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REPÚBLICA PORTUGUESA

DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS

SESSÃO N.º 12

EM 10 DE JANEIRO DE 1919

Presidência do Exmo. Sr. José Nunes da Ponte

Secretários os Exmos. Srs.

Francisco dos Santos Rompana
João Calado Rodrigues

Sumário. - Respondem à chamada 72 Srs. Deputados, que aprovam a acta sem discussão. Procede-se à leitura do expediente, que tem o devido destino. O Govêrno está representado pelos Srs. Presidenta do Ministério e Ministro do Interior (Tamagnini Barbosa), Ministro da Justiça (Francisco Fernandes), Ministro das Finanças (Malheiro Reimão) e Ministro dos Abastecimentos (Cruz Azevedo).

Antes da ordem do dia. - O Sr. Camilo Castelo Branco pede informações sôbre os acontecimentos ocorridos na Régua e em Vila Rial. O Sr. Carvalho da Silva deseja tratar em negócio urgente do estado da divida flutuante. A Câmara aprova a urgência. O Sr. Avelino Mendes requer e a contraprova e invoca o § 2.º do artigo 116.º A urgência é aprovada por 60 votos contra 12. O Sr. Carvalho da Silva trata do negócio urgente, preguntando se está errada, desde 1916 até hoje, a nota da divida flutuante. O Sr. Presidente do Ministério responde ao Sr. Camilo Castelo Branco. O Sr. Ministro das Finanças responde ao Sr. Carvalho da Silva, dizendo que nem o Govêrno nem a República tem culpa de estarem erradas as notas da divida flutuante. O Sr. Correia Monteiro manda para a Mesa dois projectos de lei. O Sr. Alberto Navarro pede que à Câmara Municipal de Paredes seja restituído um dinheiro que ela depositou para compra de milho. O Sr. Ministro dos Abastecimentos declara não conhecer o assunto, mas promete imediatas providências. O Ar. Almeida Pires deseja interrogar o Sr. Ministro da Agricultura na próxima sessão.

Ordem do dia. - O Sr. Presidente refere-se com palavras de pesar à morte do Sr. Roosevelt. Associam-se às suas palavras os Srs. Presidente do Ministério, Aires de Ornelas, Almeida Pires, Pinheiro Tôrres e Avelino Mendes que recorda o falecimento do jornalista republicano, Sr. Gregário Fernandes. O Sr. Presidente encerra a sessão, marcando a seguinte para a próxima segunda feira, com a respectiva ordem do dia.

Srs. Deputados presentes à abertura da sessão.

Adelino Lopes da Cunha Mendes.
Adriano Marcelino de Almeida Pires.
Aires de Ornelas e Vasconcelos.
Albano Augusto Nogueira de Sousa.
Alberto Castro Pereira de Almeida Navarro.
Alberto Dinis da Fonseca.
Alberto Malta de Mira Mendes.
Alberto Pinheiro Tôrres.
Alberto de Sebes Pedro de Sá e Melo.
Alfredo Augusto Cunhal Júnior.
Alfredo Pinto Lelo.
Alfredo Machado.
Alfredo Pimenta.
Álvaro Miranda Pinto de Vasconcelos.
Amâncio de Alpoim Toresano Moreno.
António Martins de Andrade Velez.
Aníbal de Andrade Soares.
António Augusto Pereira Teixeira de Vasconcelos.
António Duarte Silva.
António Ferreira Cabral Pais do Amaral.
António Hintze Ribeiro.
António Lino Neto.
António Luís da Costa Metelo Júnior.
António Maria de Sousa Sardinha.
António dos Santos Cidrais.
António dos Santos Jorge.
António Tavares da Silva Júnior.
Armando Gastão de Miranda e Sousa.
Artur Mendes de Magalhães.
Artur Proença Duarte.

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Artur Virgínio de Brito Carralho da Silva.
Camilo Castelo Branco.
Carlos José de Oliveira.
Domingos Ferreira Martinho de Magalhães.
Duarte Manuel de Andrade Albuquerque Bettencourt.
Duarte de Melo Ponces de Carvalho.
Eduardo Dario da Costa Cabral.
Eduardo Fernandes de Oliveira.
Eduardo Fialho da Silva Sarmento.
Eugénio Maria da Fonseca Araújo.
Eurico Máximo Carneira Coelho e Sousa.
Fernando Cortes Pizarro do Sampaio e Melo.
Fernando de Simas Xavier de Basto.
Francisco de Almeida Eivar Weinholtz.
Francisco Joaquim Fernandes.
Francisco José Lemos de Mendonça.
Francisco José da Rocha Martins.
Francisco Maria Cristiano Solano de Almeida.
Francisco Miranda da Costa. Lobo.
Francisco dos Santos Rompana.
Francisco Xavier Estives.
Jerónimo do Couto Rosado.
João Baptista de Araújo.
João Calado Rodrigues.
João Henrique de Oliveira Moreira de Almeida.
João Henriques Pinheiro.
João José de Miranda.
João Tamagnini de Sousa Barbosa.
Joaquim Crisóstomo da Silveira Júnior.
Joaquim Faria Correia Monteiro.
Joaquim Isidro dos Reis.
Joaquim Nunes Mexia.
José Adriano Pequito Rebelo.
José de Almeida Correia.
José Augusto de Melo Vieira.
José Augusto Moreira de Almeida.
José Cabral Caldeira do Amaral.
José Caetano Lobo de Ávila da Silva Lima.
José Feliciano da Costa Júnior.
José de Figueiredo Trigueiros Frazão (Visconde do Sardoal).
José Jaciiito de Andrade Albuquerque Bettencourt.
José João Pinto da Cruz Azevedo.
José de Lagrange e Silva.
José Luís dos Santos Moita.
José Novais de Carvalho Soares do Medeiros.
José Nunes da Ponte.
José de Sucena.
José Vicente do Freitas.
Luís Nóbrega de Lima.
Manuel Ferreira Viegas Júnior.
Manuel José Pinto Osório.
Manuel Maria de Lencastre Ferrão de Castelo Branco. (Conde de Arrochela).
Mário Mesquita.
Maurício Armando Martins Costa.
Miguel de Abreu.
Pedro Joaquim Fazenda.
Pedro Sanches Navarro.
Serafim Joaquim de Morais Júnior.
Silvério Abranches Barbosa.
Vasco Fernando de Sousa e Melo.
Ventura Malheiro Reimão.

Não compareceram à sessão os Srs.:

Abílio Adriano Campos Monteiro.
Afonso José Maldonado.
Alberto da Silva Pais.
Alexandre José Botelho de Vasconcelos e Sá.
Alfredo Marques Teixeira, do Azevedo.
António de Almeida Garrett.
António Bernardino Ferreira.
António Caetano de Abreu Freire Egas Moniz.
António Caetano Celorico Gil.
António Faria Carneiro Pacheco.
António Luís de Sousa Sobrinho.
António Miguel de Sousa Fernandes.
António de Sousa Horta Sarmento Osório.
António Teles de Vasconcelos.
Artur Augusto de Figueiroa Rêgo.
Carlos Alberto Barbosa.
Carlos Henrique Lebre.
Domingos Garcia Pulido.
Eduardo Augusto de Almeida.
Eduardo Mascarenhas Valdez Pinto da Cunha.
Egas de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral.
Eugénio de Barros Soares Branco.
Fidelino de Sousa Figueiredo.
Francisco Aires de Abreu.
Francisco António da Cruz Amante.
Francisco da Fonseca Pinheiro Guimarães.
Francisco de Sousa Gomes Veloso.
Francisco Pinto.da Cunha Liai.
Gabriel José dos Santos.
Gaspar de Abreu e Lima.

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Henrique Ventura Forbes Bessa.
João Baptista de Almeida Arez.
João Monteiro de Castro.
João Ruela Ramos.
Joaquim Madureira.
Joaquim Saldanha.
Jorge Augusto Botelho Moniz.
Jorge Couceiro da Costa.
José Alfredo Mendes de Magalhães.
José Augusto Simas Machado.
José de Azevedo Castelo Branco.
José Carlos da Maia.
José Eugénio Teixeira.
José Féria Dordio Teotónio.
José das Neves Lial.
Justino de Campos Cardoso.
Luís Ferreira de Figueiredo.
Luís Filipe de Castro (D.) (Conde de Nova Goa).
Luís Monteiro Nunes da Ponte.
Manuel Pires Vaz Bravo Júnior.
Manuel Rebelo Moniz.
Martinho Nobre de Melo.
Miguel Crespo.
Pedro Augusto Pinto da Fonseca Botelho Neves.
Rui de Andrade.
Tomás de Aquino de Almeida Garrett.
Vítor Pacheco Mendes.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.

Eram 15 horas.

Fez-se à chamada.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 72 Srs. Deputados. Está aberta a sessão.

Eram 15 horas e 30 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai ler-se a acta.

Foi lida e aprovada.

Em seguida deu-se conta do seguinte

Pedido de licença

Peço a V. Exa. que consulte a Câmara sôbre se me autoriza a ir ao estrangeiro por sessenta dias. - Miguel de Abreu.

Foi concedida.

Oficio

Da junta da freguesia de Vale Maior, enviando cópia da acta da comissão da janta, pedindo autorização; para alienar os terrenos baldios necessários para a construção dum novo cemitério.

Para a comissão de administração pública.

Comunicação

Do Sr. Deputado Cunha Liai, comunicando que, por motivo de doença grave, não pode comparecer à sessão e pede a comparência do Sr- Presidente na próxima sessão a fim de interpelar S. Exa. sôbre os motivos que determinaram as acusações indirectas que lhe foram dirigidas.

O Sr. Presidente: - Está aberta a inscrição para antes da ordem do dia.

Inscreveram-se vários Srs. Deputados.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Camilo Castelo Branco.

O Sr. Camilo Castelo Branco: - Sr. Presidente: as considerações que eu vou apresentar à Câmara obrigam-me a desejar a presença do Sr. Presidente do Ministério.

Uma voz: - S. Exa. está presente.

O Orador: - Agora vejo que S. Exa. está ocupando a sua cadeira.

Sr. Presidente: as considerações que vou fazer referem-se ao incidente surgido no distrito que eu tenho a honra de representar aqui nesta casa do Parlamento.

Há dois dias, quando o Sr. Tamagnini Barbosa fez a apresentação do Govêrno a que preside, à Câmara dos Deputados, perante a qual eu estou falando, S. Exa. tez uma resumida história dos acontecimentos que precederam a constituição do segundo Ministério constitucional da presidência do Sr. almirante Canto e Castro: e, Sr. Presidente, S. Exa., fazendo essa história, detalhou à Câmara a forma como havia procurado resistir, à imposição, duma grande maioria do exército português e como só tinha visto forçado a solucionar o conflito procurando uma plataforma, conciliatória. Nesse mesmo discurso, que S. Exa. terminou com a declaração de que o seu lema é: "República e Pátria", o Sr. Tamagnini Barbosa mostrou como tinha tratado do defender a República contra a vontade do exército português.

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Isto está na ordem de ideas do lema enunciado por S. Exa. no final do seu discurso.

Mas eu permito-me preguntar por intermédio de V. Exa., ao Sr. Presidente do Ministério, e com que autoridade, por que motivo, S. Exa., durante vinte amargos dias, teve o país inteiro na mais dolorosa espectiva da guerra civil?

Não foi, decerto, por vaidade ou ambição pessoal; - faço a justiça de crer que o Sr. Tamagnini Barbosa saberia subjugar Ossos sentimentos, olhando ao bem do país - não foi, certamente, o princípio da defesa da República, pois ou não acredito que se possa pôr a República antes da Pátria.

Então porque foi?

Foi - disse-nos S. Exa. - por respeito ao princípio da continuação da obra do Sr. Sidónio Pais.

Ora eu ainda, até hoje, não vi definido o que seja a obra do Dr. Sidónio Pais.

Politicamente, a, obra de Sidónio Pais foi o exercício do poder pessoal, e para fazer o exercício do poder pessoal Pm qualquer país, em qualquer parto do mundo, é necessário ter um grande prestígio que, nestes últimos oito anos de República, apenas o teve o Dr. Sidónio Pais.

Para fazer o exercício do poder pessoal como Sidónio Pais o fez e disse, é necessário ter atrás de si a opinião unânime do povo.

Por consequência, melhor teria andado o Sr. Presidente do Ministério vendo logo na primeira hora que, acima das ideas da defesa da República e acima de qualquer possível idea de ambições pessoais, está o bem do país.

Foi S. Exa. atacado, rudemente, por alguns Srs. Deputados; foi preguntado ao Sr. Presidente do Ministério porque foi que não castigou a manifestação dos militares das juntas do norte.

Não soube, porque não quis o Sr. Presidente do Ministério, responder ao Sr. Deputado Cunha Lial, quando êle lhe preguntou a razão porque estiveram presos no Pôrto vários oficiais e o Sr. Deputado Serafim Morais; não soube porque não quis dizer que êsses oficiais e o Sr. Deputado Machado, que foi a Braga, tinham sido enviados pelo Sr. Presidente do Ministério nessa obra de minar o que era uma justíssima reivindicação do exército, ao qual, emquanto viveu o Dr. Sidónio Pais, toda a população do país deveu estar sossegada era suas casas, graças às vigílias dêsse exército português. (Apoiados).

Estas considerações, Sr. Presidente, vêm a propósito de acontecimentos graves, de que tenho apenas informações imprecisas, mas do que o Sr. Presidente do Ministério mo poderá dar esclarecimentos e à Câmara.

Consta-me que na vila da Régua fôrças que se pretendiam dizer representantes da República velha, em nome dessa República, destituíram as autoridades que até ali...

O Sr. Adelino Mendes (interrompendo): - Foi o que fizeram as autoridades monárquicas no Pôrto.

O Orador: Sr. Presidente: continuando nas minhas considerações, tenho a declarar à Câmara que me honro muito bom usa apartes que mo fazem; no emtanto, acho que é uma simples norma dum princípio, pelo menos de ordem...

O Sr. Adelino Mendes: - Peço desculpa a S. Exa.

O Sr. Presidente: - Peço ao Sr. Deputado Adelino Mendes a fineza de não interromper o orador. Se S. Exa. deseja falar, o melhor é pedir a palavra.

O Orador: - Aproveitando a ocasião para responder ao Sr. Deputado Adelino Mendes, tenho a dizer que as autoridades que estavam no Pôrto na ocasião em que foi morto o Dr. Sidónio Pais são as que ainda hoje lá estão.

O Sr. Adelino Mendes: - Já foram demitidas.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (Tamagnini Barbosa): - Apoiado.

Trocam-se vários apartes.

O Orador: - Peço aos meus ilustres colegas desta Câmara, por intermédio de V. Exa., Sr. Presidente, que quando me

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queiram interromper o façam pedindo-me licença. (Apoiados). Apartes.

O Orador: - Continuando nas considerações que estava fazendo, eu tenho a dizer que várias fôrças que estavam na Régua destituíram as autoridades republicanas ali colocadas pelo Govêrno da República na Vila da Régua e Vila Rial. Tenho informações imprecisas, mas o Sr. Presidente do Ministério dará informações precisas à Câmara sôbre o facto de terem ainda essas mesmas fôrças necessidade de ir a Vila Rial e aí, depois de oito horas de canhoneio, restabeleceram a ordem, repondo no seu lugar as autoridades que tinham sido destituídas.

Pergunto pois ao Sr. Presidente do Ministério quais são as medidas que vai tomar contra êsses perturbadores da ordem pública, contra êsses indivíduos que se atreveram a destituir as autoridades, sendo necessário que ilustres oficiais do exército, aqui alcunhados de desordeiros, fossem a Vila Rial restabelecer a ordem.

Aproveito a ocasião para, por intermédio de V. Exa., Sr. Presidente, preguntar ao Sr. Presidente do Ministério a significação duma frase aqui pronunciada e em que S. Exa. resume o seu programa quando se quere referir à pacificação da família portuguesa.

É uma frase como outras que têm sido aqui pronunciadas; mas eu pregunto se a pacificação da família portuguesa é permitir que todos os crimes praticados em Portugal, que são conhecidos, fiquem e continuem impunes. Pregunto se S. Exa. entende por essa pacificação: as autoridades de Vila Rial não saberem cumprir os seus deveres e abandonarem os seus lugares, e fôrças militares praticarem actos de opressão sôbre essa população sendo necessário que outras fôrças restabelecessem a ordem.

Quando S. Exa. tratava de organizar o actual Ministério que apresentou à Câmara houve pessoas ponderadas, chamadas para ser ouvidas, que lhe mostraram que era patriótico recolher os conselhos e aproveitar as indicações sobretudo as do exército.

Só o Sr. Castro Lopes com os assomos da sua- indomável bravura natural entendeu o contrário.

É preciso que o Sr. Presidente do ministério reflita.

O Sr. Adelino Mendes: - Sr. Presidente, o ilustre orador está falando há mais de 10 minutos, e, por consequência, infringindo o Regimento.

O Sr. Presidente: - Peço a V. Exa. que restrinja as suas considerações. Há vários oradores inscritos.

O Orador: - Eu não sei se já passaram os 10 minutos que o Regimento me concede, mas nesse tempo está incluído aquele que o Sr. Adelino Mendes falou. S. Exa. falou tanto e por tantas vezes. (Apoiados).

De resto eu devo dizer que além do Regimento havia normas nesta casa que davam margem a falar-se em assuntos de interêsse, sem se estar a contar o tempo.

O Sr. Adelino Mendes: - V. Exa. consulta a Câmara, e eu serei um dos que aprovarei para V. Exa. continuar a falar.

O Orador: - Não tenho de consultar a Câmara, pois vou terminar, não preciso falar muito para dizer bastante, para dizer tudo o que desejo. O Sr. Adelino Mendes fica com o resto do tempo, com toda a sessão, com todo o dia para falar à vontade.

O Sr. Presidente: - O Sr. Carvalho da Silva pediu a palavra para o seguinte negócio urgente:

Foi lido na Mesa o seguinte requerimento:

Requerimento

Tendo o Sr. Presidente do Ministério declarado ontem no Senado que não podia por agora publicar-se uma nota com o estado da dívida flutuante porque se tinha descoberto que essa nota estava errada desde 1916, tendo esta declaração a maior gravidade, requeiro a V. Exa. se digno consultar a Câmara sôbre se, como assunto urgente, posso tratar dêste caso na sessão de hoje. - O Deputado, Artur Carvalho da Silva.

O Sr. Presidente: - Está aprovada a urgência.

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O Sr. Adelino Mendes: - Requeiro a contraprova, com a declaração de quantos aprovaram e rejeitaram.

Procede-se à contraprova.

O Sr. Presidente: - Rejeitaram a urgência 12 Srs. Deputados e aprovaram 60.

O Sr. Artur Carvalho da Silva: - Agradeço, em primeiro lugar, à Câmara o ter aprovado a urgência para eu usar da palavra, pelo que me diz respeito pessoalmente, emquanto reconheça que se a Câmara achou urgente o assunto é porque sabe que nenhuma questão de maior importância e gravidade pode haver para o nosso país.

Todos os dias, nesta Câmara, se tem tratado da defesa da República e de se saber quem é bom republicano e pode servir a República, e até o Sr. Presidente do Ministério não se esqueceu de declarar que a sua divisa é "República" e depois "Pátria". Pois eu direi a S. Exa. que quem tenha um pouco de consciência do estudo financeiro que atravessa o nosso país deve, primeiro do que tudo, ter por divisa tratar da administração do país e da fiscalização das contas do Estado.

O que se não diria antes de 1910, quando os paladinos da República nos comícios se não cansavam de desacreditar os homens do regime, se um Presidente do Ministério viesse ao Parlamento dizer que a nota da dívida flutuante não podia ser publicada, porque desde certa data estava errada, estava falsificada? (Apoiados).

Bem sei que o Govêrno não é culpado desta situação.

O Sr. Carlos de Oliveira: - É porque antes de 1910 nenhum Ministro tinha a coragem de fazer essa afirmação, embora as notas da dívida flutuante fossem falsificadas.

O Orador: - Ninguém se importa com administração pública, e quando na Câmara se levanta alguém, para tratar dêsse assunto, todos o interrompem.

Apartes.

Peço o favor de me não interromperem, porque êste assunto deve ser tratado sem paixão, mas com serenidade. - É uma questão grave de administração do Estado.

Depois de 1910 tem-se tratado de tudo no Parlamento, menos da questão financeira.

Sabe V. Exa. o espectáculo vergonhoso que a partir de 1910 tem oferecido a discussão dos orçamentos do Estado. Depois de se tratar de tudo, quando chegava próximo o dia 30 de Junho, em que era indispensável votar-se o Orçamento, é que êles se discutiam de noite, à pressa, estando os Srs. Deputados o Senadores a dormir nas bancadas.

No Parlamento do uma cousa só se tratava, sendo a divisa da República - aumentar espantosamente os impostos. Disso é que se tratava, e não de prestar contas ao país da administração dos dinheiros públicos.

Muitas vezes, antes de 1910, se acusou a monarquia de esbanjar os dinheiros públicos; todavia, se compararmos os orçamentos da monarquia com os da República, ver-se há quam vergonhosa é a administração da República, relativamente à administração da monarquia.

Não é com palavras, é com factos, com números, que havemos do comparar a administração monárquica com a administração republicana.

Eu bem sei que não é o actual Govêrno o responsável; a responsabilidade é dos Governos que em 5 de Dezembro foram depostos pela revolução libertadora.

Interrupção do Sr. Deputado Maurício Costa, que não foi ouvida.

O Orador: - Eu julgo mais útil para o país tratar dêstes assuntos, que são da máxima importância, que de inquéritos à maçonaria.

O Sr. Presidente: - Eu peço a V. Exa. a fineza de se restringir ao assunto urgente para que lhe foi concedida a palavra.

O Orador: - Eu estou tratando do assunto obedecendo a uma preocupação, qual é a de não querer culpar êste Govêrno dessas faltas, e é curioso que seja a maioria que não queira que eu assim fale.

Eu estou a dizer que a culpa dessa vergonha é dos Governos da União Sa-

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grada, que apresentaram falsos superavit.

O Sr. Presidente: - Peço novamente a V. Exa. a fineza de restringir as suas considerações, porque há ainda outros oradores inscritos.

O Orador: - Visto que V. Exa. e a Câmara não querem que essas cousas sejam aqui ditas, ou limito-me a preguntar ao Sr. Presidente do Ministério se é verdade, como S. Exa. ontem disse no Senado, estar errada a nota da dívida flutuante desde 1916.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (Tamagnini Barbosa): - Pedi a palavra para responder às preguntas do Sr. Deputado Camilo Castelo Branco, que se referem a alterações da ordem pública, porque ao Sr. Carvalho da Silva responderá o Sr. Ministro das Finanças.

Disse o Sr. Camilo Castelo Branco que eu tinha agora adoptado como lema República e Pátria, em vez de Pátria e República, que eu sempre segui. E S. Exa. foi o primeiro a reconhecer que na solução do conflito eu não pus a República acima da Pátria.

O que eu disse não significa que eu ponha em primeiro lugar a minha qualidade de republicano para depois cuidar da de português.

Depois das declarações do Sr. D. Manuel de Bragança, aqui repetidas pelo leader da minoria monárquica, Sr. Aires de Ornelas, de que não era o momento próprio para se tratar da mudança de instituições, eu não posso também esquecer o que me incumbe: Pátria primeiro e regime depois.

Respondida à primeira parte, pregunto quais os crimes praticados na Régua e quem são os criminosos, pois ignoro-o.

S. Exa., que diz que houve crimes praticados na Régua, decerto os conhece e não terá dúvida em declarar quais êles são.

Eu devo dizer o seguinte:

Tenho informações, que já tornei públicas no Senado, que alguma cousa de anormal se passou em Vila Rial antes de se conhecerem no país os resultados do entendimento ou plataforma que se estabeleceu para o acordo entre as juntas militares e o Govêrno o devo dizer a V. Exa., Sr. Presidente, que o que sei é apenas através de informações transmitidas por estações que não são de Vila Rial.

Sei também que alguns funcionários que transmitiram estas, informações não merecem inteira confiança.

Não houve autoridades destituídas, pois todas ôlas declararam que só deviam obediência ao Govêrno.

As fôrças não se concentraram para marchar contra o Pôrto, porque o Govêrno não quereria as responsabilidades duma guerra civil. Mas o que o Govêrno não podia, quaisquer que fossem as circunstâncias, era ficar numa- atitude que pudesse ser tomada como cobardia. Não se compreenderia que, se alguém disparasse contra êle, êle não mandasse disparar.

Sr. Presidente: o que sucedeu foi que fôrças marcharam contra as fôrças reunidas na Régua.

Apartes.

Segundo várias informações, não houve colisão alguma. O que houve foi adesão às juntas militares duma parte e o desejo de só obedecer às ordens do Govêrno da outra parte.

O comandante da divisão de Vila Rial declarou que pedia a sua demissão e foi-lhe ordenado que fizesse a entrega, do comando ao oficial mais graduado da sua divisão.

Êsse comando foi entregue, dando-se fôrça às autoridades.

Não tenho informações até a data de que fôrças procedessem contra Vila Rial.

O que se passou foi antes de se tornar conhecida a resolução do conflito.

Portanto, Sr. Presidente, tudo isto deve ser levado à conta de conflitos travados ainda por se supor que a situação era a mesma que antes do solucionado o conflito. Porventura criaturas mais briosas, criaturas que com mais relutância tivessem de fazer a sua adesão às juntas militares, quisessem reagir contra as juntas; daí o choque das duas fôrças. Se estas conhecessem que o Govêrno estava constituído, que as juntas estavam dissolvidas, que tudo se havia resolvido de acordo, eu estou convencido que fôsse quem fôsse que estivesse a comandar tropas ou

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à testa da divisão de Vila Rial, êsse alguém não quereria iniciar um novo conflito e provocar novas perturbações no país.

Logo que tive conhecimento dêste telegrama, que me foi levado em mão própria pelo Sr. Ministro do Comércio, eu imediatamente expedi um telegrama ao Sr. governador civil de Vila Rial e comandante militar de Vila Rial, dizendo:

Leu.

Ao mesmo tempo que isto fazia, um novo telegrama-circular mandei a todos os governadores civis, onde dizia o seguinte:

Leu.

Eu mandei exercer essa censura postal o telegráfica visto que ela estava nas mãos dos membros das juntas nas localidades onde tinham a sua acção e enviei êsse telegrama para evitar mais perturbações, mais confusões, para evitar mais intrigas, que foram a causa única do que ia sucedendo no país, o que era uma catástrofe para todos nós.

Sr. Presidente: creio ter dado todas as explicações que me foram pedidas pelo Sr. Camilo Castelo Branco, devendo declarar mais que logo que tenha conhecimento do qualquer informação sôbre os acontecimentos do Vila Rial eu imediatamente a transmitirei à Câmara, como é meu dever.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro das Finanças (Malheiro Reimão): - Sr. Presidente: pedi a palavra para responder às considerações feitas pelo Sr. Carvalho da Silva. Todavia, antes de entrar propriamente na questão de que S. Exa. se ocupou, devo declarar que o Govêrno aceitou a urgência para o assunto relativo à administração do Estado, mas devo declarar também que se o Govêrno soubesse do uso que o Sr. Carvalho da Silva ia fazer da urgência não a tinha aprovado.

Vozes da direita: - Porque?! Porquê?!...

O Orador: - Porque S. Exa. limitou a duas palavras a pregunta que quis fazer e gastando todo o tempo em falar na questão política, atacando...

Vozes da direita: - Ora essa?! S. Exa. julga que devemos pedir licença ao Govêrno para falar?! A Câmara é que reconhece ou não as urgências dos assuntos. Nunca se viu semelhante coisa. É extraordinário!

O Orador: - Falo com toda a sinceridade. Os Deputados que são membros do Govêrno reconhecem a urgência por se tratar duma questão de administração, mas se soubesse que se ia levantar uma questão política não teria reconhecido a urgência!

Vozes da direita: - O Govêrno não tem nada com as questões que os Deputados levantam, sejam ou não políticas! Apoiado! Apoiado! É extraordinário!

Vozes da esquerda: - Ordem, ordem! Então não deixam falar o Ministro?!

O Orador: - Sôbre a questão para a qual a Câmara reconheceu a urgência tenho a declarar que nem o Govêrno nem a República tem culpa do que se passou...

Vozes da direita: - Então quem foi? Fomos nós?!...

O Orador: - S. Exas. deixam-me explicar, ou não?

Os mapas da dívida flutuante, devido aos transtornos causados pela guerra, chegaram do estrangeiro fora do tempo. No Ministério das Finanças organizaram-se os mapas com os documentos que havia. Verificou-se depois que as contas não estavam certas, devido simplesmente às dificuldades de transporte que há. Então, o Sr. Presidente do Ministério e todo o Govêrno entenderam que não valia a pena trazer contas erradas, devendo rectificar-se as que estavam feitas. (Apoiados).

Querem tornar o Govêrno responsável por isto?

Por aqui termino as minhas considerações, julgando que expliquei suficientemente à Câmara o que houve sôbre o assunto.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem.

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O Sr. Correia Monteiro: - Sr. Presidente: tendo-me V. Exa. dado há pouco a palavra para depois ma retirar a fim de a conceder ao Sr. Carvalho da Silva, e como é meu costume submeter-me às decisões da Mesa, limitei o meu protesto às palavras que por essa ocasião disso.

Vamos, pois, ao assunto para que me inscrevi.

Por decreto de 29 de Maio de 1907 foram os vencimentos dos empregados das Secretarias da Presidência das Relações e das Procuradorias da República equiparados aos vencimentos dos empregados do Ministério da Justiça e dos Cultos. Em 25 de Dezembro de 1914 os decretos n.ºs 1:105 e 1:185 aumentaram os vencimentos dos empregados dos Ministérios, que novamente foram aumentados em 29 de Novembro de 1918 pelo decreto n.° 5:021, ficando o pessoal das Relações e das Procuradorias da República numa manifesta desigualdade perante os empregados do Ministério da Justiça.

Para obviar a êsse inconveniente o legislador, pelo decreto de 8 de Maio de 1918, equiparou para todos os efeitos legais os empregados das Relações e das Procuradorias aos empregados do Ministério da Justiça, mas arranjou maneira de que essa equiparação não servisse para os vencimentos.

Para obviar a isto tenho a honra de mandar para a Mesa um projecto de lei.

Aproveito também o ensejo para apresentar outro projecto de lei sôbre a reorganização dos serviços do campo entrincheirado.

Terminando, Sr. Presidente, devo fazer uma observação. Muitos Deputados, quando se trata de questões políticas, estão com uma atenção extraordinária, ao passo que, quando se trata de assuntos importantes, a sua atenção deixa muito a desejar.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Alberto Navarro, mas previno S. Exa. de que faltam pouco minutos para se entrar na ordem.

O Sr. Alberto Navarro: - Conforme o número de minutos assim desejarei falar ou não...

O Sr. Presidente: - Faltam cinco minutos.

O Sr. Alberto Navarro: - Chega-me êsse tempo.

Sr. Presidente: o assunto para que pedi a palavra refere-se à pasta das Subsistências.

O caso é muito simples. Em Junho do ano passado o Ministro das Subsistências declarou à Câmara Municipal de Paredes que tinha à sua disposição 20:000 quilogramas de milho colonial que chegariam a Lisboa no Moçambique, ao preço de $13(0) cada quilograma, e ordenava à Câmara que depositasse 2.720$ para pagamento dêsse milho.

Êsse depósito fez-se, mas o milho nunca chegou.

A Câmara tem requerido mais de uma vez, e do Ministério têm respondido que não chegou ainda a oportunidade de resolver.

Há seis meses, portanto, que a Câmara está sem receber o milho, e sem a quantia que depositou.

Requereu ultimamente que, visto não lhe enviarem o cereal, lhe permitisse o levantamento do dinheiro que tinha depositado. Nem uma cousa nem outra foi deferida.

Como representante dos povos daquele concelho peço a V. Exa. que, informando-se do caso, dê as necessárias providências, ordenando que a Câmara possa levantar o dinheiro que de facto lhe pertence, visto que não recebeu o cereal que tinha pago, a requisição do Ministério das Subsistências, e, caso V. Exa. queira, posso fornecer-lhe toda a documentação que diz respeito ao assunto, era cópia, é claro.

Já que estou com a palavra, vou referir-me a outro assunto que diz respeito à pasta das Finanças, e que eu tratei aqui quando ainda era Secretário de Estado dessa pasta o Sr. Tamagnini Barbosa.

O caso é o seguinte: tendo S. Exa. declarado em nome do Govêrno do que faria parte que não exerceria funções legislativas no que dizia respeito a assuntos tributários, a assuntos financeiros, o que é certo é que pela pasta das Finanças se tem publicado vários decretos contendo matéria que diz respeito a contribuição de registo. S. Exa. declarou então que me responderia oportunamente. Tran-

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sitou, porém, de pasta e até hoje não me respondeu cousa alguma.

Renovo hoje as minhas preguntas ao actual Ministro das Finanças, esperando que S. Exa. me responda.

O orador não reviu.

O Sr. Cruz Azevedo (Ministro dos Abastecimentos e Transportes Marítimos): - Pedi a palavra para declarar que não conheço o assunto. Prometo, Aporem, a S. Exa. que hoje mesmo, à noite, tratarei do caso, e, ou o milho ou o dinheiro, serão entregues. E caso a Câmara Municipal do Paredes tenha grande necessidade do milho, posso cedê-lo porque tenho bastante.

O orador não reviu.

O Sr. Alberto Navarro: - O que a Câmara pede, e já há dois meses tornou a requerer, é que lhe seja entregue o dinheiro.

O Sr. Moreira de Almeida: - Podia a palavra para mandar para a Mesa um requerimento que corro pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros.

O Sr. Adelino Mendes: - Mando para a Mesa um requerimento e um projecto de lei.

O Sr. Almeida Pires: - É para V. Exa., Sr. Presidente, fazer sciente o Sr. Ministro da Agricultura de que desejo tratar dum assunto da sua pasta, esperando que S. Exa. compareça na próxima sessão.

O Sr. Presidente: - Anuncio que vai entrar-se na ordem do dia.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - A Mesa desta Câmara foi ontem dolorosamente surpreendida pela notícia do falecimento do ilustre cidadão americano Teodoro Roosevelt, antigo Presidente da República; personalidade eminente, que mareou nm lugar de destaque não se entre os seus concidadãos de maior valor e prestígio, mas ainda entre os de todas as nações civilizadas, já pelas qualidades superiores do sen carácter o talento, já sobretudo pelo esfôrço de actividade e energia que punha sempre na defesa de todas as causas em que havia um princípio de moral ou justiça a reivindicar.

E para que a homenagem devida à sua memória seja condigna dos seus altos merecimentos e possa significar ao mesmo tempo a funda e cordeal simpatia que a nação portuguesa consagra de há muito à grande e nobre República Norte-Americana, julguei do meu dever aguardar a presença do Govêrno nesta Câmara, certo do que êle desejaria associar-se de bom grado a todas as manifestações do pezar, com que a Câmara julgasse oportuno acentuar a participação que toma no luto que contrista hoje a grande nação amiga.

Alêm de que a hora que passa não é só de luto para o povo americano, é de luto também para todas as nações aliadas, que jamais poderão esquecer-se que foi êle o grande cidadão norte-americano um dos primeiros homens do Estado que ergueu a sua voz potente e generosa, logo no início dessa guerra tremenda que ensaguentou por mais de quatro anos a terra e o mar, em favor do direito contra a fôrça, da justiça contra a iniquidade e da liberdade contra a opressão.

E a sua propaganda vingou felizmente, e êle, o glorioso extinto, teve a fortuna de ver a sua humanitária aspiração coroada da mais retumbante vitória de que reza a história e entrou finalmente no repouso eterno o misterioso da morte com a consoladera satisfação de ter cumprido um nobre e glorioso dever de humanidade.

Deixando ao cuidado da Câmara qualquer indicação que sôbre êste assunto julgue oportuno comunicar-me, desde já proponho que se exare na acta um voto de fundo pezar pela perda de tam insigne benemérito, reservando-me- a satisfação de o fazer comunicar ao ilustre representante daquele país, bem como à Câmara dos Deputados, e de encerrar logo em seguida a sessão em homenagem à sua para sempre saudosa memória.

O Sr. Presidente do Ministério (Tamagnini Barbosa): - Sr. Presidente: pedi a palavra para me associar ao voto de sentimento proposto por V. Exa. pelo falecimento do antigo Presidente da República Americana, Roosevelt.

Sr. Presidente: associo-me a essa manifestação de pezar, em nome de todo o

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Govêrno, recordando quam brilhante foi a acção dêsse ilustre homem de Estado, dêsse devotado republicano, prestando as nossas homenagens à nação americana nossa aliada, nesta guerra tremenda contra os impérios centrais.

Nesta manifestação traduzo mais uma vez as simpatias do Grovêrno por essa nação, demonstrando-lhe quanto nós sofremos quando ela sofre, ao mesmo tempo que muito nos alegramos quando ela se alegra.

O orador não reviu.

O Sr. Aires de Ornelas: - Sr. Presidente : faço uso da palavra para me associar, em nome da minoria monárquica, à manifestação de sentimento por V. Exa. proposta pelo falecimento de Roosevelt, dêsse grande homem de Estado que foi Presidente da República Americana. Roosevelt fica na história como o primeiro que fez enveredar a República Americana naquela senda gloriosa que Wilson levou tam longe. Êle foi o primeiro que entendeu dever afirmar e demonstrar que a política americana não tinha apenas por âmbito o continente americano, seguindo a antiga doutrina de Monroe.

Devemos dizer que toda a política wilsoneana esteve em germe na atitude de Roosevelt.

Nós não podemos, em virtude da acção tam importante e tamanha que a América desempenhou na guerra contra os impérios centrais, esquecer a obra de Roosevelt, sendo daqueles que mais convenceu o povo americano do que o seu interêsse estava do lado dos aliados. Nestas circunstâncias é perfeitamente justificável que a minoria monárquica, pela minha voz, acompanhe a Câmara neste voto de sentimento.

O orador não reviu.

O Sr. Almeida Pires: - Sr. Presidente: pedi a palavra para me associar, em nome da maioria parlamentar, ao voto de sentimento proposto por V. Exa., pela morte do Roosevelt. Êle deixou um passado brilhantíssimo e patriótico e foi a encarnação do ideal da democracia americana. Roosevelt deu ao mundo uma prova de liberdade, preparando a América para a luta, a fim de mais fàcilmente se vencerem os impérios centrais.

E por isso, Sr. Presidente, que a maioria parlamentar se associa ao voto de sentimento, prestando as suas profundas homenagens à memória de Roosevelt e à República norte-americana.

O orador não reviu.

O Sr. Pinheiro Tôrres: - Sr. Presidente: já na sessão de ontem, depois de me ter associado ao voto de sentimento pela morte de Olavo Bilac, prestei as minhas homenagens à memória de Roosevelt. Mas, sendo informado por V. Exa. de que o Govêrno devia acompanhar esta consagração à singular figura de Roosevelt, reservei-me para, na sessão de hoje, mais largamente me referir a êsse grande homem de Estado.

Com efeito Roosevelt merece não só a nossa admiração, mas, o que é mais, a nossa simpatia. Individualidade singular, por vezes contraditória na aparência, êle foi sempre grande, em todas as manifestações da sua vida intelectual e social.

Como professor foi eminente; como escritor deixou seis ou sete livros, cheios duma eloquência sóbria, feita de ideas e de pensamentos superiores.

Como homem dó acção êle foi prodigioso. A sua actividade e o seu poder de combatividade tornaram-no uma verdadeira potência.

Êle descansava desta actividade, fazendo as suas famosas caçadas em África, ecoando ainda há pouco na Europa que êle tinha descoberto um rio no interior do Brasil.

Patriota devotado, êle serviu a sua Pátria como homem de Estado e como soldado.

Ninguém desconhece que êle combateu heroicamente na guerra de Cuba, como coronel, regressando ao seu país coberto de glória.

Quando esteve à frente do comissariado de Nova York, que começou a sua acção por morigerar os costumes sociais e políticos dessa grande cidade.

Como Presidente da República iniciou a política de engrandecimento, de imperialismo, sendo sou sonho a extensão do domínio económico e político no Pacífico.

Vem a pêlo recordar a sua intervenção para se efectivar a paz entre a Rússia e o Japão, e ainda para completar a sua personalidade deve dizer-se que êste ho-

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mem do luta foi um extraordinário amigo do povo. Não poderemos esquecer ainda que foi êle que recebeu, num dos últimos anos, o prémio Nobel. Foi dos maiores apologistas da entrada dos Estados Unidos na guerra.

Ainda sob o ponto de vista especial, como representante da minoria católica, deixem-me V. Exa., que preste homenagem à forma respeitosa como êle tratou sempre a igreja nos Estados Unidos, prestando culto a essa fôrça disciplinadora o educadora.

É por todos estes motivos que me associo ao luto dos Estados Unidos e a Câmara não me levará a mal que eu saúde o representante actual dêsse país, Wilson, que tam extraordinária acção está desempenhando e que ainda há pouco acabou de fazer uma visita cheia de alto significado ao Pontífice romano, indicando assim que êle não pode ser excluído da Conferência da Paz, sem uma injustiça que revoltaria a consciência do mundo.

Em volta destas considerações, honrando a memória do Roosevelt, saúdo os Estados Unidos e entusiásticamente presto homenagem ao seu estorço e à sua acção enérgica em prol do direito e da justiça.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Adelino Mendes: - Sr. Presidente: a figura extraordinária de Roosevelt acaba de ter nesta Câmara a consagração que lhe era devida, pondo-se em destaque a sua fé ardentíssima nos destinos da sua Pátria e o entusiasmo inexcedível com que êle pregou e aconselhou a entrada dos Estados Unidos na guerra.

Era fácil dizer cousas várias sôbre Roosevelt.

Dispenso-me disso, porque pouco ou nada poderia acrescentar àquilo que os oradores procedentes já disseram.

Mas, Sr. Presidente, se prestamos homenagem aos estrangeiros ilustres, que a morte arrebatou, entendo que o Parlamento português também alguma cousa deve aos portugueses, republicanos e patriotas, que a morte também fez desaparecer.

Hoje mesmo os jornais trouxeram a notícia do falecimento dum antigo republicano, que apezar de não ter desempenhado na política dêste puís um grande e inesquecível papel, foi um grande carácter e um honestíssimo combatente.

Foi, alêm disso, um jornalista e um jornalista, republicano e um cronista parlamentar dos mais distintos.

Sem do maneira nenhuma querer elevar à categoria de imortal êste meu amigo, vou propor que se lance na acta um voto de sentimento pela morte do Gregório Fernandes, e estou convencido de que, prestando à sua memória esta homenagem, todos concordarão com ela e a aplaudirão sinceramente.

O Sr. Presidente: - A Mesa ainda não chegou a comunicação dêsse falecimento.

Alem disso a sessão de hoje é consagrada à homenagem a Roosevelt.

Na primeira sessão eu proporei que a Câmara manifeste o seu pezar pela morte do Sr. Gregório Fernandes.

O Sr. Presidente: - Vou encerrar a sessão.

Amanhã há trabalhos em comissões.

A próxima sessão é na segunda feira, com a seguinte ordem do dia: discussão do projecto n.° 17 e do parecer n.° 19.

Está encerrada a sessão.

Eram 16 horas e 45 minutos.

Documentos mandados para a Mesa durante a sessão

Projectos de lei

Da comissão revisora da Constituição, sôbre a Constituição Política da República Portuguesa.

A imprimir.

Do Sr. Adelino Mendes o mais nove Srs. Deputados, concedendo uma pensão a D. Luísa Rosa Pereira de Magalhães.

Para o "Diário do Governo".

Do Sr. Maurício Costa e mais onze Srs. Deputados, mandando cessar todo o procedimento judicial ou disciplinar sôbre delitos políticos, abuso de liberdade de pensamento o infracção disciplinar dos regulamentos militares ou civis.

Para o "Diário do Governo".

Do Sr. Artur Mendes de Magalhães, autorizando o Govêrno a modificar a or-

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ganização do campo entrincheirado de Lisboa e das tropas que o guarnecem. Para o "Diário do Governo".

Do Sr. Correia Monteiro, estabelecendo os vencimentos ao pessoal das secretarias das presidências das Relações do continente e das Procuradorias da República.

Para o "Diário do Governo".

Parecer

Da comissão de finanças, criando o lugar de chefe da secção do arquivo do Congresso, sôbre uma proposta das Mesas e comissão administrativa.

A imprimir com urgência.

Requerimentos

Renovando o requerimento feito na sessão de 13 de Dezembro último em confirmação dó que enviei para a Mesa na sessão legislativa anterior, requeiro que com a máxima urgência me seja enviada, pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros, cópia do processo relativo à demissão, em 1912, do chefe de missão Constâncio Roque da Costa, a qual foi mandada anular por acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, ainda hoje não promulgada.

Declaro que preciso dêste documento para me ocupar do assunto em aviso prévio ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, o qual desde já lhe anuncio nos termos e para os efeitos do Regimento. - J. Moreira de Almeida.

Mandou-se expedir.

Requeiro, pelo Ministério da Instrução Pública, cópia dos processos de sindicâncias feitas à Biblioteca Nacional de Lisboa pelo Sr. António Sérgio e pelo Sr. Fidelino de Figueiredo, actual director da mesma Biblioteca.

Requeiro ainda, pelo mesmo Ministério, cópia da sindicância, inquérito ou cousa parecida às obras do novo edifício do Conservatório de Lisboa, com a nota exacta de todas as despesas até hoje efectuadas com as mesmas obras.

Mais requeiro, pelo Ministério da Instrução Pública e pelo Ministério do Comércio, nota exacta e clara de todas as despesas abonadas ou autorizadas em favor do Bureau de Renseignements que a Sociedade Propaganda de Portugal instalou ou vai instalar em Paris à custa do Estado e doutras entidades, sem que o Parlamento haja autorizado quaisquer verbas destinadas a sustentar semelhante instituição, de cujos resultados há razões mais fundamentadas para duvidar.

Requeiro ainda, pelo Ministério do Comércio todos os documentos e esclarecimentos que me habilitem a julgar da necessidade e oportunidade da missão de que foi encarregado, para a desempenhar em França, um vogal do Conselho de Turismo. - Adelino Mendes.

Mandou-se expedir.

O REDACTOR - Herculano Nunes.

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