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REPÚBLICA PORTUGUESA

DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS

128.ª SESSÃO EM 5 DE JUNHO DE 1912

SUMÁRIO. - Lida a acta dá-se conta do expediente.

Antes da ordem do dia. - O Sr. Deputado Ferreira da Fonseca inata pela discussão dura projecto, que apresentou, concedendo isenção de direitos do material destinado à iluminação eléctrica do concelho de Trancoso.- O Sr. Deputado Gouvêa Pinto ocupa-se de assuntos relativos à Índia Portuguesa e manda para a mesa dois projectos de lei. - E aprovada a acta da sessão anterior. - São admitidas, em "segunda leitura", as seguintes propostas de lei: dos Srs. Ministros da Justiça (António Macieira) e do Interior (Silvestre Falcão), relativa aos crimes de vadiagem, e do Sr. Ministro das Colónias (Cerveira de Albuquerque) regulando a reintegração no serviço militar do ultramar dos indivíduos que, tendo pertencido ao exército, armada e forças militares coloniais, se encontrem com baixa do serviço. São tambêm admitidos, em "segunda leitura", os seguintes projectos de lei: dos Srs. Deputados Adriano Pimenta, Germano Martins, Pádua Correia, Henrique Cardoso e Fernando Macedo, criando, na cidade do Pôrto, um hospital de policlínica, denominado Hospital da Cidade; dos Srs. Deputados Tomás da Fonseca, Gastão Rodrigues, Fernando Macedo, Caldeira Queiroz, Pires de Campos, Sá Pereira e Pereira Vitorino, autorizando o Govêrno a alienar o palácio e a quinta do Alfeite, nos termos das leis em vigor.- E aprovado, sem. discussão, um novo parágrafo introduzido pelo Senado no projecto de lei n.° 160. - O Sr. Deputado Brandão de Vasconcelos responde às considerações feitas pelo Sr. Deputado Gouvêa Pinto, com respeito ao Sr. Governador Geral da Índia. - O Sr. Deputado Ezequiel de Campos refere-se a assuntos de administração da Ilha de S. Tomé. - O Sr. Deputado Casimiro de Sá ocupa-se da forma como estão sendo feitos os provimentos, transferências e nomeações. - O Sr. Deputado Macedo Pinto insta pela discussão do projecto relativo à delimitação da região dos vinhos do Dão. - O Sr. Deputado Morais Rosa critica o estado em que se encontram os serviços da contabilidade do Ministério do Interior.- O Sr. Deputado Amorim de Carvalho trata do que se passou por ocasião dos acontecimentos provocados pelos sócios da "Juventude Católica". - O Sr. Deputado Ramos da Costa apresenta e justifica um projecto de lei destinando a Palácio de Justiça o edifício do antigo Palácio da Ajuda, com excepção da parte onde está a Biblioteca. - O Sr. Presidente do Ministério (Augusto de Vasconcelos) comunica à Câmara que o Ministério apresentou a sua demissão colectiva ao Chefe do Estado.- Mandam documentos para a mesa os Srs. Deputados Brandão de Vasconcelos, Casimiro de Sá, Vitorino Guimarães, por parte da comissão de finanças, Costa Basto, Prazeres da Costa, Alexandre de Barro. - Ezequiel de Campos e Alberto Souto. - E autorizada a reùnir durante a sessão a comissão de administração pública. Primeira parte da ordem do dia (continuação da discussão, na generalidade, do orçamento do Ministério do Fomento). - Usam da palavra os Srs. Deputados Macedo Pinto, Aquiles Gonçalves, António Maria da Silva, Brito Camacho, Fernando Macedo, Joaquim Ribeiro, Alexandre de Barros, Pires de Campos, Angelo Vaz. É aprovado, na generalidade, o orçamento do Ministério do Fomento. - O Sr. Deputado Vitorino Guimarães requere, e a Câmara concede, a urgência e dispensa do Regimento para entrar imediatamente em discussão o projecto de lei autorizando, pelo Ministério do Interior, a abertura de um crédito extraordinário de 19:300^000 réis para pagamento de férias ao pessoal da Imprensa Nacional. E aprovado o projecto, na generalidade e na especialidade, depois de algumas considerações do Sr. Deputado Santos Moita. E dispensada a última redacção do projecto, a requerimento do Sr. Deputado Vitorino Guimarães.

Segunda parte da ordem do dia (continuação da discussão, na especialidade, do projecto de lei n.° 200, passando a guarda e conservação dos móveis e imóveis dos extintos paços riais para o Ministério das Finanças).- Usam da palavra os Srs. Deputados Pádua Correia, Álvaro Poppe, Álvaro de Castro (relator), Brito Camacho e Fernando Macedo. São aprovados os artigos 10.° a 16.°, com propostas de aditamento do Sr. Deputado Brito Camacho aos artigos 14.° e 15.°, e com uma proposta de emenda a êste último, do Sr. Deputado Álvaro Poppe. - É rejeitado o artigo 9.° e aprovada uma proposta de substituição dêsse artigo, do Sr. Deputado Álvaro de Castro (relator). - Discussão do projecto de lei n.° 208, autorizando o Govêrno a identificar e separar os bens mobiliários que constituíam propriedade particular do ex-rei D. Manuel e dos diversos membros da sua família e a fazer a respectiva entrega a quem de direito. - E aprovado, na generalidade e na especialidade, depois dalgumas considerações doa Srs. Deputados Brito Camacho, Matos Cid (relator) e Germano Martins. - (Continuação da discussão do projecto de lei n.° 212, modificando o quadro permanente dos oficiais da arma de infantaria). - Usam da palavra os Srs. Deputados Fernando Macedo, Manuel Bravo, Valente de Almeida e Helder Ribeiro.

Antes de se encerrar a sessão. - Trocam-se explicações entre o Sr. Deputado Brito Camacho e o Sr. Presidente sôbre a ordem dos trabalhos da Câmara até estar constituído o novo Governo. - O Sr. Deputado Alexandre de Barros insta pela discussão do projecto de lei sôbre o aumento da polícia civil da cidade do Porto. - Mandam declarações de voto para a mesa os Srs. Deputados Morais Rosa, Malva do Vale e Bissaia Barreto.

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Presidência do Exmo. Sr. António Aresta Branco

Secretários os Exmos. Srs.

Baltasar de Almeida Teixeira
Francisco José Pereira

Abertura da sessão - Às 14 horas e 5 minutos.

Presentes à chamada - 55 Srs. Deputados.

São os seguintes: Adriano Gomes Ferreira Pimenta, Afonso Ferreira, Alexandre Augusto de Barros, Alfredo Djalme Martins de Azevedo, Alfredo Guilherme Howel, Alfredo Maria Ladeira, Álvaro Poppe, Angelo Vaz;, António Amorim de Carvalho, António Aresta Branco, António Brandão de Vasconcelos, António Joaquim Ferreira da Fonseca, António José Lourinho, António Maria da Cunha Marques da Costa, António Silva Gouveia, António Valente de Almeida, Baltasar de Almeida Teixeira, Carlos Olavo Correia de Azevedo, Eduardo de Almeida, Fernando da Cunha Macedo, Francisco José Pereira, Gaudêncio Pires de Campos, Guilherme Nunes Godinho, Henrique José Caldeira Queiroz, Henrique José dos San tos Cardoso, João Duarte de Meneses, João José Luis Damas, João Luís Ricardo, João Machado Ferreira Brandão, Joaquim António de Melo Castro Ribeiro, Joaquim Brandão, Joaquim José Cerqueira da Rocha, Jorge Frederico Velez, Caroço, Jorge de Vasconcelos Nunes, José Augusto Simas Machado, José Barbosa, José Botelho de Carvalho Araújo, José Dias da Silva, José Jacinto Nunes, José Luís dos Santos Moita, José Miguel Lamartine Prazeres da Costa, José Vale de Matos Cid, Jovino Francisco Gouvêa Pinto, Luís Augusto Pinto de Mesquita Carvalho, Manuel de Brito Camacho, Manuel Pires Vaz Bravo Júnior, Miguel de Abreu, Pedro Alfredo de Morais Rosa, Pedro Januário do Vale Sá Pereira, Philemon da Silveira Duarte de Almeida, Rodrigo Fernandes Fontinha, Severiano José da Silva, Tomé José de Barros Queiroz, Vitorino Henriques Godinho, Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.

Entraram durante a sessão os Srs.: Adriano Mendes de Vasconcelos, Afonso Augusto da Costa, Alberto de Moura Pinto, Alberto Souto, Albino Pimenta de Aguiar, Alexandre Braga, Alexandre José Botelho de Vasconcelos e Sá, Álvaro Nunes Ribeiro, Álvaro Xavier de Castro, Amílcar da Silva Ramada Curto, António Barroso Pereira Vitorino, António Joaquim Granjo, António José de Almeida, António Maria Malva do Vale, António Maria da Silva, António Pádua Correia, António de Paiva Gomes, António Pires Pereira Júnior, Aquiles Gonçalves Fernandes, Artur Augusto Duarte da Luz Almeida, Augusto José Vieira, Aureliano de Mira Fernandes, Caetano Francisco Cláudio Eugénio Gonçalves, Carlos Amaro de Miranda e Silva, Carlos Maria Pereira, Casimiro Rodrigues de Sá, Emídio Guilherme Garcia Mendes, Ernesto Carneiro Franco, Ezequiel de Campos, Fernando Baeta Bissaia Barreto Rosa, Francisco Correia Herédia (Ribeira Brava), Francisco de Sales Ramos da Costa, Gastão Rafael Rodrigues, Germano Lopes Martins, Helder Armando dos Santos Ribeiro, João Barreira, João Camilo Rodrigues, João Carlos Nunes da Palma, João Gonçalves, João Pereira Bastos, Joaquim Ribeiro de Carvalho, José Afonso Pala, José António Simões Raposo Júnior, José dó Barros Mendes de Abreu, José Bernardo Lopes da Silva, José Francisco Coelho, José de Freitas Ribeiro, José Maria Vilhena Barbosa de Magalhães, José Mendes Cabeçadas Júnior, José Montez, José Perdigão, José Pereira da Costa Basto, José da Silva Ramos, José Tomás da Fonseca, Júlio do Patrocínio Martins, Manuel Alegre, Manuel Gregório Pestana Júnior, Manuel José da Silva, Tiago Moreira Sales, Tito Augusto de Morais, Vítor Hugo de Azevedo Coutinho, Vítor José de Deus Macedo Pinto.

Não compareceram à sessão os Srs.: Alfredo Balduíno de Seabra Júnior, Alfredo Rodrigues Gaspar, Américo Olavo de Azevedo, Angelo Rodrigues da Fonseca, António Afonso Garcia da Costa, António Alberto Charula Pessanha, António Albino Carvalho Mourão, António Augusto Pereira Cabral, António Caetano Celorico Gil, António Cândido de Almeida Leitão, António Flórido da Cunha Toscano, António França Borges, António Maria de Azevedo Machado Santos, António dos Santos Pousada, Carlos António Caliito, Carlos Henrique da Silva Maia Pinto, Domingos Leite Pereira, Francisco Cruz, Francisco Luís Tavares, Francisco Xavier Esteves, Henrique de Sousa Monteiro, Inocêncio Camacho Rodrigues, João Carlos Rodrigues de Azevedo, João Fiel Stockler, Joaquim José de Oliveira, Joaquim Teófilo Braga, José Bessa de Carvalho, José Carlos da Maia, José Cordeiro Júnior, José Maria Cardoso, José Tristão Pais de Figueiredo, Luís Inocêncio Ramos Pereira, Luís Maria Rosete, Miguei Augusto Alves Ferreira, Porfírio Coelho da Fonseca Magalhães, Sidónio Bernardino Cardoso da Silva Pais.

Procedeu-se à chamada.

O Sr. Presidente: - Responderam à chamada 55 Srs. Deputados. Está aberta a sessão. Vai ler-se a acta.

Foi lida a acta.

O Sr. Presidente: - Como não há número para deliberar, mando proceder à leitura do expediente.

Deu-se conta do seguinte

EXPEDIENTE

Ofícios

Do Senado, comunicando que no próximo sábado, 8, pelas 14 horas, reùnirá o Congresso, para discussão dos assuntos constantes dos ofícios n.ºs 691 e 692, datados de 3 do mês corrente.

Para a Secretaria.

Do Senado, enviando o projecto de lei n.° 160, com alterações introduzidas pelo mesmo, e juntamente um novo autógrafo, para que de novo seja submetido â apreciação desta Câmara.

Do Senado, remetendo o projecto de lei que tem por fim autorizar o Govêrno a permitir os jogos de azar nas estações termais, balneares e climatéricas de Portugal, continente e ilhas adjacentes.

Igualmente envia um exemplar do respectivo parecer da comissão de legislação civil, seguido do projecto inicial.

Para a comissão de legislação civil e comercial.

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Do Ministério das Colónias, remetendo 23 exemplares do projecto da organização do Conselho de Administração dos Portos e Viação, da província de S. Tomé e Príncipe.

Para a Secretaria.

Do Sr. Deputado Alfredo Balduíno de Seabra Júnior, pedindo uma licença de trinta dias.

Para a comissão de infracções e faltas.

Telegramas

Lisboa. - Porto. - De novo lembro projecto policia civil desta cidade; é melhoramento inadiável e necessário. = Governador Civil, Sá Fernandes.

Para a Secretaria.

Lisboa. - Signatários representação estudo engenharia estrangeira renovam representação pedindo urgência.

Para a Secretaria.

O Sr. Presidente: - Tenho uma comunicação a fazer â Câmara, de que sou responsável.

A Câmara sabe que o Sr. Deputado Francisco Cruz saiu, certo dia, da sala dizendo que renunciava o seu mandato e, nesse sentido, mandou uma carta para a mesa.

Eu rasguei essa carta, para instar com S. Exa. a fim de o dissuadir do seu propósito. Até hoje, porem, não tem sido possível encontrá-lo; não sei mesmo se saiu de Lisboa. Nestas condições, parece me que a Câmara deveria conceder uma licença ao Sr. Francisco Cruz, para ver se eu consigo demove-lo da sua intenção.

Vozes: - Muito bem, muito bem.

Consultada a Câmara, resolveu afirmativamente.

O Sr. Ferreira da Fonseca: - Sr. Presidente: na sessão de 2 de Junho foi lido na mesa um telegrama da Câmara Municipal de Trancoso, com relação a um contrato que fez para a iluminação eléctrica daquele concelho.

Nessa ocasião eu pedi a palavra, assim como na sessão seguinte, para tratar do assunto sôbre que versava êsse telegrama, mas não me foi possível usar da palavra, o que só hoje consigo fazer.

A Câmara Municipal de Trancoso fez um contrato com um concessionário para a iluminação eléctrica daquela vila, contrato que foi devidamente sancionado pelo nosso Govêrno, e no qual ficou estabelecido que o concessionário prestaria uma caução de 500$000 réis, que perderia, em favor da câmara municipal, caso não fizesse, a instalação da luz eléctrica num certo prazo.

Em 20 de Novembro a Câmara Municipal de Trancoso representou ao Govêrno pedindo a isenção de direitos para o material a importar para essa instalação, e, nesse mesmo sentido, eu apresentei em 15 de Dezembro um projecto de lei. Até hoje, porem, êsse assunto não foi resolvido, e isso poderá prejudicar muito essa câmara, porque, se o Parlamento lhe não conceder a isenção de direitos para o material, ela perderá os 500$000 réis que o concessionário depositou como caução, e aquela vila ficará sem um óptimo melhoramento.

Portanto, eu pedia a V. Exa., Sr. Presidente, que, com a maior brevidade, pusesse em discussão o meu projecto de lei, a fim de se liquidar êste assunto.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Gouvêa Pinto: - Sr. Presidente: em 30 de Março último os jornais de Lisboa publicaram, fornecido pelo Ministério das Colónias, um telegrama do Sr. Governador Geral da Índia, em que êste funcionário se mostrava indignado contra aquilo que eu tinha afirmado no meu discurso de 8 do mesmo mês. Porque se tinha indignado o Sr. Governador da Índia? Fiz um detido exame de consciência para saber se tinha faltado à cortezia que costumo usar nos meus actos e se desrespeitara a sagrada memória dos meus educadores, saindo dos moldes da boa educação que me tinham ministrado meus saudosos pais.

Compulsei êsse meu discurso que provocara a indignação e o desmentido do Sr. Dr. Couceiro da Costa, para ver se nele encontrava a justificação do telegrama de S. Exa.

Nem uma palavra clara ou dúbia que pudesse melindrar o carácter nem as qualidades pessoais do ilustre Governador de Goa. Pelo contrário, a afirmação do maior respeito e consideração, que continuo mantendo, por S. Exa. Porque, pois, a indignação do ilustre funcionário?

S. Exa., apavorado ante a sua obra ou a dos funcionários, com os quais se solidarizou, e, na natural turbação de espírito que ela lhe causa, expediu êsse telegrama como os outros que tem ido despejando para o Govêrno da metrópole.

Aguardei que o Sr. Dr. Couceiro da Costa dissesse da sua justiça, pelo correio, que vinte dias depois devia trazer ao Ministério das Colónias o seu relatório, e oportunamente requeri que me fossem remetidos êsse e outros documentos sôbre os acontecimentos. Só me foram mandados, tardiamente, o relatório e um ofício do Sr. Couceiro da Costa, desacompanhados doutros documentos elucidativos que sei existirem no Ministério das Colónias.

Ora êsse relatório, que tem a data de 4 de Abril último, confirma a segunda alvidração e, portanto, a acusação que formulei de que a causa da revolta ou protesto fora uma ilegalidade, e outra cousa não é essa segunda alvidração.

Também o Sr. Governador diz que mandou deter um fousder. Eu tinha afirmado que fora preso. Portanto, tambêm neste ponto é descabido o desmentido de S. Exa. A única diferença é que o Sr. Governador da Índia diz ter mediado um grande espaço de tempo entre a segunda alvidração e a revolta. Que importa? O facto é que houve uma ilegalidade. Próxima ou remota, não importa ao caso (Apoiados).

S. Exa. errou, o que era desculpável, mas pretende reincidir no êrro, o que é um crime, e apela para a fôrça pública, com a qual julga defender o prestigio da autoridade. É outro êrro.

O prestígio da autoridade só se robustece no estrito cumprimento da lei (Apoiados). S. Exa. respeitando a lei e obrigando os funcionários, seus subordinados, a respeitá-la tambêm, é que poderá impor-se aos governados e especialmente àqueles que se revoltaram contra uma flagrante arbitrariedade. Se a alvidração da circunscrição de Valpoy estava baixa, só havia que pedir a responsabilidade ao chefe da circunscrição.

Quanto a essas alvidrações, devo informar a Câmara que elas estão sendo, de ano para ano, tara puxadas, que o orçamento de 1910-1911 calcula a cobrança provável em 20:400$000 réis, isto é, superior à receita dos três anos de 1906-1907, 1907-1908 e 1908-1909!

Imagine a Câmara se há ou não razão para as revoltas, que continuarei a classificar de protestos. E chamam-se bandidos aos ranes!

Um médico distinto, descendente de militares europeus, o Sr. Dr. Adolfo Costa, diz a respeito dos ranes isto, que aliás é geralmente conhecido na Índia, mas que se ignora na metrópole:

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"Nunca roubaram mais do que o necessário para se sustentar, nunca violaram mulheres, nunca maltrataram velhos e crianças, nunca as suas espadas curvas se mancharam no sangue dum prisioneiro".

Trata-se daqueles que na metrópole são tidos como selvagens, emquanto que por cá, que se diz terra civilizada, vemos... o que se está vendo com os prisioneiros (Apoiados).

Estou convencido de que o Sr. Dr. Couceiro da Costa não poderá dominar a situação. Durante cinco anos procurou vencer os ranes um bravo militar que se chamou Barão de Ourem, que teve de ceder lugar a outro militar do seu estofo, o Conde de Torres Novas, que terminou a revolta, concedendo perdão aos rebeldes, 500 rupias anuais ao chefe Dupú Rane e seus sobrinhos, alem doutras concessões.

A revolta de 1895 terminou, tambêm, com umas sensatas medidas do governador, general Joaquim José Machado, medidas que consistiram na ocupação militar e administrativa, escolha meticulosa do pessoal, construção de estradas, telégrafos, distribuição de terras, a questão religiosa tirando a influência dos ranes sôbre os roytos, proibição da enorme agiotagem feita por saneares projecto duma caixa económica e de crédito agrícola.

Porque não se puseram em execução essas medidas?

A essa revolta de 1895, que tambêm teve por causas ilegalidades e arbitrariedades, juntavam, os exploradores de então, o infame complemento duma suposta hidra nativista!

Os goenses são portugueses e amam entranhadamente a nacionalidade portuguesa. Vivem do dinheiro que angariam, pelo seu trabalho honesto, na Índia Inglesa, donde vêem, em média mensal, para Goa, uns 40:000$000 réis, pagos em vales postais, afora grandes somas recebidas por diversas outras vias.

Pois essa gente, que tudo quanto possui o deve ao estrangeiro, é portuguesa e quere ser sempre portuguesa!

Nesse ano, 1895, quando sustentei um rude combate contra aqueles que especulavam com a situação da Índia, encontrei um decidido apoio por parte da imprensa republicana. Foi extenuante essa campanha célebre. Tive de escrever, diariamente, quatro e cinco artigos nos jornais republicanos. De certo, não tinham êsses artigos o brilho que caracteriza a prosa dos ilustres jornalistas que dirigiam êsses jornais, mas continham matéria bastante para o restabelecimento da verdade sôbre a chamada revolta marata e a complementar hidra nativista. Consegui, após uma longa campanha, esclarecer a opinião da metrópole, que heróis de pacotilha traziam desnorteada. E êste resultado devi-o ao auxílio dos jornais republicanos, que reconheciam a necessidade de esmagar aqueles que, para certos fins, pretendiam deturpar a verdade.

Os actuais acontecimentos são idênticos, as causas as mesmas e a minha campanha parlamentar igual, se não mais branda do que aquela que tam grande apoio mereceu à imprensa republicana. Como se explica, pois, essa reviravolta dum partido que tanto combateu na oposição princípios que parece querer renegar no Govêrno?

Há dias afirmei que estava onde sempre estive e repito-o agora: sempre na defesa dos bons princípios e pugnando pela verdade e pela legalidade.

Tinha ainda que fazer algumas considerações acêrca da exoneração do comandante militar de Satary. A êste respeito limitar-me-ei a ler um artigo editorial do importante jornal de Nova Goa, O Correio da Índia, intitulado Balbúrdia e que diz o seguinte:

"Foi exonerado, a seu pedido, por motivos pundonorosos, segundo diz a portaria, o sr. Capitão Arnaldo Joaquim da Cunha Rola Pereira do cargo de comandante militar da província de Satary, sobrestando o Sr. Governador Geral dêste Estado na apreciação da forma por que êsse oficial exerceu as respectivas funcções. até que se efectue a rigorosa sindicância que simultaneamente requereu aos seus actos!!!"

O Sr. Capitão Rola Pereira exonerado e sindicado?!! Que alta balbúrdia!! Aliás, vejam o seguinte telegrama, publicado no Século de 28 de Março último: "Recebeu-se ontem em Lisboa um telegrama de Goa dizendo ser inexacto e injusto um artigo publicado num jornal da capital com respeito a Satary. Êsse mesmo telegrama acrescenta:

Acontecimentos unicamente resultantes saída tropas Macau, julgando algumas populações Novas Conquistas ocasião propícia dar largas sua natural tradicional tendência rebeldia pilhagem. Comandante militar de Satary capitão artilharia Rola Pereira honesto, ponderado, incapaz quaisquer extorsões, violências, sendo alvidrações feitas sempre nos termos da lei sem excesso ou injustiça". Vejam mais a portaria de 26 de abril em que a propósito do encontro das nossas tropas com os rebeldes em Caranzol, no dia 29 de Março, mandava é Sr. Governador louvar o capitão de artilharia comandante militar de Satary, Arnaldo Joaquim da Cunha Rola Pereira, pela acertada direcção, coragem, firmeza e energia com que comandou a referida coluna.

Ora, se o Sr. Capitão Rola Pereira é tudo isto quanto diz êsse telegrama, a portaria e as notas oficiosas que ameaçam balburdiar o país, por que essa exoneração e rigorosa sindicância? Porque tambêm, agora, essa sobrestação do Sr. Governador Geral na apreciação da forma por que êsse oficial exerceu as respectivas funções, quando, aliás, o Sr. Governador, tanto aqui como na metrópole, se fartou propositadamente de antecipar essa apreciação em termos os mais peremptórios e lísongeiros, em despeito de tudo quanto a imprensa disse e os amigos da ordem disseram.

Uma rigorosa sindicância por motivos pundonorosos? Um militar pundonoroso, Sr. Couceiro da Costa, por motivos pundonorosos não requere uma sindicância, pede um conselho de guerra. E, pois, perante um conselho de guerra, Sr. Couceiro da Costa, que um militar se deve ilibar e não perante um sindicante, embora militar, segundo a nossa fraca opinião.

Mas, na época presente, nada nos admira; porque, tratando-se de operações militares na província de Satary reùne-se logo um conselho familiar de paisanos!!!

Tanto isto é verdade, público e notório que, até hoje, não obstante as grandes comoções,por que tem passado o país, não foram ouvidos os oficiais da guarnição, quando aliás o bom senso aconselhava que deviam ser êles os primeiros a serem ouvidos e consultados, como os mais competentes e os mais autorizados no assunto.

Mas, não senhores, nada disto se tem feito, porque tudo isto anda numa balbúrdia."

Sinto muito ter que afirmar à Câmara que é insustentável a situação do Sr. Dr. Couceiro da Costa. S. Exa. não conseguirá dominar os chamados revoltosos ou antes os que protestam contra as arbitrariedades, empregando para êsse fim a fôrça pública por mais numerosa que ela seja, o que só acarretará enorme dispêndio para o Tesouro o querer sustentar a enorme receita de 175$000 réis, extorquidos aos rostos.

Visto o Sr. Presidente não me conceder mais tempo para proseguir nas minhas considerações, termino propondo que a Câmara, visto não termos governo - e não digo isto por e Ministério estar demissionário, mas porque até hoje não temos tido governo que governe - escolha um indivíduo competente e de reconhecida imparcialidade, que vá inquirir das causas que determinam as rebeliões propor medidas que exterminem essas causas. Mando para a mesa um projecto de lei substituindo o artigo 7.° do decreto n.° 1 de 17 de Julho de 1886, na parte que se refere ao limite mínimo de cinco anos parar

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os efeitos da aposentação no último cargo exercido, pelo seguinte:

"E reduzido a dois anos o tempo preciso para a aposentação, com o vencimento do categoria da sua classe a qualquer funcionário civil, fisicamente impossibilitado de exercer o seu cargo, fazendo-se a aposentação nos termos dos artigos 3.° e 4.° e seus parágrafos do decreto n.° 1 de 17 de Julho de 1886.

Mando tambêm para a mesa um projecto de lei estabelecendo ao filho único de Jacob Emídio de Sousa Proença, delegado que foi da Junta de Saúde em Damão, morto no cumprimento de seu dever profissional e oficial, a pensão vitalícia anual de 360$000 réis, correspondente ao soldo de alferes que cabe a um facultativo em comissão.

Tenho dito.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 86 Srs. Deputados. Está em discussão a acta.

Foi aprovada a acta.

O Sr. Presidente: - Vai procedesse à leitura duma

Última redacção

Foi aprovada a última, redacção do projecto de lei n.º 248.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se a segundas leituras.

Segundas leituras

Propostas de lei

Resolver o problema da criminalidade deve ser uma das aspirações supremas daqueles a quem, na vida dos Estados, é dada a nobre função de reformar as condições sociais, no sentido dum constante aperfeiçoamento.

E se a sua resolução completa e pronta não é possível, nem por isso se deve deixar de estudar tal problema, sob os seus diversos aspectos, provendo de remédio os males que com maior gravidade se nos apresentam ou para que medidas de mais fácil aplicação nos sejam indicadas.

Em Portugal, as dificuldades de ordem geral, que em todos os países são enormes, agravam-se com as precárias circunstâncias do Tesouro Público, que tornam por ora impossível uma profunda reforma do regime prisional.

Torna-se portanto necessário trabalhar a pouco e pouco, aproveitando qualquer ensejo de fazer alguma cousa, sempre que assim se possa, para que de pequenos materiais, paciente e metodicamente reunidos, se consiga fazer obra que, ao fim de tempo, se imponha pela sua grandeza.

É por isso que na proposta de lei que se segue, apenas se procura resolver o caso, no ponto restrito dos crimes de vadiagem e dos que, com êle ligados, nos apresentam uma classe de criminosos altamente prejudiciais á sociedade, não só pelo seu parasitismo actual, mas ainda porque constitui uma primeira étape no caminho do crime de maior gravidade.

E o vadio que, começando por uma resistência passiva contra as leis de ordem e trabalho necessárias à sociedade, nos dá o ladrão e o assassino.

Regenerar êsse indivíduo, torná-lo apto para a vida, habilitá-lo a concorrer com o seu esforço para o bom funcionamento do organismo social, é atacar o crime numa das suas origens mais notáveis.

E se as medidas profiláticas, por motivos de vária ordem, são difíceis em todas as sociedades, e, portanto, de aplicação lenta, que ao menos se aperfeiçoem as terapêuticas.

Não tem êste assunto sido descurado nas nossas leis.

Já a Orden., livro 5.°, título 68, mandava castigar os vadios, açoutando-os publicamente ou deportando-os.

O Código Penal de 1886, que nesta parte copiou o de 1852, determina que os vadios sejam condenados em prisão correccional e depois postos â disposição do Govêrno para lhes fornecer trabalho pelo tempo que parecer conveniente.

A lei de 21 de Abril de 1892 que equiparou aos vadios, para o efeito de aplicação de pena, os indivíduos com certo número de condenações, determinou que tanto êstes como aqueles a que se refere o Código Penal possam ser transportados para as possessões ultramarinas.

Depois, na lei de 3 de Abril de 1896, determinou-se que seriam punidos como vadios os que explorassem sob certas formas, a mendicidade e os que vivessem a expensas de mulheres prostituídas. Esta lei manteve o princípio da deportação, aparecendo já nela a imposição do trabalho em estabelecimentos adequados, quando os houvesse.

O decreto de 23 de Março de 1899, regulamentando a lei de 21 de Abril de 1892, determinou que os vadios fossem internados na Escola Agrícola de Vila Fernando, recebidos nos trabalhos do Estado ou transportados para o ultramar.

Como, porem, em Vila Fernando não podem ser internados indivíduos com mais de dezoito anos (regulamento de 17 de Agosto de 1901, artigo 124.°) e a parte que, sob êste ponto, mais importância tinha, da lei de 1896, nunca foi executada, porque não foi criado o estabelecimento especial a que ela se referia, apenas de duas formas se pode dar destino aos vadios maiores de dezoito anos, que são os mais numerosos e perigosos: - empregados nos trabalhos do Estado ou deportá-los para o ultramar.

A primeira solução não dá resultado, porque não pode haver vigilância sôbre o condenado, que evite a sua fuga do local onde trabalha e o regresso onde era preciso que não estivesse, por ser o meio em que a sua tendência criminosa era efectivada. E até os indivíduos encarregados da fiscalização dos trabalhadores não costumam ver com bons olhos a chegada dum vadio condenado, elemento sempre prejudicial à disciplina daqueles com quem se põe em contacto.

Fica a deportação, medida aliás nada estimável, que não é posta em práctica com facilidade, resultando daí a acumulação de muitas dezenas de vadios nas cadeias, onde esperam a ocasião de seguirem para o ultramar, e onde entretanto constituem um elemento perturbador a que se devem quási sempre os actos mais notórios de indisciplina e rebeldia.

A tudo isto acresce a necessidade de evitar que para as colónias seja lançada a grandes jactos uma população que não convêm onde é preciso trabalhar com ordem e afinco, desentravada e produtivamente.

Estas considerações nos levam a propor medidas que, postas em práctica desde já, obviarão aos inconvenientes que as disposições legais em vigor determinam.

Na proposta que o Parlamento vai ter ocasião de apreciar, punem-se os que são vadios e aqueles que, pelo seu procedimento, mostram uma relutância para o trabalho que, repetidamente evidenciada, nos pareceu dever ser equiparada à vadiagem, para os efeitos penais.

São tendentes a êste fim as disposições contidas nos artigos 1.° a 5.°, onde se definem os crimes que a lei pune, e que são, com poucas alterações os que já se encontravam no Código Penal e leis citadas de 1892 e 1896.

No artigo 1.°, eliminou-se o elemento da falta de domicílio certo, estabelecido no Código Penal, para evitar que qualquer indivíduo, pelo simples facto de ter um pequeno quarto arrendado, onde, embora falsamente, declarava ter sua residência, deixasse de ser considerado vadio, pôsto que realmente o fôsse, pelas demais circunstâncias do seu viver. Era um meio de que frequentíssimas vezes se usava e que nos tribunais tinha de ser atendido, embora constituísse uma evidente mistificação.

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Fixa-se o número de reincidências que em cada um dos crimes são necessárias, conforme a sua gravidade, para constituir a vadiagem.

Estabelece-se no artigo 11.° o princípio da extinção do internato logo que o condenado mostre que êle é desnecessário para o fim que se pretendia atingir, a regeneração dum indivíduo considerado inapto para viver no meio social.

Posta de parte, quási por completo, a deportação, que só nos casos, muito excepcionais do artigo 13.°, é permitida, criam-se estabelecimentos onde proveitosamente se pode fazer a educação moral, física e até profissional dos vadios, impondo-lhes um trabalho, metódico e vigiado que até agora não tem tido.

E êsses estabelecimentos não podem deixar de ser de duas espécies: a Casa Correccional de Trabalho, onde se estabeleçam oficinas várias e a Colónia Penal Agrícola, onde se empreguem aqueles que, pelas suas especiais condições, devam dedicar-se aos trabalhos de agricultura, de preferência a quaisquer outros. Cada um trabalhará conforme as suas aptidões, pois só assim o trabalho será proveitoso para o Estado e para o condenado.

Aproveita-se desde já para Casa Correccional de Trabalho a Penitenciária de Coimbra, que é desnecessária para cumprimento de prisão maior, e que já dotada com pessoal a quem o Estado tem de pagar, embora lhe não aproveite serviços, dá a possibilidade de, sem aumento de encargos para o Tesouro, aplicar imediatamente medidas cuja urgência se impõe.

No artigo 18 § 3.° fixa-se a quantia de 27:300$000 réis destinada à adaptação do edifício e terrenos para a Colónia Penal Agrícola e para a sua instalação e funcionamento, sendo aplicada conforme a tabela anexa á presente proposta.

Não constituí; porem, toda esta verba de dotação um novo encargo para o Estado. Há que atender ao que actualmente é gasto, sem o devido proveito, com tais ser viços.

Seria um trabalho longo averiguar duma maneira segura e completa quanto tem custado e estão custando os presos postos à disposição do Govêrno, nos termos das leis em vigor.

Mas um ligeiro exame, tomando sempre por base o mínimos de despesa, leva-nos â conclusão de que muito se economiza para fazer face à dotação proposta.

Vejamos.

Além dos menores até 16 anos, que vão em breve ser internados num estabelecimento dependente da Tutoria da Infância, estão actualmente na cadeia central de Lis boa 143 indivíduos postos à disposição do Govêrno. A sustentação dêles custa, o mínimo, 20$120 réis por dia E claro que não ficarão indefinidamente na cadeia. Ainda que vão todos para Cabo Verde, para onde o transporte é mais barato (24$300 réis cada um) custará a deportação 3:474$900 réis. Êstes indivíduos, ao chegarem ao ultra mar, não podem ser lançados à margem, perfeitamente ao abandono, de sorte que, ficando, como ficam, sujeitos ao regime dos degredados, custam o mínimo de 100 réis por dia, o que dá uma despesa diária de 14$300 réis.

Isto é, os presos que estão actualmente no Limoeiro se forem para o Ultramar, têm gasto ao Estado, no fim dum ano o mínimo de 8:694$400 réis; e se forem par Angola custarão 10:624$900 réis.

Façamos agora um outro cálculo.

Em 1907 foram 80 vadios para a Guiné e 21 para Cabo Verde. Atendendo ao preço das passagens e á sua sustentação, custaram no fim dum ano 7:086$100 réis.

Em 1908, 165 que foram para Angola, custaram em igual período 12:259$500 réis.

Em 1909, foram 84 para Angola, que custaram 6:241$200 réis.

Em 1910 foram para Angola 57, que custaram 4:235$100 réis.

Dos 143 que estão no Limoeiro, 28 entraram há mais dum ano e, portanto, tem gasto até agora o mínimo de 1:4300$00 réis.

Isto é, desde 1907 até hoje tem-se gasto com os vadios o mínimo de 21:252$700 réis.

Esta quantia é calculada considerando que cada condenado apenas estava um ano a cargo do Estado. Como, porêm, quási todos estão mais do que êsse tempo, aquela verba sobe a muito maior valor. Basta que a deportação tenha durado dois anos a cada um, para tal verba aumentar de 14:855$500 réis.

Eis o que se gastaria se todos os indivíduos a que a presente proposta se refere fossem enviados ao seu legal destino, para se evitar a sua permanência nas cadeias durante anos, cumprindo uma pena de prisão Correccional que lhes não foi imposta.

Para fazer face, sob o ponto de vista orçamental, a parte da despesa criada com a Colónia Penal Agrícola, lança-se mão das seguintes verbas que, aprovada a presente proposta, são desnecessárias com a aplicação que até agora lhes é dada.

Da verba que no capítulo. 4.°, artigo 20.°, do orçamento do Ministério do Interior é destinada a transporte de vadios e reincidentes para o ultramar sairão 2:500$000 réis, ficando reduzida a 500$000 réis, para ocorrer às despesas com as deportações excepcionais a que se refere o art. 13.°

Extintos os lugares de sub-director e de médico adjuncto da Penitenciária de Coimbra, desaparecem as verbas de 800$000 réis e 400$000 réis, do capitulo 6.°, artigo 15.° do respectivo orçamento.

Da verba a que se refere o capítulo 6.°, artigo 19.° do Orçamento do Ministério da Justiça - material para as oficinas da Penitenciária de Lisboa - são desviados réis 15:000$000, quantia que se tornará desnecessária, por virtude de nova organização do trabalho em tais oficinas. Como deixam de estar nas cadeias civis de Lisboa os muitos presos postos à disposição do Govêrno, que até agora lá esperavam durante muito tempo a deportação, tira-se da verba destinada a sustento de presos (Capítulo 6.° artigo 20.° do orçamento) a quantia de 2:500$000 réis. E assim, aproveitadas quantias incluídas no orçamento de despesa, na importância total de 21:200$000 réis, apenas terá de ser votada a diferença, - 6.150$000 réis, bem insignificante em relação ao* benefício que da proposta resultará, quando convertida em lei.

No artigo 27.° estabelece se uma pena Correccional para os estrangeiros expulsos do território português que a êle voltem antes de decorrido o prazo da expulsão. E esta uma maneira de efectivar, como é indispensável, a pena de expulsão, que sem ela se tornava irrisória, porque o estrangeiro expulso, entrava novamente, o que só podia, determinar segunda expulsão, a respeito da qual êle procedia como da primeira vez fizera.

E no, § único, ressalva-se o disposto no artigo 44.° e parágrafos do decreto de 31 de Dezembro de 1910 relativamente aos jesuítas, por se tratar dum preceito determinado por especial necessidade de defesa da República contra tais indivíduos.

No artigo 28.° tornou-se extensiva a disposição do. § único do artigo 391.° do Código Penal aos casos em que a pessoa ofendida tenha menos do 16 anos. A fixação da idade para tal fim liga-se com o desenvolvimento normal dos indivíduos. Ora, desde que no decreto de 25 de Dezembro de 1910, se estabeleceu como idade mínima para o casamento dos indivíduos do sexo femenino (que são aqueles a que principalmente se atende no referido parágrafo do Código Penal) a de 16 anos, em vez da de 12 fixada no Código Civil, razoável era a disposição consignada na presente proposta, para harmonizar os preceitos

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contidos em leis diversas, inspiradas nos mesmos princípios.

Dá-se aos juizes de Investigação Criminal competência para julgar os crimes indicados, para que, em casos simples e de fácil averiguação, quando realizadas as prisões em flagrante delito, haja toda a brevidade na aplicação das penas.

Eis, em resumo, o que contêm a proposta, cuja aprovação trará ao país e mormente às grandes cidades, vantagens que, num futuro bem próximo, facilmente se apreciarão.

Artigo 1.° Aquele que, sendo maior de 16 anos, não tenha meios de subsistência, nem exercite habitualmente alguma profissão, ou oficio, ou outro mester em que ganhe sua vida, não provando necessidade de fôrça maior que o justifique de se achar nestas circunstâncias, será declarado vadio e internado num dos estabelecimentos a que se refere o artigo 14.°, por tempo não inferior a três meses nem superior a seis anos.

Art. 2.° Todo o indivíduo, apto para ganhar sua vida pelo trabalho, que for encontrado a mendigar, será condenado a prisão correccional até dez dias.

§ único. A disposição dêste artigo é tambêm aplicável:

1.° Aquele que, sendo inapto para ganhar sua vida pelo trabalho, for encontrado a mendigar em contravenção dos regulamentos administrativos.

2.° Aquele que, tendo solicitado do Estado fornecimento de trabalho, por qualquer forma ceder a outrem a respectiva guia para ser admitido a trabalhar.

3.° Aquele que exercer a mendicidade sob a simulação de venda de artigos de comércio, de bilhetes ou cautelas de lotarias, ou da prestação de outros serviços semelhantes.

Art. 3.° Será condenada em prisão correccional dum mês a um ano:

1.° Aquele que se entregar à prática de vícios contra a natureza.

2.° Os mendigos que simularem enfermidades ou que empreguem ameaças ou injúrias.

3.° Aquele que explorar a mendicidade com menores de 16 anos.

Art. 4.° Será condenado em prisão correccional de seis meses a dois anos aquele que viver a expensas de mulher prostituída.

Art. 5.° São considerados vadios para os efeitos da presente lei, e como tal declarados na última sentença condenatória, os que sendo maiores de 16 anos e não tendo ainda completado 60, incorrerem por crimes nas condenações indicadas em alguns dos números seguintes:

1.° Duas condenações em penas maiores.

2.° Uma condenação em pena maior e duas em penas correccionais.

3.° Cinco condenações em penas correccionais.

§ 1.° Para os efeitos dêste artigo tem-se em consideração as condenações anteriores à publicação da presente lei; mas, qualquer que seja o seu número e natureza, só poderá ter lugar a sua aplicação quando ocorrer nova condenação nas condições prescritas.

§ 2.° Também serão computadas para os efeitos dêste artigo as condenações que tiverem sido proferidas por tribunais militares sôbre crimes comuns, e aquelas sôbre que tiver recaído indulto ou comutação ou houver prescrição.

§ 3.° As condenações por crimes políticos e de abuso de liberdade de imprensa, bem como pelos crimes previstos e puníveis pelos artigos 368.°, 369.°, 381.° a 388.°, 407.°, 410.°, 411.°, 419.° e 420.° do Código Penal, serão excluídas para os efeitos da presente lei.

Art. 6.° As reincidências no crime de vadiagem serão punidas com um internato por tempo não inferior ao dôbro da duração do internato imediatamente anterior, mas não podendo, em caso algum, ser superior a seis anos.

Art. 7.° A primeira reincidência no crime do artigo 2.° e seu parágrafo será punida com prisão correcional por trinta dias; a segunda, com prisão correccional por sessenta dias, e a terceira será considerada crime de vadiagem para os efeitos do artigo 1.°

Art. 8.° A primeira reincidência no crime do artigo 4.° será considerada crime de vadiagem, para os efeitos do artigo 1.°

Art. 9.° A primeira reincidência nos crimes previstos no artigo 3.° será punida com prisão correccional de seis meses a dois anos, e a segunda reincidência nos mesmos crimes será considerada crime de vadiagem para os efeitos do artigo 1.°

Art. 10.° A quarta e seguintes reincidências nos crimes previstos no artigo 2.°, a terceira reincidência e seguintes nos crimes previstos no artigo 3.° e a segunda reincidência no crime previsto no artigo 4.° serão punidas nos termos do artigo 6.°

Art. 11.° Entre os mínimos e os máximos estabelecidos nos artigos 1.° e 6.°, o internato durará até que o Ministro da Justiça ordene a sua terminação, sob parecer fundamentado do conselho disciplinar do estabelecimento, que será constituído pelo director, secretário e médico.

Art. 12.° Logo que o internado seja restituído à liberdade, o director do estabelecimento comunicará ao respectivo encarregado do registo criminal o tempo por que durou o internato, a fim de por êste ser feito o averbamento no respectivo boletim.

§ único. Nos certificados do registo criminal relativos a menores não se fará menção das condenações pelo crime previsto no artigo 1.°, salvo quando tais certificados sejam passados a requisição de qualquer autoridade.

Art. 13.° O Govêrno poderá deportar para qualquer prisão das províncias ultramarinas, sôbre proposta fundamentada do conselho disciplinar, qualquer internado que se mostre incorrigível ou cuja presença se torne perigosa no estabelecimento.

§ único. Esta deportação durará pelo tempo necessário para se atingirem, conforme o caso, os máximos fixados nos artigos 1.° e 6.°

Art. 14.° Para os efeitos desta lei, são criadas: uma Casa Correccional de Trabalho e uma Colónia Penal Agrícola.

Art. 15.° O juiz declarará sempre na sentença condenatória se o réu há-de ser internado na Casa Correccional de Trabalho ou na Colónia Penal Agrícola, sem prejuízo das transferências dum para outro estabelecimento, que poderão ser determinadas pelo Ministro da Justiça, sôbre parecer fundamentado do director do estabelecimento aonde estiver o internado a transferir.

§ único. Na distribuição dos condenados por aqueles estabelecimentos ter-se há especialmente em vista a idade, antecedentes, robustez, meio em que viveram, profissão que, porventura, tivessem exercido e tendências manifestadas.

Art. 16.° A Penitenciária de Coimara será transformada em Casa Correccional de Trabalho, devendo ter imediatamente essa aplicação, embora com carácter provisório.

Art. 17.° O pessoal da Penitenciária de Coimbra ficará servindo, com a sua respectiva dotação, na Casa Correccional de Trabalho; e é o Govêrno autorizado a proceder à remodelação interna de todos os respectivos serviços, dentro da dotação orçamental, sem prejuízo dos direitos dos actuais empregados e sem poder criar novos lugares. § único. São extintos os lugares de sub-director, capelão e médico adjunto e é criado mais um lugar de professor, com o ordenado de 360$000 réis que será provido no antigo capelão.

Art. 18.° A Colónia Penal Agrícola será instalada em edifício e terrenos adequados, que o Govêrno determi-

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nará, com o seguinte pessoal: 1 director, escolhido de entre os juizes de primeira instância; 1 secretário, escolhido de entre os delegados da Procuradoria da República; 1 médico; 1 regente agrícola, feitor; 2 professores; 2 escriturários; 1 ecónomo e o pessoal extraordinário contratado que fôr necessário.

§ 1.° Todos os lugares, à excepção de director, secretário e o pessoal contratado, serão providos por concurso e o de ecónomo sujeito a caução.

§ 2.° O serviço desempenhado por juizes e delegados nos lugares de director e secretário da Colónia Penal Agrícola é considerado, para todos os efeitos, como serviço prestado nas respectivas magistraturas.

§ 3.° No Orçamento Geral do Estado será inscrita a verba de 27:350^000 réis, para a adaptação do edifício e terrenos para a Colónia Penal Agrícola, e para a sua instalação e funcionamento, nos termos da tabela anexa.

Êste encargo foi reduzido a 6:150$000 réis, atendendo ao disposto no artigo 31.° e seus parágrafos.

Art. 19.° Aos guardas e pessoal de serviços domésticos de todos os estabelecimentos penais já existentes ou criados pela presente lei, bem como dos de protecção a menores, será fornecida alimentação pelos respectivos estabelecimentos.

Art. 20.° Todo o pessoal dos estabelecimentos penais existentes, como o dos criados pela presente lei, pode, independentemente da licença, usar armas de qualquer espécie, quando em serviço dentro ou fora dos estabelecimentos.

Art. 21.° Fica o Govêrno autorizado, durante o próximo ano económico, a transferir, dentro da dotação total dos estabelecimentos a que se refere a presente lei, duma para outra verba e dum para outro estabelecimento, as quantias que forem necessárias para assegurar o seu bom funcionamento, ainda que no orçamento do Ministério da Justiça as dotações de tais estabelecimentos sejam inscritas em capítulos diversos.

Art. 22.° O pessoal contratado da Casa Correccional de Trabalho e da Colónia Penal Agrícola poderá ser escolhido, sempre que seja possível, de entre os internados.

§ 1.° As nomeações do pessoal extraordinário serão feitas pelos directores dos respectivos estabelecimentos sujeitas à aprovação do Ministro da Justiça.

§ 2.° Os lugares de guardas da Casa Correccional de Trabalho (Penitenciária de Coimbra) serão, à medida que forem vagando, preenchidos por pessoal contratado, nos termos dêste artigo.

Conseqúentemente as quantias destinadas a pagamento de seus vencimentos irão sendo transferidas da verba do pessoal do quadro para a do pessoal extraordinário.

Art. 23.° O produto do trabalho dos presos nos dois estabelecimentos criados pela presente lei constituirá receita própria dos mesmos estabelecimentos.

§ único. O director do estabelecimento terá a faculdade de arbitrar aos internados uma gratificação, de harmonia com o seu comportamento, grau de regeneração, trabalho produzido e quaisquer outras circunstâncias atendíveis, não podendo despender com essas gratificações mais do que quarenta por cento do rendimento líquido do trabalho dos internados.

Art. 24.° Os internados poderão desempenhar as funções do pessoal contratado nos termos do artigo 15.° e seu parágrafo mesmo durante o internato, conforme o seu comportamento e grau de regeneração; mas, para o efeito das respectivas retribuições e emquanto lhes não fôr concedida a liberdade, atender-se há a que continua sujeito ao regime Correccional e a que. elas tem de ser estabelecidas tendo-se em vista o disposto no artigo 18.° e seus parágrafos.

Art. 25.° Emquanto não fôr criado estabelecimento para internato de indivíduos do sexo feminino, os que incorrerem nas disposições dos artigos 1.°, 3.° e 5.° da presente lei serão internados na cadeia de Lisboa destinado a tais indivíduos (Aljube) e aí sujeitos ao regime de trabalho, observando-se em tudo que fôr aplicável a presente lei e sendo as atribuições do conselho disciplinar do estabelecimento desempenhadas pelo director das cadeias civis.

Art. 26.° Todo o estrangeiro que incorrer na sanção dos artigos 1.° a 4.° desta lei poderá ser expulso, pelo Govêrno, do território português, quer antes quer depois de ter cumprido a pena em que foi condenado.

Art. 27.° Todo o indivíduo, nacional ou estrangeiro, que, expulso do território português por virtude de sentença judicial ou determinação legal do Govêrno, a êle voltar antes de findo o prazo da expulsão, quando o haja, será condenado em prisão Correccional nunca inferior a 6 messes e multa correspondente, e pôsto fora da fronteira depois de cumprida a pena.

§ único. O disposto neste artigo não altera o que se acha preceituado no artigo 44.° e parágrafos do decreto de 31 Dezembro de 1910, quanto aos membros da Companhia de Jesus.

Art. 28.° O disposto no § único do artigo 391.° do Código Penal é aplicável sempre que a pessoa ofendida fôr menor de 16 anos.

Art. 29.° Os indivíduos presos em flagrante delito por crimes previstos nesta lei serão julgados nos termos do artigo 7.° e seus parágrafos e do artigo 8.° do decreto de 18 de Novembro de 1910, não podendo ser soltos antes do julgamento.

Art. 30.° Os indivíduos que tenham sido postos à disposição do Govêrno, antes da promulgação desta lei, serão mandados internar, pelo Ministério da Justiça, em qualquer dos estabelecimentos a que se refere o artigo 14.° logo que êstes estejam a funcionar e á medida que fôr havendo vagas, e aí permanecerão pelo prazo máximo de três anos, podendo antes disso ser postos em liberdade nos termos do artigo 11.°

§ único. Se tiverem sido deportados para as províncias ultramarinas aí permanecerão no estabelecimento penal em que se encontrarem por tempo não inferior a três meses nem superior a três anos, a contar da data da promulgação da presente lei, podendo ser, dentro dêstes limites, mandados pôr em liberdade pelo Governador da respectiva província, sôbre parecer fundamentado, nos termos do artigo 11.°, do director, chefe ou comandante do respectivo estabelecimento.

Art. 31.° Para fazer face a parte da despesa proposta no § 3.° do artigo 18.° é o Govêrno autorizado a fazer as seguintes transferências:

§ 1.° Do orçamento do Ministério do Interior, capítulo IV, artigo 20.°, - transporte de vadios e reincidentes para o ultramar, - a quantia de 2:500$000 réis, ficando a mesma verba neste Ministério reduzida a 500$000 réis. § 2.° Do capítulo VI, artigo 15.°, do orçamento do Ministério da Justiça, - pessoal do quadro da Penitenciária de Coimbra, - a quantia de 1:200$000 réis, correspondentes aos vencimentos do sub-director e do médico adjunto do mesmo estabelecimento, lugares êstes que ficam extintos.

§ 3.° Do capítulo VI, artigo 19.°, do orçamento do Ministério da Justiça, - material para as oficinas da Penitenciária de Lisboa, - a quantia de 15:000$000 réis.

Nestas circunstâncias, a Penitenciária de Lisboa só poderá efectuar despesas nas oficinas, independentemente da cobrança de receitas, até a quantia de 38:200^000 réis em vez de 53:200$000 réis, como até agora lhe era facultado.

§ 4.° Do capítulo VI, artigo 20.° do orçamento do Ministério da Justiça, - material e diversas despesas das cadeias do Limoeiro e Aljube, sustento dos presos, - a quantia de 2:500$000 réis.

Art. 32.° É autorizado o Govêrno a decretar os regulamentos difinitivos necessários para a execução da presente lei.

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Art. 33.° Ficam revogados os artigos 256.° a 262.° do Código Penal, lei de 21 de Abril de 1892, artigos 5.°, 6.° e 7.° da lei de 3 de Abril de 1896 e o decreto de 23 de Março de 1899. = O Ministro da Justiça, António Macieira Júnior = O Ministro do Interior, Silvestre Falcão.

Tabela dos vencimentos do pessoal a que se refere o artigo 18.° e parágrafos

[Ver tabela na imagem]

(a) Esta importância só poderá ordenar-se à proporção que for dando entrada nos cofres do Estado.

Admitida. Para a comissão de legislação criminal.

Senhores. - Segundo os princípios estabelecidos pelas maiores autoridades em matéria de organização de forças militares coloniais, devem estas ser sempre enquadradas com o pessoal europeu, para que, pela sua cultura e maior grau de instrução, possa êste pessoal dar àquelas forcas a coesão e unidade necessárias.

É esta a orientação que entre nós tem sempre presidido à organização das forças militares ultramarinas, e nestes termos constituía o exército metropolitano a fonte de recrutamento das praças europeias, quer soldados, quer graduados, de que as colónias precisavam para a constituição dos efectivos das respectivas guarnições.

A organização, porêm, do exército, que presentemente vigora, tendo em vista a permanência nos quadros das suas unidades, dum limitado número de praças, veio dificultar o recrutamento de praças europeias para as forças coloniais, o qual terá de futuro, na sua quási totalidade, de ser feito com praças licenceadas do activo, pertencentes à reserva, e com aquelas que, tendo prestado serviço, militar, se encontrem com baixa.

Não permitindo a legislação em vigor, para os graduados, a reintegração no serviço militar, e sendo conveniente por outro lado, como estímulo à oferta, que se conte aos que de novo forem servir no ultramar, o tempo de serviço militar anteriormente prestado, para efeito da reforma e recompensas, tenho a honra de apresentar á vossa apreciação a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.° É permitido aos indivíduos que, tendo pertencido ao exército, armada e forças militares coloniais, se encontram com baixa de serviço, quando possuam bom comportamento militar e civil, aptidão física e tenham o mínimo de idade de vinte e três anos e o máximo de trinta e cinco anos, a reintegração no serviço militar do ultramar.

Art. 2.° Às praças que, encontrando-se nas condições expressas no artigo antecedente, sejam reintegradas no serviço militar do ultramar, ser-lhes há contado, para efeito de reforma e readmissão, o tempo de serviço prestado no seu anterior alistamento.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrário.

Lisboa, em 3 de Julho de 1912. = Joaquim Basilio Cerveira e Sousa de Albuquerque e Castro.

Projectos de lei

Se em todos os ramos da administração do Estado o Pôrto tem sido até agora, constantemente, quási sistematicamente prejudicado, no que diz respeito à assistência pública, o esquecimento ou, melhor até, o desprezo que aos altos poderes governantes êle tem merecido é da mais flagrante evidência.

Com efeito, pela forma mais absoluta o podemos afirmar, nunca o Estado cuidou em realizar naquela cidade qualquer espécie de assistência pública que não fôsse subsidiar com parcimoniosos donativos dois ou três institutos de caridade.

E esta atitude de desleixo e indiferença para com o Pôrto tomada, que se vem arrastando de há muito, cada vez mais gravidade assumindo, nenhuma desculpa pode merecer de quem quer que seja, nem mesmo terá a justificá-la o excepcional incremento que a beneficência, mercê à generosidade dos particulares, conseguiu atingir naquela cidade.

Repetidas vezes aos governos da monarquia, e agora aos da República, o Pôrto tem feito sentir, em palavras bem amargas de ressentimento e protesto, a sua insustentável e vergonhosa situação em face do problema da assistência, cuja solução não pode de forma alguma alcançar condignamente, sofrivelmente mesmo, só com o auxílio das instituições caritativas de iniciativa particular.

Porque, Srs. Deputados, se é certo que o Pôrto possui muitos estabelecimentos de beneficência, alguns até de grandiosidade invulgar, certo é que êles, dia a dia, se mostram mais insuficientes e acanhados para realizarem, só por si, a obra sempre dispendiosa e difícil duma assistência, tam perfeita e completa quanto é mester, a que o Pôrto, pela sua população, pelas suas especiais circunstâncias de largo centro industrial, pela sua reconhecida e tantas vezes comprovada insalubridade e ainda pela avultada soma com que contribui para as despesas gerais do país, tem incontestável direito.

Bastará dizer-vos que o Hospital Geral de Santo António, cujo custeio está inteiramente a cargo da Santa Casa da Misericórdia do Pôrto, comportando apenas e com sacrifício 600 doentes, tem sempre nos seus livros de inscrição uma média de 250 indivíduos a requererem hospitalização que, por falta de recursos, não pode ser-lhes concedida.

Num dos períodos mais agudos do ano findo (diz-se no relatório ultimamente publicado pela comissão administrativa daquele estabelecimento) verificou-se pelos livros de inscrição estarem à espera de vez, para serem hospitalizados, 187 homens, 190 mulheres e 39 crianças.

Isto é simplesmente vergonhoso.

Preciso e urgente é que o Estado se compadeça desta situação e lhe procure o indispensável remédio.

De resto o Pôrto tem direito a pedir que alguma cousa lhe concedam em matéria de assistência pública; tem mesmo - porque não dizê-lo? - o direito de exigir que lhe ouçam e defiram as suas justíssimas reclamações.

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Solicitamos a vossa atenção para o orçamento do Ministério do Interior e por êle reconhecereis a razão do nosso asserto.

Pelo capítulo da assistência pública, cuja verba total monta à cifra de 1.207:657$790 réis, ao Pôrto cabem, única e simplesmente, cinco contos e tal!!

Acrescentando, porêm, àqueles 5 contos de réis a quantia de 19 contos de réis que, pelo capítulo da Saúde Pública, é atribuído ao Hospital do Bomfim para tratamento de moléstias infecciosas e hospitalização de meretrizes, vê-se que o Estado, para toda a assistência pública do Pôrto, dispende apenas 24 contos de réis anuais ao passo que só em Lisboa gasta nem mais nem menos de 780 contos de réis!

E, emquanto o Pôrto, daquela reduzida quantia de 24 contos de réis, ainda devolve ao Estado 3 contos de réis para os tuberculosos, Lisboa, alem dos 780 contos de réis, recebe mais para assistência, números redondos: - 32 contos da lotaria, 70 contos para o novo hospital de alienados e 44 contos para encargos de empréstimos com obras nos hospitais.

Quer dizer, a assistência pública no Pôrto, merece ao Estado apenas, pouco mas de 21 contos de réis, 9 a capital 1:219 contos de réis!

A diferença é espantosa e irritante!

Não serão, pois, justas todas as reclamações e protestos da segunda cidade da República?

Ninguém ousará, seguramente, negar-lhe razão.

Mas que se pede agora? Um impossível? Um exagero? Não.

Simples e unicamente que concedam ao Pôrto uma cota parte da receita anual do Fundo Nacional de Assistência Pública.

Não se pede ao Estado que se sacrifique, que perturbe a sua economia ou desorganize as suas finanças; pede-se tam somente que não esqueça o Pôrto, como até agora, tem sucedido, na repartição duma verba importante para que êle. largamente, contribui.

Pelo orçamento em discussão vê-se ter a receita do Fundo Nacional de Assistência Pública atingido, neste ano económico, a soma de 294 contos de réis. Tudo leva a crer, porêm, que nos futuros anos económicos ela aumente considerávelmente.

Não será, por isso, demais, Senhores Deputados, que ao Pôrto, que para a sua assistência pública só recebe 21 contos de réis, o Estado conceda, anualmente, da receita daquele fundo, 90 contos de réis, destinados à construção e sustento dum hospital de que tanto necessita, não só para tratamento de enfermos, mas ainda para ensino dos alunos da Faculdade de Medicina.

Dessa quantia, que solicitamos seja concedida ao Pôrto, vereis pelo nosso projecto serem 40 contos de réis aplicados ao pagamento dos encargos anuais - juro e amortização - resultantes dum empréstimo que o Estado, â semelhança do que fez com alguns hospitais de Lisboa e com o das Caldas da Rainha, terá de contrair para a edificação e montagem do Hospital, e os 50 contos restantes destinados para o seu sustento.

Por forma que, dentro do curto prazo, tendo-se liqnidado o empréstimo contraído, o Pôrto ficará apenas recebendo do Fundo da Assistência os 50 contos de réis para subsídio da sustentação do hospital.

Por todas as razoes expostas, e confiando plenamente no vosso comprovado espírito de justiça, temos a honra de vos apresentar o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É criado na cidade do Pôrto um hospital de policlínica para tratamento de 200 enfermos, pelo menos, e ensino dos alunos da Faculdade de Medicina, denominado Hospital da Cidade.

Art. 2.° O referido hospital começará a edificar-se dentro do prazo de três meses a contar da data da aprovação dêste projecto de lei, sendo o local para a sua edificação escolhido pela Câmara Municipal do Pôrto, ouvido o director da Faculdade de Medicina da mesma cidade.

Art. 3.° Para ocorrer às despesas de construção e montagem do Hospital da Cidade fica o Govêrno autorizado a contrair, na Caixa Geral de Depósitos, um empréstimo de 400:000$000 réis.

Art. 4.° Do. Fundo Nacional de Assistência Pública o Govêrno destinará anualmente 40:000$000 réis para pagamento dos encargos de juro e amortização do referido empréstimo, e 50:000$000 réis para subsídio de sustentação do hospital.

Art. 5.° Para as suas despesas ordinárias o Hospital da Cidade, alêm do subsídio de 50:000$000 réis pelo Govêrno concedido do Fundo Nacional de Assistência Pública, disporá mais das seguintes receitas:

a) Do subsídio que a Câmara Municipal do Pôrto lhe possa conceder;

b) Dos subsídios que lhe venham a ser concedidos pelas câmaras municipais do distrito do Pôrto, interessadas na hospitalização dos seus munícipes;

c) Do subsídio que a Faculdade de Medicina do Pôrto possa ceder dos seus rendimentos próprios;

d) Das verbas provenientes da hospitalização de estrangeiros, militares e enfermos que, não sendo indigentes, paguem o seu respectivo tratamento;

e) De doações e legados; e

f) De contribuições voluntárias e produtos de subscrições ou de espectáculos organizados em seu favor.

Art. 6.° O Estado poderá aplicar à sustentação do Hospital da Cidade quaisquer outras receitas que venha a poder dispensar-lhe.

Art. 7.° A administração do Hospital da Cidade fica a cargo duma comissão composta de:

2 vereadores da Câmara Municipal do Pôrto;

1 representante do conselho da Faculdade de Medicina;

1 representante das associações de socorros mútuos do Pôrto;

1 delegado da Junta Autónoma das Obras da Cidade;

1 delegado da Associação dos Jornalistas Portuenses;

E pelo secretário da Faculdade de Medicina.

Art. 8.° O Hospital da Cidade terá um director clínico e um corpo médico efectivo, que serão, respectivamente, o director e corpo docente da Faculdade de Medicina.

Art. 9.° A comissão administrativa, juntamente com o director clínico do hospital, elaborarão um regulamento interno, que será submetido â aprovação do Govêrno.

Art. 10.° Fica revogada a legislação em contrário. = Os Deputados, Adriano Gomes Ferreira Pimenta = Germano Martins = Pádua Correia = Henrique José dos Santos Cardoso = Fernando da Cunha Macedo.

Admitido. Para a comissão de saúde e assistência pública.

Srs. Deputados. - O orçamento apresentado a esta Câmara para 1912-1913 consigna no seu capítulo 4.°, referente aos Palácios do Estado, a seguinte despesa, com a sua administração e conservação:

[Ver tabela na imagem]

Por outro lado, consultando-se o último orçamento aprovado, na parte relativa ao Ministério do Interior, constata-se a espantosa verba de 187:267$067 réis, que não melhorou ainda, antes se tem agravado, relativa à renda de casas de escola, habitação de professores, reparação, etc.

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SESSÃO N.° 128 DE 5 DE JUNHO DE 1912 11

Lisboa tem, para as suas 42 freguesias, apenas 74 escolas primárias oficiais, devendo ter mais de 200. Dessas mesmo nem todas funcionam, havendo 13 freguesias sem escola.

Por uma consulta feita à contabilidade do Ministério do Interior, vê-se que a renda paga anualmente pelo Estado, com as escolas primárias de Lisboa, é de réis 30:000$000.

No Pôrto há tambêm 24 escolas primárias, arrendadas pelo Estado e que no orçamento pesam com a verba de 6:000$000 réis. Relativamente a escolas normais, sabe-se que só a do Pôrto funciona em edifício próprio, estando as outras instaladas em velhos casarões em ruínas, com rendas elevadíssimas. A Câmara Municipal de Lisboa, a quem vai ser entregue êste triste inventário, confirma o nosso pessimismo.

Na sua última reunião, o vereador Agostinho Fortes, encarregado de inquirir do estado do ensino primário na capital, declarou que era horroroso, havendo escolas que são verdadeiras retretes, terminando por alvitrar que a Câmara ceda ao Estado os terrenos necessários para a construção de edifícios próprios para escolas.

Nestas circunstâncias, apresento à votação da Câmara o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É o Govêrno autorizado a alienar o palácio e quinta do Alfeite, nos termos das leis em vigor.

Art. 2.° O produto da venda será destinado â construção de escolas primárias em Lisboa e Pôrto, proporcionalmente às suas necessidades.

Art. 3.° Fica revogada a legislação era contrário.

Câmara dos Deputados, 16 de Maio de 1912. = Os Deputados, Tomás da Fonseca = Gastão Rodrigues = Demando da Cunha Macedo = Henrique Caldeira Queiroz = Gaudencio Pires de Campos = Pedro Januário do Vale Sá Pereira = Pereira Vitorino.

Admitido. Para a comissão de agricultura.

O Sr. Presidente: - Peço a atenção dos Srs. Deputados. A esta mesa foi enviada, pelo Senado, uma rectificação a um projecto de lei, aqui votado há dias, no qual, por descuido ou êrro de redacção, deixou, nesta casa do Parlamento, de ser incluído um parágrafo, aprovado pelo Senado, que era necessário para complemento da lei. Vai ler-se, para a Câmara resolver.

Foi lido na mesa o projecto de lei n.° 160, votado pela Câmara dos Deputados.

Foi lido na mesa o parágrafo, aprovado pelo Senado, sôbre o qual não se pronunciara, ainda, a Câmara dos Deputados.

Foi aprovado, sem discussão.

O Sr. Brandão de Vasconcelos: - Mando o seguinte requerimento para a mesa:

Requerimento

Requeiro, pelo Ministério do Interior, nota da importância recebida como pagamento das análises feitas para investigação do bacilo diftérico no Instituto Bacteriológico Câmara Pestana, desde que êste estabelecimento foi, pela autorização concedida pelo artigo 68.° do decreto de 22 de Fevereiro de 1911, agregado à faculdade de Medicina de Lisboa, e bem assim o produto da importância daquelas análises em cada um dos três anos anteriores. = Brandão de Vasconcelos.

Mandou-se expedir.

Aproveito a ocasião, para- me referir a umas observa, coes, feitas há pouco, pelo Sr. Deputado Gouvêa Pinto.

Insurjo-me contra as palavras de S. Exa., porque não compreendo as ideas do Sr. Gouvêa Pinto, ao querer pôr na rua, porque não lhe agrada, um governador que tem sabido cumprir honestamente o seu dever.

As revoltas são periódicas naquela região. E porquê? Porque tem havido sempre uma amnistia para os revoltosos, tendo-se chegado até o ponto de serem condecorados e de se lhe conferir pensões pelos seus actos!

O que é certo é que quando a algum indivíduo falta dinheiro, arma-se logo uma revolta, pois já todos sabem que hão-de ter com que se sustentar durante a maior parte do ano.

Quero, tambêm, referir-me ao caso da destruição de que foi vítima um agricultor que tinha plantado 20:000 pés de borracha. Certamente, daqui para o futuro ninguêm se atreve a fazer plantações com o receio de as ver destruídas.

O governador, a meu ver, andou muito bem em suspender as garantias. Era essa a única maneira de restabelecer a ordem pública.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Gouveia Pinto: - Peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Não posso dar, agora, a palavra a V. Exa.

Vozes: - Apoiado! Apoiado!

O Sr. Gouvêa Pinto: - V. Exas. não querem que se faça luz sôbre o caso.

O Sr. Presidente: - Advirto o Sr. Deputado Gouvêa Pinto de que não está no uso da palavra. Tem a palavra o Sr. Ezequiel de Campos.

O Sr. Ezequiel de Campos: - Eu tinha pedido a palavra há muitos dias, e a ocasião oportuna para falar foi-se-me.

Agora só posso chamar a atenção de V. Exa., Sr. Presidente, para o seguinte: é que não estando presente o Sr. Ministro das Colónias, cuja atenção desejava solicitar para um problema de administração de S. Tomé, limito-me a pedir ao Sr. Presidente que transmita a S. Exa. a minha estranheza pelo facto de se terem inscrito verbas elevadíssimas para trabalhos, que não foram com certeza realizados por tanto dinheiro, no Boletim n.° 18, de 27 de Abril do corrente ano.

Nada mais podendo dizer, porque não está presente o Sr. Ministro das Colónias, deixo por aqui as minhas considerações, esperando outra oportunidade para mais claro e mais detalhado ser no que tenho a dizer.

Tenho dito.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Casimiro de Sá: - Eu tinha pedido a palavra para quando estivesse presente o Sr. Ministro do Fomento; mas como S. Exa. não está, aproveito a ocasião de estar com a palavra para mandar para a mesa um projecto de lei muito simples.

Êste projecto diz respeito ao provimento dos professores dos liceus.

A forma como são actualmente feitos os provimentos dos professores, quer por transferências, quer por nomeações, é perfeitamente arbitrária.

Dá-se uma vaga em qualquer liceu do pais, e aparece nomeado o professor sem que tenha precedido concurso, e sem que a quási totalidade dos professores do país saiba

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que se deu essa vaga, de maneira que a ela não pode concorrer um professor que esteja, por exemplo, no liceu de Bragança ou no liceu de Vila Rial.

Pode estar ali toda a vida, porque não aparecendo vagas, não pode concorrer; e só sabe que existiram vagas depois que elas estão preenchidas.

Mando, portanto, para a mesa um projecto de lei, para o qual peço a urgência, mas não dispensa de Regimento, a fim de que a Câmara tome uma resolução, modificando-o pela forma que entender, porque êste projecto não tem nada com finanças, nem com o aumento ou diminuição de despesa, e tem simplesmente por fim regularizar um serviço público, restabelecer um preceito de justiça, onde ela tem faltado até hoje.

Limito-me a mandar para a mesa o meu projecto, que é muito simples, chamando para êle a atenção da Câmara e dos competentes.

O projecto de lei determina que, logo que ocorra alguma vaga de professor em qualquer liceu, abrir-se há concurso por provas documentais, por espaço de trinta dias, para o seu preenchimento.

Foi a publicar no "Diário do Governo".

Para "segunda leitura".

O Sr. Macedo Pinto: - Pedi a palavra para declarar a V. Exa. que recebi telegramas das câmaras municipais de Lamego, Lagoaça, Moimenta da Beira, Sernancelhe e outras, pedindo-me para instar junto de V. Exa. para pôr em discussão o projecto relativo à demarcação da região dos vinhos do Dão. V. Exa. sabe que êsse projecto foi aqui discutido durante algumas sessões e depois desapareceu; - nunca mais veio à discussão. Êste assunto é importantíssimo, pois pode originar a alteração da ordem naquela região. Peço, portanto, a V. Exa. o obséquio de pôr êsse projecto à discussão o mais depressa possível, - tanto mais que da parte daqueles que se interessam por êle já houve uma entente. Já se chegou a um acôrdo, e portanto é discutido rapidamente.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Morais Rosa: - Pedi a palavra para me referir aos serviços de contabilidade do Ministério do Interior. Há professores primários que tem adiantado ao Estado duzentos e tantos mil réis, e se vêem vexados e perseguidos por dívidas que não são dêles, mas do Estado, isto com a agravante de haver verbas no Orçamento para isso, mas porque os serviços naquela repartição não andam nem desandam. Se há quem possa dar providencias sôbre isso, seria bom que as tomasse.

O Sr. Amorim de Carvalho: - V. Exa. faz me o obséquio de me dizer se na mesa está alguma participação oficial da demissão do Govêrno?

O Sr. Presidente: - Até êste momento nada recebi.

O Orador: - Eu precisamente desejava tratar do mesmo assunto de que tratou o Sr. Macedo, Pinto - e é natural que pedindo para que fôsse pôsto em discussão o projecto dos vinhos do Dão, tambêm gostaria de ouvir a opinião do Sr. Ministro do Fomento para ver se se entrava no assunto a valer, porque se dizia lá por cima que era por uma questão de politiquice que se não deixava passar o projecto.

Fui procurado por um grupo de republicanos de Lisboa que me relataram o que se tinha passado na Juventude Católica, e que viram nos jornais que se prenderam cincoenta indivíduos que lá estavam, deixando-se ir embora o bispo de Portalegre e outros responsáveis. A polícia só notou que havia dois criminosos: um empregado do comércio e um menor de dezoito anos; o resto era tudo santa gente.

Ora, o que eu queria frisar, é êste caso único sucedido com a polícia de Lisboa: é que, pelo facto dos republicanos passarem a responder aos vivas à monarquia, ao rei e ao Papa, com vivas à República, a polícia se lhes dirigisse, e dissesse que não permitia gritos subversivos!

Acho isto extraordinário e se, porventura, houvesse Govêrno, eu pediria providências ao Sr. Ministro do Interior, para êste caso.

Já os vivas à República são vivas subversivos!

S. Exa. não reviu.

O Sr. Ramos da Costa: - Sr. Presidente: a Câmara sabe que o edifício onde se acham instalados os tribunais de 1.ª instância, não reúne condições nenhumas para um estabelecimento daquela ordem; não há adjectivo com que se possam classificar aquelas instalações.

É, portanto, indispensável que a justiça tenha um edifício, pelo menos, decente, porquanto em todos os países civilizados os tribunais se encontram instalados em edifícios luxuosos e extraordinariamente grandes, como sucede, por exemplo, em Bruxelas, em que o palácio da justiça é o maior que existe na Europa.

Há dias li nos jornais que tinha sido apresentado um projecto para edificação dum palácio da justiça na Avenida da Liberdade, palácio que importaria, em muitos milhares de escudos se fôsse construído nas devidas condições.

Parece-me que ao Govêrno, e a todos nós, cumpre, não só fazer as máximas economias nas despesas que não são produtivas, sejam elas de que natureza forem, embora venham reparar algum mal que se tenha dado até ao presente, como tambêm nos cumpre conservar todos os monumentos e edifícios que são do Estado, aplicando-os, o melhor possível, aos fins a que êles se adequem.

E assim, alguns edifícios do Estado, que estavam na posse da família rial, já tiveram alguma aplicação, sucedendo o mesmo a outros edifícios que estavam ocupados por ordens religiosas, mas há ainda muitos que necessitavam ter qualquer aplicação, para se evitar a grande despesa que se faz com a sua conservação, sem proveito algum.

Nestes casos está o palácio da Ajuda que. pela sua extensão, pelo enorme número de divisões que tem, julgo estaria nas condições de ser aplicado para palácio da justiça.

A esta minha idea podem objectar alguns advogados, dizendo que êsse palácio está muito longe do centro da cidade; mas, por muito que seja a nossa consideração pelas conveniências particulares dos advogados, nós devemos pôr sempre, em primeira plana, os interesses do Estado. (Apoiados).

A Câmara apreciará o meu projecto conforme julgar conveniente; mas entendi, por descargo de consciência, que devia apontar êste facto para ser tomado em consideração.

A questão de estar longe não é razão. Precisamos dêsse edifício. Há carreiras de carros eléctricos e outros, alem dos comboios, que fazem o transporte de passageiros de Lisboa para Belém.

Além disso, segundo me consta, pensa-se em estabelecer um presídio na cêrca do antigo Convento das Salésias e portanto fica êste próximo do palácio da justiça.

Devemos aproveitar os edifícios do Estado e não estarmos a alugar casas para instalação de repartições públicas, aumentando desnecessáriamente as despesas do Estado.

Alugou-se uma casa na Rua da Trindade por 7:500$000 réis para a instalação da biblioteca do Ministério das Co-

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lónias, quando na Cordoaria ou noutro edifício do Estado se podia acomodar bem essa biblioteca, sem despesa com a renda.

Há uma circunstância a apontar: é que êsse edifício está sendo arruinado com o enorme peso de papéis e livros do arquivo, e daqui a pouca a proprietária vem pedir uma indemnização, e o Estado tem que lha dar, agravando mais a Fazenda Pública.

Esta biblioteca, que possui documentos de grande valor, tem por baixo uma oficina de funileiro e um carvoeiro, estabelecimentos perigosos e que dum momento para outro podem ser pasto dum incêndio, e lá se perde a biblioteca, o que é uma perda irreparável.

Portanto, peço a V. Exa. que faça constar ao Sr. Ministro das Colónias a conveniência de acabarmos com aquele arrendamento e de mudarmos a instalação daquele arquivo para um edifício do Estado.

A razão por que se alugou a casa da Rua da Trindade foi para a Direcção da Fazenda das Colónias estar mais â larga no Terreiro do Paço, luxuosamente instalada.

Por consequência, isso mostra o pouco zelo que há no serviço público.

Eu, na qualidade de contribuinte, protesto contra todos êstes esbanjamentos. Não terá eco a minha observação, mas o que fico sabendo é que toda a Camará, ou parte dela, ouve as minhas considerações, e já não fica ignorando como estas cousas se vão fazendo; ao mesmo tempo que o público sabe que há um Deputado que pugna pelos seus interesses, pondo de parte quaisquer interesses particulares.

Termino, mandando para a mesa o meu projecto de lei.

A Câmara apreciará êste documento conforme entender.

Foi a publicar no "Diário do Governo".

Para "segunda leitura".

Entrou na sala o Sr. Presidente do Ministério.

O Sr. Presidente do Ministério (Augusto de Vasconcelos): - Declaro que o Govêrno, tendo apreciado o resultado das votações ontem efectuadas nesta casa do Parlamento, reconheceu que não dispunha do apoio da maioria parlamentar, necessário para a sua missão. Nestas circunstâncias, apresentou a sua demissão colectiva ao Sr. Presidente da República. É a comunicação que tenho a fazer ao Sr. Presidente e à Câmara.

Feita esta comunicação o Sr. Presidente do Ministério saiu da sala.

O Sr. Vitorino Guimarães: - Por parte da comissão de finanças, mando para a mesa o parecer da mesma comissão sôbre a proposta de lei do Sr. Ministro do Interior autorizando o Govêrno a reforçar, com 19:300$000 réis, a verba fixada por lei de 30 de Dezembro de 1911, para férias ao pessoal da Imprensa Nacional.

O Sr. Presidente: - Como vai passar-se à ordem do dia, convido os Srs. Deputados que tenham papéis a mandar para a mesa, a fazê-lo.

Documentos enviados para a mesa

Requerimentos

Requeiro que, pelo Ministério do Interior, com a máxima urgência, me seja fornecida cópia dos documentos existentes no mesmo Ministério e referentes à dissolução da Comissão Administrativa da Câmara de Gaia, a que o Exmo. Ministro se referiu na sessão desta Câmara do dia 3 de Junho, e do estudo dos quais resultou o não ser homologada a sentença do Tribunal Administrativo dada sôbre esta questão, pelo convencimento que o mesmo Exmo. Ministro teve (na frase de S. Exa.) de que essa sentença não traduzia a expressão da justiça. = Costa Basto.

Mandou-se expedir.

Requeiro, com urgência, pelo Ministério do Interior:

Cópia do ofício ou informação oficial dirigido pelo director da Escola de Arte de Representar ao Ministério do Interior, sôbre os indivíduos que se propuseram candidatos às 3.ª e 8.ª cadeiras da mesma escola;

Informação sôbre se todos os candidatos, apresentaram, dentro do prazo fixado no programa dos respectivos concursos, os documentos nele exigidos, e não os tendo apresentado quais os documentos com que faltaram então, ou que ainda não apresentaram até esta data;

Informações das razões justificadas do adiamento dos concursos daquelas duas cadeiras para o mês de Outubro, tendo terminado em 3 de Abril o prazo para a apresentação dos requerimentos, documentos e teses impressas. = Prazeres da Costa.

Mandou se expedir.

Requeiro que, pelo Ministério da Justiça, me sejam enviados os autos (ou auto) de investigação administrativa sôbre os actos do padre Ferreira Neves, ex-pároco encomendado da freguesia de Rio Tinto, concelho de Gondomar. = O Deputado, Alexandre de Barros.

Mandou-se expedir.

Requeiro o "Boletim da Direcção Geral de Agricultura, Anuários dos Serviços Florestais e Agrícolas" (especialmente o n.° 4.°).

Tenho urgência dêste documento para estudos que estou a fazer. = Ezequiel de Campos.

Mandou-se expedir.

Parecer

Da comissão de marinha, aprovando o projecto de lei n.° 251-B.

Foi a imprimir.

Nota de interpelação

Desejo interpelar o Sr. Ministro do Interior sôbre as demoras nos pagamentos de vários subsídios a que tem direito os professores primários, esperando ouvir de S. Exa. quais as medidas que tenciona tomar para pôr em ordem a Direcção de Instrução Primária, e para se pagar a tam modestos funcionários aquilo que há muitos meses lhes é devido. = Alberto Souto.

Mandou-se expedir.

ORDEM DO DIA

Primeira parte

Continuação da discussão, na generalidade, do Orçamento do Ministério do Fomento

O Sr. Presidente: - Vai continuar a discussão, na generalidade, do Orçamento do Ministério do Fomento.

O Sr. Jacinto Nunes: - Peço a V. Exa. que consulte a Câmara sôbre se permite que a comissão de admi-

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nistração pública reuna durante a sessão, para apreciar o Código Administrativo.

Consultada a Câmara, resolveu afirmativamente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Macedo Pinto.

O Sr. Macedo Pinto: - Não vai discutir o orçamento de despesas referente ao Ministério do Fomento nas suas minuciosidades. Vai, apenas, referir-se a uma verba inscrita no artigo 46.°, destinada às estações experimentais de agricultura. Sente não haver já Ministro do Fomento, pois tencionava dirigir-se a S. Exa. para lhe preguntar qual era a forma como desejava distribuir essa verba consignada no artigo 46.°

O orador refere-se, em seguida, á região do Douro, acentuando que êste foi sempre sistematicamente desprezado por todos os governos da monarquia, e afigura-se-lhe que o continua a ser pelos governos da República. A região do Douro é importantíssima; compõe-se de 21 concelhos e de 340:000 habitantes actualmente está atravessando uma crise agudíssima, vendo fugir para o Brasil nada menos de 6:000 habitantes por ano. Pelos seus vinhos licorosos, aquela região produs 9:000 contos em ouro. Precisa ter, por consequência, uma protecção especial.

Alude, depois, à lei de Setembro de 1908, que, em seu entender, era uma devida satisfação às justíssimas reclamações da região do Douro, e frisa o facto de ter o sul exigido, ao mesmo tempo, do Govêrno, medidas excepcionais em seu proveito.

Se houvesse Govêrno, queria êle, orador, pedir, ou mesmo exigir, do Ministro do Fomento, que fizesse estabelecer uma estação experimental de agricultura no Douro, cuja criação, a seu ver, se impõe como impreterivelmente para já.

A crise continua a ser angustiosa. Os proprietários vivem miseravelmente, visto que a maior parte dos vinhedos estão entregues a estrangeiros; o trabalhador vive miseravelmente, tambêm, e é quási milagrosamente que o operário consegue viver. O Govêrno Provisório da República viu-se na imperiosa e inadiável necessidade de perdoar as contribuições no Douro. Aquela região só tem duas culturas: a do vinho e a do azeite; e pena é, no entender do orador, que se não cultivem os frutos que são saborosíssimos. Não há meios de comunicação. As estradas que existem são de longa data, algumas de 1840, o que mais dificulta as relações com outras regiões. Por tudo isto o Douro merece uma protecção especial.

Por último, refere-se a uma parte do artigo 33.°, e, parecendo-lhe que se trata de aumento de vencimentos, deseja saber qual é a aplicação da verba de 38:072$000 réis.

Termina, lamentando que não tivessem vindo à Câmara os desenvolvimentos dos orçamentos dos serviços autónomos, pois que entende que o Parlamento tem obrigação de saber como se despende o dinheiro da Nação.

O discurso será publicado na íntegra quando S. Exa. restituir as notas taquigráficas.

O Sr. Vitorino Guimarães (por parte da comissão de finanças): - Há dias foi aqui apresentada uma proposta pelo Sr. Ministro do Interior, abrindo um crédito extraordinário de 19:300$000 réis para se pagarem as férias do pessoal da Imprensa Nacional.

Não havendo actualmente dinheiro para pagar as férias àquele pessoal, como as folhas tem de ser feitas até quinta-feira, a comissão de finanças pede a V. Exa. que consulte a Câmara sôbre se autoriza a urgência e a dispensa do Regimento a fim dêsse projecto entrar desde já em discussão. O projecto é aquele em que a comissão de finanças converteu a proposta de lei do Sr. Ministro do Interior.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Presidente: - Vou consultar a Câmara sôbre a urgência e dispensa do Regimento pedidas pelo Sr. Deputado Vitorino Guimarães. Devo declarar que o projecto a que S. Exa. se referiu já tem o parecer da comissão de finanças.

Consultada a Câmara, aprovou a urgência e a dispensa do Regimento.

Foi lido na mesa o projecto de lei.

É o seguinte:

Projecto de lei

Artigo 1.° É o Govêrno autorizado pelo Ministério do Interior a reforçar com 19:300$000 réis a verba designadamente inscrita no capítulo 7.°, artigo 3.°, da despesa ordinária do dito Ministério, fixada por lei de 30 de Dezembro de 1911, com aplicação a férias ao pessoal das oficinas, armazéns e escola da Imprensa Nacional.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário.

O Sr. Presidente: - Está em discussão na generalidade.

O Sr. Santos Moita: - Sr. Presidente: embora concorde com o parecer da comissão de finanças, lamento que a Imprensa Nacional seja um dos grandes cancros do Estado, aquele que maior verba consome sem proveito algum para o mesmo Estado.

Entendia eu que era bom, que, tendo-se entrado no problema das realizações concretas, o Govêrno reformasse a Imprensa Nacional, transformando êsse estabelecimento numa cooperativa e entregando-a aos seus empregados para êles a explorarem.

Far-se-hia assim alguma cousa de proveitoso para o país.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Presidente: - Como não está mais nenhum Sr. Deputado inscrito, vai votar-se.

Foi aprovado, o projecto na generalidade.

O Sr. Afonso Ferreira: - Peço a contraprova.

Procedeu-se à contraprova, dando a votação o mesmo resultado.

Foi aprovado o projecto na especialidade.

O Sr. Vitorino Guimarães: - Peço a V. Exa. que consulte a Câmara sôbre se dispensa a última redacção dêste projecto, a fim de que possa seguir imediatamente para o Senado.

Consultada a Câmara, foi dispensada a última redacção do projecto.

O Sr. Aquiles Gonçalves (relator): - Sr. Presidente: como relator do Orçamento do Ministério do Fomento, vou procurar responder às considerações feitas pelo Sr. Deputado Macedo Pinto.

Estou convencido de que qualquer Ministro do Fomento não negará o estabelecimento duma estação experimental na região do Douro.

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Essas estações experimentais hão-de dar bom resultado, como já se tem observado na estação experimental de agricultura de Queluz.

Quanto aos aumentos de despesas consignados no orçamento em discussão, tenho a dizer que foram feitos com critério de utilidade.

A diuturnidade de serviço acarretou, evidentemente, um aumento de despesa que se acha inscrito no orçamento.

S. Exa. não reviu.

O Sr. João Barreira: - Mando para a mesa um parecer, por parte da comissão de instrução superior e especial, aprovando o projecto de lei n.° 248-A.

Foi a imprimir.

O Sr. António Maria da Silva: - Começa por ler a seguinte

Moção

A Câmara, reconhecendo a inconveniência de se discutirem os orçamentos de quaisquer Ministérios sem préviamente se ter submetido ao exame do Congresso algumas das reformas do Govêrno Provisório, muito em especial as que directamente contendem com a economia do país e a sua defesa, entre elas a dos correios, telégrafos, telefones e fiscalização das indústrias eléctricas, resolve anteceder a aprovação do Orçamento de 1913-1914 da análise dessas leis e continua na ordem do dia. = António Maria da Silva.

Defendendo a sua moção, declara que não pode admitir, como Deputado, que as leis que contendem, absolutamente, com o Orçamento Geral não tenham sido préviamente revistas, a fim de que ninguêm pudesse alegar ignorância quando aprovasse ou rejeitasse qualquer das verbas pertencentes aos serviços autónomos. Não é culpa das estações, oficiais, que enviaram, a tempo, os seus desenvolvimentos para o Ministério das Finanças.

O orador alude, depois, às afirmações erróneas que se tem feito acêrca do aumento havido nos Correios e Telégrafos, dizendo que se algum aumento houve foi insignificante e não beneficiou os empregados, mas, apenas, teve por fim corresponder às necessidades do país.

Todos reclamam a necessidade absoluta de desenvolver os serviços públicos, mas a República não pode fazer num ano o que as administrações monárquicas não fizeram em mais de vinte. De resto, sem se terem aumentado as verbas, simplesmente por economias feitas tem-se obtido muito mais do que a monarquia nunca fez.

O orçamento dos serviços autónomos dos Correios e Telégrafos é tam minucioso que êle, orador, não conhece serviço público que o seja mais, visto que a qualquer pessoa é dado fazer o exame dêsse orçamento.

Acêrca dos aumentos de ordenados aos empregados dos correios e telégrafos, deve dizer que êsse aumento é justo, visto que o serviço dos empregados dos correios e telégrafos tem aumentado muito, alem de que êsses funcionários prestam serviço extraordinário.

Falou-se, tambêm, no ordenado do administrador geral dos correios e telégrafos.

O ordenado do administrador geral dos correios não aumentou, como se pretendeu dizer, na República. Na monarquia êsse lugar era exercido por dois funcionários. O director dos correios e telégrafos tinha 1:400$000 réis de ordenado e mais uma percentagem sôbre as receitas. Agora o administrador geral dos correios e telégrafos tem 2:400$000 réis, mas não recebe nenhuma percentagem. Deve dizer que êsse funcionário para ter razão e autoridade de fiscalizar as despesas públicas e poder discutir, se êste ou aquele tinha a remuneração conveniente, teve a ombridade de dizer ao Sr. Ministro do Fomento dêsse tempo, que era uma criatura revolucionária e que não queria que ninguêm dissesse que tinha vindo para a República unicamente para encher a barriga. Discutiu com o Sr. Ministro do Fomento e disse que não convinha fixar-lhe ordenado, a fim de ficar livre para a discussão. O Ministro respondeu que êle, orador, podia abandonar o cargo por qualquer circunstância e que, por isso, não tinha o direito de prejudicar quem lhe viesse a suceder.

Depois de feitas estas afirmações, quem tiver direito para lhe arremessar a primeira pedra que lha atire.

O discurso será publicado na íntegra quando S. Exa. restituir as notas taquigráficas.

O Sr. Brito Camacho: - Sr. Presidente: o Ministro do Fomento a que acaba de referir-se o Sr. António Maria da Silva, era eu.

Não foi S. Exa. que fixou o ordenado do Administrador dos Correios e Telégrafos.

Quem o fixou fui eu. E fixei-o, para não prejudicar quem lhe viesse a suceder no cargo.

Eu disse então a S. Exa.: "não posso remunerar êsse funcionário com generosidade, mas tenho de o remunerar, pelo menos, com a decência devida".

E apesar da situação difícil em que se encontra o Tesouro Público, eu não tive dúvida em aumentar êsse vencimento.

Sou eu, pois, o responsável pela fixação do vencimento do Administrador Geral dos Correios e Telégrafos.

O Sr. Presidente: - Vai ler-se a moção do Sr. António Maria da Silva.

Foi admitida a moção do Sr. Deputado António Maria da Silva.

O Sr. Fernando Macedo: - Sr. Presidente : no último dia em que se discutiu o orçamento pareceu-me que o Sr. Ministro do Fomento inferiu das considerações que então expuz, que eu queria que, ao mesmo tempo que da verba destinada â construção de estradas se retirasse uma certa importância para ir reforçar a da conservação, a distribuição do excesso da verba da construção fôsse feita proporcionalmente à área de cada um dos distritos.

Ora eu não disse nem quis dizer isso . O que eu disse, e repeti por várias vezes, foi que, da maneira como as estradas estavam arruinadas, em virtude dos últimos temporais, e na previsão de que êles se venham novamente a repetir-se, havia necessidade de aumentar a verba da conservação e reparação, reservando todavia uma determinada importância para a conclusão das mais importantes obras de arte, bem como para o empedramento das terraplanagens executadas, pois que qualquer dêstes trabalhos não podia abandonar-se, sob pena de se perderem por completo.

S. Exa. disse que era materialmente impossível distribuir a verba destinada á construção de estradas proporcionalmente à área dos diversos distritos, pois que, se tal se fizesse, não se satisfariam as necessidades de todos êles.

Evidentemente que eu nunca poderia ter dito isso, porque a admitir a distribuição dessa verba, proporcionalmente à área de cada distrito, seria o distrito de Beja o mais contemplado, quando é certo que eu procuro pôr em evidência u de Bragança, como o mais necessitado de vias de comunicação.

O que eu desejaria que se fizesse era um trabalho mais completo do que aquele que realizei, e em que fundamento as minhas considerações, trabalho estatístico por iniciativa do Ministério do Fomento e executado em

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todos os distritos, nas respectivas direcções de obras públicas, e do qual constassem as necessidades de cada um, em face da sua riqueza agrícola, minéria, industrial, etc.

E, Sr. Presidente, se essa estatística fôsse feita de harmonia com os dados que apresentei à Câmara e que hoje, em parte, vou repetir, todos podiam ter a certeza de que a distribuição seria o mais justa e equitativa possível.

Assim, Sr. Presidente, voltando a falar do distrito de Bragança, que é o que mais carece dêstes melhoramentos, vou dizer à Câmara as circunstâncias em que se encontra um dos mais ricos distritos do país, rico não só sob o ponto de vista dos seus jazigos minérios, mas tambêm sob o ponto de vista da agricultura.

O concelho de Miranda, está completamente isolado e separado do concelho de Vimioso por 20 quilómetros e do de Mogadouro por 19; o concelho de Freixo de Espada-á-Cinta está separado do de Mogadouro por 40 quilómetros, do de Moncorvo por 48 e da estação da Barca de Alva por 10; o de Carrazeda está separado do de Vila Flor por 15 quilómetros; e tanto o de Freixo, como o de Carrazeda completamente isolados.

Se esta estatística fôsse um trabalho perfeito, saber-se-hia que era da maior urgência a construção dos 10 quilómetros de estrada para completar a ligação de Freixo com o terminus do Caminho de Ferro do Minho e Douro, porque a drenagem dos seus variados, abundantes e riquíssimos produtos agrícolas nunca se fará para o norte, mas sim e quási exclusivamente para Barca de Alva.

Se a estatística se baseasse nestes dados, veríamos que uma pipa de vinho produzida neste concelho é sobrecarregada com o transporte em carro de bois desde a propriedade até o embarcadouro, ou sejam 800 réis; 1$200 réis de transporte pelo Rio Douro, até a sua margem esquerda próximo da estação de embarque, e ainda 240 a 300 réis desde a margem esquerda do rio até o cais de embarque.

Mas isto não é tudo, pois ainda temos que levar em conta (c)s prejuízos sofridos pelo proprietário ao afundar-se um barco com uma carregação de vinhos ou de azeitona, e adicionar-lhes os prejuízos causados pelas cheias muitas vezes inesperadas do rio, que encontrando o areal pejado de mercadorias e produtos agrícolas, por falta de meios de transporte, os arrasta na impetuosidade da corrente por falta de tempo e de recursos para os remover para lugar seguro.

Esta estatística poder-nos-hia dizer mais que o concelho de Miranda, quási desconhecido, e só assim se explica o abandono a que tem sido votado, é digno duma especialíssima atenção pela riqueza minéria que o seu solo abriga, tornando-se notáveis os seus preciosíssimos mármores e alabastros, que fazem quási inexplorados, devido à falta de comunicações que permitam o transporte de aparelhos modernos para a sua económica extracção e manipulação.

Sr. Presidente: sou eu talvez um dos poucos membros desta Câmara que conhecem um tanto de perto, a triste história dêstes importantíssimos jazigos marmóreos, cujo filão se presume estender-se e abranger quási todo o concelho de Bragança, ou seja uma extensão de aproximadamente 50 quilómetros.

Várias tem sido as empresas organizadas para levar a efeito a exploração daqueles riquíssimos calcáreos; mas todas tiveram de abandonar tam lucrativo empreendimento porque nunca o Estado acorreu a auxiliá-las.

Procurou uma destas empresas exportar para o país vizinho os mármores em bruto, pois que eram isentos de direitos ou incidia sôbre êles uma insignificante percentagem ad valorem; mas a estrada a construir até Zamora, e muito principalmente até a fronteira, era tam dispendiosa, que esta tentativa fracassou como todas as outras.

É pena ver grandíssimas placas de mármore de 20 e mais metros quadrados de superfície, cornpletameate abandonadas, tendo de se subdividir em pequenos fragmentos, a fim de poderem ser transportadas a dorso de cavalgadura até Macedo de Cavaleiros, único ponto em que podem ser trabalhadas, para o caminho de ferro.

Tudo isto nos podia dizer a estatística organizada no Ministério do Fomento, e assim ficaria o respectivo Ministro habilitado a satisfazer os justos interesses das regiões mais importantes e mais atrasadas do país, desenvolvendo a economia local e geral, pelo impulso que a agricultura e as novas indústrias a estabelecer receberiam.

Lastimo que não tenhamos ainda Ministro do Fomento, para poder ouvir estas reclamações; mas como a lição estava estudada, tinha de dar o meu recado.

Outra questão é o caminho de ferro do Pocinho a Miranda, duma importância capital, não só sob o ponto de vista do transporte dos produtos agrícolas e mercadorias de toda a ordem, como tambêm por encurtar a viagem para o norte da Europa.

Eu, depois de organizado o novo Ministério, terei ocasião de chamar a atenção do novo Ministro do Fomento para êste problema de capital importância.

Outro assunto ainda, que na tabela de despesa do Ministério do Fomento chama a minha atenção, é o seguinte.

Encontram-se nessa tabela verbas destinadas a pessoal extraordinário e a pessoal adido.

É uma cousa que não se compreende bem; porque eu creio que pessoal extraordinário é aquele que é admitido para o desempenho de serviços extraordinários, findos os quais, êsse mesmo pessoal é dispensado; assim como me parece que pessoal adido é todo aquele que existe a mais dos quadros e que, portanto, excede êstes.

Entendo eu que é assim; e sendo assim, como se admite que haja ao mesmo tempo pessoal extraordinário e adido?

É uma cousa incompreensível.

Por exemplo: entre pessoal adido encontram-se porteiros, engenheiros, apontadores, serventes, fiscais dos caminhos de ferro, contínuos, condutores, desenhadores, chefes de conservação, escreventes, etc., etc.

Vamos ver o pessoal extraordinário, e nesta categoria há: amanuenses, escriturários, guarda dum palácio, serventes, contínuos, fieis, guardas de aulas, capatazes, porteiros, jornaleiros, desenhadores, etc.

Portanto, há amanuenses, porteiros, serventes, contínuos, desenhadores, etc., adidos e extraordinários, o que para mim não faz sentido, dando-me a impressão que há pessoal a mais para as necessidades do serviço.

E isto uma herança do passado?

Creio bem; mas é absolutamente indispensável pôr-se um termo a êste estado de cousas.

E isto não sucede só no Ministério do Fomento; sucede em todos.

Ora, é triste que se apresente êste espectáculo desolador: pessoal extraordinário para um lado, pessoal adido para outro; um e outro com categorias iguais.

Se o pessoal adido é o que já não pode fazer serviço, então dê-se-lhe outra designação, mas faça-se um orçamento ciar o"

Outro assunto, que eu deveria reservar talvez para a discussão na especialidade, mas para o qual chamo, desde já, a atenção do Sr. relator, é o seguinte:

No artigo 1.° do capítulo 1.° encontra-se o seguinte:

[Ver tabela na imagem]

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No artigo 1.° do capítulo 1.° a gratificação de 90 escudos e no artigo 7.°, do capitulo 2.°, a mesma gratificação ao mesmo funcionário.

Não compreendo bem como, no mesmo orçamento, o mesmo funcionário se encontra com duas gratificações.

Não há dúvida de que o funcionário é o mesmo; mas creio que isto não passa dum engano, que o ilustre relator desfará.

Limito por aqui as minhas considerações para, na especialidade, tratar doutros assuntos, que já tenho anotados, e com os quais terei de fatigar, mais uma vez, a atenção da Câmara.

O Sr. Joaquim Ribeiro: - Ao ver o orçamento que se discute, encontrei nele uma verba que logo chamou a minha atenção, por ter uma grande disparidade com as outras.

E a que se refere à reparação e conservação de edifícios públicos.

Essa verba é de 700 contos de réis, ao passo que a da construção e reparação de estradas é apenas de 350 contos de réis.

A comissão já reduziu essa verba que era de 800 contos de réis, a 700 contos de réis; mas eu acho extraordinário que, ao passo que para estradas, que é tudo quanto há-de mais urgente fazer-se, se dá uma quantia tam pequena, para a outra se dá uma quantia grande.

A razão é, talvez, a dos operários sem trabalho.

Acho bem que o Govêrno lhes dê trabalho; mas eu quereria, em primeiro lugar, que o Ministro que estivesse na pasta do Fomento, mandasse proceder ao cadastro dêsses operários, para ver quais os competentes, e para ver se êles podiam ter aplicação em obras particulares.

Além disso, nestes últimos anos, tem vindo para Lisboa grande número de operários da província.

Eu entendo que o Sr. Ministro do Fomento poderia aconselhar êsses homens a irem para as suas terras, porque, na província, se não há falta de braços para outros serviços, sente-se bastante essa falta nos serviços agrícolas.

O Sr. Alexandre de Barros: - Sr. Presidente: a situação, para falar sôbre o orçamento do Ministério do Fomento é, para as considerações que eu desejava fazer, a mais inconveniente ou a mais inoportuna. Não está presente o Sr. Ministro do Fomento, de modo que as minhas considerações perder-se hão talvez, se a elas não prestar um pouco de atenção algum dos membros da comissão de finanças da nossa Câmara.

Do desenvolvimento da despesa do orçamento do Ministério do Fomento algumas considerações há necessidade de fazer, por modo que os futuros orçamentos alguma cousa sejam de útil e valioso para o país.

Disse ontem aqui na Câmara, com a autoridade que lhe dão o seu trabalho e a situação especial que ocupou no Govêrno da República, o Sr. Brito Camacho, que o Ministério do Fomento era daqueles em que se gastava dinheiro, que no Ministério do Fomento se não procuravam e não se podiam procurar receitas, imediatamente pelo menos, sem que nesse Ministério se gastasse dinheiro para fomentar a riqueza pública e a vida nacional, porque o contrário era a mesma cousa que não ter Ministério com êsse nome e com essa significação administrativa e política. Disse S. Exa. verdades que importa fixar, a quem amanhã desta Câmara ou de fora dela, sobraçar a Pasta do Fomento.

Do orçamento do mesmo Ministério se apura que uma cousa sucede: e haver uma soma de despesas enormes com funcionários, e haver uma diferença em despesas, com aquilo que nós chamamos absolutamente indispensável, para que as despesas com funcionários sejam produtivas.

Assim verifico que nas estações de fomento agrícola, que nas chamadas escolas industriais, que nos institutos industriais e técnicos, falta uma cousa que é absolutamente indispensável, material para trabalho; que nós estamos a fazer no nosso pais, quási podemos dizer assim, bacharéis em comércio e indústria, mas criaturas absolutamente incapazes de corresponder às necessidades que o nosso país tem na sua expansão comercial.

Sabe-se que uma reforma em verdade produtiva se tentou em Portugal; e tentou-a Emídio Navarro, fazendo dos institutos industriais alguma cousa de prático para o nosso país.

Sabe-se, tambêm, que Ministérios que depois vieram transformaram os institutos técnicos em verdadeiros institutos teóricos, donde saem criaturas intelectualmente aparelhados para tudo que não seja trabalhar, a fim de obter o que é conveniente que se obtenha nesses institutos.

Sr. Presidente: há três questões importantes a que não podemos deixar de atender: são as medidas de fomento, a defesa nacional e a instrução. Estas três questões são basilares para a consolidação da nossa República. Creio que esta minha opinião é a de toda a Câmara. Tratemos, pois, a sério dessas questões, porque assim não só faremos com que a República se consolide, como obteremos que o orçamento tenda quanto possível para o equilíbrio. Peço a V. Exa., Sr. Presidente, que marque para ordem do dia questões de interesse geral, como por exemplo a dos açúcares, pôrto franco, etc.

A propósito dêste orçamento nada mais tenho a dizer, terminando por mandar para a mesa uma proposta reduzindo a verba de 700 contos de réis para construção de estradas a 400 contos de réis. Isto é não só um corte nas despesas como concorre um bocadinho para o equilíbrio orçamental; e é com êstes pequenos nadas que poderemos concorrer eficazmente para que o orçamento se equilibre.

Quando chegarmos ao Ministério das Finanças, não deixarei de falar no aumento de ordenado que os funcionários dêsse Ministério obtiveram. E proporei que se suprima o aumento feito aos vencimentos dos funcionários dêsse Ministério, porque não permitindo as forças do Orçamento que se melhore igualmente a situação dos funcionários dos outros Ministérios, não é justo que se mantenha essa desigualdade que de resto não está em harmonia com as circunstâncias apertadas do Tesouro Público.

É extraordinário, por exemplo, que o porteiro do Ministério das Finanças ganhe tanto como ganha um oficial do exército. É preciso que nós cortemos, doa a quem doer; se a Câmara se quere acreditar, é preciso que se resolva a cortar todas as despesas a mais, injustas, e que ponha tudo num pé de igualdade.

Mais tarde, quando as circunstâncias do Tesouro o permitam, serei eu o primeiro a querer que sejam pagos condignamente todos os funcionários públicos; mas emquanto se não pagar a todos por igual, é injusto, e o Sr. Ministro das Finanças do Govêrno Provisório teve culpa, dando o exemplo de esbanjamento, aumentando os vencimentos aos funcionários do seu Ministério, ao passo que os funcionários dos outros Ministérios os não tem e reclamam com razão.

A minha proposta é a seguinte:

Proposta

Proponho que a verba de 800 contos de réis para a conservação e reparação de edifícios públicos seja reduzida a 450 contos de réis. = O Deputado, Joaquim Ribeiro.

Foi admitida.

Eu recordarei à Câmara que a Alemanha cuida muito a sério no seu ensino técnico; mas, apesar disso, já deixou que outros povos lhe passassem adiante, como, por exemplo, a Itália.

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A Alemanha, com o seu feitio comercial, não pode vender os seus produtos, ao passo que a Itália, numa situação inferior, pode, de facto, aproveitar alguma cousa dêsse comércio da Alemanha. São factos constatados na nossa terra e dos quais nós devemos tirar ensinamento, no sentido de que o ensino seja produtivo.

Disse o Sr. Brito Camacho, e do relatório de S. Exa., como Ministro do Fomento se apura, que S. Exa. não disse senão a verdade, que, tendo concedido a uma espécie de corporação particular, o ensino agrícola, essa corporação tinha produzido trabalho tam útil, que dentro de pouco tempo o Estado não teria que subsidiá-la.

Ora o que se fez para o ensino agrícola, era o mesmo que se devia seguir para o ensino comercial.

S. Exa. sabe que há, no nosso país, institutos de ensino comercial, devidos á iniciativa particular, que estão prestando altíssimos serviços ao nosso comércio, e que êsses altíssimos serviços contrastam com o que actualmente prestam os institutos oficiais.

Parece-me, por consequência, que ao organizar-se êste ensino, não se devia atender simplesmente a aumentar o número de professores, mas, principalmente a dar aos professores oficiais os elementos necessários para que êles possam preparar bons alunos e futuros professores, entre êsses alunos.

Sr. Presidente: eu verifico e, por isso, faço estas considerações na generalidade da discussão do Ministério do Fomento, que as verbas destinadas a material, são sempre, em todas as secções dêsse Ministério, muito pouco valiosas, e consigno e apuro ainda, Sr. Presidente, um outro facto, ao qual já se referiu o Sr. Ministro do Fomento, e a que eu não deixarei tambêm de fazer referencia especial.

Disse S. Exa., como tambêm já o dissera o Sr. Brito Camacho, que houvera necessidade de entregar aos operários sem trabalho uma parte das receitas consignadas no Ministério do Fomento, e que o Ministro do Fomento se encontrava numa situação delicada, tendo à porta do seu Ministério cidadãos pedindo trabalho, vendo a ordem pública ameaçada por êles, e sabendo que o dinheiro que se gastava com êsses operários podia ser aplicado utilmente em serviços do seu Ministério. Eu devo dizer a S. Exa. que êsse facto não sucede simplesmente em Lisboa; - dá-se em todo o país. No Norte, nomeadamente no Pôrto, a verba consignada para conservação de estradas é desviada para pagamento a um pessoal buscado nas greves e no ruído das ruas, para conseguir dêsse pessoal uma tranquilidade e um sossego que se julgam proveitosos, ora para a monarquia, ora para a República. Semelhante estado de cousas não pode manter-se, - e não é conveniente que se mantenha. Temos que estudar uma maneira hábil e inteligente para evitar que o urbanismo seja no país, que é um país agrícola, um perigo.

Nós estamos a fazer derivar os trabalhadores dos campos para as cidades, onde êles constituíam já no passado regime, e constituem presentemente, um perigo e um gravame para a situação do Ministério cujo orçamento estamos discutindo.

Sr. Presidente: há no norte do país e no meu concelho, uma estrada marcada e dotada com a soma total de 90 contos de réis. Êsses 90 contos bastariam para a construção dessa estrada, cujo orçamento, se não me engano, foi organizado em 1897. Sabe V. Exa. quanto se gastou no primeiro lanço dessa estrada?

Gastaram-se 96 contos de réis, 6 contos de réis a mais do que estava orçado.

Pois não se construiu a décima parte dêsse lanço, porque o dinheiro foi pago a operários sem trabalho da cidade do Pôrto.

Pregunto se esta situação pode manter-se e se algum Ministro da República, honrado como foi o Sr. Brito Camacho e como é o actual Sr. Ministro do Fomento, pode consentir que as verbas inscritas no orçamento para a construção e reparação de estradas sejam distribuídas por operários sem trabalho.

Cada um dos Ministros da República que tem ocupado a pasta do Fomento tem trabalhado bastante para merecer a estima do país; mas e absolutamente indispensável que os que venham de futuro ocupar aquela pasta trabalhem no sentido duma remodelação completa do seu Ministério.

Eu procurarei, e certamente o procurarão muitos dos membros da Câmara, já empenhados na questão do ensino comercial, que êsse ensino se avigore e melhore.

Concluindo as minhas considerações, pedirei, apenas, á Câmara, que ainda tem de ver, certamente, pela fôrça das circunstâncias, passar diante de si vários orçamentos do Ministério do Fomento, que se melhorem os serviços para que a República não seja aquilo que os nossos adversários afirmam ser.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Pires de Campos: - Chama a atenção da Câmara para a situação em que se encontram os guardas inválidos da mata da Marinha Grande, os quais tendo 100$000 réis de ordenado de categoria e 80$000 réis de exercício, não podem pedir a reforma, pelos prejuízos que daí lhe adviriam, visto terem de se aposentar apenas com 100$000 réis. Êstes empregados tem a seu cargo serviços importantes, numa extensa área, alguns com trinta anos de serviço.

Apresentou, em tempo, uma comissão dêstes empregados ao Sr. Ministro do Fomento, que prometeu fazer justiça. Deve notar-se que a mata da Marinha Grande rende 60:000$000 réis e que êstes empregados tem de exercer a polícia da mata, onde se dão frequentes incêndios. Vai mandar um projecto de lei neste sentido para a mesa.

A adega social de Leiria nunca serviu para o fim que se teve em vista ao criá-la. Apenas tem sido de utilidade a interesses particulares e para criar o pessoal. Por isso vai mandar para a mesa um projecto de lei, eliminando essa adega.

Os seus projectos de lei são os seguintes:

Para o efeito da aposentação a que tem direito pelo disposto no artigo 34.° do decreto de 25 de Novembro de 1886, que organiza os serviços florestais, e para o da sua passagem á situação de inactividade, nos termos dos artigos 8.° a 17.° do decreto de 29 de Setembro de 1899, que regulamentou as situações, licenças, doenças e penalidade do pessoal do Ministério das Obras Públicas, Comércio e Indústria, será considerado como categoria e totalidade dos vencimentos (categorias e exercícios), que actualmente percebem os mestres e guardas florestais.

Eliminando no capítulo 3.°, artigo, a verba n.° 37 do actual orçamento do Ministério do Fomento.

O discurso será publicado na íntegra quando S. Exa. restituir as notas taquigráficas.

O Sr. Angelo Vaz: - Pedi a palavra simplesmente para mandar para a mesa uma proposta de emenda ao artigo 2.°, que tende a assegurar a realização duma obra que reputo indispensável: trata-se da construção do quebra-mar no pôrto de Leixões. Essa obra está estudada e as estações competentes consideram-na absolutamente indispensável, trazendo ao mesmo tempo uma economia considerável para o Tesouro.

Peço ao Sr. relator da comissão do orçamento do Ministério do Fomento que tome na devida consideração a proposta que envio para a mesa e que eu redigi da seguinte forma:

Proposta

Proponho que da verba de 174:000$000 réis, consignada no n.° 20.° do capítulo 2.° do orçamento das des-

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pesas do Ministério do Fomento, seja destacada uma verba de 25:000$000 réis destinada ao início da construção do quebra-mar em Leixões, segundo o projecto e respectivo orçamento elaborados pelas repartições competentes e aprovados em 13 de Janeiro de 1910.

O artigo 20.° do capítulo 2.° ficaria assim redigido: "Reparações e melhoramentos em portos artificiais: Para pagamento de material e mão de obra 149:000$000 réis;

Para início da construção do quebra-mar em Leixões, segundo o projecto e respectivo orçamento elaborados pelas repartições competentes e aprovados em 13 de Janeiro de 1910, 25:000$000 réis". = Angelo Vaz.

Acrescentarei que o parecer da comissão de obras públicas é inteiramente favorável a esta minha proposta, e entre as pessoas que compõem essa comissão está o ilustre engenheiro Sr. Ezequiel de Campos, que tão proficientemente costuma tratar estas questões.

Tenho dito.

S. Exa. não reviu.

Foram admitidos os dois projectos de lei do Sr. Deputado Pires de Campos.

Foi admitida a proposta do Sr. Deputado Angelo Vaz.

O Sr. Presidente: - Devo dizer que submeti à admissão da Câmara os projectos de lei e as propostas que tem sido mandadas para a mesa, a fim de fazerem parte da discussão na especialidade.

Está esgotada a inscrição sôbre a generalidade do Orçamento.

Foi aprovado, na generalidade, o orçamento do Ministério do Fomento.

Segunda parte

Continuação da discussão do projecto de lei n.° 200, passando a guarda e conservação dos móveis e imóveis dos extintos paços riais para o Ministério das Finanças

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à votação do artigo 9.° do projecto de lei n.° 200, sôbre a conservação e administração de móveis e imóveis dos extintos paços riais.

O Sr. Pádua Correia: - Mando para a mesa a seguinte

A Câmara, reconhecendo que a fixação das taxas é matéria regulamentar, emite o voto de que os alunos de quaisquer escolas sejam sempre isentos de taxa, provando a sua identidade escolar. = Pádua Correia.

Foi admitida.

O Sr. Álvaro de Castro (relator): - Sr. Presidente: como há uma série de emendas e substituições ao artigo 9.° e seu § único, peço a V. Exa. o obséquio de as mandar ler todas, a fim de que a Camará fique com conhecimento delas, pois que, talvez, já se não lembre.

Foram lidas na mesa todas as propostas apresentadas, em uma das sessões anteriores, sôbre o artigo 9.°

Foi aprovada a moção do Sr. Deputado Pádua Correm. Foi lido na mesa, para se votar, o corpo do artigo 9.°

É o seguinte:

Art. 9.° Os demais palácios, emquanto por disposição legislativa não tiverem aplicação especial, serão destinados à visita do público, mediante taxas e condições a regulamentar para cada um deles.

Foi rejeitado.

Foi lida na mesa, para se votar, a proposta de substituição do Sr. Deputado Álvaro de Castro.

É a seguinte:

Proposta

Proponho que o artigo 9.° tenha a seguinte redacção: "Os demais palácios, quintas, jardins, tapadas e cêrcas, a esta data sem aplicação especial, ou emquanto a não tiverem, serão destinados à visita do público mediante taxa e condições a regulamentar. = Álvaro de Castro.

O Sr. Álvaro Poppe: - Desejava que ficasse explicada qual a doutrina que consigna essa proposta, porque no artigo 7.° não se englobam todos os paços que estão entregues aos diferentes Ministérios, isto é, que se refere não só aos edifícios consignados no projecto, mas a todos.

O Sr. Álvaro de Castro (relator): - Devo dizer que a idea da comissão, de acôrdo com o Sr. Ministro das Finanças, é que no projecto se compreendam todos os edifícios que já estejam ou venham a ser entregues aos diferentes Ministérios.

De maneira que a única redacção que deveria ser modificada era a do artigo 7.° Isso pode ser feito na comissão de redacção, desde o momento em que fique expresso que se trata não só os palácios aqui enumerados, mas de todos aqueles que foram entregues a êste ou àquele Ministério.

Foi aprovada a proposta de substituição do Sr. Deputado Álvaro de Castro.

Foi lido na mesa para se votar, o § único} proposto pela comissão de finanças, para o artigo 9.° É o seguinte:

"§ único. A taxa a cobrar será de 100 réis, excepto aos domingos e dias feriados, em que a entrada será gratuita.

O Govêrno estabelecerá, em regulamentos adequados, as taxas a cobrar por quaisquer distracções que dentro das propriedades do Estado se estabeleçam ou já estejam estabelecidas. Do rendimento da taxa cobrada nas propriedades do Estado em Cintra, 25 por cento serão destinados á Misericórdia de Cintra".

Foi rejeitado.

Foi lida na mesa, para se votar, a proposta de substituição do Sr. Deputado Brandão de Vasconcelos. É a seguinte:

Proposta

Emenda ao § único do artigo 9.° proposta pela comissão:

"A taxa a cobrar será de 100 réis.

Aos domingos será de 50 réis.

Nos dias feriados da República será gratuita". = Brandão de Vasconcelos.

Foi rejeitada.

Foi lida na mesa, para se votar, a proposta de substituição do Sr. Deputado Carvalho Araújo.

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É a seguinte:

Proposta

Proponho que o § único tenha a seguinte redacção: "A taxa a cobrar nunca será inferior a 100 réis, excepto aos domingos e dias feriados, em que a entrada será gratuita.

O Govêrno estabelecerá em regulamentos adequados as taxas a cobrar por quaisquer distracções que dentro das propriedades do Estado se estabeleçam ou já estejam estabelecidas. Do rendimento da taxa cobrada nas propriedades do Estado, em Cinta, 25 por cento serão destinados à Misericórdia de Cintra". = Carvalho Araújo.

Foi aprovada.

Ficaram prejudicadas todas as outras propostas.

Foram lidos na mesa e aprovados sucessivamente, sem discussão, os artigos 10.°, 11.°, 12.° e 13.°

São os seguintes:

"Artigo 10.° A receita desta proveniência, bem como a de quaisquer arrendamentos de imóveis não compreendidos na aplicação fixada nos artigos anteriores, a de vendas de frutos, ou ainda outras de qualquer proveniência, constituirão receitas do Estado.

Artigo 11.° Em cada ano económico será inscrita na tabela da despesa do Ministério das Finanças, com destino a despesas com pequenas reparações nos palácios e suas dependências, amanho de propriedades, concertos, etc., uma verba não excedente a dois terços da cobrança a que se refere o artigo anterior, realizada no ano antecedente.

§ único. No ano económico de 1912-1913 vigorarão as verbas que para as despesas de conservação e administração dos paços e suas dependências forem consignadas pelo respectivo Orçamento no Ministério das Finanças.

Artigo 12.° A administração de cada palácio ficará a cargo directo dum administrador auxiliado "pelo pessoal que for julgado indispensável e que o Govêrno por êles distribuirá de entre os actuais serventuários, por forma a reduzir a actuai despesa, e não podendo em caso algum ser feitas nomeações de estranhos, salvo para as vacaturas que de futuro ocorram.

Artigo 13.° A ninguêm será facultada moradia ou qualquer usufruição gratuita nos palácios e seus anexos ou dependências, salvo àqueles empregados que superiormente forem julgados indispensáveis ou convenientes para a sua guarda e segurança".

Foi lido na mesa, e entrou em discussão, o artigo 14.° É o seguinte:

"Artigo 14.° E extinta a Repartição das equipagens, passando para o palácio de Belém, em depósito, todos os automóveis, carruagens e animais que ao Estado ficaram pertencendo".

O Sr. Brito Camacho: - Sr. Presidente: recorda-se V. Exa. de eu ter preguntado aqui ao Sr. Ministro das Colónias se S. Exa. estaria de acôrdo em que o Jardim Colonial fôsse instalado no parque de Belém, porque isso traria vantagens para o jardim, porque lhe daria a amplitude que êle não tem e que precisa ter, não prejudicando em nada, nem o palácio nem o parque, e antes representando melhor aproveitamento.

S. Exa. concordou e fez inscrever a verba de 14 contos de réis para a instalação do Jardim Colonial.

Ora pelo que se vê, rapidamente, no projecto não vem nada a êsse respeito. De modo que me parecia conveniente juntar a êste artigo 14.° um parágrafo único em que isso se estabelecesse.

O Sr. Álvaro de Castro (relator): - Talvez não seja necessário, porque o artigo 9.° foi modificado no sentido de se compreenderem todos os palácios, quintas e cercas e a forma de serem aplicados e ter destino especial como sucede com o palácio das Necessidades, onde se vai certamente instalar o quartel general.

O Sr. Brito Camacho: - Não me parece que dentro da doutrina dêste artigo esteja esta disposição. Amanhã pode negar-se o Jardim Colonial.

O Sr. Álvaro de Castro (relator): - V. Exa. o que quer já determinado, é que seja destinado para isso. Estou de acôrdo; não vejo inconveniente.

O Sr. Brito Camacho: - Tinha sido feito de acôrdo com o Sr. Ministro das Colónias, e tanto assim que se inscreveu a verba de 14 contos de réis.

O Sr. Álvaro de Castro (relator): - Eu explico a razão por que não se fez artigo especial para o Jardim Colonial, como para parte do palácio das Necessidades destinada ao quartel general. í

Podia, quem interpretasse a lei, julgar que o Govêrno não ficava autorizado a usar de qualquer palácio para qualquer outro destino.

O Sr. Brito Camacho: - Agora sabe-se que há boa vontade de instalar ali o Jardim Colonial, e não sei se amanhã, com outro Ministro, a haverá.

Mando para a mesa a seguinte

Proposta

Proponho que ao artigo 14.° se ajunte o § único: "No Parque do Palácio de Belém será instalado o Jardim Colonial". = Brito Camacho.

Foi admitida.

Foi aprovado o artigo 14.°

Foi aprovada a proposta de aditamento do Sr. Deputado Brito Camacho.

Foi lido na mesa e entrou em discussão o artigo 15.° É o seguinte:

"Artigo 15.° É autorizado o Govêrno a proceder à venda dos animais e material que, por inúteis, possam ser dispensados, e a contratar, se assim lhe convier, a venda ou arrendamento das instalações actuais das equipagens e da iluminação eléctrica".

O Sr. Brito Camacho: - Eu creio que V. Exas. se referem à iluminação eléctrica que está instalada na Ajuda.

Devo dizer que aquelas instalações custaram, ou melhor a pretexto daquelas instalações, foram roubados 400 a 500 contos de réis.

Foi um dos roubos mais descarados que se fizeram no tempo da monarquia.

Da sindicância a que se mandou proceder, e que foi feita por funcionários de obras públicas da maior competência e honestidade - e eu conheço-os pessoalmente a todos - verificou-se que, efectivamente, tinha sido uma roubalheira descarada, que até se destacava entre as roubalheiras da monarquia.

Era minha intenção, quando fiz a reforma da agronomia, estabelecer na Tapada da Ajuda um ensaio de lavoura

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SESSÃO N.° 128 DE 5 DE JUNHO DE 1912 21

eléctrica, o que, de resto, não é novidade nenhuma. Na Alemanha, por exemplo, vi eu algumas funcionando admiravelmente.

De modo que eu achava, visto a disposição do artigo 15.° ir, pelo menos, tirar a possibilidade dessa tentativa, que ela devia ser modificada conforme proponho.

Como se trata duma cousa bastante importante, atrevia-me a lembrar êste facto á comissão.

Se ela vê que, a propósito de aproveitar aquela instalação eléctrica, para fazer um ensaio da lavoura eléctrica, é útil, que o aceite; se ela vir que nenhuns resultados poderá dar, então rejeita-o.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Álvaro de Castro (relator): - Sr. Presidente: estou perfeitamente de acôrdo com as considerações apresentadas pelo Sr. Brito Camacho. Eu não conheço a instalação eléctrica do Paço da Ajuda, nem a cultura eléctrica; de maneira que não posso, por mim, afirmar se é bom ou mau o alvitre de S. Exa.; mas, visto que é o Sr. Brito Camacho que o apresenta, parece-me que a dis posição, que S. Exa. propõe, pode ficar.

O Sr. Fernando Macedo: - Requeiro que se interrompa a sessão, para a comissão de finanças reùnir e resolver sôbre o alvitre do Sr. Brito Camacho.

O Sr. Álvaro de Castro (relator): - A comissão só indo a Belém é que estará habilitada a poder responder ao Sr. Brito Camacho. Em todo caso, como já disse, pode fazer-se uma redacção que satisfaça os desejos de S. Exa.

O Sr. Fernando Macedo: - Desisto do meu requerimento.

O Sr. Brito Camacho: - Nesse caso, mando para a mesa a seguinte

Proposta

Proponho que ao artigo 15.° se ajunte o seguinte:

"§ único. As instalações eléctricas da Tapada da Ajuda fornecerão electricidade para a iluminação dos palácios e a energia motora de que carecer o Instituto Superior de Agronomia para os seus ensaios de lavoura eléctrica ou outros fins pedagógicos". = Brito Camacho.

Foi admitida.

O Sr. Álvaro Poppe: - Mando para a mesa a seguinte

Proposta

Proponho a eliminação das ^palavras "a partir de" "e a contratar" do artigo 15.° = Álvaro Poppe.

Foi admitida.

Foi aprovada a proposta do Sr. Deputado Álvaro Poppe.

Foi aprovado o artigo J?5.°, com a modificação resultante da aprovação da proposta do Sr. Deputado Álvaro Poppe.

Foi aprovada a proposta de aditamento do Sr. Deputado Brito Camacho.

Foi lido na mesa, e entrou em discussão, o artigo 16.° É o seguinte:

"Art. 16.° Fica revogada a legislação em contrário".

Foi aprovado.

Discussão do projecto de lei n.° 208, autorizando o Govêrno a identificar e separar os bens mobiliários que constituíam propriedade particular do ex-rei D. Manuel e dos diversos membros da sua família e a fazer a respectiva entrega a quem de direito.

O Sr. Presidente: - Vai ler-se, para entrar em discussão, o projecto de lei n.° 208, autorizando o Govêrno a identificar e separar os bens mobiliários que constituíam propriedade particular do ex-rei D. Manuel e dos diversos membros da sua família e a fazer a respectiva entrega a quem de direito.

Foi lido na mesa. É o seguinte:

Artigo 1.° E o Govêrno autorizado a identificar e separar os bens mobiliários que constituíam propriedade particular do ex-rei D. Manuel e dos diversos membros da sua família e a fazer a respectiva entrega a quem de direito.

Art. 2.° Esta entrega não impedirá nem o cumprimento dos diplomas em vigor sôbre a liquidação e pagamento dos chamados adiantamentos e outros quaisquer débitos de que são ou sejam responsáveis o mesmo ex-rei e os membros de sua família, nem tam pouco a execução das disposições do decreto com fôrça de lei de 19 de Novembro de 1910 sôbre protecção de obras de arte.

§ único. Tal entrega deverá fazer-se por meio de termo lavrado em duplicado, no "piai se deverão mencionar, especificadamente, todos os mobiliários que forem restituídos. Um dêsses exemplares ficará arquivado no Ministério das Finanças e o outro no arquivo da Torre do Tombo.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrário.

O Sr. Matos Cid (por parte da comissão de administração pública): - Mando para a mesa um parecer.

O Sr. Brito Camacho: - Êste projecto não deve ser discutido sem estar presente o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros. Por isso, proponho, como questão prévia, o adiamento da discussão até haver um novo titular da pasta dos Negócios Estrangeiros.

O Sr. Matos Cid (relator): - Simplesmente para dizer que o Sr. Augusto de Vasconcelos declarou que havia toda a urgência na aprovação dêste projecto de lei.

O Sr. Brito Camacho: - Perante a explicação do Sr. Matos Cid desisto da minha questão prévia.

O Sr. Germano Martins: - Para lembrar a V. Exa. que, apesar do Ministério estar demissionário, os Srs. Ministros podiam vir à Câmara dar as informações que lhes fossem pedidas sôbre os projectos em discussão. Pedia a V. Exa. a fineza de ficar encarregado de transmitir êste alvitre ao chefe do Govêrno, Isso seria, tambêm, serviço de expediente.

Foi aprovado o projecto, na generalidade e na especialidade.

Continuação da discussão do projecto de lei n.° 212, modificando o quadro permanente dos oficiais da arma de infantaria

O Sr. Presidente: - Continua em discussão o projecto de lei n.° 212, perfilhado pelo Sr. Ministro da Guerra.

O Sr. Fernando Macedo: - Não obstante não estar presente o Sr. Relator do projecto, não me dispenso de continuar nas minhas considerações porque elas são de carácter geral.

O Sr. Relator não só não apresentou argumentos com

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22 DIÁRIO DA CAMARA DOS DEPUTADOS

que pudesse destruir as considerações por mim já feitas sôbre o projecto em discussão, como fez dele uma defesa tam frouxa, que mais me deu a impressão de ser o seu coveiro.

Entre várias afirmações disse S. Exa. que êste projecto põe a arma de infantaria em igualdade de circunstâncias com as outras armas. Vou provar à Câmara que a sua afirmação não tem razão de ser.

Os regimentos de infantaria tem actualmente, o seguinte quadro permanente:

1 comandante, coronel ou tenente-coronel, 3 majores, 1 ajudante do regimento, 3 ajudantes de batalhão, 1 médico, 1 subalterno da administração militar, 6 capitães e 6 tenentes comandantes de companhias e mais 3 subalternos para as 12 companhias.

Dêstes números se conclui que das 12 companhias do regimento, apenas 6 são comandadas por capitães, sendo as outras 6 comandadas por subalternos, havendo ainda um de 3 subalternos, número êste indivisível por 12, donde resulta haver em cada regimento 9 companhias que apenas tem 1 oficial, o seu comandante.

Vamos agora ver o que sucede com as outras armas do exército. Por exemplo:

Um batalhão de sapadores-mineiros tem 4 companhias, cada uma com o seu capitão, 1 subalterno, 2 segundos sargentos e 2 primeiros cabos.

Um batalhão de pontoneiros tem igualmente 4 companhias, cada uma com 1 capitão, 4 ou 1 subalternos, 1 primeiro sargento, 3 segundos sargentos e 3 primeiros cabos.

Uma companhia de projectores tem 1 capitão, 1 subalterno, 1 primeiro sargento, 2 segundos sargentos e 2 primeiros cabos.

Um grupo de telegrafistas de campanha tem:

Duas companhias, cada uma com 1 capitão, 5 subalternos, 1 primeiro sargento, 6 segundos sargentos e 6 primeiros cabos.

Uma companhias de telegrafia sem fios tem:

1 capitão, 5 subalternos, 1 primeiro sargento, 8 segundos sargentos e 8 primeiros cabos.

Uma companhia de caminhos de ferro tem:

1 capitão, 1 subalterno, 1 primeiro sargento, 9 segundos sargentos e 12 primeiros cabos. Em resumo, todas as companhias das tropas de engenharia são comandadas por 1 capitão, todas tem pelo menos 1 subalterno, elevando-se êste número em algumas a 5, em todas há 1 primeiro sargento e pelo menos 1 segundo, sendo o número dos primeiros cabos bastante elevado em relação às companhias de infantaria que apenas tem 1.

Nos regimentos de artilharia de campanha, alem do comandante, que é um coronel, há tambêm um 2.° comandante com o pôsto de tenente coronel, o que não sucede na infantaria e que bastante falta lhe faz, pois que não só o coronel não pode desempenhar as suas próprias funções acumuladas com as que pertencem ao tenente-coronel, como tambêm qualquer dos majores não pode acumular o complexo serviço que pertencia ao tenente-coronel com o do comando do seu batalhão.

Quanto às batarias, todas elas podem ser comandadas por capitães, ao passo que na infantaria só 6 das suas 12 companhias é que podem ter capitães por comandantes, alem de em cada bataria haver um subalterno, 1 primeiro sargento, 1 segundo sargento e 6 primeiros cabos.

Não continuo no exame das diferentes unidades da artilharia para não me tornar mais fastidioso, não podendo, porem, deixar de salientar a circunstância desta arma ter os seus quadros de oficiais, sargentos e primeiros cabos numa proporção muito superior aos da infantaria.

E ainda relativamente a sargentos e primeiros cabos, é o seu número tam escasso na arma de infantaria que só com dificuldades e imperfeição o serviço é desempenhado; senão vejamos: Ao passo que na engenharia e artilharia,

por cada companhia ou bataria há 1 primeiro sargento e um número variável de segundos sargentos e primeiros cabos, na infantaria para as suas 12 companhias há 9 primeiros sargentos, 15 segundos e 12 primeiros cabos; quer dizer, 2 sargentos e 1 primeiro cabo, o máximo, por companhia.

Simplesmente desolador, Sr. Presidente!

Vamos ver o que se passa na cavalaria. Nesta arma, semelhantemente ao que. se dá nos regimentos de artilharia de campanha, alem de haver um comandante, coronel ou tenente coronel, há ainda um tenente-coronel 2.° comandante.

Todos os esquadrões podem ser comandados por capitães, ao passo que na infantaria só 6 companhias podem ser comandadas por capitães.

Nos regimentos a 3 esquadrões, cada um dêstes tem 2 subalternos, tendo 3 nos regimentos a 4 esquadrões; em cada um dêles há ainda 1 primeiro sargento, 2 segundos e 2 primeiros cabos.

Creio que esta simples análise do projecto não pode deixar a mais leve dúvida no espírito da Câmara.

Se o Sr. relator estivesse presente não podia dizer que a infantaria ficava em igualdade de circunstâncias com as outras armas, porque, como se vê, não é assim.

Além do Sr. relator, defendeu ainda o projecto um ilustre membro da comissão de finanças, e disse que êle não representava aumento de despesa.

Ora, se o projecto tem por fim um aumento de quadros, necessáriamente traz aumento de despesa.

Disse o Sr. Vitorino Guimarães que a despesa proveniente do aumento dos quadros pode ser compensada com a receita proveniente do artigo 4.° do projecto; mas nós não podemos contar com essa receita, porque não sabemos se a Câmara aprovará o artigo 4.°.

O ilustre, relator disse ainda que se deve contar com a economia a realizar com a reorganização do exército ultramarino. Ora, eu ignoro as bases em que se fará essa reorganização.

De modo que S. Exa., para justificar uma despesa, vai basear-se em receitas, que nós não sabemos se se poderão efectivar.

De todos os argumentos produzidos, não só pelo Sr. relator, como tambêm pelo ilustre membro da comissão de finanças, eu creio que a Câmara não ficou suficientemente elucidada com a defesa que os meus ilustres colegas fizeram do projecto, e confio em que não o votará por injustificado.

Sinto não ver presente o Sr. Brito Camacho, pois parecendo-me que S. Exa. apoiava e auxiliava a breve e frouxa defesa feita pelo Sr. relator, eu não posso deixar de lembrar, nesta ocasião, as palavras de S. Exa. quando, na sessão de 13 de Maio dizia:

A reorganização do exército foi feita scientíficamente. Terá do sofrer as críticas do Parlamento, nem se compreendia que assim não fôsse. Não é portanto, intangível.

O que não se deve é estar a fragmentar essa reorganização como acontece com a proposta do Sr. Pais de Figueiredo. Hoje, pela impressão que em mim ficou da atitude de S. Exa., durante a discussão do projecto, vejo que é diferente a sua opinião em face do enxerto que se pretende fazer na reorganização, enxerto ao acaso emquanto a comissão de guerra não provar o contrário o, que até agora não fez.

O Sr. Ministro da Guerra, por seu turno, na defesa que fez do projecto, não foi mais feliz do que o Sr. relator da comissão de finanças, pois que quási se limitou a expor o que fora a sua acidentada carreira militar, cem o que nós nada temos que ver; no emtanto, como depois o perfilhou, é possível que se reserve para mais tarde fazer uma defesa mais completa.

Sr. Presidente: insisto em todas as considerações que

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SESSÃO N.° 128 DE 5 DE JUNHO DE 1912 23

fiz, dizendo mais uma vez que êste projecto não satisfaz as necessidades da arma de infantaria.

Como provei â saciedade, ela está numa inferioridade esmagadora e humilhante em relação às outras armas, tendo sido tratada com uma desumanidade sem igual pela reorganização do exército.

Termino por aqui as minhas considerações, dizendo mais uma vez que não posso dar o meu voto a êste projecto.

Tenho dito.

O Sr. Manuel Bravo: - Voto o projecto em virtude das declarações que fez, sôbre êle, o Sr. Ministro da Guerra.

O Sr. Valente de Almeida: - Se neste projecto houvesse alguma cousa de imoral, eu, sem que nenhuma fôrça do mundo me conseguisse calar a boca, pronunciaria a palavra - imoral - com todas as suas letras.

Evidentemente, o projecto não é imoral, e não foi, portanto, sob êsse aspecto que eu o combati e combato ainda agora.

É um projecto justo, dizem os autores.

Concordo, tanto mais que não sou autoridade na matéria; mas sendo justo, no emtanto, é duma lógica elementar, duma hermenêutica comesinha, que não é urgente.

Urgente é a revisão do importantíssimo diploma chamado a reorganização do exército.

Esta lei é justa; é, por assim dizer, uma lei que estabelece uma espécie de restituição?

Pois muito bem, com toda a sua justiça e espírito de restituição, ela que fique para que na discussão inteligente, erudita, elevada, que os militares desta Câmara façam, seja atendida na lei definitiva da reorganização do exército.

Antes disso, continuo a considerá-la como justa, mas inoportuna, porque não veio quando devia vir.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Helder Ribeiro: - Tem-se combatido o projecto com o fundamento de que altera a organização do exército e não satisfaz às necessidades da arma de infantaria. A dificuldade da promoção a capitão na arma de infantaria não está na organização do exército metropolitano, mas na organização do exército colonial e na facilidade de admissão de alunos na Escola do Exército.

O Sr. Fernando Macedo fez uma análise resumida da organização do exército; mas nas considerações que expôs não conseguiu convencê-lo da verdade que quis demonstrar.

S. Exa. declara que rejeita o projecto, porque não satisfaz às necessidades da arma de infantaria e porque representa aumento de despesa. Estas duas razoes contradizem-se, porque, se S. Exa. queria mais, maior seria naturalmente o aumento de despesa.

Terminando, diz que a prova da utilidade do projecto está em que o Sr. Ministro da Guerra o adoptou.

O discurso será publicado na integra quando S. Exa. restituir as provas taquigráfícas.

O Sr. Brito Camacho: - Pedi a palavra para lembrar que, estando demissionário o Govêrno e parecendo ser seu propósito não vir à Câmara, talvez não seja conveniente V. Exa., Sr. Presidente, marcar o Orçamento para discussão, porque há verbas que só podem ser justificadas pelos respectivos Ministros.

Se V. Exa. entende, que se deva alterar o que se tinha resolvido, sôbre a discussão do Orçamento e do Código Administrativo, parecia-me mais conveniente. Tanto mais que a crise ministerial deve durar alguns dias.

O Sr. Presidente: - O Sr. Presidente do Senado acaba de me comunicar que a sessão do Congresso, que devia efectuar-se no sábado, foi antecipada, por motivos ponderosos, para a próxima sexta-feira.

Ao Sr. Brito Camacho direi que, como amanhã se discute o Código Administrativo e na sexta-feira se realiza sessão conjunta do Congresso, há tempo de sobra para se pensar na ordem dos trabalhos da sessão de sábado próximo.

Na sessão do Congresso, alem da prorrogação da sessão legislativa, tratar-se há do projecto dos caminhos de ferro do Alto Minho, sôbre o qual houve divergências entre as duas Câmaras.

O Sr. Alexandre de Barros: - Pedi a palavra para solicitar de V Exa., Sr. Presidente, que o projecto sôbre o aumento da polícia civil do Pôrto seja trazido, o mais depressa possível, à discussão.

É um assunto importante, que se refere â segurança pública, e V. Exa. certamente, não terá inconveniente em pôr êsse projecto quanto antes à discussão.

O Sr. Presidente: - A próxima sessão é amanhã, às 13 horas e meia, sendo a ordem do dia a seguinte:

Projecto de lei n.° 74, organizando o Código Administrativo.

Projecto de lei n.° 66, demarcando a região dos vinhos do Dão.

Projecto de lei n.° 199, sujeitando à análise polariscópica todos os açúcares importados em Portugal e ilhas adjacentes.

Projecto de lei n.° 159, concedendo terrenos no ultramar aos emigrantes israelitas.

Projecto de lei n.° 212, modificando o quadro da arma de infantaria.

Projecto de lei n.° 104, esclarecendo e completando as disposições do decreto de 23 de Agosto de 1911, relativas ao subsídio arbitrado aos membros do Congresso.

Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 55 minutos.

Declaração de voto

Declaramos que se tivéssemos estado presentes no momento em que, na sessão de ontem, se votou a moção do Deputado Sr. António José de Almeida, a teríamos aprovado. = Pedro Alfredo de Morais Rosa = António Maria Malva do Vale = Bissaia Barreto.

Para a acta.

O REDACTOR = Melo Barreto.

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APÊNDICE Á SESSÃO N.° 128 DE 5 DE JUNHO DE 1911 25

Discurso proferido pelo Sr. Deputado Helder Ribeiro, que devia ler-se a pag. 23 da sessão n.° 128 de 5 de Junho de 1912

O Sr. Helder Ribeiro: - Não fazia tenção de tomar parte neste debate; mas como a discussão do projecto tem derivado pouco mais ou menos para o campo das referências à reorganização do exército, isso me leva a nela intervir.

Tem-se combatido o projecto sob o ponto de vista de que êle altera a disposição fixada na reorganização do exército para a arma de infantaria e de que com êste projecto se procura ineficazmente obtemperar aos inconvenientes que resultaram duma má vontade, que à viva fôrça se quere discortinar contra essa arma.

É sempre bastante difícil, e assunto muito delicado e melindroso, o fazer-se uma lei de quadros, porque tem-se de atender às necessidades orgânicas, e pareceria que seriam essas necessidades as que deveriam principalmente, e devem, servir de base para a fixação dos quadros duma arma; mas há outro ponto a atender quando se estabelecem êsses quadros, e é que na maneira como se estabelecem as promoções entre as diferentes categorias da hierarquia militar, se não vá simplesmente atender às condições de ordem orgânica, mas tambêm a uma conveniente equiparação entre os diferente graus e as diversas armas.

Pois que se fossemos organizar na mesma porporção um esquadrão de cavalaria e uma companhia de infantaria, tínhamos que atender aos seus efectivos de guerra, que na infantaria nunca exigiram mais que um capitão e três subalternos.

Para a cavalaria já esta proporção muda por complecto, porque para um capitão comandante de esquadrão, são indispensáveis cinco subalternos.

Seguindo pois só o primeiro daqueles critérios a permanência no pôsto de subalterno na arma de cavalaria seria quási dupla da infantaria o que representaria uma grave injustiça.

Portanto, não podemos, de forma alguma, atender só êsse critério, temos que procurar conjurar os vários princípios para obter uma promoção regular e sensivelmente equiparada nas diferentes armas. Nos cálculos feitos pelo legislador, nós encontramos, para a arma de infantaria, o seguinte:

Leu.

Pelas proporções que acabo de ler entre os diferentes postos e comparados com os mesmos nas outras armas, ressalta bem as insignificantes diferenças que entre êles existem e mostra tal que o legislador bastante atentou na necessidade de manter o equilíbrio na promoção aos diferentes postos da hierarquia militar nas diferentes armas e, portanto, querer atribuir ao diploma, que regula a organização do exército, a dificuldade que se nota hoje nas promoções na arma de infantaria, é afirmação que de forma alguma é de aceitar.

Essa desigualdade da promoção resulta de várias causas, por completo estranhas àquela reorganização, assim há a considerar a saída de oficiais para o Ultramar e que não são contados no quadro do continente nos postos de subalternos e capitães; quando regressam vem concorrer com. os do quadro, fixado pela lei, atendendo só ás necessidades do exército metropolitano, na promoção a oficiais superiores, tanto mais que os oficiais naquelas condições orçam por uns 200.

Mas há mais: Tem sido os abusos cometidos na admissão de alunos para a Escola de Guerra, e que infelizmente já se repetiram na República, (Apoiados) que tem agravado a situação da arma de infantaria.

Houve um Ministro, no tempo da monarquia, que mandou admitir os concorrentes que tinham sido rejeitados pela Junta, mas já depois de proclamada a República, tendo sido, pelo conselho da Escola de Guerra, fixado um certo número de alunos, para a admissão a essa Escola, êsse número foi depois elevado, pelo então Ministro da Guerra, Sr. Pimenta de Castro.

Devemos, por conseguinte, aceitar a situação em que se encontra a arma de infantaria, como consequência de factores que são alheios à reorganização do exército.

O Sr. Deputado Fernando Macedo, considerando o projecto, disse que não podia de forma alguma dar-lhe o seu voto, porque não satisfaz as necessidades da arma de infantaria e porque representa um aumento de despesa.

As conclusões do discurso de S. Exa. estão em contradição. Por um lado, rejeita o projecto porque não satisfaz às necessidades da arma de infantaria, isto é, entende que o aumento deve ser maior e por outro lado porque o projecto representa um aumento de despesa.

O Sr. Fernando de Macedo: - Foi simplesmente para responder ao Sr. Vitorino Godinho que disse que o projecto trazia aumento de despesa, não disse que o rejeitava porque trouxesse aumento de despesa.

O Orador: - Disse tambêm S. Exa. que êste projecto era uma fragmentação da organização do exército.

Ora, eu devo dizer que êste projecto é uma medida transitória que se manterá emquanto não tiver desaparecido a classe dos supranumerários.

Como mais nenhuma afirmação se fez sôbre o projecto, parece-me ter demonstrado a sem razão das afirmações feitas. E para mostrar que êste projecto representa uma obra aceitável, lembrarei à Câmara o facto de, sendo êste um projecto de iniciativa particular desta Câmara, o Sr. Ministro da Guerra, ao chegar aqui e sabendo que se levantavam dúvidas sôbre se o projecto podia ser discutido visto importar um ligeiro aumento de despesa e estar já em discussão o orçamento, não teve dúvida alguma em o perfilhar imediatamente, tal facto é tanto mais de ponderar quanto S. Exa. tem na gerência da sua pasta dado as provas mas claras e mais categóricas de quanto zela o dinheiros públicos. (Apoiados).

E êste facto que queria acentuar e creio que bastará para a Câmara votar o projecto em discussão.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem.

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APÊNDICE Á SESSÃO N.º 128 DE 5 DE JUNHO DE 1912 27

Discurso proferido pelo Sr. Deputado Pires de Campos, que devia ler-se a p. 18 da sessão n.° 128 de 5 de Junho de 1912

O Sr. Pires de Campos: - Não me proponho referir-me na generalidade ao orçamento do Ministério do Fomento, mas somente a dois assuntos, que. considero importantes. Em primeiro lugar, quero referir-me à mata da Marinha Grande, da qual fazem parte alguns funcionários, que tem um vencimento mesquinho.

Ora, sucede que há homens, nessa mata, os chamados guardas florestais, que têm 30 e mais anos de serviço. Mas, por uma má interpretação, dada no Ministério das Finanças, sucede que êsses desgraçados ficaram apenas com 100$000 réis para a reforma, o que dá a média de 5$000 por mês. Isto é condenar êsses funcionários à morte, pela miséria e pela fome.

Ora, entre êsses funcionários encontram-se republicanos dedicadíssimos; e que o não fossem, mereciam a nossa atenção.

Como não se podem reformar pelos motivos expostos, sucede que a mata da Marinha Grande está transformada num hospício de inválidos.

Bastará dizer que tendo duplicado a área da mata, êsses homens não podendo prestar serviço, dão prejuízo para o Estado.

Eu tinha tido a honra de apresentar ao Sr. Ministro do Fomento, uma comissão dêsses funcionários, entre os quais vinha um, com 38 anos de serviço; e S. Exa. concordou em que era nessário remodelar a lei.

O director, consultando a legislação, teve ocasião de observar que a melhoria na aposentação daqueles empregados era de inteira justiça.

Como, porêm, no Ministério das Finanças, se tem dado uma interpretação diferente à lei, era necessário apresentar um projecto de lei, de forma que êsses funcionários não fossem condenados à fome. E estava combinado o Sr. Ministro do Fomento apresentar êsse projecto, tanto mais que, como Deputado, estou inibido de apresentar projectos de lei, que poderão representar aumento de despesa ou diminuição de receitas.

Vê, V. Exa., Sr. Presidente, a minha situação: inibido de apresentar um projecto de lei, aliás justo; por outro lado o Govêrno não existe e não pode cumprir um dever humanitário. Vou, entretanto, apresentá-lo chamando a atenção do colega encarregado da revisão do orçamento do Fomento, e esperando que S. Exa. lhe aplicará toda a sua atenção e que, por fim, a Câmara o aceitará.

Não tenho em mim, na defesa dêsses infelizes empregados do Estado, um qualquer fim político, mas tam somente fazer justiça.

Devo dizer a V. Exa. que a mata da Marinha Grande rende, por ano, 60 contos, e que os serviços do pessoal são enormes e complexos.

Outro ponto, para que quero chamar a atenção do Sr. relator do orçamento do Fomento, é para a verba 37, do capítulo 3.°

Por essa verba está consignada uma despesa de réis 360$000 anuais com um mestre da adega social de Leiria.

Em 14 de Julho de 1901, o Ministério Hintze Ribeiro, por causa da crise vinícola, que assoberbava o país, promulgou uma disposição, tendente a beneficiar a agricultura nacional, criando adegas regionais, sociais, etc., apresentando êste argumento de valor: - que abundava o vinho de caldeira.

Êsse facto, que serviu de base para a apresentação dêsse decreto, deixou de existir; e V. Exa. sabe bem, Sr. Presidente, que hoje, em Portugal, felizmente, o vinho tem um preço muito remunerador, que então não tinha.

De maneira que a despesa com a referida adega não tem hoje razão de existir.

A adega social de Leiria nunca serviu para o fim que se teve em vista ao criá-la. Apenas tem sido utilizada para interesses particulares e para criar o mestre da adega cujo vencimento o Estado paga, alem doutras regalias importantes. Por isso vou mandar para a mesa um projecto de lei eliminando essa adega e para o qual chamo a atenção do Sr. relator da comissão de finanças.

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