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REPÚBLICA PORTUGUESA
DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS
SESSÃO N.º 49
EM 25 DE FEVEREIRO DE 1916
Presidência do Exmo. Sr. Manuel Joaquim Rodrigues Monteiro
Secretários os Exmos. Srs.
Baltasar de Almeida Teixeira
Alfredo Soares
Sumário.- Antes da ordem do dia.- Abre a sessão com a presença de 66 Srs. Deputados.
É lida a acta da sessão anterior e depois aprovada sem discussão por 75 votos.
Dá-se conta do expediente. São admitidos à discussão diversas proposições de lei. O Sr. Vieira da Rocha justifica e manda para a Mesa um projecto de lei, relativo ao Código Civil Português. O Sr. João Gonçalves critica diversos actos da autoridade de Vila Franca. O Sr. Ministro do Interior (Almeida Ribeiro) responde. O Sr. Carlos Olavo envia para a Mesa um parecer da comissão de instrução pública, e o Sr. Alfredo Ladeira um outro parecer da comissão de petições. O Sr. Francisco Cruz reclama o policiamento da estação de Pampilhosa. Responde o Sr Ministro do Interior (Almeida Ribeiro). O Sr. Vitorino Godinho refere-se à situação do inspector escolar da circunscrição de Ancião Responde o Sr. Ministro de Instrução (Ferreira de Simas). O Sr. Presidente nomeia os três membros da Câmara que irão ao Pôrto tomar parte na homenagem ao antigo Sr. Deputado Henrique Cardoso.
Documentos enviados para a Mesa. - Requerimentos dos Srs. Júlio Martins, Albino Pimenta de Aguiar, Rodrigues de Sá, Alfredo Ladeira, Bernardo Lucas, José Augusto Pereira, Costa Júnior e Aresta Branco. Diversos pareceres. Projecto de lei do Sr. Pedro Chaves.
Renovação de iniciativa do Sr. Lopes Cardoso
Ordem do dia. - Entra em discussão, na especialidade, o parecer n ° 234, sôbre as cartas orgânicas das colónias. O Sr Brito Camacho pregunta se o Govêrno não dá informações acêrca da apropriação, agora feita, dos navios alemães. O Sr. Presidente do Ministério (Afonso Costa) declara estar pronto a responder. Usa da palavra o Sr. Brito Camacho, formulando preguntas sôbre o mesmo assunto. Responde o Sr. Presidente do Ministério (Afonso Costa), apimentando diversas considerações acêrca da requisição dos mesmos navios. O Sr. Simas Machado manda para a Mesa uma declaração, em nome da minoria evolucionista. O Sr. Presidente do Ministério (Afonso Costa) responde ao Sr. Simas Machado.
São sucessivamente aprovados, sem discussão, os artigos 1.°, 2.°, 3° e 4.º do parecer n.º 234. Entra em discussão a proposta já apresentada à base 19.ª pelo Sr. Cruz e Sousa. Usa da palavra o Sr. Prazeres da Costa, que envia uma proposta para a Mesa. Usa da palavra o Sr. Jorge Nunes, justificando a proposta de aditamento que envia para a Mesa. Usa da palavra o Sr. Ernesto de Vilhena. O Sr. Jorge Nunes substitui por uma outra a sua primeira proposta.
É aprovada a proposta do Sr. Prazeres da Costa. É aprovada a base 19.ª da comissão, ficando prejudicada a proposta do Sr. Cruz e Sousa. É aprovada a proposta do Sr. Jorge Nunes. É aprovada a base 20.ª, com a emenda do Sr. Jorge Nunes. É aprovada sem discussão, a base 21.ª, sendo dispensada a última redacção.
É a sessão encerrada.
Presentes à chamada: - 75 Srs. Deputados.
São os seguintes:
Abílio Correia da Silva Marçal.
Abraão Maurício de Carvalho.
Adriano Gomes Ferreira Pimenta.
Alberto de Moura Pinto.
Albino Pimenta de Aguiar.
Albino Vieira da Rocha.
Alfredo Maria Ladeira.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.
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Amadeu Monjardino.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Albino Carvalho Mourão.
António Aresta Branco.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Cândido Pires de Vasconcelos.
António Correia Portocarrero Teixeira de Vasconcelos.
António da Costa Godinho do Amaral.
António Dias.
António Firmo de Azevedo Antas.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António Maria Pereira Júnior.
António Marques das Neves Mantas.
António Medeiros Franco.
António de Paiva Gomes.
António Pires de Carvalho.
António Vicente Marçal Martins Portugal.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Artur Duarte de Almeida Leitão.
Augusto José Vieira.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Casimiro Rodrigues de Sá.
Custódio Martins de Paiva.
Diogo João Mascarenhas de Marreiros Neto.
Domingos da Cruz.
Domingos Frias de Sampaio e Melo.
Domingos Leite Pereira.
Eduardo Alberto Lima Basto.
Eduardo Alfredo de Sousa.
Ernesto Júlio Navarro.
Evaristo Luís das Neves Ferreira de Carvalho.
Francisco Coelho do Amaral Reis (Pedralva).
Francisco Correia de Herédia (Ribeira Brava).
Francisco José Pereira.
Francisco do Livramento Gonçalves Brandão.
Francisco de Sousa Dias.
Francisco Xavier Pires Trancoso.
Gastão Rafael Rodrigues.
Henrique Vieira de Vasconcelos.
João Baptista da Silva.
João Canavarro Crispiniano da Fonseca.
João Carlos de Melo Barreto.
João Elísio Ferreira Sucena.
João Gonçalves.
João Luís Ricardo.
Joaquim António de Melo Castro Ribeiro.
Jorge de Vasconcelos Nanes.
José António da Costa Júnior.
José Augusto Pereira.
José Augusto Simas Machado.
José Barbosa.
José Mendes Nunes Loureiro.
Luís Augusto Pinto de Mesquita Carvalho.
Luís de Brito Guimarães.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel Joaquim Rodrigues Monteiro.
Manuel Martins Cardoso.
Mariano Martins.
Pedro Alfredo de Morais Rosa.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Pedro Virgolino Ferraz Chaves.
Sérgio da Cunha Tarouca.
Tomás de Sousa Rosa.
Urbano Rodrigues.
Vasco Guedes de Vasconcelos.
Entraram durante a sessão os Srs.:
Adelino de Oliveira Pinto Furtado.
Afonso Augusto da Costa.
Alberto Xavier.
Alexandre Braga.
Álvaro Poppe.
Amândio Oscar da Cruz e Sousa.
Amílcar da Silva Ramada Curto.
António Augusto Fernandes Rêgo.
António Barroso Pereira Vitorino.
António Caetano Macieira Júnior.
António Maria da Silva.
Armando da Gama Ochoa.
Armando Marques Guedes.
Artur Augusto da Costa.
Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.
Augusto Pereira Nobre.
Bernardo de Almeida Lucas.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Constâncio de Oliveira.
Ernesto Jardim de Vilhena.
Francisco Alberto da Costa Cabral.
Francisco Cruz.
Francisco de Sales Ramos da Costa.
Gastão Correia Mendes.
Germano Lopes Martins.
Hermano José de Medeiros.
Jaime Zuzarte Cortesão.
João Barreira.
João de Barros.
João Cabral de Castro.
João Crisóstomo Antunes.
João de Deus Ramos.
João José da Conceição Camoesas.
João José Luís Damas.
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João Pereira Bastos.
João Teixeira Queiroz Vaz Guedes.
Joaquim José de Oliveira.
José António Simões Raposo Júnior.
José Bessa de Carvalho.
José Botelho de Carvalho Araújo.
José Maria Vilhena Barbosa de Magalhães.
José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.
Júlio do Patrocínio Martins.
Levy Marques da Costa.
Luís Carlos Guedes Derouet.
Manuel da Costa Dias.
Raimundo Enes Meira.
Vitorino Henriques Godinho.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Não compareceram à sessão os Srs.
Alexandre José Botelho de Vasconcelos e Sá.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Angelo Vaz.
António Alberto Charula Pessanha.
António de Almeida Garrett.
António Augusto de Castro Meireles.
António Caetano Celorico Gil.
António José de Almeida.
António Maria da Cunha Marques da Costa.
António Maria Malva do Vale.
António Miguel de Sousa Fernandes.
Augusto Luís Vieira Soares.
Eduardo Augusto de Almeida.
Francisco José Fernandes Costa.
Gaudêncio Pires de Campos.
Guilherme Nunes Godinho.
Helder Armando dos Santos Ribeiro.
Jaime Daniel Leote do Rêgo.
João Catanho de Meneses.
João Lopes Soares.
João Pedro de Sousa.
João Tamagnini e Sousa Barbosa.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
José Alfredo Mendes de Magalhães.
José de Barros Mendes de Abreu.
José de Freitas Ribeiro.
José Maria Gomes.
José Mendes Cabeçadas Júnior.
Manuel Augusto Granjo.
Manuel Firmino da Costa.
Manuel Gregório Pestana Júnior.
Rodrigo José Rodrigues.
Vítor Hugo de Azevedo Coutinho.
O Sr. Presidente: - Estão presentes 66 Srs. Deputados e vai ser lida a acta.
Eram 15 horas e 5 minutos.
Foi lida a acta.
O Sr. Presidente: - Encontram-se na sala 75 Srs. Deputados e está em discussão a acta.
Foi aprovada a acta.
Expediente
Telegramas
Sant'Ana. - Câmara Municipal Sant'Ana, salvaguardando interesses distrito, pede V. Exas. não sejam aprovados projectos venda água colónia autonomia junta agrícola que esmagou apicultura, vinhos toda economia agrícola. - Presidente.
Para a Secretaria.
A comissão Executiva da Junta Geral do Pôrto pede com o maior interesse que seja pôsto em execução com a possível brevidade o projecto de lei apresentado pelos Srs. Deputados, Adriano Pimenta, Germano Martins e Jaime Cortesão, na sessão de 17 do corrente.
Para a Secretaria.
De Baião. - Estiveram esta noite sede dêste concelho administrador e presidente câmara Mesão Frio que procuravam administrador daqui a quem aquele havia telegrafado três vezes no sentido de permitir livre trânsito do milho para aquele concelho, não obtendo resposta apesar de o procurarem pessoalmente não o encontraram, pois reside Pôrto, onde é empregado comercial. Tanto o Douro como o povo dêste concelho pretendem que o milho que aqui possa ser dispensado vá matar fome povo Mesão Frio e não seja para o Minho para onde o administrador daqui o está comprando e pretende fazer exportar com fôrça armada para tal fim solicitada; se prontas medidas não forem tomadas, será dentro em breve invadido êste concelho pelo povo de Mesão Frio, Santa Marta e Régua, prevendo-se graves conflitos e desgraças a lamentar.
A Câmara minha presidência aproveita ocasião levar conhecimento de V. Exa. que êste concelho está sem autoridade administrativa há três meses, limitando-se
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a vir aqui duas ou três vezes por mês comprar milho e receber ordenado: assim, em nome povo dêste concelho, peço providências imediatas. - O Presidente Câmara Baião, José Pinto Soares.
Representações
Do Sr. António de Sant'Ana Cabrita Júnior, capitão de artilharia, pedindo para que lhe sejam pagos os seus vencimentos durante o tempo em que exerceu o cargo de chefe de estado maior do destacamento expedicionário a Moçambique em 1914.
Para a comissão de guerra; conforme o despacho supra.
Dos guardas das cadeias civis, pedindo para lhe ser abonada a importância de $30 ou lhes seja fornecida comida, conforme é feito aos seus colegas da Cadeia Racional.
Para a Secretaria.
Para a comissão de finanças.
Dos oficiais e amanuenses da Delegação de Saúde de Lisboa, pedindo para serem incluídos no quadro da Direcção Geral de Saúde com as categorias de um segundo oficial e dois terceiros, com os mesmos vencimentos que auferem os funcionários de idêntica categoria da referida Direcção Geral.
Para a Secretaria.
Para a comissão de saúde e assistência.
Do Sr. João Nascimento Azevedo, segundo sargento n.° 796 da 7.ª companhia de reformados, pedindo que lhe seja aplicado o disposto no § único da lei de 14 de Maio de 1914.
Para a Secretaria.
Para a comissão de guerra.
Ofícios
Do Sr. Ministro do Interior, enviando à Câmara ofícios e telegramas de várias agremiações do concelho de Celorico de Basto, protestando contra a desanexação da freguesia de S. Bartolomeu do Rêgo, do referido concelho.
Para a Secretaria.
Para a comissão de administração pública.
Do Sr. Ministro da Guerra, enviando á Câmara determinados documentos pedidos pelo Sr. Deputado João Pereira Bastos.
Para a Secretaria.
Do Sr. Ministro da Guerra, enviando à Câmara alguns esclarecimentos pedidos pelo Sr. Deputado José António da Costa Júnior.
Para a Secretaria.
Do Sr. Ministro da Guerra, enviando à Câmara documentos relativos ao primeiro sargento do regimento de infantaria n.° 1, Marnede Augusto Arvelos Formosinho, conforme pedido do Sr. João Lopes Soares.
Para a Secretaria.
Admissões
Foram admitidas à discussão as seguintes disposições de lei:
Artigo 1.° As disposições da lei de 4 do Setembro de 1915 que regula a promoção ao pôsto de tenente dos alferes do serviço de saúde, serviço veterinário, secretariado militar, quadros auxiliares do exército e chefes de música de 3.ª classe são extensivas aos alferes de cavalaria e infantaria.
Art. 2.° Fica revogada a legislação era contrário.
Sala das sessões, 23 de Fevereiro de 1916.- O Deputado, Tomás de Sousa Rosa.
Admitido. Para a comissão de guerra.
Artigo 1.° É o Govêrno autorizado a vender ou a aforar, nos termos da presente lei, quaisquer propriedades rústicas ou terrenos destinados à agricultura, e que, sendo pertença do Estado ou próprios da Fazenda Nacional, por qualquer título gratuito ou oneroso venham sendo explorados ou usufruídos por outrem ha mais de dez anos consecutivos.
§ único. A venda ou aforamento efectuar-se hão sempre em hasta pública, salvas as determinações do artigo seguinte.
Art. 2.° Aos rendeiros e colonos que o tenham sido consecutivamente, durante mais de dez anos, das propriedades e terrenos referidos, por contrato ou contra-
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tos com o Estado ou com usufrutuários vitalícios das mesmas propriedades ou terrenos, é permitido comprar ou tomar de aforamento as próprias propriedades ou terrenos de que hajam sido colonos ou rendeiros, desde que o requeiram pelo Ministério das Finanças, no prazo máximo de trinta dias, a contar da publicação da presente lei no Diário do Govêrno.
§ 1.° Havendo mais de um rendeiro ou colono nas condições dêste artigo, será preferido o que o tenha sido durante maior espaço de tempo
§ 2.° No caso de morte ou por impedimento de qualquer rendeiro ou colono nas condições designadas, consideram-se subrogados em todos os direitos que lhe são consignados neste artigo e parágrafo anterior, como se fora vivo ou não estivera impedido, os seus descendentes, desde que pró r em ser agricultores ou lavradores.
Art. 3.° No caso de ser requerida a venda, como determina o artigo anterior, o preço das propriedades ou terrenos a que respeita será o representado pela soma de vinte rendas anuais, calculadas segundo a média das anuidades obtidas nos últimos cinco anos.
Art. 4.° No caso de ser requerido o aforamento, a importância do foro será correspondente a uma sexta parte da renda anual, tomando por base a média das rendas nos últimos cinco anos, entendendo-se estipulado o total de cinco foros para os efeitos de laudémio.
Art. 5.° Quando as propriedades e terrenos a que se refere a presente lei estejam por qualquer título sujeitos a usufruto vitalício de terceiros, o preço da venda obtido será convertido em títulos de dívida pública averbados com a cláusula dêsse usufruto e entregues aos usufrutuários, para o fim de percebimento por êstes dos respectivos juros, e de igual sorte lhe pertencerão durante e tempo do seu usufruto os foros que se vençam em caso de enfiteuse, os quais poderão cobrar directamente dos enfiteutas.
§ 1.° Quando haja lugar a remissão de enfiteuse, se procederá como no caso de venda, quanto ao valor das vinte pensões do foro.
§ 2.° É expressamente ressalvado o direito do Estado de fazer anular em qualquer tempo pelo meio competente os títulos de usufruto, quando para tanto haja lugar.
Art. 6.° Fica revogada a legislação em contrário.
Sala das Sessões da Câmara dos Deputados, em 23 de Fevereiro de 1916. - O Deputado, António Maria da Cunha Marques da Costa.
Admitido. Para a comissão de Agricultura.
Artigo 1.° Os oficiais maquinistas nomeados para prestarem interinamente, na Direcção das Construções Navais, os serviços de engenheiros de máquinas, ou os diplomados com êste curso, são colocados em comissão especial ao abrigo das disposições do artigo 116.° do decreto com fôrça de lei de 14 de Agosto de 1892.
Art. 2.° Os oficiais maquinistas nomeados, por concurso, agentes técnicos de máquinas, segundo o disposto no artigo 189.° do decreto com fôrça de lei, de 22 de Maio de 1911, são colocados em comissão especial, ao abrigo das disposições do artigo 116.° do decreto com fôrça de lei de 14 de Agosto de 1892.
Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrário.
Sala das Sessões, em 23 de Fevereiro de 1916.- O Deputado, Domingos da Cruz.
Admitido.
Para a comissão de marinha.
Artigo 1.° É autorizada a Câmara Municipal do concelho de Ilhavo a vender em hasta pública todos os seus terrenos baldios, que não sejam de interesse municipal, a fim de com o produto da venda poder realizar melhoramentos de utilidade pública.
§ único. Esta mesma autorização é aplicável aos terrenos que porventura se encontrem na posse ilegítima de munícipes.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário.
Câmara dos Deputados, 23 de Fevereiro de 1916.- O Deputado, A. Marques da Costa.
Admitido.
Para a comissão de administração pública.
Artigo 1.° É o Govêrno autorizado a contrair um empréstimo até a quantia de
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200.000$, que será levantado por séries, exclusivamente destinado à construção de cinco faróis no arquipélago dos Açores, colocados nos seguintes locais: um na Ponta do Castelo, Ilha de Santa Maria, distrito de Ponta Delgada; um na Ponta das Contendas, Ilha Terceira, e um na Ponta do Carapacho, Ilha Graciosa, distrito de Angra do Heroísmo; um na Ponta do Albernaz, Ilha das Flores, e um na ponta leste da Ilha do Pico, distrito da Horta, de acôrdo com o plano adoptado pela comissão nomeada por portaria do Ministério da Marinha, do 28 de Outubro de 1902, e com as indicações técnicas da repartição competente, no mesmo Ministério.
§ único. Esto empréstimo, cuja amortização será feita no prazo máximo de vinte anos e a juro não superior a 5 por cento ao ano, será feito em qualquer estabelecimento de crédito do continente da República ou das ilhas adjacentes ou com qualquer entidade financeira de reconhecida idoneidade.
Art. 2.° As juntas gerais dos distritos de Ponta Delgada e Angra do Heroísmo concorrerão com a importância dos juros e amortização de metade das quantias que forem despendidas nos faróis que se construírem nos respectivos distritos administrativos, inscrevendo as quantias destinadas a êsse fim nos seus orçamentos ordinários e entregando-as ao estabelecimento em que tiver sido feito o empréstimo, por intermédio do Govêrno ou directamente.
§ único. As quantias que as juntas gerais tiverem de entregar principiarão a ter êsse destino no ano seguinte àquele em que se iniciarem os trabalhos de construção dos faróis, nos respectivos distritos.
Art. 3.° O saldo da anuidade a pagar pela importância do empréstimo será satisfeito pelo Govêrno, da verba da receita do imposto de farolagem.
Art. 4.° Durante o período em que as juntas gerais dos dois distritos de Ponta Delgada e Angra do Heroísmo tiverem de satisfazer os encargos resultantes desta lei, ficam dispensadas de contribuir para a construção de novos faróis, continuando, porem, com o encargo da sua conservação.
Art. 5.° O Govêrno providenciará para que os faróis, a que se refere o artigo 1.°, entrem em funcionamento dentro do prazo de dois anos, a contar da publicação desta lei.
Art. 6.° Fica revogada a legislação em contrário.
Sala das sessões da Câmara dos Deputados, 23 de Fevereiro de 1916.- Amadeu Monjardino.
Admitido.
Para a comissão de marinha.
O Sr. Vieira da Rocha: - Pedi a palavra para mandar para a Mesa um projecto de lei que trata dum assunto cuja resolução de há muito vem sendo reclamada por todos aqueles que consagram a sua actividade ao estudo das questões de direito, como sejam os magistrados, os jurisconsultos e os advogados.
A lei de 21 de Julho de 1867 mandava que em 22 de Março de 1868 entrassem em execução, no continente de Portugal, as disposições que constituem o chamado Código Civil Português, e o artigo 6.° dessa mesma lei consignava que qualquer alteração que de futuro viesse a fazer-se ás disposições ou artigos nele contidos seriam introduzidas dentro do referido Código, vindo a fazer dele parte integrante, quer essa alteração viesse revogar total ou parcialmente qualquer dos seus artigos, quer ela viesse regular matéria nova, que, pela natural evolução dos princípios sociais e jurídicos, mão tinha sido prevista ou considerada na época da sua promulgação.
As disposições do artigo 6.° da referida carta de lei não lograram ainda ser executadas em Portugal, e, depois de numerosas edições oficiais que tem sido publicadas do Código Civil, êle encerra ainda no seu seio aquelas disposições que estavam nele contidas á data da sua publicação e que, por virtude de legislação posterior, se encontram revogadas.
A certesa do direito e sua clareza é uma das condições essenciais à vida e ao progresso das sociedades. Quando nos tribunais reina a dúvida acêrca de quais sejam as disposições que devem aplicar-se à resolução de qualquer hipótese ocorrente, quando a jurisprudência não sabe determinar quais sejam as normas a seguir na resolução de qualquer caso, podemos dizer que a vida da sociedade e a vida dos indivíduos que a constituem se encontram
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desprotegidas em face da confusão das normas do direito.
Urge, pois, pôr um termo a êste estado de cousas, prejudicial à nossa vida jurídica e prejudicial portanto à nossa vida social. O projecto que tenho a honra de enviar para a Mesa visa a terminar coca êsse estado de cousas a que acabo de referir-me.
As modificações do Código Civil tem-se realizado sempre que disposições avulsas vem lançar nele a confusão. Foi assim que a confusão do nosso direito, nas primeiras épocas ou, melhor, nos primeiros séculos da nacionalidade portuguesa, aconselharam a publicação das Ordenações Afonsinas. E quando, depois da publicação dêstes primeiros códigos, - se códigos se lhes pode chamar,- novas leis, com carácter avulso e extravagante, vieram estabelecer a desordem, seguiu- se a legislação manuelina.
Quando das cortes de 1761, pedia-se que se publicasse, desde logo, um Código Administrativo, em Portugal, porquanto o povo não queria ser regido pelas Ordenações Filipinas, que haviam sido promulgadas por um monarca de origem e nacionalidade espanhola, e essa reclamação só muito tarde foi atendida, em 1767, quando o caos da nossa legislação chegou ao último ponto, por virtude das numerosas disposições legislativas do Marquês de Pombal, que vinham modificar as disposições anteriores, principalmente na parte em que o direito civil trazia a organização política e administrativa da nacionalidade portuguesa.
Foi então nomeada uma comissão para elaborar um projecto de lei, tendo apresentado um projecto o professor Pascoal Pereira, da Universidade de Coimbra, mas que não conseguiu vingar.
Com a Revolução Francesa vieram para Portugal as novas ideas que tinham produzido as alterações no direito civil dos povos modernos; e por isso mesmo se pensou logo, na Constituinte, em nomear uma comissão de elaboração dum projecto do Código Administrativo Português, que não chegou a ser elaborado nas primeiras décadas do constitucionalismo em Portugal, porque êsse espaço de tempo foi, por vezes, interrompido pelas constantes discussões, ora absolutistas, um constitucionalistas, e porque a atenção da Câmara tinha sido absorvida pelo estudo do problema que mais dizia respeito ás bases fundamentais da nacionalidade portuguesa.
Era preciso dar a Portugal o Código das suas autorquias locais, e é por isso que, desde 1822 até 1867, nós vemos, numa grande parte, a atenção do Poder Legislativo absorvido Da Constituição de 1822, na Constituição de 1838, e na elaboração dos vários códigos administrativos que então foram publicados em Portugal. É à parte êsse Novíssimo Código da Reforma Judiciária, publicado em 1842, á sombra do qual ainda hoje, infelizmente, dormimos, mais nada, em Portugal, se realizou em matéria de codificação.
Em 1867 apareceu o Código Civil Português, e por virtude do artigo 6.°, da sua carta de lei, qualquer modificação que fôsse introduzida no mesmo código, faria dele parte integrante.
Todavia, essa disposição não se tem cumprido.
A par destas circunstâncias, uma outra de carácter capital é importante considerar neste momento, em que, apôs a implantação da República em Portugal, uma grande revolução, sob o ponto de vista jurídico, se realizou neste país, incompatível com muitas das disposições exaradas no Código Civil Português.
Precisamente, porque é uma República com uma organização jurídica com as mais superiores aspirações, tem obrigação de movimentar, desde os seus alicerces, as forças do nosso direito privado e de o colocar a par do direito das nações mais cultas e mais modernas. (Apoiados).
Nestas condições creio ter justificado o projecto que tenho a honra de mandar para a Mesa e espero que êle será tomado na devida consideração.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. João Gonçalves: - Sr. Presidente: aproveito a presença do Sr. Ministro do Interior para chamar a atenção de S. Exa. para um facto a que já tive ocasião de me referir.
V. Exa., Sr. Presidente, deve estar lembrado de que em tempos tratei, nesta Câmara, dum caso de morte, praticado em Vila Franca.
Procedeu-se a várias diligências nessa ocasião que não foram levadas a cabo, porque a certa altura o respectivo administrador
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do concelho fez sentir ao agente de investigação criminal a sua mágua, por terem sido chamados a prestar declarações indivíduos que lhe eram particularmente afectos, e ao seu partido.
Pelos documentos oficiais, que tenho em meu poder, vê-se que, alêm dos detidos, outras pessoas foram chamadas a prestar declarações, pessoas que pela sua respeitabilidade e categoria social devem merecer consideração ás quais a conduta dos agentes tinha colocado numa situação tal, que muitos poderiam duvidar da sua honestidade.
Devo dizer que todos que foram chamados a prestar declarações, se acusavam mutuamente de gatunos e de terem cometido furtos.
Estas eram as tais pessoas, por quem o administrador do conselho se mostrava maguado por terem sido chamadas a prestar declarações!
Leu.
Quer dizer: o agente de investigação criminal termina por dizer que mais nenhuma pessoa foi chamada a prestar declarações e que nenhuma outra foi detida.
No emtanto, pelas declarações do administrador, pretende-se lançar a suspeição de que tinham sido chamadas a prestar declarações, alem dos detidos, outras pessoas de alta respeitabilidade.
Eu, Sr. Presidente, devo fazer justiça ao Partido Democrático de Vila Franca de Xira, onde se encontram criaturas honestas e bem intencionadas; mas, em nome da dignidade de todos nós, em nome da dignidade da República, eu não posso, sem o meu protesto, consentir que essa autoridade venha encobrir o procedimento destas criaturas, alegando que elas eram democráticas; sendo triste, verdadeiramente, que factos dêstes se produzam.
Vila Franca precisa duma autoridade com bom senso; e se a actual o tem, eu vejo que lhe falta a energia que os casos como êste e desta natureza requerem.
Estas últimas ocorrências tornaram-se públicas, assim como as declarações da autoridade; e assim V. Exa. pode ver em que princípios se funda o administrador para manter a ordem nessa localidade.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro do Interior (Almeida Ribeiro):- Sr. Presidente: quando o Sr. João Gonçalves tratou pela primeira vez do assunto a que acaba de referir-se, eu disse que ia informar-me do que havia e que procederia conseqùentemente.
Pedi informações e delas não apurei procedimento irregular das estações oficiais, que me habilitasse a concluir que tivesse havido qualquer acção menos correcta por parte das autoridades de Vila Franca de Xira.
O Sr João Gonçalves, porêm, com documentos diversos, fez considerações abundantes, demonstrando que efectivamente tinha havido, por parte do administrador, quaisquer irregularidades.
O Sr. João Gonçalves: - Houve grande imprudência para com as criaturas dessa natureza, acusadas de gatunos e de assassinos.
O Orador: - Os presos foram chamados a prestar declarações diversas.
O Sr. João Gonçalves: - Os que prestaram declarações foram aqueles cujos nomes eu li há pouco a V. Exa.
O Sr. Luís Derouet: - Ordem! Ordem! Custa-me que êste Parlamento esteja a perder tanto tempo com cousas destas.
Devo dizer a V. Exa. que o administrador é um bom republicano e o escrivão é um ferrenho monárquico.
O Sr. Francisco Cruz: - Lá por ser monárquico podia ser um homem honrado.
Conheço alguns republicanos que são verdadeiros bandidos e monárquicos que são pessoas honestíssimas.
O Sr. Presidente: - Peço a atenção da Câmara. Tem a palavra o Sr. Ministro do Interior.
O Sr. Ministro do Interior (Almeida Ribeiro) (continuando): - Mas, dizia eu, Sr. Presidente, que o Sr. João Gonçalves trouxe agora documentos diversos, fazendo várias considerações em que procurou demonstrar que o administrador do concelho de Vila Franca tinha procedido menos dignamente.
Parece-me que S. Exa. confundiu declarações com detenções. Nas funções administrativas de carácter judicial, como própria-
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mente em juízo, acontece serem chamadas pessoas a prestar declarações, mas pessoas que não são arguidas.
O Sr. João Gonçalves: - Isso frisei eu a V. Exa.
O Orador: - Os detidos podem estar acusados de crimes; mas os declarantes estão em condições absolutamente distintas.
Termino, Sr. Presidente, afirmando ao Sr. Deputado João Gonçalves que se eu concluir que o administrador procedeu menos dignamente, por certo tirarei as consequências dêsse procedimento.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Carlos Olavo (por parte da comissão de administração publica): - Pedi a palavra para mandar para a Mesa um parecer desta comissão.
O Sr. Alfredo Ladeira (por parte da comissão de petições): - Para enviar para a Mesa um parecer desta comissão.
O Sr. Francisco Cruz: - Pedi a palavra para chamar a atenção do Sr. Ministro do Interior para um caso que S. Exa. decerto remediará, que é a necessidade de se policiar a estação do caminho de ferro de Pampilhosa.
Como S. Exa. sabe, Pampilhosa é uma das estações mais movimentadas do país; portanto, não é razoável que constantemente seja invadida por gatunos nacionais e estrangeiros, que roubam volumes das carruagens e as carteiras dos bolsos dos passageiros.
Eu acho que era de toda a conveniência colocar ali uma estação permanente da guarda republicana, visto que outras localidades de menos importância as tem; e pedia ao Sr. Ministro do Interior que olhasse, com olhos de ver, para êste caso.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro do Interior (Almeida Ribeiro):- Sr. Presidente: eu tenho já conhecimento da falta de guarda republicana na estação de Pampilhosa, porque foi a própria Companhia dos Caminhos de Ferro que, em tempos, me oficiou mostrando a situação, - que é, realmente, vergonhosa! - motivada pela gatunagem que priva os passageiros, por vezes, de quantias e objectos importantes. Mas, dada a relativa escassez de guarda nacional republicana, por isso que os quadros, criados pela lei de 1 de Junho de 1913, não puderam ainda ser todos organizados, havendo, portanto, para criar ou para organizar muitas companhias ou partes de companhias e batalhões, eu não pude satisfazer, na ocasião, o pedido pela forma porque o Sr. Deputado Francisco Cruz agora indicou, que consistia em que a guarda nacional republicana fôsse policiar permanentemente aquela estação. Em todo o caso, não descurei o assunto e agora, tentando solucionar o problema ao menos transióriamente, vou ordenar que polícia, vá de qualquer outro ponto, por exemplo de Coimbra, de modo que ao menos se atenue um pouco o inconveniente a que a Companhia dos Caminhos de Ferro e agora o Sr. Deputado aludiram.
Era isto o que eu tinha a dizer.
O orador não reviu.
O Sr. Vitorino Godinho: - Sr. Presidente: pedi a palavra para chamar a atenção do Sr. Ministro da Instrução Pública para a situação especial e delicada em que se encontra o inspector da circunscrição escolar de Ancião em relação à respectiva câmara municipal.
O Sr. Ministro de Instrução Pública não desconhece que êsse inspector, dê há tempos a esta parte, - pode mesmo dizer-se: - desde a época em que ali foi colocado! - tem vindo a criar uma situação, para êle cada vez mais dificultosa, em relação à Câmara Municipal de Ancião. S. Exa. mandou fazer um inquérito, de que eu não sei o resultado; mas o que sei, por informações que eu tenho por seguras, é que o indivíduo encarregado de proceder a essa diligência se demorou na localidade apenas umas 36 horas, não tendo, com certeza, tempo bastante, no meu entender, para apreciar da verdade dos factos e da situação em que se encontra o inspector escolar.
O que sei, tambêm, é que várias entidades, daquela circunscrição escolar, telegrafaram ao sindicante comunicando-lhe que queriam ser ouvidas, e êle não quis ouvi-las, parece que por ter pressa de retirar--se daquela terra, que, se não é uma for-
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mosura, não é tam má que não consiga demorar um visitante três ou quatro dias. especialmente quando lá tem que fazer.
Eu não quero pôr em dúvida a competência profissional e a honorabilidade do sindicante, tanto mais que me dizem ser êle meu correligionário dedicadíssimo, como o é sempre que o Partido Democrático está no Poder (Risos); não quero tambêm pôr em dúvida a razão que possa assistir ao inspector escolar, que deve ser um dedicado amigo da instrução primária, pois que, tendo o curso de medicina, o põe de parte para se dedicar à instrução primária; mas, o que peço ao Sr. Ministro, que tem pôsto e põe, ao serviço da instrução, toda a sua boa vontade, o que peço a S. Exa. é que, no interesse do próprio inspector, mande proceder a uma rigorosa sindicância, e que o sindicante que vá àquela localidade não seja tam apressado e possa ouvir todas as entidades que desejam depor.
O caso é simples, como S. Exa. acaba de ver, e eu, como informação, vou ainda ler o que diz um jornal a êsse respeito.
Leu.
Houve, pois, pessoas que desejaram ser ouvidas pelo sindicante, mas êle não ligou importância a êsse desejo.
Portanto S. Exa. o Sr. Ministro tem de proceder no próprio interesse da instrução.
Tenho dito
O orador não reviu.
O Sr. Ministro de Instrução (Ferreira de Simas): - Sr. Presidente: o processo a que se refere o Sr. Deputado Vitorino Godinho foi por mim recebido ainda há poucos dias, e ainda não tive tempo de o estudar detidamente para poder confirmar ou não as afirmações que fez o ilustre Deputado.
Não posso porêm deixar de dizer que se nomeei êsse sindicante referido, não foi por êle ser meu correligionário, mas por ser um inspector de circunscrição, e que eu procederei de forma a que justiça seja feita ao sindicante e a todos.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: - Tenho a participar à Câmara que nomeio para tomarem parte na homenagem comemorativa do aniversário do falecimento do Deputado Henrique Cardoso os Srs. Angelo Vaz, Adriano Pimenta e Augusto Nobre.
Vai passar-se á ordem do dia, discussão na especialidade do parecer n.° 234.
Os Srs. Deputados que tenham documentos para mandar para a Mesa, podem fazê-lo.
Documentos enviados para a Mesa
Projecto de lei
Do Sr. Deputado Albino Vieira da Rocha, autorizando o Govêrno a nomear uma comissão, composta de jurisconsultos, encarregada da execução, por projecto, do artigo 6.° da carta de lei de 1 de Julho de 1867 e de propor ao Govêrno todas as modificações que entender convenientes ao Código Civil.
Para o "Diário do Govêrno".
Renovação de iniciativa
Renovo a iniciativa do projecto de lei n.° 192-B, publicado no Diário do Govêrno n.° 111, de 14 de Maio de 1914. - O Deputado, Lopes Cardoso.
Para a comissão de finanças com toda a documentação existente.
Projecto de lei
Do Sr. Pedro Virgolino Ferraz Chaves, cedendo definitivamente á Irmandade da Misericórdia do concelho de Ovar todos os móveis e imóveis arrolados nos concelhos de Ovar e Anadia pertencentes ao Colégio do Sagrado Coração de Jesus e Colégio, vulgarmente denominado, das Doroteias.
Para a Secretaria.
Para o "Diário do Govêrno".
Requerimentos
Requeiro que, pelo Ministério do Fomento, me sejam fornecidos com a maior urgência os seguintes documentos:
1.° Cópia das actas das reuniões do júri que, nos termos do n.° 6.° do anúncio de 11 de Dezembro de 1915, publicado no Diário do Govêrno, 2.ª série, n.° 289 de 14 do dito mês e ano, classificou os desenhos (projectos) dos concorrentes ao concurso das novas estampilhas do correio e para encomendas postais.
2.° Declaração do número de desenhos (projectos) apresentados pelos concorrentes
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quer do tipo de estampilhas para encomendas postais quer do correio.
3.° Declaração das dimensões exacta dos desenhos apresentados para cada um dos tipos das referidas estampilhas em altura e largura com a designação da - Divisa - adoptada nesses desenhos.
4.° Declaração das dimensões exactas em altura e largura de cada um dos desenhos (projectos) que pelo júri foram classificados com os primeiros e segundos prémios. - O Deputado, José Augusto Pereira.
Para a Secretaria.
Requeiro que, pelo Ministério de Instrução Pública, me seja fornecido um exemplar do livro Lutos caseiras de Marques Gomes. - O Deputado, Casimira Rodrigues dê Sá.
Para a Secretaria.
Requeiro que, pelo Ministério do Fomento, me sejam enviados os documentos que por várias vezes já tenho requerido com urgência, relativos à administração dos Caminhos de Ferro do Estado, especialmente relativos às gratificações distribuídas em harmonia com o § 17.° da base 1.ª (14 de Julho de 1899); como eu preciso dêsses esclarecimentos antes do Orçamento entrar em discussão, repito, preciso com urgência dêsses documentos, e por agora limito-me a registar o facto. - José António da Costa Júnior.
Para a Secretaria.
Requeiro que, pelo Ministério de Instrução, me seja fornecido um exemplar do livro Lutas Caseiras, por Marques Gomes.- O Deputado, Alfredo Maria Ladeira.
Para a Secretaria.
Requeiro que, com muitíssima urgência, pelos Ministérios do Fomento e Finanças, me sejam fornecidas cópias:
Do mapa do rateio para a exportação de lãs, ultimamente autorizada, com o nome dos requerentes, quantidades e qualidades que pediam para exportar e números de quilogramas que foram ou serão autorizados a exportar;
Do resultado do inquérito a que se procedeu para fazer o rateio.- O Deputado, Albino Pimenta de Aguiar.
Para a Secretaria.
Requeiro que, pelo Ministério de Instrução, me seja permitido examinar na repartição respectiva o processo disciplinar instaurado contra o professor de instrução primária da freguesia de Santo Estêvão, do concelho de Tavira, Veríssimo Manuel Martins.- O Deputado, Aresta Branco.
Para a Secretaria.
Requeiro que, pelo Ministério de Instrução Pública, me seja fornecido o livro Lutas Caseiras, do escritor Marques Gomes.- O Deputado, Júlio Martins.
Para a Secretaria.
Requeiro que, do Ministério dos Estrangeiros, se requisite a alteração, sendo possível, da obra publicada oficialmente no Canadá Rapport sur le développement dês industries electrochimiques en Europa, par la commission canadienne.- Bernardo Lucas.
Para a Secretaria.
Requeiro que, pelo Ministério do Interior, me seja fornecido um exemplar da obra A instrução educativa e a organização geral do Estado, publicada, em 1909, por aquele Ministério.- Bernardo Lucas.
Para a Secretaria.
Pareceres
Da comissão de negócios eclesiásticos, sôbre o projecto de lei n.° 301-H, da iniciativa do Sr. Adriano Gomes Ferreira Pimenta, autorizando o Govêrno a vender á Junta Geral do distrito do Pôrto o edifício do antigo seminário dos Carvalhos.
Para a comissão de administração pública.
Da comissão de finanças, sôbre o projecto de lei n.° 241-1, da iniciativa do Sr. Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa, criando um novo distrito administrativo com sede na cidade de Lamego.
Imprima-se.
Da comissão de petições, sôbre requerimentos de vários cidadãos que pedem para ser reconhecidos como revolucionários civis.
Para a Secretaria.
Imprima-se.
Da comissão de administração pública, sôbre o projecto de lei n.° 7-Q, da inicia-
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tiva do Sr. Francisco de Sousa Dias, autorizando a Câmara Municipal de Benavente a aceitar as casas que lhe são concedidas, sôbre designadas condições, pela comissão de socorros às vítimas do terremoto ali sofrido.
Para a Secretaria.
Para a comissão de finanças.
Da comissão de finanças, sôbre o projecto de lei n.° 306-H, da iniciativa do Sr. Ministro do Interior, abrindo um crédito especial de 80.000$, a favor do Ministério do Interior, para o pagamento de férias ao pessoal da Imprensa Nacional, material e diversas despesas.
Para a Secretaria.
Imprima-se.
Da comissão de colónias, sôbre o projecto de lei n.° 213-B, da iniciativa do Sr. Ministro das Colónias, modificando as leis n.ºs 277 e 278, de 15 de Agosto de 1914, sôbre as bases orgânicas das colónias.
Aprovado.
Para a comissão de redacção.
Dispensada a leitura da última redacção.
ORDEM DO DIA
Continuação da discussão do parecer 11.° 231, sôbre a proposta de lei n.° 213-B, modificando algumas bases das leis n.ºs 277 e 278 de 15 de Agosto de 1914.
O Sr. Brito Camacho: - Tendo sido preguntado, no final da sessão de ontem, por parte da oposição evolucionista, se o Govêrno viria hoje à Câmara informá-la acêrca da apropriação dos navios alemães - e tendo até o Sr. Aresta Branco preguntado se o Sr. Presidente do Ministério viria à Câmara na sessão de ontem, ao que o Sr. Presidente respondera que S. Exa., por motivo de serviço público, não podia comparecer, - desejaria eu, Sr. Presidente, saber se, efectivamente, estando S. Exa. hoje presente, tenciona informar o Parlamento sôbre o que se passou, desde já, ou se julga necessária uma sessão especial.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Afonso Costa): - Sr. Presidente: tive informação de que dois ilustres Deputados da oposição desejavam, interpelar o Govêrno. Estou inteiramente à disposição da Câmara e de qualquer ilustre Deputado para responder a quaisquer preguntas. Informações acêrca do que se passou a propósito dos navios alemães, parecem-me desnecessárias, porque os jornais deram disso notícia circunstanciada, tendo sido publicado no Diário do Govêrno o decreto que expõe as circunstâncias em que o Govêrno procedeu, absolutamente dentro da esfera de acção cometida ao executivo pela legislação em vigor.
O orador não reviu.
O Sr. Brito Camacho: - Como o Sr. Presidente do Ministério declarou que nada tinha que dizer de sua iniciativa, mas que estava à disposição da Câmara ou de qualquer Deputado, dirigirei apenas algumas preguntas a S. Exa.
Disse o Sr. Presidente do Ministério que fez a apropriação de navios alemães no uso duma autorização do Parlamento e nos estritos termos da lei. Trata-se, por conseguinte, segundo o critério do Govêrno, da execução duma lei, duma questão de carácter jurídico e não duma questão de política internacional.
Visto que S. Exa. remeteu os Deputados que desejassem conhecer o assunto para os jornais, servir-me hei dêles para formular as minhas preguntas.
Vi nos jornais que o Govêrno tinha feito a apropriação não apenas de navios alemães surtos no Tejo, mas de todos que se encontrassem em qualquer ponto do território português, o que quere dizer, segundo os jornais, que o Govêrno se apropriou de sessenta e cinco navios que se encontram, uns no pôrto de Lisboa, outros nos portos das ilhas e outros nas colónias o que representa, tambêm conforme a mesma informação, uma tonelagem que excede muito as necessidades do comércio português.
Nessas condições, tenho de preguntar ao Govêrno se êle tenciona utilizar os navios para a satisfação das necessidades do comércio marítimo, a fim de prover às necessidades da alimentação pública, como se diz no decreto, e às necessidades industriais pelo transporte fácil, rápido e barata de matérias primas, ou se, dada a requisição de todos os navios estar em desproporção com as necessidades e com o vo-
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lume do comércio, o Govêrno tenciona explorar a indústria de fretes.
Não sei se, efectivamente, o comércio tem crescido de tal forma, e isso seria caso de regozijo, que torne indispensáveis todos êsses transportes, ou se o Govêrno, considerando as necessidades gerais e os altos lucros que hoje competem à indústria do transportes, se resolveu a fazer essa explorarão por bua conta. Admitindo que o Govêrno tencione, efectivamente, explorar a indústria de fretes, desejaria saber como e de que maneira o entende fazer, se por sua inteira conta e correndo o Estado todos os riscos duma indústria que, neste momento, é lucrativa, sendo ao mesmo tempo muito precária, se constituindo uma companhia que faça a exploração dessa indústria, ou se o Estado será comparte na companhia que, porventura, venha a criar-se. São preguntas inteiramente legítimas e ás quais o Govêrno nenhuma dificuldade terá em responder, se acaso o Govêrno - e assim o vi nos jornais - tenciona conservar os barcos e fazer a sua exploração mercantil. Lembrarei que se neste momento a indústria de fretes é realmente lucrativa, ela não deixa, contudo, de ser tambêm assas perigosa.
Tenciona o Govêrno utilizar os barcos para transporte de mercadorias e, por conseguinte, com todos os característicos de um transporte comercial? Parece-me que só nessa qualidade o Govêrno poderia usar e utilizar os barcos e, nessas condições, a indústria poderia não somente dar grande proveito ao Tesouro, mas podia, tambêm, dar despesas bastante avultadas. Suponho que nas condições actuais em que se fazem fretes marítimos, o Govêrno não lançaria para essa indústria todo êsse número de barcos sem que préviamente os tivesse segurado contra qualquer risco. Êles são, desde já, propriedade do Estado e o Estado, conforme se disse, a propósito do incêndio do Depósito de Fardamentos, não segura as suas propriedades. Não se seguram, em regra, navios de guerra, mas seguram-se navios mercantes; e sendo êstes hoje propriedade do Estado e instrumento duma indústria que o Estado exerce, desejaria eu saber se, no caso da administração directa dos navios pelo Estado, êle toma todas as providências de modo que os riscos de tal indústria fiquem reduzidos ao mínimo possível.
Reportando-me ainda aos jornais - visto ser essa a única fonte de informação que tenho, e que foi, de resto, legitimada pelo Sr. Presidente do Ministério - direi ter visto que os barcos serão detidos na posse do Estado e serão tripulados ou, pelo menos, comandados por oficiais da marinha de guerra, arvorando pavilhão e flâmula.
Não dou novidade alguma dizendo que barcos que tem a bordo oficiais de marinha de guerra e arvoram flâmula e pavilhão são, para todos os efeitos, barcos de guerra, e se podem fazer transportes de guerra não podem fazer tráfego mercantil.
Vi num dos decretos publicados que seria dada indemnização pelo uso que o Estado fizesse dos barcos de que se apropriou, mas fala-se apenas de indemnização por motivo de avaria. Tomando a palavra no significado que ela tem em direito comercial, não vi que indemnização fôsse devida pelo facto da avaria máxima ou deterioração máxima representadas pela perda do navio, e julgo esta consideração importante, não porque me importe saber de indemnizações que outros devam receber, mas porque preciso ver a medida em que pode ficar cerceada a margem de lucros, - se se vai exercer a referida indústria.
Desejaria eu saber como o Govêrno acautela os prejuízos que venham a resultar de perdas prováveis que êsses navios podem ter na sua fatalidade, pois sabe se como é fácil suceder hoje um desastre ou uma multiplicação de desastres sem que se possam determinar bem as suas cansas, porque um torpedo ou uma mina flutuante podem causar a perda de um navio e ninguêm responde por ela.
Não se explicando isto no decreto, desejaria eu saber tambêm se o Estado, dono dos navios e que os utiliza, tambêm é responsável pela sua perda total ou, em face do decreto, só pela avaria que não importe perda do objecto.
Parece-me que esta pregunta é inteiramente legítima e que se o Govêrno não o inscreveu no decreto, com maior facilidade esclarecerá a Câmara.
Tambêm vi nos jornais que alguns dos navios podem rapidamente e facilmente começar a ser aproveitados; mas que alguns outros, e creio que em número bastante grande, se encontram em estado de não poder ser de utilização imediata.
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Desejaria eu saber ainda se a indemnização a que se refere o decreto é contada desde o momento da apropriação ou apenas a partir da utilização, porque tratando-se de sessenta e tantos transportes, muitos dos quais exigem grandes reparações, - segundo dizem os jornais, - pode dar-se o caso de, precisamente quando se tenham feito largas despesas de reparação e despendido grossas somas em preparar êsses navios para exercer a sua função comercial, terminar nesse momento a guerra e o Estado ser obrigado a uma indemnização por serviços de que não tenha tirado utilidade ou por instrumentos de que não se tenha servido. Desejava que tambêm a êste respeito o Sr. Presidente do Ministério esclarecesse a Câmara, no que não vejo o mínimo inconveniente.
Desejava eu tambêm saber se o acto agora praticado implica, no critério do Govêrno, qualquer alteração, suspensão ou derogação do tratado de comércio feito com a Alemanha em 30 de Novembro de 1908, pois não será indiferente para o comércio português e para os comerciantes do estrangeiro que com Portugal mantêm relações comerciais, saberem se, efectivamente, subsiste êsse tratado ou se, automaticamente, porque a Alemanha tenha faltado ao cumprimento dalguma cláusula,- e ainda isso ontem, vinha nos jornais,- ou porque o acto agora praticado pelo Govêrno implique a futura dêsse tratado, o referido tratado caducou.
Já que me referi a êste ponto, direi que, a meu ver e na minha interpretação inteiramente desautorizada, porque nem sequer soa bacharel formado em direito, o artigo 2.° dêsse tratado dava ao Govêrno o direito à apropriação que fez. Tenho ouvido sustentar doutrina contrária; não me parece, porem, que ela possa assentar em bons e sólidos fundamentos. Tive ocasião, ainda no tempo da monarquia, de discutir na Câmara êsse tratado, e, se bem me recordo, um dos Deputados republicanos de então que discutiu o assunto, foi exactamente o actual Sr. Presidente do Ministério.
Faltava-me competência, mas estudei o assunto, como faz quem tem boa vontade e bons colaboradores; discuti o largamente e, se bem me lembro, o Sr. Presidente do Ministério disse, num dos seus discursos, que o tratado não tinha vantagens e que, porventura, seria a Alemanha a primeira a desejar que êle não fôsse aprovado.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Afonso Costa): - Disse que a Portugal é que êle não convinha.
O Orador: - Tenho ligeira idea de se ter dito que nem mesmo à Alemanha conviria. Lembro-me que a propósito se levantou a questão da impossibilidade em que Portugal ficava de cobrar os direitos alfandegários em ouro, o que quere dizer que o tratado não prestava e não merecia as honras com que o Parlamento o recebeu, até o ponto de se fazer uma festa ao Sr. Wenceslau de Lima, Presidente do Conselho de então. Mas é um tratado que está em vigor, à sombra do qual se criaram interesses e se estabeleceram relações comerciais que subsistem, dadas as nossas relações com a Alemanha, mas que podem, é certo, ter automaticamente caducado.
Tambêm me parece que para segurança, tranquilidade e confiança que deve ter quem faz o comércio em larga escala, não pode ser indiferente que o Govêrno diga à Câmara se, pelo acto agora praticado, nos termos da lei, conforme disse o Sr. Presidente do Ministério, e dentro do mais estrito direito, como S. Exa. afirmou, pode o comércio ter segurança de que êstes navios que arvoraram agora a bandeira portuguesa hão-de ser tratados como o devem ser os navios mercantes de todos os países que não estão em guerra.
Esta pregunta parece-me ser absolutamente necessária e creio que a resposta do Govêrno, conforme ela for, incutirá ou não uma grande confiança no comércio, podendo até intensificar as suas transacções.
Fica ao critério do Govêrno responder a esta pregunta como julgar mais conveniente.
Eu, ao formulá-la, sinto apenas o desejo de que não fique em ninguêm qualquer suspeição acêrca do acto praticado pelo Govêrno, a fim de que todos saibam que êle não encobre quaisquer sombras ou mistérios.
É um acto praticado á clara luz do sol, discutido no Parlamento como acto de administração pública.
Por emquanto não tenho necessidade de formular mais preguntas, a não ser a se-
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guinte: só o Sr. Presidente do Ministério pode dizer á Câmara se hoje, como ontem, subsiste, sem alteração, a nossa vida de relações. Não insisto, sequer, pela resposta; S. Exa. dirá o que julgar conveniente ou mesmo não dará nenhuma resposta, se isso for de conveniência maior.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Afonso Costa): - Sr. Presidente: vou responder com a maior simplicidade e rapidez às preguntas do Sr. Brito Camacho acêrca do acto, não só legítimo, mas necessário e urgente da requisição dos navios alemães fundeados nos portos portugueses. A lei em que o Govêrno se fundou para assim proceder tem a data de 7 de Fevereiro é a lei das subsistências, cuja base 10.ª diz que o Gov6rno poderá requisitar, em qualquer ocasião, as matérias primas e os meios de transporte que se encontrem nos domínios da República, e o decreto que regula o modo de o fazer tem o n.° 2:229, de 23 do corrente. Empregou o Sr. Brito Camacho a palavra apropriação em vez de requisição, que, devo dizer, tem uma significação bem diferente, e daí o equívoco em que S. Exa. me pareceu por um momento estar, supondo que êsses navios passavam a ser pertença do Estado quando êles apenas vão ser utilizados pelo Govêrno Português. Antes de mais nada, ocupar-me hei do aspecto jurídico da questão, porque, infelizmente, vejo que poderão existir dúvidas acêrca da legitimidade do procedimento do Govêrno. O Govêrno não só usou dum direito legítimo, mas ficou dentro da esfera de acção que lhe marcavam todas as convenções e toda a legislação interna e externa respeitante ao assunto.
Preguntou S. Exa. se seriam precisos todos os navios alemães surtos nos portos portugueses. A resposta que tenho a dar é afirmativa. Todos os navios existentes em 22 de Janeiro nos portos nacionais, imobilizados por virtude dos países a que pertencem os seus armadores estarem em guerra, são necessários ao nosso comércio, á nossa economia, à diminuição da gravidade do problema das subsistências.
Pode objectar-se que Portugal tem vivido com menos navios para o seu comércio, mas é preciso notar que o comércio português não tem sido assegurado apenas por navios portugueses, mas por navios estrangeiros, por carreiras de navegação estrangeira tocando nos nossos portos, por sua conveniência ou por conveniência do serviço de fretes.
As carreiras de navegação que se faziam, passando por Portugal, para as nossas colónias e para o Brasil, onde temos muitos compatriotas e um grande comércio, e para os países da Europa com os quais estamos em relações, estão muito diminuídas. As carreiras de navegação alemã estão suspensas por pertencer o domínio dos mares aos seus adversários. A navegação inglesa e francesa tem diminuído bastante, estando suspensas algumas das suas carreiras, e outras já se anuncia que vão ser reduzidas. De sorte que o nosso comércio com os países do norte da Europa, com o Brasil, com a América do Norte e, porventura, com as nossas polónias corre o risco, não só de diminuir, mas até de ser suprimido. Por consequência, ou temos navios de comércio para sustentar essas comunicações, ou sujeitamo-nos a ter de cortar as relações comerciais para todos êsses pontos e de aumentar a crise das subsistências não só na metrópole, mas até mesmo a vida das nossas colónias, algumas das quais são sustentadas pelo continente, como S. Tomé.
Esta crise é tam grave, e as condições em que êste problema coloca o nosso pais, pequeno, mas com um grande império colonial, sem marinha mercante, com a sua alimentação feita por via de importação em relação a muitas mercadorias, com necessidade de matérias primas para as indústrias, para as fábricas, caminhos de ferro e até empresas de navegação, são tais que, mesmo conservando a posição excepcional que temos ultimamente tido devido às nossas excelentes relações internacionais, seria para recear que viéssemos a cair numa situação absolutamente incomportável. Assim, pode dizer-se que seria precisa uma grande frota marítima para conservar o preço que as subsistências e as matérias primas hoje atingiram.
Os transportes em Inglaterra tem encarecido imensamente; ainda recentemente se fez o cômputo de que o preço de tonelagem para alguns países tem aumentado 1:000 por cento. A Inglaterra tem encontrado grande dificuldade em atender todos os pedidos de transportes que lhe são re-
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clamados pela Bélgica e outros países amigos, e é recente o acôrdo que fez com a Itália, onde o custo do frete, por tonelada, chegou a ser de 200 liras. Nestas condições podia-se, sem pessimismo, recear que as carreiras de navegação, especialmente os que respeitam ao transporte de carvão e de trigo, pudessem ser suprimidas dum momento para o outro, e nós ficaríamos então em circunstâncias de não poder viver, se não tivéssemos meios de transporte.
Alêm destas razões, para a utilização de todos os navios uma outra muito especial havia: era a de se recear que os comandantes dos navios alemães ancorados em portos portugueses praticassem actos de sabotage, destruindo várias peças dos seus maquinismos, se não tivessem outro meio de impedir que se efectuasse a requisição, como, de resto, já foram encontradas avarias em sete dêsses navios. No Bulow houve uma verdadeira destruição, declarando o seu comandante que fora êle quem mandara praticar êsse acto, que é delituoso em face das nossas leis e da competência dos tribunais portugueses, mas que essas ordens não tinham sido dadas agora, mas há cêrca de um ano, na previsão - disse êle - de que o navio pudesse ser tomado pelos ingleses! Num outro encontrou-se um dispositivo, em relação às suas caldeiras, que faz presumir que o capitão e a marinhagem pretendiam provocar uma explosão violenta, em seguida â entrada dos representantes do Govêrno Português que iam fazer a requisição dêsse navio.
Felizmente que as caldeiras puderam ser apagadas a tempo de não se produzirem consequências, a não ser as de deixarem prejudicada uma parte dos maquinismos.
Ora, se estas eram as disposições dos comandantes dos navios, se esta era a sua atitude, evidentemente que a requisição tinha de ser feita em conjunto, porque, de contrário, logo que fizéssemos a requisição dos primeiros, os outros seriam prejudicados pelas suas equipagens e só encontraríamos ferros velhos e depósitos de ostras para neles arvorar a bandeira portuguesa.
Preguntou o Sr. Brito Camacho se no caso de serem requisitados todos os navios, êles eram destinados apenas ao nosso comércio marítimo, a assegurar a solução do problema das subsistências, ou se o Govêrno pretendia chamar a si a indústria dos fretes. Essa pregunta afigura-se-me quási desnecessária. O Govêrno não quere exercer o comércio, mas úniciamente assegurar pelo melhor preço, com a sua intervenção, a chegada ao país e a expedição para os países com quem temos relações comerciais, das mercadorias necessárias. Se o Govêrno pudesse dentro das obrigações que assumiu pelas requisições dos navios, e que estão mencionadas no decreto, sob o ponto de vista das várias despesas que êste serviço importa, levar tam baixo o preço dos fretes que as mercadorias tambêm tivessem uma baixa sensível, o Govêrno teria encontrado o melhor prémio para o seu procedimento. Por emquanto ainda não se pode dizer se êsse serviço será ou não feito directamente pelo Estado, se por meio de um arrendamento a urna empresa que se forme, se por qualquer entendimento com uma empresa, técnica ligada ao Estado, com o Pôrto de Lisboa, por exemplo. Tudo isso depende do número dos navios utilizáveis imediatamente, do prazo e das condições das carreiras a fazer e dos serviços a estabelecer; mas o que posso afirmar desde já é que o serviço de transportes de mercadorias de primeira necessidade e de matérias primas, e as comunicações de Portugal com as suas colónias, com o Brasil e com os outros países com que temos comércio, ficará assegurado, e os transportes serão feitos pelo melhor preço.
O Estado não pode ter o propósito de transformar uma utilização que é baseada nas necessidades públicas, numa outra função que não seja a de dar aos navios requisitados o papel de diminuir as despesas de transportes e, portanto, de concorrer para a diminuição do preço das subsistências e das matérias primas.
Quanto aos seguros contra os riscos que êsses navios possam correr, depende isso de negociações a entabolar com as companhias seguradoras. Para êsse fim foi nomeada uma comissão, conforme estabelece o regulamento, e dessa comissão faz parte um representante das companhias de seguros, o Sr. Fernando Brederode, que é uma competência na especialidade.
Todas as classes interessadas tem ali os seus representantes, os quais, defendendo
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eficazmente os nossos interêsses, não desprezarão os dos proprietários dos navios que o Estado tem obrigação de salvaguardar.
Preguntou S. Exa. se os navios serão comandados por oficiais da marinha de guerra. A êsse respeito devo dizer que os navios terão uma feição mercante, muito embora sejam comandados por oficiais da marinha de guerra, como muitos navios mercantes estrangeiros e até alguns dos nossos em várias ocasiões por determinação do Govêrno.
O que é necessário acentuar é que o Govêrno não pensa em transformar êsses navios mercantes em navios de guerra, mesmo porque tal medida estaria em desacordo com a base em que se estabelece o princípio da requisição.
Neste momento o Govêrno preocupou-se simplesmente em utilizar os navios para o fim a que foram destinados, que é o de navios mercantes, e de lhes dar as tripulações em harmonia com as funções que tem de desempenhar.
Preguntou tambêm o Sr. Brito Camacho se as indemnizações seriam concedidas só em caso de avaria, ou tambêm no caso da perda total de qualquer dêsses navios.
A resposta a essa pregunta é a seguinte: se a companhia em que o navio estiver seguro for obrigada a entregar a importância do seu valor, essa importância não pertence ao Estado, mas sim aos respectivos armadores. No caso de desaparecer um navio alemão - porque alemães continuam a ser êsses navios - por motivo de qualquer acto praticado por indivíduo da mesma nacionalidade, isso está previsto no direito internacional.
Preguntou ainda S. Exa. se as indemnizações seriam concedidas pelos navios que já estão prejudicados.
As indemnizações, como se diz claramente no decreto publicado, só serão concedidas desde a data em que o Estado se utilizar dêsses navios; até êsse momento, o Estado não tem obrigação de pagar cousa alguma. Essa despesa será lançada no débito dos seus proprietários. Tudo isso, porêm, está regulado pelas disposições do Código Comercial e pelos princípios do direito comum.
Preguntou mais S. Exa. se, em virtude do acto praticado pelo Govêrno, estava suspenso, ou derrogado, o tratado de comércio com a Alemanha.
A êste respeito tenho a dizer que êsse tratado foi ratificado em 21 de Maio de 1901 e entrou em vigor em 5 de Junho do mesmo ano, e que, consoante a sua cláusula 2õ.a, devia vigorar oito anos, mas, passados cinco anos, êle poderia cessar, se uma das partes contratantes o denunciasse.
Fui eu quem chamou a atenção do actual Sr. Presidente da República, quando Presidente do Ministério, para o grave problema do tratado de comércio com a Alemanha, pedindo a S. Exa. a para ouvir, sôbre o assunto, as associações comerciais, os seus colegas do Ministério e até o próprio Parlamento, se fôsse preciso.
O Sr. Bernardino Machado fez pgsas diligências, e encontrou em todos a disposição da conservação dêsse tratado por mais algum tempo. Mas, se nós tivéssemos denunciado êsse tratado em 5 de Junho de 1914, êle teria acabado em 5 de Junho de 1915, em plena guerra, e a situação de Portugal, em relação à Alemanha, seria igual á que hoje tem, visto que nem importamos nem exportamos produtos alemães. E, se me preguntarem se o tratado está em vigor ou foi suspenso por algum motivo, só terei a responder que êsse tratado existe.
A verdade, porêm, é que, em 1917,nós teremos que nos pronunciar, para sabermos se o queremos ou não, e o nosso direito, o nosso dever, o que corresponde às conveniências morais e até materiais do país, é denunciar êsse tratado o mais cedo que o pudermos fazer. (Muitos apoiados).
Precisamos ter uma atitude que não deixe dúvidas a ninguêm, nem à Alemanha, acêrca da nossa orientação quanto à nossa política comercial.
As defesas que a outra parte contratante encontra no tratado prejudicam-nos no nosso comércio com a Inglaterra, com o Brasil, com a França e com a Espanha, países com os quais, principalmente após a situação que a guerra veio estabelecer, temos toda a conveniência em nos ligar cada vez mais estreitamente.
O tratado com a Alemanha não se aplica ao caso presente. O seu artigo 2.° refere-se á retenção e não á requisição.
A hipótese que êle prevê é a de obstarmos por qualquer forma à livre navegação. A palavra retido ninguêm a quis ler è daí o equívoco. Os navios que foram requisitados não navegavam, nem podiam
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navegar; estavam, por fôrça das circunstâncias, imobilizados, e, por consequência, não tinham a situação que pudesse corresponder à necessidade de retenção por parte do Govêrno Português. Mas, ainda que a palavra retenção abrangesse o significado de requisição a indemnização que, como consequência, nesse artigo 2.° do tratado se estatui, não é a indemnização prévia, mas a concessão prévia de indemnização, a afirmação de que se dará indemnização; e essa fez-se da maneira a mais rasgada, a mais clara e a mais definida. A notificação foi feita aos armadores, só depois de publicado o suplemento ao Diário do Govêrno sôbre as requisições dos navios, cumprindo-se assim rigorosa mente a primeira parte do artigo, se êle se aplicasse à requisição. Mas encontram-se ainda adiante as palavras: a combinar entre as partes interessadas (que são os armadores e não o país a que êles pertencem, e o sentido dessas palavras não permite dúvidas, é transparente: a indemnização que houver de ser dada será concertada mais tarde entre as partes interessadas em termos justos e equitativos, isto é, serão concedidas as indemnizações que forem devidas e não aquelas que forem reclamadas.
Preguntou depois S. Exa. se o comércio poderia ficar com a segurança de que os navios alemães embandeirados em portugueses seriam tratados no mar como o devem ser navios de países que não estão era guerra, isto é, se não correm risco algum. Se a pregunta é: como devem ser tratados, respondo sem hesitação que não correm o menor risco.
Não preciso citar o termo do memorandum, publicado por um dos países em guerra, acêrca dos cuidados e precauções que devam tomar os comerciantes e os viajantes dos navios de nações não em guerra, para declarar que fico inteiramente seguro, como chefe do Govêrno que sou, de que o que digo não só corresponde ao sentimento de todos os portugueses, mas ao de todos os homens imparciais e justos. Essa pregunta deveria antes ser dirigida a quem fôsse capaz de praticar um tal acto. Preguntou, finalmente, S. Exa. se o acto do Govêrno não alterou as nossas relações externas.
Nesse ponto só tenho que confirmar o que disse por ocasião da discussão da base 10.ª da lei de 7 de Fevereiro, isto é, que não se alteraram as nossas relações externas, e, se o acto praticado pudesse ter alguma influência na nossa situação internacional, êle só podia ser nobilitante e honrado para Portugal, por corresponder ao reconhecimento de todos os povos, sobretudo daqueles que não sejam dominados por paixões, ao apreciarem a nossa conduta, de que nós exercemos unicamente um direito, fazendo a requisição dos navios alemães, e cumprimos um dever - o dever imperioso de defendermos os interesses do país que administramos. A convicção de que da atitude tomada pelo Govêrno não podem resultar nenhumas circunstâncias, para as quais não estejamos bem prevenidos, deve tranquilizar todos os cidadãos portugueses, todos aqueles que amem dedicadamente o seu pais. Portugal procedeu honrada e dignamente na questão que se debate, questão muito discutida pelas circunstâncias da guerra, mas que, afinal, se resume numa simples medida tomada no sentido de ocorrer às exigências da economia geral e de atenuar a grave crise das subsistências.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador não reviu.
O Sr. Simas Machado: - Sr. Presidente: deve lembrar-se V. Exa. e a Câmara de que ontem, antes de encerrar a sessão, fui eu que pedi a palavra, e disse, em nome dos Deputados evolucionistas, que esperava que na sessão de hoje o Sr. Presidente do Ministério, ou qualquer dos membros do Govêrno, viesse dar explicações à Câmara sôbre a expropriação dos navios alemães. Hoje, o Sr. Presidente do Ministério parece ter estranhado êste pedido, ontem formulado por mim dizendo que a imprensa nos podia ter esclarecido acêrca do caso.
Sr. Presidente: tenho pelo talento do Sr. Presidente do Ministério e pela sua ilustração o maior respeito e a máxima das considerações, mas, francamente, não posso admitir como boa essa teoria, sustentada hoje por S. Exa. (Apoiados), porque me parece que há um certo número de casos de importância capital que devem ser tratados directamente entre o Executivo e o Legislativo e não por intermédio das gazetas.
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E dito isto à boa paz, sôbre a questão hoje debatida e cuja discussão foi iniciada pelo Sr. Brito Camacho, eu, em nome dos Deputados evolucionistas, mas desde já declarando a V. Exa. que os orienta um grande sentimento patriótico, limito-me a mandar para a Mesa, em nome dêsses Deputados, a seguinte
Declaração
Fundamentou o Govêrno, nos altos e urgentes interesses da economia pública, a requisição já efectuada dos navios alemães surtos em portos portugueses.
A minoria evolucionista. na suposição de terem sido previstas e acauteladas todas as consequências de tal acto, regista as declarações feitas pelo Govêrno e faz votos para que sejam sempre e da melhor forma salvaguardados os interesses nacionais. - Pela minoria evolucionista, Simas Machado.
Para a acta.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Afonso Costa): - Sr. Presidente: agradeço as palavras do Sr. Simas Machado e devo explicar que nas palavras que proferi relativamente ao conhecimento que todos deveriam ter pelas notícias dos jornais, quanto ao acto praticado pelo Govêrno, não queria eu evidentemente dizer que o Govêrno não estava pronto a responder a todas as preguntas que lhe fossem dirigidas.
Quanto à declaração que S. Exa. fez em nome da minoria evolucionista, desejo que as palavras patrióticas que ela contêm, venham a ter correspondência exacta nos factos que ocorreram e que ocorram de futuro.
O orador não reviu.
O Sr. Adelino Furtado: - Mando para a Mesa um parecer da comissão dos negócios eclesiásticos.
O Sr. Presidente: - Vai entrar em discussão o parecer na especialidade.
Vai ler-se o artigo 1.°
Leu-se.
O Sr. Presidente: - Está em discussão. Como ninguêm pede a palavra, considera-se aprovado.
Foi aprovado.
Em seguida foram aprovados sem discussão os artigos 2.°, 3.° e 4.°
O Sr. Presidente: - Está em discussão a base 19.ª
Foi lida na Mesa a seguinte proposta de substituição:
Proposta
1.° Proponho que a base 19.ª da lei n.° 278 de 15 de Agosto de 1914,- a que se refere a proposta de lei n.° 213-B, seja substituída pela seguinte;
Para fiscalizar, segundo os preceitos indicados nesta lei, a legalidade das actas de administração financeira e a regularidade de execução dos serviços de contabilidade pública das colónias, haverá para cada um dos grupos de colónias, a seguir indicados, um inspector de fazenda encarregado tambêm de servir de consulta dos governos coloniais em assuntos de administração financeira, emquanto permanecer na colónia a que a consulta respeite.
Para os efeitos de inspecção, as colónias consideram-se agrupadas pela seguinte forma:
Grupo occidental: Angola, S. Tomé e Príncipe, Cabo Verde e Guiné; grupo oriental, Moçambique, Índia, Macau e Timor.
Os inspectores comunicam directamente aos governadores as faltas que encontrarem e os erros que descobrirem na execução dos serviços de contabilidade e na administração financeira das colónias, e enviam periodicamente ao Govêrno da metrópole relatórios em que registarão detalhadamente a acção que, no desempenho das suas funções, tiverem exercido e o resultado da fiscalização permanente que lhes é incumbida.
Dêstes relatórios, enviados directamente à metrópole, enviarão logo aos inspectores cópias autênticas aos respectivos governadores das colónias.
Os inspectores não podem acumular as suas funções com outras comissões remuneradas nas colónias em que estiverem reunidos, nem são considerados, para nenhum efeito, chefes de serviço.
Os inspectores não intervêm directamente na administração das colónias, nem na acção dos governadores, e não podem revogar as ordens e instruções dêstes nem impedir a execução das suas deliberações finais, entendendo-se que a independência que lhes é confiada, no exercício das suas funções, não prejudica a natural subordi-
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nação administrativa aos governadores das colónias.
Na ausência dos inspectores, as funções de consulta serão exercidas pelo respectivo director de fazenda.
2.º Proponho que os inspectores sejam nomeados pelo Ministro das Colónias e escolhidos entre os chefes de repartição e inspectores actuais de serviço de fazenda das colónias. - O Deputado Armando Oscar da Cruz e Sousa.
Para a Secretaria.
Foi admitida.
Foi rejeitada.
O Sr. Prazeres da Costa: - Sr. Presidente: na base em discussão estão perfeitamente definidas as funções dos auditores fiscais.
Assim é que a êstes funcionários, alem doutras atribuições de carácter fiscal, compete levar ao conhecimento do governador o& erros que descobrir na administração financeira das colónias, e comunicar ao Govêrno da metrópole, em relatórios periódicos, o resultado da fiscalização que lhes é cometida.
Nos termos da base em discussão, o auditor fiscal não pode acumular as suas funções com as de inspector de fazenda, nem com outra qualquer comissão de serviço remunerado.
Quanto aos dois inspectores, cuja criação se propõe, a base apenas estabelece que serão por êles exercidas as funções de inspecção de administração financeira e de contabilidade, nos termos que furem regulamentados, e, desta forma, fica-se sem saber, porque a base nada nos diz a êste respeito, se o inspector de fazenda pode, ou não. acumular as suas funções com as de director dos serviços de fazenda, ou com qualquer outra comissão de serviço remunerada; e ainda se o inspector de fazenda pode, ou não, levar ao conhecimento do governador os erros que descobrir, e se pode, ou não, comunicar ao Govêrno da metrópole, em relatórios periódicos, o resultado da sua fiscalização, porque a base apenas diz que as funções de inspecção financeira e de contabilidade serão exercidas pelo inspector.
É, portanto, uma cousa muito vaga, e como nenhum regulamento pode conter doutrina que não esteja na lei, e como certamente o inspector de fazenda não pode ter atribuições diversas daquelas que, pela base em discussão, são cometidas ao auditor fiscal, em matéria de administração financeira, eu mando para a Mesa a seguinte
Proposta
Proponho que, na base 19. ª, as palavras "nos termos que forem regulamentares", sejam substituídas pelas seguintes:
"de maneira análoga à estabelecida para os auditores fiscais e que será expressa nos regulamentos especiais".- O Deputado, Prazeres da Costa.
Leu-se na Mesa e foi admitida.
O orador não reviu.
O Sr. Jorge Nunes: - Sr. Presidente: ouvi com muita atenção a discussão que se travou sôbre esta proposta de lei, e acêrca dela se disse muito, relativamente à nossa administração colonial, defendendo uns a máxima descentralização de serviços, dando aos governos locais a maior amplitude, amoldada às circunstâncias dos mesmos e consoante o seu grau de civilização, e desejando que, em breve, as cartas orgânicas fossem postas em execução; ao contrário doutros Srs. Deputados, aos quais parecia melhor que apenas se dêsse às colónias aquela independência compatível com o sen desenvolvimento actual e com as normas seguidas na administração da metrópole que, devo dizer, são cada vez mais centralizadoras.
E, Sr. Presidente, apesar de ser Deputado por uma das nossas colónias, não sou colonial, e porque o não sou, entendo que, neste momento, devo socorrer-me dalguma cousa que, por dever de ofício, tenho lido, para dizer tambêm qual é a minha opinião sôbre esta matéria.
Eu desejava cercar o pessoal encarregado das funções do visto e da fiscalização de todas as operações de contabilidade nas colónias.
Infelizmente, quando se institui um serviço da natureza daquele que se pretende agora criar nas nossas colónias, as influências políticas ou pessoais postas em jôgo, são de tal ordem que, muitas vezes, não é o mais competente mas o mais influente o encarregado de exercer funções melindrosas, tam complexas como estas dos auditores fiscais.
Vou mandar para a Mesa a minha proposta e por ela V. Exa. verá que eu pro-
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curo fazer o recrutamento do pessoal encarregado de exercer as funções de auditores administrativos entre os mais competentes, isto é, cem pôr de parte aquelas habilitações de ordem geral que são indispensáveis a todos os funcionários públicos, mas, ao mesmo tempo escolhendo aqueles que tenham mais conhecimento das nossas colónias, e assim, por ordem hierárquica entendo que os cargos dos auditores fiscais, auditores adjuntos e inspectores de Fazenda devem ser promovidos por concurso documental, aberto no Ministério das Colónias, só podendo recair a nomeação em certos indivíduos, começando no governador geral e terminando na categoria de chefes de serviço provincial.
A idea fica lançada, o Sr. Ministro aproveitá-la há ou não.
Suponho que a minha intervenção não foi de todo o ponto descabida nesta discussão.
Proposta
Proponho que á base 1.ª do parecer n.° 234 se faça o seguinte aditamento :
Os cargos de auditores fiscais, auditores adjuntos e inspectores de fazenda serão providos por concurso documental, aberto no Ministério das Colónias. As nomeações só poderão recair em indivíduos que tenham exercido alguns dos seguintes cargos:
a) governadores gerais;
b) governadores de província;
c) secretários gerais de governos de província;
d) chefes de repartição do Ministério nas Colónias;
e) governadores de distrito;
f) secretários de governos de província;
g) chefes de serviços provinciais.
E são condições de preferência para as nomeações:
1.° O exercício de cargos designados nas alíneas anteriores pela ordem que estão inscritos.
2.° Mais tempo e melhores serviços prestados nos cargos mencionados nas referidas alíneas.
3.° Maiores habilitações literárias, considerando-se iguais habilitações literárias os cursos superiores ou especiais de anos ou serviços.
Em igualdade de habilitações literárias terão preferência os concorrentes habilitados com o curso da escola colonial.- Jorge Nunes.
Admitida.
Retirada.
O orador não reviu.
O Sr. Ernesto de Vilhena (relator): - Em nome de comissão de colónias declara não poder aceitar a substituição do Sr. Deputado Cruz e Sousa aceita a do Sr. Prazeres da Costa, por tornar o texto da lei mais claro, e embora concorde com as considerações feitas pelo Sr. Jorge Nunes, não pode aceitar a sua proposta, porque o assunto a que ela se refere deve fazer parte de regulamentos especiais.
O discurso será publicado na integra guando o orador restituir as notas taquigráficas.
O Sr. Jorge Nunes: - Sr. Presidente: não me convenceram as razões aduzidas pelo ilustre relator, contrariando a minha proposta, porquanto S. Exa. até implicitamente concordou com ela.
S. Exa., apenas, pelas suas considerações me pode convencer que a considera de difícil aplicação, porquanto a destrinça é difícil de fazer-se no momento actual; e então, só por êsse motivo, S. Exa. entende que não deve ser aprovada pela Câmara.
Para mostrar a S. Exa. e â Câmara ate que ponto vai o meu propósito de concorrer para a melhoria da proposta do Sr. Ministro das Colónias, eu peco licença ao Sr. Presidente para consultar a Câmara sôbre se permite que eu retire essa proposta, fazendo-a substituir por outra.
Esta é uma proposta, pode dizer se, apenas de efeitos morais. Desde que a Câmara vote, o Ministro das Colónias, seja êle quem fôr, está livre de prover êsses lugares. Escudado neste aditamento, que eu mando para Mesa, à base 19.ª, pode realizar aquilo que eu consubstanciei na proposta que mandei para a Mesa e que peco licença para substituir por outra, que mando para a Mesa se a Câmara mo consentir.
Proposta
Proponho que se aplique ao final da base 19.ª da proposta da comissão, a doutrina da base 7.ª da lei n.° 277; isto é, que se adite à base 19.ª o seguinte:
"A nomeação dos auditores fiscais recairá em indivíduo reconhecidamente compe-
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tente, de mérito já revelado no desempenho de funções públicas ou no estudo dos assuntos coloniais. - Jorge Nunes.
Foi aprovada.
Para a comissão de redacção.
Foi admitida depois da Câmara ter resolvido conceder que fôsse retirada a anteriormente apresentada.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Jorge Nunes requere para que possa retirar a sua proposta e substituí-la por outra que enviou para a Mesa. Os Srs. Deputados que aprovam, tenham a bondade de se levantar.
Foi aprovado.
O Sr. Presidente: - Vai ler-se; para se admitir.
Foi lida e admitida.
O Sr. Presidente: - Vai votar-se a proposta do Sr. Prazeres da Costa.
Foi aprovada.
O Sr. Ernesto de Vilhena (relator): - Apenas para dizer que a comissão de colónias concorda com a proposta de aditamento apresentada pelo Sr. Jorge Nunes.
O Sr. Presidente: - Vai votar-se a base 19.ª da proposta da comissão.
Foi aprovada e prejudicada a substituição do Sr. Cruz e Sousa.
O Sr. Presidente: - Vai votar-se o aditamento do Sr. Jorge Nunes.
Foi aprovado.
O Sr. Presidente: - Vai ler-se, para se votar, a base 20.ª
O Sr. Jorge Nunes: - Requeiro que seja dispensada a leitura.
Foi aprovado.
O Sr. Jorge Nunes: - Para mandar para a Mesa uma proposta sôbre uma falha de redacção.
Proposta
Proponho que na 5.ª regra da base 20.a, a seguir ás palavras "do seu visto" se acrescentem as seguintes "bem como com o visto do inspector de Fazenda" e se ponham no plural as palavras "nesse caso".-O Deputado, Jorge Nunes.
Para a Secretaria.
Para a comissão de redacção.
Foi admitida e seguidamente aprovada bem como a base 20.ª, sendo em seguida aprovada sem discussão a base 21.ª
O Sr. Luís Derouet: - Requeiro dispensa da leitura da última redacção.
Foi concedida.
O Sr. Presidente: - Marco a primeira sessão para a próxima segunda-feira, 28 do corrente, à hora regimental, com a seguinte ordem do dia:
Parecer n.° 242 - sobre a proposta de lei n.° 241-N - sobre a importação de papel para jornais.
Parecer n.° 223 - sôbre a proposta de lei n.° 207-I - regulando a matrícula no Instituto Superior Técnico dos indivíduos habilitados com o curso da Escola de Construções, Indústria e Comércio.
Parecer n.° 230 - sobre o projecto de lei n.° 153-E - criando uma assemblea eleitoral na sede da freguesia de Barcouço, concelho da Mealhada.
Parecer n.° 222 - sôbre a proposta de lei n.° 17-M - autorizando a Câmara Municipal do concelho de Viseu a municipalizar os serviços de iluminação eléctrica na cidade de Viseu.
Parecer n.° 76 - sôbre o projecto de lei n.° 29-H - considerando na situação de reserva, durante 5 anos, os oficiais generais que neste pôsto tenham atingido o limite de idade se não forem julgados incapazes de todo o serviço pela Junta Hospitalar de Inspecção.
Está encerrada a sessão.
Eram 18 horas e 15 minutos.
O REDACTOR - Afonso Lopes Vieira.