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REPÚBLICA PORTUGUESA

DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS

SESSÃO N.º 60

EM 14 DE OUTUBRO DE 1919

Presidência do Exmo. Sr. Domingos Leite Pereira

Secretários os Exmos. Srs.

Baltasar de Almeida Teixeira
José Maria de Campos Melo

Sumário. - Respondem à chamada 49 Srs. Deputados. Declara-se aberta a sessão e é lida a acta. - Procede-se a segunda chamada, porque sendo o quorum de 60, se verifica não haver número para aprovar a acta, por se encontrarem presentes apenas 58 Srs. Deputados. - Havendo número regimental, é aprovada a acta sem discussão. - Dá-se conta do expediente.-É admitida uma proposta do Sr. Brito Camacho referente aos pedidos de renúncia.

Antes da ordem do dia. - Mandam propostas de lei os Srs. Ministro da Marinha (Rocha e Canha), do Comércio (Ernesto Navarro) e da Guerra (Helder Ribeiro). - O Sr. Pedro Pita requere que entre em discussão o parecer n." 75, referente ao subsidio aos membros do Parlamento. O requerimento é aprovado, depois de considerações produzidas pelos Srs. Júlio Martins, Jorge Nunes e pelo Sr. Deputado requerente. O parecer é aprovado na generalidade, tendo usado da palavra os Srs. Nuno Simões, Jorge Nunes, Raúl Tamagnini, Júlio Martins e Dias da Silva. Passando-se à especialidade, a discussão fica pendente para a sessão seguinte, antes da "ordem do dia".

Ordem do dia. - Os Srs. António Granjo, pelo Partido Republicano Liberal, e o Sr. Júlio Martins pelo partido Republicano Popular, definem a sua atitude perante o Govêrno. O Sr. António Fonseca responde ao Sr. Granjo. O Sr. Dias da Silva refere-se principalmente à questão ferroviária e à prisão de menores sindicalistas. O Sr. Presidente do Ministério (Sá Cardoso) faz declarações em, nome do Govêrno e o Sr. Ministro da Justiça (Lopes Cardoso) responde ao Sr. Deputado socialista. Ainda usam da palavra sôbre o assunto os Srs. Júlio Martins, Jorge Nunes e Presidente do Ministério.

Antes de encerrar a sessão. - O Sr. Dias da Silva troca explicações com o Sr. Presidente sôbre o preenchimento de vagas no funcionalismo do Congresso.

Documentos mondados para a Mesa. - Projectos de lei. - Propostas de lei. -Parecer. - Nota de interpelação. - Declarações de voto. - Requerimentos.

Abertura da sessão às 15 horas e 15 minutos.

Presentes à sessão 33 Srs. Deputados.

São os seguintes:

Acácio António Camacho Lopes Cardoso.
Alberto Ferreira Vidal.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
Amílcar da Silva Ramada Curto.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio e Maia.
António Alberto Charula Pessanha.
António Albino Marques de Azevedo.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Bastos Pereira.
António da Costa Ferreira.
António da Costa Godinho do Amaral.
António Francisco Pereira.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António Joaquim Granjo.
António José Pereira.
António Lobo de Aboim Inglês.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Augusto Dias da Silva.
Augusto Pires do Vale.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.

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2 Diário da Câmara dos Deputados

Domingos Cruz.
Domingos Frias de Sampaio e Melo.
Domingos Leite Pereira.
Eduardo Alfredo de Sousa.
Estêvão da Cunha Pimentel.
Evaristo Luís das Neves Ferreira de Carvalho.
Francisco Alberto da Costa Cabral.
Francisco da Cruz.
Francisco José Pereira.
Francisco de Pina Esteves Lopes.
Hermano José de Medeiros.
Jaime Júlio de Sousa.
João Cardoso Moniz Bacelar.
João Luís Ricardo.
João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.
Jorge do Vasconcelos Nunes.
José António da Costa Júnior.
José Garcia da Costa.
José Maria de Campos Melo.
José Maria de Vilhena Barbosa de Magalhães.
José Mendes Nunes Loureiro.
Júlio Augusto da Cruz.
Júlio do Patrocínio Martins.
Ladislau Estêvão da Silva Batalha.
Luís Augusto Pinto de Mesquita Carvalho.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Manuel José da Silva.
Manuel José da Silva.
Manuel Alegre.
Nuno Simões.
Pedro Góis Pita.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Raúl António Tamagnini de Miranda Barbosa.
Raúl Lelo Portela.
Tomás de Sousa Rosa.
Vasco Borges.
Vergílio da Conceição Costa.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Afonso de Melo Pinto Veloso.
António Aresta Branco.
Francisco da Cunha Rêgo Chaves.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
João José da Conceição Camoesas.
João Pereira Bastos.
Joaquim José de Oliveira.
José Gregório de Almeida.
José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.
Luís de Ornelas Nóbrega Quintal.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.

Srs. Deputados que não compareceram à sessão:

Abílio Correia da Silva Marçal.
Adolfo Mário Salgueiro Cunha.
Afonso Augusto 4a Costa.
Afonso de Macedo.
Alberto Álvaro Dias Pereira.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Albino Vieira da Rocha.
Alexandre Barbedo Pinto de Almeida.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.
Álvaro Pereira Guedes.
Álvaro Xavier de Castro.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
Antão Fernandes de Carvalho.
António Albino de Carvalho Mourão.
António Cândido Maria Jordão Paiva Manso.
António Carlos Ribeiro da Silva.
António Dias.
António Germano Guedes Ribeiro de Carvalho.
António Joaquim Machado do Lago Cerqueira.
António Maria Pereira Júnior.
António Maria da Silva.
António Marques das Neves Mantas.
António Pais Rovisco.
António de Paiva Gomes.
António Pires de Carvalho.
António dos Santos Graça.
Augusto Joaquim Alves dos Santos.
Augusto Pereira Nobre.
Augusto Rebelo Arruda.
Bartolomeu dos Mártires Sousa Severino.
Custódio Maldonado de Freitas.
Custódio Martins de Paiva.
Diogo Pacheco de Amorim.
Domingos Vítor Cordeiro Rosado.
Francisco Coelho do Amaral Reis.
Francisco Cotrim da Silva Garços.
Francisco José Martins Morgado.
Francisco José de Meneses Fernandes Costa.
Francisco Luís Tavares.
Francisco Manuel Couceiro da Costa.
Francisco de Sousa Dias.
Henrique Ferreira de Oliveira Brás.
Jacinto de Freitas.

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Sessão de 14 de Outubro de 1919 3

Jaime de Andrade Vilares.
Jaime da Cunha Coelho.
Jaime Daniel Leote do Rêgo.
João Estêvão Águas.
João Gonçalves.
João Henriques Pinheiro.
João José Luís Damas.
João Lopes Soares.
João de Ornelas da Silva.
João Ribeiro Gomes.
João Salema.
João Xavier Camarate Campos.
Joaquim Brandão.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
José Domingues dos Santos.
José Gomes Carvalho de Sousa Varela.
José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
José Monteiro.
José Rodrigues Braga.
Leonardo José Coimbra.
Liberato Damião Ribeiro Pinto.
Lino Pinto Gonçalves Marinha.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel José Fernandes Costa.
Maximiano Maria de Azevedo Faria..
Mem Tinoco Verdial.
Orlando Alberto Marçal.
Plínio Octávio da Conceição Silva.
Vasco Guedes de Vasconcelos.
Vítor José de Deus de Macedo Pinto.
Vitorino Henriques Godinho.
Xavier da Silva.

Às 15 horas e 5 minutos:

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.

Procedeu-se à chamada.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 49 Srs. Deputados.

Foi lida a acta.

Ás 15 horas e 15 minutos.

O Sr. Presidente: - Está em discussão a acta.

Estão presentes 58 Srs. Deputados.

Vai proceder-se à segunda chamada.

Eram 15 horas e 32 minutos.

Procedeu-se à segunda chamada.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 60 Srs. Deputados.

Está à votação a acta.

Foi aprovada a acta e deu-se conta do seguinte

Expediente

Pedidos de licença

Carta do Sr. Plínio e Silva, pedindo a licença necessária em vista de estar no estrangeiro em missão oficial de serviço.

Para a Secretaria.

Concedidos sessenta dias.

Comunique-se.

Para a comissão de infracções e faltas.

Carta do Sr. Luís Mesquita Carvalho, pedindo para o seu colega António de Carvalho Mourão dez dias de licença.

Para a Secretaria.

Concedido.

Comunique-se.

Para a comissão de infracções e faltas.

Carta do Sr. Álvaro de Castro, pedindo dez dias de licença.

Concedido.

Comunique-se.

Para a comissão de infracções e faltas.

Carta do Sr. João Estêvão Águas, pedindo licença até o dia 15 do corrente.

Para a Secretaria.

Concedido.

Comunique-se.

Para a comissão de infracções e faltas.

Carta do Sr. Luís Tavares de Carvalho, pedindo para se ausentar nos dias 13 e 14 do corrente.

Para a Secretaria.

Concedido.

Comunique-se.

Para a comissão de infracções e faltas.

Carta do Sr. Álvaro Guedes, pedindo quatro dias de licença.

Para a Secretaria.

Concedido.

Comunique-se.

Para a comissão de infracções e faltas.

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4 Diário da Câmara dos Deputados

Carta do Sr. João Soares, pedindo sessenta dias de licença para tratar da sua saúde.

Para a Secretaria.

Concedido.

Comunique-se.

Para a comissão de infracções e faltas.

Carta do Sr. João Gonçalves, pedindo vinte dias de licença.

Para a Secretaria.

Concedido.

Comunique-se.

Para a comissão de infracções e faltas.

Carta do Sr. João J. Luís Damas, pedindo vinte dias de licença para se tratar.

Para a Secretaria.

Concedido.

Comunique-se.

Para a comissão de infracções e faltas.

Carta do Sr. João Camoesas, pedindo para se ausentar nos dias 13 e 14 do corrente.

Para a Secretaria.

Concedido.

Comunique-se.

Para a comissão de infracções e faltas.

Carta do Sr. Bartolomeu Severino, pedindo 4 dias de licença.

Para a Secretaria.

Concedido.

Comunique-se.

Para a comissão de infracções e faltas.

Carta do Sr. Orlando Marçal, pedindo para se ausentar nos dias 13 e 14 do corrente.

Para a Secretaria.

Concedido.

Comunique-se.

Para a comissão de infracções e f altas.

Carta do Sr. José Rodrigues Braga, pedindo trinta dias de licença a contar de 13 do corrente.

Para a Secretaria.

Concedido.

Comunique-se.

Para a comissão de infracções e faltas.

Carta do Sr. Alberto Jordão Marques da Costa, acompanhando um telegrama do Sr. João Ribeiro Gomes, em que êste lhe pede trinta dias de licença.

Para a Secretaria.

Concedido.

Comunique-se.

Para a comissão de infracções e faltas.

Carta do Sr. Afonso de Macedo, pedindo oito dias de licença para se ausentar de Lisboa.

Para a Secretaria.

Concedido.

Comunique-se.

Para a comissão de infracções e faltas.

Carta do Sr. Alberto Jordão Marques da Costa, pedindo dez dias de licença.

Para a Secretaria.

Concedido.

Comunique-se.

Para a comissão de infracções e faltas.

Telegrama do Pôrto do Sr. Lúcio de Azevedo, comunicando o impedimento do seu regresso antes de quinta-feira.

Para a Secretaria.

Concedidos três dias de licença.

Para a comissão de infracções e faltas.

Telegrama de Mértola, do Sr. José Monteiro, pedindo trinta dias de licença.

Para a Secretaria.

Concedido.

Comunique-se.

Para a comissão de infracções e faltas.

Telegrama das Caldas, do Sr. Maldonado Freitas, pedindo quatro dias de licença a começar em 7 do corrente.

Para a Secretaria.

Concedido.

Comunique-se.

Para a comissão de infracções e faltas.

Carta do Sr. Nóbrega Quintal, pedindo licença para se ausentar de Lisboa nos dias 13 e 14 do corrente.

Para a Secretaria.

Concedido.

Comunique-se.

Para a comissão de infracções e faltas.

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Sessão de 14 de Outubro de 1919 5

Telegrama das Caldas da Bainha, do Sr. Maldonado Freitas, pedindo licença até 21 do corrente.

Para a Secretaria.

Concedido.

Comunique-se.

Para a comissão de infracções e faltas.

Telegrama de Seia, do Sr. António Dias, pedindo dez dias de licença.

Para a Secretaria.

Concedido.

Comunique-se.

Para a comissão de infracções e faltas.

Telegrama de Coimbra, do Sr. Dias Pereira, pedindo um mês de licença.

Para a Secretaria.

Concedido.

Comunique-se.

Para a comissão de infracções e faltas.

Telegrama de Aregos, do Sr. João Salema, justificando as suas faltas.

Para a Secretaria.

Concedidos trinta dias de licença.

Comunique-se.

Para a comissão de infracções e faltas.

Carta do Sr. Maximiano Maria de Azevedo Faria, acompanhando um atestado médico, pedindo trinta dias de licença com princípio em 7 do corrente.

Para a Secretaria.

Concedido.

Comunique-se.

Para a comissão de infracções e faltas.

Telegramas

Do presidente da Câmara de Viana de Castelo, renovando o pedido de aprovação do projecto sôbre indemnizações.

Para a Secretaria.

Do governador civil de Ponta Delgada em nome do povo daquele distrito, pedindo discussão do parecer n.° 112, por melhorar a situação financeira da junta geral.

Para a Secretaria.

Do presidente da comissão executiva da Mealhada, protestando e pede providências imediatas sôbre abuso de autoridade praticado pelo administrador do concelho e pedindo uma sindicância.

Para a Secretaria.

Do pessoal da Câmara Municipal de Alijo, pedindo sejam atendidas as suas reclamações.

Para a Secretaria.

Do governador civil de Santarém, em nome dos empregados das administrações dos concelhos e câmaras municipais dêste distrito, pedindo aumento de vencimentos.

Para a Secretaria.

Representações

De alunos do 3.°, 5.° e 7.° anos do liceu de Braga, pedindo para serem abrangidos pelas disposições do decreto n.° 6:128, de 25 do Setembro de 1919.

Para a comissão de instrução secundária.

De dois guardas nocturnos da Casa de Moeda e Papel Selado, pedindo aumento de vencimentos.

Para a comissão de finanças.

Do oito empregados no Aquário Vasco da Grama, pedindo melhoria de situação.

Para a comissão de finanças.

Requerimentos

De António Cândido de Mendonça Furtado de Meneses e Pinto, coronel do estado maior de infantaria, pedindo que lhe não seja descontado no tempo de serviço, o que teve de licença registada até 30 de Novembro de 1887.

Para a comissão de guerra.

De Luís de Amorim, guarda nocturno da Casa da Moeda, pedindo que lhe seja reconhecido o direito à aposentação.

Para a comissão de finanças.

Ofícios

Do Ministro do Comércio e Comunicações, pedindo cópias da proposta sôbre exportação de lã churra e dos pareceres das comissões que a estudaram.

Para a Secretaria.

Satisfaça-se.

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6 Diário da Câmara dos Deputados

Do mesmo, pedindo cópia da proposta relativa à construção do caminho de ferro de Coimbra a Arganil e respectivo parecer.

Para a Secretaria.

Satisfaça-se.

Do Presidente do Tribunal Militar Especial de Lisboa, pedindo para que o Sr. Tomás Rosa ali possa ir depor como testemunha.

Para a Secretaria.

Concedido.

Comunique-se.

Para a comissão de infracções e faltas.

Do Ministério das Finanças, enviando documentos sôbre vencimentos dos membros da Junta do Crédito Público e dos proventos recebidos pelos membros dos Conselhos de Administração e Fiscal da Caixa Geral de Depósitos, desde 1913, pedidos pelo Sr. Manuel José da Silva.

Para a Secretaria.

Do mesmo Ministério, enviando documentas relativos a restituições dos direitos por drawback, efectuados nas Alfândegas do Lisboa e Pôrto desde 1916 a 1918, pedidos pelo Sr. Raúl Tamagnini Barbosa.

Para a Secretaria.

Do mesmo Ministério, enviando cópia do decreto n.° 6:120, que abre um crédito especial de 100.000$ a favor do Ministério do Trabalho.

Para a Secretaria.

Para a comissão de finanças:

Do Ministério da Agricultura, remetendo nota dos vencimentos recebidos pelos directores gerais daquele Ministério, pedida pelo Sr. Manuel José da Silva.

Para a Secretaria.

Do Ministério da Marinha, enviando um requerimento do funcionário Eleutério Augusto Gomes de Abreu, pedindo melhoria de situação.

Para a Secretaria.

Para a comissão de finanças.

Admissões

É admitida a proposta de lei do Sr. Brito Camacho, já publicada na sessão do dia 7 do corrente, sôbre os pedidos de renúncia dos Srs. Deputados.

O Sr. Francisco Cruz: - Manda para a Mesa um requerimento.

Vai nos documentos mandados para a Mesa.

O Sr. Rocha e Cunha (Ministro da Marinha): - Mando para a Mesa um projecto de lei criando a Escola de Pesca.

Vai adiante por extracto.

O Sr. Ernesto Navarro (Ministro do Comércio): - Mando para a Mesa três propostas de lei.

Vão adiante por extracto

O Sr. Helder Ribeiro (Ministro da Guerra): - Mando para a Mesa uma proposta de lei dando à Cruzada das Mulheres Portuguesas o Instituto de que tinha sido desapossada pelo dezembrismo. Peço a V. Exa. que consulte a Câmara sôbre a urgência.

Consultada a Câmara, resolveu afirmativamente, e vai adiante por extracto.

O Sr. Pedro Pita (em nome da comissão de subsídios): - Sr. Presidente: já há tempo que a Câmara nomeou uma comissão especial para rever os subsídios aos membros do Congresso da República. Êsse parecer foi enviado à comissão de finanças e já está distribuído, sob o n.° 75.

As faltas de número para as sessões são justamente derivadas da insuficiência do subsídio actual, e porque as funções parlamentares não são apanágio de burgueses ricos, é necessário habilitar aqueles que tem de prestar os seus serviços ao País como legisladores a poder fazê-lo com decência e imparcialidade. Nestas condições peço a V. Exa. que consulte a Câmara sôbre se ela admite que entre já em discussão, sem prejuízo da ordem da dia, o citado parecer.

O orador não reviu.

O Sr. Júlio Martins (sôbre o modo de votar): - Acho justo o pedido do ilustre parlamentar o Sr. Góis Pita, mas declaro a V. Exa. que nós não votamos êsse parecer sem primeiro termos votado os projectos sôbre trigos e oficiais milicianos.

O orador não reviu.

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O Sr. Jorge Nunes (sôbre o modo de votar): - Tendo reconhecido há muito a necessidade desta Câmara tratar de assuntos de grande importância para o País, não acho lógico que comecemos por nós. Eu sei que há muitos Deputados que não se podem manter na capital, porque as dificuldades são grandes; mas acima dêste caso há outros, dalguns dos quais depende a vida do Govêrno, e muito importantes, que sobrelevam aquele, e por onde devemos principiar.

Nestas condições, êste lado da Câmara dá, em princípio o seu aplauso ao projecto de aumento de subsídio, mas não o vota desde já.

O orador não reviu.

O Sr. Pedro Pita (para explicações): - Sr. Presidente: creio que não fui ouvido quando fiz, e repeti, o requerimento que em nome da comissão de revisão dos subsídios aos Parlamentares, apresentei há pouco à consideração desta Câmara. Realmente, eu salientei bem que desejava a discussão do parecer de que trata o meu requerimento, sem prejuízo do debate sôbre os assuntos que estão dados para a ordem do dia, e, portanto, sem prejuízo da discussão das questões a que se referiu nas suas considerações o Sr. Júlio Martins.

Sr. Presidente: eu não quis, há momentos, dizer, tam claramente, quanto agora me vejo obrigado, aquilo que tenho a dizer sôbre êste assunto, e é o seguinte: E perfeitamente lógico que se votem todos os projectos que estão na ordem do dia, mas é necessário, antes de mais nada, pôr esta Câmara em condições de poder funcionar, e para isso é preciso habilitar os seus membros com os meios suficientes para poderem cá vir. (Apoiados).

Numa democracia, como já tive ocasião de salientar, o seu parlamento não devo ser apanágio dos burgueses ricos! Se o Sr. Jorge Nunes é rico, há muitos Deputados que o não são.

E necessário que se diga que não desonra ninguêm querer trabalhar e ter vontade para isso, mas não ter os meios para tal, pois que não se podem manter em Lisboa os Deputados, só com o subsídio que atualmente vem cem, tendo muitas vozes de manter duas casas, uma na capital e outra na província. E para que se dignifique o Parlamento, notando-se as faltas aos que cá não vêm, podendo dizer-se que se cá não vêm, não é. por falta de meios, mas por que não querem, é mester que se pague aos Deputados como deve ser. Hoje um Deputado tem um vencimento inferior ao de qualquer carroceiro ou sapateiro, sem desprimor para essas classes. Ainda outro dia eu li um letreiro, exposto numa montra duma sapataria, pedindo oficiais e pagando-lhes a 4 escudos por dia, isto é, mais do que se paga a qualquer Deputado.

Ora foi ponderando estas circunstâncias, e tambêm ponderando que os assuntos da ordem do dia são urgentes na sua solução, que pedi à Câmara que se aproveitassem tempo destinado para antes da ordem do. dia, na discussão dêste parecer.

O Sr. Presidente: - Tenho de pôr o requerimento de V. Exa. à votação, e V. Exa. está já a discutir o parecer...

O Orador: - Estava-o explicando!...

O Sr. Presidente: - As considerações que V. Exa. estava a fazer não eram explicações: era já a discussão do parecer.

O Orador: - Tenho dito.

Foi aprovado.

O Sr. Presidente não reviu as sua palavras de intervenção.

Foi aprovado o requerimento.

O Sr. Presidente: - Vai ler-se, para se discutir, o parecer. A hora do se entrar na ordem do dia é às 17 horas.

Foi lido e entra em discussão o

Parecer n.° 75

Senhores Deputados. - Da guerra agora finda, resultou uma desorganização profunda na sociedade e um agravamento no custo da vida, consequência lógica do constante elevamento dos preços dos géneros de primeira necessidade.

Desse estado de cousas compartilham,, evidentemente, os membros do Congresso, sendo perfeitamente justo o que diz a comissão do revisão constitucional, no seu parecer de alteração ao artigo 19.° da Constituição.

A vossa comissão, depois de ter cuidadosamente estudado o assunto, ponderan-

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do-o com o maior critério, reconhece que é indispensável melhorar o subsídio dos membros do Congresso, que em país nenhum é tam insignificante como no nosso, pois noutros, mais pequenos e menos importantes, não só o subsídio é maior, mas ainda são dadas outras garantias importantes, que muito contribuem para tornar viável a aceitação do mandado legislativo por parte de indivíduos que, noutras circunstâncias, o não poderiam aceitar.

Assim, a vossa comissão tem a honra do submeter à apreciação do V. Exas. o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° O subsídio aos membros do Congresso é fixado em 2.400$ anuais, pagos em duodécimos.

§ único. Os membros do Congresso que exerçam funções públicas e recebam vencimentos ou honorários de qualquer espécie em quantia inferior à fixada neste artigo, só receberão a diferença; e, se fôr igual ou superior, nada receberão.

Art. 2.° Os membros do Congresso têm direito a mais:

1.° Uso e porte do arma;

2.° Passagem gratuita de 1.ª classe em todas as linhas férreas portuguesas;

3.° A passagem de 1.ª classe de ida e volta e 50 por cento para sua mulher e filhos, em vapores nacionais ou estrangeiros, quando, vivendo nas ilhas ou colónias, tenham de vir tomar parte nos trabalhos parlamentares.

Art. 3.° Aos membros do Congresso serão, no princípio da sessão legislativa, fornecidas cadernetas de guias de transito, que juntamente com o bilhete de identidade e apresentadas nas bilheteiras das linhas férreas portuguesas, lhes dão direito à passagem nos termos do artigo 2.° Estas guias serão autenticadas com o sêlo branco do Congresso e a assinatura do presidente da Câmara respectiva.

§ único. Aos membros do Congresso que residam nas ilhas ou colónias, será abonada a sua passagem e 50 por cento das passagens para sua família nos termos do n.° 3.° do artigo 2.°

Art. 4.° O subsídio aos membros do Congresso é livre de qualquer dedução, a não ser o desconto de 10$ por cada dia de não comparência à sessão revertendo esta quantia para o cofre do Congresso.

§ 1.° Quando a falta seja por motivo de doença nenhum desconto será feito; mas quando a doença dure por mais de três dias, deverá ser comprovada com atestado médico, confirmado pelo sub-delegado de saúdo respectivo.

§ 2.° Aos membros do Congresso que se encontrem de licença, concedida pela Câmara, não será feito o desconto por dia de sessão a que faltem, mas pelo tempo que se acharem ausentes dos serviços parlamentares, proporcionalmente ao subsídio que anualmente recebam.

Art. 5.° Fica revogada a legislação em contrário.

Sala das sessões da comissão de revisão do subsídio aos membros do Congresso, 5 de Agosto de 1919. - Afonso de Melo - A. L. Aboim Inglês - Vasco de Vasconcelos - José Maria de Campos Melo - Pedro Pita.

Senhores Deputados. - Resolveu a Câmara que fôsse submetido ao parecer da vossa comissão do finanças o projecto apresentado pela comissão escolhida para rever o subsidio aos membros do Congresso, no qual é proposta a elevação dêsse subsidio e a concessão doutras vantagens.

O assunto é melindroso, mas nem por isso deve deixar de ser resolvido com são critério, atentas as condições económicas e financeiras em que actualmente vive a sociedade portuguesa, e que afectam por igual todos os indivíduos.

É geralmente reconhecido que a nossa moeda sofreu uma depreciação superior a 100 por cento, devido a circunstâncias diferentes, derivadas do enorme conflito mundial em que Portugal teve de entrar, e que por isso não pôde deixar de dar-se o aumento de todos os salários, vencimentos ou honorários, como meio de minorar a situação dos proletários, dos funcionários e doutras classes.

Deverão fugir a esta regra os membros do Congresso, que exercem o mais alto e soberano poder da Nação, e que, em virtude do regime em que vivemos, podem e devem ser escolhidos dentre todas as classes e condições?

Não nos parece justo.

Se se admitisse a excepção, teríamos de obrigar os membros do Congresso, que não fossem abastados ou funcionários residentes em Lisboa, a uma vida penosa,

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ou de eliminá-los da representação parlamentar, o que seria contrário aos princípios dum regime democrático e, porventura, aos próprios interêsses do país. que se veria privado duma representação oriunda de todas as fôrças.

Mas parece à comissão que não será de aceitar o projecto apresentado, nos seus próprios termos.

Foi resolvido, e muito bem, pela Assemblea Nacional Constituinte, tendo naturalmente em vista as considerações atrás expostas, que os Deputados e Senadores recebessem um subsídio. Estabelecido que êsse subsidio deve somente ser abonado durante ás sessões, não haverá que modificar tal princípio.

Os parlamentares não são funcionários públicos, nem exercem, como tais, uma profissão. Portanto, é curial que o subsídio que se lhes fixe diga respeito unicamente aos períodos de tempo em que desempenham o seu mandato.

Reconhecido que é insuficiente o subsídio que actualmente se percebe, dadas as circunstâncias em que vivemos, só há que elevá-lo pura e simplesmente para ser abonado nas mesmas condições, fixando-se uma quantia que, dentro da modéstia, orno é aconselhável num país de difícil situação financeira como o nosso, proporcione, contudo, aos parlamentares uma situação que não seja mesquinha nem embaraçosa.

Não adoptou a comissão a idea de fazer o abono por sessão, dada a situação especial do Senado, em que muitas vezes não há mais do que uma ou duas sessões por semana, o que, portanto, prejudicaria os respectivos membros, sem que para isso tivessem dado motivo.

Quanto às demais regalias de que trata o projecto, entre as quais avulta a das passagens gratuitas em todas as linhas férreas portuguesas e nos vapores nacionais e estrangeiros, em determinadas condições, entende a comissão de finanças que não deverá recomendá-las à vossa aprovação.

O aumento de despesa que daí resultaria seria enorme, e não nos parece que fôsse de fácil realização o processo adoptado no projecto.

Tratando-se de estabelecer honorários para os membros do Congresso, só há que fixar-lhes o subsídio com que êles devem satisfazer as suas despesas, entre as quais figuram necessàriamente as das viagens que tenham de fazer. Isso mesmo se deduz da própria lei constitucional há poucos dias votada, que só fala de subsídio.

Não deve julgar-se, porém, que a comissão de finanças seja contrária à idea de os membros do Congresso virem a ter passe ou bónus nos caminhos de ferro, corno1 acontece em tantos outros países. Mas entende que Isso deve ser encargo das companhias exploradoras e não do Estado, como se dá com os oficiais do exército o da armada, que têm o bónus de 50 por cento. Poderá o caso ser acautelado nos contratos das concessões ou de renovação delas, pois não se compreende que os representantes da Nação tenham, no caso sujeito, situação de inferioridade em relação aos oficiais que, deve dizer-se, gozam muito justamente daquele benefício.

Partindo, pois, do princípio de que deve somente ser elevada a importância do subsídio e que nele devem ser encontrados os vencimentos dos parlamentares que forem funcionários de forma a não permitir a sua acumulação e a tornar, tanto quanto possível, igual para todos o mesmo subsídio, a comissão entendeu ainda dever recomendar ao vosso alto critério a fixação dum preceito com que se procure reprimir as faltas às sessões e às chamadas de que muitas vezes resulta encerramento dos trabalhos parlamentares, por falta de número.

Em face destas considerações, julga poder aconselhar à vossa aprovação o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É fixado em 200$ mensais, livres de qualquer dedução, o subsídio aos membros do Congresso, durante as sessões.

§ único. Os presidentes das duas Câmaras receberão mais 100$ mensais cada um, tambêm isentos de descontos.

Art. 2.° Aos parlamentares que forem funcionários públicos ou receberem remuneração por lugares em emprêsas que tenham contratos com o Estado ou dêste recebam subvenção ou privilégio, serão os vencimentos que tiverem nossa qualidade encontrados no subsídio, nada recebendo dêste se auferirem honorários superiores.

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Art. 3.° Por cada dia de não comparência à sessão ou por falta a qualquer chamada de que resulte encerramento dos trabalhos por deficiência de número, sofrerão os membros do Congresso o desconto de 15$.

§ único. Se as faltas forem motivadas por doença devidamente justificada ou por virtude de licença concedida pela Câmara, o desconto será feito pelo tempo em que estiverem ausentes, proporcionalmente ao subsídio mensal.

Art. 4.° Fica revogada a legislação em contrário.

Sala das sessões da comissão de finanças, 18 de Agosto de 1919. - Álvaro de Castro - Alves dos Santos (com declarações) - Manuel José da Silva (Oliveira de Azeméis) (com restrições) - Estêvão da Cunha Pimentel - António Maria da Silva - Alberto Jordão Marques da Costa (com restrições) - Prazeres da Costa - António José Pereira, relator.

O Sr. Nuno Simões: - Sr. Presidente: Quando há tempo se procurou habilitar o Parlamento a alterar o subsídio aos seus membros, tivo ocasião de exprimir o meu voto, que, sem nenhuma intenção do prejudicar ninguêm, e de pôr de parte ou de menos considerar os legítimos interessas de todas as pessoas que trabalham o têm de ganhar pelo que produzem, era contrário à fixação de novo subsídio feito por esta Câmara para os seus membros.

E entendendo que todos os parlamentares são dignos do respeito e da consideração gerais e tendo o prazer de declarar o meu máximo respeito e consideração por todos, tive então ocasião de pronunciar-me no sentido de que o aumento de subsídio aos parlamentares traria necessàriamente, como consequência, uma série de reclamações de toda a espécie de todos os funcionários, que pelo país se encontram numa situação difícil para ocorrerem às suas necessidades.

E a minha discordância do projecto de aumento de subsídio aos parlamentares é mais por ver o critério desigual em que se continua pelo que respeita à remuneração do funcionalismo, do que por deixar de reconhecer a justiça da melhoria de situação dos parlamentares, sujeitos como todos às tremendas dificuldades económicas da hora presente. Entendo, pois, que cada vez mais se acentua a necessidade de uniformizar os vencimentos de todos os funcionários do Estado, e depois disso de pensar em garantir aos parlamentares uma vida independente e a coberto de necessidades.

Sou funcionário público e com remuneração superior ao subsídio de Deputado, mas não deixo de reconhecer que há muitos funcionários cujos proventos não correspondem àquilo que produzem.

E nesta hora de economias o aumento de subsídios aos: deputados não pode deixar de estimular e sancionar todos os pedidos feitos ou a fazer do melhoria de situação, o que traria um desequilíbrio enorme às finanças do Estado.

Desejo, Sr. Presidente, que fique exarado o meu voto no sentido de que, concordando em absoluto em que é diminuta a retribuição que os parlamentares recebem, atenta a carestia da vida, pelas exigências da sua situação social e atenta, a necessidade de prestigiar o Parlamento, colocando os parlamentares em condições de poderem concorrer às sessões, sou contra o aumento do subsídio nêste momento. E como funcionário público, ainda que a Câmara vote o aumento, continuarei a receber pelo meu lugar, embora a minha retribuição funcional esteja longe do subsídio par lamentar com o aumento que se propõe.

E faço isto porque não vim aqui para tratar da minha situação.

O Sr. Jorge Nunes: - Sr. Presidente: eu sei que alguns membros desta Câmara me consideram rico. Já me chamaram burguês endinheirado. Oxalá que nos meus rendimentos eu pudesse estabelecer uma comparação sequer com alguns meus colegas denominados proletários ou defensores das classes proletárias. Sc puser em confronto a minha situação, tenho a certeza de que S. Exas. a não invejam. Mas isso é lá para fora, não é para aqui. Muito que tivesse, isso de nenhuma maneira influiria no meu modo de pensar.

Desde que esta Câmara vote o aumento de subsídio aos seus membros, perderá toda a autoridade para negar, seja a quem fôr, a satisfação de qualquer reclamação de aumento de vencimentos.

Trocam-se diversos apartes.

Sr. Presidente: eu sei que é difícil, extremamente difícil, a situação dalguns

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Srs. Deputados, que têm de abandonar as suas casas na província para permanecerem em Lisboa, onde são obrigados a estar para frequentarem o Parlamento, mas cifrei tambêm que se houvesse possibilidade ainda - e começarei por mim - de criar a alguns uma situação favorável, isso só daria vantagens, e grandes, para o país.

As dificuldades da vida são grandes, não há dúvida, mas não é menos verdade que as consequências delas são sentidas por todos na família portuguesa. E, Sr. Presidente, não hesito em afirmar que não são os Srs. Deputados as pessoas que vivem pior.

Sobretudo o que eu não posso aceitar, e contra o que protesto, é que estejamos nós a votar um aumento de subsídio para nós próprios.

Então pregunto eu: porque é esquecido quem se senta nas cadeiras do Govêrno? Como é possível a vida a um Ministro que recebe apenas 7 escudos e tal por dia?

E devemos notar que o Ministro tem despesas de representação, que não são exigida pela situação de Deputado. Alem disso, os indivíduos que são Ministros estão sendo assediados diariamente com pedidos de dinheiro para quêtes, kermesses, etc.

Porque razão um Ministro há-de ficar com 7 escudos e tal por dia, apenas?!

Entendo que esta Câmara antes de apreciar o assunto do aumento do subsídio, deverá resolver todas as reclamações pura melhoria de situação que estejam entregues ao estudo das comissões pelos funcionários, alguns dos quais ainda estão recebendo apenas 15$ e 20$ mensais.

Esta parca remuneração, paga a quem tem mulher o filhos, é o bastante para uma família morrer de fome. Essas pessoas lutam dia a dia com a fome, tendo de viver porque nasceram, ao passo que nós estamos aqui porque queremos.

Antes de se proceder à satisfação dessas reclamações justas, teremos acaso alguma parcela de autoridade moral para votar o aumento do nosso subsídio?

Reconheço que é justo, e mesmo indispensável, para garantir o regular funcionamento do Congresso, o aumento do subsídio concedido aos parlamentares. Mas, Sr. Presidente, não devemos nós votá-lo para nós mesmos. Assim eu voto contra o projecto tal como está, e noutra ocasião eu defenderei um artigo novo que vou enviar para a Mesa, para que o aumento seja ,para a legislatura que se seguir a esta.

Vozes: - Então isso é que é moral?

O Orador: - Eu bem sei que a caridade bem entendida começa por nós, mas, não obstante isso, eu entendo, repito, que para os outros é que devemos votar o aumento e não para nós.

Tenho dito.

O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando restituir, revistas, as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.

O Sr. Raúl Tamagnini: - Sr. Presidente: pedi a palavra para responder às considerações feitas pelo Sr. Jorge Nunes, embora não fizesse tenção de pronunciar-me sôbre êste projecto de lei.

Creio, Sr. Presidente, que tenho no assunto autoridade especial, visto que não tenho recebido subsídio, nem tenciono recebê-lo. Sou funcionário público. Só tenho aquilo que ganho. Estou fazendo uma despesa superior às minhas posses, porque, para poder exercer o meu mandato de Deputado, sou forçado a ter duas despesas de casa: uma no Pôrto, onde tenho a família, outra em Lisboa, no hotel onde estou. Fico com menos do que qualquer Deputado que recebe subsídio. Por isso disse que tinha autoridade para falar no assunto.

E com essa autoridade declaro que acho justo que a Câmara se ocupe já do assunto, visto que, em primeiro lugar, não se altera, por isso, a ordem do dia para a qual está designado um projecto que constitui o principal motivo da minha estada aqui - o projecto das indemnizações devidas pelos monárquicos.

Em segundo lugar e ao contrário da opinião do Sr. Jorge Nunes, trata-se do um assunto de moralidade.

É preciso acabar com as suspeições que lá fora são lançadas sôbre os Deputados. Dizem lá fora que os Deputados que vivem em Lisboa com um subsídio incapaz de chegar para a sua sustenta-

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ção, é porque, de alguma parte lhes vêm rendimentos. É necessário que tais suspeições desapareçam duma vez para sempre.

E preciso que essas suspeitas desapareçam duma vez para sempre. (Muitos apoiados).

Para isso, é indispensável que os membros do Poder Legislativo recebam o suficiente para fazer face às despesas da sua sustentação.

Nestas condições, eu dou o meu aplauso ao projecto e aprovo o requerimento do ilustre Deputado Sr. Góis Pita, convencido de que é absolutamente estéril qualquer discussão sôbre êle, visto que estamos dispostos a não protelar o estudo e solução dos diferentes problemas de interêsse nacional que estão pendentes, assim como a adoptar medidas que tendem a melhorar a situação aflitiva de muitas classes trabalhadoras, mormente dos funcionários administrativos.

O Sr. Júlio Martins: - Sr. Presidente: eu entanto que são justas, inteiramente justas as considerações que tem sido feitas acerca da situação em que os congressistas se encontram, principalmente da situação daqueles que têm de viver exclusivamente do subsídio parlamentar. Efectivamente, com 100$ mensais ninguêm pode viver decentemente na capital. É uma verdade que todos confirmam, que todos sentem. Quem afirmar o contrário, ou argumenta de má fé ou vive por processos especiais, dignos de serem apontados para elucidação dos necessitados. Todavia a situação em que o País se encontra presentemente não aconselha a aprovação dêste projecto e a sua discussão neste momento nem nos exalça nem nos ergue. (Apoiados).

Nós que estamos a faltar constantemente às sessões desta Câmara, quando se encontra pendente a solução de assuntos vitais para o País, e quando o próprio Govêrno considera indispensável o estudo de problemas que se relacionam com a nossa situação económica hoje extremamente agravada e para a qual temos de olhar com olhos de ver! Nestas condições, não podemos estar por mais tempo a perder a fôrça moral necessária para a boa e eficaz realização da obra que êste Parlamento tem de efectuar. De facto, se amanhã o público confrontar a velocidade com que nós pretendemos votar o projecto que se discute com a inércia que temos mantido perante a resolução de problemas de instante efectivação, chegará a conclusões que certamente não nos poderão honrar muito. (Apoiados). Evidentemente nós não estamos em situação tam aflitiva que não possamos esperar mais algum tempo. Nesta hora, embora eu concorde com êle em princípio, não posso dar o meu voto ao projecto. Além de que o projecto não pode ficar tal como está. O País tem de sabor o que cada um ganha em relação ao que produz. Quem é Deputado é Deputado e ganha como tal; quem é funcionário público deve ganhar como funcionário público. (Apoiados).

O Sr. Eduardo de Sousa: - Há Deputados que têm quatro e cinco lugares, e eu sei dalguns que até negoceiam em farinhas.

O Orador: - Portanto. Sr. Presidente, eu desejaria que o projecto de subsídio aos Srs. Deputados fôsse aprovado, mas não nas actuais circunstâncias, pois que temos muitos outros projectos que devemos aprovar.

Há um projecto sôbre o qual a República não pode estar sem o resolver, e é o projecto das indemnizações àqueles que, pondo-se ao lado da República, foram roubados e prejudicados pelos monárquicos.

Nós temos que votar êsse projecto, porque: aprovando-o, o Parlamento ergue-se, levanta-se; e, assim, eu desejo que o Parlamento não vá fazer uma chantage, pois que, emquanto tem estado sossegado em relação a êsse outro projecto, vai empregar o tempo com cousas que nos dizem respeito.

Portanto, fiquem todos com a sua maneira de ver, mas na certeza de que eu, estando de acordo com êste projecto, no emtanto entendo que tendo vindo á Câmara muitos pedidos de aumentos de vencimentos a funcionários, não posso votar contra êsses pedidos e votar para mim um projecto de aumento dos meus vencimentos.

Tenho dito.

O orador não reviu, nem o Sr. Eduardo de Sousa reviu o seu "aparte".

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O Sr. Dias da Silva: - Sr. Presidente: eu tenho por norma dizer sempre a verdade, e por consequência não sei lazer política; e, assim, eu entendo que esta Câmara não ficará moralmente agravada por votar êste subsídio.

Voto êste projecto, mas é necessário tambêm olhar duma vez para sempre para os funcionários que ganham pequenos vencimentos, como os funcionários administrativos, que, como aqui foi dito, alguns há que ganham somente vinte escudos, o que é na verdade uma miséria que não tem razão de ser. (Apoiados).

Não há tambêm, razão alguma para os Srs. Deputados continuarem a receber os subsídios que hoje recebem. (Apoiados).

Não falo por mim, mas ninguêm pode duvidar que por exemplo, para os Deputados da província, os subsídios que mensalmente recebem não lhes chega para as despesas de hotel (Apoiados), e muitos Srs. Deputados não estão tambêm aqui porque querem, mas estão por vontade popular, emquanto que outros estão por favor da alta finança, como se diz.

Apartes.

E necessário acabar duma vez para sempre com o que se diz lá fora.

Por exemplo diz-se que esta Câmara, na questão dos transportes marítimos, está vendida por duzentos contos.

Apartes.

Isto diz-se de boca em boca pela rua do Ouro.

Estas palavras são motivadas decerto pela má administração que tem havido, e para o confirmar basta ver quais êsses processos de administração.

Todas as condições da nossa vida se estão agravando dia a dia, porque o Govêrno está sob a mão da alta finança, assim como o Parlamento na sua maioria, porque, se a maioria quisesse, o Govêrno já não estaria no Poder.

Sr. Presidente: eu sou contrário ao parecer da comissão, porque entendo que o vencimento dos Deputados devia ser anual, visto que não se compreende que os Deputados estejam acorrentados a um Govêrno. Quando os Govêrnos entendem fechar as Câmaras, os Deputados vêem-se obrigados a andar esmolando, porque não têm outros meios de vida pelo motivo de, quando se lançam na vida política, abandonarem as suas ocupações.

Não é desonroso vir aqui dizer isto.

Sr. Presidente: veja V. Exa. a nossa diferença em relação à maneira de ver do Sr. Júlio Martins: S. Exa. não se esqueceu das indemnizações aos senhores do dinheiro, da indústria, do comércio e lavoura. S. Exa. está tomando muita piedade por êsses grandes republicanos. Era preciso que V. Exas., em vez desta caridade, resolvessem aqui o aumento dos vencimentos dos funcionários administrativos e dos serventes dos hospitais civis. Êstes últimos ganham 60 centavos, o que é tam exíguo que quási lhes não permite viverem, sôbretudo se têm mulher e filhos.

Sr. Presidente: embora discorde do parecer, voto-o em princípio, de modo a dar absoluta independência a todos os membros desta Câmara; somente entendo que o ordenado a estipular-lhes deveria ser anual, para que os membros do Poder Executivo não andem acorrentados a êste ou àquele Govêrno.

Tenho dito.

O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando restituir, revistas, as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.

Foi aprovado o parecer na generalidade.

Entrou em discussão na especialidade.

O Sr. Jaime de Sousa: - Mando para a Mesa uma proposta de aditamento ao § único do artigo 1.°

Proposta

Acrescentar ao § único as seguintes palavras: "e de qualquer encontro em vencimentos que percebam por outros serviços públicos". - O Deputado, Jaime de Sousa.

Admitida.

Aprovada.

O Sr. Augusto Dias da Silva: - Pedi a palavra para mandar para a Mesa uma proposta de substituição, para que requeiro a prioridade de votação.

Foi admitida a proposta do Sr. Jaime de Sousa.

Foi admitida, em contraprova, a proposta do Sr. Augusto Dias da Silva, que é a seguinte:

Proposta

Proponho que o artigo 1.° do projecto da comissão seja substituído pelo artigo 1.º

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do projecto inicial. - O Deputado, Dias da Silva.

Prejudicada.

O Sr. António José Pereira (relator): - Sr. Presidente: declaro, em nome da comissão de finanças, como relator do parecer, que a comissão aceita a emenda apresentada pelo Sr. Jaime de Sousa, mas não concorda com a do Sr. Augusto Dias da Silva, porquanto esta última aniquilaria o que só teve em vista quando se elaborou a proposta.

O exercício da missão de Deputado não constitui um emprego que tenha de ser pago em duodécimos, mas deve simplesmente ser remunerada quando se exerça.

Eu quero declarar à Câmara e a V. Exa., Sr. Presidente, que quando redigi êste parecer, o pensei muito.

Vi que era uma questão que devia agitar extraordinariamente as opiniões, e procurei fazer uma obra tanto quanto possível cuidada, em que pus o melhor da minha boa vontade, da minha inteligência e tambêm da minha honestidade.

Tem-se dito que á preciso que se aumentem tambêm os vencimentos aos funcionários públicos.

É verdade. Devem-se aumentar todos os ordenados, ainda que para isso tenham de reduzir-se os quadros. Por isso velarei sempre aqui e na comissão de finanças.

Se o pudesse fazer neste momento, proporia tambêm a redução do número dos legisladores.

Tenho dito.

O Sr. Augusto Dias da Silva: - Acho muito moral o princípio da minha proposta. Assim os parlamentares podem, no interregno parlamentar, estar em contacto com as populações que os elegeram. Não sendo funcionários públicos, não podem estar em contacto com os eleitores, porque não têm meios para viver no interregno parlamentar:

Têm de estar acorrentados aos Governos, visto não terem meios de viver.

Seria moral que os Deputados no interregno parlamentar tivessem a necessária independência, e para isso só tendo subsídio.

O orador não reviu.

O Sr. António Fonseca: - Padece-me que a proposta do Sr. Dias da Silva não deve ser votada pela Câmara. Então dizia-se que os Deputados recebiam ordenado e não subsídio. O subsídio só era no fundo um ordenado.

O Sr. Augusto Dias da Silva: - Se não fôsse empregado público, havia de aceitar a minha proposta.

O Orador: - Dizendo isso, autorizai-me a dizer que S. Exa. apresenta a sua proposta, porque não é funcionário do Estado.

Não é por ser funcionário do Estado que não aceito a sua proposta. Os Deputados não podem ganhar honorários durante o interregno parlamentar.

O artigo 19.° da Constituição diz: "que os membros do Congresso terão durante as sessões o subsídio que será fixado".

Se a Constituição determina que o subsídio seja pago quando o Congresso funciona, a proposta do Sr. Dias da Silva não tem razão de ser, nem, constitucionalmente, nem sob o ponto do vista em que S. Exa. colocou a questão.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Não há mais nenhum Sr. Deputado inscrito. Vai votar-se.

Leu-se na Mesa o artigo 1.º e § único do parecer da comissão.

O Sr. Augusto Dias da Silva: - Requeiro prioridade para a, votação da minha proposta.

O Sr. Presidente: - Vou consultar a Câmara sôbre o requerimento do Sr. Dias da Silva.

O Sr. Carlos Olavo: - Desde que V. Exa. ouviu ler a disposição constitucional que mostra que a proposta do Sr. Dias da Silva é inconstitucional, não podia admitir essa proposta.

Pôsto à votação o requerimento, foi rejeitado.

Foi aprovado, o artigo 1.º, § único.

Foi aprovado o aditamento do Sr. Jaime de Sousa.

Foi considerada prejudicada a proposta do Sr. Dias da Silva.

Leu-se na Mesa o artigo 2.º do projecto da comissão.

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O Sr. Eduardo de Sousa: - Sr. Presidente: tenho a honra de mandar para a Mesa a seguinte

Proposta

Proponho que ao artigo 2.° seja acrescentado o seguinte parágrafo:

§ 1.° Nenhum Deputado poderá deixar de receber o seu subsídio, isto sem prejuízo do disposto neste artigo. - Eduardo de Souza.

Admitido.

Eu sou dos Deputados que poderia perfeitamente passar sem o subsídio, por circunstâncias muito especiais. Entendo, porém, que a Câmara deve voto à. minha proposta, pois nenhum parlamentar pode ter direito a alegar que tem liberdade de opinião, que procede e fale como quere, só porque não recebe subsídio. Tal argumento representa uma injúria lançada àqueles que, por qualquer circunstância de ordem pessoal, o recebem. (Apoiados).

Um Deputado que invoca êste argumento, esquece que se lhe pode dizer que se não recebe subsídio pelo Parlamento pode recebê-lo por vias travessas.

Por minha parte podia dispensar o subsídio, mas não o faço porque entendo que êle é uma garantia democrática: é uma remuneração por um serviço prestado à Nação.

O orador não reviu.

O Sr. Pedro Pita: - Sr.. Presidente: pedi a palavra para mandar para a Mesa uma proposta de emenda ao art. 2.°, assim redigida:

Proposta

Proponho que entre as palavras "honorários" e "superiores" do artigo 2.° se inclua a palavra "líquidos". - Pedro Pita.

Admitido.

De maneira que fica bem assente que os parlamentares nada receberão de subsídio, desde que recebam honorários líquidos superiores ou iguais aos que receberiam como parlamentares.

O orador não reviu.

Foi admitida a proposta do Sr. Eduardo de Sousa.

Foi admitida a proposta do Sr. Pedro Pita.

O Sr. Júlio Martins: - Sr. Presidente: uso da palavra para mandar tambêm para a Mesa uma emenda ao artigo 2.°

O meu desejo era que todos aqueles que o povo honrou com o seu mandato de Deputado viessem ao Congresso desempenhar única e exclusivamente as suas funções parlamentares. (Apoiados).

Por maior inteligência que tenha qualquer dos meus ilustres colegas - e ela é grande - por melhor vontade que cada um sinta para bem desempenhar as suas funções parlamentares e as suas funções públicas, por mais que multipliquem a sua actividade, nunca dará um excelente parlamentar nem um excelente funcionário, como daria se exercesse uma só função.

Com o nosso sistema de contabilidade, a medida a introduzir, assente sôbre um princípio de moralidade, não representava afinal um princípio de economia; e porque eu assim penso, desejo expor o meu critério a êste respeito, que concretizo na seguinte

Proposta

Proponho que se substitua o artigo 2.° pelo seguinte:

Nenhum membro do Congresso poderá receber, durante o período das sessões, vencimentos superiores aos que pelo subsídio lhe venham a competir. - Júlio Martins.

Admitida.

Assim, os parlamentares só recebem durante as funções parlamentares o ordenado que lhes competir.

O orador não reviu.

O Sr. Dias da Silva: - Muito bem, assim é que é. Vai ser rejeitado.

O Sr. António dei Fonseca: - É rejeitado, o bem.

Leu-se na Mesa a proposta do Sr. Júlio Martins, e foi admitida.

O Sr. Presidente: - A discussão dêste parecer continua amanhã, antes da ordem do dia.

ORDEM DO DIA

O Sr. António Granjo: - Sr. Presidente: cabe-me a honra do definir a atitude do Partido Republicano Liberal perante o Govêrno. Não pude definir ainda essa

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atitude visto que o Congresso foi convocado para a eleição do Conselho Parlamentar, e esta Câmara não tem funcionado por falta de número.

Quando tive a honra de fazer a apresentação do Partido Republicano Liberal ao Congresso, êsse partido era apenas a conjugação da antiga União Republicana e de elementos de antigos evolucionistas, e nesses antigos evolucionistas encontrava-se o meu querido amigo e ilustre parlamentar Júlio Martins, que se separou para constituir o Grupo Parlamentar Popular.

Sinais dos tempos.

Hoje, porém, falo em nome do Partido Republicano Liberal, ao qual se agregou a organização das Beiras, precedida pelo ilustre parlamentar Sr. Afonso de Melo, e mais o Partido Centrista, representado nesta Câmara pelo Sr. João Pinheiro, resolução que está apenas dependente do Congresso do mesmo partido.

Sr. Presidente: em seguida à posse presidencial, apresentou o actual Govêrno a demissão, sendo-lhe ratificada a confiança do Sr. Presidente da República.

Resolvendo-se a continuar no Govêrno o actual Gabinete, deve êste desde logo coutar, por parte do Partido Republicano Liberal, com uma atitude de firme e franca oposição.

Essa atitude tinha sido definida nesta Câmara, por parte do Partido Evolucionista, pelo Sr. António José de Almeida, que então era o leader dêsse partido, e que é hoje o Chefe do Estado.

A mesma atitude tinha sido definida nesta Câmara pelo Sr. Brito Camacho, então leader da União Republicana, e a mesma atitude tinha sido definida pelos Srs. Afonso de Melo e João Pinheiro.

A atitude do Partido Republicano Liberal não pode constituir, pois, para o Govêrno uma surpresa.

O Sr. Augusto Dias da Silva (interrompendo): - Se fôr firme.

O Orador: - De mais, Sr. Presidente, o Partido Republicano Liberal aprovou já as bases do seu programa, que vai ser apresentado no primeiro e próximo Congresso, programa que foi largamente distribuído e publicado nos jornais de grande circulação do País.

Por essas bases se vê que há profundas divergências entre as soluções que o Partido Republicano Liberal adopta para a resolução dos problemas nacionais, quer sob o ponto de vista jurídico e educativo, quer sob o ponto de vista económico e financeiro, e quer ainda sob o ponto de vista político e religioso', e o programa que o Govêrno representa.

Nestes termos, e em face dêsse programa, o Govêrno ainda não podia contar, da parte do Partido Republicano Liberal, com qualquer outra atitude.

Quanto aos termos e aos limites dessa oposição, podia talvez dispensar-me de fazer declarações precisas, visto que essa oposição é feita nos mesmos termos e nos mesmos limites por que foi feita até aqui pelos Deputados que hoje constituem o Partido Republicano Liberal, e que até então constituíam os grupos parlamentares a que aludi.

Não faremos jamais oposição sistematicamente (Apoiados)t porque a oposição sistemática a um Govêrno republicano só o pode fazer um partido que queira derrubar a República.

Não daremos nenhum pretexto aos inimigos do regime para que continuem na sua campanha de descrédito contra os homens públicos da República. (Apoiados). Faremos isso com absoluta firmeza, porque sempre, no Poder e na oposição, estamos resolvidos a defender a República.

Não criaremos por simples prazer dificuldades ao Govêrno, apenas para que as cadeiras do Poder fiquem vagas (Apoiados). Vimos para inaugurar na República a política orgânica, em que os interêsses gerais da Nação se sobreponham às questiúnculas pessoais e aos baixos interêsses de partidos. (Apoiados). O Partido Republicano Liberal há-de ir ao Poder, mas, sendo um partido essencialmente democrático, pode ir ao Poder pelos movimentos da opinião pública, que o criou. Estando inteiramente fora de qualquer meio revolucionário, nem se aproveitará de qualquer cabala política de ocasião, nem irá ao Poder por uma simples combinação parlamentar, que não corresponda a uma insofismável indicação da opinião pública.

Por isso, Sr. Presidente, sempre que seja necessário manter o respeito pela

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bandeira nacional, e sempre que a ordem pública perigue, o Govêrno contará com o apoio do Partido Republicano Liberal. Por sua voz, êste partido espera que o Govêrno, em nenhuma circunstância e em nenhuma ocasião, invocará essas supremas razões para fazer uma baixa política, porque se porventura a questão do prestígio nacional e da ordem pública forem invocadas apenas para satisfação de interêsses partidários ou próprios, a oposição do Partido Republicano Liberal não admitirá transigência de espécie alguma.

O Govêrno anunciou que vai apresentar ao Parlamento um largo plano de reconstituição económica e financeira.

Sr. Presidente: na discussão das propostas de lei que o Govêrno apresentar ao Parlamento, o Partido Republicano Liberal entrará para lhes dar a sua colaboração.

O intuito do Partido Republicano Liberal é promover o desenvolvimento do País e a estabilidade da República; e assim, na discussão que se fizer dessas propostas, procurará melhorar aquelas que forem susceptíveis de melhoria, mas nunca esquecendo que os interêsses gerais devem sobrepor-se sempre aos interêsses privados, fiscalizando, até o último centavo, a aplicação dos dinheiros públicos, e nunca consentindo, sem o seu protesto, que entidades ou grupos se valham das circunstâncias para imporem aos Govêrnos qualquer contrato ruinoso.

Ainda, Sr. Presidente, o Partido Republicano Liberal reconhece que o Govêrno presidido pelo Sr. Sá Cardoso tem feito uma louvável tentativa, uma tentativa honesta, de conseguii, com o apoio do Partido Republicano Portugnês, uma política de tolerância e conciliação.

É de justiça dizer que o Partido Republicano Liberal acredita na sinceridade dos intuitos do Sr. Presidente do Ministério; simplesmente o Partido Republicano Português não tem correspondido, na sua acção, a êsses louváveis intuitos do Sr. Presidente do Ministério.

Por toda a parte a acção do Partido Republicano Português se tem desentranhado em actos de violência e sectarismo, que encontraram seu eco dentro da imprensa e do Parlamento.

Sr. Presidente: estou convencido de que o Sr. Sá Cardoso acredita na sinceridade das minhas palavras, e, por sua vez, se o Sr. Presidente do Ministério quiser falar à Câmara e ao País com a mesma franqueza o a- mesma sinceridade com que eu falo, estou convencido, tambêm, de que reconhecerá hoje o pleno insucesso da sua tentativa de paz e de tolerância. Êsse insucesso donde vem?

Não das dificuldades que, porventura, levantassem no seu caminho as oposições, mas sim das dificuldades que encontrou dentro do seu próprio partido. É que, Sr. Presidente, os partidos não renunciam nunca aos seus usuais processos. Os partidos não se despem num minuto do espírito que adquiriram durante anos em que no Govêrno exerceram uma acção num certo sentido e com um sistemático intuito.

Em todo o caso, Sr. Presidente, vemos que o Govêrno continua no poder, e, sendo assim, parece que o Sr. Sá Cardoso não julgou ainda esgotada a hipótese dessa política de tolerância e de conciliação. Por minha parto tenho apenas a dizer que é pena que à honestidade de intuitos de S. Exa. e que toda a Câmara reconhece, não corresponda uma visão clara das circunstâncias e uma nítida compreensão dos acontecimentos.

Os fortes nunca se dominam, as circunstâncias mandam mais do que os homens. De facto, a tentativa dessa política de paz e conciliação, que o Govêrno anunciou ao País, e que quis fazer através as dificuldades que o partido de que saiu lhe levantou, e apesar disso, essa tentativa falhou desastradamente. (Não apoiados).

Essa política de paz e de tolerância é perfeitamente necessária à República; e é imposta pela opinião pública, mas essa política de. paz e de tolerância só pode ser feita pelos partidos educados na obediência à lei o que respeito às crenças, e não por um instrumento político que até hoje só soube usar do espírito de violência o de coacção. O resultado da experiência, feita julgo-o por mim averiguado plenamente, e o País tambêm não se ilude porque, por via de regra, em Portugal quem faz mais inteligentemente a política é o povo, voem-se nos processos usados pelo Partido Republicano Português, que apenas conseguiram concitar contra si a animadversão geral, e trazer para a República os dias mais negros.

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Essa política de paz e de tolerância tem de ser feita por um instrumento apto; foi êsse instrumento que se criou, e em nome do Partido Republicano Liberal afirmo que essa política de tolerância e de paz se há-de fazer.

Não temos a sofreguidão do poder. Engana-se quem suponha que da parte do Partido Republicano Liberal não há a convicção profunda de que só com o povo se pode governar, e que há-de ser com uma indicação perfeitamente popular que o Partido Republicano Liberal há-de assumir o poder.

Sr. Presidente: eram estas as declarações que tinha a fazer, e creio que elas merecem o respeito de todos aqueles para quem a República é um culto.

Pouco nos importará que as vaias, que as objurgatórias, que os risos dos cínicos ou as palavras dos ingénuos procurem perturbar-nos a serenidade; havemos de atingir o nosso fim, porque o nosso fim é um fim nacional e contamos para isso com a Nação, que nos há-de apoiar, porque somos necessários à vida nacional.

Tenho dito.

O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, guando restituir, revistas, as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.

O Sr. Júlio Martins: - Sr. Presidente: o meu camarada e amigo e Sr. António Granjo, ilustre leader do Partido Republicano Liberal nesta Câmara, acaba de definir com o brilho que costuma pôr em todos os assuntos de que trata, a posição do seu Partido em relação ao Govêrno do Sr. Sá Cardoso.

Não desconhece V. Exa., Sr. Presidente, que a fisionomia parlamentar desta Câmara se transformou inteiramente com o aparecimento em scena do Partido Republicano Liberal e com a constituição do Grupo Parlamentar Popular.

Eu escusava neste momento de afirmar qual era a minha situação e a dos meus amigos em relação ao Govêrno que se encontra no Poder.

Será a mesma situação que nós porventura manteríamos se neste momento se encontrasse nas cadeiras do Poder um Govêrno liberal presidido pelo Sr. Camacho ou pelo Sr. António Granjo.

É-me absolutamente indiferente a questão política neste momento.

Nós havemos de apreciar os Govêrnos pelo conjunto de medidas que êles apresentarem à discussão do Parlamento.

Afirmou o Govêrno que traria ao Parlamento um plano económico de ressurgimento nacional.

Esperamos por essas medidas.

Nós desejamos, Sr. Presidente, que duma vez para sempre as correntes parlamentares e os organismos políticos que se constituíram não sejam aglomerados que os homens decretem dogmáticamente nas conversas dos centros políticos ou nas intrigas dos bastidores da má política, e que todos os organismos políticos dêste País desfraldem perante o Povo a afirmação concreta dos seus princípios governativos.

Sr. Presidente: nós desejamos saber qual a política económica do Govêrno.

Desejamos saber qual a política comercial do Govêrno.

Está o Govêrno disposto a entregar desde já a vicia comercial do País ao livre jôgo das fôrças económicas?

Ou pelo contrário, reconheço o Govêrno que no período de transição em que nos encontramos será precisa a intervenção de controles de fiscalização do Estado, em harmonia com as associações, cooperativas e com as iniciativas individuais?

São dois pontos de vista que estabelecem correntes de doutrina a discutir, a apoiar ou a reprovar.

Qual a política industrial do Govêrno?

E, Sr. Presidente, um outro ponto de vista que o Govêrno exporá à Câmara, para que possamos estar a seu lado, ou combatê-lo se as suas ideas se não harmonizarem com as que defendemos.

Qual a política bancária do Govêrno?

Está o Govêrno disposto a seguir a orientação que a tal respeito aqui foi definida pelo Sr. Vitorino Guimarães?

Ou porventura quer o Govêrno adoptar o mesmo sistema que tem seguido até hoje?

E um outro ponto de vista que terá ocasião de nos demonstrar.

Qual é a política agrícola do Govêrno?

Está o Govêrno convencido absolutamente de que é indispensável transformar radicalmente os processos da nossa

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legislação rural e os processos da nossa cultura?

Está o Govêrno habilitado a vir declarar que vai proceder a um inquérito ao património rural do Estado, para entrar numa mais lógica distribuição da terra?

Qual é a orientação que o Govêrno vai adoptar a êste respeito?

Está o Govêrno disposto a adoptar medidas contra o absenteísmo rural?

Está o Govêrno disposto a estabelecer a unidade agrária, a unidade na família rural, a fixar à terra, por medidas de auxílio do Estado, as colónias agrícolas se elas são susceptíveis e têm os elementos indispensáveis de se agregarem à terra, aumentando a produção?

Desejava ouvir o Govêrno na orientação e exposição do problema económico.

Qual é a política que o Govêrno vai adoptar sob êste ponto de vista, que lá fora tem corifeus, defensores com ideas perfeitamente antagónicas?

Temos já hoje os elementos indispensáveis para possuir uma marinha mercante. Segundo as declarações do Govêrno, devemos em breve receber os barcos que cedemos à Inglaterra.

Entende o Govêrno dever manter uma frota nacional à disposição do Estado?

Pensa o Govêrno na organização de qualquer regime de consortium do Estado?

São pontos concretos de administração política, perante os quais o Govêrno manterá a sua situação e perante os quais manteremos a nossa orientação.

Qual é a política dos transportes, debaixo do ponto de vista dos caminhos de ferro?

Sei que o Govêrno já apresentou à Câmara um projecto de lei para adiantar à Companhia dos Caminhos de Ferro 200 contos com o fim dela cumprir compromissos com os seus empregados.

Qual é a política do Govêrno em relação aos caminhos de ferro?

Temos de fazer uma discussão larga sôbre a situação das companhias de caminhos de ferro que têm contratos com o Estado.

Temos de ver qual a orientação em que se encontram as companhias de caminhos de ferro que estão debaixo da fiscalização directa do Estado.

O que pensa o Govêrno sôbre a nossa política hidráulica?

Segundo as declarações feitas pelo Sr. Ministro do Comércio e Comunicações, sabemos que tem em mente a realização dum vasto plano de aproveitamento da nossa energia hidráulica.

Nós temos quedas de água muito importantes no Douro, e ou sei que se trabalha no Ministério do Fomento sôbre êsse assunto.

Quando tive a honra de ser Ministro do Comércio e Comunicações submeti à comissão de obras públicas um plano sôbre o assunto. Que pensa o Govêrno a êste respeito?

Nós temos um acordo - o de 1912 - onde se encontram as bases de entendimento para resoluções futuras que transformarão por completo o nosso sistema de viação.

Qual é a orientação do Govêrno?

Qual é o ponto do vista do Govêrno sôbre tratados de comércio?

Ainda hoje ouvi dizer que se ia tratar dum tratado com a Espanha, mas não é só êsse tratado que nos interessa.

Esperemos que o Govêrno nos exponha o seu ponto de vista, para nós marcarmos a nossa posição.

Nós temos um déficit enorme, segundo declarou o Sr. Ministro das Finanças; quais são, para lhe fazer face, as medidas financeiras do Govêrno?

O que pensa o Govêrno sôbre o ponto de vista de viação ordinária?

Está o Govêrno na disposição de manter os pontos de vista dos outros Govêrnos sôbre os altos comissários nas colónias?

O que pensa o Govêrno? Pensará em fazer novo empréstimo para o fomento das nossas colónias?

Nós necessitamos saber quais são as ideas do Govêrno para nortearmos a nossa oposição.

Outro ponto de vista, Sr. Presidente, sôbre o qual o Govêrno terá de marcar o seu modo de pensar.

Assim, duma maneira geral, vê V. Exa. qual é a nossa orientação.

Nós não somos desejosos, nem sôfregos, do Poder. Marcámos bem a nossa situação desinteressada; e se o Partido Liberal se apresenta hoje, pela boca do seu leader, como instrumento para a vasta realização duma obra de Govêrno, não seremos, nós que dificultaremos a

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sua ascensão ao Poder, até a facilitaremos, visto que para nós são indiferentes os homens, desde que pugnem pelos altos interêsses do Estado, e os procurem realizar. (Apoiados).

Sr. Presidente: aqui nos encontramos, com a situação que definimos, esperando que o Govêrno corresponda a ela com as medidas indispensáveis. O Govêrno terá de nós todo o apoio e vontade de auxiliar, se porventura a sua maneira de proceder corresponda à nossa, mas tora uma oposição franca o liai, se seguir por outro caminho, indo contra os melhoras interêsses do País, que são, actualmente, a reorganização das suas fôrças financeiras e económicas. (Apoiados).

Tenho dito.

O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando restituir, revistas, as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.

O Sr. António Fonseca: - Sr. Presidente: o Sr. António Granjo, leader do Partido Republicano Liberal, fez no sou discurso alguma" afirmações que nós democráticos, do Partido Republicano português, não podemos deixar passar sem o mais cabal e formal desmentido. (Apoiados).

S. Exa., leader dum partido que acaba de formar-se, e que por lógica deve ser oposicionista, sentiu-se no dever da vir fazer oposição; e como, em sua consciência, não a podia fazer ao Govêrno, Porque receava alienar de si as simpatias duma grande massa política que o apoia, procurou fazer afirmações fáceis contra o Partido Republicano Português. (Apoiados). E pena foi que S. Exa., que tam justo se mostrou na apreciação que fez à obra do Govêrno, não tivesse o mesmo procedimento para o Partido de que laço parte, e de cuja política é o Govêrno que ali está nas cadeiras do Poder, e que tem o nosso apoio. (Apoiados).

Reconhece S. Exa. que o Govêrno tem pretendido fazer uma política de conciliação, mas afirma que se elo não tem conseguido o. seu empenho, isso se deve à falta de cooperação da maioria e à falta de tolerância manifestada por êste Partido. Ora isso é absolutamente inexacto. Realmente, o Sr. Presidente do Ministério, não podia fazer uma política de conciliação, se essa não fôsse a política do partido que o apoia. (Apoiados).

Se o Sr. Presidente do Ministério estivesse nessa, matéria em desacordo, que somente o Sr. António Granjo verifica, com a maioria, o único caminho que S. Exa. tinha a seguir era ir-se embora, porque a maioria lhe indicaria que não estava bem naquele lugar. Mas é justo concluir-se que se até agora e em todos os lances da vida governativa, o Partido Republicano Português tem prestado ao Govêrno todo o seu apoio, que é necessário à sua vida, é porque tambêm é concorde com a política de conciliação que êle faz. (Apoiados).

Se alguns factos isolados se tem produzido, que inspirassem as afirmações do Sr. António Granjo, não é culpado dolos, nem o Sr. Presidente do Ministério, nem o Govêrno, nem as autoridades seus delegados, nem ainda o Partido Republicano Português. Êste partido não consente quaisquer desmandos, mas isso não impede que lhe suceda como de resto sucede em todos os partidos, ter de sofrer alguns, da parte dos seus correligionários.

O Sr. António Granjo não concretizou factos. Pois era bom que o tivesse feito. Só assim eu poderia balanceá-los para tirar a prova cabal da transigência que anima o Partido Republicado Português.

Mas para não ir mais longe, lembro desde já o espírito de tolerância do Partido Republicano Português nos últimos actos eleitorais. Manteve se a máxima liberdade a toda a gente.

Todos conhecem a liai e desinteressada cooperação prestada a todos os partidos.

Mas, Sr. Presidente, há da parte do Partido Republicano Português actos de intransigência? Há, houve, e há-de havê-los. Mas são actos de intransigência contra os inimigos da República (Apoiados), contra os perturbadoras da ordem pública. (Apoiados).

Essa intransigência é a nossa honra; é a nossa glória.

Nós somos e continuaremos a ser, intemeratos defensores da República, intransigentes contra, os seus inimigos. (Apoiados).

Em mais de um lance da nosso vida política, o Partido Republicano Português tem-se mostrado um partido de ordem,

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que não tolera nenhuma espécie de perturbações da ordem pública.

Se é por isto que nos acusam de intolerantes, se é nisto que se quere ver a nossa falta de política conciliadora, então ainda bem!

Sr. Presidente: depois de feitas estas declarações, não poderá ficar no espírito de ninguêm a mais leve dúvida sôbre a política do Partido Republicano Português, que é, efectivamente, neste momento, a política de conciliação, preconizada pelo Sr. Presidente do Ministério, porquê é a que realmente se coaduna melhor com os interêsses da República. E tem-no sido sempre. A muitas passagens da história da República e do Parlamento, se podem ir buscar provas bem cabais de que a falta de espírito de conciliação, a falta de transigência não podem ser atribuídas ao Partido Republicano Português, mas sim àqueles que deviam colaborar com êle e todavia não colaboraram. E porquê? Por não terem sido animados de igual espírito de tolerância.

Quis parecer-me que o Sr. António Granjo vê quaisquer divergências ou sessões no Partido Republicano Português.

O Sr. António Granja: - Eu não disse que as via.

O Orador: - As palavras valem por si e pelas intenções que as ditam.

O Sr. António Granjo: - Se as mintas palavras correspondem ao estado de espírito de V. Exa., que o leva a fazer essas declarações, eu nada tenho com isso.

O Orador: - As palavras de V. Exa. é que me obrigam a estas declarações.

S. Exa. referiu-se à, falta de apoio do Partido Republicano Português ao Govêrno. Ora não é exacto.

O Sr. António Granjo: - As faltas de número...

O Orador: - A falta de número não pode ser encarada sob êsse aspecto, a não ser com intuitos de fazer especulação política.

Sei muito bem que se faz essa especulação até nos1 jornais, depois que o Sr. Presidente do Ministério disse que não podia colaborar com o Parlamento desde que êle não fizesse obra útil.

Essa declaração honra S. Exa., mas não apoiar o Govêrno, por não haver uma sessão nesta Câmara, é conclusão forçada.

Não é espírito nenhum de intolerância, nem para com o Sr. Presidente do Ministério, a falta de número nesta Câmara, e essa falta depende de várias circunstâncias. (Apoiados).

Parece-me que pelo que toca ao Partido Democrático, êsse espírito de intolerância, que S. Exa. quis atribuir-lhe, não existe.

E absolutamente errónia essa afirmação, e se porventura eu quisesse apresentar factos para contestar o que eu vejo não tem valor, eu poderia ir encontrar nas relações do Partido Democrático com o público factos mais que necessários para mostrar que em todas as circunstâncias da vida do nosso partido temos procurado agir nos limites da nossa esfera, com uma tolerância que não será ultrapassada por nenhum partido, nem pelo Partido Republicano Liberal.

Tenho dito.

O discurso, revisto pelo orador, será publicado na íntegra guando restituir, revistas, as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.

O Sr. Dias da Silva: - Sr. Presidente : ouvi as declarações dos ilustres leaders dos Partido Republicano Liberal e do Partido Popular e lamento que S. Exas. tenham escolhidos uns nomes tam simpáticos que não correspondem de modo nenhum aos títulos que representam; e se assim não fôsse, não poderia interpretar doutro modo a declaração feita pelo Sr. António Granjo, quando dizia que o Govêrno seguia uma política absolutamente tolerante.

Isto é absolutamente assombroso!

E assombroso que S. Exa. viesse, como leader de um partido liberal, dizer que dá apoio a um Govêrno que seja tolerante, quando esto Govêrno só tem sido tolerante para os açambarcadores e para os homens do bacalhau.

Não vejo que o Govêrno seja tolerante fora disto.

A sua tolerância mostra-se mandando fazer os julgamentos dos jovens sindicalistas à porta fechada. (Apoiado).

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S. Exa. diz que apoia o Govêrno; e assim, S. Exa., leader de um partido de oposição, torna-se esteio do Govêrno que assim procede.

São estas as conclusões que se tiram das declarações de S. Exa. e do procedimento do Govêrno.

Apartes.

Com respeito ao Sr. Júlio Martins, S. Exa. seguiu a política monárquica.

Apartes.

O Sr. Jorge Nunes (interrompendo): - Chegue-lhe, assim.

Risos.

Apartes.

O Orador: - V. Exas. acham graça, mas a verdade é que os monárquicos caracterizavam-se exactamente por não dizer a verdade. Ora o Sr. Júlio Martins, no seu discurso de há pouco em defesa do grupo parlamentar a que pertence, não fez uma única afirmação concreta, limitando-se a divagar sôbre diversas questões de carácter político o social, escondendo duma forma bem visível e inteiramente condenável a sua forma de pensar. Hoje não há lugar para subterfúgios, a franqueza eleve estar em tudo.

Pelas declarações dos diferentes leaders desta Câmara, conclui-se que os diversos agrupamentos políticos de que êles foram eco estão ao lado do Govêrno; dêste Govêrno que teve a coragem de dizer que não permitia o aumento das tarifas para efeito de concessão dos 17 por cento ao pessoal, e que não hesita em autorizar agora a Companhia a fazer um aumento de 50 por cento que eu, aliás, estou convencido que não pega.

O discurso será publicado na integra, revisto pelo Orador, quando restituir, revistas, as notas taquigráficas que lhe foram pedidas.

O Sr. Sá Cardoso (Presidente do Ministério e Ministro do Interior): - Sr. Presidente: em nome do Partido Republicano Liberal fez as suas declarações políticas o ilustre Deputado Sr. António Granjo, na qualidade de leader do referido Partido. Mais tarde falou tambêm o Sr. Júlio Martins, que em nome do Partido Popular fez tambêm diversas afirmações de carácter político.

Devo dizer à Câmara que a situação política do Govêrno não mudou absolutamente em nada. Dentro do Parlamento continua a existir a mesma oposição, porquanto quem era oposionista continuará a sê-lo, e a mesma maioria continua compacta ao lado do Govêrno. (Apoiados).

Por isso a situação em que se encontra o Govêrno é absolutamente a mesma. Todavia talvez não suceda o mesmo em relação ao País, por isso que a fusão dos diferentes grupos políticos, formando um grande partido que tem a pretensão do se opor ao Partido Republicano Português, já largamente organizado, devo ter tido grande influência no espirito público.

O Sr. António Granjo e bem assim o Sr. Júlio Martins afirmaram que não faziam oposição sistemática ao Govêrno, antes aguardariam, em espectativa benevolente, as medidas que o Govêrno trouxesse à Câmara, para então as apreciarem segundo o seu critério político. Ora é essa justamente a forma de fazer oposição que o Govêrno deseja. Desde o primeiro dia que o Govêrno vem afirmando que não prescinde da colaboração parlamentar.

A colaboração parlamentar é naturalmente a discussão das nossas propostas, tanto mais que na maioria delas o Govêrno, reconhecendo a sua falibidade, traz raramente ao Parlamento uma medida de que faça questão fechada, questão governamental. Por consequência, o Govêrno aceita de bom grado essa colaboração.

Disse é Sr. António Granjo que tinha falhado por completo a política de tolerância inaugurada pelo Govêrno, e reivindicou para o seu partido inaugurar uma época em que as questiúnculas se não sobreponham à resolução dos interêsses e problemas políticos.

Nesta segunda parte, peço licença ao Sr. António Granjo para dizer que S. Exa. não pode tomar a vanguarda, porque eu tive ocasião de vir dizer à Câmara que devia de ser exactamente uma política de tolerância e uma política de concórdia entre os republicanos aquela que nortearia a vida do Govêrno, e disse tambêm que se os republicanos enveredassem pelo caminho das questões irritantes, imediatamente o Govêrno, não querendo tersar luta com republicanos, abandonaria as cadeiras do Poder.

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Por mais que procure, Sr. António Granjo, não tenho encontrado as dificuldades que S. Exa. disse que eu devia ter encontrado dentro da maioria. Pelo contrário. Ainda nesta casa do Parlamento se não levantou uma discussão política em que eu não visse a maioria, compactamente, apoiar o Govêrno. (Apoiados).

Não percebo, pois, como é que S. Exa. não admite que naja opiniões diversas durante uma discussão. E um princípio liberal, creio. E S. Exa. que está à frente dum partido liberal, parece-me que deveria aceitar esto modo de ser: que se façam sempre discussões amplas, principalmente nas questões em que o Govêrno não fez questão fechada.

Se tivesse realmente falhado a política de tolerância, eu não poderia ter assistido ao imponente espectáculo, para mim inolvidável, do dia de domingo último nas Caldas da Rainha e em S. Martinho do Pôrto, nem iam pouco o dia de ontem passado em Évora, o não assisti, mas sei, o que se passou em Coimbra e no Pôrto.

Se a política de tolerância do Govêrno tivesse falhado, posso garantir que a República não tinha tido os dois dias felizes, como foram os de domingo e segunda feira, em que o Sr. Presidente da República foi aclamado vibrantemente, durante o precurso até as Caldas, recebendo depois uma delirante ovação em S. Martinho do Pôrto.

Anda ontem em Évora se fez, não ao Presidente do Govêrno, mas à República, uma manifestação como talvez nunca ali se tivesse feito.

O Sr. Manoel Fragoso: - Como nunca se fez!

O Orador: - Não posso ir tam longe, mas suponho, pelo que vi, que assim devia ter sido.

Vibrou intensamente a alma republicana, e se houvesse a atmosfera revolucionária que se gora contra o espírito de intolerância, certamente êste facto seria impossível.

Pelo contrário, o caminho está lançado e eu reivindico para mim a glória de ter sido o iniciador.

Eu tenho absolutamente a convicção de que qualquer Govêrno que se sentar nestas cadeiras enveredar pelo caminho das perseguições, êsse Govêrno não se aguentará quinze dias.

O Sr. Dias da Silva: - Isto é extraordinário.

O Orador: - O Sr. Júlio Martins pronunciou um discurso, não direi de homem de Govêrno, mas S. Exa. preguntou ao Govêrno o que tencionava fazer. Está plenamente no seu direito.

O Govêrno tenciona apresentar à Câmara o início de medidas de largo alcance, um largo plano financeiro económico e de fomento. O Govêrno apresentará sucessivamente trabalhos sôbre caminhos de ferro, sôbre navegação, turismo, quedas de água, telégrafos, estradas, etc.

O Sr. António Granjo: - Então não é um largo plano?

O Orador: - É apenas um início. São propostas iniciais, e que no futuro Govêrno V. Exa. continuará, e eu então farei oposição tam lial como V. Exa. me tem feito.

V. Exa. fez larguíssimas preguntas ao Govêrno. Eu não responderei uma e, uma, mas sucessivamente, em dias seguidos, apresentarei medidas, e entre elas a primeira será a de navegação, a questão de transportes, a qual não ficará a cargo do Estado.

Outra questão importantíssima: as quedas de água. Está um engenheiro em Espanha ultimando as negociações.

O Sr. Dias da Silva: - Naturalmente entregue a emprêsa particular.

O Orador: - V. Exa. está sempre bem informado. Ainda agora disse que o Govêrno ia fazer um largo adiantamento à Companhia dos Caminhos de Ferro.

Uma pregunta feita por S. Exa., traz sempre uma insinuação.

Interrupção do Sr. Dias da Silva, que não se ouviu.

O Orador: - Brevemente o Govêrno trará ao Parlamento o pedido instante para que seja discutida uma alteração constitucional ao artigo 87.° Será um dos

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casos em que o Govêrno terá de fazer questão ministerial, porque temos de encarar de frente a resolução do problema colonial. Se o Govêrno não tomou qualquer medida a êsse respeito, no pequeno interregno parlamentar, foi exactamente por ser pequeno êsse interregno, e porque estando o Govêrno a dois dias da abertura do Parlamento, não queria resolver o assunto sem que êle estivesse aberto.

O Sr. Dias da Silva não falou para fazer declarações.

Com relação aos ataques feitos ao Govêrno, por ignorar a prisão dos jovens sindicalistas, tenho a declarar à Câmara que isso é uma cousa que precisa de ser aclarada.

Em várias associações, que tem os seus estatutos legais, reuniram-se indivíduos estranhos para tratarem de assuntos diversos para que essas associações foram fundadas.

Nessas associações reuniam-se rapazes de 14, 16 e 20 anos.

Julga a Câmara que o que nessas associações HO discutia eram as teorias bolchevistas?

Não. Nessas associações discutia-se a maneira do não obedecer a ninguêm, de se recusarem a assentar praça quando fossem chamados a cumprir êsse dever e a de se recusarem a reconhecer a existência dos patrões nas oficinas.

Chegaram até a fazer a propaganda do crime!

Estas ideas. eram professadas por vários indivíduos, e até por uma mulher, ou meio dos rapazes de 14, 16 e 20 anos.

Pregunto, se a isto é que o Sr. Dias da Silva chama intolerância dalgum Govêrno...

O Sr. Dias da Silva (interrompendo): - Chamei intolerância pelo facto dos presos serem julgados à porta fechada.

O Orador: - Não é bem assim.

O Sr. Dias da Silva (interrompendo): - S. Exa. mandou encerrar a União dos Sindicatos por não ter estatutos.

O Orador: - Pelo que aí se dizia até se chegava ao crime!

O Sr. Dias da Silva: - Isso são insinuações!

O Orador: - Não são; eu podia até citar nomes:

O Sr. Dias da Silva: - De que me queixo é que se façam julgamentos à porta fechada.

O Orador: - Não é assim; a sala era pequena, mas estava cheia de público.

Portanto não foi feito o julgamento à porta fechada,

O Sr. Dias da Silva: - Mas exerceram-se violências.

O Orador: - Posso garantir a V. Exa. que êsses homens só estiveram detidos doze horas, pois foram relegados logo em seguida ao Poder Judicial.

O Sr. Lopes Cardoso (Ministro da Justiça) (interrompendo): - Quando o Sr. Dias da Silva se referia a êsse assunto, ou preguntei ao Sr. Costa Júnior o que havia sôbre o caso, e êle disse que de facto não tinham assistido do julgamento todas as pessoas que acompanhavam os réus.

Até hoje nem o Sr. Costa Júnior, nem o Sr. Dias da Silva concretizaram as suas afirmações.

O Orador: - Mas mesmo que fossem verdadeiras as afirmações do Sr. Dias da Silva, não ora a mim, chefe do Poder Executivo, que S. Exa. teria de se dirigir mas ao Poder Judicial.

O Sr. António Granjo: - Não é bem assim, porque se o Poder Judicial tivesse prevaricado, V. Exa. tinha o direito de o chamar à ordem.

Digo isto apenas para salvaguardar os princípios.

O Orador: - V. Exa. compreende que não foi essa a intenção das minhas palavras.

Julgo ter respondido duma maneira geral aos Srs. Júlio Martins e António Granjo, agradecendo a S. Exas. a sua cooperação, pois outra cousa não posso chamar à sua oposição.

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O caminho trilhado pelo Govêrno é o caminho que já estava traçado, e que ou continuarei a seguir.

Em quanto à declaração do Sr. António da Fonseca, tenho a certeza de que a maioria pensa e sente da mesma forma que o Govêrno.

Isto é: que a única política aceitável é aquela que temos trilhado: de tolerância, sossêgo e ordem.

Mas com esta condição: esta tolerância, êste desejo o esta vontade que o Govêrno tem de. que se mantenha a harmonia entre todos os portugueses, cessam imediatamente quando haja o menor indício de perturbações de ordem pública, porque então a energia e a decisão tomam o lugar da tolerância.

Tenho dito.

Não foram revistos, pelos oradores que os fizeram, os "apartes" intercalados no texto.

O Sr. Lopes Cardoso (Ministro da Justiça): - Sr. Presidente: eu pedi a palavra pelo facto do Sr. Dias da Silva, incidentalmente, se ter referido à forma como se fizeram os julgamentos dos jovens sindicalistas no Tribunal da Boa Hora. Disse S. Exa. que êsse julgamento se tinha efectuado à porta fechada.

Há dias e depois do Sr. Dias da Silva ter falado comigo a êsse respeito, estando o Sr. Costa Júnior junto da minha carteira, eu comuniquei a êste senhor as palavras do Sr. Dias da Silva e o Sr. Costa Júnior respondeu que não tinha sido bem assim, e que os jovens sindicalistas haviam sido julgados sem que à audiência assistissem todas as pessoas que os acompanhavam, mas, em todo o caso, com toda a publicidade. Eu retorqui que não era natural que pudessem caber na sala do tribunal todos os indivíduos que acompanhavam os jovens sindicalistas e daí, por certo resultar nem todos assistirem ao seu julgamento, convencendo-me, portanto, de que o presidente do tribunal só não admitiu na sala as pessoas que excediam o número de lugares destinado ao público. É isso o que se faz em toda a parte.

O Sr. José de Almeida: - Com certeza que a sala não podia comportar mais pessoas do que aquelas que lá cabiam.

Isso era uma acção natural e escusava a interferência do presidente.

O Orador: - V. Exa., que é uma pessoa culta, compreende que quando se diz que uma sala está cheia, subentende-se que nos referimos àqueles lugares que podem e devem ser ocupados sem prejuízo da disciplina que o presidente tem de manter.

O Sr. Dias da Silva: - Eu posso informar a V. Exa. de que quando a imprensa quis entrar na sala da audiência lhe foi vedada a entrada e que foi só depois de muita discussão que ali conseguiu entrar, e sabe V. Exa. quantas pessoas estavam na sala? Vinte pessoas.

O Orador: - Tendo-me explicado o leader do partido de V. Exa. que as cousas se tinham passado desta maneira, e não tendo eu razões para supor que o magistrado que presidiu ao julgamento tivesse exorbitado, nada tinha de intervir: agora, que V. Exa. faz uma afirmação concreta, de que o presidente do tribunal não cumpriu o seu dever, não admitindo na sala todo o público que ela podia comportar, eu vou proceder imediatamente a averiguações.

Agora, um outro ponto. Disse-se que o Poder Executivo tinha obrigação de intervir.

Apoiado; mas só agora e não nesse momento em que lhe era vedado dar instrução para que entrasse mais ou menos gente na sala. da audiência, porque o Poder Judicial é um poder independente. Vou mandar averiguar como os factos se passaram e procederei tendo sempre em vista que o juiz apenas tinha de mandar abrir as salas da audiência e dirigir os trabalhos do julgamento com toda a serenidade, pois até agora, devo dizê-lo, apesar de toda a propaganda deletéria que se tem feito, a acção judicial tem-se sempre exercido livremente.

Da mesma forma os Poderes Legislativo e Executivo, são tambêm alguma cousa dentro do nosso País. Não seriam, contudo, se essa escola de perversão social pudesse criar novos adeptos e exercer a sua acção condenável e deletéria. Então é que nem Poder Legislativo, nem Executivo, nem Judicial poderiam prestigiar a Repú-

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blica, nem prestigiar-se dentro da República. E devo dizer que se alguma escolha houve quanto ao público que concorreu a êsse tribunal, ela era absoluta mente justificada, porque a forma como os jovens sindicalistas se portaram nas prisões não nos levava ao convencimento de que dentro dêsse tribunal não haveria atentados contra os delegados do Poder.

O Sr. Carlos Olavo: - As primeiras audiências foram interrompidas por tumultos provocados pelo público.

O Orador: - Diz V. Exa. muito bem.

Não entendo que só deva usar de rigor para com os jovens sindicalistas porque se trata de crianças, mas devemos concorrer que se não deformem êsses caracteres...

O Sr. Augusto Dias da Silva: - O Govêrno não usa de rigor para com os jovens sindicalistas porque é o primeiro a reconhecer que os actos que êles praticam são a consequência da má orientação do mesmo Govêrno.

O Orador: - Quem responde pela política geral do Govêrno é o Sr. Presidente do Ministério. S. Exa. já o fez, e cabalmente, por isso termino por aqui as minhas considerações.

Tenho dito.

Os "apartes" não foram revistos pelos oradores que os produziram.

O Sr. Júlio Martins: - Sr. Presidente: em virtude das declarações do Sr. Presidente do Ministério, eu vi-me obrigado a pedir a palavra.

O Sr. Presidente do Ministério afirmou que eu tinha traçado pontos de vista interessantes, mas que me não tinha apresentado como homem de Govêrno a afirmar um ponto concreto de doutrinas e de ideas.

Ora, Sr. Presidente, definamos bem as nossas respectivas situações.

Eu quis afastar-me inteiramente do campo político nesta sessão, e comecei por afirmar que me era absolutamente indiferente que subisse ao poder o Sr. Brito Camacho ou o Sr. António Granjo à frente do Partido Liberal ou que lá se conservasse o Sr. Sá Cardoso como chefe do Govêrno.

Sendo assim, jamais eu podia pretender apresentar-me neste momento perante a Câmara como um homem que desejasse tomar conta do Govêrno. O que eu queria era formular preguntas concretas ao Govêrno, para saber quais os pontos de vista que êle tinha para administrar o País.

Sr. Presidente do Ministério: nós havemos de nos encontrar. V. Exa. iniciou mal a sua resposta. Se estivesse com atenção veria quais os pontos de vista do Govêrno que podemos defender.

A nossa política é uma política acentuadamente das esquerdas republicanas e, pelas preguntas que fizemos, isso acentuamos.

Quando trouxe para aqui a pregunta ao Govêrno, sob o ponto de vista agrário, nessa pregunta dei-lhe a resposta daquilo que penso.

Sr. Presidente: eu não me quero apresentar como homem de Govêrno por ora, nem tenho nesta Câmara uma fôrça parlamentar a apoiar-me para homem de Govêrno, e para situações do empréstimo não sirvo, como lá fora, reconheço-o, não tenho uma corrente de opinião pública a impor-me, mas, quando essa corrente de opinião pública surgir, não me recusarei a aceitar o lugar que se me imponha.

Sr. Presidente: preguntei ao Govêrno se estava disposto a fixar desde já, e ràpidamente, o património rural do Estado em relação a unidades familiares, estudando as qualidades da terra e estudando os elementos indispensáveis de produção. Na pregunta defini um ponto de vista concreto e a orientação dos homens que me acompanham.

Queremos que se fixem na terra as unidades agrárias e as unidades familiares; queremos que se façam medidas rasgadas, intervindo o Estado, para que, fixando essas populações, se lhes dê um certo e determinado período de tempo para que demonstrem quais as que são susceptíveis de se agarrar à terra, as que são susceptíveis de produzir.

Nas preguntas concretas que dirigi ao Govêrno ia expressa a minha maneira de pensar.

Preguntei ao Govêrno, e se o não fiz pregunto agora, se está resolvido a remodelar o nosso sistema tributário, e quais nesse campo os princípios que o Govêrno

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afirma. Aceita o Govêrno o regime cereal tal como se encontra?

Nestas preguntas, eu não queria fazer um debate político e não queria fazer um ataque ao Govêrno, e se S. Exa. me desafia, começamos já um debate político sôbre o assunto; nestas preguntas, repito, afirmei os pontos de vista concretos da minha doutrina.

Preguntei ao Govêrno qual a sua política sôbre transportes. O Govêrno quere ou não a exploração dos barcos pelo Estado? Não é princípio que eu possa desde já aceitar. Havemos de discutir aqui e demonstrar se a intervenção do Estado é má pelos homens incompetentes que tem à frente ou se é má pelos princípios que defendem.

Veja o Govêrno como nas preguntas que lhe fiz definimos concretamente os pontos de vista que vínhamos de apresentar.

Sr. Presidente: sôbre quedas de água o Govêrno não respondeu nada.

Respondeu-me o Govêrno que estava um delegado a tratar do assunto em Espanha. Ora fui eu, como Ministro do Comércio, que cumprindo os compromissos dos Governos anteriores, fiz essa nomeação. Mas não me disse o Govêrno quais os pareceres, e há diferentes, que vai adoptar para a exploração dessas riquezas. E tendo pontos de vista concretos sôbre o assunto, não seria eu quem dissesse como resposta que não tinha feito um programa.

Sr. Presidente: sôbre o ponto de vista da política colonial, o Govêrno disse-nos que nos apresentaria uma proposta baseada no artigo 87.° da Constituição; mas em que circunstâncias? Eu estabeleci bem, no meu discurso de há pouco, a minha opinião: quero uma autonomia rasgada, uma autonomia dentro da qual as nossas colónias possam desenvolver-se, a fim de que as não percamos, neste momento tam grave para nós, como País colonial. (Apoiados).

Sr. Presidente: preguntei ainda ao Govêrno, estribando-me na sua declaração ministerial, se êle iria agora realizar a apregoada liberdade de comércio, nesta hora em que todos os países estão restringindo cada vez mais o consumo das subsistências para os seus concidadãos. Debaixo dêste ponto de vista, temos tambêm as nossas ideas, mas o Govêrno não nos respondeu concretamente, e disse-nos que nós estávamos a formular um plano concreto do Govêrno, como se nós nos apresentássemos com intenções de Govêrno.

Sr. Presidente: eu desejava saber tambêm qual o ponto de vista do Govêrno sôbre e problema social. Está o Govêrno disposto a reconhecer a organização da Confederação Geral do Trabalho? Está o Govêrno disposto a fazer associar os patrões, de forma a constituírem uma Confederação Geral Patronal, a fim de que o Estado, reconhecendo os conflitos entre patrões e operários, se coloque no meio deles e realize a sua função moderadora? (Apoiados).

O que nos respondeu o Govêrno, sôbre o problema da rede de estradas, e o seu plano, a organizar no nosso país? Nada; absolutamente nada. E eu neste, como em todos os pontos, fazendo esta pregunta ao Govêrno, iniciava já o meu modo de ver, porque entendo que só por um largo desenvolvimento das estradas podemos sair da miséria em que nos encontramos. (Apoiados).

Sr. Presidente: fiz mais preguntas concretas ao Govêrno sôbre a questão financeira; preguntei ao Govêrno, se êle, em presença da situação pavorosa da nossa divida pública, pensava numa conversão da nossa dívida flutuante.

Chamei a atenção do Govêrno para êstes pontos.

Preguntei ao Govêrno se pensa em lançar no País uma vasta operação de crédito, coordenada a um programa de fomento.

Fazendo estas preguntas, demonstrava, ipso facto, que não desejava levantar questões políticas.

Defenderei sempre as liberdades amplas do povo, porque do povo viemos, com o povo contamos sempre nas horas trágicas e amargas, em que a República tem estado a ponto de sossobrar, devido aos homens de Govêrno terem esquecido as energias másculas dêsse povo, que é e tem sido vibrante na defesa da República, quando a vida nacional tem estado em perigo gravíssimo.

O programa do Partido Republicano Liberal, que conta com a organização do cadastro da propriedade para daqui a 12

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anos com o fim de remodelar os impostos, não impedirá de ir ao fundo o País.

Ponho assim ponto no meu discurso político, não querendo por forma alguma competir com as grandes, iniciativas e as qualidades estaduais dos homens que se encontram no Govêrno.

Não quero já atacar o Govêrno, sem êle definir os seus pontos de vista de administração; mas, se o Govêrno me convida a ir para êsse campo, declaro que aceito o repto.

O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, guando restituir, revistas, as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.

O Sr. Jorge Nunes: - Contra o que muitos podem supor, não temos perdido o nosso tempo nesta sessão.

Muito proveito se tira das declarações feitas pelos diferentes partidos e grupos e até mesmo por parte do Govêrno.

Demonstrou-se que o Partido Republicado Liberal, apreciando devidamente a situação do País, está pronto, quando a opinião pública o indicar, a ser Govêrno.

Já, se esboçaram um tanto os pontos, a orientação política tio grupo parlamentar, chefiado tam distinta e galhardamente pelo meu velho amigo o Sr. Dr. Júlio Martins.

E até, Sr. Presidente, com resposta aqueles que receavam uma fraqueza da parte do Partido Republicano Português que apoia o Govêrno, essa dúvida deve ter desaparecido, pelo menos hoje, ou por algumas horas, em face das declarações categóricas do Sr. Dr. António Fonseca.

Mas, Sr. Presidente, eu não pedi a palavra para vir fazer declarações em nome do partido a que tenho a honra de pertencer; eu pedi a palavra porque o Sr. Presidente do Ministério, na sua resposta, levantou já um pouco o véu, mostrando-nos alguma cousa do muito que esperamos do Govêrno, que êle se propõe pôr em prática, fazendo transitar essas propostas por esta Câmara.

Tem sido sempre objecto da atenção cuidadosa do Sr. Presidente do Ministério o convencer o País de que só com a Câmara e pela Câmara se propõe governar.

Se S. Exa. pautar sempre os seus actos pelas palavras que tem pronunciado a êste respeito. S. Exa. merecerá o meu completo aplauso. Infelizmente, porêm, ainda que tais sejam os propósitos do Sr. Presidente do Govêrno, na prática eu vou vendo já que o seu pensamento é falseado, e que as medidas que o Govêrno se propõe pôr em prática, ou já tem pôsto, ou anuncia, não estão de harmonia com as declarações peremptórias feitas pelo Sr. Presidente do Govêrno, de que só com a Câmara e pela Câmara se propõe governar.

Recordo-me que numa das últimas sessões do princípio de Setembro, o Govêrno trouxe a esta Câmara uma proposta de lei, na qual e no artigo 17.,°, salvo êrro, pode ao Parlamento autorização pura reorganizar os Ministérios das Finanças, do Comércio e, da Agricultura. E eu nesta Câmara não precisava de gastar muitas palavras a êsse respeito, porque todos nós devemos e queremos dever toda a obediência à Constituição. Eu disse que o Parlamento simplesmente podia dar essas atribuições ao Govêrno, quando se tratasse de declarar a guerra ou fazer a paz; que fora disso essas funções só não podiam outorgar ao Govêrno, em face da Constituição da República Portuguesa. Tanto isto assim era, que a Câmara substituiu a proposta do Govêrno por uma outra que foi apresentada por lei, a qual dava ao Govêrno a faculdade de distribuir pelos Ministérios da Agricultura, do Comércio e das Finanças, conforme as. suas aptidões e necessidades do serviço e, de harmonia com as disposições da lei, os funcionários do extinto Ministério dos Abastecimentos. E nada mais.

O Govêrno não fez disto uma questão fechada, e não o podia fazer, dadas as declarações do Sr. Presidente do Ministério. Conseguiu, porém, no Senado, que fôsse feito o seguinte aditamento:

"Podendo o Ministério da Agricultura reorganizar os seus serviços...".

Êste aditamento, votado no Senado, veio à sanção do Congresso, e todos devem estar lembrados do que foram, aquelas horas tristes, que nenhum prestígio trazem à República, das últimas sessões do Congresso.

Isto foi lido na Mesa para merecer, o exame do Congresso, mas tal doutrina passou despercebida, e nós que na véspera tínhamos votado que não deveríamos faltar às disposições da Constituição, e que muito expressamente devíamos dizer

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ao Govêrno aquilo para que era autorizado, vinte e quatro horas depois votámos êste aditamento, sem dele termos conhecimento. Foi esta uma das razões porque pedi a palavra.

O que aqui está é contra o pensamento da Câmara; isto foi arrancado ao Congresso numa ocasião em que ninguêm ouviu e soube o que votou.

Se o Sr. Presidente do Ministério quere realmente corresponder com os actos do seu Govêrno às afirmações tantas vezes feitas, o há pouco repetidas, de que só com a Câmara e pela Câmara quere governar, desde que se diz no fim que o Govêrno dará conta ao Parlamento do uso que fez dessa autorização, pregunto, sem reconhecer, neste momento, a forma irregular que se arrancou êste aditamento, se S. Exa., com o Parlamento aberto, não entende que as providências que o Govêrno deve tomar pelo que diz respeito ao Ministério da Agricultura não devem ser precedidas de qualquer medida legislativa.

O Sr. Charula Pessanha (interrompendo): - É assunto já resolvido e não pode tratar-se dele nesta sessão.

O Orador: - O Regimento não consente que na mesma sessão legislativa se tratem assuntos já rejeitados, mas como êste não foi rejeitado, mas sim aprovado, a todo o tempo a Câmara pôde tratá-lo.

Está o Parlamento aberto, e o Sr. Presidente do Ministério não nos faz seguramente a injustiça de supor que estamos aqui para fazer um obstrucionismo sistemático a qualquer obra que nos apresente, e assim ou o Govêrno prescinde do Parlamento e usa da autorização que lhe foi conferida nessa lei, ou então, vivendo com a Câmara e para a Câmara, desde que o Parlamento está aberto, a êle entrega a sua resolução. É assim? Esta é a pregunta concreta que faço ao Govêrno.

Alêm disso, temos pendente uma proposta de lei sôbre cereaes, proposta que está já de tal maneira deturpada, em toda a sua economia, que entendo que devo merecer um novo exame das respectivas comissões, sem o que não pode ser útil ao Govêrno e ao País.

Estando pendente da apreciação da Câmara essa proposta, hoje o Diário de Notícias anuncia-nos que vai ser publicado um decreto modificando o preço de venda dos cereais à moagem, sem que conjuntamente se verifique o diagrama e sem que o Parlamento a êsse respeito se pronuncie.

Pregunto se, estando pendente da discussão o projecto dos cereais, o Govêrno entende que deve sobrepor-se ao Parlamento.

Quando o Sr. Presidente do Ministério levantou um pouco o véu para nos indicar quais os seus colegas que traziam nas respectivas pastas trabalhos maravilhosos de regeneração nacional, processos administrativos os mais lógicos e racionais de desenvolver a riqueza pública, S. Exa. afirmou à Câmara que uma das primeiras medidas a ser submetida à sua apreciação seria a respeitante à navegação. Não há dúvida de que, como disse o Sr. Júlio Martins, essa proposta merece um cuidado extremo, já pelo seu aspecto moral, já pelo que ela importa aos superiores interessas da Nação, já porque ela pode implicar uma possível alienação de bens nacionais com um proveito que eu dispenso por agora de averiguar.

Eu não digo que o Govêrno, pois suponho que o não fará, traga a esta Câmara uma proposta detalhada, até os mínimos pormenores, sôbre todas as vantagens que podem advir para o Estado da passagem dos transportes marítimos para as mãos de entidades particulares. Mas se o Govêrno pensa em submeter à apreciação do Parlamento uma proposta de lei nesse sentido, que ela seja de tal forma concreta que nos habilite a pronunciarmo-nos sôbre ela com perfeita consciência e conhecimento de causa.

Eu sou daqueles que entendem que o Estado não deve alienar a exploração dos transportes marítimos, pois que se ela não tem sido feita até aqui com os resultados desejáveis, por falta de competência ou por quaisquer outros motivos, o remédio é fácil de tomar. Hei-de empregar todos os argumentos legítimos e honestos, que não me hão-de faltar, para evitar, essa anunciada operação, acompanhando a discussão, na especialidade, até os últimos extremos, o defendendo os interêsses do Estado como um leão.

Estou com curiosidade de ver essa proposta, e oxalá que nela dalguma maneira

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se zelem os interêsses do Estado e que não seja possível, nem nesta Câmara, nem lá fora, alguêm atribuir-lhe propósitos menos patrióticos e úteis para a vida da Nação.

Sr. Presidente: eram estas as observações a fazer às declarações do Sr. Presidente do Ministério, mas, antes de dar por concluídas as minhas considerações, consinta V. Exa. que mais uma vez eu note as contradições que encontro entre os propósitos do Govêrno e as palavras agora pronunciadas pelo Sr. Presidente do Ministério.

Disso S. Exa. que desejava viver com a Câmara, e, referindo-se a uma proposta relativa à vida das nossas colónias, foi dizendo que a apresentaria como uma questão fechada, de modo que S. Exa. vindo dizer como chefe duma situação ministerial, que apresenta uma proposta que considera fechada, o mesmo é que lançar para a oposição uma laranja descascada.

Interrupção do Sr. Presidente do Ministério que não foi ouvida.

O Orador: - Eu bem sei o que êsse artigo 87.° da Constituição representa na vida ministerial, no que diz respeito às colónias.

Sei a importância que êle, tem, e sei que se trata duma questão importante, qual é a dos altos comissários.

Eu posso falar nisto, porque da parte do Govêrno nem uma palavra houve de inconfidência, e como nada êle disse, eu tenho a liberdade absoluta de supor que se trata dos altos comissários.

Não há dúvida que não podemos fazer depender do Terreiro do Paço a vida das colónias.

Ainda que se conheçam as colónias, as providências para as necessidades de momento, não se facilitam pelas distâncias a que elas ficam.

Eu quero um comissário que seja um governador, na mais alta acepção do termo; não quero um rei, não quero dois reis, não quero reis dentro duma república. E aquelas razões que foram apresentadas já há meses, para que essa providência fôsse tomada, porque dentro de horas talvez não fôsse possível segurar o que se nos escapava das mãos, - essas razões nunca me convenceram, e os factos têm mostrado que eu estava no bom terreno.

Essas razões, repito, não colheram no meu espírito, e ainda me levam hoje, com mais justificado motivo, a não considerar indispensável, mas antes um perigo, a modificação do artigo 87.° da Constituição, de forma a que o Parlamento, o País, não tenha ingerência na vida administrativa das nossas colónias.

Aguardo, porem, com o máximo interêsse essa providência do Govêrno, e eu tenho pena que ela venha a envolver uma laranja descascada, porque não tendo eu fôrça para fazer escorregar o Govêrno nela, talvez a Câmara se possa convencer que ela deve ser uma questão aberta e não haver mais uma contradição da parte do Sr. Presidente do Ministério.

Concluo, Sr. Presidente, dizendo que não entro propriamente no debate político, porque êsse aspecto da questão coube de direito ao meu ilustre correligionário, Sr. António Granjo.

O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando restituir a revistas, as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.

O Sr. Sá Cardoso (Presidente do Ministério e Ministro do Interior): - Sr. Presidente: está a hora adiantada, mas eu não quero deixar ficar para amanhã as pequenas considerações que desejo fazer em resposta ao Sr. Júlio Martins. S. Exa. tomou como um propósito agressivo da minha parte a frase que eu disse, citando a do Sr. Dias da Silva, de que S. Exa. não tinha apresentado ideas de Govêrno.

Pelo meu temperamento e feitio, S. Exa. não devia supor que eu irritasse a questão propositadamente para a transformar num debate político. Foi uma frase incidental, sem intenção de querer levar novamente S. Exa. a tomar a palavra para fazer as considerações que fez.

Não me arrependo, porém, de a ter proferido, visto que ela deu margem a que S. Exa. produzisse magníficas considerações, e se não respondo concretamente a elas, é porque não tencionando demorar-me nas cadeiras do Poder não tinha preparado um largo programa governativo. Todavia, sôbre os assuntos a que S. Exa. se referira, o Govêrno trará

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algumas medidas, não aquelas que representem uma solução imediata do problema, mas que serão o seu início E tenho a certeza de que hei-de encontrar S. Exa. ao meu lado em muitas das medidas que o Govêrno, tenciona apresentar ao Parlamento, pois sôbre algumas delas, da maneira como S. Exa. se expressou, eu tive ensejo de verificar que milhamos perfeitamente no mesmo campo.

A seu tempo elas virão. Amanha - e aproveito a ocasião para responder ao Sr. Jorge Nunes - será naturalmente apresentada a proposta relativa aos navios, e desnecessário era estabelecer um debate que dentro de horas se terá de fazer.

Fez o Sr. Jorge Nunes uma larga discussão sôbre o assunto, mas sem perfeito conhecimento do caso, porquanto falou sôbre hipóteses.

O Sr. Jorge Nunes: - Apenas quis afirmar um propósito...

O Orador: - O Govêrno apresenta as bases- Está da parte do Parlamento conceder aquilo que pede.

Eu não vejo incoerência da minha parte, desde o momento que o Parlamento concedeu ao Govêrno autorização até 2 de Dezembro, o Govêrno só tem que vir à Câmara dar conta dos seus actos.

O Parlamento votou porque entendeu que devia votar, e o Govêrno apresentará os casos que julgar indispensáveis para tomar as medidas que precisar, embora depois tenha que apresentar contas à Câmara.

V. Exa. referiu-se á liberdade de comércio. Nesse ponto direi que o Govêrno não abdica das suas ideas; mas no momento actual essa liberdade de comércio não pode dar-se.

Outro ponto ainda: o Sr. Ministro do Comércio trará ao Parlamento um projecto sôbre estradas, aproveitando ideas de V. Exa.

Não veja V. Exa. nas minhas palavras qualquer agressão; nunca pela minha cabeça me passou semelhante cousa, além de que V. Exa., representando um pequeno grupo de deputados, certamente não pensa em escalar as cadeiras do poder.

Nunca houve agressão da minha parte.

O Sr. Dias da Silva: - Sr. Presidente: havendo vagas de sub-chefes de repartição da secretaria desta Câmara, e constando-me que a Comissão Administrativa do Congresso pretende fazer nomeações com pessoal estranho ao funcionalismo desta Câmara, eu pregunto o que há sôbre isto, visto ser uma injustiça se assim se fizer, pois o pessoal desta Câmara tem competência, e é bem republicano, como se provou por uma sindicância que há pouco se fez, sendo afastados aqueles que não mereciam, confiança à República.

Nestes termos, não há razão absolutamente nenhuma para que se faça o que se diz.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - As considerações de V. Exa. fundamentam-se num boato que V. Exa. diz ter ouvido. Eu não posso estar a ligar uma grande importância a boatos, a não ser quando êles são espalhados pelos Srs. Deputados.

Não sei o fundamento que tal boato possa ter.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Presidente: - A próxima sessão é amanhã, à hora regimental. Antes da ordem do dia continua a discussão do parecer 75, sendo a ordem do dia a que estava marcada para hoje.

Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 20 minutos.

Documentos enviados para a Mesa durante a sessão

Projecto de lei

Do Sr. António Pais Rovisco, sôbre a classificação da praça de Elvas.

Para o "Diário do Govêrno".

Propostas de lei

Do Sr. Ministro da Guerra, entregando à Direcção da Cruzada das Mulheres Portuguesas o Instituto de Reeducação dos Mutilados de Guerra.

Aprovada a urgência.

Para a comissão de guerra.

Para o "Diário do Govêrno".

Dos Srs. Ministros das Finanças e Comércio, criando em todas ás estâncias hi-

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drológicas e outras, comissões de iniciativa, com o fim de promover o desenvolvimento das estâncias.

Para o "Diário do Govêrno".

Dos mesmos Srs. Ministros, autorizando o Conselho de Turismo a promover a fundação de entidades destinadas a concorrer para o incremento da indústria hoteleira.

Para o "Diário do Govêrno".

Do Sr. Ministro do Comércio, autorizando o Govêrno a criar novos Armazéns Gorais Industriais o suprimir os criados pelo decreto n.° 4:020.

Para o "Diário do Govêrno".

Do Sr. Ministro da Marinha, criando escolas de pesca para educação profissional e técnica do pescador.

Para o "Diário do Govêrno".

Parecer

Da comissão de finanças, sôbre a proposta de lei n.° 111-B, dos Srs. Ministros da Guerra e Finanças, abrindo um crédito de 160.000$ para a reconstrução da Garage Militar de Lisboa.

A imprimir com urgência.

Nota de interpelação

Desejo interpelar o Exmo. Sr. Ministro da Instrução sôbre a nomeação efectiva do inspector do Círculo: Escolar dá Feira, feita por despacho de 20 de Agosto e publicado no Diário do Govêrno, 2.ª série, de 11 do Setembro do corrente ano. - Angelo Sampaio Maia.

Para a Secretaria.

Declarações de voto

Declaramos que rejeitamos o artigo 1.° do projecto que fixa o subsidio dos Srs. Deputados em 250$ mensais, por julgarmos que êsse subsídio, fixado em 150$, era suficiente, desde de que aos Deputados residentes fora de Lisboa fôsse concedida uma ajuda de custo para viagem.

Sala das Sessões, 14 de Outubro de 1919. - António Francisco Pereira - Manuel José da Silva - José Gregório de Almeida.

Para a acta.

Declaro, que embora reconheça insuficiente o actual subsídio dos Deputados, rejeitei o parecer da comissão que propôs o aumento por entender que êsse aumento devia apenas ser votado para os Parlamentos que de futuro se elejam, caso subsista a actual carestia de vida. - Tavares Ferreira.

Para a Secretaria.

Para a acta.

Requerimentos

Requeiro que, pelo Ministério da Instrução, me seja dada autorização para consultar os seguintes processos:

a) O que concede licença ilimitada ao antigo inspector escolar electivo da Feira, Madeira Marques;

b) O que nomeia, pela concessão de licença àquele, inspector efectivo daquele mesmo círculo o antigo professor de Fiaes, do concelho da Feira.

Sala das Sessões, 14 de Outubro de 1919. - Angelo Sampaio Maia.

Requeiro que, pelo Ministério da Marinha, me seja fornecido, com a possível brevidade, um mapa do qual conste o efectivo dos sargentos o praças da armada, em efectivo serviço, indicando-se nele as que pertencem aos quadros, por virtude de diplomas legais, as que faltam ou excedem êsses quadros. - O Deputado, Domingos Cruz.

Expeça-se.

Requeiro que, pelo Ministério da Instrução Pública, me seja fornecida nota dos professores nomeados para as escolas superiores de instrução primária, desde 1 de Junho do corrente ano até o presente.

Igualmente requeiro que, pelo Ministério da Instrução Pública, me seja concedida licença para examinar os processos da nomeação dos mesmos professores.

Sala das Sessões, em 14 de Outubro de 1919. - O Deputado, João Bacelar.

Expeça-se.

Requeiro que, pelo Ministério das Finanças., me seja fornecida com a maior urgência, cópia da sentença que condenou, o oficial da Alfândega de Angra, Teixeira da Silva.

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Igualmente requeiro me seja dada. com a mesma urgência, cópia dos processos existentes na Direcção Geral das Alfândegas, relativos ao empregado aduaneiro, Aragão e Brito, e bem assim os motivos por que foi demitido do cargo para que fora nomeado em Timor.

Sala das Sessões, em 14 de Outubro de 1919. - O Deputado, Francisco da Cruz.

Expeça-se.

Requeiro que, pelo Ministério da Guerra, me sejam fornecidos com urgência os seguintes documentos:

Cópia da exposição feita pelo coronel Cristóvão Adolfo Ribeiro da Fonseca ao Exmo. Ministro, em Abril do corrente ano.

Cópia do despacho do Exmo. Ministro sôbre essa exposição.

Cópia do requerimento do referido coronel, feito em harmonia com o despacho do Exmo. Ministro lançado na exposição atrás pedida em cópia, e que foi por despacho do mesmo Ministro presente ao Conselho Superior de Promoções.

Cópia do parecer do Conselho Superior de Promoções sôbre o dito requerimento incluindo os considerandos e apreciações que o antecedem.

Cópia do despacho do Exmo. Ministro e bem assim do decreto que promoveu a general da reserva o referido coronel Ribeiro da Fonseca e outros coronéis que se encontravam na mesma situação.

Mais requere:

Cópia da declaração prestada pelo coronel Ribeiro da Fonseca de que deseja concorrer à vaga de general por escolha dada em Outubro ou Novembro de 1913.

Sala das Sessões, em 14 de Outubro de 1919. - O Deputado, Angelo Sampaio Maia.

Expeça-se.

O REDACTOR - Sérgio de Castro.

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