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REPÚBLICA PORTUGUESA

DIÁRIO DA CAMARA DOS DEPUTADOS

SESSÃO N.° 82

EM 14 DE NOVEMBRO DE 1919

Presidência do Exmo. Sr. Domingos Leite Pereira

Secretários os Exmos. Srs.

Baltasar de Almeida Teixeira
António Marques das Neves Mantas

Sumário. - Abre-se a sessão com a presença de 61 Sr. Deputados.

É lida a acta da sessão anterior, sendo aprovada sem discussão.

Dá-se conta do expediente.

São admitidas à discussão algumas proposições da lei.

O Sr. Presidente anuncia que o parecer n.º 52 continua em discussão na especialidade.

O Sr. Pedro Pita (em nome da comissão de administração pública) manda um parecer para a Mesa.

Usa da palavra sôbre o artigo 1.° do parecer n.° 92 o Sr. Jorge Nunes.

Responde-lhe o Sr. Ministro das Finanças (Rêgo Chaves).

Usam em seguida da palavra os Srs. Raul Tamagnini, Virgílio Costa, Paiva Manso, Júlio Martins e Brito Camacho, que manda para a Mesa uma proposta. É admitida.

O Sr. António Fonseca faz algumas considerações e envia para a Mesa uma proposta. É admitida.

Usam em seguida da palavra os Srs. Manuel José da Silva (Pôrto) e Jorge Nunes.

Lê-se na Mesa a proposta do Sr. Brito Camacho.

O Sr. António Fonseca requere prioridade para a sua proposta. É aprovado êste requerimento.

A Câmara aprova a proposta do Sr. António Fonseca, considerando-se prejudicada a do Sr. Brito Camacho.

É aprovado o artigo 1.°, salva a emenda.

É aprovado sem discussão o artigo 2.º

São aprovados sem discussão os artigos 3.° e 4.°

A Câmara dispensa a última redacção dêste projecto, a requerimento do Sr. Paiva Manso.

Entra em discussão o projecto de lei n.° 136-L.

Usam da palavra os Srs. Jorge Nunes, Mariano Martins, Vergílio Costa, Dias da Silva, António Fonseca, Orlando Marçal, Brito Camacho, Ministro do Comércio e Comunicações (Ernesto Navarro), Júlio Martins e Ministro das Finanças.

Esgotada a inscrição, é aprovada a generalidade do projecto.

Entrando em discussão na especialidade, usa da palavra sôbre o artigo 1.º o Sr. António Fonseca que manda para a Mesa uma proposta de eliminação. Lida na Mesa, é admitida, e em seguida aprovada.

A Câmara aprova o artigo 1.°, salva a emenda.

O Sr. António Fonseca apresenta uma proposta de substituição que é admitida.

É rejeitado o artigo 2.º do projecto e aprovada a substituição do Sr. António Fonseca.

Lido o artigo 3.º, o Sr. António Fonseca propõe a sua eliminação. É aprovada esta proposta.

Aprovado o artigo 4.°, sem discussão, o Sr. Afonso de Macedo requere a dispensa da última leitura. É aprovado êste requerimento.

O Sr. Manuel José da Silva (Oliveira de Azeméis) requere a discussão do parecer n.º 166, na próxima sessão destinada às questões regionais.

Usa da palavra, sôbre o modo de votar, o Sr. Brito Camacho; e em seguida é rejeitado o requerimento do Sr. Manuel José da Silva.

Feita a contraprova, é considerado aprovado.

Entra em discussão o parecer n.º 123; usando da palavra os Srs. Costa Júnior, que manda para a Mesa uma proposta de emenda, Mesquita Carvalho que apresenta uma moção, Francisco José Pereira, Maldonado de Freitas, Eduardo de Sousa e Hermano de Medeiros.

É rejeitada a moção do Sr. Mesquita Carvalho.

O Sr. Eduardo de Sousa requere a contraprova.

Efectuada a contraprova, verifica-se que a rejeitaram 50 e a aprovaram 15 Srs. Deputados.

É aprovada a generalidade do projecto em discussão, levantando-se protestos.

O Sr. António Fonseca invoca o artigo 109.° do Regimento.

Usam da palavra para invocar o Regimento os Srs. Afonso de Melo e Mesquita Carvalho.

O Sr. Tavares Ferreira requere que seja prorrogada a sessão até ser votado o projecto em discussão. É aprovado.

O Sr. Eduardo de Sousa requere a contraprova e a contagem. Efectuada a contraprova, verifica-se

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que o requerimento do Sr. Tavares Ferreira foi aprovado por 56 Srs. Deputados e rejeitado por 15.

Posta em discussão na especialidade, é admitida uma proposta de emenda do Sr. Costa Júnior, ao artigo 1.°

A Câmara admite uma proposta de emenda do Sr. Maldonado de Freitas.

Usam da palavra os Srs. António Fonseca que manda para a Mesa uma proposta de eliminação, Júlio Martins que apresenta uma emenda, Francisco José Pereira (relator) e Hermano de Medeiros que envia uma proposta para a Mesa.

São admitidas as proposta dos Srs. António Fonseca, Júlio Martins e Hermano de Medeiros.

Usa da palavra o Sr. Afonso de Melo que propõe o adiamento da discussão até que o Sr. Ministro das Finanças forneça a Câmara alguns elementos de apreciação.

O Sr. Eduardo de Sousa, envia para a Mesa um requerimento.

O Sr. Presidente dá esclarecimentos ao Sr. Eduardo de Sousa que em seguida usa da palavra para explicações.

É admitida a proposta do Sr. Afonso de Melo.

Usa da palavra, o Sr. Ministro do Trabalho (José Domingues dos Santos).

Fala o Sr. Mesquita Carvalho, e requere que a discussão seja sustada até que o Sr. Ministro das Finanças esteja habilitado a responder e o Sr. Presidente do Ministério compareça.

É rejeitado êste requerimento, em prova e contraprova, por 52 votos contra 11.

O Sr. Sr. Presidente anuncia que a discussão dêste parecer continuará na primeira sessão destinada às questões regionais, e suspende a sessão, marcando a seguinte com a respectiva ordem do dia.

Abertura da sessão às 15 horas e 20 minutos.

Presentes à chamada 61 Srs. Deputados.

São os seguintes:

Afonso de Macedo.
Alberto Ferreira Vidal.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Álvaro Pereira Guedes.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Albino de Carvalho Mourão.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Cândido Maria Jordão Paiva Manso.
António da Costa Ferreira.
António da Costa Godinho do Amaral.
António Dias.
António José Pereira.
António Marques das Neves Mantas.
António Pais Rovisco.
António de Paiva Gomes.
António Pires de Carvalho.
António dos Santos Graça.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Bartolomeu dos Mártires Sousa Severino.
Custódio Maldonado de Freitas.
Custódio Martins de Paiva.
Domingos Cruz.
Domingos Frias de Sampaio e Melo.
Domingos Leite Pereira.
Eduardo Alfredo de Sousa.
Evaristo Luís das Neves Ferreira de Carvalho.

rancisco da Cruz.
Francisco da Cunha Rêgo Chaves.
Francisco José Pereira.
Francisco de Pina Esteves Lopes.
Jaime da Cunha Coelho.
Jaime Júlio de Sousa.
João Cardoso Moniz Bacelar.
João Salema.
João Xavier Camarate Campos.
Joaquim Brandão.
Jorge de Vasconcelos Nunes.
José António da Costa Júnior.
José Garcia da Costa.
José Maria de Campos Melo.
José Mendes Nunes Loureiro.
José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.
Júlio Augusto da Cruz.
Júlio do Patrocínio Martins.
Ladislau Estêvão da Silva Batalha.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Luís Augusto Pinto de Mesquita Carvalho.
Luís de Ornelas Nóbrega Quintal.
Manuel Alegre.
Manuel José da Silva.
Manuel José da Silva.
Mariano Martins.
Miguel Augusto Alves Ferreira.
Orlando Alberto Marçal.
Pedro Góis Pita.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Raul António Tamagnini de Miranda Barbosa.
Vasco Borges.
Vasco Guedes de Vasconcelos.
Vergílio da Conceição Costa.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Adolfo Mário Salgueiro Cunha.
Afonso de Melo Pinto Veloso.

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Alexandre Barbedo Pinto de Almeida.
Álvaro Xavier de Castro.
Amílcar da Silva Ramada Curto.
António Albino Marques de Azevedo.
António Aresta Branco.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António Maria da Silva.
Augusto Dias da Silva.
Augusto Pereira Nobre.
Augusto Pires do Vale.
Francisco Alberto da Costa Cabral.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Francisco de Sousa Dias.
Helder Armando dos Santos Ribeiro.
Hermano José de Medeiros.
Jacinto de Freitas.
João Estêvão Águas.
João Gonçalves.
João José Luís Damas.
João Luís Ricardo.
João Pereira Bastos.
João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.
José Domingos dos Santos.
José Gregório de Almeida.
José Monteiro.
Manuel do Brito Camacho.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Manuel Ferreira da Rocha.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
Raul Lelo Portela.
Tomás de Sousa Rosa.

Srs. Deputados que não compareceram à sessão:

Abílio Correia da Silva Marçal.
Acácio António Camacho Lopes Cardoso.
Afonso Augusto da Costa.
Alberto Álvaro Dias Pereira.
Albino Vieira da Rocha.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
Antão Fernandes de Carvalho.
António Bastos Pereira.
António Carlos Ribeiro da Silva.
António Francisco Pereira.
António Germano Guedes Ribeiro de Carvalho.
António Joaquim Granjo.
António Joaquim Machado do Lago Cerqueira.
António Lobo de Aboim Inglês.
António Maria Pereira Júnior.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Augusto Joaquim Alves dos Santos.
Augusto Rebelo Arruda.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Diogo Pacheco de Amorim.
Domingos Vítor Cordeiro Rosado.
Estêvão da Cunha Pimentel.
Francisco Coelho do Amaral Reis.
Francisco Cotrim da Silva Garcês.
Francisco José Martins Morgado.
Francisco José do Meneses Fernandes Costa.
Francisco Luís Tavares.
Francisco Manuel Couceiro da Costa.
Henrique Ferreira de Oliveira Brás.
Jaime do Andrade Vilares.
Jaime Daniel Leote do Rêgo.
João Henriques Pinheiro.
João José da Conceição Camoesas.
João Lopes Soares.
João de Ornelas da Silva.
João Ribeiro Gomes.
Joaquim José de Oliveira.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
José Gomes Carvalho de Sousa Varela.
José Maria de Vilhena Barbosa de Magalhães.
José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
José Rodrigues Braga.
Leonardo José Coimbra.
Liberato Damião Ribeiro Pinto.
Lino Pinto Gonçalves Marinha.
Manuel José Fernandes Costa.
Maximiano Maria de Azevedo Faria.
Mem Tinoco Verdial.
Nuno Simões.
Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.
Vítor José do Deus de Macedo Pinto.
Vitorino Henriques Godinho.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Xavier da Silva.

Às 15 horas e 10 minutos principiou a chamada.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 61 Srs. Deputados. Está aberta a sessão.

Vai ler-se a acta.

Foi lida a acta.

Eram 15 horas e 20 minutos.

O Sr. Presidente: - Está em discussão a acta.

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É aprovada a acta e lido o seguinte

Expediente

Pedidos de licença

Do Sr. João Salema, solicitando 20 dias do licença.

Concedido.

Comunique-se.

Para a comissão de infracções e faltas.

Do Sr. Camarate do Campos, solicitando 3 dias de licença.

Concedido.

Comunique-se.

Para a comissão de infracções e faltas.

Ofícios

Do Ministério da Justiça, enviando cópia dum ofício respeitante ao registo predial, satisfazendo em parte ao requerido pelo Sr. José Garcia da Costa.

Para a Secretaria.

Do Ministério das Colónias, enviando cópia do processo interposto pelo segundo sargento Adelino de Lima, pedida pelo Sr. Domingos Frias.

Para a Secretaria.

Do Ministério da Instrução Pública, participando que podem ser consultados, na Repartição de Ensino Secundário, os documentos pedidos pelo Sr. António Marques das Neves Mantas.

Para a Secretaria.

Do Senado, enviando uma proposta de lei que considera sujeitas ao regime florestal as tapadas de Mafra.

Para a Secretaria.

Para a comissão de agricultura.

Telegramas

Pôrto. - Empregados judiciais, tribunais, relação, comércio, cível, pedindo promulgação da nova tabela de emolumentos judiciais.

Baião. - Oficiais justiça comarca Baião pedindo imediata discussão nova tabela emolumentos.

Penela. - Funcionários administrativos pedindo aumento vencimento.

Cadaval. - Do Presidente Câmara Cadaval acerca do aumento vencimentos empregados administrativos, sentindo ficar a cargo do Estado o pagamento empregados administrações por serem empregados Estado e não Câmara. - Nascimento Pereira, presidente.

Para a Secretaria.

Nisa. - Rogo consiga adicional 30 por cento contadores comarcas dois escrivães compensação justa pouco movimento judicial. - Contador Nisa.

Gaia. - Da comarca municipal de Gaia protestando energicamente contra o projecto que cria a comarca municipal de Espinho.

Para a Secretaria.

Representações

Da Câmara Municipal do Pôrto, protestando contra o pedido feito à Câmara dos Deputados no sentido de estabelecer no Pôrto regime idêntico ao que se projecta estabelecer em Lisboa relativamente à regulamentação do jôgo do azar.

Para a Secretaria.

Para a comissão de comércio e indústria.

Da junta médica do Ministério do Comércio e Comunicações, pedindo que a sua remuneração, por sessão, seja equiparada à das juntas médicas, da Caixa de Aposentações e do Ministério do Trabalho.

Para a Secretaria.

Para a comissão de finanças.

Do Sr. Augusto Lopes Carneiro, solicitando da Câmara a autorização necessária para que possa depor, o Sr. Augusto Dias da Silva, e pedindo que o mesmo Sr. Deputado indique o dia e a hora em que poderá produzir o seu depoimento.

Para a Secretaria.

Concedido.

Comunique-se.

Para a comissão de infracções e faltas.

Da Câmara Municipal de Penela, chamando a atenção da Câmara dos Deputados para as circunstâncias precárias das

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finanças do Município em face das pretensões dos funcionários administrativos.

Para a Secretaria.

Para a comissão de administração pública.

Admissões

Foram admitidas à discussão as seguintes proposições de lei

Projectos de lei

Do Sr. Vergílio Costa, organizando o quadro do pessoal artístico da Direcção Geral dos Trabalhos Geodésicos e Topográficos.

Para a Secretaria.

Admitida.

Para a comissão de obras públicas e minas.

Do Sr. Maldonado de Freitas, criando na vila das Caldas da Rainha uma Escola Comercial.

Para a Secretaria.

Admitido.

Para a comissão de instrução especial e técnica.

Do Sr. António Pais Rovisco sôbre um empréstimo de 150.000$ para a Escola de Ferreira Borges, de Lisboa.

Para a Secretaria.

Admitido.

Para a comissão de instrução especial e técnica.

Do Sr. Orlando Marçal, considerando professores tirocinantes das Escolas Comerciais ou Industriais os actuais mestres de estenografia, dactilografia e caligrafia.

Para a Secretaria.

Admitido.

Para a comissão de instrução especial e técnica.

O Sr. Presidente: - Entra em discussão na especialidade o parecer n.° 92.

Está em discussão o artigo 1.°

O Sr. Pedro Pita: - Mando para a Mesa um parecer da comissão de administração pública acerca de um projecto de lei que autoriza a Câmara Municipal de Coimbra a cobrar um imposto sôbre as companhias de seguros.

O Sr. Jorge Nunes: - Devo confessar que o projecto em discussão é daqueles que não podem ser votados pela Câmara.

Temos de limitar a discussão apenas aos seus artigos, porque o não acompanha uma só linha de relatório e as comissões de finanças e de instrução pública especial e técnica limitam-se a dar-lhe o seu apoio.

O Sr. Presidente: - Lembro a V. Exa. que o projecto já foi aprovado na generalidade!

O Orador: - Sei-o bem, mas como o projecto tem apenas três artigos, eu, para condenar o primeiro, tenho de me referir ao parecer das comissões.

O da comissão de instrução especial e téchnica diz o seguinte:

"É absolutamente necessário dotar a Escola Industrial do Infante D. Henrique com um edifício apropriado e com o material didáctico necessário para bem poder ministrar um bom ensino".

A comissão de finanças, diz no seu parecer:

"A vossa comissão de finanças, reforçada a sua opinião pela da comissão de instrução especial e técnica, é de parecer que êste projecto merece a vossa aprovação".

Eu pregunto à Câmara e a V. Exa. porque é que se julga que 150.000$ são bastantes para construir um edifício desta natureza.

Eu pregunto se é possível discutir um assunto desta natureza sem que esteja presente nenhum membro do Govêrno.

Se é legítimo que se discuta um projecto que traz o aumento de 150.000$, sem que esteja presente o Sr. Ministro das Finanças, estando em vigor a lei de 13 de Março de 1913.

O Sr. António Fonseca (interrompendo): - A presença e aquiescência do Sr. Ministro das Finanças só é necessária quando se discute o Orçamento.

O Orador: - V. Exa., como membro da maioria, poder-me há dizer se está ou não de pé a lei travão?

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O Sr. Raul Tamagnini: - V. Exas. confundem Poder Executivo!

O Orador: - Não confundimos.

A V. Exas. é que lhes convém desconhecer o que é Poder Legislativo!

Para V. Exas. acima da lei está o número.

Ora o número impõe-se, mas não convence.

Sr. Presidente: eu já percebi a razão por que o Sr. Ministro das Finanças não está: é porque S. Exa. a pronunciar-se, tinha de o fazer abertamente contra o projecto, e S. Exa. não quero malquistar-se ainda mais do que está com a maioria.

O Govêrno tomou assim esta cómoda situação de não aparecer no Parlamento quando é preciso.

O Govêrno, quando não precisamos dele para cousa nenhuma, é solícito em aparecer aqui, (Apoiados).

De mais, Sr. Presidente, desde que o Sr. Ministro das Finanças declarou ontem na Câmara que a situação do pais é do tal modo desafogada que milhares do contos a mais nas despesas públicas, sem se contrabalançarem com as receitas precisas, de nenhuma maneira afectam já o Tesouro Público, acho que quem assim pensa não tem interêsse em acompanhar as discussões desta casa, e tanto se interessa que votemos milhares de contos de despesas, como cousa nenhuma. (Apoiados).

O Govêrno declara, em notas oficiosas, acompanhadas por outras do seu partido, que, acerca dos problemas nacionais, tem largas medidas a executar, e ninguêm mais competente do que êle para o fazer, desde que o deixem trabalhar em sossêgo e em ordem, a imprensa, apoiando o Govêrno, quere tambêm que êle trabalhe, e que o Parlamento o auxilie, mas eu pregunto que valor podem ter essas medidas que não passam de afirmações? (Apoiados).

O Govêrno diz que é preciso fazer-se, mas não faz cousa nenhuma! (Apoiados).

Entra na sala o Sr. Ministro das finanças.

O Orador: - Ora ainda bem que está presente o Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Rêgo Chaves (Ministro das Finanças): - Estou no Parlamento desde que se fez a primeira chamada.

O Orador: - Mas como o Parlamento, para mim, legislador, é só esta sala, pode V. Exa. estar onde quiser no edifício, que não estando aqui, não me serve para nada, e eu tenho o direito de exigir a sua presença.

O Sr. Rêgo Chaves (Ministro das Finanças): - Para outra vez, ou peço licença a V. Exa. para sair da sala.

O Orador: - V. Exa. não tem de me pedir licença.

Pode sair da sala quando quiser, mas eu é que tenho o direito de exigir a sua presença nesta casa, dêste lugar, ao passo que V. Exa. dêsse lugar não pode exigir a minha. (Apoiados).

O Sr. Rêgo Chaves (Ministro das Finanças): - É por isso que estou aqui.

O Orador: - Mas vamos ao que importa.

Comecei eu há pouco por dizer que o artigo 1.° da lei do 15 de Março de 1913, chamada a lei-travâo, não consente que um projecto desta natureza, que traz um aumento de despesa de 150 contos, possa ser apreciado pela Câmara e até recebido pela Mesa, sem se pronunciar sôbre êle, a seu favor, a comissão de finanças e tambêm o Sr. Ministro das Finanças.

Alguém da maioria pôs em dúvida que a aquiescência do Sr. Ministro das Finanças fôsse indispensável, e eu então preguntei se se considerava, ou não, de pé a lei travão.

A proposta orçamental já foi apresentada há meses. Estamos, por consequência no período destinado à discussão do orçamento. Se êste se não discutiu foi por que não houve tempo ou por que as comissões não puderam dar os seus pareceres a tempo. Nestas condições, tivemos necessidade de votar duodécimos.

As disposições do artigo 1.° da lei travão são claras. Em face delas, desde 13 de Janeiro em diante, já se não consente a discussão e votação de qualquer projecto de lei que traduza aumento de despesa ou diminuição de receita, sem que o

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Ministro das Finanças seja previamente ouvido e declare que concorda com êsse aumento ou essa diminuição.

Foi esta a doutrina acérrimamente defendida pelo Sr. Dr. Afonso Costa, muito saudoso chefe do partido do Sr. António Fonseca...

Recordo-me, pois, perfeitamente de que ficou bem assente, nesta casa do Parlamento, que o período de discussão orçamental começava desde a data da apresentação da proposta de lei. Pelo menos foi êste o método do trabalho adoptado conforme o ditou com o seu autoritarismo e despotismo o Partido Democrático de então. E se tivesse à mão o Diário das Sessões fácilmente mostraria que foi esta a interpretação que deu à lei-travão o Sr. Dr. Afonso Costa.

Estamos Sr. Presidente, dentro do período da discussão orçamental, e já ao Orçamento Geral do Estado nos referimos quando esta Câmara votou os duodécimos pedidos pelo Govêrno.

Não fizemos, é certo, uma discussão do orçamento nos seus mínimos detalhes, mas apreciámo-lo grosso modo.

E, assim, nenhum projecto de lei que acarrete aumento de despesa pode ser discutido e votado sem que o Sr. Ministro das Finanças declare que concorda com o projecto.

A lei tem de se respeitar, de contrário ninguêm se pode admirar de que a oposição no uso legitimo dum direito seja violenta nos seus ataques e embarace as discussões do Govêrno ou da maioria.

Neste momento, a Câmara só pode fazer uma cousa: é mandar o projecto novamente à comissão de finanças para, depois de ouvido o Sr. Ministro das Finanças, ser apreciado por ela. Desde que se não faça isso, comete-se um abuso.

De 15 de Janeiro para cá V. Exa. não pode receber na Mesa nenhuma proposta que traga aumentos de despesa.

O Sr. António Fonseca está-me a ouvir e a concordar comigo.

O Sr. António Fonseca: - Estou a ouvir e a discordar...

O Orador: - Terminando as minhas considerações eu direi que desejava ouvir a opinião do Sr. Ministro das Finanças não só para me esclarecer a mim, mas tambêm à Câmara que não sabe o que se vai votar.

O orador não reviu.

O Sr. Rêgo Chaves (Ministro das Finanças): - Tendo o Sr. Jorge Nunes insistido para eu declarar qual a minha opinião sôbre êste projecto, devo declarar a S. Exa. que não concordo com a aplicação da lei-travão neste momento, pois não me consta que esteja em discussão o orçamento. Esta discussão nem sequer foi interrompida porque não se iniciou.

Dêste modo, eu não dou a mesma interpretação à lei de 18 de Março de 1913.

O artigo 1.° da lei-travão impõe que seja ouvida a opinião do Ministro. Ora eu creio que estamos muito a tempo de pedir essa opinião, e que tanto faz ouvir a Câmara da sua boca como exará-la no parecer com a palavra concordo.

O Sr. António Fonseca (interrompendo): - O legislador conhecia muito bem a palavra apresentou, e serviu-se dela para evitar que os Deputados apresentassem propostas de aumento de despesa emquanto se discutisse o orçamento.

O Orador: - A segunda pregunta concreta que S. Exa. me fez, foi esta: concorda o Ministro das Finanças com o aumento de despesa?

Eu declaro que estou absolutamente de acordo com a comissão de finanças e com a comissão de instrução técnica e especial desde que elas me dizem o seguinte:

A vossa comissão de finanças, reforçada a sua opinião pela comissão de instrução especial e técnica é de parecer que este projecto mereço a vossa aprovação.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Raul Tamagnini: - Ouvi as considerações feitas pelo Sr. Jorge Nunes. S. Exa. pôs mais uma vez em evidência a sua retórica, muito brilhante quando quere fazer a oposição.

Mas S. Exa. o Sr. Jorge Nunes desta vez não tem razão.

Que a não tem sob o ponto de vista da lei-travão, acaba de o provar o Sr. Ministro das Finanças e de o confirmar, num àparte, o Sr. António Fonseca.

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Que não tem razão no ataque ao projecto em si, toda a gente o compreende, desde que se saiba que se trata dum projecto cujo fim é criar no Pôrto, cidade industrial e trabalhadora por excelência, uma escola técnica industrial digna dêsse nome. É necessário estabelecer no Pôrto o ensino profissional, capaz de criar operários que produzam conscientemente. É necessário olhar a sério e por forma prática êste problema do ensino técnico em Portugal que se relaciona intimamente com o desenvolvimento económico do país.

A Escola Industrial Infante D. Henrique está instalada num pardieiro pelo qual o Estado paga anualmente dois contos de renda.

S. Exa., para fazer oposição a êste projecto, oposição que é descabida e da razão da qual, certamente, S. Exa. é o primeiro a não estar convencido, procurou impressionar a Câmara, ferindo a nota do grande encargo que traz ao Estado um dispêndio do 150 contos. Não viu S. Exa. bem o projecto, pois que, se o tivesse lido com atenção, saberia que do que se trata é do Estado contrair um empréstimo naquele montante, amortizável em 25 anos, o que se traduz numa amortização, anual, de 6 contos aproximadamente. Ora, se deduzirmos desta quantia a verba de 2 contos, que é a renda que o Estado paga actualmente, como já disse, fica apenas o encargo de 4 contos anuais. Mal de nós se o Estado não pudesse despender êsses 4 contos para fomentar a instrução profissional neste desgraçado país que tem sido só de doutores.

Longe de mim a intenção de maguar com isto os que o são, pois eu tambêm tenho um curso superior.

Temos sido homens teóricos. E tanto assim que para as nossas fábricas vamos buscar os respectivos mestres ao estrangeiro. Ora é preciso que possamos habilitar nas nossas Escolas os indivíduos que possam competentemente exercer o lugar de mestres de fábricas e oficinas. É mester termos pessoal habilitado para que os nossos produtos possam rivalizar com os do estrangeiro, não só entrenós, como até lá fora. E isto só se conseguirá fomentando o ensino profissional em condições de produzir bons resultados.

Só com escolas instaladas em edifícios apropriados e dotados do indispensável material é que podemos atingir êsse desideratum.

Permita-me S. Exa. dizer que eu tambêm conheço a existência da lei-travão. Sou da mesma opinião do Sr. Ministro das Finanças. Ela nada vem ao caso, visto que não estamos na discussão do Orçamento. Que S. Exa. o Sr. Ministro das Finanças concordaria com êste projecto, já eu esperava, visto que conheço bem o espírito liberal e progressivo de S. Exa.

O Sr. Jorge Nunes fez ainda algumas considerações significativas da sua estranheza sôbre o facto de esto projecto não vir precedido de considerandos.

Mas que considerandos seriam necessários numa questão desta natureza?

O que seria necessário dizer para que toda a gente reconheça a necessidade de se arranjar um edifício apropriado a esta escola, quando todos sabem que é absolutamente preciso desenvolver o ensino profissional e que no Pôrto não há nenhum edifício em condições para alugar?

Não eram, pois, precisos quaisquer considerandos, e o ataque de S. Exa. está, pois, absolutamente aniquilado.

O orador não reviu.

O Sr. Vergílio Costa: - Sr. Presidente: a comissão de instrução especial e técnica não podia opor-se a êste projecto porque, tendo o país apenas 12 escolas industriais e quási todas funcionando em péssimas condições, é absolutamente justificável êste projecto pelo qual se pretende fazer um empréstimo para adquirir um edifício próprio e material didáctico para essa escola poder funcionar bem e ministrar bom ensino.

Sr. Presidente: temos apenas 12 escolas industriais no país e todas funcionando em péssimas condições.

Não compreendo porque o Sr. Jorge Nunes se opõe a êste projecto, bem sei que é mais um encargo para o Estado, mas êsse encargo não é de 150 contos, pois que dele é preciso deduzir a renda.

Parece-me que é de toda a justiça a aprovação dêste projecto, porque é necessário desenvolver o ensino técnico que é uma boa garantia para o futuro do país.

Tenho dito.

O orador não reviu.

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O Sr. Paiva Manso: - Tenho visto levantar dificuldades à aprovação do parecer n.° 62, que diz respeito ou projecto n.° 28-L, e isso causa uma profunda mágua, uma imensa tristeza. Mágua e tristeza que resultam de convencer-me que êsse obstrucionismo só pode basear-se numa das duas razões: ou o desconhecimento completo do estado do ensino, profissional no nosso país, ou o desejo pessoal de levantar dificuldades a quem tenta fazer alguma cousa em benefício dêsse ensino.

A Escola Industrial Infante D. Henrique, a que se refere o projecto em discussão era a única escola industrial completa no norte do país anteriormente à reforma de 1918. Continua sendo a escola mais frequentada apesar de estar instalada num velho edifício, sem conforto e sem capacidade para os fins a que se destina, onde inclusivamente nos dias chuvosos de inverno há necessidade de suspender as aulas porque a chuva cai copiosamente dentro das próprias aulas. A Escola Industrial Infante D. Henrique tem actualmente 600 alunos, na sua maioria operários que têm de se acumudar em grupos de 40 em salas onde mal caberiam normalmente uns vinte alunos...

É necessário olhar atentamente para o ensino profissional no nosso país. Tal como se exerce actualmente, excepção feita das escolas industriais de Lisboa, êsse ensino é uma burla... A aprendizagem faz-se de cor, de cor aprendem os alunos a descrever uma máquina, um motor, qualquer instrumento de que, na prática, tenham de servir-se e, quando saídos das escolas os alunos se vêem em frente duma máquina ou outro aparelho, de que careçam para o exercício da sua profissão, vêem-se em sérios embaraços, nas mais sérias dificuldades... porque os não conhecem.

A escola industrial a que se refere o projecto em discussão tem agora, em virtude da aplicação do decreto n.° 5:029, uma frequência às suas oficinas de serralharia e carpintaria de cêrca de 200 alunos que têm de estar numa oficina onde cabem apenas cêrca de dezoito pessoas; tem salas de aulas com 1m,85 de altura onde se acumulam durante uma hora e hora e meia 40 alunos!

Sr. Presidente: foram estas circunstâncias e exclusivamente elas que me determinaram o trazer à Câmara êste projecto de lei, sendo, certamente, meu desejo que a medida que se tenta promulgar para a Escola Industrial Infante D. Henrique se estendesse a todas as outras escolas industriais de maneira a dar aos nossos operários e aos nossos mestres de oficinas, aquela instrução profissional que é indispensável para o progresso da nossa indústria.

A Escola Industrial Infante D. Henrique paga anualmente uma elevada renda pela casa onde está instalada nas condições por mim apontadas, e despende ainda umas pequenas verbas com a aquisição dum certo material didáctico; representa isto um encargo permanente.

Pois bem, sendo aprovado êste projecto o Estado passa a pagar durante 25 anos a verba anual aproximada de 10 contos, donde resultará, simplesmente, um pequeno encargo para a obtenção duma Escola Industrial em boas condições para ministrar o ensino.

Sr. Presidente: depois destas explicações estou absolutamente certo de que o projecto de lei n.° 28-L merecerá a aprovação da Câmara, tanto mais que agora parece que se intenta fazer alguma cousa em benefício do ensino técnico e profissional.

A República é certo que alguma cousa fez já em benefício dêsse ensino, mas apenas em matéria de reformas.

Já em 1911 o Sr. Brito Camacho, então Ministro do Fomento, reformando o velho Instituto Industrial e Comercial de Lisboa fez muito em beneficio do ensino técnico na cidade de Lisboa esquecendo, embora, o Pôrto e agora, depois da nova reforma de ensino técnico e profissional, parece que alguma cousa se fará nesse sentido.

A verdade, Sr. Presidente, é que só criar escolas não basta; isso será manter o ensino no estado em que se encontra.

Sendo assim melhor é encerrar as escolas industriais portuguesas.

Disse.

O Sr. Júlio Martins: - Sr. Presidente: concordo inteiramente com êste projecto. As considerações apresentadas pelo Sr. Jorge Nunes não me impressionaram, por me parecer que elas não tinham cabimento nesta altura da discussão.

O projecto está discutido na generalidade. A Câmara reconheceu, por conse-

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quência, não só a necessidade dêsse projecto se não, tambêm, que eram justos os princípios fundamentais, dentro dos quais êle está orientado. Sendo assim, entendo que não podemos por mais tempo estar a protelar esta discussão tanto mais que a lei-travão só se opõe a projectos que importem aumentos de despesa quando apresentados durante a discussão do Orçamento.

Eis a razão por que o projecto tem o meu apoio. Aprová-lo é de inteira justiça.

O orador não reviu.

O Sr. Brito Camacho: - Sr. Presidente, é minha opinião que êste projecto não deveria ser discutido nesta altura, não pela mesma razão que apresentou o meu amigo Sr. Jorge Nunes, pois que, discordando da opinião de S. Exa., acho que a lei-travão, neste momento, não é aplicável. A lei-travão é aplicável desde que o Orçamento entre em discussão.

Assim é que entendi sempre lei travão e assim continuo a entendê-la.

Sr. Presidente: suponho que a lei-travão representou uma grande vantagem e que foi duma grande necessidade.

E se o legislador não estabeleceu o principio de que desde a apresentação do Orçamento cessava o direito de iniciativa de Deputados e Senadores a apresentarem projectos que importassem aumentos de despesa, foi porque não quis arcar com uma tradição muito velha e com um hábito muito enraizado.

Sr. Presidente: é sempre bom assentar doutrina neste ponto importante; eu sou de opinião que a lei-travão não é aplicável emquanto o Orçamento não entrar em discussão.

Acho que êste projecto não pode ser discutido por esta razão simplíssima: porque é inconstitucional. Peço a V. Exa. a fineza de reparar no que dispõe o n.° 4.° do artigo 26.° da Constituição. Diz-se aqui:

"Autorizar o Poder Executivo a realizar empréstimos e outras operações de crédito que não sejam de dívida flutuante estabelecendo ou aprovando previamente as condições gerais em que devem ser feitos".

Eu pregunto se um projecto autorizando um empréstimo, em que se não diz qual a taxa de juro e qual o prazo de amortização, realiza as condições marcadas neste n.° 4.° do artigo 26.° da Constituição.

Entendo que êste projecto deve ser retirado da discussão para que a comissão devidamente o considere, e estabeleça qual a taxa de juro dêste empréstimo e o modo da sua amortização.

Já ouvi apontar números, pretendendo-se demonstrar que êste projecto traz grandes vantagens visto que o Estado paga 2 contos do ronda pelo edifício do que se trata o por êste projecto, aprovado êle, os encargos não serão considerávelmente maiores, ficando o Estado, ao cabo de 25 anos, com um edifício seu.

Pareceu-me ouvir dizer que o encargo para o Estado era de 6.000$ anuais, o que se me afigura ser menos exacto. Êsses 6.000$ escudos não representam sequer o juro, a uma taxa de 5 por cento. É bom, pois, rectificar estes números, que certamente foram apresentados do boa fé, mas que não são a expressão da verdade.

Desejaria que a comissão do finanças indicasse a taxa de juros para o empréstimo e o sistema da sua amortização.

Só assim nós saberemos qual o encargo que êste empréstimo pode trazer ao Estado.

De harmonia com as considerações que acabo de fazer, mando para a Mesa a seguinte proposta:

A Câmara, reconhecendo que o projecto é inconstitucional, porquanto se não conforma com o disposto no n.° 4.° do artigo 26.° da Constituição da República, resolve que êle seja retirado da discussão. - O Deputado, Brito Camacho.

Lida na Mesa, foi admitida.

O Sr. António Fonseca: - Sr. Presidente: eu tinha pedido a palavra para responder às considerações do Sr. Jorge Nunes, acerca da aplicabilidade da lei-travão à lei que se discute.

Dispenso-me, porém, de o fazer, porque o Sr. Ministro das Finanças, o Sr. Júlio Martins e o Sr. Brito Camacho encarregaram-se de pôr a questão da lei-travão nos seus verdadeiros termos.

Efectivamente a lei-travão não é aplicável ao caso presente, pois discussão de

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Orçamento é uma cousa e apresentação é outra.

Se porventura em qualquer legislatura se tem procedido de forma diversa, isso não quere dizer que devamos proceder agora por essa forma.

O Sr. Rêgo Chaves (Ministro das Finanças): - O artigo 54.° da Constituição diz o seguinte:

"Artigo 54.° Nos primeiros quinze dias de Janeiro o Ministro das Finanças apresentará à Câmara dos Deputados o Orçamento geral do Estado".

O Orçamento foi apresentado, e o Regimento da Câmara diz no seu artigo 99.°:

"A leitura da proposta ou projecto de lei precederá a discussão dele na generalidade; a leitura de cada um dos artigos precederá a discussão na especialidade".

A proposta de lei foi apresentada, mas ainda não entrou em discussão.

O Orador: - É evidente. Eu vou mandar para a Mesa uma proposta que decerto satisfará o Sr. Brito Camacho.

"Proponho a substituição das palavras por vinte e cinco anos" por "ao juro máximo de 5 por cento e amortizável em vinte e cinco anos". - António Fonseca.

Não há razão, Sr. Presidente, para se não discutir e votar êste projecto, que traz todas as vantagens para o país, pois se destina a fomentar a instrução técnica e profissional, quando é certo que, com pleno assentimento do Sr. Jorge Nunes, se tem discutido outros, que, aumentando as despesas, não têm a utilidade que êste tem, tornando-se essas despesas, por assim dizer, improdutivas.

Por último, Sr. Presidente, devo dizer que todas as considerações feitas em volta da lei-travão são inteiramente descabidas, visto o projecto já estar votado na generalidade. Todas as questões prévias que poderiam ser apresentadas estão prejudicadas pela votação da generalidade.

O orador não reviu.

O Sr. Manuel José da Silva (Porto): - Pedi a palavra, Sr. Presidente, para declarar que a minoria socialista aprova êste parecer e para fazer algumas considerações demonstrativas de que o auxílio à Escola Industrial Infante D. Henrique, fornecendo-lhe uma casa, é uma preocupação antiga de todos os indivíduos que se têm interessado pelo ensino industrial no Pôrto.

Sôbre a inconstitucionalidade ou constitucionalidade dêste projecto eu nada direi, visto não ter para isso competência. Mas, falando da sua utilidade, devo dizer que ainda no tempo da monarquia se entendeu que a casa onde funciona a Escola Infante D. Henrique era insuficiente, tendo-se adquirido para a mesma escola uma casa existente na Rua das Taipas que, por sinal, há perto de vinte anos está abandonada e a cair a pedaços.

O Sr. Raul Tamagnini: - Essa casa já está destinada à Escola Oliveira Martins.

O Orador: - Em 1913, eu interroguei nesta Câmara, sôbre o assunto, o Sr. Ministro do Fomento, que era então o Sr. Estêvão de Vasconcelos, e S. Exa. respondeu-me o seguinte:

Que tinha ido ao Pôrto ver o edifício, e que achava melhor vendê-lo e, com êsse dinheiro e mais algum que se pudesse despender, fazer um edifício para a Escola Infante D. Henrique.

É absolutamente indispensável, Sr. Presidente, que essa Escola, a mais importante do norte do País, possua um edifício nas condições devidas, e, por consequência, a minoria socialista dá o seu voto, com satisfação, a êste parecer.

O orador não reviu.

Lida na Mesa a proposta do Sr. António Fonseca, foi admitida.

O Sr. Jorge Nunes: - Sr. Presidente: eu tinha resolvido não voltar à discussão se não fôsse a intervenção no debate e pela forma como o fez o ilustre Deputado Sr. António Fonseca.

O facto do Sr. Ministro das Finanças dizer primeiro que concordava com o projecto e dizer depois que a êle não tinha aplicação a lei-travão, não me surpreendeu, porque o Ministério, com uma maioria que tanto lhe exige e nada lhe dá, não pode ter outra atitude que não seja a de concordar com o que a maioria quero.

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A comissão de finanças, porém, é que continua a afirmar-se sôbre os projectos por forma tal que eu não sei como classificá-la.

Uma comissão de finanças que não se pronuncia sôbre os projectos, que guarda um silêncio absoluto e que até mesmo quando se trata dum empréstimo, não se lembra que tem de acabar um dia o capital que mutua...

O Sr. Tamagnini Barbosa (interrompendo): - Quando acaba a amortização não se paga mais nada.

O Orador: - Isso é que eu não sei. V. Exa. traz constantemente a esta Câmara projectos que aumentam as despesas públicas e por isso não me admira de que V. Exa., qualquer dia se lembre de aumentar a dotação da Escola porque a julgue insuficiente.

A comissão de finanças devia pronunciar-se sôbre êste projecto, pois assim é como se não existisse.

Estamos ou não estamos no período da discussão, para a aplicação da lei-travão? Quando eu tiver tempo e pachorra irei procurar nos "Diários" de 1913-1914 matéria bastante para mostrar ao Sr. António Fonseca e ao Sr. Ministro das Finanças que o ponto de vista da doutrina assente nesta Câmara é de que o período da discussão do Orçamento vem desde a sua apresentação. Isto é que eu hei-de demonstrar talvez até apresentando a assinatura do Sr. António Fonseca que nesse tempo era correligionário sectarista do poder quási absoluto do Sr. Afonso Costa.

Mudaram os tempos e eu desejaria que S. Exa. fôsse, não um ilustre legislador - que já o é - mas um cuidadoso homem de leis acompanhando, sem se submeter à vontade partidária, a discussão dos projectos que aqui são apresentados, sem a preocupação de ver previamente qual o lado da Câmara que os oferece à nossa apreciação.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Está encerrada a discussão sôbre o artigo 1.°

Vai votar-se.

O Sr. António Fonseca (para um requerimento): - Sr. Presidente: peço a V. Exa. que consulte a Câmara sôbre se concede a prioridade de votação para a minha proposta.

Concedido.

Foi lida e aprovada a proposta do Sr. António Fonseca.

Ficou prejudicada a moção do Sr. Brito Camacho.

Foram aprovados o artigo 1.°, salva a emenda, e o artigo 2.°

Trocam-se várias explicações entre os Srs. Jorge Nunes, Tamagnini Barbosa e Vergílio Costa.

Foram aprovados os artigos 3.° e 4.°

O Sr. Paiva Manso: - Requeiro a dispensa da última redacção.

Foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Vai entrar em discussão o parecer n.° 136-L.

Foi lida na Mesa.

É o seguinte:

Projecto do lei n.° 136-L

Artigo 1.° Fica o Govêrno autorizado a contrair com a Caixa Geral dos Depósitos um empréstimo até a quantia do 150.000$ a juro não excedente a cinco por cento, amortizável em quarenta anos destinado à aquisição e adaptação ou construção dum edifício para instalação da Escola Comercial de Veiga Beirão de Lisboa, e aquisição de mobiliário e material escolar.

Art. 2.° No Orçamento do Ministério do Comércio e Comunicações para o ano económico de 1919-1920 será inscrita a verba correspondente para fazer face ao pagamento de juros e amortização do empréstimo a que se refere o artigo 1.°

Art. 3.° A importância do empréstimo será inscrita no Orçamento do Ministério do Comércio e Comunicações.

Art. 4.° Fica revogada a legislação em contrário.

Sala das Sessões da Câmara dos Deputados, em 22 de Agosto de 1919. - Afonso de Macedo.

O Sr. Jorge Nunes: - Sr. Presidente: eu não pedi a palavra para combater o projecto, visto que êle é apenas uma parcela daquela soma de créditos no valor de 450 contos.

Êste projecto pertence à série dos que pedem 150 contos para cada escola e eu

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não combaterei, repito-o, tanto mais que a Câmara, que já votou o outro, tambêm vota êste. O motivo que me levou a pedir a palavra foi o de fazer uma declaração terminante a V. Exa. Uma vez que temos uma sessão por semana destinada a projectos do campanário, eu digo a V. Exa. que ou se discutem apenas os projectos que têm parecer ou então eu declaro a V. Exa. que em tudo quanto souber e puder lhe farei o maior obstrucionismo.

Já sabemos que atrás dêste vêem outros e a breve trecho temos aqui a repetição das últimas horas do encerramento de todas as sessões legislativas. É a isso que nos não associamos e isso não se fará sem o nosso mais veemente protesto.

O orador não reviu.

O Sr. Mariano Martins: - Já ia adiantada a discussão do projecto, autorizando o empréstimo, para a construção da Escola do Infante D. Henrique, quando eu reconheci que aquele projecto não devia talvez estar na ordem do dia de hoje, porquanto, sendo a sessão de hoje destinada a projectos de lei de carácter regional, vi com muita surpresa que o projecto não traz encargos tam somente para as corporações administrativas da terra onde se vai erigir a escola, mas que tambêm os seus encargos, todos talvez, recaem sôbre o Estado. Era, portanto, um projecto de carácter geral e não de carácter regional.

O projecto em discussão não tem os pareceres das respectivas comissões.

É certo que mais de um projecto de lei tem sido votado sem parecer, mas com êste o procedimento tem de ser outro, porquanto é absolutamente necessário que a comissão de finanças, ou o Sr. Ministro das Finanças declarem se o Tesouro está habilitado a comportar êsses encargos, a fim de que no próximo Orçamento se inclua a verba necessária.

O orador não reviu.

O Sr. Vergílio Costa: - Fui eu que pedi que o projecto de lei entrasse em discussão, porque era absolutamente semelhante ao que acabava de ser aprovado. Êsse projecto de lei foi pôsto à apreciação da Câmara e a Câmara deliberou que o projecto fôsse discutido. Por isso admira-me de que o Sr. Mariano Martins venha agora com essas considerações e não o tivesse feito quando a Câmara deliberou que o projecto de lei fôsse discutido.

O que é certo é que êste projecto é absolutamente idêntico ao que foi aprovado, e seria bem estranho que a Câmara, que aprovou aquele, não quisesse aprovar êste.

É preciso que olhemos para o ensino comercial com o mesmo carinho, com que olhamos para o ensino industrial.

A comissão de instrução técnica declarou que nada tinha a opor à votação dêste projecto de lei, porque em Lisboa temos quatro escolas industriais e apenas até ao actual ano lectivo tínhamos uma escola verdadeiramente comercial que funciona por empréstimo num liceu e pode ministrar o ensino à noite e é destinada especialmente aos empregados do comércio.

Não temos nenhuma escola comercial que ministre o ensino diurno.

Foi o Sr. Júlio Martins, quando Ministro do Comércio, que teve ensejo de criar essa escola. Entendeu S. Exa. que era absolutamente necessário criar mais uma escola comercial, porque não bastava uma escola só para o desenvolvimento do ensino comercial que se tinha já criado em Lisboa.

Está provado que a escola comercial Ferreira Borges funciona à noite e tem uma frequência de mais de mil alunos, frequência superior a qualquer escola industrial de Lisboa, onde há quatro.

Pregunto: como é possível ministrar o ensino comercial sem edifícios?

O que pretende a Câmara que façam êsses alunos depois de se terem matriculado?

Estando essa escola para funcionar, não foi possível adquirir um edifício apropriado.

A escola Veiga Beirão está a funcionar na Costa do Castelo, onde o ensino pode simplesmente ser ministrado de tarde. Essa escola era destinada principalmente, não a empregados do comércio, mas a todas as pessoas que, tendo só exame de instrução primária e pertencendo à carreira comercial, quisessem tirar o curso elementar de comércio.

Não é razoável que uma escola comercial, única a ministrar o ensino comercial em Lisboa, tendo uma frequência supe-

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rior à frequência das quatro escolas industriais, não tenha edifício próprio para funcionar às horas competentes.

É necessário dotar essa escola com edifício próprio e o material necessário para poder funcionar de manhã, o que não pode fazer agora.

E tanto é necessário que há alunos do sexo feminino que foram obrigados a transitar para a Escola Ferreira Borges, que ministra o ensino comercial a alunos do sexo masculino. Aí o ensino é ministrado à noite a indivíduos que estavam dispostos a frequentar o curso comercial de dia.

Não se pode deixar de aprovar êste projecto de lei, a não ser que se queira obrigar os alunos a ficarem com os seus cursos em meio, porquanto mão podem frequentar essa escola à noite.

É absolutamente justo que a Câmara aprove êste projecto. É necessário dotar a Escola Comercial Veiga Beirão com o material próprio para funcionar.

Tendo a Câmara aprovado o outro projecto de lei da Escola Infante D. Henrique, que está instalada em melhores condições do que a escola Veiga Beirão, como tive ocasião do ver, apesar de não satisfazer ao ensino, peço que o projecto de lei seja aprovado.

O orador não reviu.

O Sr. Augusto Dias da Silva: - Em nome da minoria socialista declaro que voto o projecto. Trata-se dum novo edifício escolar, e bom seria se dalgum modo êsses novos edifícios pudessem influir no espírito académico. Bom seria que jamais o país pudesse ver o que não há muito se observou por ocasião da última greve dos eléctricos, quando alunos do Instituto Superior Técnico substituíram os guardas--freios, assim como outros alunos, doutras escolas desempenharam vários serviços públicos.

Não me parece que todos os alunos do Curso Superior Técnico tivessem ido voluntariamente ao Ministério da Instrução pedir autorização para visitarem os edifícios particulares, onde se executam êsses serviços, deixando os seus estudos.

Como êles precisam de aprender, e como os edifícios em que actualmente recebem a instrução talvez contribuam para que êstes rapazes tenham espírito pequeno, a minoria socialista não pode deixar de estar de acordo com o projecto.

O orador não reviu.

O Sr. António Fonseca: - Sr. Presidente: o Sr. Mariano Martins acentuou, com razão, que se não devia prescindir das informações das comissões a que os vários projectos tenham de ser submetidos.

O parecer das respectivas comissões é tanto mais indispensável neste projecto quanto é certo que êle tem sôbre os outros uma particularidade grave, qual é a de aumentar as despesas.

Se há necessidade de fazer o exame e o estudo de todos os projectos, para que o Parlamento não faça uma obra má, os projectos que trazem aumento de despesa devem ter maior estudo, para não se fazerem despesas inúteis.

No emtanto êste projecto está na ordem do dia por deliberação da Câmara, e, sendo tam simples a sua matéria, a Câmara deve já estar esclarecida depois das explicações do Sr. Vergílio Costa.

Efectivamente, o Govêrno transacto criou, pela pasta que era gerida pelo Sr. Júlio Martins, a Escola Comercial Veiga Beirão, e essa escola está funcionando nas caves do Liceu de Passos Manuel e tem uma frequência máxima.

Não é possível admitir um número maior de alunos que aquele, que já a frequenta, pela simples razão de que já lá não caberiam mais.

Vê-se, portanto, quanto foi útil para o ensino comercial a medida tomada pelo Sr. Júlio Martins, e quanto é necessário, sob o ponto de vista pedagógico, melhorar essa escola sob o ponto de vista da higiene, melhorando as condições em que está funcionando.

A Câmara, portanto, nesta altura, deve votar o projecto, a que de certo a comissão técnica daria parecer favorável. Pela parte que diz respeito à comissão de finanças, esta, ponderando as razões apresentadas, tambêm não lhe seria contrária.

Eu entendo, portanto, que a Câmara, aprovando êste projecto, não faz senão completar a obra do Sr. Júlio Martins quando Ministro.

O orador não reviu.

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O Sr. Orlando Marçal: - Uma vez que o ilustre Deputado Sr. António Fonseca é o primeiro a reconhecer as indiscutíveis vantagens dêste projecto, e como nós estamos convencidos de que êle vem acudir a uma necessidade instante do ensino comercial, julgo dispensáveis as minhas considerações, pois estou certo de que a Câmara o aprovará.

O orador não reviu.

O Sr. Brito Camacho: - Pedi a palavra não propriamente para discutir êste projecto, mas para fazer, a propósito dele, declarações quási idênticas às que fiz a respeito do projecto anterior.

Sendo estas sessões especiais realizadas uma vez por semana, não há realmente desculpa alguma que possa atenuar a falta de trazer à discussão um projecto sem o parecer das respectivas comissões. Há oito dias para escolher os projectos que são de maior importância para constituírem a ordem do dia das sessões de sexta-feira. Sendo assim, não se pode alegar falta de tempo para as respectivas comissões poderem dar a seu parecer sôbre ele? É absolutamente inadmissível que nestas sessões extraordinárias apareçam projectos sem os respectivos pareceres.

Além disso, eu desejo preguntar a V. Exa., Sr. Presidente, se julga que um projecto desta natureza pode figurar na ordem do dia dessas sessões especiais, uma vez que a Constituição diz bem claramente que elas são exclusivamente destinadas à apreciação dos projectos de interêsse local. Acaso se pode reputar esta proposta como de interêsse local?

E agora permitam-me V. Exas. que eu note o demasiado retraimento que tem o Poder Executivo na iniciativa de propostas dêste género, que mais pertencem a êle do que a nós.

Não se diga que a Câmara deve votar de olhos vendados tudo quanto diga respeito a instrução, especialmente a instrução técnica, unicamente porque dela estamos carecidos. De que não carecemos nós? O que eu desejava é que em matéria de ensino técnico, em vez do só legislar a retalho, houvesse um Ministro competente, pela natureza das funções que lhe competem, e competente pela preparação que deve naturalmente possuir, que trouxesse a esta Câmara um plano de organização que coubesse dentro das possibilidades orçamentais. Se o Sr. Ministro do Comércio tomasse essa iniciativa mereceria por completo os nossos aplausos e teria cumprido a obrigação - que certamente lhe seria grata - de continuar a obra do homem que teve a alta visão das necessidades económicas do país e que foi o iniciador do ensino técnico em Portugal. Seria êste o melhor galardão erguido à memória do grande estadista que foi Emídio Navarro, e ninguêm melhor o poderia prestar de que S. Exa. o Sr. Ministro do Comércio.

Acresce ainda que é positivamente S. Exa. a pessoa mais categorizada para saber quais as necessidades mais urgentes dêste ensino e se êle carece apenas de edifícios e material escolar, ou tambêm duma reforma que permita um bom recrutamento de professores.

Não é para fazer obstrucionismo nem oposição a êste projecto que eu uso da palavra, mas simplesmente para fornecer - se porventura me está reservada essa satisfação - ao Sr. Ministro das Finanças o ensejo para declarar se entende que esta avalanche de projectos constantemente submetidos â apreciação do Parlamento cabe dentro das disponibilidades do nosso Orçamento.

É efectivamente necessário gastar com o ensino no nosso país, mas se os ilustres membros desta Câmara tivessem o cuidado de ler o Diário do Govêrno, desde Maio a esta parte, e soubessem que a pretexto do ensino ou com o ensino se tem gasto mais do que se gastava noutro tempo em dois ou três Ministérios, se verificasse que pela pasta da Instrução Pública se tem esgotado já, aproximadamente, 3:000 contos, dos quais apenas uma pequena parte destinada a construção de edifícios escolares e o resto despendido com o pagamento de professores que nem sequer ainda entraram em exercício, se levassem em linha de conta tudo isto, certamente não teriam tanto alvoroço em votar êste projecto.

O orador não reviu.

O Sr. Ernesto Navarro (Ministro do Comércio): - Não era minha intenção usar da palavra sôbre êste projecto, justamente para não protelar a sua discussão, mas, depois das palavras que acaba de

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proferir o ilustre Deputado Sr. Brito Camacho, eu não posso deixar de o fazer, dada a muita consideração que S. Exa. me merece.

S. Exa. afirmou que era de grande conveniência a realização dum plano de ensino consoante as suas necessidades o exigência, de forma a evitar que estivéssemos constantemente a tocar no assunto. Devo dizer ao ilustre Deputado que eu já troquei impressões no sentido de trazer a esta Câmara uma proposta contraindo um grande empréstimo para que todas as escolas tivessem edifícios apropriados. Êste empreendimento, alêm das vantagens que saltam à primeira vista, teria ainda a vantagem do representar uma diminuição de despesa para o Estado, que deixaria de pagar rendas.

E é por isso que eu entendi e vi com simpatia a aprovação do projecto da Escola do Infante D. Henrique, como tambêm. o reforço da verba para a construção do edifício para o Instituto Superior Técnico, e pelos mesmos motivos vejo com igual simpatia a proposta do Sr. Vergílio Costa, relativamente à Escola Comercial de Veiga Beirão, que, tendo uma frequência escolar bastante grande, funciona com grandes deficiências higiénicas. E não posso deixar de aplaudir essa proposta, porque ela não contraria, de resto, o projecto de conjunto que porventura eu terei de trazer ao Parlamento, relativamente ao ensino, e a que o Sr. Brito Camacho se referiu com muita propriedade.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Júlio Martins: - Sr. Presidente: pedi a palavra para declarar a V. Exa. e à Câmara que muito bem faz o Parlamento votando a autorização dum empréstimo para a construção dum edifício para a Escola de Veiga Beirão. Eu tenho responsabilidades ligadas a êsse assunto. Durante o curto tempo que passei pelas cadeiras do Poder tive ocasião de ver que o nosso ensino técnico não estava realmente em condições não só de poder fornecer um ensino inteiramente compatível com as necessidades do nosso meio, isto é, debaixo do ponto de vista da orientação pedagógica, mas tambêm estava em muito más condições debaixo do ponto de vista material. Até mim chegaram imensas reclamações, afirmando-me todas que o ensino comercial em Lisboa era deficiente e que era indispensável que se alargasse a sua esfera de acção. Nessas condições, criei uma escola comercial, para cuja instalação se levantaram imensas dificuldades, porque não foi possível encontrar-se casa para ela. E tam bem foi essa escola recebida pelos indivíduos que realmente têm interêsse no desenvolvimento do ensino que a escola criada, abrindo as suas matrículas, contou logo com uma frequência do 1:000 alunos, frequência que é qualquer cousa que nos demonstra o bom acolhimento que teve essa minha iniciativa e a necessidade de se alargar êsse ensino comercial cada vez mais (Apoiados).

Sr. Presidente: devido às dificuldades de instalação, como já disse, essa escola foi funcionar para, a Escola n.° 1, no Castelo, mas, em virtude da grande afluência de alunos e das más condições higiénicas dessa escola para tam grande número do alunos, o ensino ressentiu-se no seu aproveitamento por parte dos alunos. Nestas condições, vindo à Câmara uma proposta para que se dote com o edifício indispensável ao seu ensino a Escola Comercial Veiga Beirão, eu entendo que muito se honra a Câmara, e presta um bom serviço à instrução pública, aprovando êste projecto. (Apoiados).

Sr. Presidente: quanto às considerações do Sr. Brito Camacho, eu devo dizer que concordo com o ponto de vista geral de S. Exa. de que é absolutamente indispensável que se faça uma obra de conjunto relativamente ao ensino técnico, mas, como muito bem disse o Sr. Ministro do Comércio e Comunicações, não vejo que no momento possa ser prejudicial a essa obra de conjunto a aprovação do projecto que se discute.

Com as escolas criadas pelo Govêrno de que fiz parte, a sua frequência é maior do que nas quatro escolas industriais que nós encontrámos.

Tudo quanto se faça a favor do ensino industrial é bem aceite por aqueles que a frequentam, porque representa um desenvolvimento para o nosso comércio e indústria.

A aprovação dêste projecto não invalida a iniciativa que qualquer Ministro queira realizar.

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Com respeito ao facto, a que só referiu o Sr. Brito Camacho, dêste projecto não ter o parecer das respectivas comissões, devo dizer que há já precedentes, como, por exemplo, aquele que deu uma certa soberania ao Instituto Superior Técnico.

É por todas estas razões que voto êste projecto.

Disse.

O orador não reviu.

O Sr. Rêgo Chaves (Ministro das Finanças): - A minha opinião é a mesma que expendi há pouco com respeito a outro, projecto que aqui se discutiu.

É certo que o projecto não tem os pareceres das comissões, mas, desde que a Câmara, na sua soberania, os dispensou, eu nada tenho de opor.

Pela manifestação da Câmara vejo que o crédito que se pede é absolutamente indispensável e, neste caso, aceito essa despesa.

O orador não reviu.

É aprovado o projecto na generalidade.

Entra em discussão, na especialidade, o artigo 1.°

O Sr. António Fonseca: - Parece-me que as palavras "Caixa Geral de Depósitos", contidas neste artigo, podem ser um embaraço para se fazer o empréstimo, porque pode a Caixa Geral de Depósitos não ter disponibilidades para o fazer, ficando o Govêrno impossibilitado de fazer êsse empréstimo com outro estabelecimento.

Sou, portanto, de opinião que se eliminem estas palavras, o que não vai afectar a economia do projecto.

Neste sentido, mando para a Mesa uma proposta.

Foi lida e admitida na Mesa e em seguida aprovada. É a seguinte:

Artigo 1.°:

Proponho a eliminação das palavras "Na Caixa Geral de Depósitos". - António Fonseca.

É aprovado o artigo 1.°

Entra em discussão o artigo 2.°

O Sr. António Fonseca: - A obrigação, imposta neste artigo, de se incluir esta verba no orçamento de 1919-1920, parece que não obriga a excluí-la nos orçamentos seguintes. Por isso eu proponho que se modifique a redacção para o seguinte: "desde 1919".

Mando para a Mesa a proposta.

É a seguinte:

Proposta de substituição ao artigo 2.°: No orçamento do Ministério do Comércio e Comunicações será anualmente inscrita a verba necessária para o pagamento dos juros e amortização dêste empréstimo. - António Fonseca.

O Sr. Presidente: - Não havendo mais ninguêm inscrito, vai votar-se.

Foi rejeitado o artigo 2.° do projecto.

Foi aprovada a proposta de substituição do Sr. António Fonseca.

Leu-se na Mesa o artigo 3.°

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

O Sr. António Fonseca: - Não compreendo, Sr. Presidente, a significação dêsse artigo. O que no orçamento se inscreve é apenas a verba necessária para o pagamento de juros e amortização. Desde que no artigo 2.° já se diz isso, parece-me que o melhor é eliminar êsse artigo. Mando, portanto, para a Mesa a seguinte proposta:

Proponho a eliminação do artigo 3.° - António Fonseca.

Foi admitida.

Foi aprovada.

Foi aprovado o artigo 4.°

O Sr. Afonso da Macedo: - Requeiro a V. Exa., Sr. Presidente, se digne consultar a Câmara sôbre se dispensa a leitura da última redacção.

O Sr. Manuel José da Silva (Oliveira de Azeméis): - Sr. Presidente: requeiro a V. Exa. que consulte a Câmara para que na próxima sessão, destinada à discussão de projectos regionais, se inclua na ordem do dia o parecer n.° 166, relativo à proposta de lei n.° 101-A, já votada no Senado.

O Sr. Presidente: - Segundo a disposição regimental é à Presidência que compete fixar a ordem do dia.

O Sr. António Fonseca: - Se a minoria é quem começa a abrir o precedente,

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18 Diário da Câmara dos Deputados

imagine V. Exa. o que será a ordem do dia quando a maioria tambêm formular os seus requerimentos! A ordem do dia é atribuição exclusiva do Sr. Presidente!

O Sr. Manuel José, da Silva (Oliveira de Azeméis): - Creio que é tambêm atribuição da Câmara dar qualquer indicação à Presidência!

O Sr. Presidente: - V. Exa. desiste do seu requerimento?

O Sr. Manuel José da Silva (Oliveira do Azeméis): - Não, senhor!

O Sr. Brito Camacho: - Sr. Presidente : eu queria preguntar a V. Exa. se fica estabelecido que nunca mais a Presidência consultará a Câmara para alterar a ordem do dia...

O Sr. Presidente: - Em vista da manifestação da Câmara, da qual ou vi S. Exa. tomar parte, vou pôr à votação da Câmara o requerimento do Sr. Manuel José da Silva.

O Sr. Brito Camacho: - É para agradecer a atenção de V. Exa., mas creio que depois da indicação da maioria...

O Sr. Presidente: - A Câmara é soberana, e a Presidência não tem mais do que acatar as suas resoluções.

Os Srs. Deputados que entendem que na próxima ordem do dia, de trabalhos regionais, se inclua o parecer n.° 166, tenham a bondade de se levantar.

Foi rejeitado.

O Sr. Jacinto de Freitas: - Requeiro a contraprova.

Feita a contraprova, verificou-se ter sido aprovado.

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à discussão do parecer n.° 123. Vai ler-se.

Leu-se na Mesa.

É o seguinte:

Parecer n.° 123

Senhores Deputados. - A vossa comissão de administração pública, tendo examinado com toda a atenção o projecto de n.° 9-D, da iniciativa do Sr. Maldonado Freitas, reconhece que êle vem atender as legítimas aspirações do povo das Caldas da Rainha, que com desgôsto tem visto protelada a execução da lei n.° 827, de 24 de Setembro de 1917, de cujas disposições fiava o impulso progressivo da riqueza e engrandecimento da sua linda vila, destinada a ser no nosso país um dos mais atraentes centros do turismo nacional.

O projecto de lei do Sr. Maldonado Freitas, restabelecendo a lei n.° 827, suspensa por um decreto ditatorial do dezembrismo, propõe umas modificações a essa lei, que o tempo demonstrou, serem necessárias o com as quais esta comissão concorda, sendo, porem, de parecer que elas ficarão melhor esclarecidas votando--se o projecto com a seguinte redacção:

Artigo 1.° São restabelecidas as disposições da lei. n.° 827, de 24 do Setembro de 1917, com as seguintes modificações:

a) A direcção técnica e serviços clínicos do Hospital de Santo Isidoro serão confiadas pela Câmara Municipal das Caldas da Rainha ao clínico ou clínicos de sua confiança e escolha, sem prejuízo dos direitos adquiridos pelo actual clínico contratado.

b) O artigo 12.° e seus parágrafos da referida lei serão substituídos pelo seguinte:

Artigo 12.° O Govêrno, emquanto se não realizar o concurso para a adjudicação da exploração do balneário e anexos, ou se depois de aberto êsse concurso êle ficar deserto, entregará a administração do Hospital da Rainha D. Leonor e anexos, bem como a exploração da indústria do turismo nos seus arredores, a uma junta autónoma, composta de cinco vogais de sua livre nomeação e escolha, que organizará e executará o plano de reformas e melhoramentos dos serviços que lhe são confiados.

§ único. A junta autónoma, no caso de ficar deserto o concurso, funcionará por cinco anos tendo como única remuneração uma percentagem nos lucros da exploração, que será fixada pelo Govêrno.

Art. 2.° É restabelecido o antigo subsídio anual de 16.100$, pago em duodécimos, ao Hospital da Rainha D. Leonor.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrário.

Como pelo disposto no artigo 3.°, a despesa com o subsídio concedido pelo

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Estado ao Hospital da Bainha D. Leonor é agravada em 1.700$, é esta comissão de parecer que o projecto não deve vir à discussão parlamentar sem previamente ser ouvida a comissão de finanças.

Sala das Sessões da comissão de administração, pública, 22 de Agosto de 1919. - Abílio Marçal, presidente - Vasco Vasconcelos (com declarações) - Nuno Simões - Alves dos Santos - Francisco José Pereira.

Senhores Deputados. - A vossa comissão de finanças é de parecer que podeis aprovar o projecto de lei n.° 9-D.

O único aumento de despesa que êle determina corresponde a uma restituição, visto que, por uma emenda no orçamento do Ministério do Interior, de 1912 a 1913, a sua importância foi eliminada com fundamentos que deixaram de existir. Por outro lado o extraordinário agravamento das condições gerais de vida seria bastante para justificar o aumento do subsídio concedido ao Hospital de D. Leonor, das Caldas da Bainha.

Sala das Sessões da comissão de finanças, 28 de Agosto de 1919. - Aníbal Lúcio de Azevedo - Augusto Rebelo Arruda- J. M. Nunes Loureiro - Álvaro de Castro - Alves dos Santos - Manuel José da Silva (Oliveira de Azeméis) (com restrições) - Estêvão Pimentel - Nuno Simões, relator.

Projecto de lei n.° 9-D

Senhores Deputados. - Considerando que o decreto n.° 3:812, de 2 de Fevereiro de 1918, que suspendeu a lei n.° 827, de 9 de Setembro de 1917, não teve em vista a defesa dos interêsses da população das Caldas da Bainha, nem os dos indigentes, mas tam sómente acarretar prejuízos para a mesma população e indigentes, privando-os de receber benefícios de há muito reclamados;

Considerando que a aludida lei n.° 827 é a que mais seguramente defenderá todos os interêsses da população caldense, e, consequentemente, os progressos desta privilegiada região, para a indústria do turismo, e ainda do seu balneário;

Considerando que a desanexação do Hospital de Santo Isidoro, por entrega a fazer à Câmara Municipal das Caldas da Bainha, não é contrária nem atentatória das disposições testamentárias que o criou, antes traz benefício de incalculável valor para os pobres do concelho, e duma insofismável economia para o seu município;

Considerando ainda que a Câmara das Caldas pretende instalar, conforme os modernos requisitos, uma assistência cirúrgica, no Hospital de Santo Isidoro, mais ampla;

Considerando, finalmente, que só por deficiência de informação é que neste Parlamento se reduziu o subsídio anual do Hospital D. Leonor, das Caldas da Bainha, a 14.400$, quando é certo que êste estabelecimento recebia 16.100$ até fins do ano de 1911 a 1912, como compensação dos foros e outros ,bens que foram encorporados nos Próprios Nacionais, e que eram seus:

Tenho a honra de submeter à Câmara o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° Ficam restabelecidas as disposições da lei n.° 827, publicada no Diário do Govêrno de 24 de Setembro de 1917, excepto a segunda parte do seu artigo 2.° e os parágrafos 1.° e 2.° do artigo 12.°

Art. 2.° Dentro da doutrina do citado artigo 12.° da lei n.º 827 confiará o Govêrno, quando o julgar conveniente, a administração do Hospital da Bainha D. Leonor e anexos, e ainda os arredores aproveitáveis para a exploração da indústria do turismo, a uma junta autónoma.

Art. 3.° O Estado, como compensação dos foros e outros bens que o Hospital de D. Leonor, das Caldas da Bainha, possuía, mas que foram encorporados nos próprios Nacionais, eleva-lhe o subsídio anual a 16.100$, pago em duodécimos.

Art. 4.° Fica revogada a legislação em contrário.

Sala das Sessões da Câmara dos Deputados, 4 de Julho de 1919. - O Deputado, Custódio Maldonado Freitas.

O Sr. Costa Júnior: - Sr. Presidente: concordando na essência com o projecto, dou-lhe o meu voto.

Há, porém, uma parte do artigo 12.° que entendo deve ser eliminada e, nesse sentido, mando para a Mesa uma proposta.

Escuso de fazer considerações, porque a Câmara compreende bem o seu alcance.

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É a seguinte:

Artigo 12.° Eliminar as palavras: "bem como a exploração da indústria do turismo nos seus arredores". - Costa Júnior.

O Sr. Mesquita Carvalho: - Sr. Presidente: abstenho-me de entrar na discussão e apreciação da matéria dêste projecto porque vou mandar para a Mesa uma moção que equivale a uma questão prévia.

Trata-se, pelo projecto, de alterar no que está estabelecido a administração e até a direcção técnica de dois estabelecimentos hospitalares, o Hospital da Rainha D. Leonor e o Hospital do Santo Isidoro, bem como o balneário de águas medicinais anexo a um dêsses estabelecimentos.

Em primeiro lugar e pelo alcance que têm êste projecto, entendo eu, e parece-me que estará toda a Câmara de acordo comigo, que ele não pode discutir-se sem a presença do Sr. Ministro do Trabalho, que é a pasta por onde corre êste assunto o porque o Govêrno tem de pronunciar-se sôbre êle na parte que diz respeito à sua direcção técnica, que está sujeita ao Poder Executivo.

Mas há mais grave ainda: e é que, tratando-se dum assunto desta natureza, a que estão ligados interêsses administrativos e direcção técnica e clínica de dois hospitais e um balneário, é com verdadeira surprêsa que vejo que não foi ouvida a comissão especial desta Câmara, cujo parecer deve ser o primeiro, a comissão de assistência, à qual devem ser sujeitos assuntos desta natureza.

Assim mando para a Mesa a minha moção que V. Exa., Sr. Presidente, terá de considerar como questão prévia e na qual se diz o seguinte:

Moção

A Câmara dos Deputados, reconhecendo que a discussão do parecer n.° 123 (projecto de lei n.° 9-D), não pode prosseguir sem o parecer da comissão de assistência pública.

Resolve que baixe a essa comissão para, com o seu parecer, voltar de novo a discutir-se.

Sala das Sessões, 14 de Novembro de 1919. - Luís de Mesquita Carvalho.

Por agora nada mais tenho a dizer.

Tenho dito.

O orador não reviu.

Foi admitida.

O Sr. Francisco José Pereira (relator): - Sr. Presidente: parece-me não ter razão de ser a moção do Sr. Mesquita Carvalho, a fim de ser ouvida a comissão de saúde e assistência sôbre êste projecto.

Trata-se do restabelecimento de uma lei já votada pelo Parlamento.

Parece-me que, nos termos dêste projecto, os assuntos técnicos dêsses hospitais ficam entregues a pessoas que tem competência para tratar do assunto.

Julgo, portanto, que não há razão para a comissão do assistência ser ouvida.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Maldonado de Freitas: - Sr. Presidente, foi com bastante surpresa que ouvi o Sr. Mesquita Carvalho afirmar a necessidade dêste projecto ir à comissão de assistência.

Se não fôsse o dezembrismo que tantos meus antagonistas serviram, não haveria necessidade de ser tratado este assunto novamente na Câmara dos Deputados, porquanto em 24 do Setembro de 1917, vinha no Diário do Govêrno, 1.ª série, publicada a lei n.° 827, cuja doutrina é a mesma dêste projecto, hoje só tento o mais concretamente defender os interêsses locais.

Àpartes.

Tenho estabelecido uma rigorosa fiscalização administrativa na vila das Caldas e assim verifico que já de longa data se diz que os naturais são incapazes para administrar os seus haveres; já o Marquês de Pombal o dizia muito claramente nas suas ordenações.

A monarquia acabou por latrocínios, a República não pode iniciar pelo mesmo processo, embora seja essa a política de muitos que se imiscuíram no regime vigente, já de antemão dispostos a continuar no logradouro que através de cambalachos eleiçoeiros conseguiram alcançar.

O Sr. Eduardo de Sousa: - Já começou. Já há muito que começou.

O Orador: - Não tem sido sem o meu protesto.

Sr. Presidente: é preciso que a administração dêste hospital seja boa, para que os povos daquela região possam ga-

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nhar com os benefícios próprios dessa instituição, que é o seu melhor património.

Já o Marquês de Pombal o dizia nas suas ordenações e V. Exas. permitam-me que eu leia, que os médicos deviam ter determinadas habilitações para bem servir aquele estabelecimento, e ai dos que últimamente têm estado no hospital, se fôssem obrigados a cumprir o que então se dispunha.

Eis a ordenação:

"Determino outrossim, o Médico além das suas ordinárias obrigações e das que abaixo lhe são declaradas, será mais obrigado a escrever todos os anos as observações que fizer da virtude daquelas águas, e dos casos mais notáveis, fazendo em todas as estações do ano análise das mesmas águas, e dos casos mais notáveis para se combinar a aplicação delas segundo as moléstias, temperamento e diversidade das doenças e estações do tempo, como se pratica em quási todas as águas termais da Europa, etc.".

Está presente o Sr. Salema que pode testemunhar quanto eu tenho trabalhado em volta dêste estabelecimento, pelo lado técnico, ao contrário de todos os outros que só se têm interessado pela parte política, fazendo dali um caldeirão eleiçoeiro.

Foi para benefício das Caldas da Rainha, dos seus naturais que a rainha D. Leonor em 1467 fundou aquele estabelecimento.

Sr. Presidente: eu renovo hoje a lei n.° 827 apresentada pelo Deputado Afonso Ferreira porque no dezembrismo houve parlamentares que nesta Câmara têm assento que servindo-se dêsse sol nascente alcançaram um decreto ditatorial revogando, somente por política torva.

A moção apresentada pelo Sr. Mesquita Carvalho não tem razão de ser, porque não se trata duma lei nova, mas duma lei antiga.

É por isso que eu me encontro neste lugar defendendo êste projecto, e por esta forma clara.

Creio que não é necessário apresentar mais factos para demonstrar a inoportunidade da moção do Sr. Mesquita Carvalho, e convencer a Câmara de que a sua aprovação seria um mau precedente.

O Sr. Eduardo de Sousa: - Sejam quais forem as opiniões do Marquês de Pombal e do Sr. Maldonado de Freitas sôbre êste assunto, eu entendo que, sendo êle duma natureza especial e técnica, não devia ter vindo à Câmara sem ter transitado, previamente, pelas comissões respectivas que com os seus pareceres nos habilitariam a discuti-lo e votá-lo.

Porque é que êste projecto veio tam apressadamente à Câmara sem os pareceres das comissões?

Ninguém o diz!

De mais a mais o Regimento da Câmara dispõe que êstes assuntos não podem ser discutidos sem a presença do respectivo Ministro.

Por consequência entendo que sem ser ouvida a opinião do Govêrno a Câmara não se pode pronunciar, seja qual fôr a opinião do Marquês de Pombal, o primeiro, pois que outros mais têm surgido na vida política portuguesa, desde Costa Cabral até o Sr. Afonso Costa, que me pareço ser ainda Deputado nesta casa.

Por todas as razões, entendo que êste projecto deve baixar às comissões respectivas para lhe darem pareceres.

O da comissão de assistência pública é, a meu ver, indispensável.

O orador não reviu.

O Sr. Mesquita Carvalho: - Sr. Presidente: eu disse, há pouco, que não entrava, neste momento, na apreciação daquilo que, rigorosamente, se pode chamar a economia do projecto. Nessa determinação me mantenho, embora saiba que, acerca dele, há muitas e variadas considerações a fazer e de variada espécie.

Limito-me, pois, à matéria da questão prévia.

Impugnaram-na o ilustre relator da comissão de administração pública e o não menos ilustre autor do projecto em discussão.

Impugnaram-na, Sr. Presidente, com o único fundamento do que o projecto tende, apenas, a pôr do novo em vigor as disposições da lei n.° 827 que foram revogadas por um decreto do tempo do sidonismo.

Se assim fôsse, talvez houvesse alguma razão na impugnação feita, embora em todo o caso, atendendo-se ao assunto especialíssimo de que se trata, devesse sem-

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pre ser ouvida a comissão especial desta Câmara.

O Sr. Eduardo de Sousa: - Apoiado.

O Orador: - Mas não é assim.

O projecto de lei que se traz à discussão difere inteiramente e fundamentalmente da lei n.° 827. E, Sr. Presidente, difere em dois pontos essenciais: um é o que modifica por completo, no projecto actual, o que estava disposto no artigo 2.° daquela lei, pelo que respeita à direcção técnica do hospital do S. Isidoro, visto que na lei era mantida a direcção do próprio hospital Rainha D. Leonor, como é determinação expressa no testamento do instituidor dêsse hospital, ao passo que, pelo projecto, a direcção técnica dêsse hospital passa para clínicos da escolha livre da Câmara Municipal das Caldas da Rainha.

O outro ponto encontra-se no seguinte: no artigo 12.° apenas só, dava ao Govêrno no caso do ficar deserto o concurso, o direito da nomeação duma comissão especial para dirigir e administrar o balneário e anexos, ao passo que pelo artigo 2.° do projecto, se dá não só isso, mas a administração do próprio hospital Rainha D. Leonor.

O que se pretende por êste projecto, e sôbre isto não podem restar dúvidas, é entregar a administração e até a direcção técnica e clínica do hospital de S. Isidoro a clínicos da escolha da Câmara Municipal das Caldas da Rainha.

Há uma grande disparidade entre êste projecto e a lei n.° 827.

Nestas condições é absolutamente indispensável que se pronuncie sôbre êste assunto a comissão especial desta Câmara que só pode ser a comissão de assistência.

É necessário que esta comissão se pronuncie não só no que respeita à direcção técnica dos hospitais mas à sua própria administração, e é até para lamentar, não querendo empregar outro termo, que a comissão técnica a quem foi dada a incumbência de dar parecer sôbre êste projecto fôsse a comissão de administração pública que para o caso nada tem a não ser, pela pretensão verdadeiramente monstruosa, de transformar a administração dos dois hospitais e o estabelecimento balneário em artigo de turismo.

Foi só por êste motivo que a comissão de administração pública foi ouvida, visto que é incompetente para se pronunciar acerca da direcção interna e direcção clínica dos dois hospitais.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Hermano de Medeiros: - Sr. Presidente: absolutamente de acordo com as considerações do Sr. Mesquita Carvalho, sou tambêm de parecer que o projecto deve baixar à comissão do assistência a fim do sôbre êle dar o seu parecer.

Há no projecto cousas verdadeiramente monstruosas, permita-se-me o termo, e das quais eu discordo em absoluto.

Hoje que se procura em medicina criar a especialização, e que ela vai sendo criada metodicamente, não só no país como em todo o mundo, hoje que se exigem provas de competência a médicos para dirigir serviços clínicos, e a direcção dum balneário é a direcção dum serviço clínico dos mais importantes, não se pode aceitar a doutrina dêste projecto.

Àparte do Sr. Júlio Martins que não se ouviu.

Sr. Presidente: entre outras cousas que revoltam os meus sentimentos de justiça, há esta: é a câmara municipal que há-de escolher livremente o médico dos hospitais, lugar que só deve dar-se por concurso e não a qualquer pessoa de amizade de qualquer dos vereadores das Caldas da Rainha.

O projecto tem esta tremenda monstruosidade contra a qual não podia deixar de lavrar o meu protesto.

Mas há mais, Sr. Presidente, junto dum hospital com serviços de assistência pública há jôgo. Isto está bem explícito num artigo que a comissão propõe.

Batota e assistência pública!

Lavro o meu protesto, o mais veemente, contra um projecto desta natureza.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Como não está mais nenhum Sr. Deputado inscrito, vai votar-se.

Leu-se a moção do Sr. Mesquita Carvalho.

Posta à votação, foi rejeitada.

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O Sr. Eduardo de Sousa: - Requeiro a contraprova e invoco o § 2.° do artigo 116.°

Fez-se a contraprova.

O Sr. Presidente: - Estão levantados 50 Srs. Deputados e sentados 15. Está, portanto, rejeitada a moção do Sr. Mesquita Carvalho.

Vai votar-se a generalidade do projecto.

Posta à votação, foi aprovada.

O Sr. Mesquita Carvalho: - Peço a palavra sôbre a generalidade do projecto.

O Sr. Presidente: - A generalidade já está votada.

O Sr. Mesquita Carvalho: - Não pode ser. Inicialmente foi mandada para a Mesa uma questão prévia sôbre a qual a Câmara acaba de se pronunciar. Temos agora, portanto, de nos pronunciar sôbre a generalidade do projecto.

O Sr. Presidente: - Sr. Mesquita Carvalho, o projecto está já aprovado na generalidade.

O Sr. Mesquita Carvalho: - Não pode ser!

Vozes da direita: - Apoiado!

Vozes da esquerda: - Ora essa! Não apoiados!

Trocam-se mais àpartes.

O Sr. Mesquita de Carvalho: - Sr. Presidente; o parecer n.° 123 foi lido e pôsto à discussão na generalidade. O primeiro que falou sôbre êle, foi o Sr. Costa Júnior que se limitou a mandar para a Mesa uma emenda, que segundo V. Exa. informou, ficaria para se votar na discussão da especialidade. Em seguida a isto, pedi eu a palavra e fiz uso dela unicamente para enviar para a Mesa uma moção que representava uma questão prévia, e sôbre esta questão prévia, nos termos do Regimento, recaiu a discussão que se produziu.

Quando se votou depois essa moção, verificou-se que ela foi rejeitada; de forma que temos agora de continuar na discussão da generalidade, a qual não foi votada porque não podia sê-lo.

O Sr. Presidente: - A discussão na generalidade foi já encerrada...

Vozes da direita: - Não pode ser!

O Sr. Mesquita Carvalho: - A economia do projecto está por discutir...

O Sr. Presidente: - Pus à votação na generalidade o parecer.

O Sr. Mesquita Carvalho: - Perdão, V. Exa. não podia pôr...

O Sr. Presidente: - Quando eu cheguei à Presidência, tive conhecimento de que tinha sido encerrada a discussão na generalidade, e ia fazer-se a contraprova sôbre a votação da moção do Sr. Mesquita Carvalho, contraprova que deu em resultado a rejeição dessa moção. Em seguida, nos termos do Regimento, pus à votação a questão principal, na generalidade, que foi aprovada. Não posso, portanto, agora abrir a discussão na generalidade. (Muitos apoiados da esquerda).

O Sr. Eduardo de Souza: - Protesto energicamente! V. Exa. está equivocado! Não se podia votar a generalidade!

O Sr. Presidente: - Vou pôr à discussão na especialidade o parecer.

O Sr. Eduardo de Sousa: - Isso é um escândalo! Não pode ser! O Sr. Afonso Costa e o Marquês de Pombal eram contra a batota!

Uma voz da esquerda: - Tambêm eu sou!

O Sr. António Fonseca: - Mas não se trata agora da batota!

Trocam-se mais àpartes e estabelece-se sussurro.

O Sr. Presidente: - Peço a atenção da Câmara.

O Sr. António Fonseca: - Peço a palavra para invocar o Regimento!

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24 Diário da Câmara dos Deputados

O Sr. Presidente: - Tem V. Exa. a palavra.

O Sr. António Fonseca: - Sr. Presidente: eu invoco o artigo 109.° de Regimento que diz:

"Em qualquer estado do debate, poderá suscitar-se uma questão ou moção de ordem.

São moções de ordem: a questão prévia, etc."

E o sou § 1.° diz o seguinte.

"A questão prévia dá-se sempre que um Deputado proponha que a Assemblea, por qualquer motivo, não pode deliberar concernentemente à matéria que se discute, e, sendo apoiada por cinco Deputados, considera-se admitida, entrará em discussão e será resolvida antes da questão principal".

Já V. Exa. vê que aqui não se diz que há-de haver uma inscrição especial e prévia sôbre a questão prévia. Ela entra em discussão com a generalidade do assunto em discussão. E ela só pode ser votada depois do esgotada a inscrição na generalidade. É o princípio seguido.

No emtanto, o pelas disposições dêste artigo 109.°, o que se vota primeiro é a questão prévia. (Apoiados). Foi o que se fez.

O orador não reviu.

O Sr. Afonso de Melo: - Sr. Presidente tendo pedido a palavra para invocar o Regimento, eu vejo-me forçado a dizer, fazendo mais uma vez a afirmação do muito respeito que tenho pelas altas qualidades de V. Exa., que a sua interpretação não pode ser aceita pela Câmara. O § 1.° do artigo 109.° é claro.

A questão prévia apresentada pelo Sr. Mesquita Carvalho foi admitida o entrou em discussão em harmonia com o que manda o Regimento para ser resolvida antes da questão principal. E V. Exa. compreende que seria uma inutilidade estar-se a discutir a questão principal, sem se saber se a questão prévia seria ou não de admitir.

Não seria lógico tambêm, nem regular, que se discutissem ao mesmo tempo dois assuntos que, embora conexos, podem ter fins muito diferentes e consequências muito diversas. Quantas vezes as questões prévias são levantadas precisamente porque envolvem assunto de gravidade diferente da questão principal. Eu creio que V. Exa., Sr. Presidente, que não estava presente na ocasião de ser votada a questão prévia, não podia deixar de pôr em discussão o projecto na generalidade.

Posso afirmar a V. Exa. que alguns Srs. Deputados pediram a palavra para a discussão na generalidade, e entre êles o Sr. Brito Camacho, sendo de presumir, Sr. Presidente, que V. Exa., desejando que os trabalhos prossigam com regularidade e não sejam atropelados os direitos dos Deputados que queiram entrar no debate, dará aos mesmos trabalhos outra orientação.

O orador não reviu.

O Sr. Mesquita Carvalho: - Sr. Presidente : V. Exa. e a Câmara hão-de permitir que, em poucas palavras, eu esclareça o assunto, tal como êle se me afigura de direito e tal como êle foi de facto.

Pelo que respeita ao direito, direi que as considerações produzidas pelo Sr. Ferreira da Fonseca não vêm se não confirmar a interpretação que eu dei ao Regimento.

De facto, o Regimento diz que a questão prévia será discutida e votada em primeiro lugar. Se é discutida e votada em primeiro lugar, é o distintamente da matéria. E, se algumas dúvidas podem restar, esclarece-as o parágrafo imediato.

Quando se refere ao adiamento lá diz muito expressamente:

"O adiamento pode ser indefinido ou por tempo determinado. Sendo proposto por um deputado e apoiado por cinco, entra logo em discussão, e pode ocupar o lugar da questão principal até resolução da Assemblea sôbre êle, ou é discutido simultaneamente com a matéria em discussão. Neste caso, o adiamento prefere na ordem da votação".

É o que sempre sucedeu com questões prévias desta natureza, porque a minha tendia precisamente a dizer que a Câmara, visto ao projecto faltar uma das condições regimentais que considero indispensável, o parecer da Comissão de Assistência não podia nem devia pronunciar-se sôbre a matéria. Nestes termos a minha moção vi-

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sava a, sendo votada pela Câmara, impedir que a discussão prosseguisse e, assim, tendo ela sido rejeitada, a discussão tem de prosseguir.

O Sr. António Maria da Silva (interrompendo) - Mas V. Exa. não pensou da mesma maneira quando da revisão constitucional. Então foi apresentada uma questão provia do Sr. Mem Verdial que foi discutida juntamente com a generalidade e votada primeiro. O caso era precisamente o mesmo.

O Orador: - Eu ainda não concluí. V. Exa. não pediu autorização para me interomper e eu não lha dou.

Só com minha autorização V. Exa. me podia interromper e não teve a correcção de ma pedir. É necessário que nos habituemos a respeitar uns aos outros.

Qualquer que seja a consideração pessoal que eu tenha por V. Exa. ou por qualquer outro membro desta casa, não admito que se falte à correcção que me é devida, quando demais a mais tem de ser exercida dentro dos termos precisos do Regimento.

Disse eu, Sr. Presidente, que a questão tinha duas partes: uma de direito, outra de facto, e esta é, no presente caso importante.

São duas as circunstâncias e a primeira é que, ao mandar para a Mesa, a minha questão prévia, declarei desde logo que me abstinha nesse momento de tratar de matéria, direito que me reservava para depois de devidamente discutida e votada a questão prévia; e tanto isto calou no espírito da Câmara que os dois ou três Srs. Deputados que falaram depois de mim se limitaram a discutir a questão prévia e nada mais.

Por consequência, rejeitada como foi a minha questão prévia, segue-se, nos termos regimentais, a discussão normal da generalidade.

V. Exa., Sr. Presidente, não tinha de submeter à votação a generalidade do projecto, nem tem de interromper a discussão. Por isso mesmo eu pedi a palavra e hei-de falar na generalidade.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - V. Exa. insiste no seu ponto de vista e eu insisto no meu. Estando encerrada a discussão na generalidade, eu não posso...

O Sr. Mesquita Carvalho: - Aí é que está o equívoco de V. Exa. A discussão não está encerrada.

Sussurro.

O Sr. Tavares Ferreira: - Requeiro que a sessão seja prorrogada até se votar o projecto em discussão.

Vozes: - Não pode ser.

Sussurro.

O Sr. António Fonseca: - Talvez fôsse preferível resolver-se primeiro o incidente.

Chamo a atenção de V. Exa., Sr. Presidente, para o artigo 109.° e seu § 1.° que chama moção de ordem às questões prévias.

O Sr. Presidente: - O Sr. Tavares Ferreira pediu a palavra para um requerimento.

Requereu S. Exa. a prorrogação da sessão até se votar a matéria que se discute. Os Srs. Deputados que aprovam tenham a bondade de se levantar.

Foi aprovado.

O Sr. Júlio Cruz: - Requeiro a contraprova!

O Sr. Eduardo de Sousa: - Requeiro a contagem!

Pausa.

O Sr. Presidente: - Estão levantados 15 Srs. Deputados e sentados 56. Está aprovado o requerimento.

O Sr. Orlando Marçal: - Assim é que se procede!

O Sr. Presidente: - Vai discutir-se na especialidade o artigo 1.° Vão ler-se as propostas já mandadas para a Mesa sôbre êste artigo.

Leu-se o artigo 1.°

Foi lida na Mesa e admitida a proposta do Sr. Costa Júnior.

Foi lida na Mesa e admitida a proposta do Sr. Maldonado de Freitas.

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26 Diário da Câmara dos Deputados

É a seguinte:

Proponho que o artigo 12.° da substituição proposta pela Comissão, fique assim redigido:

"O Govêrno confiará, e imediatamente, a administração do Hospital a duas comissões: uma técnica e outra administrativa:

a) A comissão técnica será composta pelos dois médicos do estabelecimento e de mais um vogal da comissão administrativa;

b) A comissão administrativo, será composta por um delegado da Câmara Municipal, outro da Associação Comercial o Industrial e de mais um dos médicos da comissão técnica.

§ único. Estas comissões serão propostas ao Ministro do Trabalho, pelo governador civil de Leiria, cessando as suas funções logo que o Estabelecimento Balnear e Anexos, fôr adjudicado a qualquer empresa. - Maldonado Freitas.

O Sr. António Fonseca: - Sr. Presidente : eu pedi a palavra para dizer a V. Exa. que concordo inteiramente com o restabelecimento das disposições da lei n.° 827, do 24 de Setembro de 1917, mas estou absolutamente em desacordo com as alterações que se pretende introduzir nessa lei e especialmente a que se refere à alínea b).

Uma voz da direita: - S. Exa. não é partidário da regulamentação do jôgo?

O Orador: - Sou partidário da regulamentação do jôgo, mas do que não sou partidário é do que o jôgo possa ser administrado pelos directores do hospital.

De resto, não se discute o jôgo. O turismo não é simplesmente a batota.

Considerar a batota como único elemento de turismo, não pode ser a expressão duma pessoa inteligente.

Adiante.

Quer da leitura do relatório do projecto, do Sr. Maldonado de Freitas, quer da leitura do parecer da comissão de administração pública, o que se infere é que os serviços do Hospital da Rainha D. Leonor, e outros hospitais, foram regulamentados pela lei n.° 827, de 24 de Setembro de 1917, lei que foi depois suspensa pelo decreto n.° 3:812, de 2 de Fevereiro de 1918, que ainda não foi revogado. Não houve evidentemente, durante a vigência da lei n.° 827, qualquer facto que aconselhasse a alteração.

Não sei, por consequência, o que se produziu no curto período de Setembro de 1917 a Fevereiro de 1918, que aconselhasse a propor uma alteração num detalhe mínimo.

Para que serve estar a fazer tambêm questão sôbre um assunto em que não temos o direito de nos pronunciar, emquanto estiver vivo ou não pedir a reforma a pessoa que actualmente administra êsse hospital? Só depois da vaga se dar é que o Congresso se poderá pronunciar.

A alínea b) diz:

"b) O artigo 12.° e seus parágrafos da referida lei serão substituídos pelo seguinte:

Art. 12.° O Govêrno, emquanto se não realizar o concurso para a adjudicação da exploração do balneário e anexos, ou só depois de aberto êsse concurso êle ficar deserto entregará a administração do Hospital da Rainha D. Leonor e anexos, bem como a exploração da indústria do turismo nos seus arredores, a uma junta autónoma, etc".

Sr. Presidente: o que é o turismo nos arredores?

São campos de equitação, campos de futebol e jôgo?

Deve entregar-se isto a uma administração dum hospital?

Não se compreende que assim seja.

Neste parágrafo único diz-se o seguinte:

"A junta autónoma, no caso de ficar deserto o concurso, funcionará por cinco anos, tendo como única remuneração uma percentagem, nos lucros da exploração que será fixada pelo Governo".

O Sr. Maldonado de Freitas: - Veja V. Exa. que o hospital das Caldas da Rainha em 1810 rendia em vinhos e trigo 12 contos. Não é, pois, muito que o Estado hoje inscreva no orçamento 25 contos.

O Orador: - Mantenho, a minha opinião. Entendo que se devem eleminar as alíneas a) e b).

Seria mais lógico fazer-se a discussão, não sôbre êste projecto especial, mas sô-

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Sessão de 14 de Novembro de 1919 27

bre e lei n.° 827, de 1917, em que apenas é necessário fazer insignificantes alterações.

Assim garantimos os interêses dos caldenses.

Não há, em minha opinião, vantagem em se fazer um projecto de lei integralmente novo.

Por isso mando para a Mesa a seguinte proposta:

Proponho a eliminação das alíneas a) e b) do artigo 1.° e, neste, as palavras "com as seguintes modificações". - O Deputado, António Fonseca.

O orador não reviu.

O Sr. Júlio Martins: - Sr. Presidente: a meu ver a Câmara não pode votar o artigo 12.°, tal como está.

Argumenta-se de facto que o turismo não se reduz ao jôgo.

O que se deve estabelecer é o princípio do concurso, porque a Câmara tem realmente o direito de escolher um indivíduo que fôsse ao concurso, porque já averiguou da sua competência técnica e pode averiguar do seu republicanismo.

Pouco conheço do que se passa nas Caldas da Rainha, mas sei que a direcção do hospital tem obedecido mais a uma exploração política do que a uma exploração hospitalar.

Eu não compreendo bem o pensamento do autor do projecto nas suas alíneas.

Mas desde que S. Exa. apresentou as suas emendas e pelas que ouvi ler na Mesa, apresentadas pelo Sr. António Fonseca, não tenho dúvidas em dar o meu apoio ao projecto. Envio tambêm para a Mesa a seguinte proposta:

Proponho que a alínea a) do artigo 1.° seja assim redigida:

a) A direcção técnica e serviços clínicos do Hospital de Santo Isidoro serão confiados pela Câmara Municipal, por meio de concurso, sem prejuízo dos direitos adquiridos pelo actual clínico contratado. - O Deputado, Júlio Martins.

O Sr. Francisco José Pereira (relator): - Eu pedi a palavra para dizer a V. Exa. que a comissão aceita as emendas enviadas para a Mesa.

Creio, porêm, que está prejudicada a emenda do Sr. Costa Júnior.

O Sr. Costa Júnior: - Não tenho dúvidas em retirar a minha proposta.

O Sr. Hermano de Medeiros: - Em virtude do princípio do concurso já exposto, eu concordo com o Sr. Maldonado de Freitas.

De facto para dirigir estabelecimentos desta natureza é necessário idoneidade e uma câmara municipal não pode por seu alvedrio nomear qualquer, porque não tem competência para isso.

É uma questão de competência.

O Sr. Maldonado de Freitas, substitui o artigo 1.° por duas comissões, uma técnica e outra administrativa.

A comissão técnica, compõe-se segundo a proposta, de dois médicos e de um membro da comissão administrativa.

Discordo em absoluto desta idea, porque o membro da comissão administrativa pode ser um honrado sapateiro das Caldas da Rainha, mas em todo o caso um sapateiro.

Sr. Presidente: Mando para a Mesa a seguinte

Proposta de substituição da alínea a)

A direcção técnica dos serviços clínicos do Hospital de Santo Isidoro, a cargo da Câmara Municipal das Caldas da Rainha, serão providos por concurso de provas práticas e documentais. - Hermano de Medeiros.

Admitida.

Para a Secretaria.

É um esclarecimento à proposta do Sr. Maldonado Freitas, porque eu não concebo que o Parlamento possa adoptar outro critério para um lugar de competência.

Foi admitida a proposta do Sr. António Fonseca.

Leu-se a proposta do Sr. Júlio Martins, que foi admitida.

O Sr. Júlio Cruz: - Requeiro a contraprova e a contagem.

Procedeu-se à contraprova.

O Sr. Presidente: - Aprovaram a admissão da proposta do Sr. Júlio Martins, 61 Srs. Deputados e rejeitaram, 8.

Está admitida.

Foi admitida a proposta, do Sr. Hermano de Medeiros.

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O Sr. Afonso de Melo: - Sr. Presidente: desejo saber se êstes dois hospitais de que trata o projecto são ou não estabelecimentos do Estado.

Creio que êstes assuntos de assistência pública correm agora pelo Ministério do Trabalho, e como está presente o Sr. Ministro do Trabalho, peço que S. Exa. me diga se êstes hospitais são ou não pertenças do Estado e não de qualquer particular, de qualquer misericórdia, de irmandade, ou de câmara municipal.

Em primeiro lugar, acho aceitável o princípio do Estado ser o zelador, como a Constituição impõe, dos bens da Fazenda Nacional.

Pregunto, se é admissível que o Govêrno continue impassível à invasão das suas atribuições, e pregunto se o Govêrno entende que os bens do Estado são logradouro de câmaras municipais, associações comerciais, de qualquer pessoa ou colectividade que por qualquer motivo teria preferencia ha administração dêsses bens do Estado.

Sr. Presidente: ouvi um àparte do Sr. Júlio Martins, no qual S. Exa. falou em política partidária, o assim desejo tambêm preguntar se se trata do satisfazer quaisquer desejos partidários.

O Estado deve zelar os seus bens, e eu acho que não ficam bem garantidos, quer pela economia do projecto, quer pelas emendas apresentadas pelo Sr. Maldonado de Freitas.

Quero ainda preguntar-se o Sr. Ministro do Trabalho julga que o Govêrno é realmente incompetente para que continue nas suas mãos a administração dêsses dois hospitais de que se trata.

Se o Govêrno quere dar perante a Câmara e o país, essa pública confissão de incapacidade administrativa, se não se julga capaz de administrar com espírito seguro aqueles bens que há tanto tempo estão confiados à sua guarda, é o que eu tambêm pregunto.

Sr. Presidente: êstes projectos que de vez em quando caem, como catadupas, sôbre esta Câmara, têm muitas vezes êstes aspectos graves, apesar de à primeira vista parecerem simples.

E assim pregunto para onde caminhamos, de tal modo com prejuízo do prestígio e dos interêsses da Nação.

Distribuem-se por amigos e afilhados, pensões e indemnizações.

Agora entregam-se os hospitais às corporações locais.

São colocados fora da fiscalização do Govêrno e do Congresso.

Pregunto ainda ao Sr. relator, quais são as razões de ordem técnica que levaram a comissão de administração pública, a aconselhar a esta Câmara a aprovação dêste projecto.

Que razões não teve, vê-se claramente pelo facto da mesma comissão aceitar as emendas apresentadas pelo autor do projecto e pelo Sr. Júlio Martins, que significam a inversão completa do todo o pensamento primário e estrutural do projecto.

Vê-se que a comissão referida não teve um ponto de vista assente.

Desejo ainda que S. Exa. o Sr. Ministro das Finanças nos diga se os bens dêstes hospitais, pertencem ao património do Estado.

O Sr. Rêgo Chaves (Ministro das Finanças): - Um dêsses hospitais está sujeito a determinadas condições resultantes dum legado e, portanto só poderei dar esclarecimentos completos, desde que amanhã tire os apontamentos necessários.

O Orador: - V. Exas. vêem, pois, que o Sr. Ministro das Finanças, num projecto desta natureza que diz respeito a um edifício que vale dezenas de contos não se julga habilitado a responder à pregunta que tive a honra de lhe fazer. Nestas condições se outro motivo não houvesse para que a discussão não prosseguisse bastaria esta. Assim, requeiro para que seja consultada a Câmara sôbre se entende que êste projecto seja retirado da discussão até o Sr. Ministro das Finanças se declarar habilitado a responder às minhas preguntas, pedindo a V. Exa. para me reservar a palavra para depois da resolução da Câmara.

Vozes: - Não pode ser!

O Orador: - O Sr. Presidente é que pode dizer se, nos termos do Regimento, o meu pedido tem ou não razão de ser.

Sussurro.

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O Sr. Presidente: - Se V. Exa. deseja fazer mais algumas considerações o melhor seria fazê-las antes de eu submeter o requerimento à votação. Depois desta realizada não lhe posso conceder novamente a palavra. (Muitos apoiados).

O Orador: - Eu acato inteiramente a resolução de V. Exa. Se há alguêm que não mantenha a regularidade dos trabalhos parlamentares e não se submeta às resoluções de V. Exa. êsse alguêm não pertence a êste lado da Câmara. (Apoiados da direita).

Se o Sr. Ministro das Finanças mo permite, eu pedirei ainda outros esclarecimentos fundamentais para a discussão dêste projecto. Eu desejo saber se é o Estado quem continua ou não a fornecer os fundos necessários para a sustentação dêsses hospitais...

O Sr. Rêgo Chaves (Ministro das Finanças): - Evidentemente que eu não tenho aqui à mão os elementos indispensáveis para responder cabalmente a todas as preguntas que V. Exa. se lembre de fazer. Há preguntas que só servem para protelar as discussões e as que V. Exa. me acaba de fazer pertencem a êsse número.

O Orador: - Permita-me V. Exa. que eu manifeste a minha mais viva estranheza perante a declaração do Sr. Ministro das Finanças.

Pois então discute-se um projecto em que estão era jôgo legítimos interêsses do Estado e o Sr. Ministro das Finanças não se julga habilitado a dizer se, entregando êstes hospitais à administração da câmara municipal, o Estado continua ou não a pagar para esses hospitais?

Sendo o projecto omisso a êste respeito, tenho de concluir que o Estado continua a pagar para os outros administrarem. O que pregunto a V. Exa., Sr. Ministro das Finanças, é se acha isto bem, é se, V. Exa. que põe fiscais ao lado da mais pequena despesa, que faz passar por uma fieira apertadíssima a mísera folha de ordenados dum cantoneiro, se acha bem que se vão entregar dezenas de contos a entidades particulares sem sombra de fiscalização. Que confiança lhe merece a vereação das Caldas da Rainha para lhe entregar assim de mão beijada, sem fiscalização, contos e contos déreis?

Esta é que é a verdade, Sr. Ministro das Finanças.

Os interêsses da Nação não se defendem desta maneira.

Continuando desta forma V. Exas. não cumprem o seu dever nem de Ministros nem sequer de patriotas; atraiçoam assim os interêsses da Nação.

É realmente um triste sintoma, um desgraçado sintoma esta facilidade com que as cousas do Estado vão sendo deitadas à margem sem que o Govêrno se interêsse pela fiscalização que sôbre elas deve exercer, sem que defenda palmo a palmo êsse terreno que é o seu, porque o Govérno não foi chamado ao Poder para satisfazer as ambições dum partido, nem distribuir um bodo aos seus correligionários, mas, para defender os interêsses da Nação.

Termino mandando para a Mesa uma proposta de emenda assinada por cinco membros desta Câmara.

A proposta é a seguinte:

Proposta

Em virtude das declarações do Sr. Ministro das Finanças propomos o aditamento da discussão do parecer n.° 123 nos termos do artigo 109.°, § 2.°, do Regimento. - Os Deputados, Aresta Branco - Afonso de Melo - Raúl Lelo Portela - Francisco da Cruz - Brito Camacho - Hermano de Medeiros.

Admitida nos termos do § 2.° do artigo 109.° do Regimento.

O orador não reviu.

O Sr. Eduardo de Sousa: - Mando para a Mesa um requerimento.

O Sr. Presidente: - O requerimento de V. Exa. não é dirigido à Câmara mas à Mesa que não pode fornecer a V. Exa. as Ordenações Filipinas, visto que na biblioteca do Congresso existe apenas um exemplar o eu tenho do observar o disposto no §2.° do artigo 69.° do regulamento interno.

O Sr. Eduardo de Sousa: - Sr. Presidente: eu sei precisamente tudo isso que V. Exa. acaba de dizer; mas parece que os Srs. Deputados ignoram que a biblioteca já está fechada a esta hora.

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O Sr. Presidente: - Afirmo a V. Exa. que a biblioteca esta aberta.

O Sr. Presidente: - Vai ler-se uma proposta do Sr. Afonso de Melo.

Foi lida e, considerada admitida, entra em discussão.

O Sr. Domingos dos Santos (Ministro do Trabalho): - Sr. Presidente: pedi a palavra para, com muito prazer, responder às considerações que fórum feitas pelo Sr. Afonso de Melo.

Preguntou-me S. Exa. se eu, como membro do Govêrno, acho bem que o Estado vá alienar uma parte do seu património em benefício duma câmara municipal. A pregunta assim formulada eu responderei, evidentemente, que não. Eu, como homem do Govêrno, entendo que não está bem que o Estado faça, a quem quer que seja, a alienação dos seus bens. Mas não é êsse o caso presente: o Estado não aliena cousa alguma; autoriza a dar a uma empresa particular, de arrendamento, a exploração das Caldas da Rainha. E devo dizer que, posta a questão neste pé, eu estou inteiramente de acordo com o proponente. Por observação própria, efectivamente, tenho verificado que os serviços que estão a cargo do Estado correra sempre mal, não progridem, alêm de trazerem imensos encargos para o Estado. Eu sou daqueles que pensam que o Estado é mau administrador, por si só, e esta afirmação que faço provêm da observação que tenho feito dalguns serviços públicos.

No caso presente, as Caldas da Rainha, que, desde muito tempo, tem vindo sendo exploradas pelo Estado, têm sido mal exploradas. (Apoiados). E, em várias sindicâncias a essa exploração, todas elas têm concluído dizendo que se deve entregar essa exploração a uma empresa particular.

Nestas condições, eu, que fui de propósito às Caldas da Rainha averiguar de perto o que lá se passava, tive ocasião de observar os fundamentos das sindicâncias, porque, podendo dar a exploração das Caldas da Rainha largos benefícios para a região e para o país, elas estavam quási em embrião. Consequentemente, quando o Sr. Maldonado de Freitas me falou neste projecto, eu declarei logo que o aceitava.

Quanto à afirmação de que o Estado vai dar de mão beijada à Câmara Municipal as Caldas da Rainha o Sr. Afonso de Melo não foi rigoroso. O Estado não dá nada de mão beijada, e, sobretudo, sem fiscalização. Por esta alteração que o Sr. Maldonado de Freitas apresentou, em quanto à empresa a quem será adjudicada, por concurso, a exploração das Caldas da Rainha, não tomar posse dela, a Câmara Municipal terá a sua administração.

Entendo, pois, que o projecto devo ser aprovado para bem dos interêsses das Caldas da Rainha.

São estas as explicações que mo cumpre dar a S. Exa.

O orador não reviu.

O Sr. Mesquita Carvalho: - Sr. Presidente: para as considerações que tenho de fazer sôbre a critica do artigo 1.° do projecto, eu careço absolutamente de que o Sr. Ministro das Finanças traga a esta Câmara os esclarecimentos que lhe foram já pedidos pelo Sr. Afonso do Melo, e que S. Exa. declarou que só daqui a dois ou três dias estaria habilitado a trazer, o careço tambêm da presença do Sr. Presidente do Ministério.

Nestas condições, e sem prejuízo do uso da palavra, eu requeiro que esta discussão seja suspensa até que o Sr. Ministro das Finanças se de por habilitado a trazer aqui os esclarecimentos pedidos, e o Sr. Presidente do Ministério esteja presente.

O Sr. Presidente: - V. Exa. acaba de fazer o que já fez o Sr. Afonso de Melo, que foi um requerimento no sentido de ser suspensa a discussão dêste parecer até que o Sr. Ministro das Finanças viesse, suficientemente habilitado, fornecer os esclarecimentos que S. Exa. pediu, e o Sr. Presidente dó Ministério estivesse presente.

Eu nessa altura avisei S. Exa. de que, a pôr o seu requerimento à votação nesse instante, não poderia continuar a usar da palavra. Tinha do a dar ao primeiro orador inscrito depois de S. Exa.

Outro tanto tenho de dizer a V. Exa. Deseja, pois, V. Exa. que ponha o seu requerimento à votação imediatamente, considerando as suas considerações

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terminadas, ou deseja prosseguir, ficando a votação do seu requerimento para mais tarde?

O Sr. Mesquita Carvalho: - Peço a V. Exa. que ponha o meu requerimento à votação imediatamente.

É pôsto à votação o requerimento do Sr. Mesquita Carvalho.

O Sr. Presidente: - Está rejeitado.

O Sr. Eduardo de Sousa: - Requeiro a contraprova e a contagem.

Procede-se à contraprova.

O Sr. Presidente: - Estão sentados 11 Srs. Deputados e levantados 52.

Está rejeitado.

O quorum é de 55.

Êste projecto continua em discussão na próxima sexta-feira, dia destinado aos projectos de interêsse regional.

A próxima sessão é na segunda feira, às 14 horas, com a seguinte ordem de trabalhos:

Antes da ordem do dia:

Parecer n.° 152, que fixa os vencimentos dos funcionários administrativos.

Parecer n.° 67, que concede pensões vitalícias de 360$ a cada um dos cidadãos João Lucas Fernandes e José Marques do Carmo Catarino.

Ordem do dia:

1.ª parte:

Interpelação do Sr. Angelo Sampaio Maia ao Sr. Presidente do Ministério.

2.ª parte:

Parecer n.° 178, que reorganiza a Secretaria da Presidência da República e fixa- os vencimentos dos seus respectivos empregados.

Parecer n.° 46, que atribui exclusivamente ao Ministro das Finanças as nomeações, transferências, colocações e mais movimento do pessoal que pertenciam aos directores gerais e chefes de repartição do Ministério das Finanças.

Parecer n.° 131, que aplica ao Arsenal do Exército as disposições 10.ª e 11.ª do regulamento da Manutenção Militar de 19 de Agosto de 1911 e a disposição do artigo 2.° da lei de 20 de Julho do 1912.

Parecer n.° 88, que passa à situação de reforma, no pôsto que actualmente têm, os oficiais que foram reintegrados depois do 5 de Dezembro de 1917.

Parecer n.° 135, que altera o decreto n.° 5:570 sôbre vencimentos dos oficiais do exército.

Parecer n.° 66, que cria no Instituto do Professorado Primário os lugares de regente, sub-regente e ecónoma.

Parecer n.° 144, que regula a situação dos oficiais milicianos.

Parecer n.° 74, que estabelece as normas para a classificação dos concorrentes aos lugares de professores electivos o agregados dos liceus.

Está encerrada a sessão.

Eram 20 horas.

Documentos mandados para a Mesa durante a sessão

Projectos de lei

Do Sr. Domingos da Cruz, criando duas assembleas eleitorais nas freguesias de Jovim e S. Pedro da Cova, concelho de Gondomar.

Para a Secretaria.

Para o "Diário do Govêrno".

Pareceres

Da comissão de administração pública, sôbre a proposta de lei n.° 181-B do Senado, declarando inelegíveis os empregados corpos dos administrativos.

Para a Secretaria.

Imprima-se.

Da mesma comissão, sôbre o projecto de lei n.° 186-J, do Sr. José Maria de Campos Melo, dividindo o concelho de Belmonte em duas assembleas eleitorais.

Para a Secretaria.

Para a comissão de legislação civil e comercial.

Da comissão do orçamento, sôbre a proposta de lei n.° 239-F, do Sr. Ministro do Interior, reforçando na quantia do 15.000$ a verba inscrita no Orçamento para "Investigações e Inquéritos".

Para a Secretaria.

Imprima-se.

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Da comissão de administração pública, sôbre o projecto de lei n.° 201-E, do Sr. Sá Pereira, autorizando a Câmara Municipal de Loures a lançar designados impostos.

Para a Secretaria.

Para a comissão de agricultura.

Da mesma comissão, sôbre o projecto de lei n.° 7-E, do Sr. Pedro Góis Pita, dando nova organização à comarca do Funchal.

Para a Secretaria.

Imprima-se.

Da mesma comissão, sôbre o projecto de lei n.° 16-M, do Sr. Augusto Joaquim Alves dos Santos, autorizando a Câmara Municipal de Coimbra a lançar um imposto com aplicação ao serviço de incêndios.

Para a Secretaria.

Imprima-se.

Da mesma comissão, sôbre o projecto de lei n.° 194-L, do Sr. José Garcia da Costa, autorizando a Administração dos Caminhos do Ferro do Estado a construir um ramal que ligue a vila do Portel com a estação do Viana do Alentejo.

Para a Secretaria.

Para a comissão de finanças.

O REDACTOR - João Saraiva.

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