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REPÚBLICA PORTUGUESA
DIÁRIO DA CAMARA DOS DEPUTADOS
SESSÃO N.º 14
(NOCTURNA)
EM 18 DE DEZEMBRO DE 1919
Presidência do Exmo. Sr. Domingos Leite Pereira
Secretários os Exmos. Srs.
Baltasar de Almeida Teixeira
António Marques das Neves Mantas
Sumário. - Respondem a chamada 60 Srs. Deputados. Lida a acta é aprovada, sem discussão. Dá-se conta do expediente. É aberta a sessão.
Antes da ordem da noite. - O Sr. Francisco Cruz pregunta se a sessão tem uma ou duas partes. O Sr. Presidente presta explicações.
O Sr. Presidente comunica à Câmara o falecimento do contra almirante Sr. Borja de Araújo, propondo um voto de sentimento, a que se associam, em nome do Govêrno e de todos os lados da Câmara, os Srs. Ministros dos Negócios Estrangeiros (Melo Barreto), Júlio Martins, António Granjo, António Maria da Silva, Jaime de Souza, Pacheco de Amorim, Viriato da Fonseca.
Primeira parte da ordem da noite. - Entra em discussão o parecer n.° 255, usando da palavra os Srs. Raúl Portela, António Granjo e António Maria da Silva.
Entra-se na
Segunda parte da ordem da noite. - Continuação da interpelação do Sr. Brito Camacho, sôbre o caso do arroz. Trocam-se explicações entre o Sr. Costa Júnior, e o Sr. Presidente. Usam da palavra o Sr. Júlio Martins, que manda lima moção para a Mexa e o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros. O Sr. Nóbrega Quintal requere a prioridade para a moção do Sr. Júlio Martins, trocando-se explicações entre o Sr. Presidente e os Srs. Nóbrega Quintal e Brito Camacho. O Sr. António Maria da Silva pede a leitura de todas as moções. Entrando em discussão o parecer 292, o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros comunica que o Sr. Ministro da, Instrução (Joaquim de Oliveira) não pode comparecer por motivo de serviço público, sendo o Sr. Costa Júnior de opinião que não deve discutir-se sem a presença do Sr. Ministro da Instrução. O Sr. Pedro Pita pede que a Câmara seja consultada sôbre se concorda com a prorrogação da sessão até a votação da proposta.
É aprovado. Lido o artigo 1.° e tendo usado da palavra, sôbre êle, o Sr. Costa Júnior, é aprovado.
Abertura da sessão às 21 horas e 45 minutos.
Presentes à chamada 65 Srs. Deputados.
São os seguintes:
Abílio Correia da Silva Marçal.
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Alberto Álvaro Dias Pereira.
Alberto Carneiro Alves da Cruz.
Álvaro Pereira Guedes.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
António Albino Marques de Azevedo.
António Augusto Tavares Ferreira.
António da Costa Ferreira.
António da Costa Godinho do Amaral.
António Dias.
António Francisco Pereira.
António Joaquim Granjo.
António José Pereira.
António Lôbo de Aboim Inglês.
António Maria da Silva.
António Marques das Neves Mantas.
António Pais Rovisco.
António Pires de Carvalho.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Bartolomeu dos Mártires Sousa Severino.
Diogo Pacheco de Amorim.
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Domingos Cruz.
Domingos Frias de Sampaio e Melo.
Domingos Leite Pereira.
Eduardo Alfredo de Sousa.
Evaristo Luís das Neves Ferreira de Carvalho.
Francisco da Cruz.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Francisco José de Meneses Fernandes Costa.
Francisco José Pereira.
Francisco Pinto da Cunha Lial.
Henrique Ferreira de Oliveira Brás.
Jaime do Andrade Vilares.
Jaime da Cunha Coelho.
Jaime Júlio de Sousa.
João Estêvão Águas.
João de Ornelas da Silva.
Joaquim Brandão.
Jorge de Vasconcelos Nunes.
José António da Costa Júnior.
José Gomes Carvalho de Sousa Varela.
José Maria de Campos Melo.
José Mendes Nunes Loureiro.
José Monteiro.
José Rodrigues Braga.
Júlio do Patrocínio Martins.
Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.
Luís António da Silva Tavares do Carvalho.
Luís Augusto Pinto de Mesquita Carvalho.
Luís do Ornelas Nóbrega Quintal.
Manuel Ferreira da Rocha.
Manuel José da Silva.
Manuel José da Silva.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
Mariano Martins.
Maximiano Maria de Azevedo Faria.
Mem Tinoco Verdial.
Orlando Alberto Marçal.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.
Vasco Guedes de Vasconcelos.
Ventura Malheiro Reimão.
Vergílio da Conceição Costa.
Viriato Gomes da Fonseca.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Acácio António Camacho Lopes Cardoso.
Afonso de Macedo.
Alexandre Barbedo Pinto de Almeida.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
Amílcar da Silva Ramada Curto.
António Cândido Maria Jordão Paiva Manso.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Augusto Joaquim Alves dos Santos.
Augusto Rebêlo Arruda.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Custódio Martins de Paiva.
Francisco da Cunha Rêgo Chaves.
João Cardoso Moniz Bacelar.
João Gonçalves.
João Xavier Camarate Campos.
Joaquim José de Oliveira.
José Domingos dos Santos.
José Gregório de Almeida.
Júlio Augusto da Cruz.
Ladislau Estêvão da Silva Batalha.
Lino Pinto Gonçalves Marinha.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Pedro Góis Pita.
Raúl Lelo Portela.
Rodrigo Pimenta Massapinha.
Vasco Borges.
Xavier da Silva.
Srs. Deputados que não compareceram à sessão:
Adolfo Mário Salgueiro Cunha.
Afonso Augusto da Costa.
Alberto Ferreira Vidal.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Albino Vieira da Rocha.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.
Álvaro Xavier de Castro.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
Antão Fernandes de Carvalho.
António Albino de Carvalho Mourão.
António Aresta Branco.
António Bastos Pereira.
António Carlos Ribeiro da Silva.
António Germano Guedes Ribeiro de Carvalho.
ntónio Joaquim Ferreira da Fonseca.
António Joaquim Machado do Lago Cerqueira.
António Maria Pereira Júnior.
António de Paiva Gomes.
António dos Santos Graça.
Augusto Dias da Silva.
Augusto Pereira Nobre.
Augusto Pires do Vale.
Custódio Maldonado de Freitas.
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Domingos Vítor Cordeiro Rosado.
Estêvão da Cunha Pimentel.
Francisco Alberto da Costa Cabral.
Francisco Coelho do Amaral Reis.
Francisco Cotrim da Silva Garcês.
Francisco José Martins Morgado.
Francisco Luís Tavares.
Francisco Manuel Couceiro da Costa.
Francisco de Pina Esteves Lopes.
Francisco de Sousa Dias.
Helder Armando dos Santos Ribeiro.
Henrique de Vieira do Vasconcelos.
Hermano José de Medeiros.
Jacinto de Freitas.
Jaime Daniel Leote do Rêgo.
João Henriques Pinheiro.
João José da Conceição Camoesas.
João José Luís Damas.
João Lopes Soares.
João Luís Ricardo.
João Pereira Bastos.
João Ribeiro Gomes.
João Salema.
João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.
Joaquim Aires Lopes de Carvalho.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
José Garcia da Costa.
José Maria de Vilhena Barbosa de Magalhães.
José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
Júlio César de Andrade Freire.
Leonardo José Coimbra.
Liberato Damião Ribeiro Pinto.
Manuel Alegre.
Manuel José Fernandes Costa.
Miguel Augusto Alves Ferreira.
Nuno Simões.
Raúl António Tamagnini de Miranda Barbosa.
Tomás de Sousa Rosa.
Vítor José de Deus de Macedo Pinto.
Vitorino Henriques Godinho.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Abertura da sessão às 21 horas e 45 minutos.
O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.
Ás 21 horas e 30 minutos procedeu-se à chamada.
O Sr. Presidente: - Estão presentes 65 Srs. Deputados. Está aberta a sessão.
Vai ler se a acta.
Às 21 horas e 45 minutos foi aberta a sessão e leu-se a acta, que foi aprovada sem discussão.
O Sr. Presidente: - Vai ler-se o expediente.
Leu-se o seguinte
Expediente
Pedido de licença
Do Sr. Alexandre Barbedo Pinto de Almeida, a começar no dia 20 do corrente.
Para a Secretaria.
Concedido.
Comunique-se.
Para a comissão de infracções e faltas.
Requerimento
De Rodolfo dos Santos, tenente supranumerário de infantaria, pedindo que lhe seja pontada a antiguidade, como alferes, desde 5 de Outubro de 1910.
Para a Secretaria.
Para a comissão de guerra.
Antes da ordem da noite
O Sr. Presidente: - Está aberta a inscrição para antes da ordem da noite.
Pediram a palavra vários Srs. Deputados.
O Sr. Francisco Cruz (para interrogar a Mesa): - Sr. Presidente: peço a V. Exa. me diga se a sessão desta noite tem só uma parte ou duas.
O Sr. Presidente: - A primeira parte da ordem da noite é o parecer n.° 255, e a segunda é constituída pela interpelação do Sr. Brito Camacho e pelo parecer n.° 292,
Lamento ter de comunicar à Câmara o falecimento do Sr. contra-almirante Custódio Borja de Araújo, que era um distinto oficial da nossa armada, e que, por ocasião da revolta monárquica de Janeiro, comandou as fôrças navais que no norte actuaram contra os insurrectos. Proponho, pois, um voto de sentimento pela sua morte, e que êle seja consignado na acta.
O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Melo Barreto): - Sr. Presidente:
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pedi a palavra para, em nome do Govêrno, me associar ao voto de sentimento proposto por V. Exa. pela morte do contra-almirante Custódio Borja de Araújo. S. Exa. foi um dos oficiais mais distintos da nossa marinha de guerra, tendo prestado relevantes serviços ao país e à República por ocasião do movimento revolucionário de Janeiro. O Govêrno inclina-se respeitoso perante a memória do ilustre oficial.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Júlio Martins: - Pedi a palavra, Sr. Presidente, para me associar, em nome do Grupo Parlamentar Popular, ás palavras proferidas por V. Exa. acêrca do falecimento do Sr. contra-almirante Custódio Borja de Araújo, que comandou as tropas republicanas de marinha a quando da traulitânia do Pôrto. S. Exa. prestou assim à Pátria o à República um altíssimo serviço que jamais poderemos esquecer.
O orador não reviu.
O Sr. António Granjo: - Sr. Presidente: a minoria liberal igualmente se associa ao voto de sentimento proposto por V. Exa. por motivo do falecimento do Sr. contra-almirante Custódio Borja de Araújo.
O extinto comandou as fôrças navais republicanas que estiveram no norte por ocasião da revolta monárquica, e êsse alto serviço prestado à República não pode ser esquecido por esta casa do Parlamento.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. António Maria da Silva: - Sr. Presidente: a maioria desta Câmara associa-se tambêm às palavras de V. Exa. em louvor do falecido contra-almirante, Sr. Borja de Araújo, que comandou a divisão naval por ocasião da revolução monárquica do Pôrto.
O orador não reviu.
O Sr. Jaime de Sousa: - Sr. Presidente: é com profunda mágua que me associo ao voto de sentimento proposto por V. Exa.
Tendo conhecido de perto o contra-almirante Custódio Borja de Araújo, posso dizer à Câmara que o extinto, tendo comandado as fôrças navais que foram ao norte colaborar no restabelecimento da República, era não só um republicano da têmpera necessária para praticar o acto que praticou e que a República regista na sua história, mas tambêm um dos mais brilhantes oficiais da nossa armada, espírito largamente liberal, muito estudioso e muito aplicado.
Tive a honra de servir com Borja de Araújo e ao saber da sua morte senti profunda emoção que ainda agora me acompanha ao associar-me ao voto proposto por V. Exa.
O Sr. Pacheco de Amorim: - Pedi a palavra para me associar ao voto de sentimento proposto por V. Exa.
O orador não reviu.
O Sr. Viriato da Fonseca: - Sr. Presidente: é com profundo pezar que me associo a esta manifestação pela morte do grande português que se chamou Borja Araújo; conheci-o limito novo, foi sempre um carácter honesto e digno de todo o respeito. Conheci-o como oficial da armada e como amigo íntimo; conheci-o na intimidade familiar e conheci-o na intimidade social sempre como homem de timbre e carácter, e por isso não podia deixar de me associar com calor, com nervosismo a êsse acontecimento que veio enlutar a pátria caboverdeana, pois que o contra-almirante Borja de Araújo era filho de Cabo Verde, enlutando tambêm a pátria portuguesa.
Fiquei satisfeito por ver que de todos os lados da Câmara se prestou homenagem sincera a êsse grande homem, a êsse filho de Cabo Verde, já pelo seu carácter honesto e sério, já pelos seus serviços à pátria prestados.
ORDEM DA NOITE
Primeira parte
Entra em discussão o parecer n.° 255.
O Sr. Raúl Portela: - Quando discuti êste projecto na generalidade, produzi a afirmação de que quando se discutisse na especialidade eu mandaria para a Mesa propostas de emendas.
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Cumpro o que então disse e vou mandar as propostas e respectivos aditamentos.
Tenho uma proposta que altera o corpo do artigo 1.° na sua disposição fundamental. É para o empréstimo de 8:000 contos ser pago em séries de 2:000 contos e assim já o Estado não fica com o encargo de pagar juros.
Em conformidade com o que disse quando discuti êste projecto na generalidade, vou mandar as propostas para a Mesa e espero que a Câmara as tomará em consideração na certeza de que são ditadas pela maior sinceridade.
Leram-se e foram admitidas.
Proposta de aditamento
Proponho que ao artigo 1.° seja aditado o seguinte parágrafo:
§ 3.° As séries de 2:000.000$ serão emitidas e somente aplicadas às obras a realizar ou às propostas de material a adquirir depois de devidamente aprovadas pela respectiva repartição técnica. - Raúl Lelo Portela.
Para a Secretaria.
Prejudicada.
Proposta de emenda
Proponho que o artigo 1.° fique assim redigido:
É autorizado o Govêrno a contrair um empréstimo de 8:000.000$ em séries de 2:000.000$... O resto como está no artigo. - Raúl Lelo Portela.
Para a Secretaria.
Rejeitado.
O orador não reviu.
O Sr. António Granjo: - Sr. Presidente: as emendas apresentadas pelo ilustre Deputado liberal Sr. Raúl Portela foram já suficientemente fundamentadas por S. Exa., mas não me dispensam, em todo o caso, de fazer algumas considerações sôbre elas, porque bem o merecem.
A forma que S. Exa. deu às suas emendas parece-me que é incomparavelmente mais conveniente do que a forma dada no artigo 1.° do projecto.
No seu discurso, o Sr. António Maria da Silva, por palavras embora que não merecessem a devida atenção da Câmara, em todo o caso produziu a defesa do serviço dos correios, telégrafos e telefones, dizendo que ninguêm mais do que o estado maior do exército devia conhecer os circuitos a estabelecer, as linhas arruinadas, emfim, toda a rêde.
Sr. Presidente: embora no relatório que precede êste projecto se diga por uma forma muito genérica o que é essa rede, em todo o caso como se trata de defesa nacional não era necessário trazer à Câmara cousa alguma a êste respeito.
O Sr. Ernesto Navarro (Ministro do Comércio): - V. Exa. na sessão diurna exigiram mais a propósito da Covilhã. Agora acham demais.
O Orador: - Nós não fazemos nunca política em projectos desta natureza.
A expressão V. Exas. não corresponde bem ao nosso propósito.
Quem quer que falou sôbre êsse ponto fê-lo apenas em nome próprio, não falando em nome dêste lado da Câmara, nem tam pouco eu falo agora em nome dêste lado. visto que, em relação a um problema desta ordem, não é de admirar que haja opiniões divergentes.
O que é preciso saber é se as minhas considerações serão ou não de atender.
No relatório que precede o projecto há uma abundância de pormenores sôbre a rede telegráfica e telefónica que ninguêm exigiu, que era absolutamente escusada. Certamente que os propósitos do Sr. Ministro do Comércio e da comissão, foram apenas elucidar a Câmara, mas eu devo notar que essa elucidação era nada adiantava, por que tratando-se de pormenores com carácter rigorosamente técnico, êles passaram despercebidos à boa inteligência e compreensão do assunto, pois, em regra, por parte dos Deputados não há a cultura técnica suficiente e necessária para averiguar se o plano ou traçado corresponde efectivamente às necessidades e corresponde tambêm às vantagens de carácter técnico.
Preferiria, Sr. Presidente, que o Govêrno em vez de nos trazer êste relatório com abundância de pormenores técnicos, se limitasse a trazer-nos a sua proposta de lei, que implica uma despesa avultada, abonada com qualquer disposição conducente a equilibrar, por meio duma receita criada, a despesa que se vai fazer.
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Todos nós compreenderíamos que, por parte do Govêrno e da comissão se impunha uma discreção absoluta a êste respeito, e não seríamos nós que exigiríamos qualquer esclarecimento. O que temos é obrigação de exigir do estado financeiro em que nos encontramos a receita suficiente para compensar a despesa.
Já aqui se afirmou que os serviços telógrafo-postais e telefónicos em Portugal, eram não apenas deficientes, mas que a sua organização padecia de tais defeitos que só não correspondiam a uma absoluta carência dêsses serviços, em todo o caso o público não recebo dêles o benefício que devia receber.
O Sr. António Maria da Silva (interrompendo): - E o serviço deve estar em relação com o que é despendido pelo público. Sucede até que se vai depositar a respectiva importância para um determinado serviço que por fim não é prestado. É um... há em português uma palavra que define o caso.
O Orador: - E até, Sr. Presidente, só diz, e S. Exa. o ilustre Deputado Sr. António Maria da Silva, que tem autoridade muito especial neste assunto, o acaba de declarar, que tal como está organizado o serviço em Portugal, o público é vítima, a todas as horas, de verdadeiras fraudes, por que paga para que um determinado serviço lhe seja prestado, e, finalmente, não o obtêm. Não o obtêm e fica sem o dinheiro.
Não sou, Sr. Presidente, um técnico. Sei em todo o caso que por várias vezes, mormente em ocasiões de temporais, se dá o isolamento de diversos pontos do país.
Ainda ultimamente, por ocasião da insurreição monárquica, sucedeu que as fôrças republicanas que estavam ao sul da coluna de operações ficaram isoladas e viram-se não apenas embaraçadas, mas prejudicadas na sua acção, por falta das ligações necessárias, entre as diversas linhas telegráficas. Assim, Sr. Presidente, sou o primeiro a reconhecer que essas ligações são absolutamente indispensáveis, sobretudo com as terras fronteiriças, porque é nessas terras que, no momento actual, a acção insurreccional dos emigrados só faz sentir um pouco mais pesadamente, e ainda, Sr. Presidente, porque não podemos descurar o problema da defesa nacional.
O Sr. António Maria da Silva: - Sem entrar em detalhes, o que seria inconveniente, lembrarei que em algumas cias há até soluções de continuidade.
O Orador: - Bem sei. Por isso saber é que ainda mais reconheço a necessidade de efectuar as devidas reparações e até algumas novas ligações. Neste ponto estou do acôrdo com. S. Exa. o Sr. António Maria da Silva.
Eu ia a dizer, Sr. Presidente, que não há português fronteiriço que se não entristeça ante o espectáculo dos castelos arruinados, que se sucedem por toda a linha da nossa fronteira, denunciando o cuidado que os antigos portugueses tinham em defender o último palmo de terra portuguesa.
Ora, Sr. Presidente, nós hoje não temos, efectivamente, de defender as nossas fronteiras com os nossos castelos; temos, porêm, de defendê-las com linhas telefónicas, com linhas telegráficas, com estradas e caminhos de ferro estratégicos.
Não cometo nenhuma inconfidência, declarando que, erradamente, o nosso antigo plano do estado maior não visava apenas à defesa de Lisboa e das suas linhas.
Assim ordenará devidamente a retirada das linhas, abandonando à sua sorte aquelas divisões, cujas linhas do retirada não estejam suficientemente asseguradas, para estar a coberto das linhas de comunicação.
Não cometo nenhuma inconfidência por que isto vem em todos os livros publicados ultimamente sôbre organização militar. Lê-se nos livros do Sr. Sebastião Teles e do Sr. general Morais Sarmento, constituindo, o que se poderá chamar, a nossa política militar. Por essa razão primária concordo que seja indispensável a existência dessas praças e, portanto, são precisas as linhas telegráficas e telefónicas, e indispensáveis tambêm as necessárias linhas de ligação porque, no caso duma invasão, teríamos, pelo menos, a certeza de que as instruções dimanadas, do nosso estado maior chegariam aos últimos limites do território.
Exactamente por isso, a emenda apresentada pelo ilustre Deputado Sr. Por-
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tela tem, não só uma razão, a qual poderemos chamar casuística, mas tambêm uma razão de oportunidade.
De mais a mais estou convencido de que da parte de quem elaborou e apresentou o projecto de lei, de forma alguma podia existir o propósito de que êsses 8:000 contos fossem gastos por uma vez. Hão-de ser gastos conforme as necessidades ocorrentes o exigirem. Contrai-se o empréstimo o realizam-se os melhoramentos, conforme as necessidades mais instantes.
Assim, entendo que o empréstimo se devia fazer por séries, aplicando-se as primeiras séries aos trabalhos urgentes de reparação e construção, do que poderemos chamar as linhas telefónicas e telegráficas estratégicas no país. E, depois de realizadas essas obras, seria permitido tambêm, por sucessivas étapes, realizar os melhoramentos indispensáveis para melhorar e renovar os postos telegráficos.
No que vou dizer não há, e S. Exa. o Sr. António Maria da Silva sabe-o bem, o propósito de menoscabar a sua acção como director, dos Correios e Telégrafos, nem tam pouco a mais leve insinuação sôbre a forma como tem dirigido êsses serviços.
S. Exa. reconhecerá que, apesar da sua boa vontade, que apesar dos seus conhecimentos técnicos e ainda do conhecimento perfeito dêsses serviços, visto que os está dirigindo já há muito tempo, S. Exa. reconhecerá, repito, que êsses serviços não correm por forma que tenham conseguido a confiança do país.
Eu sei que os serviços postais não estão em causa, não tratamos, efectivamente, agora dos serviços postais, mas ninguêm ignora que a direcção é a mesma, e que dos maios de que enferma um serviço enfermam tambêm outros, e não me pareça que possamos dar ao país a impressão de que êste empréstimo será bem aplicado se nos não resolvermos primeiro a melhorar a organização actual dos serviços postais e telegráficos por forma que, dentro das possibilidades actuais, nós recebamos a correspondência na hora, própria.
Estas considerações ainda, não tinham sido feitas e era indispensável que se fizessem, porque, o país tem o direito de exigir que se arranque dos serviços actuais o máximo do rendimento, o máximo da utilidade, antes que telhamos de lhe pedir os sacrifícios indispensáveis para completar êsses serviços, em harmonia com as necessidades presentes e futuras.
Sr. Presidente: não posso aventurar-me a dizer que se não tenham feito todos os esfôrços para se conseguir êste desideratum mas até agora não foi conseguido ou seja por deficiência do direcção, por vício de organização, ou seja ainda por incompetência do pessoal. O certo é que os serviços postais e mesmo telegráficos têm absorvido quantias avultadas desde que se proclamou a República até hoje e todos sentem que êsses serviços funcionavam melhor nos últimos tempos da monarquia do que actualmente. Os serviços telegráficos, nos tempos da monarquia, funcionavam muito mais regularmente do que funcionam hoje apesar de haver mais linhas, muito mais pessoal e êste muito mais bem pago.
Não é, com certeza, pelo facto do serviço ser maior, porque, como digo, o pessoal é muito mais numeroso e as horas de serviço extraordinário pesam por tal forma sôbre as despesas provenientes dêsses serviços, que bem se pode dizer que representam uma percentagem muito elevada nas despesas efectuadas com os serviços postais.
Sr. Presidente: parece-me acertado estabelecer-se que o empréstimo se faça por séries, que podem ser de 2:000 contos, mas julgo tambêm necessário que com relação a cada 2:000 contos se faça uma planta ou um plano, e que essa planta ficasse inteiramente nas repartições técnicas, porque nós com isso nada temos.
Ainda, Sr. Presidente, isso representa uma economia notável, porque se pagará monos juro e não se influirá, tam decisivamente no agravamento da situação cambial, visto que a exportação de ouro será temporizada, devendo mesmo, ao que parece, realizar-se as reformas das linhas nacionais, as ligações que são necessárias e construir-se as novas linhas telegráficas e telefónicas em Portugal. Faça-se êsse empréstimo, mas faça-se com que uma parte dêle seja imediatamente aplicado ao país, o que, se envolve juro, não envolve exportação de ouro, adiando-se,
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portanto, a compra de material estrangeiro e a construção de novas linhas para mais tarde, quando a situação cambial nos seja mais favorável.
O Sr. Raúl Portela (interrompendo): - Uma das razões por que fui de parecer que o empréstimo se deve contrair em séries é porque contraindo-se um empréstimo só fica a vencer juro até que tenha aplicação completa, ao passo que fazendo-se em séries de 2:000 contos, para imediata aplicação, quási não vence juro.
O Orador: - Ainda há outra vantagem que se não afigurou a V. Exa. mas que não deixa de ser interessante.
Estou convencido de que todas as vantagens já foram devidamente pesadas pelo Sr. Ministro e pela comissão técnica. Bom é que isto se diga, para que, pelo menos, resulte da atitude parlamentar uma linha de conduta para o Govêrno que possa servir de abonação para essa mesma conduta.
Há, porêm, nas emendas do Sr. Raúl Portela alguma cousa de interessante o de necessário, sem violar nem o espírito, nem a letra da lei.
Já aqui se disse, e é conveniente repeti-lo, que da verba destinada à reorganização dos serviços telégrafo-telefónicos podiam desviar-se algumas quantias em benefício do respectivo pessoal. S. Exa. o Sr. Ministro afirmou que tal não era possível, mas o certo é que, lendo o artigo 1.° da proposta e o artigo 1.° a 6.º do decreto, fica-se com o direito de ter dúvidas.
Pela declaração expressa de S. Exa. nós ficamos sabendo qual a interpretação que lhe dá o Sr. Ministro. Mas nesta altura, em que os serviços postais e telegráficos nos dão apenas a hipótese longínqua duma participação de lucros, visto que actualmente só nos dão deficit...
O Sr. António Maria da Silva: - Não apoiado!
O Orador: - A poucos meses do avultado aumento de vencimentos que a êsse pessoal foi concedido, não é permitido um novo aumento, quando chegámos ao momento de impor a todos os funcionários, a todos os empregados do Estado pesados sacrifícios, que são absolutamente indispensáveis, se quisermos fixar na administração pública pelo menos a tendência para a redução das despesas.
As minhas palavras representam o propósito sincero de que esta lei seja estabelecida em obediência aos interêsses nacionais.
O Sr. António Maria da Silva: - Nem se pode supor outra cousa!
O Orador: - E que seja estabelecida por uma forma criteriosa e honesta, em harmonia com as supremas exigências da defesa nacional. E se algumas preguntas fiz, algumas dúvidas expus, foi apenas com o intuito de esclarecer por completo a questão, para se poder dar ao país a impressão de que sendo uma despesa indispensável ela será empregada em num melhoramento de incontestável utilidade pública.
O orador não reviu.
O Sr. António Maria da Silva: - Sr. Presidente: o assunto constante do parecer n.° 255, que se encontra em discussão neste momento, é um assunto que só impõe à consideração do Parlamento. E se nesta hora avançada da sessão legislativa, em que, infelizmente, questões de magna importância tem sido tratadas com menos carinho e sem aquela explanação que elas merecem, eu me abstenho de fazer a justificação plena dêsse parecer, não posso, todavia, deixar sem reparo algumas afirmações feitas nesta Câmara, que não correspondem inteiramente à verdade. Porque os ilustres Deputados que sôbre êle usaram da palavra quisessem dalguma maneira modificar os termos ou as conclusões das estatísticas a seu belo prazer? Não, decerto. Mas porque não estavam informados convenientemente, e ainda porque neste assunto, de carácter técnico, se torna necessário conhecê-lo um pouco em detalhe para se poder formar um juízo claro e consciencioso.
Afirmou-se ontem, ao discutir-se a generalidade do parecer, e foi hoje novamente afirmado nesta sessão nocturna, pelos Srs. António Granjo e Raúl Portela, que era absolutamente criminoso permitir que a verba de 8:000 contos fôsse despendida em pura perda, para
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avolumar simplesmente os vencimentos, já avultados, do pessoal. Seria realmente criminoso se assim fôsse, e desde que a situação se refere ao § único do artigo 198.° da organização vigente, mio há o direito de julgar que algumas verbas dela pudessem ser distraídas para outros serviços.
Mas, independentemente disso e das ajudas de custo, os funcionários têm nas verbas orçamentais a parte que lhes diz respeito dos serviços de que estão encarregados.
A organização de 24 de Maio de 1911 estabeleceu que das receitas fôsse uma parte para o fundo de reserva e a outra para o objectivo a que se refere êste artigo, isto é, 25 por cento para o Estado e 75 por cento para o fundo de reserva, alêm da verba de 400 contos que o Estado recebia tambêm, que, no sistema de partidas dobradas, tinha necessáriamente de inscrever-se como uma despesa, porque era realmente um encargo da administração, e no Orçamento Geral do Estado tinha de inscrever-se como receita. É essa a verba a que o Sr. António Granjo se referiu, e devo dizer que para o Estado não é deficit, mas sim carência de receita.
Os funcionários dos correios e telégrafos não são dos funcionários mais bem remunerados da República, porque outros serviços há que saem mais caros ao Estado, e isso lhes deu realmente razão de ordem moral para reclamarem tendo sido feitas as reformas durante a gerência do Ministério de que V. Exa. fez parte, aumentando os vencimentos, ajudas de custo, etc.
Por essa ocasião, V. Exa. sabe, que eu fiz questão para o meu nome não ir incluído na respectiva lista, e não me envergonho de confessar, que, sendo o cargo que ocupo um dos de maior responsabilidade, não só em Portugal mas em todos os países do mundo, os meus vencimentos não estão em paridade com os dos outros funcionários.
Nem todos assim fizeram, e V. Exa. há-de confessar que isto é assim; depois de ter sido votado que para os directores gerais dos Ministérios fôsse fixado o vencimento de 4.500$, o meu é de 2.400$. Há até funcionários meus subordinados que recebem mais do que eu.
De modo que, dando o meu voto a êste projecto eu apenas cuido dos interêsses do país, e não cuido dos meus interêsses nem dos funcionários meus subordinados.
Os serviços chegaram a êste estado, porque durante três anos não foi possível comprar material, porque em parte alguma o queriam vender, visto ser pouco para a guerra; portanto, acho de toda a vantagem que êste projecto seja aprovado, porque vem beneficiar o público que a êle tem direito, visto para isso pagar. Em Portugal há a preocupação de arrecadar o dinheiro, quando êle deve servir para melhorar o serviço público. Assim na gerência da administração dos correios em seis anos elevou-se o fundo de reserva à verba de 1:500 contos, e porquê?
Porque na Administração dos Correios e Telégrafos houve sempre o cuidado de calcular as despesas pelo máximo e as receitas pelo mínimo.
E eu pregunto se o Estado fez em relação a uma corporação de cêrca de 7:000 pessoas mais esfôrços durante a guerra, do que com qualquer corporação mais pequena, em que o Orçamento Geral do Estado inscreve verbas que são despesas reprodutivas, emquanto que outras são apenas despesas e mais nada.
Sr. Presidente: o Estado devia pôr na rua todos os que nada produzem.
Não se tem feito isso e o descrédito tem chegado aos serviços públicos, atingindo tambêm a Repartição dos Correios e Telégrafos.
Foi preciso que eu mantivesse ali a mais severa disciplina para evitar a anarquia, e a estas horas só a minha ponderação conseguiu evitar que nesse organismo se produzisse o mesmo descalabro dos outros serviços oficiais.
Sr. Presidente: a diferença que há entre 1911-1912 e o ano de 1917-1918, representa um aumento só em receita telegráfica de 1:000 contos.
É preciso que êstes números fique nos ouvidos de V. Exa.
Sr. Presidente: não há ninguêm que não saiba que para se obter comunicação de Lisboa para o Pôrto são precisas duas, três e quatro horas e às vezes não se pode falar, porque há uma só linha.
Vão-se construir mais cinco linhas entre as duas cidades e assim teremos um
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grande aumento de receita, ficando habilitados, a breve trecho, a saldar a maior parte do empréstimo, contraído ao Govêrno.
Vou mandar para a Mesa uma modificação ao corpo do artigo 1,° Não se trata de aumentos de vencimentos para ninguêm, mas duma obra absolutamente rendosa e produtiva.
O que se não deve é coarctar ao Govêrno a acção que lhe é devida nestes casos, e não podemos admitir que se não deixe ao Poder Executivo a faculdade do fazer o empréstimo por meio da Caixa Geral de Depósitos.
Estes trabalhos podem ser feitos em conjunto, porque o país está dividido em estações electrotécnicas.
Há trabalhos do conjunto que só se podem começar com a certeza absoluta de que se vai até o fim, e, portanto, o Ministro é que é o juiz para saber a hora em que se devem fazer os contratos.
O empréstimo pode ser feito, o máximo; em três sérios, mas é natural que o seja em duas séries.
Sr. Presidente: referindo-me ainda à orientação administrativa da Direcção Geral dos Correios o Telégrafos, eu devo dizer a V. Exa. e à Câmara, em abono da verdade, que poucos organismos do Estado, mesmo som serem de carácter autónomo, têm aquela fiscalização do serviço dos correios e telégrafos.
Cumpriram-se os regulamentos e leis orgânicas.
Os Ministros não podem dar uma ordem neste organismo do Estado. Nunca aconteceu isso.
O assunto é interessante, mas não quero alongar-me em mais considerações a êste respeito.
E bom, e tenho o direito de dizê-lo à Câmara, não afirmar o que se não pode provar.
Não quero senão contribuir para que do Parlamento da República saia uma medida que honre as pessoas que a trouxeram; e para iniciar-se aquela obra proveitosa, digna, que o país tem o direito de exigir.
Os serviços devem corresponder aos intuitos.
Mando para a Mesa uma emenda ao artigo 1.° para satisfazeres desejos dos Srs. Deputados.
O dinheiro é preciso: não é para beneficiar ninguêm.
Foi lida e admitida a proposta de emenda.
Proposta
Proponho a seguinte emenda ao corpo do artigo 1.°:
"É autorizado o Govêrno a contrair um empréstimo de 8.000:000$, destinado à remodelação e ampliação das redes telegráficas e à construção da rede telefónica inter-urbana geral e condutores internacionais e das respectivas estações, não incluindo os edifícios". - António Maria da Silva.
Para a Secretaria.
Admitida.
Aprovada.
Para a comissão de redacção.
Foi lida e rejeitada a proposta do Sr. Raúl Portela.
Foi lida e aprovada a proposta do Sr. António Maria da Silva.
Ficou prejudicada a proposta do Sr. Raúl Portela.
E aprovada a primeira proposta, salvo a emenda do Sr. António Maria da Silva.
Segunda parte
Interpelação do Sr. Brito Camacho sôbre o caso do arroz
O Sr. Costa Júnior: - Peço o favor a V. Exa., Sr. Presidente, de me dizer-se o requerimento, apresentado não é para a discussão ser feita na especialidade.
O Sr. Presidente: - O requerimento considero-o dividindo a discussão em duas partes.
Se o requerimento dissesse que a discussão era até a especialidade do parecer, então considerava-o assim.
Mas a discussão fez-se, é que pôde ser feita.
Agora tem de passar-se à segunda parte da ordem da noite.
O Sr. Costa Júnior: - V. Exa. tem de fazer a discussão na especialidade, conquanto se não faça a votação.
O Sr. Presidente: - Não consultei a Câmara. Tenho esta opinião, e V. Exa. não me convence do contrário, o que lamento.
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Eu tenho de dirigir os trabalhos, e por isso tendo formado a minha opinião a respeito do assunto, não consulto a Câmara.
O Sr. Costa Júnior: - V. Exa. interpretou assim, mas...
O Sr. Presidente: - Se o requerimento dissesse que a discussão deveria ser feita até a votação, evidentemente não precisava a segunda parte.
Foi discutido o que pôde ser discutido.
Vai entrar-se na segunda parte da ordem da noite.
Tem a palavra o Sr. Júlio Martins para continuação da discussão da interpelação do Sr. Brito Camacho sôbre o caso do arroz.
O Sr. Júlio Martins: - Eu não teria pedido a palavra pela segunda vez, se não tivesse ouvido as considerações que o Sr. Brito Camacho trouxe ao Parlamento na segunda vez que falou.
A Câmara ficou sciente de que em Março de 1917 o Govêrno fez um contrato com o espanhol Casimiro Reys para a compra em Espanha de arroz que devia ficar franco em Portugal a $26 e o país constata que são passados quási três anos e que está desembolsado de 360 contos, e que até hoje ainda não chegou a Portugal um bago de arroz.
Esta é que é a decantada questão do arroz.
Era face dos documentos e consultando o meu dossier, eu conclui que toda essa complicação tinha sido a rapaziada, a inocência da nossa delegação de Madrid.
O Sr. Brito Camacho, com as suas considerações, vem, como naquela área da Traviata: - Corro a salvar-te!
Quis tambêm S. Exa. informar que na mão do espanhol existe uma arma jurídica sôbre a qual êle se firma para dizer ao Govêrno Português que se não cumpriu o contrato, foi porque o próprio Govêrno tambêm o não cumpriu.
Afirmei eu que o espanhol em 20 de Junho de 1918 escrevera uma carta à Legação de Portugal, apresentando-se para fazer um novo contrato.
Quando é que Reys fala desta forma? Quando é que vem perante a Legação de Madrid pedir que comunique ao Govêrno de Portugal que êle quero cumprir o seu contrato, declarando que o arroz se pode porventura estragar com os primeiros, calores, apesar de estar glaciado?
É - fixemos bem esta data - em 20 de Junho de 1918; mas, dias depois, o Sr. Augusto de Vasconcelos, já Ministro em Londres, passa por Madrid e é então que o espanhol lhe apresenta o documento que já tive ensejo de ler à Câmara, documento que o Sr. Augusto de Vasconcelos confirma, rubrica e acrescenta.
Vem então agora o Sr. Brito Camacho com a carta do "corro a salvar-te", em 1919, três anos depois, sem que as repartições públicas, a Legação em Madrid, o Govêrno e nós dela saibamos cousa alguma!
E vem agora afirmar-se a respeitabilidade da Legação de Madrid, alegando-se que o Sr. Augusto Soares, numa conversa a que porventura assistiu o Sr. Afonso Costa, disse ao Sr. Augusto de Vasconcelos que ficaria o nosso antigo Ministro em Madrid encarregado de resolver a operação do arroz como melhor entendesse!
Pregunto eu agora, Sr. Presidente: quando foi que o Sr. Augusto de Vasconcelos esteve em Portugal e teve com o Ministro dos Negócios Estrangeiros de então a conversa a que por acaso assistiu o Sr. Afonso Costa? Quando?
Disse o Sr. Brito Camacho que o não sabia ao certo, mas que devia ter sido por alturas de Setembro, no entanto, talvez tivesse sido mais tarde.
Disse o Sr. Brito Camacho que se achavam protocolizadas as cartas do Sr. Egas Moniz e do Sr. Freire de Andrade.
Posso, Sr. Presidente, afirmar que assim não sucede, mas que apenas existe o protocolo do contrato assinado pelo Sr. Augusto de Vasconcelos, firmado por um notário espanhol. Vi êste documento e ninguêm pode asseverar que êle se não acha protocolizado.
O Sr. Brito Camacho: - Eu disse apenas que ignorava que o documento estava protocolizado, mas, em face do que V. Exa. acaba de dizer, fico-o sabendo.
Orador: - Tendo V. Exa. certamente consultado toda a documentação, eu não
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poderia supor que não tivesse observado êste documento.
O Sr. Brito Camacho: - Esse não li.
O Orador: - Vamos então ao assunto.
É Casimiro Reys que afirma que teve uma conferência com o Sr. Augusto de Vasconcelos em 21 de Novembro e que S. Exa. tinha regressado de Portugal por essa ocasião, de modo que a tal conversa não se devia ter realizado em Setembro, a não ser que o Sr. Augusto do Vasconcelos tivesse estado em Portugal a tratar das festas ao Sr. Presidente da República desde Setembro a Novembro.
É deveras para estranhar que, sendo o negócio do arroz tratado pelo Ministério dos Abastecimentos, nem ao menos o Ministro, por cuja pasta o assunto corria, fôsse chamado a saber quais os termos em que êle se encontrava.
Eu vou caminhando pela argumentação do Sr. Brito Camacho. Não trago documentação diferente da que existe nas repartições públicas e é por ela que faço as minhas afirmações, não as baseando em quaisquer conversas particulares que porventura se deram.
Conversas são conversas e esta questão há-de tratar-se únicamente à face dos factos e dos documentos.
Em Setembro - ou seja Novembro como os documentos indicam - já o negócio do arroz está baralhado, está confundido, está atrapalhado, sem que o Ministro dos Negócios Estrangeiros, sem que o Ministro dos Abastecimentos, sem que Govêrno do país saiba o que de verdade se afirmava nos próprios documentos. E eu preguntaria se o Sr. Augusto de Vasconcelos fez então a exposição que resultava dos documentos, isto é, se S. Exa. explicou qual era a remessa, para a qual pediu o dinheiro; eu preguntaria se a nossa Legação de Madrid não teria informado o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros e o Sr. Afonso Costa, que por acaso ali entrou, sôbre as afirmações de Reys, no documento de 5 de Abril de 1917, em que êle dizia que parte do arroz já devia estar em Lisboa e a outra parte a caminho de Portugal; eu preguntaria se o Sr. Augusto de Vasconcelos teria dito ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros e ao Sr. Afonso Costa, que por acaso ali entrou, o que é que Reys afirmava no seu telegrama de 11 de Abril, afirmando que o seu dêlegado tinha recebido o dinheiro e que, embora a exportação estivesse paralisada, se realizaria o negócio; eu preguntaria se o Sr. Augusto de Vasconcelos teria dito ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros e ao Sr. Afonso Costa, que por acaso ali entrou, quem é que o tinha autorizado a contratar com o espanhol as 4:000 toneladas de arroz, combinando com êle que 2:500 toneladas deviam ser entregues à França, e o rosto devia vir para Portugal. Mas estava tam baralhada a questão que eu duvido, por maior que fôsse a inteligência do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, e por maior que fôsse, e é, a inteligência do Sr. Afonso Costa, pudesse compreender alguma cousa, sendo muito natural que a resposta de S. Exa. fôsse: "Arranjem lá isso, mas de maneira que o arroz venha".
Admitindo, mesmo, que o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros e o Sr. Afonso Costa sabiam tudo e que a Legação de Madrid ficasse com poderes para conduzir o negócio como entendesse, - oh, Sr. Presidente! - então maior é a ignorância, maior é o desleixo, maior é a rapaziada.
Mas eu preguntaria ainda, em face da carta rubricada pelo Sr. Augusto de Vasconcelos, quando é que o arroz podia vir para Portugal - nunca, se o espanhol quiser!
Não há prazo, não há absolutamente nada!
O espanhol pode exportar ou deixar de exportar o arroz, ou deixá-lo de herança para ser comido pelos nossos bisnetos ou trinetos!
Então o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros e o Sr. Afonso Costa, pela exposição que lhes fez o Sr. Augusto de Vasconcelos podiam autorizá-lo a dar preço diferente ao arroz do que aquele que estava estabelecido no primitivo contrato?
Sr. Presidente: é muito o respeito que tenho pelos Govêrnos do meu país, mas nem por isso eu posso deixar de protestar contra o facto de se tratarem estas cousas por simples conversas, por simples autorizações.
Não pode ser assim, porque a fazenda pública não é dêles, não é de ninguêm, é de todos. (Apoiados).
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Se é assim, então que fiquem os Srs. Augusto de Vasconcelos e Afonso Costa ligados às ordens que deram.
Então, Sr. Presidente, o Sr. Afonso Costa podia - eu não acredito que o fizesse - dizer à nossa Legação em Madrid que resolvesse ela o assunto como quisesse e o Sr. Augusto de Vasconcelos dar um preço muito maior que $26?
Qual é o preço do contrato?
É de $26.
O que é que o Sr. Augusto de Vasconcelos afirma nos documentos?
Sr. Presidente: onde é que está o preço do contrato?
Onde estão os $26 em que há-de ficar cada quilograma de arroz, franco em Lisboa?
Então, até neste contrato, qual seria o interêsse do espanhol?
Era que o câmbio se agravasse. Êle mais receberia.
Então qual era o preço por, que ficava o arroz em Lisboa?
Não sabemos.
Então era com uma autorização destas que a nossa Legação em Madrid entendia defender os interêsses do país?
O que afirma mais êste documento?
Afirma que os 316 contos, que deviam ser entregues ao espanhol para que êle pusesse o arroz em Lisboa, franco, isto é, sem despesas de frete, etc., lhe foram entregues só para pagamento do custo do arroz, isto é, fora transporte, fretes, etc.
Sendo assim, Sr. Presidente, veja a Câmara como nos achamos em presença duma questão de administração pública. Eu não quero tratá-la sob outro aspecto.
Veja a Câmara se ficam ou não de pé as considerações que vim fazer aqui.
Veja a Câmara as responsabilidades de quem, como Ministro de Portugal em Madrid, realizou sôbre o arroz uma tal operação.
Sr. Presidente: estranho extraordinariamente que o Sr. Dr. Brito Camacho a quem todo o país respeita, e eu admiro a sua grande inteligência, que a tem, a sua grande autoridade, que a tem (Apoiados), embora discorde absolutamente dos seus processos políticos, eu tenho tido desde estudante, pela mentalidade de S. Exa. o mesmo respeito que hoje lhe tributo (apoiados), estranho, dizia, que S. Exa., - tam desgraçada é a questão! - deixe confundir-se, como que apagando a sua própria inteligência, na apreciação dêstes documentos.
Afirma-se que o espanhol por sua livre vontade iria entregar o dinheiro, mas passados dias, declarava que só o entregaria se o chamassem aos tribunais.
Sr. Presidente, perante um facto tam grave, como era a resposta do espanhol, nada se fez.
Teve o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros conhecimento das afirmações graves de Casimiro Reis? Foram em Janeiro?
Êsses factos precisam de ser esclarecidos. (Apoiados). A comissão tem de proceder a um inquérito completo, sôbre êste assunto doa a quem doer, para que se conheçam bem todas as altas competências do país, todas as sumidades antigas e que o continuam a ser. É preciso conhecer quais os funcionários cuidadosos, porque, se assim não fôr, a República degrada-se, a República desonra-se. (Apoiados).
Ás considerações que fez o Sr. Brito Camacho responderei apenas lendo os documentos dêste processo, tirando dêle as conclusões lógicas, as ilações concretas que se sabem.
Parece-me que às considerações do Sr. Brito Camacho mais nada tenho a responder. Mas vou dirigir-me ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros - e sabe S. Exa. que tenho por si a mais alta e profunda consideração, mas não posso calar, o que vou dizer, por maior que seja a consideração pelos altos merecimentos de S. Exa.
Desejo que V. Exa. me responda o seguinte:
Qual é a quantidade de arroz que existe hoje em Espanha?
Desejo tambêm saber a quem está consignado êsse arroz e desejo saber se êsse arroz existe em condições de poder ser exportado.
Desejo saber, se até hoje a nossa legação em Madrid pediu ao Govêrno Espanhol que lhe dêsse facilidades, para a exportação das 4.000 toneladas e se não seria mais lógico, mais natural e mais consentâneo com as circunstâncias saber em que condições se encontram as 1.500 toneladas de arroz.
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Pregunto, se porventura, quisermos importar as 4.000 toneladas de arroz, teremos, conforme se diz nos documentos, de pagar um prémio de 1.600.000$?
Estranho a atitude, em que se colocou o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, estranho que o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros que tem tratado do assunto, dissesse que chamava à responsabilidade O espanhol Casimiro Reys pelas 1:500 toneladas de arroz.
Como é que o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros vai conciliar a responsabilidade do espanhol com as afirmações que fez o Sr. Augusto de Vasconcelos o que constam hoje do documentos oficiais.
São estas afirmações da nossa Legação em Madrid que entrego à, consideração do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.
O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Melo Barreto): - Sr. Presidente: duas palavras apenas.
Tendo sido generalizada a interpelação do Sr. Brito Camacho sôbre o caso do arroz, usaram da palavra sôbre o assunto o meu querido e velho amigo António Maria da Silva que justificou plenamente, sem que aliás tivesse necessidade de o fazer, a sua correctíssima intervenção na questão do arroz, como Ministro do Trabalho; o Sr. José de Almeida, ilustre Deputado e o grande parlamentar, meu querido amigo Dr. Júlio Martins, cuja figura se destacaria em qualquer Parlamento do mundo, pelo vigor da sua inteligência e pelo esmalte da sua palavra.
Acompanhei as considerações de todos os ilustres oradores, não só pela deferência que lhes devo mas tambêm pelo interêsse que já tive ocasião do demonstrar por esta questão, a que o actual Govêrno é estranho, mas que tem procurado resolver com a maior solicitude.
E não desejo que o debate se encerre sem fazer as seguintes declarações que respondem a alguns dos pontos concretos dos discursos produzidos.
1.° O arroz, armazenado em Valência - cuja existência foi verificada, não só pelo Sr. Vasco de Quevedo, encarregado de negócios de Portugal em Madrid, mas, tambêm, pelo Sr. Soares Branco, alto funcionáriio, enviado a Espanha pelo govêrno dezembrista, para adquirir alguns géneros, e, até certo ponto, superintender sôbre a exportação de produtos alimentícios para Portugal - está sob a vigilância do vice-cônsul naquela cidade o Sr. Leopoldo Aguirre Verdaguer, que segundo comunicação feita ao Govêrno espanhol, em 21 e 26 do Outubro último, é o único agente encarregado de realizar o despacho da respectiva exportação, logo que ela seja autorizada.
2.° A Legação em Madrid tem instruções para proceder às diligências que a habilitem a enviar lhe um relatório circunstanciado sôbre a quantidade precisa de arroz existente em Valência e as condições de conservação em que êsse arroz se encontra.
3.° Sôbre a situação dos fundos fornecidos pelo Sr. Augusto de Vasconcelos, não tem outros esclarecimentos que não sejam os da nota da Legação do Madrid de 19 de Abril de 1918, reproduzindo uma declaração do espanhol Reys segundo a qual êste recebeu 649,49l pesetas, importância da factura definitiva para o pagamento das 10:012 e meia sacas de arroz armazenando um Valência e tinha em depósito, em 21 do Fevereiro anterior, no Banco Hispanho-Americano, de Valência, à sua ordem, 181:062 pesetas, mais 810 pesetas, e no Banco do Espanha, em Madrid, 175 pesetas, havendo, ainda à ordem de D. Ricardo Piñana, fabricante de Valência. 76:030 pesetas, isto é um total de 907:500 pesetas, fora outras despesas respectivas à contribuição, armazenagem, gratificações, etc., que o mesmo Reys diz seriam oportunamente justificadas.
4.° A Legação em Madrid ratificará junto do novo Govêrno Espanhol, as suas instâncias para que seja autorizada a remessa do arroz, e eu confio em que êsse Govêrno há-de honrar a promessa feita pelo seu antecessor, ao Sr. encarregado de negócios de Portugal.
5.° Dada a hipótese do malogro desta solução - o que não é de esperar, a Legação tem instruções terminantes para intimar Casimiro Reys a restituir as somas recebidas do Govêrno Português, para uma compra de arroz a que não deu cumprimento, nos precisos termos do ofício do Ministério dos Negócios Estrangeiros, de 9 de Agosto de 1918, e, em caso de recusa, para entregar a questão
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às justiças espanholas, - sem que, para isso, seja impedimento a opinião do distinto advogado Pablo Salmeron, a que o Sr. Júlio Martins se referiu, expressa no sentido de que Casimiro Reys está na relação do direito, isento de responsabilidade, opinião respeitável sem dúvida, mas não de natureza a fazer com que o Govêrno desista do direito que lhe assiste e do dever que se lhe impõe de chamar à responsabilidade, perante tribunais, o agente da transacção desastrosa de 1917.
O espanhol Reys recebeu o "preço" do arroz. A única "prestação" a que o Govêrno Português estava obrigado era "pagar". Pagou. Desde que "pagou" cumpriu, por sua parte. A circunstância de ter sido proibida, pelo Govêrno Espanhol a exportação é naturalmente, uma razão para que não tenha vindo o arroz; mas não é uma razão para que não venha o dinheiro. Não acredito que exista, em qualquer país, uma legislação que, aplicada ao caso, pudesse justificar o absurdo do Estado português ficar, simultâneamente sem o arroz e sem o dinheiro!
Emfim, os tribunais dirão se, contra o que eu espero, tiver de pronunciar-me sôbre a matéria. Por agora o que posso afirmar à Câmara é que, já nesta altura e em resultado de consultas a que procedi estou munido de pareceres jurídicos, pelo meãos tam autorizados como os do Sr. Salmeron, cujas conclusões são formuladas em sentido contrário às daquele ilustre, jurisconsulto. Êsses pareceres serão produzidos, oportunamente, se houver necessidade de os produzir.
Lê se na Mesa a moção do Sr. António Maria da Silva.
O Sr. Nóbrega de Quintal: - Peço a prioridade para a moção do Sr. Júlio Martins.
O Sr. Presidente: - Estava primeiro inscrito o Sr. António Granjo...
O Sr. António Granjo: - Requeiro a prioridade para a moção do Sr. Brito Camacho.
O Sr. Nóbrega de Quintal: - Nesse caso requeiro a prioridade para a moção do Sr. Júlio Martins, novamente.
O Sr. Presidente: - A primeira moção é do Sr. António Maria da Silva.
O Sr. Brito Camacho: - O facto de ser deputado interpelante não dá prioridade à sua moção?
É apenas o que tenho a notar.
O Sr. Presidente: - Não encontro no Regimento nenhuma disposição que dê prioridade à moção do Deputado interpelante.
O Sr. António Maria da Silva: - Peço à Câmara para serem lidas na Mesa todas as moções.
Foram lidas na Mesa as moções apresentadas.
Moções
A Câmara, corta de que as comissões de inquérito aos serviços do extinto Ministério dos Abastecimentos e ao Ministério dos Negócios Estrangeiros apurarão devidamente todas as responsabilidades que haja, seja quem fôr que as tenha no caso do arroz, em termos que elas possam efectivar-se nas instâncias competentes e considerando que a honorabilidade dos homens públicos, não sendo menos de exigir que a dos homens particulares, tambêm não pode ser menos do que ela digna de respeito, continua na ordem do dia. - Brito Camacho.
A Câmara, reconhecendo a necessidade de se esclarecer, devidamente, o assunto em discussão, continua na ordem do dia.
Sala das Sessões, 10 de Dezembro de 1919. - António Maria da Silva.
Admitida. Aprovada.
Considerando que em Março de 1917 foi, por despacho ministerial, aceite uma proposta do Carlos Reys Ortiz Rendeiro, de naturalidade espanhola, sôbre requisição e transporte de arroz (1:500 toneladas), feita à Comissão dos Abastecimentos, devendo ficar o quilograma do mesmo arroz, franco em Lisboa, a $25 ou $26;
Considerando que, para tal fim, foi posta à ordem do Ministro de Portugal em Madrid a quantia de 316 contos ou 908.045,90 pesetas, e que o mesmo Ministro foi o encarregado do controlar e fiscalizar a operação, nos termos do mesmo despacho e indicações posteriores, isto
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é, que as 1:500 toneladas deviam ser postas em Lisboa, depois de pago o seu custo, sacos, transporte e seguros, a $26 o quilograma, e a sua consignação ao presidente da Secção das Subsistências Públicas;
Considerando que o Estado português está até hoje desembolsado da importância dos 316 contos que pôs à ordem do Ministro de Portugal em Madrid;
Considerando que vai já para três anos e ainda não chegou a Portugal a mais pequena quantidade de arroz;
A Câmara dos Deputados chama sôbre o caso, desde já, a atenção do Govêrno, e resolve entregar definitivamente o assunto à Comissão de Inquérito ao Ministério dos Abastecimentos, quando esta fôr nomeada, para sôbre êle se pronunciar. - Júlio Martins.
Foi aprovada.
O Sr. Presidente: - O Sr. António Granjo pediu prioridade para a moção do Sr. Brito Camacho.
O Sr. Brito Camacho (interrompendo): - A minha moção não prejudica as outras moções.
É rejeitada a prioridade.
O Sr. Nóbrega Quintal: - Requeiro prioridade para a moção do Sr. Júlio Martins.
É rejeitado em contraprova.
São aprovadas as moções dos Srs. António Maria da Silva, Júlio Martins e Brito Camacho.
O Sr. Presidente: - Vai entrar em discussão o parecer n.° 292.
O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Melo Barreto): - Devo comunicará Câmara que o Sr. Ministro da Instrução Pública, por motivo de serviço público, não pode comparecer a esta sessão, mas concorda com o projecto.
O Sr. Costa Júnior: - Suponho que o parecer não deve ser discutido sem estar presente o respectivo Ministro.
É lido o parecer.
O Sr. Pedro Pita: - Peço a V. Exa. que consulte a Câmara sôbre se concorda que seja prorrogada a sessão até se votar êste projecto.
Foi aprovado.
É lido e pôsto em discussão o artigo 1.°:
Artigo 1.° Os alunos das Faculdades de Direito que requereram exames de estado no mês de Outubro de 1918 e não concluíram os mesmos exames, ficam dispensados das provas orais quando hajam sido aprovados nas provas escritas.
O Sr. Costa Júnior: - Sr. Presidente: tenho a dizer a V. Exa. que dou o meu voto ao projecto que acaba de ser lido, projecto que, realmente, se acha bem leito, tendo por fim remediar um êrro do Poder Executivo e regular a situação de rapazes que viam o seu futuro prejudicado por êsse êrro. Lastimo apenas que não tivesse sido pôsto em discussão há mais tempo, e que, tendo-o o Sr. Ministro apresentado há dias, tivesse de ser votado em provas da Imprensa Nacional, visto que a comissão só tarde e a más horas deu o seu parecer.
Tenho dito.
O Sr. Vasco Borges: - Pedi a palavra, Sr. Presidente, únicamente para propor o aditamento do seguinte artigo novo:
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário.
Foi admitido.
Foi aprovado o artigo 1.°
Foi aprovado o aditamento do Sr. Vasco Borges.
O Sr. Costa Júnior: - Requeiro a dispensa da leitura da última redacção.
Foi aprovado.
O Sr. Presidente: - A próxima sessão é amanhã, às 14 horas, com a seguinte ordem do dia:
Antes da ordem do dia - Parecer n.° 280, que estabelece penalidades contra os assambarcadores.
Ordem do dia - A de hoje.
Está encerrada a sessão.
Eram 0 horas e 40 minutos.
O REDACTOR - Alfredo França.