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REPÚBLICA PORTUGUESA
DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS
SESSÃO N.° 90
EM 16 DE MAIO DE 1916
Presidência do Exmo. Sr. Manoel Joaquim Rodrigues Monteiro
Secretários os Exmos. Srs.
Baltasar de Almeida Teixeira
Alfredo Soares
Sumário. - Procede-se à chamada, respondendo 72 Srs. Deputados, Lê-se o acta, que é aprovada tem discussão. Dá-se conta do expediente, que tem, o devido destino. O Govêrno está representado pelo Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Colónias (António José de Almeida).
Antes da ordem do dia. - O Sr. Alfredo de Sousa, em negócio urgente, requer e que entrem imediatamente em discussão os pareceres n.ºs 431, 339 e 455. É aprovado o requerimento. Entra em discussão o parecer n.º 431. Usam da palavra os Srs. Alfredo de Sousa, que apresenta algumas emendas, Costa Júnior e Celorico Gil, que fica com a palavra reservada. O Sr. Ministro da Justiça (Mesquita Carvalho} requer e que se discuta imediatamente o parecer n.º 407. É aprovado o requerimento, bem como o parecer. O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Colónias apresenta uma proposta de lei, com o pedido de urgência e dispensa do Regimento. O Sr. Jaime Cortesão refere-se a uma violência praticada contra um funcionário da província de S. Tomé. O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Colónias promete informar-se, para tomar as devidas providências O Sr. Almeida Ribeiro requere que entre em discussão o parecer n.º 475. É aprovado. Entra em discussão o parecer, sendo aprovado na generalidade. O Sr. Ministro da Justiça apresenta uma emenda ao artigo 1.° É aprovada, considerando-se prejudicado o artigo do parecer Aprova-se o artigo 2 ° O Sr. Ministro da Justiça propõe a suspensão do § único do artigo 3.° É aprovada, bem como o artigo, O Sr. Ministro da Justiça apresenta uma emenda ao artigo 1.º É aprovada, bem como o artigo. Aprova-se o artigo 5.°, último do parecer. A Câmara concede a urgência à proposta de lei apresentada pelo Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Colónias, a qual é aprovada.
Ordem do dia. - Continua em discussão o capítulo 1.° do orçamento do Ministério das Finanças. O Sr. Lopes Cardoso requero que a sessão seja prorrogada, na, forma dos dias anteriores. É aprovado, O Sr. Ministro das Finanças (Afonso Costa) apresenta uma proposta de lei, para a qual pede urgência e dispensa do Regimento, que a Câmara concede. A proposta fica em discussão juntamente com o orçamento do Ministério das Finanças. Usam da palavra os Srs. António Macieira, Ministro das Finanças, Jorge Nunes e José Barbosa. É interrompida a sessão até às 21 horas e meia. Reaberta, discute-se e aprova-se, com algumas emendas, o orçamento do Ministério das Finanças Principia a discutir-se orçamento do Ministério de Instrução Pública. É interrompida a sua discussão para prosseguir o debate sôbre a proposta de lei do Sr Ministro das Finanças, que é aprovada, depois de usarem da palavra os Srs. Simões Raposo, Costa Júnior, Ministro das Finanças, José Barbosa e Barbosa de Magalhães. O Sr. Presidente encerra a sessão, marcando a seguinte para o dia imediato.
Abertura da, sessão às 15 horas e 30 minutos.
Presentes 73 Srs. Deputados.
São os seguintes:
Abílio Correia da Silva Marçal.
Abraão Maurício de Carvalho.
Adelino de Oliveira Pinto Furtado.
Alberto de Moura Pinto.
Alfredo Maria Ladeira.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.
Alfredo Soares.
Amândio Oscar da Cruz e Sousa.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Albino Carvalho Mourão.
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António Aresta Branco.
António Augusto de Castro Meireles.
António Augusto Fernandes Rêgo.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Barroso Pereira Vitorino.
António Cândido Pires de Vasconcelos.
António Correia Portocarrero Teixeira de Vasconcelos.
António da Costa Godinho do Amaral.
António Dias.
António Firmo de Azevedo Antas.
António José de Almeida.
António Marques das Neves Mantas.
António Medeiros Franco.
António de Paiva Gomes.
António Pires de Carvalho.
Armando da Gama Ochoa.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Artur Duarte de Almeida Leitão.
Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.
Augusto Pereira Nobre.
Bernardo de Almeida Lucas.
Casimiro Rodrigues de Sá.
Custódio Martins de Paiva.
Domingos da Cruz.
Domingos Frias de Sampaio e Melo.
Eduardo Alfredo de Sousa.
Ernesto Júlio Navarro.
Evaristo Luís das Neves Ferreira de Carvalho.
Francisco da Cruz.
Francisco José Pereira.
Francisco do Livramento Gonçalves Brandão.
Francisco de Sales Ramos da Costa.
Francisco de Sousa Dias.
Francisco Xavier Pires Trancoso.
Gaudêncio Pires de Campos.
Guilherme Nunes Godinho.
Henrique Vieira de Vasconcelos.
Jaime Zuzarte Cortesão.
João Baptista da Silva.
João Cabral de Castro.
João Canavarro Crispiniano da Fonseca.
João Elísio Ferreira Sucena.
João Gonçalves.
João José da Conceição Camoesas.
João Pedro de Sousa.
João Tamagnini de Sousa Barbosa.
Joaquim José de Oliveira.
José António da Costa Júnior.
José António Simões Raposo Júnior.
José Botelho de Carvalho Araújo.
José Mendes Nunes Loureiro.
José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.
José de Barros Mendes de Abreu.
José Maria Vilhena Barbosa de Magalhães.
José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
Levi Marques da Costa.
Luís Augusto Pinto de Mesquita Carvalho.
Luís Carlos Guedes Derouet.
Manuel Firmino da Costa.
Urbano Rodrigues.
Vítor Hugo de Azevedo Coutinho.
Não compareceram à sessão os Srs.:
Adriano Gomes Ferreira Pimenta.
Albino Vieira da Rocha.
Alexandre Braga.
Alexandre José Botelho de Vasconcelos e Sá.
Álvaro Poppe.
Amadeu Monjardino.
Angelo Vaz.
António de Almeida Garrett.
António Maria da Cunha Marques da Costa.
António Maria Malva do Vale.
António Maria da Silva.
António Miguel de Sousa Fernandes
Augusto Luís Vieira Soares.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Eduardo Augusto de Almeida.
Francisco Coelho do Amaral Reis (Pedralva).
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Helder Armando dos Santos Ribeiro.
Jaime Daniel Leote do Rêgo.
João Catanho de Meneses.
João Luís Ricardo.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
José Alfredo Mendes de Magalhães.
José Augusto Pereira.
José Augusto Simas Machado.
José Bessa de Carvalho.
José de Freitas Ribeiro.
José Maria Gomes.
José Mendes Cabeçadas Júnior.
Júlio do Patrocínio Martins.
Luís de Brito Guimarães.
Manuel Augusto Granjo.
Manuel Gregório Pestana Júnior.
Pedro Virgolino Ferraz Chaves.
Rodrigo José Rodrigues.
Vitorino Henriques Godinho.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel da Costa Dias.
Manuel Joaquim Rodrigues Monteiro.
Manuel Martins Cardoso.
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Mariano Martins.
Pedro Alfredo de Morais Rosa.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira
Raimundo Enes Meira.
Sérgio da Cunha Tarouca.
Tomás de Sousa Rosa.
Vasco Guedes de Vasconcelos.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Entraram durante a sessão os Srs.:
Afonso Augusto da Costa.
Alberto Xavier.
Albino Pimenta de Aguiar.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
Amílcar da Silva Ramada Curto.
António Alberto Charula Pessanha.
António Caetano Celorico Gil.
António Caetano Macieira Júnior.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António Maria Pereira Júnior.
António Vicente Marçal Martins Portugal.
Armando Marques Guedes.
Artur Augusto da Costa.
Augusto José Vieira.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Constâncio de Oliveira.
Diogo João Mascarenhas de Marreiros Neto.
Domingos Leite Pereira.
Eduardo Alberto Lima Basto.
Ernesto Jardim de Vilhena.
Francisco Alberto da Costa Cabral.
Francisco Correia Herédia (Ribeira Brava).
Francisco José Fernandes Costa.
Gastão Correia Mendes.
Gastão Rafael Rodrigues.
Germano Lopes Martins.
Hermano José de Medeiros.
João Barreira.
João de Barros.
João Carlos de Melo Barreto.
João Crisóstomo Antunes.
João de Deus Ramos.
João José Luís Damas.
João Lopes Soares.
João Pereira Bastos.
João Teixeira Queiroz Vaz Guedes.
Joaquim António de Melo Castro Ribeiro.
Jorge de Vasconcelos Nunes.
José Augusto Ferreira da Silva.
José Barbosa.
Às 15 horas e 30 minutos terminou a chamada.
O Sr. Presidente: - Estão presentes 72 Srs. Deputados. Está aberta a sessão. Vai ler-se a acta.
Foi lida e aprovada a acta e deu-se conta do seguinte
Expediente
Representações
Da Câmara Municipal de Évora, pedindo que o artigo 195.° da lei administrativa de 7 de Agosto de 1913 seja interpretado no sentido de que bastará a publicação ser feita por meio de editais afixados nos lugares do estilo, nos respectivos concelhos.
Para a Secretaria.
Da Câmara Municipal de Elvas, protestando por ser obrigada a pagar os vencimentos de categoria a dois funcionários que foram separados por despachos do Sr. Ministro do Interior, de 9 de Novembro de 1915.
Para a Secretaria.
Para a comissão de administração pública.
Do conselho escolar do Liceu de Viana, pedindo para ser submetida e sancionada pelo Parlamento a disposição constitucional (artigo 8.°, § 2.°) do decreto de 29 de Agosto de 1905, que lhes aumentava em 50$ anuais os vencimentos, por cada cinco anos de bom e efectivo serviço.
Para a Secretaria.
Para a comissão de instrução primária e secundária.
Do conselho escolar de Viana do Castelo, concordando com a representação da Associação dos Professores dos Liceus do Norte pedindo para que seja revogado o artigo 42.° da lei orçamental n.°410, substituindo-o por outro em que a lotação de cada turma seja diminuída, tendo em todos os casos um limite fixado pelas dimensões da sala da aula.
Para a Secretaria.
Para a comissão de instrução primária e secundária.
Telegramas
Mesão Frio.- Câmara Municipal concelho Mesão Frio respeitosamente protesta
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contra desanexação freguesia Salto do concelho de Montalegre dêste distrito e pede à Câmara que tenha em atenção direitos adquiridos e o enorme prejuízo que ao distrito de Vila Rial advirá de tal desanexação. - Presidente Comissão Executiva, Joaquim da Silva Pinto.
Para a Secretaria.
Alenquer.- Sindicato Agrícola Alenquerense solicita emprego navios apreendidos na exportação de vinhos sem o que ficarão até próxima colheita prejudicando a nação.
Para a Secretaria.
Admissão de projectos de lei Foram admitidos os seguintes:
Sendo da maior urgência reùnir num só diploma todas as disposições existentes na legislação vigente sôbre pensões de sangue, introduzindo lhes ao mesmo tempo as modificações aconselhadas pelos modernos princípios e tornando-as o mais possível equitativas e justas, para corresponderem ao fim altruísta que as deve inspirar, vem o Govêrno apresentar à vossa ilustrada apreciação a adjunta proposta de lei, na qual não só se reùniram todas as disposições que actualmente existem dispersas por diferentes diplomas, dando-lhes uniformidade e corrigindo-lhes bastantes defeitos, mas tambêm se atenderam circunstâncias novas dignas de ser consideradas em leis desta natureza.
Assim, nas condições 1.ª e 2.ª do artigo 1 ° concatenamos disposições que se encontram mais ou menos confusas nos diplomas seguintes:
Carta de lei de 19 de Janeiro de 1827, cujas disposições foram declaradas de execução permanente pelo artigo 5.° da carta de lei de 8 de Junho de 1863; carta de lei de 24 de Maio de 1884; decreto de 17 de Fevereiro de 1891; carta de lei de 12 de Junho de 1901: artigo 192.° do decreto de 14 de Novembro de 1901; decreto de 12 de Março de 1900 (n.° 50 das instruções); decreto de 19 de Dezembro de 1907; carta de lei de 8 de Outubro de 1908 e decreto de 15 de Novembro do mesmo ano.
Na legislação transcrita, cora excepção do decreto de 15 de Novembro de 1908, se fixa prazo para o falecimento do militar, nas condições indicadas, dar direito a pensão a sua família; mas, parecendo-nos indispensável fazê-lo, julgamos que um ano é suficiente.
Tambêm não estava prevista a morte ou a inutilização do militar no estrangeiro, em serviço da nação, circunstâncias dignas de serem atendidas.
A morte no serviço de fiscalização só estava prevista para a guarda fiscal, que, pela legislação vigente, faz parte integrante do exército; entendemos, porêm, que a lei deve abranger não só as forcas da guarda fiscal, mas tambêm quaisquer outras que na metrópole ou nas colónias desempenhem serviços de fiscalização ou de polícia tanto na fiscalização aduaneira como na repressão da escravatura, etc.
Na condição 1.ª do referido artigo 1.° atendemos à morte em resultado de doença adquirida em campanha. Na legislação vigente existe esta disposição para a morte por moléstia endémica adquirida em serviço de campanha nas colónias, mas entendemos que tal designação é muito vaga e substituímo-la por outra mais precisa e de mais fácil verificação, tornando-a extensiva à metrópole e ao estrangeiro.
Na condição 3.ª do aludido artigo 1.° estabelecemos uma pensão de 50 por cento do pré ou soldo do militar inutilizado nas circunstâncias previstas nas condições antecedentes. A legislação vigente concede pensões equivalentes ao pré ou soldo dos interessados, mas parece-nos que, tendo êles direito, pela legislação actual, à reforma com o pré ou soldo por inteiro, será suficiente conceder-lhes mais 50 por cento dêsse vencimento, como compensação dos prejuízos provenientes duma reforma antecipada.
No § 1.° do mesmo artigo fixamos a importância das pensões, tornando-as equivalentes ao pré ou soldo dos falecidos, como se faz na legislação vigente, mas estabelecemos o mínimo de $20 diários, embora superior ao pré própriamante dito de qualquer soldado, por entendermos dever ser essa a importância mínima a conceder pelo Estado á família dos seus valentes defensores, e fixamos o máximo de 600$, que nos parece ser subsídio condigno para a família de qualquer oficial.
No § 2.° do dito artigo previmos a hipótese do Congresso querer tomar a iniciativa de galardoar qualquer militar com
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uma pensão superior a 50 por cento do seu pré ou soldo por algum feito heróico praticado no exercício das suas funções, ficando assim ao arbítrio do mesmo Congresso a fixação da respectiva pensão.
No artigo 2.° estabelecemos a forma de partilhar a pensão de sangue.
Pela legislação vigente, havendo viúva, pertence-lhe a totalidade da pensão, e não a havendo, ou por sua morte, é dividida pelas filhas solteiras ou viúvas e filhos menores de 14 anos de idade do militar falecido e até pelas filhas casadas, como determina a carta de lei de 7 de Abril de 1877.
Na falta daqueles parentes pertence â mãe viúva, e, não a havendo, pertence às irmãs solteiras ou viúvas, quando se prove que a subsistência daquela ou destas estava a cargo do falecido.
A divisão que propomos é muito mais equitativa e humanitária, porque, havendo filhos de anteriores casamentos, não tem a viúva, pela legislação vigente, obrigação de os sustentar pela pensão que recebe.
No artigo 4.° consignamos disposições que constam da legislação vigente (artigo 23.° do plano aprovado por decreto de 18 de Junho de 1897 e artigo 9.° do plano aprovado por decreto de 17 de Agosto de 1899), e entendemos que devem manter-se.
No artigo 5.° atendemos aos guardas da polícia cívica e aos empregados do corpo da fiscalização dos impostos, a cujas famílias, já pela legislação vigente (decreto de 23 de Dezembro de 1899 e artigo 88.° do regulamento aprovado por decreto de 9 de Agosto de 1902) eram concedidas pensões de sangue, parecendo-nos, porêm, que aos próprios indivíduos, quando inutilizados para o serviço, deve ser tambêm concedida a pensão de 50 por cento do seu vencimento de categoria, que acumularão com a de reforma.
No artigo 6.° atendemos ao risco a que andam expostas as autoridades administrativas no exercício das suas funções, parecendo suficiente as pensões que propomos para as suas famílias.
Nos artigos 7.°, 8.° e 9.° consignamos disposições aplicáveis ao pessoal médico e não médico nas condições e circunstâncias que já foram previstas num projecto de lei aprovado na Câmara dos Deputados, mas entendemos que devem tambêm abranger o pessoal do serviço mutualista e o da Cruz Vermelha no desempenho de idênticos serviços.
Igual critério presidiu à elaboração do artigo 10.°, contemplando as famílias dos militares que no cumprimento dos seus devei es forem vítimas de qualquer epidemia.
No artigo 11.° estabelecemos pensões às famílias do pessoal da Cruz Vermelha desde o dia da sua mobilização para campanha, o que nos parece de todo o ponto justo em atenção aos valiosíssimos serviços desta benemérita corporação.
No artigo 13.° consignamos uma disposição que nos parece de alta importância para mostrar aos jovens defensores da Pátria que esta os protege em caso de desastre ocorrido em seu serviço.
O artigo 14.° contêm matéria que já foi decretada e consoa do decreto n.° 2:290, de 20 de Março de 1916, e no artigo 15.° incluímos disposições análogas para os indivíduos empregados no serviço do exército.
Pelo artigo 16.° tornámos estas pensões independentes de cabimento na verba orçamental, o que já constava da legislação vigente, e isentámo-las de quaisquer imposições, incluindo imposto de sêlo nos documentos e requerimentos constantes dos processos, sendo passadas gratuitamente as certidões e atestados que forem necessários para os instruir.
Pelo artigo 17.° fixámos o vencimento das pensões desde o dia imediato ao da morte dos indivíduos que as transmitem ás suas famílias, como já está na legislação vigente, mas limitámos a cinco anos o prazo para os interessados requererem a concessão das pensões a que tiverem direito.
No artigo 18.° prescrevemos a perda da pensão por casamento, embora na legislação vigente se declare que as interessadas não perdem o direito à pensão, contraindo casamento depois de lhes ser concedida.
Tendo o marido obrigação de prover à subsistência de sua esposa, entendemos que o Estado deve supender os socorros que estiver prestando às pensionistas que se casarem.
Nos artigos 27.° a 36.° transcrevemos, com ligeiras alterações, disposições que já constam do decreto n.° 1:525, de 17 de Abril, de 1915, sôbre pensões provisórias.
Na elaboração dêste trabalho parece-nos
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que ficaram equitativamente ressalvados todos os legítimos direitos dos servidores do Estado, que por êle sacrificam a sua vida, mas a vossa muita competência lhe introduzirá as alterações que o vosso são critério vos aconselhar.
Artigo 1.° A concessão das pensões de sangue fica subordinada às condições seguintes:
1.ª Tem direito a pensão a família do militar que falecer no prazo de um ano contado desde o termo de qualquer campanha na metrópole, nas colónias ou no estrangeiro em serviço da Nação, quando se prove que a morte foi devida a doença adquirida na mesma campanha.
2.ª Tem igualmente direito a pensão a família do militar morto em combate, na defesa das instituições políticas do país, no serviço de manutenção da ordem pública, no de fiscalização ou do polícia, no de aviação e aerostação do Estado, de desastre ou agressão em serviço, ou em resultado de ferimento ou lesão adquiridos em qualquer daquelas circunstâncias, quer elas tenham lugar na metrópole, quer nas colónias, quer no estrangeiro em serviço da Nação, se a morte se der no prazo de um ano contado da data da ocorrência.
3.ª O militar que sofrer inutilação ou lesão ou adquirir doença em qualquer das circunstâncias previstas nas condições antecedentes e fôr julgado incapaz do serviço no prazo de um ano, contado desde a ocorrência de que lhe proveio a incapacidade, tem direito a uma pensão equivalente a 50 por cento do pré ou soldo que percebia, não podendo, porêm, ser inferior a $10 diários, a qual acumulará com a de reforma.
§ 1.° A pensão nos termos das condições 1.ª e 2.ª será equivalente ao pré ou soldo do falecido, não podendo, porêm, ser inferior a $20 diários, nem superior a 600$ anuais.
§ 2.° O militar a quem fôr concedida qualquer pensão vitalícia como recompensa de feito heróico praticado no desempenho das suas funções, não tem direito à de 50 por cento do seu pró ou soldo se ficar inutilizado para o serviço pelo feito que lhe deu jus a essa pensão; e, seja estiver gozando a de 50 por cento referida, ser-lhe há suspensa desde a data da concessão daquela.
Art. 2.° Para a concessão da pensão considera-se família do militar a sua viúva, os filhos, pai e irmãos nas condições seguintes:
1.ª Havendo viúva e filhos, pertencerá metade da pensão à viúva e outra metade em partes iguais às filhas solteiras ou viúvas e aos filhos até os dezoito anos de idade, ou mais, se sofrerem de alienação mental, se forem cegos, surdos-mudos ou estiverem entrevados.
Se a viúva casar ou falecer antes de lhe ser concedida a metade da pensão, será esta dividida na totalidade pelos filhos; mas, se falecer depois de ter entrado no seu gozo, não tem lugar a sobrevivência.
Se algum dos filhos casar ou falecer antes de entrar no gozo da sua pensão pertencerá o seu quinhão aos restantes irmãos ou à viúva, se êles não existirem ou forem inábeis para o herdar; mas, se falecer depois, não tem lugar a sobrevivência.
2.ª Havendo só filhos, por êles se dividirá a totalidade da pensão, se forem filhas solteiras ou viúvas e filhos nas circunstâncias já referidas.
Se alguns dêles falecerem ou casarem antes de lhes ser concedida a pensão, pertencerá esta na totalidade aos que forem hábeis para a herdar; mas, se falecerem depois, não tem lugar a sobrevivência.
Se algum filho atingir dezoito anos de idade, emquanto estiver correndo o processo, receberá por ordem especial de pagamento a parte que tiver vencido até aquela idade, sendo considerado, para êsse efeito, como emancipado.
3.ª A pensão pertencerá na totalidade à viúva, se não existirem filhos, ou forem inábeis para a herdar.
4.ª Não havendo, na ocasião do falecimento do militar, viúva nem filhos nas condições de fruir a pensão, pertencerá esta ao pai que se encontrar em alguma das circunstâncias seguintes: entrevado, cego, surdo-mudo, atacado de alienação mental ou com mais de setenta anos de idade, quando em qualquer das hipóteses só prove que não tem meios de subsistência.
5.ª Na falta ou inabilidade dos parentes já mencionados pertencerá a pensão à mãe (solteira ou viúva) e na falta desta,
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ou por sua morte, às irmãs solteiras ou viúvas do militar falecido e aos irmãos menores de dezoito anos de idade, ou maiores nas condições já indicadas para os filhos, quando se prove que tanto a mãe como os irmãos não tem meios de subsistência, não havendo sobrevivência entre irmãos.
6.ª Se o militar falecido estava divorciado de sua esposa, a pensão pertencerá na totalidade a seus filhos ou aos restantes parentes nas condições já indicadas, se aqueles não existirem ou forem inábeis para a herdar.
§ 1.° Sendo o pai a herdar a pensão, passará esta por sua morte para a mãe e desta, ou na sua falta, para as irmãs solteiras ou viúvas e irmãos do militar do falecido que se encontrem nas condições já referidas.
§ 2.° Achando-se divorciados o pai e a mãe, pertencerá metade da pensão ao pai, se se encontrar em algumas das circunstâncias da condição 4.ª, e a outra metade à mãe, se não tiver meios de subsistência.
Na pensão assim dividida não há sobrevivência entre os pais, havendo somente dêstes para os irmãos do militar falecido, que se encontrem nas circunstâncias já referidas.
Art. 3.° Os interessados instruirão os seus requerimentos com os documentos que provem achar-se rigorosamente nas condições designadas no artigo 2.°
Art. 4.° Aos militares em serviço na Companhia de Moçambique, na do Niassa ou em qualquer outra com organização semelhante à destas, são aplicáveis todas as disposições desta lei.
Art. 5.° Os guardas da polícia cívica e os empregados do corpo da fiscalização dos impostos, que no exercício das suas funções forem vítimas de desastre ou de qualquer agressão, tem direito à pensão de 50 por cento do seu vencimento de categoria, alêm da que lhes pertencer de reforma ou aposentação, se ficarem impossibilitados para o serviço, ou à totalidade do vencimento de categoria a favor de suas famílias se falecerem em resultado do qualquer daqueles acidentes, quando a incapacidade ou o falecimento se verifiquem dentro do prazo do um ano, não podendo, porêm, as pensões a conceder às famílias ser inferiores a $20 diários nem superiores a 600$ anuais.
Art. 6.° Os governadores civis e os administradores de concelho, mortos em resultado de qualquer agressão no exercício das suas funções, tem direito a legar a suas famílias a pensão de 1$ diário e os regedores do $30 diários, quando estas provem não ter outros meios de subsistência.
§ único. A família para os efeitos de que trata êste artigo é a que consta do artigo 2.°, com as mesmas precedências e condições.
Art. 7.° As famílias dos médicos que faleçam por efeito de moléstia infecciosa contraída em serviço público de assistência e defesa sanitária de epidemia será concedida uma pensão até 600$ anuais, quando provem não ter outros meios de subsistência.
§ único. A família para os efeitos de que trata êste artigo é a que consta do artigo 2.°, com as mesmas precedências e condições.
Art. 8.° Consideram-se no caso do artigo anterior os médicos de saúde pública, dos laboratórios oficiais de bactereologia, dos hospitais públicos, tanto do Estado como de qualquer corporação administrativa ou de beneficência, os do serviço mutualista e da Cruz Vermelha e os facultativos contratados para o serviço de epidemias ou obrigados ao desempenho dêsse serviço por efeito do artigo 61.° do regulamento geral de saúde pública de 24 de Dezembro de 1901.
Art. 9.° As disposições dos artigos 7.° e 8.° são aplicáveis ao pessoal não médico, empregado ou assalariado dos hospitais públicos e de isolamento, de laboratórios oficiais de bactereologia, postos de desinfecção pública, estações de saúde e lazaretos, do serviço mutualista e da Cruz Vermelha e em geral dos serviços ordinários e extraordinários de prevenção ou debelação de epidemias o de assistência aos epidémicos. A pensão irá até a quantia de 300$ anuais, quando as respectivas famílias provem não ter outros meios de subsistência.
Art. 10.° Os militares que, fazendo parte de cordões sanitários, da guarnição de lazaretos ou hospitais de isolamentos de epidémicos, forem vítimas da mesma epidemia, terão tambêm direito, a favor de suas famílias, a pensões equivalentes ao seu soldo ou pré, quando estas provem
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não ter outros meios de subsistência, não podendo as dos oficiais exceder 600$ e as das praças de pré 300$ anuais nem estas ser inferiores a $20 diários.
Art. 11.° As famílias do pessoal da Cruz Vermelha, constante da organização geral dos seus serviços, aprovada por decreto de 24 de Janeiro de 1913, são aplicáveis as disposições desta lei desde o dia da sua mobilização para campanha, sendo equiparado durante a campanha, nos termos da Convenção de Genebra, ao pessoal dos serviços militares de saúde, não podendo, porêm, as pensões dos equiparados a oficiais exceder 600$, e as dos equiparados a praças de pré 300$ anuais, nem estas ser inferiores a $20 diários, e, em qualquer das hipóteses, quando provem não ter outros meios de subsistência.
Art. 12.° Nos casos de que tratam os artigos 6.° a 11.°, quando as famílias tiverem rendimentos inferiores às pensões estipuladas nesta lei receberão do Estado a diferença.
Art. 13.° Os militares das tropas de reserva ou territoriais e os mancebos que, nos termos do artigo 15.° do decreto com fôrça de lei de 26 de Maio de 1911, forem vítimas de algum acidente grave, durante as sessões de tiro ao alvo ou outros exercícios de instrução militar preparatória, tem direito à pensão de sangue, de $10 diários, se ficarem inutilizados para o serviço e provarem, no prazo de um ano, contado da ocorrência, que não podem angariar os meios de subsistência pelo seu trabalho.
§ único. Esta pensão será concedida ou reverterá para as suas famílias se o falecimento dêstes indivíduos se der no prazo indicado, provando os requerentes que os falecidos eram o seu único amparo.
Art. 14.° Aos indivíduos contratados para tripular navios ao serviço do Estado e sob a sua administração directa, que, durante o estado de guerra, se impossibilitarem em serviço, e bem assim às famílias dos que falecerem por efeito de ferimento ou desastre ocorrido ou moléstia adquirida em serviço, devidamente comprovados, são aplicáveis as pensões desta lei computando-se-lhes as pensões mensais conforme os respectivos cargos, quaisquer que sejam os vencimentos dos seus contratos, da maneira seguinte:
Comandantes, 50$; imediatos, médicos, maquinistas encarregados e comissários, 45$: pilotos e oficiais maquinista, 35$; mestres e patrões ou arrais de pequenas embarcações, 14$; contramestres, despenseiros e telegrafistas sem fios, 12$; criados, 10$; fogueiros, marinheiros, padeiros e cozinheiros, 8$; chegadores e moços, 6$.
Art. 15.° As famílias dos indivíduos de que trata o artigo 31.° do regulamento disciplinar do exército de 2 de Maio de 1913 será arbitrada a pensão que o Govêrno julgar equitativa em harmonia com a categoria daqueles indivíduos, quando, em tempo de guerra, forem vítimas de desastres ou morrerem em campanha, não podendo, porêm, tais pensões ser inferiores a $20 diários.
Art. 16.° As pensões de sangue não estão sujeitas a cabimento na verba orçamental, são isentas de quaisquer imposições e os respectivos processos são gratuitos e isentos do imposto de sêlo nos documentos e requerimentos que encerrarem. Toda? as certidões e atestados que forem necessários para instruir os processos incluindo certidões de casamento, filiação e óbito, serão passados gratuitamente.
Art. 17.° As pensões de sangue tem vencimento desde o dia imediato ao da morte dos indivíduos que as transmitem ás suas famílias ou da ocorrência de que proveio a incapacidade do interessado, prescrevendo, porêm, o direito à pensão no prazo de cinco anos, a contar daquele dia, se dentro dêsse prazo não derem entrada no Ministério competente os requerimentos dos interessados pedindo a sua concessão.
§ único. A prescrição de que trata êste artigo não se aplica às pensões a que tenham direito os menores e interditos emquanto não tiverem quem os represente. Aos menores, que não tiverem quem os represente, é fixado o prazo de um ano, a partir do dia em que completarem vinte anos de idade, para requerem a concessão da pensão de sangue a que se julguem com direito.
Art. 18.° Perdem a pensão de sangue as viúvas que passarem a novas núpcias, as mães, filhas ou irmãs dos indivíduos falecidos nas condições da presente lei, que casarem depois de lhes ser concedida pensão.
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§ 1.° Nos títulos de renda vitalícia, passados na conformidade desta lei, será exarada por meio de verba a declaração de que os interessados perdem o direito à pensão nas circunstâncias previstas na lei, designando quais elas são para conhecimento dos funcionários que tiverem de processar as folhas dos respectivos vencimentos, bem como dos que tiverem de os pagar e fiscalizar.
§ 2.° As pensionistas devem Apresentar de seis em seis meses atestados passados em papel comum, pelas juntas de paróquia, nos quais se declare que se conservam no estado de viúvas ou de solteiras. Êstes atestados devem ficar juntos aos recibos das pensões dos meses de Janeiro e de Julho do cada ano para salvaguardarem a responsabilidade dos funcionários referidos e a obrigação da sua apresentação naqueles meses deve constar das verbas lançadas nos títulos.
Art. 19.° Cada processo será organizado no Ministério onde estava prestando serviço ou de que dependia o indivíduo militar ou civil, falecido ou inutilizado nas condições previstas nesta lei, sendo informado pela repartição competente, que indicará qual o pró, soldo ou vencimento de categoria que êle tinha ou lhe podia ser atribuído por equiparação.
Assim instruído será por aquele Ministério remetido à respectiva repartição de contabilidade que verificará ou rectificará o vencimento atribuído ao falecido, enviando sem mais interferência o processo à Direcção Geral da Contabilidade Pública para ser relatado pela Repartição Central, que deve declarar qual é a disposição da presente lei aplicável ao caso ou se lhe parece que nenhuma lhe pode aproveitar, indicando, contudo, a importância da pensão a conceder, no caso da pretensão ser deferida, e enviando-o à Procuradoria Geral da República para emitir o seu parecer sôbre o merecimento legal da pretensão.
Os pareceres da Procuradoria Geral da República podem ser de simples conformidade, se forem de harmonia com os da referida repartição de contabilidade, devendo, porêm, ser fundamentados em caso contrário.
Os processos são em seguida presentes ao Ministro das Finanças que sôbre êles lançará o seu despacho, deferindo ou indeferindo, conforme o juízo que formar dos pareceres emitidos, sendo por fim decretadas as pensões nos casos do deferimento.
§ único. O Ministro das Finanças, quando o julgar conveniente, pode mandar ouvir tambêm o Supremo Tribunal Administrativo, que emitirá parecer fundamentado.
Art. 20.° Fica expressamente proibida a concessão de pensões de sangue em circunstâncias diferentes das que estão indicadas na presente lei.
Nos casos duvidosos de interpretação de qualquer disposição dar-se-lhe há sempre a que resultar do seu sentido literal.
Art. 21.° As pessoas residentes nas colónias, que se julguem com direito a pensão de sangue, fazem os seus requerimentos ao Ministro das Colónias, dirigindo-os pelo Governador da província onde residem; êstes requerimentos, informados pelos governadores e instruídos com os documentos que puderem ser obtidos na respectiva província, serão remetidos à Direcção Geral das Colónias, que completará a instrução dos processos, requisitando oficialmente os documentos que faltarem, e promoverá o seu andamento até a expedição para a Repartição de Contabilidade do Ministério para os fins designados no artigo 19.° da presente lei.
Art. 22.° O assentamento geral das pensões continua a ser feito na Direcção Geral da Contabilidade Pública, donde se expedirão as competentes guias para registo nas colónias de todos os pensionistas a favor de quem forem concedidas pensões de sangue e daqueles que para lá pedirem a transferência do abono das que estavam, recebendo na metrópole.
Art. 23.° O registo das pensões nas colónias é feito nas inspecções superiores de fazenda provinciais em face das guias de que trata o artigo antecedente e o seu pagamento realizar-se há por ordens daquelas repartições expedidas para os cofres mais próximos das residências das pensionistas, passando êles recibos e talão, e apresentando os seus títulos de renda vitalícia para lhes ser averbado o pagamento nos espaços destinados a êsse efeito.
Art. 24.° Os recibos dos vencimentos pagos nas colónias devem ser remetidos § à 9.ª Repartição da Direcção Geral da
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Contabilidade Pública para solicitar do Ministério das Finanças o reembolso das respectivas importâncias fazendo-as entrar na Caixa Geral de Depósitos em conta das colónias a que pertencerem.
§ único. A referida repartição processará e enviará ao Ministério das Finanças, para efeito de liquidação e ordenamento da despesa, as folhas mensais de todos os pensionistas residentes nas colónias, a fim de, pelas ordens indicadas nessas folhas, solicitar depois, da Direcção Geral da Fazenda Pública, o pagamento dos recibos, à medida que lhe forem enviados das colónias.
Art. 20.° No mês de Janeiro de cada ano será organizada em cada uma das inspecções superiores de fazenda coloniais uma relação dos pensionistas falecidos na colónia ou de cujo falecimento tenha havido conhecimento no ano civil anterior, com designação dos números dos títulos, nomes dos pensionistas e importâncias anuais das suas pensões, sendo estas relações remetidas à 9.ª Repartição da Direcção Geral da Contabilidade Pública, para registar as vacaturas e comunicá-las à Repartição Central da mesma Direcção Geral.
Art. 26.° Os atestados que as pensionistas residentes nas colónias devem apresentar, para cumprimento do disposto no § 2.° do artigo 18.°, podem ser passados pelos comandantes militares ou autoridades administrativas das localidades onde residirem, mas êstes atestados só serão exigidos àquelas em cujos títulos de renda vitalícia estiver exarada a obrigação do os apresentar, ficando os pagadores responsáveis pelas quantias que abonarem às que o não fizerem.
Art. 27.° Para obviar aos inconvenientes resultantes da demora no deferimento das pretensões das famílias de oficiais, praças e mais indivíduos nas províncias ultramarinas, cujo falecimento, nos termos da presente lei, de direito a pensão de sangue, serão concedidas pensões provisórias, com as formalidades indicadas nos artigos seguintes.
Art. 28.° Para os fins indicados no artigo anterior, devem os governadores das províncias onde o falecimento se tiver dado comunicar telegráficamente a data do falecimento, indicando as causas da morte e confirmando êsse telegrama por meio de ofício expedido na primeira mala.
Art. 29.° Recebida que seja, nas respectivas Repartições da Direcção Geral das Colónias, a comunicação telegráfica de que trata o artigo antecedente, será imediatamente participado, o acto às unidades ou estabelecimentos militares a que pertenciam os falecidos à data da sua requisição pelo Ministério das Colónias.
Art. 30.° Os chefes dos estabelecimentos militares o das diferentes unidades, logo que recebam a comunicação oficial do falecimento, convidarão as pessoas de família que lhes conste existir nas condições do artigo 2.° desta lei, a entregar-lhe os seus requerimentos dirigidos ao Ministro das Finanças, pedindo pensão de sangue, devendo êstes requerimentos ser instruídos com os documentos que provem aquelas condições.
§ único. Os processos assim instruídos serão no prazo de três dias enviados directamente, pelas referidas autoridades militares, à Direcção Geral das Colónias, devendo as mesmas autoridades juntar-lhes as notas dos assentos e informar qual o soldo ou pré que pertencia aos falecidos, bem como a residência das pessoas requerentes.
Art. 31.° A repartição competente da Direcção Geral das Colónias, à qual tenha sido distribuído o processo, deverá, sem perda de tempo, enviá-lo à 9.ª Repartição da Direcção Geral da Contabilidade Pública com a sua informação; e esta Repartição, sem demora, apreciando as circunstâncias constantes dos mesmos processos, solicitará do Ministério das Finanças, pela Direcção Geral da Contabilidade Pública, o abono da pensão provisória.
Art. 32.° A Direcção Geral da Contabilidade Pública apresentará o pedido a despacho do Ministro das Finanças, e comunicará imediatamente o deferimento à, Inspecção de Finanças do distrito a que pertença o concelho da residência do requerente, para serem processadas as competentes folhas e ordenado o seu pagamento.
§ único. Quando a família do falecido residir nas colónias será a comunicação feita à 9.ª Repartição da Direcção Geral da Contabilidade Pública para os efeitos devidos.
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Art. 33.° Os processos continuarão na 9.ª Repartição da Direcção Geral da Contabilidade Pública até se completar a sua instrução, sendo então enviados à Direcção Geral da Contabilidade Pública para os fins designados no artigo 19.° da presente lei.
Art. 34.° Se a pretensão fôr indeferida, reconhecendo-se que para o abono da pensão provisória houve errada interpretação das disposições desta lei, será a pensão suspensa imediatamente, devendo o Ministério das Colónias reembolsar o das Finanças das importâncias que êste indevidamente satisfez.
Art. 35.° As disposições que ficam consignadas para o abono da pensão provisória são aplicáveis às famílias dos oficiais e praças que estejam desaparecidos ou prisioneiros de guerra, sendo considerados como mortos em combate.
§ 1.° As pensões provisórias concedidas nestas condições passarão a definitivas, abonadas por meio de título de renda vitalícia no fim de cinco anos, contados do dia em que se tiver verificado o desaparecimento.
§ 2.° Quando a todo o tempo aparecer ou deixar de estar prisioneiro algum dos oficiais ou praças, caduca imediatamente a pensão, procedendo-se quanto ao reembolso dos abonos feitos pelo Ministério das Finanças pela forma estabelecida no artigo anterior, e devendo as quantias que as famílias hajam recebido ser deduzidas nos vencimentos que tenham deixado de ser abonados.
Art. 36.° As importâncias das pensões provisórias serão restituídas ao Estado, quando se reconheça que houve má fé da parto dos interessados na instrução dos seus processos, ficando assim sujeitos às cominações do Código Penal.
§ único. Ficam responsáveis pelas importâncias abonadas, não só as pessoas que as tenham recebido, mas tambêm as autoridades que, pela sua infundada informação, deram causa aos abonos.
Art. 37.° Fica o Govêrno autorizado a abrir créditos especiais para integral execução desta lei, quando as verbas descritas no orçamento do Ministério das Finanças não comportem a despesa.
Art. 38.° Esta lei só pode ser derrogada por outra que trate exclusivamente de pensões de sangue, e assim fica proibido incluir em leis ou decretos doutra natureza quaisquer disposições concernentes a pensões de sangue, as quais serão consideradas nulas quando alterarem as da presente lei, porque só com fundamento nela e designadamente em algumas das suas disposições poderão de futuro ser concedidas tais pensões.
Art. 39.° As disposições desta lei tem aplicação somente aos factos ocorridos depois da sua publicação e não carecem de regulamento para a sua execução.
Os processos pendentes e as pensões já concedidas ficam subordinados à legislação anterior, mas as pensões existentes que forem inferiores a &2Q diários serão elevadas a esta importância desde 1 de Julho de 1916, averbando-se os respectivos títulos com a declaração de que a partir daquele dia ficam valendo pela quantia anual de 72$.
§ único. Os títulos pertencentes a pensionistas residentes actualmente nas colónias serão mandados averbar pelos respectivos governadores.
Art. 40.° Esta lei entra imediatamente em execução e revoga toda a legislação anterior sôbre pensões de sangue e mais disposições em contrário.
Sala das sessões, em 13 de Maio de 1916. - José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
Admitido.
Para a Secretaria.
Para a comissão de guerra.
Artigo 1.° Os alunos da Escola de Guerra, que nos anos de 1913, 1814 e 1915 se matricularam nos primeiros anos dos cursos comuns de artilharia a pé e engenharia militar, serão promovidos a tenentes logo que tenham completado um ano de efectivo serviço como alferes nas armas a que se destinarem.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário.
Lisboa, 13 de Maio de 1916. - Os Deputados, João Tamagnini de Sousa Barbosa- Pedro Alfredo de Morais Rosa - João Soares - Domingos Frias - Francisco Cruz.
Admitido.
Para o "Diário do Govêrno".
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Antes da ordem do dia
O Sr. Alfredo de Sousa (em negócio urgente): - Requeiro que seja consultada a Câmara sôbre se consente a discussão imediata do parecer n.° 431.
Foi aprovado.
O Sr. Américo Olavo (em nome da comissão de guerra): - Chamo a atenção de V. Exa. para o seguinte facto: há três dias requeri a discussão do parecer que mandei para a Mesa sôbre uma proposta de lei do Sr. Presidente do Ministério, dispensando o capitão Teixeira Pinto das provas para a promoção ao pôsto de major. Até hoje ainda nenhuma resolução houve, embora o assunto seja urgente, pois , êsse oficial está na contingência de ser preterido.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: - Vai ler-se o parecer n.° 431.
O Sr. Alfredo do Sousa: - Requeiro a dispensa da leitura.
Foi concedida, entrando em seguida em discussão o parecer.
É o seguinte:
Parecer n.° 431
Senhores Deputados.- À apreciação da vossa comissão de administração pública foram submetidos os projectos de lei n.° 161-A, da iniciativa do Sr. Deputado Adelino de Oliveira Furtado, n.° 370-D, da iniciativa do Sr. Deputado Alfredo Ernesto de Sá Cardoso, n.° 373-C, da iniciativa do Sr. Deputado Luís Carlos Guedes Derouet, e finalmente o n.° 387-B, da iniciativa do Sr. Deputado João Baptista da Silva.
Em todos êstes projectos pretendem os seus autores alcançar do Poder Legislativo uma autorização para as câmaras municipais, dos concelhos a que os mesmos projectos se referem, poderem vender directamente os seus foros, independentemente do preceituado nas leis da desamortização.
Entende esta comissão que se deve outorgar a pretendida autorização, pois reconhece que os corpos administrativos só poderão auferir vantagens, facilitando-lhes a venda dos foros ou de qualquer domínio censuístico que possuírem.
Como, porêm, a razão que justifica essa venda se dá em todos os corpos administrativos que possuírem aquela especial propriedade imobiliária, entende a vossa comissão de administração pública que se não deve estabelecer uma lei especial para cada concelho ou paróquia, e que antes se deve procurar organizar uma lei de natureza geral que não só autorize todos os corpos administrativos a venderem directamente os censos e foros que possuírem, como tambêm estabeleça disposições adjectivas que regulamentem a forma ou o processo como a alienação se deve realizar.
Levada por esta ordem de razões, a vossa comissão de administração publica, concordando em princípio com todos os mencionados projectos de lei. substitui-os contudo por êste outro, absolutamente genérico e aplicável a todos os corpos administrativos, que submete à vossa consideração.
Artigo 1.° São autorizados os corpos administrativos a venderem directamente por arrematação os censos e os domínios directos e enfitêuticos que possuírem.
§ único. Em nenhum caso os direitos imobiliários referidos neste artigo poderão ser vendidos por preço inferior a 70 por cento do seu valor, calculado nos termos do disposto nos n.ºs 3.° e 4.° do artigo 353.° do Código do Processo Civil.
Art. 2.° Salvo o disposto no artigo seguinte, a arrematação dos bens referidos no artigo anterior será feita na sala das sessões dos corpos administrativos a que êles pertencerem, e sempre com a assistência do agente do Ministério Público da respectiva comarca ou vara.
§ único. Para os efeitos do determinado neste artigo, o Ministério Público será avisado por ofício, e com antecipação pelo menos de oito dias, da hora e dia que se tiver designado para a praça.
Art. 3 ° Quando os direitos imobiliários a vender pertencerem a câmaras municipais de concelhos que não sejam sedes de comarca, ou a juntas de paróquia, fora de Lisboa e Pôrto, a sua arrematação realizar-se há, tambêm com a assistência do Ministério Público, na sala das sessões da câmara municipal do concelho que fôr se-
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de da comarca, da qual façam parte, respectivamente, a sede do concelho e as paróquias que possuírem os direitos mobiliários a arrematar.
Art. 4.° A presidência da praça pertence ao presidente da comissão executiva do corpo administrativo que fôr proprietário do direito imobiliário a arrematar, e ao presidente da respectiva junta de paróquia tratando-se de propriedade paroquial. De escrivão e oficial de diligências servirão, respectivamente, o chefe da secretaria e o contínuo do corpo administrativo em cuja sala de sessões a arrematação se tiver de realizar, ainda mesmo que se trate de propriedade paroquial.
Art. 5.° A arrematação será anunciada por três editais, passados em papel comum e sem sêlo, afixados com antecipação, pelo menos de vinte dias, nos lugares mais públicos da freguesia da situação do prédio sôbre o qual pesar o ónus enfitêutico, sub-enfitêutico ou censuístico, sendo um dêles no próprio prédio, e ainda por mais um outro passado em iguais condições e afixado na porta do edifício onde a arrematação se houver de efectuar, devendo cumprir-se tambêm o disposto no § 1.° do artigo 842.° do Código do Processo Civil.
§ único. Os editais e anúncios serão assinados pela entidade se quem couber a presidência da praça, e por êles serão citados os enfiteutas, sub-enfiteutas e censuários para assistirem à arrematação, a fim de puderem usar do seu direito de preferência.
Art. 6.° No dia da praça o presidente, á hora designada, e depois de se certificar da presença do Ministério Público, fará anunciar pelo oficial de diligências a, abertura da praça e pôr a lanços pelo seu valor sucessivamente cada um dos direitos imobiliários a arrematar, como fará cumprir o disposto nos §§ 1.° e 2.° do artigo 849.° do Código do Processo Civil.
Art. 7.° Não havendo quem ofereça preço superior ao valor dos direitos imobiliários a arrematar, poderão êstes voltar a uma segunda praça com o abatimento de 10 por cento, e se ainda não houver arrematante, pode não voltar a uma terceira praça por 70 por cento do seu valor.
Art. 8.° Por cada imobiliário que se arrematar lavrar-se há em papel selado um auto de arrematação, que será assinado pelo presidente, Ministério Público, arrematante e escrivão, com as mesmas formalidades e despesas das arrematações judiciais, que serão pagas pelo arrematante, pertencendo ao Ministério Público, ao escrivão e ao oficial de diligências respectivamente o emolumento e os salários, que nas arrematações judiciais pertencem ao juiz, escrivão e oficial do diligência?.
§ único. Do auto de arrematação, que fica fazendo parte do arquivo do corpo administrativo a que o mobiliário tiver pertencido, o escrivão extrairá uma cópia autêntica em papel comum e sem despesas dentro do prazo de oito dias depois de paga a contribuição de registo, a que se refere o artigo 10.º; e essa cópia será entregue ao Ministério Público, para êste a enviar dentro dum prazo cão superior a dez dias à Direcção Geral da Fazenda Pública no Ministério das Finanças.
Art. 9.° Ao arrematante é aplicável o disposto no artigo 859.° e §§ 1.° a 5.° e 8.° do Código do Processo Civil, salvo na parte que estabelece a pena de prisão. O depósito, porêm, do preço da arrematação será feito na tesouraria do respectivo corpo administrativo, não tendo o tesoureiro direito a cobrar para si percentagem alguma sôbre as importâncias que receber de preços de arrematação de bens.
Art. 10.° O arrematante fica obrigado a pagar por inteiro dentro de quinze dias toda a contribuição de registo devida pelo preço da arrematação, para o que requisitará ao escrivão as respectivas guias.
§ único A falta de pagamento da contribuição de registo do prazo marcado neste artigo sujeita o arrematante ao pagamento do dobro da contribuição que lhe será exigida coercivamente pelo Ministério Público, na falta de pagamento voluntário.
Art. 11.° Ao arrematante será passada uma carta de arrematação, que por êle será paga, a qual conterá o auto de arrematação, o conhecimento da contribuição de registo e o depósito do preço, devendo ser assinado pela entidade a que pertencer a presidência da respectiva praça e pelo escrivão.
Art. 12.° Os autos e a carta de arrematação a que se referem os artigos anteriores serão contados pelo escrivão, ao qual por isso ficam pertencendo tambêm os salários que nas arrematações judiciais cabem aos contadores.
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Art. 13.° Não haverá lugar a arrematação se o enfiteuta, sub-enfiteuta, ou o censuário, antes da abertura da praça declarar em requerimento que quere remir o respectivo domínio ou o censo pelo valor determinado no § único do artigo 1.° Em tal caso poderão os corpos administrativos outorgar uma escritura de remissão depois de paga a devida contribuição de registo.
§ único O disposto neste artigo aplica-os tambêm às corporações administrativas.
Art. 14.° O disposto nos artigos 2.° a 12.° inclusive, é aplicável à venda de quaisquer imobiliários, que os corpos administrativos possam legalmente efectuar, sendo porêm nestas vendas dispensada a cópia do auto de arrematação referida no § único do artigo 8.°
Art. 15.° Fica revogada a legislação em contrário.
Sala das sessões da comissão de administração pública, em 4 de Maio de 1916.- Carlos Olavo - Abílio Marçal - Godinho Amaral - Vasco de Vasconcelos - Alfredo de Sousa, relator
Senhores Deputados. - À vossa comissão de finanças foram enviados os projectos de lei n.ºs 161-A, 370-D, 373-C e 387, das iniciativas dos Srs. Deputados Adelino de Oliveira Furtado, Alfredo Ernesto de Sá Cardoso, Luís Carlos Guedes Derouet e João Baptista da Silva, relativos a venda de foros de diversos concelhos.
A vossa comissão de administração pública apreciou já êstes projectos e formulou um outro projecto generalizando a doutrina a seguir em casos análogos, e como da análise, tanto daqueles como dêste, não resulta para a Fazenda Pública nem aumento de despesa, nem diminuição de receita, a vossa comissão de finanças não tem que emitir parecer sôbre êles.
Sala da comissão de finanças, em 9 de Maio de 1916. - Francisco de Sales Ramos da Costa, presidente - Ernesto Júlio Navarro - Prazeres da Costa - Germano Martins - Aníbal Lúcio de Azevedo - Constâncio de Oliveira - Manuel da Costa Dias - Mariano Martins.
Projecto de lei n.° 161-Á
Exmos. Senhores. - O verdadeiro caos em que desde há anos se encontra o serviço da cobrança dos foros pertencentes á Câmara Municipal de Vila Nova de Portimão, em virtude da sua distribuição, na maior parte ser em quantias diminutas de $01, $02, $03, $04, $05, $06, $08 a $10; o prejuízo proveniente da falta de compreensão ou má fé dos enfiteutas, vendendo como isentos, prédios que são foreiros; a sua falta de pagamento, e outros processos que de há muito prejudicam a administração municipal, em quantia relativamente importante; o facto de no inventário geral existente na Torre do Tombo se encontrarem omissões de enfiteutas, nalguns prazos foreiros e noutros aparecerem enfiteutas figurados, acrescendo ainda a má discrição dos prédios foreiros; por todos êstes motivos, e porque a insignificância do quantitativo de cada foro não convida à deslocação e despesas de transporte a fazer até a sede do distrito, sendo certo que a fiscalização da Fazenda Pública se exercerá da mesma forma do que se os prazos fossem vendidos na sede do distrito, por intervenção do secretário de finanças do respectivo concelho; e, finalmente, porque o Estado só tem a lucrar com a venda, visto que o produto dela será convertido em títulos de dívida pública e a câmara, recebendo os juros dêsses títulos cobrará um rendimento que legitimamente lhe pertence, praticando um facto de zelosa administração; por êstes fundamentos vos apresento o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° É autorizada a Câmara Municipal de Vila Nova de Portimão, a vender na sede do seu concelho, em dias por ela determinados e assistida sempre pelo secretário de finanças respectivo, todos os prazos que ao mesmo município pertencem, podendo reduzi-los até 50 por cento do seu valor.
Art. 2.° O produto da venda será arrecadado por intervenção da repartição de finanças do concelho para ser aplicado, nos termos da lei das desamortizações, em títulos da divida pública fundada, que depois serão averbados em nome da Câmara Municipal de Vila Nova de Portimão.- O Deputado, Adelino Furtado.
Projecto de lei n.° 370-D
Senhores Deputados.- Há longos anos que a Câmara Municipal de Monção luta com enormes dificuldades para a cobrança dos seus foros, avolumando-se de cinco em
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cinco anos as dívidas dessa procedência, por isso que na administração do concelho, por onde correm as execuções fiscais administrativas, nunca foi possível dar andamento a tal serviço, em virtude da dificuldade de identificação dos prédios e dada a antiguidade dos emprazamentos, que montam a maior parte até cem e duzentos anos e porque as quantias exeqùendas são de insignificante importância, não se achando os foros registados.
Esperando, por meios brandos, conseguir a realização do seu intento, qual é o de liquidar duma vez semelhante estado de cousas, resolveu a Câmara Municipal de Monção, há bastantes anos. anunciar a venda dos foros nos termos da lei de 21 de Abril de 1873 e seu regulamento de 23 de Setembro do mesmo ano. Não obteve resultado algum e por uma razão bem atendível - as despesas do sêlo, papel selado e demais da praça, sendo os foros de insignificante quantia, ascenderiam a uma tal importância que levariam, como levaram, os interessados a renunciar à arrematação de um foro que sendo, por exemplo, de $01 - e há-os de meio e quarto de centavo - e cujo valor é de $20, importaria ao arrematante, só em selos e papel selado, em mais de 3$.
Continuando êste estado de cousas, nem o Estado nem a Câmara Municipal de Monção auferem qualquer rendimento: aquele, se os foreiros não pagarem as pensões á câmara, não recebe imposto algum, e, se êstes se negarem a comprar os foros, tambêm o Estado não recebe o sêlo da carta de amortização, 2,5 por cento sôbre o preço da arrematação e os 8 por cento da contribuição de registo, afora a importância do papel selado; esta fica anualmente desfalcada em rendimento aproximado de 180$, pois a tanto monta a importância dos 2:403 foros, não cobrados, cuja pensão é igual ou inferior a 1$.
No interesse do Estado e da Câmara de Monção, urge pôr termo a tais inconvenientes, facilitando por todas as formas a remissão dos foros pequenos, já dispensando emolumentos, carta de arrematação, sêlo sôbre o preço da arrematação, etc., já poupando aos foreiros as despesas da viagem até a sede do distrito onde se fazem as praças.
A solução só pode ser uma, sob pena de se continuar protegendo quem não satisfaz a importância dos foros em dívida: autorizar a Câmara Municipal de Monção a vender directamente os foros cuja pensão seja igual ou inferior a 1$, mantendo para o Estado o direito de cobrar a contribuição de registo.
Tenho, portanto, a honra de submeter à vossa apreciação o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° A Câmara Municipal do concelho do Monção é autorizada a vender, em hasta pública, os foros de que fôr directa senhoria, quando o respectivo valor, pelas avaliações regularmente feitas ou que de futuro venham a fazer-se, não exceder a quantia de 20$, observando-se, quanto ao produto da renda, o que se preceitua nas leis de desamortização, que mandam inverter em títulos da divida pública, averbados à Câmara, as importâncias das rendas.
§ 1.° A avaliação dos encargos, que não esteja regular, será feita nos precisos termos das alterações 1.ª e 8.ª do artigo 1.° do decreto-lei de 25 de Janeiro de 1911.
§ 2.° A Câmara será obrigada a enviar à Direcção Geral da Fazenda Pública, no prazo de trinta dias, da data da arrematação, relação dos foros que tenha vendido.
Art. 2.° As arrematações, a que se refere esta lei, apenas estão sujeitas ao pagamento da contribuição de registo por título oneroso, não sendo devidos emolumentos alguns, nem sêlo, alêm do papel selado do respectivo contrato.
Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrário.
Sala das Sessões da Câmara dos Deputados, 23 de Março de 1916.-Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Projecto de lei n.° 373-C
Tendo a Câmara Municipal do concelho do Sobral de Monte Agraço, após o cumprimento das formalidades determinadas no decreto n.° 931, de 7 de Outubro de 1914, tomado a deliberação de vender os seus foros, para, com o produto dessa venda, proceder à construção dum matadouro naquela vila, e o saldo, se o houver, ser aplicado na construção do edifício escolar em projecto, o que representa, perante êste Parlamento, com o fim de evi-
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tar delongas prejudiciais, a solicitação duma concessão já feita a outros municípios, tenho a honra de submeter á vossa apreciação o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° É concedida à Câmara Municipal do concelho de Sobral de Monte Agraço autorização para vender os foros de que é possuidora, aplicando o produto da venda na construção do matadouro municipal e ainda, caso haja algum saldo, na construção do edifício escolar em projecto.
Art. 2.° A venda a que esta lei se refere será feita directamente, em hasta pública, pela Câmara Municipal e por ela arrecadada a respectiva importância.
Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrário.
Lisboa, 31 de Marco do 7916.0-Deputado, Luís Derouet.
Projecto de lei n.° 387-B
Senhores Deputados.- A Câmara Municipal do concelho da Calheta, distrito de Angra do Heroísmo, necessita da competente autorização legal para, independentemente das leis da desamortização, vender os seus foros, a fim de ocorrer às despesas inadiáveis da conclusão do edifício dos Paços do Concelho.
E é para evitar delongas, manifestamente prejudiciais ao útil fim que tem em vista, que solicita do Parlamento uma concessão, justa e criteriosamente já feita a outros municípios.
Nestas circunstâncias, submeto à vossa apreciação o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° É autorizada a Câmara Municipal do concelho de Calheta, distrito de Angra do Heroísmo, a vender directamente, em hasta pública, os seus foros, independentemente das leis da desamortização.
§ único. O produto desta alienação será arrecadado pela referida Câmara, e por ela aplicado à conclusão do respectivo edifício dos Paços do Concelho.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário.
Sala das Sessões da Câmara dos Deputados, 31 de Março de 1916.- O Deputado, Baptista da Silva.
O Sr. Alfredo de Sousa:-Mando para a Mesa as seguintes
Propostas de emenda
Proponho que se suprimam ao artigo 13.° todas as palavras que seguem a "§ único do artigo 1.°", e que tambêm se suprima o § único do artigo 13.° - Alfredo de Sousa.
Proponho que no artigo 3.° se façam estas alterações:
1.ª Intercalar entre a expressão "não sejam sedes de comarca" e a frase "ou a junta de paróquia" a expressão "ou julgado municipal".
2.ª Inscrever seguidamente à expressão "que fôr sede da comarca" esta outra "ou julgado municipal".
3.ª Substituir a expressão "da qual faz parte", por esta outra "a que pertençam". - Alfredo de Sousa.
Proponho que ao artigo 8.° se adicione um parágrafo, que deverá ficar como § 1.°, passando o § único do projecto para § 2.°
§ 1.° Não há lugar ao pagamento de selos, nem dos emolumentos e salários referidos neste artigo, quando o preço total das arrematações, a que o auto de arrematação se referir, não fôr superior a 10$.- O Deputado, Alfredo de Sousa.
Artigo adicional:
Proponho o seguinte artigo, que deverá ficar com o n.° 14.°:
Artigo 14.° Ficam autorizados os corpos e corporações administrativas a outorgar contratos de remissão de foros e censos pelo preço legal. - Alfredo de Sousa.
Proponho que ao artigo 8.° se substitua a expressão "Por cada mobiliário que se arrendar", que se encontra no princípio do artigo, por esta outra: "Para todos os mobiliários que no mesmo dia furem arrematados pelo mesmo arrematante". - O Deputado, Alfredo de Sousa.
Artigo 3.° Proponho que se substitua a palavra "paróquia", que se encontra no projecto, por "freguesia". - Alfredo de Sousa.
Artigo 2.° Proponho que ao artigo 2.° se substitua a expressão: "respectiva comarca ou vara", por esta outra: "respectiva comarca, vara ou julgado municipal". - O Deputado, Alfredo de Sousa.
Foram admitidas.
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O Sr. Lopes Cardoso: - Mando para a Mesa a seguinte
Proposta
Proponho a substituição do 2.° período do artigo 9.°, pela forma seguinte: "O produto da arrematação, será depositado na Caixa Geral dos Depósitos, salvo quando as corporações administrativas destinem tal produto à amortização imediata dos seus empréstimos ou ao pagamento imediato de obras devidamente deliberadas e orçamentadas, pois que, nestes casos, dará entrada na tesouraria da Câmara sem que o Tesouro, por êsse efeito, receba qualquer percentagem.- Lopes Cardoso.
Foi admitida.
O Sr. Costa Júnior: - Protesto contra o hábito, que se está seguindo, de se discutirem projectos antes da ordem do dia, quando há assuntos importantes que reclamam a nossa atenção.
Foi aprovado o projecto na generalidade e em seguida entrou em discussão na especialidade.
O Sr. Celorico Gil: - Crê que foi ontem acusado de fazer obstrucionismo: mas deve dizer que a culpa de usar, por muito tempo, da palavra, é principalmente dos Srs. Deputados da maioria que, na melhor das intenções e com o maior dos patriotismos, arrematam a apresentação de projectos antes da ordem do dia para serem discutidos com prejuízo dos Deputados da oposição e cerceando-lhes as regalias.
Assim, êle, orador, precisa dizer ao Govêrno que a província do Algarve está ameaçada duma grave crise se o Govêrno continua a trazer para Lisboa todos os vapores de pesca, pois que as fábricas de conserva terão de fechar as suas portas; quere preveni-lo de muitas outras cousas e tudo isso lhe é impedido pela discussão de projectículos.
Não crê que o assunto em discussão seja tam necessário e tam importante que merecesse as honras de negócio urgente. E antiga a legislação que o regula e, apesar de todas as cautelas de que está rodeada, todos os dias aparecem trucs de certos figurões para a venda e arrematação de foros, por preços ínfimos. Se assim sucede com uma legislação acautelada, pior será indo entregar às câmaras municipais a arrematação dos foros sem as reservas que são para desejar.
É sempre perigoso, em sua opinião, alterar a lei antiga. Assim, se se passar em revista a legislação processoal ver-se há que as tombas e remendos que lhe tem deitado só servem para prejudicá-la, como sucedeu com a lei da Assistência Judiciária que, parecendo ter nivelado os pobres com os ricos perante os tribunais, na prática nada deu, e com a lei das pequenas dívidas que só é uma arma para chicana e nada mais.
O Sr. Presidente: - Pede ao orador que restrinja as suas considerações ao assunto em discussão.
O Orador: - Crê que o princípio estabelecido na legislação actual é incomparavelmente melhor do que o que se pretende estabelecer, e, referentemente ao § único do artigo 1.°, desejaria saber como se faz a avaliação dos bens, quem a faz e que conveniência há, para as câmaras municipais, em alienarem os seus bens cora 30 por cento de prejuízo.
O Sr. Presidente: - Adverte o orador de que faltam poucos minutos para se entrar na ordem do dia e reserva lhe a palavra.
O discurso será publicado na íntegra quando o orador restituir as notas taquigráficas.
O Sr. Ministro da Justiça (Mesquita Carvalho): - Sr. Presidente: requeiro a V. Exa. que consulte a Câmara sôbre se permite que entre imediatamente em discussão o parecer n.° 407.
Consultada a Câmara, foi aprovado o requerimento.
O Sr. Presidente: - Vai ler-se o parecer n.° 407.
Foi lido na Mesa. É o seguinte:
Parecer n.° 407
Senhores Deputados. - A vossa comissão de legislação civil e comercial, examinando o projecto de lei apresentado pelo Deputado Sr. Germano Martins, dá-lhe a sua aprovação. As atribuições que podem ser exercidas simultaneamente pelos notários e seus ajudantes, constantes dos
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n.ºs 2.° a 5.° do artigo 1.° da reforma do notariado são as de menor importância. Esta concessão representa uma vantagem para o público que assim não é obrigado a esperar que o notário termine um auto de aprovação de testamento ou uma escritura para fazer um reconhecimento ou autenticar qualquer documento. Êste projecto não dispensa o notário de estar no seu cartório, o que seria um abuso, porque só êle pode praticar as mais importantes funções notariais e fica sempre com as responsabilidades dos actos praticados pelos seus ajudantes.
A comissão aproveita a discussão dêste projecto para preencher uma omissão que se encontra na reforma do notariado.
O notário não pode intervir em actos notariais quando tiver com os interessados o parentesco consignado no n.° 3.° do artigo 36.° do regulamento de 14 de Setembro de 1900. Se há um único notário na sede da comarca e o interessado pelo seu estado de saúde se não pode transportar a um notariado próximo está impossibilitado de fazer qualquer contrato, testamento ou assinar algum documento que precise intervenção do notário. Para evitar êstes inconvenientes a comissão propõe o seguinte artigo novo:
Artigo . Quando na sede da comarca não houver outro notário a que se possa recorrer para o caso do n.° 3.° do artigo 36.° do regulamento do notariado de 14 de Setembro de 1900, os interessados poderão chamar um outro notário dentro da área da comarca ou de comarca limítrofe.
Sala das sessões da comissão de legislação civil e comercial, em 26 de Abril de 1916.- Sérgio Tarouca - Germano Martins - Abraão de Carvalho - Abílio Marçal- António Portugal - António Maria Pereira Júnior, relator.
Projecto de lei n.° 247-B
Senhores Deputados. - O projecto de lei que tenho a honra de apresentar satisfaz uma necessidade há muito reclamada.
Permite que os ajudantes dos notários pratiquem simultaneamente com êstes certos actos de menor importância, como sejam reconhecimentos, extracção de públicas-formas, etc.
É sabido como a redacção dum acto de aprovação de testamento, a leitura duma escritura pública e muitos outros actos notariais, desviam a atenção do notário e não lhe permitem durante êsse tempo desempenhar outras funções que o regulamento de 14 de Setembro de 1900 lhes atribui. Daqui resulta o inconveniente de obrigar os interessados a perdas de tempo, que o presente projecto procura evitar.
Os actos de maior responsabilidade,, como são os do n.° 1.° e alguns do n.° 6.°, do artigo 1.°, do decreto de 14 de Setembro de 1900, continuam a ser exclusivamente desempenhados pelos notários, nos termos da legislação em vigor e quanto aos outros de menor importância, mais uma vez se frisa que a responsabilidade dos notários por qualquer falta é solidária com a dos ajudantes.
Parece-nos, por esta razão, digno da vossa aprovação o seguinte projecto de lei:
Artigo único. Os ajudantes dos notários poderão simultaneamente com êstes exercer as atribuições designadas em os n.ºs 2.°, 3.°, 4.° e 5.° do artigo 1.° do decreto de 14 de Setembro de 1900.
§ único. Os notários serão sempre solidariamente responsáveis pelos actos praticados pelos seus ajudantes.
Sala das sessões da Câmara dos Deputados, em 25 de Janeiro de 1916. - O Deputado, Germano Martins.
Foi aprovado, na generalidade e na especialidade, sem discussão.
O Sr. Germano Martins: - Requeiro a dispensa da leitura da última redacção. Consultada a Câmara, foi dispensada.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Colónias (António José de Almeida): - Sr. Presidente: mando para a Mesa uma proposta de lei, para a qual requeiro a urgência.
É a seguinte:
Artigo 1.° O secretário da Junta Central de Trabalho e Emigração, a que se refere o artigo 17.° do decreto n.° 951, de 14 de Outubro de 1914, tem direito à gratificação mensal de 15$ por conta da província de S. Tomé e Príncipe, em cujo orçamento será inscrita a respectiva verba.
§ único. Essa gratificação será desde a data da nomeação do actual secretário,
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saindo do depósito da mesma província emquanto não estiver orçamentada.
Art. 2.° É revogada a legislação em contrário.- O Ministro das Colónias, António José de Almeida.
O Sr. Jaime Cortesão (em negócio urgente): - Sr. Presidente: há uma semana que eu venho pedindo a palavra para quando esteja presente o Sr. Ministro das Colónias, porque desejava chamar a atenção de S. Exa. dará um caso que reputo da maior gravidade, e se só nesta altura da sessão o faço, é devido à circunstância da parte antes da ordem do dia, que é quando se devem tratar êstes assuntos, ter sido ocupada com a discussão de pareceres.
O caso é o seguinte: o director dos serviços agrícolas de S. Tomé começou há tempos a sofrer uma perseguição na imprensa daquela província, pelo que requereu uma sindicância aos seus actos. Essa sindicância foi efectivamente instaurada, mas a certa altura o governador interino faz parar a sindicância e suspendeu êsse funcionário do exercício das suas funções e respectivos vencimentos.
Ora, isto parece-me uma grande violência, porquanto não compreendo que assim se proceda para com um funcionário que deseja que todos os seus actos sejam amplamente examinados.
Como esclarecimento, devo dizer ao Sr. Ministro das Colónias que o funcionário de que se trata se chama Armando Cortesão e é meu irmão, mas julgo que êsse facto não me impede de reclamar que justiça seja feita.
Peço, pois, providências.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Colónias (António José de Almeida):- Tomo em toda a consideração as palavras do Sr. Jaime Cortesão e vou informar-me do que há a êsse respeito. No emtanto, devo desde já dizer a S. Exa. que se houve, relativamente a êsse funcionário, qualquer espécie de violência, ela será convenientemente punida pelo Ministério das Colónias, porque se é certo que as branduras são condenáveis para quem prevarica, tambêm é certo que as violências o são, quando não sejam justificadas.
S. Exa. não reviu.
O Sr. Almeida Ribeiro: - Sr. Presidente: aproveitando a ocasião de estar presente o Sr. Ministro da Justiça, requeiro a V. Exa. que consulte a Câmara sôbre se permite que entre imediatamente em discussão o parecer n.° 475, com o que concorda perfeitamente S. Exa. o Ministro.
Consultada a Câmara, foi aprovado o requerimento.
O Sr. Presidente: - Vai ler-se o parecer n.° 470.
O Sr. Almeida Ribeiro: - Requeiro a dispensa da leitura.
Consultada a Câmara, foi dispensada a leitura, entrando em discussão.
É o seguinte:
Parecer n.° 475
Senhores Deputados.- A vossa comissão de legislação civil e comercial concorda com o projecto n.° 464-B, da iniciativa do ilustre Deputado Sr. Almeida Ribeiro e dá-lhe a sua plena aprovação.
A vossa comissão considera êste projecto como indispensável para acautelar e garantir devidamente os legítimos direitos do Estado em relação aos bens cuja pertença e propriedade lhe fui atribuída pelo disposto no artigo 62.° e seguintes do decreto com fôrça de lei de 20 de Abril de 1911.
Casos tem havido, e não pouco frequentes, em que entidades individuais e colectivas, deixando de recorrer ao processo da reclamação graciosa perante o Ministério Público, preceituado nos artigos 7.° e seguintes do decreto de 31 de Dezembro de 1910, recorreram ao sofisma de invocar em juízo a posse dêsses bens para continuarem a mante-los em seu poder, procurando assim, por meios indirectos e disfarçados, assegurar sôbre êles um direito de propriedade que não tem. E o que é certo é que os tribunais, talvez pelas contingências e erros de facto a que está sujeita a prova testemunhal, tem mantido, por vezes, essas entidades na posse dos referidos bens com manifesto prejuízo dos direitos do Estado e em manifesta contradição com o espírito da lei, que considera essas entidades como meros detentores daqueles bens e apenas senhores duma fruição precária e sem o menor direito de domínio; necessário se torna, pois, pôr termo a sofismas e fazer respeitar a lei não só na sua letra
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expressa como na sua intenção, fazendo entrar na posse e domínio do Estado aquilo que por direito e por lei lhe pertence. E ao mesmo tempo que se garantem os interêsses do Estado não se esquecem os legítimos direitos dos particulares ou entidades colectivas sôbre bens que tenham sido arrolados ou inventariados em virtude do artigo 62.° da Lei de Separação, porque se lhes garante um novo prazo, de 60 dias, para as reclamações a que se refere o artigo 7.° do decreto de 31 de Dezembro de 1910 quando ate agora tenham recorrido ás acções possessórias sem terem cumprido esta última disposição.
Sala das comissões, em 13 de Maio de 1916. - Barbosa de Magalhães, presidente - Germano Martins - Pereira Júnior (vencido) - Sérgio Tarouca - Abílio Marçal - Abraão de Carvalho, relator.
Projecto de lei n.° 464-B
Senhores Deputados. - O decreto de 20 de Abril de 1911, afirmando nitidamente a propriedade do Estado sôbre os bens até então destinados ao culto ou à sustentação dos respectivos ministros e serventuários, consignou doutrina que, inteiramente conforme aos princípios e normas do direito público nacional, havia orientado numerosos textos das nossas leis e inúmeras decisões dos nossos tribunais, no sentido de aos detentores dêsses bens pertencer apenas a sua precária fruição, excluído absolutamente o domínio, de que muitos nem mesmo seriam reputados susceptíveis por se encontrarem fora do comércio.
Mas se até a publicação do decreto o reconhecimento dessa doutrina nunca encontrou na prática contestações de valor, porque os possíveis interessados em as formular tinham assegurados indefinidamente todos os cómodos e lucros da posse material dos bens das igrejas, o mesmo não sucedeu depois.
A medida que o regime da separação se foi efectivando, a contestação dos direitos do Estado tornou-se mais e mais frequente e, se a clara e directa negação dêles deveria ser quási sempre improfícua, em face das terminantes disposições da nova lei, o mesmo não sucederia com a oposição dissimulada e indirecta, representada pelo ataque, não ao direito de propriedade, mas à posse do Estado, ataque ao qual a conhecida maleabilidade e as usuais deficiências de prova por testemunhas, feita nos tribunais de justiça, assegurou já, por vezes, condições de êxito que só a enganosa aparência conseguia justificar.
O presente projecto visa precisamente,, se não a evitar, pelo menos a atenuar os prejuízos que aos incontestáveis interessem do Estado tem causado, e pode continuar a causar, o uso de expedientes que é, urgente acautelar.
E para que com as medidas propostas nenhum legítimo direito de corporações ou. indivíduos particulares possa sofrer qualquer diminuição, ou ser definitivamente tolhido no seu justo reconhecimento, acrescenta-se-lhes a concessão dum novo prazo de reclamações para todos quantos, tendo usado de meios possessórios, pretendam, no futuro, tornar efectivos quaisquer direitos por meio da acção de propriedade.
Tais são as principais razões pelas quais tenho a honra de submeter á vossa apreciação o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° Nenhuma acção ou execução poderá ser proposta nos tribunais ordinários acêrca de bens inventariados em obediência ao preceituado nos artigos 62.° e seguintes da Lei da Separação, e antes de alienados ou desamortizados,, nos termos das leis em vigor, sem que se mostre cumprido o disposto nos artigos 7.° e seguintes do decreto com fôrça de lei de 31 de Dezembro de 1910.
Art. 2.° Com referência aos mesmos bens, antes de alienados os desamortizados, nos termos das leis em vigor, não serão admitidas justificações de mera posse, nem o emprego de quaisquer outros meios possessórios.
Art. 3.° A posse dos mesmos bens, judicialmente conferida até a data em que começar a vigorar a presente lei, por título que não fôsse o de sentença transitada em julgado, não obsta a que sejam inteiramente cumpridas as determinações da Lei da Separação e diplomas complementares, quanto à guarda, administração e destino ulterior dos ditos bens.
§ único. A posse conferida em execução de sentença proferida em acção possessória não obsta à reivindicação da propriedade pelo Estado, quando êste a ela tiver direito.
Art. 4.° É concedido novo prazo de sessenta dias, a contar da publicação desta.
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lei, para as reclamações autorizadas pelos artigos 78.° e 80.° da Lei da Separação, por parte de entidades individuais ou colectivas, incluindo as irmandades ou outras corporações administrativas, quando até agora tenham recorrido aos meios judiciais, sem a devida observância do artigo 7.° do decreto do 31 de Dezembro de 1910.
Art. 5.° Fica revogada a legislação em contrário.
Congresso da República, em 11 de Maio de 1916.- O Deputado, Artur R. de Almeida Ribeiro.
Foi aprovado, sem discussão, na generalidade.
Entrou em discussão na especialidade.
Foi lido na Mesa o artigo 1.°
O Sr. Ministro da Justiça (Mesquita Carvalho): - Sr. Presidente: mando para a Mesa uma proposta, simplesmente de redacção.
Proposta
Artigo 1.° Acêrca dos bens inventariados em obediência ao preceituado nos artigos 62.° e seguintes da Lei da Separação do Estado das Igrejas, e antes de alienados ou desamortizados, nos termos das leis em vigor, nenhuma execução poderá ser proposta nos tribunais ordinários em que se mostre cumprido o disposto nos artigos 7.° e seguintes do decreto com fôrça de lei de 31 de Dezembro de 1910. - O Ministro da Justiça, Mesquita Carvalho.
Lida na Mesa, foi admitida e aprovada, sem discussão.
Foi lido na Mesa o artigo 2.°, sendo aprovado sem discussão.
Foi lido na Mesa o artigo 3.°
O Sr. Ministro da Justiça (Mesquita Carvalho): - Mando para a Mesa uma proposta suprimindo o § único, por ser juridicamente desnecessário.
Foi admitida e seguidamente aprovada, bem como o artigo.
Entra em discussão o artigo 4.°
O Sr. Ministro da Justiça (Mesquita Carvalho): - Manda para a Mesa a seguinte
Proposta
Emenda ao artigo 4.°, acrescentar: "§ único. As acções pendentes em primeira instância, intentadas nos termos
previstos neste artigo, serão julgadas nulas de harmonia com o disposto no artigo 283.° do Código de Processo Civil." - O Ministro da Justiça, Mesquita Carvalho.
Foi admitida e depois aprovada, e bem assim os artigos 4.° e 5° sem discussão.
O Sr. Artur Costa: - Requeiro a dispensa da leitura da última redacção.
Foi dispensada.
O Sr. Presidente: - O Sr. Presidente do Ministério enviou para a Mesa uma proposta de lei sôbre a criação do lugar de secretário da junta de emigração e para a qual requereu a urgência. Consulta a Câmara sôbre se concede a urgência requerida.
Fui concedida a urgência.
O Sr. Presidente: - Vai entrar-se na ordem do dia. Os Srs. Deputados que tenham papéis para enviar para a Mesa podem fazê-lo.
ORDEM DO DIA
Discussão do orçamento do Ministério das Finanças
O Sr. Lopes Cardoso: - Requeiro a prorrogação da sessão até se votarem os orçamentos dados em ordem do dia, mas não podendo a sessão ir alêm da uma hora da madrugada.
Foi aprovado.
O Sr. Ministro das Finanças (Afonso Costa): - Mando para a Mesa uma proposta de lei para ser discutida juntamente com o orçamento do Ministério das Finanças e para a qual peco a urgência e dispensa do Regimento.
Esta proposta refere-se á autorização ao Poder Executivo para realizar empréstimos e outras operações de crédito, que não sejam de dívida flutuante, em virtude do estado de guerra, e segundo as condições enumeradas na proposta e que V. Exa. mandará ler na Mesa segundo o Regimento.
Foi aprovada a urgência e dispensa do Regimento.
Leu-se na Mesa a proposta. É a seguinte:
Proposta de lei
Artigo 1.° É autorizado o Poder Executivo a realizar empréstimos e outras
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operações de crédito, que não sejam de divida flutuante, desde que derivem do estado de guerra e se subordinem às seguintes condições gerais:
1.ª Os diversos empréstimos e operações de crédito serão sucessivamente realizados, em dinheiro português ou em ouro, não podendo o seu produto total exceder a soma das despesas excepcionais de guerra de 1914-1915, 1915-1916 e 1916-1917.
2.ª Os empréstimos e operações serão contratados por períodos nunca excedentes a cinquenta anos.
3.ª O encargo total efectivo, compreendendo juro, amortização e quaisquer comissões, não excederá 6 por cento ao ano.
4.ª Só qualquer empréstimo ou operação tiver regime especial, nunca as suas garantias poderão prejudicar ou exceder as das actuais dívidas do Estado.
5.ª Pelo produto dos empréstimos e operações poderá o Govêrno reembolsar, nos seus vencimentos ou por antecipação, as operações de dívida flutuante anteriormente realizadas para pagamento de despesas excepcionais de guerra.
Art. 2.° É tambêm o Poder Executivo autorizado a aplicar ao pagamento de dívida flutuante, o produto dos títulos da dívida fundada interna, que resolva emitir nos termos do artigo 17.° da lei de 9 de Setembro de 1908, em consequência de se reconhecer haver deficits nas gerências de 1914-1915 e seguintes, diminuindo-se nesse caso da importância correspondente o limite indicado para o total dos empréstimos e operações na condição 1.ª do artigo anterior.
Art. 3.° A mobilização dos títulos da dívida fundada interna a que se refere o artigo 2.° será operada por intermédio da Caixa Geral de Depósitos.
Art. 4.° Fica revogada a legislação em contrário.
Sala das Sessões da Câmara dos Deputados, em 17 de Maio de 1916.- O Ministro das Finanças, Afonso Costa.
Foi admitida, entrando em discussão com o capítulo 1.°
O Sr. António Macieira: - Mal parecerá que não sendo especialista em cousas financeiras, use da palavra naquela altura, o que faz apenas com o propósito de ser esclarecido, bem como a Câmara, pelo Sr. Ministro das Finanças.
Afigura-se-lhe que seria deprimente para o próprio Parlamento que uma proposta de lei tam importante como aquela que acaba de ser apresentada pudesse passar sem a menor sombra, não de reparo, mas de discussão ou, pelo menos, de esclarecimento. O Poder Executivo está sendo investido de poderes, os mais latitúdinários, para poder exercer a sua acção, que até certo ponto se explicam por virtude da situação excepcional que o pais está atravessando, se bem que possa discutir-se se seria melhor que, em circunstâncias excepcionais, o Parlamento fôsse chamado a conceder uma medida de carácter tambêm excepcional, dada a confiança que o Parlamento e o país depositam no Govêrno.
Tratando-se, entretanto, de conceder ao Poder Executivo uma autorização para poder contrair um empréstimo, cujo período não vá alêm de cinquenta anos, com juros e amortizações não excedente a 6 por cento, e falando-se em garantias, entende ser inteiramente indispensável que alguns esclarecimentos se prestem.
Desejaria saber se o Govêrno tem conversações encetadas no sentido de qualquer empréstimo ou se a proposta prevê apenas uma possível hipótese; e quando o Govêrno tenha ou não essas conversações encetadas, onde é que essas garantias poderão ser levadas.
O Estado Português encontra se hoje em circunstâncias de poder fazer os seus empréstimos sem nenhuma espécie de garantias ou, antes, com aquela única garantia que provêm do próprio crédito, que é a base fundamental de todas as relações comerciais e de carácter financeiro. Espera, pois que o Sr. Ministro das Finanças dê êsses esclarecimentos.
O discurso será publicado na íntegra quando o orador restituir as notas taquigráficas.
O Sr. Ministro das Finanças (Afonso Costa): - Parece-lhe que jamais se apresentou no Parlamento uma proposta para empréstimo de dívida fundada consolidada com maior clareza, com explicações mais perfeitas das suas condições, do que aquela que teve a honra de apresentar.
A Constituição dá inteira liberdade ao Poder Executivo para contratar operações de dívida flutuante, inteiramente sem limi-
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tes, quer em relação ao quantitativo, quer em relação aos encargos, mas deixa dependente do Parlamento, nos termos do n.° 4.° do artigo 26.°, a aprovação prévia das condições gerais em que deve fazer-se o empréstimo e outras operações de crédito. É certo que o Govêrno tem, desde 14 de Março, uma autorização do Poder Legislativo para tudo que fôr preciso realizar por causa do estado de guerra resultante da declaração que nos fez a Alemanha três dias antes.
Evidentemente que se não pode fazer uma guerra sem dinheiro, que é o nervo dela, de sorte que sendo preciso fazer despesas excepcionais por motivo da guerra, era fatalmente necessário recorrer a lançamento de impostos, que, em parte alguma do mundo, nunca chegaram a cobrir essas despesas, ou recorrer a empréstimos; e desde que o Parlamento tinha dado todas as autorizações necessárias para o fazer, desde logo declarou, no emtanto, que era propósito do Govêrno pedir o seu assentimento, relativamente a empréstimos, porque se jurídica ou constitucionalmente não era essencial, era o no sentido da perfeita solidariedade que deve estabelecer-se entre a nação e o Poder Executivo, entre a nação e aqueles que tem a seu cargo presidir aos seus destinos no momento em que existe a guerra, e o Parlamento é aquele que pode estabelecer a nossa ligação entre o Govêrno e o povo, ligação que é a única legítima.
Ora, o empréstimo não deve ir alêm de cinquenta anos, por se tratar duma despesa excepcional de guerra, sendo princípio de direito financeiro que os encargos da guerra devem ser suportados, quanto possível, pelas gerações actual e seguinte. Sabe que em outros países os empréstimos de guerra tem sido perpétuos, outros de dívida flutuante e, ainda outros, de sistema mixto.
Em Portugal devem êsses empréstimos fazer-se por períodos limitados, trazendo--se até para menos de cinquenta anos. Os juros são, em geral, de 2 ou 3 por cento, mas, desde que envolvem a amortização, o juro tem de ser maior.
Num empréstimo em Portugal, a taxa de juro e amortização, com as comissões incluídas, não exceder 6 por cento do produto efectivo do empréstimo recebido pelo Tesouro Público, constitui uma novidade.
Não há nada na história financeira portuguesa que se lhe assemelhe.
Neste momento, em países estrangeiros, não se faz empréstimo algum em que as taxas, incluindo a comissão e amortização, não sejam superiores a 6 por cento; sucede isso em países ricos e fortes, como a França e a Inglaterra.
Pelas condições de vida financeira, social, política e internacional que, no actual momento, tem a República Portuguesa, quere, o orador, ter a esperança de que as operações de crédito que se realizarem à sombra daquela autorização são feitas dentro dos moldes propostos.
Fala se na proposta em garantias, por que todos os empréstimos externos tem sido feitos por garantias; as operações financeiras a realizar são mais ou menos extensas, e pode bem suceder que qualquer dos empréstimos feitos interna ou externamente tenham condições mais difíceis, sendo internos ou vice-versa. No emtanto, compreende-se que se tem de manter a situação dos actuais credores do Estado sem lhes diminuir as garantias. O Estado é uma pessoa honesta, e o Estado português tem timbre de o ser desde 5 de Outubro de 1910.
A declaração feita na condição 4.ª é só destinada a essa segurança absoluta oferecida por esta lei á acção do Poder Executivo em relação aos empréstimos efectuados por causa da guerra.
Declara, a seguir, que o Govêrno anterior ao actual realizou diversas operações financeiras, de toda a simplicidade, pelos meios legais ordinários.
Em 1913, quando êle, orador, teve a honra de presidir a um Ministério, teve oportunidade de pagar a nossa dívida flutuante externa e de fazer um grande saneamento na administração, na parte relativa ao crédito público. Encontrou o benefício dessa obra, que foi continuada por dois governos imediatos, pois não tem havido, relativamente ao crédito do Estado, nenhuma dificuldade. Hoje, não há um único cidadão português, nem ninguêm no estrangeiro que conheça a nossa administração, que não possua plena, completa e absoluta confiança no Estado.
Houve necessidade de fazer uma operação importante.
O nosso país encontrando se aliado dum outro em guerra, e caminhando necessá-
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riamente para a guerra, marcha que era lógica, fatal e determinada pelas próprias condições da vida do nosso país, - Portugal, teve que intensificar a sua preparação militar, o que se devia ter feito sem ter aparecido a conflagração europeia; essa preparação teve base numa organização decretada pelo Govêrno Provisório e ela não devia ter parado, pois todos se deviam ter juntado para a exigir; houve, porêm quem dissesse que não convinha, que não valia a pena gastar dinheiro com o exército; e num período fatal da história política portuguesa, destruíu-se e inutilizou-se o que estava feito. Horas sombrias, que já lá vão! Na mesma ocasião em que tivemos um péssimo ano de ditadura, tivemos um mau ano cerealífero, e houve necessidade, para suprir o déficit enorme de trigo, de comprar cêrca de 200 milhões de quilogramas, com a agravante de ser adquirido a um preço de mais de $13(5) e de o Govêrno ter de entregá-lo à moagem, por uma lei votada no Congresso, a $08(89), ou seja com um prejuízo de perto de &04 por quilograma. Isto acarreta um grande déficit na nossa gerência e obriga-nos a arranjar ouro para pagar no estrangeiro essa compra feita. Foi por isso necessário realizar uma operação financeira de mera dívida flutuante no Banco de Inglaterra, que se fez em condições absolutamente honrosas, satisfatórias, com uma pleníssima confiança na nossa administração por parte daquele Banco, de vantagem para o saneamento da nossa administração interna e de abertura dum período de entendimento entre os bons financeiros ingleses e a nossa vida financeira. Essa operação foi na importância de 2.000:000 libras esterlinas, sem caução alguma e só com a simples assinatura dum delegado do Ministro das Finanças e do Director Geral da Fazenda Pública, operação destinada não só a pagar a compra do trigo, mas o material de guerra adquirido. Explica, a seguir, o alcance das condições da proposta, acentuando que a operação a que se referiu pode ser renovada sucessivamente por períodos de um ano, até um ano depois de terminada a guerra, e que o Estado precisa de estar preparado para realizar o pagamento dos títulos da divida flutuante.
Refere se, ainda, às corridas que houve em outros países, quando das declarações de guerra, pondo em relevo o que se deu em Portugal, onde não houve perturbação nenhuma, a não ser nas divisas cambiais, que a pouco e pouco vão retomando a normalidade. Em seu entender, um Ministro das Finanças deve encarar todas as hipóteses, e pregunta: - porque não há-de admitir-se a hipótese de se fazer uma operação se vale a pena pagar em dinheiro de contado uma parte da dívida flutuante? - porque não deve admitir-se a hipótese de se entregar ao Banco de Portugal as quantias necessárias para se reduzir a circulação fiduciária a 90 ou 100 mil contos?
Faz ainda algumas considerações sôbre a proposta de lei e termina declarando estar convencido de que o Parlamento dará completa confirmativa da autorização de Março de 1916, para não hesitarmos no cumprimento de deveres de aliado, que são obrigações de país em guerra e que são utilidades duma nação que quere viver e caminhar.
O discurso será publicado na integra guando o orador restituir as notas taquigráficas.
O Sr. Jorge Nunes: - Sr. Presidenta: pedi a palavra na ocasião em que o Sr. Ministro das Finanças requereu a urgência e a dispensa do Regimento para a proposta de lei em discussão, porque carecia saber se era respeitada a Constituição; mas desde que S. Exa., não se servindo de autorizações, mas baseando-se no n.° 4.° do artigo 26.° daquele diploma, veio à Câmara não só pedir autorização para realizar uma operação financeira, mas, apresentar as bases para a mesma Câmara discutir, desisto de falar.
O orador não reviu.
O Sr. Lopes Cardoso: - Por parte da comissão de redacção mando para a Mesa as últimas redacções dos orçamentos do Ministério do Trabalho e dos serviços autónomos para os quais peço dispensa da leitura.
Foi dispensada.
O Sr. António Macieira: - Congratula-se com as declarações do Sr. Ministro das finanças porque, como disse, seria desprestigiante para a República que uma proposta de lei da monta daquela passasse sem o menor reparo. Desceu S. Exa. a
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considerações de carácter geral fundamentalmente importantes para a vida nacional, o que lhe apraz registar naquele momento, para a tranquilidade de muitos e para conhecimento perfeito doutros.
Sabe que as circunstâncias do Tesouro são inteiramente diversas daquelas em que a monarquia vivia, e que essa dignificação moral, êsse levantamento de crédito, é devido exclusivamente à obra republicana, para a qual manifestamente concorreram muitas pessoas, mas em que o Sr. Dr. Afonso Costa marcou um lugar saliente e notável, e digno da gratidão da Nação Portuguesa. Deve acentuar uma passagem eloquente do discurso de S. Exa., quando disse que era necessário prepararmo-nos para a guerra, que era a marcha necessária. Desde que a Inglaterra, indo ao encontro da defesa legítima de moral internacional, defendeu a neutralidade da Bélgica, invadida por aquela mesma Nação que a garantira pela aposição da sua assinatura; desde a primeira hora em que a Franca se não viu isolada, mercê, e bem haja, da arrogância pangermanista, desde que a Inglaterra foi obrigada a tomar o campo da luta: êste debate só eleva o Parlamento. Portugal, jamais podia ficar indiferente a essa acção e, mais tarde ou mais cedo, tinha que ligar-se aos destinos morais e materiais dêsse povo, pois devia entrar na guerra quer quisesse, quer não quisesse. Está ansioso por ouvir as declarações do Govêrno sôbre umas interpelações que já foram anunciadas. É indispensável que os deputados portugueses soergam bem alto dos seus ombros a responsabilidade que sôbre êles querem fazer impender de que deixam passar cora a maior indiferença qualquer acto sem ser lógicamente esclarecido.
O Parlamento não pode dar uma demonstração de indiferença na questão da nossa participação na guerra. Tem de se ocupar dêsse assunto. O orador promete tambêm tratar dêle, com o intuito de ser esclarecido, porque é patriota. Quanto ao empréstimo, desejaria que se realizasse sem garantias. Fala-se na proposta em garantias. A sua aspiração é que isso não acontecesse, porque elas sempre excitam as cabeças dos contratadores. A moralidade na nossa administração pública dá-nos o direito de não se exigirem garantias, que são sempre vexatórias.
Regista a declaração do Sr. Ministro, de que, se fossem exigidos encargos mais onerosos do que os autorizados pelo Congresso, o Govêrno pediria a convocação do Parlamento para dizer da sua justiça e resolver, e agradece a resposta dada às observações que fez.
O discurso será publicado na integra quando o orador restituir as notas taquigráficas.
O Sr. José Barbosa: - Declara que aprova a proposta de lei, autorizando o Govêrno a realizar sucessivos empréstimos. A forma como são feitas as operações é hábil. O encargo de 6 por cento é certamente dos mais favoráveis, tanto mais que a Inglaterra realizou ha pouco empréstimos cujos encargos foram de 5,75 por cento. Isto mostra a confiança que existe no crédito do pais e na administração pública.
O encargo total efectivo de 6 por cento constituiu, pois, uma agradável surpresa para o orador.
A condição 3.ª sugere ao seu espírito a convicção de que o empréstimo que se vai contrair se destina à consolidação da dívida flutuante. Se assim é, representa uma boa medida, porque esta divida é perigosa.
O portador da dívida flutuante fácilmente troca o seu título por outro da dívida consolidada. De resto, é sempre fácil fazer-se o que se não pode deixar de fazer.
Entende que se deve fazer a conversão da dívida flutuante. Agora é fácil obter dinheiro no mercado, porque não há onde empregar os capitais. A cotação de 37,80 que tem os nossos títulos há-de baixar. Nestas condições, supõe ser uma boa medida fazer-se a conversão da divida nesse momento.
Numa das condições da proposta de lei fala-se na possibilidade de haver um regime especial de garantias. Pregunta se daremos garantias superiores às que são recebidas pelos nossos credores externos. Essas garantias não podem ser excedidas. Demos então o máximo.
A nossa circulação fiduciária atingiu 118:000 contos. Não considera um mal uma elevada circulação fiduciária, como alguns pretendem. Em França tambêm é
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grande a circulação fiduciária. Cada Câmara de Comércio pode emitir notas do valor de 1 franco. A circulação fiduciária no Estado francês vai atingir o terceiro bilião. Bem sabe que deve existir uma reserva metálica, para garantir essa circulação, mas ninguêm, neste momento, pensa que essa reserva possa garantir a importância que atinge a circulação fiduciária francesa. Nem mesmo na Inglaterra, em que a reserva metálica correspondente à emissão é elevada, se pensa na possibilidade de ser convertível toda a sua circulação fiduciária. A moeda é boa quando existe confiança nela. Em Portugal há absoluta confiança na moeda que temos. Ela é excelente, e tam excelente que 35:000 contos constituem o pé de meia.
Se o Sr. Ministro das Finanças pudesse chamar à circulação êsse capital imóvel era bom, mas não pode. Não há energia que nos possa fazer sair da rotina neste assunto.
Existem muitas notas guardadas nos corres particulares. Isto mostra que a nossa moeda continua valorizada convenientemente. O meio circulante não é excessivo, porque não temos nenhum dos sucedâneos da moeda, nenhum instrumento de crédito, como acontece noutros países que tem o cheque e outros instrumentos. Por conseguinte podemos elevar o limite da circulação fiduciária, se isso fôr preciso, para ocorrer aos encargos do Estado.
Entende que o comércio está numa situação crítica, porquanto, tendo esgotado os stocks das suas mercadorias, tem de adquirir novos stocks por preços elevadíssimos. Ora, quando acabar o estado anormal em que nos encontramos e se normalizar a produção, o valor das mercadorias há-de baixar. Então aqueles que adquiriram mercadorias por preços elevados sofrem a ruína. Muitos que se imaginam enriquecidos podem, dum momento para o outro, ver-se a braços com sérias dificuldades.
Nestas circunstâncias, muitas encomendas não são satisfeitas, por se terem esgotado os stocks e os comerciantes não quererem adquirir outros.
Entende que o Congresso devia continuar aberto, para discutir as propostas de fazenda que o Sr. Ministro das Finanças, tem de apresentar, a fim de obter os recursos para fazer face aos novos encargos que vamos contrair.
O discurso será publicado na integra quando o orador restituir as notas taquigráficas.
O Sr. Presidente: - Interrompo a sessão até as 21 horas e 30 minutos.
Eram 18 horas e 45 minutos.
As 21 horas e 55 minutos reabriu a sessão.
O Sr. Henrique de Vasconcelos: - Requeiro que V. Exa. consulte a Câmara sôbre se permite a dispensa do Sr. Ministro das Finanças para a discussão do orçamento dêsse Ministério.
O Sr. Presidente: - O Sr. Ministro das Finanças incumbiu-me de comunicar à Câmara que a discussão da proposta de lei, que S. Exa. apresentou hoje, prosseguira na sessão de amanhã, e que para a discussão do orçamento seria S. Exa. representado pelo Sr. relator.
O Sr. Constâncio de Oliveira: - Peço a V. Exa. para ficar inscrito para quando esteja presente o Sr. Ministro das Finanças, pois é justamente a sua proposta de lei que desejo discutir.
O Sr. Presidente: - Está em discussão o capítulo 1.° do orçamento do Ministério das Finanças.
Foram aprovados os artigos 1.° a 8.° e não havendo quem se inscrevesse sôbre os capítulos 2.° e 3.° foram igualmente aprovados os artigos 9° a 19.°
O Sr. Correia Herédia (Ribeira Brava) (em negócio urgente): - Peço a atenção do Sr. Ministro do Fomento, a fim de que S. Exa. comunique ao seu colega do Interior, para um telegrama que acabo de receber da Ilha da Madeira, pedindo que faça desmentir diplomáticamente o boato de estarem as águas dessa ilha invadidas por submarinos inimigos, pois que o afastamento da navegação, a que êsse boato dá lugar, coloca na situação desesperada algumas classes, especialmente a classe marítima.
Recebi tambêm o seguinte oficio:
Leu.
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Peço ao Govêrno que tome providências sôbre o assunto porque a situação de miséria em que se encontra o povo da ilha é verdadeiramente alarmante.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro do Fomento (Fernandes Costa): - Devo declarar, quanto ao primeiro assunto a que se referiu o ilustre Deputado, que o Govêrno não tem informação, nem há indícios de haver submarinos nas águas dos Açores.
Quanto ao segundo assunto comunicarei ao Sr. Ministro do Interior as considerações de S. Exa.
Foi aprovado o capítulo 4.° do orçamento e entrou em discussão o capítulo 5.°
O Sr. Constâncio de Oliveira: - Sr. Presidente pedi a palavra para insistir numa proposta que o ano passado apresentei para que no capítulo õ.°, artigo 21.° - Subsídios certos - se elimine a importância de 4.200$ a entregar à Câmara Municipal de Lisboa, nos termos do decreto de 18 de Fevereiro de 1914 e para que no artigo 22.° - Subsídios variáveis - se inclua a importância que consta do orçamento das receitas, proveniente do imposto sanitário e das carnes.
Sinto bastante que não esteja presente o Sr. Ministro das Finanças, porque o ano passado, quando tive ocasião de apresentar esta proposta, foi o Sr Ernesto de Vilhena, que era então, como hoje, relator, que, de acôrdo com o Sr. Levy Marques da Costa, fez com que fôsse incluída no orçamento a importância de 4 200$.
Mando para a Mesa a seguinte proposta:
Proposta
Proponho:
Que no capítulo 5.°, artigo 21.° - Subsídios certos - se elimine a importância de 4.200$ a entregar à Câmara de Lisboa, nos termos do decreto de 18 de Fevereiro de 1914;
Que no artigo 22.° - Subsídios variáveis- se inclua a importância que consta do orçamento das receitas, proveniente do imposto sanitário e das carnes.- Constâncio de Oliveira.
Foi admitida.
O Sr. Ernesto de Vilhena (relator): - Sinto não ter outros argumentos para responder ao Sr. Constâncio de Oliveira, alêm daqueles que apresentei no ano findo.
Nestes termos, a comissão do orçamento continua, com bastante pena sua, a não poder dar o seu apoio à proposta do ilustre Deputado.
Foi rejeitada a proposta do Sr. Constâncio de Oliveira.
Foram aprovados os artigos 21.°, 22.°, 23.°, 24.º, 25.º, 26.°. 27°, 28.°, 29.°, 29.°-A, 29.°-B, 29.°-C e 29.°-D) com as emendas do parecer ao capítulo 6.°
Foi aprovado sem discussão o capítulo 7.°
O Sr. Presidente: - Está em discussão o capítulo 8.°.
O Sr. Ernesto de Vilhena: - Sr. Presidente: mando para a Mesa uma proposta com alterações, que resultam de disposições legais promulgadas posteriormente á apresentação da proposta orçamental do Ministério das Finanças.
O Sr. Presidente: - Vai ler-se a proposta mandada para a Mesa pelo Sr. Ernesto de Vilhena.
Foi lida na Mesa. É a seguinte:
Proposta
Proponho que ao capítulo 8.° do orçamento do Ministério das Finanças sejam feitas as seguintes alterações:
Artigo 31.° Pessoal do quadro da Secretaria Geral e da Direcção Geral da Fazenda Pública: aumentar: pela elevação à 1.ª classe de juiz auditor dêste Ministério (despacho de 11 de Março último, publicado no Diário do Govêrno n.° 75, 2.ª série, de 30 do mesmo mês) a quantia de 100$;
Art. 34.° Pessoal de administração e jornaleiro (dos palácios do Estado):
Aumentar a verba respectiva com o vencimento dum funcionário em disponibilidade (falecido em 28 de Março último) nos termos do § único do artigo 5.° do decreto n.° 1052, de 17 de Novembro de 1914, na importância de 72$;
Art. 35.° Pessoal em disponibilidade (dos palácios do Estado):
Diminuir na verba respectiva, nos termos da legislação citada no artigo 34.°, a importância de 72$ com que o aludido artigo foi reforçado.
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Art. 35.°-A Eliminar a verba de 13.365$ por desnecessária.
Art. 37.° Material e diversas despesas: despesas gerais do Ministério;
Aumentar a verba destinada a iluminação, aquecimento, água, limpeza e lavagem das repartições, reparações e aquisição de material, pequenas reparações e melhoramentos nos edifícios, automóvel, despesas eventuais o imprevistas, com a quantia de 2.500$.- Ernesto de Vilhena.
Foi admitida e aprovada juntamente com os artigos 31.°, 32.°, 33.°, 34.º, 35.°, 35.º-A, 36.° e 37.º
O Sr. Presidente: - Está em discussão o capítulo 9.°
O Sr. Ernesto de Vilhena: - Mando para a Mesa uma proposta relativa ao artigo 38.°
Proposta
Proponho que â verba descrita no artigo 38.°, do capítulo 9.°, do orçamento do Ministério das Finanças, para vencimentos do pessoal do quadro da Direcção Geral da Contabilidade Pública, seja adicionada a quantia de 8.620$, correspondente aos vencimentos de um chefe de repartição, dois primeiros, dois segundos e cinco terceiros oficiais e dois chefes de secção, com que foi aumentado o quadro desta direcção Geral, por decreto n.° 2:310, de 31 de Março de 1910; em consequência da criação do Ministério do Trabalho, pela lei n.° 494, de 10 de Março dêste ano. - O Relator, Ernesto de Vilhena.
Foi lida na Mesa, admitida e aprovada, sendo tambêm aprovados os artigos 58.°, 39.°, 39.°-A e 40.°
Foram aprovados, sem discussão, os capítulos 10.° e 11.°
O Sr. Presidente: - Está em discussão o capítulo 12.°
O Sr. Ernesto de Vilhena: - Mando para a Mesa a seguinte
Proposta
Proponho que no capítulo 12.° do orçamento do Ministério das Finanças sejam feitas as seguintes alterações:
Artigo 52.° Pessoal do quadro - Pessoal menor: adicionar à respectiva verba a quantia de 600$, correspondente aos vencimentos de dois serventuários com que foi aumentado o respectivo quadro, pelo decreto n.° 2:310, de 31 de Março de 1936, em virtude da criação do Ministério do Trabalho, pela lei n.º 494, de 16 de Março dêste ano.
Artigo 54.° Abonos variáveis: incluir a verba de 300$, sob a seguinte epígrafe:
Retribuição por trabalhos extraordinários ao pessoal em serviço nocturno na estacão telefónica privativa do Ministério, nos termos do artigo 520.°, § 4.° da alínea b) e § 5.° da lei de 9 de Setembro de 1908. - O Relator, Ernesto de Vilhena.
Foi admitida e aprovada, bem como os artigos 52.°, 53.° e 54.°
Foram aprovados, sem discussão, os capítulos 13.°, 14.º, 15.°, 16.°, 17.°, 18.° e 19.°
O Sr. Presidente: - Está em discussão o capítulo 20.°
O Sr. Ernesto de Vilhena: - Mando para a Mesa a seguinte proposta:
Proponho que à verba para pagamento de despesas de anos económicos findos, descrita no capítulo 20.°, artigo 88.°, do orçamento do Ministério das Finanças, para o ano económico de 1916-1917, seja adicionada a quantia de 8.947$62.
Ano económico de 1913-1914:
[Ver tabela na imagem]
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Ano económico de 1914-1915:
[Ver tabela na imagem]
Ano económico de 1915-1916:
[Ver tabela na imagem]
O Relator, Ernesto Vilhena.
Foi admitida e aprovada juntamente com o artigo 38.°
Foi aprovado, sem discussão, o capítulo 21.°
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Foram aprovados, sem discussão, os capítulos 1.º, 2.°, 3.° e 4.° do orçamento da Caixa Geral de Depósitos e Instituto de Previdência.
O Sr. Presidente: - Está aprovado o orçamento do Ministério das Finanças.
Vai votar em discussão o orçamento do Ministério da Instrução.
O respectivo parecer é assim concebido:
Parecer n.° 302 -(k)
Senhores Deputados. - Em razão das reduções feitas na proposta orçamental, por motivo da situação anormal que atravessamos e tambêm pela consequente impossibilidade de aumentar as despesas, a bem pouco, só ao estritamente indispensável se reduzem as modificações feitas no presente Orçamento.
A tarefa de melhorar os serviços dêste Ministério realizada com tam provada dedicação pelo ilustre relator que nos precedeu, o Sr. Baltasar Teixeira, tem nesta ocasião de ser interrompida em consequência das circunstâncias actuais, que obrigam o pais a conjugar os seus esforços noutro sentido, noutra questão inadiável, a defesa dos interêsses da nossa Pátria.
E, todavia, muito há, que fazer ainda a bem da nossa instrução, sobretudo no que se refere a duas questões da mais alta importância e que de modo algum deveriam ser adiadas, porque, alêm doutras razões, precisamos de estar prevenidos para a futura luta, que se prepara desde já, para depois de finda a guerra.
Se uma delas se impõe pela oportunidade de cuidar do nosso desenvolvimento económico, a outra não é menos importante porque diz respeito à irradiação dum êrro em que não se pode insistir, por ser prejudicial à evolução da nossa raça: são elas, a instrução profissional e a reforma do ensino secundário liceal.
É lamentável que se tenha descurado tanto o ensino profissional elementar e primário: que não esteja ainda resolvido convenientemente o ensino profissional secundário, e que se continue a manter um ensino liceal que nada justifica, que não se adapta à nossa raça, prejudicando a e inutilizando todas as iniciativas.
Embora não se possam realizar agora essas aspirações, e, quem sabe, como será demorada tal solução, de importância fundamental para o país, no nos esquivamos a deixar aqui consignado o que pensamos sôbre êste assunto, instando, ao mesmo tempo, para que se procure remediar ao menos, pouco a pouco, estas deficiências da educação nacional.
No ensino primário falta ainda instituir o ensino profissional elementar, escolas de pesca, escolas florestais e escolas agrícolas. É certo que na regulamentação das Escolas Práticas de Agricultura (ensino elementar), já existentes, e cujo ensino corresponde à instrução complementar da instrução primária, especialmente adequada às exigências do ensino agrícola, se estatui a organização de cursos para jornaleiros, admitindo se igualmente os pequenos proprietários e os operários rurais já especializados, mas as escolas já organizadas são apenas duas, e a instalação de mais escolas desta natureza, para o fim que se tem em vista, a criação de cursos profissionais, tornaria êstes serviços muito despendiosos pelo grande número delas que seria indispensável instituir e pela sua despesa de sustentação.
A instrução profissional é um problema que se acha já resolvido na Suíça, na Alemanha, Áustria, Estados Unidos e Inglaterra, e que a Franca há muito procura resolver, preocupando ultimamente os seus legisladores por reconhecerem que é uma questão da mais alta importância para o desenvolvimento do seu comércio e das suas indústrias.
De facto, todos tem reconhecido que na luta pela vida sairá vencedor o mais apto, que as indústrias e o comércio dos países onde êsse ensino não estava desenvolvido, regulamentado, e não era obrigatório seriam subjugados pelos dos outros em que essa instrução se fazia intensamente.
Assim o começou a reconhecer a Inglaterra em 1878, vendo o perigo da concorrência alemã. Do inquérito a que se procedeu então averiguou se que o ensino industrial e comercial era insuficiente, reconheceu-se que a educação técnica tinha que ser considerada como uma parte integrante, indispensável, do ensino da criança, e concluiu-se propondo que as comunas fossem obrigadas a criar escolas de aperfeiçoamento e autorizadas a tornar a frequência obrigatória.
E assim deve ser. O ensino profissional tem de fazer-se obrigatoriamente como-
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já é o ensino primário e aos mestres e patrões imposto o dever de concederem ao aprendiz o tempo necessário para a frequência dos cursos de habilitação ou especialização, sem desconto no salário, que recebem pelo seu trabalho na oficina. Em alguns países o número de horas varia de cinco a doze por semana e ê dos catorze aos dezasseis anos, podendo ir até os dezanove ou vinte, a idade em que é permitida a frequência dêsses cursos.
Na Alemanha o legislador conseguiu reabilitar o trabalho manual e fazer insinuar e penetrar na opinião pública a idea de que a instrução profissional desenvolvida era ao mesmo tempo uma necessidade, um dever e uma honra.
Foi assim que ela pôde fazer chegar o seu comércio e a sua indústria ao grau de expansão e desenvolvimento que somos forçados a reconhecer e a admirar.
De toda a Alemanha é a cidade de Munich aquela que tem a sua educação profissional mais perfeita; compreende três graus do ensino. O primeiro grau é destinado às crianças de seis a catorze anos, escola primária pública obrigatória, com quatro horas de trabalhos manuais por semana, no último ano.
O segundo grau abrange as crianças de 14 aos 18 anos e é constituído por escolas de aperfeiçoamento para aprendizes. Estas escolas subdividem se em escolas profissionais de aperfeiçoamento destinadas aos aprendizes de profissões que fazem objecto dum ensino especial, ensino teórico e prático na oficina, com 8 a 10 horas de instrução obrigatória por semana e compreende os cursos de serralheiros, carpinteiros, marceneiros, escultores, litógrafos, impressores, pedreiros, sapateiros, comerciantes, electricistas, etc., ao todo 39 profissões diversas, divididas por 46 escolas, e em escolas de aperfeiçoamento do ensino geral, destinadas ás crianças que não tenham feito escolha duma profissão ou cuja profissão não faz objecto dum ensino especial, com 7 horas de trabalhos manuais.
Os cursos do terceiro grau são facultativos para artistas, empregados e contramestres, rapazes de mais de 18 anos, que desejam aperfeiçoar os seus conhecimentos adquiridos no ensino obrigatório. Compreende duas espécies de escolas. As primeiras dispondo de cursos profissionais destinados aos alunos que não querem interromper o seu ofício e que reservam para êsse fim 8 a 10 horas por semana, sendo esta instrução feita ás noites e aos domingos de manhã e as outras frequentadas por aqueles que podem dispor de 30 a 48 horas de ensino por semana; são as escolas profissionais própriamente ditas.
Na Áustria a instrução profissional atinge uma percentagem elevada, 87 por cento. Os cursos profissionais compreendem a classe preparatória para as crianças cuja instrução primária é incompleta, cursos gerais destinados a aprendizes de diversas profissões e cursos técnicos, com oficinas anexas, para aprendizes duma determinada profissão ou de profissões similares.
Esta instrução não é só fornecida pelo Estado mas tambêm por diversas corporações e subsidiadas por êle.
Existe em Viena uma escola de cursos de aperfeiçoamento, já insuficiente, embora construída em 1912, que comporta 5:200 aprendizes distribuídos por 337 salas dêste estabelecimento, ocupando as oficinas 7:246 metros quadrados. É um verdadeiro palácio de trabalho, onde os alunos encontram, alêm do ensino profissional, a educação física em aulas de gimnástica, tiro, esgrima, leitura, etc., o que torna útil e agradável a frequência desta escola.
Não desejamos alongar mais as considerações acêrca do que se faz no estrangeiro em matéria de instrução profissional, citaremos apenas o facto deveras interessante do Govêrno Americano ter instituído o ensino profissional até para os índios, tanto para homens como para mulheres.
O que sôbre êste assunto se tem feito no estrangeiro precisa de ser pôsto em prática em Portugal, com critério e com rapidez.
A descentralização dos serviços de instrução primária feita pelo decreto de 29 de Março de 1911 não tem dado os resultados que seria de esperar, salvas raras excepções entre as quais nos o grato citar o excelente serviço de instrução primária a cargo da Câmara Municipal do Pôrto. A liberdade administrativa, como a liberdade política, supõe um grau de instrução que o nosso povo ainda não possui.
Não seria arriscado propor a revogação dêsse decreto, voltando os serviços a ser centralizados como antigamente?
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Neste caso a solução do problema era mais fácil pela intervenção directa do Estado, criando cursos complementares profissionais adjuntos às escolas primárias, e organizando os programas dos trabalhos manuais de molde a satisfazerem o fim visado.
Os programas de ensino primário determinam a execução de trabalhos manuais, certo é, mas êsse ensino é por via de regra insuficiente ou não se faz.
Não se regulamentou a lei: ficou por concluir essa grande obra republicana.
O ensino profissional podia fazer-se nas escolas primárias distribuídas por todo o país, em aulas diurnas e nocturnas, e adequado às necessidades regionais.
Em virtude da descentralização do ensino primário, é das atribuições das câmaras municipais fazer tambêm a educação profissional, no próprio interesse da sua população; se o não fizerem, compete ao Estado intervir, a fim de realizar-se essa imprescindível reforma nacional.
Na nossa educação comercial e industrial elementar só são beneficiadas as crianças dos principais centros, e que podem dispor dalguns meios de fortuna para poderem concluir um curso que obriga a alguns anos de frequência; mas esta população escolar representa o mínimo da população que deve receber a instrução profissional; não a podem conseguir êsses milhares de crianças que frequentam fábricas e oficinas, ou que trabalham nos campos, às quais o Estado nem lhes proporciona o meio de a obterem, nem a garantia de o poderem fazer sem prejuízo dos seus salários, intervindo junto dos patrões ou mestres.
Os nossos jornaleiros e operários, tanto homens como mulheres, e as crianças, precisam dessa educação profissional elementar que os habilite num ofício, ou os aperfeiçoe, de modo a facilitar-lhes o ganho da vida. Êsses cursos devem ser curtos, um ano quando muito, porque é preciso que as crianças bem depressa comecem a angariar meios de subsistência para si e para os seus, e regidos por mestres dêsses ofícios, para ser profícuo o ensino ministrado.
A sua acção é não só social como moral; vale mais estabelecer a instrução profissional obrigatória, do que remediar males resultantes dessa falta, com muitas colónias penais, que sempre representam um castigo, uma correcção que muitas vezes se teria evitado.
Trazia isto um grande benefício, não só para a população permanente como para a emigradora, porque os nossos jornaleiros e operários contribuem com uma larga percentagem para a emigração.
Ora as condições em que essas pobres criaturas emigram são, em geral, bem desgraçadas sob todos os pontos de vista, sobretudo pelo que se refere a analfabetismo e educação profissional, o que só pode contribuir para que o seu esforço, a sua acção, sejam inferiores às dos emigrantes provenientes dos outros países onde a instrução está mais difundida, do que resulta uma luta pela vida mais intensiva, difícil e cheia de insucessos pela falta daqueles factores primordiais.
Daí resulta, sem dúvida, a situação subalterna em que os nossos emigrantes se colocam em relação aos outros.
Todos nós sabemos, ou temos ouvido falar, no que sucede, geralmente, aos emigrantes portugueses que chegam ao Brasil, e ninguêm pode duvidar da acção benéfica, salvadora, digamos assim, que resulta para a nossa economia nacional dos que, pelo seu esforço, conseguem triunfar, e quanto mais teríamos a lucrar com a conveniente preparação dêsses factores do trabalho e da riqueza.
Um país, como o nosso, que dispõe duma extensa linha de costa e, por conseguinte, com numerosos centros de pesca, uns mais importantes que outros, não possui ainda uma única escola profissional e técnica de pesca.
Os processos de pesca ou não os usados pelos pescadores desde tempos remotos e transmitidos pela tradição, sem progresso, ou, quando muito, com progressos lentos, ou novos e introduzidos por industriais que, em geral, vão ou submeter ou arruinar as populações que vivem das indústrias do mar.
Ensinar essas populações, ou fomentar a sua educação com subsídios, é uma função e um dever do Estado. Nem com tam pouco elas contribuem para a riqueza pública.
É nessas escolas que os filhos dos pescadores vão receber uma educação técnica adequada à sua profissão, como já de há muito lá fora se faz. Nós temos centros de
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pesca que bem justificam a necessidade da instalação de escolas para pescadores, tais como Caminha, Viana, Póvoa de Varzim, Mato zinhos, Aveiro, Figueira, Nazaré, Cascais, Setúbal, Lagos, Faro e Olhão, o pôrto dos mais audazes pescadores algarvios.
Escolas florestais tambêm não as temos. Existe apenas dependente da Direcção dos Serviços Florestais, uma escola para guardas daqueles serviços.
Convinha porêm estabelecer pelo menos três, nos principais centros florestais, Gerez, Estrela e Marinha Grande e destinadas à educação profissional das crianças dessas zonas e onde os seus serviços poderão ser mais tarde aproveitados. Os alemães estabeleceram essas escolas nos centros das suas florestas e fazem-nos frequentar de preferência por crianças de constituição fraca que vão aí encontrar, a par de uma educação profissional que lhes possa servir para grangear a vida, um meio salutar para robustecer o seu organismo.
O ensino elementar agrícola que igualmente muito convêm difundir por todo o país, já que se diz que somos um país essencialmente agrícola, poderá ser feito em cursos complementares junto das escolas primárias e nas escolas especiais de agricultura já criadas. Sob êste assunto temos já um exemplo de quanto pode o esforço particular, que oxalá fôsse extensivo a outras profissões.
Queremos referir-nos às escolas móveis agrícolas organizadas por O Comércio do Pôrto e que tem produzido excelentes resultados. Principiaram pela Escola Móvel Agrícola de Maria Cristina que tem realizado já 15 missões no norte do país e à sombra dela criaram-se outras escolas e missões.
Todas elas tem sido sustentadas por beneméritos cidadãos que assim se propõem proteger por forma eficaz a agricultura nacional.
A propaganda das escolas móveis agrícolas organizada por O Comercio dó Pôrto realiza-se por meio de lições expositivas, trabalhos experimentais e palestras dominicais.
Figuram no presente Orçamento verbas na importância de 64.200$ para 134 professores e 100 professoras de escolas móveis e de 8.400$ para 100 cursos nocturnos.
Porque não se determina que nesses cursos se faça tambêm o ensino profissional ou, pelo menos, que metade dêsses professores se ocupem exclusivamente dêsse ensino? Cremos bem que resultariam para o país mais vantagens imediatas e seria um meio de, sem aumento de despesa, se dar começo à educação profissional elementar.
Entre as vantagens do ensino profissional há pelo menos duas cujos resultados são indiscutíveis:
1.ª Proporcionar à criança uma garantia de preferência na sua colocação pelo aperfeiçoamento resultante da aprendizagem, ou facultar-lhe os meios de angariar melhor situação económica pelo trabalho individual, exercendo uma profissão que lhe garante um futuro, livrando-a das consequências sociais e morais da falta de preparação e de amor pelo trabalho.
2.ª Fazer progredir o nosso comércio e as nossas indústrias. Uma boa educação técnica profissional para aqueles que não sabem ler e escrever seria um estímulo para se ilustrarem, para progredirem.
Ou fazemos isto ou estamos condenados a ser vencidos na nova luta que vai travar-se depois da guerra pelas armas e para a qual já alguns países cuidadosamente se estão preparando.
Precisamos de aproveitar êste momento único na nossa vida económica, porque do trabalho alheio temos despreocupadamente vivido durante muitos anos, sofrendo agora, mais que outros povos, as consequências dessa indesculpável falta.
Sôbre a organização da instrução secundária, parece-nos absolutamente indispensável uma reforma principalmente no ensino industrial e no ensino liceal.
Pelas mesmas razões já expostas, quando nos ocupamos do ensino profissional elementar reconhecemos que o ensino médio, ou secundário, necessita duma reforma que unifique, oriente e desenvolva o ensino profissional apenas ministrado em alguns institutos de carácter precisamente pouco definido, sobretudo pelo que diz respeito ao grau de ensino que neles se fornece.
Os institutos de ensino profissional secundário devem ter por fim criar um pessoal técnico que vá exercer funções intermédias ao operário das oficinas e dos campos, saído das escolas profissionais elementares e ao engenheiro, ao agrónomo e
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ao silvicultor formados nas escolas profissionais superiores.
Para o ensino industrial há em Lisboa uma Escola de Construções, Indústria e Comércio, e no Pôrto um Instituto Industrial e Comercial que precisa de ser transformado numa escola igual à de Lisboa, passando o curso superior de comércio, anexo a êste Instituto, para a Faculdade de Comércio, criada pelo decreto de 19 de Abril de 1911, que ficaria equivalente ao Instituto Superior de Comércio, de Lisboa e anexada à Universidade do Pôrto.
Ficariam dêste modo duas escolas secundárias industriais e comerciais bem organizadas e de ensino bem definidos, e completar-se-ia o ensino superior técnico e comercial nas duas cidades do país, que seria constituído pelo Instituto Superior Técnico e Instituto Superior de Comércio em Lisboa e Faculdade Técnica e Faculdade de Comércio, no Pôrto, uniformizando os seus títulos, se os dois primeiros estabelecimentos de ensino fossem encorporados na Universidade de Lisboa, como estatuía a proposta de lei d(c) reorganização universitária de 28 de Junho de 1914, da qual resultaria a grande vantagem da unificação dos seus programas e dos seus diplomas.
O ensino liceal, tal como está, só pode escravizar a nossa raça, inutilizar e malograr iniciativas.
O que tem produzido estas últimas gerações, saídas dos liceus, em trabalhos que se relacionem o estudo das sciências físico-químicas ou histórico-naturais, sciências que demandam aplicação demorada?
Se elas chegam quási inutilizadas pela fadiga cerebral, a que são obrigadas, com conhecimentos incompletos e confusos, sem preparação sólida e indispensável para a sua iniciação no ensino universitário! E esta a opinião, talvez unânime, dos professores que os recebem nos primeiros cursos nas Universidades.
É preciso limitar a seis anos o ensino liceal, tendo em vista que as necessidades que a vida moderna, de luta, criou ao homem exige que todos entrem na fase de trabalho produtivo o mais cedo possível. De resto, em seis anos pode-se bem conseguir uma educação pura, geral, perfeitamente aceitável, quer como ilustração média, quer como preparatória dos cursos superiores, desde que se eliminem os programas pomposos e se deixe de perder tempo com essa fragmentação de disciplinas, absolutamente dispensável numa raça de tam elevada precocidade mental como a nossa.
O regime liceal de classes é necessário que acabe para bem de todos, restabelecendo-se o ensino por disciplinas completas, que é o que mais convêm á nossa índole mental. Nas idades em que frequentam os liceus as crianças portuguesas tem o desenvolvimento cerebral suficiente para poderem prescindir dessa fastidiosa pulverização duma mesma matéria por diferentes atios, obrigando-as a um número de aulas diárias que as cansa e cretiniza, tornando as simples receptores passivos e inutilizando-as para o estudo próprio, para o esforço pessoal, que são incapazes de realizar depois de extenuadas com tantas e tam longas prelecções dos professores. Será muito bom sistema para crianças de mentalidade preguiçosa, que precisam repisar,, repetir conhecimentos que a nossa raça, pela sua precocidade mental, adquire fácilmente.
Nem em tudo o germanismo pode e deve ser imitado.
Alêm disto, com o nosso feitio impressionista que tam atraente nos torna a novidade, é inevitável o aborrecimento e o tédio por uma disciplina que somos obrigados a estudar anos e anos seguidos e ás vezes tam dispensávelmente repisada, que bem mostra a dificuldade que houve em reparti-la pelos sete anos do calvário liceal.
A educação da mocidade portuguesa fazia-se em bases mais sólidas e muito melhor antes da reforma em vigor. O estudante tinha mais tempo para o descanso cerebral, tinha tempo para dirigir a sua actividade para qualquer outro estudo da sua predilecção e que demandas-se aplicação, tinha, alêm disso, o que é importante sob o ponto de vista moral, pela independência que dava ao carácter da criança, a liberdade da escolha das disciplinas que iam sucessivamente interessando o seu espírito, amoldando se ao seu desenvolvimento intelectual ou à sua predilecção, de que resultava tambêm uma melhor aplicação e aproveitamento, adquirindo por esta forma uma soma de conhecimentos basilares, fundamentais, para a entrada nos cursos superiores e obtidos num período mais i curto e sem aborrecimento nem fadiga.
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Nada disto sucede actualmente; todos nós o sabemos, todos nós o compreendemos, mas não há talvez a coragem de o confessar e de procurar remediar esta grave falta em que caímos impondo-nos uma reforma que a Espanha, com um critério bem mais superior, conhecendo melhor as condições da sua raça, não aceitou, e que a França já considera imprópria para a educação dos seus filhos.
Como já dissemos, os que ministram ensino nos nossos cursos superiores, sobretudo os que tem a seu cargo cadeiras dos primeiros anos, sabem bem o estado em que entram ali os estudantes saídos dos liceus, onde, no emtanto, há excelentes professores. Não levam ideas seguras nos princípios mais gerais e absolutamente indispensáveis como preparatórios do ensino universitário, não possuem capacidade, por via de regra, para resolver um assunto pelo seu próprio esforço, pois para tudo necessitam de explicação - porque ao explicador vem habituados - e o que é mais desolador, não demonstram pela matéria do ensino aquele interesse que uma cousa naturalmente desperta. Embora não sabendo nada, o que é certo é que de tudo já ouviram falar no liceu, onde, com o luxo dos programas actuais, se versa tudo pela rama sem que cousa alguma se fique a saber, a sério.
É preciso, tambêm, que desapareça a ramificação no curso secundário. O curso dos liceus deve ser uno, de modo a ministrar um conjunto de conhecimentos que de vem constituir, na época actual, uma educação scientífica média, indispensável, claro está, aos que desejam adquirir qualquer curso superior. Essa educação tem de ser uma educação geral, devendo os preparatórios especiais para cada curso superior ser feitos, depois, nas Faculdades de Sciências. E, assim, que a estas Faculdades terá o estudante que quere ser médico de ir buscar as cadeiras que o hão-de habilitar com a preparação de sciências biológicas necessárias ao aluno de medicina; que o que deseja ser engenheiro terá de ir procurar as cadeiras indispensáveis como preparatórios matemáticos ao estudante de engenharia. Os que se destinam à formatura em direito ou em letras deveriam, tambêm, transitar pelas Faculdades de Sciências, onde teria de ser criada uma secção de sciências sociais, da qual algumas cadeiras seriam obrigatórias como preparatório a êsses estudantes.
Em suma: julgamos que se torna indispensável uma completa remodelação do ensino secundário liceal, reduzindo o número de liceus, encurtando o respectivo curso, pelo menos um ano, suprimindo-lhe a bifurcação e restabelecendo o regime por disciplinas. Com as economias que daí resultariam - e que seriam bastante consideráveis - poder-se-ia organizar melhor o ensino secundário profissional, do qual, voltamos ainda uma vez mais a insistir, é urgente cuidar com particular atenção.
Falamos na redução do número de liceus e, com efeito, não há nada que justifique um liceu na Póvoa de Varzim, onde, pelo carácter local, pôrto de pesca de grande importância outrora, hoje decadente por causas várias, entre elas a deficiência da educação profissional, impossibilitando a luta contra processos de pesca mais aperfeiçoados em uso em portos próximos, ficaria melhor uma escola de pesca, de vantagens regionais incontestáveis. E, como êste, talvez outros mais.
A Escola de Desenho Industrial de Gil Vicente, em Setúbal, deveria ser amplamente melhorada e modificada, tal é a importância das indústrias locais relacionadas com a pesca e a grande população marítima e industrial. Pelas mesmas razões deveria ser melhorada e reformada a Escola Industrial e Comercial de Pedro Nunes, em Faro, centro da província mais rica na indústria da pesca do país. Tanto esta como a antecedente mereciam fazer parte do ensino secundário profissional, pesca e suas indústrias, estabelecendo-se ao mesmo tempo cursos elementares profissionais.
E o que há a fazer no ensino secundário para as crianças do sexo masculino tem de fazer-se para as do sexo feminino, cujo ensino entre nós é muito restrito.
Há muitas profissões em que a mulher pode iniciar-se ou aperfeiçoar-se para poder desempenhar com proficiência os diversos mesteres que lhe são mais adequados, como outros e para os quais actualmente vai sendo aproveitada.
No ensino universitário é preciso fazer-se uma remodelação dentro das bases estabelecidas, porque o que está decretado, com algumas modificações satisfaz perfeitamente, honrando o Govêrno que refor-
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mou o antigo ensino superior tam insuficiente, tam incompleto que nos colocava sob êste ponto de vista numa situação bem subalterna perante as outras nações.
Depois, porêm, de decretada a actual reforma tem sido publicadas tantas alterações que uma revisão geral se impõe, visto que os anos em que ela tem vigorado já bastam para se estabelecer em definitivo o seu regular funcionamento.
Uma das modificações mais importantes a fazer é a que diz respeito aos assistentes. Devem eliminar-se os lucrares de segundos assistentes por desnecessários. A sua remuneração é tam diminuta que os indivíduos providos nesses lugares, procurem outras ocupações onde possam conseguir mais proventos, de maneira que e tempo que dedicam à assistência é o mínimo que as suas obrigações exigem, porque todo o tempo de que podem dispor é para que nos liceus, onde geralmente vão arranjar acumulações, possam obter maior número de horas de serviço, a fim de aumentar os seus vencimentos,
O sistema de recrutamento é tampem defeituoso.
O candidato aprovado no seu concurso de entrada para segundo assistente julga-se seguro no seu lugar, não obstante o que a êsse respeito está regulamentado por lei, de maneira que não procura aperfeiçoar-se, progredir. Seria muito mais vantajoso para o ensino que os concursos se fizessem no final do seu tirocínio como primeiros assistentes, que deveriam ser mantidos e com melhor remuneração, a fim de que se lhes pudesse exigir, mais soma de trabalho, e mais aplicação ao ensino de que são encarregados.
Seriam suficientes os primeiros assistentes, podendo os professores admitir aos trabalhos dos laboratórios apenas assistentes livres, como se faz na Itália, sem remuneração e sem compromisso, do que resultaria grande vantagem para a boa selecção dos futuros candidatos. Tal como está não deve êste serviço continuar.
Seria pueril supor que a reforma universitária, que veio nobilitar o nosso ensino superior, foi bem recebida por todo o professorado. Não foi. Primeiro, porque vinha acabar com a cómoda chamada à lição, e portanto a dispensa da obrigatoriedade de prelecção por parte dos professores; segundo, porque obrigava alguns professores a adquirir os conhecimentos práticos das disciplinas que professavam e em que não tinham sequer sido iniciados. E quando o ensino prático se não obtêm desde novo não é fácil a sua adaptação em idade avançada.
Daí a reacção constante que se tem manifestado contra essa excelente reforma, procurando-se voltar à antiga, pelo número de leis e pelas modificações que tem sofrido.
Uma delas, bem manifesta, é a alteração na constituição dos júris, com a desculpada falta de solenidade pelo reduzido número de professores que os constituem, tirando o carácter especializado aos concursos e fazendo intervir nas decisões do júri votos dos professores que não podem conhecer os méritos, já hoje complexos, doa candidatos, nem mesmo avaliar com conhecimento de causa o valor das suas provas.
É certo, e é justo referir, que naquela deliberação não houve unanimidade de votos.
Com o ensino tal como está ou mesmo dentro dos moldes em que pode ser modificado o júri tem de voltar à sua constituição primitiva, à decretada na lei universitária, isto é, a ser organizado apenas pelos professores da secção, os únicos na verdade competentes para o julgamento das provas, sob a informação dos professores do grupo respectivo.
Veja-se ainda o que algumas vezes se tem passado com a escolha dos candidatos a segundos assistentes para provimento definitivo. Não se atendeu à lei e em vez de se admitirem apenas assistentes provisórios, até que êsses ou novos candidatos pudessem concorrer dentro das condições legais, ou se obrigassem êsses assistentes a largo tirocínio, antes do concurso, arranjaram-se autorizações especiais para dar lugar à entrada de candidatos, alguns dos quais por forma alguma podiam concorrer, não só pela sua insuficiente preparação como pela falta do curso exigido pela lei.
Desta maneira o recrutamento definitivo foi feito em condições obtidas por alterações da lei com desvantagem para o ensino e prejuízo para os candidatos que, abrigando-se á sombra da lei, fizeram os seus cursos na esperança dum dia poderem concorrer.
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Na organização dos cursos algumas modificações há ainda a fazer. Os primeiros anos médicos estão talvez sobrecarregados; o regulamento das Faculdades de Sciências tal como está, não satisfaz por deficiente que é; nas escolas de farmácia várias modificações são solicitadas, etc.
Mas, há bons elementos para se fazer a reforma, o projecto de lei de reorganização universitária de 28 de Junho de 1914 e o chamado projecto dos reitores. Do estudo dêsses dois projectos poderá, sem dúvida, e com um estudo cuidadoso, chegar-se â organização dum diploma adequado às exigências do nosso ensino e que não deveria ser alterado durante um determinado período de anos, para não voltarmos ao estado de confusão a que se chegou.
O ensino técnico superior deve merecer especial atenção.
Não é só para aqueles que desejam obter um diploma de habilitação geral na engenharia civil, na engenharia de minas ou em qualquer das outras especialidades, química, electricidade ou mecânica, que devem abrir-se as nossas escolas superiores técnicas, mas tambêm para os indivíduos que queiram simplesmente aperfeiçoar se em uma ou em diversas especialidades, ou ainda obterem um certificado que lhes proporcione a entrada para a direcção de fábricas ou serviços determinados segundo as necessidades regionais.
Deveriam criar-se cursos, para o que basta fornecer a essas escolas os meios económicos para êsse fim, de enologia, tinturaria, cerâmica, fiação, tecelagem, costumes, química industrial, física aplicada às artes, metalurgia, electricidade industrial, etc., para alunos inscritos ou livres.
Não deveria ser exigido documento de habilitação para a frequência dêsses cursos e no fim dêles seriam sujeitos a um exame, aqueles dos alunos que desejassem adquirir una documento de habilitação.
Não devemos impedir de frequentar as nossas escolas aqueles que desejem instruir-se e possam assim contribuir para o nosso desenvolvimento industrial, agrícola e comercial, embora não tenham meios ou preparação para fazerem um curso longo e dispendioso.
Assim fazem tambêm algumas das escolas francesas de ensino superior; outras exigem certa preparação ou um exame de entrada. Temos por exemplo as Faculdades de Sciências que fornecem diplomas de químicos agrícolas (Clermont, Poitiers, Rennes), químico industrial ou engenheiro-químico (Lyon, Lille, Clermont, Bordéus, Marselha, Montpellier, Nancy); enologia (Dijon) alêm doa estudos electrotécnicos-professados nas Faculdades de Lyon, Marselha, Clermont, Montpellier, Poitiers, Besançon ou nos Institutos especializados nesse ensino, de Toulouse, Grenoble, Lille ou Nancy. A fabricação dos coiros e o seu comércio, a fabricação do papel, leitaria, cervejaria, relojoaria, etc., são tambêm ensinadas em diversas Faculdades em cursos complementares.
Porque não poderão as nossas Faculdades de Sciências fazer o mesmo, assim como as nossas escolas técnicas?
Resumindo as considerações expostas, parece-nos que se deveria entre nós fazer o seguinte:
Organizar e publicar o regulamento do ensino primário; levar as câmaras municipais a efectivarem os trabalhos manuais nas escolas infantis e no ensino primária elementar e complementar a prática no superior, criando simultaneamente cursos complementares profissionais em harmonia com os interêsses locais e que poderiam funcionar nos edifícios escolares em horas compatíveis com os outros cursos e ás noites e aos domingos de manhã; decretar e regulamentar o ensino profissional; determinar que metade do número de professores e professoras das Escolas Móveis façam o ensino profissional; reorganizar as escolas industriam e comerciais, instituindo cursos complementares que pudessem ser frequentados por aprendizes das oficinas e fábricas sem prejuízo dos seus salários e sem a obrigação de exame de habilitação para a frequência; unificar os programas e diplomas das escolas de construções e indústrias e comércio e o Instituto Industrial e Comercial do Pôrto, isolando dêste estabelecimento o curso superior de comércio que se igualaria ao que é professado no Instituto Superior de Comércio de Lisboa.
No ensino superior fazer ingressar nas Universidades de Lisboa e Pôrto o Instituto Superior Técnico e o Instituto Superior de Comércio na primeira e o Curso Superior de Comércio na segunda, com designações, programas e diplomas idênticos.
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Nessas escolas deveriam criar-se cursos complementares profissionais, sem exigência de prova de habilitação para a entrada e com exame facultativo à saída dos cursos, que não deveriam exceder um ou dois anos de duração.
O Estado auxiliaria tambêm as corporações locais que promovessem a abertura de cursos complementares, quer junto das suas oficinas ou das suas fabricas quer independentes.
Há já alguma cousa feita por iniciativa particular que certamente se alargaria e desenvolveria se o Estado fomentasse e protegesse essas iniciativas. A organização e desenvolvimento dos Museus é tambêm uma medida indispensável pelo alto valor educativo que possuem e pela demonstração do estado de adiantamento dos povos que representam.
Sob êste ponto de vista, o nosso país está num grau de inferioridade lamentável. Os nossos museus de sciências e de artes quási que só se encontram em Lisboa. Raros são os museus espalhados pelas cidades da província e alguns dêles de iniciativa particular, legados de dedicados e apaixonados cultores.
Não aspiramos a possuir museus como os que se encontram nas principais cidades europeias, mas como os que se vêem em cidades mais modestas e para a realização dos quais, nas artes pelo menos, não nos faltam elementos preciosos. Os museus de sciência, pela nova feição que vão tomando, contribuem eficazmente para a educação do povo, são verdadeiras aulas práticas, de demonstração. Assim o compreenderam os americanos introduzindo essas modificações, que na Europa foram adoptados pela Inglaterra e na esteira da qual seguiram outros países. Actualmente são factores indispensáveis do ensino e da educação do povo.
Na impossibilidade actual de aumentar as despesas dêste orçamento fizemos apenas algumas modificações para atender disposições legais ou reclamações justas e que podem ser atendidas. A justificação e descriminação dessas despesas é a seguinte:
No artigo 16.° fizemos alteração de verba destinada às novas escolas normais de Lisboa, Pôrto e Coimbra por a julgarmos insuficiente, aumentando-a com mais 4.500$.
Art. 21.° Aumentamos com 400$ a dotação do prestante Instituto para filhos dos professores primários para que possa realizar-se a aspiração da sua desvelada directora de fazer anexo a êste estabelecimento, um secção de ensino profissional destinado às alunas internas e a crianças estranhas ao Instituto.
Tudo o que se refira ao desenvolvimento do ensino profissional deve merecer--nos o incondicional apoio e interesse.
No capítulo 4.°, artigo 27.°, abonos variáveis, abatemos 12 254$, para ocorrer ás alterações feitas no presente orçamento e por ser possível essa redução sem prejuízo dos serviços. Por êste mesmo motivo abatemos no mesmo artigo na verba para gratificações pelo serviço de exames a quantia de 3.000$.
Capítulo 4.°, artigo 28.° Aumentou-se a verba destinada à renda da casa para o Liceu Gil Vicente por ser urgente ampliar a sua instalação e aumentámos 1.000$ à dotação para material por ela ser muito inferior à dos outros liceus de Lisboa. Por não existir no orçamento verba para material para o ensino privativo do curso secundário do Liceu Feminino do Pôrto inscrevemos 1.500$ porque se trata do ensino profissional que é aquele que mais convêm auxiliar. Por ser insuficiente e atendendo às fundamentadas reclamações do seu reitor foi igualmente acrescentada a verba consignada no Liceu de Lamego.
No capítulo 5.º artigo 37.° aumentámos em 1.000$ a dotação do Instituto de Oftalmologia de Lisboa, destinado a material e despesas diversas por ser insuficiente a dotação actual em razão de elevação de preços nos géneros alimentícios, medicamentos, artigos de vestuário e calçado.
Sem êste aumento tem o seu Director de reduzir a admissão de doentes por já fechar com déficit a sua administração no presente ano económico, pelos motivos acima indicados.
No mesmo capítulo artigo 37.°; incluímos a verba de 400$ para renda da casa em que actualmente está a funcionar o Laboratório de Higiene do Pôrto porque em virtude das obras da nova avenida a instalação do referido laboratório teve de ser mudada pela necessidade de expropriar
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a casa que ocupava, sem direito a reclamação perante a câmara daquela cidade.
No mesmo capítulo, artigo 37.°, incluímos a quantia de 400$ para a Faculdade Técnica por não ter ainda no orçamento verba por onde possa ocorrer ás despesas de expediente e de secretaria e mais 2.600$ para o estabelecimento de aulas práticas de carácter profissional o que lhe era facultado pela lei que a criou.
Ainda concedemos um aumento de dotação aos dois Museus de Zoologia e de Botânica da Faculdade de Sciências, por serem insuficientes os que lhe estavam consignados na lei e não poderem manter-se abertos ao público, sem essas verbas agora rectificadas.
E para ajudar a instalação da nova Faculdade Técnica do Pôrto ainda incluímos no presente orçamento verbas para os laboratórios e gabinetes que as não possuíam e sem as quais não podiam funcionar em razão da diminuta dotação consignada para os outros gabinetes e laboratórios. Todas elas são de grande importância para o funcionamento daquela escola, embora sejam insuficientes, mas as circunstâncias actuais não nos permitem conceder-lhes uma maior dotação.
No capítulo 6.°, artigo 47.°, material e diversas despesas, reduzimos a metade a verba consignada ao alargamento de laboratórios por não ser possível despender-se essa quantia por falta de espaço e por não dever fazer-se pelo motivo de boa administração, visto que o Instituto Técnico já tem verba especial para construção dum magnifico edifício. A verba, que reduzimos é a que aplicamos a melhorar a situação da Faculdade Técnica do Pôrto. Há uma tal disparidade nos orçamentos das duas escolas, que seria uma injustiça negar-se lhe êste modesto subsídio. Alêm do professorado, frizaremos apenas o facto da Faculdade do Pôrto não ter ainda verba para pessoal administrativo e menor, emquanto que o Instituto Técnico tem dezanove funcionários ao serviço, com o qual gasta 6.199$.
Para pessoal jornaleiro tem 5.000$ e para material e diversas despesas 9.500$, emquanto que a Faculdade Técnica não tem verba para pessoal jornaleiro, e pelo presente orçamento é-lhe consignada apenas a verba de 400$ para material e diversas despesas.
Na lei orçamentai de 1915-1916, artigo 90.°, foi criada uma Escola Industrial em Gondomar, aplicada ao ensino da ourivesaria, indústria local de grande importância e que convêm desenvolver. Para êsse fim dotamos essa escola, para poder funcionar, com a quantia de 2.000$, distribuída conforme se vê na tabela anexa.
Capítulo 7.°, artigo 80.° Attendendo aos aumentos dos encargos com a alimentação de animais e alargamento da área cultivada, aumentou-se a quantia de 1.000$ à verba destinada a custeio e salários.
Artigo 84.° Atendendo a que as despesas aumentaram extraordinariamente, devido â crise actual, com a alimentação dos alunos e dos gados, tendo tambêm crescido o número de alunos, elevou-se a quantia para êste fim destinada a 16.000$.
No artigo 90.° aumenta-se, com mais 1.000$, a verba destinada a despesas diversas, da Escola de Queluz, considerando que a escola está no período de instalação e que, pela região em que está estabelecida, os subsídios aos alunos absorvem verba importante, e ainda porque êste ano vão ser cultivados mais 122 hectares.
No artigo 96.° aumentamos 100$ a dotação do Museu de Bragança, visto que a câmara desta cidade oferece livros e material, assim como luz e água, desde que nesse museu seja tambêm instalada uma biblioteca.
A Escola Prática de Agricultura de S. Bento necessita tambêm que se lhe aumente a dotação do artigo 90.°, porque esta Es cola está num período de reorganização, precisando de adquirir mobiliário e material escolar, gados, etc., e porque a dotação anterior era tam insuficiente que não chegou para cobrir as despesas. Elevámos a sua dotação com mais 1.000$.
No artigo 110.° aumentamos 192$93 para ocorrer a despesas resultantes da carestia dos géneros.
Artigo 116.° Reduziu-se em 3.000$ a verba de 20.000$, para ocorrer a alterações feitas neste orçamento.
A estas se resumem as alterações que fizemos, sentindo bem que o orçamento da Instrução Pública em Portugal não pudesse ser dotado com maior verba para satisfazer todas as exigências requeridas para o desejado avanço e aperfeiçoamento do nosso ensino. Concluídas as nossas considerações, confiamos, Srs. Deputados, que
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aproveis as modificações introduzidas pela vossa comissão do orçamento na proposta orçamental e que constam da tabela anexa.
Sala das sessões da comissão do orçamento na Câmara dos Deputados, em 5 de Maio de 1916. - António Macieira, presidente - Carvalho Araújo - Constâncio de Oliveira - João Carlos de Melo Barreto - Eduardo Alberto Lima Basto - Manuel da Costa Dias - Rodrigo Rodrigues - Ernesto de Vilhena - Abílio Marçal - Augusto Nobre, relator.
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ALTERAÇÕES PROPOSTAS NO ORÇAMENTO DA DESPESA DO MINISTÉRIO DA INSTRUÇÃO PÚBLICA PARA O ANO ECONÓMICO DE 1916-1917
[Ver tabela na imagem]
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[Ver tabela na imagem]
Foi aprovado, sem discussão, o capítulo 1.°
O Sr. Presidente: - Está em discussão o capítulo 2.°
O Sr. Carvalho Mourão: - Manda para a Mesa um projecto de lei, para o qual pede a urgência e dispensa do Regimento a fim de entrar em discussão juntamente com o orçamento que se discute, e lamenta que o pessoal do Ministério de Instrução seja filho bastardo da Administração Geral do Estado, pois não lhe é concedida a equiparação do vencimento que outros Ministérios gozam, incluindo o novo Ministério do Trabalho.
Acentua que êsses funcionários não são servos de gleba e estranha que, contráriamente ao que sucede em todos os países do mundo, em Portugal não haja nenhum carinho pelos serviços de instrução e a sacrifique sempre a outros serviços esquecendo que ela é vitalíssima na acção do Estado.
Reserva-se para em melhor ocasião fazer mais largas considerações que tam importante assunto justifica e limita-se, por agora, a protestar solenemente contra os cortes feitos no Ministério de Instrução e contra o facto de se colocarem os seus funcionários em situação deprimente relativamente a outros funcionários.
O projecto é o seguinte:
Artigo. Os processos de concursos para provimento das escolas de instrução primária são organizados pela 2.ª Repartição
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de Instrução Primária e Nacional, competindo ao Govêrno a nomeação dos respectivos professores.
§ único. É revogado o artigo 11.° da lei n.° 424, de 11 de Setembro de 1916.
Artigo. O Govêrno decretará no respectivo regulamento a forma de assegurar aos professores de instrução primária o pagamento dos vencimentos a que tiverem direito. - O Deputado, Carvalho Mourão.
O discurso será publicado na integra quando o orador restituir as notas taquigráficas.
O Sr. Costa Júnior: - Pedi a palavra porque desejava saber a razão por que foi diminuída a verba destinada a seguros.
O Sr. Almeida Ribeiro: - A razão por que foi diminuída a verba destinada a seguros foi porque, representando essa verba uma percentagem, diminui desde que a soma do orçamento baixe, embora o número de edifícios a segurar seja o mesmo.
O Sr. Augusto Nobre (relator). - Creio que o Sr. Ministro de Instrução pensou em equiparar os vencimentos dos funcionários do seu Ministério; mas a comissão nada pode fazer a êste respeito e só a Câmara é que pode deliberar, o que é de toda a justiça.
O Sr. António Mantas: - O Sr. Carvalho Mourão defendeu uma justa causa. Disse S. Exa. que os funcionários do Ministério de Instrução são uma excepção dos funcionários dos outros Ministérios. Depois de se ter feito a equiparação de vencimentos dos funcionários de todos os Ministérios, com excepção dos funcionários do Ministério de Instrução, e tendo-se ultimamente criado o Ministério do Trabalho, em que os seus funcionários ficam com o vencimento igual ao dos funcionários do Ministério das Finanças, é extraordinário que, ao apresentar-se o orçamento do Ministério de Instrução, não houvesse o bom senso de se propor que os funcionários dêste Ministério fossem equiparados aos dos outros Ministérios.
Esta flagrante injustiça é bem sensível, tanto mais quanto é certo que se faz no Ministério de Instrução uma economia de 105 contos.
Segundo dados que tenho para fazer a referida equiparação nesse Ministério, seriam necessários apenas 2.400$.
Isto é o que se chama uma verdadeira miséria, depois de se ter feito, repito, uma economia de 105.000$.
É com a maior justiça que os funcionários do Ministério de Instrução se sentem vexados pela ofensa que lhe fazem e ninguêm tem de estranhar que não trabalhem, com aquele carinho com que tem trabalhado, vendo que não são tratados com a consideração a que tem direito.
Apelo para a Câmara, e creio que ela certamente ouvirá êste meu justo apelo, e, no sentido de fazer a justiça referida, vou mandar para a Mesa uma proposta, esperando que a Câmara lhe dê o seu voto.
O orador não reviu.
A proposta é a seguinte:
Proposta
Proponho que das verbas eliminadas do orçamento do Ministério de Instrução Pública sejam destacados 2.400$ que serão aplicados à equiparação dos vencimentos aos dos funcionários dos outros Ministérios.- António Mantas.
O Sr. Presidente: - Vai ler-se para ser submetida à admissão a proposta mandada para a Mesa pelo Sr. António Mantas.
Leu-se.
O Sr. Vitorino Guimarães (sobre o modo de votar): - Sr. Presidente: quere parecer-me que a proposta apresentada pelo Sr. António Mantas nem sequer pode ser admitida à discussão e ainda menos aprovada por ser contrária às disposições da lei de 15 de Março de 1913, visto que trás aumento de despesa.
Se fôsse aprovada, seria necessário ir buscar verba para a por em execução, pois os saldos devem reverter para o Estado.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: - Em harmonia com as declarações feitas pelo Sr. Vitorino Guimarães, não pode ser submetida à admissão a proposta do Sr. António Mantas. Vai proceder-se à votação dos artigos relativos ao capítulo 2.°
Foram aprovados os artigos 2.°, 3.°, 4.°, 5.°, 6.° e 7.°
Entrou, em discussão o capítulo 3.°
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O Sr. Augusto Nobre: - Mando para a Mesa as seguintes
Propostas
Capítulo 3.°, artigo 13.°: Proponho que se reduza, na verba dos vencimentos correspondentes a lugares vagos, e que não podem ser providos, em virtude da execução da lei n.° 233, de 7 de Julho de 1914, 6.000$. - Augusto Nobre.
Capítulo 3.°, artigo 16.°: A comissão desiste da proposta constante do artigo 15.°, capítulo 3.°, relativa a material, etc., inscrita nas alterações propostas no orçamento da despesa.- O Deputado, Augusto Nobre.
O Sr. João de Deus Ramos: - Requeiro que entre em discussão juntamente com o artigo 13.° o projecto de lei que suspende por um ano a lei que reorganizou o ensino normal.
O Sr. Tavares Ferreira: - Sr. Presidente: com bastante surpresa vejo que no artigo 20.°, sob a rubrica de construções escolares, se inscreveu uma verba de 30 contos para a construção da Escola Machado de Castro. Nem sob o ponto de vista legal nem mesmo de necessidade esta verba deve estar incluída neste capítulo. Neste sentido mando para a Mesa uma proposta para que seja eliminada e para que á verba de 200 contos se dê o destino que a lei lhe manda dar.
O orador não reviu.
A proposta é a seguinte:
Proposta
Capítulo 3.°, artigo 20.°:
Proponho que se suprima a verba de 30.000$ destinados à Escola Industrial Machado de Castro inscrita no artigo 20.° do capítulo 3.° e que êste artigo fique assim redigido:
Subsídios para construções escolares:
[Ver tabela na imagem]
Subsídio anual à Associação das Escolas Móveis para construção e instalação de jardins escolas
Para outras construções escolares do ensino primário
Tavares Ferreira.
O Sr. Costa Júnior: - Sr. Presidente: devo declarar que estou perfeitamente de acôrdo com as declarações apresentadas pelo Sr. Deputado Tavares Ferreira, Efectivamente essa verba deve desaparecer dêsse capítulo.
Pedi a palavra especialmente para falar sôbre as escolas móveis.
Todo o pessoal das escolas móveis anda há tempo pedindo para que se lhe dê uma compensação, um subsídio relativo aos meses de Agosto e Setembro, de 25$.
O ano passado essa verba foi concedida a êsse pessoal, mas êste ano foi retirada do orçamento.
Desejava saber a razão por que essa verba desapareceu do orçamento, porque motivo se recusa dar subsídio aos professores das escolas móveis e se mantêm para um certo e determinado número de professores.
Era esta a pregunta que desejava fazer ao Sr. relator.
O orador não reviu.
O Sr. Medeiros Franco: - Sr. Presidente: vou mandar para a Mesa uma proposta de emenda ao artigo 19.° e que tem por fim reduzir a verba inscrita nesse artigo e destinada ao pagamento de despesas de expediente, limpeza e material das escolas móveis, e que seja inscrita no artigo 19.°-A do mesmo capítulo a verba de 240$ para trabalho extraordinário do amanuense que exerce as funções de secretário da inspecção das escolas móveis.
A proposta é a seguinte:
Proposta
Proponho que seja reduzida a verba inscrita no capítulo 3.°, artigo 19.°, da proposta orçamental do Ministério de Instrução Pública para o ano económico de 1916-1917, com aplicação ao pagamento das despesas de expediente, limpeza e material das escolas móveis, e que, sob a rubrica de "Abonos variáveis" das referidas escolas, seja inscrita no artigo 19.°-A, do mesmo capítulo a verba de 240$, destinada ao pagamento de trabalhos extraordinários desempenhados alêm das horas regulamentares pelo amanuense que exerce as funções de secretário da Inspecção das Escolas Móveis. - António de Medeiros franco.
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Creio que a Câmara pratica um acto de justiça aprovando esta proposta. O orador não reviu.
O Sr. Carvalho Mourão: - Afirma que um dos escândalos maiores que se tem produzido no actual regime é, sem dúvida, o que respeita ás escolas móveis. Tem documentos comprovativos da incapacidade absoluta dos professores chamados inscritos, de ensino livre, e, a seu ver, era melhor que as escolas estivessem fechadas que ser regidas por essa qualidade de professores. As escolas móveis só podem ser instaladas, por lei, em sítios onde não possam haver escolas fixas, mas o facto é que em Lisboa, Pôrto e outros pontos existem escolas móveis. O abuso é de tal ordem que em Mirandela um professor da escola móvel tinha por companheira uma mulher inscrita nos registos da polícia sanitária. É isto duma democracia honrada e nobre?! Em seguida faz mais algumas considerações, mostrando a necessidade que há em se reformar o ensino normal, criando-se um bom professorado, e declara não concordar com a proposta do Sr. João Deus Ramos. Terminando, manda para a Mesa a seguinte proposta:
Proponho que o Govêrno seja autorizado a distrair da verba inscrita no capítulo 3.°, artigo 18.° - Escolas móveis - a quantia necessária para se fazer nova instalação conveniente das novas escolas normais.- Carvalho Mourão.
O discurso será publicado na íntegra quando o orador restituir as notas taquigráficas.
O Sr. Azevedo Antas: - Sr. Presidente, pela reforma de instrução primária foram extintos os seis lugares de amanuenses dos comissariados, passando êsses funcionários a ficar adidos ás inspecções escolares criadas por essa reforma, com o vencimento anual de 200$, vencimento absolutamente insuficiente, com o qual nenhum indivíduo pode viver por mais modesto que seja.
Êsses amanuenses que ficaram adidos são apenas seis e alguns dêles exercem as funções de secretários das inspecções escolares. Aproveito a ocasião de estar no uso da palavra para mandar para a Mesa um projecto de lei para que os vencimentos dêsses amanuenses, quando exerçam as funções de secretários das inspecções escolares tenham o mesmo vencimento de 200$ e o correspondente vencimento de exercício dos lugares de amanuenses das inspecções escolares.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro das Finanças (Afonso Costa): - Sr. Presidente: pedi a palavra para declarar que não posso dar o meu voto às propostas apresentadas pelos Srs. Deputados Medeiros Franco e Azevedo Antas, visto implicarem aumento de despesa.
O Sr. Simões Raposo: - Pedi a palavra para mandar para a Mesa uma proposta eliminando uma verba e aumentando uma outra, dentro do mesmo capítulo e do mesmo artigo. Eu explico à Câmara o meu intuito.
Pela legislação de 1901 as professoras da escola anexa devem ser equiparadas nos seus vencimentos às professoras do ensino primário da terra onde esteja fixada a Escola Normal. Esta legislação foi esquecida e o que e facto é que as professoras da Escola Normal de Lisboa recebem uma quantia inferior àquele a que pela lei tem direito.
Dá-se o caso de em Portalegre ter falecido uma professora das respectivas escolas, estando por tanto o vencimento disponível. No orçamento a páginas 28 em que estão inscritos os ordenados dos professores diz-se o seguinte:
Leu.
Eu proponho a eliminação desta verba e que seja aumentado o ordenado das professoras da referida escola do seguinte modo, segundo a minha proposta:
Leu.
Pag. 24:
Lisboa - Escola anexa:
[Ver tabela na imagem]
Pag. 28:
Portalegre - Escola anexa, eliminar 380$. - Simões Raposo.
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Por esta minha proposta ha efectivamente um aumento de despesa, mas há tambêm uma diminuição pela eliminação do inscrição do vencimento da professora falecida, não se aumentando pois realmente a despesa.
Já que estou com a palavra, quero referir-me a um assunto que julgo da maior importância, como é a proposta mandada para a Mesa pelo Sr. João de Deus Ramos, dando assim a minha opinião sôbre o assunto.
Eu entendo que o que se está fazendo com respeito ao ensino normal é um crime de lesa pátria.
Não se pode melhorar a instrução primária sem primeiro organizar as escolas normais como cias devem ser, e nós estamos há cinco anos perdendo tempo, pois ninguêm poderá sustentar que seja possível conseguir uma boa instrução primária sem criar um instituto que produza professores á altura da sua missão.
Adiando por mais um ano a execução da respectiva lei, praticamos um êrro grave, pois que vamos negar a essas escolas normais os recursos para poderem satisfazer o seu fim.
Entrei no assunto tendo em consideração os altos interêsses da instrução nacional. Entendo que as escolas normais já deviam estar a funcionar. A reforma da instrução primária deve ser cuidadosamente aplicada pela instituição das escolas normais, tal como fora delineada. Essa reforma tem sido completamente esfacelada, principalmente nesse ponto. Se o que existia era mau, o que depois da República tem existido é cem vezes pior.
Tem-se adiado, constantemente, a resolução dêste problema, umas vezes por um motivo e outras vezes por outro. O que é facto é que a cinco anos da República se vem propor que, por mais um ano, se adie a resolução dêste problema. Êste ano a discussão dos orçamentos tem sido rápida, tem-se feito uma discussão própriamente de eliminação de verbas. Resumindo as minhas considerações, direi que o que simplesmente quero declarar é que o meu voto é contrário à proposta do Sr. João de Deus Ramos.
O orador não reviu.
O Sr. João de Deus Ramos: - Sr. Presidente: tenho a honra de pertencer à comissão nomeada pelo Sr. Ferreira Simas para proceder à regulamentação da lei que reorganizou o ensino normal e de pertencer tambêm à comissão instaladora da Escola Normal de Lisboa.
Numa das sessões realizadas apresentei uma proposta no sentido de que fôsse prorrogada por mais dois anos a lei que reorganizou o ensino normal.
Êste facto responde a qualquer hipótese que possa sugerir num espírito desprevenido relativamente ao intuito que haja na apresentação da minha proposta. Entendo que é indispensável e fundamental a organização das escolas normais para a transformação de todo o ensino primário, mas por isso mesmo acho que deve haver a maior meticulosidade na organização dessa escola.
A razão única que me levou a apresentar o projecto de lei que está em discussão foi essa e mais nenhuma.
Disse o Sr. Carvalho Mourão que da verba destinada ás escolas móveis se poderia tirar dinheiro para a instalação das novas escolas normais e argumentou contra as escolas móveis.
Não é a mim, mas ao Sr. Ministro de Instrução, que cabe responder-lhe, embora S. Exa. começasse as suas considerações por uma referencia especial à minha pessoa.
O Sr. Carvalho Mourão: - Creio que eu não fiz referências a V. Exa., mas ás escolas móveis.
O Orador: - V. Exa. dirigiu-se a mim a respeito das escolas móveis, e eu devo dizer-lhe que é ao Sr. Ministro que compete responder-lhe.
O Sr. Carvalho Mourão: - Eu dirigi-me a V. Exa., mas particularmente, o que é uma cousa diversa.
O Orador: - Mas V. Exa. disse que isso era um escândalo.
O Sr. Carvalho Mourão: - Disse e continuo a dizer: isso e um escândalo enorme.
O Orador: - É pena que V. Exa. não dissesse isso ao Sr. Ministro de Instrução e aos inspectores, para êles lhe provarem que V. Exa. acha uma má idea o que é uma obra tam útil.
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O Sr. Presidente: - Peço a V. Exa. a fineza de restringir as suas considerações.
O Orador: - Vou ser muito breve.
Ia eu dizendo, Sr. Presidente, que adiar por um ano a aplicação da lei que reorganiza o ensino normal não é prejudicar a lei, é proporcionar a sua boa execução.
A verba que devia ser paga ao pessoal passa a reforçar as escolas normais. O dinheiro é o mesmo, passando de pessoal para material.
Ainda outras considerações de ordem pedagógica eu podia apresentar, e bastantes.
Certamente que as escolas normais tem de funcionar em casas alugadas. É inevitável, principalmente numa ocasião tam especial como esta. Por isso, é que eu digo que devemos suspender a execução da lei. Por um ano, é para mim duvidoso.
Entretanto, precisamente no mesmo espírito em que está o Sr. Deputado Simões Raposo, para que o mais brevemente possível se comece a organizar a reforma das escolas normais, é que eu alvitrei a suspensão da execução da lei por aquele prazo.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Simões Raposo: - Sr. Presidente: as dificuldades que o Sr. João de Deus Ramos apresentou, para não se poder dar, desde Setembro de 1916, como estava afixado, execução à lei que reorganiza as escolas normais, são umas dificuldades perfeitamente de ordem material.
Parece-me que a Câmara, em vez de por mais um ano suspender a execução da lei, devia antes abreviar a instalação das escolas normais, que eu reputo absolutamente necessárias.
Acho um mau proceder adiar por mais tempo a execução da parte da reforma, do Govêrno Provisório, porque não é possível reformar a instrução primária sem reorganizar as escolas normais.
Nós estamos há cinco anos à espera e o Sr. João de Deus Ramos diz que mais um ano de suspensão ainda é uma hipótese.
A meu ver tem-se perdido muito tempo e, se se fizesse um inquérito, verificar-se hia que houve demoras absolutamente injustificáveis.
É esta a minha opinião.
Foi admitida a proposta enviada para a Mesa pelo Sr. Simões Raposo,
Foi rejeitada a proposta do Sr. Carvalho Mourão.
Foi aprovada a proposta do Sr. João de Deus líamos.
Foram aprovados os artigos 8.°, 11.° e 12.° do orçamento do Ministério de Instrução.
Leu-se a proposta enviada para a Mesa pelo Sr. Simões Raposo.
O Sr. Ministro das Finanças (Afonso Costa): - Sr. Presidente: eu ouvi atentamente ler a proposta do Sr. Simões Raposo e vejo que por ela se aumentariam os ordenados aos professores, na parte própriamente de categoria e exercício, embora se diminuíssem na parte relativa ao subsídio de renda de casa.
Parece-me que essa proposta, só sendo transformada em projecto de lei é que pode seguir os seus trâmites, por isso que vem aumentar o ordenado de categoria.
O Sr. Simões Raposo: - V. Exa., Sr. Ministro das Finanças, não estava presente quando eu justifiquei a apresentação desta proposta, que é baseada numa lei de 1901, que manda equiparar os vencimentos dos professores normais aos de instrução primária.
Essa legislação não tem estado em vigor e eu não proponho uma nova lei; mas a aplicação da legislação actual.
O Orador: - V. Exa. deve ter muita razão; mas a disposição do n.° 5.° da lei de 1907 diz o seguinte:
Leu.
É, portanto, inútil votar aqui uma proposta que aumente qualquer ordenado.
S. Exa. não reviu.
O Sr. Simões Raposo: - Não me parece que V. Exa. tenha razão.
Desde o momento em que a legislação de 1901, que está em vigor, determina que os vencimentos sejam equiparados, está perfeitamente dentro das funções do Parlamento o remediar-se uma injustiça, é não é preciso um projecto de lei para que os professores normais percebam ordenados iguais aos dos de instrução primária das localidades onde residem.
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Mas, como isso traz um aumento de despesa de mais de 220$, eu proponho a equiparação, tambêm fundado numa lei que manda que não sejam providos os lugares de professores das escolas anexas.
Ora, como está vago o lugar de professor da escola anexa de Portalegre, eu proponho que essa verba seja eliminada, e que seja aumentado o ordenado ao professor da escola anexa de Lisboa, cumprindo-se assim a lei em vigor.
O Sr. Ministro das Finanças (Afonso Costa): - A lei que ainda não foi aplicada, é porque algum defeito tem. Eu não posso aceitar essa proposta.
O Orador: - Em 11 de Outubro de 1901 foram aumentados os vencimentos dos professores das escolas normais, e é em harmonia com isso que eu faço a minha proposta.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro das Finanças (Afonso Costa): - Esse aumento foi decretado em 1901. É preciso que uma nova lei venha dizer que os aumentos de 1915 tambêm se aplicam aos professores das escolas anexas.
Foi rejeitada a proposta do Sr. Simões Raposo.
Foram aprovados os artigos 13.°, 14.º, 15.º e 16.º com o projecto de lei apresentado pelo Sr. João de Deus Ramos, ficando prejudicada a emenda da comissão.
Foram aprovados os artigos 17.°, 18.° e 19.º
Foi lida na Mesa a proposta do Sr. Tavares Ferreira, relativa ao artigo 20.°
O Sr. Augusto Nobre: - Sr. Presidente: pedi a palavra para declarar que a comissão não pode concordar com essa proposta, visto essa verba ser destinada à construção da Escola de Machado de Castro; alêm de que a lei não é bem clara, pois fala em escolas primárias e complementares.
O Sr. Ministro das Finanças (Afonso Costa): - Sr. Presidente: concordo com a parte da proposta que se refere à construção e instalação dos jardins-escolas, mas discordo absolutamente da segunda parte da proposta, na qual se elimina a verba destinada á construção do edifício para a Escola de Machado de Castro.
S. Exa. tem realmente razão em que as escolas primárias se espalhem por todo o país, mas isso não basta para se impedir a construção dessa escola industrial.
O Sr. Tavares Ferreira: - Mas é preciso notar que a verba de 200 contos é destinada únicamente à construção de escolas primárias.
O Orador: - A Escola de Machado de Castro, apesar de ser uma escola industrial, é uma escola complementar.
Requeiro, pois, que a proposta seja votada em duas partes.
S. Exa. não reviu.
Foram rejeitadas a 1.ª e 3.ª partes da proposta de eliminação do Sr. Tavares Ferreira, sendo aprovada a 2.ª
Foram aprovados: a emenda do parecer ao artigo 21.°; artigo 21.°, salva a emenda, e artigo 22.°
O Sr. Presidente: - Está em discussão o capítulo 4.°
O Sr. Ministro das Finanças (Afonso Costa): - Sr. Presidente: na sessão da tarde foi interrompida a discussão da proposta ligada ao orçamento das Finanças, relativa a empréstimos.
Parece-me que não há tempo para votar o orçamento do Ministério de Instrução; e se V. Exa. fôsse bastante amável, consultando a Câmara sôbre se ela permite que se discuta, no resto da sessão de hoje, a proposta de empréstimos, talvez ganhássemos algum tempo, ficando para amanhã o orçamento do Ministério de Instrução.
S. Exa. não reviu.
O Sr. Simões Raposo: - Sr. Presidente: eu não tenho dúvida nenhuma em votar o pedido do Sr. Ministro das Finanças; mas tenho de lembrar a V. Exa. que êste assunto foi retirado da discussão, da ordem em que estava, por V. Exa., parece-me, ter dito que o Sr. Ministro não podia comparecer no princípio da sessão.
Sôbre esta proposta estava inscrito um camarada meu, o ilustre Deputado Sr. Constâncio de Oliveira, que desejava fazer as suas considerações, não só em seu nome pessoal, como no do Partido Evolucionista.
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Como êsse meu colega não se encontra aqui presente, eu proferirei algumas curtas palavras a respeito da proposta, embora não possua a autoridade nem tenha o brilho que certamente seriam atributo do Sr. Constâncio de Oliveira, na discussão de assunto tam melindroso, se S. Exa. porventura aqui estivesse.
O orador não reviu.
Foi aprovado o requerimento do Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Costa Júnior: - Pelas considerações que hoje fez o Sr. José Barbosa, eu vi que os empréstimos que se projectam devem orçar aproximadamente em 100:432 contos e deve ser precisa, para a amortização e juros, a importância de 8:146.900$.
Ora eu desejava saber onde é que o Sr. Ministro das Finanças vai buscar esta receita para satisfazer aos encargos dos empréstimos, se nós temos no Orçamento um déficit de três mil e tantos contos.
O orador não reviu.
O Sr. Simões Raposo: - Sr. Presidente: vou ser muito breve nas minhas considerações, por isso que se trata dum assunto da mais alta importância, que é preciso ser tratado com muito cuidado, e eu não quero que as palavras que vou pronunciar tenham uma outra responsabilidade que não seja a pessoal, que eu lhes imprimo.
A proposta apresentada pelo Sr. Ministro das Finanças é de largo alcance e não é fácil a leigos como eu, apreciá-la a uma simples leitura e dela formar uma opinião verdadeiramente conscienciosa.
Se eu bem compreendi, a proposta é uma autorização ao Govêrno para contrair os empréstimos necessários para consolidar a dívida flutuante, aumentada pelas despesas da guerra.
Se essa operação não se puder realizar viria depois ao Parlamento buscar as devidas autorizações.
O Sr. António Macieira referiu-se às garantias em que se fala na proposta de lei, dizendo que devia realizar essas operações sem garantias dadas ao credor. Eu entendo que se deve realizar o empréstimo, porque me parece que é de alta importância para o país, mas desejava tambêm que não se concedessem garantias especiais, embora o empréstimo não possa ficar prejudicado.
Eu sei que o Sr. Afonso Costa há-de defender os interêsses do Estado, livrando-se da judiaria universal, porque, embora sejamos em tempo de guerra, é natural que ela continue em volta do Ministério das Finanças.
Vota esta proposta, como fazendo parte das largas autorizações concedidas ao Govêrno pela lei de 7 de Agosto de 1914.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro das Finanças (Afonso Costa): - Respondendo aos oradores que o precederam, diz que se não trata duma autorização vulgar concedida ao Govêrno, mas de usar da disposição que estabelece o n.º 4.° do artigo 26.° da Constituição. Trata se de fazer uma obra de patriotismo e de saneamento. Mostra que não é possível prever até que ponto a guerra poderá levar as nossas dificuldades financeiras e pregunta se já se calculou qual é o aumento da dívida pública da França, ou da Inglaterra, se a guerra durar até de 30 de Junho de 1917, e o que é preciso que aumente a receita anual da Inglaterra para que ela possa suportar o aumento do encargo da sua dívida pública até essa data. Calcula-se que os Estados aliados terão feito despesas de guerra na importância de 100 milhões de contos. Veja-se o que é êsse número colossal em relação ao encargo que representa anualmente e distribua-se pelos três povos grandes: a França, a Inglaterra e a Rússia, depois pela Itália, uma parte pelo Japão, depois pelos pequenos Estados que hão de precisar quem lhes facilite meios financeiros, e veja-se o que poderia ser a situação de todos os Estados, mesmo que a guerra termine em 30 de Junho de 1917 e tendo em vista que as despesas da guerra terão aumentado. A questão de indemnização de guerra é a solução dos países inexperientes. Imaginar que a Alemanha, a Áustria, a Bulgária e a Turquia possam dar uma indemnização correspondente a 100 milhões de contos, é imaginar o impossível, porque êsses países tambêm ficam - e depois de vencidos muito mais - esmagados de encargos da sua dívida, independentemente daqueles que vão encontrar e mais fácilmente então tomar-lhe as linhas dos seus caminhes de ferro, as receitas dos seus orçamentos, e não fazer caso das despesas do pagamento dos serviços do Estado.
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Seria incomportável, mas seria a lógica indemnização de guerra. O problema da taxa de juro de dívida pública, a distribuição de encargos do Estado terá uma remodelação profunda nos grandes países e depois, por reflexo natural, poderá ver-se aplicada automaticamente aos países vencidos e vencedores e trazer parte da solução do problema. Alguns países terão de dobrar os seus orçamentos e não lhes chegará, porque terão de fazer a reconstituição de povoações, de monumentos, de serviços, sobretudo a Franca.
Necessário é, pois, arranjar os meios financeiros para cobrir êsse excesso de despesa, e até o Sr. José Barbosa queria, para ver se o Govêrno lhe anunciava quais eram as suas medidas de fazenda, que o Govêrno pedisse a prolongação da sessão e que essas medidas viessem com a mesma simplicidade com que veio esta autorização. A isso responde que não há de pedir agora ao Parlamento que prolongue as suas sessões para conhecer as medidas de fazenda, porque o Govêrno ainda não as tem preparadas para as trazer ao Parlamento.
O Govêrno conhece a necessidade de aumentar as receitas públicas, e alguma cousa já tem feito, como sejam as sobretaxas sôbre a importação dalgumas mercadorias que aumentaram 2:000 contos. Desde Janeiro de 1914 tem o que pode chamar as suas pessoais propostas de fazenda, redigidas e prontas a entrar no Parlamento, largamente documentadas, actualizadas, anotadas e algumas já modificadas por motivo de carácter financeiro, que a guerra pôs em evidência. Não lhe faltam elementos, mas cada cousa precisa da sua hora, e a guerra há-de dar alguns ensinamentos até que venham essas medidas. Não se separa do direito, mesmo do dever, de pedir a convocação extraordinária do Congresso, para alguns aumentos de receita.
Há muita matéria especial que tem sido considerada, depois de iniciada a guerra, em outros países aliados, e que no nosso país precisa tambêm ser considerada, mas necessário é não esquecer que os novos impostos, excepto a contribuição predial e alguns outros, estão por emquanto em situação anárquica o precisam duma profunda remodelação, duma transformação completa. Nos outros países, uns tinham já essa remodelação, como a Inglaterra, e mesmo a Alemanha, de modo que os seus aumentos caem, sem perturbação, sôbre elementos de vida perfeitamente organizados.
Em Franca, o próprio imposto geral de rendimento foi pôsto em execução parcialmente, em plena guerra, com atenuações e restrições, mas foi considerado como susceptível de poder aumentar-se no campo onde seja possível, sem prejuízo da vida social e da economia do país; em Portugal há falta de elementos e terá de fazer-se a colheita máxima de receita, sem prejudicar ou anular fontes de receita que são mais necessárias do que nunca.
Tem procurado apurar, em relação a cada ramo da, vida financeira, onde é que o Estado pode intervir, quais os problemas a que pode trazer modificações, quais os sistemas em vigor, com os quais o Estado pode chamar a atenção do Parlamento, e quando tudo isso constituir corpo suficientemente firme para dar produtividade bastante larga ou durante a guerra, ou no intervalo das sessões, ou no seu período ordinário, consoante as condições da guerra, e da vida financeira geral, o Govêrno cumprirá êsse dever.
Não tem nenhum receio, tem mesmo a convicção de que o país precisa encontrar um grande apoio do Estado para tirar da guerra a contra partida que ela contêm, para depois dela se refazer e progredir sob os pontos de vista económico, colonial, da nossa agricultura, da nossa indústria.
Pelo seu estudo do problema, pode afirmar que o país tem condições, sem perturbação das fontes de vida nacional, de aumentar os meios necessários e suficientes para cobrir e pagar os encargos de juros e amortização, não apenas de 135:000 contos, mas de 200:000 que a guerra nos possa levar.
Acabada a guerra, ou ainda durante ela, poderão ser aumentadas as nossas receitas; e, terminada que seja, podemos organizarmos de modo que possamos, com as despesas normais, ir com todos os encargos da dívida pública, ainda que vão para 200:000 contos efectivos.
São estas as palavras que correspondem às suas propostas, conquanto não se trate de quantia tamanha, nem toma em conta a parte que ao país deve pertencer nas indemnizações de guerra, pela razões que expôs.
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Porque não deve o Ministro das Finanças fazer os seus cálculos senão pelas circunstâncias de ordem geral e permanente do país, está seguro de que todos viverão o bastante, não para ver o que das consequências da guerra pode resultar, mas sente que se pode dizer que, por maior que fôsse o esforço da República desde 1910, se continuaria num quási marasmo, tam estéril tinha sido a administração monárquica, tam desprezadas estavam as colónias, tanto entregue ao acaso a economia interna que, à quelque chose malheur est bon, precisamente porque a guerra nos chamou a uma situação em que nos tínhamos de definir e de nos afirmar, precisamente porque vem completar a necessidade de definição que a raça portuguesa trazia desde tam long-e, e se tinha afirmado por esforços titânicos, como o ultimatum de 1890, essa luta contra o aniquilamento a que nos levavam os administradores da monarquia, depois das tentativas para libertar da morte que nos decretara a monarquia, depois do estabelecimento da República, depois de tanta realização de idealismos; tudo isso precisava um complemento, esperava um rugido mais forte e mais vivo, uma transformação mais profunda e veio a guerra tamanha, de tal grandeza para todo o Universo que, quando a História, passado um século, mais tarde, se fizer e fôr separar as idades antigas das modernas serão bem mesquinhos os factos que separam as idades em comparação daqueles em que tomámos parte e que separaram o mundo em que pôde criar-se êsse monstro constituído pelos impérios centrais e os povos idealistas e progressivos, que são a França, a Inglaterra, a Itália e Portugal.
Quando se vir o que foi essa hora, ver-se há que foi triste, mas que foi feliz, porque deu1 á luz um Portugal novo, a humanidade nova deu-lhe ocasião de ressurgir, de caminhar, fixando um momento solene em que êle teria oportunidade de mostrar as qualidades eminentes da nossa raça, continuando a obra do passado, melhorando-a numa aspiração de raça tam sublimada, tam grande, tam elevada tam civilizadora.
Não faz o elogio da guerra, mas dentro dela, porque existe e nós a temos, e com ela caminhamos pelo único caminho do qual ninguêm terá forças para sair, se não querendo que o país se suicide, havemos de percorrê-lo, certos do cumprimento dum dever, com a aspiração dos que querem evitar, para a sua raça, para a sua Pátria, a lembrança de que o sofrimento é insignificante em comparação com a grandeza que vamos legar aos nossos filhos, aos nossos sucessores, ao Portugal novo.
O discurso será publicado na íntegra quando o orador restituir as notas taquigráficas.
O Sr. José Barbosa: - As últimas palavras do Sr. Ministro das Finanças obrigam-o a dizer que S. Exa. não respondeu a alguém que tivesse perdido a fé, mas a alguém que, como S. Exa., foi sempre republicano e sempre patriota. Tambêm tem fé; tambêm crê que o país e a República tem um destino e hão-de cumpri-lo; mas porque é assim queria que S. Exa., Ministro das Finanças dum país em guerra, lhe dissesse a que fontes de receita vai buscar recursos para fazer face aos encargos novos.
Nos outros países para cada encargo novo é criada a receita e, ainda há pouco, o Ministro das Finanças da Inglaterra declarava que o Govêrno inglês não hesitaria diante dos maiores sacrifícios de dinheiro e que só tinha um recurso para fazer face aos encargos: o imposto, e a êle se recorreria constantemente.
Quando preguntou ao Sr. Ministro das Finanças onde iria buscar receita para fazer face aos novos encargos, quais as medidas de fazenda com que ia regular a situação financeira não queria colocar S. Exa. na situação de estabelecer medidas definitivas; a guerra fôrça a medidas provisórias e essas são tomadas em todos os países. Mr. Ribot não há muito que no Parlamento Francês declarou que o próprio imposto sôbre o rendimento não era a fórmula definitiva do imposto e o Sr. Ministro das Finanças acaba de repetir que êsse imposto não está executado duma maneira definitiva.
Há porêm uma cousa para a qual um Estado bem administrado não pode encontrar desculpa: é aumentar os encargos e tirar dos novos encargos recursos para lhes fazer face. Tirar recursos do crédito é mau sistema financeiro e tanto a Franca como a Inglaterra procuram evitá-lo porque é um verdadeiro círculo vicioso.
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Certamente, porque êle, orador, se não fez bem compreender, o Sr. Ministro das Finanças fez uma ligeira confusão quanto à forma de realização do seu empréstimo. Não disse que S. Exa. tencionava fazer um empréstimo único, mas que ia fazer uma operação de crédito ou um empréstimo por séries, visto que o fundo que se vai criar é uma dívida fundada amortizável.
Quis dizer que S. Exa. ia pedir ao país, aproximadamente, 135:000 contos numa série de empréstimos, dispensando duas verbas de que não há vantagem alguma em fazer a consolidação - 27:000 contos do Banco de Portugal e 10:000 contos da Caixa Gerai de Depósitos.
Fixando a nota da capitação portuguesa, está provado que há tempo de dar emprego a uma quantia que oscile entre 8:000 e 10:000 contos; ficariam 85:000 contos a obter pela transformação dos bilhetes da dívida flutuante em títulos da nova dívida fundada de 6 por cento, o que representa um encargo novo de 5:100 contos.
Preguntava, então, a que forma de imposto ia S. Exa. pedir êsse acréscimo, porque sabendo que se seguira o critério da progressividade, não acha, contudo, bastante seguir êsse critério para se avaliar, por exemplo, o que seria a contribuição industrial, porque a sua incidência é péssima e não há quem possa compreender que situação, alêm do hábito, sustenta até hoje essa contribuição.
Entende que no actual momento não devemos estar de braços cruzados a imaginar que não podem criar-se indústrias, desenvolver-se o comércio e que não pode fomentar-se tudo quanto seja riqueza do país. Nos países em que os efeitos da guerra mais se sentem, não se hesita diante dos problemas industrial e comercial.
Neste mesmo momento, a França selecciona os produtos que importa, que não deve importar ou que pode deixar de importar. É preciso não perder de vista a delicadeza do problema duma transformação duma contribuição, quando nenhum inquérito pode estabelecer um critério seguro para o lançamento dos impostos porque se desconhece as indústrias que progridem e as que definham. O Sr. Ministro das Finanças adoptou o sistema deplorável de aceitar as despesas impostas por uma situação a que já não podemos fugir e de satisfazer os aumentos dos encargos resultantes dessa situação r por meio de novos recursos ao crédito. É contra êste sistema que deseja que fique lavrado o seu protesto. Acha que tem sido um êrro grave protelar a apresentação das medidas de fomento, e classifica de intolerável a vida de expediente em que se vive, relativamente a matéria financeira. Ninguêm sabe o que o Sr. Ministro das Finanças tem nos seus planos de finanças, e um belo dia surge com essas medidas e impõe-nas ao país.
O Sr. Ministro das Finanças (Afonso Costa): - Virá ao Congresso.
O Orador: - Nesse dia não sabe se o país receberá as medidas, como as receberia se porventura tivessem sido largamente experimentadas e emendadas. Tambêm não vê aplicar o dinheiro que o Estado dispende, por forma a proporcionar um aumento de riqueza capaz de dar base de tributo para fazer face aos encargos contraídos.
O discurso será publicado na íntegra quando o orador restituir as notas taquigráficas.
O Sr. Barbosa de Magalhães: - Toda a Câmara teve a satisfação de ouvir as claras explicações que o Sr. Ministro das Finanças deu sôbre a actual situação financeira do país e de admirar mais uma vez a energia de S. Exa. e o seu grande amor patriótico.
Eu desejaria que a maioria apresentasse um requerimento para que o discurso de S. Exa. fôsse mandado imprimir e distribuir, mas como isso traz aumento de despesa, a maioria tomava sôbre si o encargo de custear essa despesa.
A maioria, Sr. Presidente, confia no grande talento de S. Exa. e no glorioso destino da Pátria Portuguesa.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro das Finanças (Afonso Costa): - Não podia deixar de pedir a palavra para agradecer ao Sr. Barbosa de Magalhães as palavras elogiosas que me dirigiu.
Não há necessidade de afixar discursos, mas que a nossa acção corresponda ao sentimento patriótico que ditam as palavras
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de todos. Os portugueses cada vez se unem mais no cumprimento dos deveres que esta hora grave e severa a todos incumbe.
O debate que se fez a propósito das medidas financeiras, há-de levar a todo o país o sentimento duma confiança profunda nos destinos da Pátria Portuguesa, e para isso todos contribuem embora colocados em campos diversos.
Eu nunca me esquecerei do tempo em que todos os republicanos trabalharem juntos para levar a efeito a gloriosa revolução de 5 de Outubro.
Posso assegurar ao Parlamento que o Govêrno está disposto a encarar o problema financeiro com todas as consequências que êle comporte. A minha proposta é simplesmente destinada a realizar despesas de guerra, e não a fazer face a novos empréstimos ou a tomar encargos de empréstimos anteriores.
Se o país está pronto a cumprir todos os deveres que a guerra comporta, tambêm deve estar pronto, no ponto de vista financeiro, a cumprir, pelo alargamento dos impostos, todos os deveres que, por causa da guerra, resultem para todos os cidadãos. (Apoiados).
S. Exa. não reviu.
É aprovada, na generalidade e na especialidade, a proposta do Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Presidente: - A próxima sessão é hoje, â hora regimental, com a seguinte ordem do dia:
Primeira parte:
Parecer n.° 302-K, orçamento do Ministério de Instrução Pública.
Parecer n.° 302-M, orçamento do Ministério das Colónias.
Parecer n.° 312-1, orçamento do Ministério da Marinha:
Segunda parte:
Parece n.º 402, sôbre o estabelecimento da Indústria siderúrgica em Portugal.
Parecer n.° 462, sôbre os exames de bacharéis da Faculdade de Letras.
Parecer n.° 473, modificando a lei de expropriação por utilidade pública.
Pareceres n.ºs 412, 430 e 459, reconhecendo revolucionários civis.
Está encerrada a sessão.
Era 1 hora e 55 minutos.
Documentos mandados para a Mesa durante a sessão
Pareceres
Da comissão de finanças, sôbre o projecto de lei n.° 72-F, do Sr. Bernardo de Almeida Lucas, isentando do sêlo alguns registos dos articulados, sentença e acórdãos.
Para a Secretaria.
Da comissão de finanças, sôbre o projecto de lei n.° 478-L, do Sr. Francisco de Sales Ramos da Costa, autorizando o Govêrno a nacionalizar a manufactura dos livrinhos de papel para fumar.
Para a Secretaria.
Da comissão de finanças, sôbre o projecto de lei n.° 332-G, dos Srs. João Pereira Bastos e Alfredo Sá Cardoso, alterando a organização e regulamento dos serviços de Instrução Militar Preparatória.
Para a Secretaria.
Requerimentos
Requeiro que, pelo Ministério da Justiça, me seja fornecida cópia do processo de sindicância feita aos actos do ex-delegado da comarca de Castelo Branco, Cândido Pedro Viterbo ou, no caso de impossibilidade de a fornecer com brevidade, me seja facultado o exame do mesmo processo.- O Deputado, Gastão Correia Mendes.
Para a Secretaria.
Requeiro que me sejam fornecidas as seguintes publicações:
Do Ministério das Colónias: Mousinho de Albuquerque, Eduardo Costa e Paiva Couceiro.
Do Ministério do Fomento:
Le Portugal au point de vue agricole.
Le Portugal Vinicole.
Livros mandados fazer para a Exposição Universal de Paris de 1900.- Sérgio Tarouca.
Últimas redacções
Do projecto de lei n.° 302-G, fixando as despesas do Ministério do Trabalho e Previdência Social para 1916-1917.
Do projecto de lei n.° 302-b, fixando as despesas e calculando as receitas dos serviços dos correios e telégrafos, para o ano de 1916-1917.
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Do projecto de lei n.° 302-J, fixando as despesas e calculando as receitas da exploração do Pôrto de Lisboa para 1916-1917.
Do projecto de lei n.° 475, regulando as acções em execução, propostas nos tribunais ordinários acêrca de bens inventariados em obediência à Lei da Separação.
Do projecto de lei n.° 302-N, fixando as despesas e calculando as receitas dos Caminhos de Ferro do Estado de 1916-1917.
Do projecto de lei n.° 365, dando faculdade ao Govêrno, durante o prazo de 12 meses para mudar paróquias civis, criar concelhos e paróquias, mudar as sedes dos concelhos e suprimir concelhos e paróquias em designados casos.
Dispensadas as leituras.
Remeta-se ao Senado.
O REDACTOR - Herculano Nunes.