Página 1
REPUBLICA PORTUGUESA
DIÁRIO DA CAMARA DOS DEPUTADOS
SESSÃO N.º 7
EM 10 DE DEZEMBRO DE 1919
Presidência do Exmo. Sr. Domingos Leite Pereira
Secretários os Exmos. Srs.
Baltasar de Almeida Teixeira
António Marques das Neves Mantas
Sumário. - Respondem à chamada 64 Srs. Deputados. É lida a acta, que se aprova sem discussão, fazendo-se em seguida a leitura do expediente.
Antes da ordem do dia. - O Sr. Tavares de Carvalho prescinde de usar da palavra por não estar presente o Sr. Ministro da Agricultura.
O Sr. Manuel José da Silva desiste de falar por não estar premente nenhum membro do Govêrno.
O Sr. Domingos Rosado trata de trabalhos de obras públicas no distrito de Évora.
O Sr. Jaime de Sousa pede para que a comissão de pescarias possa reúnir-se durante a sessão, comunicando o Sr. Presidente que ela ainda se não encontra constituída.
O Sr. Manuel Fragoso revolta-se contra as correrias, perigosas, dos automóveis, principalmente do Parque Automóvel Militar, pelas ruas da capital.
O Sr. António José Pereira insta pelos documentos que pediu referentes à sindicância aos funcionários do Congresso, pela realização duma interpelação ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros pelo cumprimento da lei de sindicância aos Ministérios.
O Sr. Hermano de Medeiros solicita a presença dos Srs. Ministros da Justiça e do Comércio.
O Sr. Viriato da Fonseca marca a sua atitude na Câmara e refere-se ao envio de bolchevistas para Cabo Verde, reclamando contra o facto.
O Sr. Jorge Nunes insta para que volte ò discussão o projecto chamado "dos funcionários administrativos".
O Sr. Joaquim Brandão manda para a Mesa um projecto de lei referente ao concelho de Cezimbra, para que requere a urgência, que é concedida.
O Sr. Nóbrega Quintal nota a ausência, no Parlamento, do Sr. Ministro das Colónias.
O Sr. Pais Rovisco deseja saber se os bolchevistas, que o Govêrno afastou do continente, foram julgados por algum tribunal.
O Sr. João Gonçalves apresenta um projecto de lei restabelecendo a Escola Industrial de Damião de Góis, em Alenquer, e trata dos vencimentos do pequeno funcionalismo.
O Sr. Hermano de Medeiros protesta contra o termos em que a vereação de Lisboa proveu uma escola, contra a letra da lei chamada dos "cônjuges". Responde o Sr. Ministro da Instrução Pública (Joaquim de Oliveira), que tambêm manda para a Mesa três propostas de lei, requerendo a urgência para duas delas, que é concedida.
O Sr. Alberto Vidal responde ao Sr. Hermano de Medeiros, que por sua parte lhe replica.
Lê-se na Mesa uma nota de interpelação do Sr. Cunha Lial ao Sr. Ministro das Finanças sôbre a situação cambial.
Declara-se constituída a comissão de instrução secundária.
Ordem do dia. - Realizam-te as eleições da comissão revisora de contas, de um vogal efectivo e de um vogal substituto para a Junta do Crédito Público no triénio de 1920-1923.
Continua a interpelação ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros sôbre a compra de arroz em Espanha.
O Sr. António Maria da Silva requere, e é aprovada, a generalização do debate. Usa da palavra o Sr. Melo Barreto (Ministro dos Negócios Estrangeiros). O Sr. António Maria da Silva apresenta e justifica uma "moção de ordem") que é admitida. Segue-se o Sr. Júlio Martins, que fica com a palavra reservada.
Antes de se encerrar a sessão. - O Sr. Manuel José da Silva (Oliveira de Azeméis) pede a comparência, na sessão seguinte dos Srs. Presidente do Ministério e Ministro da Agricultura.
Encerra-se a sessão, marcando-se a imediata para o dia seguinte à hora regimental.
Documentos mandados para a Mesa durante a sessão. - Nota de interpelação - Comunicações - Projectos de lei - Propostas de lei - Parecer - Requerimentos.
Abertura da sessão às 15 horas e 23 minutos.
Presentes à chamada Srs. 64 Deputados.
Página 2
2 Diário da Câmara dos Deputados
Presentes os Srs.:
Abílio Correia da Silva Marçal.
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Alberto Ferreira Vidal.
Albino Pinto da Fonseca.
Álvaro Pereira Guedes.
Angelo de Sá Conto da Cunha Sampaio e Maia.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Albino de Carvalho Mourão.
António Albino Marques de Azevedo.
António Augusto Tavares Ferreira.
António da Costa Ferreira.
António da Costa Godinho do Amaral.
António Dias.
António Francisco Pereira.
António Joaquim Granjo.
António Marques das Neves Mantas.
António Pais Rovisco.
António Pires de Carvalho.
Augusto Pereira Nobre.
Augusto Rebêlo Arruda.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Bartolomeu dos Mártires Sousa Severino.
Custódio Martins de Paiva.
Domingos Cruz.
Domingos Frias de Sampaio e Melo.
Domingos Leite Pereira.
Domingos Vítor Cordeiro Rosado.
Eduardo Alfredo de Sousa
Evaristo Luís das Neves Ferreira de Carvalho.
Francisco José Pereira.
Francisco Pinto da Cunha Lial.
Francisco de Sousa Dias.
Jaime de Andrade Vilares.
Jaime Júlio de Sousa.
João Estêvão Águas.
João José Luís Damas.
João de Ornelas da Silva.
João Xavier Camarate Campos.
Joaquim Brandão.
Jorge de Vasconcelos Nunes.
José António da Costa Júnior.
José Garcia da Costa.
José Gomes Carvalho de Sousa Varela.
José Mendes Nunes Loureiro.
José Monteiro.
Júlio Augusto da Cruz.
Ladislau Estêvão da Silva Batalha.
Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Luís Augusto Pinto de Mesquita Carvalho.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Manuel Ferreira da Rocha.
Manuel José da Silva.
Mariano Martins.
Maximiano Maria de Azevedo Faria.
Mem Tinoco Verdial.
Pedro Góis Pita.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.
Vasco Borges.
Vasco Guedes de Vasconcelos.
Vergílio da Conceição Costa.
Viriato Gomes da Costa.
Entraram durante a sessão os Srs.:
Acácio António Camacho Lopes Cardoso.
Adolfo Mário Salgueiro Cunha.
Afonso de Macedo.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Alexandre Barbedo Pinto do Almeida.
Álvaro Xavier de Castro.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
António Cândido Maria Jordão Paiva Manso.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António José Pereira.
António Lôbo de Aboim Inglês.
António Maria da Silva.
António de Paiva Gomes.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Augusto Pires do Vale.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Diogo Pacheco de Amorim.
Estêvão da Cunha Pimentel.
Francisco Alberto da Costa Cabral.
Francisco da Cruz.
Francisco da Cunha Rêgo Chaves.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Francisco José de Meneses Fernandes Costa.
Henrique Ferreira de Oliveira Brás.
Henrique Vieira de Vasconcelos.
Hermano José de Medeiros.
Jacinto de Freitas.
Jaime da Cunha Coelho.
João Gonçalves.
João Pereira Bastos.
João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.
Joaquim José de Oliveira.
José Domingos dos Santos.
José Gregório de Almeida.
Página 3
Sessão de 10 de Dezembro de 1919 3
José Maria de Campos Melo.
José Rodrigues Braga.
Júlio do Patrocínio Martins.
Liberato Damião Ribeiro Pinto.
Lino Pinto Gonçalves Marinha.
Luís de Ornelas Nóbrega Quintal.
Manuel José Fernandes Costa.
Manuel José da Silva.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
Raúl Lelo Portela.
Tomás de Sousa Rosa.
Ventura Malheiro Reimão.
Não compareceram os Srs.:
Afonso Augusto da Costa.
Alberto Álvaro Dias Pereira.
Alberto Carneiro Alves da Cruz.
Albino Vieira da Rocha.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.
Amilcar da Silva Ramada Curto.
Antão Fernandes da Carvalho.
António Aresta Branco.
António Bastos Pereira.
António Carlos Ribeiro da Silva.
António Germano Guedes Ribeiro de Carvalho.
António Joaquim Machado do Lago Cerqueira.
António Maria Pereira Júnior.
António dos Santos Graça.
Augusto Dias da Silva.
Augusto Joaquim Alves dos Santos.
Custódio Maldonado de Freitas.
Francisco Coelho do Amaral Reis.
Francisco Cotrim da Silva Garcês.
Francisco José Martins Morgado.
Francisco Luís Tavares.
Francisco Manuel Couceiro da Costa.
Francisco de Pina Esteves Lopes.
Helder Armando dos Santos Ribeiro.
Jaime Daniel Leote do Rogo.
João Cardoso Moniz Bacelar.
João Henriques Pinheiro.
João José da Conceição Camoesas.
João Lopes Soares.
João Luís Ricardo.
João Ribeiro Gomes.
João Salema.
Joaquim Aires Lopes de Carvalho.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
José Maria de Vilhena Barbosa Magalhães.
José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
Júlio César de Andrade Freire.
Leonardo José Coimbra.
Manuel Alegre.
Miguel Augusto Alves Ferreira.
Nuno Simões.
Orlando Alberto Marçal.
Raúl António Tamagnini do Miranda Barbosa.
Rodrigo Pimenta Massapina.
Vítor José de Deus de Macedo Pinto.
Vitorino Henriques Godinho.
Vitorino Máximo do Carvalho Guimarães.
Xavier da Silva.
O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.
As 15 horas e 5 minutos procedeu-se à chamada.
O Sr. Presidente: - Estão presentes 64 Srs. Deputados. Está aberta a sessão. Vai ler-se a acta.
Abriu a sessão às 15 horas e 23 minutos. Leu-se a acta da sessão anterior.
O Sr. Presidente: - Está em discussão a acta.
Foi aprovada sem discussão.
O Sr. Presidente: - Vai ler-se o expediente.
Foi lido o seguinte
Expediente
Pedidos de licença
Do Sr. Alberto Jordão, um dia.
Concedida.
Comunique-se.
Para a comissão de infracções e faltas.
Do Sr. Evaristo de Carvalho, dois dias.
Concedida.
Comunique-se.
Para a comissão de infracções e faltas.
Parte de doente
Do Sr. Amílcar da Silva Ramada Curto.
Concedida a licença.
Comunique-se.
Para a comissão de infracções e faltas.
Representação
Dos ajudantes e amanuenses das conservatórias do registo civil de Lisboa,
Página 4
4 Diário da Câmara dos Deputados
apresentando as bases para melhoria da sua situação.
Para a Secretaria.
Para a comissão de administração pública.
Ofícios
Do juiz sindicante ao inspector da fiscalização do extinto Ministério dos Abastecimentos, Júlio Gonzaga dos Anjos, pedindo a comparência dos Srs. Domingos Pereira, Orlando Marçal, António Pais Rovisco, Nóbrega Quintal, Júlio Martins, Afonso do Macedo, Jorge Nunes, António Maria da Silva o major Tavares de Carvalho.
Para a Secretaria.
Do Ministério da Instrução Pública, enviando cópia dum ofício do director do Observatório da Serra do Pilar em que pede aumento da dotação anual do mesmo observatório.
Para a Secretaria.
Para a comissão de finanças.
Telegrama
Lisboa. - Os empregados do tráfego das Alfândegas de Lisboa e Pôrto pedem a V. Exa. para que a Representação que entregaram nessa Câmara em 26 do Novembro passado para melhoramentos de seus vencimentos seja discutido o mais breve possível pois cada vez se torna mais cara a vida a ponto de não podermos viver. - A comissão, Brito e Pinto - Alfredo de Andrade - Joaquim da Silva.
Para a Secretaria.
O Sr. Presidente: - Está aberta a inscrição para antes da ordem do dia.
Pedem a palavra vários Srs. Deputados.
Antes da ordem do dia
O Sr. Tavares de Carvalho: - Desejava ocupar-me dum assunto na presença do Sr. Ministro da Agricultura. Como S. Exa. não está, prescindo de falar.
O Sr. Manuel José da Silva (Oliveira de Azeméis): - Eu desejava tambêm falar sôbre alguns assuntos, mas como não vejo presente nenhum membro do Govêrno, desisto de usar da palavra.
O Sr. Domingos Rosado: - Sr. Presidente: eu inscrevi-mo para quando estivesse presente o Sr. Ministro do Comércio. S. Exa. porêm, não se encontra ainda nesta Câmara, e, nessas condições, peço a V. Exa. o obséquio de transmitir as minhas considerações àquele membro do Govêrno.
Eu desejava chamar a atenção do Sr. Ministro do Comércio para a maneira como correm os serviços de obras públicas no distrito de Évora, onde nada se faz, a ponto de se encontrarem as estradas absolutamente intransitáveis, apesar de estarem dotadas desde o mês de Maio.
Precisava de dizer isto no Parlamento, porque, particularmente, já estou farto do envidar os meus esfôrços para que a Direcção de Obras Públicas realize os indispensáveis trabalhos nas estradas daquele distrito.
Peço, pois, a V. Exa. a fineza de transmitir ao Sr. Ministro do Comércio e Comunicações as minhas considerações, para que S. Exa. de as providências que o caso requere, principalmente para a estrada entre Évora e Redondo, que está dotada desde Maio com 7.000$, e que ainda nenhuma reparação sofreu.
Terminando, Sr. Presidente, peço ainda a V. Exa. que mande fazer uma larga distribuição do Regimento desta Câmara, porquanto os Deputados que aqui estão de novo ainda o não receberam, quando muito o precisam conhecer.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: - Transmitirei ao Sr. Ministro do Comércio e Comunicações as considerações que acaba de fazer o Sr. Domingos Rosado, e quanto ao pedido que S. Exa. fez para que se distribua o Regimento, tenho a dizer que pode S. Exa., ou qualquer Sr. Deputado que ainda não recebesse um exemplar do Regimento fazer a sua requisição, que mediatamente será satisfeita.
S. Exa. não reviu.
O Sr. Jaime de Sousa: - Sr. Presidente: as considerações que eu tencionava fazer hoje, já tive ensejo de as fazer ontem, e, assim, não preciso usar da palavra. Aproveito, porem, a ocasião para pedir a V. Exa. se digne consultar a Câmara sôbre se permito que a comissão de pescarias reúna durante a sessão.
Página 5
Sessão de 10 de Dezembro de 1919 5
O Sr. Presidente: - Não posso fazer essa consulta à Câmara por que na Mesa não consta que a comissão de pescarias esteja constituída.
O Orador: - Julgava que já o estivesse, e é para lamentar que isso ainda se não tivesse dado.
O orador não reviu.
O Sr. Manuel Fragoso: - Sr. Presidente: desejaria que estivesse presente o Sr. Ministro da Guerra ou qualquer outro membro do Govêrno, para ouvir o assunto que vou tratar; mas mesmo na ausência de S. Exas., farei no emtanto as minhas considerações.
O assunto diz respeito aos automóveis do Parque Automóvel Militar, e então eu procurarei liquidá-lo com a mesma rapidez com que os referidos autos costumam despachar para o outro mundo os pacíficos habitantes de Lisboa.
O caso já foi tratado nesta Câmara e no Senado, e eu quero crer que fossem dadas as ordens precisas, mas vê-se, porêm, que elas não foram acatadas nem estão a ser cumpridas!
São perfeitamente criminosas as correrias vertiginosas em que andam os automóveis do Parque Automóvel Militar pelas ruas de Lisboa, pondo em perigo a vida dos habitantes da capital.
Isto não pode continuar! E necessário pôr-se cobro às velocidades dêsses carros!
90 por cento dos desastres causados por automóveis que vêm relatados nos jornais, são originados pelos automóveis do Parque Automóvel Militar.
O Sr. Vasco Vasconcelos: - Já três vezes levantei esta questão e ficou tudo como dantes.
O Orador: - De duas uma: ou nas ruas- de Lisboa só andam automóveis do Parque Automóvel Militar e continua, assim o uso e abuso dêsses carros como lei do Estado, ou os chauffeurs dos automóveis do Parque Automóvel Militar os únicos a quem se permite a liberdade de excederem as velocidades razoáveis e não acatarem nem respeitarem as leis em vigor.
Os Srs. chauffeurs do Estado julgam-se, talvez por isso, senhores das ruas da cidade e de imunidades especiais, desobrigados de respeito pela polícia e pelas leis?! Parece que sim.
Até aqui ainda escapavam à sua fúria destruidora os que iam pelos passeios, quem se fazia transportar nos eléctricos, ou quem viajava em outros automóveis.
Presentemente nem já êstes escapam; porque êles investem uns com os outros, investem com os eléctricos e saltam pelos passeios.
Amanhã nem já me admirarei de ouvir dizer que os carros do Parque Automóvel Militar atropelaram sua Majestade Fidelíssima El-Rei D. José I no alto do seu cavalo de bronze da memória do Terreiro do Paço.
Peço, pois, ao Sr. Presidente que transmita, com interêsse, as minhas considerações ao Sr. Ministro da Guerra, fazendo ver a necessidade de S. Exa. ordenar, para o comando do Parque Automóvel Militar, que se respeitem as leis e os regulamentos em vigor.
Chamo tambêm a atenção do Sr. Presidente do Ministério para que S. Exa. diga à polícia de Lisboa que olhe cuidadosamente, e em especial, para os automóveis do Estado.
Assim teremos conseguido, permita-se-me a expressão, duma cajadada matar dois coelhos: salvar a vida àqueles ditosos habitantes de Lisboa que até hoje tenham escapado, e salvar tambêm os interêsses do Estado constantemente lesados em dezenas de milhares de escudos, que é quanto custam, ao tesouro público, os desastres dos automóveis do Parque Automóvel Militar.
O Sr. Eduardo de Sousa: - E o perigo dos side-cars?
O Orador: - Êsses ainda são piores, porque alêm de tudo mais dão-nos cabo da cabeça. Quanto a mim, Sr. Presidente, quando pego nos jornais e leio as três letras fatídicas P. A. M., já de certa forma as confundo com o R. I. P. que costumam encimar os convites religiosos para os funerais católicos.
O Sr. António José Pereira: - Sr. Presidente: peço a V. Exa. que não veja nas minhas palavras a mais pequena censura, pois tenho por V. Exa. a maior consideração e respeito.
Página 6
6 Diário da Câmara dos Deputados
Devo dizer a V. Exa. que estou perfeitamente sentido. Há três meses seguramente que enviei à Mesa um requerimento pedindo diversos esclarecimentos a propósito da sindicância feita aos empregados do Congresso, e até hoje não me foram remetidos êstes esclarecimentos, o que sinto profundamente.
Em fins de Outubro enviei à Mesa uma nota de interpelação ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros. Segundo ouço dizer e vejo nos j ornais, existe uma crise ministerial, e eu entendo que é preciso que o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros não abandone as cadeiras do poder Bem essa interpolação se realizar.
Chamo a atenção do V. Exa. para o seguinte facto que me parece muito importante. Foi aprovada há pouco no Parlamento a lei que era referente à sindicância aos diversos Ministérios. Não sei a razão por que essa lei não foi ainda publicada no Diário do Govêrno. Consta-me que já esteve na Imprensa Nacional e que foi retirada dali.
Parece-me que essa lei devia ter sido publicaria imediatamente.
O orador não reviu.
O Sr. Mem Verdial: - Comunico que se constituiu a comissão de ensino especial e técnico, que nomeou presidente o Sr. Aboim Inglês, e a mim para secretário.
O Sr. Domingos Cruz: - Peço a V. Exa. que me reserve a palavra para quando esteja presente o Sr. Ministro da Marinha.
O Sr. Hermano de Medeiros: - Como desejo dirigir-me ao Sr. Ministro da Instrução ou ao Sr. Ministro do Comércio e como V. Exa. me concede a palavra, eu vejo-me na necessidade, visto a ausência daqueles Srs. Ministros, de pedir a V. Exa. a fineza de solicitar a presença do S. Exas. nesta Câmara antes da ordem do dia.
Espero que S. Exas. não deixarão de comparecer, visto que as considerações que tenho a fazer são interessantes, e referem-se a assunto que demanda, talvez; uma resolução imediata.
O orador não reviu.
O Sr. Jorge Nunes: - Desisto agora da palavra, visto que desejo a presença de qualquer Sr. Ministro.
O Sr. Viriato da Fonseca: - E a primeira vez que tenho a honra de falar nesta Câmara e assim começo, cumprindo o meu dever, por dirigir a minha respeitosa saudação a V. Exa. à Câmara. Nesta minha saudação envolvo tambêm a colónia que eu aqui represento, e as colónias restantes e todo o povo português representado aqui por V. Exas. todos.
Eu apresento-mo nesta Câmara como Deputado regionalista independente. Não tenho nenhuma facção política.
Pretendo conservar-m tam sómente a dentro do campo que me está naturalmente indicado por aquela minha situação. Pugnarei sempre por tudo que seja para bem da nossa Pátria, afastado das contendas políticas que, sobretudo, nesta hora grave para a nossa Pátria, nunca trazem cousa boa.
Empregarei toda a minha boa vontade, toda a minha energia, no sentido do me manter neste âmbito que julgo ser ornais proveitoso neste momento em que todos nós, que estamos nesta sala, temos uma grande responsabilidade perante o País o perante a história. Todos nós temos o indiclinável dever de levantar bem alta a nossa querida Pátria que está atravessando uma terrível crise económica, financeira e social. Eu quereria que todos os portugueses de mãos dadas, num esfôrço único e solene, dispensassem a sua mais valiosa acção o seu mais profícuo trabalho, para o bem do País. Dar-me-hei por feliz se puder com o meu esfôrço intelectual, com a minha grande vontade de acertar, acompanhar S. Exas. nessa obra alevantadamente moral de que tanto carece o nosso Portugal.
Se assim suceder, sairei daqui contente e irei beijar os meus filhos com aquela alegria que é própria dum homem honrado que cumpre o seu dever.
Na minha qualidade de militar, permita-me V. Exa. que eu satisfaça um desejo que ainda não tive ocasião de realizar em assemblea tam brilhante como esta, qual é o de significar o meu grande respeito e admiração pelos meus valentes camaradas que nos campos da França e em África, se bateram em prol da honra, da
Página 7
Sessão de 10 de Dezembro de 1919 7
verdade e da humanidade. (Apoiados), por todos aqueles que derramando o seu sangue quiseram que Portugal mais uma vez inscrevesse nas páginas da sua épica história, uma linha brilhante de sacrifícios próprios da nossa alma e das nossas conveniências.
Aos meus camaradas um abraço de verdadeiro amigo e verdadeiro português.
Dito isto vou entrar no assunto para que pedi a palavra. Ontem no final da sessão recebi um telegrama da Câmara Municipal do S. Vicente, comerciantes e povo, e hoje já recebi outro da Associação Comercial, que passo a ler.
Eu, logo que êsses bolchevistas a que se referem os telegramas desembarcassem em S. Vicente, vi quanto isso desagradaria a êsse povo; o Sr. Vera Cruz levantou-se no Senado e protestou já contra êsse facto.
Eu sou amigo do Sr. Presidente do Ministério, e fui seu companheiro de estudo e nas lides e trabalhos durante muito tempo nos regimentos, tenho por êle a máxima estima e consideração, pelo que entendi que não devia levantar êste assunto na Câmara sem a prevenir, o foi o que fiz no final da sessão de ontem, mas S. Exa. estava muito cansado e não me pôde dar atenção.
Cabo Verde há mais de 400 anos que sofre e não merece êste castigo. Cabo Verde há muito que tem uma crise permanente.
Cabo Verde não merece êste castigo! Eu não sei o que quere dizer esta idea bolchevista, nem até agora tive tempo de estudar as suas teorias, mas respeito todas as ideas e não quero empanar as ideas bolchevistas, mas o facto é que em toda a parto onde êsses indivíduos têm desenvolvido os seus processos têm empregado sempre a desordem.
Peço a V. Exa., Sr. Presidente, para transmitir ao Sr. Presidente do Ministério o que acabo de dizer, que o povo de Cabo Verde vê com muita mágua o facto dêsses bolchevistas irem para lá onde não há forças, nem presídios; mas estou certo que assim como a lepra em 100 anos não produziu até muitos estragos, pornãoser o seu habitat, tambêm esta lepra não se desenvolverá, pois êsse povo não tem tempo para pensar nessas cousas, está nas suas lides e só pensa no trabalho. Peço a V. Exa. para transmitir as minhas considerações ao Sr. Presidente do Ministério, e se preciso fôr dizer-lhe que êsse povo de mãos postas lhe pede que não mande essa gente para Cabo Verde.
O Sr. Jorge Nunes: - Recebi uma representação da Câmara Municipal do Pôrto, pedindo que V. Exa. empregue os seus melhores esfôrços para conseguir da comissão encarregada do estudar o projecto dos funcionários administrativos dê o seu parecer, a fim de assunto voltar à tela da discussão, para retomar qualquer resolução.
O orador não reviu.
O Sr. Joaquim Brandão: - Mando para a Mesa um projecto de lei do interêsse para a Câmara Municipal de Cezimbra.
Dispenso-me de o justificar porque o relatório que o procede o justifica bem.
Peço urgência para o projecto.
A urgência foi concedida e o projecto de lei vai adiante por extracto.
O Sr. Nóbrega Quintal: - Peco a V. Exa. para me reservar a palavra para quando estiver presente o Sr. Ministro das Colónias, pois tenho um assunto interessante a tratar com S. Exa.
Já disse numa sessão que não sabia se o Sr. Ministro das Colónias existia; não sei se S. Exa. está em Lisboa e se está disposto ou não a vir a esta Câmara.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: - Transmitirei ao Sr. Ministro das Colónias os desejos de V. Exa.
O Sr. Pais Rovisco: - Quando entrei nesta sala ouvi o representante de Cabo Verde falar em bolchevistas que o Govêrno tinha mandado para Cabo Verde.
Eu desejava preguntar ao Sr. Presidente do Ministério se êsses indivíduos foram julgados ou se voltamos à lei de 13 de Fevereiro.
Eu desejava, portanto, que V. Exa. fizesse a. gentileza de transmitir ao Sr. Presidente do Ministério o desejo que temos de que S. Exa. venha aqui, quanto antes, dizer se êsses indivíduos, que sob a acusação de bolchevistas seguiram para
Página 8
8 Diário da Câmara dos Deputados
Cabo Verde, foram condenados, ou não, por algum tribunal.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: - Satisfarei os desejos de S. Exa.
O Sr. João Gonçalves: - Mando para a Mesa um projecto do lei, restabelecendo o funcionamento da Escola Damião de Góis, em Alemquer. Esta escola já existia no tempo da monarquia, mas deixou de funcionar pela razão de que os empregados que nela prestavam os seus serviços foram transferidos para outra escola.
Aproveito a ocasião para dizer que em virtude do que ontem aqui foi dito acêrca do assunto que interessa aos funcionários administrativos, eu não votarei nenhuma proposta de aumento de despesas emquanto não forem atendidas as justas reclamações dos pequenos funcionários.
Não é doutrina aceitável que êste Parlamento tivesse pressa em valorizar os seus trabalhos, aumentando o subsídio aos membros do Congresso, e se esqueça agora das reclamações justas do pequeno funcionalismo.
O orador não reviu.
O Sr. Hermano de Medeiros: - Pedi a palavra, estando presente o Sr. Ministro da Instrução, para dirigir a S. Exa. uma pregunta à qual, de certo, me poderá responder desde já.
Durante o Govêrno da presidência do Sr. Domingos Pereira eu fui nomeado membro da comissão administrativa da Câmara Municipal do Lisboa. Nessa altura foi aberto, pela Câmara Municipal, concurso para provimento duma escola estabelecida por virtude dum legado.
Ora como eu sei que sôbre matéria de instrução só há uma lei, a que foi votada pelo Parlamento, eu quero preguntar ao Sr. Ministro se o provimento dessa escola deveria ser feito segundo as leis gerais da República, ou se, porventura, a Câmara Municipal tem a tal respeito alguma lei especial, segundo a qual deveria agir.
Se assim é, não terei razão para formular as considerações que pretendo fazer. Creio, porêm, que não é assim.
Sr. Presidente: a quando o caso se passou eu sustentei, na minha qualidade de membro da comissão administrativa da câmara municipal, o que me pareceu ser a boa doutrina, e tanto eu tinha razão que, tentando fazê-lo por duas vezes em duas das suas sessões, a comissão administrativa não conseguiu fazer o provimento que pretendia.
Tratava-se de senhoras que concorreram a um lugar de professoras em Lisboa. Uma com vinte valores, uma com dezoito, e duas com dezassete valores cada.
A câmara resolveu admitir a concorrente que tinha vinte valores. Até aqui, parece, tudo estava, bem.
Mas, Sr. Presidente, há a lei chamada dos cônjuges, votada pelo Parlamento da República, e essa lei estabelece, taxativamente, que seja preferido o cônjuge que esteja nas condições de exercer o lugar a prover.
Ora uma das senhoras com a alta classificação de dezassete valores, como esposa de um professor, estava absigo daquela lei.
E por duas vezes se fez a tentativa de trazer à discussão da comissão administrativa, de que tive a honra de fazer parte, a nomeação da senhora que teve 20 valores, o daqui lhe presto a minha homenagem; mas a lei é para se cumprir, e por duas vezes eu da minoria fiz com que se retirasse da tela da discussão o projecto. E eu quero que me digam se não tinha razão o se a câmara municipal não se rege pelas leis do país.
Mas esperaram que eu deixasse ide ter voz lá dentro da câmara municipal para fazerem a nomeação dessa senhora. Eu lavro daqui o meu protesto contra êsse facto, que não sei nem quero classificar, e espero as explicações do Sr. Ministro da Instrução Pública.
Tenho dito.
O Sr. Joaquim de Oliveira (Ministro da Instrução Pública): - Sr. Presidente: ouvi com toda a atenção as considerações apresentadas pelo ilustre Deputado Sr. Hermano de Medeiros, e devo dizer a S. Exa. que desconhecia, por ainda não estar bem inteirado dêle, o assunto que S. Exa. acaba de versar. Mas logo que chegue ao meu Ministério, hoje mesmo ou amanhã, o mais tardar, averiguarei do assunto e tomarei as providências que realmente o caso requere.
Página 9
sessão de 10 de Dezembro de 1919 9
O Sr. Hermano de Medeiros: - V. Exa. dá-me licença?
Eu queria que V. Exa. me dissesse se a câmara municipal se rege pelas leis do país e se a lei dos cônjuges está ainda em vigor.
O Orador: - A resposta que tenho a dar a V. Exa. é afirmativa.
O Sr. Hermano de Medeiros: - Então a câmara municipal anda mal.
O Orador: - Eu não posso informar V. Exa.; como já disse, não conheço bem o assunto.
Sr. Presidente: aproveito estar no uso da palavra para mandar para a Mesa quatro propostas de lei, que são, segundo o meu parecer, de grande utilidade. A primeira tem por fim restituir às câmaras municipais do País a administração do ensino primário geral. A reforma do ensino primário geral determinou que a administração do ensino, mesmo sob o ponto de vista financeiro, ficasse a cargo das juntas escolares; mas acontece que na maioria dos concelhos do país essas juntas não estão organizadas, e naqueles em que o estão têm-se dado abusos a que é necessário por cobro.
De resto, esta proposta de lei tem vindo sendo reclamada não só pelas câmaras municipais de Lisboa e Pôrto, mas tambêm pelas câmaras, do resto do país. Resumidamente, ela tem por fim estabelecer o statu que ante a 5 de. Dezembro de 1917. No emtanto, eu altero essas disposições anteriores a 5 de Dezembro de 1917 em certos pontos.
Desta forma julgo que dou plena satisfação às reclamações do professorado primário e, ao mesmo tempo, às instantes exigência do ensino.
As outras propostas, para as quais peço urgência, são: uma destinada a abrir um crédito extraordinário para pagar aos professores primários, visto que a verba existente de 1:500 contos se encontra completamente esgotada e mo coloca na contingência de Lhos não poder pagar; a outra a pedir tambêm um crédito extraordinário para pagar aos professores das Faculdades de Letras de Lisboa e Pôrto.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Por não ter ouvido bem, eu não sei quais as propostas para que V. Exa. pediu a urgência.
O Sr. Joaquim de Oliveira (Ministro da Instrução): - Pedi apenas a urgência para as duas propostas que têm por fim abrir créditos especiais para pagar aos professores do instrução primaria e das Faculdades de Letras de Lisboa e Pôrto.
O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando devolver, revistas, as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
As propostas de lei vão adiante por extracto.
O Sr. Alberto Vidal: - O ilustre Deputado, o Sr. Hermano de Medeiros, do quem tive a honra do ser companheiro na Câmara Municipal do Lisboa, acaba de fazer uma acusação por êste município ter cometido o hediondo crime do nomear uma candidata para uma escola privativa, que teve vinte valores, isto é mais três que a defendida aqui por S. Exa.
A escola a que ela ainda pertence é privativa da Câmara e foi constituída em virtude dum legado.
No uso pleno dum direito, a câmara entendeu que devia nomear a professora mais habilitada, o que foz, tendo ouvido préviamente o seu advogado síndico, que dou parecer favorável.
O Sr. Hermano de Medeiros: - Eu posso informar V. Exa. de que êsse parecer foi uma verdadeira torpeza.
O Orador: - O caso é, porêm, muito simples. Só a professora se julga preterida apela para os tribunais, que dirão de que lado está a justiça. (Apoiados).
O Sr. Hermano de Medeiros: - Pedi a palavra para rebater as afirmações do Sr. Alberto Vidal.
Eu comecei por dizer ao Sr. Ministro da Instrução que a escola ora da câmara em virtude dum legado, mus uma vez aberto o concurso para o preenchimento dessa escola, não pode ser provida pessoa alguma senão sob a letra expressa da lei.
Por mais que argumente o Sr. Alberto Vidal e o advogado síndico da câmara,
Página 10
10 Diário da Câmara dos Deputados
que lavrou um parecer que lhe foi pedido baseado numa lei já revogada, parecer que não é um documento digno de ser considerado por êsse mesmo motivo, a verdade é que não foi respeitada a lei do País.
Estou certo que o Sr. Ministro da Instrução tratará êste assunto com inteira justiça.
Foi lida na Mesa uma nota de interpelação do Sr. Cunha Leal.
Vai adiante publicada.
ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: - Interrompe a sessão a fim de os Srs. Deputados confeccionarem as suas listas para as eleições constantes da "ordem do dia".
Eram 16 horas e 20 minutos.
O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.
Eram 16 horas e 55 minutos.
O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.
Responderam os Srs.:
Abílio Correia da Silva Marçal.
Adolfo Mário Salgueiro Cunha.
Afonso de Macedo.
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Alberto Ferreira Vidal.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Albino Pinto da Fonseca.
Alexandre Barbedo Pinto de Almeida.
Álvaro Pereira Guedes.
Álvaro Xavier de Castro.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
António Albino de Carvalho Mourão.
António Albino Marques de Azevedo.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Cândido Maria Jordão Paiva Manso.
António da Costa Ferreira.
António da Costa Godinho do Amaral.
António Dias.
António Francisco Pereira.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António Joaquim Granjo.
António José Pereira.
António Lôbo de Aboim Inglês.
António Maria da Silva.
António Marques das Neves Mantas.
António Pais Rovisco.
António de Paiva Gomes.
António Pires de Carvalho.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Augusto Pereira Nobre.
Augusto Pires do Vale.
Augusto Rebêlo Arruda.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Bartolomeu dos Mártires Sousa Severino.
Custódio Martins de Paiva.
Diogo Pacheco de Amorim.
Domingos Cruz.
Domingos Frias de Sampaio e Melo.
Domingos Leite Pereira.
Eduardo Alfredo de Sousa.
Estêvão da Cunha Pimentel.
Evaristo Laís das Neves Ferreira de Carvalho.
Francisco Alberto da Costa Cabral.
Francisco da Cunha Rêgo Chaves.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Francisco José de Meneses Fernandes Costa.
Francisco José Pereira.
Francisco Pinto da Cunha Leal.
Francisco de Sousa Dias.
Henrique Ferreira de Oliveira Brás.
Hermano José de Medeiros.
Jacinto de Freitas.
Jaime da Cunha Coelho.
Jaime Júlio de Sousa.
João Estêvão Aguas.
João Gonçalves.
João José Luís Damas.
João de Ornelas da Silva.
João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.
João Xavier Camarate Campos.
Joaquim Brandão.
Joaquim José de Oliveira.
Jorge de Vasconcelos Nunes.
José Domingos dos Santos.
José Gomes Carvalho de Sousa Varela.
José Gregório de Almeida.
José Maria de Campos Melo.
José Mendes Nunes Loureiro.
José Monteiro.
José Rodrigues Braga.
Júlio Augusto da Cruz.
Júlio do Patrocinio Martins.
Ladislau Estêvão da Silva Batalha.
Liberato Damião Ribeiro Pinto.
Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.
Página 11
Sessão de 10 de Dezembro de 1919 11
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Luís de Ornelas Nóbrega Quintal.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Manuel Ferreira da Costa.
Manuel José Fernandes Costa.
Manuel José da Silva.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
Mariano Martins.
Maximiano Maria de Azevedo Faria.
Mem Tinoco Verdial.
Pedro Góis Pita.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.
Raúl Lelo Portela.
Vasco Borges.
Vasco Guedes de Vasconcelos.
Ventura Malheiro Reimão.
Vergílío da Conceição Costa.
Viriato Gomes da Fonseca.
O Sr. Liberato Pinto: - Comunico a V. Exa. que se constituiu hoje a comissão de instrução secundária, escolhendo para seu presidente o Sr. Baltasar Teixeira e a mim para secretário.
O Sr. Presidente: - Vou continuar a interpelação do Sr. Dr. Brito Camacho ao Sr. Ministro dos Estrangeiros.
O Sr. António Maria da Silva: - Requeiro a generalização do debate.
Foi aprovado.
O Sr. Melo Barreto (Ministro dos Negócios Estrangeiros): - Serei muito breve na minha resposta ao Sr. Dr. Brito Camacho, cujas considerações acompanhei com a atenção e o interêsse que me merece, sempre, a palavra do ilustre parlamentar, quer pelo que ela própria representa, quer pelo valor político, que não pode deixar de lhe ser atribuído, sejam quais forem as circunstâncias em que se faça ouvir. E serei breve, pelas razões que passo a expor.
Em primeiro lugar, porque o assunto versado não é da responsabilidade da minha gerência; em segundo porque nem mesmo e da responsabilidade do meu Ministério, que nele teve, apenas, como em muitos outros, o que pode chamar-se uma simples acção de órgão transmissor.
Trata-se, com efeito, duma transacção celebrada pela antiga comissão de abastecimentos do Ministério do Trabalho, com um súbdito espanhol, que se propôs fazer entrar no país 1.500 toneladas de arroz, a um preço tal que, depois de pagos os direitos, se poderia vender a $26 o máximo. A comissão de abastecimentos deu parte dessa transacção ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, em 22 de Março de 1917, pedindo que o representante de Portugal em Madrid fôsse encarregado de fiscalizar a reíerida compra de arroz e de efectuar o respectivo pagamento, e, no dia 11 de Abril, informou o mesmo Ministério de que fora aberto em Madrid o crédito de 908.045,95 pesetas, correspondentes a 316 contos, ao câmbio do dia, para o pagamento referido. O que se passou depois? Tendo o Sr. Dr. Augusto de Vasconcelos recebido a comunicação da Direcção Geral da Fazenda Pública, para pagar o arroz ao fornecedor, à medida que êle fôsse sendo adquirido, nela se firmou, certamente, para entregar a quantia mencionada a êsse fornecedor, mediante a apresentação da factura comprovativa dessa aquisição, - feita a crédito, - em vez de o fazer mediante a apresentação dos documentos de embarque ou carregamento. Mas a verdade é que o arroz não chegou a vir para Portugal, porque, ao ultimar-se a operação, já o Govêrno Espanhol proibira, de novo, a exportação dêsse género, que estivera autorizada durante quinze dias, pela rial ordem de 12 de Março de 1917. Depois disso fizeram-se várias tentativas para se conseguir a remessa do arroz e obteve-se, por duas1 vezes, a respectiva autorização, mas, da primeira, a licença foi suspensa antes de realizada a operação e, da segunda, foram levantadas dificuldades insuperáveis ao agente que devia efectuá-la. Tal foi a situação em que encontrei ao assumir a gerência da pasta dos Negócios Estrangeiros: o Tesouro Público desapossado da quantia de 316 contos, representativa dum fornecimento de arroz, parte do qual continua em Valência, em vez de todo êle ter dado há muito entrada em Portugal para o consumo público. Logo que tive conhecimento do facto tratei dêsse assunto junto do Govêrno Espanhol, por intermédio da nossa legação em Madrid, para se pôr termo a um estado de cousas que não pode, evidentemente continuar. E para
Página 12
12 Diário da Câmara dos Deputados
que a Câmara avalie o interêsse das minhas diligências, Irio as seguintes palavras duma nota dirigida pelo Sr. Ministro de Portugal em Madrid, ao Sr. marquês de Lema, então Ministro dos Negócios Estrangeiros de Espanha, no dia 18 de Agosto dêste ano, pedindo a renovação da autorização de saída do arroz:
"Em vista da crise de subsistências com que luta o meu país e atendendo ao desembolso feito, há1 mais de dois anos, pelo meu Govêrno, tomo a liberdade de pedir, com a maior instancia a V. Exa., que seja renovada a licença do exportação das referidas toneladas de arroz, parte das quais pertence à colheita de 1916, e que o agente encarregado detratar das operações não seja embaraçado nas suas démarches, por nenhuma estação oficial espanhola. Afirmando a V. Exa. que nenhum pedido desta natureza lhe tenho dirigido com tanto empenho, nem que tam vivamente me tenha recomendado o Govêrno Português... etc."
Antes disso, em 11 do mesmo mus, o Sr. Dr. Couceiro da Costa fizera uma larga exposição dos factos ao Govêrno Espanhol.
No dia 21 de Outubro o Sr. encarregado de negócios em Madrid realizou uma nova diligência junto do Sr. Presidente do Conselho do Ministros de Espanha, apresentando a S. Exa. um memorandum, cuja cópia tenho presente, e referindo que o agente encarregado das operações do arroz em Valência seria o Sr. D. Leopoldo Aguirre Verdaguer, vice-consul do Portugal naquela cidade; e, o simples registo dêste facto responde ao reparo formulado pelo Sr. Dr. Brito Camacho, com respeito a ser, ainda hoje o súbdito espanhol Reis o agente indispensável. No dia 23 do mesmo mês, o Sr. Vasco Quevedo telegrafou dizendo: creio resolvido favoravelmente caso arroz Reis.
Finalmente, o mês passado o mesmo diplomata dirigiu-lhe o seguinte telegrama:
"Ministro Abastecimentos declarou-me, ontem, que concede licença de exportação arroz Reis, assunto que leva a conselho de Ministros. Tendo presidente do conselho de Ministros e Ministro do Estado mostrado melhor interêsse, julgo que caso está decidido definitivamente. Não abandono assunto sem licença estar em meu poder".
De resto, para esta solução - desejada, evidentemente, por quantos zelam os interêsses do País - deve contribuir a situação excelente em que se encontra a Espanha, no tocante à produção do arroz, que excede, em larga escala, a quantidade indispensável ao consumo nacional; isto alêm de haver, ainda um stock importante da colheita do 1918. Com efeito, a colheita de arroz em Espanha pode calcular-se em 242.288 toneladas, representando um aumento de 30.140 toneladas sôbre a colheita anterior. Ora, como o consumo anual não é superior a 180.000 toneladas, há um excesso de 62.000 toneladas, sem falar no que resta da colheita antecedente.
Tais são as únicas démarches da responsabilidade da minha gerência, com que muito me honra, porque elas demonstram a atenção que tenho consagrado ao assunto e o interesso que mo mereço tudo quanto possa representar a sagrada defesa dos dinheiros públicos, que os homens de governo devem zelar, sempre, com inflexível severidade.
Repito: - o Govêrno está empregando os esfôrços mais instantes no sentido de que venha para Portugal o arroz, comprado e pago em 1917. Espero consegui-lo, como acabo de expor; - mas se, por qualquer circunstância, não o obtiver, apesar dêsses esfôrços, efectivados junto do Govêrno Espanhol, creia a Câmara que não hesitarei nos meios a empregar, sejam êles de que natureza forem, para que aos cofres públicos se restitua o dinheiro empregado nessa malfadada operação.
O Sr. Dr. Brito Camacho disse, no comêço do seu discurso, que, em volta dêste caso, se têm levantado suspeições desonrosas,- e, na última sessão, exortou a Câmara, com a autoridade da sua palavra, para que a discussão corresse calma e serena, visto tratar-se da honra dum homem. Por mim, ficaria mal com a minha consciência se não aproveitasse o ensejo que essas duas afirmações me proporcionam para prestar a homenagem do seu respeito à honorabilidade do Sr. Dr. Augusto de Vasconcelos, que, de resto,
Página 13
Sessão de 10 de Dezembro de 1919 13
não considero, nem poderia considerar, em causa, nesta questão.
O Sr. António Maria da Silva - Sr. Presidente, cumprindo o preceito regimental mando para a Mesa a minha moção de ordem que é a seguinte:
A Câmara, reconhecendo a necessidade de se esclarecer, devidamente, o assunto em discussão, continua na ordem do dia.
Sala das Sessões, 10 de Dezembro de 1919. - António Maria da Silva.
Admitida.
Sr. Presidente, tendo eu requerido a generalização do debate, e tendo dirigido um ou outro àparte ao ilustre Deputado interpelante, o Sr. Brito Camacho, natural era que falasse sôbre o assunto. Limitar-me hei a dizer algumas palavras de esclarecimento; porêm, antes disso, convêm notar que conheço o Sr. Dr. Augusto de Vasconcelos há trinta anos, e durante êsse largo período mantive sempre com S. Exa. as melhores relações.
A argumentação do Sr. Brito Camacho pode reduzir-se, apesar de ter falado, no pleno uso dum direito, em duas sessões, pode reduzir-se a estas três questões fundamentais: a sobretaxa não estava incluída no prazo de aquisição do arroz; não se fez um contrato; o crédito não foi aberto a tempo em Madrid.
Creio que foram êstes os três pontos capitais da sua argumentação, aos quais mo vou referir.
Pela dedução do seu discurso, parece-me que são êstes os pontos fundamentais, em torno dos quais girava a discussão; e só não são fundamentais para S. Exa., para mim assim os considero.
Os dois primeiros pontos são os que me devem interessar.
As duas primeiras afirmações do Sr. Brito Camacho são, sem ofensa para S. Exa. absolutamente inexactas, e o terceiro ponto não tem o valor que S. Exa. lho atribuiu.
Entremos propriamente ao assunto.
Em 26 de Março de 1917, sendo eu Ministro do Trabalho, foi submetido a meu despacho um parecer da comissão do abastecimentos sôbre uma proposta de Casimiro Eeys, tendo eu ordenado que se adquirisse o arroz desde que o seu preço compreendendo as despesas, não excedesse $25 ou $26 o quilograma.
No mesmo dia pedi ao Ministério das Finanças a abertura dum crédito à ordem do nosso Ministro.
A 19 a direcção da fazenda pública comunicou que o crédito tinha de ser aberto em Lisboa à ordem do Ministério do Trabalho.
Isto era uma doutrina inaceitável, pois o que se queria era que o dinheiro estivesse à ordem do nosso Ministro em Madrid, o que não se abrisse um crédito como se fazia por exemplo com o trigo.
Era necessário fiscalizar a qualidade do arroz, e para isso o crédito devia ficar à ordem do nosso Ministro em Madrid para elo ir fiscalizando as entregas que fossem sendo feitas, e bemdigo a ordem que dei para que êsse crédito fôsse assim aberto.
De modo que, tendo a Direcção Geral da Fazenda Pública entendido que a ordem devia ser aberta ao Ministério do Trabalho, eu pugnei pelos bons princípios.
Em 22 a comissão de abastecimentos volta a insistir pela abertura do crédito em Madrid, explicando que os fornecimentos do arroz deviam ser pagos à medida que fossem sendo trazidos para Portugal e em presença dos respectivos documentos.
Na mesma data, a comissão oficiava à repartição dos negócios consulares em termos que, pelo que se vê da leitura, que V. Exas. compreendem muito bem que a responsabilidade, se por acaso a houve, da não comunicação dêste ofício ao Sr. Augusto de Vasconcelos, não pode ser atribuída ao Ministério do Trabalho ou àquele organismo encarregado de dar execução às ordens do Ministro, a comissão central de subsistências.
Declarei que a sobretaxa estava incluída; e isso estava bem explícito no meu próprio despacho; mas supondo mesmo que as palavras do despacho atraiçoavam o meu pensamento, nem assim o argumento colhe, porquanto, alêm do que eu disse verbalmente, existe um documento posterior do Sr. Augusto de Vasconcelos, datado de 22 de Junho de 1918, que bem corrobora a forma dos meus intuitos.
Tendo sido feito o meu despacho em conformidade com o parecer da comissão,
Página 14
14 Diário da Câmara dos Deputados
quando eu escrevi a palavra "concordo", subentendia-se que eu transportava para o meu despacho todos as palavras contidas no parecer.
Quando se disse ao espanhol: "adquira-se o arroz nestas condições", pouco importava que êle tivesse pôsto outras, desde que se dissesse que o preço em Lisboa, depois de feitas todas as despesas, era de $26.
Disse o espanhol que não contava com a sobretaxa. Mas o que tem o Ministério dos Estrangeiros com isso?
O Sr. Brito Camacho reputou êste facto como mínimo, eu ainda o reputo como menos do mínimo, e se a êle me refiro foi porque S. Exa. no seu discurso várias vezes versou êste facto. Mas deixemos êste ponto que está esclarecido, e vamos ao resto, e o resto para mim é simplesmente provar à saciedade que se celebrou um contrato.
Sr. Presidente: a propósito dum documento que devo ter aqui, discute-se sôbre se o Sr. Augusto de Vasconcelos teve ou não conhecimento dêle. Assegurou o Sr. Brito Camacho, e não foi contestado, pelo Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, do que não há documento algum que comprovo que S. Exa. recebeu a cópia dêste ofício enviado pela comissão dos abastecimentos.
Mas há um outro, do qual êle não podia alegar desconhecimento, porque está como telegrama que lhe foi enviado pelo Ministro de então.
O Sr. Brito Camacho: - V. Exa. dá-me licença?
Eu disse que a primeira pessoa pela qual o Ministro de então teve conhecimento do negócio, foi o espanhol, e o documento a que S. Exa. se refere confirma esta minha afirmação.
O Orador: - Muito folgo com isso, e se esta questão, estivesse perfeitamente clara e ou não soubesse o que é esta terra, e o que nela se diz dos seus homens públicos, eu não teria pedido a palavra; mas estou disposto a falar tantas vezos quantas forem as necessárias, aqui ou em outro qualquer lugar, para definir bom situações e marcar bem responsabilidades. De resto, eu só tenho o desejo máximo do que desta questão saia bem colocado o Sr. Augusto de Vasconcelos, como espero que saia, porque tenho com S. Exa. relações estreitas de amizade, que vêm de há trinta anos, do nosso tempo de estudantes.
E durante êsses trinta anos, só um facto se me desgostou, sem, contudo, termos alterado as nossas relações, e foi o de êle ter pactuado com a ditadura.
Mas isto não vem agora para o caso.
Já vê, V. Exa., Sr. Presidente, e a Câmara, que não podia nunca albergar-se no meu espírito a idea de ser desagradável para com S. Exa.; mas o que não posso deixar de ter é o direito de crítica, bem como o direito do sacudir do cima de mim, se disso tivesse necessidade, a chuva que, .porventura, me pudesse atingir.
É por isso que eu quero exercer o meu direito de livre crítica sôbre alguns pontos fundamentais do discurso do Sr. Brito Camacho.
Um dêsses pontos fundamentais é, se, real monte ou não, se trata dum contrato, que, como disse, foi a minha única intervenção no assunto, podendo verificar-se que eu empreguei todos os meios necessários, directa ou indirectamente, e sem demora. Vamos, porêm, ao contrato.
Estranhou o Sr. Brito Camacho que neste processo figurasse uma proposta sem testemunhas e sem caução.
Diz S. Exa. que não era uma proposta, por que não tinha testemunhas nem tinha caução.
Há aqui, com perdão de S. Exa., um desconhecimento profundo das leis e praxes comerciais.
A assinatura do espanhol lá está, e com essa assinatura cobre uma proposta de celebração de contrato.
Mas desde que sôbre essa proposta recaiu um despacho ministerial, e que o espanhol aceitou, indo comprar o arroz, e isso está no processo, a tal segunda parte era absolutamente indispensável para transformar a proposta em contrato verídico.
O contrato foi celebrado e está perfeito na linguagem empregada pelos juristas, e, se S. Exa. quisesse, podia certificar-se lendo o artigo 97.° do Código Comercial, porque isto é um contrato mercantil a que se refere êste Código e tambêm o Código Civil, pois se trata do um bem móvel.
Página 15
Sessão de 10 de Dezembro de 1919 15
Mais ainda. Desde que se pudesse provar, e em acto mercantil é admissível qualquer acto de prova - até uma comunicação telefónica, por exemplo, é admissível como prova.
Se S. Exa. não sabe isto, eu digo que se têm dado factos dêstes em todos os Ministérios e dá-se até em casas comerciais.
Basta uma comunicação telefónica para se julgar um contrato feito, e em tempo de guerra, quando se fazia tanta chantage, isso não impedia que assim fôsse, apesar de eu empregar todos os meios para evitar qualquer chantage; e nenhum Ministro, posso dizer, tirou maior proveito das circunstâncias do que eu, apesar de tantas dificuldades.
Eram casos de chantage, porque várias criaturas queriam enrequecer, manchando mesmo a honra do Ministro, oferecendo os géneros por um preço mais barato do que aquele por que o oferecia a Comissão do ravitaillement, quando toda a gente sabia que isso não era possível.
Mas, Sr. Presidente, resumindo, devo dizer que o contrato só poderia ser de compra, quer dizer, escritura ou acto público; e refiro-me a êste ponto, porquê foi um dos casos a que se referiu o Sr. Brito Camacho no seu discurso.
Dá-se porêm êste caso: chega-se a um estabelecimento, e pregunta-se se tem determinado artigo, isto em linguagem mercantil, e, no caso de o não ter, se se poderá adquirir.
Respondem afirmativamente: celebra-se evidentemente um contrato comigo, e embora êle tenha de o adquirir em casa de qualquer outra pessoa, fica por êsse facto invalidado o contrato? Não.
Mas seja como fôr, e mesmo que o Sr. Brito Camacho tenha muita razão, o que não há dúvida nenhuma para quem me está escutando, é que realmente se fez com o espanhol um contrato de compra ou venda, e quando V. Exa. não queira aceitar esta forma de classificação, houve pelo menos um contrato de mandato ou procuradoria, que se dá quando há alguma pessoa que se encarrega de fazer qualquer cousa por mandado de outrem. O mandato pode ser verbal ou escrito.
É certo que o povo das nossas aldeias tem uma concepção simplista do que é um contrato, o reduzem-no a duas formas: contrato de compra e venda ou doação.
Se S. Exa. estivesse fora da capital e quisesse adquirir um chapéu ou um par de botas, e encarregasse alguêm de lhes adquirir o artigo ou qualquer cousa comercial de Lisboa, e se, porventura, depois do objecto estar comprado, êle desaparecesse da posse da pessoa encarregada da aquisição, e ela lhe exigisse o preço do objecto, pregunta-se: S. Exa. tinha obrigação de lho pagar?
Evidentemente, que sim.
E por quê? Por que se estabeleceu uma relação jurídica entre os dois.
E onde está classificada essa relação jurídica no Código Civil?
Na parte que trata das pessoas?
Na parte que traia das cousas? Não.
Na parte que se refere ás relações contratuais.
S. Exa., praticando um acto dessa naturesa, tinha feito um contrato da mesma forma que, se S. Exa. se meter num elétrico, faz um contrato quando dá o dinheiro e o condutor lhe entrega o bilhete, por que faz um contrato de transporte. E a Câmara me dispensará de ser mais prolixo em exemplos.
O Sr. Brito Camacho: - Da mesma forma, quando eu anunciei a minha interpelação ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, fiz um contrato: falar eu primeiro e o Sr. Ministro depois!
Risos.
O Orador: - Aí podia o Sr. Ministro negar-se!
Mas, Sr. Presidente, nunca houve dúvidas nem dentro do Ministério, nem fora dêle, nem mesmo na Legação de Madrid, mas o Sr. Dr. Brito Camacho contestou que se tratasse dum contrato.
O Sr. Dr. Augusto de Vasconcelos sabia, como se vê de um dos seus telegramas, sabia que era um contrato, e ninguêm lhe podia chamar outra cousa.
Diz-se, porem, que não havia testemunhas.
Efectivamente não havia testemunhas, mas havia um documento que tinha fôrça provatória com a assinatura do próprio.
Entre as testemunhas e um documento assinado pelo próprio, o que tem mais fôrça provatória?
Sem dúvida o documento. Que não tinha caução.
Página 16
16 Diário da Câmara dos Deputados
Em contratos desta natureza jamais se pedia caução.
Se qualquer dos ilustres Deputados presentes e principalmente aquele que acaba de me interromper, pensasse um exigir caução, responder-lhe-ia com uma gargalhada.
Uma voz: - Não vejo porque, desde que se tratasse de boa fé.
O Orador: - Isto é fundamental, e por que o é, eu dispenso-me de argumentar com V. Exa. sôbre o assunto.
Hoje compra-se sem se saber o preço, e quem não fizer assim, arrisca-se a ficar sem os géneros.
Se os Govêrnos não procedessem por esta forma e se entregassem a bisantinices, os géneros não mais viriam, e o povo morreria de fome.
V. Exas. sabem que no ano de 1916 nos encontrávamos num dos períodos mais intensos da guerra.
Os torpedeamentos eram constantes, e ninguêm podia contar com a chegada dos géneros encomendados.
Qual era pois a melhor caução?
Era não comprar o arroz som ter a certeza do que êle era de 1.ª qualidade, como o espanhol afirmava, sem que o Ministro nomeasse pessoa de sua confiança para o verificar. (Muitos apoiados).
Era esta ou não a melhor caução? (Apoiados).
Não se fez, porêm, assim, e quais são as culpas do Govêrno Português, pela sua pasta do Trabalho, que devendo pugnar pelos interêsses do Estado, não o fez na parte deliberatória do seu contrato?
Exijam-se as responsabilidade a quem de direito e se faço esta exigência, faço-a sem querer atingir a honorabilidade pessoal de quem quer que seja.
Mas há mais.
Se houve um Ministro a quem enviam um crédito sem as respectivas instruções ministeriais e fica à espera que lhe mandem quaisquer indicações e não pensa na maneira de efectivar o cumprimento da ordem recebida que determinava que o crédito fôsse aberto à sua ordem3, é evidentemente porque havia razões que assim o exigiam.
Para quem tantas preguntas fazia, não é realmente compreensível que êle próprio ou qualquer dos seus subordinados não tivesse preguntado isso ao Ministério dos Negócios Estrangeiros.
O Sr. Brito Camacho (interrompendo): - V. Exa. dá-me licença?
O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros de então, Sr. Augusto Soares, só soube do negócio do arroz pelo Sr. Augusto de Vasconcelos.
Faço esta declaração porque entendo que devo elucidar a Câmara a êste respeito.
O Orador: - Estimo muito que isso assim seja, não só por se tratar de um correligionário meu e meu amigo, mas ainda porque mais uma vez fica demonstrada a chantage que se tem feito, atribuindo todos os males da nossa terra aos democráticos.
Sr. Presidente: é preciso não confundir a celebração do contrato, cuja responsabilidade é minha, com a execução do mesmo contrato.
Isto está bem discriminado não só no Código Civil, mas até no Código Comercial.
Eu reivindico para uma responsabilidade da celebração do contrato e pena tenho que o arroz ainda não viesse.
Espero, contudo, que êle venha.
Exijo-o como representante da Nação.
Estou absolutamente convencido de que o meu ilustre amigo, meu companheiro de escola, o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, Melo Barreto, não quererá que êste contrato se torne numa mistificação.
O arroz há-de vir e pelo preço por que eu o comprei.
De contrário faremos uma obra de mistificação, cometeremos uma obra desonesta e eu hei-de revoltar-me absolutamente se alguêm imaginar que ilude a nossa boa fé.
Se viesse o dinheiro, o espanhol nada perderia, porque os 316 contos renderam-lhe muito mais.
De resto. Sr. Presidente, eu lembro ao Ilustre Deputado interpelante, que entre as funções dos agentes diplomáticos - e isto verifica-se lendo qualquer tratadista de direito internacional, desde os mais velhos, como Martens, ate aos modernos, como o nosso Dr. Vilela - existe a função de informação, e, note V. Exa., esta
Página 17
Sessão de 10 de Dezembro de 1919 17
função é capital no agente diplomático, não precisa de ser provocada para ser exercida.
Por conseqùência, desde que esta função é uma dás que pertencem a qualquer dos nossos Ministros no estrangeiro, o Sr. Dr. Augusto de Vasconcelos tinha a obrigação restrita de prevenir o Govêrno Português de que era perigoso entregar o dinheiro ao espanhol, visto não ter a certeza de poder conseguir o permis da exportação, e emquanto não tivesse defendido os interêsses do Estado, consignando ao próprio Estado, por intermédio de qualquer dos seus órgãos executórios, aquele artigo de primeira necessidade que era o arroz e que era nosso, porque nosso era o dinheiro.
O Sr. Brito Camacho referiu-se a um facto que era do meu inteiro conhecimento e que me deu até bastante desgosto, mas que eu não referiria agora se S. Exa. o não tivesse citado.
Era eu de facto o Ministro do Trabalho quando me foi requisitado um vapor para o espanhol, e é certo, mas de que eu tinha pago o frete. Dentro vinha o trigo a que o Sr. Brito Camacho se referiu, e que serviu para alimentar uma povoação de Espanha, o os Srs. Deputados que sabem as amarguras que então tive para ter a certeza absoluta de que não faltaria o trigo necessário para a alimentação pública. Recordam-se certamente do meu aborrecimento, da minha exaltação até, quando vi que êsse carregamento não vinha para Portugal como devia.
Era Ministro nessa época o Sr. Augusto de Vasconcelos, e não tinha porventura S. Exa. nesse momento a melhor das oportunidades para pedir a compensação que a Espanha nos devia, porque tinha ficado com um género que era nosso? Tinha.
Tenho, Sr. Presidente, o direito de dizer a V. Exa. o trabalho que então tive, as torpes insinuações que me foram, feitas. Atiraram me responsabilidades que eu não tinha, adulteram-se actos meus que só um dia se conhecessem mostrariam bem como eu procedia, atribuiram-se outros predicados até por antagonistas políticos o eu tive a enorme generosidade de me calar sempre.
Foi os se o motivo que me obrigou a entrar na questão; mas já que mo refiro a isso, que foi considerado como fortuito, tenho o direito de revoltar-me contra aqueles que lhe chamam acaso fortuito, e que me dá direito a dizer que muito tarde se pensou em aproveitar essas condições especiais que tinham derivado do facto da apreensão - apreensão que podia fazer-se em condições diferentes daquelas que foram feitas.
O nosso representante em Madrid usou dêsse facto para dizer ao respectivo Ministro espanhol que deixasse sair êsse arroz, que era uma pequena compensação à sobretaxa, estando a fronteira fechada.
Mas S. Exa. foi mais longe, afirmou que o Sr. Augusto de Vasconcelos tinha tido intervenção numa compra, em Espanha, de muares e cavalos para a nossa mobilização.
E realmente eu mesmo necessito de defender-me porque sou causa no processo.
Eu ouvi com mágua que no Parlamento alguêm, com o prestígio do Sr. Brito Camacho, que foi Ministro no Govêrno Provisório, chefe do um partido e a figura mais prestigiosa do Partido Republicano Liberal, fizesse acusações desta ordem, a Ministros, embora do outra política, o até a um querido amigo seu.
Disse S. Exa. que o espanhol podia e devia ser acreditado.
Eu não tive contratos com o espanhol, a não ser através da comissão.
Não encarreguei nenhum Ministro, nem o espanhol, de fazer contrabando. Quando isso se faz guarda-se segredo. Impõem-no deveres, impõe-no uma defesa elementar.
Resumindo: o Ministro do Trabalho em 1917 - que era eu - celebrou um contrato de que me orgulho, e em tais condições de defesa que não foram aceitas.
Todos os funcionários dêle dependentes cumpriram as cláusulas, até chegar a Madrid o crédito que fora aberto pela Direcção Gorai da Fazenda Pública, em qualquer estabelecimento bancário, onde o Govêrno Português tinha realmente as importâncias mais do que necessárias.
Fiquei convencido de que êsse crédito ia para Madrid.
Circunstâncias supervenientes determinaram que não chegasse a mercadoria comprada.
Circunstâncias várias determinaram que ela lá não chegasse, e o Sr. Dr. Brito
Página 18
18 Diário da Câmara dos Deputados
Camacho pensará um pouco sôbre a razão porque ela não chegou a tempo.
Isto é mais uma razão para que houvesse mais cuidado e para que hoje ainda o tenhamos, e não deixar que o espanhol continue as suas falcatruas.
Eu não teria o direito de dizer qualquer coisa se o espanhol não começasse a praticar actos que em minha consciência julgo ilegítimos.
Parte da argumentação feita não tem produzido factos, e eu incluo-me no número daqueles que a fizeram som uma importância primordial, o isso mo leva a dizer que nós estamos neste dilema: ou o arroz, na quantidade o preço por que foi adquirido, ou os 316 contos, que são absolutamente nossos.
Tenho dito.
O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando restituir, revistas, as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
Os àpartes intercalados no discurso não foram revistos pelo orador.
O Sr. Jaime de Sousa (em nome da comissão de pescarias): - Comunico a V. Exa. que a comissão de pescarias se acha constituída, escolhendo para presidente o Sr. Augusto Nobre, e para secretário o Sr. Santos Graça, que está ausente.
O Sr. Júlio Martins: - Em obediência às prescrições regimentais, maneio para a Mesa a seguinte moção de ordem.
Sr. Presidente: iniciou o Sr. Brito Camacho o debate desta questão, e deu-lhe origem uma conferência pública realizada pelo meu camarada e amigo Sr. Afonso de Macedo, conferência a que eu tive a honra de presidir.
Está V. Exa. lembrado de que nesta Câmara houve um largo debate, em que se falou em possíveis crimes e criminosos que existiam no Ministério dos Abastecimentos.
Foi nomeada uma comissão de inquérito às possíveis roubalheiras - êste termo foi então empregado - dêsse Ministério, comissão a que em certo momento faltaram os elementos indispensáveis para bem cumprir a sua missão.
Foi o projecto para o Senado e lá não foi discutido imediatamente.
Entretanto o Grupo Parlamentar Popular realizou uma sério de conferências públicas, tendo o Sr. Afonso de Macedo exposto a indicação do título da sua conferência.
O Sr. Brito Camacho: - V. Exa. disse que tinha havido demora. E preciso que a Câmara saiba como se passaram as cousas. Quando a proposta foi enviada para o Senado o leader da maioria preguntou ao Sr. Augusto de Vasconcelos se podia a proposta seguir com urgência o dispensa do Regimento. O Sr. Augusto de Vasconcelos disse que não podia permitir isso sem que essa proposta fôsse primeiro à comissão, e, se a comissão dos se o seu parecer em vinte e quatro horas, o deixaria discutir, e até lhe dava o voto.
Aqui vê V. Exa. como as cousas se passaram e qual foi o obstrucionismo.
O Orador: - E com todo o prazer que eu permito as interrupções do Sr. Brito Camacho, mas não vejo que S. Exa. neste momento invalidasse as minhas considerações. S. Exa. veio referir-se a uma conversa que tinha havido nu Senado, o com isso não temos nada.
O facto é que a proposta não foi discutida imediatamente.
O Sr. Brito Camacho: - O efeito foi-se.
O Orador: - Eu não estou aqui a tirar efeitos. V. Exa. é que armou em procurador do Senado. Eu não quero tirar efeitos, mas a questão tem eleitos, como V. Exa. sabe. Os meus efeitos são documentados e lógicos.
Quando a proposta veio para esta Câmara o Sr. Brito Camacho mandou para a Mesa uma nota de interpelação ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, dizendo que a questão do arroz tinha sido passada no tempo do dezembrismo, quando essa questão não foi passada nesse tempo, e S. Exa. assim já o reconheceu, por uma referência que no passado Parlamento dezembrista tinha feito o meu prezado amigo e hoje correligionário Sr. Cunha Lial.
Eu então, querendo conhecer detidamente a questão, pedi ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros autorização para ir ao seu Ministério, fazendo idêntico pedido ao Sr. Ministro da Agricultura, e
Página 19
Sessão de 10 de Dezembro de 1919 19
fui-me inteirar do que era a decantada questão do arroz.
Não venho trazer para dentro da discussão conversas particulares; não tenho senão de apreciar a questão à face da documentação que se encontra no Ministério dos Negócios Estrangeiros e no Ministério da Agricultura. Sempre assim, e é à face e em presença dêstes documentos que hei-de tirar as conclusões lógicas, categóricas, absolutas de que a nossa legação do Madrid, dentro dêste processo, foi leviana, incompetente, inconsciente, inocente, e que se porventura hoje o Govêrno Português, como afirma o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, não tem na sua mão os elementos indispensáveis para chamar à responsabilidade do caso o espanhol do arroz, foi porque o Sr. Augusto de Vasconcelos, representante de Portugal na legação de Madrid, já fora dessa legação representando Portugal em Londres, assina ao espanhol um novo contrato.
Vamos então iniciar a questão.
Foi em 1 de Março que o espanhol entregou a sua primitiva proposta à Direcção dos Abastecimentos públicos.
Êle propõe nesse documento interessante trazer a Portugal 1:500 toneladas de arroz de boa qualidade, e que, depois de pagos os direitos, os transportes, seguros de guerra e marítimos, ficasse em Portugal à razão de $25 o quilograma.
A comissão de abastecimentos lê a proposta e dá ao espanhol uma margem de lucros, em lugar de fixar o preço, dizendo-lhe que o arroz devia ficar franco em Lisboa ao preço de $25 ou $26. Realmente o Sr. António Maria da Silva tem razão, porque se se tivesse fixado no negócio o custo das sobretaxas o negócio podia fazer-se? Evidentemente que não, porque as sobretaxas são sempre variáveis, e, como tudo o indica, elas não entraram nos cálculos do espanhol.
O que é certo é que, se se tivesse lançado um despacho da comissão de abastecimentos, que o Ministro depois confirma, para que o arroz fique em Lisboa, franco, ao preço de $25 ou $26, é crível que nesse preço se compreendam as sobretaxas?
Mas a comissão de abastecimentos mandou o seu despacho ao Ministro do Trabalho, que era então o Sr. António Maria da Silva, e S. Exa. lançou-lhe em seguida o despacho de que concordava com as condições propostas, devendo abrir-se um crédito no Ministério das Finanças à ordem do Ministro de Portugal em Espanha. E a questão não fica por aqui ainda: há um pormenor que o Sr. Brito Camacho deixou de salientar, mas que eu, que não estou aqui fazendo - notem V. Exas. - uma oração declamatória sôbre o assunto, mas um dossier sôbre documentos que o processo me fornece, não deixarei de frisar, porque exporei a questão nos seus termos gerais, para que V. Exas. façam dela um claro entendimento. (Apoiados).
O despacho do Sr. António Maria da Silva vai ao Ministro das Finanças, que lhe lança a seguinte nota: "desde que o arroz deve ser pago em Lisboa a $25 ou $26, entende o Ministro das Finanças que o crédito não deve ser aberto em Madrid, mas em Lisboa, e pago apenas quando o arroz esteja entregue nesta cidade". Parece-me realmente, sem ofensa para ninguêm, que, se se tivesse seguido êste processo, talvez que o negócio do arroz não nos tivesse trazido à situação em que nos encontramos, sem 300 e tal contos; sem as pesetas, que, ao câmbio de hoje, devem atingir uma quantia assas importante, sem que um barco de arroz tenha vindo ainda a Portugal, e sem que se saiba se, realmente, as 1:500 toneladas de arroz existem nos entrepostos de Valência, e, se lá existem, à ordem de quem se encontram, porque há quem diga que devem estar à ordem do Govêrno Português, mas o espanhol diz que estão à sua ordem.
O Sr. António Maria da Silva: - V. Exa. dá-me licença? Sabe a razão por que o critério do Ministro das Finanças não era aceite para o caso?
É porque os homens do arroz não o entregavam senão por dinheiro. Estava-se em tempo de guerra, os prazos de pagamento eram com créditos à vista, de maneira que era preciso que tal se fizesse.
O Orador: - Mas, Sr. Presidente, continuemos; o que é certo é que foi aberto à ordem do Ministro de Portugal em Madrid, um crédito de 316 contos, que fo-
Página 20
20 Diário da Câmara dos Deputados
ram transformados em francos e depois em pesetas.
Sr. Presidente: a abertura dêste crédito foi ordenada um 22 da Março de 1917, e nesta data dizia-se que o arroz devia vir consignado ao presidente da comissão das subsistências públicas.
No Ministério dos Negócios Estrangeiros afirma-se que êste documento foi transmitido à nossa legação de Madrid, não se compreendendo, por conseqùência, que ela ignorasse que estava um crédito aberto para compra do arroz, e que êste devia vir consignado ao presidente da comissão das subsistências públicas.
Sr. Presidente: o Sr. Brito Camacho afirmou que o Sr. Augusto de Vasconcelos não foi ouvido sôbre o contrato; efectivamente assim é, porque, pela documentação que existe, verifica-se precisamente isso.
Está, por conseqùência, assim lavrado um despacho ministerial.
Disse o Sr. Brito Camacho que isto não é um contrato; respondeu-lhe, o muito bem, o Sr. António Maria da Silva, que se antecedeu ao que sôbre êsse assunto ia dizer, apesar de não tèi4 trocado com S. Exa. qualquer impressão.
Preguntou igualmente o Sr. Brito Camacho quais eram as garantias e qual a caução.
Oh, Sr. Presidente, qual era a melhor caução - como muito bem disse o Sr. António Maria da Silva - que o Govêrno da República teria para si do que entregar é dinheiro ao espanhol mediante o arroz?
Não havia absolutamente perigo algum porque, apesar do crédito estar aberto, o dinheiro só seria entregue depois do arroz ser transportado para Portugal.
O Sr. Presidente: - V. Exa. deseja concluir as suas considerações, ou quere ficar com a palavra reservada para amanhã?
O Orador: - Fico com a palavra reservada.
O orador não reviu, nem foram revistos, pelos oradores que os fizeram, os "àpartes" intercalados no discurso.
O Sr. Presidente: - O resultado das eleições para vogais da Junta do Crédito Público e da comissão revisora de contas é o seguinte:
[Ver valores da tabela na imagem]
Vogais para a Junta do Crédito Público:
Efectivo. - João José Luís Damas (eleito)
Substitutos:
António Pires de Carvalho
Sampaio Maia
Júlio Cruz
Listas entradas
Listas brancas
Comissão revisora de contas:
João Teixeira Queiroz Vaz Guedes (eleito)
José Mendes Nunes Loureiro (eleito)
Joaquim Brandão (eleito)
Listas entradas
Listas brancas
O Sr. Manuel José da Silva (Oliveira de Azeméis): - Desejava pedir a V. Exa., Sr. Presidente, a fineza do comunicar aos Srs. Presidente do Ministério o Ministro da Agricultura que eu desejaria a presença de S. Exas. na sessão de amanhã, para os interrogar.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: - O Sr. Presidente do Ministério comunicou-me há pouco que não podia comparecer à sessão de amanhã em virtude de estar incomodado de saúde; no emtanto comunicarei ao Sr. Ministro da Agricultura os desejos de V. Exa.
S. Exa. não reviu.
O Sr. Presidente: - A próxima sessão é amanhã à hora regimental com a seguinte ordem do dia:
Interpelação ao Sr. Ministro dos Estrangeiros pelo Sr. Camacho.
Proposta autorizando, o pagamento de 5:400 contos à Câmara Municipal de Lisboa.
Parecer n.° 212 - Remodelação da Casa da Moeda.
Está encerrada a sessão.
Eram 19 horas.
Página 21
Sessão de 10 de Dezembro de 1919 21
Documentos mandados para a Mesa durante a sessão
Nota de interpelação
Desejo interpelar o Sr. Ministro das Finanças sôbre a acção do Govêrno no sentido do provocar uma melhoria na situação cambial.
Sala das Sessões, 10 de Dezembro de 1919. - Francisco Pinto da Cunha Lial.
Para a Secretaria.
Expeça-se.
Comunicação
Exmo. Sr. Presidente. - Tenho a honra de comunicar a V. Exa. que ficou instalada hoje a comissão de instrução secundária, tendo sido escolhido para presidente o Sr. Baltasar Teixeira e para secretário o Sr. Lúcio dos Santos.
Sala das Sessões, 10 de Dezembro de 1919. - Lúcio dos Santos.
Para a Secretaria.
Projectos de lei
Dos Srs. João Gonçalves, Sá Pereira, Marcos Leitão, João José Luís Damas e João de Ornelas da Silva, restabelecendo em Alenquer a Escola de Damião de Góis.
Para a Secretaria.
Para o "Diário do Govêrno".
Do Sr. Augusto Nobre, autorizando o Govêrno a contrair um empréstimo até 300.000$ para um edifício, mobiliário e material ao ensino, para a Faculdade Técnica do Pôrto.
Para a Secretaria.
Para o "Diário do Govêrno".
Dos Srs. Joaquim Brandão, Jorge Nunes e Tavares de Carvalho, elevando a 120.000$ a autorização concedida à Câmara Municipal de Cezimbra para contrair um empréstimo para determinadas obras.
Para a Secretaria.
Aprovada a urgência.
Para a comissão de administração pública.
Para o " Diário do Govêrno".
Propostas de lei
Do Sr. Ministro da Instrução autorizando o Govêrno a permitir o funcionamento de escolas do sexo masculino e do feminino, segundo o regime em vigor à data da publicação do decreto n.° 5:787-A de 10 de Maio de 1919.
Para a Secretaria.
Aprovada a urgência.
Porá a comissão de instrução primária.
Para o "Diário do Govêrno".
Do mesmo Sr. Ministro, passando para as Câmaras Municipais a administração das escolas, que competia às juntas escolares.
Para a Secretaria.
Aprovada a urgência.
Para a comissão de instrução primária.
Para o "Diário do Govêrno".
Dos Srs. Ministros da Instrução e das Finanças, autorizando o Govêrno a abrir créditos especiais necessários para ocorrer a indicados pagamentos de despesas do Ministério da Instrução Pública.
Para a Secretaria.
Aprovada a urgência.
Para a comissão de finanças e Orçamento conjuntamente.
Para o "Diário do Govêrno".
Dos mesmos Srs. Ministros, autorizando o Govêrno a abrir os créditos especiais necessários para reforçar a verba inscrita no capítulo 3.° do artigo 22.° do Orçamento do Ministério da Instrução Pública para pagamento do pessoal e outros dos serviços da instrução primária.
Para a Secretaria.
Aprovada a urgência.
Para a comissão de finanças e Orçamento, conjuntamente.
Para o "Diário do Govêrno".
Parecer
Da comissão de finanças sôbre a proposta de lei n.° 244-I, do Sr. Ministro da Justiça, restaurando a comarca de Ourique.
Para a Secretaria.
Imprima-se.
Requerimentos
Requeremos que, pelo Ministério do Comércio e Comunicações, nos sejam prestados os seguintes esclarecimentos:
1.° Se no ano civil de 1918 o Estado
Página 22
22 Diário da Câmara dos Deputados
recebeu da Companhia dos Caminhos de Ferro Portugueses as quantias que nas linhas, que têm garantia de juro, e em que o rendimento excedeu as verbas garantidas, a percentagem de rendimentos que lhe era devida;
2.° Quanto deixou de receber em caso negativo;
3.° Com que fundamento, em caso ainda negativo, essas verbas deixaram de ser recebidas.
Sala das Sessões, 10 de Dezembro de 1919. - Francisco Pinto da Cunha Lial e António Pais Rovisco.
Expeça-se.
Requeiro que, pelo Ministério das Finanças, me seja enviada, com a maior brevidade, nota de todos os créditos abertos nesse Ministério a seu favor ou a favor de qualquer outro desde 1 de Julho até o presente, indicando a sua consignação.
9 do Dezembro de 1919. Manuel José da Silva (Oliveira de Azeméis).
Espeça-se.
Requeiro que, pelos diferentes Ministérios, me seja fornecida nota dos indivíduos encarregados de proceder a quaisquer sindicâncias e que, por êsse facto, recebam quaisquer proventos e qual a importância que cada um recebe. Bem entendido que me refiro às sindicâncias pendentes à data do presente requerimento.
Sala das Sessões, 10 de Dezembro de 1919. - Jorge Nunes.
Para a Secretaria.
Expeça-se.
Requeiro que me seja fornecida, com a maior urgência pelas repartições competentes dos Ministérios da Agricultura, Comércio e Finanças, nota:
1.° Número e nomes de todos os funcionários do extinto Ministério dos abastecimentos;
2.° Sua categoria;
3.° Funções que desempenhavam;
4.° Situação de cada funcionário a dentro dêsse Ministério, adido, do quadro ou em comissão;
5.° Sendo funcionário em comissão, qual o lugar de que era proprietário;
6.º Ordenado de cada funcionário;
7.º Função que desempenha actualmente;
8.° Data da nomeação de cada funcionário.
9 de Dezembro do 1920. - Manuel José da Silva (Oliveira de Azeméis).
Expeça-se.
O REDACTOR - Sérgio de Castro.