádio-telegrafia e a mim, na qualidade de presidente dessa comissão, cumpre-me expor como os factos se passaram.

Logo que a comissão examinou o projecto, eu comecei a1 compreender, e, como eu, outros membros da comissão, que tinha de fazer um estudo mais meticuloso do assunto.

Daí resultou ter a comissão reunido várias vezes, reuniões a que compareceu o Sr. António Maria da Silva, o a que, por mais duma vez, presidiu o Sr. Ministro do Fomento.

De duas vezes que reuniu a comissão estiveram presentes os Srs. Ministro do Fomento e Presidente do Ministério, e a ambas estas reuniões assistiu S. Exa. Depois houve mais reuniões, creio que duas, em que se discutiu detidamente o projecto, sendo até apresentados pelo Sr. relator, Nunes Ribeiro, diversos gráficos, alêm do que já tinha apresentado no antigo projecto

Houve uma certa discordância entre as distâncias dos diferentes poios rádio-telegráficos - e era natural que houvesse - porque o projecto apresentava essas distâncias, baseado nas medidas dadas pelo cabo submarino.

Aí diz S. Exa., o honrado Deputado António Maria da Silva, o Sr. Freitas Ribeiro empregou o método das coordenadas geográficas, falando matemáticamente. No primeiro caso pode dizer se que se mediu a distância por meio duma curva de terceiro grau, e no segundo caso por meio duma curva de primeiro grau.

Como digo, discutiram-se as insuficiências, acordou-se em vários pontos, e o Sr. António Maria da Silva, na última reunião a que assistiu, declarou que assinava vencido. Isto foi quási no princípio dêste mês, no dia 8 ou 10. Depois, a comissão continuou a trabalhar no assunto, a pedir que reunissem todos; o Sr. António Maria da Silva nunca mais apareceu; umas vezes vinha cedo, ou-

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trás tarde; resultado, não reuniu com a comissão. Ultimamente, o Sr. Ministro dos Estrangeiros declarou ao Sr. Nunes Ribeiro que era necessário reùnir e deliberarmos sôbre o que havia, para se apresentar o projecto.

Foi em virtude dêste facto, que nós reunimos. Apresentou-se o Sr. Ministro dos Estrangeiros, e não compareceu o Sr. António Maria da Silva nem o Sr. Palma. Desde o princípio do mês que as assinaturas do projecto estavam feitas, e que vinha sendo discutido conforme a opinião técnica de cada um; portanto S. Exa. disse, como vejo no Sumário das Sessões, que não lhe foi presente o projecto, não é o rigor da verdade; o projecto foi presente à comissão e foi discutido; S. Exa. mesmo o discutiu; ouviu-o ler. Discutiu o projecto apresentado pelo Govêrno, a comissão não concordou, depende da Câmara estudá-lo convenientemente, na certeza de que o meu voto, o projecto antigo não conseguirá. Mas não vem para agora discutir assuntos desta ordem, visto que ainda não foi presente â Câmara.

Só pedi a palavra para rectificar esta expressão, que não é o rigor- da verdade. Como S. Exa. disse que não lhe foi presente o projecto, cito os factos. O projecto apresentado pelo ilustre relator e distinto marinheiro, a Sr. Nunes Ribeiro, foi discutido período a período, e foi comparado com o projecto antigo.

S. Exa. assistiu a essa discussão, e não só S. Exa. como o Sr. Ministro do Fomento, e o Sr. Ministro dos Estrangeiros, por duas vezes, estando à última presente o Sr. Ministro dos Estrangeiros e não estando o Sr. António Maria da Silva. Se se apresentou o projecto à presidência foi unicamente porque o Sr. Ministro dos Estrangeiros nos disse que era urgente resolver o problema e se não tem a assinatura de S. Exa. é porque S. Exa. não estava, mas pode assiná-lo quando entender, assim como o Sr. Palma.

Sôbre o assunto julgo ter esclarecido a Câmara, e se mais esclarecimentos forem necessários, mais darei.

O Sr. Manuel Bravo: - E para preguntar a V. Exa. se os Srs. Ministros, a quem anunciei interpelações, já se deram por habilitados a responder a elas, e, no caso afirmativo, pedia a V. Exa. o favor de aã marcar para ordem do dia.

O Sr. Presidente: - Na mesa só há a declaração do Sr. Ministro do Interior de que está habilitado a responder a todas as interpelações que lhe anunciaram.

O Sr. Manuel Bravo:-Eu peco a V. Exa. o favor de comunicar a êsses Srs. Ministros que nos primeiros dias da próxima semana eu realizarei, mesmo com a ausência de S. Exas., essas interpelações.

A Câmara está a finalizar os seus trabalhos e são assuntos importantes os que tenho a tratar.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Júlio Martins: - Peço a V. Exa. que sejam dadas para discussão as interpelações que eu anunciei.

O Sr. João Gonçalves:- Sr. Presidente: recebi um telegrama da Câmara Municipal de Alenquer, para o qual chamo a atenção do Govêrno, em que me informam de factos graves que ali se passaram na ocasião da eleição da comissão para avaliação dos prédios rústicos e urbanos.

Não se exigiram documentos comprovativos da identidade dos eleitores, votou quem quis e exerceu-se a mais torpe corrupção, comprando-se votos a 300 réis por cabeça.

O resultado é que se arranjou uma comissão à vontade de quem era rico.

Não quero empregar a palavra cacique, porque ela está em todos os campos.

Para outro ponto desejava chamar a atenção do Govêrno, e sinto que não esteja presente o Sr. Ministro do Interior porque desejava chamar a atenção de S. Exa. para uma questão que considero de honra para a República.

Há um mês houve uma cheia que pôs na miséria os habitantes de Vila Franca.

O comércio daquela região, por autorização do Govêrno, confiado na palavra do Sr. Ministro do Interior, forneceu os géneros necessários às famílias que tinham ficado na miséria.

Quando estive em Vila Franca, o comércio veio á estação pedir-me que lhe pagassem, pois não podiam continuar a estar desembolsados da importância dos géneros fornecidos, e que são apenas na importância de réis 2:000$000.

O que é facto é que até hoje não tem conseguido o pagamento dêsses géneros.

Não se pode consentir que o Govêrno tenha autorizado o fornecimento dêsses géneros, e até hoje não tenham sido pagos.

Se falo no assunto, é porque nos jornais vi um telegrama da Associação comercial de Vila Franca, protestando contra o procedimento do Govêrno, e como êste não se encontra presente, significo o meu protesto contra a demora do pagamento dêsses géneros.

Espero que o Govêrno procurará salvar o prestígio da República pagando a quem deve.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Presidente: - A próxima sessão é na segunda feira, 27 do corrente, às treze horas e meia e a ordem do dia é a seguinte:

Orçamento das despesas do Ministério do Fomento.

Projecto de lei n.° 180, dispondo quanto à execução dos artigos 39.° e 169.° da lei da separação do Estado da igreja.

Projecto de lei n.° 111, criando um núcleo de colonização no planalto de Benguela.

Projecto de lei n.° 159.°, concedendo terrenos no ultramar a emigrantes israelitas.

Projecto de lei n.° 212, organizando o quadro de oficiais da arma de infantaria.

Está encerrada a sessão.

Eram 18 heras e 50 minutos.

O REDACTOR = Afonso Lopes Vieira.

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